Revista radar

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radar

editorial

Bem-vindo! Você tem em suas mãos a primeira edição da Radar! Seja bem-vindo! A Radar nasce de uma proposta pioneira: acreditar em nossa região como um polo da produção cultural. Acreditamos no potencial criativo da nossa gente. Parafraseando Vitor Ramil, podemos não estar no centro do país ou nos tradicionais pontos de efervecência cultural, mas estamos no centro de uma outra história. Não somos uma revista pelotense, somos uma revista pampeana, e gostamos de imaginar que rap e a milonga não são tão diferentes um do outro. Nesta primeira edição, buscamos aliar o valor da cultura gaúcha, olhando o mundo através de nossos olhos. Tenha uma boa leitura! Um fraterno abraço da Equipe Radar.

NESTA EDIÇÃO

pág. 3 CAPA | pág. 4 CRÔNICAS | pág. 6 DONNA DINNAH | pág. 10 CULTIVANDO AS TRADIÇÕES | pág. 14 A MORTE DE UM ÍDOLO | pág. 16 LEIA MULHERES | pág. 20 CULTURA POMERANA CAMPONESA | pág. 22 POR TRÁS DA COROA | pág.24 DICAS | pág.26 DOS LEITORES

Expediente

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diretora Mariana Lealdino | editor Douglas Dutra | repórteres Brenda Vieira, Nicole Collares e Sara Carulina | imagens Hiago Reisdoerfer | diagramação Felipe Madeira | revisão Júlia Sassi e Júlia Wasieleski | colunas Fábio Ávila

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radar edições


capa

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Na capa desta edição “Todos caminhos levam ao sol” do fotógrafo pelotense Gabriel Huth. Pelotas, junho de 2017

Na contracapa: Sem título

Gabriel Huth, 36 anos, é fotógrafo e engenheiro por formação. É estudante de jornalismo na UFPel e estagiário em fotojornalismo no Diário Popular. Conheça seu trabalho em facebook.com/ gabrielhuthfotografia

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Júlia Wasieleski

crônica

A Resistência do Teatro

É preciso entender a importância do teatro na sociedade como forma de cultura e meio de comunicação. Com origem na Grécia Antiga, o teatro teve como primeiro espetáculo a homenagem ao Deus Dionísio, registrado na literatura. O teatro é cultura e pode carregar uma infinidade de características dos mais diversos lugares do mundo. É possível fazer uma peça sobre romances dos anos 70 nos palcos atuais, ou uma peça francesa em palcos brasileiros. Levando em conta que a comunicação é quando duas consciências trocam informações, o teatro é um meio de comunicação, pois faz a troca de informações entre os personagens e a platéia por meio da atuação e dos símbolos. É perceptível que com as novas tecnologias, o teatro foi perdendo espaço, principalmente para as Telenovelas. Apesar disso, muitos artistas promovem peças e criam companhias com o objetivo de disseminar e preservar o teatro. A cultura passou por grandes mudanças com a globalização e as novas tecnologias. A mistura de culturas causou um grande impacto em diversos lugares do mundo. O acesso a informação ficou mais fácil. Saber o que é cultura e diferenciar uma da outra ficou mais difí-

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cil. Se antes era possível separar cultura erudita e popular, agora a cultura de massa ganhou espaço e o desmembramento de cada uma se tornou uma tarefa complicada. Isso afetou o teatro, principalmente com o surgimento das Telenovelas. Passou a ser mais interessante ficar no conforto do sofá se divertindo com as histórias passadas na televisão. Os palcos se tornaram ultrapassados, menos interessantes. As pessoas passaram a se importar mais com o imediatismo, com as sensações que as novas tecnologias trazem. Deixaram de lado os teatros, museus, concertos e exposições. A resistência do teatro como forma de disseminação de cultura pode ser visto nas companhias de teatro independentes, que tem o objetivo de passar para as pessoas todo o cunho cultural que o teatro carrega. O teatro é único, não se iguala às novas tecnologias, cada atuação, mesmo quando repetida, nunca vai ser idêntica. O teatro surpreende por ser, de geração em geração, uma forma de comunicar, informar e contar histórias. É capaz de misturar culturas sem perder a essência. É a originalidade da cultura no caos tecnológico.


crônica

Show de graça o ano inteiro O entretenimento e algo de suma importância na vida das pessoas, o cinema, teatro e mais atualmente os shows musicais, sobretudo os mais populares. Não diferente de tantas outras opções de distração, os shows estão cada vez mais caros, assim, o entretenimento alternativo e barato é almejado e bem vindo. Apreciadores de músicas clássicas ou mesmo do popular flash back, podem dispor de apresentações de alto nível profissional e técnico diariamente nas ruas da cidade de Pelotas, artistas de rua encontraram meio de sustento nas praças, ruas e no centenário calçadão da Andrade Neves. Quem vai ao centro da cidade provavelmente passará pelas ruas Sete de Setembro e Andrade Neves, contemplará o chafariz uma obra consagrada, vinda da França em 1873. Outra chance de contemplação, e o que é melhor, de graça, não veio da França ou da América do Tio Sam. Vagner Meneses, ou o Vagner do Sax é pelotense e tem 36 anos. Vagner do Sax é musico não-acadêmico, instruído pelo sargento aposentado do exército José da Luz, o Seu Luz. Dentre outras atividades exercidas teve uma passagem pela banda de música da 8ª Brigada de Infantaria Motorizada, e é ativo na cultura pelotense e região tendo participado de diversos trabalhos como com bandas populares, fanfarras e bandas de bailes. Há cinco anos desenvolve um trabalho solo que o levou ao reconhecimento

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Fábio Ávila

nas redes sociais, culminando com convites para apresentações inclusive no exterior. A sua grande realização foi a gravação do CD que inicialmente era apenas um teste para aferir a aceitação e o nível de popularidade. Todavia revelou-se uma forma de obtenção de sustento para completar as lacunas das apresentações em shows e participação de eventos musicais. Mesmo tendo boa aceitação do público a demanda de apresentações não era suficiente para suprir o sustento da família, tendo que trabalhar em outra atividade profissional. Em 2014, quando se viu desempregado, com o fim dos trabalhos no polo naval, onde desempenhava a função de soldador, passou a viver da venda de CDs no centro de pelotas, no calçadão da Andrade Neves, próximo ao chafariz, e em eventuais contratações para festas, cerimonias de casamentos, formaturas, lançamento de livros, almoços e jantares sociais. Destaca sua apresentação na câmara de vereadores, amplamente divulgada pela imprensa. Em tempos de crise generalizada, a capacidade de adaptação e flexibilidade do brasileiro continua sendo um diferencial para uma melhor qualidade de vida, enfrentar com atitude as dificuldades são marcas de um povo lutador e que, como dizem, nunca se entrega. Parabéns, Vagner do Sax.

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experiência

O Lado B da noite Mariana Lealdino

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ulho. Pelotas. Quando o sol se põe na cidade mais doce do Rio Grande do Sul, a vida noturna é convidativa. Happy hour, balada, a noite pelotense apesar de fria, não intimida os amantes de uma boa música. Ao entrar no pequeno pub, a primeira provocação é puramente gastronômica. Logo na entrada, o cheirinho de bolinho de bacalhau invade minhas narinas, provocando o sentido mais primitivo do ser humano: fome. Mas logo em seguida, minha atenção se volta para as paredes, bordada de pequenos quadros que vão, de Beatles a Djavan. Das mais simples às refinadas bebidas, e uma coleção de embalagens de cerveja que faria qualquer colecionador passar “nervoso” de inveja. Pedi uma bebida, e para minha surpresa, o quentão docinho veio servido em pequenas xícaras de porcelana, o que era no mínimo curioso, mas me ganhou pela criatividade. FOCO, apesar da todas as distrações, eu tinha um objetivo para estar ali. Minha missão era

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entrevistar a banda Dona Dinnah. Já acompanhava o trabalho deles há algum tempo (sempre cercada de companhias, umas sóbrias, outras nem tanto) e, pra ser sincera, um pouco nervosa de passar de “mais uma da plateia que canta parelho com o vocalista” para “profissional séria com um objetivo a ser cumprido na noite”. Vai que eles me reconhecessem e não topassem a entrevista? E em parte meus receios se confirmaram quando o vocalista Eduardo Freda logo me identificou, porém, assim que expliquei o que estava fazendo ali, na hora ele topou a entrevista. Ufa! Me levando ao encontro do resto da banda, todos me receberam com a maior boa vontade e com sorriso no rosto. A Dona Dinnah nasceu há dez anos. Começou com a proposta de fazer covers, hoje segue fazendo releituras de diversos clássicos da música brasileira. A banda que é composta por Alexandre Black, Rogers Lemes, Eduardo Freda, Fernando Silva, e Douglas Ribeiro, está em sua segunda formação.


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Dona Dinnah já é conhecida e tem o seu público na noite pelotense

Em um papo descontraído, eles contam que existe um movimento intenso no cenário musical em Pelotas. Ainda que as bandas underground em Pelotas tenham um acesso mais difícil às grandes casas noturnas, eles já conquistaram um espaço, e já conseguiram atingir um grande público em diferentes ambientes, inclusive em festas particulares. Para uma banda que não toca o que “predomina” não só na noite pelotense, mas no cenário nacional, dez anos de história é um tempo considerável. Quando pergunto qual o diferencial da banda, é o baterista Alexandre Black que responde rapidamente “Ah, é a nossa energia. As releituras e

o repertório, mas acima de tudo, a energia. Quando estamos no palco, nos divertimos com o trabalho, e o público sente isso”. E para esta humilde repórter isso ficava claro a cada minuto de conversa. Enquanto falávamos, as pessoas começavam a se aproximar, já dando a impressão que o ambiente talvez pudesse não ser grande o suficiente. “Nós temos amigos no cenário musical, que já nos presentearam com músicas autorias em homenagem à Dona Dinnah, por que a banda traz uma música mais alternativa na noite,

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“nosso público é uma galera que quer balançar pensando”

que faz as pessoas dançarem e se divertirem.” A banda também já foi citada na música da banda FreaK Brotherz, “Da Dom Pedro à Joaquim”. Outro grupo underground pelotense, que é referência na região. Quando pergunto sobre as dificuldades nesse mercado musical, eles respondem que mesmo fazendo a alegria da galera, trabalham com um som que tem o seu repertório mais “lado b” acaba limitando o acesso às casas noturnas. “Apesar de tocarmos clássicos, artistas renomados da história da música brasileira, ainda é difícil entrar nos espaços. Nós tocamos Tim Maia, Jorge Benjor, e ainda assim não conseguimos atingir certos locais, o que revela um empobrecimento da cultura musical, não só em Pelotas, mas no Brasil. E isso afeta toda banda que queira trabalhar com o lado B. Nós nadamos contra a maré, estamos tocando há

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dez anos, nós vamos continuar tocando, até onde der. Pelotas ainda favorece muito por ter uma cena alternativa muito forte e que procura viver outros estilos. E nós temos um público muito fiel e diverso. Tocamos em aniversários, formaturas, nossa faixa etária é muito variada, mas ainda predomina um público mais adulto, uma galera que não só quer balançar, nosso público é uma galera que quer balançar pensando.” Para finalizar, pergunto dos planos para a banda, e para minha surpresa, dizem que estão trabalhando em sons autorais e também videoclipes. Encerrei minha entrevista querendo falar mais, porem o horário não permitia, eles já iriam começar a tocar, me despeço já guardando papel e caneta com a sensação de dever cumprido e na certeza que mais uma vez, lá estaria eu, na plateia.


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tradição

Cultivando as Raízes texto de Brenda Vieira

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impossível contar a história do Rio Grande do Sul e não remeter o olhar ao histórico de lutas, coragem e bravura. O Estado foi palco de uma luta que marcou os gaúchos, que todos os anos, dedicam uma semana (ou até mesmo o mês) para cultivar seu tradicionalismo pelos pagos e campanhas do Rio Grande. O Rio Grande do Sul, que além de céu, sol e Sul é história, cultura e tradição. Os Pampas também são mares, ritmos e história. História De grande valor ao povo gaúcho, a Revolução Farroupilha foi o mais longo e um dos mais importantes movimentos de revolta civil bra-

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sileiro. A Guerra dos Farrapos contra o Império durou dez anos – de 1835 a 1845 – e foi ao amanhecer do dia 20 de setembro de 1835 que aconteceu o Marco Inicial para a luta sul-rio-grandense que mostrava como pano de fundo os ideais liberais, federalistas e republicanos. A primeira capital após ser proclamada a República Rio-Grandense foi a cidade de Piratini, localizada no sudeste do Rio Grande. A Revolução foi também uma luta contra os altos impostos cobrados pelo governo central ao Estado. Produtos como charque, couros e erva-mate, passaram a ter taxas pesadas sobre eles. Além disso,


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As tradições gaúchas fazem parte do cotidiano o Rio Grande do Sul já sediava, desde o século XVII, disputas entre Portugal e Espanha, e as lideranças locais acreditavam que por mérito das gerações de famílias que aqui lutaram e defenderam o país, o ressarcimento deveria acontecer através do incentivo ao crescimento econômico do Sul. A luta teve fim no dia 1º de março de 1845, dia em que se assinou a paz com o Tratado de Poncho Verde, que continha nas suas principais condições à anistia plena aos revoltosos, a libertação dos escravos que combateram no Exército piratinense e a escolha de um novo presidente provincial pelos farroupilhas. Cultivo às tradições Passados quase duzentos anos da Guerra dos Farrapos, ainda se cultivam inúmeras tradições pelo Estado, e são nos Centros de Tradições

Gaúchas que é reservado este espaço especial para a dedicação às tradições da terra. Um dos nomes mais importantes da música tradicionalista gaúcha, Cristiano Quevedo, relata que a música gaúcha é uma forma de aproximar as novas gerações da história do povo sul-rio-grandense: “A música é a maneira que a gente tem de aproximar os nossos filhos, netos, a cultura do nosso povo. A cultura gaúcha é muito bonita, os valores do gauchismo são muito bonitos. São valores de família de igualdade, humanidade e liberdade que tantos farrapos pelearam e hoje não queremos mais peleia, queremos que com paz a gente chegue a igualdade dos povos e principalmente valorizando desde cedo a nossa cultura”, declara o cantor. Outra dupla de destaque no cenário musical do Rio Grande do Sul, César Oliveira e Rogerio

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tradição

Os Pampas também são mares, ritmos e história Melo, se orgulham de levar sua arte tradicionalista aos palcos. “É a preservação das nossas raízes, dos nossos costumes. Através da nossa música nós cantamos o campo, o homem do campo, a nossa história”, contam. E não é só na música que as tradições são cultuadas no Rio Grande. Através dos Centros de Tradições Gaúchas (CTG), a dança também faz parte da história. Rafael Mendonça tem 17 anos e faz parte dos CTGs há 11 anos. Envolvido no meio tradicionalista, passou por quatro CTGs de Rio Grande ao longo deste tempo. Ele fala da importância do cultivo as tradições dentro do Centro: “Quando comecei era apenas mais uma diversão, hoje em dia vejo mais como um aprendizado para a vida, a ter responsabilidade, ajudar os outros, e se importar. Eu diria que é até entender um pouco as pessoas. No meu caso, eu usei o tradicionalismo como uma ‘escola para a vida’” declara. Semana Farroupilha As comemorações em alusão ao Movimento Farroupilha até o ano

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de 1994 eram ponto facultativo nas repartições públicas e feriado municipal apenas em algumas cidades do interior, ganharam incentivo no ano sucessor, de 1995: Definida pela Constituição Estadual com a data magna do Estado, o dia 20 de setembro passou a ser feriado. O decreto estadual 36.180/95, e a lei federal 9.093/95, firmam que “a data magna fixada em lei pelos estados federados é feriado civil”. Como em todos os anos, as comemorações ocorrem em diversas cidades pelo Estado. O tema para os Festejos Farroupilhas de 2017 é “Farroupilhas: idealistas, revolucionários e fazedores de história”. Diversas atrações embalam as comemorações que vão do dia 7 de setembro ao dia 20, e contam com invernadas temáticas - com a participação dos integrantes dos CTGs (Centro de Tradições Gaúchas), DTGs (Departamento de Tradições Gaúchas) e Piquetes, música tradicionalista e hábitos como o churrasco e o chimarrão espalhados entre as mais de 400 cidades do Estado.


radar web

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da lama ao caos O cantor e compositor Juliano Guerra trabalha em seu terceiro álbum, o Neura, com lançamento previsto para 2018. Depois dos discos Lama (2012) e Sexta-Feira (2015) Juliano Guerra segue seu caminho no samba autoral e trabalha em um disco que junta as aflições e neuroses do homem contemporâneo à suas referências, que vão do grunge ao samba, passando pela MPB e pela música brega

Confira a entrevista que fizemos com ele acessando o QR Code no topo da página! 13


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artigo

A morte do ícone de uma geração

Hiago Reisdoerfer

O começo dos anos 2000 foi marcado pelas fortes ações militares dos Estados Unidos em países do Oriente Médio no que foi posteriormente nomeado como Guerra ao Terrorismo, o que resultou em um dos mais noticiados atentados terroristas de todos os tempos: O ataque às torres gêmeas. No entanto, era exatamente na virada do milênio que o mundo da música também seria virado de cabeça para baixo com uma banda que conseguia casar, de forma genial e totalmente inovadora, o Rap e o Hip-Hop com o Rock pós-grunge/ soft punk. De março a junho de 2000, nos estúdios da NRG, na Califórnia, sob o selo da Warner Bros. uma descon-

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hecida e fracassada banda tentava o sucesso. E eles conseguiram. Em 24 de outubro, Linkin Park, liderada pelo icônico Chester Bennington, lançava Hybrid Theory, seu álbum de estreia. Com 12 faixas, o CD tomou o mundo de uma maneira que, mesmo nos primórdios da internet, praticamente todo jovem do planeta Terra já tinha a sua cópia na cabeceira da cama após 3 meses de lançamento. A banda conseguia tirar um som completamente novo, abusando de instrumentos eletrônicos, pick-ups e sintetizadores que contrastavam com as guitarras sujas e distorcidas, acompanhando pianos, teclados e instrumentos de sopro. Outras bandas, que vieram antes do Linkin Park, como a banda Korn, por exemplo, já tinham trazido pro mundo da música essa união do rap e do rock, porém nunca de forma tão majestosa e, principalmente, tão popular como os californianos. Essa união de estilos, em conjunto com o material inovador e rebelde adotava uma postura que o mundo precisava naquele momento, uma vazão de sentimentos para com o que acontecia diante dos nossos olhos. A juventude contemporânea acompanhava os lançamentos da banda, e, assim, emergia cada vez


agosto/2017 mais nessa ideologia de se fazer ouvir, de se rebelar e de buscar ‘Um Lugar Para Sua Cabeça’. E foi assim que crianças, adolescentes e jovem-adultos, principalmente, adotaram o Linkin Park como a banda da sua geração, ou melhor, como a voz da sua geração. No último dia 20, o mundo novamente parou para ler e ouvir o que os veículos de comunicação tinham para dizer sobre o Linkin Park, mas as notícias não eram das melhores. Vindo de um lançamento muito recente, a banda da Califórnia tinha há pouco sido metralhada pelos críticos, que taxavam o novo trabalho como desleixado, preguiçoso e fraco. No dia da estreia do primeiro clipe da nova fase da banda, Chester Bennington foi encontrado morto em sua casa, nos arredores de Los Angeles, nos Estados Unidos. Ainda que a polícia esteja com investigações abertas sobre o caso, todos os fatores apontam para o suicídio do músico. As primeiras notícias foram divulgadas pelo site de fofocas estadunidense, TMZ, e escancaravam em manchetes chamativas que o cantor havia sido encontrado enforcado, próximo as 09h, deixando sua esposa, seis filhos e uma incontável quantidade de fãs. De fato, o sentimento vai muito além da perda. Me lembro de ainda garoto, aos cinco anos de idade, correr para a casa de um vizinho para passar a tarde jogando videogames de cartucho e, principalmente ouvir o Hybrid Theory. Lembro de pegar dinheiro escondido dos meus pais para comprar

uma camiseta da banda. Lembro de ouvir histórias parecidas com as minhas de diversos amigos e conhecidos. Lembro de ter tido a vontade de conhecer música por causa dos caras, e, mais do que isso, lembro de ter despertado meu lado crítico, questionador e rebelde por finalmente entender as letras da banda, poucos anos mais tarde. E não parou por aí, em 2003 a banda lançou o álbum Meteora, e agora eu e meus amigos pulávamos dois muros pra chegar na casa de um primo de um dos integrantes da turma que tinha comprado o disco em uma viagem com a família. Em 2007 a gente conhecia o Minutes to Midnight e eu lembro de passar praticamente um mês inteiro sem dormir tentando aprender todas as músicas da melhor forma possível na minha nada boa primeira guitarra elétrica. Isso me faz acreditar que qualquer jovem nascido na década de 90, se perguntado, vai poder contar uma história envolvendo a banda. Mesmo que as possíveis causas que levaram o músico a decisão trágica que tomou sejam importantes e precisem ser discutidas, principalmente por tocarem em pontos importantes como a depressão e a superação da perda, o importante nesse momento é lembrar, já que na história do rock e na história da nossa geração os músicos fracassados e rejeitados da Califórnia jamais irão perder o seu lugar de importância.

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ideias

Leia mulheres Um clube de leitura que reivindica a presença das mulheres na literatura

texto de Sara Carulina e Nicole Collares

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ense nos clássicos da literatura, quantos foram escritos por mulheres? Quantas mulheres foram e são personagens principais com a devida valorização? A literatura escrita e protagonizada por mulheres ainda sofre preconceito, um tratamento diferenciado, uma situação de menos-valia. Seja no ambiente acadêmico, social, de presença em espaços notórios, de locais de fala, de indicações a prêmios e outros inúmeros lugares, as mulheres não são inseridas na sociedade com a mesma valorização que os homens.

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Infelizmente, ainda não há um grande reconhecimento das mulheres na literatura e tendo isso em mente que a escritora britânica Joanna Walsh criou o projeto #ReadWomen2014 (#LeiaMulheres2014), que consistia simplesmente em ler obras escritas por mulheres, entendendo que o mercado na época era, e ainda é, muito restrito ao acesso de escritoras como também a escrita sobre temas feministas. No Brasil, em 2015, conhecendo o projeto da britânica, três amigas, Juliana Gomes, Juliana Leuenroth e Michelle Henrique, se juntaram


agosto/2017 para colocar em prática o clube de leitura, representando uma luta pelo reconhecimento da força feminina também na literatura.

Algumas leituras do grupo

O clube busca dar visibilidade às escritoras não tão conhecidas e tornar públicas histórias contadas por elas, como Os Presos que Menstruam, da escritora Nana Queiroz, livro que conta a vida de mulheres presidiárias. São lidas obras, clássicas ou contemporâneas, escritas exclusivamente por mulheres, com diferentes nacionalidades e com escritos de temas variados. No Brasil, o projeto que era organizado apenas por três amigas que gostavam de ler, tomou proporções inesperadas em dois anos de atuação. Devido à influência das redes sociais e de mediadoras dispostas a divulgar a ideia, hoje o clube de leitura está presente em 23 estados do país. Os encontros acontecem uma vez por mês, sempre em um espaço cultural, promovendo rodas de diálogo e troca de experiências. Embora o nome do clube seja Leia Mulheres, o projeto é acessível também a homens, abrindo espaço para que eles possam conhecer as histórias e contribuir para as discussões. O projeto não tem fins lucrativos nem possui patrocínios. O clube faz contato com editoras, livrarias e instituições, porém são os próprios integrantes que compram seus livros. Cada cidade tem seu próprio modo de selecionar a próxima obra a ser lida. Normalmente, se recebe a opinião dos integrantes e a escolha é feita por votação, sempre de um

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radar mês pra outro. No Rio Grande do Sul, existem clubes em quatro cidades: Porto Alegre, Caxias do Sul, Gravataí e Rio Grande. Aqui no sul do estado, o projeto começou em 2015 com as gurias Giselle Silveira, Michelle Vasconcelos e Joice Martins que conheceram a iniciativa através de uma mediadora de Goiânia. “Achamos essa ideia maravilhosa, pois trabalhamos com a Literatura Feminina no meio acadêmico, mas sempre pensamos em divulgar as obras de escritoras para a comunidade. Tantas obras fantásticas que não ganham a visibilidade e o valor merecido precisam ser compartilhadas não apenas na academia, mas entre todos.”, comentou Giselle. Atualmente, Paula Machado também se inseriu no projeto como mediadora em Rio Grande. Quarto de Despejo, de Carolina de Jesus; Sejamos Todos Feministas, de Chimamanda NgoziA dichie; Um Teto Todo Seu, de Virginia Woolf; Antologia Poética, de Anna Akhmátova; A Guerra Não Tem Rosto de Mulher, de Svetlana Aleksiévitch; Estrelas Além do Tempo, de Margot Lee Shetterly; Mulheres, Classe e Raça, de Angela Davis; Presos Que Menstruam, de Nana Queiroz, são os livros já lidos pelo Clube. Para o próximo encontro, no mês de agosto, o livro escolhido para a discussão é Reinvindicação dos Direitos das Mulheres, de Mary Wollstonecraft. Já para o encontro do mês de setembro, a obra escolhida foi Niketche - Uma História de

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Poligamia, de Paulina Chiziane. Em Rio Grande, o clube se reúne, normalmente, no primeiro sábado de cada mês no espaço cultural da Livraria Vanguarda, no Partage Shopping Rio Grande. Em nível nacional, é possível conferir o trabalho de mediadoras através do site leiamulheres.com.br. Nele, se podem encontrar quais são os estados e suas respectivas mediadoras, assim como é realizada a disponibilização de resenhas sobre as obras já lidas dentre os clubes. Outra forma de acompanhar as leituras feitas, conferindo vários outros conteúdos compartilhados pelas mulheres e também trocando experiências com clubes de todo o Brasil, é por meio da página facebook.com/leiamulheres. Já em Rio Grande, o Leia Mulheres possui um grupo no Facebook aberto à comunidade. Segundo a moderadora, Giselle Silveira, que iniciou as atividades em Rio Grande, “O clube de leitura Leia Mulheres é o primeiro da cidade dedicado exclusivamente a divulgar obras de escritoras. Auxiliar, promover e incentivar a leitura dessas obras é de suma importância para dar voz a essas mulheres.”. Para o futuro, Giselle e as outras moderadoras já tem planos: promover eventos maiores, com clubes de leitura na Feira do Livro da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), no Balneário Cassino e estabelecer reuniões fixas em diferentes espaços da cidade.


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Casa de Cultura Pomerana Camponesa

Um resgate histórico-cultural em constante construção Por Felipe Madeira

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ascida no interior da pequenina cidade de Canguçu, mais precisamente dentro da Escola Municipal Carlos Soares da Silveira, localizada em Nova Gonçalves, zona rural do município, uma pequena ação coletiva, proposta pela equipe diretiva aos alunos do sexto ao nono ano do turno inverso, têm construído não apenas referências culturais e históricas, mas despertado a consciência comunitária em preservar memórias e costumes pomeranos; A iniciativa intitulada “A cultura local reinventando o currículo

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escolar” buscava promover uma ação educativa focada na valorização da identidade do aluno na família, escola, comunidade e sociedade, dentro da concepção de construção de um espaço de memória. O objetivo, em primeira instância era de que este espaço, construído por todos, alunos, professores e comunidade, pudesse concretizar o registro e a preservação do patrimônio cultural pomerano. “História, Memória e Sustentabilidade Pomerana Alemã”, disciplina ofertada na escola em


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Objetos como louças, rádios, bule, armários, televisões, roupas, calçados, panos de parede compõe o patrimônio atual do museu. (Foto: Danísio Xirú)

2007, na prática, em levar os estudantes, em turno inverso, a visitações a museus, propriedades rurais e taperas. Nessas últimas, foram encontrados objetos que passaram a fazer parte do acervo do museu a qual a escola almejava construir, a partir do consentimento dos então proprietários. Visando resgatar e preservar a cultura alemã e pomerana, a escola contou com o apoio técnico da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (FURG) no ano de 2014, onde os alunos, os quais se propuseram à serem monitores voluntários receberam instruções de uma museóloga da instituição, instruções sobre como manusear e limpar os objetos doados pela comunidade, bem como catalogar os dados referentes a história de cada. Em 2015, o projeto ficou em primeiro lugar entre os 497 mu-

nicípios gaúchos, na categoria Museus, Patrimônio e Memória na 4ª edição do Prêmio Cultura Famurs/ Codic a qual destaca ações culturais desenvolvidas pelas administrações municipais que implantam ou executam atividades de estímulo ao desenvolvimento cultural ou regional. O museu itinerante atualmente não possui espaço físico, devido a problemas de infraestrutura causados por um incidente suscitado pela queda de uma árvore. Intitulado “Casa da Cultura Pomerana Camponesa”, a partir de uma proposta da vinda dos alunos e da comunidade, o museu participa atualmente da agenda da cidade, em eventos como a semana dos museus, e onde é recebido o convite, já tendo atraído centenas de visitantes, incluindo uma comitiva latino-americana que veio conhecer de perto a proposta.

Casa da Cultura Pomerana Camponesa

Local: Itinerante, estabelecido na Escola Carlos Soares da Silveira, Nova Gonçalves, zona rural de Canguçu

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séries

Por trás da

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COROA

texto de Júlia Sassi


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niciando o ano com tudo, a série The Crown desbancou Game Of Thrones e levou para casa prêmios como o Globo de Ouro de Melhor Série Dramática e Melhor Atriz em Série Dramática. Com um orçamento de aproximadamente US$ 130 milhões para sua primeira temporada, a produção da Netflix é a série de TV mais cara da história. Como enredo principal, a série conta a história da Rainha da Inglaterra, Elizabeth II, desde seu casamento com Philip. Ao longo de dez episódios, a criação de Peter Morgan revive os primeiros anos de reinado da Rainha, desde a morte de seu pai, o Rei George VI. A atriz Claire Foy interpreta Elizabeth durante toda a temporada. Completam o elenco os atores John Lithgow (Winston Churchill) e Matt Smith (Príncipe Philip). Muito bem amarrada à realidade, The Crown já foi agraciado pela verdadeira Rainha, que assistiu aos episódios e se impressionou com a semelhança. Digna de premiação, a atriz Claire Foy, de 33 anos se parece de fato com a Rainha. Por seus traços e seus gestos tão sutis, o olhar firme e ao mesmo tempo confuso durante o início de

agosto/2017 seu reinado. Ao mesmo tempo em que precisa ser uma rainha, Elizabeth é uma filha que recentemente perdeu o pai e a avó, e Claire sabe mesclar os sentimentos sem que pareçam improváveis. A primeira série do streaming produzida no Reino Unido relata as conversas semanais de Elizabeth II com o Primeiro-Ministro Churchill, a recomposição do Reino Unido após a Segunda Guerra Mundial e o drama da Princesa Margarida, irmã da Rainha. Com uma personalidade extremamente diferente da irmã, Margarida é apaixonada por um homem casado e que trabalhava para seu pai. A Rainha ainda se vê na posição de precisar liderar como uma rainha e resolver dilemas familiares. Além de todos os outros atributos da série, o que espanta é a familiarização dos atores com seus respectivos personagens. De acordo com o produtor, a segunda temporada será focada no Príncipe Philip, por sua complexidade. A segunda temporada tem previsão de estreia para novembro de 2017 e iniciará exatamente onde a primeira começou: entre os anos de 1956 a 1964.

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dicas

Desvendando a humanidade Douglas Dutra

Das 8,7 milhões de espécies que habitam a Terra, não há dúvida sobre qual delas domina o planeta. O gênero homo, que existe há 2,4 milhões de anos, evoluiu biológica e socialmente, dando origem a espécie sapiens, isto é, eu e você. É debruçando-se nessa espécie fascinante, que hoje ensaia a dominação espacial e uma nova evolução, desta vez tecnológica, que o historiador israelense Yuval Noah Harari fez o livro Sapiens: Uma Breve História da Humanidade. Harari devota quase 500 páginas à tentativa de compreender o que nos trouxe até aqui, o que nos fez ser o que somos e como conseguimos dominar o planeta. Baseando-se em fatos históricos e científicos, o autor consegue produzir no leitor a sensação do

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quão pequenos somos neste planeta, ao mesmo tempo em que sentimos a mais profunda reverência pela grandiosidade da nossa espécie. Apesar da busca pela acuracidade, Harari não cai em explicações simplistas, mas busca apresentar o leitor as possibilidades e peculiaridades que podem ter resultado no que somos hoje. Harari divide sua narrativa em três acontecimentos, que considera marcos para o avanço da espécie humana. Ele começa pela revolução cognitiva, o marco inicial para a existência do homem, passa pela revolução agrícola, que permitiu à humanidade sua sofisticação, alcança a unificação da humanidade, através da complexificação da sociedade, dos laços familiares e da religião, e culmina na revolução

científica, que agora põe em xeque a existência da humanidade como conhecemos. O best-seller, publicado no Brasil em 2015 pela L&PM Editores, está na lista de mais vendidos de não-ficção por 37 semanas, e já vai para a 24ª impressão, comprovando que é possível a divulgação da ciência de uma maneira didática e inteligível.


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+cult

dicas de filmes, séries, livros e músicas

Twin Peaks: The Return dirigida por David Lynch

No retorno da clássica série dos anos 90 o aclamado diretor David Lynch trás mais dos mistérios e aventuras que começaram em uma pequena cidade do noroeste. Neste retorno, temos clássicos personagems da série original e a “quase” volta do agente Dale Cooper (Kyle MacLachlan). Disponível na Netflix.

Sapiens: Uma Breve História da Humanidade Yuval Noah Harari L&PM Editores 464 páginas Preço de capa: R$ 41,80

Fragmentado (Split)

dirigido por M. Night Shyamalan

Kevin possui 23 personalidades distintas e consegue alterná-las quimicamente em seu organismo apenas com a força do pensamento. Um dia, ele sequestra três adolescentes que encontra em um estacionamento. Vivendo em cativeiro, elas passam a conhecer as diferentes facetas de Kevin e precisam encontrar algum meio de escapar. Um dos melhores filmes do ano, já tem previsão de lançamento de uma continuação para o ano que vem. Disponível em Blu-Ray DVD.

Enclausurado Ian McEwan

O narrador deste livro é nada menos do que um feto. Enclausurado na barriga da mãe, ele escuta os planos da progenitora para, em conluio com seu amante - que é também tio do bebê -, assassinar o marido. Apesar do eco evidente nas tragédias de Shakespeare, este livro de McEwan é uma joia do humor e da narrativa fantástica. Em sua aparente simplicidade, Enclausurado é uma amostra sintética e divertida do impressionante domínio narrativo de McEwan, um dos maiores escritores da atualidade. Publicado pela Companhia das Letras. Nas livrarias.

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radar

do leitor

Dicas dos leitores Na Radar nosso leitor também dá dicas de cultura e eventos!

Mande sua sugestão para: leitor@revistaradar.com.br “Um dos lugares que eu mais gosto de ir são nos museus de Rio Grande. A cidade apresenta uma vasta quantidade de museus e com temáticas variadas. Tem dois que eu gosto muito: museu oceanográfico e museu cidade do rio grande. O primeiro apresenta uma coleção fantástica sobre animais marinhos e permite com que tenhamos um certo “contato” com alguns dos animais através dos tanques onde ficam os pinguins e o leão marinho, hipirelo. O segundo, trás um acerco extremamente moderno de como foi e como é a Cidade do Rio Grande, através de móveis, vestimentas e muito material digital conseguimos entender tudo que aconteceu em cada época da nossa cidade.” Verônica Marandini, 25 Relações Públicas “A Biblioteca Pública Pelotense é sempre um passeio cultural que vale a pena. Lá além de biblioteca, no porão podemos visitar um museu. Há sempre atividades artísticas culturais, como peças teatrais, recitais de música. Eu recomendo.” Roberta Postale, 25 Estudante de Teatro “O mercado Público de Pelotas sempre oferece uma diversidade de barzinhos com música e comida boa. Sempre vale a pena dar uma passada lá depois do trabalho, pra conferir o que “rola” por lá. E o melhor é que sempre tu acabas encontrando alguém conhecido, ou até mesmo fazendo novas amizades.” Fernando Garcia, 28 Cabeleireiro

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ruim ĂŠ passar sede!

novo biri pomelo


Sem tĂ­tulo Gabriel Huth

setembro de 2016


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