Revista NB - Comportamento

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Comportamento

Por Murilo Melo Fotos Divulgação

Cupido

virtual

CRESCE O NÚMERO DE USUÁRIOS DE APLICATIVOS VOLTADOS PARA A CONQUISTA

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nquanto milhares de casais apaixonados lotam bares e restaurantes do mundo inteiro, um número incalculável de pessoas tecla em busca de um relacionamento, trocando confissões, cantadas e elogios sem sair de casa. Elas fazem parte do contingente de usuários que atualmente frequentam os principais aplicativos com esse fim, que se multiplicam nos celulares com tecnologia Android e iOS. O negócio se tornou comum devido a uma grande mudança de comportamento nos últimos tempos. Quando surgiu, no início da década de 90, o conversar virtualmente por meio de chats era visto como a última alternativa para os tímidos e desesperados que não conseguiam encontrar um par. Hoje, apenas com um deslize do dedo no smartphone, boa parte das pessoas utiliza aplicativos como ferramenta capaz de aproximar gente interessante e que tenha gostos parecidos. “Essa história de que os opostos se atraem não existe por lá. São as afinidades que mais despertam interesse, muito mais até do que a aparência física e as condições financeiras”, afirma a psicóloga Camila de Castro. “Quem bate papo virtualmente não tem paciência para tantas novidades.

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Encontrar alguém semelhante é mais rápido e fácil”, defende. O Tinder, por exemplo, virou febre. Criado em 2012 em Los Angeles, nos Estados Unidos, o app chegou ao Brasil em julho de 2013 e, segundo a empresa, tem impressionantes 10 milhões de usuários no país. A maioria se diz solteira e tem entre 14 e 40 anos. Muito mais direto do que os tradicionais sites de relacionamento, o método da ferramenta é simples: durante o cadastro, você define se quer conhecer homens, mulheres – ou ambos –, a faixa etária e a distância em quilômetros que a pessoa deve estar. Feito isso, como num álbum de figurinhas, você percorre perfis de pessoas que estão próximas e escolhe quais são de seu interesse. O aplicativo passa a mostrar os perfis um por vez e, conforme for agradando, é necessário dar um “aprovado” (coração verde) ou “descartado” (xis vermelho). Se uma pessoa que você aprovou também curtir seu perfil, acontece o “perfect match”, a combinação perfeita. O aplicativo pergunta se você quer começar uma conversa reservada, em um chat do próprio sistema, com a finalidade de induzir en-

contros entre usuários – seja apenas para “ficar”, seja para um relacionamento mais duradouro – ou continuar à mercê de novas possibilidades. Aderir à brincadeira é mais fácil ainda. Do download ao começo da paquera são segundos. Basta conectar-se ao aplicativo com uma conta no Facebook e preencher uma tagline ou descrição curta. O sistema permite escolher até quatro fotos de seu perfil, e logo de cara avisa que tudo o que acontece no aplicativo fica por lá. Nenhuma conversa, por exemplo, será compartilhada na sua timeline. Durante a busca, cada perfil mostra o que é considerado suficiente para uma leitura dinâmica: as fotos, nome, idade, amigos em comum no Facebook, hobby e interesses, tudo numa tela só. Em uma questão de segundos, é possível ter uma ideia do universo intelectual, do tipo físico e do círculo social da pessoa, um processo que poderia levar dias em outros sites de relacionamento ou na vida real. Curiosamente, o aplicativo vem sendo bastante utilizado em ambientes como baladas e bares, onde a “pegação” costuma correr solta ao vivo e pessoalmente. “Até alguns anos atrás, o cigarro era a desculpa para se aproximar de alguém em um barzinho. Hoje estão todos no celular, se identificando por conta da geolocalização”, diz o sociólogo e pesquisador Lúcio Mauro Coutinho. Quando a estudante de jornalismo Luana*, 22 anos, decidiu finalmente sair para ir ao cinema com o pretendente que conheceu no Tinder (e depois por conversas mais longas por áudio e vídeo via Facebook e WhatsApp), o risco parecia baixo.


Há pessoas que entram ali para encontrar o cara dos sonhos, a mãe dos seus filhos, o homem que vai pedir a mão em casamento. Outras pessoas só querem um namorado para a semana

Ninguém é de ninguém

“Eu tive o cuidado de não passar meu telefone tão rápido”, lembra. “Eu já sabia que a gente tinha muita coisa em comum, já que estudamos e ouvimos as mesmas coisas e frequentamos os mesmos lugares”. “Assim que nos vimos, nos tratamos como se a gente já se conhecesse há muito tempo. Se não desse certo, por algum motivo, eu tinha certeza que pelo menos dali eu faria um grande amigo”, diz ela. Do coração verde ao namoro, foram menos de quatro semanas. “Quando eu percebi que nenhum outro cara chamava mais a minha atenção, quando ele me disse que eu era a mulher que ele sempre quis ter, decidimos desinstalar o app juntos. Não tinha explicação continuar por lá”. Antes de descolar um namoro pelo Tinder, Luana paquerava pela noite de Salvador, mas, segundo ela, não encontrava ninguém interessante. “As pessoas não querem saber o que você faz da vida, quais são suas expectativas e planos. Simplesmente querem você por uma noite”, diz. Para ela, o aplicativo filtra o que se requer do outro, e por isso é mais benéfico do que conhecer gente na balada.

“Eu vivia nessa coisa de conhecer gente apenas pelo Facebook. Quando instalei o Tinder, notei a diferença na hora. Ele destravou o que para mim era muito engessado e oculto em sites de relacionamento”, diz a promotora de eventos Viviane*, 27 anos. Ela conta que geralmente usa o app nas pausas forçadas: aguardando chamar a senha do banco, na sala de espera da clínica, na fila do supermercado, tomando um café. Com isso, diz ter conhecido dois

homens incríveis graças ao aplicativo, mas não quer se prender a ninguém. “Eu vejo como a forma de relacionamento moderno. Conhecer e não se apegar”, argumenta. Depois do fim de um namoro, o publicitário Bruno*, 36 anos, saiu com cerca de onze meninas que conheceu no Tinder em três meses. Todas, segundo ele, não passaram de sexo casual. De acordo com Bruno, é difícil manter um relacionamento com meninas que conhece através de aplicativos. “Eu não as levo a sério. Fico por ficar. Posso, um dia, conhecer uma que me surpreenda, mas ainda não é o caso”, revela.

Velhos riscos

Para a psicóloga Camila de Castro, alguns usuários, por mais que tenham semelhanças entre os perfis, têm objetivos diferentes no aplicativo. “Cada um vive um momento e ponto. Há pessoas que entram ali para encontrar o cara dos sonhos, a mãe dos seus filhos, o homem que vai pedir a mão em casamento. Outras pessoas só querem um namorado para a semana, alguém para abafar a carência do final de semana”, explica.

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Comportamento Outro fator que se deve levar em conta é a confiança em excesso. Segundo a psicóloga, o comprometimento inicial é baixo e o usuário se sente mais aberto a agir por impulso. “Sair para jantar, tomar um café ou até encarar sexo casual com um desconhecido não deve ser visto como uma obrigação ou como algo comum porque seu amigo faz. É necessário levar em conta a confiança e credibilidade que a pessoa transmite. Sair com alguém que você teclou por uns dias pode ser uma grande cilada”, avisa. A saída para diminuir os riscos e aumentar as chances de iniciar um romance sem percalços, conforme Camila, é conseguir o máximo de informações a respeito da pessoa, marcar algo num lugar público e avisar a alguém sobre o programa.

Ferramenta particular

O sociólogo e pesquisador Lúcio Mauro Coutinho acredita que o Tinder ganhou adeptos porque a conversa nesse aplicativo só flui se houver interesse em ambas as partes. “Cada um joga como quer e no seu ritmo, sem cobrança inicial. Ali, quando um não quer, dois não brigam. Daí esse tipo de comportamento aparece como base de um processo para saber o que as pessoas entendem e como elas observam o mundo”, explica. O uso que Luíza e Marcelo* fazem do app, por exemplo, é muito particular. Eles começaram a namorar ainda adolescentes, mas desde os 15 anos ela resolveu assumir que é bissexual. Depois de oito anos casados, viram no Tinder, há menos de um ano, a possibilidade de uma nova forma de vida. Luíza é quem faz o primeiro filtro e Marcelo acompanha o progresso dos corações verdes da mulher, dando opinião aqui e ali sobre as escolhidas. “Ele me compreende e por isso vivemos um relacionamento leve, sem drama, sem desejos reprimidos”, confessa Luíza.

Marcelo explica que não se importa com as meninas que Luíza passa horas conhecendo porque, para ele, dali jamais vai sair um grande amor. “O que eu e ela sentimos é muito maior do que uma aventura em um aplicativo”. Luíza conta que no começo não foi fácil. A moça não dava coração verde para ninguém. Além disso, a ferramenta não permite evitar amigos em comum, exatamente o que gostariam de fazer. “Por enquanto não houve encontro com ninguém. Estamos experimentando e avaliando candidatas”, brinca.

Igualdade

Há um cupido digital gay em ascensão e ele está no Glindr e Blendr. Nascidos em berço americano, com o método igualzinho ao Tinder, ambos surgem também com proposta de realizar encontros. Só que, por aqui, entre pessoas do mesmo sexo. O resultado não poderia ser diferente: a plataforma conquistou o mercado brasileiro. Nascido em Cachoeira, na Bahia, mas vivendo em Salvador desde o ano passado, Victor Mendes, 29 anos, não vê problemas em falar sobre sua orientação sexual. “Gosto de homens e ninguém tem nada com

isso”, avisa o rapaz. Formado há quatro anos em Letras, ele reconhece, no entanto, que sempre teve dificuldade para engrenar um relacionamento mais duradouro. “Já namorei durante três anos e meio, mas não deu certo”, afirma ele, que está sozinho desde o início do ano. “É difícil descobrir pessoas que passeiem pelos mesmos gostos que eu”. Em fevereiro, por curiosidade, Victor decidiu instalar o Blendr no seu smartphone. “Daí conheci uns meninos legais, saí com dois. É legal conhecer gente que não tem medo de falar sobre a própria sexualidade”. Para a psicóloga Camila de Castro, assim como os héteros, o público gay “quer sair, conhecer gente, planejar, namorar, casar ou até mesmo só curtir uma noitada.” Victor ainda não encontrou seu par perfeito, mas não reclama. “Arrumei dois grandes amigos, com quem vou a bares e baladas todos os fins de semana e falo sobre as mazelas e alegrias da vida”, diz ele, que em seu perfil virtual informa estar apenas em busca de novas amizades. “Vejo o aplicativo hoje como um instrumento para ampliar meu círculo de relacionamento. Só vou namorar alguém com quem tenha forte afinidade”, afirma. Mesmo com problemas recorrentes (como a repetição de perfis descartados) e algumas divergências de geolocalização, os aplicativos Blendr, Tinder e Glindr são objetos de constantes mudanças e melhorias. Há poucas semanas, começaram a recomendar perfis a partir das preferências manifestadas pelo usuário, calculando padrões de comportamento pessoal. A concorrência do Tinder também é forte. Há poucos meses, a cópia brasileira Eaí é exatamente igual ao aplicativo americano, com a diferente e boa sacada da possibilidade de repescagem. O app disponibiliza uma lista dos últimos perfis descartados. Afinal, todo mundo merece uma nova chance. l *Os nomes foram trocados a pedido das fontes

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