MODA POR MURILO MELO | FOTOS DIVULGAÇÃO
Admirável
HOMEM NOVO FICOU NO PASSADO A IDEIA DE QUE OS HOMENS SÃO LIMITADOS NO VESTIR. EXIGENTES, ELES VÃO ÀS COMPRAS, ESCOLHEM COM CRITÉRIO E CONQUISTAM O MERCADO FASHION Homens e mulheres são finalmente iguais, ao menos quando se trata de moda. Foi-se o tempo em que para eles a expressão ‘vestir-se bem’ significava encontrar uma roupa limpa e passada dentro do armário. Prestar atenção na aparência entrou, com o passar do tempo, na lista de interesses do brasileiro, que aprendeu a usufruir dos frutos que uma boa imagem cheia de estilo podem trazer. Prova disso é o crescimento visto em algumas importantes marcas e grifes nacionais nos últimos anos, que agora dispõem, consequentemente, de mais espaço nas vitrines das lojas ou de coleções exclusivas para eles. Os números falam por si. Para se ter ideia, no Brasil, segundo pesquisa realizada pela Inteligência de Mercado (Iemi), as vendas do segmento de moda masculina cresceram 4,5% em 2014, uma alta maior do que o comércio de peças focadas para o público feminino, cujo crescimento ficou na casa de 3,7%.
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Isso quer dizer que o comércio de menswear no país arrematou R$ 58,9 bilhões ano passado. Hoje, a moda masculina também responde por 50% do mercado mundial de luxo, de acordo com dados da consultoria de mercado Euromonitor International. Outra grande mudança é que lojas de luxo, antes com confecções apenas para mulheres, lançaram coleções masculinas. O grupo Restoque, da grife feminina Le Lis Blanc, criou no ano passado sua marca para homens, a Noir, Le Lis. A Versace, que até pouco tempo era apenas um referencial feminino, agora aposta em peças voltadas para os homens, público que responde por 46% das vendas. A Prada, vendo o crescimento do setor, revelou aos investidores, em abril, o plano de abrir mais 50 lojas masculinas nos próximos três anos. Em 2013, quatro foram abertas. A alta nas vendas para os próximos anos deve ser alavancada principalmente por peças como camisetas, jeans e casacos, de acordo com o Iemi. O negócio se tornou tão grande que, não por acaso, acontece em julho a primeira Fashion Week de Nova Iorque dedicada inteiramente aos marmanjos.
DIVERSIDADE NO CLOSET O homem contemporâneo ainda vive sob a influência do uniforme dos grandes industriais de 200 anos atrás. Não é à toa que o conjunto formado por terno, camisa e gravata predomina na vida executiva. Mas a moda masculina está mudando. Pelo menos é o que aposta a nova geração de estilistas que trabalha em paralelo com as marcas comerciais para tentar deixar o figurino dos homens mais condizente com os novos tempos. Tecidos florais, com estampas geométricas como bolinhas e até corações já fazem parte dessa realidade. “O homem de todos os lugares do mundo estava focado em ganhar dinheiro e ter um bom carro para parecer bem-sucedido. Porém, novos pilares se levantaram. Ele quer o carro e o dinheiro, mas precisa cuidar do visual que lhe dá uma condição de autoestima e melhora seus relacionamentos, tanto na vida profissional quanto afetiva”, diz o consultor de moda Bruno Garcia. A diversidade que começa a aparecer no mundo da moda masculina revela que o homem está mais exigente e não se contenta só com o marinho, o marrom, o preto e o cinza. Ele quer opções para se traduzir também pela roupa nos diferentes ambientes em que transita. Descobriu que para gostar de moda não tem necessariamente que gostar dos desfiles, de shopping center, ou de fazer compras. “O homem moderno entende que escolher a própria moda é mais um exercício de autoconhecimento do que uma questão de gastar sola de sapato. Exercício esse que torna o homem mais interessante –independentemente da roupa que vista –, criativo e bonito”, diz a design de moda Juliana Correa. Estamos falando de homens como o médico Marcos Cardoso, de 30 anos. Ele, que só saía de casa usando roupas básicas, como camisas lisas de cores monocromáticas ou peças que descombinavam uma da outra, de uns cinco anos para cá resolveu mudar completamente. O despertar aconteceu depois que o médico foi morar na Austrália para fazer um intercâmbio. Lá, fez amizade com pessoas de sua faixa etária e descobriu o prazer em se vestir bem. “Eu
percebi o quanto eles se preocupavam em aparecer bem vestidos, combinando cores, formas e peças e como apareciam arrumados nos lugares, se davam bem na paquera e ficavam bonitos nas fotos por causa disso”, conta. A mudança ajudou Marcos a se sentir mais seguro, a atrair mais olhares em seus relacionamentos e, consequentemente, a elevar a autoestima. “As pessoas elogiam uma camisa que uso, um relógio, um sapato. Querem saber onde comprei, como eu vou a uma festa. Eu entendi que me arrumar não é só colocar uma roupa e sair de casa. Agora eu tenho o meu próprio estilo, o que me faz me sentir mais bonito”, diz. A sensação de ter um jeito único de sair vestido pelo mundo também é percebida pelo engenheiro Daniel Botelho, 28. Toda vez que vai ao shopping fazer compras com a namorada Luíza Campos, 24, ele deixa a moça na loja preferida dela e sai à caça de produtos que tenham a ver com ele nas grifes em que está acostumado a comprar. “Às vezes acho que ele tem um gosto muito melhor do que o meu”, revela Luíza. Mas o namorado dela explica. “Comprar exige cuidado. Seleciono o que eu gosto, daí analiso todas as peças, experimento e olho tudo detalhadamente. Me preocupo com o tamanho, observo se me deixa confortável. Só aí eu levo”. O cuidado mencionado por Daniel já é seguido à risca pelo fisioterapeuta Diego Leite, 39 anos, um fissurado em moda masculina. Seus braços extremamente musculosos e suas coxas torneadas não permitem que ele use qualquer jeans, peça que sempre corre as mãos nas araras dos estabelecimentos. O jeans é sempre citado como uma roupa que, acima de tudo, traz conforto a quem usa. Acontece que, para atletas e pessoas fortes, às vezes ele fica justo a ponto de incomodar quem não gosta de usá-lo dessa maneira. “A primeira coisa que pergunto ao vendedor é se o jeans possui um corte fit mais folgado. Ou seja, se acompanha as curvas da perna, mas que não fique tão grudado como calças slim fit”, diz. O consultor de moda Bruno Garcia explica que o truque, entretanto, está na cintura. “Geralmente, para homens mais magros, a área destinada à coxa é menor, dependendo da silhueta de quem usa, mas para homens fortes essa área precisa ter mais espaço, sem parecer folgado demais”, analisa.
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MODA ELES ESTÃO NA INTERNET Diferente das mulheres, boa parte do público masculino não segue as cartilhas do mundo da moda. No entanto, a grife brasileira Jack the Barber (Jack, o Barbeiro, em português) surgiu com vontade de mudar esse cenário. A empresa, lançada discretamente há alguns meses, é a primeira do e-commerce dedicada a atender exclusivamente aos homens, com modelos raramente encontrados no varejo tradicional. A ambição é atrair parte dos consumidores que hoje frequentam as lojas de marcas como Ralph Lauren, Tommy Hilfiger, Brooksfield, Noir e a descolada Colcci. Fundada por Guilherme Paulino com o apoio de investidores, a Jack the Barber tem como objetivo resgatar a moda tradicional masculina sem perder o olhar para as novas tendências de modelagem e materiais. “Em um mundo onde o fast fashion está presente no dia a dia das pessoas, queremos resgatar a referência da moda atemporal masculina. Certas coisas são sempre atuais e os homens podem contar conosco para resgatar os conceitos que fazem parte do universo masculino,” diz o empresário. A inspiração surgiu a partir de um episódio frustrante pelo qual ele passou há dois anos, quando tentou comprar uma calça no varejo de rua. Ao experimentá-la, o empresário viu que a peça servia na cintura, mas sobrava demais nas pernas. Por isso, teve de deixar a roupa na loja para que fosse ajustada. Quando voltou para buscá-la, Paulino notou que a barra estava malfeita. “Perdi 15 dias para resolver algo simples”, diz. “Decidi criar uma loja com uma numeração mais completa”, explica. A Jack the Barber, ao contrário da maioria das varejistas, tem numeração de pernas, cintura e largura da calça. Cores inusitadas nos modelos oxford, xadrezes miúdos, colarinhos clássicos e modelagem confortável dão a tônica das camisas; corte reto e acima dos joelhos para as bermudas em cartela viva, que são ótimas para os dias ensolarados; calças cáqui ou sarja de corte reto, chino ou slim – enviadas já nas medidas finais do comprador –; blazers em tons tradicionais como bege e marinho; e calçados casuais como mocassins completam a brincadeira. Junte aí os charmosos pocket squares e a febre das meias coloridas e já se tem um estilo. Mas não é só de roupas e sapatos que vivem os homens. Eles também passaram a se preocupar com os acessórios que compõem o visual. A moda do pulseirismo, prática em usar várias pulseiras ao estilo hippie, já pegou os braços dos marmanjos de todos os estilos e faixas etárias. “Os acessórios aparecem para eles como aliados para deixar um look básico mais interessante ou então ‘conversar’ com uma peça chave”, diz a design de moda Juliana Correa. O olhar atento a esse mercado que não para de crescer fez a estudante de design de moda Brunna Fernandes, 20 anos, largar o emprego num escritório e abrir a Use Pulse, uma
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O homem de todos os lugares do mundo estava focado em ganhar dinheiro e ter um bom carro para parecer bem-sucedido. Agora, ele quer o carro e o dinheiro, mas precisa cuidar do visual que lhe dá autoestima e melhora seus relacionamentos” Bruno Garcia, consultor de moda loja virtual de Salvador especializada em colares e pulseiras. Os produtos são artesanais, produzidos por ela, e feitos sob medida. Custam em média R$ 34,90, e são produzidos a mão, um por um, de acordo com as encomendas. É usado couro legítimo, sintético, fechos práticos, pingentes dos mais diversos tipos, cordões e materiais naturais, como sementes, contas de madeira e fibras de palha. “Temos uma procura imensa do público masculino, correspondente a 80% dos nossos clientes. São homens que curtem cuidar da aparência, com vida social bastante ativa”, diz Brunna. É um público que, segundo Brunna, assim como as mulheres, é bastante exigente e cobra explicações na hora de levar o produto para casa. “Por mais que muitos achem que não, os homens gostam, sim, de saber detalhes dos produtos, tais como material, acabamento, tamanhos, qualidade de atendimento e até mesmo atendimento pós-compra. O preço é o último quesito que costumam avaliar, o que importa mais para eles é a qualidade e o design do produto”. A sócia dela, a estudante de artes Marcelle Fontes, é responsável pela fotografia e gerenciamento das vendas no site e em redes sociais como Facebook e Instagram, além de estar sempre em contato com clientes através do WhatsApp. “Percebemos que pessoas de diversos lugares, principalmente homens de estados como Brasília, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo procuram pelos nossos produtos. O pulseirismo já pegou o universo masculino”, afirma Marcelle.
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E-COMMERCE LUCRATIVO É o tipo de negócio que atrai o publicitário Caio Matos, 25. Além de escolher a dedo a roupa que vai sair, ele sempre combina o relógio com pulseiras e colares. O mix de acessórios, diz ele, ajuda a dar singularidade ao estilo. “Se saio sem uma pulseira dessas, me sinto desarrumado”, enfatiza, enquanto diz ter nove pulseiras apenas no braço esquerdo. Os números relacionados às vendas na internet também mostram que o menswear não para de crescer. Dados da consultoria IbisWorld mostram que as vendas online de peças para homens, seja de roupa ou de acessórios, tiveram uma alta anual de 17,4% no período entre 2010 e primeiro semestre de 2015, superando alimentos (16,7% de crescimento) e calçados (13,6%), os setores que tiveram vendas mais substanciais pela internet.
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Eu entendi que me arrumar não é só colocar uma roupa e sair de casa. Agora eu tenho o meu próprio estilo, o que me faz me sentir mais bonito” Marcos Cardoso, médico
Com tanto interesse e mercado para ser explorado, logo, a necessidade de informações direcionadas para os homens deu abertura para o surgimento das mais diversas orientações. Novos livros sobre moda masculina foram lançados recentemente para ajudar o homem a se encontrar em meio às araras das lojas. Entre eles está Manual de Estilo (Companhia Editora Nacional), da revista americana Esquire, reconhecida mundialmente pelas produções de moda masculina. Entra em ação também o trabalho dos blogueiros masculinos, que, com a demanda alta, vão muito além de apenas dizer o que combina ou não. Eles ajudam os internautas a perceberem o que funciona com o corpo, o estilo e a personalidade de cada um. “Meu site é visitado por vários tipos de homens e de diferentes idades. Eles querem saber o que é tendência, mas também estão preocupados com os cuidados de cabelo e pele”, diz o blogueiro Leonardo Costa. “Eles querem saber opiniões sobre marcas, cores e até mesmo tamanhos. Recebo cerca de cinquenta dúvidas de leitores por dia”, revela o blogueiro David Oliveira. Os dois concordam e deixam bem claro para seus leitores que investir em peças com tecido e corte de boa qualidade é fundamental para se vestir bem. E que qualquer um pode ser arrojado sem perder a elegância e a espontaneidade.
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