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OS GUARDIÕES DOS ANIMAIS EM FUKUSHIMA por Sara Bastos
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aoto Matsumura e Keigo Sakamoto provavelmente não se conhecem, mas têm muito em comum: são os guardiões dos animais de Fukushima, a província japonesa vítima do maior acidente nuclear desde Chernobil e onde ninguém quer – ou pode – viver.
Naoto Matsumura
De onde os animais não tiveram como fugir. Muitos foram deixados para trás acorrentados e morreram de fome. Com a missão de salvar o máximo número de animais possível, Naoto Matsumura, agricultor, recusou ser evacuado da cidade de Tomioka (situada a
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menos de 20 quilómetros da central nuclear de Fukushima) e é agora o único habitante dessa cidade fantasma, juntamente com dezenas de vacas, porcos, gatos, cães e até um pónei e duas avestruzes. Keigo Sakamoto, que trabalhava em instituições de apoio a
deficientes mentais, também recusou ser evacuado após o acidente nuclear e permaneceu na cidade de Naraha, a sul de Fukushima, onde cuida e alimenta mais de 500 animais abandonados, incluindo os seus 21 cães.
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Para além do risco de vida que ambos enfrentam, ao habitar zonas altamente radioativas, não têm electricidade ou água potável e tiveram de improvisar com painéis solares e geradores para conseguirem iluminação, refrigeração dos alimentos, cozinhar e acesso à Internet. Naoto tem uma página no Facebook e Keigo conseguiu um pequeno subsídio estatal para o ajudar na tarefa de cuidar dos animais: todas as segundas e sextas viaja até à cidade de Iwaki onde se abastece. Para conseguir alimentar todos os animais necessita de cerca de uma tonelada de comida por mês. A maioria dos cães que Keigo alimenta afastaram-se do contacto humano e ficaram pouco sociáveis. Mas há um “especial”, a quem Keigo chamou de Atom (“Átomo” em português), por ter nascido pouco tempo antes do desastre nuclear. Quando Naoto recusou ser evacuado e ficou para trás, fê-lo principalmente pelos seus animais. Mas cedo se apercebeu que existiam muitos mais animais a precisar de ajuda, vários deles fechados e sem acesso a comida ou água. Centenas de vacas morreram desta forma.
Keigo Sakamoto fotografado por David Guttenfeld
der / AP / National Geographic
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Naoto conta que uma das cenas mais tristes que presenciou foi de uma vaca, que estava pele e osso, a afastar o seu bezerro que queria desesperadamente amamentar-se. Atordoado pela fome, o bezerro afastou-se a chorar e agarrou-se a um pedaço de palha, como se fosse uma teta da mãe. Morreram os dois.
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Japan Time
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Naoto chegou a salvar um cão que se encontrava preso dentro de um celeiro há quase ano e meio. Durante todo esse tempo alimentou-se da carne apodrecida do gado que tinha morrido à fome. Sobreviveu, sabe Deus como, até Naoto o encontrar no Verão de 2012, como se imagina num estado lastimoso. Naoto resgatou-o e assim que o cachorro começou a recuperar, chamou-lhe Kiseki (“Milagre” em português). “Quando fui alimentar os meus cães, os cães da vizinhança ficaram doidos. Fui verificar e encontrei-os acorrentados. Toda a gente foi embora a pensar que iriam voltar em poucos dias, penso eu. A partir desse momento comecei a alimentar todos os cães e gatos. Não podiam esperar, começavam logo a latir quando ouviam a minha carrinha. Para todo o lado que eu fui havia algum cão a latir. Como se dissessem ‘tenho sede’ ou ‘não temos comida’. Comecei então as minhas rotinas diárias.”
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“Não há vizinhos. Sou o único aqui e estou para ficar.” Keigo Sakamoto
Damir Sakoji / Reuters
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“Disseram-me que não devo ficar doente nos próximos 30 ou 40 anos. Provavelmente já estarei morto nessa altura de qualquer das formas, então não me podia importar menos com isso.” Naoto Matsumura
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governo japonês começou a evacuação de todos os residentes próximos da Central Nuclear de Fukushima dia 11 de Março de 2011, expandindo a área nos dias seguintes até 45 quilómetros de distância. Para acalmar a população, o governo passou a mensagem de que seria uma evacuação temporária e dentro de dias estariam de volta. Muitos animais ficaram assim para trás, com reservas de comida e água que os donos acreditaram ser suficientes. Aqueles que se recusaram a deixar os animais para trás, enfrentaram diversos problemas. As autoridades recusaram-se a alojar animais até cerca de 3 meses depois, quando criaram um abrigo para o efeito. Muitos dos refugiados tiveram de esconder os seus animais dentro de carros e até mesmo ficar com eles nas viaturas, pois não podiam entrar nos abrigos.
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Grupos de proteção animal começaram inicialmente a tentar alimentar os animais que foram deixados para trás, até serem impedidos de voltarem a aceder aos locais afetados pela radiação. Ainda assim, conseguiram salvar cerca de 1.500 cães e gatos enquanto tiveram acesso. Após algumas filmagens perturbadoras terem escapado para os media, o governo japonês proibiu definitivamente qualquer acesso por partes dos grupos de defesa animal e chegou mesmo a prender dois voluntários, Hiroshi e Leo Hoshi, a 28 de Janeiro de 2012. A família Hoshi, ás suas custas, já tinha salvo cerca de 200 animais. Keigo Sakamoto e Naoto Matsumura são os “desordeiros” que ficaram e os salva-vidas de todos os animais que não tiveram como sair das cidades. São os guardiões dos animais de Fukushima.
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Produção: Carlos Gandra Conteúdos: Sara Bastos Contacto geral geral@mundodosanimais.pt Colaboração editor@mundodosanimais.pt A Revista Mundo dos Animais é uma publicação gratuita. Sinta-se livre para a distribuir por email, twitter, blog ou qualquer outro meio, desde que nenhum dos conteúdos seja de alguma forma alterado. Todas as edições podem ser acedidas gratuitamente em: www.mundodosanimais.pt/revista Visite-nos em: www.mundodosanimais.pt /mundodosanimais @mundodosanimais +MundodosanimaisPt © 2016 Mundo dos Animais