Na Cuia 1

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EDIÇÃO 1

ÉPOCA DE PUPUNHA

O INCRÍVEL SORVETE DE PUPUNHA E + uma receita

RETROSPECTIVA DA VIRADA CULTURAL PARAENSE O QUE ACONTECEU NO SUPER EVENTO DE CULTURA NA REGIÇÃO

JURACI SIQUEIRA

a SUA OBRA DE CORPO E ALMA

E MUITO MAIS CULTURA... cONFIRA!

CARIMBÓ Um canto? Uma dança? Um ritmo? Afinal, o que é carimbó? Com a palavra: Dona Onete e Mestre Lucas Bragança, do Grupo Sancari

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A

PALAVRA “CUIA” É DERIVADA DE “KU’YA”, EM TUPI. É A CASCA DO FRUTO DA CUIEIRA PELA METADE, SEM A PARTE DO MEIO. PARA OS PARAENSES, NA CUIA CABE TUDO. NÃO SÓ O TACACÁ, MAS TAMBÉM A MANIÇOBA, O VATAPÁ, O AÇAÍ. COMER NELA TRAZ UM “QUÊ” DE HISTÓRIA, DE REGIONALIDADE TANTO NORTISTA, QUANTO BRASILEIRA. E É ESSA A INTENÇÃO DESSA REVISTA AQUI. A PRETENSÃO É TRAZER AOS LEITORES AS INFLUÊNCIAS DO CENÁRIO AUDIOVISUAL, MUSICAL, LITERÁRIO, GASTRONÔMICO, TEATRAL, E DIVERSOS MAIS, EM CONGRUÊNCIA UNS COM OS OUTROS. A NA CUIA TEM COMO PRINCIPAL FOCO A HISTÓRIA DOS MOVIMENTOS CULTURAIS, QUAIS AS SUAS INFLUÊNCIAS, QUAL O IMPACTO DELES NAS COMUNIDADES DE BELÉM. UMA PREOCUPAÇÃO DA NOSSA EQUIPE É FOMENTAR ESSA NECESSIDADE CRESCENTE DE DIVULGAÇÃO DA PRODUÇÃO CULTURAL LOCAL, PARA A MANUTENÇÃO DO CENÁRIO E A VALORIZAÇÃO DO QUE NOS É PRÓXIMO. ISSO (EU ESPERO!) AJUDA NA CRIAÇÃO DE UM SENTIMENTO DE PERTENCIMENTO A ESSA TERRA E NOS ENVOLVE COM QUEM DEPENDE DAS MANIFESTAÇÕES CULTURAIS PARA SOBREVIVER. COMO VAMOS VER AO LONGO DESSA EDIÇÃO, TEM MUITA GENTE QUE NÃO SÓ VIVE DE ARTE, MAS VIVE A ARTE. O VELHO E O NOVO, O QUE FOI HISTORICAMENTE MARGINALIZADO E ELITIZADO, O INTERNACIONAL E, PRINCIPALMENTE, O REGIONAL. TUDO JUNTO E MISTURADO, NA CUIA.

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Luana Lisboa Arte

Lorena Emanuele

Diretora de Arte Arte Diagramadora Repórter Colaborativa

Social Media Ana Luiza Nogueira Mariana Guimarães


Izadora Nunes

Agenda Cultural Repórter Colaborativa

Vitória Mendes Repórter

Stéfanie Olivier

Resenhista Repórter Colaborativa

Juliana Araújo Editora-Chefe Repórter

Madylene Barata Repórter

Matheus Botelho Repórter

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janeiro 4 . Com farinha pupunha 12. Especial Virada Diversas visões dos nossos repórteres na virada cultural de belém. 18. Agenda Cultural precisa-se sair de casa 22. capa carimbó, o ritmo paraense 28. dona onete força da mulher! 31. juraci siqueira vida e obra do mestre das palavras 36. “beco sem saída” hoje eu não quero voltar sozinho

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Vista Cultura Vista

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coM FARINHA

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POR JULIANA ARAÚJO

Janeiro com gosto de pupunhA Pupunha no doce? Quando os ingredientes regionais ganham força, é preciso inovar e, ainda assim, louvar as tradições

A

Feira da 25, no final da tarde, não passa nem perto de parecer lotada. Na frente das barracas, porém, os poucos vendedores de pupunha, com as bacias da fruta cozida, laranja e vermelho, quase no asfalto e os cachos crus do lado de dentro, esperam os últimos fãs

do seu produto. Distribuída pelos índios sul-americanos, os lugares onde a pupunha foi popularizada foram o litoral da Colômbia, a Costa Rica e a Amazônia brasileira. Por aqui o mercado é de alta qualidade no período de safra, mas durante os outros períodos a fruta é esquecida.>> 7


Marcilene Tavares Magno, feirante há aquilo - às vezes é até mito, sabe? É mais 15 anos, explica que a época da pupunha saber cozinhar mesmo. Se ela descascar lecomeça esse mês e vai até junho. Ou seja, as gal também, ela não é uma pupunha seca, frutas não cozidas que eu via dispostas em sabe?”. Contudo, a facilidade de descascar sua barraca estavam pálidas, não pela qua- o fruto não tem conexão com o teor de óleo, lidade do produto que ela costumava vender, fibras, nem com o sabor. mas pela época do ano, já que a entrevista

Identificar quão saborosa a pupunha é

foi feita ainda em dezembro. Sobre o tempo se torna uma dificuldade pelo fato de que isso de preparo, Marcilene diz que

não é definido pela maturação,

“depende da quantidade. Se

mas aleatoriamente. Por isso é

for pouco - um quilo -, é meia hora. Isso quando tá no tempo da pupunha”. “Quando a gente cozinha, assim, é no máximo umas cinco horas”, a feirante relata. Também, pudera: são trinta quilos de pupunha por dia, só na barraca dela.

Nós podíamos ser conhecidos pelos rios. Mas é pela comida, e não tem incentivo pra isso.

difícil comprar pupunha e também produzí-la: os cachos tem frutas de qualidades diferentes. De acordo com o INPA “existem demandas para pupunha de melhor qualidade na Amazônia, o que oferece uma oportunidade de desenvolver variedades”.

Segundo documento oficial do INPA A pesquisa mostra que a preferência em Be-

(Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), lém é pelo fruto proveniente do seu próprio a época de entressafra, de julho até dezem- estado e da região do rio Solimões, que tem bro, tem seu mercado alimentado por frutas como média os frutos oleosos. derivadas de pupunheiras inermes (sem espinhos), em municípios de tradição agrícola no estado, porém o plantio é voltado para a produção de palmito da pupunha, que se popu-

C

heguei no Dona Dica, restaurante com um ambiente modesto e acolhedor, em uma terça-feira, dia que

larizou recentemente. A produção no segundo o lugar não abre, e César, o idealizador dos semestre ainda é pequena para a demanda.

pratos, puxou duas cadeiras de frente para

A feirante vai apertando as pupunhas a Almirante Tamandaré. Ele falou um pouco

com o polegar e diz: “Falam que a pupunha das suas criações com a pupunha. “Eu já titem que ser roída, a pupunha tem que fazer nha pensado em fazer um salgado com isso, 8


achava interessante, mas o que? Um dia eu

tive o click, sabe?” E assim nasceu o salgado

zem crescer esse mercado, e César reconhe-

de pupunha e linguiça defumada.

ce isto. Nessa época de alta temporada, ele

Sobre a valorização dos ingredientes

fala da gastronomia regional como iniciativa

regionais, o cozinheiro volta a falar de turis-

popular: “Nós podíamos ser conhecidos pelos

mo. “Hoje o turismo de Belém é a gastrono-

rios, pelas manifestações culturais. Mas é pela

mia. Quando chega alguém de fora, a gente

comida, e não tem incentivo pra isso. É por-

diz “vou te levar em um lugar pra comer””. Ele

que as pessoas fazem, é iniciativa popular”.

conta que fica feliz de poder contribuir para o crescimento desse mercado, mas que sempre procura novos lugares dentro da cidade para provar comida nova. “Tem muito lugar que não é valorizado. Encontrei muita coisa

Trabalhos com produtos regionais fa-

A

decoração colorida e descolada da Brigaderie, loja de brigadeiros finos na esquina da Gentil com a Três de Maio,

combina com o estilo da sócia do empre-

gostosa andando pela cidade. São lugares

endimento, Taiana Lauin, que senta comigo

que precisam ser enxergados”.

para conceder a entrevista e pede logo um>> 9


expresso. “É. Nós que fazemos”, ela responde de fazer um segundo teste. “A gente vai fazer rapidamente, quando pergunto se é a loja que uma nova batida, pra colocar uma pupunha produz o sorvete de pupunha que utilizam na diferente, que fica com um paladar mais forbebida que foi divulgada no instagram da Bri- te”. De acordo com a empresário, o foco não gaderie e me fez procurá-la para falar

era ser “forte” nos ingredientes regionais, mas

dos usos alternativos do in-

usá-los para que o paraense

grediente.

entenda que são produtos de

ela continua. A minha taça

com carne seca. “É totalmente

O importado “Na verdade, é uma qualidade. “Desde o começo por ser parceria com a Cairu que a importado - cai a gente tá batendo na tecla de gente tem. Levamos a base muito mais rápido colocar coisas regionais [no e só fazem lá com o proces- no paladar do que cardápio]”. o so das máquinas deles, pra Só de pupunha, já produregional ficar com uma textura boa”, ziu brigadeiro e salgado da fruta de Expresso com Sorvete de Pupunha chega. diferente eu vender um chocolate do Combú, Enquanto eu provo a bebida, ela fazendo a brigadeiro de pupunha, e dizer que estou vendescrição do paladar. E é precisa. “No doce a dendo pupunha vai se perdendo, ela vai caindo pro também um brigadeiro belga. O importado lado do milho”. O sorvete é amidoso, só dá por ser importado, por ser chocolate belga pra sentir o gosto da pupunha bem no final. ele cai muito mais rápido no paladar do que o Com o expresso, fica impressionantemente regional, que lá fora todo mundo ama, adora, leve. 10

vende e explora”. Taiana comenta que a empresa preten-


RECEITA Ingredientes: 1. 100g de pupunha cozida 2. 1 xícara de creme de leite 3. 1 colher de sopa (cheia) de manteiga 4. 2/3 de xícara de bacon em cubinhos 5. Uma pitadinha de sal

Preparo: 1. Descasque e tire o caroço das pupunhas. 2. Frite o bacon - sem colocar óleo nenhum, ele frita com a própria gordura

3. Tire o excesso de gordura do bacon jogando ele em uma “caminha” de papel-toalha. 4. Bata no processador a pupunha e o creme de leite. É recomendado que a fruta ainda esteja quente - e nova! (Comprar e deixar de um dia pro outro pode fazer com que ela fique mais seca). 5. Misture a manteiga na massa do purê. 6. Coloque em uma panela, em fogo médio, mexendo moderamente. 7. Adicione o sal (Eu sei que “uma pitada” não ajuda, mas depende dos outros ingredientes. O jeito é provar, galera, senão corre o risco de salgar!). 8. Adicione o bacon ao purê e continue mexendo! 9. Quando o purê estiver um pouco mais grosso, desligue o fogo. 10.Sirva!

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ESPECIAL VIRADA

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a identidade na Virada cultural Em belém, a virada cultural aconteceu nos dias 13 e 14 de dezembro. foi o primeiro evento desse tipo que a cidade sediou. A equipe dA Na Cuia esteve lá, participou de pertinho de um monte de shows, oficinas, entre outras atividades. Aqui, cada um conta sua experiência no evento.

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POR AMANDA PINHO:

E

conforto cultural, “porque muita gente se limita

m um dos pontos turísticos mais boni- quanto à sua escolha musical, então espero tos e frequentados da cidade, a noite que elas possam conhecer novos artistas e começou agradável e com um clima que todo mundo, do mais pobre até o mais

bem família. Enquanto Tom Salazar e Daiane rico, possa aproveitar o que estão oferecenGasparetto davam início às atrações da noite, do”. Por fim, a noite e o começo da manhã crianças se dividiam entre brincadeiras e pi- foram “uma grande oportunidade de conhepocas à beira do anfiteatro. A segunda atração cer um pouco mais da cultura regional e nada noite foi Delcley Machado que manteve a cional”, como muito bem resume a advogada plateia atenta. A bióloga Pamela Baker, que es- Amanda Vieira. tava com alguns amigos, celebrou o evento, dizendo que “estava faltando algo desse tipo POR JULIANA ARAÚJO: em Belém”.

Toda cabelos e cores, Luê foi a tercei-

ra atração da noite. Um dos momentos mais

C

omecei a Virada indo na Casarela, pra cobrir a Programação Infantil, com desenho e contação de estó-

bonitos da noite, foi quando, violino em mãos, rias, com a designer Júlia Leão, e culinária ela chamou o pai ao palco e, juntos, eles le- infantil com a chef Sophia Honda. O organizavaram um pouco de junho àquela noite de dor Victor Kato, da Ovelha Negra, teve a ideia dezembro. Arthur Espíndola também passou para o evento por causa do próprio filho. “Os por lá com seu samba e quando Dona Onete pais precisam de uma programação para o subiu ao palco a noite já estava em festa. Felix final de semana e as crianças precisam de Robatto, Mestre Vieira e Pio Lobato fecharam um espaço para desacelerar, para criar”, disa noite da melhor maneira possível e a sen- se. Ele me contou que a intenção do projeto sação de que tudo tinha valido à pena era também é criar um público-alvo para o cenápalpável.

rio cultural local, fazendo com que as crianças

Uma enxurrada de preciosidades regio- se envolvam com as atividades e criem gosto

nais em um único palco, em uma única noite pela arte. A Sophia falou da importância do e todo mundo pôde se deliciar com tudo isso envolvimento das crianças em eventos cultusem nem precisar pagar nada. Para a tradu- rais como esse. “As crianças tem que sentir tora Pamela Russo, a Virada Cultural fez com que podem fazer as coisas. que as pessoas saíssem das suas zonas de 14

Elas não podem ser tratadas como se-


res a parte, elas tem que aprender a fazer”,

show foi um dos mais envolventes, o que dei-

disse.

xou Lucas Padilha, vocalista da banda, muito

De noite, fui para a Praça da Bandeira.

satisfeito: “Mesmo com todos os problemas

Quando eu cheguei, a Molho Negro tava aca-

que a gente teve por aqui, a gente conseguiu

bando de tocar. Camila Honda entrou no palco

fazer um show muito bacana. Foi improvisa-

depois da exibição do videoclipe da sua mú-

do, mas foi ótimo”, disse.

sica “Baile Saudoso”. Em entrevista para a Na

Cuia, a cantora, que apresenta as músicas do

Brás, onde acontecia a Virada de Rua, que

CD desde 2012, contou que suas influências

uniu a exposição fotográfica Paráfrica, alguns

foram moldadas no âmbito familiar. Seguido

shows de rap, intervenções de grafite, além

dela, o grupo Cronistas de Rua se apresentou,

de concurso de b-boys. Quando cheguei, por

aquecendo a platéia para a atração nacional:

volta das 17h30, quem se apresentava era a

Emicida. Os fãs do rapper tentaram invadir

Família Sempre Pelo Certo. Para Rog MC, inte-

o backstage e o próprio palco - e um deles

grante do coletivo, “a apresentação foi

conseguiu. Ele movimentou a praça, com forte

algo muito construtivo, principalmente pela

presença de palco e brincando com as mú-

vinda do Bruno B.O., que veio de Ipixuna pra

sicas. A minha noite acabou por aí, mas os

participar da Virada”. E ainda teve uma sur-

shows seguiram, com Strobo e Manoel Cor-

presa: Keila Gentil, vocalista da Gang do Eletro.

deiro na sequência.

Logo após, rolou a Batalha de São Brás, dis-

De lá, segui para o Mercado de São

puta de rimas que acontece todo sábado no

POR VITÓRIA MENDES:

M

inha primeira parada foi na loja Ná

mercado. O vencedor foi o MC Gabriel, que levou um prêmio de 300 reais.

Figueredo. Em clima intimista, a programação no local teve shows

do cantor Lucas Guimarães e das bandas Cais Virado e Meio Amargo. Infelizmente, as constantes quedas de energia na rua atrapalharam o show do Cais Virado, queimando

POR LOUISE LESSA:

E

m uma das ruas estreitas da cidade velha, os 4 garotos se preparavam instalando caixas de som e afinando ins-

trumentos. Na primeira banda a tocar na no

um amplificador no fim da apresentação. Por

primeiro dia de Virada Cultural fez seus show

causa disso, a banda Meio Amargo fez um

entre musicas com arranjos psicodélicos e ti-

show acústico. Apesar dos contratempos, o

radas de humor. Algumas horas depois, no>> 15


início da tarde a Banda A Trip to Forget Some- co pela sua proposta diferenciada de mostrar one com suas guitarras e camadas de efeito as formas de expressão paraense. O espaço tocou. De acordo com Erick Lopes, o guitarrista configurava uma amostra da diversas persoda banda a Virada “é um evento que está ten- nalidades do povo paraense, demonstrada tando fazer um panorama um pouco maior, pelo modo de se vestir e viver em sociedade. não só da música, mas de toda arte em Belém.”

POR MATHEUS BOTELHO:

F

oi caindo a noite e o cortejo das vacas

POR MADYLENE BARATA:

J

á na chegada se ouvia o som do batu-

profanas desceu o Ver-o-Peso, ocupando a rua, contagiando as pessoas em

que no Espaço Casulo Cultural, o som volta. Com o “Cordão da Vaca Virada” as “vaespalhado era, ainda que tímido, um quinhas” cantaram e dançaram ao batuque

atrativo para os que por ali passavam. É que dos tambores, celebrando a lua e a rua como estava acontecendo uma oficina de batuque espaços de ocupação-manifestação-producom Wellington Alemão no salão principal ção de mulheres. “A gente promove os corjunto com a exposição “Cidades Íntimas” e o tejos porque queremos estar na rua falando bazar Bonanza.

para outras mulheres que não fazem parte do

Na Estácio FAP acontecia a exposição grupo e mostrar que a gente quer discutir o

“Diversidades Amazônicas” desenvolvida pe- papel da mulher na sociedade” nos contou los alunos da FAP. A exposição atraia o públi- Erika Boni, uma das participantes do grupo. 16


fotógrafo admitiu que foram fotografias despre-

POR STÉFANIE OLIVIER:

O

Fórum Landi recebeu fotovarais e exposições durante a tarde do dia 13 de Dezembro e o que não faltou

foi criatividade e inspiração! Duas de três paredes laranja continham fotografias do cotidiano de Jeffeson Ferreira e Ellen Almeida, amigos de longa data, capturadas tanto na capital quanto no interior paraense. O grande detalhe deles foi associar cada fotografia a uma frase de Leminsk, grande ídolo dos dois. A outra parede laranja ficou vazia a maior parte do tempo, mas quando o dono dela, Diego de Queiroz, chegou e montou o fotovaral “Projeto Fotográfico Vila da Barca”, contou com as poucas horas que restavam para terminar a exposição do sábado para mostrar o trabalho dele. Poderíamos claramente perceber a sensibilidade dele ao retratar o cotidiano de uma comunidade que vive entre a Belém moderna e a Belém marginalizada, a Vila da Barca. O

tensiosas, mas ao perceber a potencialidade que existia ali correu para se inscrever na exposição da Virada Cultural. Ainda bem, né? A exposição “O Retrato Que Há Em Mim” foi feita por 22 alunos da APAE, orientados pela professora de Artes Silvana Saldanha. Eram fotografias dos próprios alunos que, após visitarem exposições e espaços culturais, pintaram autorretratos de artistas famosos em cima das suas próprias fotos. Por fim, a festa Timeless foi um sucesso. O objetivo? A valorização da música eletrônica na capital paraense. Eric Bordalo, um dos organizadores e DJs da Belhell, disse: “trouxemos DJs que se destacam na cena eletrônica de São Paulo (Renato Cohen) e do Rio de Janeiro (Rodrigo S), mas se o cara que vive em Belém tem mostrado conhecimento no assunto e tido ênfase nesse estilo musical, ele também teve a vez dele na Timeless”.

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AGENDA CULTURAL, POR IZADORA NUNES: Projeto Pôr-do-Som – Estação das Docas Toda sexta-feira a partir das 18h, com entrada franca, na Orla do Armazém 3. Dia 02/01 – Grupo Paranativo

Segue abaixo a programação da Mostra

Melhores de 2014-APJCC, no Cine CCBEU.

Cine CCBEU: Espaço de exibição de gran-

des obras da cinematografia mundial e fórum regular de debates sobre arte, cultura e cinema. Numa parceria entre Centro Cultural Brasil Estados Unidos e Associação Paraense de Jovens Críti-

contemporâneo Pedro Costa, o bressoniano místico Eugène Green e a sensação francesa Abdellatif Kechiche. Juntando-se a eles, aparece uma merecida homenagem ao maior estúdio de animação de todos os tempos, com as obras crepusculares de seus autores-ícones, Hayao Miyazaki e Isao Takahata. Infelizmente, devido a questões estruturais, a Mostra, neste ano, contará com apenas cinco filmes (os cinco primeiros colocados), mas, ainda assim, será a celebração já conhecida. Celebrar o cinema é celebrar o que ele representa, o poder de criar a vida. É refletindo sobre o passado que melhor conseguimos viver o presente e prever o futuro. Feliz 2015! Cauby Monteiro - APJCC 2014

cos de Cinema (APJCC). Nunca antes a Mostra de Melhores Filmes do Ano da APJCC esteve tão de acordo com o gosto que a nossa breve (mas já marcante) história demonstrou ser o nosso. Figuram na lista abaixo vários nomes que, nos últimos sete anos, entraram no panteão de autores celebrados pela nossa associação. Abel Ferrara, Richard Linklater, Wes Anderson, Bong Joon-ho e o primeiro lugar James Gray são velhas apostas que já nos encheram de alegria e que ainda servem para nos lembrar do porque ainda devemos amar e devotar a nossa vida ao cinema. Entre os novatos em nossa tradicional lista, mestres foram finalmente descobertos pelos membros: o português guru do cinema 18

Os 10 Melhores de 2014-APJCC 1-The Immigrant, de James Gray 2-Boyhood, de Richard Linklater 3-Vidas ao Vento, de Hayao Miyazaki 4-Bem vindo a Nova York, de Abel Ferrara 5-O Conto da princesa Kaguya, de Isao Takahata 6-O Grande Hotel Budapeste, de Wes Anderson 7-Snowpiercer, De Bong Joon-ho 8-Cavalo Dinheiro, de Pedro Costa 9-La Sapienza, de Eugène Green 10-Azul é a cor mais quente, de Abdellatif Kechiche


MOSTRA MELHORES DE 2014-APJCC 5º Lugar:

2° Lugar:

05/01 -“O Conto da Princesa Kaguya”,

08/01 -“Boyhood”,

de Isao Takahata

de Richard Linklater

País: Japão

País: Estados Unidos

Ano:2013

Ano:2014

Duração: 137 minutos

Duração: 165 minutos

Livre

12 anos

Trailer:

Trailer:

https://www.youtube.com/watchv=3u8bn1lG_M https://www.youtube.com/watch?v=vsv0HsiZzMw

4º Lugar:

1º Lugar:

06/01 -“Bem-vindo a Nova York”,

09/01 -“The Immigrant”,

de Abel Ferrara

de James Gray

País: Estados Unidos

País: Estados Unidos

Ano:2014

Ano:2013

Duração: 125 minutos

Duração: 113 minutos

16 anos

14 anos

Trailer:

Trailer:

https://www.youtube.com/watch?v=X-ywjLGsE4 https://www.youtube.com/watch?v=wIeVTWABPKU

3º Lugar: 07/01 -“Vidas ao Vento”, de Hayao Miyazaki País: Japão Ano:2013 Duração: 127 minutos 10 anos Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=LLnK6kSL7s 19


Projeto Pôr-do-Som – Estação das Docas Dia 09/01 – Grupo Frutos do Pará (alusivo ao Aniversário de Belém) Serviço: De 05 a 09 de janeiro (segunda a sexta), às 18h30 No Cine Teatro do CCBEU (Travessa Padre Eutíquio, 1309) ENTRADA FRANCA Coordenação e Curadoria: APJCC Realização: CCBEU e APJCC Mais informações: http://cineccbeu.blogspot.com.br/ E-mail: cineccbeu@gmail.com

Projeto Teatrinho do Mangal – Mangal das Garças Quinzenalmente, aos domingos, a partir

O gabineto do Dr. Caligari -1920 15/01 às 16h (Quinta-Feira) Cinema Mostra de sombras que assombram O Homem que ri -1928 O gabinete das figuras de cera- 1924 (18h) 16/01 às 16h (Sexta-Feira) Cinema Mostra de sombras que assombram A Ultima Gargalhada -1924 O Golem -1920

Projeto Pôr-do-Sol – Estação das Docas Em domingos alternados, a partir das 17h30, no Anfiteatro São Pedro Nolasco. A entrada é gratuita. 16/01 – Grupo Raiz de Cafezal

das 10h30, no entorno do Memorial Amazônico da Navegação. A entrada é gratuita. Dia 11/01 – Trupe de Bubuia em “Convite pro Mangal” (Alusivo ao aniversário do Parque) 13/01 às 18h – Sesc Boulevard Cinema Mostra de sombras que assombram Bate papo de abertura da mostra com Marco Antonio Moreira 14/01 às 16h ( Quarta-Feira) Cinema Mostra de sombras que assombram As mãos de Orlac -1924 18h 20

17/01 às 16h (Sábado) Cinema Mostra de sombras que assombram Fausto -1926 Nosferato -1922 (18h) 20/01 (Terça-Feira) Sesc Boulevard

18h- Sarau Literário “Poéticas Amazôni-

cas” com o grupo Griô. Projeto Pôr-do-Sol – Estação das Docas

Em domingos alternados, a partir das 17h30, no Anfiteatro São Pedro Nolasco. A entrada é gratuita. Dia 23/01 – Grupo Balé Folclórico da Amazônia


Projeto Teatrinho do Mangal – Mangal das Garças Quinzenalmente, aos domingos, a partir das 10h30, no entorno do Memorial Amazônico da Navegação. A entrada é gratuita. Dia 25/01 – Ester Sá em “Uma história com mil macacos” Dia 30/01 – Grupo Cheiro do Pará

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CAPA

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POR VITÓRIA MENDES E MATHEUS BOTELHO

Carimbó: A dança da cidade das mangueiras Na tradição e na inovação, investigamos o que é o carimbó para os artistas da área e o que represeta na história do movimento cultural paraense.

E

sse carimbó que não deixa ninguém parado, seja ele de pau e corda ou, como Dona Onete batizou, “chamegado”, tem um pouco do batuque e do “molejo” do negro; da dança em formato de roda e alguns instrumentos como as maracas e o carimbó (ou curimbó) do índio; e a dança em pares, as palmas e o padrão melódico do branco. Além de tudo, uma forte expressão religiosa, onde geralmente se agradece aos santos padroeiros pela boa colheita e pescaria. Sim! Ele tem isso e um pouco mais, como um leque de opções para escolher, se divertir e por que não refletir também? Quando nas letras, em geral, se fala sobre o cotidiano do agricultor ou do pescador e também questões sociais, políticas e ambientais, procura-se a abertura de debates so-

bre esses temas, os expondo nas rodas de carimbó, assim, difundindo o debate dentro dos grupos e das comunidades. Foi dessa forma que começou a se pensar no carimbó como bem cultural imaterial da cultura brasileira. Hoje, o desejo já é realizado. Porém, foi durante os preparativos para o IV Festival de Carimbó de Santarém Novo, no final de 2005, em que, nos debates promovidos pela coordenação do evento observou-se a necessidade de preservação e valorização do carimbó. A partir daí, surgindo a “Campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro” que reuniu várias associações culturais e grupos de carimbó em prol da obtenção do registro. Um desses grupos é o Sancari, nascido lá na rua Álvaro Adolfo, no bairro da Pedreira, em Belém.>>

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A TRADIÇÂO DO GRUPO SANCARI

se apresentava no palco. Ela foi logo me apre-

O

sentando aos integrantes do grupo: os músicos,

Sancari é um grupo de carimbó pau e corda – forma como são identificados os grupos que tradicionalmente

mantém um instrumental mais artesanal – que, há 18 anos atua na capital, não abrindo mão desse estilo mais tradicional de carimbó. Um dos fundadores do grupo é o mestre Lucas Bragança, que também coordena o Sancari, junto com sua esposa, Neire Prestes Rocha. E juntos, eles vivenciam o carimbó e passam essa experiência para os seus filhos e netos, assim como, o grupo como um todo, movimenta a comunidade do bairro aonde mora, com suas festas e com o seu batuque. E pelas peculiaridades que o grupo Sancari possui, sendo um grupo que faz carimbó de raiz numa localidade onde predomina um carimbó direcionado para o mercado, e tendo uma participação feminina efetiva, além do costume de passar de geração em geração – característica dessa expressão cultural – o fazer carimbó, que nós os procuramos para compreender melhor essas peculiaridades e complexidades que o carimbó possui.

Quando entramos em contato com o gru-

po, nos convidaram para participar do evento “Ver -o-Peso da Cultura”, organizado por eles com o apoio da prefeitura de Belém. Aceitamos prontamente. O evento aconteceu num sábado de manhã, no Ver-o-Peso, ao lado do Solar da Beira. Ao chegar, fui recebido pela dona Neire, coordenadora do Sancari, enquanto um grupo de chorinho 24

cantores, dançarinos. Neste momento, o mestre Lucas Bragança estava organizando os instrumentos para apresentação que aconteceria em alguns minutos. Enquanto isso, dona Neire contou um pouco mais sobre a história do grupo e o seu trabalho como coordenadora do Sancari.

“Quando o Sancari começou só eram ho-

mens”, ela diz. No início, o grupo tocava em vários locais e mandava fazer camisas para as apresentações, mas quando terminavam de tocar eles acabavam distribuindo todas e, com isso, sempre precisavam mandar fazer novas. “Então não tinha uma organização”, afirmou. E foi recolhendo as camisas no final das apresentações que dona Neire começou a organizar o grupo, “Quando terminavam de tocar eu pegava as camisas todinhas, guardava, passava, pra em outra apresentação eles terem. E assim foi aumentando.”. Hoje, ela organiza a agenda do grupo, novas empreitadas como o projeto “Ver-o-Peso da Cultura”, a vestimenta e os dançarinos. “Eu fico em casa e penso: Égua, mas esse grupo tem que aparecer!”, comenta. E dessa forma a dona Neire começou a fazer parte efetivamente do grupo, com um toque de cuidado, aliado ao pulso firme e uma boa dose de atitude feminina.

Após os músicos se organizarem, o mestre

Lucas Bragança pôde conversar. Antes que começasse a apresentação, fomos para um local onde havia menos pessoas circulando, afinal, era


um sábado, um dos dias de maior circulação no que as pessoas entendam o que é aquilo que Ver-o-Peso. Assim caminhamos até as proximida- está se fazendo, o que está se tocando. Então, des da Praça do Pescador e batemos um “papo” isso pra mim é importante no carimbó. É mostrar sobre o carimbó: como ele é feito e os seus des- para as pessoas o que na realidade é o carimbó, dobramentos.

como ele é feito”.

COM A PALAVRA: MESTRE LUCAS BRAGANÇA

Na Cuia: Existem vários estilos de carimbó, como

Começamos o nosso diálogo com a seguinte pergunta: O que é carimbó? Mestre Lucas Bragança: “O Carimbó, pra mim... O carimbó ele me dá quase tudo o que eu preciso - me dá alegria de chegar, cantar, ver, ver o povo dançando... Então, o carimbó me dá essa vontade de viver mais, cada vez mais esses momentos. O carimbó pra mim está como se fosse... como se fosse não - o carimbó pra mim é uma parte principal da minha vida”.

o carimbó tradicional, que é chamado de pau e corda; o carimbó estilizado, que é chamado de carimbó “chamegado”. Como você vê esses estilos e as suas diferenças? Mestre Lucas Bragança: “É assim: o carimbó na realidade foi difundido da necessidade de “mostragem” mesmo para turistas, o povo de fora ver. Então as pessoas foram vendo uma necessidade de, com a tecnologia maior, foram introduzindo no carimbó algumas coisas que, por exemplo, não tem no meu grupo. O meu grupo toca

Na Cuia: E como é para você fazer o carimbó?

um carimbó de raiz, pau e corda. Nós jamais ire-

Mestre Lucas Bragança: “Na realidade, nós

mos botar uma bateria, um teclado ou um baixo,

já pegamos essa célula pronta dos nossos an-

uma guitarra, um violão, isso não vai acontecer

tepassados, são coisas que já vem de família.

no nosso grupo. Mas devido essa necessidade

Então nós já pegamos encaminhado. O que nós

de mostrar aquele carimbó comercial, é que se

estamos fazendo é tentar melhorar cada vez mais

formaram os grupos desse carimbó mais mo-

nosso carimbó, nosso ritmo, nossa audição, para

derno, mais estilizado. >> 25


E essa que é a diferença, e mesmo no carimbó com esse registro de patrimônio cultural imaterial de raiz, dependendo de cada região, você sente brasileiro, ele vem nos dar mais suporte, mais uma diferença. Você diz: ‘Pô, mas os caras tocam apoio, mais política cultural. Então esse momento um carimbó de raiz igual como tocam lá, mas agora que é o momento de nós mostrarmos por aqui é um pouquinho diferente’. Isso por que cada que que nós lutamos tanto para esse carimbó ser região do nosso estado, onde toca-se carimbó, registrado como patrimônio cultural. Então agora é tem uma célula diferente, tem um gingado próprio, hora de nos juntarmos e ver. Então o nosso objetium jeito de tocar que pertence a eles, um jeito vo agora, é fazer o que? É resgatar aqueles mesde cantar. Então são essas coisas que fazem o tres que estão abandonados no interior, é fazer a carimbó ser o que é: essa mistura, diversidade salvaguarda dos mestres. A salvaguarda dos múde ritmos, que no final das contas acaba sendo o sicos, a salvaguarda dos compositores. É isso que mesmo carimbó, mas com suas peculiaridades, vem fortificar esse nosso trabalho. Quer dizer que suas diferenças de um lugar para o outro”.

essa nossa luta, a gente lutou não por ser patri-

Na Cuia: Como você vê o carimbó estilizado?

mônio, mas sim querendo buscar algo mais para

Mestre Lucas Bragança: “Eu acho que o ca- aquelas pessoas que lutam em favor do nosso rimbó é carimbó, independentemente de ser esti- carimbó”. lizado, “chamegado”, como a Dona Onete diz, ou Na Cuia: Qual a importância de produzir os prócomo a gente que faz o carimbó de raiz. Eu acho prios instrumentos? que é carimbó. Agora, para nós, num estilo que, Mestre Lucas Bragança: “Bom, primeiro que se for de interesse realmente comercial, ele vem a gente está fazendo aquilo que a gente gosta e, influenciando a galerinha aí para tocar esse ca- no meu caso, eu estou repassando aquilo, estou rimbó desse jeito. Então isso está mostrando que mostrando para as pessoas o meu trabalho, denaqui se faz carimbó de diversas maneiras, diver- tro da minha cultura (o que eu faço), mostrando sas formas, jeitos de cantar diferentes, jeitos de to- para outras pessoas. A gente vende, a gente dá, a car diferentes. Então isso é legal. Até por que se gente empresta... Então, isso é que é legal, que a não tivesse isso, fosse o tempo todo a mesmice, gente está produzindo aquilo o que a gente contodo tempo a mesma coisa... Então tem uma dife- some no nosso dia-a-dia no meio da nossa culturença. Isso é bacana de ver. Eu acho importante ra. A gente constrói e a confecção de instrumentos isso pro nosso carimbó”.

é uma coisa maravilhosa que a gente faz. E eu

Na Cuia: Pra você, qual a importância de ter o

graças a Deus tenho esse dom de fazer isso. E a

carimbó registrado como patrimônio?

gente vende, empresta, aluga, dá. E assim a gente

Mestre Lucas Bragança: “O carimbó agora, vai mostrando...” 26


Na Cuia: Vocês fazem oficinas ensinando os jo- hoje não, hoje a gente já vê que está bem legal. A vens do grupo Sancari?

participação dos jovens hoje está muito bacana.

Mestre Lucas Bragança: “É, na realidade os A gente já vê os jovens mais presentes. Então a meninos que tocam com a gente estão desde participação deles hoje está boa”. criancinha. A gente está sempre incentivando essa Na Cuia: o que é preciso para ser um mestre de vivência das crianças, até para o nosso lado - ao carimbó? invés deles irem para outros canais, não, vamos Mestre Lucas Bragança: “Bom, primeiro você colocar aqui esses “moleques” do nosso lado e tem que ter uma certa experiência e passar, transhoje a gente já tem e os molequinhos estão to- mitir essa experiência, do seu conhecimento para cando aí com a gente direto e é muito bacana a as pessoas mais jovens. Trazer, ensinar eles a fagente ver isso”.

zerem aquilo que você faz, viver aquilo que você

Na Cuia: E como você vê a participação des- vive, naquele contexto do carimbó. Então isso, sa nova geração, da juventude, nesse carimbó e para gente ser um mestre mesmo tem que ter dentro do grupo Sancari?

todos esses requisitos aí. Primeiro que a gente não

Mestre Lucas Bragança: “Bom, pelo menos pode ser egoísta, de ter só para a gente. Eu morro, eu posso falar pela nossa comunidade, onde a

e aí? O que eu vivi, o que eu fiz não vai servir de

gente mora, no bairro, na rua onde a gente mora. mais nada, por que eu morri, levei comigo, ponto. Lá as crianças são muito envolvidas com o nos- Eu tendo pessoas que fazem aquilo o que eu faço, so carimbó. Quando a gente está lá brincando ou vai dar continuidade ao meu trabalho”. ensaiando eles estão lá pelo meio. Aí um pega Na Cuia: E qual a importância de se ter um mesuma maraca e sacode... Então, o envolvimento tre de carimbó? deles dentro do nosso carimbó é muito forte lá na Mestre Lucas Bragança: “Na realidade isso vem nossa rua. Mas isso pra mim é... Eles vão ser o de mitos. Porque a pessoa, como a gente diz no futuro do Sancari! Por isso é que a gente está tra- interior, o mestre, é a pessoa que tem a experiênzendo essas crianças. Porque daqui a mais uns, cia da vivência, de conhecimento, de saber fazer digamos, dez anos, vamos dizer que eu me apo- as coisas. Então esse é que é mais o sentido do sente ou eu morra, mas tem as crianças que vão mestre. Mas para nós, a gente tem o mestre como dar continuidade a esse trabalho. Então por isso é uma pessoa fundamental para aquilo o que a que é importante a participação dos jovens”.

gente faz”.

Na Cuia: O senhor acha que há uma resistência Na Cuia: Como é que você vê a participação da dos jovens ao carimbó?

mulher no carimbó?

Mestre Lucas Bragança: “Olha, já foi pior. Mas

>> 27


Mestre Lucas Bragança: “Ah, rapaz, na realidade, eu acho que a participação, não só no carimbó, mas em todo o contexto é fundamental. Primeiro, que eu como um homem - a mulher que nos deu a vida. Então isso aí já diz tudo. Eu acho que... Eu acho não, tenho certeza que a mulher é a coisa mais importante que existe neste mundo em que nós vivemos. É de lá que surge as vidas, é de lá que saem as experiências, o carinho de mãe. A mulher é fundamental, sem mulher “tá” pegando!” Na Cuia: Você acha que mulher pode ser mestra

NINGUÉM DUVID

de carimbó? Mestre Lucas Bragança: “Com certeza! Não só pode como tem! Porque as mulheres que vivem no interior mesmo têm essa vivência direto. Ali na vila Silva nós temos várias mestras de carimbó lá. O grupo “As sereias do mar” é só mulher. Elas são mestras, elas transmitem para as outras meninas aquilo o que elas vivem. Então isso é fundamental”. Na Cuia: Então muito obrigado, mestre, por responder as nossas perguntas. Afinal é um tema muito importante da gente debater. Mestre Lucas Bragança: “Se você for fazer um trabalho mesmo a fundo, você passa a vida todinha falando de carimbó e não consegue terminar. Porque a dinâmica é muito rápida, é muita coisa. Tem coisas que você nem imagina que aconteça dentro do carimbó. Você lá no interior vê. Então isso é bacana a gente ver”.

28

Cheguei à casa de Dona Onete em um

fim de tarde gostoso, desses que não têm uma nuvem no céu e bate um vento bom; um convite silencioso para ficar na varanda papeando. Na mesma hora, havia chegado um rapaz numa moto, funcionário de uma empresa, pedindo que ela autografasse seu disco Feitiço Caboclo para a pessoa cujo nome estava escrito em um papel. Ela joga a chave do portão para mim (confesso que me senti de casa nessa hora) e me pede para levar até ela papel com o nome. Quem encomendou o autógrafo foi Chay Suede, o galã do momento da TV Globo. Um fã assumido de nossa rainha do carimbó chamegado. Ela assina o disco carinhosamente, faz marcas de bei jos com o batom e me faz entregar para o moço da moto. Sortudo esse Chay!


DE DA FORÇA DA MULHER!

Assim é Dona Onete: admirada por pú-

ela, trata-se de um meio “completamente machis-

blicos de várias idades e cidades do Brasil. Um

ta. Eles se reúnem, aquele bocado de homem, e

prestígio que alcançou não apenas pela simpatia,

cantam. Se surge um grupo de mulheres, não sai

mas pela criatividade ao transformar

do lugar.”. “Mas eu sou mestra!”,

o carimbó de raíz em um ritmo com

afirma.

mens, claro.

vidada para dar palestras sobre

Você tem o mais swing, adicionando guitarra e Os mestres são aqueles poder, meu outros instrumentos. “Eu tirei de um capazes não apenas de cantar, amor. Nós não marasmo”, ela diz. A conversa foi mas compõem e, principalmente, estamos sobre a presença feminina no capossuem um conhecimento para abaixo de falar a respeito do carimbó. Conta rimbó, um mundo cheio de grandes mestres. Predominantemente ho- ninguém. com orgulho que tem sido con

Dona Onete afirma que não são muitas

cultura paraense em escolas e congressos. “Eu

as mulheres que cantam carimbó. Destaca suas

só falo das coisas que eu convivi, que eu sei, ou

amigas Bea e Esperança, pesquisadoras do ritmo,

que eu apalpei e peguei, que seja concreto.”. Mas

e Lia Sophia. “A mulher é mais sensitiva, é malicio-

seu conhecimento não advém apenas da experi-

sa. O jeito da mulher cantar é diferente”. Segundo

ência no interior do Estado. >> 29


Ela também estudou Psicologia da Infância e da e agora, internacional. Apesar dos percalços, é ela Adolescência, participou de movimentos sociais e a principal representante do carimbó em outras integrou a Secretaria de Cultura do Pará. “Eu já era terras. Recentemente, gravou um vídeo da música de mente aberta há muito tempo. Acho que é por Boi Guitarreiro para a BBC Mundo e no dia desisso que cheguei até aqui.”

ta conversa, estava de viagem marcada para se

Mesmo com tanto conhecimento sobre o apresentar no Caixa Cultural de Curitiba. E é por

assunto, Dona Onete sentiu a discriminação e ex- isso que diz, com tanta segurança: “Eu, nesse uniclusão daqueles que estavam envolvidos no mo- verso masculino, já conquistei meu espaço.”. vimento para transformar o carimbó em Patrimô-

E ela acrescenta outros exemplos inspira-

nio Cultural Imaterial do Brasil. Sobre uma possível dores: “Você já leu Eneida? Eneida de Moraes foi mudança de postura após o título, em setembro, abusada, atrevida. E não foi só ela! Outras mulheela critica: “Não fizeram nada, não vejo nada, não res entraram na Cabanagem e atiraram. Faziam tá acontecendo nada. Nem a festa que poderia tudo que um homem faz. E agora que estamos ter na cidade, um grande arrastão como o Arraial vendo uma mulher na Presidência da República? do Pavulagem... Eu acharia que devia ser isso. Po- Nunca pensavam que veríamos isso num munderiam mandar buscar grupos de Marapanim, do tão machista quanto o nosso. E ela é mão de colocar todo mundo na rua. Não teve. Tinha dois ferro, pulso de ferro. Eles querem um mundo de grupinhos que queriam se fazer presente. Eu não homens. E a gente não vai deixar.”. fui convidada. Pinduca também não foi.”.

Pergunto, finalmente, se uma mulher tão

Em 2006, foi campeã do Festival do Ca- poderosa como Dona Onete tem um recado a

rimbó de Marapanim, cantando com o grupo Ra- dar para nós. E a resposta não poderia encerrar ízes do Cafezal. “Nunca ninguém tinha ganhado, essa conversa de maneira mais encorajadora: “Eu além deles mesmos de lá. Fui campeã. E custou deixo um recado: Que continuem sendo o que muito. Tivemos que brigar com jurados pra ga- são. Lutadoras, poderosas, atrevidas e abusadas. nhar esse campeonato.”. Mesmo com esse feito, É o nosso lema. Você tem o poder, meu amor. diz que se sente excluída da história resgatada Nós não estamos abaixo de ninguém.”. nas pesquisas realizadas para dar o título de patrimônio ao ritmo. “Aí o que aconteceu comigo? Me transformei. Cantei carimbó do jeito que eu queria que ele fosse. Não fiquei apegada a isso.”.

E foi com um pouco de chamego e malí-

cia que ganhou notoriedade no cenário nacional 30


Juraci Siqueira e a obra não nasceu para quatro paredes

Gostava de olhar o rio POR MADYLENE BARATA

Em sua luta constante E costumava dizer: - “Nossa vida é semelhante Ao rio que calmo desponta Tem preamar e reponta, Possui enchente e vazante...” (Juraci Siqueira) 31


N

ão foi difícil encontrar o poeta Juraci Siquei-

tura, poeta-performista e tudo mais que decidir ser

ra, muito menos constatar a simplicidade

ele pode fazer coexistir, porque ele harmoniza em

e a alegria que ele enxerga a vida e as

si essas e tantas outras qualidades.

pessoas. É grande a satisfação de ouvir as experi-

ências de um homem que desde cedo se encan-

sua obra. O escritor já publicou de tudo “tenho do

tou e se dedicou à poesia. Juraci tem a palavra

religioso, do pornô rasgado até o infantil” ele diz.

como orientação, é com ela que ele materializa a

“Tem momentos que falo sério e tem momentos

sua concepção sobre o mundo, harmoniza frases

que eu tenho fala escrachada mesmo. Eu não

e versos e as expressam oralmente ou por meio

paro nem num tema nem num formato, escrevo

da escrita.

pra todo mundo porque tem pessoas que gostam

Professor, filósofo, artista e viajante, Juraci

desse meu lado safado, tem outras que gostam

saiu do interior do Pará para mostrar sua poesia

do meu lado infantil. Eu não tenho que escolher

para o mundo. A mudança de Cajari para Belém

leitor, o leitor que tem que escolher o que gosta da

foi, simbolicamente, a travessia de uma vida pa-

minha obra” complementa.

cata para uma vida pulsante, que lhe proporcio-

nou compartilhar com a gente o encantamento

contar histórias, declamar poemas e cantar tro-

de seus versos leves e sonoros.

vas. Teve muito cedo contato com a literatura de

Saiu de Cajari exatamente aos 16 anos.

cordel, a principal responsável para suas produ-

Foi para Macapá e se casou. A profissão de açou-

ções atuais. O poeta conta que para a produção

gueiro lhe fez conhecer muitas pessoas, dentre

de obras Infanto-juvenis Uma neta foi uma grande

elas poetas, que passava horas falando de poe-

instigadora, ela criou três personagens e fazia com

sia e literatura. Foi então que começou a escrever

ele contasse histórias diferentes usando sempre

o primeiro. A vinda de Macapá para Belém não

os mesmos personagens. Via que nessas obras

tardou, aqui ele começou uma vida acadêmica

sempre havia animais de outras faunas, mas se

(fez graduação em filosofia na Universidade Fede-

perguntou: “E nossos animais? E nossas mucuras

ral do Pará), participou e fomentou alguns eventos

e quatis?” Foi ai que criou poemas com os bichos

culturais e se acostumou com uma vida múltipla.

da Amazônia e observou que atingia as crianças.

Hoje é poeta, filósofo, professor, oficineiro de

Essa qualidade artística reflete muito em

Quando criança escutava seu padrasto

Juraci Siqueira não só conhece muito da

literatura, performista, contador de histórias; poeta-

cultura daqui, mas vivencia, fundou e mantém

filósofo, professor-poeta, performista-contador de

muitos grupos. “A minha mãe é a Amazônia. Nós

história, filósofo-professor, filósofo-oficineiro de ltera-

temos voz também e eu sou a voz que canta por

32


aquele que não tem voz, meu cantar pela Ama- e o estupro continua, “o capitalismo te ‘emprenha’ zônia é assim, minha arma é a palavra”. O poeta de dívidas e dúvidas. Ser filho de boto é ser filho leva a poesia para os lugares mais simples, ins- desse sistema que está ai”. trui, ajuda, orienta. Juraci há 28 anos deixa uma

Mas existe no Juraci o oposto do que mui-

extensão de si para cada pessoa que conhece e tos leem hoje. Com um humor subversivo Os encontra, é um coração com um trecho poético.

Versos Sacânicos lembram por vezes Bocage ou

Como veio do interior do Pará, conta que Gregório de Matos. Resultado de um trabalho do

muito do que escreve é influenciado pelas narra- jornal PQP que quer dizer, cinicamente, “Jornal tivas que ouvia de pessoas simples, contadores Para Quem Pode” de Raimundo Mário Sobral, esde histórias natos. “O regional marca a tua vivên- tes versos trazem sem nenhum pudor histórias de cia, não dá para negar, o artista regional se nutre pessoas do (nosso) cotidiano. das vivências e dos signos regionais por que eles

O que me parece é que ainda é difícil en-

possuem uma força muito forte sobre a vida do xergar a poesia no que está próximo, perto, na artista” diz Juraci Siqueira. Sua obra apresenta as essência das coisas simples. O mistério de sentirlendas da Amazônia sem ser pueril, pois ela pos- se perto da própria vida ao ler o poema de um sui mais do que uma reprodução de narrativas, outro. Talvez por isso exista gente que ainda não ela situa o ser personagem-leitor num universo de conhece as obras de Juraci Siqueira, talvez por subjetividades universais.

isso alguém pode erroneamente achar que “O

A representação do boto vai além dos re- chapeu do boto”, “O menino que ouvia estrelas e

flexos de sua vivência no interior, há uma signifi- se sonhara canoeiro” e até “Os versos sacânicos” cação ampla e comum para essa representação. não são literatura, ou são limitadas por que apreO poeta afirma com sagacidade que, apesar da sentam temáticas amazônicas. personificação em Boto, ele não é o boto, mas

A conversa de quase uma hora com Ivone

é um dos filhos do boto. E não apenas ele, nós Carvalho e Hiran Possas foi por esse caminho e também somos porque “ser filho de boto é ser eles me fizeram conhecer muito mais do que o filho de um estupro, segundo a lenda. Nós, os bra- escritor. Ambos fazem pesquisa sobre a obra de sileiros somos resultados de um estupro porque Juraci Siqueira. Ivone faz mestrado em Educação fomos invadidos por um povo que não falava na UEPA e Hiran Possas tece sua tese de Doutoranossa língua, que não tinha a nossa religião, que do sobre o Juraci na PUC de São Paulo, mas a tinha outra forma de comércio. Fomos invadidos, fala dos dois foram mais que falas de pesquisafoi trocado nossa religião, foi trocado nossa língua” dores, >> 33


foram falas de encantados e conhecedores da ços públicos. Sua obra não nasceu para quatro vida de Juraci Siqueira.

paredes ou para respirar “mofo” e “naftalina” dos

Ivone Carvalho me dizia que “Juraci situa gabinetes.Seu texto é solar, germinado pela velo-

o ser no regional, ele fala do sujeito, aquele que cidade das transformações mundanas, especialpode estar em qualquer lugar do mundo, mas mente das ‘bordas’ ” disse com muita autoridade está sendo representado metaforicamente por Hiran Possas. aquele regional” e Hiran Possas, não simultanea-

Ninguém se basta, me disse Juraci, e ele

mente, complementava “penso que Juraci repre- é fruto de tudo que viveu e de todas as pessoas senta primeiramente a vida, o homem, o universal. com quem conversou. Vive naturalmente através Suas texturas são telas sobre o homem com

da palavra escrita ou co(a)ntada a própria essên-

tintas marcantes para as Amazônias. O “glocal” cia humana, diz que “se fosse crime ser poeta, setransita em sua poética simplesmente por Juraci ria condenado, já não poderia mais negar.” Aos ser um flâneur devorador da outridade”.

66 anos com o corpo de 40, como ele mesmo

Juraci Siqueira é assim, gosta de desafios afirma, “já está é muito no lucro” por conta de tan-

e prefere ser escolhido ao escolher. “Eu não esco- tos reconhecimentos já recebido pelo Pará afora. A lho o leitor, o leitor que me escolhe. Eu escrevo pra conversa foi longa, e mais parecia uma verdadeira todos os gostos, não tenho uma temática única, aula de filosofia com um verdadeiro mestre do que trabalho todas as formas possíveis, posso traba- uma entrevista para uma matéria. Foi então que lhar o crônica, o conto, literatura de cordel, trova, percebi que a obra e o autor não caberiam aqui, soneto Haikai, poemas em versos livres tudo para pois são muitos detalhes, muitas experiências e as pessoas descobrirem as várias maneiras de poemas que têm mais de 30 anos. São poesias usar um texto poético” conta.

plausíveis, experiência de várias vidas numa só.

Não escreveu para ser grande e famoso, Basta dizer então que esta matéria termina aqui,

mas hoje é reconhecido e homenageado. Repug- mas obra de Juraci Siqueira não e agora ele, um na artistas que acreditam ser superiores, para eles ser poeta, o poeta canoeiro, está levando a poesia deixa uma mensagem: “Aos homens de muito daqui para o mundo. siso, eu volto sempre a insistir, Deus não nos daria o riso se não fosse para sorrir”. Também não lhe é virtuoso a estabilidade ilustre de uma cadeira na Academia Paraense de Letras, “Juraci é um eleito pela Academia das ruas, das praças e dos espa34


35


BECO SEM SAÍDA POR STÉFANIE OLIVIER

36


H

oje Eu Quero Voltar Sozinho é um filme correto além de já existir, foi ela quem causou que tem como personagens principais sucesso e fez o diretor Daniel Ribeiro disparar e estereótipos alvos de preconceitos na ser motivado a roteirizar um longa-metragem.

sociedade: um garoto cego (Leonardo) e o A ingenuidade foi necessária pra construir o menino que vai do interior para a capital (Ga- diferencial e, consequentemente, o destaque. briel), como se já não o suficientemente passí- veis de bullying, descobrem-

Também não digo que o roteiro foi perfei-

to. Chego a arriscar que foi quadrado demais,

se gays. Sem falar da melhor amiga (Giova- esquematizado demais e até treinado demais. na) que acredita no amor de contos de fadas Não saía natural na voz dos nossos queridos e é apaixonada pelo melhor amigo, acaba três protagonistas. O que transmite a realidade achando que o romance dela vai começar nos personagens pra gente é o tom de nervocom o novo aluno do colégio. Mas o destino sismo ao falar algo importante ou a sensação nunca fica ao lado dos sonhadores.

de vergonha que sentimos junto com eles, é

O diretor Daniel Ribeiro capricha na lim- aquele pequeno sotaque presente na fala de-

peza estética do filme e não pensa duas ve- les que é próprio de ator iniciante. Pensamos zes antes de dar um ar mais americanizado que eles estão até nervosos por estarem inno cenário. O filme tem como espaço a ca- terpretando papéis diferentes do comum pela pital de São Paulo, mas se em nenhum mo- primeira vez, mas se vocês perceberem o Famento do longa citassem a localidade, imagi- bio Audi, ator que interpreta o Gabriel, tem 27 naríamos que se passaria em algum interior anos e muita bem pacato. Tirando esse detalhe (que me experiência na dramaturgia. importunou muito durante todo os 95 minutos

O preconceito existe no filme na forma

de filme) preciso dizer que a mensagem, ape- dos pais que têm receio de deixar o filho desar de tão esteticamente quadrada quanto os ficiente fazer uma viagem de intercâmbio, ou enquadramentos do filme, é linda. “O amor é até mesmo com os colegas da escola, tamcego” e c’est la vie.

bém notamos quando os colegas da classe

Esse resumo faz com que o filme, além têm raiva do barulho da máquina de escrever

dos motivos estéticos, fique mais idealizado e de uma certa “proteção” que a professora ainda. Mas vale ressaltar que o foi baseado no tem com o Leonardo. Mas entre eles três - Leo, curta-metragem Hoje Eu Não Quero Voltar So- Gabriel e Gi - percebemos que as intrigas são zinho e essa essência com ar perfeitamente mais sentimentais que físicas. 37


O que chama a atenção de Leonardo plorarem os sentimentos dela. Quer dizer, todo

no Gabriel é o poder de descobrir novas sen- mundo já amou o melhor amigo que ama sações, coisa que a melhor amiga dele não outra pessoa, então seria fácil de sentirmos na poderia dar. Quando ele descobre que está pele o que ela passou, mas apesar de ela ter apaixonado pelo amigo não há um nervosis- reagido de forma estranha ao saber da paimo sobre ser um garoto ou o questionamento xão do melhor amigo, parece que ela foi tão sobre a reação dos pais e dos colegas de passiva... senti falta de uma cena feita apenas sala de aula, mas sim aquele nervosismo do pra ela. primeiro amor de qualquer pessoa. A dúvida se é recíproco ou não. Isso é bonito.

Apesar da limpeza estética excessiva, é

impossível não nos apaixonarmos pelos per-

Já o Gabriel não hesita em aceitar fazer sonagens e até pela trilha sonora do filme. Na

o trabalho com o Leo, mesmo sabendo que cena final, quando o Leo e o Gabriel estão anpoderia ser um processo mais lento ou que a dando de bicicleta e começa a tocar La Belle máquina poderia o irritar em um momento de e Sebastian - There’s Too Much Love (música estresse pela conclusão do trabalho. E apesar preferida do Gabriel no filme), a nossa vontade de tentarem nos passar um certo receio por é de sair correndo e baixar a música, aprenter se apaixonado por um garoto (quando ele der a letra e arranjar um amorzinho pra dantenta se envolver com a Karina), o medo de ter çar com a gente no nosso quarto, que nem a um relacionamento

cena dos dois meninos no quarto do Leo.

com o Leo não é por ele ser um menino e sim por não saber se é recíproco também. Ah, Ele foi exibido no Cine Líbero Luxardo o primeiro amor...

Vou pedindo desculpas aos fãs da Gi zembro.

por não ter falado muito dela por aqui, mas é que eu realmente acho que ela teve uma função boa no curta-metragem, mas não souberam aproveitar a personagem no longa. Parece que só a colocaram porque ela estava no projeto original. Ela ficou sendo apenas a parte engraçada e em todas as cenas tentavam encaixar ela em algum lugar. Senti falta de ex38

(Centur) nos dias 19, 20 e 21 de de-


39


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