Revista Milímetros nº 8

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revista da audiovisual capixaba nº 8

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editorial

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feminino à frente de nossa entidade a Mostra Produção Independente diretora e produtora Sáskia Sá (Gestões Novos Rumos traz como tema as 2004-2006 e 2006-2008) e a produtora e ações afirmativas e o audiovisual fotógrafa Carla Osório (2008-2010). Ambas enquanto espelho da própria sociedade mulheres inquietas, guerreiras, impetuosas brasileira. Ao longo de seus 18 anos de e perseverantes e que contribuíram, inegaexistência, a ABD Capixaba tem sido uma velmente, para consolidar o papel da ABD voz dos realizadores de audiovisual junto Capixaba enquanto organização que milita aos agentes públicos responsáveis pela pela valorização do audiovisual capixaba política cultural local e nacional. Ouvir, e de seus profissionais. propor, discutir, negociar, avaliar, formu Temos ainda muitos desafios para lar, consultar… Enfim, movimentar-nos tornar sustentável esse importante e pupoliticamente para construir consensos jante setor da economia criativa. Ao poder que contribuam para fortalecer a cadeia público cabe organizar e estruturar a “casa”, produtiva do audiovisual e para instituciocriar condições para que a capacidade nalizar políticas públicas em consonância criativa dos realizadores se converta em com a realidade do mercado é a razão de riqueza - econômica e artística, gerando existir da ABD Capixaba. trabalho, renda, pertencimento e desen Dados da Agência Nacional do Cinevolvimento artístico-cultural. Quando nos ma sobre os filmes de longa-metragem comparamos com outras praças brasileiras, lançados em 2016 demonstram que o percebemos que esse passo ganha mais cinema brasileiro é negligente com a sua celeridade quando a política cultural local diversidade étnico-racial e de gênero: 97,2% funciona democraticamente como um dos diretores são pessoas brancas e cerca catalisador da cadeia prode 80% são homens. Um dutiva do audiovisual. levantamento informal feito Estar à frente de uma enpela produtora Maria Grijó Estar à frente de uma tidade que é dona de um sobre os Editais da Secretaentidade com histórico histórico de tantas lutas traz ria de Estado da Cultura do de tantas lutas traz grandes responsabilidades e Espírito Santo entre 2009 e responsabilidades e desafios, mas também per2016 apontam que 85% dos permite olhar para mite olhar para as pautas do recursos dos projetos cono audiovisual com audiovisual capixaba com templados foi destinado a otimismo. um certo otimismo. Temos pessoas brancas e que 86% lidado com uma geração desse mesmo montante foi inteiramente nova de reapara os homens. lizadores que trazem novas inquietações Isso significa que o audiovisual brasileipolíticas e estéticas, reinventam o modo ro não expressa a diversidade étnico-racial de produzir e difundir filmes, criam e dee de gênero que compõe o país. Pessoas fendem seus espaços de forma ainda mais negras, mulheres, LGBTQI+, indígenas, horizontal. Ao mesmo tempo, a ABD tem, quilombolas e outras comunidades tradiao redor de si, uma atuante e colaborativa cionais lutam para serem soberanos sorede de realizadores históricos que, mesbre a forma como são representados pela mo à duras penas, peitaram as limitações imagem audiovisual. A Mostra Paralela e econômicas e políticas para produzir seus Pós-Mostra Novos Rumos são janelas para filmes. Essa sinergia é muito potente e produções audiovisuais que expressam o animadora! n protagonismo dessas clivagens sócio-culturais que constituem o povo brasileiro e capixaba. O conteúdo editorial da Revista Milímetros também traz esse debate a partir da fala dos próprios realizadores. Pensando esse contexto, é motivo Leandra Moreira de grande honra compor uma tríade de Presidente da ABD Capixaba mulheres na presidência da ABD CapixaGestão Biênio 2017/2019 ba. Fazem parte dessa história do poder


28 Produção de projeção Diego Navarro Assessoria de Comunicação Paulo Gois Bastos e Carolina Ruas Fotografia Luara Monteiro Redes Sociais Guilherme Rebêlo Concepção Visual Gabriel Perrone Apresentadora Janine Correa Vinhetas Thiago Rocha Vídeo Homenagem Carol Covre Curadoria da Pós Mostra Novos Rumos Diego de Jesus Hegli Lotério

Povos Tradicionais: o Audiovisual Como Resistência

Comissão do Júri da Mostra Competitiva André Felix Kênia Freitas Ursula Dart

Realização Associação Brasileira de CurtasMetragistas e Documentaristas do Espírito Santo (ABD Capixaba) www.abdcapixaba.com.br Facebook e Instagram: @abdcapixaba

46 l Obras seriadas são as novas queridinhas do audiovisual

53 l Catálogo O poder de filmar • Mostra Competitiva • Mostra Paralela • Pós-Mostra Novos Rumos

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Apoio Comunicação Impressa Cine Jardins Instituto de Artes e Técnicas em Comunicação (Iatec) Link Digital Livres Filmes Secretaria de Cultura/Ufes TV Gazeta Patrocínio Banestes – Banco do Estado do Espírito Santo

41 l ABD capixaba atua para aperfeiçoar e ampliar as políticas culturais

Edição nº 8 / Ano 2018 Edição e Reportagem Paulo Gois Bastos (MTB/ES 2530) Reportagem e Redação Carolina Ruas, Leonardo Vais, Marcos Sacramento e Paulo Gois Bastos Revisão de Textos Luiz Cláudio Kleaim Projeto Gráfico e Diagramação: Comunicação Impressa Tiragem: 350 exemplares DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Foto de Luara Monteiro

Coordenação de projeção da Mostra Competitiva e de produção do DVD Coletânea Thiago Moulin

Comissão de Seleção da Mostra Competitiva Adriano Monteiro Carol Covre Rosana Paste

Todas as cores do Arco-íris na telona

38 l Audiovisual capixaba se alia a outros estados

Filme Hic, de Alexander Buck

Coordenação Geral e Produção Executiva Leandra Moreira

Filme Montação, de Wan Viana

34 l Por um audiovisual com a cara do Brasil

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Homenagem a Suely Bispo”

Para enegrecer as telas: as conquistas e desafios do cinema negro

O cinema feito por mulheres

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homenagem/perfil Paulo Gois Bastos

Teatro e

cinema com

Foto: Acervo pessoal Suely Bispo

poesia

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Com um percurso de três décadas nos palcos capixabas, exercendo diversas funções do fazer teatral, com cerca de 20 trabalhos no cinema e participação em uma importante obra da teledramaturgia nacional, além de publicações literárias e historiográficas, a baiana Suely Maria Bispo dos Santos é a homenageada da 13ª Mostra Produção Independente – Novos Rumos. Na trajetória dessa artista radicada no Espírito Santo, é possível perceber seu engajamento político na luta pela valorização da cultura negra e da arte de interpretar. Seu riso generoso e, ao mesmo tempo, fugidio ainda expressa o olhar da jovem que enfrentou a intensa timidez para abraçar a carreira de atriz. Suely Bispo aos 18 anos

Os Mais Amados, curta-metragem inédito de Rodrigo de Oliveira

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dedicação à vida artística foi algo que aconteceu sem muito planejamento. Durante a sua infância teve uma única experiência com teatro na escola, mas que não foi levada adiante. “Eu era muito tímida e sofri muito com minha timidez. Foi somente por volta dos 20 anos, assim que me mudei para Vitória, que me aproximei do teatro no movimento de teatro amador. A primeira pessoa do teatro que conheci foi a Maura Moschem, durante o pré-vestibular. Foi uma aproximação rápida, mas só depois soube que ela era do teatro. Logo em seguida, conheci a Verônica Gomes, pois morávamos na Ilha de Santa Maria, primeiro lugar em que residi em Vitória assim que cheguei de Salvador”. Ainda na Bahia, Suely Bispo fizera o vestibular para Comunicação Social, porém não conseguiu ser aprovada. Já residente no Espírito Santo, ingressou na graduação em História pela Universidade Federal do Espírito Santo, em 1986. A escolha pelo curso foi motivada, em parte, por um amigo e namorado que era formado no mesmo curso e, em outra, pela leitura do poema Analfabeto Político, do poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht. “O irônico é que foi alguém do teatro, o Brecht, que me levou a decidir por fazer a graduação em História. Eu gostava do curso, mas fiquei um pouco decepcionada, não sabia se era aquilo mesmo que queria. Se fosse hoje, teria mudado para o curso de Artes Cênicas. Mas essa graduação foi muito importante para a minha formação enquanto ser humano e ser político. Depois de formada, dos anos 90 até o início dos anos 2000, cheguei a atuar como professora de escolas públicas em Serra e Cariacica”.

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Foto: Acervo pessoal Suely Bispo

Espetáculo Oxum (2018)

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Suely se aproximou do fazer teatral a convite de Verônica Gomes: “Tornamo-nos amigas e passei a ir com ela para os ensaios de teatro. Comecei a sentir uma coisa diferente, algo que me atraía para o palco e dizia que eu não devia estar sentada na plateia, mas sim atuando lá em cima”. A constante presença nos ensaios, de certa forma, expressava o desejo de Suely por atuar e lhe rendeu o convite para integrar o elenco da peça A Gang do Beijo, uma adaptação da obra de José Louzeiro sob a direção de Armando Mecenas. Sua primeira aparição na telona é no curta-metragem Fausto (1995), de César Huapaya. Na verdade, trata-se do registro em vídeo inspirado na consagrada obra de Marlowe e Goethe. O filme foi pensado para fazer parte do espetáculo cênico homônimo do Teatro Experimental Capixaba, ambos sob a direção de César Huapaya, fundador dessa companhia e diretor com o qual Suely atua há 24 anos. Essas duas obras, peça e filme, foram os seus primeiros trabalhos como atriz profissional e, dessa forma, seu batismo na profissão. “Foi tão difícil fazer o Fausto, entrar no mangue, gravar no lixão e no abatedouro, tomar banho de sangue. Foi o meu grande teste. Se eu não quisesse realmente ser atriz, teria parado naquele momento. Para abraçar essa carreira, é preciso querer muito e aguentar o tranco, saber que é difícil e, mesmo assim, desejar continuar”. É bem evidente na trajetória de Suely a militância pela valorização da cultura afro-brasileira. No final dos anos 80, ela participou do Grupo Raça, organização que congregava estudantes e militantes negros na Ufes. Essa temática

também perpassa muitos de seus trabalhos no teatro e no cinema, além de estar expressa em sua produção literária e historiográfica. Em 2012, atuou como a primeira coordenadora do Museu Capixaba do Negro - Verônica Pas após sua reforma e restauração. É autora do livro Resistência Negra na Grande Vitória: dos Quilombos ao Movimento Negro, obra que foi publicada em 2006 e deverá ter uma segunda edição lançada ainda este ano. “Hoje temos esse conceito de lugar de fala. Sempre exerci isso onde estou e nos

vários lugares que ocupei e ocupo. Seja as artes cênicas, na literatura, seja no audiovisual, aonde vou levo essas questões”. Durante a vida universitária, Suely se aproximou dos textos poéticos por meio da via teatral. No início dos anos 90, integrou o Guardiães da Poesia, grupo que fazia adaptações dramatúrgicas a partir de vários autores. Essa aproximação entre as artes cênicas e a poesia é uma das marcas de sua trajetória, mas sua relação com a literatura vai mais além: é de sua autoria os livros de poemas

Desnudalmas (2009) e Lágrima Fora do Lugar (2016). Em 2012, ela também concluiu o Mestrado em Estudos Literários pela Ufes com uma dissertação sobre a obra do poeta afro-brasileiro Solano Trindade. Suely também participa do Sarau Afro-tons, em Vitória, que em 2017 lhe rendeu homenagem com o livro-coletânea Zacimbas e Suelys; e do Coletivo Louva Deusas, de São Paulo, iniciativa dedicada à produção de textos e desenhos eróticos de mulheres negras, com que publicou a coletânea Além dos Quartos.

Uma atriz tímida na coxia Espetáculo juvenil de 1987 e estreia de Suely Bispo nos palcos, A Gang do Beijo foi apresentado em Vitória e circulou por algumas cidades do interior do Espírito Santo e também integraram em seu elenco nomes como Eliezer de Almeida, Dudu Guimarães e Verônica Gomes. O enredo dessa montagem se passa em uma escola e a personagem de Suely era uma estudante que fazia parte da turma de alunos rebeldes. “Eles questionavam a ordem e o sistema. Havia um momento em que os estudantes entoavam o Hino Nacional com uma letra diferente e debochada. Eu, ainda muito tímida, só gesticulava com a boca, mas não cantava, pois tinha medo”. Essa timidez acabou por afastar Suely dos palcos, mas não do teatro. Ela continuou a assistir a ensaios de montagens e assumir outras funções do fazer teatral que não a interpretação. Novamente na companhia de Verônica Gomes passou a frequentar a casa do diretor César Huapaya, fundador do Teatro Experimental Capixaba. “Fui assistindo às peças dele e pensava: ‘Quero trabalhar com esse diretor’, pois achava o teatro dele muito bonito. Lembro-me da montagem de

Eu Sou Vida; Eu Não Sou Morte, de Qorpo Santo, que utilizava a linguagem do teatro japonês e foi encenada no final dos anos 80. Foi despertando o desejo de trabalhar com o César, então eu ficava rodeando o teatro, mas fugia do palco”. Parte desse temor de expor-se no palco foi sendo desconstruída em sua participação no grupo Guardiães da Poesia no início dos anos 90. Sediada na Ufes, no Campus de Goiabeiras, e com encontros sempre aos domingos, essa experiência teatral era conduzida pela atriz Margareth Maia, que orientava os processos cênicos e os exercícios corporais. Durante essa vivência, Suely encenou em seu segundo trabalho: a montagem de A Descoberta do Fogo no País do Sabiá que apresentava criações dramatúrgicas a partir da colagem de textos poéticos de inúmeros autores. Enquanto não se entregava à carreira de atriz, Suely ficava “rodeando” o palco, exercendo funções técnicas e nos bastidores. Como contrarregra trabalhou em diversos espetáculos como em Ainda Bem Que Aqui Deu Certo, sob a direção de Erlon Paschoal, e no Auto do Frei Pedro Palácios. “Eu era

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uma excelente contrarregra e gostava de fazer, tanto que profissionalmente primeiro me registrei como contrarregra e só depois como atriz. Também fiz o som para alguns espetáculos junto com o Robson de Paulo. Eu adorava fazer e, de vez em quando, ainda faço. Só não aprendi a fazer luz, pois acho mais complexo, mas quero aprender, pois gosto de atuar em vários lugares no teatro. Acabei exercendo essas funções porque tinha medo de entrar em cena. Era uma defesa, uma forma de estar no teatro e não me expor”. Sua profissionalização como atriz aconteceu em Fausto, espetáculo do Teatro Experimental Capixaba dirigido por César Huapaya. Após mais de um ano de ensaios, essa montagem fez estreia no Fiesta Santafesina de Teatro, em Santa Fé, Argentina. De volta ao Brasil, a peça circulou pelo Espírito Santo com apresentações em Vitória, São Mateus e Cachoeiro. “Foi uma experiência bastante ousada para a época. Era um espetáculo super arrojado, pois o público ficava no palco com o elenco, fomos um dos primeiros grupos a fazer isso aqui em Vitória e as pessoas achavam aquilo estranho e não compreendiam muito bem a proposta”. Em 1996, Fausto foi apresentado na Kuntfest Weimar, em Weimar, Alemanha. “Tive que buscar meu registro profissional por causa dessa viagem para a Alemanha. As coisas foram acontecendo e eu nunca disse assim ‘vou ser atriz’, mas senti o ‘bichinho’ do teatro morder-me e, quando isso acontece, você não não consegue deixar de fazer teatro”. Junto com o grupo Teatro Experimental Capixaba, sob a direção de César Huapaya, Suely atuou em outros cinco espetáculos: O

Beatitude, filme de Délio Freire

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Riso Contra A Dengue (2000); A Flor de Nanã - montagem apresentada de 2004 a 2008 em que se recriava o ambiente de um terreiro de candomblé dentro do teatro; Farsa de Juliana e Dom Jorge (2005) - montagem que recriava um grande um bailado inspirado no folclore brasileiro e no romanceiro medieval, que para Suely foi “um dos espetáculos mais bonitos e alegres que Vitória já assistiu. Foi um dos momentos que eu mais senti prazer de estar no palco”. Nessa peça, ela interpretou mais de um personagem, entre eles a famosa cafetina negra Maria Tomba Homem. Além dessas peças, atuou também em As Relações Naturais (2007), de Qorpo Santo, e Cantantes dos Reis (2009 e 2010). Suely Bispo tem em sua trajetória nos palcos seis trabalhos solos com caráter de performance ou monólogos. O primeiro dele foi Oxum, trabalho criado para um encontro de mulheres negras organizado pela historiadora Edileuza Penha de Souza, em 1996, e com coreografia da própria Suely. Esse espetáculo foi sendo apresentado por diversos anos, sofrendo modificações no seu formato de acordo com o espaço e o público das apresentações. Em 2009, ele desdobrou-se em Oxum e Iemanjá - O Encontro das Águas, proposta que reúne performance em dança, teatro e poesia. Um de seus trabalhos de destaque é Shakespearianas, montagem que estreou em 1998 e que foi apresentada até 2004. A criação desse espetáculo, que adapta textos de personagens femininas de William Shakespeare, teve seu roteiro escrito por Suely Bispo e Paulo de Paula, que fez a direção. Esse monólogo levou o prêmio pelo Júri Popular de Melhor Espetáculo no 1º Festival Nacional de Monólogos de Vitória no ano de sua estreia e, no ano seguinte, os prêmios de Melhor Cenário e Melhor Figurino no 8º Concurso Nacional de Monólogos Ana Maria Rêgo, no Piauí. A produção de Shakespearianas também tem a assinatura de Suely, que fez outros trabalhos como produtora, especialmente, para os seus espetáculos solos. Nesse formato solo e mesclando poesia e dramaturgia, ainda constam no currículo da atriz as montagens Negra Poesia (2004), proposta com texto de poetas negros como

Waldo Motta, Elisa Lucinda, Cruz e Souza, Solano Trindade, e da própria Suely Bispo; Momento Solano Trindade (2008), sarau poético pelo centenário de nascimento do poeta Solano Trindade; e Um recital para Miguel Marvilla (2014 a 2018). Suely Bispo também fez parte da Companhia de Teatro Terra Rádio, iniciativa que desenvolvia montagens infanto-juvenis com a temática ecológica. Dessa empreitada atuou nas montagens Rádio Terra Planeta Água (2001); Nem Todo Lixo é Lixo (2004 a 2008); e Alice no País Sem Maravilhas (2005 a 2007). Esses espetáculos contavam com textos de Margareth Maia e com a direção de Verônica Gomes, circulavam principalmente em escolas e foram apresentados no Instituto Terra, em Aimorés-MG. Em 2000, como resultado de uma oficina de teatro de máscaras, sob o comando do diretor Dácio Lima, da Companhia do Gesto do Rio de Janeiro, Suely integrou o elenco da peça Jogo de Máscaras. Durante a preparação, o jeito brincalhão e, por vezes, disperso da atriz foi motivo de reprimendas por parte do diretor. Tal exigência de disciplina contribuiu para que ela ficasse mais atenta ao seu trabalho de intérprete.

3331, curta-metragem de Jorge Nascimento

Em 2002, integrou o elenco de In Sanatório, montagem escrita e dirigida por Pablo Cruces. Nessa proposta de teatro imersivo, o público era transportado por um ônibus com janelas vedadas até o local do espetáculo: uma casa onde funcionava um manicômio. A montagem teve ampla repercussão na época e Suely interpretava uma louca que falava com Deus. Alguns espectadores, eventualmente, chegavam a confundir a ficção com a realidade durante as apresentações. Completam a lista de trabalhos para o palco Ah, Vitória que Saudades, montagem de 2015 com texto do Milson Henriques e direção de Verônica Gomes; e Na Carreira do Divino, peça escrita por Carlos Alberto Soffredini com direção de Robson de Paula. Além desses, os autos: Auto de Frei Pedro Palácios, onde fazia a cena do povo e o anjo negro; e Auto da Paixão de Cristo, com direção de Verônica Gomes, que se apresentava na Pedra Cebola.

Interpretar para as lentes e telas Depois de seu batismo como atriz no espetáculo e no filme Fausto, ambos dirigidos por César Huapaya, Suely Bispo integrou o elenco da ficção Herói da Bingolândia, curta-metragem de 2001 dirigido e roteirizado por Ricardo Sá e Alexandre Serafini. Sua personagem era uma bêbada. Também fizeram parte do elenco Wilson Coelho, Marco de Castro, Júlio Barros, entre outros. As gravações aconteceram nas praias do município de Serra e o filme brinca com linguagem do gênero fílmico western para fazer crítica política. Em 2003, fez uma pequena participação no curta E no Princípio Era o Verbo, de Virgínia Jorge. Durante seus primeiros trabalhos para o cinema, Suely ainda não tinha muito clara a diferença que é interpretar para uma lente

em relação à atuação nos palcos, sobre a necessidade de diminuir-se o histrionismo teatral. “No início, eu não tinha essa percepção, em Fausto, pensar isso não era importante, pois era uma montagem de teatro para o cinema, assim não foi preciso aprender essa técnica de interpretar em função da linguagem do cinema. Depois que fui fazendo outros filmes, eu ouvia as pessoas falarem: ‘O pessoal do teatro exagera no cinema, fica aquela coisa exagerada e exacerbada’. Aí, fui começando a perceber a diferença. No filme 3331 considero que estou muito teatral, apesar de eu gostar. Depois desse filme, comecei a ficar mais natural, fui trabalhando isso em mim”. Produção de 2011, 3331 é um curta-metragem dirigido por Jorge Nascimento em que Suely é uma das

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Um Recital para Miguel Marvilla (2017)

personagens protagonistas do roteiro. Suely também emprestou sua voz para três obras cinematográficas: foi a narradora off do documentário Reis Quitumbis - curta de 2009 dirigido pelo antropólogo Osvaldo Martins, com fotografia de Ricardo Sá e que retrata o cotidiano cultural e econômico de comunidades quilombolas do norte capixaba. Em 2012, fez a voz original para Um Apólogo, animação de Darcy Alcântara, Felipe Gaze, Wolmir Alcântara e Délio Freire e, no ano seguinte, para um dos episódios da série de animação A Flauta dos Sonhos, produção de 2013, roteirizada por Délio Freire e dirigida por Darcy Alcântara e Wolmir Alcântara. Em 2014, interpretou duas prostitutas na ficção Cais dos Cães, curta-metragem roteirizado e dirigido por Marcos Veronese. Esse filme teve como inspiração a crônica José Versus José, do jornalista Pedro Maia. Nesse mesmo ano, ainda atuou no curta A Letra do A, produção institucional do Ministério da Educação dirigida por Jefinho Pinheiro. Em 2015, interpretou a orixá Oxum na ficção afro-futurista Beatitude, de Délio Freire. Curta-metragem este que faz uma releitura do mito da escrava Anastácia. Nele, Suely divide a tela com o ator Markus Konká, que interpreta São Benedito. Nesse mesmo ano, foi lançado o primeiro longa-metragem do currículo de Suely Bispo: Destinos das Sombras, de Klaus Berg. Seus últimos trabalhos para o cinema foram os curtas ficcionais ainda inéditos Os Mais Amados, de Rodrigo de Oliveira, no qual interpreta a mãe de Jesus; e Abelha Rainha, de Thayla Fernandes. Os dois filmes se encontram em fase de finalização. Em relação a

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Foto: Acervo pessoal Suely Bispo

reportagem

essas recentes produções, Suely diz que tem se surpreendido com o profissionalismo dos projetos. “Foram sets muito bem organizados, trabalhos conduzidos de uma forma muito competente e organizada. Isso me chamou a atenção. Foram experiências muito boas desde a preparação até as filmagens. Apesar de toda a dificuldade que é produzir cinema no Espírito Santo, temos visto ótimas produções. O pessoal do cinema tem que ser guerreiro para fazer a coisa acontecer. Percebo que estamos evoluindo bem técnica e artisticamente falando. Tenho percebido um profissionalismo maior nas últimas equipes com as quais atuei”. Em 2016, Suely Bispo foi convidada a integrar o elenco da segunda fase da novela Velho Chico, obra de Benedito Ruy Barbosa e Edmara Barbosa, com direção de Luiz Fernando Carvalho. Seu personagem era a mãe preta e cozinheira Doninha que na primeira fase foi interpretada pela atriz Bárbara Reis. “Fui privilegiada pela sorte e pelo destino, pois meu primeiro trabalho na televisão teve a direção de um diretor consagrado como Luiz Fernando Carvalho. De certa forma, eu me identificava com aquela obra, pois a novela fazia vários questionamentos políticos. Apesar da Doninha, minha personagem, ocupar uma posição subalterna como empregada da casa, a obra em si era muito contundente. Ela era também uma conselheira de todos. Foi uma proposta de trabalho não muito comum para a própria televisão. Eu não tinha cadastro na Globo nem enviei currículo para lá; fui descoberta através das redes sociais e do Markus Konká. Foi incrível mesmo!”. n

Marcos Sacramento Colaboração: Adriano Monteiro

É Cinema

inegável o fato de que o audiovisual produzido e protagonizado por negros está passando por um momento de efervescência no âmbito hollywoodiano. O prêmio de melhor atriz-coadjuvante de Viola Davis conquistado no Oscar de 2017, dois anos depois de ela ser a primeira negra a ganhar um Emmy de melhor atriz dramática, indicava sinal de novos ares e novas cores nas telas do cinema e da televisão. Junto com os prêmios conquistados por Davis veio o

NEGRO

entre a explosão criativa e a escassez de recursos Alavancada principalmente pelas políticas afirmativas dos últimos anos, uma nova geração de realizadores negros tem expressado suas inquietudes por meio da produção audiovisual, mas o protagonismo de pessoas negras na direção de filmes no Brasil ainda é muito discrepante quando comparado com a participação de pessoas brancas

triunfo do blockbuster Pantera Negra, trabalho dirigido por um negro, Ryan Coogler, com elenco predominante afrodescendente e trama com pegada afrofuturista. Lançada no começo deste ano, a superprodução arrecadou até o início de junho US$ 1,34 bilhão em todo o planeta, chegando a superar Titanic. Este ano ficou marcado também pela conquista do roteirista e diretor Jordan Peele, primeiro negro a ganhar o Oscar de roteiro original com o terror Corra, filme com indicações também nas categorias “melhor filme”, “melhor diretor” e “melhor ator”. Saindo do cinemão norte-americano para aterrissar em terras brasileiras, onde o dinheiro que circula nas produções audiovisuais nem de longe se compara ao que rola na terra de Donald Trump, ao contrário da discriminação racial, tão incrustada na sociedade brasileira quanto por lá, surge a pergunta: a quantas anda a produção audiovisual de realizadores brasileiros afrodescendentes? Joel Zito Araújo, cineasta e pesquisador, com pós-doutorado em Comunicação e Antropologia pela Universidade do Texas, tem uma visão positiva do momento atual. Na opinião de Joel Zito, a melhor palavra para ilustrar a participação de diretores, roteiristas ou produtores, entre outros profissionais

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Joel Zito Araújo cineasta e pesquisador

O que acelerou muito o processo foi a conquista da política de cotas para jovens negros e indígenas nas universidades. Isso colocou no mercado mais de 300 mil profissionais que estão botando pra quebrar.

negros, no cenário audiovisual brasileiro é “explosão”. “Eu tenho um lugar especial para avaliar esse crescimento da produção negra, porque eu sou curador do encontro do Zózimo Bulbul”, afirma Joel Zito referindose ao Encontro de Cinema Negro Brasil, África e Caribe. “Nesse espaço, observo esse fenômeno em que a palavra ‘explosão’ é mais apropriada”. Lida de modo apressado, a afirmação do cineasta pode parecer um tanto quanto utópica. Ainda mais se confrontada com os números de uma pesquisa da Ancine divulgada no começo deste ano. De acordo com o estudo, que teve como universo de pesquisa 142 longas-metragens brasileiros lançados comercialmente nos cinemas no ano de 2016, há um inquietante déficit em relação ao número de negros

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na função de direção. Dos filmes pesquisados, 97,2% foram dirigidos por pessoas brancas e apenas 2,1% por negros, dos quais não havia nenhuma mulher. De onde vem, então, o otimismo de Joel Zito? A impressão do cineasta mineiro a respeito da atual produção de realizadores negros é sustentada também por números que, se por um lado não refutam os dados da pesquisa da Ancine, por outro oferecem indícios explícitos de mudança. “Durante a fase do Zózimo (2007 a 2012), o encontro tinha característica de ser um evento majoritariamente de exibição de filmes estrangeiros, da África e da diáspora africana. Os brasileiros tinham pouca participação porque eram poucos os filmes feitos por diretores afrodescendentes, então eles eram minoritários no festival, com poucas inscrições, refletindo a realidade do contexto audiovisual brasileiro”, explica Araújo. “O que aconteceu nos três últimos anos é o que vai demonstrar que houve uma explosão. Três edições atrás, o festival recebeu inscrições de cerca de 50 filmes de afro-brasileiros e afro-brasileiras, dos quais nós selecionamos uns 30. No ano seguinte, esse número saltou para 108 inscrições e nós selecionamentos cerca de 58 filmes. Neste ano agora o número de inscrições saltou para 172, eu estou em pleno processo de seleção. Veja bem, em três anos, triplicou o número de inscritos e seguramente vai triplicar o número de filmes selecionados e exibidos no encontro”, destaca. Para Joel Zito, o fenômeno inevitavelmente levará a um salto na qualidade dos trabalhos assinados por afrodescendentes. “Tem uma regra no meio audiovisual, que na verdade serve pra tudo, que diz que a qualidade vem da quantidade. Então, com esse aumento de realizadores aparecem aqueles filmes de destaque, filmes de grande qualidade, como o curta Peripatético e o longa Café com Canela”. Lançado em setembro de 2017, Café com Canela, de Glenda Nicácio e Ary Rosa, coleciona prêmios; entre eles os

de melhor roteiro, júri popular e melhor atriz (Valdineia Soriano) na 50ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Além da qualidade artística, o que chama a atenção no longa é a combinação de dois elementos essenciais para a “explosão” de produções audiovisuais capitaneadas por negras e negros. O primeiro deles são as políticas de incentivo à produção audiovisual, por meio de editais viabilizados pelos governos estadual e federal, dentro da parceria dos arranjos regionais, favorecendo realizadores de fora do eixo Rio-São Paulo. O segundo elemento foi a mudança paulatina do perfil dos estudantes universitários nos últimos anos, seja por meio da implantação do sistema de cotas raciais, seja devido

à criação de novas unidades públicas de ensino superior, que resultaram no aumento do acesso de afrodescendentes aos bancos das universidades. A dupla à frente de Café com Canela, por exemplo, é egressa do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), fundada em 2006. “A gente vive num momento muito distinto do contexto da minha juventude”, ressalta Joel Zito, ao lembrar das discussões e reivindicações por mais representatividade negra e recursos para produzir. “O que acelerou muito o processo foi a conquista da política de cotas para jovens negros e indígenas nas universidades. Isso colocou no mercado mais de 300 mil profissionais nos últimos quinze anos. Esses profissionais, que estão ou trabalhando diretamente no mercado diretamente ou nas organizações e grupos políticos, estão botando pra quebrar”. Um desses jovens realizadores que estão botando pra quebrar, como disse Joel Zito, é o capixaba Alexander Buck, diretor de HIC, ganhador do Prêmio Especial do Júri na 12ª Mostra Produção Independente, da ABD Capixaba, realizada no ano passado em Vitória. “Sou filho de políticas públicas que me deram condições de estudar, caso contrário eu não teria condições. Isso é fato, então sou muito grato a isso: a essa revolução que deu acesso a pessoas pobres e negras ao ensino superior”, revela Buck. Formado em Publicidade com uma bolsa integral do Programa Universidade para Todos (Prouni), ele tomou gosto pelo audiovisual durante o curso

Hic, filme de Alexander Buck (2016)

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na Faesa, iniciado em 2008. Se a graduação contribuiu para que ele tomasse gosto, a produção de outro capixaba foi o empurrão necessário para que o rapaz tivesse certeza que queria tornar-se um realizador de audiovisual. “Uma coisa que me marcou muito foi a estreia de Mangue Negro, de Rodrigo Aragão, em 2009. Quando vi aquele filme me deu uma tela azul. Eu fiquei muito empolgado, quase não acreditando. O Rodrigo me mostrou que isso é possível, independentemente de ter recurso ou não, fazer que algo aconteça”. A partir daquela data, Alexander passou a produzir com os recursos que tinha à disposição, utilizando equipamentos próprios, emprestados de amigos ou do laboratório da faculdade. Realizou, entre outros, Jeitinho Brasileiro (2010), Eu Zumbi: Coisas de Bar ou Passa a Régua e Traz a Conta (2011), A Fantástica Vida de Baffus Bagus Bagarius (2012), Monstrólogo (2015), Plantadores de Água (2015) e Repolho (2015). Este foi o primeiro trabalho de Buck como profissional dedicado exclusivamente ao audiovisual, pois até então ele era concursado na Prefeitura da Vitória. “Quando a gente montou a (produtora) Finórdia, o primeiro trabalho foi o curta Repolho. Sabe, eu sempre pensei em criar coisas que não existem, olha a ousadia!, jamais vou conseguir fazer isso, mas é bom ter isso dentro da gente. É daí que saem as ideias legais. É o fantástico, né? Eu tenho uma pegada própria, posso fazer coisas realistas, mas trabalho muito com aforismos filosóficos. O Repolho teve uma trajetória boa. Aqui no Espírito Santo poucos compraram para exibir, mas fez muito sucesso fora. Ganhou um festival na Espanha, em Bilbao, Bideodromo, em 2017, um festival que reunia filmes experimentais do mundo todo, de mais de 40 países. Ele ganhou o prêmio máximo no festival. Aí pensei, alguma coisa ele tem, né?”, conta. A obra representa um capítulo importante na carreira de Buck, não só pela repercussão e pelos prêmios que levou. Foi por causa de Repolho que ele passou a identificar-se como realizador negro e a importar-se com mais

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profundidade aos assuntos e problemas de cunho raciais. “A partir do Repolho fui conhecido para o Encontro Brasil África Caribe de Cinema Negro. A partir daí, comecei a refletir profundamente sobre a questão racial, a questão do cinema negro. Sou muito grato ao Joel Zito, ao espírito do Zózimo. Fui convidado enquanto realizador negro. Minha percepção (quanto à negritude) era muito embrionária, muito ingênua. Ela foi despertada nesse convite de 2015. A partir dali, comecei a ter contato com cineastas da África, de outros países, do Caribe. Vendo os filmes deles, conversando com eles, percebi tanta coisa que fazem no mundo e que não chegam para a gente”.

A Cor do Fogo e a Cor da Cinza, documentário de André Felix (2014)

Depois da experiência de participar do principal evento de cinema negro do país, Alexander decidiu que precisava falar de negritude, de racismo. “A partir daí, escrevi o HIC e pensei: ‘Preciso falar sobre isso’. Foi um projeto que fiz com bastante carinho, mas tive que fazer na correria, foi um processo de autoconhecimento, de busca”. Realizado por meio do edital Curta Afirmativo 2014/2015, HIC usa a história de um maratonista africano acometido por uma crise de soluço para denunciar o racismo no cotidiano. “Pra escrever, fui ler muitos depoimentos em uma página de Facebook em que as pessoas postavam suas experiências de racismo. Eu lia chorando, não só por empatia

com aquelas pessoas, mas por colocar-me em muitas daquelas situações e conseguir enxergar-me nelas, pois já sofri muito racismo na minha vida. A partir dessas coisas fui aprofundando-me, então fui ler, artigos, fui conversar com muitas pessoas”, explica. A consciência despertada com o convite ao Encontro Brasil África Caribe de Cinema Negro não ficou restrita à realização de HIC. “Sou militante, não aceito falar que não existe racismo no Brasil, isso é um absurdo”, protesta Alexandre, que em novembro do ano passado se juntou aos realizadores Adriano Monteiro, Daiana Rocha e Dell Freire para criar o Coletivo Damballa, com a proposta de ser “um espaço simbólico onde voz e sensibilidade negra se unem para fortalecer criadores e realizadores de audiovisual com um objetivo concreto: o estabelecimento de condições necessárias para a inserção do cineasta negro”. As condições necessárias, para Alexander, passam pelas cotas raciais nos editais direcionados ao audiovisual. “A discussão de cotas é importantíssima nesse âmbito, porque é dinheiro público, tudo que é público precisa representar as pessoas que vivem nesse país, pagam impostos”. As cotas, na opinião de Joel Zito, são necessárias e eficientes, mas ainda não alcançam uma dimensão capaz de reduzir significativamente o abismo histórico entre brancos e negros no setor. “Avalio que a Ancine e o MinC ainda estão dando esmola, sabe? Porque se você pegar o montante de dinheiro que a Ancine colocou à disposição neste ano e ver a porcentagem desse montante, que eles destinaram às políticas de reparação e de promoção de realizadores negros e indígenas, vai ver que é uma esmolinha. Nós temos que brigar por isso, por igualdade de oportunidades. Igualdade não é esmola”. Para André Félix, diretor, entre outros trabalhos, do curta A Cor do Fogo e A Cor da Cinza (2014) e do longa-documentário Diante dos Meus Olhos (2018), que traça a trajetória da banda de rock capixaba “Os Mamíferos”, a existência de uma política pública que permita aos afrodescendentes o acesso

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reportagem

aos meios de produção para o audiovisual significa liberdade, emancipação. “Cada vez mais acredito que as políticas públicas vão criar mais contundência no discurso dos filmes e dar liberdade ao realizador negro, condições de poder emancipar-se a cada filme, a cada imagem, poder construir uma nova imagem, poder, inclusive, ser criticado e errar. Acredito que a partir do momento que essa condição financeira nos é dada, acho que o objetivo final, o sonho, é chegar a esse lugar, é ver obras de negros completamente loucas, livres, que a gente experimente mais um pouquinho da vida”. A liberdade de criação, de ver o mundo sob um olhar negro e de romper paradigmas também é um anseio do cineasta e ator Edson Ferreira, diretor de Entreturnos (2014), primeiro longa de ficção dirigido por um negro no Espírito Santo. “Não vejo o cinema negro necessariamente só com elementos negros, por exemplo, um filme só com pretos. Acho super legal, mas não acredito que somente isso seja um cinema negro. Meu longa Entreturnos tem quatro personagens principais e um negro, mas todos estão na mesma camada social. Todos eles vem de uma camada periférica, eu não coloco o branco em uma situação economicamente superior, mas ao mesmo tempo quero valer-me de fugir de estereótipos. Tenho um batedor de carteiras, que é branco. Um médico, e é negro. Busco a fuga de estereótipos. Acredito num cinema com o olhar de um negro”, explica Ferreira. Esta almejada liberdade, contudo, esbarra na falta de uma política robusta e contínua para oferecer a negros e indígenas, assim como outros grupos minorizados, plenas condições de expressar-se por meio do cinema, do vídeo e de outras manifestações

audiovisuais. “Em 2016 saiu um Edital Longa BO Afirmativo, eram três projetos e fiquei em quarto lugar. Esse edital não saiu de novo, estamos esperando por ele. Quando vão sair mais políticas aqui dentro do Espírito Santo? Da Prefeitura de Vitória, por exemplo, você vê a Lei Rubem Braga que praticamente não existe mais, e, mesmo quando ela existia, não tinha esse olhar. Os editais da Secult: acho que vão ter um horizonte voltado para questão racial, mas que ainda não é suficiente. Então são rebarbas, né? São pequenas contribuições do poder público”, lamenta Ferreira fazendo eco à opinião de Joel Zito. A saída, para o cineasta e pesquisador mineiro, está no ativismo. Ele cita como exemplo de iniciativa a criação da Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (Apan). “A Apan congrega essa juventude que tem surgido e feito uma enorme pressão na Ancine, na secretaria de audiovisual do MinC. No nível estadual, tenho as notícias das pressões no Espírito Santo.” Ele recomenda, porém, que os realizadores mantenham o fluxo criativo, mesmo com a escassez de recursos. É o velho e ainda válido pensamento do “faça você mesmo”, prática adotada, inclusive, por Alexander Buck e Edson Ferreira no início de suas carreiras. ”Não adianta o ativismo político se as pessoas não produzirem seus roteiros e seus curtas sem financiamento para poder exercitar e aprender durante o processo, até porque a maior parte dos cineastas do cinema mundial aprendeu a fazer cinema não em escolas de cinema, mas sim no movimento cineclubista, vendo e fazendo filmes. Não adianta também ficar reclamando que não tem dinheiro se você não toma a iniciativa de escrever seu roteiro, de juntar com os amigos e fazer um curta, ou um ficcional, documental ou experimental para aproveitar a oportunidade na hora em que surgirem essas oportunidades. E, apesar de tudo, elas estão surgindo”. n Entreturnos, longa-metragem de Edson Ferreira (2014)

Reikwaapa, filme de Marcelo Guarani e Ricardo Sá (2013)

ovos Tradicionais: o Audiovisual Como Resistência Marcos Sacramento

Enquanto o cenário audiovisual protagonizado por afrodescendentes experimenta um aumento do número de obras nos mais diversos formatos, com abordagens que vão de temas ligados à cultura negra, como os mitos e histórias dos povos africanos, a assuntos baseados no cotidiano ou com viés universal, a produção referente a outros povos tradicionais presentes no Espírito Santo não experimenta a mesma potência

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omeranos, indígenas e quilombolas, têm no audiovisual uma poderosa ferramenta para preservação de seu patrimônio cultural, tanto para divulgar à sociedade em geral os seus valores e costumes, de forma a combater preconceitos e estereótipos, quanto, principalmente, para registrar os hábitos e tradições transmitidos de forma oral e ameaçados de cair no esquecimento

à medida que a população envelhece, como um instrumento de reflexão e de afirmação de sua própria cultura. Foi com esse objetivo que Werá Djekupe, cujo nome português é Marcelo Guarani, idealizou o documentário Reikwaapa - Ritos de Passagem Guarani (2013), curta-metragem que fala dos rituais da transição da infância para a adolescência dos guaranis da aldeia Três

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Bate-Paus, documentário de Jorge Kuster Jaccob (2005)

Foto: Acervo Instituto Marlin Azul

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Marcelo, que neste curta participou como um dos personagens, o tema, que trata da importância e dos significados da flauta na cultura guarani, foi escolhido pelos jovens da aldeia os quais também escreveram e dirigiram o curta. Para Marcelo, a mesma tecnologia, que pode significar uma ameaça às tradições transmitidas oralmente há séculos, tem o poder de manter vivos os rituais e valores tradicionais ainda presentes no cotidiano guarani, mesmo que a modernidade e o estilo de vida ocidental tenham forte presença na sociedade. “Apesar de usarmos roupas, falarmos português,

Foto: Lorram Pereira

Palmeiras, em Aracruz. “Hoje não é mais como nos tempos antigos. Com a globalização, as cidades estão cada vez mais perto das nossas aldeias, levando alguns prejuízos à nossa sociedade, os jovens começam a ficar meio desinteressados na nossa cultura. Na nossa aldeia temos a casa de rezas, onde o povo mais velho transmite a nossa história, por isso a ideia da gente gravar ou escrever em livros a nossa própria história é pra gente continuar, para aquilo ficar registrado”, explica Marcelo. O título da obra, que também tem a direção de Ricardo Sá, significa “você sabia?”, em clara referência ao papel de levar um pouco da cultura guarani àqueles que ainda não a conhecem. Propósito também do documentário Mimby Marae’y, em português “Flauta Sagrada”, produzido a partir de uma oficina de audiovisual realizada na aldeia pelo Instituto Parceiros do Bem. Segundo

frequentarmos as escolas, o rito de passagem ainda é cultuado na nossa cultura. A casa de rezas é como uma faculdade, uma escola onde se aprende a parte espiritual, o que é certo e o que é errado. Mesmo com uso de celular, roupas e televisão; a nossa tradição, a nossa língua e a nossa crença é continuada, porque temos muita história na nossa cultura. Os vídeos são uma forma de gravar e deixar tudo documentado para que as próximas gerações possam ter acesso a esse saber no futuro”, destaca a liderança guarani. Especialista em Educação, Diversidade e Culturas

Indígenas, mestre em Linguística e Línguas Indígenas pela UFRJ e produtor cultural, Jocelino da Silveira Quiezza, o Jocelino Tupiniquim, tem a mesma opinião quanto ao uso do audiovisual como aliado contra a perda da identidade. “É por causa dessa cultura artificial e midiática que as grandes emissoras de TV têm colocado no nosso meio, mas, ao mesmo tempo que temos essa mídia, podemos usar o audiovisual para fazer o contraponto”, declara. Desde 2015, ele promove exibições de filmes e vídeos para a sua comunidade, após conseguir computador, projetor e uma caixa de som por meio do Programa de Sustentabilidade Tupi Guarani. A ideia inicial de Jocelino, que era dar uma alternativa de lazer à comunidade além das partidas de futebol, transformou-se em uma maneira de perpetuar costumes tupiniquins e de divulgar e discutir problemas relacionados aos povos indígenas. “A gente passa uma sessão meio que hollywoodiana como entretenimento mesmo. No meio dessa programação, a gente sempre exibe um trecho de vídeo

que tem a ver com a nossa causa, com nossa luta, com o resgate de nossa história. Entre dois filmes, a gente passa algo com 10 a 20 minutinhos pra poder valorizar esse espaço, algo mais voltado pra nós mesmos”, explica. A iniciativa incentivou ações como oficinas de vídeo, noites culturais e a criação do Cine Clube Yby Membyra (em português “Filhos da Terra”), que foi contemplado pelo edital do Fundo Estadual de Cultura do Espírito Santo (Funcultura) de 2017 para incentivo ao desenvolvimento e à manutenção do cineclubismo. Embora tenha sido premiado, Jocelino acredita que deveria ser promovido um maior acesso de indígenas aos editais e às leis de incentivo: “Ainda falta a capacitação para que os povos indígenas tenham esse tipo de acesso, porque tem muita burocracia, embora a Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo tenha facilitado muito com os Editais, que não são difíceis de escrever. Mas não é todo mundo que tem uma

Reikwaapa, filme de Marcelo Guarani e Ricardo Sá (2013) Sessão do Cine Clube Yby Membyra


reportagem Foto: Apoena Medeiros / Acervo Instituto Marlin Azul

Carolina Ruas

A vez, a voz e olhar das mulheres no

CINEMA

Contar uma história - seja no cinema e na televisão, seja no stories do Instagram - é, para além da realidade projetada, oferecer ao mundo um ponto de vista singular sobre um fato, uma ideia ou um acontecimento. É traduzir uma determinada forma de compreender o mundo e produzir novos mundos, inventar possibilidades imaginadas e materializar os sonhos

capacitação para escrever, encaminhar e executar o projeto. Tem que estar bem centrado para fazer tudo certinho. Além do mais, o Espírito Santo, mesmo sabendo dos povos indígenas que existem aqui, não acordou para poder fazer alguma coisa direcionada a essa população”. Professor, sociólogo e diretor de dois filmes documentários a respeito do povo pomerano, Bate-Paus ( 2005) e Hochtijd – Um Casamento Pomerano (2011), Jorge Kuster Jacob cita uma outra questão que prejudica a conservação e a promoção das culturas tradicionais. “Muitos prefeitos e secretários municipais faltam na formação cultural local, tradicional e popular. Temos secretários que só sabem realizar festas caipiras e rodeios e não conseguem perceber que com esses eventos matam a cultura local. Falta sensibilidade política no sentido de enxergar que a cultura tradicional, popular e local pode

contribuir decisivamente com agricultura, pecuária, indústria e outros setores municipais no seu verdadeiro desenvolvimento local”, analisa Jacob. Como se vê, para os povos tradicionais, o audiovisual é uma ferramenta essencial para a sobrevivência enquanto grupo social diante de ameaças vindas de diversas direções, seja da mídia hegemônica, da pressão do poderio econômico contra terras indígenas e quilombolas, seja devido às ações equivocadas de gestores públicos, como Jacob destacou. Em algumas situações, essas ameaças podem resultar na própria aniquilação física, como lembrou Jocelino Tupiniquim. “O que se tem implantado ultimamente no país é uma política de ódio em relação aos povos indígenas”. Frente a este cenário, garantir o acesso dos povos tradicionais aos meios de produção de audiovisual é assegurar a permanência de direitos fundamentais. n

Foto: Divulgação Caju Produções

Hochtijd - Um Casamento Pomerano, documentário de Jorge Kuster e Adriana Jacobsen (2011)

Bastidores de Abelha Rainha, filme inédito de Thayla Fernandes

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é também uma história de luta por espaço e por reconhecimento que colidem diretamente com o espírito de rebeldia dos novos tempos. O crescimento da pauta feminista no meio cinematográfico contribui para que as mulheres estejam cada vez mais empoderadas no setor, buscando ocupar os espaços em busca de representatividade. Os episódios recentes de Hollywood, seja na denúncia do assédio contra mulheres, como é o caso do produtor Harvey Weinstein, seja

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Foto: Divulgação Karol Mendes

O

cinema é um espaço que privilegia o olhar masculino sobre o mundo, concentrando nesse grupo o poder de fala e, consequentemente, o poder de influenciar o espectador. “É a partir da linguagem que você vê a discrepância da legitimação do poder. E isso vem de uma sociedade de homens para homens”, comenta a realizadora Maíra Tristão. No mundo todo, pesquisas e levantamentos recentes dão conta de que a grande e esmagadora parte dos filmes mais vistos no mundo tem um ponto de vista muito específico: o do homem branco ocidental. Segundo estudo publicado pela San Diego State University, as mulheres representaram apenas 11% de todos os diretores entre os 250 filmes de maior bilheteria nos Estados Unidos em 2017. No Brasil, segundo o Informe Diversidade de Gênero e Raça nos Lançamentos Brasileiros da Agência Nacional do Cinema - Ancine, apenas 19% de todos os longas produzidos no Brasil em 2016 foram realizados por mulheres. Nenhuma mulher negra esteve à frente de um longa metragem neste ano. E não é que não hajam mulheres presentes na história do cinema. Muito pelo contrário, a história revela a presença de mulheres desde seus primórdios e ao longo de todo o seu desenvolvimento enquanto linguagem. A fundação das bases do cinema enquanto narrativa é atribuída à francesa Alice Guy Blaché, ao transformar um conto popular francês, La Fée aux choux (1896), na primeira produção ficcional em cinema que se tem registro. No Brasil, Cléo de Verberena lança em 1931 o primeiro filme dirigido por uma brasileira, O Mistério do Dominó Preto, o qual também produziu e atuou. Mas a história das mulheres no cinema

na atividade cinematográfica. Assim, surgem os primeiros editais com reservas de vagas na Secretaria de Audiovisual do Ministério da Cultura e nos editais do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) da Ancine, que já estão em vigor. Para Saskia Sá, realizadora veterana no cenário capixaba, isso é sintomático: “O Espírito Santo sempre teve muitas realizadoras mulheres. Só que, em geral, elas só fizeram curta-metragem, porque quem tem acesso aos maiores recursos são os homens”, conta. Sáskia argumenta que é preciso mudar também os júris, as curadorias e todas as esferas de decisão do meio cinematográfico para composições mais diversas. Tendo iniciado sua carreira como atriz nos anos 1990 e logo depois seguido como produtora, Sáskia Sá conta sobre o processo individual de descobrir-se capaz de liderar os projetos como roteirista e como diretora. “Sempre escrevi e tive minhas ideias, mas naquela época eu não pensava em contar minhas próprias histórias, porque a gente é formatada para isso. Em 2011, montei minha empresa e passei a lutar para conquistar meu espaço como roteirista e como diretora, juntando-me com outras mulheres para tentar viabilizar as produções”. “As ações afirmativas são importantíssimas, porque elas vêm antes e dão condições para as pessoas acessarem esses recursos. Quando essas medidas são implementadas, muda-se totalmente a estrutura do mercado”, concorda Ursula Dart, também realiTerritório do Desprazer, filme de Mirela Marin e Maíra Tristão (2017)

Diretora Karol Mendes durante gravação do curta Riscadas

no movimento pela equidade dos salários na indústria, as mulheres estão reivindicando seu espaço e denunciando os vários motivos pelos quais muitas vezes elas não estejam nas listas. A fim de corrigir essas deficiências no acesso, a Comissão de Diversidade da Ancine optou por adotar ações afirmativas que estimulem a participação não só de mulheres, mas também de negros e indígenas

zadora. Com muitos anos de carreira, Ursula ocupa um lugar raramente ocupado por mulheres no cinema: a fotografia. O mesmo estudo da Ancine aponta que a direção de fotografia é um campo essencialmente masculino, com 85% de presença. Os homens estão na liderança das equipes e atribuídos às funções mais criativas, não só na fotografia, mas assinando roteiro e a própria direção. Já as mulheres estão presentes com mais força na área de produção. “Não é à toa: são funções que ancoram a pessoa; todas as funções que ‘voam’ são do mundo masculino”, comenta Ursula. Assédio, falta de espaço, invisibilidade. Esses são alguns obstáculos que a maioria das mulheres relatam como os principais a serem enfrentados no mundo do cinema. Mas as novas gerações começam a dar conta de que esses lugares são possíveis de serem ocupados por mulheres e se organizam para fazer o enfrentamento necessário. “Quando entrei na faculdade, vi que é uma bolha mesmo, mas aos poucos a gente vai conquistando espaço”, comenta Karol Mendes, realizadora negra e estreante na direção do curta Riscadas, que foi recém contemplado por edital do Funcultura. Karol conta também que a ausência de referências femininas, tanto no trabalho quanto no ensino, contribuem para afastar muitas profissionais mulheres, especialmente as negras e as de periferia, da ideia de

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Foto: Divulgação Cineclube Teresa de Benguela

trabalhar com cinema: “É um apagamento mesmo, a gente não tem ideia de que essas pessoas existem”, comenta. Por todas essas questões, tem crescido cada vez mais as produções de cinema realizadas por equipes majoritariamente femininas; seja por vontade própria, seja impulsionada por alguma ação afirmativa, como no curta Abelha Rainha, de Thayla Fernandes. Produzido com recursos do Prêmio Carmem Santos, do Ministério da Cultura, que dedica recursos especificamente para produções que tiverem direção feminina, Abelha Rainha tem mulheres em todas as funções de liderança. Luanna Esteves, produtora executiva do curta, conta que ela e a diretora buscaram montar um time Simonetti. Ela acredita que a também equilibrando mulheres aprendizes e experientes. política de reservas de vagas “Apesar de o roteiro original ser de um homem, a diretora pode iniciar uma mudança fez uma nova versão e deu outro olhar a partir das vivências no cenário e ampliar um dela, com esse lugar de fala. Isso foi bem forte e importante pouco mais o funil de inpara a equipe toda alinhar-se com o tema que também era vestimento na área. sobre mulheres”. Para Sáskia Sá, a con Outra produção recente que se pauta por essa lógica centração de recursos nas é o curta Território do Desprazer, documentário de Mirela mãos de realizadores hoMarin e Maíra Tristão. Centrado na história real de mulheres, mens afeta diretamente o o filme também conta com uma equipe majoritariamente modo como as mulheres feminina. “A nossa opção de ter trabalhado com uma equipe são vistas e como a reprefeminina veio muito pelo tema, que fala de intimidade e de sentação no cinema muitas sexualidade. Isso foi fundamental para a liberdade que a vezes não se encaixa com a gente construiu com as nossas personagens. Também foi nossa vida. “Onde que está o uma forma de fortalecer as profissionais que estão à nossa nosso ponto de vista sobre volta, acreditar no trabalho das pessoas e incluí-las no proo cotidiano, sobre nossas cesso”, defende Maíra Tristão. vidas, sobre o que somos? A Maíra também diz que esse processo de afirmação das gente quer fazer filme, quer mulheres enquanto profissionais no meio cinematográfico é contar nossas histórias por difícil. “Acho que a gente tá caminhando devagar, mas está nós mesmas. Essa cadeia acontecendo. As políticas públicas são fundamentais para alimentar da produção de ampliar esse acesso e a nossa ação também, porque a lógica cinema tem que mudar”. do sistema, pelo simples fato de sermos mulheres, coloca-nos em uma situação de incapacidade”. Por meio de articulação da ABD Capixaba, o setor audiovisual capixaba tem pautado a necessidade de os editais de fomento do Funcultura trabalharem com o mecanismo de reserva de vagas a fim de garantirem melhor distribuição e uma produção mais diversa. “O cinema é uma visão do mundo, é uma questão política, por isso é importante que tenha mulheres, negros, índios para que eles sejam representados. E o homem branco não vai abrir mão desse privilégio. Então, é nos juntarmos para ocupar esse espaço porque temos todo o direito de viver e A diretora Adélia Sampaio durante a primeira mostra do Cineclube Teresa de Benguela trabalhar com isso”, afirma Maria Grijó

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Raça e gênero no mesmo roteiro A desigualdade de oportunidades entre os gêneros não é novidade e está presente em praticamente todas as áreas, principalmente quando se considera o recorte racial. “A gente sabe, sente que há uma desigualdade, mas, quando a gente vê esses dados, fica assustada por saber como é grande essa diferença”, comenta a realizadora Hegli Lotério. Ela faz parte de um grupo ainda menos privilegiado: o das mulheres negras, que, segundo o Informe da Ancine, não dirigiram ou roteirizaram nenhum longa brasileiro produzido em 2016. Também não estão presentes entre os números de realizadores já contemplados por recursos públicos no Espírito Santo. As dificuldades das mulheres negras para encontrar espaço de expressão no cinema brasileiro são muito maiores, consequência direta da relação de menor privilégio que esse grupo usufrui na sociedade e resultado da invisibilidade de seu trabalho e de sua visão de mundo. A primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem a ser lançado nos cinemas foi Adélia Sampaio, com Amor Maldito, em 1984. Depois dela, nunca mais uma mulher negra teve um filme a entrar no circuito comercial até o presente ano quando O Caso do Homem Errado, longa de Camila de Moraes, vem ao mundo. O intervalo de 34 anos entre uma obra e outra dão conta do tamanho do vácuo de representação que existe entre o mercado cinematográfico e as mulheres negras. Para Hegli Lotério, realizadora negra recém-formada, a primeira dificuldade se apresenta na memória e no total desconhecimento de personagens como Adélia Sampaio. “A gente sabe que não é fácil, a gente liga a TV e não vê nem nota a sub-representação de mulheres negras na frente das câmeras, quem dirá atrás”, comenta. Ela conta que foi pesquisando individualmente que passou a conhecer escritoras e diretoras negras e, assim, passou a identificar-se com o cinema e com o feminismo negro.

Se os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE dizem que metade da população brasileira é negra e que mais da metade é composta de mulheres, a ausência de representação no cinema soa como um problema grave. A realizadora Karol Mendes, que se interessa pela área de fotografia, diz que já sentiu as dificuldades de inserção nesse meio. “Vi que não tinha mulher preta nesse lugar, mas resolvi provar que eu poderia. Quando você entra num espaço que não te foi autorizado, você tem que ser três vezes melhor do que as outras pessoas”, comenta. Hegli Lotério e Karol Mendes, assim como outras centenas de realizadoras em início de carreira, sentem o peso da falta de representação de mulheres negras, mas têm forçado as estruturas para conseguir seu lugar ao sol. A penúltima temporada da novela adolescente da TV Globo, Malhação - Viva a Diferença, por exemplo, contou com uma roteirista negra, Renata Martins, pela primeira vez em sua história de mais de 23 anos de existência. Da pesquisa de Hegli Lotério sobre mulheres negras no cinema brasileiro surgiu a ideia do cineclube Teresa de Benguela, iniciativa dedicada a exibir exclusivamente produções de mulheres negras. Com sessões realizadas majoritariamente na Universidade Federal do Espírito Santo, a ideia do cineclube é atuar também nas escolas estaduais. Na primeira edição, cinco diretoras negras participaram: Adélia Sampaio, Sabrina Fidalgo, Joyce Prado, Camila de Moraes e Renata Martins. “O cinema ajuda a construir a nossa memória, mas as personagens negras vão ficando esquecidas. Ter onde espelhar-se faz muita diferença na nossa formação, na nossa autoestima. Uma mulher negra ocupando esses espaços é uma porta de entrada”, comenta Hegli, que hoje também é curadora de diversas mostras e festivais do estado. Nas próximas edições do Teresa de Benguela, a ideia é criar um laboratório de narrativas negras, uma atividade que junte as criadoras para impulsionar projetos em início de carreira. n


reportagem

Leonardo Vais

Todas as Cores do

Arco-Íris na Telona

mofobia, a não-normatividade do masculino e do feminino, a aceitação e rejeição familiar, além de um timing narrativo que dialoga diretamente com a linguagem do cinema e dos seriados televisivos voltados para o público LGBTQI+ produzidos na atualidade. “Pela primeira vez, vemos esses temas serem encarados diretamente em uma produção ficcional local, e a importância disso é inegável – inclusive em termos daquilo que a teórica Mariana Baltar chama de uma ‘pedagogia sociocultural’, na qual a imagem fílmica permite ao espectador, através de partilhas e experiências mostradas na tela, aprender sobre como vivem os indivíduos não-heteronormativos”, explica Erly.

Nova Geração

O realizador Izah Candido é diretor da websérie documental Corpo Flor (2018), que trata da transgeneridade negra para além das fronteiras do masculino e feminino, e um dos protagonistas de Transvivo (2017), documentário de Tati W. Franklin, que trata da transexualidade a partir de registros do cotidiano sobre os processos de transição de gênero, as experiências e histórias contadas por meio do audiovisual. Segundo ele, essas produções são uma das formas de atravessar o público e ampliar o discurso para o debate. “O audiovisual é uma ferramenta que tem alcançado cada vez mais espaços por intermédio da internet e das redes sociais. É algo que circula muito e chega a vários lugares. A partir disso, os encontros são propostos e com eles os atravessamentos. Acho que é difícil as pessoas assistirem qualquer coisa

Esses novos realizadores e suas produções colocam em primeiro plano as experiências e o cotidiano de personagens LGBTs. Muitos deles tratam o assunto com total propriedade por pertencerem a esse lugar de fala. Seus filmes, de forma ficcional ou documental, abrem um olhar para as vivências e humanizam as histórias desse público.

CLOSE CERTO. A gíria usada pelo público LGBTQI+ que denomina algo assertivo e muito bem feito define bem a produção audiovisual capixaba realizada nos últimos dez anos com foco na diversidade sexual.

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E

ste recorte temporal, segundo o cineasta, pesquisador e professor do Curso de Cinema e Audiovisual e do Mestrado em Comunicação em Territorialidades da Universidade Federal do Espírito Santo - Ufes, Erly Vieira Jr., deve-se ao ano de 2008, que marca um novo paradigma para a produção de filmes LGBTQI+ no cenário capixaba ao lançar a primeira experiência ficcional protagonizada por personagens LGBTs. Despertai, de Edson Poloni e Lorenzzo de Angeli, acompanha a vida de um grupo de amigos gays, lésbicas e trans abordando o cotidiano de seus personagens e de seu público e tratando de, entre outros assuntos, relacionamentos amorosos e familiares, ho-

Transvivo, documentário de Tati W. Franklin (2017)

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sem minimamente parar para pensar sobre o assunto depois”, afirma. Apesar de uma produção crescente de obras voltadas a e sobre o público LGBTQI+, Izah acredita que é preciso ampliar o discurso para além do tema e realizar inclusão também no mercado de trabalho: “Há muita coisa sendo feita para LGBT, mas sem LGBT na produção. Precisamos pensar em lugares de fala, em protagonismo na frente e atrás das câmeras”. Izah também defende que, cada vez mais, existam políticas públicas, como cotas e editais específicos para realizadores LGBTQI+, que estimulem e fortaleçam o discurso da diversidade: “Se só uma parcela da população, que são homens brancos cis heteronormativos, tem feito filmes, está na hora de mudar e, então, sim, sou a favor de minimamente colocarmos em pé de equidade a possibilidade de outros olhares produzirem cultura”. Para o codiretor e roteirista da websérie Corpo Flor, ao lado de Izah, Wan Viana - que também dirigiu

Montação (2016), documentário sobre o processo de transformação de drag queens - reconhecer essas existências LGBTs por meio da sua produção audiovisual é uma das formas de fortalecimento para se pensarem políticas que tratam da valorização e do respeito à diferença e à diversidade: “Oferecer espaço para que as pessoas possam dividir suas experiências e para que eu possa aprender mais sobre o outro e possa também levar esse conhecimento às outras pessoas”. Mesmo sabendo das dificuldades do mercado audiovisual, Wan Viana, diz perceber uma forte presença de LGBTs nessa área: “Sempre existiram, mas, agora, com a sensação de maior aceitação que está acontecendo no mercado, essas pessoas podem falar de si próprias de maneira mais direta. São LGBTs contando suas próprias histórias e, daí, trabalhos incríveis acontecem”. “Acredito que o incentivo em políticas públicas para a produção cultural de conteúdo LGBTQI+ demonstre interesse do estado democrático que tais manifestações culturais continuem existindo e se fortaleçam. E daí já não tenho certeza se essa é a vontade da maior parcela dos nossos governantes”, complementa Viana. Diretor do documentário experimental XX Tape (2016), selecionado para o 25º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, em São Paulo, e da ficção Câmera Calibre (2017), Anderson Bardot considera que a produção audiovisual é uma ferramenta de transformação humana e social por meio desses novos olhares. “Enquanto bicha, pensadora, entendo que, quando tomo a história pra mim, eu abro o meu campo de visão para além do meu ego e isso me faz entender a

Websérie Corpo Flor, de Izah Candido e Wan Viana (2018)

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Coisa de Menino, ficção de Bipe Couto e Dayana Cordeiro (2014)

importância de produzir saberes através do cinema. O audiovisual pode servir de diagnóstico e até mesmo de receita para as dores sociais”, acredita ele, que se prepara para dirigir a adaptação para a tela grande do espetáculo de dança Inabitáveis, da Cia In Pares, que trata do encontro casual e sexual entre dois homens. Para Bardot, existir enquanto cineasta que se propõe a debater temas que parte da sociedade não quer discutir é viver em constante enfrentamento: “Sempre estivemos em todos os lugares, em toda a história da humanidade, mas nunca estivemos tão despretensiosos e fluídos como agora. E isso é um resultado de lutas. Não há momento melhor do que agora para levantarmos bandeiras e dizermos com orgulho o que nós somos, o que sofremos e o que amamos. Mostrar a beleza de sermos desprendidos e diferentes. E eu me sinto honrado em fazê-lo”.

A diversidade sexual no cinema capixaba A produção audiovisual com temática LGBTQI+ está presente na história do cinema nacional desde suas décadas iniciais. De acordo com o livro O Cinema Que Ousa Dizer Seu Nome, do jornalista e cineasta Lufe Steffen, o primeiro curta gay brasileiro é Um Clássico, Dois em Casa, Nenhum Jogo Fora, lançado em 1968 e dirigido pelo manauara Djalma Limongi Batista. Nestes 50 anos, após o lançamento do filme de Limongi, diversos trabalhos como A Rainha Diaba (1974), de Antônio Carlos da Fontoura, que coloca uma personagem travesti como chefe do tráfico; e Vera (1986), que aborda os conflitos relacionados a identidade de gênero, trataram do tema, mesmo que de forma mais espaçada. Foi na década de 90 e, principalmente, depois da fase da retomada do cinema nacional que uma série de realizadores assumiram seu lugar de fala e uma pluralidade de produções surgem com a proposta de se debaterem os temas ligados à diversidade sexual. Para o cineasta Erly Vieira Jr., desde a década de 70, já é possível perceber um olhar queer - que resumidamente pode

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Cartas Para Eros, de Herbert Fieni (2016)

ser definido como tudo que escapa às formulações habituais ou de senso comum - nas produções realizadas no Espírito Santo, por cineastas como Amylton de Almeida. “Podemos observar ecos de um olhar queerizante sobre a realidade social em alguns de seus documentários, como por exemplo, o senso de humor que denuncia certas convenções do poder masculino exercido sobre as prostitutas em São Sebastião dos Boêmios (1976)”. Outros ecos queer podem ser percebidos em produções da década de 80, nos trabalhos de coletivos como o Balão Mágico e Aedes Aegyptis. Mas talvez a primeira obra audiovisual capixaba assumidamente queer seja Comida, Sexo e Morte (1992), do coletivo Éden Dionisíaco do Brasil, dirigido por Lobo Pasolini. “Nele, não somente se encontra espaço para o exercício de sexualidades dissidentes, que até então são invisíveis no audiovisual local, como também há uma forte filiação à estética clubber tão marcante nas culturas LGBT dos anos 90”, explica Erly, que também é professor do Poscom-Ufes, em que desenvolve e orienta pesquisas sobre cinema e corpo por meio das quais a produção audiovisual queer é objeto constante de estudo. Ao longo da década de 1990 e início dos anos 2000, essa atitude e estética queer influenciou o trabalho de vários videoartistas e cineastas locais que, não necessariamente, tratavam de questões voltadas ao universo da diversidade sexual. São destaques, C33 Oscar Wilde (1999) e Jorge: o Guerreiro (2000), de Jean R.; A Festa do Bolinha (2001), de Rodrigo Linhales e Tati Rabelo; Manoela (2001), de Fabrício Coradello e Saudosa (2005), de Fabrício Coradello e Erly Vieira Jr. Mas é depois de 2008, com Despertai, que o cinema LGBTQI+ ganha força nas produções locais apresentando

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uma pluralidade de temas dentro do aspecto da realidade. Neste mesmo caminho surgem Angorá (2011), de Emerson Evêncio; Você suportaria? (2013), de Sandy Vasconcelos, primeira cineasta trans capixaba. Coisa de Menino (2014), de Bipe Couto e Dayana Cordeiro, e Dia de Pais (2016), de Thiago Oliveira, que incluem o universo infantil dentro da temática LGBTQI+. Nessa fase também surge uma série de documentários como Homens (2008), de Lucia Caus e do paraibano Bertrand Lyra, que discute outras formas de masculinidade e feminilidade no nordeste brasileiro. Rainhas da noite (2010) e O aniversário de Chica Chiclete, ambos de Diego Herzog (2012), concentram-se no universo performático das drag queens e transformistas. Do Outro Lado do Arco-Íris, de Leonardo Vais e Mayara Mello (2012), resgata memórias de preconceito contra homossexuais em diversos ambientes. Já Velcro (2017), de Natália Gotardo, dá voz a casais de mulheres lésbicas enquanto Nós (2016), de Gustavo Guilherme e Lorhana Victor, centra-se nos jovens negros. O universo trans aparece em diversas produções. A transexualidade feminina é abordada em filmes como Eu, Mulher (2015), de Adryelisson Maduro; e Toda Noite Estarei Lá (2017), de Thiago Moulin; além de Transem Ação (2015), do ES Cineclube Diversidade. Já

a transexualidade masculina é tema de Transverso (2016), de Danyllo Rocha e Nina Rocha, e do já citado Transvivo (2017), de Tati W Franklin. Outros filmes que se destacam são Romance a la Nelson (2012), de Mariana Preti; Planície (2015), de Gabriel Perrone; o curta experimental de Fabrício Fernandez, Transcorpos (2015); Embaraçadas (2014), de Paulo Sena; e do diretor Rodrigo de Oliveira Teobaldo Morto, Romeu Exilado (2015) e Ano Passado Eu Morri (2017). Segundo Erly, um dos filmes que melhor sintetiza o universo queer é Cartas Para Eros (2016), de Herbert Fieni, documentário ensaístico em primeira pessoa, parte de imagens de arquivos e de memórias pessoais do cineasta sobre a cena LGBT capixaba dos anos 90. “Ao promover, através da dimensão sonora e da pós-produção da imagem, um outro tipo de corporeidade a ser partilhada pelo espectador, Cartas Para Eros propõe sua própria queerização do sensório, ativando memórias diversas desse ‘estar-no-mundo’ queer que por décadas tem atravessado nossas vidas. A meu ver, cabe às produções audiovisuais queer captarem e reinventarem constantemente esse imaginário”, finaliza Erly. Em parceria com Lamartine Neto, Fieni também dirigiu Meninos do Arco-Íris (2013), curta que faz da lenda do arco-íris uma metáfora para abordar as fronteiras entre os gêneros masculino e feminino.

Muita Lacração no Cineclube Com a proposta de se debaterem questões relacionadas à sexualidade, identidade de gênero, identidades marginalizadas, afetividade, entre outros assuntos, surgiu em 2013 o Cineclube ES Diversidade. O coletivo realizou, desde 2013, 30 sessões individuais na Grande Vitória e no município de Linhares e quatro Mostras Audiovisuais de Sexualidades e Afetos com uma programação de curtas e longas de diversas partes do Brasil e do mundo. Para Fabrício Fernandez, um dos fundadores do coletivo, o Cineclube surgiu da vontade de ampliar a possibilidade de trocas de experiências a partir do audiovisual “do desejo de se criarem encontros na prática cineclubista, de conversar sobre os corpos e as vidas LGBTs”, conta. A seleção de filmes sempre apresentou, em sua maioria, trabalhos inéditos no estado ou que haviam sido exibidos apenas em festivais e a autorização para exibição era direto com os realizadores por meio das redes sociais. Em seu segundo ano, o cineclube se desdobrou em uma mostra anual de cinema que tinha como foco a diversidade dentro da diversidade. Aubrey Effgen, outro membro do cineclube, destaca a realização das mostras como um importante veículo de fortalecimento de políticas que tratam da valorização e do respeito à diferença e à diversidade. “Nunca imaginamos o alcance e, ainda mais, o volume desse tipo de produção aqui no Brasil. Há muita gente pautando a diversidade como algo urgente, pois o conflito pode ser resolvido de várias formas e por que não nos conhecendo através de obras audiovisuais?”, indaga ele. A partir de 2018, o Cineclube está sendo realizado pelos artistas Castiel Vitorino, Rodrigo e Napê. A 5ª mostra, que acontece nos dias 31 de agosto e 1º de setembro, acrescenta ao tema da diversidade sexual, a negritude. n

Montação, de Wan Viana (2016)


entrevista Paulo Gois Bastos

Por um audiovisual

com a

cara do

Brasil

Integrante da Comissão de Gênero, Raça e Diversidade da Ancine, Gledson Mercês trabalha como Técnico em Regulação da Atividade Cinematográfica e Audiovisual desde 2012 e, atualmente, exerce o cargo de Coordenador Substituto de Gestão de Processos de Fomento na Superintendência de Fomento da Agência Nacional do Cinema - Ancine. Comunicólogo, ator e com Especialização em Artes Visuais e Direção Teatral, ele também integrou a equipe que produziu o Informe Diversidade de Gênero e Raça nos Lançamentos Brasileiros de 2016, pesquisa que explicita a pouca participação de mulheres e de negros como protagonistas da produção audiovisual nacional. Nesta entrevista, Gledson fala sobre o papel da Comissão e sobre a importância que a diversidade tem para a política audiovisual brasileira.

A

proposição de ações que promovam a inclusão, a diversidade e a igualdade de oportunidades para grupos discriminados em função da cor, raça, etnia, origem, gênero, deficiências, idade, cultura, crenças, orientação sexual e outros, além da recomendação de práticas de sensibilização contra a cultura discriminatória e preconceituosa, são algumas das atribuições da Comissão de Gênero e Diversidade da Ancine. Criada a partir do protagonismo dos servidores da própria Agência, essa instância posta em funcionamento desde o final do ano passado tem orientado a adoção de medidas que ampliem o acesso aos meios de produção audiovisual para pessoas negras, mulheres, indígenas, povos tradicionais e LGBTQI+. A investida em uma política audiovisual que promova uma maior representatividade de gênero e raça na mídia também se ancora no Informe Diversidade de Gênero e Raça, que foi publicado pela Coordenação de Monitoramento de Cinema, Vídeo Doméstico e Vídeo por Demanda da Superintendência de Análise de Mercado da Ancine. Nesse estudo, que contou com informações do Sistema de Acompanhamento da Distribuição em Salas de Exibição - Sadis, foram analisados dados de 1.326 pessoas que integraram as equipes de 142 longas-metragens brasileiros lançados comercialmente em 2016. Dessa amostragem, 97,2% das obras contaram com a direção de pessoas brancas. As mulheres respondem por 19,7% dos filmes. Sobram 2,1% para os homens negros e nenhum filme de 2016 contou com a direção ou com o roteiro de uma mulher negra. Por que a discussão sobre as minorias políticas é importante para a política audiovisual? Estamos falando de um país de mais de 200 milhões de pessoas onde apenas uma pequena parte da população é representada. O cinema brasileiro que vemos hoje é, no geral, feito por um homem, branco e heterossexual. Temos outras vozes no país e não podemos continuar sendo apenas esse mesmo tipo de cinema. Esse modelo não se sustenta mais por muito tempo e vai esgo-

tar-se. O país é grande, há público para tudo e a população brasileira clama por outras vozes. Os profissionais do audiovisual, que são negros, mulheres e indígenas querem oportunidades, mas eles não têm acesso aos grandes recursos, às grandes empresas e aos grandes patrocínios, nem ao fomento público. Por isso, precisamos discutir e rever tudo isso para encontrar soluções que promovam o acesso dessa população excluída aos recursos. Estamos falando de uma indústria e de um mercado. E não se trata somente de reparação das injustiças que foram cometidas com a população negra, indígena e com as mulheres; a diversidade é, sobretudo, uma questão que passa pela economia. Negros e mulheres são consumidores; nós pagamos por esses conteúdos e queremos uma visão diferente das coisas, queremos ter oportunidade de voz. A diversidade é tanto para o público quanto para os profissionais do audiovisual. Veja o exemplo do filme Pantera Negra, uma produção com um elenco majoritariamente negro e que trazia mulheres no poder. Foi um sucesso e está entre as dez maiores bilheterias de todos os tempos. Isso é uma prova de que a diversidade gera lucro e emprego e faz com que o país cresça. Há ainda a questão da representatividade: não adianta só colocar o negro no papel de subalterno ou o profissional negro ocupando apenas as funções profissionais de menor prestígio, não adianta mais criar essa imagem deturpada. Com essa

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com interesse pessoal pelo tema. A Comissão é formada por 16 servidores da Ancine e surgiu a partir dessas vontades individuais e por constatarmos a falta de diversidade no audiovisual brasileiro; a ausência ou a representação subjugada de negros, indígenas e mulheres. Em novembro do ano passado, a Comissão foi institucionalizada e, de lá pra cá, tem tido muito trabalho e está sendo muito atuante. Hoje a Comissão não faz parte do organograma da Ancine. Ela é um setor específico, tem um mandato de dois anos e objetiva promover a diversidade de gênero e raça no audiovisual brasileiro, atua tanto em questões internas sobre a diversidade da própria Agência quanto em questões externas. A Comissão não tem o poder de decisão na Ancine, mas auxilia nas decisões e temos prestado atenção a todas as decisões relacionadas ao audiovisual que perpassam por questões da diversidade.

fórmula desgastada, o audiovisual brasileiro não se sustenta. É preciso uma renovação que passa pela diversidade de gênero, raça e qualquer outra diversidade, pois assim é a realidade da população que se quer ver e ocupar seu espaço. Como a Comissão surgiu? Quem faz parte dela e como é o seu funcionamento? Alguns servidores da Ancine tinham interesse pelo assunto. Eu, particularmente, no meu trabalho de conclusão da graduação, debrucei-me sobre o papel do negro na telenovela. Então, foram juntando-se pessoas

“O cinema brasileiro que vemos hoje é, no geral, feito por um homem, branco e heterossexual. Temos outras vozes no país e não podemos continuar sendo apenas esse mesmo tipo de cinema.”

Foto: Divulgação Ancine

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Existe uma interlocução da Comissão com o mercado e com a sociedade civil? Fizemos algumas apresentações interna e externamente. Temos participado de eventos relacionados a essas temáticas, promovendo exibições de filmes para os servidores seguidas de debate com os realizadores. Temos feito algumas apresentações abertas a todo público. A gente convida personalidades, atrizes e atores negros, indígenas e outros profissionais do audiovisual para eles participarem e nós ouvirmos deles a fim de entendermos suas demandas. Temos sempre buscado diálogo com as entidades como, por exemplo, a Associação de Profissionais do Audiovisual Negro - Apan, que está sempre presente e com alguns players. Temos tido reuniões com essas pessoas porque esse é um lugar importante para entender as suas demandas. Apesar de ser uma Comissão da Agência, ela não veio de uma demanda vertical; mas surgiu a partir dos próprios servidores e tem mantido diálogo com várias entidades e com várias representações do audiovisual e de pessoas que lutam pela diversidade no cinema brasileiro. Temos sido buscados e temos sido proativos em consultar como está o mercado. A partir desse diagnóstico, podemos atuar para que

sejam desenvolvidas políticas públicas que promovam o aumento da diversidade no audiovisual. O que mais chamou atenção nos números apresentados pelo Informe Diversidade de Gênero e Raça nos Lançamentos Brasileiros de 2016? Os dados dessa pesquisa não foram surpresa, porque já sabíamos que havia falta de diversidade no audiovisual. Na verdade, precisávamos de um estudo que mostrasse esses números, pois, por mais que a gente saiba e veja, precisamos de números concretos obtidos a partir de uma metodologia aplicada para, a partir daí, tomarmos alguma atitude. O que mais surpreende é esses números serem tão cruéis no que diz respeito à falta de negros no mercado. Houve 142 filmes de longa-metragem lançados no cinema brasileiro, porém nenhum deles foi dirigido ou roteirizado por uma mulher negra. Os homens negros respondem apenas por 2% das direções e roteiros, ou seja, 98% dos filmes dirigidos e roteirizados em 2016 foram feitas por pessoas brancas. Não estamos falando de uma minoria, mas uma maioria que não é representada, porque as pessoas negras são 54% da população brasileira e as mulheres quase 51%, ou seja, são duas maiorias. No entanto, no audiovisual elas são minorias. Esses dados indicam que há algo muito errado na forma de fazer cinema e produzir audiovisual no país, por isso precisamos urgentemente ter atitudes para mudar esse quadro. Que medidas a Ancine vem tomando para promover a diversidade em suas políticas? O primeiro grande passo foi a Agência incluir a diversidade entre os princípios e valores do seu Planejamento Estratégico para o quadriênio 2017-2020. Isso deu base e respaldo para o desenvolvimento de ações, como o desenvolvimento de estudos por parte da Superintendência de Análise de Mercado. Além disso, foram estabelecidas cotas para os editais da SAv para negros, mulheres e indígenas e também em um recente edital da própria Ancine. Uma outra ação foi a paridade no Comitê de Investimento do Fundo Setorial

do Audiovisual - FSA. Este ano, pela primeira vez, essa instância também teve cotas para negros e mulheres. São quatro membros servidores da Ancine e dois membros do BRDE com mandato de dois anos e com a função de analisarem os projetos que são submetidos à Ancine para obterem do FSA. Essas ações da Ancine podem estimular a adoção políticas culturais para o audiovisual que promovam a diversidade por parte dos estados e municípios? Conhece outras experiências de ações afirmativas para o audiovisual que existam no país? Sabemos da existência de alguns editais regionais e estaduais atentos a essas questões da diversidade, como em Pernambuco, que foram lançados antes mesmo de a Comissão ser criada. Por ser o maior órgão do cinema no Brasil, tomara que tenham a Ancine como modelo, principalmente das boas práticas. Cremos que, ao tomar esse tipo iniciativa, a Ancine sirva de exemplo para outros editais e políticas públicas nas unidades federativas para que estados e municípios desenvolvam ações semelhantes, como colocar cotas em seus editais ou criar comissões que deem atenção a essas questões, para que construamos uma sociedade mais justa e igualitária também nas telas. Somos um país onde a maioria da população é negra e mulher, mas não vemos essa presença nos filmes. Hoje não é mais possível aceitar essa falta de representatividade de cabeça baixa sem fazer nada e sem tomar uma atitude. Já não é possível ficarmos calados diante das injustiças que sempre foram cometidas. n

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Foto: Fabiano Fenelon

entrevista Marcos Sacramento

Audiovisual capixaba se alia a outros estados A

fim de ocupar um papel de destaque no cenário nacional, com uma cadeia produtiva de audiovisual robusta a ponto de poder ser chamada de indústria, a ABD Capixaba se uniu a entidades semelhantes dos estados de Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul com fins de fundar o Fórum do Audiovisual de Minas, Espírito Santo e Sul (Fames). Tal articulação busca dar mais dinamismo à situação do audiovisual no Espírito Santo de modo a sintonizá-la com o movimento experimentado por estados de fora do eixo Rio-São Paulo, como Ceará e Pernambuco, e contribuir com o fim de certa imobilidade dos entes públicos locais no sentido de estarem mais alinhados com a política audiovisual nacional. Criado no final de 2017 nos moldes da Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte e Nordeste (Conne), entidade que congrega realizadores dessas regiões e que tem obtido resultados positivos por meio da interlocução com o poder público, o Fames surge em um período que, apesar de conturbado

politicamente, reservou duas notícias positivas para os realizadores dos cinco estados: a primeira foi o aumento da verba disponível neste ano pelo Fórum Setorial do Audiovisual sob o total de R$1,2 bilhão. A outra, que interessa especialmente aos estados do Fórum, foi a mudança no número multiplicador usado para calcular o montante destinado a cada estado pelos editais do Arranjos Regionais. Até o ano passado, para cada R$1,5 injetado pela Ancine nos estados, o poder local deveria injetar R$1. A partir de 2018, a proporção passou a ser 4 para 1.

“Todos os estados representados pelo Fames são relevantes na produção audiovisual nacional, com um importante histórico e com potencial desenvolvimento, pois têm todos os elos da cadeia do Audiovisual representados”.

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“Já houve avanços. O principal é ter representação, foi ser ouvido. Já em fevereiro, tivemos uma reunião com o presidente da Ancine e fomos ouvidos, colocamos todas as pautas lá”, explica Diego de Jesus, diretor da ABD Capixaba e representante do Espírito Santo no Fames. Diego destaca que uma das principais pautas do fórum é aumentar a cota dos editais da região de 10% para 20%. “Até porque os estados que compõem a Fames participam com quase 25% do PIB do Brasil”, justifica. A Revista Milímetros conversou com Rodrigo Martins, coordenador do Fames, sobre os motivos que levaram à criação do Fórum e quais perspectivas ele vislumbra para o futuro da política audiovisual. Engenheiro de computação e economista, com especialização em Planejamento Estratégico e em Cinema, ele possui capacitação em Gestão de Fundos de Investimentos e é sócio fundador do estúdio de animação Amazing Graphics de Curitiba. Martins atua há 22 anos no mercado nacional e internacional. Atualmente, preside o Sindicato da Indústria Audiovisual do Paraná (Siapar). Você poderia fazer um breve histórico sobre a criação do Fames, explicando o contexto que favoreceu a constituição dessa entidade? Os sindicatos patronais dos estados que compõem a base do Fames já atuavam em alguns temas de forma conjunta, em função da reorganização geográfica da região Sul perante a Ancine, que incluiu Minas Gerais e o Espírito Santo. Entretanto, identificamos

a necessidade de uma organização a fim de sermos mais efetivos e alinhados, além do próprio fortalecimento da união entre esses estados. Após isso, mobilizamo-nos para lançarmos o Fames no evento promovido pelo Sebrae Paraná, ocorrido em dezembro de 2017, para o setor audiovisual no qual estavam presentes a Ancine e os sindicatos. Quais demandas levaram à sua criação e quais são as principais pautas levantadas pelo Fames atualmente? São demandas relacionadas à regionalização dos instrumentos de fomento do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e políticas do Ministério da Cultura (MinC). Nesta pauta estão, por exemplo, os mecanismos de cotas regionais e coproduções. Como o Fórum funciona? Quais são as ações e atividades desenvolvidas por ele? O Fórum é formado pelos sindicatos das indústrias audiovisuais dos estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Minas Gerais. Estas entidades Dauri Batisti possuem voto e são representadas pelos seus presidentes. Há também convidados que são os representantes da Bravi (Brasil Audiovisual Independente) nos estados e a Fundacine no Rio Grande do Sul. Esta é a composição do Fórum que tem como objetivo reunir-se anualmente. Existe um

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reportagem Carolina Ruas

“Estamos em um momento virtuoso, no qual um grande investimento está sendo realizado por parte do FSA. Precisamos apenas garantir que o uso deste recurso seja realizado de forma eficiente e de forma a ampliar os resultados conseguidos até o momento”. coordenador e, neste momento, eu assumo esta função. O que o Fórum almeja alcançar a curto, médio e longo prazo? O Fórum está com seu foco no Programa Anual de Investimentos da Ancine e do FSA. Nosso objetivo é que os recursos sejam colocados e operados da forma mais eficiente possível em uma política nacional, mas principalmente nos estados representados pelo Fames. Pleiteamos um assento no Comitê Gestor do Fórum Setorial do Audiovisual (CGFSA) para que possamos ter esta representação de forma mais efetiva no encaminhamento dos recursos do FSA. Quais são as principais semelhanças e diferenças entre os estados que compõem o Fórum? As diferentes realidades, em termo de mercado e política audiovisual, são um complicador na condução do Fórum? Todos os estados representados pelo Fames são relevantes na produção audiovisual nacional, com um importante histórico e com potencial desenvolvimento, pois têm todos os elos da cadeia do Audiovisual representados. Como avalia a política audiovisual nacional do atual momento? Quais perspectivas vislumbra? Estamos em um momento virtuoso,

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no qual um grande investimento está sendo realizado por parte do FSA. Precisamos apenas garantir que o uso deste recurso seja realizado de forma eficiente e de forma a ampliar os resultados conseguidos até o momento. As coproduções entre produtoras de fora do eixo Rio de Janeiro-São Paulo com grandes produtoras desses dois estados são interessantes ou são apenas imposições do mercado? Não se trata de uma forma de as produtoras pequenas entrarem no circuito de produção e de as produtoras grandes fluminense e paulistas terem acesso a verbas destinadas a outros estados, acesso a recursos que não têm nos seus estados de origem? Creio que temos que pensar nas possíveis sinergias oriundas das coproduções. Realmente pode haver importantes ganhos no acesso a recursos, mas também a bons profissionais e bons projetos. E as coproduções entre realizadores dos estados do Fames, são interessantes? Há alguma possibilidade de o Fames fomentar essas coproduções? Sim, são interessantes e já estamos fomentando na defesa dos instrumentos de regionalização, mas, em paralelo ao acesso aos recursos financeiros, existe uma complementaridade que deve ser observada, além da própria divisão dos riscos relacionados à atividade audiovisual. Há algum projeto como promoção de seminários, eventos ou capacitações entre os realizadores dos cinco estados? Sim, temos um convênio entre os sindicatos participantes, no qual todas as produtoras afiliadas aos sindicatos possuem os mesmos benefícios em qualquer dos estados para cursos treinamentos, seminários etc. n

ABD Capixaba atua para aperfeiçoar e ampliar as políticas culturais

O descompasso entre a atuação do poder público e as demandas do setor audiovisual no Espírito Santo é uma relação de longa data. Das transformações radicais pelas quais o setor passou ao longo dos últimos dez anos - fruto da criação do Fundo Estadual de Cultura - Funcultura e dos editais de fomento - e mais ainda pela consolidação da Agência Nacional do Cinema - Ancine e do Fundo Setorial do Audiovisual FSA como coprodutores de inúmeras obras de relevância do cinema brasileiro, pouco se deve à habilidade das gestões municipais e estadual em colocar-se num papel ativo na arena das disputas por recursos federais.

P

or meio da linha de Arranjos Financeiros Estaduais e Regionais da Ancine/ FSA, mecanismo que a partir de 2015 complementa o recurso aportado pelos governos estaduais e municipais, essa produção local cresceu e começa a dar resultados no sentido de promover o desenvolvimento e sustentabilidade desse setor da economia criativa. Esses recursos são proporcionais ao montante apresentado pelo Funcultura, que em 2018 lança editais com um aporte de R$ 2,39 milhões do governo do estado. Segundo a regra dos arranjos regionais, a Agência multiplica em quatro vezes o valor aportado pelo estado, ou seja, para 2018,

anunciou uma previsão de aporte de no valor de R$ 9,563 milhões, totalizando uma soma inédita no valor de R$ 11,790 milhões em recursos destinados para os editais de audiovisual no Espírito Santo. Segundo o representante da Câmara do Audiovisual no Conselho Estadual de Cultura - CEC, Igor Pontini, o aumento dos recursos está ligado à atuação política e à profissionalização do setor, que tem se unido e se organizado para pensar formas de melhorar cada vez mais o acesso e para formular propostas que atualizem as políticas necessárias ao fortalecimento do mercado. “Estamos crescendo muito em todos

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Demanda do setor audiovisual para o Funcultura os segmentos da cadeia produtiva, mas não avançamos mais porque não há um gestor público caminhando junto com a gente. É preciso atuação estratégica na formulação e implementação de uma política cultural voltada para o audiovisual”, comenta. Ainda por meio de parcerias com a Ancine/FSA há uma série de instrumentos legais que podem desdobrar-se em políticas de fomento ao audiovisual capixaba, mas que esbarram na inércia dos órgãos públicos estaduais e municipais que são os entes que podem dialogar por uma via institucional com a agência. Ao longo do primeiro semestre deste ano a ABD Capixaba realizou nove reuniões abertas com fins de debater e apresentar ações para o aperfeiçoamento dos Editais do Funcultura voltados ao audiovisual. Desses encontros, foi elaborado um documento com uma série de recomendações para o aperfeiçoamento dos Editais do Funcultura que vão desde a necessidade de se instituírem inscrições on-line para os editais abertos (até então, as inscrições deveriam ser feitas por meio de mídia física) até a conclusão de que é preciso instituir reserva de vagas para grupos minoritários que têm baixa ou nenhuma participação no acesso aos recursos, como negros, mulheres, indígenas e a comunidade LGBTQI+. Tais demandas foram encaminhadas à Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo - Secult por meio da Câmara do Audiovisual do Conselho Estadual de Cultura (ver quadro na próxima página). Para Pontini, as propostas colocadas pelo setor local demonstram que o Espírito Santo tem um acúmulo em conhecimento das políticas públicas, em sintonia com as políticas anunciadas pela Ancine, mas que ainda é difícil aprofundar as questões porque

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não há um interlocutor dentro da gestão pública que dê direcionamento a essas demandas. “Este ano o volume de recursos que nós temos, só para o audiovisual, é o mesmo valor que o Funcultura vai aportar para o restante das demais linguagens e área culturais. Logo, é um volume significativo de recursos para ser administrado. São muitos projetos que precisam ser fiscalizados. É preciso verificar se essas produções estão dando certo, qual fim levaram, qual direcionamento tomar a partir desses resultados, e por aí vai”. A Secult, questionada sobre se as recomendações encaminhadas ao CEC são viáveis e como essas medidas seriam adotadas pela secretaria, informou por meio do subsecretário da pasta, Ricardo Pandolfi, que “as demandas foram levadas à análise da Procuradoria Geral do Estado para que possamos, seguindo a legislação, cumprir as questões colocadas pela câmara”. O que parece é que, para os editais de 2018, apenas a recomendação de aceitar inscrições on-line será acatada pela Secretaria. Quanto às formas de alinhamento com outras instituições, a Secult-ES respondeu que essas articulações acontecem corriqueiramente, porém sem mais detalhes. Hoje, a política cultural no Espírito Santo tem direcionamentos genéricos e nada setorizados. A secretaria demonstra que é uma orientação da gestão trabalhar de forma transversal, ou seja, sem trabalhar as especificidades de cada setor. Enquanto isso, é a presença dos recursos da Ancine/FSA que segue impulsionando o Espírito Santo a fazer o dever de casa e criar condições mínimas para que o mercado audiovisual se desenvolva e, ao mesmo tempo, esteja em sintonia com as demandas da sociedade.

Inscrição, critérios e avaliação w Avaliação de recursos deve ser feita por membros externos à comissão de seleção; w Registrar em áudio e/ou vídeo a etapa de defesa oral dos projetos; w Permitir a complementação de recursos com outras fontes de financiamento; w Exigir comprovação profissional e/ou estudantil dos proponentes para além da comprovação de residência por dois anos; w Restringir a participação de um mesmo projeto a apenas um edital por ano; w Instituir inscrição on-line, evitando problemas com leitura de DVD; w Solicitar parecer formal das bancas julgadoras com análise dos projetos seguindo o padrão dos editais da Ancine; w Incluir espaço para o parecer no formulário para análise dos projetos; w Exigir o cumprimento dos critérios de pontuação.

Edital de Desenvolvimento w Permitir que o/a produtor/a também seja o/a proponente de um projeto; w Permitir que uma empresa produtora seja indicada para representar até 2 (dois) projetos selecionados no momento da contratação; w Aumentar para 03 (três) o número de encontros com os consultores e solicitar a emissão de parecer sobre o último tratamento do roteiro; w Permitir a contratação de consultoria em roteiro e/ou tutoria externa nos itens financiáveis pelo edital;

Editais de Longas e Séries w Estender a exigência de duas obras realizadas no currículo das empresas proponentes para a produção de ficção e de documentário.

Proposta de ações afirmativas para os Editais w Pontuação de incentivo para equipes diversas: pontuação extra para proponente que apresente uma equipe técnica diversificada, ou seja, que contenha mulheres, negros, indígenas e pessoas LGBTQ+ via autodeclaração de pertencimento. Exemplo: Mulher + 5 pontos / LGBTQ + 5 pontos / Negros, índios, povos e comunidades tradicionais + 10 pontos. w Reserva de vagas: 50% dos prêmios destinados à reserva de vagas: 25% para mulheres e 25% para negros e indígenas. No caso dos editais que contemplem apenas um prêmio, mantém-se a regra anterior.

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TVs Públicas: a promessa continua Um dos instrumentos legais disponíveis pela Ancine/FSA é o Programa de Apoio ao Desenvolvimento ao Audiovisual Brasileiro - Prodav da Ancine, com linhas de incentivo específicos para a produção de obras seriadas, telefilmes, documentários e ficções com foco no mercado de televisão. As linhas Prodav 01 e Prodav 02 têm o foco na produção de conteúdo para televisão em que o suporte financeiro é destinado a arranjos regionais articulados entre governos estaduais, televisões e outras instituições locais. Desde 2016, a ABD Capixaba articula a criação desse módulo com a Secult-ES e a TV Educativa do Espírito Santo - TVE-ES), como uma grande oportunidade de aquecer a produção de conteúdo local para televisão do estado. Segundo o diretor da TVE-ES, Geraldo Magela, todas as irregularidades e acertos legais que precisavam ser feitos na emissora para acessar essa linha já estão prontos. Na proposta encaminhada à Ancine, a TVE-ES poderá abrir um Edital de Chamamento para a Produção de Obras Seriadas, no qual serão selecionados 10 (dez) projetos entre documentário, ficção e animação, cada qual com 13 episódios de 26 minutos de duração. O edital é destinado à participação de produtoras brasileiras independentes, localizadas no Espírito Santo, com registro regular e classificadas na Ancine.

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O investimento solicitado ao FSA para este módulo é de R$ 750 mil, que devem complementar o aporte do sistema RTV/ ES no valor de R$ 75 mil. Segundo a regra, ao todo, o Edital de Chamamento terá R$ 825 mil para aplicar na produção local. A Secult-ES informou que o projeto para acessar a linha do Prodav 02/2016 foi encaminhado à Ancine e está na fase de consulta prévia. A expectativa de que o módulo já esteja valendo em 2019. Segundo Magela, “a TVE tem todo o interesse em exibir a produção capixaba de qualidade e, no que diz respeito ao aceite da TV, estamos de portas abertas”. O investimento da Ancine depende da organização local e da partilha de responsabilidades entre as partes. A Secult-ES é a responsável por atuar na elaboração dos editais públicos para a produção desse conteúdo junto com a TVE-ES. Esta, por sua vez, fica responsável por arcar com o licenciamento e a exibição das obras produzidas a partir deste edital. O acesso ao Prodav é a porta de entrada para o mercado de conteúdos para a televisão que se abre para o Espírito Santo. E há outras oportunidades a serem visualizadas por esse caminho. A ABD Capixaba iniciou diálogos com outras instituições do estado, como a TV Assembleia e a TV Universitária, veículos que, apesar de terem uma produção restrita a um universo muito específico das instituições às quais estão vinculados, podem desenvolver uma política que, a exemplo da TVE-ES, contribua para a ampliação da política de fomento ao audiovisual.

Lei Rubem Braga teima em renascer das cinzas Em relação às políticas municipais, o ritmo de investimento e a capacidade de aporte das prefeituras continuam ancorados nas leis de incentivo fiscal de cada município, ou seja, estão atrelados ao potencial de arrecadação de ISSQN/IPTU. No caso da Lei Rubem Braga, do município de Vitória, sua criação em 1991 teve um importante papel no estímulo à produção de curta-metragem e na gênese do mercado de produção audiovisual profissional no Espírito Santo. Desde 2015 sem abrir editais para novos projetos por problemas de gestão e de fiscalização dos recursos, agora a Lei Rubem Braga ensaia um retorno às atividades com importantes reformulações no seu mecanismo de acesso. Falta de recurso, problemas na avaliação e fiscalização dos projetos aliados a um elevado número de pendências na prestação de contas são os principais motivos apontados para a paralisação das atividades da lei. Tais problemas de operação estão diretamente ligados ao mecanismo de troca de bônus que até então era adotado pela legislação, que relega ao proponente a tarefa de persuadir empresas sediadas no município a apoiarem seus projetos. Esse mecanismo fez com que vários projetos, apesar de serem aprovados, nunca conseguissem sair do papel. A reformulação em curso da Lei Rubem Braga, segundo informa a Secretaria de Cultura do município, passa pela alteração desse mecanismo de troca de bônus. Isso quer dizer que a lei passará a atuar com financiamento direto, via Fundo de Cultura, com o objetivo de dar mais agilidade à obtenção de recurso e de eliminar as barreiras burocráticas do processo. “Todas essas alterações, tanto nas normas documentais quanto no formato da obtenção do recurso, foram discutidas exaustivamente com a classe artística e cultural, por meio do Conselho Municipal de Cultura”, informa a PMV. Ainda não há um volume de recursos aprovados para o investimento nesta nova modalidade. A prefeitura avalia vincular um percentual ao orçamento anual da Secretaria de Cultura para a aplicação da lei, mas essa etapa ainda precisa passar pela aprovação do Conselho Municipal de Cultura. A previsão é de que a Lei Rubem Braga volte a publicar editais ainda em 2018. n

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Leonardo Vais

Obras

seriadas

são as novas queridinhas do

audiovisual

O hábito de “maratonar” seriados entrou na rotina dos brasileiros. De acordo com pesquisa realizada pela empresa Nielsen, e publicada em abril de 2016, sete entre cada dez brasileiros consomem conteúdo audiovisual por meio do formato on demand ou, em bom português, vídeo sob demanda. O modo como os espectadores foram mudando o hábito de consumir programas televisivos aconteceu de maneira significativa a partir da popularização e da qualidade da internet.

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Projetos séries de animação da Eye Move

reportagem

Babu e os Bichos, projeto de série de animação da Eye Move

O

s serviços de streaming são uma ferramenta decisiva nesta mudança. Essa tecnologia permite que se acompanhe a transmissão de um evento ao vivo ou no formato vídeo sob demanda; o usuário pode escolher quando, onde e o que pretende assistir. Quanto ao conteúdo, a pesquisa aponta que 89% dos usuários brasileiros preferem assistir a filmes e, em segundo lugar, 54% desses espectadores assistem a séries. Isso comprova o hábito do público de “maratonar”, que é assistir a vários episódios em sequência. Isso torna as séries as novas “queridinhas” da produção audiovisual. Um fator importante para fomentar este mercado foi a implementação da Lei da TV Paga (Lei nº 12.485/2011) que democratiza a produção e o acesso a essas obras. Essa legislação determina que todos os chamados canais de espaço qualificados devam veicular um mínimo de 3h30min de conteúdo brasileiro semanalmente em horário nobre, sendo metade destes de produtora independente. Vale um adendo: de acordo com dados da Agência Nacional do Cinema - Ancine, em 2016, foram registradas 3007 horas de obras independentes, sendo 68% delas seriadas.

Manual do Pirata, projeto de série de animação da Eye Move

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Novos mercados e necessidade de fomento

Palaloos, projeto de série de animação da Eye Move

A multiplicidade de janelas Canais de TV paga e aberta, plataformas na internet e serviços on-line têm se mostrado capazes de alavancar a indústria audiovisual brasileira, especialmente em formato seriado e traçando sustentabilidade econômica para o setor. Além disso, investimentos públicos realizados por meio de editais de cultura têm possibilitado que produtoras independentes desenvolvam obras audiovisuais visando a uma carreira comercial, o que era bem restrito há alguns anos. Para a roteirista e diretora Melina Leal Galante, que também é uma das editoras do site Séries Por Elas, os serviços on-line dão um novo panorama para a produção de séries. “Sem dúvida alguma, a internet é uma grande potência e as plataformas estão contribuindo para uma ampliação desse consumo de séries, que gera mais burburinho, mais interesse, mais investimento e por aí vai. Eu sou uma entusiasta das plataformas e não vivo mais sem elas”.

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Apesar da importância e dos novos percursos que a internet trouxe, Melina acredita que a televisão ainda é um veículo fundamental para a distribuição dos conteúdos para o grande público. “Acredito na TV como um catalisador de conteúdos, entre eles as séries, principalmente se considerarmos que muitas produções de outros países chegam ao Brasil por meio dos canais abertos. Porque aqui a gente volta numa questão socioeconômica: quem assiste a TV no Brasil Quem tem acesso à internet? E o que é assistido nessas duas mídias? As séries estão aí, mas o grande conteúdo seriado do Brasil são as novelas. E a novela é majoritariamente consumida pela televisão, por mais que hoje algumas emissoras já disponibilizem sua programação em plataformas digitais”.

Um mercado em franca expansão”. Para o produtor e sócio-diretor da produtora de animação Eye Move, Bruno Nogueira, o mercado de séries no Brasil passa por um momento de ascensão, tanto que se refere à produção quanto a possíveis parcerias. “Nós vivemos em volta de muitas janelas que exibem e precisam de conteúdo a todo momento. Mais especificamente no Brasil, com as leis de incentivo, a demanda dos canais e players só aumenta. Para nós no Espírito Santo, a tarefa é desenvolver ótimos projetos e comer pelos cantos,

atingindo inicialmente players menores, como porta de entrada no mercado, ou buscando coprodutores nacionais e internacionais. A partir daí, nós podemos alçar voos maiores”. Outra etapa importante para a produção de séries é o financiamento. Além dos privados, os editais públicos são fator decisivo na produção desses novos trabalhos. “Existem várias fontes de financiamento. Para a animação, o Fundo Setorial do Audiovisual não é tão usado ainda como poderia ser, mas isso pode mudar com a evolução dos regimentos. Além

do FSA, o artigos 39 e 1ºA da Lei do Audiovisual são muito usados. Fontes locais, como da Secult, também são muito importantes”. De acordo com o produtor, todo o processo para viabilizar uma série, desde a ideia inicial até o produto final, demanda paciência e jogo de cintura. “O processo é muito longo e é preciso uma dose de desapego do projeto, pois várias mudanças virão. O produto final pode não ser exatamente o que estava na ideia inicial. É um processo muito orgânico com muitas pessoas envolvidas”.

Saber negociar a sua ideia O interesse do cineasta Alexandre Serafini por séries é de longa data. “Sempre gostei de séries, sempre gostei do formato. Até mesmo sitcom”, conta o realizador. Serafa, como é conhecido no meio audiovisual, pretende não ser somente um espectador, mas também um realizador de séries. Ele está à frente de uma proposta de série baseada no personagem Luca Bandit, protagonista do livro Ponto Morto, de Saulo Ribeiro, roteirista e parceiro do diretor. Em abril deste ano, apresentou sua ideia no pitching de ficção da 8ª Edição do Rio Content Marketing, do qual participaram apenas dez

projetos de todo o Brasil. O evento aconteceu em abril na cidade do Rio de Janeiro e integra o Rio2C. “Estava nervoso, porque quem estava sentado na mesa eram profissionais da Globo, da Fox, da Record, da Sony. Eram os caras da ponta. Eu não tinha noção do tamanho que era a parada”, conta Serafini, que agora está em negociação para a realização e produção desse projeto. Os realizadores também precisam estar preparados para a realidade do mercado, pois a produção de uma série para grandes canais é um meio-termo entre quem cria e quem viabiliza esses projetos. “Série é mercado. E

mercado é assim. O produtor quer isso; eu tenho isso e a gente vai se entendendo. O David Lynch vende um negócio super autoral, mas a gente não é o David Lynch ainda!”, ironiza Serafa. Segundo o diretor, uma dica que parece simples, mas que faz toda diferença é identificar qual o melhor veículo para o realizador apresentar seu projeto. “Cada canal tem um perfil e uma demanda. Eu quero isso, isso e isso. Quero uma série procedural, sitcom, quero comédia, quero dramático. A pessoa que está nessa tem que saber como mapear isso, saber aonde vai apresentar seu projeto”. n 49


informe publicitário

Banestes investe R$ 2 milhões em projetos socioculturais A cultura de um povo é a sua história e a sua razão de ser. O Banestes, um Banco que cuida e incentiva o desenvolvimento do Espírito Santo, procura investir na cultura local, proporcionando oportunidades de inclusão cultural à sociedade, através de seus projetos sociais e apoiando eventos, feiras e diversos programas com essa finalidade. Ao longo de 2017, foram investidos cerca de R$ 2 milhões em projetos distribuídos por todo o Estado. Assim, o Banco ocupa um importante papel de agente do desenvolvimento e defensor da identidade, sociedade e cultura capixaba. É parceiro em eventos e projetos nos segmentos

ambiental, social, cultural, esportivo e de exposições e congressos, que valorizam as manifestações da região e favorecem a cidadania das comunidades do Espírito Santo. Constante incentivador das artes e das manifestações culturais capixabas, o Banestes neste ano já apoiou dezenas de atividades culturais em diferentes regiões do Estado, como o Carnaval de Vitória. E m m a i o , m a rc o u presença na 7ª edição do Festival Internacional de Jazz e Bossa de Santa Teresa, o Santa Jazz, quando a cidade se tornou palco da sofisticação com apresentações de artistas nacionais e internacionais.

Carnaval de Vitória foi patrocinado pelo Banestes

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Na mesma categoria de evento, patrocinou o Festival de Inverno de Guaçuí, no Sul do Estado, e divulgou aos participantes os cartões Banescard e Banestes Visa no estande do Banco. O Banestes também é um dos patrocinadores do projeto Work in Process, que envolve trabalhos da artista plástica capixaba Rosilene Luduvico. Radicada na Alemanha, ela participa de uma sequência com quatro relevantes ações que culminarão com uma exposição no Palácio Anchieta, com obras de grandes dimensões, denominada “Alvorada”. Na área do audiovisual, o Banco patrocinou na primeira quinzena de junho o 40º Cine Ema – Festival de Cinema Ambiental e Sustentável do ES, que aconteceu em Burarama, Cachoeiro de Itapemirim. É um projeto social e cultural de ampliação da consciência ambiental através do cinema, exibindo gratuitamente obras audiovisuais que tematizem o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável em mostras na praça pública. A cultura se manifesta na dança, na culinária, na música, na história da comunidade, nos patrimônios históricos e religiosos. Buscando alcançar

o máximo desse leque de oportunidades, o Banestes participou também neste ano como patrocinador de um dos maiores eventos da área cultural no Espírito e de importante envergadura turística, Os Passos de Anchieta. A iniciativa teve como objetivo promover o turismo religioso, cultural e histórico do município de Anchieta, além de contribuir para conservação do patrimônio histórico e artístico do local e, sobretudo, projetar a cidade em âmbito regional, estadual e nacional. Para o mês de agosto, o Banestes marcará presença no 19º Festival Nacional de Teatro de Gua-

“Suassuna - O Auto do Reino do Sol”: musical gratuito na praça

çuí, evento que fortalece as manifestações culturais do município como um polo catalisador no sudoeste do Estado e região do Caparaó. Como ação de respon-

Espetáculo a céu aberto O Banestes investe em projetos aprovados pela Lei Rouanet e, em 2017, o grande destaque foi o espetáculo “Suassuna – O Auto do Reino do Sol”, em comemoração aos 80 anos do Banco. O musical, que tem recebido vários prêmios pelo país, é uma homenagem ao poeta e dramaturgo Ariano Suassuna e foi apresentado gratuitamente na Praça do Papa, em Vitória, para cerca de 10 mil pessoas.

Criança O Banco também tem realizado ações enquadradas em outras leis de incentivo, com destaque para o Fundo da Infância e Adolescência, e com investimento distribuídos em três projetos em parcerias com a Associação Salvamar de Assistência à Criança e ao Adolescente, a Casa de Acolhida e Educação Infantil (Creche da Alegria) e Associação Lar Semente do Amor (Rede Alsa).

Monumento histórico

O Banestes inovou ao assinar contrato de

sabilidade social, na oportunidade, serão oferecidos cursos para a formação de novos atores e grupos, bem como contribuir para os já existentes. n

patrocínio com o Instituto Góia para a restauração do Relógio da Praça Oito de Setembro, no Centro de Vitória. Inaugurado em 1942 e tombado pelo Conselho Estadual de Cultura em 1992, o Relógio da Praça Oito destaca-se na paisagem e na memória dos cidadãos capixabas e está associado diretamente ao Banestes, já que a primeira agência está sediada em um dos lados da quadra.

Esporte Na área esportiva, o Banestes manteve neste ano a parceria com a Federação e Futebol do Estado do Espírito Santo para a realização do Campeonato Capixaba, quando alcançou as metas estabelecidas em retorno de mídia espontânea e em ações de relacionamento com públicos estratégicos, garantindo excelente retorno sobre o investimento. Seguindo na área esportiva, o Banestes firmou parcerias com instituições que trabalham de forma integrada e multidisciplinar o esporte aliado à família, escola e comunidade, através da Lei de Incentivo ao Esporte.

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CATÁLOGO Mostra Competitiva Mostra Paralela Pós-Mostra Novos Rumos

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O Poder de

Filmar

Diego de Jesus e Hegli Lotério

Em 1965, dois dos maiores cineastas se encontraram para uma conversa/entrevista: Jean Rouch, francês e na vanguarda do cinema etnográfico feito na época, e Ousmane Seméne, cineasta senegalês que ajudou a fundar os pilares do Cinema Africano pós-colonização. Eles debatiam sobre cinema e modos de olhares até que, depois de uma provocação de Rouch – sobre por que Seméne não gostar de alguns dos seus filmes –, diz a lenda que o diretor africano respondeu: “Porque vocês mostram, vocês fixam uma realidade sem ver a evolução. O que eu tenho contra você e os africanistas é que vocês nos olham como se fôssemos insetos”. O entendimento de cinema de Ousmane Seméne é que não adianta apenas “olhar”; ver não é suficiente nesta arte. É necessário analisar aquilo que vem antes e depois. É preciso explorar as subjetividades daquilo que se vê. E talvez haja um limite nessa exploração de subjetividade; uma linha, em quem só é oriundo daquele meio que se filma, consegue ultrapassá-la. A lógica de feitura do cinema é basicamente – e tradicionalmente – calcada numa relação de subordinação em que aquele que filma tem um poder absoluto sobre os seus objetos de filmagem. Independentemente da forma do filme – mesmo se ele for registrado pelos próprios personagens, a princípio, sem participação do(a) diretor(a) naquele ambiente, naquele momento, em uma espécie de compartilhamento do poder –, a autoridade do cineasta estará lá, seja indicando regras para o jogo da captação, seja montando o filme na ilha de edição. A subordinação sempre estará lá, queira o realizador ou não. Por isso, é urgente que,

para um ambiente cinematográfico diverso, haja uma diversidade nos detentores do olhar. Assim, consequentemente, haverá um compartilhamento de poder e, dessa forma, aqueles que historicamente tiveram menos espaço para transmitir o seu olhar agora conquistariam o seu Poder de Filmar. Desde a retomada do cinema brasileiro é perceptível uma falta de diversidade de olhares atrás das câmeras. Nessa toada, por meio de ações afirmativas nos acessos às universidades e de fomento à produção audiovisual, bem como da modernização de tecnologias que antes só eram acessíveis para classes financeiramente privilegiadas da sociedade, outros grupos conquistaram seu poder de filmar e propor um novo cinema. Mesmo ainda estando longe de termos um cenário ideal de todos os filmes lançados comercialmente em salas de cinema em 2016 – segundo estudos recentes da Agência Nacional de Cinema - Ancine, 75% são de realizadores homens brancos –, os pequenos avanços já demonstram sinais de abalar o status quo cinematográfico nacional. Há hoje não apenas novas abordagens temáticas no cinema brasileiro, mas também novas perspectivas de se filmarem os corpos e de se pensar a mise-en-scène. A Pós-Mostra Novos Rumos da ABD Capixaba pretende fazer um pequeno panorama de filmes recentes nacionais que evidenciam a potência da diversidade de olhares. De diferentes estéticas e temas, financiados por editais de cultura ou coletivamente, de diretoras mulheres a homens negros, de diferentes regiões do país, são filmes que evidenciam a importância da subjetividade do olhar de quem filma; como Historiografia que consegue com poucos artifícios e de modo muito impactante recontar episódios da história da arte e da ciência pela perspectiva de quem nunca pôde contá-la. Como a mostra propõe dialogar os novos rumos do cinema, as realizadoras negras se fazem presentes. O cinema negro

brasileiro tem se potencializado pelo prisma das cineastas negras que assumem o risco de falar a partir da ótica atravessada pelos fatores de gênero e raça. Uma combinação que evidencia, em Travessia, a importância de reconstruir-se a memória de quem no passado não tinha acesso aos mecanismos. Em Braços Vazios, a abordagem dos efeitos colaterais do genocídio dos corpos negros reforça uma mensagem urgente no Espírito Santo: vidas negras importam. Para mais, enquanto em Revejo a construção entre passado, presente e futuro da mulher que redescobre seu corpo assegura a negritude feminina numa perspectiva contemporânea, em A Boneca e o SIlêncio um novo horizonte da independência do corpo feminino é simbolizado por uma forma fílmica impactante e contundente, em que o não-dito tem mais espaço que o dito. O único longa-metragem da mostra, Meu Corpo é Político, ao propor uma câmera que acompanha o movimento de corpos periféricos, traz ao mundo um cinema que atesta o real daquele meio e evidencia o uso desses corpos para o autoconhecimento de seus personagens e para o seu uso militante. É o cinema como indutor de poder aos corpos antes marginalizados. Dos filmes selecionados, dois são de realizadores homens que tentam trazer uma nova dinâmica entre o olhar do cineasta e o seu objeto de filmagem. Como em Chico, em que o gênero afrofuturismo é usado como um imaginário de resistência quando o corpo negro e sua subjetividade são sequestrados por um Estado opressor em níveis jamais vistos. Ou na apropriação de um imaginário de consumo que, em Superpina, é ressignificado em prol da liberação dos corpos. n

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Mostra Competitiva A Flor Azul

(Documentário, 14’18”, 2018, Livre) Memória, afeto e devoção. Nair caminha por sua casa com o coração: canta e floresce ao partilhar simplicidade e a raiz forte de sua sabedoria. Desabrocha a potência de uma pureza inabalável; contempla a natureza nas pessoas e leva a casa pra calçada. Em um portão florido, evoca sensibilidade e lembra da brevidade de ser flor, luz e amor em Jardim Sulacap, bairro do Rio de Janeiro composto majoritariamente por famílias de militares. Direção, roteiro, produção executiva, direção de arte, montagem: Roger Ghil Direção de fotografia: Roger Ghil, Jussara Saldanha e Yolanda Brito Mixagem: Mario Schiavini Assistente de áudio: Carolina Gomes Ghil Elenco: Nair Gomes da Silva e Família.

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A Mesa no Deserto

Direção: Diego Scarparo Roteiro: Jovany Sales Rey Direção de Produção: Magno Santos Direção de Fotografia: Gabriel Fontes e Victor Lima Som Direto: Raphael Herdy e Anderson Xuxinha Direção de Arte: Diego Scarparo Edição de Som: Raphael Herdy Mixagem: Torre Inc Trilha Sonora: André Prando, Raphael Herdy, João Victor Bissoli e Márcio Vianna Maquiagem FX: Rodrigo Aragão Efeitos Visuais: Lucas Duarte e João Paulo Oliveira Figurino: Nayara Tognere Elenco: Edson Ferreira, Rejane Arruda, Lílian Casotti, Margareth Galvão, Markus Konká e Luiz Carlos Cardoso Produção Executiva e Empresa Produtora: Global Village Creative + Executive Carreira: Rio Fantanstik International 2017 - Rio de Janeiro (RJ) / Sinistro 2017 - Mostra Nacional de Cinema de Horror - Rio de Janeiro (RJ) / Chhatrapati Shivaji International Film Festival 2018 / Palmacine Festival 2017 - Festival Nacional de Cinema de Palmácia (CE) / Festival Internacional de Cine de San Luis Potosí 2017 / Cefalù Film Festival 2018 - Palermo / TDTW - Punk Film Festival 2018 Berlin / Los Angeles Cine Fest 2018 Los Angeles / Falcon International Film Festival 2018 - London / TPCINE 2018 - Festival Nacional de Cinema de Três Pontas (MG) / VI Festcine 2018 - Pinhais (PR) / Der Phantastische Trashfilm 2018 (Kassel) / Festival Internacional Cine en las Montañas 2018 - Quindio - Colombia / Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Efeitos Especiais, Melhor Figurino, Melhor Maquiagem - Palmacine 2018

A Mulher do Treze

(Ficção, 15’, 2017, 16 anos) No futuro, o mundo foi destruído por uma grande guerra e se tornou um imenso deserto radiativo; E o que restou da humanidade é o que temos hoje: ódio. Num mundo de alta tecnologia e pouca esperança de vida, o saqueador “Sargento”, num roubo mal-sucedido, passa a noite que mudará sua vida para sempre.

(Ficção,16’, 2017, 12 anos) Inês mantém sua rotina. Direção e Roteiro: Rejane Arruda Direção de Produção: Maria Grijó Simonetti

Produção Executiva: Vitor Graize Empresa Produtora: Pique-Bandeira Filmes Direção de Fotografia: Igor Pontini Som Direto: Greco Nogueira Direção de Arte: Antônio Apoliário Elenco: Byra Bastos e Tito Leal Montagem: Rodrigo de Oliveira Edição de Som: Cons Buteri

Ádito

(Ficção, 14’54”, 2017, Livre) Uma mulher dorme num quarto vazio, sem janelas. Uma voz insiste em mantê-la acordada. Entre proximidades e distâncias, Ádito revela um fragmento da história da vida de duas mulheres. Direção, Roteiro, Direção de Produção e Direção de Arte: Renata Ferraz, Rubiane Maia Direção de Fotografia: Manuel Vason Som Direto: Flávio Hobo Elenco: Renata Ferraz e Rubiane Maia Montagem: Fernanda Pires Gurgel Edição de Som: Flávio Hobo Carreira: 24˚ Festival de Cinema de Vitória, ES, Brasil (première) / 6˚ Cinerama: zonas de correspondências, Centro Cultural Light, Rio de Janeiro, RJ, Brasil / 21 Islands International Short Film Fest, Pregones Theater PRTT, NY, EUA.

Água Viva

(Documentário, 13’05”, 2018, Livre) Vitória Mulheres de uma turma de hidroginástica comunitária conversam submersas sobre questões femininas da

terceira-idade. Maternidade, trabalho e aposentadoria são alguns temas abordados. Direção e Roteiro: Bárbara Ribeiro Direção de Produção: Juliana Gama Direção de Fotografia: Shay Peled e Tati W. Franklin Montagem: Bárbara Ribeiro e Ramon Zagoto Som, Edição de Som, Mixagem e Trilha Sonora: Gisele Bernardes e Sann Gusmão Pesquisa: Bárbara Ribeiro e Lissa Tinôco Assistência de Direção: Diego Nunes Assistência de Produção: Lissa Tinôco Designer: Herbert Fienni 2º Assistência de Direção: Hegli Lotério 2º Assistência de Produção: Juan Gonçalves

Ano Passado Eu Morri

(Híbrido, 25’30”, 2017, 12 anos) A Rodrigo, o diretor deste filme, foram dados três meses de vida. Solitário diante da morte, o diretor procura por Eduardo, seu primeiro namorado. Mas Eduardo não responde. Rodrigo e o Brasil talvez não tenham sobrevivido a 2016. Direção e Roteiro: Rodrigo de Oliveira Direção de Produção: Maria Grijó Simonetti Produção Executiva: Vitor Graize Empresa Produtora: Pique-Bandeira Filmes Direção de Fotografia: Igor Pontini Som Direto: Hugo Reis Direção de Arte: Diana Klippel Elenco: João Paulo Stein, Rodrigo de Oliveira, Lorena Lima e Isabella Masiero Montagem: Rodrigo de Oliveira Edição de Som e Mixagem: Hugo Reis Carreira: 50º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro / 24º Festival de Cinema de Vitória / 9ª Semana - Festival de Cinema / 11º For Rainbow - Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual

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Mostra Competitiva Blubir

(Experimental, 1’, 2018, Livre) Um fundo muito raso dói a vista. Mas A profundidade não é vista a olhos vestidos O fora é vazio quando o que está dentro não é encontrado. O que está fora não é tocado quando Por dentro está vazio. Procura. Avesso. O dentro virado pra fora engole. O fora embrulhado pra dentro vomita. Espalha. Encontra. O dentro e o fora estão dentro. O fora e o dentro estão fora.

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Direção, Roteiro, Direção de Produção, Direção de Fotografia, Edição de Som: Endi Ma

Campo

Catrina

(Ficção, 11’41”, 2016, Livre) A vida e a morte estão sempre conosco. Uma mulher tenta enfrentar o lado sombrio que existe dentro dela. O lado das trevas Direção, Roteiro Direção de Fotografia: Marcelo N. Reis Direção de Produção: Bronze Entretenimento Som Direto: Israel Concha Ruiz Elenco: Marilyn Ricaño Rodríguez Montagem: Israel Concha Ruiz Edição de Som e Mixagem: Emundo Guillermo Urzúa Trilha Sonora: Edmundo Guillermo Urzúa e Marilyn Ricaño Rodríguez Maquiagem: llama Michelle Bretón Carreira: Los Angeles Cine Fest / Festival de Audiovisual de Belém - FAB / Festcine Amazonia / Festival Boca Do Inferno (FBI) / Mostra de Audiovisual América Latina UFMT

Ceca

(Videoarte, 3’, 2018, Livre) Fluido ferro & o campo. Direção, Direção de Fotografia e Edição: Caio Fabricius Edição de Som, Mixagem, Trilha Sonora e Produção: Lucas Côrtes Assistência de Produção e Consultoria: Guilherme Hastenreiter

(Videoclipe, 4’35”, 2017, Livre) Videoclipe da música Ceca de Joana Bentes. Direção, Direção de Produção e Direção de Fotografia: Suellen Vasconcelos e Tati Franklin

Roteiro: Joana Bentes, Suellen Vasconcelos e Tati W Franklin Produção Executiva: Daiana Castilho Dias Empresa Produtora: Filmes Fritos e Plano B Elenco: Joana Bentes e Thaylan Tolentino Edição de Som e Mixagem: Ricardo Camera e Marcos Xuxa Levy Trilha Sonora: Joana Bentes Produção: Joana Bentes Assistência de Produção: Wagner Vieira Assistência de Produção de Set: Raphael Sampaio Making Of, Still e Câmera de Apoio: Shay Peled Colorização: Willian Rubim Styling: Luiza Moreno Figurino: Virgínia Barros e Fauê”

Corpo-Paisagem

Direção, Roteiro, Direção de Fotografia, Montagem e Edição de Som: Antonio Carlos Queiroz Filho

Epigramas

(Experimental, 4’, 2018, Livre) Epigrafes de uma cidade em ruinas Direção, Roteiro, Direção de Produção: Wayner Tristão Direção de Fotografia: Vanessa Malheiros

Lá Não Venta Como Venta Aqui

(Videoarte, 4’, 2018, Livre) Este vídeo experimental (vídeo-dança/vídeopoesia) busca articular a ideia do hibridismo que há entre corpo, paisagem e lugar. Busca, portanto, mostrar em imagens e sons, a perene intercambialidade que há entre o habitar o corpo e habitar a cidade. Resulta, nesse sentido, na constituição de uma narrativa poética que é tecida na diluição das fronteiras existentes entre dança e paisagem, bem como, na e pela experiência do corpo como um mapa de afetos. As imagens foram capturadas entre janeiro e dezembro de 2017 em Portugal e no Brasil, como parte da pesquisa de pós-doutoramento realizada no Departamento de Geografia (Instituto de Ciências Sociais - Universidade do Minho), sobre os temas Cidade, Geografia e Dança, com a supervisão da Profa. Dra. Ana Francisca de Azevedo.

(Documentário,14’, 2017, Livre) A Vila de Itapemirim tem ares de florescer, mas é pequena e carrega marcas de um passado e de um futuro que parecem nunca se concretizar. Direção e Roteiro: Melina Leal Galante Direção de Produção e Produção Executiva: Maria Grijó Simonetti Empresa Produtora: Ventania Direção de Fotografia: Junior Batista Som Direto: Matheus Noronha Elenco: Maria da Penha e Diti Montagem: Diego de Jesus Edição de Som e Mixagem: Hugo Reis

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Mostra Competitiva Luiz, Paixão pelo Jazz

(Anima Mundi 2016) / Melhor Roteiro no 10º Curta Taquary (Pernambuco 2017) / Grande Prêmio do Júri - 7º Festival Cartón (Argentina 2017) / Grande Prêmio do Canal Brasil 2017 / Melhor Curta nacional no BAF (Brasília 2017)

onde você ancora seus silêncios? 1 (Documentário, 25’, 2018, Livre) A fascinante aventura de Luiz Paixão na terra do Jazz e sua vasta coleção de discos e autógrafos de celebridades do Jazz e da MPB. Direção: Eurico Scaramussa Roteiro: Eurico Scaramussa e Marcos Valério Guimarães Direção de Produção: Maria Elisiária Sá Scaramussa Direção de Fotografia: Eurico Scaramussa Montagem e Edição de Som: Marcos Valério Guimarães

O Projeto do Meu Pai

60 (Animação, 5’, 2016, Livre) Eu tenho um amigo que diz que a gente precisa desenhar uma mesma coisa mil vezes, até ela ficar do jeito que a gente acha que é. Direção, Roteiro, Direção de Produção, Direção de Fotografia, Direção de Arte, Montagem e Animação: Rosaria Empresa Produtora: Fasfavor Desenhos Animados Edição de Som e Mixagem: Rodrigo Boecker Trilha Sonora: Lenina Z Carreira: Melhor Filme Brasileiro (Rio de Janeiro & São Paulo) e Melhor Curta (Rio de Janeiro) no Anima Mundi 2016 / Prêmio Aquisição do Canal Brasil e Prêmio BNDES

(Experimental, 3’17”, 2017, Livre) Vitória Perdida em um mar de silêncios sobre sua ancestralidade africana a personagem busca na Calunga algum lugar onde possa se encontrar. Desequilibrada, sem porto, resolve ela mesma ancorar-se dentro de uma frágil nau. Direção, Roteiro, Direção de Produção, Direção de Arte e Elenco: Charlene Bicalho Produção Executiva: Maria Eduarda Moulin Direção de Fotografia: Bruno Gava Montagem e Edição de Som: Matheus Noronha Trilha Sonora: Elton Pinheiro Carreira: Residência Artística FábricaLab 2017 / Aprovado na Mostra Verbo 2018 da Galeria Vermelho (SP) / Aprovado na exposição “cá entre nós” da Galeria OÁ (ES)

(Documentário, 25’, 2018, Livre) Rio das Lágrimas Secas traz um recorte sobre as perdas sofridas por mulheres de três pequenas comunidades, localizadas no caminho da lama de destruição do desastre/ crime ambiental provocado pelo rompimento da barragem de rejeitos de mineração da Samarco, que ocorreu no dia 5 de novembro de 2015 e afetou o Rio Doce e todos os ecossistemas ao seu redor, matou 19 pessoas e desalojou inúmeras outras. Todas as mulheres tiveram seus modos de vida e as suas relações com seus territórios e com a paisagem em que habitavam transformados pela tragédia. Todas tiveram que aprender a ser atingidas por este crime. Direção, Roteiro e Produção Executiva: Saskia Sá Direção de Produção: Alana Ribeiro Empresa Produtora: Horizonte Líquido Direção de Fotografia: Iza Rosenberg Som Direto, Edição de Som, Mixagem e Trilha Sonora: Greco Nogueira Montagem: Rafael Balducci

Secret Lie Bl ack Butt erflies

Sobre a Gente

(Animação, 7’47”, 2017, Livre) O filme conta as histórias dos participantes da animação. Direção e Roteiro: Alunos do Projeto Animação/ Núcleo Animazul Direção de Produção e Produção Executiva: Beatriz Lindenberg Empresa Produtora: Instituto Marlin Azul Montagem, Orientação de Roteiro e Animação: Analúcia Godoi Trilha Sonora: os alunos e Pedro de Alcântara Assistentes: Ariane Piñeiro, Irson Barbosa e Marineia Anatório Tratamento de Imagens: Analúcia Godoi e Núcleo Animazul Carreira: Rói-Rói - Mostra de Cinema Infantil (2018) / 6º Olhar de Cinema - Festival Internacional de Curitiba (2018) / 26ª Edição do Festival de Animação do Brasil Anima Mundi (2018) / Cineminha na Biblioteca(2018) / 17ª Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis (2018).

Solveris - CherryBlossom

Rio das Lágrimas Secas (Videoclipe, 5’09”, 2016, Livre) Performance da banda Secret Lie Direção, Montagem e Edição de Som: Marcelo N. Reis Roteiro: Nuno Miguel Silva Direção de Produção: Bronze Entretenimento Produção Executiva: Nuno Miguel Silva Empresa Produtora: Bronze Entretenimento Direção de Fotografia: Marcelo N. Reis e Nuno Miguel Silva Carreira: Fest Clip

(Videoclipe, 4’19”, 2017, Livre) Videoclipe realizado para a musica “cherry Blossom” do grupo capixaba SOLVERIS presente no álbum Coligações Expressivas 4

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Mostra Competitiva Direção, Roteiro e Montagem: Junior Batista Direção de Produção e Elenco: Solveris Direção de Fotografia: William Rubim Edição de Som: Dj Caique Assistência de Fotografia: Lucas Dornellas Produção: Karol Mendes, Vinicius, Laila Salles, Victor Lima Maquiagem: Erika Almeida Figurino: Patrik Braga Color Grading: William Rubim

Teresa

Terra Vermelha (ou “o perigo da história única”)

Sonhos (Lado B)

(Videoclipe, 4’39”, 2017, Livre) No centro de Vitória, o moleque do morro que logo cedo já não tem a mãe em casa pro café sai para mais um dia correr atrás do prejuízo, ganhar um trocado e satisfazer seus anseios. Trabalha na feira, dá duro, e ao final desse dia, com o pouco que ganhou, tem a sua recompensa tão desejada: Ir ao encontro da cultura!”

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Direção e Direção de Arte: Gabriel César Roteiro: Joao Paulo Soares Wanzeller, Cesar Resende Lemos Direção de Produção e Direção de Fotografia: Luis Neves Empresa Produtora: Projeto Sete Lab Som Direto: Felipe Almeida Elenco: Gabriel Roque Costa, Joao Paulo Soares Wanzeller, Cesar Resende Lemos e Nego Dan Montagem: Cesar Gabiru Edição de Som: Marcelo Shimu STUDIO 3 e Cesar Gabiru Mixagem e Trilha Sonora: STUDIO 3

(Videoclipe, 2’35”, 2017,12 anos) O clipe mostra a banda Whatever Happened To Baby Jane num ensaio antes subir ao palco. Paralelamente narra a tarde de algumas garotas, onde todas são Teresas e juntas assistirão ao show da banda logo mais a noite. Dentre elas a protagonista destaca-se em seus altos e baixos de emoções. Teresa é uma mulher forte e independente que resolve suas lutas diárias. Geralmente acerta mas permite-se errar também e no final quer celebrar os seus sentimentos. Teresa pode ser um alter ego de todos. A parte que não se quer mostrar, mas existe internamente em cada um e que de vez em quando aparece diante dos espectadores. Direção, Roteiro, Direção de Produção, Produção Executiva e Direção de Arte: Erika Mariano Direção de Fotografia, Montagem e Edição de Som: Gabriel Castro Elenco: Banda Whatever Happened To Baby Jane, Priscila Vescovi, Moyara Kossmann, Ana Carolina Lima Pereira, Katharina Santos Igreja, Luiza Cossetti, Ana Luiza Gonçalves, Rachel Póvoa Canuto, Silvia Labuto, Laysa Santiago, Jéssica Oliveira Música: Teresa (Whatever Happened to Baby Jane) Assistência de Fotografia e Assistência de Produção: David Ferreira e Julio Mariano Vídeoclipe produzido para a disciplina de Vídeo do curso Superior de Fotografia da Universidade Vila Velha - UVV.

(Documentário, 6’, 2018, Livre) Terra Vermelha (ou “o perigo da história única”) trata do poder que o discurso hegemônico tem em produzir narrativas estereotipadas sobre um determinado lugar. Questionamos esse processo a partir do olhar sensível e poético daqueles que revelam o verdadeiro “perigo da história única”. O lugar das múltiplas narrativas é, portanto, o lugar do empoderamento. Por isso: “Histórias importam. Muitas histórias importam”. Direção, Roteiro, Direção de Fotografia, Montagem e Edição de Som: Antonio Carlos Queiroz Filho

Tríptico

(Videoarte, 4’34”, 2017, Livre) Uma porta que se fecha ao som de um cometa; uma patrulha de exército; uma moeda de real gira como se tivesse perdido o controle, como um cometa desgovernado. Segundo Pasolini, o vídeo ilustra sua percepção do mundo atual, um mundo que se fecha física e intelectualmente, dominado pelo medo e o prospecto de colapso econômico. Direção, Roteiro, Direção de Produção, Direção de Fotografia, Montagem e Edição de Som: Lobo Pasolini

Vinillis Frutiferis

(Ficção, 15’, 2015, Livre) Um jornalista vai ao interior do Espírito Santo para conhecer a “Vinillis frutiferis”: uma árvore cujos frutos são discos de vinil e que precisa que os beija-flores, com seus bicos, toquem a música. Num jogo entre realidade e ficção, descobrimos as histórias e as relações dos moradores que preservam essa espécie até hoje. Direção e Roteiro: Victorhugo Passabon Amorim Direção de Produção e Empresa Produtora: Instituto Marlin Azul Produção Executiva: Beatriz Lindenberg Direção de Fotografia: Juarez Pavelak Som Direto: Greco Nogueira Direção de Arte: Sara Passabon Amorim Elenco: Youssef Nicolas Nasr, Toufic Youssef Nasr, José Dell’Armi, Hélia Zechini Dell’Armi, Rosalina Dell`Armi, Maria Dell’Armi, Eliana Dell’Armi Marotto, Eduardo Dell’Armi Marotto, Maria da Penha Costa da Silva, Dienifer Liverani da Silva, Regiane da Cunha Liverani, Rafaela Costa da Silva, Alcilei Dias Monteverde, Pedro Henrique Fassarella, Carlos Roberto Barbosa Baiense, Paloma Uliana Mendes, Pâmela Cristina Evangelista e Victorhugo Passabon Amorim Montagem: Francisco Neto (Expurgação) Edição de Som e Mixagem: Felipe Mattar (Expurgação) Trilha Sonora: Alessandra Biato, João de Paula, Clerison Paula Silva e Francisco Neto Produção: Hugo José Costa Amorim e Rosa Amélia Rossetto Produção de Set: Gabriela Nogueira Still e Fotografias Finais do Curta: Ratão Diniz Ilustrações: Benício Ramos Coordenação de Finalização: Lorena Louzada (Expurgação) Carreira: Festival Mimo 2016 / 5º Festival TV e Cinema de Muqui

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Mostra Paralela Canto de Mulher Quilombola - Território Sapê do Norte Gisele Jesus Vicenti (Xis Makeda) (Documentário, 4’43”, 2017, Livre) Produzido pelo Grupo Sawabona de Cultura Negra, o documentário retrata o protagonismo de mulheres quilombolas da região do Sapê do Norte, no Espírito Santo, através das memórias de seu “canto” territorial e seus cantos culturais ancestrais.

Mulheres de Barro

Edileuza Penha de Souza (Documentário, 26’, 2014, Livre) Em meio aos relatos de suas histórias de amor, doze mulheres, paneleiras e congueiras de Goiabeiras Velha, em Vitória-ES, confeccionam suas panelas de barro com a mesma força e destreza com que a vida moldou seus destinos e afetos. Apesar de uma vida sofrida essas mulheres conquistaram uma velhice tranquila retirando do barro e do congo a razão e o prazer de viver.

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O Golpe

Marco Luppi

(Videoclipe, 3’30”, 2018, Livre) Uma abordagem do golpe. O golpe que sofremos diariamente. Um golpe que tem endereço, tem cor, tem gênero e tem classe social.

Cine Jardins 02 DE JULHO DE 2018 (Segunda-Feira) 19h Abertura da Mostra e Lançamento da 8ª Revista Milimetros 20h Mostra Competitiva 21h Debate com realizadores 03 DE JULHO DE 2018 (Terça-Feira) 19h Mostra Competitiva 21h Debate com realizadores 04 DE JULHO DE 2018 (Quarta-Feira) 14h 4º Fórum do Audiovisual Capixaba (Ufes) 19h Mostra Competitiva 21h Debate com realizadores 05 DE JULHO DE 2018 (Quinta-Feira) 19h Mostra Paralela 20h Homenagem 20h30 Premiação, encerramento da Mostra e Lançamento do DVD coletânea.

Pós-Mostra Novos Rumos 64

06 e 07 DE JULHO DE 2018 – CINE METRÓPOLIS – 19h


Pós-Mostra Novos Rumos A Boneca e O Silêncio Carol Rodrigues

Chico

Meu Corpo É Político Alice Riff

Superpina Jean Santos

Irmãos Carvalho

(Documentário, 19’, 2015, São Paulo, 14 anos) A solidão de Marcela, uma menina de 14 anos, que decide interromper uma gravidez indesejada.

Braços Vazios Daiana Rocha

(Ficção, 23’, 2017, Rio de Janeiro, 12 anos) 2029. Treze anos depois de um golpe de Estado no Brasil, crianças pobres, negras e faveladas são marcadas em seu nascimento com uma tornozeleira e têm suas vidas rastreadas por pressupor-se que elas irão, mais cedo ou mais tarde, entrar para o crime. Chico é mais uma dessas crianças. No aniversário dele, é aprovada a lei de ressocialização preventiva, que autoriza a prisão desses menores. O clima de festa dará espaço a uma separação dolorosa entre Chico e sua mãe, Nazaré.

(Documentário, 71’, 2017, 12 anos, São Paulo) Meu corpo é político aborda o cotidiano de quatro militantes LGBT que vivem em periferias de São Paulo. A partir da intimidade e do contexto social dos personagens, o documentário levanta questões contemporâneas sobre a população trans e suas disputas políticas.

Revejo Láisa Freitas

Travessia Safira Moreira

Historiografia (Ficção, 16’, 2018, Espírito Santo, 14 anos) Vera é uma mãe que perdeu seu filho, Carlos, de forma trágica. Ela não consegue se recuperar do trauma e se apega às lembranças numa tentativa de amenizar seu sofrimento. Até que um dia Vera encontra um bilhete que a obriga a fazer uma escolha.

(Ficção, 28’, 2017, Pernambuco, 16 anos) Paula é uma jovem criativa que faz “bicos” como fotógrafa e também atua como cantora em um restaurante chamado “Boca da Noite”. Seu currículo é selecionado para trabalhar no “Superpina”, um pacato supermercado no coração do bairro do Pina. Entre prateleiras e estoques, clientes e funcionários irão experimentar o “Amor Primo”.

Amanda Pó

(Documentário, 3’40”, 2017, São Paulo, Livre) Quem escreveu a História, na qual homens são sempre protagonistas?

(Documentário, 19’10”, 2017, Espírito Santo, Livre) Identidades Negras são construídas coletivamente. Revejo é um filme sobre tornar-se negra e rever a si mesma de forma contemplativa. Com Anita Freitas dos Santos, Cecília Freitas dos Santos, Tamyres Batista, Ana Clara Chagas da Silva, Daiana Rocha, Danúsia Peixoto, Elaine Vieira, Hegli Lotério, Léia Rodrigues, Luiza Vitório, Marlene de Oliveira, Naira Valente, Sandra Chagas, Sonia Rodrigues da Penha e Valentina Matos Ferreira.

(Documentário, 5’, 2017, Rio de Janeiro, Livre) Utilizando uma linguagem poética, Travessia parte da busca pela memória fotográfica das famílias negras e assume uma postura crítica e afirmativa diante da quase ausência e da estigmatização da representação do negro.



02 A 05 DE JULHO

MOSTRA COMPETITIVA DE CURTAS CAPIXABAS patrocínio

CINE JARDINS 19H entrada gratuita programação completa em www.abdcapixaba.com.br realização

apoio

EDITORAÇÃO ELETRÔNICA


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