…as esculturas que vou fazendo são actos cada vez mais livres, por isso cada vez menos pré-conceituosos, procurando em cada dia e em cada acção, fazer o jogo da vida1. José Aurélio
José Aurélio: viver a escultura Ainda jovem estudante na casa dos 20 anos, nos finais da década de 50, José Aurélio inicia o seu percurso artístico segundo as principais vertentes que irão caracterizar a sua obra: pluralismo formal, matérico e conceptual, constante postura experimental, marcado sentido social e ético. O gosto de experimentar o novo sobrevive, até hoje, como traço de juventude, no artista amadurecido e empenhado no desígnio de articular imaginativamente espírito e matéria. Torna-se por isso difícil a identificação de uma direcção, objectivo ou programa que esclareça as opções tomadas, ou mesmo a sistematização por fases, núcleos, ou outro qualquer método de arrumação a que habitualmente se recorre em esforço de clarificação. Será, contudo, na articulação de todas estas vertentes, concretizada em extensa obra, mais do que num único fio condutor, formal ou conceptual que poderá ser identificada a marca autoral do escultor. Qualquer tentativa de sistematização da produção artística de José Aurélio deve sobretudo ter em conta a constância de um espírito investigador. Definido como um “experimentador”2, reconhece em si próprio esse renovado entusiasmo por encarar novos desafios e encontrar soluções para os problemas que o seu próprio trabalho, à escala do estúdio ou do espaço público, vai colocando. Poucas vezes as soluções encontradas para uma situação são aplicáveis noutras quer no que respeita a selecção dos materiais a utilizar, quer no que tem que ver com as soluções técnicas para problemas de construção, resistência e durabilidade.
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José Aurélio in 5 Escultores. Setúbal: Museu de Setúbal, 1984. AZEVEDO, Fernando de – “A Paz e a Árvore da Vida”. Monumento à Paz. Almada: Câmara Municipal de Almada, 2001.
O método de trabalho de José Aurélio define e simultaneamente reflecte esta postura. Tipicamente, a busca de solução para um problema inicia-se com uma produção intensa de desenhos seguida pela construção de maquetas com variáveis graus de sofisticação. O processo de trabalho que, no caso de uma grande escultura para um parque, passa pela produção de uma maqueta, destinada a ser substituída pela grande peça final, por vezes encontra justificação ali mesmo, no pequeno formato, e o registo final necessita apenas um ajuste do material de produção. É o que acontece, muitas vezes com as jóias ou as medalhas, as primeiras produzidas em materiais preciosos, as segundas, geralmente cunhadas ou fundidas em bronze. O mesmo método aplica-o ainda José Aurélio ao ensaio de articulação de materiais diversos na produção do que se poderia designar por estudos finais. São construções em arame, cartão, contas, pedacinhos de chapa ou plástico, gravetos, paus, que resultam em surpreendentes coisas íntimas. O manusear de um material até encontrar a forma satisfatória tem equivalente na selecção que resulta do olhar receptivo à descoberta, ao encontro, no sentido picassiano, da peça de maquinaria solta, do pedaço de madeira na praia, da lâmpada ou do botão, que articula entre si ou que integra na construção em ferro ou na peça fundida em bronze. Para José Aurélio, “a escultura é um processo de ocasiões, de circunstâncias, onde não se podem perder as oportunidades do momento”3. Para que a oportunidade não se perca é necessário, antes de mais, reconhecê-la enquanto tal e, em seguida, ser capaz de materializar as respectivas potencialidades formais, materiais ou simbólicas. José Aurélio é mestre desse processo que exige não só o domínio de múltiplas tecnologias como disponibilidade para deixar falar as formas e os materiais, sem lhes sobrepor a voz de um quaquer pré-conceito. Através desse diálogo com as matérias mas também com os lugares, os tempos, e as pessoas, se concretizam as obras públicas destinadas a muito espaço e muita gente. A obra pública de José Aurélio vive, antes de mais, da sua extraordínária sensibilidade para a escala. José Aurélio transita, do pequeno formato (da medalha, por exemplo) para a grande escultura de exterior, com a segurança que lhe vem de extensas pesquisas desenvolvidas na definição da forma
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“ Uma conversa na Quinta da Preta”. José Aurélio Gestos e Sinais. Lisboa: Fundação Mário Soares: Magno, 2001.
e de profundos conhecimentos técnicos e de comportamento dos materiais. Mas, tendo presentes a especificidade das condições de produção e de recepção do pequeno formato como da obra monumental, José Aurélio está sobretudo atento à necessidade de adequar a sua visão pessoal à voz colectiva exterior sabendo que é nesse equilíbrio que se joga o sucesso de cada peça. Da diversidade aparentemente caótica da vasta produção escultórica de José Aurélio emerge esse sagrado amor pela matéria que move o escultor na sua incansável investigação. Preferindo trabalhar os metais José Aurélio ouve, com humildade, as gentes que, ao longo dos séculos com eles tem lidado e aprende, atento, as técnicas tradicionais. Estuda as formas identificando o que nelas foi ditado pela matéria e o que pertence à identidade dos tempos e dos lugares. No processo vai encontrando as suas respostas, inventivas, arrojadas e quase sempre provisórias, como são as dos verdadeiros investigadores. Os riscos que cada nova situação transporta e a necessária revisão de soluções verifica-se talvez com mais evidência (e emoção) no combate amigável, já com algumas décadas, que José Aurélio vem travando com o vento. A busca de resposta para a questão de criar habitantes do céu, utilizando a linguagem essencialmente matérica (entenda-se pesada) da escultura na produção de peças simultaneamente leves e resistentes às variações meteorológicas, tem alimentado uma criação cinética única na escultura em Portugal que combina tecnologias sofisticadas com aplicações tradicionais de conhecimento empírico acumulado ao longo dos séculos. Afirmar que José Aurélio vive a escultura é reconhecer-lhe a postura de absoluta abertura no que diz respeito à definição do seu campo de actividade, isto é, para José Aurélio tudo pode ser escultura ou melhor, tudo pode ser encarado como uma questão a resolver dentro do âmbito da escultura. É também afirmar que José Aurélio se coloca a ele próprio dentro da escultura que vai concebendo e fabricando, podendo as múltiplas facetas da sua obra ser entendidas, no limite, como metáfora de si mesmo ou ainda ver o escultor “como personagem da sua obra”4.
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SOUSA, Rocha de – “Imagens para uma escultura que se move no tempo”. Natureza Metálica. Centro Cultural Malaposta, 1994
Espírito e matéria5 José Aurélio inicia-se na escultura num tempo nacional difícil mas onde a escultura oficialmente monolítica apresentava já algumas brechas abertas por primeiros ensaios de abstracção, os objectos surrealistas e, mais directamente relevante para o jovem artista, a escultura muito pessoal de Jorge Vieira. Desde as primeiras produções, ainda enquanto aluno da Escola de Belas Artes de Lisboa, José Aurélio revela um pendor experimentalista traduzido em utilizações de vários materiais e exploração de diversas técnicas que constituíram, na época, manifestações de independência face ao monolitismo do ensino académico. Entra para a ESBAL, em 58, por opção e incentivo de Lagoa Henriques. Será ainda este escultor que o apresentará a Jorge Vieira que, na sua opinião, fazia “da melhor escultura” praticando “uma contenção das formas como ninguém”. Se para o mestre formado por Barata Feyo, a questão formal ganha, naturalmente, primazia, a José Aurélio o trabalho de Jorge Vieira interessa também pela inventividade e a utilização de materiais pobres que interpreta como sinais de uma postura de independência e inconformidade que o jovem escultor respeita e encontra em si próprio. A reforma do ensino artístico, introduzindo novas disciplinas e pressupondo uma aprendizagem de trabalho com novos materiais, quase não se faz sentir ainda por muito tempo e a escultura em barro, enquanto suporte de transição para materiais mais nobres e duradouros, continua predominante ao longo de todo o curso. Os professores, António Duarte, Joaquim Correia, Martins Correia e Soares Branco asseguram continuidade a uma concepção da escultura que tem como quase exclusivas vocações o retrato, a estatuária comemorativa ou decorativa, e o relevo essencialmente decorativo. José Aurélio dá por terminada a sua formação escolar com uma já interessante carreira artística em curso. Com ele haviam estudado mais cinco jovens escultores, entre os quais Espiga Pinto e Fernando Conduto. Na pintura, será Rogério Ribeiro o mais próximo e com os três manterá José Aurélio, ao longo dos anos, contactos profissionais e de amizade.
José Aurélio, Espírito e matéria, 1958. Ferro. 970x500x130cm. Exposta pela primeira vez numa Exposição Extra-escolar, 1958, Lisboa. 5
José Aurélio expõe, pela primeira vez, numa Exposição Extra-Escolar da ESBAP, com uma particpação que anuncia já as variadas direcções que o seu trabalho irá seguir: uma cerâmica intervencionada, uma capa de caderno com desenhos a marcador, uma ânfora em bronze sustentada por três pernas antropomórficas. Nesse mesmo ano, a recém-fundada Fundação Calouste Gulbenkian, organiza a sua primeira grande exposição na Sociedade Nacional de Belas Artes. Com este ponto de situação prospectivo é premiado, na escultura, o consagrado Barata Feyo, os já citados António Duarte e Joaquim Correia, mas também Jorge Vieira que expõe peças de cariz surrealizante e a maqueta, radicalmente abstracta, para o monumento ao Prisioneiro Político Desconhecido. Ecos dessas formas encontram-se em peças contemporâneas do jovem José Aurélio, nomeadamente a já citada ânfora, numa Construção em ferro e numa Cabeça de Peixeira em terracota, ambas de 58, todas presentemente desaparecidas. No ano seguinte, José Aurélio apresenta, em Exposição Extra-escolar, Espírito e matéria, que assinala um momento de independência relativamente às referências nacionais e internacionais a que se reporta essa fase inicial de formação e carreira. O tema, que irá retomar em 85, em peça de maior ambição, em ferro e pedra, indicia a busca que irá nortear a produção de uma vida, complementando uma acentuada sensibilidade pelos valores culturais intangíveis com um conhecimento profundo dos meios mais adequados à sua materialização. Nascido em Alcobaça, José Aurélio cresce familiarizando-se com a escultura erudita e popular, entre o Mosteiro e o trabalho artesanal local. À dimensão académica e aos contactos com artistas independentes acrescenta, a partir de 58, a experiência de produção industrial aceitando o convite para dirigir o Estúdio da Secla, nas Caldas da Rainha. Tipicamente, José Aurélio transforma a conveniência de um emprego em oportunidade de conhecimento e experimentação. A primeira produção cerâmcia é de 1957, em Alcobaça, seguida de exposição na Galeria Diário de Notícias, no ano seguinte. Tomás de Melo interessa-se pelo que vê e põe-no em contacto com a Secla, empresa de produção cerâmica, que convida José Aurélio a dirigir o sector artístico da fábrica. O convite que, nessa qualidade, o escultor faz, por sua vez, a António Quadros, é sintomático da direcção que lhe interessa seguir: não perdendo de vista a vertente pragmática que caracteriza a actividade de uma indústria, trabalhar na fronteira entre o erudito e o popular, na livre exploração da fantasia e do humor.
Estas duas referências artísticas nacionais de José Aurélio, em início de actividade, Jorge Vieira e António Quadros, elucidam as prioridades que o jovem escultor define para si próprio e para o seu trabalho: uma postura de independência, de trabalho directo com os materiais, de destemor pelo risco de explorar caminhos não validados por sistemas aceites. 58 é também o ano de uma primeira experiência internacional. Tendo colaborado com Jorge Vieira na produção das peças que este apresenta na Feira Internacional de Bruxelas, José Aurélio viaja pela Bélgica, Holanda e França confirmando afinidades com a escultura de Picasso, González, Calder e Moore. Em 59, apresenta-se no palco internacional da I Bienal de Paris com O grito, prémio Mestre Manuel Pereira, de manifesta inspiração picassiana. Em 1960 recebe a primeira encomenda, destinada a um hotel. Em Dança escultura executada directamente em gesso, um par, enlaçado, representado em tamanho natural, dança animadamente. A obra, de paradeiro desconhecido, constituirá, na sua atipica figuração, um raro caso de caminho ensaiado em fase inicial de carreira e não retomado pelo escultor ao longo da vida. Nesse mesmo ano, José Aurélio abandona os estudos. A decisão prende-se com uma importante encomenda para o exterior de um edifício em Lisboa, uma grande incisão em pedra que executa no ano seguinte. Com o finalizar do percurso académico encerra-se o primeiro ciclo de uma obra que, como foi referido, apresentava, nas suas múltiplas vertentes, as principais referências bem como os caminhos independentes que começava a abrir. Sintomaticamente, a peça que envia, no ano seguinte, à II Exposição de Artes Plásticas da Fundação Gulbenkian, Besta 666, é obra muito sua na combinação dos materiais, na técnica constructiva que utiliza, na imaginosa ambiguidade da representação, na dinamização que obtém com o movimento da água. Nesse ano de 1961, José Aurélio fixa residência em Óbidos. A decisão, ditada, em primeiro lugar, por razões práticas de proximidade com a fábrica Secla, teria consequências determinantes na construção de um projecto de vida e de um percurso artístico independente. A improvável escolha de Óbidos para estabelecer não só residência e atelier mas também uma galeria, a Ogiva, revelou-se uma aposta de resultados únicos no panorama artístico nacional envolvendo os mais interessantes e promissores jovens artistas num identificável “espírito Ogiva” que perduraria muito para além dos curtos três anos de viabilidade do projecto.
Muito espaço e muita gente6 O destino social de muita da escultura de José Aurélio, tem que ver com o seu entendimento do lugar e do papel do artista na sociedade enquanto agente catalizador de acção política no sentido mais lato. Esse entendimento, reflete-se na aptência para a criação artística de vocação colectiva seja na intervenção, com peças monumentais, no espaço público, seja na produção de pequenos múltiplos, na generalidade medalhas, destinados à fruição privada por um grande número de destinatários. Trata-se, em qualquer dos casos de escultura de função comemorativa (celebratória ou evocativa) que exige, por um lado, a adequação de uma visão pessoal a uma ideia exterior e, por outro, o encontrar da melhor solução formal e técnica para cada situação tendo em consideração as distintas condições de produção e de recepção de uma e de outra tipologia. A vocação monumental de grande parte da escultura de José Aurélio anuncia, desde os primeiros trabalhos, o significativo número de projectos de obras para espaços públicos que irá concretizar. A concepção e produção de uma escultura monumental são, por regra, para José Aurélio, um processo colectivo. A fase de pesquisa do evento ou personalidade a comemorar, o estudo da história e identidade do lugar de implantação, são fases de diálogo em que o escultor se abre à participação exterior e a deixa contribuir no processo criativo. No momento de execução, a colaboração com outros profissionais, nomeadamente arquitectos e técnicos ou, em casos mais raros, a contribuição do trabalho de uma comunidade, são uma mais valia apreciada pelo escultor. É em 1966 que se oferece a José Aurélio a primeira oportunidade de intervenção num espaço público7. A encomenda, da Câmara Municipal de Óbidos, veicula a solicitação do governo central de um monumento aos heróis de Angola. O escultor resolve o problema ideológico e político com uma proposta de monumento a todos “aqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando” e imagina uma forma ambígua, de mão aberta simultaneamente lida como uma pomba, em betão rebocado e pintado de branco, implantada directamente no solo. A escala e a cor ajustam-se 6
Segundo José Aurélio: “A escultura precisa de muito espaço e muita gente”, José Aurélio Escultura, Óbidos: Galeria Ogiva, 1973.
Em 1964, havia participado no concurso para a amarração da ponte 25 de Abril, em equipa com o arquitecto António Aurélio e o pintor Querubim Lapa. O primeiro prémio seria atribuído ao projecto do arquitecto Conceição Silva com escultura de Jorge Vieira. 7
à dimensão e ao casario da vila, a forma abre-se a uma simbologia de paz evitando a retórica glorificadora da ideologia vigente. A solução técnica será, admitidamente, a sua primeira experiência com alguma importância: “uma estrutura em betão com aplicação de reboco que lhe deu a forma final”8 inteiramente produzida no local. O 25 de Abril, e o intenso envolvimento cívico que se lhe seguiu, multiplicaria as oportunidades de participação em projectos de carácter público. Em 10 de Junho de 74, José Aurélio colabora na organização, pelo Movimento Democrático de Artistas Plásticos que ele próprio integra, da acção pública de execução, por dezenas de artistas, de um grande painel mural na Galeria de Arte Moderna de Belém. A sua contribuição artística será uma escultura efémera de grande formato, Portugal Novo, uma embalagem em madeira, com 4,5 m de altura, em forma de mapa de Portugal carimbado com destinatário: “Para todos”, remetente: “Movimento das Forças Armadas”, conteúdo: “Um Portugal Novo” e o aviso: “Muito Frágil”. O mesmo envolvimento cívico e político ditariam a participação no concurso para um Monumento a Humberto Delgado. José Aurélio vence o concurso de iniciativa local, organizado pela Sociedade Nacional de Belas Artes. e executa, em 1976, em Cela Velha, Alcobaça, o primeiro “monumento em liberdade à liberdade”. “Experiência difícil de repetir”, a obra, executada com baixo orçamento apesar do apoio da Câmara Municipal e de emigrantes oriundos da região, mobilizou a população que contribuiu com materiais e trabalho. Produzido no lugar, com soluções técnicas inventivas dado os escassos meios financeiros disponíveis, utiliza o betão na construção dos elementos verticais dispostos em anel quebrado por uma vertical que irrompe do centro. A mensagem, formalmente simples, torna-se ainda mais explícita pelas inscrições, à maneira de grafittis (castração, humilhação, repressão, mordaça), alusivas ao passado recente. 10 anos mais tarde, em 1984, um monumento na Vidigueira celebra o aniversário da revolução com os testemunhos físicos da actividade produtiva local. José Aurélio utiliza mós de lagar de azeite, em granito, numa construção alegórica que sugere o movimento rotativo e transforma o elemento líquido em água escorrendo em lágrimas.
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“ Uma conversa na Quinta da Preta”. José Aurélio Gestos e Sinais. Lisboa: Fundação Mário Soares: Magno, 2001.
Em 1977, José Aurélio aceita o convite para colocar uma peça de exterior em frente ao edifício da Embaixada de Portugal em Brasília9. Conjuntamente com o arquitecto, foi seleccionada a Cruz de Cristo, forma que o escultor vinha trabalhando e apresentara em 73, na Ogiva, em bronze de pequenas dimensões. Inicialmente, tratara-se de transformar a forma plana da Cruz de Cristo para um objecto com presença do espaço. José Aurélio encontra uma equivalente dimensão volumétrica que se iria revelar uma das formas mais conseguidas do seu repertório escultórico. A Cruz de Cristo de José Aurélio é, fundamentalmente, um volume virtualmente inscrito num cubo, constituído por seis elementos iguais, correspondentes às seis faces do cubo, cujas bases se ligam entre si. A escala monumental, necessária nessa situação particular, exigiu alguma simplificação adicional dos elementos formais iniciais mas o essencial manteve-se verificando-se que funciona na perfeição em qualquer escala como se veria, alguns anos mais tarde, quando transformada em jóia. Em Brasília, a peça repousa sobre um vértice imaginário do cubo em inesperado dinamismo, reforçado pelo vermelho intenso que a recobre destacando-se contra o ritmo regular da longa fachada em betão do edifício. Em 1988, e até 90, José Aurélio abraça a “maior aventura da minha vida”, as gárgulas para o novo edifício da Torre do Tombo. O escultor havia participado, por várias vezes, com intervenções escultórica, em projectos de arquitectura, desde a referida grande incisão em pedra em 61, a baixos-relevos em materiais vários. Mas, admitidamente, a que mais o “pôs à prova como escultor, como fazedor de coisas”10 foram essas “exclamações no silêncio” como lhes chamaria Vasco Graça Moura. Para as oito gárgulas, previstas no projecto de arquitectura, José Aurélio definiria um conteúdo simbólico, um rosto e um nome, agrupando-as tematicamente em quatro “Fautores da História” e quatro “Guardas da Escrita” A execução envolveu a extracção de blocos de pedra calcária da Serra de Alvados retirados da pedreira expressamente para o projecto e a talha directa de cubos de 2m de lado. A “aventura” não se ficou pelo trabalho de investigação aturado na definição conceptual do projecto, nem pela inventividade formal mas passou também pela descoberta de soluções engenhosas para, movimentar os blocos de 20 toneladas, virá-los e trabalhá-los nas seis faces.
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Arquitecto do edifício, Chorão Ramalho.
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“ Uma conversa na Quinta da Preta”. José Aurélio Gestos e Sinais. Lisboa: Fundação Mário Soares: Magno, 2001.
Em 1999, José Aurélio executa a Grande Escultura do Parque da Paz, em Almada. O projecto revela-se novo desafio no âmbito da escultura pública. Ocupando uma praça com 48 x 26 metros no interior do parque e aí funcionando como “centro geométrico de um acontecimento urbanístico”11 equilíbra as funções simbólica e estética; não sendo um monumento comemorativo, recusa uma leitura tendencialmente unívoca; não se associando a um projecto de edifício, dispensa os constrangimentos formais e técnicos que este, inevitavelmente impõe. O que se joga num projecto como este, é o reforço da capacidade comunicativa do próprio parque intensificando a sua mensagem “de carácter iminentemente poético”12. A complexidade do problema leva José Aurélio a apresentar três propostas alternativas. A solução escolhida “desdobra, deserenrola e recorta, a partir de um eixo central, uma estrutura espiraliforma que parte de um centro vertical para uma periferia, brincando com o espaço”, deste modo adequando-se ao sentido do próprio parque “como novelo de caminhos que não levam a parte alguma e que tem o seu centro onde quer que se encintre aquele que o está usufruindo”13. Com função idêntica à do monumento, a medalha exige a “capacidade de reduzir uma ideia de elaboração complexa à sua expressão mais simples”14 . A intimidade do trabalho criativo e de produção do modelo ou do prototipo contrasta com a extensão de público que acede à obra por via da sua natureza múltipla. As condicionantes impostas pelo muito pequeno formato e por essa condição de múltiplo comemorativo, sejam de natureza técnica, material ou simbólica constituem um desafio para José Aurélio que tem, na sua vasta produção medalhística algumas peças emblemáticas da sua obra escultórica. A extensa produção medalhística de José Aurélio inicia-se em 66 com uma medalha para a Air France destinada a comemorar os 20 anos da ligação aérea Paris-Lisboa. A medalha, fundida em bronze, é executada a partir de uma matriz gravada no gesso que resulta num pequeno baixo-relevo circular editado em 20 exemplares.
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AZEVEDO, Fernando de – “A Paz e a Árvore da Vida”. Monumento à Paz. Almada: Câmara Municipal de Almada, 2001.
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PARDAL, Sidónio – Parque da Cidade de Almada. Almada: Câmara Municipal de Almada, 1997.
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PORFIRIO, José Luís – Parque da Cidade de Almada. Almada: Câmara Municipal de Almada, 1997.
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COOK, John - The Medal, Set., 1984 [publicado no catálogo José Aurélio Medalhas. Alcobaça: Museu de Alcobaça, 1987].
Mas seria com a sua participação no concurso para a medalha duplamente comemorativa do centenário de Calouste Gulbenkian e da inauguração do Museu Gulbenkian, em 69, que José Aurélio se iria afirmar na cena medalhística internacional. Vencendo um concurso com mais de duzentas participações submtido a um juri internacional, José Aurélio vê reconhecido um trabalho que aborda a medalha como objecto escultórico ao intervir na linguagem tradicionalmente facilitadora da produção em série: a perfeita circularidade interrompida, a superfície irregularmente texturada, o grafismo aplicado manualmente resultam num objecto que se experencia como único não obstante integrar uma edição de 2000 exemplares (fig. 10). No ano seguinte, José Aurélio transforma o múltiplo que é a medalha em elemento de uma nova peça original, Homenagem a uma medalha premiada, uma construção vertical modular, conceptualmente próxima da brancusiana coluna sem fim que José Aurélio revisita, mais tarde, em obras de outra escala. Idêntica sensibilidade objectual aparece na medalha para a Feira Mundial de Osaka, em 70. José Aurélio faz convergir a tradição ocidental da medalha, enquanto pequeno objecto de natureza comemorativa com a tradição nipónica do netsuke, objecto de uso pessoal esculpido em intricados motivos decorativos “linda de ver – linda de tocar”15. Entre 1970 e 73, JoséAurélio produz seis medalhas em bronze dedicadas à Galeria Ogiva, em Óbidos16. Com excepção da medalha cunhada em 200 exemplares, todas são fundidas com edições não superiores a 100 exemplares. Trata-se de objectos escultóricos, produzidos com a minúcia e a subtileza da jóia, oferecem superfícies ricas em texturas, relevos, saliências e reentrâncias, volumes, aberturas e movimento, objectos ricos em estímulos ao tacto, convidando à manipulação mais do que à simples observação visual (fig. 13). O carácter de objecto precioso desse tipo de medalha é invertido na medalha evocativa do Movimento Democrático de Artistas Plásticos, de 74. José Aurélio transporta para a medalha o carácter humorístico e experimental de muita da sua produção escutórica, produzindo, semi-manualmente, dezenas exemplares em plástico e papel nas cores da bandeira nacional, de um objecto que, no ver-
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COOK, John - The Medal, Set., 1984 [publicado no catálogo José Aurélio Medalhas. Alcobaça: Museu de Alcobaça, 1987].
1970: medalha referente à galeria Ogiva e medalha assinalando a sua inauguração; 1971: dedicada a Josefa de Óbidos e, simultaneamente comemorativa do 1º ano de actividade da Ogiva; 1972: Ogiva 2 anos; 1973: Ogiva 3 anos I e Ogiva 3 anos II. 16
so, se confunde com um pin exibindo um slogan político, enquanto que no reverso se transforma em jogo popular. O mesmo carácter de jogo, convidando à interactividade, se verifica na medalha/objecto comemorativa do 8º centenário da Abadia de Alcobaça, de 1978. Dois círculos, que apresentando cada um uma das faces da medalha, interceptam-se perpendicularmente aos respectivos diâmetros que se articulam por meio de dobradiças permitindo que cada uma das faces se abra ou feche segundo a acção de quem manipula o objecto. A visão escultórica de José Aurélio, o sentido rigoroso de escala, permite-lhe a materialização de um mesmo conceito celebratório ou evocativo, alternativamente no muito grande e no muito pequeno formato. A convicção de José Aurélio de que a escultura “precisa de muito espaço e muita gente”17 ganha assim um sentido mais amplo em duplas produções como a homenagem ao General Humberto Delgado com o monumento público inspirando a medalha tridimenssional ou a Memória da chegada dos portugueses ao Japão, de 92, em que a escultura nasce a partir dos modelos da medalha.
Coisas íntimas18 É na tranquilidade do seu atelier que José Aurélio vai ensaiando e materializando as suas ideias, sonhos e sentimentos. Ao cabo de várias décadas, os frutos dessa inquietação permanente povoam densamente o espaço de trabalho que é afinal coincidente com o da vida privada e familiar. Por vezes, emergem em exposições, em espaços públicos ou em vitrinas de ourivesarias. Mas nem sempre ganham outro estatuto, escala ou registo e vão apenas apontando caminhos possíveis, como anotações que se guardam para futuras meditações. Um entendimento da escultura enquanto objecto permanece na obra de José Aurélio, seja com um sentido quase de desafio ao estatuto maior da escultura, seja como um veículo de experimentação formal e conceptual. Adivinha-se já na série de pequenas esculturas em terracota, de 57, a maior
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José Aurélio Escultura. Óbidos: Galeria Ogiva, 1973.
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Título de exposição no Círculo de Artes Pásticas de Coimbra (CAPC), 1983.
parte hoje desaparecidas, que miniaturizam figuras humanas modeladas em liberdade formal, reminiscentes do humor e sensualidade de outros bonecos de barro encontrados tanto nas versões populares das feiras como em mais sofisticadas peças de Jorge Vieira. Ou num pequeno sapo, do ano seguinte, combinando a terracota com o ferro, associação improvável de materiais opostos nos respectivos graus de durabilidade, maleabilidade e temperatura. Esse percurso da escultura até ao objecto fá-lo pouco depois José Aurélio, em sentido inverso, no Estúdio da Secla, investindo o objecto cerâmico do estatuto escultórico de peça autónoma, despido de funcionalidade prática. A libertação da segurança que a figura oferece faz-se com a invenção de novos objectos como Espelho, de 64, inteiramente em ferro e incorporando a realidade utilitária de dois garfos. A contaminação de uma vocação puramente estética, simbólica ou comemorativa da escultura pela vida quotidiana nunca corresponde, no trabalho de José Aurélio, a uma trivialização ou rebaixamento de estatuto. Antes, trata-se de investir a peça escultórica de elementos poéticos ou de humor, que lhe acrecentam complexidade e cativam afectivamente o espectador pelo manifesto envolvimento pessoal do seu autor. É que, para José Aurélio, a escultura, uma das mais públicas disciplinas das Belas Artes, é também uma coisa íntima. Tome-se, como exemplo, a peça Maria de 68. O ponto de partida é um manequim de loja de que José Aurélio se apropria e utiliza como modelo no processo de fundição em bronze. Na caixa de areia que utiliza para a passagem dessa forma a bronze, inscreve os sulcos que irão resultar nas excrescências ondulantes laterais e a decoração e inscrição no corpo da peça. Após a fundição, retém os vestígios dos canais pelos quais se verte o bronze no momento da fundição, incorporando na peça essa memória do processo. No lugar da cabeça inexistente coloca uma irreverente bola de bilhar vermelha negando à obra final a sisudez do bronze. Finalmente reduz o pedestal a uma haste em ferro e latão que permanentemente acompanhará a peça fixando-lhe o estatuto de objecto autónomo. O mesmo acontece com diferentes tipologias, nomeadamente a jóia. Por estatuto, eminentemente público na dose de ostentação que normalmente implica, a jóia é, simultaneamente algo que se usa junto ao corpo, remetendo para essa proximidade mesmo quando guardada em estojo ou exposta em vitrina. A esse duplo estatuto, público e privado, José Aurélio acrescenta a dimensão do afecto e da sensualidade, privilegiando assim a vertente íntima da jóia. A ambiguidade reforça-se no material utilizado na produção da joia: o ouro, a prata, o marfim ou o coral mas também sementes, ossos,
vidros, fio, materiais pobres que recordam que o verdadeiro valor da peça se joga no investimento afectivo que materializa. Em 1982, a propósito da XVII Exposição de Arte, Ciência e Cultura, José Aurélio concebe uma série de peças de ourivesaria subordinadas ao tema dos descobrimentos. Os pendentes reproduzem as formas planas do astrolábio, do quadrante, ou da rosa-dos-ventos ou o volume da esfera armilar e da balestilha. De entre a série, destaca-se a Cruz de Cristo, já referida a propósito da sua utilização monumental. O processo construtivo claramente modular, as formas geometricas regulares, o ritmo conseguido pela repetição dos vários elementos resultam, como se disse, numa forma escultórica que funciona em qualquer escala e, quando produzida no material adequado, tanto pode adquirir conotações lúdicas, como celebratórias, ser uma jóia, um brinquedo ou uma escultura pública. A aptência de José Aurélio para trabalhar a escala, pensar intermutavelmente o grande e o pequeno encontrando os materiais ajustados para cada caso regista-se em exposições como Ouro, Prata, Marfim e outras Especiarias, na Culturgest, em 1995 e Agua e outras Jóias, nas Caldas da Rainha em 2003. Em ambas se expunham esculturas e jóias sendo que as segundas se distinguiam pela função acrescentada a uma visão indiscutivelmente escultórica ao nível do enunciado conceptual e da materialização formal. José Aurélio joga com o conceito de jóia em instalações de grande escala, produzidas expressamente para as exposições. Pulseira do mar, por exemplo, é apresentada em instalação de alguns metros de diâmetro nem por isso deixando de conter esse elemento de intimidade que a jóia transporta já não pela escala ou o uso mas antes pela familiaridade dos elementos materiais que a constituem, que podem ser náuticos como na Pulseira do Mar (roldanas, âncora, bóias, cordas, bandeiras, hélices, cadernais). Mas essa intimidade que caracteriza tanta da obra escultórica de José Aurélio, verifica-se num sem número de objectos, esculturas de médio ou grande formato que regista não propriamente uma produção paralela mas talvez antes um enfatizar de uma atenção prestada à realidade envolvente descobrindo, em quase tudo, matéria escultórica. Em 1983, José Aurélio expõe, no Círculo de Artes Plásticas de Coimbra, Coisas Íntimas. Aí se podiam ver “trabalhos nunca mostrados em pública exposição, que foram acompanhando o escultor nos seus ‘ateliers’; objectos encontrados que se impõem pela sua força de aparição ou se acumulam
em conjuntos (ossos), e vão ganhando composição e sentido, suportes de uma meditação difusa; jóias, outra intimidade, essa, para ver, mexer, usar, na sua óbvia relação com o corpo e com o amor também”19. Um grupo de peças funciona como aproximações a uma auto-representação de intensão mais ou menos explícita nos títulos Máscara, Retrato e Auto-retrato. A Máscara (ou Cisne Negro) que não esconde, antes revela a personalidade lúdica, descontraída e imaginativa do seu autor, é de aço, os olhos, duas esferas, também em aço, pintadas de branco, lembra uma grande ave mas, de facto, não se trata de nenhum animal específico. Em Auto-Retrato o escultor tranformou-se em espécime caprino materializado em madeira, chifre, vidro e ferro. Trata-se, por um lado de afirmar que o escultor gosta dos seus materiais, dos desafios que lhe coloca a sua manipulação, das formas que lhe sugerem, das improváveis combinações que possibilitam. Mas não será de negligenciar alguma aproximação às “feições gargulares” do escultor, sinal de que José Aurélio, “está no que faz”20. Outra série evoca memórias, antropomorfizações resultantes de combinações improváveis de materias ou em utilizações imaginativas de materiais tradicionais: ferro e osso em Memória do ditador, ferro em Memória de mulher e Memória de Ângelo Correia, ferro e granito em Memória da Lavandeira, testemunhos de aversões, afectos ou amizades pessoais, lugares vividos e por isso também coisas íntimas. Memórias de experiências mais remotas, preservadas em detritos encontrados, materiais orgânicos, objectos descartados, em Memória da praia, madeira e cortiça (3-72); Memória da beiramar (24-73); Cabeça de sereia, esferovite, percebes, alumínio e vidro (2-82) Em diferente registo intimista, José Aurélio transpõe para a escultura paisagens e naturezas mortas, categorias tradicionalmente reservadas à pintura. Mais uma vez, é o carácter eminentemente objectual da escultura que se impõe não já pela incorporação ou reutilização dos objectos reais, mas pela sua representação em materiais e técnicas escultórico por excelência. Fruto venenoso conjuga duas técnicas de fundição em bronze (o miolo, utilizando um molde, o revestimento, através da modelação directa da areia) numa peça estranhamente grande par o fruto que representa na sua pequenez PORFÍRIO, José Luís - “As coisas…A vida…”.Círculo de Artes Plásticas de Coimbra:54 Exposições: 1981-1983. Coimbra: Galeria CAPC, 1983. 19
20
“ Uma conversa na Quinta da Preta”. José Aurélio Gestos e Sinais. Lisboa: Fundação Mário Soares: Magno, 2001.
enquanto objecto escultórico. Passeio pela linha do horizonte, materializa, utilizando material e técnicas idênticas, uma pequena paisagem no limiar de uma escala impossível. O Jarro e a Garrafa, leva mais longe esse jogo de ambiguidades entre os objectos reais, as tradições de representação pictórica e escultórica e os géneros artísticos em que se inscrevem: os objectos estão presentes não apenas pela forma mas também pela escala naturalista; a natureza morta enriquecida com contrastes de texturas e cores, apresenta-se-nos tendencialmente em dois planos literalmente justapostos; o volume, real, nos seus 8 cm de espessura, não corresponde ao vulto dos objectos representados mas antes aproxima-se do baixo-relevo, a técnica mais pictórica da escultura.
Habitantes do Céu A criação de objectos cinéticos tem ocupado José Aurélio ao longo dos anos. Naturalmente, interessa-lhe o resultado mas o processo de resolução dos problemas técnicos, o encontrar a solução simultaneamente mais simples e resistente, constituem, para José Aurélio motivação permanente. O movimento está presente em todas as tipologias: jóias que, não por acaso, são preferencialmente pendentes, incorporam frequentemente elementos cinéticos seja a cauda de uma sereia, ou um fiode-prumo; medalhas com dobradiças, abrem-se e fecham-se para revelar a sua mensagem; esculturas sobre sólidos plintos, contrariam com delicadas articulações o peso do bronze ou do ferro de que são feitas; pequenos desenhos móveis no espaço em arames, fios, contas ou largos e precários gestos em madeira e pano desafiam a brisa; esculturas monumentais, rigorosamente planeadas resisitem ao vento parecendo leves e frágeis. O Anjo, enquanto metáfora do movimento, aparece pela primeira vez na obra de José Aurélio numa aldraba, em bronze, para a casa de um amigo e, no ano seguinte, num pequeno amuleto em prata que o escultor transportou consigo durante largos anos. Em 59, o anjo surge em peças produzidas no Estúdio Secla, em posição de voo, uma haste de metal prendendo-o a uma base em pedra. Outras entidades voadoras, mais ou menos fantásticas povoam o universo da produção de José Aurélio na Secla, permanecendo, contudo, bem agarradas à terra de que são feitas. Voltam os anjos em 61, para um baixo-relevo em bronze encomendado para as instalações de uma companhia internacional de transportes aéreos, como Habitantes do Céu e, em 97, aparece um Bicharoco em aço, na fachada
de um edifício de Lisboa. O movimento real aparece, em 66, com a Passarola uma versão muito pessoal da máquina voadora setecentista, “filigrana” em madeira, cobre, vidro e latão. O movimento pendular que dá vida à peça é obtido pelo método de instalação, pendurada do tecto, em interior ou, episodicamente, de um ramo de árvore, cumprindo-se assim o seu destino com a ajuda do vento. Mas o movimento incorporado no método de construção da própria peça começa a partir de 67, com Fonte e Composição Móvel onde se combinam materiais (bronze, latão e marfim) e técnicas de fundição e de construção simples para obter movimentos pendulares. Em anos seguintes outras peças como Interpenetrações móveis, de 69, e novas Composições móveis diversificam as formas onsistindo na incorporação do movimento real accionado apenas pelo toque. Em todas estas esculturas o movimento acontece num ou outro elemento de peças que se destinam a ser colocadas, em completa estabilidade, numa base. Em Árvore móvel, de 72, José Aurélio explora esse contraponto entre o estável e o móvel, opondo os dois principais elementos constituintes da escultura: a horizontalidade, estabilidade, opacidade e peso do material da “mesa” que constitui a parte inferior da peça, e a verticalidade, mobilidade e leveza da árvore. Multiplomóvel, em aço inox, transfere para a série (250 exemplares) o conceito de escultura em movimento. Neste caso, a escultura é também um brinquedo, transportável, e o movimento resulta exclusivamente da intervenção deliberada do fruidor sobre uma forma de engenhosa concepção, não tendo a escultura qualquer componente móvel. O mesmo princípio seria utilizado na escultura para exterior, em pedra, aço e ferro, D. Quixote, de 83, sendo a controlada acção humana, substituída, pela mais aleatória força do vento que acabaria por destrui-la. Na década de 70, José Aurélio inicia uma numerosa e variada série de peças cinéticas para exterior. As suas referências são os papagaios de papel e os cataventos de ferro, de relativamente pequena dimensão nos telhados, ou de maior envergadura quando acoplados a engenhos de água. Entre esses dois tipos de estruturas, umas fundamentalmente precárias, as outras destinadas a durar, vai José Aurélio imaginando as suas construções cinéticas, investigando soluções construtivas e seleccionando materiais que ofereçam, simultaneamente, leveza e durabilidade necessárias para poder vencer
essa luta que vem travando com o vento que lhe destrói as peças exigindo permanente vigilância e restauro. A primeira Construção móvel destinada a ser instalada no exterior, com carácter de permanência, é de 73, em aço inox. Em 80, Bambusina festiva assume o seu destino precário nos próprios materiais em que é construída (bambu, cordel e pano) Em 93, José Aurélio tem oportunidade de produzir uma série de esculturas em torno do tema da aeronáutica, para a Base Aérea nº1, em Sintra. Não se tratou somente de uma oportunidade temática mas sobretudo de utilizar, como matéria-prima, detritos, peças e materiais aeronáuticos obsoletos. O resultado foi um significativo número de peças de exterior agrupáveis em esculturas de natureza eminentemente lúdica, que utilizam modelos de avião ou bombas de exercício que “nos aparecem como personagens numa narração”, em obras que articulam componentes de várias origens não já em situações narrativas mas em “coincidência com a relação dos objectos com o espaço, o ar, os movimentos relativos”, peças “ao mesmo tempo quietas e inquietas sobre a horizontalidade de um plano, chão ou plinto”21 e brancusianas colunas sem fim em perpétuo impulso ascendente. Na década de 90, José Aurélio intensifica a produção de cataventos. O espaço em torno do atelier povoa-se de estruturas prontas a moverem-se com o vento. As técnicas aperfeiçoam-se com a vontade de as fazer durar ao mesmo tempo que o seu carácter lúdico autoriza e estimula a imaginação nas combinações improváveis de objectos e materiais seleccionados na sua constução que incluem hélices de vários tamanhos e proveniências, rodas e rolamentos de bicicletas, peças desenhadas expressamente utilizando metais de diferentes naturezas e proveniências. Esse parque eólico privativo é, já há alguns anos, um projecto em curso que, por sua vez, tem inspirado outras obras como a instalação, em 2002, de Peixes voadores para Alqueva, um festivo e poético “cardume” voador à entrada do castelo de Reguengos de Monsaraz.
21
PORFIRIO, José Luís – “Na Terra como no Céu”. Phoenixes. Sintra, 1997.
Esse sagrado amor pela matéria22 Admitidamente, o ferro é o material preferido por José Aurélio que o começou a utilizar em 1958, possivelmente encorajado pelo exemplo de Jorge Vieira com quem trabalha na produção de esculturas em ferro para o Pavilhão de Portugal da Feira Internacional de Bruxelas, nesse ano. As referências internacionais são Picasso e González, como se pode verificar em Grito, de 58 ou nos picassianos Pan e uma cabeça de cavalo, igualmente intitulada Grito com que obtém o Prémio Mestre Manuel Pereira, em 59. Em Portugal, as iniciais afinidades temáticas e formais com Jorge Vieira, verificam-se também no uso do ferro em construções abstracatas ou imaginativamente figurativas. Mas José Aurélio cedo parte para explorações mais pessoais das possibilidades do material e, logo em 58, Espírito e matéria, reduz-se a uma acutilante composição abstracta que apresenta numa Exposição Extra-Escolar. Nessa época inicial para José Aurélio, Jorge Vieira está também presente no uso do barro como matéria final e nas formas que lhe dá, desde as primeiras miniaturas antropomórficas, de 57, à Cabeça e Cabeça de Peixeira, do ano seguinte. Diferentes formas e motivos aparecem trabalhados em barro vidrado ou com engobes produzidos no âmbito do trabalho que desenvolve, a partir de 58, no Estúdio da Fábrica Secla: de novo Pan, num medalha, e Anjo, ambos de 59 ou, em 60, um Galo, seguidos de várias outras figuras que imaginativamente vão tomando a forma de objecto de uso, seja jarro ou terrina. Até 1961, o ano da autonomização do escultor que abandona os estudo para se lançar numa carreira profissional, José Aurélio mostrava competência no uso de quase todos os materiais que irá a utilizar, com mais ou menos frequência, ao longo da sua carreira. Utiliza ainda a prata e o bronze, em imaginativos pequenos objectos, mais ou menos utilitários, como um pequeno amuleto ou aldrabas para casa própria ou de amigos. Não tendo tido grande expressão na obra de José Aurélio, a pedra aparece também em Cabeça de Cavalo, de 58. O talhe directo será a técnica sempre utilizada por José Aurélio para trabalhar a pedra, seja em obra de menor dimensão, como Degrau, de 61, Quimera, do ano seguinte, ou Colar de Afrodite, de 89, em monumentos como o Padrão do 8º Centenário
22
CARNEIRO, Alberto – José Aurélio Escultura. Óbidos: Galeria Ogiva, 1973.
da Abadia de Cister, de 78, seja na grande obra para o edifício da Torre do Tombo, as oito Gárgulas, já mencionadas. Em 66, na primeira oportunidade de trabalho em obra pública, inicia-se no uso do betão para Mão, em Óbidos e utiliza o mesmo material no ano seguinte, em duas obras, satisfazendo encomenda privada destinada à Quinta do Paúl. Mas a sua mais importante obra em betão será o Monumento a Humberto Delgado, em 76, já referido. Em 1967, José Aurélio envolve-se numa experiência de trabalho na Fundição Sá Lemos, em Vila Nova de Gaia, que irá ter decisivas repercussões no seu trabalho. Se até aí pouco utilizara o bronze, provavelmente pelas conotações marcadamente académicas que inevitavelmente teria, José Aurélio acerca-se agora do material e das técnicas tradicionais de o trabalhar com a abertura que o caracteriza acabando por desenvolver um método próprio que reequaciona as premissas mais fundamentais de uma tradição milenar. O que está em causa é a utilização do método de criação de moldes em areia, a partir de um modelo prévio, destinados à fundição de peças em bronze. No processo de produção habitual, ao escultor cabe a criação da peça em material provisório (tipicamente, o gesso), e validação da peça (ou peças, no caso de se tratar de um edição de múltiplos) final em bronze. Os momentos intermédios de produção são executados, nas oficinas de fundição, pelos respectivos técnicos que executam o molde em areia e procedem à fundição propriamente dita. José Aurélio apropria-se de um método de mediação para o transformar numa técnica criativa. A areia torna-se a matéria inicial da obra, nunca existindo um objecto prévio, em barro, gesso, ou em qualquer outro material. O escultor cria a forma directamente na areia, abrindo sulcos, escavando as formas, obtendo um negativo sem que, para isso tenha alguma vez existido um positivo. O trabalho directo na areia elimina a possibilidade de produção de réplicas ou múltiplos e o resultado é, necessariamente, uma peça irrepetível. A descoberta, e a exploração das suas possibilidades, resulta numa produção intensa de novas peças introduzindo-lhes movimento, combinando outros materias. Mas a característica mais saliente desta produção talvez seja o papel que o desenho passa a ter na obra escultórica de José Aurélio. O novo
método, pode ser descrito como de desenho em areia resultando em peças em que a linha, sinuosa ou geométrica, adquire um protagonismo raro em escultura. Não se trata de inscrições na superfície, nem tão pouco de baixos-relevos, mas de um delinear de planos tridimensionais. Essa linearidade, que dá forma a superfícies eminentemente planas, é complementada, por vezes, com áreas de marcado volume, ou de vazio, que criam novos ritmos enquanto reafirmam a tridimensionalidade da peça. A explosão criativa resultante da descoberta da técnica é apresentada em exposição individual de José Aurélio na Ogiva, em 1973. Algumas peças integram já outros materiais, combinam técnicas, ensaiam tipologias. O método traduz-se numa nova liberdade porque diminui a dependência de um processo que, tradicionalmente, escapa aos escultores. Simultaneamente, minimiza interrupções no processo criativo permitindo uma continuidade na construção da peça propícia à inclusão do acidente ou da solução encontrada no momento, que explicam a sugestão de espontaneidade e a frescura de muitas das peças. Nessa mesma exposição, o ferro reaparece numa série de 5 Variações sobre um Tema. Mas é nos anos 80 que o ferro, “fundido, construído ou simplesmente dobrado”23, ressurge em força na obra de José Aurélio. O escultor apresenta outro à vontade na sua utilização, aplicando-o sobretudo em projectos para eventuais obras de grande formato, algumas concretizadas. Em 1986, mostra uma série de Siglas em exposição colectiva no Mosteiro de Alcobaça homenageando assim os canteiros que trabalharam na construção do Mosteiro e nas paredes deixaram testemunho da sua presença. José Aurélio transcreve essas assinaturas incisas na pedra para volumes, obtidos pela modelação do ferro, resultando em desenhos no espaço de escala monumental, por vezes concretizada em peças de grandes dimensões. Em 87, o processo torna-se mesmo o enfoque da obra em série intitulada, justamente, Dobragens, atitude que o escultor retoma em 93, com nova série culminando numa monumental Dobragem Biombo. A utilização de materiais encontrados e de fragmentos de objectos descontextualizados, caracteriza
23
12 Sinais no Tempo. Montemor-o-Novo: Galeria Municipal , 1997.
também uma parte assinalável da produção de José Aurélio. São peças que começam a aparecer nos anos 70, década particularmente propícia a alimentar a sua veia experimentalista. Pequenos objectos reminiscentes de uma atitude vizinha do surrealismo, como “memórias” de passeios à beira-mar ou retratos e mácaras, já referidos, combinam plástico madeira e cortiça penas, conchas e lâmpadas. Nos anos 80, a utilização de fragmentos e peças avulsas assume outra responsabilidade em obra mais pública como a Máquina do Mundo, homenagem a Camões que, sobre um tambor de moinho de torrar café, acumula molas, foices, cruzes, cravos, uma trempe de lareira, segmentos de grades de janela, correntes, rodas dentadas. Em 94, José Aurélio reafirma a sua Natureza metálica, em escultura e exposição com o mesmo nome. A sua produção mais recente confirma essa fascinação pelas “matérias do fogo” que Alberto Carneiro já identificara no amigo referindo, logo a propósito da primeira exposição individual na Ogiva, em 73, “esse diálogo constante que ele mantém com os seus materiais, desde a lava incandescente do bronze vertido nos moldes de areia até ao pequenino parafuso”24. O método de trabalho continua a envolver exercícios de paciência e reflexão até à descoberta da forma adequada como pôde testemunhar Fernando de Azevedo relativamente ao projecto para a Grande Árvore da Paz, em aço corten, para Almada, iniciado em 97: “um pedaço de papel, um rectângulo inteiro e umas dobragens e recortes. Mais: uns recortes como um jogo desinteressado que, pouco a pouco surpreende e se torna como um comando do destino, uma figura. Um palmo de papel inteiramente recortado, dobrado e desdobrado nos cortes, aparece enfim, na forma transposta de uma árvore: tronco, ramos e raízes, por assim dizer”25. Nos últimos anos, José Aurélio regressou à oficina de fundição, encontrando novas potencialidades numa técnica que explorara nos anos da juventude. Regressa também à Ogiva, mais de trinta anos depois da sua primeira exposição, expondo a obra recente em diálogo com a de então, ambas nascidas entre o fogo e a areia.
24
CARNEIRO, Alberto – José Aurélio Escultura. Óbidos: Galeria Ogiva, 1973.
25
AZEVEDO, Fernando de – “A Paz e a Árvore da Vida”. Monumento à Paz. Almada: Câmara Municipal de Almada, 2001.
A Fruteira da memória
Começavam os anos 70. Em Outubro foi inaugurada,
aconteciam “coisas”, onde chapas se uniam a outras
em Óbidos, uma diferente galeria de arte – a Ogiva. À
e, dessa união, nasciam as esculturas.
altura, não tinha mais de 10 anos. Contudo, se revisito a memória, consigo-a clara, nítida, grata. Grata exactamente na medida em que descobri outras coisas, vi pessoas diferentes, porque sem saber bem o quê nem porquê, tive a noção de que tudo o que ali acontecia e a que eu assistia, acrescentava algo a todos os que lá estavam. Hoje sei que partilhavam a pertinência de um desafio, a fraternidade de encontros que só ali poderiam ocorrer. Ali, onde a centralidade geográfica que o acaso ditou permitia organizar colectivos de artistas plásticos que não mais viriam a ter lugar.
Anos depois, entre muitas outras peças, mais precisamente em 1985, surgiu a Fruteira. Fundida com técnica de areia, esta obra em bronze, assente num pilar de pedra toscamente modelado, devolveu-me alguma coisa deste início da década de 70. Talvez uma incursão tangencial às naturezas mortas de Josefa, também de Óbidos. Talvez uma reminiscência de um tempo de tantas generosidades, em que a mesa se punha para a partilha de tantos. Talvez o valor simbólico da fruta fresca, assim colocada em jeito de oferenda. Talvez a proximidade da terra. Ou talvez
Pequena entre adultos, entre outros filhos também,
apenas o reencontro dos gestos familiares do escultor
lembro-me de percorrer aquele espaço amplo, com
modelando e polindo o bronze, conformando-o ao
escadas e patamares que criavam diferentes plata-
seu pensamento. Ou, talvez ainda, o prazer de redes-
formas gerando diversos pontos de vista. E é neste
cobrir uma genealogia plástica que comigo se cruza.
caminho de pré-adolescência que encontro, como
Por tudo isto, torna-se necessário registar aqui o meu
uma marca impressiva, o escultor José Aurélio, já
obrigada a José Aurélio por me ter desafiado para
amigo da família, e descubro uma escultura outra,
esta escrita que, sem o meu querer deliberado, me
que podia ser tocada, balançada, colorida. Lembro-
escapou para uma confissão de memórias.
me do atelier do escultor, pejado de objectos de aparente inutilidade, com estranhos instrumentos de trabalho e onde, por vezes de um dia para o outro,
Ana Isabel Ribeiro
Sabes Rosa...
Sabes Rosa, me han pedido que hable de ti. Tengo un
solitaria e concentrada en tus propios pensamien-
amigo artista que te va a llevar a una exposición. Mal
tos, se me caen lágrimas como puños, pensando
sabía él cuando hizo su escultura, que por detrás de
en la hermana que me dejó sin aliento, el día que se
aquella niña-mujer, estabas tú, orientando su mano.
marchó para siempre.
Pero yo lo supe en cuanto te vi en su casa. Sentada
A veces, te veo reflejada en la noche contra el Tajo,
a la puerta, mirando al cielo como siempre hacías,
brillando en la oscuridad y se me hace la luz en el
tenías que ser tú.
corazón y en el cerebro y te veo a mi lado, empujando
Por eso, te llevé conmigo. Não sei se fazes ideia do que significa que os outros encontremos na tua obra pedaços das nossas vidas.
al destino. Con el amor y la energía que solo dos mujeres que aman pueden hacer.
Não sei se outros te terão dito, que uma parte da tua
Que segredos escondes por trás de escopros e
energia criadora vai com as tuas obras, cada vez que
martelos, no bricabraque da tua caverna? Quem te
metes mão na matéria e retiras dela bocados da vida
ensinou a modelar atitudes? A que mulher roubaste,
dos outros. Crias e tiras. Crias e das. É o que fazes.
enquanto dormia, a segura calma de dama-cheia, de
Como o Zé do Telhado. Teimoso fazedor e ladrão de
infanta-matrona que puseste na tua obra? Terás tu
ideais e sonhos.
consciência de que só alguns homens privilegiados
A veces, me siento a tu lado sonriendo, y me pongo a cuchichear contigo. Como cuando éramos niñas, y preparábamos secretos atentados contra primos y vecinos, convencidas de que los asustaríamos con nuestra terrible creatividad. A veces, cuando te veo sentada al borde del agua,
conseguem ler nas nossas entrelinhas e retratar o eterno feminino que há em cada uma de nos? Onde está o outro género em ti? Como consegues mostrar em duro e pesado bronze, o lado poderoso, sensual e doce da Eva que todos nós, homens e mulheres, somos um pouco? Ana Mercedes
Composições
Estas “Composições” são pequenas peças em bron-
Em toda a obra de José Aurélio, desde as peças
ze, sólidos geométricos combinados com versatili-
como estas ou ainda mais pequenas como as me-
dade. Numa predomina a morfologia da pirâmide
dalhas ou as jóias, até às esculturas de grande porte
com o vértice como ponto de apoio, invertendo a
ou monumentos públicos, encontramos sempre esta
sua posição de fixidez ao solo; noutra predominam
afinação pela surpresa, a qual se transforma rapida-
os círculos e duas semi-esferas, uma está assente no
mente numa experiência lúdica.
solo, e a outra lança-se no espaço agarrada a um semi-circulo.
No caso destas duas “Composições” que são peças que resultam de combinações básicas e que utilizam
São composições simples que formulam proposições
recursos pouco elaborados − sobretudo se as com-
acerca do equilíbrio dos sólidos, e se alimentam do
pararmos com outras obras do escultor − é este
rigor da geometria, da resistência dos materiais e da
apelo ao que há de essencial que nos atrai.
estrutura formal que as suporta.
Aliás toda a obra de José Aurélio se estrutura entre
Mas o mais curioso acerca destas peças, se as olhar-
uma linha mais geométrica e outra figurativa. Em
mos com atenção, é a malícia com que são produ-
ambos os casos, estas linhas encontram-se no ponto
zidas, pois sem dúvida alguma desafiam as leis da
em que a metamorfose se impõe como uma quali-
física. É neste aspecto que reside o seu encanto,
dade poética, transformando aquilo que parecia im-
numa espécie de trompe l’oeil da escultura que nos
possível ser modificado. E neste aspecto, podemos
permite esquecer o peso dos sólidos, quer através do
condensar a qualidade de um percurso ou de uma
uso do bronze patinado diferentemente, quer atra-
obra, como nestas composições escultóricas que
vés do modo como os elementos estão ligados entre
parecem desafiar as leis da gravidade.
si permitindo um jogo formal versátil.
Cristina Azevedo Tavares
“Toi et Moi” e a TV
As imagens passam a uma velocidade estonteante. O som, as palavras, misturam-se. Dramas, risos, vozes de animais, vozes esganiçadas dos desenhos animados, música, imagens de guerra, de paz, grandes vidas resumidas em meia hora, anúncios.... umas vezes o pensamento alheia-se de tudo, outras acompanha. Tudo é veloz. De repente, na pausa, os olhos repousam em duas silhuetas. Gradualmente, sobem contornando as curvas de uma acentuadas pelas formas rectas da outra. Não as consigo separar. E num crescendo de complementaridade, uma cria asas e as duas voam na imaginação de uma relação perfeita. Elas completam-se. Dinora
Pedro e Inês
Os caminhos da criação artística cruzam-se, desde os
um múltiplo e não uma unidade pré-determinada.
primórdios, na obra de José Aurélio, com os do pa-
Constituem igualmente o ensejo para propor uma
trimónio histórico-cultural.. De facto, nela abundam
nova síntese nos plano simbólico e formal, que forje
as peças que assinalam acontecimentos e figuras da
um novo nexo emocional com o passado. Nesta pers-
história portuguesa, mais longínqua ou mais recente.
pectiva, a obra de José Aurélio preenche um espaço
Na sua origem estão muitas vezes projectos ditados
importantíssimo da relação do Portugal actual com a
por um intuito comemorativista, próprio da relação
sua própria memória.
entre as instituições (que encomendam) e o passado.
O episódio de Pedro e Inês, que José Aurélio tratou
Mas a alusão histórica e o contexto patrimonial não
segundo os cânones da medalhística, consagra a pre-
estão apenas presentes na escultura, onde o registo
valência da vida sobre a morte, do amor e do desejo
público é dominante, ou na medalhística. Marcam
sobre os constrangimentos de situação. O autor jun-
igualmente, de forma mais ou menos ostensiva,
tou o seu contributo ao de todos aqueles, escritores
muitas peças de atelier, incursões na ourivesaria e nos
e artistas plásticos, que desde o século XVI fazem de
objectos destinados a espaços mais intimistas. O que
Inês a Rainha de Pedro (de facto, um Rei sem Rainha).
quero sublinhar é que na obra de José Aurélio, o en-
Ao conceber uma peça em que duas cabeças coroa-
contro com a história e o património são uma inter-
das, masculina uma e feminina a outra, se justapõem
secção insistentemente procurada e não um contacto
parcialmente, como verso e reverso, José Aurélio deu
tangencial e fortuito.
ênfase ao sonho (o espaço limpo dourado que se
O trabalho sobre a memória histórica e o diálogo com o património constituem exigências de uma reflexão moderna sobre a identidade, quando esta é vista como uma construção e não como um dado,
abre na frente de cada uma das personagens), em detrimento do acontecido e preferiu a história aos factos. João B. Serra
A Criatura
“Aquilo é um rádio?” Perguntou-me , ironicamente. Não, respondi eu. “Julguei. Como tem antenas”... .Aquilo não são antenas. Aquilo são cornos.” Cornos? “tornou o outro. “Mas aquilo não é um animal.” Engana-se! Atirei - lhe eu, sobranceiramente. Hesitou cedendo um pouco, “ Bom, pelo menos, até parece ter olhos”... E não lhe cheira a nada, nem lhe sabe a nada? “Não me sabe a nada? Acha que deveria cheirar? Acha que deveria saber-me a alguma coisa?” Por que não ? A ideia de um sabor forma-se também pela percepção dos olfactos. Se constata que tem olhos e se vier a aceitar que tem cornos, muito provavelmente, tratar-se-á de um ser que tem uma qualquer forma de vida, que se transforma, enfim...que terá, como nós, um sistema límbico que permite trazer à lembrança o perfume de alguém, aromas primaveris... “Não! Desculpe, por favor, não exageremos e deixe-se de litratices! O que vejo ali é um valentíssimo cepo, embora bem afagado e quase polido, mas um cepo, um pedaço de toro que sobe hirto e fálico e que, na sua ascensão, vai diminuindo de volume até que, subitamente, bifurca-se e... “Interrompo -- o: E esse cepo, ou toro, como Você o denomina, não lhe cheira a nada? “ E Você a insistir! Se me cheira? É obvio que, se aproximar o nariz, claro que cheira porque toda a madeira, como um membro decepado do corpo, tem cheiro até à sua dissolução e transformação absolutas. Mas Você interrompeu-me, aliás, com alguma impertinência, quando eu estava, muito simplesmente, a relatar-lhe o que via. Dizia-lhe eu que o cepo, no topo da sua trajectória ascensional, por-
que aquela coisa parece-me nascer do chão, atinge o ponto onde, ao bifurca-se, diria que de uma maneira inevitável e repentina, gera dois ramos. Foi, digamos, um acontecimento que fez surgir uma nova estrutura. Você não leu o Prigogine? “ Meu Caro, vejamos com calma: Começou por perguntar-me se aquela criatura era um rádio...”Alto! Alto aí! Por amor de Deus! Desculpe–me , uma vez mais, mas acho que a sua imaginação está a entrar, decididamente, no campo do delírio. Uma criatura? Além do cepo, que não passa de um pau, Você sabe o que são aqueles dois elementos cromados? Pois fique sabendo que são dois míseros ferros que terão pertencido a uma canga de bois. Sabe o que é aquilo a que chama os cornos? São duas varetas de metal e os olhos não passam de duas simples esferas de vidro pechisbeque presas por arames. Francamente! E chama, Você ,criatura ao conjunto de toda esta quinquilharia! Uma criatura, meu Amigo, é um ser que foi criado e, nesse sentido, acho até que há algo de pecaminoso na sua afirmação, porque só ao Criador tal é possível Com que então criatura ? Agora, parece-me que começo a perceber onde Você queria chegar com essa história dos cheiros.” Pois ainda bem que começou a entender. Aquela criatura – insisto no nome- paradoxalmente, não foi criada, no sentido místico do termo, nem gerada por um Criador , mas construída por um demiurgo que, como é da natureza dos demiurgos, junta coisas com coisas, preciosas ou sucateiras e,
por vezes, deste fazer e desfazer das tralhas, resultam criaturas como esta, que testemunha o meu quotidiano há quase quarenta anos. Hoje, é a minha mais fiel e disponível companheira. Silenciosamente, os seus belos olhos azuis, daquele azul tão transparente, afagam-me com doçura nas horas amargas da solidão. Assiste às minhas refeições, acompanha as minhas horas de leitura e escuta comigo a música que nos enche a casa e todas as conversas, entre familiares ou amigos, com absoluta discrição. Se o sol da manhã trás novas, e nos entra, radioso , pela portada da varanda, rejubila também e o brilho dos seus braços torna-se mais brilhante e o azul dos seus olhos mais fosforescente. Quando, por alguns anos, viveu no nosso quarto, velava, atentamente, o nosso sono e viu-nos, sem espírito de voyeur, fazer amor apaixonadamente. Confiei-lhe, inclusivamente, o que tenho de mais precioso: o meu filho que, na sua cama de criança, dormia protegido sob o seu olhar maternalmente azul . Por vezes, quando estou cansado, encosto-me ao seu tronco e o aroma velho da madeira traz-me a sombra fresca da árvore .Nos ferros, lá no alto, que à canga, realmente ,pertenceram, há a memória do odor quente e adocicado da junta pachorrenta e as varetas de metal, a que Você chamou, talvez acertadamente , antenas, sintonizam-me com o universo inteiro. Percebeu, Você, agora, aquela história dos cheiros? Jorge Pinheiro
Árvore Móvel
A composição, emocionada por sentimentos e inter-
Subjacente, está uma herança, mas sobretudo uma
pretações, por nexos e objectivos para condividir e
inovadora continuidade do mundo formal gerado no
responsabilizar, é constituída por elementos gerados
mediterrâneo, fruto de uma delicada quanto insistente
na geometria, de regras próprias, por elementos an-
maturação e apuro de formas, símbolos, finalidades,
tropomórficos e fitomórficos.
até úteis. Um mundo marcadamente fitomórfico que
A esta capacidade para integrar diferentes géneses formais, para criar o novo com o existente, junta-se um continuado raciocínio de selecção, não em nome de uma aparente e explícita homogeneidade de formas,
se representa pela mão do homem e lhe atribui identidade. José Aurélio é um escultor do mediterrâneo, mundo onde, frequentemente, são ténues e misteriosos os limites entre natureza e artifício.
que satisfaria uma perceptível marca formal, de evi-
Assim aconteceu, historicamente, com as volutas do
dente e impositiva auto-identificação, mas de opções,
capitel jónico, que fixaram para sempre um elemento
que transmitem o forte e multifacetado mundo de
constitutivo e referencial para a arquitectura.
significados da escultura de José Aurélio.
Nesta peça articulada, de multíplice leitura, que como
Sem dúvida uma “flor articulada”, que se inscreve na
aquelas também encabeça um elemento vertical de
atitude e no percurso do artista, mas também, certa-
suporte, formas e movimento são pluridimensionais.
mente, uma operação emotivo-formal com elementos
Movimento complexo: sujeito à gravidade, desta faz
decompostos, separados, desagregados, encontrados,
uso na tensa relação entre três volutas, que são espi-
que são aglutinados, articulados e movimentados de
rais, no arco com duas séries de esferas que o encur-
acordo com exigentes graus de liberdade. Ao reco-
vam para terra, na energia que se entrega à atmosfera
nhecimento de uma originária condição, de quase
e é figurada por dois discos e o arco que seccionam.
caos, sobrepõe-se a vontade de uma nova realidade, armónica, propositiva, optimista: onde, da desordem, nasce ordem. À dispersão insignificante de formas e objectos no espaço, contrapõem-se correspondências, novos sentidos.
Formas precisas e singulares, ancoradas e suspensas, articuladas, que trocam energia entre matéria e a sua ausência, que é espaço. José Charters Monteiro
Motor Imóvel Duas Esculturas de José Aurélio
Aparentemente opostas “Coluna” e “Origens”
tratasse, emitindo um braço em espiral na direcção
são duas peças afinal convergentes na pulsão
do seu centro, forma perfeita e acabada a do círculo
sem limites que as anima, para cima sempre
que, afinal, sempre pode ser acrescentada em direc-
mais para cima no primeiro caso, para dentro
ção ao fundo cada vez mais fundo, ou ao centro cada
ou para um fundo cada vez mais fundo, no
vez mais centro.
segundo, movimentos perpétuos num como no outro caso.
Se nos lembrarmos, ou soubermos, que estas formas nascem do vazio, obtido pela escavação numa caixa
Como o seu nome indica “Coluna” joga na
de areia, i.e., que são o positivo desse negativo, encon-
verticalidade, intenção que nasce não de
traremos nestas, e em muitas outras formas, criadas a
um gesto mas de uma soma ou do acres-
partir desse vazio, uma subtil ironia que se acrescenta
centamento rítmico de fragmentos ou de
quando, como nestes dois casos, elas são capazes, não
elementos, aparentemente desiguais que
só de se enfrentar, como de configurar o mundo no
mais não são que a soma de uma mesma
seu crescimento e acrescentamento contínuo. Imagens
forma em frente e verso, jogando ora
do mundo estas esculturas são também imagens nos-
com a sua face lisa ora com a sua face
sas, quero dizer, imagens do homem que neste mundo
relevada, forma que se repete num subtil
habita, animal vertical por excelência que faz da mão,
decréscimo, prolongando, visual e imagi-
do olhar e do entendimento instrumentos para subir
nariamente, o seu crescimento vertical.
cada vez mais alto, ir cada vez mais longe, saber e sen-
“Origens” é um círculo colocado na vertical como se uma roda (do tempo?) se
tir cada vez mais fundo. José Luís Porfírio
Infrutescência: Uma Escultura (Trabalho e ciência, eros e inocência)
Observo com prazer a imagem que reproduz a escultura a que o artista atribuiu o nome de Infrutescência. Erecta, como que almejando a altura de um céu azul sem mácula, tendo ao fundo num primeiro plano o casario branco de Aljubarrota, e, mais distante, um segmento alongado, de contornos de contornos sensuais da serra dos Candeeiros, a obra sugere-me, talvez efémera mas incisivamente, a vitória de eros sobre thanatos, das forças vitais sobre a afirmação niilista e hedionda dos valores da morte. A escultura consiste numa haste em bronze, com um metro de dez centímetros de altura, qual esguio tronco de planta, associando à sua afirmação fálica o elemento contrastante de dezenas de frutos que dela emergem, assim proporcionando o cariz da sedução erótica feminina... Redondo, apetitoso, era o fruto da tentação no Génesis, redondas, apetitosas, seriam as formas de Eva... Como dizia Kleist em Do Teatro das Marionetas, «devemos comer de novo da árvore do conhecimento para retomarmos ao estado de inocência». Na esteira de Freud, mas acentuando o carácter revolucionário do erotismo na práxis civilizacional, Herbert Marcuse, no seu Eros e Civilização, afirma, algures, que «a percepção estética é acompanhada do prazer, ela implica um fortalecimento da sensualidade contra a tirania da razão (da qual não pode, no entanto, prescindir)». Trata-se de uma sábia tirada de dialéctica perfeita, que vem certeiramente ao encontro do
que me parece sintetizar não só a escultura de que é objecto este texto, como grande parte do já longo, árduo e profícuo labor artístico de José Aurélio, esse trabalhador incansável, esse «jogador» impenitente. Também no trabalho, não prescindindo da razão (da ciência, do conhecimento da Natureza), ele, pelo lúdico do jogo e da insinuação erótica, se insurge contra a tirania da razão. E fá-lo em pulsão (ou impulso) à qual bem se poderá aplicar o iluminado conceito de «libido genitófuga» do filósofo Géza Roheim. «Genitófuga» porque, precisamente, pelo carácter lúdico, descomprometido com um finalismo produtivista/ alienante, a libido se afirma como um em-si, que exclui a genitalidade como mera função de (re)produção – podendo, no entanto, a (re)produção constituir-se como corolário (um para-si) daquele valor em-si. Se assim não fosse, lisa seria a haste de Infrutescências, e não pejada dos frutos que a povoam. Talvez «lateralizando» um pouco a tendência deste texto, remeto-me e remeto os seus possíveis leitores para dois versos admiráveis do grande poeta que é Fernando Echevarría: «Por detrás do aberto haverá sempre abrir-se / muito maior o espaço.». A profundidade, diria genesíaca destes versos, que nos levam também a pensar no conceito de «obra aberta» de Umberto Eco, conduzem-nos a essa zona tão rica, tão fascinante, tão ambígua e tão sedutora que é a luz que no nosso íntimo ilumina aquilo que nos é indizível, aquele movimento interior que não sabemos ex-
primir e cujo reflexo/resposta encontramos, por vezes, em certa poesia, em certa música, ou nem isso, em certo «nada» que é «tudo», explosão surda do reino do invisível: «É o invisível que visibiliza / seu corpo em ritmo» (ainda Echevarría). Será esse «abrir-se» antes do «aberto», esse «invisível» como fonte de energia que desencadeia o big bang da criação, gerando/ visibilizando o seu (próprio) corpo em ritmo. Eis aí o surgir da obra de arte (da obra; da obra aberta). Se falei em «lateralizar», fi-lo porque a abordagem de sentido erótico que vinha fazendo da escultura em questão, e da obra do escultor em geral, poderá substituir-se ou desviar-se para outras leituras, leituras tão pessoais, tão subjectivas, tão «abertas», quantos os olhares dos seus fruidores. Dizia Schiller: «O que “deve” ser, será a própria liberdade – a liberdade de jogar. A faculdade mental que exerce essa liberdade é a da imaginação. O livre jogo da imaginação traça e projecta as potencialidades do ser total.» A já aludida e nunca de mais repetida vertente lúdica da obra de José Aurélio encontra-se aqui também absolutamente justificada. E o riquíssimo e multiforme imaginário do artista foi sempre abrindo canais e canais de sentidos e vertentes imensas que se conjugam num só caudal final que só um nome pode ter: LIBERDADE. Levi Condinho
Alvéolos
Uma obra de arte é sempre mais do que aquilo que
esta percepção, resultante de uma óbvia deformação
o seu criador idealizou, dando azo, por vezes, a si-
profissional, não podia estar mais afastada da fonte
tuações irónicas e a apreciações muito distantes das
de inspiração do artista e das suas intenções origi-
originais. Como se diz correntemente, as formas e
nais. A assimilação que fiz destas formas, associada
as ideias que as obras de arte veiculam podem ser
ao conhecimento que tenho da relação profunda,
percepcionadas e traduzidas de modos diferentes,
visceral mesmo, entre José Aurélio e o imaginário
dependendo dos sujeitos e dos contextos em que
medieval português, inspirando-se nele e recriando-
se estabelece o contacto. Mas é precisamente esta
o, levou-me de imediato, talvez erroneamente, para
dimensão aberta das obras de arte, tornando-as ob-
a Batalha – sublinho que esta prontidão foi verídica,
jecto de múltiplas recriações e interpretações, que
não é, de todo, um efeito literário, gasto e oco.
constitui um dos fascínios da relação que se pode estabelecer com elas.
Mas, ao fim e ao cabo, as formas são livres e não se compadecem com os espartilhos que lhes queremos
Quando olhei para esta peça pela primeira vez pen-
colocar para as apreender. Por isso, no fundo, creio
sei, de imediato, nos alvéolos e nos respectivos caixi-
que o fascínio pela rede emaranhada de alvéolos
lhos pétreos que preenchem o vão da grande janela
irregulares, a rugosidade do bronze e o jogo que
da fachada principal da igreja da Batalha – uma obra
este, tal como a pedra, estabelece com a luz do sol,
fantástica feita de desdobramentos sucessivos e de
mudando-lhe as tonalidades e os efeitos de sombra,
combinações cuidadosamente estudadas de várias
criam uma ponte válida para o gozo de efeitos plás-
formas irregulares e contracurvadas. Para o bem e
ticos idênticos, sejam eles criados hoje no bronze,
para o mal, a dinâmica flamejante das linhas ascen-
ontem no calcário estremenho e antes disso, e sem-
sionais e centrífugas desse janelão interpuseram-se
pre, nas raízes de um arbusto.
entre mim e as formas plásticas criadas por José Aurélio nesta peça. Vim a descobrir, mais tarde, que
Luís Urbano Afonso
Eolos
A vertente estética desta segunda fase da obra eó-
expressiva de cisterciense borgonhês e medieval que
lica do escultor, transmuta-se em figurações aladas
apresenta à comunidade o fruto do seu trabalho
e em representações zoomórficas que representam
executado no bronze intemporal e eterno, dourado
animais que são caracterizados pelo seu dinamismo,
a folha de ouro. Revela ainda um momento funda-
como o caracol que prefigura o movimento espira-
dor, mágico e ritual, em que o acaso (ou talvez não)
lado, a serpente que prefigura o ziguezague e ainda
faz desvendar um sábio mestre forjador mostrando
o peixe cuja cauda prefigura a ondulação do movi-
e demonstrando que o catavento é ele. Como os
mento natatório, necessário à propulsão dentro de
ventos tecem novas formas que não são dele, assim
água. É excepcional o valor da foto em que o artista,
os cataventos originam, captam e permitem fluir as
qual Hércules ou Vulcano de helénica presença,
composições mais insólitas e inesperadas. É assim
exibe o catavento e o eleva como se fora um facho
que a energia do céu e que vem do ar se liberta na
de luz, um archote do futuro ou um litúrgico gesto
atmosfera e penetra num ventre de metal para o fa-
de louvor ao Criador, personificado no seu corpo
zer rodopiar e elevar à categoria de object d’art.
que é catavento. Encarna também uma dimensão
Madalena Braz Teixeira
O Infinito que se aproxima
Quando se olha uma escultura somos obrigados a
que a explicação dada pelo imediatismo duma asso-
rodar com ela. Esta condição tão
ciação de imagens.
Lógica , imediata e evidente, é simultaneamente a sua
Ao percorrer a grande nave do Mosteiro de Alcobaça,
propriedade mágica e a diferença
(onde praticamente o autor nasceu), pelos corredores
Que estabelece com outras formas de arte.
laterais, vi, senti, reencontrei a peça infinita na forma dos altos arcos que a belíssima estrutura desenha. E
Esta condição ainda lhe dá atributos de pensamento
aí, o que mais me surpreendeu nas duas, na peça e na
e realização, porque se nós, perante a obra, o senti-
arquitectura, foi o espaço livre, a rotura fina, aperta-
mos tão evidente, o autor desde o primeiro momen-
da pelas paredes que, por uma geometria de grande
to, ou o gesto ou “inspiração” que o mobiliza para o
equilíbrio, lhe dão o corpo ou o vazio interventivo
trabalho, é obrigado a “ver” no espaço, a sentir-lhe
que lhes significam o desejo de infinito. Tal como na
o volume. Julgo que essa continuidade ou forma de
música, e é uma analogia tentadora, o silêncio separa
realização, ao fim de muitos anos de trabalho, se ins-
dois acordes para melhor os revelar.
tala como uma forma de ver e de pensar o corpo das
Falei em “mistério” e é cada vez com maior convicção
peças e lhes dar, certamente, as seguranças que a sua
que me revejo numa linha insegura, por natureza
construção implica na dimensão, na harmonia, na
inexplicável, mas que nos remete para um sentido
surpresa, na inventiva de realizar, de progredir atrás
anterior, exigente, que abre a aproximação às peças
duma ideia. Como é evidente, não se procura novida-
sem recurso imediato à razão, à explicação ou à sua
de nestas breves palavras, mas antes, através delas, o
interpretação pela palavra. Pausas de reflexão e de si-
entendimento duma arte e naturalmente dum artista
lêncio parecem necessárias à construção de qualquer
que tão apegada e apaixonadamente a pratica.
entendimento.
A peça sobre a qual tento escrever chama-se “INFINI-
É, no entanto, difícil o silêncio e a tentação é muitas
TO”, sendo simples a razão imediata da escolha; um
vezes mais forte perante as peças, de lhes manifestar-
certo mistério envolvente, porventura mais verdadeiro
mos o gosto, a alegria, as tentativas mais diversas de
dizer, usando a ferramenta das palavras, como recurso efectivo de comunicação entre cada um de nós e a peça, entre cada um de nós e os outros. Uma contradição conciliável! Assim dito, diria ainda do “INFINITO” que, na beleza do despojamento formal, dois volumes ascendem no espaço, simétricos, rigorosos, iguais, separados por linha de ar, numa escala de difícil referência, entre a fotografia que olho e a peça que vi. Posso sempre imaginá-la entre a dimensão da mão ou a do corpo inteiro como confronto, ou a monumentalidade à qual o Mosteiro se associa como referência primeira deste encontro. Este “INFINITO”, no entanto, aproxima-se gerido pelo escultor. É de homens que se trata, cujo sonho não conhece finitude e por isso entre a mão e o Mosteiro, a escala não lhe determina a forma, mas é a forma que lhe dá as asas para que o “mistério” possa voar. Obrigado Zé, fabricante de formas, escultor, que te encontras tanto com o seixo afeiçoado pelo mar, como com o Mosteiro que desde menino te guarda. Rogério Ribeiro
Bolas
Bolas Rui Vieira Nery
No lugar da obra
Não me poderei ligar emotivamente a uma peça da
As pequenas maquetas são parte de história de todo
exposição de José Aurélio, sem primeiro falar sobre
o trabalho do escultor. Poderei, sem dúvida, reco-
as pequenas maquetas que vivem espalhadas pelo
nhecer nesta série de trabalhos expostos antevisões
atelier. As maquetas, sejam elas de papel ou num
de monumentais esculturas, e esta peça em particu-
material mais duradouro, guardam a memória das
lar reforça um tal ponto de vista.
formas e dos lugares para onde foram pensadas. São representações simbólicas de lugares ligados às pessoas e às suas aspirações. Talvez por isso se entenda a liberdade poética e as diferentes formas de expressar conteúdos formais que se adequam a diferentes contextos comunitários e geográficos. Essas maquetas, muito simples, resolvidas pela mera dobragem de uma folha ou o encontro experimentado com as qualidades de um qualquer material, são expressões conscientes de um domínio a todos os níveis da linguagem escultórica. Quando se pensa colocar escultura de grandes dimensões em espaços de domínio público, é necessário pensar os
Esta ideia é expressa na dimensão da mesma e na forma inteligente como é exposta – a altura da peanha permite uma aproximação monumental ao objecto, projecta no espaço a escultura e permite, pelo olhar, caminhar pelo seu interior. A peça poderá ser definida por três planos que se interceptam. Está presente a vontade de transcender o carácter pictural que uma figura frontal apresenta; visa também transformar de forma dinâmica e tridimensional as várias vistas em um só objecto escultórico; e, deste modo, oferece um olhar ideal do todo tornado conteúdo poético.
lugares como uma rede muito complexa e sensível.
E assim, sem perder as qualidades próprias de cada
As esculturas públicas de José Aurélio são pontos de
parte do grupo, a escultura ganha sentido poético
conexão identitários que subtilmente reforçam os
quando percebemos a frontalidade de uma parte
elos que ligam as comunidades aos seus lugares de
projectada na inversa da outra, sendo o observador
memória e os projectam no futuro.
um elemento cúmplice activo. Sérgio Vicente
Paisagem Dramática
Esta peça, cujas componentes são susceptíveis de
dos como grandes formas ungulares saindo da base,
alguma variação na disposição, sempre sob a condi-
na sua pátina de bronze esverdeado. Tudo disposto
ção evidente de serem respeitadas certas simetrias e
em torno de uma placa circular. O espaço modula-se
concentricidades, pelo facto de se chamar Paisagem
pois na vertical e na horizontal. Dele desprende-se um
dramática evoca logo alguma pintura romântica de
sentido do trágico que, subitamente, se imobilizou e
Caspar David Friedrich e também outras paisagens
de que afinal, num paradoxo irresolvido, acaba por se
de altaneira solidão, como a dos picos a elevarem-se
desprender a grande serenidade dos enigmas trans-
agressivos e a proporcionarem uma estonteante no-
formados numa espécie de música plástica ou de labi-
ção de abismo no interior da Ilha da Madeira. Mas,
rinto organizado como partitura tridimensional para
para além destes apelos a uma experiência individual
incessantes deambulações. Porquê? Talvez porque a
e fragmentária, esta peça também tem qualquer coi-
escala mais ou menos portátil do conjunto instalado,
sa de druídico, de espaço pronto para um ritual anti-
diluindo pela proporção o potencial de ameaça da
quíssimo e cósmico de influição de poderes mágicos e
paisagem, se adequa a uma contemplação mais ínti-
de medição da passagem do tempo, e far-nos-ia pen-
ma e mais à medida das nossas pacatas melancolias.
sar, por aí, numa metáfora em bronze de Stonehenge
Sem poder ser domesticada, esta paisagem torna-se
ou de Alles Stenar, à espera de que o sol provoque
doméstica. Propõe-se como exercício da vertigem,
projecções das sombra no espaço e acentue interva-
mas controla-a. Passou a ser, ou a poder ser, qualquer
los de luz nos vãos pontuados por esguios separado-
coisa cuja natureza se situa entre o brinquedo e o
res. Depois ainda, saindo destes quadros referenciais
objecto propiciador da meditação, entre a armadilha
possíveis e induzidos pelo próprio título, atenta-se no
para o olhar e o jogo em que o ver, o sentir, o evocar
contraponto entre sete elementos verticais, pontiagu-
e o pensar se tornam indissociáveis.
dos e ásperos, de secção triangular e pátina escura, com outros tantos elementos mais baixos, arredonda-
Vasco Graça Moura
Quatro peças para Josefa de Óbidos
As quatro esculturas de homenagem a Josefa de
passou-se o mesmo: o escultor prescrutou, desven-
Óbidos, pintora do século XVII, ilustram de maneira
dou, viu as obras, buscou descobrir o outro lado da
muito clara os caminhos de pesquisa do seu autor.
personalidade e intuir-lhe o espírito artístico preciso.
Como sempre, tais peças testemunham o que é tra-
Estas quatro peças, realizadas todas por volta de
ço comum na produção de José Aurélio: a exigência
1971, quando José Aurélio teve a ideia peregrina de
na busca da forma pura, o rigor constante em nome
abrir o espaço da sua Galeria Ogiva para homenage-
da depuração, e o eterno debate travado com a
ar a pintora do século XVII, são prova cabal deste fio
matéria em bruto, a fim de sondar os limites da
metodológico de trabalho, desta fidelidade a uma
descritividade possível. Essas são notas essenciais de
linha rigorosa de criação, em que o pendor imagi-
identidade do trabalho de José Aurélio, do seu estilo
nativo se recria com a sonoridade do testemunho
de escultor, e são, também, características de modus
histórico. Josefa era, como se sabe, uma imaginosa
faciendi que muito importam se quisermos empre-
especialista em miniaturas, naturezas-mortas, cenas
ender um diálogo fecundo com a sua escultura.
bíblicas e representações alegóricas com Meninos
José Aurélio é um artista de fidelidades subterrâ-
caduras de flores, temas com que encheu de arte,
neas, de perduradas memórias: os temas históricos
cor e afecto, num estilo sempre inconfundível, os
encontram no seu alfobre criativo uma dimensão de
espaços sagrados da região. Era importante para o
exigência e, ao mesmo tempo, de busca do essen-
escultor, por isso, num gesto de depuração minima-
cial, os indícios do tempo, os sinais fundamentais da
lista, adequarem-se as peças a um percurso plástico
identidade buscada. Com Josefa de Óbidos, a mais
que foi, sempre, ingénuo mas coerente, feminil, se-
notável mulher-pintora da arte barroca portuguesa,
dutor, feito de irreverências e de personalidade.
Jesus vestidos de rendas e Cordeiros Pascais em cer-
Em 1970, José Aurélio abriu as portas da Galeria Ogiva, sítio emblemático de debates artísticos, de actos de resistência e de surdas conspirações contra a ditadura, para que duas dezenas de artistas contemporâneos se associassem a um modo-outro de ver, a três séculos de distância, a pintura de Josefa de Óbidos. Já esse acto, pelo que tinha de inovador, ao pôr em diálogo vivo obras do século XVII e obras do século XX, revelava, na sua coragem e na dimensão polémica que abria, bastante das preocupações e exigências do escultor. Foi nesse contexto que nasceu a belíssima medalha com o Cordeiro Pascal, bem como a retoma do mesmo tema em volume, e a deliciosa jóia-peitoral, reflexo do mundo doméstico e feminil da célebre pintora seiscentista. A exploração do intimismo, em notas de alta qualidade plástica, a partir do desvendamento dos sinais da arte joséfica, equacionam de modo exemplar os caminhos criadores da escultura de José Aurélio. Vítor Serrão
BIOGRAFIA 1938 José Aurélio nasce em Alcobaça. 1958 Matricula-se no curso Especial de Escultura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (ESBAL). Coordenador do sector artístico da fábrica SECLA, Caldas da Rainha, até 1966. Trabalha com Jorge Vieira na sua participação na Feira Internacional de Bruxelas. Na mesma feira trabalha na produção de publicação para o pavilhão do Brasil. Viagem de estudo a França, Bélgica e Holanda. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
José Aurélio e Guilherme Lopes Alves. Posto de Turismo, Sintra. Fernando Pernes escreve texto para a exposição sobre a escultura de José Aurélio. Pintura e escultura de Manuel Baptista, João Gomes Horta e José Aurélio. Galeria Diário de Notícias, Lisboa. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Exposição Extra-escolar dos alunos da ESBAL. Lisboa. 1959 Prémio Mestre Manuel Pereira com a escultura em ferro O Grito. Viagem de estudo a França.
Vale de Lobos. Baixo-relevo em barro policromado, interior do Hotel Vasco da Gama, Monte Gordo. Abandona a ESBAL. 1961 Instala residência e atelier em Óbidos. Grande incisão em pedra, em edifício na Avenida António Augusto Aguiar, Lisboa. Habitantes do Céu, baixo-relevo em bronze, British Airways, Lisboa. Baixos-relevos em madeira, restaurante Gambrinos, Lisboa. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
II Exposição de Artes Plásticas, Fundação Calouste Gulbenkian. III Salão dos Novíssimos, SNI, Lisboa 1962 Inicia pesquisa e levantamento documental da faiança portuguesa popular e erudita, no âmbito da sua actividade na SECLA. 1964 Participa no concurso para o Maciço de Amarração da Ponte 25 de Abril. Formou equipa com António Aurélio e Querubim Lapa. O projecto foi premiado com menção honrosa. Elemento escultórico metálico, Terminal British Airways, Londres EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Exposição Extra-escolar dos alunos da ESBAL. Lisboa. I Bienal de Paris. Participa com a escultura O Grito. 1960 Primeira encomenda: escultura Dança para Hotel em
Cerâmicas, Cooperativa Árvore, Porto. 1965 Inaugura Ogiva “Pequena”, em Óbidos. Grito, escultura em ferro, para o Centro Português em Roterdão.
1966 Primeiro monumento: Mão, Óbidos.
Medalha Feira Mundial de Osaka.
Primeira medalha: Air France -20 anos - Paris Lisboa.
1971 Instalação As Bambinelas com Artur Rosa e Helena Almeida. Galeria Ogiva, Óbidos.
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Medalha Josefa na Ogiva
Arte Portuguesa, Rio de Janeiro, Brasil.
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
1967 Experiência de trabalho na Fundição Sá Lemos, em Vila Nova de Gaia. Desenvolve técnica de escultura em bronze fundido, em molde de areia talhado directamente, sem modelo prévio. 1968 Baixo-relevo em mármore branco, Casa dos Estudantes Portugueses, Cidade Universitária, Paris [destruído]. Elementos em bronze para o Monumento a João de Sousa Machado, Lobito, Angola. Projecto de arquitectura de Sommer Ribeiro. 1969 Primeiro prémio no concurso para a medalha Comemorativa da Inauguração da Sede e Museu da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) no âmbito das comemorações do centenário do nascimento de Calouste Gulbenkian. 1970 Inaugura galeria Ogiva, em Óbidos. Viagem de trabalho e estudo ao Japão, Hong Kong, Macau, Tailândia, Nepal, Irão, Grécia e Suécia. Alegoria à chegada dos portugueses ao Japão, elementos escultóricos para o Pavilhão de Portugal, Feira Mundial de Osaka, Japão. Medalhas Ogiva - Galeria de Arte Inauguração.
e Ogiva -
Josepha na Ogiva, Galeria Ogiva, Óbidos. Exposição de homenagem a Josefa de Óbidos no 1º ano do aniversário da galeria. XIV Intermedaille, Colónia, Alemanha. 1972 Medalha Pintor António Areal Medalha Ogiva - 2 Anos EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
14 Medalhas. Gravarte, Lisboa. 1973 Primeiro prémio no concurso para a Medalha do Congresso de Projectistas e Consultores. Em Memória de Um Amigo, Caldas da Rainha. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
José Aurélio Escultura, Galeria Ogiva, Óbidos. Instalação Tidos, contidos e consumidos, Círculo de Artes Plásticas, Coimbra. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
XV Intermedaille, Helsínquia, Finlândia. 1974 Integra o Movimento Democrático dos Artistas Plásticos. Realiza escultura Portugal Novo durante a execução do painel colectivo do 10 de Junho, Galeria de Arte Moderna de Belém, Lisboa.
Medalha Movimento Democrático de Artistas Plásticos
Com a colaboração de Alberto Carneiro trabalha na execução do Monumento ao Espírito Feirense.
1975
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
XVI Intermedaille. Cracóvia, Polónia. 1976 Vence concurso para o Monumento ao General Humberto Delgado, Cela Velha, Alcobaça. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Exposição de Arte Moderna Portuguesa SNBA, Lisboa. 1977 Cruz de Cristo, escultura metálica em aço pintado de vermelho, Embaixada de Portugal, Brasília.
Escultura e Vida, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. Expõe Homenagem a Josefa d’Óbidos II. XVIII Fidem, Lisboa. 1980 Emissor/Receptor, Gávea, Rio de Janeiro, Brasil. Máquina do Mundo. Integrada na exposição do 4º Centenário de Luís de Camões, SNBA. O Principezinho, escultura em bronze, prata e vidro, realizada para o Dia Mundial da Criança, Casa da Cultura, Caldas da Rainha. Medalha 4º Centenário de Luís de Camões. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Cultura Portuguesa, Madrid. Participa com Cruz de Cristo. XVIII Fidem. Budapeste, Hungria. 1978 Bolseiro da Fundação Gulbenkian, subsídio de investigação. Padrão comemorativo do 8º Centenário da Fundação da Abadia de Alcobaça. Escultura metálica, Novo Leblon, Rio de Janeiro, Brasil. Medalha Abadia de Alcobaça – 8º Centenário EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
9 Esculturas, Novo Leblon, Rio de Janeiro. 1979 Instala atelier em Vila da Feira, para realizar o Monumento a Manuel Laranjeira.
Arte dos anos 80 na Sociedade Nacional de Belas Artes. SNBA, Lisboa. 1981 Instala-se em Alcobaça. Executa o projecto e as obras de recuperação da casa da Quinta da Preta. 1982 Grande Escultura da Carris, primeiro prémio em concurso nacional, Miraflores, Lisboa. Padrão para o Concelho de Castanheira de Pêra. Medalha A Fernando Pessoa. 1983 Estudos para Homenagem ao Teatro de Animação. Projecto não executado, do qual existe maqueta. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Coisas Intimas, Círculo de Artes Plásticas, Coimbra.
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Colecção de jóias alusivas aos Descobrimentos, Castelo de Palmela. No âmbito da exposição O Astrolábio 1555 integrante da XVII Exposição Europeia de Arte, Ciência e Cultura. XIX Fidem. Florença, Itália. 1984 Monumento 25 de Abril - 10 anos, Vidigueira. Primeiro prémio para medalha do 1º Centenário do Porto de Leixões. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
5 Escultores, Museu de Setúbal.
Siglas, Museu de Alcobaça. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
III Exposição de Artes Plásticas, FCG, Lisboa. 1987 Primeiro prémio no concurso de medalha FAO World Food Day. Artista convidado do Congresso da British Art Medal Society. Com o escultor David Reid, promove cursos de novas tecnologias no âmbito da fundição de cera perdida na ESBAL e na Casa da Moeda. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
The resurgent art medal: an International Selection. Penn State University, E.U.A. 1985 Prémio da 1ª Bienal de Escultura, Caldas da Rainha. Monumento à Padeira de Aljubarrota, Alcobaça. Monumento às Origens de Porto de Mós. Fonte 5º Centenário do Hospital Termal, Caldas da Rainha. Fonte da Benedita. Benedita, Alcobaça. Medalha Viagem à China. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Escultura, Centro Cultural Regional, Santarém
18 Esculturas em ferro 40 medalhas, Casa da Moeda, Lisboa. José Aurélio Medalhas, Mosteiro de Alcobaça. José Aurélio Bronzes.British Council, Lisboa. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
XXI Fidem, Colorado Springs, E.U.A. 1988 Estudos e início da execução de oito gárgulas para o edifício da Torre do Tombo, Cidade Universitária, Lisboa. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
José Aurélio Escultura. Instalação Homenagem a Túlia Saldanha. Círculo Artes Plásticas, Coimbra.
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
I Bienal de Escultura, Caldas da Rainha. Um rosto para Fernando Pessoa: obras de trinta artistas portugueses contemporâneos, FCG, Lisboa XX Fidem. Estocolmo, Suécia 1986
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
1989 Execução e colocação das gárgulas na Torre do Tombo. Viagem de estudo a França. Homenagem à Revolução Francesa, escultura em aço corten. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Escultura. Galeria Municipal de Almada EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
The Medal as Art, Pittsburgh, EUA.
Natureza Metálica, Centro Cultural Malaposta. 50 medalhas + 1, Cidade da Praia da Vitória, Ilha Terceira. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
1990 Monumento aos Cordoeiros, Cortegaça.
Rosto do Infante, Convento de Cristo, Tomar; Pavilhão das Indústrias, Viseu.
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
1995 Projecto para a valorização do Nó da Auto-estrada em Stª Maria da Feira. Esculturas e projecto urbanístico. Estudo do projecto e do programa de acção cultural para a Casa Humberto Delgado. Monumento “Em louvor de”, projecto de António Dacosta. Realizado em parceria com o Arquitecto Sérgio Infante, Cantagalo, Ilha Terceira.
Mulher é o tema: colectiva de escultura. Câmara Municipal de Loures 1991 Monumento aos 75 anos de Abrantes. Memorial para Sagres, proposta do escultor apresentada à Comissão dos Descobrimentos. 1992 Ninfita Neptuna, mascote para o Pavilhão de Portugal na Expo de Sevilha. Memória da chegada dos Portugueses ao Japão, escultura móvel em bronze. Medalha Memória da chegada dos Portugueses ao Japão. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Escultura para tocar. Convento dos Cardais, Lisboa. 1993 Monumento ao Trabalho, Almada. Alegoria ao Desporto, Vila Franca de Xira. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Ideia para um Monumento. Estudos para Monumento ao Trabalho, Galeria Municipal de Almada. 1994
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Ouro, Prata, Marfim e outras Especiarias. Culturgest, Lisboa. Lembranças da Terceira Ilha. Museu do Hospital, Caldas da Rainha. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
Um ourives e 7 artistas. Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa 1996 Memorial, Boquilobo, Torres Novas. Retrato de Rodrigo Maria Berquó, no centenário da sua morte, Caldas da Rainha. S. Mamede, em granito, Vila Maior, Feira. Participa no Colóquio Historia da Cerâmica Moderna, Caldas da Rainha. Montagem dos elementos escultóricos do Nó da Feira. Estudos para o Monumento à Paz, Parque de Almada.
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
3 Encontros com Pessoa. Casa Fernando Pessoa, Lisboa. 1997 Monumento aos Pioneiros da Aviação, Alfragide. Projecto plástico do Elevador Panorâmico de Almada. Projecto de parceria com o Arquitecto José Manuel Charters Monteiro para valorização da antiga escola da Pide, em Sete Rios, Lisboa [não executado]. EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
12 Sinais no Tempo 67-97.Galeria Municipal, Montemor-o-Novo. Phoenixes, Palácio do Marquês, Sintra.
Alcobaça. Troféu Acontece [RTP] Objecto Oculta Mão. Intervenção na Casa Fernando Pessoa, Lisboa. Moeda Comemorativa do 25 de Abril - 25 Anos EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
3 Peças 3 Autores. Lugar do Desenho, Gondomar. Estúdio Secla: Uma renovação na cerâmica portuguesa, Museu Nacional do Azulejo 2000 Proposta para intervenção artística no Castelo de Alcobaça [não executada]. Comunicação na Academia Nacional de Belas Artes EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
1998 Prémio da XXVI FIDEM, Haia, Holanda Retrato de D. João V, Coudelaria de Alter. Nª Srª da Boa Viagem, Pavilhão da Santa Sé, Expo 98, Lisboa. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
A Figura Humana na Escultura Portuguesa do Século XX. Edifício da Alfândega: Porto XXVI FIDEM, Haia, Holanda 1999 Grande Escultura do Parque da Paz, em aço corten, Almada. Escultura para a Estação de 7 Rios, Lisboa. Retrato de Camões, Assembleia da República, Lisboa. Grande Catavento, Coudelaria de Alter. Escultura Metálica, Centro Cénico da Cela, Alcobaça. Padrão 25 de Abril - 25 Anos, Alcobaça. Presépio do Santuário, Fátima. À Roda do Círculo, Escola Frei Estêvão Martins,
Desenho e Escultura, Casa da Cerca, Almada Manuel Laranjeira. Três intervenções/ instalações, Casa Fernando Pessoa, Lisboa. Raízes da Poesia, Associação Defesa do Património, Mértola Instalação 7 Difusores Cósmicos, Museu Aberto, Monsaraz Jóias e Outras Alquimias, Museu do Traje, Lisboa. 7x7 - Mitos e Coincidências, Biblioteca Municipal, Ponte de Sor. EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
A Moda do Século, Museu do Traje, Lisboa. Virgínia Vitorino, Galeria Conventual, Alcobaça. 2001 Coordena o projecto de arte pública no âmbito da celebração dos 25 anos de poder local em Almada – construção de 11 esculturas em cada uma das 11 freguesias do município. Executa no âmbito deste projecto a escultura Nós e os outros. Monumento Porta de Abril, São Paulo, Brasil
Inês, Escola Inês de Castro, Alcobaça. Bibliografia seleccionada: 2002 9 Peixes Voadores, Reguengos de Monsaraz Prémio Escultura SNBA com Moinho dos sete caminhos, escultura em alumínio e ferro Presépio, Almada 2003 Menção Honrosa – Prémio Dorita Castel Branco, Sintra Menção Honrosa, Bienal do Seixal EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Liberdades: Antologia da obra do escultor José Aurélio. Casa do Corpo Santo, Casa de Bocage e Museu do Trabalho, Setúbal Água e outras jóias, Museu do Hospital e das Caldas, Caldas da Rainha Abril, Associação 25 de Abril, Lisboa EXPOSIÇÕES COLECTVAS
Inertes com vida, SECIL, Fábrica de Cimento MaceiraLiz, Maceira. (e)vocações. Expõe duas instalações a partir de arte sacra pré existente, Galeria de São Bernardo, Mosteiro de Alcobaça. 2004 Poesia, Capuchos, Costa de Caparica EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
Escultura/ instalação Paisagem dramática, Museu Aberto, Reguengos de Monsaraz 2005 Memorial Pablo Neruda, Capuchos, Costa de Caparica Círio do Vau, Óbidos
FURTADO, José Afonso - O escultor, o Poeta, a Fotógrafa. Alcobaça: Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Alcobaça, 2004. Fotografias de Ana Gaiaz; escultura José Aurélio e Vasco Graça Moura. José Aurélio: Gestos e Sinais. Lisboa: Fundação Mário Soares: Magno, 2001. Monumento à Paz: Escultura de José Aurélio. Almada: Câmara Municipal de Almada, 2001. Texto de Fernando de Azevedo, poema de Levi Condinho, fotografia de Jorge Barros, design João Machado. MOURA, Vasco Graça - Variações metálicas. Lisboa: ASA, 2004. Poemas de Vasco Graça Moura a partir de esculturas e do atelier de José Aurélio. Com fotografias de Ana Gaiaz. PARDAL, Sidónio - Parque da Cidade de Almada: arquitectura de uma paisagem. Lisboa: Câmara Municipal de Almada e CESUR (Universidade Técnica de Lisboa), 1997.