Magos
Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos n.º8 | Ano 2021
Magos
| Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos n.º 8 Ano: 2021
Propriedade Câmara Municipal de Salvaterra de Magos Coordenação Presidente da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, Eng.º Hélder Manuel Esménio Textos Roberto Caneira Ana Correia Grafismo Soraia Magriço Capa População da vila de Salvaterra de Magos pertencente à Freguesia de São Paulo (adaptada) Arquivo Nacional Torre do Tombo Execução Gráfica Gráfica Central de Almeirim, Lda Depósito Legal 380652/14 ISSN 2184-7940 Data Setembro 2021 Tiragem 800 exemplares
www.cm-salvaterrademagos.pt Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos
Índice 1 | Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800 | Roberto Caneira | pág. 03 à 76 2 | Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos - Igreja da Misericórdia A intervenção do seu Património Integrado e Móvel | Ana Correia | pág. 77 à 123
Salvaterra de Magos | n.º 8 | Ano: 2021
Magos Prefácio As Jornadas de Cultura promovidas em setembro pelo Município de Salvaterra de Magos, permitem a redescoberta e valorização do nosso património cultural e envolvem os nossos munícipes com a sua história local. Para além de espetáculos, recriações históricas, exposições e distribuição gratuita do livro infantil “Pedro e o Falcão”, destaca-se também mais uma edição da Revista MAGOS. Esta revista que já vai no seu 8.º número, assume-se cada vez mais como um imprescindível veiculo de transmissão de conhecimentos e valorização da nossa memória social e cultural. Esta edição é dedicada à vila de Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII (1775 -1800), revela-nos aspetos históricos de Salvaterra de Magos neste período,
mas também destaca as obras de recuperação do retábulo do altar da igreja da Misericórdia e das telas que se inserem cronologicamente neste período. Desde a sua génese a revista MAGOS tem sido editado em papel e on line, como forma de abranger o maior número de pessoas. Este número pela primeira vez tem na capa da sua edição o código ColorADD.Social, que auxilia na integração social de pessoas com dificuldade na identificação de cores, nomeadamente as portadoras de daltonismo. A revista MAGOS é fundamental na divulgação da nossa memória, e deverá ser vista como um investimento futuro para fomentar boas práticas de conservação, preservação e divulgação das nossas raízes identitárias.
O Presidente da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos
Eng.º Hélder Manuel Esménio
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Salvaterra de Magos em finais do Séc. XVIII 1775 a 1800 Roberto Caneira Técnico Superior de História
patrimoniocultural@cm-salvaterrademagos.pt
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
1 | Contexto histórico de Salvaterra de Magos em finais do Séc. XVIII (1775 - 1800) O período deste artigo tem como hiato cronológico o último quartel do séc. XVIII - 1775 a 1800, e compreende a vigência dos seguintes monarcas: D. José I, D. Maria I e D. João VI, este último apenas como regente, dado que a sua coroação vai ocorrer em 1818. A 23 de fevereiro de 1777 falecia D. José I, em virtude de uma doença epilética, ascendia ao poder a sua filha D. Maria I. O reinado da rainha D. Maria I abrange o período de 1777 a 1792, quando lhe diagnosticaram demência e teve de abdicar do trono para o seu filho D. João,que atuou como regente do Reino. D. Maria I a exemplo do seu pai continuava a frequentar o Paço Real de Salvaterra de Magos, que beneficiava de duas infraestruturas que cativavam a presença da família Real nesta vila: o edifício da Real Falcoaria e a Casa da Ópera integrados no Paço Real de Salvaterra de Magos, serviam para combater o ócio da comitiva real que anualmente a partir de janeiro/fevereiro se deslocavam para esta localidade:
A instabilidade governativa da rainha era visível e preocupante, o agravamento da doença de D. Maria I ocorreu em Salvaterra de Magos, em 1792. Elementos da comitiva real encontravam-se no Paço desta vila e tiveram de ir de urgência para Lisboa, era já difícil esconder os sintomas da demência da rainha: «Continuou o encobrimento da moléstia, mas em Fevereiro de 1792 se fez público pela retirada que a corte fez de Salvaterra e cessação de despachos. Nem todos os médicos do Paço sabiam da enfermidade. Principiou a moléstia com demasiados escrúpulos de consciência. O peso enorme do Governo a entrou a enfastiar do despacho. Pôs-se em oração. Depois entrou a duvidar de se salvar e não queria receber a eucaristia. Enfim endoideceu formalmente. Conservou-se o segredo bastante tempo.»2
A partir de 1792, D. Maria I estava incapacitada para governar, e seu filho D. João, assumiu a direção dos assuntos de Estado, e mais tarde em 1799 a regência do Reino. A regência e o reinado de D. João VI decorre numa época de grandes mudan«No mês de Janeiro, a Corte passava geralmente ças políticas e sociais, os ecos da revolução frana Salvaterra de Magos, onde vivia para os prazeres cesa e a subida ao poder de Napoleão, seguiu-se da música e da caça, voltando a Lisboa antes da o bloqueio continental e as invasões francesas e a Quaresma.» 1 consequente fuga da Corte para o Brasil, onde se manteve 14 anos. Em 1821 D. João VI regressou a Portugal, após o triunfo das ideias liberais foi obrigado a jurar pela Constituição de 1822.
1 2
Joaquim Veríssimo Serrão, História de Portugal, vol. VI, Lisboa, Editorial Verbo, 1982, p. 302 Luís de Oliveira Ramos, D. Maria I, Lisboa, Temas e Debates, 2010, p. 228
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Magos 2 | As deslocações da corte a Salvaterra de Magos
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A estadia da corte no Paço Real de Salvaterra de Magos, acontecia por norma em janeiro ou fevereiro. A presença da Família Real em Salvaterra de Magos, era designada por Jornada de Sua Majestade, e para bem receber a comitiva real, a Câmara Municipal tinha de ter alguns cuidados, para acolher os nossos reis. A Gazeta de Lisboa3 descreve-nos as frequentes deslocações da família Real para Salvaterra de Magos, normalmente era por via fluvial, uma viagem cómoda, segura e relativamente rápida. 19 de janeiro de 1779 «Ontem pela manhã Sua Magestades e a Real família se embarcaram e partiram para Salvaterra» 15 de fevereiro 1780 «S. Magestade e real família continuam ainda a sua residência em Salvaterra, donde se recebem as agradáveis notícias de sua boa saúde.» 22 de janeiro 1782 «Temos a satisfação de saber que Suas Magestades e Altezas passam em Salvaterra uma boa saúde» 13 fevereiro 1784 «As notícias de Salvaterra informam que Sua Magestade e Altezas ali continuam sem novidade nas suas interessantes saúdes.»
12 março 1784 «Sua Magestade e toda a Real Família voltavam de Salvaterra para o Palácio d’Ajuda no dia 8 deste mez, sem novidades nas suas interessantes saúdes.» 21 janeiro 1785 «Sua Magestade e toda a Real Família, depois de haverem assistido à festa do desagravo do desacato de Santa Engracia, partiram a 18 de deste mez para Salvaterra, onde temos a satisfação de saber que chegaram com bom sucesso.» 7 fevereiro 1786 «As noticias de Salvaterra são sumamente agradáveis por assegurarem de boa saúde que Suas Magestades e Altezas ali gozam disfrutando a amenidade do tempo que tem feito há alguns dias.» 28 fevereiro 1786 «As notícias de Salvaterra nos certificam de que Suas Magestade e Altezas passam sem novidades nas suas interessantes saudes, a execepção da Snr.ª Infanta D. Carlota Joaquina, que se acha sangrada, por uma moléstia de olhos, a que se espera sirva aquele remedio de acelerar o desejado restabelecimento. Ali pegou fogo na noite de 25 no quarto do Ex.mo Conde de Valadares, e ainda não se extinguiu com a possível prontidão, não deixou de causar bastante susto, e incomodo, por ser a hora em que todos dormiam.»
Figura 1 - Gazeta de Lisboa - 13 Fevereiro 1784 Cf. Joaquim Manuel da Silva Correia; Natália Brito Correia Guedes, O Paço Real de Salvaterra de Magos: A corte. A ópera. A falcoaria, Lisboa, Livros Horizonte, 1989, pp. 203-204 3
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
7 março 1786 «Com satisfação se teem recebido noticias de Salvaterra de que a Snr.ª Infanta D. Carlota Joaquina se acha com melhoras e que Suas Magestades e mais Pessoas Reais gozam boa saúde.» 30 janeiro 1789 «Sua Magestade e Altezas chegaram segunda feira VilaFranca de Xira donde se propunham embarcar-se para o real sitio de Salvaterra.» 6 março 1789 «Sua Magestade e Altezas havendo a 3 do corrente partido do Real sitio de Salvaterra de Magos por agua, desembarcaram às 4 horas da tarde no Cais de Belém, donde com grande contentamento de toda esta cidade se restituíram felizmente ao Real palácio d’Ajuda.» 7 fevereiro 1792 «A Rainha Nossa Senhora e toda a Familia Real se restituíram na tarde de 3 do corrente do Real sitio de Salvaterra de Magos a esta Capital, e foram
Magos residir para o palácio da Praça do Comércio, afim de poder Sua Magestade mais comodamente fazer uso de banhos das Alcacerias.» Os livros de receita e despesas do Município revelam-nos os gastos que a edilidade tinha com a presença real, mas também os rendimentos que advinham da corte em Salvaterra de Magos. A principal despesa era com azeite e comestíveis que tinham de vir de Santarém, velas para iluminar o edifício dos Paços do Concelho e quantias a despender com a guarda real, vejamos alguns exemplos: 1792 - despesa com azeite e comestíveis «Despendeo mais o Procurador do Concelho a quantia de mil e quatrocentos e quarenta reis com hum homem que levou hua carga dos dr Corregedor a Santarem para mandar vir azeite e comestíveis na Jornada de Sua Magestade no anno de mil settecentos e noventa e dous como consta do mandado que vay alinho» 4
Figura 2 - Registo de despesa com azeite e comestíveis durante a Jornada de Sua Majestade - 1792 4
A.H.M.S.M. - Livro de receitas e despesas 1792-1800, fl. 4
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Magos Figura 3 - Despesa com cera para iluminar o Edifício da Câmara Municipal para receber o Príncipe Regente - 1800
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1800 - Despesa com com velas para iluminar a Câmara «Despendeo o Procurador do Conselho a quantia de mil e quarenta reis para dois arrataes de cera se porem à noite nas janelas da Caza da Camara por eluminação a vinda do Principe e Regente em a noite de vinte e oito de Janeiro, como consta do mandato que vai alinha. Salvaterra 28 janeiro 1800»5 Guarda Real - 2 fevereiro 1783 «Despendeo mais o dito tesoureiro do concelho coatro mil reis com a propina dos soldados da guarda real como consta do mandato que vay alinho.»6 Fl. 5 As receitas para os cofres do Município, eram essencialmente da renda de barracas para albergar alguns elementos da comitiva, devido à escassez de alojamento era necessário armar barracas de pano:
1784 - receita de 4 barracas «Carrego em receita ao ditto Thezoureiro do Concelho quatro mil e outocentos reis de renda de quatro barracas, que se armão de pano encostadas as Cazas da Camara, no tempo da Jornada de Sua Magestade a mil e duzentos reys cada huma que foi a referida quantia de quatro mil e outocentos reys.»7 1786 - receita de 2 duas barracas «Carrego mais em receita ao Procurador do Concelho Rafael Ferreira de Carvalho a quantia de mil seiscentos reys de duas Barracas de pano que se armarão junto ao caes no tempo da Jornada.»8 1790 - receita de 4 barracas «Carrego mais ao Procurador do Concelho a quantia de dez mil reis de renda dos chões em que se armaram várias barracas em ano de mil settecentos e noventa no tempo das jornadas de Sua Magetade.»9
Idem, fl. 130 A.H.M.S.M. - Livro de receitas e despesas 1783 - 1791, fl. 5 7 Idem, fl. 14v 8 Idem, fl. 51v 9 Idem, fl. 113v 5 6
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
2.1 | O Real Teatro de Salvaterra de Magos O Real Teatro de Salvaterra de Magos, inaugurado em 1753, continuava a ser um elemento fundamental para cativar a presença da família real nesta localidade. Este teatro, recebeu inúmeras produções operáticas onde atuaram reconhecidos artistas internacionais. Segundo uma descrição de uma viajante francês, datada de 1765, conseguimos saber que o teatro tinha capacidade para 500 pessoas, possuía 3 filas de camarotes onde se acomodavam hierarquicamente os elementos da família real e comitiva: «A sala de espetáculos de Salvaterra tem uma lotação de 500 pessoas, tem três filas de camarotes de primeira (três camarotes de cada lado); ao fundo do anfiteatro com uma galeria que se prolonga de cada lado os primeiros camarotes. Este anfiteatro está coberto com um reposteiro franjado, apoiado em pilares, como uma tenda; neste se situa o lugar do Rei que se senta num cadeirão, ao meio, tendo à sua direita, o Infante D. Pedro, seu irmão e seu genro e à sua esquerda a Rainha, a Princesa do Brasil e as três outras Princesas e ao longo da galeria, á esquerda, as damas de honor. O outro lado, à direita da galeria, fica vazia, há oito segundo e oito terceiros camarotes que são ocupados por portugueses aos quais se oferecem bilhetes.»10 Com o terramoto de 1755 e a ruína do edifício da Ópera do Tejo em Lisboa, o Real Teatro de Salvaterra de Magos, tornou-se o principal teatro régio do Reino. Manteve-se em funcionamento até 1792, sendo substituído pelo teatro de S. Carlos em 1793. 11
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Figura 4 - Fachada nascente do Paço de Salvaterra de Magos, assinada por Carlos Mardel. Desenho identificado por Aline Gallash-Hall de Beuvink na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
Joaquim Manuel da Silva Correia; Natália Brito Correia Guedes, Op. Cit. p. 39 Cf. Aline Gallasch-Hall de Beuvink, O Real Teatro de Salvaterra de Magos. A reconstrução de uma memória, Casal de Cambra, Edição Caleidoscópio, 2016, p. 61 10
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Figura 5 - Ópera “La Vera Costanza” de Domenico Cimarosa - 1785 - Cf. Aline Gallash-Hall de Beuvink
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2.2 | A Falcoaria Real
A Falcoaria continuava a ser um importante atrativo para a presença da Corte em Salvaterra de Magos, embora sem a opulência, o fausto e o barroco da corte de D. José. D. Maria I continuava também a privilegiar a falcoaria e as caçadas reais. Exemplos disso são as várias aquisições de falcões para a Falcoaria Real, durante o reinado de D. Maria I, as aves vinham da Dinamarca, Holanda ou Malta: «Regista-se e ao Mestre da Falcoaria da vila de Salvaterra Jacob Francisco que se acha em Lisboa se ordene me venha falar para lhe dar a ordem necessária na forma de Sua Mag.de; e se passe a que for do costume para se apresentar um escaler em que o dito Mestre vá receber a bordo do navio Estrela da Madrugada os Passaros Falcões que nele veem da Dinamarca e os conduza à Falcoaria» da dita vila de Salvaterra.» 12 No Arquivo Histórico Municipal, encontram-se dois documentos referentes ao edifício da Real Falcoaria: uma ordem do Monteiro Mor do Reino e um outro sobre a necessidade de dar a melhor carne às aves de rapina da Falcoaria. Registo do Monteiro Mor do Reino para que os mestres Real Falcoaria, deixem os oficiais de Justiça fazer o seu trabalho:
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«Registo de huma ordem do Monteiro Mor do Reino, expedida pro Avizo da Secretaria do Estado para os Mestres e Officiaes da Real Falcoaria, não embaracem os Menistros e Officiaes de Justiça de entrarem na mesma Falcoaria a fazerem diligências enarentes ao seu cargo e officios. Os Mestres e Officiaes da real falcoaria da Villa de Salvaterra não embaracem que nella entrem o Juíz de Fora da mesma villa e seus officiaes a fazerem as diligências inherentes ao seu cargo e officios como são porsederem ao Inventário dos Bens das pessoas que faleceram na dita Falcoaria e outras diligencias de semelhante natureza, pois que estas devem praticar e se fazem com dispensáveis para a boa administração da justiça. Por Sua Magestade asinno em avizo de dezanove do corrente, do Visconde da Villa Nova de Cerveira; Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Reyno, aos vinte e dous de Abril de mil settecentos e outenta e sinco = O Monteiro Mor E não se continha mais em a referida ordem que a copiei, bem e fealmente, a qual me reporto e entreguei ao Mestre da Real Falcoaria Henrique Verhoven que aqui assignou; Eu João António de Mendença a escrevi e assignei.» 13
Joaquim Manuel da Silva Correia; Natália Correia Guedes, Op. Cit, p. 175 A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1775 - 1793, fl. 97
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Figura 6 - Registo de uma ordem do Monteiro Mor do Reino 1785 - A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1775 - 1793
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Outro documento interessante da perspetiva histórica local é o requerimento de Jacob Francisco Mestre da Real Falcoaria em 1800, a solicitar que os marchantes do Açougue devem dar a melhor carne às aves de rapina da Falcoaria, o que não estava a acontecer e por isso o Juiz de Fora notifica os marchantes para cumprirem esta ordem: “Cópia de um requerimento que fez Jacob Francisco Mestre da Real Falcoaria ao Doutor Juiz de Fora João António Rodrigues Frade” “Diz Jacob Francisco que tendo a honra de Mestre da Real Falcoaria com a obrigação de tratar com toda acxaleão e cuidado dos passaros recomendado por sua Magestade succede que os Marchantes do Assougue desta Villa de donde o supplicante se prové de carne para os ditos pássaros adezatendem não fazendo caso da sua preferencia e privilegio que deve ter para poder cumprir bem a sua obrigação, tanto na brevidade e preferencia a outra qualquer pessoa, como da qualidade da mesma carne, que deve ser da milhor que haver no mesmo Assougue, como por rapção, cos contrapesos que lhe correspondem, conforme o uzo do mesmo, como V.Ex.a ter mandado por vezes sem que atendão as ditas ordens nem o escrivão as cumpre como deve, requer o supplicante que V.Ex.a lhe mande passar
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AHMSM, Livro de Posturas Municipais 1795 - 1858, fl. 50v
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Magos nova ordem, por serem novos Marchantes , para que estes sejão notificados para aviarem ao supplicante da carne porciza com preferenciaasima dita maescirconstancia devidas penas de prisão co mais que V.Ex.a for servido, ficando a dita ordem depois destinda em seu poder para poder usar ditta quando lhe for percizo. Doutor Juiz de Fora seja servido mandar passar a dita ordem como requer sua petição como que V.Ex.a lhe parecer que faz abem da Fazenda Real da dita Falcoaria. E recebera Merce = como requer = Rodrigues= Notifiquei aos Marchantes ambos Francisco Gonçalves Pontevel – e Francicso Pedro Coxeiro em suas proprias pessoas para todo o referido na petição aqual eu lhe declarei que elles bem entenderão em fe de que passei apresenta. Salvaterra vinte de Abril de mil setecentos oitenta e sette = José Lucas de Aguiar = E não continha mais a dita petição que eu bem e fielmente aqui escrevi por ordem do Verador mais velho Francisco Pedro de Freitas, ca dei aquem ma deu para aqui alcancar, com fé do que me assignei: Salvaterra Treze de Dezembro de 1800 anos: O Escrivão da Camara Filipe JoseSimoes » 14
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Figura 7 - Requerimento que fez Jacob Francisco Mestre da Real Falcoaria - 1800 - AHMSM - Livro das Posturas Municipais 1795 - 1858
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3 | As preocupações do executivo municipal Para além da presença da família real no Paço desta vila, que ocorria apenas nos meses de inverno: janeiro e fevereiro, e que certamente trazia algum reboliço à vila, nos restantes meses o executivo tinha que assegurar o normal funcionamento do concelho e manter as exigências básicas e necessárias da população. As preocupações do executivo municipal, consistiam em obter dinheiro para fazer face às despesas, manter e realizar as obras necessárias para a comunidade local, assegurar e cumprir a justiça entre outros aspetos que vamos abordar. Os livros de receitas e despesas já mencionados, são uma fonte histórica para perceber como se geria o orçamento da Câmara Municipal. As maiores receitas vinham normalmente dos terrenos municipais que eram aforados. As propriedades que o concelho tinha, exemplo da Junqueira, Ramalhais ou Corte do Concelho, eram terrenos arrematados em hasta pública, e que os rendeiros depois tinham de pagar com uma parte dos cereais que iam para arrematação e a venda destes géneros entravam nos cofres da Câmara. Vejamos alguns exemplos: - Ramalhais - 1783 «Carrego mais o dito Thezoureiro trinta mil reis porcedidos de dous moyos de sevada, que paga de renda António da Fonseca da terra chamada de Ramalhaes, suja sevada se arrematou em praça a quem mais desse, de que chegou o preço de A.H.M.S.M. - Livro de receitas e despesas 1783-1791, FL. 2V Idem, fl. 3 17 Idem, fl. 3 18 A.H.M.S.M. - Livro de receitas e despesa 1792-1800, fl. 82v 15 16
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duzentos e cincoenta reis cada alqueire, que os cento e vinte alqueires somara a referida quantia.»15 - Junqueira - 1783 «Carrego mais o dito Thezoureiro vinte e quatro mil e duzentos e sincoenta reis, procedida de novente e sette alqueires de sevada que paga de renda João Rodrigues da Fonseca de huma terra chamada a Junqueira cuja sevada se arrematou em praça a quem mais desse do que chegou ao peço de duzentos e sincoenta reis cada alqueire que os ditos noventa e sette alqueires somara a referida quantia.»16 - Corte do concelho - 1783 «Carrego mais o dito Thezoureiro trinta e sette mil e outocentos reis porcedidos de dous moyos de trigo que paga de foro António Nogueira, da terra chamada Corte do Concelho cujo trigo se arrematou em praça a quem mais deu do que chegou ao preço de trezentos e quinze reis cada alqueire que os dittos dous moyos somara a referida quantia.»17 Uma outra fonte de receita eram as rendas e as licenças: Renda de um chão junto do Cais - 1797 «Carrego mais o Procurador do Concelho a quantia de mil e seiscentos reis de renda de hum chão no citio do Cais desta villa que paga ao concelho desta villa vencido em trinta de Junho do anno de mil e settecentos e noventa e sette de que he rendeiro Bazilio da Costa.»18
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Renda de um chão junto do Celeiro - 1797 Conserto das janelas do edifício da Câmara - 1797 «carrego mãos o Procurador do Concelho a quan- «Despendeo mais o Procurador do Concelho a tia de dous mil reis de renda de hum chão que paga quantia de tres mil e quinhentos reis com hum carSilvestre Joze da Costa ao concelho no sitio encos- pinteiro para concertar a janelas das cazas da Catado ao Seleyro de Sua Alteza vencido no prezente mara como consta do mandato que vay alinha.»22 ano de mil e settecentos e noventa e sette.»19 Conserto da porta do açougue - 1797 Licença de uma bateira - 1797 «Despendeo mais o Procurador do Concelho a «Carrego mais o Procurador do concelho a quantia quantia de mil e duzentos e dez reis com o conserde mil e seiscentos reis que deo hum arais pella to da porta do assougue desta villa como consta licença de andar com a sua bateira no Porto da Pa- do mandato que vau alinha.»23 lhota, neste presente anno de mil e settecentos e Consertos de vários edifícios - 1799 noventa e sette.»20 «Despendeo mais o Procurador do Concelho a Os encargos com os transportes de médico, para quantia de oito mil cento e secenta reis que tanto assistir doentes era outra preocupação da Câmara, emportou a despesa do concerto da fonte da villa, como demonstra esta despesa com um aluguer de caza do porteiro deste Juízo e tilhado do relógio, um cavalo para um médico: como consta do rois emandado que vai alinho. 24 Cavalo de aluguer para transporte de médico Salvaterra, 24 de Maio de 1799» – 1798 As ordens eram trazidos pelos caminheiros, que «Despendeo o Procurador do Concelho a quantia traziam os documentos e por isso tinha de ser pade seiscentos e sincoente reis de hum cavalo de gos por este trabalho. O edital ficava afixado no aluguer para hir a villa de Sãomora falar ao Médico pelourinho, que se encontrava em frente à Câmara para vir tratar aos doentes deste villa como veyo Municipal: seis mezes, como consta do mandato que vay aliDespesa com um caminheiro - 1799 nho.»21 «Despendeo mais o Procurador do Concelho a As despesas eram mais abrangentes, estava ao en- quantia de novecentos secenta e seis reis com hum cargo do Município, a limpeza de fontes, concerto caminheiro por huma ordem que troce com hum do relógio ou substituição de janelas e fechaduras edital, e este ser afixado no pelourinho desta villa, em edifícios públicos. para efeito de se indicar do Doutor Provedor desta
Idem, fl. 87 Idem, fl. 83v 21 Idem, fl. 98 22 Idem, fl. 84 23 Idem, fl. 115 24 Idem, fl. 87 19 20
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
Camara Jose Germano de Santa Marta Mesquitta e Mello, como consta do mandado de que vai alinho. Salvaterra 20 Maio de 1799.»25 Outras despesas que saiam do cofre do município são relativas ao Convento de Jericó e ao conserto de pesos e medidas do açougue municipal: Convento de Jenicó - 1791 «Despendeo o Procurador do Concelho a quantia de sincoenta mil e duzentos reis com os religiosos do Convento de Jenicó de dous anos que se lhe devia que findarão no anno de mil e settecentos e noventa e dous a meyo tostão cada semana de esmola por Sua Provizão que tem de Sua Real Magestade, como consta do mandato que vay alinha.»26 Pesos e medidas - 1791 «Despendeo o Procurador do Concelho a quantia de outtocentos e outtenta reis do concerto dos pezos do Asougue no anno de mil settecentos e noventa e dous como consta do mandato que vay a linha.»27 O ensino também era uma preocupação da edilidade, em 1779, verifica-se o registo de um Professor Régio de seu nome Joze Pedro Gomes, para ocupar o lugar da escola de “ler, escrever e contar”, que se encontrava vaga. Este documento revela a existência de um local, que servia de instrução em Salvaterra de Magos:
Idem, fl.114 Idem, fl. 12 27 Idem, fl.13 28 A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1775 - 1793, fl. 26 25
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Magos Registo de um professor em Salvaterra de Magos - 1779 «Registo da provisão do Mestre, Professor Régio da Gramática e Ortografia Portugueza da V. de Salvaterra de Magos, Jozé Pedro Gomes Dona Maria por Graça de Deos Rainha de Portugal e dos Algarves daquém e alem mar em Africa Senhora da Guiné, V.º faço saber ao que esta minha provisão virem, que Joze Pedro Gomes, lhe reprezentouq em a villa de Salvaterra se acha vaga a escola de ler, escrever e contar pedindo me houvesse por bem nomear por seu titullodella. E visto o seu requerimento e informação q se houve: Hei por bem nomear ao dito Joze Pedro Gomes para substituto da referida Escola de ler, escrever e contar interinamente, e em quanto a não houver Mestre, ou não mandar o contrário, vencendo de ordenado quarenta mil reis, por anno, que lhe serão pagos pello cofre da Junta do Subsidio Literário destes meus Reinos na folha dos Professores delles e será obrigado a cumprir tudo com as minhas reaes determinações e registar esto cargo na Camara a que pertencer. A Raynha Nossa Senhora a mandou pello Arcebispo do seu Conselho, que sera Presidente da real MezaSensoria, Joze Simões de Rima da Costa Pereira a fez em Lisboa aos vinte e nove de Abril de mil settecentossettenta e nove = FelisJoze Leal Arnault por despacho da Real Meza Censoria de vinte de abril de mil settecentos e setenta e nove.» 28
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Figura 8 - Registo de um Professor Régio em Salvaterra de Magos - 1779 - A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1775 - 1793
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
O conserto e obras em infraestruturas fundamentais tais como pontes ou o açougue municipal, também mereciam a atenção, mas como os parcos rendimentos do município não permitiam a reparação, era necessário recorrer ao apoio do Governo de D. Maria I, como demonstra este registo: Conserto da Ponte e açougue da vila de Salvaterra Registo de huma Provizão q veyo para o conserto da ponte e asougue desta V.ª a qual he o seguinte: Dona Maria por Graça de Deos raynha de Portugal e dos Algarves daquém e de dalem Mar em Africa Senhora da Guiné, faço saber a vos Provedor da Camara de Santarem que o Prezidente e Veriadores do Senado da Camara da villa de Salvaterra me reprezentarão por sua carta datada de trinta e hum de Outubro do anno passado, que a ponte daquella villa e asougue estavão ameaçando huma grande ruína a qual o concelho nem o Povo por muito pobres podiam reparar que duas oficinas não podia a bem comum estar sem ellas e que como fosse uteis e necessários na falta de remedio para a sua prevenção naquele Povo costumava em mandar prover com remedio de outros e ainda com os meos reais direitos e que para sedar alguma providencia a que o dono nem foce final exclusivo dos dittos dois edifícios presentia no depozito das cizas dos bens reais alhum dinheiro o qual elle suplicavam lhe mandace apelar ao dito fim em beneficio da referido Povo e da minha Real comitiva que todos os anos paçava a dita villa de Salvaterra. E visto o que na dita carta referirão informação que sobre esta particular ouvindo a Camara Nobreza e Povo da villa de Salvaterra reposta do Procurador
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A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1775 - 1793, fl. 58v - 59
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Magos da minha real Coroa a que se deo vista e constam pelladitta vossa informação autor da vistoria apontamentos e avaliação a que mandaste proceder a muita total ruina que ameaçava a ponte tam precisa aos moradores da villa como aos viajantes para cuja reedificação he necessária a quantia de tresentos e sincoenta mil reis para a casa do asougue em duzentos e cincoenta mil reiis para o que não chega a importância de quinhentos quarenta mil oitocentos setenta e oito reis que estão no cofre das sizas da cobrança desta villa e considerados como exclusivos das ditas dessas avaliações seiscentos mil reis como a experiencia tem de mostrado Hey por bem e vos mando façais rematar em hasta publica pello menor lanço as dittas obras da ponte e do asougue da villa de Salvaterra constando dos apontamentos nos autos de vistoria que consta se vos remetem por copia aplicando para o seo pagamento anuncio na quantia de quinhentos quarenta mil oitocentos sessenta e oito reis das referidas obras das sizas da mesma villa que se achão no cofre, e fazendo registar esta ordem nos livros da camara a cumprir o fim. A Raynha Nossa Senhora a mandou pellosMenistros abaixo assignados do seo concelho e seus desembargadores do Paço Joaquim Ferreira dos Santos a fez em Lisboa a vinte e outo de abril de mil setecentos outenta e hum anos.»29 A Fonte de S. Sebastião, durante o inverno era atingida com inundações que contribuiam para o seu declínio e ruína. Durante a real jornada de Sua Majestade em Salvaterra de Magos, era motivo de queixas e por isso o executivo municipal decidiu mudar esta fonte de sítio:
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duração de 3 dias que se deveria realizar a partir de 15 de Setembro: «Registo da provisão que veio do Desembargo do paço para haver Feira tres dias nesta villa de Salvaterra e nos dias quinze, dezasseis e dezassete do mez de setembro anualmente. Dom João por Graça de Deos Principe Regente de Portugal e dos Algarves d’Aquem e d’Alem Mar em Africa e da Guiné. Faço saber que a Camara da Vila de Salvaterra de Magos, me representou por sua petição, que havia muitos anos se tinha deixado de fazer a feira que em outro tempo se costuma fazer na dita villa do que tinha rezultado muito prejuízo ao concelho que sendo originariamente muito pobre pela mediocridade das suas vendas primordiais o ficara sendo ainda mais nela parte dos lucros que recebia da dita feira, resultante tambem de tal omissão ficar desfalcada a minha real terça e não verificado os direitos reaes que seja pela entrada já pelas vendas e já pela permutuação dos generos que a feira occazionava se porcedião. E porque estes inconvenientes acrescião os incommodos que sofriam os moradores da dittavilla e com particularidade os lavradores nos annuaes e mecessarios provimentos de gados que hião fazer a outras feiras muito remotas com grande trabalho e despeza nestes termos persuadido o conselho e todo o Povo da referente villa de que não desmerecia a As feiras eram locais de trocas comerciais, funda- mesma contemplação que me tinhão merecido oumentais para assegurar víveres e outros bens es- tras povoações a quem eu concedera licença para senciais, na vila de Salvaterra de Magos a feira já haverem feira nas suas respectivas terras me pedia não se realizava há vários anos, o que acarretava fosse servido prometer-lhe faculdade para haver em muito prejuízo ao concelho, o Príncipe e regente Salvaterra huma feira todos os anos por trez dias D, João, determina a realização de uma feira, com «E logo pello ditto Procurador da Camara Joze Joaquim Faria foi requerido a este Senado que por noticia que havia tido pello Alcaide deste Juizo se constava que o capitam Enginheiro Manoel de Souza Ramos e o Mestre das Reais Obras terão toda recomendação do Excellentissimo Conde de Valadares para se haver de reparar a notória ruina que padece a fonte desta villa denominada de Sam Sebastião o que depois de conferida se foi fazer vistoria a ditta fonte a qual depois de vista e examinada se assentou unanimemente acordo que a ditta fonte no sitio em que presentemente esta se não pode conservar defendida das innundaçoens do Inverno de que se não pode ver livre por estar em maior declineo que faz terreno onde ella esta situada o que no tempo da real jornada faz hum indevezivel vexame publico por cujo motivo se asentou que seria conveniente mudala do ditto sitio para o Largo de Sam Sebastião ou para onde mais comodamente por eles dicto Excelentissimo delegados. Achando-se mais que os canos e mais aquedutos da dita fonte estão entupidos com varias raízes que os fazem deixar extrahir grande parte da agoa que pudera vir para a ditta fonte motivo porque este anno tem a ditta fonte menor agoa que aos anteriores que ocazionara hum vexame no tempo da real jornada que chegou ao excesso de se distribuir por ordem.»30
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A.H.M.S.M. - Acordãos da Câmara 1774 - 1795, fl.294
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contínuos sendo o primeiro em quinze de Setembro. E visto seu requerimento ratificado em sua resposta e na qual concordão a Nobreza e Povo que mandei ouvir o que consta da informação que se houvesse pelo carregador da Camara de Santarem e a resposta do Dezembargador Procurador da Coroa a que se deu vista e não teve duvida. Hei por bem conceder aos suplicantes licença para terem huma feira na sobredita villa de Salvaterra de Magos nos dias quinze, dezasseis e dezassete de setembro de cada anno e mando as justiças e as que pertencer que comprão e guardem esta provisão como nella se contem a qual se transladara nos livros da dita camara e valera ponto que sem efeito haja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação do livro segundo título quarenta em contrário. Não pagarão novos direitos pelo não devem como constou de hum conhecimento em forma registado a folha duzentos e vinte e oito do livro seis verso do registo geral o Principe Nosso Senhor o mandou pelos Ministros abaixo assignados do seu conselho e seus desembargadores do Paço. Joaquim Ferreira dos Santos a fez em Lisboa a vinte e oito de julho de mil oitocentos anos.»31 As coutadas A caça desde os primórdios da nossa nacionalidade, ocupou um estatuto relevante junto dos nossos monarcas. Esta atividade era levada a efeito em zonas privilegiadas apelidadas de coutadas reais de caça. As coutadas de caça existiam enquanto espaço régio particular dedicado à prática daquela atividade, havia uma forte legislação para controlar e conservar os recursos naturais, cinegéticos e florestais das coutadas:
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Magos «O regimento velho e o novo aplicavam-se a quem caçasse perdizes, lebres, coelhos ou outra veação e em sua casa agasalhasse qualquer pessoa achada a caçar ou desviado do caminho com besta, lança e espingarda, cães ou outro ardil e artifício para caçar; e outrossim quem cortasse madeira e lenha ou painço verde sem licença, arrancasse torga, casca, cortiça e cepa e as fizesse em cinza ou carvão, largasse fogo e pusesse malhada de gado a pastar, pescasse nos tempos de defesos nas coutadas da vila de Muge. Também o regimento e o novo tratavam nas demarcações das coutadas da vila de Salvaterra e da pena e castigo a aplicar a quem caçasse perdizes, lebres, coelhos ou monteasse porcos, veados e qualquer outra veação ou não cumprisse e fizesse o contrário do que nelas se continham nos tempos de defeso.» 32 Em finais do séc. XVIII, com a acentuada presença da família real em Salvaterra de Magos, era necessário manter a proteção das espécies cinegéticas e a limpeza das matas e por isso é usual encontrar ordens do Monteiro-Mor a autorizar a limpeza das matas: Registo de ordem para a rama do Pinhal desta villa de Salvaterra de dez de junho de mil settecentos setenta e sette anos = Fernando Joze de Mello Gentil Homem da Camara da Raynha e a Nossa Senhora e Monteiro Mor do Reino V.ª mando o Juiz da Coutada da villa de Salvaterra que o João de Faria e Moço do Monte da mesma Coutada deixe limpar o Pinhal da dita villa aproveitem da sua limpeza delle fazendo com a dita limpeza e derrama em beneficio do Pinhal visto que ha quatro anos não he limpo. Por Sua Magestade
A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1798 - 1802, fl. 161v José Estevam, Anais de Salvaterra de Magos. Dados históricos desde o século XIV, Lisboa, Edições de Couto Martins, 1959, p. 40
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Magos afim o ordenar o que cumpre. Joze Francisco settecentos setenta e sette na falta de escrevam do da Costa o faz em Lisboa a dez de Junho de mil Monteiro Mor do Reino com sobredita.» 33
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Figura 9 - Registo para se realizar uma feira em Salvaterra de Magos - 1800 - A.H.M.S.M. - Livro de registos 1798 - 1802 33
AHMSM - Livro de Registo de cartas, avisos e licenças das Coutadas – 1775 – 1800, fl. 16-16v
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Figura 10 - Carta Geográfica das Montarias da vila de Santarém - 1775
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Magos 4 | Análise das Posturas Municipais de 1779
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As posturas municipais, são normas de regulamentação de um concelho, são feitas pelo poder concelhio e são exaradas em livro próprio e designadas de livro de posturas. São consideradas uma fonte histórica para perceber aspetos económicos, sociais e históricos de um concelho, nelas são determinados o funcionamento e as necessidades de um município: (…) sendo feitas em órgãos como o concelho ou a Câmara e respondendo à necessidade especificas de cada município, em matérias vitais do bem comum, como o abastecimento alimentar, o comércio, a produção artesanal, os preços, os salários, a regulação dos pesos e medidas, a saúde e sanidade urbanas, a utilização dos bens comuns do concelho, tais como baldios, rossios, pastos, bosques e águas, a conservação do património edificado pelo concelho tais como calçadas, pontes, muros, fontes e poços, a defesa da propriedade e das culturas agrícolas dos seus moradores.»34 Foram dois os livros de posturas municipais de Salvaterra de Magos analisados:livros de posturas dos anos de 1779 e 1795, o nosso estudo deu mais ênfase ao primeiro datado de 1779, dado que as posturas depois repetem-se em 1795, com exceção dos regulamentos dos ofícios que está mais elaborado e mais completo no livro de 1795 e que será objeto da nossa investigação. Nas posturas municipais de 1779, verificam-se várias posições que regulamentam a economia agrícola,
exigem a necessidade de se aferirem os pesos e medidas, controlam o abastecimento dos produtos, determinam a forma como devem ser vendidos, o mesmo se passa em relação aos animais, os cuidados a ter na sua circulação e a salvaguarda dos campos agrícolas da destruição dos animais. De forma a fiscalizar o comércio de produtos e evitar enganos para os compradores, era proibido vender com pesos diminutos e era obrigatório a aferição destes pesos e medidas: «Postura 61 - medidas e pesos deminutas Acordão e fizeram postura que toda a pessoa que pezasse com medidas com pezo ou medidas deminutas sendo apanhado na delicto comprovando se pagara de penna seis mil reis.»35 «Postura 80 - que não meçam senão por medidas aferidas Acordão e fizeram postura que todas as pessoas que houveram de pezar e medir o não poderão fazer sem ser por medidas e pezos aferidos pela padrão desta camara com penna de tres mil reis e trez dias de cadeya.»36 A economia rural era a grande base económica do concelho e da qual dependia a subsistência da população local. Nesta economia agrária existia uma interdependência entre a agricultura e a pecuária, os animais eram essenciais à vida agrícola: produziam estrume para a fertilização das terras, auxiliavam na lavoura e no transporte dos bens alimentares.
Mário Viana, «Posturas Municipais Portuguesas: uma Introdução», In Posturas da Câmara da Horta (1603-1886), Horta, CM. Da Horta / Núcleo Cultural da Horta, 2010, p. 14 35 A.H.M.S.M., Livro de Posturas 1779, fl. 9 – 9v 36 Idem, fl. 12 34
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A utilização de animais exigia uma licença da Câmara Municipal: «Postura 6 - que ninguém uza bestas e gados Acordão e fizeram postura que ninguém posa usar de bestas e gados sem licença de seus donos com pena de dous mil reis.» 37 Os animais só poderiam circular dentro da vila com chocalhos, e ainda tinham de ter cabrestos e os condutores não podiam andar em cima do carro, mas sim à frente do carro de bois: «Postura 8 - chocalhos e cabrestos e boys e andarem ensima dos carros Acordão e fizeram postura que nenhum sinjaleyro desta villa para dentro traga os boys sem cabrestos nem elles nem os criados andaram em sima dos carros nem tragão os boys sem chocalhos pello damno que fizerem sob pena de mil reis todo o que trouxer os boys sem chocalhos.» 38 «Postura 101 - sobre qualquer carreiro for em sima do carro Acordão que nenhum carreiro va em sima do carro por dentro da villa mas sim adiante dos bois, fazendo o contrario ter pena de duzentos reis.» 39 A alimentação dos animais obedecia a certas regras, não se podiam alimentá-los nas ruas ou praças da vila, e os palheiros não deveriam estar dentro da vila: «Postura 9 - palheyros na villa e dar de comer aos boys nas ruas e praças Acordão e fizeram postura que nenhum pode fazer Idem, fl. 1v Idem, fl. 1v 39 Idem, fl. 15v 40 Idem, fl. 1v 41 Idem, fl. 13 42 Idem, fl. 6v 37 38
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Magos palheyros dentro desta villa nem darem de comer aos boys e bestas nas praças e ruas desta sob penna de mil reis que darem de comer aos gados os que fizerem palheyros seis mil reis por cada hum.»40 Aos cingeleiros era exigido uma licença que tiravam na Câmara Municipal, para desempenhar este ofício: «Postura 87 - sobre os sinjaleiros que tirem licença Acordão que todos os sinjaleiros desta villa e seu termo que tirem licença da camara ainda que não andem a frete por tudo na forma de rezolução de Sua Majestade do anno mil settecentos e sincoenta e trez em que se acha registado, e todo o que o contrário fizer tera de penna quinhentos reis.»41 O controlo e exploração dos produtos agrícolas, era fiscalizado pela Câmara Municipal, para o efeito requeria-se uma autorização da edilidade para vender estes produtos para fora do termo: «Postura 41 - terra fechadas Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa possa tirar desta villa e seu termo sem licença da Camara pão trigo e senteyo sevada e milho e todo o género de legumes nem ainda carne vacas e boys nem nenhum género de gado groso ou miúdo sera galinhas frangos nem nenhuma cabra nem azeite para fora da villa e seu termo e somente os lavradores poderão ir vender as novidades da sua lavoura de que quiserem a estes sob penna de seis mil reis tanto os de fora como da vila e termo.»42
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Figura 11 - Cingeleiro à frente da junta de bois tal como constava nas posturas do século XVIII (década de 40 séc. XX)
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Os lavradores de fora do termo de Salvaterra, não podiam arrendar terras: «Postura 49 - que os lavradores de fora não venham arrendar terras Acordão e fizeram postura que nenhuma pesssoa que não for morador nesta terra, villa e seu termo possa vir arendar terras algumas no campo desta villa salve quando os moradores as não mester porque necessitando elles dellas as lavrarão pagando aos senhores o mesmo que os de fora sob penna de pagara o lavrador assim as vier lavrar por cada vez que fora achado lavrando as ou semeando as digo lavrar seis mil reis por cada ves que for achado lavrando ou semeando ou mandando as lavrar ou semear com uso dellas.»43 A necessidade de mão de obra agrícola, estava sujeita a normas apertados, os campos necessitavam de braços de trabalho e por isso as posturas impediam que os trabalhadores locais fossem trabalhar para fora do termo de Salvaterra de Magos: «Postura 54 - que senão levem trabalhadores para fora da terra Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa de fora venha a esta terra e seu termo buscar gente de trabalho para a levar para fora deste nem para o ditto efeyto lhe falte nenhuma pessoa desta villa e seu termo penna de tres mil reis e trinta dias de cadeya.»44 A renumeração dos trabalhadores obedecia a certos critérios, os seareiros não podiam pagar mais
Idem, fl. 7v - 8 Idem, fl. 8v 45 Idem, fl. 9 46 Idem, fl. 17 47 Idem, fl. 9v - 10 43 44
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Magos que os lavradores, a renumeração também não se podia alterar depois de estar feita: «Postura 59 - que os seareyros não abrão preço Acordão e fizeram que nenhum seareyro abrisse preço a homens de trabalho nem lhe pagasse mais que os lavradores penna de tres mil reis.»45 «Postura 108 - sobre os homens de trabalho que se lhe não alterem os preços depois de estarem feito pellos lavradores Acordão que nenhum siareiro ou outra qualquer pessoa da terra ou de fora não poderá fazer preços aos homens de trabalho senão os lavradores. Nem pessoa alguma de fora podera vir buscar a esta villa os homens sendo necessários nesta villa para o trabalho dos lavradores e siareiros que estão em primeiro lugar e todo o que fizer o contrario em qualquer das duas couzas se declarão terão de pena quatro mil reis e vinte dias de cadêa.»46 Os homens que trabalhavam nas vinhas tinham de cumprir certas regras e o seu salário estava regimentado: «Postura 64 - Sallario dos homens da vinha Acordão e fizeram postura que nenhum cavador das vinhas possa ganhar de seu jornal por dia possa ganhar digo por dia mais de cento e sincoenta reis e que não possa trazer para caza sepas nem vides e nas cavas e mergolhias não levem mais de cento e sincoenta reis tudo a seco sob penna de mil reis e que também encorrerão os que duvidem trabalhar pelo ditto preço alem de que sempre serão obrigados os que tiverem officio.»47
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Figura 12 - Livro de Posturas 1779
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Figura 13 e 14 - Cingeleiros Salvaterra de Magos - décadas de 40 e 50 (séc.XX)
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Durante as colheitas os pardais eram uma preocupação pelos danos que podiam fazer nas searas, por isso surge uma postura que determina que cada pessoa da vila, era obrigado até ao fim de maio, trazer uma dúzia de pardais à Câmara: «Postura 31 - dos pardaes Acordão e fizeram postura que todas as pessoas desta villa e seu termo athe o fim de Mayo de cada hum anos sejão obrigados a trazer a Camara huma dúzia de pardais sob penna de quinhentos reis.»48 «Postura 52 - que o rendeyro devera executar a postura dos pardaes Acordão e fizeram postura que o rendeyo deve executar a postura dos pardaes tendo cuidados os que cumprem e fazendo em coimas.»49 O transporte dos produtos agrícolas era feito por animais, e ao entrarem na vila tinham de ser pela arreata, ou seja por uma corda que se liga ao cabresto do animal:
da villa, so sim a levara a besta pella ariatta quer seja carregada ou descarregada tera de penna se o contrario fizer duzentos reis.»50 Certos animais no tempo das colheitas não podiam andar livremente pelos campos, uma postura interditava patos nas searas e nas eiras, e o mesmo se atribuía às colmeias que não podiam estar dentro da vila: «Postura 81 q-ue não andem pattos nas siaras nem nas eyras sem guardados Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa desta villa e seu termo traga pattos sem guardados se forem achados nas siaras ou nas eyras sem o dito guardador pagara o dono de comdemnação por cada cabeça duzentos reis, e sendo achados segunda ves sera a pena dobrada e sendo achados terceira ves serão tomados por perdidos para o concelho.»51 «Postura 64 - colmeyas nos quintais a huma legoa fora ao redor da villa «Postura 92 - sobre os orteloens que vierem a ven- Acordão e fizeram postura que não estejam colder ortallice com cangalhas que venha com a besta meyas nos quintaes nem athe huma legoa a redor pella ariatta da villa em qualquer numero que for penna de mil Acordão que os orteloens que vierem a esta villa reis he doas colmeyas a dois mil reis e deste nucom ortaliça em cangalhas, ou que traga outra qual- mero para asima e de lhe serem postas fora a sua quer cousa, não poderão andar a cavallo dentro custa.»52
Idem, fl. 5 Idem,fl. 8 50 Idem, fl. 14 51 Idem, fl. 12v 52 Idem, fl. 10 48 49
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A comercialização dos produtos agrícolas exigia o controlo do preço e impedia a sua revenda: «Postura 23 - que se não atravessem frutas e ovos Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa atravesse fruta para revender aos arráteis nem ovos nem se vendão por mais de sinco reis cada hum com penna de quinhentos reis.»53 A vinicultura e o vinho desempenharam um papel importante na sociedade portuguesa, o vinho além do seu uso em cerimónias religiosas, era muito consumido às refeições e nas tabernas, que eram locais de sociabilidade e lazer. As posturas municipais regulamentavam a sua qualidade, a forma como era armazenado e a sua venda. O vinho estava sujeito a um preço estipulado: «Postura 14.º vendagem por cada pipa de vinho Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa que vender vinho de vendagem possar levar mais de oitocentos reis a dois almudes do que tras por cada pipa penna de mil reis ao taverneyro e o que pagar o mesmo por reforma de 25 de dezembro de 1760 e que ninguém compre para tornar a vender sem almotaçar penna de dous mil reis que também encorrera as pessoas que acostumão vender com as quiserem vender pello dito salario.»54 A venda do vinho só podia acontecer mediante uma licença que era concedida; «Postura 71 - vinho para venda Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa
Idem, fl. 4v Idem, fl. 3 55 Idem, fl. 11 56 Idem, fl. 12v 57 Idem, fl. 13 53
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Magos das que costumam vender vinho o possam comprar para o tornar a vender antes debayxo da licença geral se lhe conceda serão obrigados a vender dos lavradores preferindo preços da governança se lhe concedera licença para comprarem nenhum para revender penna de seis mil reis.»55 O armazenamento do vinho tinha de ser em vasilhas e não em odres, que era um recipiente feito em pele de animal: «Postura 82 - que tenhão vinho em odres os taverneiros ou quem o vender Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa que vender vinho não o tenha em odres mas sim em vazilheiros de pao e todo o que fizer o contrário tera a pena de quinhentos reis por cada ves que for achado.»56 A qualidade do vinho era importante, estava proibido o vinho que estivesse avinagrado, a sua venda não podia ser diminuta, e era feita por medidas aferidas: «Postura 88 - sobre os que vendem vinho e se lho acharem avinagrado Acordão que toda a pessoa que vender vinho nesta villa e seu termo não vendão vinho avinagrado que fazendo o contrário terá de penna quinhentos reis.» 57 «Postura 93 - sobre os que venderem vinho pello miúdo depois de o ter medido achando se deminutto
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Acordão que toda a pessoa que vender nesta villa e seu termo vinho pello miúdo, achando-se o dito vinho já medido ao Povo demenutto, ou qualquer pessoa que se queixe com duas testemunhas, pagara o dobro p.ª que o leva diminuto e terá de penna dous mil reis pagos de cadea.» 58 «Postura 94 - sobre os que vendem vinho que o meção em sima do fonil Acordão que toda a pessoa que vender vinho nesta villa e seu termo o midirão em sima do fonil fazendo o contrário terá de penna duzentos reis.» 59 «Postura 95 - sobre os que venderem vinho e aguardente que seja pellas medidas e não por copos Acordão que toda a pessoa nesta villa e seu termo que vender vinho e aguardente que seja medido pellas medidas aferidas e não por copos que fazendo o contrario terá de penna quinhentos reis e achando se furto terá de pena seis mil reis.» 60 Eram proibidos jogos nas tabernas, de forma a evitar desordens e escaramuças: «Postura 65 - jogos nas tavernas Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa que vender vinho e dar de comer ou tiver tenda não de ou consinta sem sua caza jogos de cartas ou laranginhas e outros alguns com penna de dois mil reis aos dono da caza os jugadores outo dias de cadeya.» 61 O quotidiano da vila estava sujeito a regras, ao nível da higiene e salubridade, as posturas determinavam
a conservação de fontes e chafarizes, a necessidade de evitar o lixo e as imundices, assim como a limpeza das ruas e praças. As posturas municipais eram muito rigorosas com a criação de porcos, era necessário o registo dos animais na Câmara, o seu abate e venda da carne também carecia de uma licença municipal e os porcos não podiam dormir na vila, pelos danos que causavam à saúde pública: «Postura 34 - criar vender ou andar porcos pellas ruas sem licença da Camara Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa crie porcos em suas cazas ou quintaes sem os registar na Camara declarando donde virão e a quem os comprarão e os que registarem os não possam matar nem vender sem licença da Camara com penna de quinhentos reis.» 62 Postura 44 - não durmão porcos na villa Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa meta porcos na villa a dormir pello damno que cauzão a saúde com penna de quatro mil reis ao dono e aos pastor mil reis.» 63 «Postura 76 - Porcos pella fazendas e ruas Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa deyxe andar porcos pelas ruas ainda que sejão pequenos penna quinhentos reis e se forem as fazen das so poderão os donos destas livremente matar das so poderão os donos destas livremente matar e avizar os donos dos porcos para os aproveitar.»64
Idem, fl.14 Idem, fl. 14-14v 60 Idem, fl. 14v 61 Idem, fl. 10 62 Idem, fl. 5v 63 Idem, fl. 7 64 Idem, fl.11v 58 59
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Era proibido lavar roupa nos poços e tanques das fontes: «Postura 12 - que se não lave roupa nos poços Acordão e fizeram postura que nenhuma poderá lavar roupa nos poços ou tanques das fontes salvo trinta poços arrendados tirando agoas levando a em potes ou alguidares sob pena de quinhentos reis.»65 As ruas deviam estar limpas, sem lixo, desimpedidas sem obstáculos e era interdito estender roupa, nas ruas e travessas exceto os seus vizinhos: «Postura 13 - limpeza de ruas e praças Acordão e fizeram postura que nenhuma suje à frente de sua porta sem deytar licho nas ruas praças ou travessas sob pena de quinhentos reis.»66 «Postura 15 - carros nas ruas Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa ponha nem mande por carro nas ruas, patheos ou em travessas e praças nem estendão roupa nas praças salvo os vizinhos dellas sob penna de quinhentos reis.» 67 «Postura 48 - travessa de fronte da Mizericordia Acordão e fizeram postura que na Travessa defronte da porta da Mizericordia N. Sr.a da Conceição estejão carros palha nem se fizessem monturos penna de quinhentos reis a cada pessoa que deytar o lixo ou puzer carros.»68 «Postura 50 - licho ao pé das casas da camara e mais partes da Praça della Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa Idem, fl.2v Idem, fl.2v 67 Idem, fl.3 68 Idem, fl.7v 69 Idem, fl. 8 70 Idem, fl. 1 71 Idem, fl. 2 65 66
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Magos deyte licho ao pé das cazas da camara e mais partes da praça della com penna de seis mil reis.»69 O peixe era outro produto apreciado pela população de Salvaterra de Magos, a proximidade ao rio Tejo, rico em várias espécies piscícolas, contribuía para o seu consumo na alimentação. As posturas municipais regulamentavam a sua qualidade, local de venda, o seu abastecimento à vila, penalizavam abusos, zelavam pela higiene entre outros aspetos. Nenhum pescador ou seu criado podia levar mantimentos da vila sem primeiro deixar peixe para consumo local: «Postura 4 - pescadores que levão mantimentos sem trazer peyxe Acordão e fizeram postura que nenhum pescador nem seos criados levam mantimentos deste Povo sem trazerem peyxe para provimento delle com pena de duzentos reis.»70 A venda do pescado estava sujeito a uma licença passada pelo almotacé ou pela Câmara Municipal: «Postura 10 - comprar peyxe para se vender sem licença Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa por sy nem por outrem posa comprar peixe que vier vender a esta villa para tornar a vender sem licença dos almotacês os quais não poderão dar se não por de avio ao povo sob penna de dois mil reis e trinta dias as portas de vender fechadas.» 71
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«Postura 35 - que os almocreves não venham comprar peyxe sem licença da Camara ou trazerem carga Acordão e fizeram postura que nenhum almocreve que vier de fora ao districto desta villa comprar peyxe e possa fazer sem licença da camara a qual se lhe não dará senão trazendo carga que não vendessem os pescadores sem licença da Camara digo sem licença sob penna de mil reis pagar de cadeya tanto os pescadores como os almocreves.» 72 Certas espécies de peixe, nomeadamente o sável tinham que ter uma bitola, cujas dimensões eram dadas pela Câmara Municipal: «Postura 28 - pescadores de bitola Acordão e fizeram postura os pescadores tanto desta villa como de fora dellla que costumão pescar saveis fizessem postas de bitola que lhe se dada pella Camara para venderem ao Povo penna de mil reis.» 73 Os regatões eram vendedores ambulantes, que vendiam peixe, o termo regatões advém de estarem sempre a regatear o preço do pescado. «Postura 66 - que os regatoens conduzão peyxe Acordão e fizeram postura que se não conceda licença a nenhum regatão assim da vila como do termo sem que primeiro se obrigue na camara ao provimento de peyxe de Setubal há semana ou semanas que lhes tocarem por distribuição e cazo que faltem ou sem licença uzem deste tracto e serão condenados a seis mil reis.»74
Idem, fl. 5v - 6 Idem, fl. 4v 74 Idem, fl. 10v 75 Idem, fl. 12 76 Idem, fl.13v 72 73
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Magos O local para venda era a Praça do Pelourinho: «Postura 77 - nenhum pescador de agua doce venda peyxe fora da praça do Pellourinho da villa Acordão e fizeram postura que nenhum pescador de agoa doce venda peyxe senão na praça e Pellourinho desta villa com penna de mil reis ao que o contrário cobrar pella primeyra ves e pella segunda dois mil reis pagas de cadeya ao arbitro da Camara para quem sera a comdemnação.»75 A venda e o consumo de carne, tinha a seu cargo várias regras estipuladas pelas posturas municipais, a higiene nos açougues, a qualidade das rês abatidas pelos marchantes entre outros aspetos regimentavam este produto alimentar, fundamental na subsistência da comunidade local. A carne não podia ser diminuta no peso: «Postura 90 – sobre os cortadores achando-se a carne demenuta Acordão que o cortador ou quem pezar a carne no asougue desta villa não dê carne demenutta no pezo que fizer ao Povo, e achando-se em autto de correição, a dita carne demenutta ou qualquer pessoa que se queixe dando duas testemunhas pagara o tres dobro p.º quem a levara demenutta e tera de penna seis mil reis, pagos de cadêa.»76 O marchante deveria aferir três vezes ao ano os pesos do açougue: «Postura 96 - sobre o marxante aferir tres vezes no anno os pezos do asougue Acordão que o marxante que arrematar as carnes
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sera obrigado a aferir os pezos tres vezes no anno, a primeira aferição sera no ultimo de janeiro, a segunda sera no ultimo de abril digo de maio e a terceira no ultimo de setembro, e fazendo o contrario terá de penna mil reis pagos de cadêa.» 77 O controlo da carne para venda também era regulamentado: «Sobre os marxante vender cabra por capado e vaca ruim Acordão que qualquer marxante que almotaçar as carnes do asougue desta villa que não vendem cabra por capado nem vendão vaca morranhoza que fazendo o contrario tera de penna seis mil reis e vinte dias de cadêa.»78 O Cais da Vala, foi durante séculos a principal porta de saída e entrada de mercadorias, era através da via fluvial que se escoavam os produtos, dado que a rede viária em Portugal do séc. XVIII era muito deficiente, por isso os rios eram designados as “estradas líquidas”. As posturas municipais determinaram o embarque e desembarque das mercadorias e dos passageiros: «Postura 36- que os barcos vão aportar a Ribeyra a esperar pellos passageiros Acordão e fizeram postura que os barcos que forem de carreyra vão directamente portar na Ribeyra de Lisboa a deytarem passageiros pellas as quais esperarão querendo estas vir na mare em que o barco houver de partir tudo sob pena de dois mil reis que será comdemnado pellos juramentos dos passageiros.»
«Postura 37 - que nenhum barco tome carga alguma ao que estiver de carreyra Acordão e fizeram postura que estando algum barco de carreyra nenhum outro seja tão uzado de que se tem a thomar couza alguma de fretes passageiros com penna de mil reis.»79 Os arrais das embarcações deviam entregar tudo o que recebiam nos barcos: «Postura 46 - os barqueiros entreguem o que recebem para seus barcos Acordão e fizeram postura que os arrais dos barcos desta villa sejam obrigados a entregar todo o que recebem para os seus barcos ainda que seja aos companheiros pois elles os approvão para o que bastara o juramento das partes e que sirva a ley das pessoas e de governação para Lisboa tudo sob penna de dois mil reis.»80 Os barcos ou bateiras fora da vila não podiam carregar mercadorias sem a licença da Câmara Municipal: «Postura 51 - não carregarão barcos nem bateyras sem licença da Camara Acordão e fizeram postura que nenhum barco nem bateyra de fora desta villa possa vir carregar a ella sem licença da Camara penna de mil reis e dez dias de cadeya e a licença sem as poderá conceder senão p.ª palhas e frutas.»81 As taxas aplicadas aos barcos e o valor dos fretes de algumas mercadorias também estavam exaradas nas posturas municipais:
Idem, fl. 14 Idem.fl. 17v 79 Idem. fl. 6 80 Idem, fl. 7 – 7v 81 Idem,fl. 8 77 78
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Figura 16 - Livro de Posturas 1779
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«Postura 53 - que os barqueiros observem o seu regimento Acordão e fizeram postura como Arrais dos barcos e bateyras desta villa que todas as vezes que hum barco grande tirar de tres mil reis de frete ou bateyra dois mil reis de frete serão obrigados a hir logo para Lisboa não os impedindo o tempo e não excedão a tacha que se lhe declara no seu regimento com penna de dois mil reis.»82 «Postura 56 - barqueiros que levão mais da tacha Acordão e fizeram postura que todo o barqueiro que levasse mães de taxa perdesse a carreyra p.ª o barco que se lhe seguisse e se lhe não restituísse por nenhum respeyto e a servisse pagaria seis mil reis de comdemnação.»83 «Postura 57 - fretes de pannos de palha Acordão e fizeram postura que nenhum barqueiro levasse de condição de cada panno de palha desta villa para a cidade de Lisboa mais de cincoente reis sendo de empreitada sessenta reis penna de seis mil euros.»84 «Postura 62 - frete de fruta Acordão e fizeram postura que nenhum barqueiro desta villa ou de fora della possa levar de frete por cada camada de fruta mais de duzentos e oitenta reis, penna de mil reis.»85 Os cereais constituíam a base alimentar popular
em finais do séc. XVIII, nos livros de Posturas Municipais, aparecem várias normas sobre os moleiros, atafoneiros, venda de farinha e pão. A criação de galinhas, pombos ou porcos era proibida em casa ou quintais dos moleiros e atafoneiros, de forma evitar falta de condições de higiene e salubridade: «Postura 1- Athofaneiras Acordão e fizerão postura que nenhum athofaneyro nem moleyro posa criar nem trazer em sua caza nem quintais galinhas, pombos ou porcos com pena de quinhentos reis por cada cousa.»86 O valor dos cereais a levar para os moinhos ou azenhas estava estipulado, assim como as medidas: «Postura 3 - dos que carregão pão para asenhas Acordão e fizeram postura que todas as pessoas que acarretar pão pª asenhas e moynhos não poderão levar mais de hum vintém por cada alqueire do seu sallario sob pena de quinhentos reis.»87 «Postura 30 - que os athafoneyros e molleyros de medida prefeyta Acordão e fizeram postura que os athafoneyros e molleyros desta villa e seu termo sejão obrigados a dar a medida prefeyta e feytas as farinhas dentro de tres dias depois da entrega do pão sob penna de dois mil reis e sem da demenuição que faltar.»88
Idem, fl. 8v Idem, fl. 8v 84 Idem, fl. 8v- 9 85 Idem, fl. 9v 86 Idem, fl. 1 87 Idem, fl. 1 88 Idem, fl. 5 82 83
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
As posturas também regulamentavam a maquia dos moleiros: «Postura 78 - que as maquias tem os moleyros Acordão e fizeram postura que nenhum molleyro podesse levar de maquia por cada saco de pão do que meyo alqueire com penna de tres mil reis por cada ves que fosse achado a vender mais.»89 Os tipos de pão que os padeiros deviam fazer: «Postura 83 - que todo o padeiro tenha pão de des reis Acordão que todo o padeiro desta villa quem fizera pão que fora também pão de des reis, não o fazendo terá de penna duzentos reis.»90 Para a venda da farinha era obrigatório uma licença: «Postura 89 - sobre os que tem logea de merceraria e as mulheres forem padeiras os que vendão na dita logea farinha Acordão que toda a logea de mercearia nesta villa e seu termo que as suas molheres forem padeiras que tirem licença separadas ou ainda nas sobreditas logeas vendão farinha, tera a mesma obrigação de a tirar a d.ª licença separada em nome diferentes sem embargo de ter tudo na mesma caza, e tudo o que fizer o contrário terá de penna quinhentos reis.»91 «Postura 98 - sobre os que vendem farinhas que tirem licença Acordão que toda a pessoa que vender farinha nesta villa e seu termo serão obrigados a tirar licença da Camara e não o fazendo terá pena de quinhentos reis.»92 Idem, fl. 12 Idem, fl. 12v 91 Idem, fl.13v 92 Idem, fl. 15 93 Idem, fl.15v 94 Idem, fl. 3 89 90
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Magos Os moinhos desta vila e seu termo deviam moer primeiro a farinha dos seus moradores e só depois às pessoas de fora: «Postura 100 - sobre os moinhos de vento pertencentes a esta villa que não façam farinhas p.º fora do termo sem primeiro fazer os da villa Acordão que os moinhos pertencentes a esta villa e seu termo, não façam farinhas para as pessoas de fora do termo, fazendo primeiro aos que são moradores nesta villa e seu termo e fazendo o contrario terá de pena dous mil reis pagos de cadêa.»93 As posturas municipais também visavam os jogos, os bons costumes, a segurança e a entrada na vila de Salvaterra de Magos de pessoas de fora ou extravagantes, ou seja, pessoas fora do comum. Era proibido homens e mulheres solteiras arrendar casas a extravagantes, e nenhuma pessoa de fora poderia morar na vila, sem ter licença da Câmara para averiguar a sua “qualidade”: «Postura 16- que se não arendem casas a extravagantes Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa homens ou mulheres soltheyros possam arrendar cazas a extravagantes com pena de mil reis.»94 «Postura 18 - que ninguém venha morar a esta villa sem licença da Camara Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa de fora possa vir morar a esta villa sem licença da Camara para se averiguar que qualidade de gente
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he penna de mil reis e incorrera a pessoa que lhes arendar sem licença da Camara.»95 Sobre os jogos, estipula-se que alguns jogos apenas se façam em dias santos ou domingos e outros estão proibidos: «Postura 19 - que oficiais mecânicos não joguem fora dos dias santos Acordão e fizeram postura que os mancebos de solda nem jornaleyros possam jogar a bolla nem outro jogo nem os oficiais mecânicos nos dias da semana e somente aos Domingos e dias Santos so poderão divertir penna de quinhentos reis.»96 «Postura 79 - da bilharda Acordão e fizeram postura que nenhum rapaz ou homem desta villa possa jogar guinêa e bilhar de tudo sob penna de quinhentos reis e tres dias de cadeya se seus pais sabendo dos ditos jogos não os castigarem ficarão incursos nas mesma penna.»97 A nível de segurança e para evitar desacatos era proibido entrar na vila com lanças, dardos ou cachamorras, era ainda proibido aos pastores a sua permanência na vila exceto para assistir a missas: «Postura 17 - trazer lanças, dardos ou chachamorras Acordão e fizeram postura que nenhuma pessoa ou pastor possa usar ou trazer nesta villa lanças zaganchas dardos ou cachamorras grandes penna de quinhentos reis.»98
«Postura 32 - que não venham a villa criados de soldada Acordão e fizeram postura que todos os criados de lavoura ou pastores de gado grossos como miúdos não podem vir a esta villa nem andar nella se não virem ouvir missa ou buscar o seu sustento sob penna de mil reis.»99 Durante a realização de festividades, havia largada de touros e muitas pessoas subiam para os telhados das casas, as posturas impediam este ato, com exceção dos donos da casa: «Postura 73 - festejos dos telhados da praça Acordão e fizeram postura que dos telhados da praça vir touros não sendo seus donos pague quinhentos reis.»100 Em relação ao comércio, as posturas municipais interditam o “atravessamento” de certas mercadorias, estas deveriam estar primeiro à disposição do povo de Salvaterra de Magos e só depois é que podiam ser vendidas para fora: «Postura 106 - sobre os que atravessa a cal telha e tejolo Acordão que nenhum mestre pedreiro ou de carpinteiro o outro qualquer pessoa compre cal telha e tejolo sem que primeiro esteja tres dias no Porto da Valla a vender ao Povo para cada hum o comprar para as obras de suas cazas e fazendo o contrario tera de penna seis mil reis o que comprar.»101
Idem, fl.3v Idem, fl.3v 97 Idem, fl. 12 98 Idem, fl. 3-3v 99 Idem, fl.5-5v 100 Idem, fl.11 101 Idem, fl. 16v 95 96
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
«Postura 107 - sobre os que atravessam os mantimentos e sal e louça Acordão que toda a pessoa de qualidade alguma atravessa qualquer qualidade de mantimentos que venha vender nesta villa sem que primeiro esteja tres dias ao Povo. Como tambem o sal e louça e todo o que fizer o contrario tera de penna seis mil reis o que comprar.» 102 As posturas também determinam os salários de certos ofícios como era o caso dos pedreiros e dos carpinteiros: «Postura 63 - sallario dos pedreyros e carpinteyros Acordão e fizeram postura que os officiaes de pedreyro e carpinteyro e seus serventes não levassem mais sallario que os seguintes a saber os officiais de pedreyro de Abril athé ao ultimo dia de Setembro trezentos reis e os servente duzentos reis como mais tempo levara os mestres duzentos e quarenta reis e os serventes cento e sincoenta reis. Indo trabalhar ao termo aonde não são moradores no primeyro tempo desta postura levarão os mestres trezentos reis o que levar mais de concertar fornos nos ditos tempos desta asima declarada sob a dita penna não digo declarada pagarás mais quinhentos reis. Sob a mesma penna ganhara mais os aprendizes do que metade do que ganhão os Mestres.»103
Idem, fl. 17 Idem, fl. 9v 104 A.H.M.S.M. - Livro de corridas 1782 - 1807, fl. 15 105 Idem - fl.15 106 Idem - fl.15 102 103
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Magos As posturas municipais de Salvaterra de Magos, são um manancial de informação para o enriquecimento da história local, através delas conseguimos descorar como era o quotidiano desta vila e seu termo em finais do séc. XVIII. Nem sempre as posturas eram respeitadas, e por isso cabia à Câmara Municipal fiscalizar o cumprimento das posturas, e quem estivesse em incumprimento era autuado. As coimas eram registadas em livro próprios designados de livros de corrida ou de correições. Nas corridas, ou correições participavam os vereadores, o procurador e o escrivão da Câmara, que mensalmente percorriam o concelho, verificando se as posturas municipais estavam a ser cumpridas, levantando coimas sempre que tal não acontecia. Alguns exemplos de não cumprimento das posturas municipais: 1784 - Maria Joaquina hum porco solto, pelas ruas condemnada em quinhentos reis. 104 - Luiz Joze sem licença de vender vinho condemnado em quinhentos reis. 105 - Vicente da Silva sem licença e escripto de aferição sem escripto de almotaçaria condenado pellas faltas de licença quinhentos reis, pello escripto de aferição duzentos reis, faz tudo mil settecentos reis.106
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- Vicente Rebello por ter vinho em odre contra as posturas condemnado em quinhentos reis. Fl. 16v - António Dias por hir em sima do carro pellas ruas contra as posturas condemnado em quinhentos reis. 107 1786 - João António Thexeira por se lhe achar hum pezo de bronze de meyo arratel com diminuição de sinco oitavas e não se achar aferido, condemnado em dous mil reis.108 - Joze António Fernandes por se lhe achar umpezo de ferro de meyoarratel com diminuição de duas oitavas, condemnado em dous mil reis. Fl. 25 - JozeAntonio Fernandes por se lhe achar quarenta e sinco bacalhaus em sua logea a vender podres emcapaz de se comer e vender-se ao Povo, e foi visto pelo médico sirgião do Partido da Camara em que declararão debaixo de juramento dos Santos Evangelhos, em que não hera capaz de se comer nem de se vender de que foi lançado ao mar, e foi condemnado em seis mil reis. 109 1794 - Francisco Rodrigues da Palhota, por fazer huma obra nas suas cazas, e meter na porta da rua dous degraus sem ter licença da Camara, para por os dittos degraus, condemnado em dous mil reis.110
1800 - Francisco de Mello condemnado em cinco tostões por falta de licença do seu officio de sapateiro. 111 - Francisco Henrique condemnado em cinco tostões por falta de licença de seu officio de carpinteiro.112 - Justino Gomes condemnado em cinco tostões por falta de licença do seu officio de barbeiro. 113 As fianças eram prestadas por “oficiais mecânicos”, ou seja, aqueles que exerciam um ofício, e que no exercício dessa profissão, ficavam sujeitos a fiança, com o intuito de salvaguardar uma eventual perda de bens com que trabalhavam. - fiança de barca - 1792 Ao primeiro dia - e Janeiro de mil setecentos e noventa e dous nesta vila de Salvaterra de Magos em escriptório de mim escrivão apareceo Manuel da Fonseca arais da barca que serve o povo desta villa e porelle me foi dito e requerido que queria hum alvará de fiança para que dava por seu fiador eprincipal pagador o Dionisio Duarte, e pello ditto fiador foi ditto que se obrigava a dar conta de tudo que lhe entregou o povo desta villa que foiçe na sua embarcação como tambem a toda a Fazenda que em Lisboa recebeu para entregar aos negociantes desta vila e juntamente por qualquer
Idem - fl.16v Idem - fl.25 109 Idem - fl. 26 110 Idem - fl. 44v 111 Idem - fl. 72 112 Idem - fl. 72 113 Idem - fl. 72 107 108
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Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII - 1775 a 1800
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pessoa do povo a que tudo se obrigava por tempo de hum ano, na falta do dito Manoel da Fonseca, que aqui obrigava todos os seus bens havido e por haver de que aqui a assignou cada arais com huma cruz a qual para constar fiz este termo.114
- licença para vender vinho 1799 Aos vinte oito dias do mez de março de mil setecentos noventa e nove nesta villa de Salvaterra de Magos, em meu escritório aparesem prezente Jose Nobre, e por elle me foi requerido que queria huma licença p.ª vender vinho, agoardente e tudo mais Fiança Serralheiro - 1796 Aos vinte dias do mez de Abril de mil setecentos e que for a bem do Povo e sua orgencia, e que queria noventa e seis, nesta villa de Salvaterra de Magos assinar termo de estar pellas posturas e acordeaos em meu escritório apareceo Joze da Cunha com do Senado da Camara, e ouvindo seu requerimende sua petição p.ª lhe passar sua licença para poder to lhe fiz a licença pedida, e o presente termo 117 que se assignou e p.ª constar fiz o presente. uzar do seu officio de serralheiro e que queria assignar termo de estar pellas posturas e acórdãos - licença para vender farinha - 1796 do Senado da Camara, e como por elles me foi re- Aos outto dias do mez de novembro de mil setquerido lhe foi aprezentado termo que assignava e tecentos e noventa e seis nesta villa de Salvaterra para constar foi apresentado termo. 115 de Magos em meu escriptório apareceo prezente Manoel Ferreira Marques filho e por elle me foi Venda de produtos - 1799 Em o primeiro de julho de mil settecentos e no- dito que queria huma licença para poder vender venta e nove nesta vila de Salvaterra de Magos em farinha e que queria assignar termo de estar pellas meu escriptório apareseu prezente Manoel Nu- posturas e acórdãos do Senado da Camara e como nes Viegas, e por elle me foi requerido que queira por elle me foi requerido lhe passei sua licença e termo de estar pellas posturas e huma licença para vender vinho, aguardente, azei- lhe foi prezente 118 acórdãos. te, vinagre e tudo mais que for o bem comum do povo e sua urgência, e que queria assignar termo - licença do cortador do Assougue - 1800 para estar pelas posturas deste senado e acardãos Aos vinte e nove dias do mez de maio de mil oitoe vendo o seu requerimento lhe fiz a licença que centos anos em o meu escriptório tomou juramenpedia, o presente termo o que assignou consigo e to dos Santos Evangelhos o cortador do Assougue eu Filippe Jorge Simões a escrevi. 116 desta villa Manoel JozeTheodoro. 119
A.H.M.S.M. - Livro de Fianças 1784 - 1874, fl. 14 Idem - fl. 28v 116 Idem - fl. 37v 117 Idem - fl. 37 118 Idem - fl.34 119 Idem - fl. 29 114 115
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Magos Cada ofício tinha um regimento com o objetivo de controlar a atividade profissional do ponto de vista técnico, por isso eram sujeitos a um exame na Câmara Municipal, de forma a garantir a qualidade e a competência no exercício da profissão. Nos regimentos também se estipulava a taxa e o valor dos serviços prestados. Vejamos alguns exemplos de regimento de diferentes profissões:
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com qualquer pertexto dar lhes donativo algum, e os donos do pão que contrariarem a estas Posturas pagara mil reias. E as forneiras ou forneiros que levarem mais dos dittos preços pellos alqueires ou tirarem a poia em pão ou receberem pitança alguma ou tirarem alguma porção de massa sera condenada em dous mil reis. De bollos fartes queijadas e mais couzas desta qualidade levarem de cada vinde hum que não seja Regimento e taxa dos forneiros o maior com pena de quinhentos reis «Acordão e fizeram o prezente Regimento que toLevara por cada lado trinta reis e excedendo a esdos os forneiros e forneiras, antes que principiem tes preços pagara quinhentos reis de condenação. a exercer seo trato, se formalizaram com os papeis Os donos dos fornos porem nelles forneiras e a necessários na forma de Postura para bem cumcarretadores, e que sejam abonados para poderem prirem suas obrigações e segurança a importância pagar as partes a perda que lhe cauzarem e não das condenaçõens das coimas que lhe forem feio fazendo assim pagaram os donos como fiadores tas, e asignarão termo de estarem pellas posturas das sobreditas forneiras e acarretadores das pere acordarãos as leis do senado. das mencionadas. Serão obrigados a cozer bem o pão tanto as paQuerendo as forneiras sahir dos fornos se despedeiras, como as cazeiras e achando-se mal cozido, diram quinze dias antes aos donos delles perante queimado ou incapaz de se deitar, ou por outro testemunhas obrando o contrário pagaram a perda qualquer motivo e que tenha dado couza as mesque cauzarem aos referidos donos e serão condemas forneiras pagarão aos donos a perda e paganados em quinhentos reis. rão de condenação quinhentos reis. O prezente Regimento terá porgado na logea em Não cozerão pão as padeiras que tenha mao cheipartes e de modo que de todos possa ser visto ro, com pena de mil reis metade para o denunciancom pena de dez tostões.»120 te e outra para o concelho, e debaixo da mesma pena incorrerão os que tiverem dous fornos arrendados tendo hum fechado o que somente devem ter huns fornos. Nem cozeiras nem padeiras poderão dar e pagar as forneiras apoiem pão mas sempre e será em dinheiro a razão de trinta reis por alqueire de trigo e milho ou mistura sem outra pitança nem poderão
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AHMSM - Livro de Posturas 1795 - 1858, fls. 36-37
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Regimento e taxas de Moleiros «Acordarão que nenhum Moleiro nem atafoneiro uzaram de seu oficio sem primeiro haver da Camara licença e juramento e Regimento com Carta de Exzaminação e fiança na forma determinada, aos officiaes mecânicos com alugeição das penas a elles impostas e com as mesmas serão obrigados os carreteiros dos moleiros a darem fiança e juramento. Não aseitarão os moleiros e carreteiros, as padeiras e farinheiros, trigo nem outro grão algum que não seja limpo e escolhido sob pena de mil reis. O trigo e mais grãos que se lhe entregar para desfazer em farinha não o trocarão sob penas de perderem a farinha para os prezos e pagarem ao dono o grão pello maior preço. Levarão de maquia meyo alqueire de cada saco de seis alqueires, e a este respeito de menos quantidades de grão que se lhe entregar, e nunca maquinará senão nos mesmos géneros que receberem e não em farinha com pena de tres mil reis. Não poderão os moleiros pedir pitança bolo ou poita com pena de quinhentos reis nem poderão ter nos moinhos porcos nem porcas nem galinhas frangos cada com pena de quinhentos reis. Entregarão em farinha a mesma quantidade de que houverem recebido em grão, medida por meyo alqueire ferrado e aferido com as mais medidas de que uzarem e a ditta entregue se não fara por alqueire e qualquer diminuição que houver na farinha a pagarão ao dono e chegando a huma quarta pagarão mil reis mais de condenação. De trigo porem, entregarão de cada seis alqueires que receberem ao dono seis alqueires e quata de farinha por ter mostrado a experiençia e exzames 121
Idem, fls. 38 - 39
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Magos feitos que ainda depois de tirada a maquia em grão por dúzia sette alqueires de farinha com de pagar ao dono a importância de valor da dita quarta de farinha a serem condenados em mil reis, e achando-se as partes diminuição na entrega de farina que os moleiros lhe fizeram dentro de um mês contado do dia em que se houver feito por seo juramento athe tres alqueires serão condenados ao pagamento os moleiros e da pena para o concelho de mil reis. Não poderão os Moleiros nem por si nem por outras pessoas vender farinhas pellas dezordeas e abuzos que com este pretexto se praticão: não sejão farinheiros nem contratem em farinhas de qualidade alguma mas precisamente só se ocupem no Offico de Moleiros desfazendo o grão que lhe for levado aos moinhos ou elles mandarem conduzir com pena de mil reis. Porem podem livremente vender em farinha somente o grão proveniente da sua maquia. Os carreteiros de nenhum modo e por nenhum pertexto poderão vender grão, ou farinha para desse toda a fraude e prejuízo das partes e dos mesmos moleiros com pena de mil reis de condenação, e a mesma pena terá quem lha comprar. Os Moleiros dos Moinhos de Magos não poderão moer aos Negoçiantes que vendem farinhas sem primeiro estar aviado o Povo desta villa e seu termo que fazendo o contrario serão condenados em mil reis. O prezente regimento estara pregado no Moinho em parte e de modo que todos que alli forem o possão ver e ler para não ignorarem as obrigações nelle compreendidas e suas taxas com pena de mil reis.» 121
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Regimento dos Arrais dos Barcos e Barqueiros e Taxas de fretes «Acordarão que nenhum Barqueiro podera ser arais dos barcos ou bateiras nesta villa e seu termo sem ser exzaminado dar juramento, fiança e ter Regimento como fica declarado dos officios Mecanicos. Com a pena, ahi imposta: as cartas de exzaminação lhe não valerão sem primeiro serem registadas na Camara. Em cada embarcação grande desta villa e seu termo que navegar pello Tejo, terá hum arais e dous companheiros exzamninados e hum mosso para a loja por se evitarem as desgraças que acontecem por falta de mão de obra, em cada embarcação pequena como barcos pequenos e bateiras bastara que ande hum só companheiro exzaminado o elle arais que fizer viagem de outra maneira pagara dous mil reis de condenação e o companheiro que não foi exzaminado pagara mil reis. Haverá em cada barco uma marca posta pello Juiz do Officio para por ella regularem a carga com que hade navegar da qual marca passara certidão quando lhe puzer o escrivão do Officio, ou quem navegar sem ella ou carregarem mais do que pella marca se lhe arbitram pagara tres mil reis de condenação por qualquer das sirconstancias que lhe faltar. Quando os barcos estiverem carregados athe marca assinada de pão ou outros géneros não poderão embarcar nelle gente mais do que a do serviço dos mesmos barcos. Em cada barco grande não poderão embarcar senão athe sincoenta pessoas, nos medianos athe quarenta e nos pequenos athe trinta o que se intende alem das pessoas de serviço pena de tres mil reis, debaixo da mesma pena não embarcarão pessoa alguma nos barcos carregados com palha com borda.
Cada hum dos barcos grandes e pequenos andara aparelhado com dous remos quatro varas dous paus de leme, duas pas encavadas, mais hum de trasto, e huma fatexa, com pena de que se lhe não achando estar pagarem tres mil reis, não tendo dous paus de leme dous mil reis, outro tanto pella falta de qualquer pá sento e sincoenta reis, pella falta de cada huma das varas. Havera mais em cada embarcação huma pojo, huma gindareza ,huma ostaga sempre algadricada e inçebada e huma prancha com pena de quinhentos reis por faltar qualquer das sobreditas couzas, teram mais hum toldo, huma inxada, podão, veruma, martelo, pregos, estoupa, vertedouro, e ferro de calafetar, pena de duzentos reis por cada couza que faltar das sobreditas. Nenhum barqueiro impedira os passageiros a que se embarquem onde quiserem nem os descomponhão de palavras, ou de pancada por não quererem embarcar com elles, com pena de seis mil reis, e de baixo da mesma pena nenhum arais fara viagem para Lisboa sem lastro de pedra ou areya como he costume. Nenhum barqueiro desta villa e seu termo não podera nella usar o seu oficio em especial licença da Camara exzaminando e approvando suas cartas de exzamninação, sujeitando-se as posturas dos Barqueiros desta villa e o que for achado obrando o contrario pagara mil reis de condenação. O Juiz de Officio sera obrigado a visitar repetidas vezes as embarcaçõens e exzaminar se acham bem aparelhadas, se os cascos tem algum perigo e doe que achar falta dara parte ao almotaçeque logo mandara notificar os donos e arais della para que não fação viagem sem as conçertar ou aparelhar do que lhe faltar dezobedeçendo pagara tres mil reis de condenação, a mesma pena terá o Juiz de
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Officio achando-se negligente na sua obrigação, e de baixo da mesma pena levará huma relação de todas as embarcaçõens que houver nesta villa e seu termo com apontamentos de que cada hum faltar para bem navegar e tudo se prover de remedio. Enquanto nas ocaziõens de cheias experimentão os moradores dos campos, e lavradores muita perda em gados e abogoarias e o perigo das suas vidas por não terem quem os socorra, se determina que em semelhantes ocaziõens os barqueiros desta villa e seu termo e barcos de passar, acudão logo que se lhe requerer a salvar tudo que estiver em perigo de naufragar com pena de tres mil reis, cada arais e companheiros, a quem pagarem seu trabalho os donos das fazendas ou quem lhes requerer o socorro, o que for justo atendendo-se ao perigo a que tambem se vão expor, mas nunca se demorarão ao preço mas vão acudir ao perigo que amiaça e depois se lhe fara justissa para serem pagos, o que serão entendera havendo tal tormenta que evidentemente anunçia perigo por que então não serão contratados a isso. Fl. 41 Todos os barqueiros que diser que o seu barco ha de partir em tal dia e não partir com as encomendas e passageiros que tiver pouco ou muntos ou partindo aportar primeiro em outra parte pagara tres mil reis de condenação, não havendo quem o impida navegar ou abrigar aportar. Os Arrais de qualquer embarcação tomara conta das encomendas e pessoas que embarcarem com elles faltando alguma encomenda ou alguma outra couza aos passageiros, pagara tres mil reis de condenação para o concelho e o darão aparte, sem que lhe valha a desculpa de lhe não entregarem a elle mas a seus companheiros ou a outros e que os passageiros forão os qyefizerão o roubo, porquando o arrais esta obrigado a tudo o que se entregar
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Magos nos seus barcos a responder por todos nunca deixara sahir pessoa alguma para fora sem primeiro saber se alguem se queixa de algum roubo, e sobre as taxas abaixo vay declarado se levarem de mais serão condenados em dois mil reis Taxa de fretes Não poderão levar mais de passagem para Lisboa a cada Pessoa do que outenta reis de verão e inverno, pena de condenação; Por cada moyo de trigo cevada e senteyo ou de legumes ou outro qualquer género a duzentos reis por moyo; Por cada carrada de fruta duzentos e quarenta reis Por huma dúzia de melancias a secenta reis Por hum saco de fruta vinte reis Por hum bahu de dous fexaduras cem reis Por outro dito de huma fechadura sincoenta reis Por huma canastra de galinhas vinte reis Por outra desta mais pequena des reis (…) Taxa dos bateis que andem levar para vários portos na forma abaixo declarado Acordarão que nenhum Arais dos Bateis que desta Villasahirem sendo fretado que não poderão levar mais do que vay aportado neste Regimento com pena de mil reis fazendo o contrário e terão obrigação de terem este Regimento para seu Governo debaixo da mesma pena de mil reis , e terça parte para quem o denunciar e as duas partes para o Concelho. Para Alhandra e Villa Franca e Povos levarão outtocentos reis Levara para Villa Nova quatrocentros reis Levara para Villa de Castanheira seiscentos reis Levara para as Vertudes settecentos vinte reis Levara para São Marcos Carreya outtocentos reis Levara para o Esteyo do Carvão do Rey seiscentos reis
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Figura 17 - Cais da Vala - Finais do século XIX - Fotografia de Carlos Relvas
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Levara para a Boca da Ribeira quatrocentos reis Levara para a Villa de Benavente outtocentos reis Levara para Leziria de Montalvo trezentos reis Levara para Vao da Praya duzentos reis Levara para Villa de Santarém mil e seiscentos reis Levara para Porto de Muge e Mugem outtocentos reis Levara para Valada e Escaroupim quatrocentos reis Levara para Moxais de El Rey trezentos reis Levara para Lezirão duzentos reis Levara para Casa Branca duzentos e quarenta reis Levara para Azambuja seisçentos reis» 122
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Figura 18 - Varino no Cais da Vala - Década de 50 (séc.XX) 122
Idem, fls 39 - 43v
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Regimento e Taxas dos Cingeleiros «Acordarão que para bom Regime dos moradores desta Villa e seu termo foi o prezente Regimento e Taxas dos fretes que andem levar pellas carradas tanto pella villa e termo e fora do termo de que não poderão levar mais do que vay apontado abaxo declarado com pena de mil reis de condenação fazendo o contrário e de baixo da mesma pena se não tiver neste Regimento para a sua Governo para saber quando há de levar para que não alegue Ignorancia alguma ou desculpa. Levar por cada carrada que seja de trigo sevada ou de outro qualquer género de grão do mais longe desta villa athe ao Cais sessenta reis E sendo mais perto sinconta reis E sendo perto da Villa para onde for a carrada trinta reis E de areia se entendera pella mesma na maneira na forma asima declarada, ainda que seja terra ou salão ou entulho De palha levara outenta reis De cal çem reis De telha ou tijolo levara secenta reis Sendo de vinho çem reis Levara por cada carrada a Benavente quatrocentos reis A Escaroupim huma carrada A Mugem outtocentos reis A Palhota duzentos reis Ao meio do Campo sendo meya legoa duzentos reis As Gatinheiras duzentos e quarenta reis A Jericó duzentos reis Em huma de cada legoahimcurzado
123
Meyalegoa duzentos reis Hum quarto de legoa cem reis Meyo quarto de legoa sincoenta reis E não poderão andar em sima do carro dentro da villa com pena de quinhentos reis e debaixo da mesma pena se acauzo quebrarem telhados.» 123 Regimento e Taxa das Estalagens e também casas de Pasto «Acordarão que para bem do Povo se fez o prezente Regimento e Taxa para saberem como se handem Governar os Estalajadeiros em suas Estalagens, e tambem para os que somente tiverem caza de Pasto de que serão obrigados a tello para por elles se guiarem com pena de que se o não tiver sera condenado a mil reis e a mesma pena terá fazendo o contrario o que nella declara, a terça parte para quem denunciar e as duas partes para o concelho. Levara de cama e quarto sento e vinte reis Levara de cama dobrada sento e vinte reis Levara de cada cesto de palha trinta reis Levara de cada bestas de argolas que não desse de comer des reis Levara por cada alqueire de sevada quarenta reis sobre o preço que comer Levara de huma esteira des reis Levara por cada quarta de carne cozida quinze reis Levara por cada quarta de porco cozida ou assada vinte reis Levara por cada quarta de capado ou carneiro cozido quinze reis Levara por cada quarta de qualquer das carnes guizadas trinta reis
Idem, fls 44 - 44v
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Levara por cada huma galinha cozida o lourada quatrocentos reis.»124 Regimento dos taverneiros Acordarão que para bem do Regimento dos que vendem vinho e para que alegam em tempo alguma ignorância ou desculpa se fes o prezente Regimento tirado das Posturas que nella declarão as penas impostas os que fizerem o contrario para por elles serem condenados não observando este regimento de que terá de pena de mil reis de condenação se o não tiver Não poderão medir o vinho senão em sima do fonil e o ditto fonil tenha hum ralo Nunca poderão medir senão pellas medidas e não por copos. Terão sempre cuidado de andarem as medidas lavadas e metidas em huma selha ou alguidar com agoa cobertas com hum pano lavado, como também cobertos por conta das moscas ou mosquittos. Terá medidas de real e dous reais conforme forem os preços dos vinhos para dar ao comprador o que lhes pertencer. Não podera vender vinho novo nem mistura nem agoape antes do São Martinho. Nem podera vender vinho novo misturado com velho antes do São martinho Todos os mezes levara huma mostra do vinho a hum dos almotaceis para ver se esta capas de se vender ao Povo. Não conçinterão em suas casas jogos de qualidades alguma Não concinterão filhos familios
124 125
Idem, fls 45v - 46 Idem, fls 46 - 47
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Magos Não comprarão pão de qualidade alguma a criados de lavradores e seus filhos familios Não comprão a troco de vinho algum ferro de sircunstancia que sejão de lavradores ou ainda que seja a dinheiro Não poderão deitar Agoa no vinho que o que for achado sera condenado em tres mil reis de condenação, a terça parte para que o acuzar e as duas partes para o concelho.» 125 Sobre a obrigação dos ferreiros serralheiros que devem ter «Acordarão que para bom Regime que todos os Mestres ou Officiaes do Officio de Ferreiro que trabalharem pello ditto seu Officio ainda que seja serralheiro que fizer obra a pezo, serão obrigado a ter pezos e balanças aferidos pello padrão do concelho e fazendo o contrario serão condenados em mil reis.»
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Magos 5 | Análise aos aspetos sociodemográficos de Salvaterra de Magos em finais do séc. XVIII
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Em finais do séc. XVIII, sob as ordens do Eng. Theodoro Marques Pereira da Silva e tendo como ajudante o Eng. Ignacio Joze Leal, foram realizados três levantamentos da população: Coruche; Salvaterra de Magos e Samora Correia. Estes levantamentos são fontes históricas, para compreender a evolução demográfica destes locais e contextualiza-los com a demografia portuguesa em finais do séc. XVIII. O levantamento de Salvaterra de Magos, decorreu em 1788, e já foi alvo de um estudo aprofundado pelo Prof. J. Manuel Nazareth e Prof. Fernando de Sousa.126 No início do documento, há uma descrição geográfica do local e o número existente de fogos em 1788: «VILLA DE SALVATERRA DE MAGOS Esta villa se acha situada em terras da Coroa ao Sul do Rio Tejo, 9 Legoas distante de Lisboa para aparte de Leste, com huma Freguezia denominada S. Paulo sujeita ao Patriarcado Real e da Comarca de Santarem, tem 515 fogos.» Salvaterra de Magos possuía em 1788, 1100 homens e 1043, o que perfaz um total de 2143 pessoas127, na estrutura profissional, as profissões ligadas à agricultura ocupavam o lugar cimeiro: «Assim 59,43% da população pertence ao sector primário, 20,60% ao secundário e o terciário 19,97%. Finalmente no sector terciário trabalha igualmente cerca de 20% da população activa. Nos transportes trabalham 24 marítimos, que representam 3,79% do total; o comércio ocupa 5,71%, sendo os
tendeiros a actividade comercial mais importante seguida dos «taberneiros» e dos «negociantes» os serviços ocupam 4,59%, sendo o grupo dos «almoxarifes, alcaides, fiéis, priostes e meirinhos» o mais importante; finalmente, o grupo dos «diversos» representa 5,88% do total, na qual os estudantes têm a importância de 3,65%.» 128 (…) No sector primário que, como dissemos, ocupa 59,43% da população activa, mais de metade (34,70%) aparece designado como simples trabalhador, havendo, no entanto, alguns casos em que aparecem outras especificações, como «a do campo» e «moços do campo»; em seguida a ocupação mais importante é a do «campino» (6, 34%), que antecede os «pastores» (4,44%) e os «lavradores» (4,12%); seguem-se os «emprazadores» (pessoas que seguem caça grossa) e os «falcoeiros», com 2,38%; finalmente, com reduzida importância, aparecem uma série de pequenas profissões onde apenas os «cingeleiros» têm uma importância superior a 1%. No sector secundário trabalham cerca de 20% da população activa, dos quais 10,45% trabalham no artesanato ligado aos serviços (sapateiros, alfaiates e barbeiros); os restantes 10% repartem-se pelos outros tipos de artesanato - 6,18% ligados à construção civil (carpinteiros, pedreiros, serralheiros e pintores), 2,38% ligados à actividade agrícola (moleiros, ferradores, ferreiros e abegões), 1,27% ligados à alimentação (cortadores, forneiros e padeiros) e os restantes 0,23% são cesteiros.
J. Manuel Nazareth; Fernando de Sousa, «Aspectos Sociodemográficos de Salvaterra de Magos em finais do Séc. XVIII», In Análise Social, vol. XVII (66), 1981-2, 2.º, pp. 313-373 127 J. Manuel Nazareth e Fernando de Sousa, no artigo citado , encontraram uma ligeira diferença de números, segundo estes autores, havia 2139 pessoas: 1097 homens e 1042 mulheres. 128 Idem, pp. 370 - 372 126
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Vejamos a estrutura profissional dividida em profissões129:
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Idem, p. 371
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Os criados não foram considerados nos cálculos
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População da Villa de Salvaterra de Magos, Pertencente à Freguesida de S. Paulo - Ano de 1788 ARQUIVO NACIONAL TORRE DO TOMBO
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Bibliografia CORREIA, Joaquim Manuel da Silva; GUEDES, Natália Brito Correia, O Paço Real de Salvaterra de Magos: A corte. A ópera. A falcoaria, Lisboa, Livros Horizonte, 1989 ESTEVAM, José, Anais de Salvaterra de Magos. Dados históricos desde o século XIV, Lisboa, Edições de Couto Martins, 1959 GALLASCH-HALL DE BEUVINK, Aline, O Real Teatro de Salvaterra de Magos. A reconstrução de uma memória, Lisboa, Caleidoscópio, 2016 NAZARETH, J. Manuel; SOUSA, Fernando de «Aspectos Sociodemográficos de Salvaterra de Magos em finais do Séc. XVIII», In Análise Social, vol. XVII (66), 1981-2 RAMOS, Luís de Oliveira, D. Maria I, Lisboa, Temas e Debates, 2010 SERRÃO, Joaquim Veríssimo, História de Portugal, vol. VI, Lisboa, Editorial Verbo, 1982 VIANA, Mário, «Posturas Municipais Portuguesas: uma Introdução», In Posturas da Câmara da Horta (1603-1886), Horta, CM. Da Horta / Núcleo Cultural da Horta, 2010 Arquivo Histórico Municipal de Salvaterra de Magos A.H.M.S.M. - Acórdãos da Câmara 1774 - 1795 A.H.M.S.M. - Livro de Corridas 1782 - 1807 A.H.M.S.M. - Livro de Fianças 1784 - 1874 A.H.M.S.M. - Livro de Posturas Municipais 1779 A.H.M.S.M. - Livro de Posturas Municipais 1795 - 1858 A.H.M.S.M. - Livro de Receitas e Despesas 1783 - 1791 A.H.M.S.M. - Livro de Receitas e Despesas 1792 - 1800 A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1775 - 1793 A.H.M.S.M. - Livro de Registos 1798 - 1802
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Magos
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Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos Igreja da Misericórdia
A intervenção do seu Património Integrado e Móvel
Ana Correia (MEMORIAE TRADERE)
memoriae.tradere@gmail.com Salvaterra de Magos | n.º 8 | Ano: 2021
Magos Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos Igreja da Misericórdia A Intervenção do seu Património Integrado e Móvel
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(fotografia gentilmente cedida pelo Sr. Provedor Dr. João José D. Oliveira e Sousa)
Largo da Escola n.º 2 Ribaldeira 2565 251 Dois Portos +351 261 713 014
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Magos Âmbito Em Março de 2019 fomos contactados pela Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos para apresentar uma proposta de intervenção de conservação e restauro e respetivo orçamento para a recuperação da sua Capela mor na Igreja da Misericórdia, para a reabilitação e montagem de quinze telas de dimensões consideráveis que compunham o teto da nave e vinte e duas pinturas de cavalete também pertencentes ao seu espólio. Este projeto teve o seu início em finais de Dezembro desse mesmo ano ao abrigo do Fundo Rainha D Leonor. Foram assumidas duas frentes de trabalho distintas, uma equipa dedicou-se ao trabalho in situ de conservação e restauro da capela mor, e uma outra, foi formada para realizar em atelier a recuperação das telas do teto da nave e as demais pertencentes ao acervo. À presente data a intervenção na Igreja ao nível dos elementos em talha encontram-se concluídos e os trabalhos nas telas em atelier encontram se a decorrer.
Princípios deontológicos e normativos da intervenção realizada
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O projeto de conservação e restauro, procurou de uma maneira geral respeitar as peças em questão, preocupando se também com a sua funcionalidade. O processo de conservação e restauro do património genericamente deve englobar o conhecimento dos materiais constituintes do edifício, das peças em questão, o local de exposição das mesmas, aliadas à sua função e características específicas associadas a uma correta manutenção antes e após a intervenção. Toda e qualquer intervenção de conservação e restauro deve ser precedida por um exame metódico e rigoroso, visando a compreensão do conjunto em todos os seus aspetos. As técnicas e os materiais utilizados foram selecionados tendo em consideração a sua compatibilidade, a sua estabilidade, reversibilidade bem como
as condições ambientais em relação ao conjunto de modo a haver uma degradação mínima possível quer do ponto de vista físico, quer do ponto de vista químico, e aqueles que, mais facilmente e em maior percentagem, possam vir a ser removidos sem prejudicar a composição das peças. Foi tido o devido e merecido respeito pela integridade física e estética das peças. As técnicas e materiais utilizados não impedirão tratamentos futuros. As reconstituições e reintegrações não foram hipotéticas ou realizadas por analogia. Serão facilmente identificáveis, de modo a evitar confusões miméticas ou falsificações, mas sem, contudo, quebrar o aspeto geral das obras, nem alterar a sua técnica construtiva.
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Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos - Igreja da Misericórdia - A intervenção do seu Património Integrado e Móvel
Apresentação da Empresa A Memoriae Tradere denominação em latim para preservar para a memória é uma empresa que surge em 2004 com Bruno Santos Assis e um outro sócio (que entretanto saiu em 2007) como atelier de Conservação e Restauro de Património Móvel e Integrado. Foi fundada com um princípio consciente e responsável, associou profissionais com formação académica, técnica e superior que visam sempre nas suas intervenções respeitar pessoas e peças tenham elas valor de mercado, artístico ou apenas afetivo, de modo a manter os seus devidos enquadramentos. Em 2012 com a entrada de uma nova sócia Ana Cunha Correia, decidem mudar o nome da empresa para A.C.C & B.S.A Conservação e Restauro Lda. e constituir a marca Memoriae Tradere®. Manteve se a filosofia da empresa e os princípios orientadores, no fundo foram apenas dividir-se responsabilidades aliados à vocação de cada um dos sócios. E sendo a Conservação e Restauro uma área pluridisciplinar onde é impossível uma só pessoa encerrar em si todo o conhecimento, é uma área técnico científica demasiado abrangente a Memoriae Tradere® tem que se cercar constantemente de profissionais com os mais variados perfis. E para este trabalho em específico tivemos que incrementar a equipa adicionando mais profissionais competentes das respetivas áreas de conservação e restauro (de acordo com o estipulado no decreto lei n.º 140 de 2009 de 16 de junho) e já familiarizados com o método de trabalho preconizado pela empresa.
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Partiu também de nós uma primeira abordagem ao Professor Dr Vítor Serrão dada a nossa suspeita da relevância do espólio de pintura da Santa Casa da Misericórdia, em boa hora o fizemos, pois o Senhor Professor irá investigar e analisar a fundo todos os dados histórico artísticos associados a estas pinturas.
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Prof. Dr. Vítor Serrão com Ana Cunha Correia, Elisabete Ferreira e Bruno Santos Assis durante a primeira visita ao atelier.
Magos CARACTERIZAÇÃO | DESCRIÇÃO FORMAL PRELIMINAR
Capela-Mor
81 Capela-mor antes de ser intervencionada.
À data da nossa primeira visita à Igreja da Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos e apesar da Capela mor na altura se encontrar totalmente repolicromada e ter sido impossível identificar as suas técnicas decorativas originais, este espaço é sem dúvida herdeiro das opções estéticas adotadas no período pós terramoto de 1755. Tem as influências artísticas neoclássicas provenientes de Itália que se fizeram sentir na altura. Possui uma decoração pouco profusa, com recurso a motivos florais e vegetalistas. De linhas planas, com uma grande sobriedade decorativa bastante contrastante com altares barrocos por exemplo é uma capela muito despojada, as colunas dos retábulos são
de fuste liso com um reduzido canelado, encimadas por capiteis coríntios, remate ladeado por duas estátuas alegóricas de feição hierática. Esta nova tendência refletia muito a situação económica vivida no país, muito distante dos tempos gloriosos da chegada de ouro e diamantes do Brasil. A tridimensionalidade na representação e o ouro perderam espaço dando lugar à pintura de fingido a sugerir pedra mármore de várias tonalidades Foi uma época em que a retablística viveu mais do trabalho de carpinteiros e de pintores do que propriamente da intervenção de mestres entalhadores e escultores remetendo-se estes para pequenos apontamentos decorativos. Salvaterra de Magos | n.º 8 | Ano: 2021
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Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos - Igreja da Misericórdia - A intervenção do seu Património Integrado e Móvel
A entrada da Capela mor tem um arco forrado a madeira policromada. É constituída pelo retábulo mor, por dois laterais e por elementos arquitetónicos decorativos que fazem a ligação entre estes três retábulos. O teto da capela mor possui uma decoração a três dimensões com elementos em madeira entalhados e policromos. Identificámos a madeira como sendo de casquinha, aparelhada e entalhada com aplicação de massa de preparação branca tradicional. Tal como foi acima mencionado, foi-nos impossível decifrar numa primeira abordagem as técnicas de produção artística da superfície destes elementos, pois eles encontravam se totalmente repolicromados.
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Fotografia geral do Retábulo Mor prévia à intervenção.
Arco forrado a madeira policroma e elementos entalhados agregados ao tecto da Capela Mor.
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Retábulo lateral do lado do Evangelho, antes de ser intervencionado.
Retábulo lateral do lado da Epístola, fotografia prévia aos trabalhos de conservação e restauro.
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Capela-Mor Levantamento do Estado de Conservação Durante o levantamento do estado de conservação verificámos alguma debilidade estrutural, devido principalmente a falta de função dos elementos metálicos e vestígios de ataque perpetrado por inseto xilófago e térmitas, ainda ativo e disseminado por todo o suporte lenhoso. A madeira como material orgânico, é uma das principais fontes nutritivas dos insetos, proporcionando assim o seu aparecimento e a sua propagação. Era também visível ataque biológico e existiam zonas com grandes concentrações de humidade. Bem menos dramática era a perda parcial de elementos decorativos/forma esculpida, possuía no entanto algumas fendas e fissuras de orientação transversal e longitudinal dispersas ao longo do suporte, promovidas em grande parte pelas oscilações de temperatura e humidade do interior da Igreja. Os elementos metálicos de ancoragem encontravam se fortemente oxidados, originaram um aumento de tensão resultante do aumento volumétrico do metal com consequentes contaminações e pequenas fraturas da madeira nas áreas circundantes. Como já foi anteriormente referido, durante a nossa primeira avaliação foi-nos impossível aferir o real
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estado de conservação do original subjacente ou, sequer certeza de que existiria material original sob a repolicromia. Após a realização de sondagens conseguimos apurar que existia material original suficiente que justificasse o seu levantamento. A policromia original para além de estar praticamente completa, encontrava-se em muito bom estado de conservação apresentado apenas, perda de frações de camada cromática e sua preparação deixando visíveis o suporte ou a preparação branca tradicional devido às variações de volumen discrepantes entre a madeira e as restantes camadas por influência das variações de humidade relativa e temperatura no interior do espaço, e por ação antrópica. Possuía fendas e fissuras dispersas, de direção transversal e longitudinal ao nível da superfície. Sujidades diversas sobrepostas, uma de cariz mais superficial outra de natureza mais impregnada, a propriedade hidrófuga das mesmas causou igualmente, a perda das propriedades físicas da preparação e o desgaste da superfície cromática e da folha de ouro. O verniz utilizado estava bastante envelhecido resultando numa oxidação da camada de proteção.
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Magos Tratamento Efetuado
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O tratamento realizado incidiu essencialmente numa revisão estrutural, com a execução de elementos novos em madeira de casquinha para substituir aqueles que se encontravam em mau estado de conservação, bem como, as peças de sustentação que estavam podres e friáveis e elementos que tinham perdido a sua função de sustentação e ancoragem. Visto ter sido detetada atividade de térmitas e insetos xilófagos, foi urgente a realização de uma desinfestação curativa e preventiva em toda a madeira incluindo na nova que foi introduzida, com o objetivo de travar a ação dos insetos e, prevenir o seu reaparecimento no futuro. Também foram executadas algumas talhas em madeira da mesma essência, foi feita uma reposição de elementos decorativos dos quais existiam registos suficientes que viabilizaram a sua produção (simetria). Entretanto chegou a fase mais desafiante de toda a intervenção, a realização de sondagens através da abertura de várias janelas, afim de apurar se existiria material original subjacente, em quantidade e qualidade e, confirmar que a sua remoção não interferia com a estabilidade físico química das peças. Após atestarmos a viabilidade do levantamento da camada não original, todas as superfícies foram limpas, por via mecânica e por via química dependendo da adesividade da tinta à superfície, posteriormente uma limpeza generalizada à camada original respeitando e mantendo sempre a patine da camada pictórica. Por fim, foi realizada uma reintegração cromática de lacunas e de elementos novos que foram reconstituídos, através de método diferenciado para
conferir uma unidade estética a todo o conjunto. Foi muito compensador perceber que todo este conjunto retabular por detrás da pintura nova que lhe foi conferida, permanecia íntegro e inalterado, que foi pintado não por estar danificado, mas por algures no tempo por uma questão de moda ou até mesmo com o objetivo de disfarçar as imperfeições do passar dos anos alguém o pintou sem comprometer o original.
Desinfestação.
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Um dos pequenos entalhes efetuados.
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Exemplos de algumas sondagens realizadas para verificar se existiria material original subjacente.
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Fotografia sequencial do processo de douramento a ouro fino de elemento novo entalhado.
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Durante a reintegração cromática de lacunas de uma coluna.
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Durante a reintegração cromática lacunar, aplicação de tom base.
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Capela mor finalizada.
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Retábulo mor após conclusão.
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Tecto da Nave Pintura sobre suporte têxtil
O teto da nave da Igreja da Misericórdia originalmente era composto por quinze grandes pinturas sobre suporte têxtil, catorze com iconografia das Obras de Misericórdia e uma representando a “Visitação”. As Obras de Misericórdia são ações e práticas que o Cristianismo espera que sejam cumpridas por qualquer cristão. No catolicismo dividem-se em sete Obras de Misericórdia Corporais direcionadas para aliviar o sofrimento corporal “Dar de comer aos que têm fome”, “Dar de beber aos que têm sede”, “Vestir os desnudos”, “Dar abrigo
aos peregrinos”, “Visitar/curar os enfermos”, “Visitar os cativos/presos”, “Sepultar os mortos” e sete Obras de Misericórdia Espirituais mais vocacionadas para tratar a esfera espiritual “Instruir os ignorantes”, “Aconselhar os duvidosos”, “Advertir os que pecam”, “Sofrer injúrias com paciência”, “Perdoar a quem nos ofendeu”, “Consolar os tristes desconsolados”, “Rogar a Deus pelos vivos e pelos mortos”. Esta iconografia foi amplamente utilizada em Igrejas das Misericórdias e bastante difundida durante o séc XVIII.
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Aspeto global do teto da nave sem as pinturas sobre tela.
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Magos Estas pinturas possuem uma estética visivelmente barroca, infelizmente ainda não foi detetada nenhuma assinatura, a autoria do pintor ou da sua oficina ainda não atribuída mas encontra-se numa fase de estudo. De acordo com o Professor Dr. Vítor Serrão, são telas de finais do séc. XVII, ou inícios do séc XVIII, com duas mãos distintas, mas com inspiração em gravuras que facilmente reconheceu e identificou. Para aprofundar esta matéria é fundamental que possa consultar os arquivos da Misericórdia de Salvaterra de Magos, nomeadamente Livros de Acordãos das Mesas, Livros de Receita e Despesa entre outras fontes.
Aquando das chuvas e cheias de 1979 uma área do telhado e parte estrutural da ala norte Igreja colapsaram e quase se perderam irremediavelmente estas pinturas. Eventualmente presumimos que não foram acondicionadas e guardadas nas melhores condições e tudo isso contribuiu para uma degradação mais acelerada. Quando as fomos analisar verificámos que já tinham sido alvo de intervenção mas sem nenhum procedimento técnico concluído. O último registo que temos da sua recuperação data de 1994/1996. Foi necessária uma revisão de fundo pois alguns dos materiais aplicados já se encontravam obsoletos.
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(Imagem retirada da internet) Igreja da Misericórdia de Salvaterra de Magos aquando da derrocada de parte da sua estrutura.
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“Dar abrigo aos peregrinos”, tela de João Rodrigues Andino (Igreja da Misericórdia de Faro, c 1679 e gravura de Dirk Volkertsz Coornhert, segundo Hendrick van He, Leiden, 1552. De acordo com Prof. Dr. Vítor Serrão estas poderiam ter sido fontes seguidas pelo pintor ou pintores do Teto da Igreja da Misericórdia de Salvaterra.
“Dar abrigo aos peregrinos”, tela do teto da Igreja da Misericórdia de Salvaterra de Magos.
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Magos Pinturas do teto da nave
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Foram facilmente identificadas 14 pinturas que já tinham empregues a marouflage uma técnica que consiste na colagem de um painel rígido sobre o qual as telas são coladas pelo seu reverso. Apesar de estarem razoavelmente estabilizadas, os tratamentos foram interrompidos em 1996 e um hiato de sensivelmente 25 anos deu início ao processo de degradação de materiais que foram aplicados. Ou seja, para além da revisão do que não foi iniciado teve que se fazer uma verificação de tudo o que havia sido feito desde 1994. Todas as pinturas sem exceção possuíam ataque biológico, microorganismos (bactérias e fungos), deixando o suporte com múltiplas manchas, provavelmente o local onde estariam acondicionadas deveria ser bastante húmido e com arejamento deficiente.
Apresentavam diversas deformações/enfolamentos, 25 anos dispostas na vertical contribuíram para estas patologias. Algumas lacunas dispersas ao longo do suporte têxtil de diversas dimensões, devido ao processo de envelhecimento dos adesivos aplicados nos remendos. Pulverulência generalizada da camada de preparação aplicada, sujidades diversas acumuladas sobre a superfície das pinturas, nomeadamente poeiras. Envelhecimento da camada de proteção com consequente perda de elasticidade do verniz, tornou-se rígido e quebradiço, consequente perda de transparência da superfície pintada. Muitas das pinturas requeriam uma limpeza química mais intensiva da que teria sido efetuada anteriormente.
Tratamento Efetuado Dada a complexidade deste trabalho, ainda se encontra a decorrer em atelier é muito moroso rever procedimentos técnicos em pinturas desta dimensão. Foi feita uma desinfeção generalizada no reverso destas pinturas para remover os fungos e prevenir o seu reaparecimento Posteriormente tivemos que corrigir as suas deformações, planificámos pintura a pintura aplicando pesos distribuídos sobre elas. Após o melhoramento da superfície procedemos à remoção de restauros, intervenções anteriores perniciosas para a estabilidade físico química das pinturas, substituímos inúmeros remendos e reforçámos áreas fragilizadas.
A limpeza da superfície pictórica, foi executada por via mecânica e dependendo da adesividade da sujidade à superfície por via química com produtos ou soluções que determinámos, após realização de sondagens a partir de testes de solubilidade da matéria que se pretendia remover respeitando e mantendo sempre a patine original da superfície pictórica. Optámos também por remover alguns repintes (anteriores a 1994) por deturparem a leitura das pinturas. Após retificação das massas anteriormente aplicadas, fizemos preenchimentos ao nível da camada de preparação de lacunas com massa de preparação sintética, e de elementos novos (remendos) que tinham sido aplicados. Salvaterra de Magos | n.º 8 | Ano: 2021
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As lacunas preenchidas foram integradas cromaticamente com materiais reversíveis e distintos dos originais, ou seja, com aguarelas e têmperas, de modo diferenciado, aplicadas através de mancha e com a técnica “trattegio” e como camada final, foi aplicado um filme de verniz acrílico mate com proteção de radiações ultravioleta.
Graças a um dos técnicos que iniciou esta intervenção em 1994 tivemos acesso a um mapa que permitiu facilmente identificar a localização das pinturas que à medida que vão sendo concluídas vão sendo montadas no seu local original de implantação Em virtude da existência deste mapa conseguiu-se otimizar todo o processo de montagem.
“Dar abrigo aos peregrinos”, antes e depois da intervenção.
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Durante a reintegração cromática a aguarela.
“Visitar os cativos/presos”, antes da revisão dos procedimentos técnicos e após a conclusão do restauro.
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“Visitar/curar os enfermos”, apesar desta pintura já ter a preparação branca, todo o tratamento prévio teve que ser revisto, nomeadamente a limpeza química. Esta pintura tinha muita reintegração cromática. Antes e depois.
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Pintura de Cavalete Do lote de vinte e duas pinturas de cavalete que Narrativos estamos a recuperar em atelier gostaríamos de “Beijo de Judas e violência de Pedro” destacar quinze que fariam certamente parte da “Jesus condenado à morte (?)” Via Sacra da Igreja da Misericórdia. Ao observar“Flagelação” mos atentamente uma fotografia antiga, prévia ao “Ecce-Homo” desabamento de parte da estrutura, foi nos pos“Jesus ajudado por Simão de Cirene” sível identificar algumas desta pinturas dispostas “Jesus é despojado de suas vestes” na parede do lado do Evangelho. Conseguimos “Sepultamento” também isolar este conjunto por possuírem uma cercadura idêntica e uma representação estética muito semelhante. O total numérico também nos alertou para o número de estações da Via Crúcis que podem ser de catorze ou quinze. A Via Sacra, Simbólicos ou também Caminho da Cruz, diz respeito ao iti- Pedro”“Anjo com Cruz” nerário percorrido por Jesus Cristo carregando a “Anjo com tocha, bolsa com 30 moedas” Cruz desde a sua condenação até ao Calvário. “Anjo com coluna e açoites” Estas quinze pinturas conseguimos dividir em dois “Anjo com coroa e cana” grupos, sete pinturas narrativas com cenas dos ”Anjo com bacia e gomil” passos da Paixão com as suas correspondentes “Anjo com Verónica” oito simbólicas. As simbólicas representam anjos “Anjo com escada e vaso com bálsamo” exibindo os instrumentos da Paixão de Cristo. “Anjo com Santo Sudário”
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A partir desta fotografia antiga conseguimos perceber a localização de três das pinturas. Podendo nem ser a sua disposição original não deixa de ser um detalhe cuiroso.
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Tal como nas pinturas do teto, o Professor Dr. Vítor Serrão apenas teve oportunidade de fazer a observação das mesmas, para chegar a dados mais concretos precisa de verificar e procurar fontes escritas que sustentem a sua análise. De qualquer modo, acredita que “Algumas das fontes utilizadas para a elaboração das bandeiras dos Passos foram gravuras de Van Mallery, Jerónimo Wierix e Antón Wierix integradas no livro Evangelicae Historiae Imagines, do jesuíta Jerónimo Nadal (Antuérpia 1593). Várias das cenas tiveram congeminação a partir deste livro difundidíssimo nos círculos católicos. Já para as figuras dos anjos segurando símbolos da Paixão, recorreu se a estampas de Aegidius Sadeler II (1568-1629) na obra Theatrum Passionis Christi, segundo modelos de Pieter Candid[1]. Aegidius Sadeler II passou por Roma em 1592 gravando originais de Bartholomeu Spranger e Hans Speckaert. As suas estampas, muito populares, foram alvo de outras versões, desde o nórdico Karel van Mallery ao francês Élie Dubois, a quem se deve uma série Arma Christi, gravada a buril[2]. O modelo destas estampas de Sadeler II serviu ao artista das bandeiras de Montemor o Novo para compor, com variações, as figuras de anjos. Na série da Paixão de Cristo, na Misericórdia do Porto, encomendada em 1613”. • [1] Ver The Illustrated Bartsch’s (1997), v. 72, parte 1, ed. Abaris Books, p. 107-119. Segundo LIMOUZE, Dorothy -“Aegidius Sadeler (c 1570 1629 Drawings, Prints and the Development of an Art Theoretical Attitude”, Prag um 1600: Beitrage zur Kunst und Kultur am Hofe Rudolfs II, Freren, 1988 pp. 183-192. Estas gravuras seguem desenhos de bPieter Candid.
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• [2] Sobre estas gravuras, seguidas nas misericórdias metropolitanas e, também, nas que se construíram nos espaços coloniais, como sucede em Salvador da Bahia, ver FREIRE, Luís Alberto Ribeiro -“As ‘Arma Christi’ de Eli du Bois e José Joaquim da Rocha”. Revista Museu, IV série, nº 8 (1999) 151-181.
O Professor Dr. Vítor Serrão também pensa serem datáveis dos finais do sec. XVII, ou inícios de XVIII, e de boa qualidade. O pintor ou pintores usaram as gravuras como inspiração para as sua representações em tela, transpondo as suas linhas gerais, não fazendo cópias literais simplificando os detalhes.
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Fontes seguidas pelos pintores ou pintor.
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Anjos segurando símbolos da Paixão, pertencentes à Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos.
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“Sepultamento” em gravura, e a pintura pertencente à Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos.
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Gravuras eventualmente usadas como fontes/inspiração pelos pintores ou pintor.
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“Beijo de Judas e violência de Pedro”, pertencente à Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos.
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Magos Principais formas e fenómenos de alteração e degradação
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Estas pinturas foram localizadas por mero acaso numa dependência da Igreja da Misericórdia e estavam muito mal acondicionadas, podemos dizer que ficaram perdidas e esquecidas no tempo. Foi urgente a sua recuperação, estavam em muito mau estado, em algumas quase nem se percebia a existência de camada pictórica. Pelo menos em três delas seria impossível a recuperação total, pelo menos foi nisso que acreditámos na altura. Globalmente o suporte têxtil encontrava se bastante enfraquecido com perda de elasticidade, apresentando diversas deformações/enfolamentos e vincos. Verificava-se a existência generalizada de áreas fragilizadas, já com rasgões, e outras áreas que indiciavam o início do processo de rasgões. Muitas evidenciavam uma transparência reveladora do seu débil estado de conservação. Possuíam imensas lacunas dispersas ao longo do suporte têxtil de diversas dimensões. Tinham uma oxidação grave do suporte resultando num escurecimento
das fibras e na perda de resistência e flexibilidade do tecido. Contaminações de óxidos oriundos dos elementos metálicos de fixação. Ataque biológico muito intenso, microorganismos (bactérias e fungos), deixando o suporte têxtil muito manchado. Ao nível da camada cromática, presença de elementos metálicos aplicados diretamente sobre a superfície pictórica consequentes contaminações de óxidos procedentes dos elementos metálicos. Estalados (craquelet) generalizados e muito incidentes por toda a superfície pictórica. Múltiplas lacunas de diferentes dimensões, dispersas por toda a superfície promovidas por roturas no suporte. Pinturas com grandes áreas em destacamento e alguma pulverulência. Uma sujidade bastante aderente ocultava a temática das pinturas. Os bastidores e respetivas molduras das pinturas estavam totalmente degradados de recuperação inviável não ofereciam qualquer estabilidade às telas.
As três pinturas que possuíam níveis máximos de degradação.
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Tratamento Efetuado Dado o nível de degradação destas pinturas, foram elaborados testes de reação aos tratamentos, com realização de provas de humidade e de resistência dos pigmentos. Destinaram-se a atestar a resistência/sensibilidade das telas, das suas camadas de preparação e dos seus pigmentos e aglutinantes. Foi efetuado um facing de proteção à camada pictórica remanescente, para permitir todas as fases subsequentes do restauro afim de não se comprometerem ainda mais as pinturas. Um facing é uma operação que visa proteger toda a superfície da pintura através da aplicação de um papel japonês com um adesivo, após secagem viabiliza mais tranquilamente os trabalhos que são necessários desenvolver nas pinturas. Planificação do suporte têxtil com vista ao melhoramento da superfície, estavam tão enfoladas devido à exposição climatérica adversa que, precisaram de humidade conjugada com calor do ferro e bastantes pesos distribuídos a exercerem pressão. Após uma limpeza superficial optámos logo por remover restauros provenientes de intervenções anteriores totalmente desadequados e perniciosos para a estabilidade física e química das pinturas. O tratamento de rasgões e colmatação das lacunas que existiam ao nível do linho, foi executado com a introdução de tela semelhante e/ou fios. Em todas as pinturas apenas foi necessária a colocação de bandas de linho, que são peças colocadas nas extremidades das telas para reforço mas, após avaliação do reverso de três, optámos pela reentelagem
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que, consiste na aplicação de uma peça inteira de linho sobre o suporte têxtil original. Limpeza da superfície das pinturas, por via mecânica e, dependendo da adesividade da sujidade à superfície, por via química, com produtos ou soluções destes determinados após realização de sondagens a partir de testes de solubilidade da matéria que se pretendia remover respeitando e mantendo sempre a patine original das pinturas. Depois do preenchimento das áreas lacunares e dos remendos introduzidos e numa fase pós nivelamento de massas foi feito o engradamento das telas em bastidores novos e extensíveis, as telas foram fixas às grades com agrafos inoxidáveis. As grades servem para segurar/apoiar a tela mantendo a rígida e em tensão. Deverão ser reguláveis/extensíveis, possuem ensambladuras que se podem abrir ou fechar mediante cunhas/palmetas, mantendo-a assim a tela sempre em tensão. As lacunas preenchidas foram integradas cromaticamente com materiais reversíveis e distintos dos originais, com aguarelas, de modo diferenciado, as bases foram aplicadas através de mancha e finalizámos com a técnica de trateggio. Para finalizar foi aplicado um filme de verniz acrílico mate com proteção de radiações ultravioleta. Com a conclusão de todos os procedimentos técnicos, proceder-se-á à colocação das telas em local determinado pelo Sr. Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos em articulação com os representantes do Fundo Rainha D. Leonor.
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107 Pintura antes da intervenção.
Durante a realização de testes de limpeza.
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Após o tratamento do suporte têxtil e da conclusão da limpeza química.
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Aplicação e nivelamento de preparação sintética.
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“Anjo com escada e vaso com bálsamo”, em fase de integração da camada pictórica.
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Pintura antes da intervenção.
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Após a fixação da camada cromática e da primeira fase de limpeza química.
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Durante a aplicação de remendos.
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“Sepultamento”, em fase de reintegração cromática.
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Fotografia prévia à intervenção.
Tratamento do suporte têxtil com aplicação Depois da limpeza da superfície cromática. de reforço e remendos.
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Pintura pronta a engradar e a integrar.
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“Anjo com Verónica”, integração cromática a decorrer.
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Pintura antes de ser intervencionada.
Realização de testes de limpeza.
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Durante a limpeza química.
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Tratamento do suporte têxtil com aplicação de bandas e inserção de remendos e aplicação de tecido.
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Aplicação de preparação sintética em áreas lacunares da superfície, preparada para ser integrada cromaticamente.
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“Anjo com coluna e açoites”, durante a reintegração cromática.
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Durante a pré fixação da policromia.
Pintura em MUITO mau estado.
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Primeira fase da limpeza.
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Esta foi uma das pinturas a ser reentelada.
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Algumas das fases do tratamento efetuado.
“Flagelação”, reintegração cromática encontra se a decorrer.
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Tela antes de ser intervencionada Esta foi O suporte estava de tal modo debilitado Conclusão da limpeza química da camada uma das que pensámos não ter recupera- que tivemos que optar pela reentelagem. pictórica. Ficámos muito satisfeitos por perceber que afinal era possível restituir a esta ção possível. pintura a sua dignidade física e estética.
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“Jesus é ajudado por Simão de Cirene”, reintegração cromática encontra se a decorrer.
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Magos Considerações Finais
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Se a ação de Conservação e Restauro em Património Integrado incluso num espaço museológico se pode guiar pelos princípios da intervenção mínima, em que meramente nos focamos na direção da estabilização dos processos de alteração em curso, sem o cuidado constante de estabelecer uma uniformidade estética já desaparecida, o mesmo não se passa com o Património Integrado que ainda desempenha as suas funções sócio-culturais. Esta questão obriga a uma reflexão mais criteriosa, agrupando o respeito pela integridade física, estética e histórica dos Bens Culturais, aos princípios da estabilidade, reversibilidade com a fácil identificação dos materiais selecionados para a intervenção. Para nós representou um grande desafio começar um trabalho do zero com um nível de degradação brutal quase no limite do irrecuperável mas foi igualmente difícil pegar num trabalho começado por colegas de profissão há 25 anos atrás onde a
metodologia e materiais empregues são muito diferentes dos dias de hoje. Por tudo isto, foi um trabalho extremamente compensador e sem dúvida nenhuma que acrescenta valor e experiência a nós equipa de conservadores restauradores. Não podemos deixar de agradecer e enaltecer a perseverança do Sr. Provedor João José Drummond Oliveira e Sousa, à Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos pela confiança no nosso trabalho, ao Fundo Rainha D. Leonor pelo acompanhamento irrepreensível dos trabalhos, ao Professor Dr. Vítor Serrão pelo desenvolvimento histórico e artístico das pinturas, ao Dr. Roberto Caneira da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos pela sua disponibilidade e à população de Salvaterra de Magos pela paciência, pois aguardam deste 1979 pela abertura em pleno da Igreja da Santa Casa da Misericórdia de Salvaterra de Magos.
Bibliografia
CALVO, Ana, Conservación y Restauración. Materiales, técnicas y procedimientos De la A a la Z Ediciones del Serbal. FERREIRA, Sílvia, A TALHA Esplendores de um Passado ainda Presente (Sécs. XVI-XIX), Nova Terra, 2008. ROBERT, Smith, A TALHA EM PORTUGAL, Livros Horizonte Lisboa, s/d.
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EDIÇÕES ANTERIORES DA REVISTA “MAGOS” 2014, setembro
Magos
2019, setembro
“Magos I” - Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos
Revista “Magos VI” - As Festa em Honra de Nossa Senhora da Glória
2015, setembro
2020, agosto
“Magos II” - Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos
Revista “Magos” N.º Especial Temático - Centenário da Praça de Touros de Salvaterra de Magos (1920-2020)
2016, setembro
2020, setembro
“Magos III” - Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos
Número
Especial Temático 2020
Centenário da Praça de Touros de Salvaterra de Magos (1920 - 2020)
Revista “Magos VII” - N.º dedicado a Muge
2020
VII
124 Lavadeiras, Ribeira de Muge (meados do séc. XX)
2017, setembro
Revista “Magos IV” - 500 anos do Foral Manuelino de Salvaterra de Magos (1517-2017)
2021, julho
Revista “Magos” N.º Especial Temático - A RARET e a Glória do Ribatejo - 70 anos da primeira retransmissão (4 de julho de 1951)
2018, setembro
“Magos V” - Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos
Revista Cultural do Concelho de Salvaterra de Magos
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