Musicografia Braille

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Universidade Federal do Paraná Setor de ciências humanas, letras e artes | Departamento de design

Nayara Gonzalez D. Leal

um estudo sob a ótica do design da informação

curitiba, 2011



Universidade Federal do Paraná Setor de ciências humanas, letras e artes | Departamento de design

Nayara Gonzalez D. Leal

um estudo sob a ótica do design da informação

Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Design (habilitação em Design Gráfico) da Universidade Federal do Paraná. Orientadora: Profª Drª Carla Galvão Spinillo

curitiba, 2011



Termo de aprovação

um estudo sob a ótica do design da informação

nAYARA gONZALEZ D. lEAL

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Design (habilitação em Design Gráfico), do Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, pela banca composta pelos seguintes professores:

Orientador:

Profª Drª Carla Galvão Spinillo Departamento de Design

Profª Mª Carolina Calomeno Machado Departamento de Design

Profª Daniella Rosito Michelena Munhoz Departamento de Design

Curitiba,

de

de



Se podes olhar, vĂŞ. Se podes ver, repara. JosĂŠ Saramago



Este trabalho tem por objetivo compreender a musicografia Braille como código gráfico na perspectiva da linguagem gráfica tátil. Para tal, foram consultados autores nas áreas de design da informação e música, e conceituados os termos que alicerçam essa pesquisa. Realizou-se uma análise sintática dos elementos gráficos de cada notação, em que se fez um levantamento preliminar das limitações da musicografia Braille. Foram conduzidos também estudos com os usuários da musicografia. Finalmente, foram propostos requisitos gráficos para a melhoria do sistema. Design da informação, linguagem gráfica tátil, acessibilidade, musicografia Braille

The aim of this paper is to understand Braille music notation as a graphic code on the tactual graphic language perspective. For such, authors that work with information design and music have been consulted, and the terms through which this research has been made were defined. A syntactic analysis of the graphical elements of each notation was made, in which a preliminary survey of the limitations of braille musicography was done . Studies with users of this notation have also been conducted. Finally, graphic requirements have been proposed to cause an improvement of the system. Information design, tactual graphic language, accessibility, Braille music notation



Sumário

Apresentação Introdução

11

13

Fundamentação teórica 1 Linguagem gráfica e o design de inclusão 2 Notação musical: um sistema gráfico

21

33

3 Musicografia Braille: um sistema gráfico para cegos

45

estudo analítico 4 Análise gráfica: notação musical visual x musicografia Braille 5 Estudo com usuários

74

Discussão 6 Discussão geral e requisitos gráficos para o sistema Conclusão 7 Considerações finais Referências

101

Apêndices Apêndice 1

105

Apêndice 2

107

Anexos Anexo 1

111

Anexo 2

112

Anexo 3

115

97

89

63



apresentação

Ganhei minha primeira flauta em 1999, uma dessas flautas baratas que se compram para as crianças. Nunca a toquei realmente – quando minha mãe me matriculou nas aulas, o professor recomendou que eu comprasse uma Yamaha. No entanto foi essa primeira flauta – essa que era quase um brinquedo – que motivou meu ingresso no mundo da música. Eu tinha, então, 8 anos. Se tivesse ganhado uma bola, talvez esse TCC não existisse hoje. Foram quase 10 anos frequentando a Escola de Música da Universidade Estadual de Maringá. Entre aulas práticas e teóricas, ensaios de conjunto, viagens e apresentações, construí naquela edícula amarela muitas das minhas melhores lembranças. Muito da pessoa que eu me tornei e grande parte dos amigos que eu fiz devo aos anos passados entre aquelas paredes. E é por esse motivo que quis resgatar, ao término do curso de design, meu conhecimento musical. Não apenas para trazer a harmonia da música ao design, mas para levar o olhar analítico do design à música. Espero que a minha formação como designer possa contribuir a esse campo que tanto acrescentou à minha formação como pessoa. O tema desse TCC nasceu em uma conversa com um amigo músico. Pedi que ele me contasse um problema da música que pudesse ser solucionado pelo design. “Eu estou aqui, o que vocês precisam de mim?” Eu estou aqui - e espero poder ajudar.



Introdução

Cerca de 16,6 milhões de brasileiros apresentam algum tipo de deficiência visual; desses, quase 150 mil são cegos (IBGE, 2000). Privados da visão, os cegos enfrentam dificuldades na realização de tarefas que são banais àqueles que enxergam e, muitas vezes, são deixados à margem da sociedade. Embora haja uma preocupação crescente com a inclusão, os estudantes cegos representam apenas 0,13% dos matriculados em escolas públicas e privadas da educação básica, e 0,09% do ensino superior (INEP, 2008). Na música, a situação não é diferente. No século XX, quando os cegos eram educados em regime de internato, era comum ensinar-lhes a música como uma alternativa profissional; hoje, porém, poucos conseguem ter acesso aos conservatórios e cursos superiores de música , segundo Tomé (2003). Ainda de acordo com a autora, isso se deve, em parte, à falta de professores familiarizados com o código de notação musical para cegos, a Musicografia Braille. Desenvolvida por Louis Braille (ele próprio cego e músico) em 1829, a musicografia é composta pelos mesmos elementos do alfabeto Braille. Esse alfabeto é baseado na célula de seis pontos, capaz de gerar sessenta e quatro combinações. Para os cegos, é o meio natural de leitura e escrita, sendo aplicado em diversas áreas de conhecimento, como matemática, física, química e música. É possível, no entanto, que o sistema não seja o mais adequado à escrita musical. As próprias limitações do alfabeto Braille tornam a transcrição de uma peça polifônica longa, como uma sinfonia ou um concerto, uma tarefa laboriosa. Ao contrário do sistema de escrita Braille, que mantém basicamente a mesma estrutura desde sua criação, a musicografia já sofreu diversas reformulações, e sua última versão foi publicada pela União Mundial dos Cegos em 1996 e traduzida para o português em 2004. Em todas essas revisões, não há registro de algum estudo sob a ótica do design gráfico e da informação. A musicografia se enquadra, no entanto, no conceito de representação gráfica proposto por Engelhardt (2002): marcas visíveis em uma superfície mais ou menos plana, com o intuito de transmitir informação. Assim, é possível aplicar enquadrar esse sistema de notação nas classificações a que estão submetidas as demais representações gráficas. Esse trabalho, portanto, constitui uma pesquisa na ótica do Design da Informação sobre o sistema notacional da musicografia Braille, sendo exploratória e descritiva devido à pouca literatura em design sobre este tema. Serão analisadas as estruturas sintáticas e semânticas desse sistema em comparação com a notação musical em tinta (notação tradicional).


Caracterização do problema e delimitação do objeto A notação musical em Braille apresenta hoje diversas limitações em relação à sua correspondente em tinta, limitações essas que dificultam a escrita de peças elaboradas (TOMÉ, 2003) e sua leitura. Devido à leitura tátil, os músicos cegos não podem consultar a partitura durante a execução da peça, sendo necessário, portanto, que a memorizem em sua totalidade antes de executá-la. A memorização pode ser dificultada pelo fato da musicografia Braille apresentar um número de símbolos maior do que a notação tradicional. O manual de musicografia, aprovado pela União Mundial dos Cegos em 1996, traz um total de sessenta e quatro sinais de um único caractere Braille. Quando se consideram os sinais compostos de dois ou mais caracteres, atinge-se um total de duzentos e setenta símbolos. Uma partitura em Braille exige, assim, maior demanda de memorização por parte do músico. Para facilitar essa tarefa, o sistema de escrita deveria ser o mais simples possível. Além disso, ao passo que na notação em tinta existe sempre uma maneira única e adequada de grafar uma melodia – independente de seu nível de complexidade –, a musicografia Braille apresenta regras flexíveis, deixando ao bom-senso do transcritor a decisão pelo melhor modo de representar determinada informação (TOMÉ, 2003). Por esse motivo, ainda que existam bons softwares de transcrição para a musicografia Braille, projetados para tradutores de visão normal, algumas situações ambíguas deverão sempre ser resolvidas por um músico/tradutor com grande conhecimento do sistema de notação. Considerando os aspectos acima, o problema desse trabalho pode ser formulado nas seguintes questões: • Quais as características e relações gráficas da notação musical em tinta e da musicografia Braille? • Quais as limitações representacionais da musicografia Braille? • Que dificuldades são encontradas pelos músicos cegos ao utilizar a musicografia Braille? • Que dificuldades são encontradas na transcrição da notação em tinta para a musicografia Braille?

Justificativa Esse trabalho se justifica principalmente no âmbito da responsabilidade social, no que diz respeito à questão da acessibilidade. Como diz Carneiro (2009), a música ajuda os deficientes de modo geral a resgatar a auto-estima. É importante, portanto, possibilitar que eles realizem essa atividade com autonomia. Ainda segundo o autor: A inclusão faz dos deficientes, especialmente do deficiente visual, participantes, colaboradores, atuantes no mundo que os cerca. Essa nova perspectiva abre as portas para a vida, a educação, o trabalho, a família, enfim, posiciona-o dignamente. (...) Com a iniciativa da inclusão, a vida da pessoa com necessidades especiais pode ser muito mais fácil, sem barreiras, participativa, atuante, podendo promover, ainda, o maior conhecimento dos cegos e deficientes pela sociedade, que pode em muito ajudá-los, mas que é escassa ainda de conhecimentos e pesquisas que fundamentem essa nova perspectiva. (CARNEIRO, 2009, p. 31)

São poucos os conservatórios e escolas de música no Brasil que oferecem ensino da musicografia braile, e mesmo poucos professores qualificados a trabalhar com esse sistema (BONILHA e CARRASCO, 2010). Em Curitiba, não foi encontrada, até a data de conclusão desse trabalho, uma


instituição que ensinasse a notação musical aos cegos. O Instituto Paranaense dos Cegos oferece apenas aulas de musicoterapia, em que os alunos manipulam instrumentos sem um aprendizado formal. Muitos deles sequer sabem ler em Braille. Nas palavras dos autores Bonilha e Carrasco: Compreende-se o aprendizado da Musicografia Braille como um fator de independência na assimilação do repertório de obras musicais estudadas. Assim como os estudantes de Música que enxergam necessitam ser alfabetizados na Musicografia em tinta, os alunos cegos também devem ser capazes de ler e escrever partituras. Essa autonomia possibilita que essa população freqüente espaços de formação musical, comum a todas as pessoas, o que encontra em consonância com os pressupostos da educação inclusiva. (BONILHA E CARRASCO, 2010, p. 4)

Existem diversos estudos sobre a musicografia Braille e seu ensino, a maioria deles realizada por músicos e educadores (e.g. BONILHA, 2006; CARNEIRO, 2009; SENA, 2007; SOUZA, 2010; TOMÉ, 2003), sendo que alguns são deficientes visuais eles mesmos, como a musicista Fabiana Bonilha, ou parentes de deficientes visuais, como a autora Dolores Tomé. No entanto, até a conclusão desse trabalho não foi encontrado um estudo sobre musicografia Braille realizado por um designer, analisando os aspectos gráficos do código.

Objetivos e contribuições Por se tratar de um campo pouco explorado pelo design, em que faltam materiais de referência, esse trabalho de conclusão de curso almeja estabelecer bases de pesquisa, compreendendo o sistema de notação musical em seus aspectos gráficos e de seu uso. Assim, o objetivo geral desse trabalho é compreender a musicografia Braille como código gráfico na perspectiva da linguagem gráfica tátil. Seus objetivos específicos podem ser descritos da seguinte forma: 1. Identificar os componentes e as relações gráficas da musicografia Braille em comparação à notação em tinta; 2. Determinar diferenças e semelhanças de codificação entre a notação musical em tinta e a musicografia Braille; 3. Identificar dificuldades encontradas pelos usuários (cegos e tradutores) do sistema de musicografia Braille; 4. Propor requisitos gráficos para possível melhoria da musicografia Braille a partir das necessidades dos usuários. Deste modo, essa pesquisa visa a contribuir para uma maior compreensão da musicografia Braille e seus elementos do ponto de vista do Design da Informação, classificando os componentes gráficos da notação musical em suas funções sintáticas e semânticas, e as relações que estabelecem entre si. Pretende contribuir também no âmbito metodológico, através dos protocolos usados na coleta de dados, que poderão servir para pesquisas similares futuras, buscando ampliar e estimular a pesquisa na área de linguagem gráfica tátil. O trabalho pretende também contribuir com os usuários da musicografia Braille, tanto os músicos cegos quanto os músicos videntes responsáveis pela transcrição das peças. Com ênfase nas necessidades do usuário, o trabalho pretende propor requisitos gráficos que possibilitem um futuro aperfeiçoamento do sistema de notação.


Terminologia adotada Para fins deste trabalho serão adotados alguns termos que podem ter interpretação ambígua ou imprecisa, e por esse motivo são definidos aqui. O termo notação em tinta será utilizado para denominar o sistema de notação musical ocidental gravado em tinta sobre o papel, em contraponto à musicografia Braille (ou apenas musicografia), que é o sistema de notação musical proposto por Louis Braille em 1829 e aperfeiçoado pela União Mundial dos Cegos. Será chamado de cego aquele que apresenta tal deficiência visual que torna necessária a leitura em Braille, e de vidente aquele que apresenta pouca ou nenhuma deficiência visual, enxergando a olho nu ou com auxílio de lentes corretivas.

Estrutura do trabalho Quanto à sua estrutura, o trabalho está organizado em 7 capítulos. Nessa introdução, foi feita uma breve apresentação do tema da musicografia Braille, e foi delimitado o problema. Os capítulos seguintes organizam-se da seguinte maneira: Capítulo 1 – Linguagem Gráfica. Trata dos fundamentos da linguagem gráfica: o que é, quais são os modos de simbolização, aspectos sintáticos e semânticos. São apresentados também alguns princípios do Design da Informação, aplicações da linguagem gráfica em sistemas de notação, e as iniciativas de linguagem gráfica tátil para deficientes visuais. Capítulo 2 – Notação musical: um sistema gráfico. Apresenta a notação musical em tinta, com um breve contexto histórico de seu surgimento, explicação de conceitos básicos da linguagem musical e os principais elementos que compõem a notação ocidental atual. Capítulo 3 – Musicografia Braille: um sistema gráfico para cegos. Iniciando pela história do sistema Braille de escrita, o capítulo descreve o surgimento e aprimoramento da musicografia e apresenta os principais elementos do alfabeto Braille e da musicografia. Capítulo 4 – Análise gráfica. Explana os objetivos da análise gráfica, apresenta e justifica a escolha da amostra, descreve o modelo de análise utilizado e o protocolo resultante, apresenta e discute os resultados obtidos. Capítulo 5 – Estudo com usuários. Trata de duas consultas a diferentes usuários do sistema da musicografia Braille: o primeiro realizado com um transcritor vidente, e o segundo com um músico cego. Para cada estudo são apresentados os objetivos específicos, o material, o procedimento e os resultados obtidos. Capítulo 6 – Discussão geral e requisitos gráficos para o sistema. Compara os resultados dos estudos analítico e experimental, discutindo os aspectos positivos e negativos apurados em cada um, e propõe requisitos gráficos para o sistema da musicografia Braille. Capítulo 7 – Conclusão. Apresenta as considerações finais do trabalho e as respostas às questões propostas na introdução. Descreve também as limitações do trabalho e contribuições para futuras pesquisas.


Métodos e fases O processo de pesquisa contará com quatro fases: (1) fundamentação teórica, (2) análise gráfica; (3) estudo com usuário; e (4) proposição de requisitos. A fase 1, de fundamentação teórica, contará com técnica bibliográfica e documental e abordagem bibliográfica para fazer uma revisão da literatura sobre os temas abrangidos pelo trabalho: linguagem gráfica tátil, notação musical e musicografia Braille. Com o objetivo de compreender a notação musical como um código gráfico, resultará nos capítulos 1, 2 e 3. A fase 2 tratará da análise gráfica da notação musical em tinta e Braille. Com técnica de análise sintática e abordagem indutiva, procurará determinar as diferenças e semelhanças entre as modalidades de notação e identificar limitações de codificação na musicografia Braille. Essa fase irá compor o capítulo 4. A fase 3 contará com o envolvimento dos usuários: músicos cegos e transcritores de musicografia Braille. Com os músicos cegos, pretende-se determinar, através das técnicas de observação não-participante, análise de tarefa e entrevista semi-estruturada, quais são as dificuldades encontradas na leitura da notação em Braille. O estudo com os transcritores se utilizará da técnica de entrevista semi-estruturada para determinar que dificuldades são encontradas no processo de transcrição entre os dois sistemas. A abordagem de ambos os estudos é indutiva, e ambos são descritos no capítulo 5. A fase 4 propõe requisitos gráficos para possíveis aprimorações da musicografia Braille, a partir da discussão dos resultados obtidos nas fases 4 e 5, com abordagem indutiva. É descrita no capítulo 6.

O Quadro 1 a seguir mostra nas colunas o detalhamento metodológico de cada fase: o problema abordado nela, o objetivo específico a ser atingido, a técnica de pesquisa, a abordagem e o capítulo em que ela está inserida. Nas linhas, a descrição de cada fase segundo as categorias citadas acima.


Problema

Objetivo

Fase

Abordagem

Capítulo

Compreender a notação musical como um código gráfico, identificando seus componentes e as relações que estabelecem entre si

Bibliográfica 1 Fundamentação Documental teórica

Bibliográfica

1, 2, 3

Quais as características e relações gráficas da notação musical padrão e a musicografia Braille?

Determinar diferenças e semelhanças de codificação entre a notação musical padrão e a musicografia Braille

2

Análise sintática

Indutiva

4

Quais as limitações representacionais na muscografia Braille?

Identificar limitações de codificação na musicografia Braille

Que dificuldades são encontradas pelos músicos cegos ao utilizar a musicografia Braille?

Identificar dificul- 3 dades encontradas Estudo com pelos usuários na usuários leitura da musicografia Braille

Observação nãoparticipante

Indutiva

5

Que dificuldades são encontradas na transcrição da notação tem tinta para a musicografia Braille?

Identificar dificuldades encontradas pelos músicos não-cegos que realizam a transcrição para musicografia Braille

Como é possível aprimorar a musicografia Braille, facilitando seu uso?

Propôr requisitos gráficos para a melhoria da musicografia Braille

Indutiva

6

Análise gráfica

4

Requisitos

Quadro 01: Descrição dos métodos de pesquisa e fases do trabalho

Técnica

Entrevista semiestruturada




capítulo 1

linguagem gráfica e design de inclusão

Esse capítulo versa sobre a Linguagem Gráfica e seu uso no design inclusivo. Serão apresentadas algumas definições de linguagem gráfica e seus modos de simbolização: verbal, pictórico, esquemático e tátil. Depois serão apresentados os aspectos sintáticos e semânticos que compõem essa linguagem. Serão discutidos também princípios e diretrizes que devem reger o Design da Informação. A seguir, a Linguagem Gráfica será abordada mais especificamente em suas aplicações em sistemas de notação e para o uso de deficientes visuais. Antes de apresentar os aspectos da linguagem gráfica, vale salientar alguns conceitos propostos pelos estudiosos da área. De acordo com Pettersson (2007), qualquer sistema que possibilite a comunicação entre pessoas pode ser chamado de linguagem. A linguagem gráfica, ou linguagem visual, é componente fundamental do Design Gráfico, assim como a Linguagem Oral o é da Linguística. Segundo Twyman (1979), “designer gráfico significa alguém que planeja a linguagem gráfica; gráfico significa representado ou feito visível em resposta a decisões conscientes, e linguagem significa um veículo de comunicação.” (1979, p. 117) Assim, o designer é responsável por articular conscientemente marcas visíveis de forma a transmitir uma mensagem. A obra Sémiologie graphique (Semiologia gráfica), publicada em 1967 pelo cartógrafo francês Jacques Bertin, é considerada o nascimento da sistematização da linguagem gráfica. Embora originalmente destinada à aplicação em mapas, a semiologia gráfica pode ser aplicada em qualquer representação gráfica. Segundo Oliveira (2011): A linguagem gráfica, ou seja, conjunto de diretrizes ou sistemas de sinais proposta por Bertin tinha por objetivo fornecer diretrizes para construção de gráficos que fossem vistos e não lidos. Assim, não se lê um mapa – no sentido de fazer uma série de interferências e interpretações a fim de compreender o que é apresentado – e sim se vê, ou seja, capta-se a informação de maneira mais imediatista. (OLIVEIRA, 2011, p. 2)

Já Engelhardt (2002) afirma que a expressão da linguagem gráfica são as representações gráficas. Segundo ele, “uma representação gráfica é um artefato visível em uma superfície mais ou menos plana, que foi criado com o intuito de expressar informação1”. Essa definição é ampliada nesse trabalho para incluir representações táteis, como o código Braille. A linguagem gráfica apresenta diferentes modos de simbolização, como será visto a seguir.

1

Tradução livre.


1.1 Modos de simbolização Twyman (1979) classifica a linguagem em canal e modo de simbolização. O canal pode ser auditivo ou visual. Os modos de simbolização são as maneiras como a linguagem pode se materializar, e são definidos como: verbal/numérico, pictórico e esquemático (Figura 1-01). Esses conceitos também são descritos por Van der Waarde (1999). Segundo ele, componentes verbais são todas as marcas dotadas de significado que podem ser pronunciadas; componentes pictóricos são as marcas gráficas que guardam alguma relação com a aparência ou estrutura de objetos reais; e componentes esquemáticos são aqueles que não podem ser classificados como verbais ou pictóricos, e aparecem em combinação com outros tipos de componentes gráficos. Van der Waarde (1999) acrescenta ainda a essa classificação os componentes compostos, que são marcas gráficas que não podem ser separadas mas são passíveis de classificação em mais de um modo de simbolização.

Figura 1-01: Estrutura da linguagem (TWYMAN, 1979)

Para os fins desse trabalho, será adotada a classificação proposta por Spinillo (2003), que acrescenta ao modelo acima o canal tátil, que por sua vez também apresenta componentes verbais, pictóricos e esquemáticos (Figura 1-02).

Figura 1-02: Estrutura da linguagem revista (SPINILLO, 2003)

Como a linguagem oral, a linguagem gráfica também apresenta uma gramática própria, com aspectos sintáticos e semânticos que serão apresentados a seguir.


1.2 Aspectos sintáticos e semânticos da linguagem gráfica A linguagem gráfica pode ser estudada em relação a suas regras de composição e papéis sintáticos de seus componentes, ou em relação à sua interpretação, ou seja, seus aspectos semânticos (ENGELHARDT, 2002). A sintaxe gráfica envolve os componentes de uma representação gráfica (o espaço gráfico e os objetos nele inseridos), seus papéis e as relações que eles estabelecem entre si. Já a semântica envolve os tipos de correspondência e os modos de simbolização. 1.2.1 Representação gráfica Como dito anteriormente, representações gráficas são marcas visíveis em uma superfície mais ou menos plana que visam a transmitir informação (ENGELHARDT, 2002). De forma resumida, representação gráfica é uma mensagem específica inserida em uma mídia (PETTERSSON, 2007). Assim, pode-se entender que a musicografia Braille, como o código Braille de maneira geral, embora sejam táteis, não fogem à classificação de representação gráfica, pois são formados por marcas organizadas de maneira consciente para transmitir informação. As representações gráficas, portanto, são compostas por um espaço gráfico em que estão inseridos objetos (ENGELHARDT, 2002). Diz-se que um espaço gráfico é significante quando cada posição nele é dotada de significado, independente da existência de objetos. O espaço significante pode ser métrico ou métrico distorcido. Já os objetos gráficos podem ser elementares ou compostos. A menor parcela com significado de um objeto, ou ainda, um objeto no nível mais detalhado de análise é um objeto elementar. Objetos compostos são formados por dois ou mais sub-objetos. É importante notar que os sub-objetos podem ser, por sua vez, objetos compostos, gerando vários níveis de análise (ENGELHARDT, 2002). Segundo Bertin (1983), os objetos gráficos possuem atributos visualmente perceptíveis, a saber: posição, orientação, tamanho, forma, valor, cor e textura (Figura 1-03). Posição diz respeito ao ponto em que o objeto se localiza no espaço 2D. Tamanho é um atributo versátil: pode variar de maneira homogênea para todos os lados ou apenas em sua altura, comprimento ou profundidade. Forma é o atributo visual que frequentemente dá nome ao objeto, como quadrado, triângulo etc. A cor definida por Bertin corresponde aos atributos de matiz e saturação. Valor, por sua vez, se refere ao brilho. Textura diz respeito à espessura dos constituintes de uma área. Engelhardt (2002) usa os mesmos atributos, porém os divide em duas categorias: espaciais (orientação, tamanho, forma e posição) e de preenchimento de área (cor, valor e textura). Um objeto pode exercer diversas funções sintáticas: rótulo, separador, conector, container, localizador ou linha de grid (ENGELHARDT, 2002). Um rótulo é ancorado a um outro objeto por agrupamento, e especifica informações sobre ele. Um separador pode ser uma linha ou faixa ancorada entre dois objetos de modo a separá-los. Um conector pode ser uma seta, faixa ou linha ancorada entre dois objetos de modo a conectá-los. Um container é um objeto que envolve outro objeto de modo a contê-lo. Um localizador é um objeto que localiza um ponto, umalinha, uma área ou um volume no espaço gráfico. Uma linha de grid é uma linha que marca o espaço gráfico para facilitar as relações espaço-objeto. Quando um objeto não exerce qualquer dessas funções, Engelhardt o classifica como nó. Os objetos também podem exercer funções semânticas: informacional, referencial ou decorativa (ENGELHARDT, 2002).


Figura 1-03: Atributos visuais (BERTIN, 1983)

Um objeto pode exercer diversas funções sintáticas: rótulo, separador, conector, container, localizador ou linha de grid (ENGELHARDT, 2002). Um rótulo é ancorado a um outro objeto por agrupamento, e especifica informações sobre ele. Um separador pode ser uma linha ou faixa ancorada entre dois objetos de modo a separá-los. Um conector pode ser uma seta, faixa ou linha ancorada entre dois objetos de modo a conectá-los. Um container é um objeto que envolve outro objeto de modo a contê-lo. Um localizador é um objeto que localiza um ponto, umalinha, uma área ou um volume no espaço gráfico. Uma linha de grid é uma linha que marca o espaço gráfico para facilitar as relações espaço-objeto. Quando um objeto não exerce qualquer dessas funções, Engelhardt o classifica como nó. Os objetos também podem exercer funções semânticas: informacional, referencial ou decorativa (ENGELHARDT, 2002). Em uma representação gráfica, os objetos estabelecem relações entre si ou com o espaço. Essas relações estão descritas a seguir. 1.2.2 Relações objeto-objeto São relações estabelecidas entre dois ou mais objetos em uma representação gráfica. As principais relações objeto-objeto são: agrupamento espacial, separação por um separador, alinhamento, ligação por um conector, contenção por um container e superposição (ENGELHARDT, 2002). Não raro, os objetos envolvem-se em mais do que uma relação simultaneamente. Agrupamento espacial (Figura 1-04) ocorre quando objetos são dispostos em grupos formados por proximidade, e distantes dos demais grupos. O agrupamento resulta na formação de dois ou mais objetos compostos, separados por espaço vazio. Um caso especial de agrupamento é o caso da rotulagem, em que um rótulo é ancorado a um objeto por proximidade. No agrupamento espacial, os grupos são separados apenas por espaço em branco. Separação por um separador (Figura 1-05) é uma forma de agrupamento em que a separação não é feita apenas por espaço em branco, mas através de um separador, que pode ser uma linha contínua ou segmentada ancorada entre os objetos a serem separados.


Figura 1-04: Agrupamento espacial (ENGELHARDT, 2003 p. 33)

Figura 1-05: Separação por separador (ENGELHARDT, 2003 p. 35)

Alinhamento (Figura 1-06), como o nome sugere, é a organização dos objetos em linhas, de forma que cada um tenha dois objetos vizinhos (com exceção do primeiro e do último objetos da linha). A linha pode ser segmentada, ou seja, dividida em linhas paralelas de mesma direção.

Figura 1-06: Alinhamento (ENGELHARDT, 2003 p. 37)

Conexão por um conector (Figura 1-07) ocorre quando dois ou mais objetos são unidos por uma seta ou linha. O objeto composto resultante pode ser uma cadeia linear, circular, uma árvore ou um network. Os conectores podem ser direcionados (setas) ou não direcionados (linhas). Contenção por um container (Figura 1-08) é a relação entre dois objetos em que um envolve o outro. O objeto envolvido é ancorado dentro do container.

Figura 1-07: Conexão por conector (ENGELHARDT, 2003 p. 41)

Figura 1-08: Contenção por container (ENGELHARDT, 2003 p. 47)


Superposição (Figura 1-09) envolve um objeto em primeiro plano e outro em segundo plano. O objeto em primeiro plano é percebido como se estivesse na frente do outro objeto.

Figura 1-09: Superposição (ENGELHARDT, 2003 p. 85)

Além de estabelecer relações entre si, os objetos também podem se relacionar com o espaço, conforme é descrito a seguir. 1.2.3 Relações espaço-objeto As relações entre espaço e objeto só ocorrem nos espaços gráficos significantes, em que cada posição espacial é sujeita a interpretação mesmo que não haja objetos nessas posições (ENGELHARDT, 2002). Se nas relações objeto-objeto os objetos estão ancorados a outros objetos e possuem certa liberdade de posição espacial, nas relações espaço-objeto os objetos estão ancorados a posições no espaço, posições essas que são fixas. Um objeto ancorado ao espaço pode ser um localizador de ponto, de linha, de área, de volume ou uma linha de grid. Localizador de ponto é um objeto ancorado a um ponto específico do espaço gráfico. Normalmente, o centro da área ocupada pelo ponto é posicionado no ponto exato do espaço significante. Um localizador de ponto é livre em seu tamanho e forma. Na figura 1-10, vê-se um mapa em que os nomes das cidades estão indicados por localizadores de pontos. Localizador de linha está ancorado a uma linha específica no espaço gráfico. A área ocupada por um localizador de linha é centrada na linha do espaço significante. Assim, o localizador de linha é livre em sua espessura, embora seja fixo em sua forma e comprimento. As linhas diagonais do gráfico da figura 1-11 são localizadores de linha.


Figura 1-10: Localizador de ponto (ENGELHARDT, 2003 p. 62)

Figura 1-11: Localizador de linha (ENGELHARDT, 2003 p. 63)

Localizador de área está ancorado a uma área específica no espaço gráfico. A área ocupada pelo localizador de área cobre exatamente a área do espaço significante e é, portanto, fixa em forma e tamanho. Na figura 1-12, as formas dos continentes são localizadores de área. Um localizador de volume segue as mesmas regras. Linha de grid é uma linha que demarca um espaço gráfico. Não é significante por si só, mas facilita a interpretação das relações entre os objetos posicionados no espaço gráfico. As linhas horizontais e verticais do gráfico na figura 1-13 são linhas de grid.

Figura 1-12: Localizador de área (ENGELHARDT, 2003 p. 68)

Figura 1-13: Linha de grid (ENGELHARDT, 2003 p. 91)

Foram comentados aqui os aspectos sintáticos e semânticos da linguagem gráfica e a seguir serão vistos alguns princípios que regem o Design da Informação de modo geral a fim de estabelecer as bases para o estudo da Musicografia Braille.

1.3 Princípios de Design da Informação Pettersson (2007) descreve o Design da Informação da seguinte maneira: Com o intuito de satisfazer as necessidades de informação dos destinatários pretendidos, design da informação compreende análise, planejamento, apresentação e compreensão de uma mensagem – seu conteúdo, linguagem e forma. Independentemente do meio escolhido, um material de informação bem projetado, com sua mensagem, satisfará requisitos estéticos, econômicos, ergonômicos e de assunto. (PETTERSSON, 2007, p. 10)


Assim, o papel do designer da informação não é apenas projetar o layout, e sim participar de todo o processo de comunicação para garantir a compreensão por parte do usuário. Pode-se dizer que o design da informação é centrado no usuário e leva em conta suas necessidades. Para falar de design da informação é preciso esclarecer os conceitos de informação, redundância e ruído. O conceito de informação está associado á novidade, e diz respeito ao nível de novidade em uma mensagem. O que já é previsto não constitui informação. Se o previsto contiver ainda alto grau de certeza, trata-se de redundância, repetição de condições já conhecidas. A redundância pode ser positiva em alguns casos, para reforçar uma informação (facilitando, assim, sua memorização) ou garantir maior clareza, apresentando a mesma informação de diferentes maneiras. Finalmente, ruído é qualquer distração que atrapalhe o processo de comunicação, interpondo-se entre a mensagem e o receptor (FRASCARA, 2000). Não é possível determinar regras rígidas para o processo de design da informação, pois em cada caso devem ser estudados diversos fatores como os receptores da mensagem, a mensagem em si, o contexto em que estão inseridos etc. O principal a ser considerado é que a forma deve ser desenvolvida para melhor servir à função (MIJKSENAAR, 1997). Com isso em mente, é possível determinar alguns princípios que regem o processo de design. Pettersson (2007) indica seis princípios básicos de funcionalidade: (a) definir o problema; (b) proporcionar estrutura; (c) proporcionar clareza; (d) proporcionar simplicidade; (e) proporcionar ênfase; e (f) proporcionar unidade. (a) Definir o problema – Em um processo de design, o primeiro passo é conhecer todos os fatores envolvidos: o emissor, o receptor pretendido, a mensagem e o meio. É preciso determinar com precisão qual é o objetivo do processo de comunicação, quais as características das pessoas a quem a mensagem se destina, em que contexto elas estão inseridas e como essa mensagem chegará a elas. (b) Proporcionar estrutura – A estrutura da mensagem deve estar clara para os receptores, de forma a facilitar a percepção, interpretação, compreensão, aprendizado e memorização do conteúdo informacional. O design deve explicitar essa clareza da estrutura e a hierarquia das informações. (c) Proporcionar clareza – Clareza diz respeito à legibilidade de uma mensagem gráfica. Os componentes gráficos devem se destacar claramente do fundo, ser facilmente distinguíveis e fáceis de ler. Os materiais informacionais devem ser claros, simples, transparentes e não devem conter ambigüidades. Diversos fatores influenciam na legibilidade do texto: tamanho da letra, distância das entrelinhas, comprimento da linha, cor da tinta sobre o papel, qualidade do papel etc. Na escrita Braille também é possível encontrar fatores equivalentes que interferem na legibilidade. (d) Proporcionar simplicidade – Simplicidade diz respeito à leiturabilidade de uma mensagem gráfica. Refere-se à capacidade dos receptores de compreender o estilo da mensagem. É necessário adaptar o conteúdo da mensagem aos destinatários. Simplicidade aumenta a eficiência da percepção, processamento e memorização da mensagem. (e) Proporcionar ênfase – As informações mais importantes em uma mensagem devem ser enfatizadas para atrair, direcionar e manter a atenção do receptor. Para evitar confusões, é importante utilizar a ênfase de acordo com um sistema consistente, respeitando os níveis hierárquicos das informações.


(f) Proporcionar unidade – As mensagens devem ter unidade e coerência global para não confundir os receptores. Os princípios acima citado devem ser cuidadosamente seguidos em qualquer documento informacional, inclusive nos sistemas de notação, objeto deste estudo, que serão descritos a seguir. 1.3.1 Linguagem gráfica em sistemas de notação Segundo o dicionário Michaelis, notação é um “sistema de representação ou designação convencional, bem como o conjunto de sinais com que se faz essa representação ou designação”. Pode ser aplicada a diversas áreas do conhecimento, como a química, matemática, engenharia e a música. A notação da engenharia, por exemplo, é a “linguagem através da qual quantidades de engenharia, p. ex. físicas e matemáticas, podem ser representadas e relacionadas” (PECE et al., 2010). De acordo com Blostein e Grbavec (1996, apud PECE et al., 2010), as notações representam ideias de modo a auxiliar o raciocínio matemático e a visualização. Embora os autores tratem de notações matemáticas, os princípios podem ser abstraídos e aplicados a qualquer tipo de notação. O entendimento, de acordo com os autores, se dá por quatro etapas: (a) reconhecimento dos símbolos; (b) identificação das relações espaciais entre os símbolos; (c) identificação de relações lógicas entre os símbolos; e (d) construção de significado. As notações variam em simplicidade e clareza. Segundo Pece et al. (2005), A priori, toda notação deveria ser simples e clara. Acontece que simplicidade em excesso pode resultar em falta de clareza e vice-versa. Entende-se aqui por notação simples aquela que faz uso de poucos símbolos para a representação de uma certa quantidade, demandando portanto longas definições e explicações (notação implícita/ minimalista) para cada nova quantidade apresentada. Em contrapartida, uma notação clara é aquela que, com poucas ou mesmo nenhuma explanação, expressa inequivocamente a quantidade desejada, demandando portanto um maior número de símbolos (notação explícita/complexa) para cada nova quantidade apresentada. (PECE et al., 2005, p. 8)

Onde os autores falam de “quantidade”, referindo-se a valores matemáticos, pode-se expandir para “informação” de modo a abranger o presente trabalho. Assim, uma notação simples é aquela que utiliza poucos símbolos para representar uma informação. A desvantagem dessa modalidade notacional é que, por sua natureza minimalista e abstrata, algumas relações ficam implícitas e devem ser inferidas com base no conhecimento prévio do leitor. Já uma notação clara é a que pode ser compreendida com pouca ou nenhuma explicação, pois expressa de maneira inequívoca a informação. Demanda, porém, um maior número de símbolos. Um exemplo interessante da aplicação da linguagem gráfica em sistemas de notação é o código ColorADD, desenvolvido pelo designer português Miguel Neiva em 2008. É um código monocromático que utiliza figuras geométricas para possibilitar aos daltônicos correta identificação das cores. Como se vê na figura 1-14, a cada uma das cores primárias foi atribuída uma forma geométrica, totalizando cinco símbolos simples que podem ser facilmente assimilados ao “vocabulário visual” do usuário. A partir desses símbolos, são feitas combinações para formar as demais cores, como se observa na figura 1-15. Na figura 1-16 vê-se o código completo. O ColorADD é um ótimo exemplo de como a linguagem gráfica pode contribuir para a independência e qualidade de vida dos deficientes visuais, como será demonstrado a seguir.


Figura 1-14: ColorADD - cores primárias http://coloradd.net

Figura 1-15: ColorADD - combinações http://coloradd.net

Figura 1-16: ColorADD - completo http://coloradd.net

1.4 Linguagem gráfica para deficientes visuais Ao contrário do que se acredita, a cegueira não pressupõe perda total da visão. Segundo o Instituto Benjamin Constant2, a definição de cegueira se dá por escalas oftalmológicas que partem da cegueira parcial (também dita “legal” ou “profissional”) até a cegueira total. Para fins pedagógicos, define-se como cego aquele que, mesmo apresentando vestígios de visão, necessita do sistema Braille para realizar leitura; e como portador de visão subnormal aquele que é capaz de ler tipos ampliados ou letras em relevo. O Instituto Benjamin Constant é uma instituição de ensino para deficientes visuais localizada no Rio de Janeiro. Fundado por D. Pedro I em 1854, o Instituto é um importante marco na luta dos deficientes visuais pela cidadania. Além de escola, oferece capacitação profissional, assessoria a escolas e instituições em geral e reabilitação física.

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Atualmente há diversos esforços para garantir autonomia aos deficientes visuais – autonomia essa que é direito não apenas dos deficientes visuais mas de todos os portadores de necessidades especiais, de acordo com a Lei de Acessibilidade3. Pode-se definir acessibilidade, nesse contexto, como o pleno direito de ir e vir e de usufruir dos meios de comunicação e de informação. O Design pode – e deve – desempenhar um papel importante na conquista da acessibilidade. No que diz respeito à linguagem gráfica, trata-se de estudar e aprimorar os recursos táteis oferecidos aos deficientes visuais. Um exemplo muito interessante é “O livro negro das cores” (COTTIN & FARÍA, 2011), um livro que representa as sensações causadas pelas cores através de diferentes relevos impressos em verniz (Figura 1-17). Uma prova de que a linguagem gráfica pode ajudar no processo de construção de sentido mesmo aos que não podem vê-la.

Figura 1-17: O livro negro das cores http://pallaseditora.com.br

Outro exemplo que vale destacar é a coleção de livros Conheça a Turma da Mônica em Braille (Figura 1-18) lançada durante a Bienal do Livro de 2005 pela Editora Globo. Além dos textos em Braille, os contornos dos desenhos também são em alto relevo para proporcionar uma experiência sensorial mais rica. As cores são fortes e as letras grandes para incluir também os leitores de visão subnormal.

Figura 1-18: Turma da Mônica em Braille http://monica.com.br


Projetos de sinalização também são desenvolvidos especialmente para deficientes visuais. É comum ver nas agências bancárias os chamados mapas táteis (Figura 1-19), que permitem que os cegos se localizem. O Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro desenvolveu um programa chamado DOSVOX, um sistema que se utiliza da síntese de voz para viabilizar o uso de computadores por deficientes visuais. Diversos aparelhos celulares realizam chamadas através de comandos de voz. Estudos são realizados sobre adaptação de telefones públicos a deficientes visuais (IZIDORO et al., 2006) e sobre a otimização de bulas de medicamento em Braille (LOPES, 2009).

Figura 1-19: Mapa tátil http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1087971-5605,00.html

1.5 Sumarização Nesse capítulo, foi visto que linguagem gráfica é um conjunto de normas e diretrizes que regem as representaçõs gráficas. Essa linguagem pode se materializar em 3 diferentes modos de simbolização: verbal, pictórico e esquemático; nos canais visual ou tátil. Como a linguagem verbal, a linguagem gráfica tem sua própria sintaxe. Foi visto que representações gráficas são formadas por um espaço gráfico onde estão inseridos objetos, e que esses estabelecem relações entre si. As relações objeto-objeto são alinhamento, conexão, contenção e superposição. De acordo com as relações em que estão inseridos, os objetos são classificados em funções sintáticas. As relações espaço-objeto são de localizador (de ponto, de linha, de área e de volume) e linha de grid. Foram descritos alguns princípios do Design da Informação, sendo: definir o problema; proporcionar estrutura; proporcionar clareza; proporcionar simplicidade; proporcionar ênfase; e proporcionar unidade. Em seguida foi descrita a aplicação da linguagem em sistemas de notação, e as cinco etapas do entendimento: (a) reconhecimento dos símbolos; (b) identificação das relações espaciais entre os símbolos; (c) identificação de relações lógicas entre os símbolos; e (d) construção de significado. Finalmente, foi mencionada a possibilidade de contribuição da linguagem gráfica para as representações táteis destinadas aos deficientes visuais. Nesse trabalho, será abordada a aplicação da linguagem gráfica no sistema de notação musical em Braille. Antes, porém, que se possa apresentar esse sistema, faz-se necessária uma breve descrição da notação musical em tinta.


capítulo 2

notação musical: um sistema gráfico

Esse capítulo pretende descrever o sistema de notação usado atualmente na música ocidental, explicitando seus elementos básicos e a maneira com que eles se relacionam. Primeiramente será brevemente apresentado o conceito de notação musical, bem como sua contextualização histórica. Em seguida, serão descritos os principais elementos da escrita musical e suas funções. É lugar-comum dizer que a música é a linguagem universal da humanidade. Segundo o autor Read (1979), no entanto, isso não passa de um mito perpetuado por incontáveis escritores. As canções tradicionais do Japão ou nativas da África são não apenas estranhas, mas incompreensíveis aos nossos ouvidos; da mesma forma as músicas ocidentais devem soar estranhas a esses povos. Já os símbolos que compõem a escrita musical são, esses sim, reconhecidos e compreendidos em qualquer lugar onde a cultura ocidental tenha se desenvolvido, independente de onde as ideias musicais tenham sido originadas. No oriente foram criados sistemas de notação musical independentes que não influenciaram o desenvolvimento notacional no ocidente. A notação musical é um sistema de escrita que se utiliza de metáforas visuais para representar graficamente os elementos de um discurso musical. É um complicado sistema de códigos (HARNONCOURT, 1998) que deve permitir ao intérprete executar a peça da maneira pretendida pelo compositor. Em seu artigo sobre representação do pensamento musical, Barbosa (2009) defende que a notação musical é um modo muito abstrato de representação do som, e pressupõe a construção de metáforas. Há quase três mil anos se utiliza na música ocidental a metáfora da verticalidade, que implica na representação dos sons mais agudos em posições superiores, e dos sons graves em posições inferiores. Para melhor compreender a escrita musical atual é necessário conhecer os aspectos históricos de seu desenvolvimento, que serão brevemente abordados a seguir.

2.1 Breve história da escrita musical A origem da escrita musical como é conhecida hoje no ocidente remonta há quase três mil anos, com os gregos, que desenvolveram pelo menos quatro sistemas de notação derivados de letras do alfabeto. Um exemplo dessa modalidade é o epitáfio de Seikilos (Figura 2-01) - cuja data está situada entre 200 a.C. e 100 a.C. -, no qual a melodia foi grafada acima da letra da música (READ, 1979).


Figura 2-01: Epitáfio de Seikilos http://wikipedia.org

Ainda segundo Read, a notação grega teve grande influência no desenvolvimento da escrita neumática, usada pelos monges da Europa medieval para registrar os cantos gregorianos. Essa escrita era caracterizada pelas neumas, curvas padronizadas notadas acima do texto para indicar o movimento melódico (Figura 2-02), que derivaram dos dois sinais básicos da escrita musical grega: o acutus /, que indicava movimentos ascendentes da voz, e o gravis \ para movimentos descendentes. Esses sinais, que podiam ser combinados de diversas formas para representar sequências de movimentos (Figura 2-03), ainda podem ser verificados na escrita da maior parte das línguas latinas, inclusive no português (o acento agudo, o acento grave e o circunflexo).

Figura 2-02: Escrita neumática http://tritonomusicnews.blogspot.com

Figura 2-03: Acutus e gravis (READ, 1979)

As neumas, entretanto, eram sinais bastante inexatos, não indicando quão altos eram os sons, ou quais os tamanhos dos intervalos. A distância entre as neumas e o texto sugeria rusticamente as alturas, porém sem precisão, e não havia qualquer representação do tempo das notas. Funcionavam como forma de memorização aos monges que já conheciam o canto, porém não proporcionavam o aprendizado de uma melodia nova. Em uma tentativa de solucionar esse problema, as notas passaram a ser grafadas com alturas variáveis em relação a uma linha horizontal, indicando as alturas. Esse modelo evoluiu até a pauta de quatro linhas, o tetragrama (Figura 2-04). Nesse período surgiram as claves de dó, que permitiam alterar a extensão sonora representada na pauta e adequá-la a diferentes extensões vocais. O ritmo ainda era apenas inferido pelo texto, e apenas por volta do século X foram criadas quatro figuras para indicar as durações relativas entre as notas. No fim do século XIV já havia cinco figuras de tempo. Mantinham-se as mesmas metáforas da escrita neumática, porém o espaço gráfico passou a ser medido por uma série de coordenadas.


Figura 2-04: Canto gregoriano em pauta de 4 linhas http://win.organisti.it

O monge beneditino Guido d’Arezzo teve papel muito importante no desenvolvimento do sistema atual de notação. Ele retirou das primeiras sílabas de um hino a São João (Figura 2-05) os nomes das 6 notas usadas na época: Ut, Re, Mi, Fa, Sol, La (vários séculos depois a nota Si foi nomeada devido à grafia latina do nome São João, Sancte Iohannes, e Ut foi trocada por Dó para facilitar a pronúncia).

Figura 2-05: Ut queant laxis, hino a São João Batista http://www.3irmaosdesangue.com.br

Com a adição de uma quinta linha na pauta, no século XV, formou-se o sistema de notação que foi padronizado para toda a música ocidental, e continua em uso até hoje (Figura 2-06). A invenção da imprensa, e a publicação das primeiras peças musicais em 1480, contribuiu significantemente com essa padronização. O resultado é um sistema composto por poucos símbolos, claros, concisos e facilmente distinguíveis aos olhos; uma espécie de alfabeto formado por esforços combinados e prolongados de centenas de músicos. Sobre isso, escreveu Read (1979): Como a linguagem escrita pela qual o compositor comunica-se com uma audiência através de um performer, [a escrita musical] é também um estudo dos relacionamentos humanos – a ser julgado pela efetividade com que comunica o que fazer, quando fazer e como fazer. (READ, 1979, p. 24)


Figura 2-06: Partitura atual http://fjfj.sites.uol.com.br

A evolução dos modos de representação não apenas auxiliou a produção musical, registrando suas obras, mas também auxiliou essa produção à medida que não era mais necessário memorizar as peças. Cada aprimoramento do sistema de escrita implicou também em uma organização diferenciada do texto sonoro (BARBOSA, 2009). Se ainda utilizássemos a escrita neumática, com certeza grande parte das peças que conhecemos hoje não existiria. Porém, segundo Harnoncourt (1998), embora esse sistema de notação musical venha sendo utilizado há séculos, não se pode dizer que ele seja atemporal e internacional. Analogamente às mudanças estilísticas sofrida pela música no decorrer do tempo, também a escrita adquire um significado peculiar a cada época. Em suas palavras: Temos, portanto, uma escrita, que nos deve informar tanto a respeito de notas isoladas, quanto do desenvolvimento da obra musical. Deveria ser claro para todo músico que esta notação é muito inexata, que ela não nos indica com precisão as coisas que nos diz: nada informa a respeito da duração de uma nota, sobre sua altura, nem sobre o andamento, pois os critérios técnicos necessários a este tipo de informação não podem ser transmitidos através da notação. (HARNONCOURT, 1998, p. 34)

2.2 Elementos da escrita musical 2.2.1 Nota A nota é a unidade básica de qualquer sistema de notação musical, e também o elemento mínimo de um som, pois representa um único tipo de vibração. Cada nota traz duas informações:

Frequência: também chamada de altura, indica se a nota é mais grave ou mais aguda; Duração: indica o espaço de tempo em que a nota soa.


As notas usadas na música ocidental são sete: dó, ré, mi, fa, sol, la e si; sequência que pode ser repetida diversas vezes, tanto para cima (mais agudo) quanto para baixo (mais grave). O intervalo entre duas notas pode ser medido numericamente. Duas notas contíguas formam um intervalo de segunda; se há apenas uma nota entre as duas em questão, tem-se uma terça; se há duas notas entre elas, uma quarta; e assim por diante. Por exemplo, o intervalo de dó a ré configura uma segunda; de dó a mi, uma terça; de dó a fá, uma quarta; de dó a sol, uma quinta; de dó a lá, uma sexta; de dó a si, uma sétima; e de dó a dó, uma oitava. É fácil compreender o conceito de oitava observando o teclado do piano (Figura 2-07). As teclas representadas em amarelo na figura correspondem à nota Dó, e a distância entre uma tecla dó e outra é de uma oitava. Cada tecla dó recebe um número, que nomeia toda a oitava (assim, a tecla ré que sucede o dó 2 é chamada de ré 2, o mi é mi 2 e assim por diante). O dó 3 também é conhecido como Dó Central. O piano é um instrumento de grande extensão sonora, pois abrange sete oitavas.

Figura 2-07: Representação das oitavas no teclado do piano

Na notação ocidental, não existe um sinal gráfico específico para cada nota. Ou seja, não é possível desenhar um sinal fora de contexto e afirmar que se trata da nota dó, por exemplo. A representação da nota depende da relação entre dois elementos que serão descritos a seguir: pentagrama e clave. 2.2.2 Pentagrama ou pauta Conjunto de cinco linhas paralelas horizontais e equidistantes que serve de base para a escrita musical. As linhas e os espaços são contados de baixo para cima, conforme a figura 2-08. As notas são escritas sobre cada uma das cinco linhas ou dentro de cada um dos quatro espaços, o que resulta em uma extensão de nove notas. Na figura 8 as notas estão representadas por círculos amarelos, pois as figuras de nota serão estudadas a seguir. A posição da nota indica sua altura: quanto mais superior, mais aguda, e quanto mais inferior, mais grave. Ou seja, na figura, o primeiro círculo representa a nota mais grave, em uma progressão que culmina no último círculo, a nota mais aguda.

Figura 2-08: Pentagrama

Como a maioria dos instrumentos possui extensão maior do que as 9 notas contidas no pentagrama (ou seja, alcançam notas mais agudas ou mais graves), podem ser acrescentadas até 4 linhas suplementares acima e/ou abaixo, conforme demonstrado na figura 2-09.


Figura 2-09: Linhas suplementares

Em uma partitura, cada instrumento ou voz é representado por uma pauta. Apenas instrumentos como o piano e o órgão, que permitem a execução simultânea de melodia e acompanhamento, se utilizam de duas pautas (que devem ser lidas simultaneamente), formando um sistema. Nesse caso, o sistema é marcado por uma chave, seguida de uma linha vertical que conecta as duas pautas (Figura 2-10). Os sistemas também são usados na escrita de peças para conjunto, em que vários instrumentos executam diferentes melodias simultaneamente. O sinal que representa esse tipo de sistema não é a chave, e sim o colchete (Figura 2-11).

Figura 2-10: Sistema (chave)

Figura 2-11: Sistema (colchete)

É importante compreender que cada linha ou espaço do pentagrama não está intrinsicamente relacionado a uma nota específica. Ou seja, escrever uma figura na terceira linha, por exemplo, ainda não a identifica como dó, ré ou qualquer uma das outras notas enquanto não houver uma clave, como será visto a seguir. 2.2.3 Clave A clave é um sinal gráfico que orienta a leitura do pentagrama. Ela indica a posição de uma determinada nota, e todas as outras são lidas em referência a essa. A palavra clave vem do termo latim clavis, que significa chave - pois é a chave para a compreensão da partitura. As claves existem para acomodar instrumentos de diferentes tessituras (extensão sonora), ou seja, uns mais graves e outros mais agudos. O piano, por exemplo, tem cinquenta e duas notas - é impossível escrevê-las todas nas cinco linhas e quatro espaços do pentagrama, mesmo com linhas suplementares (seriam necessárias tantas que inviliabizariam a leitura). O uso das claves permite representar diferentes alturas do som (e, portanto, dos instrumentos) dentro de um mesmo espaço gráfico.


A clave de Sol na segunda linha é uma das mais utilizadas na música atual. Seu desenho remete a uma letra S, mas na verdade deriva da grafia da letra G (a cifra da nota sol). Por ter início na 2ª linha do pentagrama (Figura 2-12), ela indica que a referida linha representa a nota Sol. O espaço imediatamente acima é a nota Lá, a linha acima (3ª linha) é Si, e assim por diante (Figura 2-13). Em algumas partituras antigas é possível encontrar a clave de Sol na primeira linha, com uma extensão mais aguda.

Figura 2-12: Detalhe clave de sol

Figura 2-13: Escala clave de sol

A clave de Fá na quarta linha também é largamente utilizada, e mais grave que a de Sol. Seu desenho representa uma letra F (cifra de Fá). Dois pontos ladeiam a 4ª linha (Figura 2-14), que passa a representar a nota fá (Figura 2-15). Nas partituras para piano, normalmente escreve-se a mão direita (melodia) em clave de Sol e a mão esquerda (acompanhamento) na de Fá. Também pode ser escrita na 3ª linha, com uma extensão mais aguda, porém esse uso é menos frequente.

Figura 2-14: Detalhe clave de fa

Figura 2-15: Escala clave de fa

A clave de Dó, desenhada com dois Cs (cifra de Dó) invertidos, pode ser escrita na primeira, segunda ou terceira linha do pentagrama (Figuras 2-16 e 2-17). Foi criada para representar as vozes humanas, porém gradativamente foi substituída pela de sol e de fá. Um dos poucos instrumentos que ainda utilizam a clave de Dó é a viola.

Figura 2-16: Detalhe clave de dó

Figura 2-17: Escala clave de dó

Para compreender a diferença da extensão sonora de cada clave, observe a figura 2-18, em que está representada uma única nota: o dó central do piano (dó 3, conforme visto no item 2.1). Na clave de fá na 4ª linha, o dó central está grafado na 1ª linha suplementar superior, reservando o pentagrama para a escrita de notas mais graves. Já na clave de sol na 1ª linha, o dó central aparece na 2ª linha suplementar inferior, o que significa que as notas grafadas no pentagrama serão mais agudas.


Figura 2-18: Dó central em diferentes claves

2.2.4 Figuras de tempo Como visto anteriormente, uma nota traz duas informações: altura e duração. A altura é indicada pela clave e posição da nota no pentagrama. A duração, por sua vez, aparece nas figuras de tempo. São elas: semibreve, mínima, semínima, colcheia, semicolcheia, fusa e semifusa (Figura 2-19). Cada figura representa um valor de tempo fico, embora relativo. A semibreve (em inglês, whole note) é a duração máxima de uma nota, e serve de referência para definir a duração de todas as outras. A mínima (half note) possui metade do valor de uma semibreve, a semínima (quarter note) vale ¼ de semibreve, ou ½ mínima, enfim, cada figura apresenta metade do valor da que a precede (Figura 2-20). Em algumas partituras é possível encontrar a breve (double whole note), com o dobro de valor da semibreve, porém seu uso é pouco comum.

Figura 2-19: Figuras de tempo

Figura 2-20: Figuras de tempo


Os elementos componentes das figuras são: Cabeça: (Figura 2-21) Forma oval, pode ser aberta (branca) ou fechada (preta); Haste: (Figura 2-22) Linha vertical fina, posicionada à direita (quando voltada para cima) ou à esquerda (voltada para baixo) da cabeça da nota; notas de mesma duração que soam juntas podem ser representadas com apenas uma haste; Bandeirola: (Figura 2-23) Traço curvo ligado à extremidade da haste, sempre voltada para a direita; Barra: (Figura 2-24) Bandeirolas compostas que conectam grupos de notas. O número de barras equivale ao número de bandeirolas da figura.

Figura 2-21: Cabeça

Figura 2-22: Haste

Figura 2-23: Bandeirola

Figura 2-24: Barra

Quaisquer figuras que possuam bandeirolas podem ser unidas por barras, de forma a facilitar a leitura. Assim, é possível unir colcheias entre si, ou colcheias com semicolcheias, semicolcheias com fusas etc., em diversas combinações. Algumas, bastante comuns, podem ser vistas abaixo na figura 2-25.

Figura 2-25: Uso da barra

Na pauta, as figuras posicionadas abaixo da 3ª linha são grafadas com as hastes voltadas para cima, e as que aparecem acima da 3ª linha apresentam haste voltada para baixo. Para figuras posicionadas sobre a 3ª linha ambas as posições da haste são possíveis, embora seja usual que ela seja voltada para baixo, como pode ser visto na figura 2-26.

Figura 2-26: Posição da haste


Na música, os momentos de silêncio são tão importantes quanto os de som. Assim, a cada figura de tempo corresponde uma pausa de mesma duração, que indica um silêncio. Na figura 2-27 é possível observar duas pautas, sendo que a inferior traz as pausas correspondestes às figuras grafadas na pauta superior.

Figura 2-27: Pausas

Ainda que o valor relativo das figuras seja fixo, não é possível determinar, fora de contexto, a duração em segundos de cada uma, pois ela é resultante de uma combinação de elementos: compasso e andamento, que serão descritos a seguir. 2.2.5 Ligadura de valores É possível prolongar a duração de uma nota de duas formas: com o ponto de aumento ou a ligadura de valores. A ligadura de valores é um sinal que une duas figuras de mesma altura, e é grafada sempre junto à cabeça das figuras (Figura 2-28).

Figura 2-28: Ligadura de valores

2.2.6 Ponto de aumento É um ponto posicionado à direita da cabeça da nota e equivale a unir a nota a outra de metade de seu valor com uma ligadura. Na figura 2-29, vê-se uma semínima pontuada, que poderia ser grafada, sem perda de significado, como uma semínima ligada a uma colcheia (metade do seu valor). Já na figura 2-30 vê-se uma semínima com duplo ponto de aumento. O segundo ponto aumenta metade do valor do primeiro ( ¼ do valor da figura original), nesse caso uma semicolcheia. O ponto de aumento também se aplica às pausas.

Figura 2-29: Ponto de aumento

Figura 2-29: Duplo ponto de aumento


2.2.7 Compassos Os compassos são células de sons que determinam a unidade de tempo, o pulso e o ritmo de uma composição. São representados na partitura com linhas verticais traçadas sobre a pauta. A soma da duração das figuras (notas e pausas) em um compasso é determinado pelo valor da fórmula de compasso. A fórmula de compasso é uma fração cujo denominador indica a unidade de tempo, e o numerador, quantas unidades de tempo cada compasso possui. É grafada apenas na primeira pauta da partitura, logo após a armadura de clave (ver 2.6 Acidentes). Na figura 2-31 aparece uma fórmula de compasso ternário (3/4). O número 4 é o denominador e indica a unidade de tempo: a 4ª parte de uma semibreve, ou seja, uma semínima. O 3 é o numerador e indica que cada compasso conterá o equivalente em valor a 3 semínimas. Na mesma figura também se podem observar as linhas verticais que dividem os compassos, e a barra dupla ao fim da pauta que indica o fim da peça (ou de uma seção da peça). Finalmente, estão representadas diferentes combinações de figuras e pausas que podem compor os compassos. As semínimas em vermelho acima da pauta não constam nas partituras, mas foram inseridas na figura para sinalizar com maior clareza as unidades de tempo, chamadas simplesmente de tempos, batidas ou pulsos. Se o denominador da forma de compasso fosse, por exemplo, 8, os tempos seriam representados por colcheias. Os compassos são formados pela variação de tempos fortes e fracos. O compasso ternário, típico das valsas, possui o primeiro tempo forte, o segundo e o terceiro fracos. A marcação do tempo de uma música pode ser feita por um instrumento chamado metrônomo, que produz batidas a intervalos regulares, em velocidades variáveis.

Figura 2-31: Compasso

A partir da definição da fórmula de compasso, é possível determinar, de forma relativa, a duração de cada figura. No exemplo supracitado, pode-se afirmar que a semínima dura 1 tempo, a mínima dura 2 tempos, a colcheia, ½ tempo, a semínima pontuada, 1 ½ tempo, e assim por diante. É possível determinar a duração de uma nota com ainda mais exatidão conhecendo o andamento da peça. O andamento normalmente é informado no início da partitura e pode ser mais lento (Largo, Adagio), moderado (Moderato, Andante) ou rápido (Allegro, Vivace). Se o andamento for fornecido em um valor numérico, então pode ser descoberta a duração exata de cada nota. Se a pulsação for 100, por exemplo, significa 100 unidades de tempo por minuto (no caso do compasso 4/4, 100 semínimas por minuto. Nesse caso, o valor de uma semínima é 0,6 segundo, o de uma mínima, 1,2 segundo, o de uma colcheia, 0,3 segundo, e assim por diante. É possível medir a pulsação com um instrumento chamado metrônomo. 2.2.8 Acidentes Acidentes são sinais utilizados para alterar a nota em um semitom. Para compreendê-los é preciso antes conhecer o conceito de tom e semitom. Tom é um intervalo determinado entre duas notas contíguas. Semitom, como o nome sugere, é metade de um tom. O teclado do piano é o melhor


exemplo para a visualização de tom e semitom: o intervalo entre duas teclas brancas adjacentes, desde que haja uma preta entre elas, ou entre duas pretas adjacentes, é um tom. O intervalo entre qualquer tecla branca e a preta adjacente, ou entre duas teclas brancas que não tenham uma tecla preta entre elas, é um semitom (como demonstrado na figura 2-32, em que os T simbolizam tons e os ST, semitons).

Figura 2-32: Tons e semitons

Há dois tipos de acidente: o sustenido (Figura 2-33), que torna a nota meio tom mais aguda, e o bemol (Figura 2-34), que a torna meio tom mais grave. Os acidentes podem aparecer imediatamente à esquerda da nota a que se referem ou junto à clave. Quando um grupo de bemóis ou de sustenidos aparece no início do pentagrama, logo após a clave, recebe o nome de armadura de clave. Eles indicam que certas notas devem ser alteradas durante toda a extensão da música. Por exemplo, se há um sinal de sustenido na 5ª linha, junto à clave de Sol, depreende-se que todas as notas Fá que aparecerem na música devem ser lidas com sustenido, ou seja, meio tom acima. Independente de quantos sejam, os acidentes na armadura de clave sempre obedecem uma ordem fixa: para os sustenidos, FÁ-DÓ-SOL-RÉ-LÁ-MI-SI; para os bemóis, a ordem contrária: SI-MI-LÁ-RÉ-SOL-DÓ-FÁ. Para anular um acidente que esteja determinado na armadura de clave ou tenha aparecido dentro do mesmo compasso, utiliza-se o sinal bequadro (Figura 2-35).

Figura 2-33: Sustenido

Figura 2-34: Bemol

Figura 2-35: Bequadro

2.3 Sumarização Nesse capítulo, foi apresentado o sistema de notação musical em tinta que atualmente é utilizado no ocidente. Em um primeiro momento foi brevemente exposto um pequeno contexto histórico do surgimento das notas e da escrita musical, e em seguida foram descritos os principais elementos que compõem essa escrita, a saber: nota, pentagrama, clave, figuras de tempo, ligadura de valores, ponto de aumento, compassos, acidentes e intervalos harmônicos. A seguir será apresentado o sistema da musicografia Braille, seu surgimento e seus principais elementos.


capítulo 3

musicografia braille: um sistema gráfico para cegos

Esse capítulo detalha o sistema de notação musical conhecido como Musicografia Braille, que é destinado a leitores cegos e deriva do sistema de escrita Braille. Inicialmente será descrito o histórico da criação do sistema Braille de escrita e da musicografia. Então serão apresentados os principais elementos de ambos os sistema, e suas funções.

3. 1 Breve histórico 3.1.1 Sistema Braille Louis Braille foi um francês que viveu no século XIX. Nascido em 1809, perdeu a visão com três anos, em um acidente na oficina do pai, que fabricava arreios e celas. Tendo facilidade para aprender, frequentou a escola local até os dez anos de idade, quando ganhou uma bolsa para estudar no Instituto Real de Jovens Cegos de Paris. Aprendeu a ler com o sistema que vigorava na época: letras grandes gravadas em alto-relevo no papel grosso. Além de lento e pouco prático, esse método não permitia que os cegos escrevessem, pois as letras eram costuradas no papel (MARINA, 2003). Em 1821, sua escola recebeu a visita de Barbier de la Serre, um oficial da artilharia francesa que desenvolvera um método de escrita em relevo denominado sonografia. Esse sistema, que possibilitava que os soltados lessem mensagens no escuro, transcrevia os sons por meio de células de doze pontos (dois de largura por seis de altura). Alguns aspectos, no entanto, foram considerados inconvenientes: a grande quantidade de pontos era inapropriada à leitura com as pontas dos dedos; e o código não representava sinais de pontuação ou figuras. Braille interessou-se muito pela escrita sonográfica e, durante os dois anos seguintes, trabalhou para aperfeiçoá-la. Aos quinze anos de idade já tinha pronto seu sistema de células de seis pontos (dois de largura por seis de altura), que se prestava à reprodução de textos, contas matemáticas e peças musicais. Em 1829 publicou o primeiro tratado sobre o código que mais tarde levaria seu nome: “Método para escrever as letras, a música e o cantochão por meio de pontos, para o uso de cegos e disposto para eles1”. Embora louve as vantagens de seu próprio sistema sobre o de Barbier, Braille afirma nesse documento que “devemos dizer em sua honra que é ao seu método que devemos a primeira ideia do nosso” (BRAILLE, 1829). O código Braille só foi adotado oficialmente em 1854, dois anos após a morte do seu autor, e continua sendo hoje o principal meio de escrita e leitura para os cegos, tendo sofrido poucas alterações.


3.1.2 A musicografia Braille A musicografia já estava inclusa no primeiro tratado de Louis Braille sobre seu código, em 1829. Ao contrário do alfabeto, no entanto, que se mantém praticamente invariável desde então, a musicografia sofreu diversas alterações, inclusive realizadas por seu autor. De acordo com Tomé (2003), apesar do grande sucesso alcançado pelo sistema na França, ele demorou a extrapolar as fronteiras do país. Em 1871 foi publicado um guia diverso de escrita musical para cegos em Londres; em 1879, foi a vez da Alemanha; e em 1885 publicou-se um novo em Paris. Para unificar os três códigos, formou-se uma comissão internacional com representantes da França, Alemanha, Inglaterra e Dinamarca. Findos os trabalhos em 1888, no congresso de Colônia, foi definido o código que, embora tenha sido ampliado e sofrido alterações, mantém sua estrutura básica até hoje. No entanto, faltavam ainda alguns símbolos para representar fielmente a linguagem musical. Para suprir essas falhas, cada país desenvolveu seus próprios símbolos, o que dificultou o intercâmbio de partituras. Em uma nova tentativa de unificação, foi realizado em Paris, em 1929, o Congresso Internacional de Especialistas em Notação Braille, com a participação de representantes da França, Itália, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos. Ainda em Paris, em 1954 ocorreu o Congresso Internacional sobre a Notação Musicográfica Braille, com representantes de 29 países (entre eles todos os participantes do congresso de 1929). Nessa conferência foram feitos muitos progressos para aproximar a notação Braille da escrita musical, porém dois participantes – o alemão Alexander Reuss e o inglês H. V. Spanner – publicaram tratados de musicografia com notações próprias, o que impediu a unificação pretendida. Nas três décadas seguintes foram realizadas diversas reuniões para tentar recuperar a unidade perdida, e adaptar a escrita às inovações verificadas no discurso musical. Criou-se, no princípio dos anos 80, o Subcomitê para a Notação Musical no Sistema Braille, dependente do Comitê de Cultura da União Mundial dos Cegos. Esse subcomitê se reuniu em 1987 em Marburg (Alemanha) para estudar três manuais distintos: os de Reuss e Spanner, surgidos no congresso de Paris de 1954, e o do russo Dr. Smirnov. Devido ao grau de complexidade da musicografia braille, foram divididos quatro grupos de trabalho em nível internacional, que deveriam levar suas propostas posteriormente para serem estudadas em nova conferência, realizada em Saanen (Suíça) no ano de 1922. Nessa conferência, os grupos de trabalho se reuniram e apresentaram o resultado de seus esforços. Algumas das propostas mereciam uma análise detalhada, portanto os grupos reuniram-se mais uma vez em Marburg, em 1994. Por fim, foi publicada em 1996 a primeira edição em língua inglesa do Novo Manual Internacional de Musicografia Braille. A tradução para o espanhol saiu em 1999, e para o português em 2004.

3.2 Braille: um sistema de escrita Como dito anteriormente, o código Braille é composto por células de seis pontos, dispostos em duas colunas de três. Os pontos são numerados de cima para baixo, primeiro a coluna da esquerda e depois a da direita, conforme a figura 3-01. A célula Braille é representada aqui como um retângulo com círculos abertos (brancos) e fechados (pretos), para facilitar a visualização. Na prática, apenas os pontos em preto são marcados em relevo no papel.


Figura 3-01: Célula Braille (TOMÉ, 2003)

Em seu tratado de 1929, Louis Braille divide os símbolos em séries de dez. A primeira série abrange as letras do alfabeto de A a J, e utiliza apenas os 4 pontos superiores da célula. A letra A é representada pelo ponto 1; a letra B, pelos pontos 1 e 2; C, pontos 1 e 4; D, pontos 1, 4 e 5; E, pontos 1 e 5; F, pontos 1, 2 e 4; G, pontos 1, 2, 4 e 5; H, pontos 1, 2 e 5; I, pontos 2 e 4; e J, pontos 2, 4 e 5, conforme a figura 3-02.

Figura 3-02: Código Braille (1ª série) (TOMÉ, 2003)

Para formar os algarismos de 0 a 9 utilizam-se os mesmos sinais ilustrados na figura 3-02. São precedidos, porém, por um sinal composto pelos pontos 3, 4, 5 e 6, o chamado “sinal de número”, visto na figura 3-03.

Figura 3-03: Código Braille (sinal de número e algarismos) (TOMÉ, 2003)

A segunda série compreende as 10 letras seguintes, e é formada preenchendo o ponto 3 em cada um dos símbolos da série anterior, conforme a figura 3-04. Obtém-se a terceira série acrescentando o ponto 6 aos símbolos da segunda. Existem muitas outras combinações. O alfabeto original, idealizado por Braille, continha 43 símbolos que abrangiam todo o alfabeto, sinais de acentuação e de pontuação. Hoje são 64 combinações possíveis, incluindo a célula em branco (alfabeto completo em anexo).

Figura 3-04: Código Braille (2ª série) (TOMÉ, 2003)


3.3 Musicografia Braille: um sistema de escrita musical Não se pretende, aqui, descrever o complexo código da musicografia Braille em todas as suas nuances e particularidades, e sim estabelecer relações entre seus modos de representação e os conceitos vistos no capítulo anterior. A principal diferença que pode ser notada entre os dois sistemas de escrita é a ausência do pentagrama na modalidade Braille. Enquanto a notação visual se baseia na metáfora da verticalidade para representar os sons mais agudos em uma posição superior na pauta de cinco linhas, e os mais graves em posição mais inferior, a escrita braille os representa lado a lado. A seguir serão apresentados os principais elementos da notação Braille. 3.3.1 Nota No capítulo anterior, foi visto que as notas, na notação musical visual, têm sua altura e duração determinadas pela relação entre alguns elementos: a posição no pentagrama, a clave, a figura de tempo e a fórmula de compasso. Na musicografia Braille, como não há pentagrama, há um sinal específico para cada nota (dó, ré, mi, fá, sol, la, si) em relação a cada figura de tempo (semibreve, mínima, semínima, colcheia, semicolcheia, fusa, semifusa). As colcheias são os sinais básicos, pois a partir delas são construídos os outros. As notas em colcheia de dó a si são representadas pelos 6 últimos sinais da 1ª série Braille, ou seja, as letras de D a J (conforme figura 3-05).

Figura 3-05: Colcheias (TOMÉ, 2003)

Acrescentando o ponto 6 a cada uma das células das notas em colcheia formam-se as notas em semínima, conforme figura 3-06. Se, por outro lado, é acrescentado o ponto 3 às mesmas células das notas de colcheia, são formadas as mínimas (Figura 3-07).

Figura 3-06: Semínimas (TOMÉ, 2003)


Figura 3-07: Mínimas (TOMÉ, 2003)

Para formar as semibreves acrescentam-se simultaneamente os pontos 3 e 6 às células de colcheias, conforme figura 3-08.

Figura 3-08: Semibreves (TOMÉ, 2003)

As semicolcheias são representadas pelos mesmos sinais das semibreves; as fusas usam os mesmos sinais das mínimas; e as semifusas usam os mesmos sinais das semínimas. O valor das notas representadas por sinais iguais é inferido do contexto, pela fórmula de compasso. Quando não é possível determinar o valor da nota pelo compasso, são usados sinais de maior ou menor valor. O sinal de maior valor é composto por três células, dipostas na figura 3-09 e, quando posicionado à esquerda de uma nota ambígua, indica que ela é uma semibreve, mínima ou semínima (de acordo com o que estiver representado). O sinal de valor menor, na figura 3-10, indica o menor valor das notas, ou seja, semicolcheias, fusas e semifusas. Na figura 3-11 pode-se ver uma mínima e quatro fusas, que são representadas pelos mesmos sinais. O sinal de valor menor, no entanto, indica que as notas que o seguem são fusas. A nota dó está destacada em vermelho para evidenciar que se trata do mesmo sinal, ainda que represente figuras diferentes.

Figura 3-09: Sinal de maior valor (TOMÉ, 2003)

Figura 3-10: Sinal de menor valor (TOMÉ, 2003)


Figura 3-11: Uso do sinal de menor valor (TOMÉ, 2003)

As pausas não possuem notas, portanto só há um sinal para cada pausa. Na figura 3-12, vê-se um quadro com as notas, seus respectivos valores e pausas, em ordem decrescente.

VALOR

NOTAS

Figura 3-12: Figuras de tempo e pausas (TOMÉ, 2003)

PAUSA


3.3.2 Sinais de oitava Como visto anteriormente, a musicografia Braille não possui pentagrama. Assim, quando um sinal de nota aparece em uma partitura, não é possível determinar a altura dessa nota. Na figura 3-13 é possível observar duas colcheias, uma nota dó e uma nota fá. Porém não se sabe se é um movimento ascendente (a nota fá é mais aguda que a nota dó) ou descendente (a nota fá é mais grave que a nota dó).

Figura 3-13: Notas dó e fa (TOMÉ, 2003)

Para resolver esse problema são empregados os sinais de oitava. São 7 sinais (Figura 3-14) que representam as oitavas do piano (ver item 2.2.1 Nota), e são posicionados imediatamente antes do sinal da nota a que se referem, sem que qualquer outra sinal possa aparecer entre eles.

Figura 3-14: Sinais de oitava (TOMÉ, 2003)

Assim, na figura 3-15 está representado o mesmo intervalo de dó para fá da figura 3-13, porém agora com os sinais de oitava. Como o dó está acompanhado pelo sinal da 4ª oitava, e o fá pelo sinal da 3ª, já é possível dizer que se trata de um movimento descendente.

Figura 3-15: Sinais de oitava (TOMÉ, 2003)

A primeira nota de uma peça ou parágrafo deve sempre ser precedida de seu sinal de oitava. Para as demais notas, o Novo Manual Internacional de Musicografia Braille (2004) estabelece as seguintes regras:


(a) Se duas notas formam um intervalo de segunda ou terceira ascendente ou descendente, a segunda delas não leva sinal de oitava, mesmo se pertencer a uma oitava diferente da nota anterior. (b) Caso formem um intervalo de quarta ou quinta ascendente ou descendente, a segunda só leva sinal de oitava se pertencer à oitava diferente da primeira. (c) Caso formem um intervalo de sexta ou maior, a segunda nota deve levar sempre sinal de oitava.

3.3.3 Claves Nas peças musicais escritas em Braille, diferentemente das impressas em tinta, a clave não é essencial para determinar a altura das notas, uma vez que os sinais de nota e de oitava já cumprem esse papel. No entanto, é usual inserir o sinal de clave no início da partitura para proporcionar uma compreensão exata da partitura por parte do músico. Na figura 3-16, os principais sinais de clave utilizados.

Figura 3-16: Sinais de clave (TOMÉ, 2003)

3.3.4 Grupos rítmicos No item 2.2.4 Figuras de tempo, foi visto que figuras que possuem bandeirolas podem ser unidas por barras, formando grupos rítmicos que facilitam a leitura. A musicografia Braille tem um recurso semelhante, que pode ser aplicado a grupos de semicolcheias, fusas ou semifusas. A primeira nota de cada grupo rítmico é escrita com o sinal representativo do seu valor real, e as seguintes são escritas com sinais de colcheia. Ao contrário da notação visual, no Braille o agrupamento rítmico só pode ser usado se todas as figuras do grupo são do mesmo valor. Na figura 3-17 podem ser vistos dois grupos de semicolcheias. A primeira nota de cada grupo, um dó e um sol, são escritas com os sinais de semicolcheia, enquanto as outras apresentam os sinais de colcheia.

Figura 3-17: Grupos rítmicos (TOMÉ, 2003)


3.3.5 Ligadura de valores Conforme visto no item 2.2.5, a duração de uma figura pode ser aumentada com a utilização de pontos de aumento ou ligaduras. Na musicografia Braille, a ligadura de valores é um sinal composto por duas células, a primeira formada pelo ponto 4 e a segunda pelos pontos 1 e 4. O sinal de ligadura é posicionado entre as duas notas que estão sendo ligadas (Figura 3-18).

Figura 3-18: Ligadura de valores (TOMÉ, 2003)

3.3.6 Ponto de aumento Na musicografia Braille, o ponto de aumento é representado pelo ponto 3, imediatamente após a nota ou pausa a que se refere (Figura 3-19). Repetindo-se o sinal é possível formar o duplo ponto de aumento (Figura 3-20).

Figura 3-19: Ponto de aumento (TOMÉ, 2003)

Figura 3-20: Duplo ponto de aumento (TOMÉ, 2003)

3.3.7 Compassos Conforme visto anteriormente (item 2.2.5 Compassos), na notação musical em tinta os compassos são demarcados por linhas verticais traçadas sobre a pauta. Na musicografia Braille os compassos são separados uns dos outros por uma célula vazia (Figura 3-21).

Figura 3-21: Célula vazia

As fórmulas de compasso são compostas por 3 células: a primeira é o sinal numérico, formado pelos pontos 3, 4, 5 e 6; a segunda é o símbolo do algarismo referente ao numerador do compasso, na parte superior da célula; e a terceira é o símbolo referente ao denominador do compasso, porém posicionado na parte inferior da célula.


Na figura 3-22 pode-se ver uma fórmula de compasso quaternário (4/4). A primeira célula é o sinal numérico, que indica que os símbolos seguintes são números. A segunda, composta pelos pontos 1, 4 e 5, é o símbolo do número 4. A terceira também é o símbolo do número 4, porém formado pelos pontos 2, 5 e 6, de forma a ficar posicionado na parte inferior da célula.

Figura 3-22: Compasso quaternário (TOMÉ, 2003)

Na figura 3-23, estão representadas algumas das fórmulas de compasso mais comuns.

Figura 3-23: Fórmulas de compasso (TOMÉ, 2003)

A fórmula de compasso também é separada dos compassos por uma célula em branco. Na figura 3-24, um exemplo de compassos notados em Braille.

Figura 3-24: Compassos em Braille (TOMÉ, 2003)

3.3.8 Acidentes Na musicografia Braille, assim como na notação em tinta, os acidentes são posicionados imediatamente antes das notas a que se referem (ver item 2.2.6 Acidentes). Na figura 3-25 vêem-se os seguintes sinais: o sustenido, formado pelos pontos 1, 4 e 6; o bemol, formado pelos pontos 1, 2 e 6; e o bequadro, formado pelos pontos 1 e 6.


Figura 3-25: Acidentes (TOMÉ, 2003)

Na figura 3-26, alguns exemplos de notas acidentadas.

Figura 3-26: Acidentes (TOMÉ, 2003)

As armaduras de clave são indicadas apenas pela quantidade de acidentes que apresentam, e não pelas notas que são acidentadas. Por exemplo, a armadura de clave de Lá maior, com Fá, Dó e Sol sustenidos, é indicada apenas por três sustenidos. Essa informação é suficiente pois, como visto no item 3.2.8, os acidentes da armadura de clave seguem sempre uma ordem determinada. Na figura 3-27 vêem-se as armaduras de claves formadas por sustenidos, e na figura 3-28, as que são formadas por bemóis.

Figura 3-27: Armaduras de claves (sustenidos) (TOMÉ, 2003)


Figura 3-28: Armaduras de claves (bemóis) (TOMÉ, 2003)

3.3.9 Intervalos harmônicos Na notação em tinta, as notas que soam simultaneamente são alinhadas pelo eixo Y. Já na musicografia Braille não é possível fazer esse alinhamento, pois não existe eixo Y. Assim, cada intervalo harmônico tem um sinal específico (Figura 3-29). A nota mais grave do intervalo é escrita em sua forma real, e a mais aguda é representada pelo sinal de intervalo (Figura 3-30).


Figura 3-29: Intervalos harmônicos (TOMÉ, 2003)

Figura 3-30: Uso do sinal de intervalo harmônico (TOMÉ, 2003)

Quando a nota mais aguda do intervalo for acidentada, o sinal do acidente antecede o sinal do intervalo, como se vê na figura 3-31. Se o intervalo for maior que uma oitava, a nota mais aguda deve ser precedida por seu sinal de oitava (Figura 3-32).

Figura 3-31: Intervalo harmônico com acidente (TOMÉ, 2003)

Figura 3-32: Intervalo harmônico maior que uma oitava (TOMÉ, 2003)

3.3.10 Acordes Acordes são grupos de duas ou mais notas simultâneas. Na musicografia Braille, a nota mais grave de um acorde é escrita em sua forma real, e as seguintes são representadas pelos sinais de intervalos correspondentes (Figura 3-33).


Figura 3-33: Acorde (TOMÉ, 2003)

3.3.11 Prefixo literário Na musicografia Braille, os sinais usados para representar as notas são os mesmos do alfabeto Braille. Portanto, as palavras ou letras que aparecem no decorrer de uma peça musical devem ser precedidas do sinal de palavra, conhecido como prefixo literário e composto pelos pontos 3, 4 e 5 (Figura 3-34). Na figura 3-35, é possível ver o prefixo literário antes da indicação Rallentando, que diminui a velocidade de um trecho da peça.

Figura 3-34: Prefixo literário (TOMÉ, 2003)

Figura 3-35: Rallentando (TOMÉ, 2003)

3.3.12 Sinal de repetição A diferença mais notável entre a escrita musical em Braille e a impressa em tinta é a introdução de sinais de repetição que não aparecem no original impresso. As repetições em Braille, usadas criteriosamente, têm como objetivo facilitar a leitura e a memorização, além de poupar espaço. (Manual internacional, p. 74)

Formado pelos pontos 2, 3, 5 e 6 (Figura 3-36), é usado para repetir partes do compasso ou compassos inteiros, reduzindo o espaço escrito e agilizando a leitura. Sua compreensão depende de grande domínio musical do leitor e certo nível de intuição.

Figura 3-36: Sinal de repetição (TOMÉ, 2003)


Na figura 3-37, vê-se um compasso em que o acorde das notas Dó, Mi e Si é repetido três vezes. Na notação Braille, o primeiro acorde é grafado em sua forma real e os três seguintes são representados por sinais de repetição. Na figura 3-38, o sinal de repetição é usado duas vezes com funções diferentes: primeiro para repetir o acorde das notas Sol, Dó e Mi e depois para repetir o compasso inteiro.

Figura 3-37: Sinal de repetição (TOMÉ, 2003)

Figura 3-38: Sinal de repetição (TOMÉ, 2003)

3.4 Sumarização Nesse capítulo, foi descrito o sistema de notação musical para cegos, musicografia Braille. Primeiramente foi apresentado o contexto histórico do surgimento do código Braille, e em seguida o surgimento da musicografia Braille. O sistema Braille de escrita foi descrito antes de serem apresentados os elementos da musicografia Braille, estes sendo: nota, sinais de oitava, claves, grupos rítmicos, ligadura de valores, ponto de aumento, compassos, acidentes, intervalos harmônicos, acordes, prefixo literário e sinal de repetição. A seguir será realizada a análise gráfica dos dois sistemas de notação musical (em tinta e Braille) segundo o modelo de Engelhardt (2002).



63



capítulo 4

Análise gráfica

Esse capítulo traz a análise gráfica dos sistemas de notação musical em tinta e Braille. Serão apresentados os objetivos da pesquisa e a amostra escolhida. Depois, será descrito o instrumento de análise. A análise será então realizada primeiro individualmente, e após serão comparados os dois sistemas de notação.

4.1 Objetivos O objetivo da análise gráfica é fazer um levantamento sintático e semântico dos elementos e relações presentes nos sistemas de notação musical visual e em Braille. Será possível comparar ambos os sistemas e verificar as soluções que cada um oferece aos mesmos problemas. A análise não se caracteriza como uma análise de similares, pois todas as peças que utilizam a notação musical estão submetidas às mesmas regras, e apresentam basicamente as mesmas relações; é mais um inventário.

4.2 Amostra Para a análise gráfica, foram escolhidos dois excertos de peças musicais, um em cada sistema notacional, como representativos de todo o sistema. O principal critério foi a presença de grande variedade de elementos, para possibilitar a riqueza da análise. A extensão da peça foi desconsiderada, visto que apenas foram descritos os elementos individualmente, e não sua ocorrência na peça. Considera-se que essa amostra será suficiente, uma vez que todas as peças que utilizam a notação musical estão submetidas às mesmas regras, conforme dito anteriormente. Na figura 4-01 vê-se uma peça na notação musical em tinta, a Sonata V em Ré Maior, de Francesco Mancini, a duas vozes. Foi escolhida por apresentar a diversidade de elementos pretendida. Como não foi encontrada sua correspondente em musicografia Braille, foi escolhido para a análise um excerto da peça Carinhoso, de Pixinguinha, a uma voz (figura 4-02). Em anexo, a peça completa em Braille e em tinta.


Figura 4-01: Sonata V em RĂŠ Maior, Francesco Mancini


Figura 4-02: Carinhoso, Pixinguinha


4.3 Instrumento de análise O modelo escolhido foi o de Engelhardt (2002), descrito no capítulo 2 deste trabalho, que abrange os elementos componentes de uma representação gráfica, suas funções sintáticas, semânticas e relações. Ao início da análise, percebeu-se que algumas informações são invariáveis para os dois sistemas de notação, e portanto elas foram retiradas do modelo de análise. São reproduzidas aqui como descritivas dos sistemas: Representação gráfica Tipo de informação: Musical Tipo de representação: Notacional Espaço gráfico Métrico (medição sonora) Tipo de correspondência Arbitrária-convencional Retiradas essas categorias, elaborou-se o protocolo de análise conforme consta na figura 4-03.

Figura 4-03: Protocolo de análise

4.4 Procedimentos Primeiramente foram analisados os objetos gráficos de cada sistema de notação, descrevendo seus atributos, funções semânticas e sintáticas. Em seguida realizou-se a análise das relações objeto-objeto em cada sistema. Finalmente, foi realizada uma breve discussão comparando os aspectos apurados em cada sistema notacional.


4.5. Resultados e discussão Nas figuras 4-04, 4-05 e 4-06 é possível ver a análise dos objetos gráficos na notação musical em tinta. Foram quinze objetos elementares analisados, considerando-se que esse sistema ainda conta com muitos outros objetos entre elementares e compostos.

Figura 4-04: Notação em tinta: objetos gráficos


Figura 4-05: Notação em tinta: objetos gráficos


Figura 4-06: Notação em tinta: objetos gráficos

Na figura 4-07, vê-se como se dão as relações entre objetos gráficos na notação musical em tinta. Foram apuradas relações de agrupamento espacial, separação por separador, alinhamento e conexão por conector.


Figura 4-07: Notação em tinta: relações entre objetos gráficos

Na figura 4-08 apresentam-se os resultados da análise dos objetos da musicografia Braille. Ao contrário da notação em tinta, nota-se que aqui há apenas um objeto elementar.

Figura 4-08: Musicografia Braille: objetos gráficos


Na figura 4-09, a análise das relações entre objetos gráficos na musicografia Braille. Foram encontradas relações de agrupamento espacial, alinhamento e contenção por um container.

Figura 4-09: Musicografia Braille: relações entre objetos gráficos

Considerando os resultados gerais da análise das duas partituras, é possível verificar uma grande discrepância entre a quantidade de objetos elementares em cada um dos sistemas de notação. Enquanto na notação em tinta foram analisados quinze objetos elementares, a musicografia Braille conta apenas com um. Em compensação, essa última apresenta um número muito maior de objetos compostos – são 64 possibilidades de célula, e muitos objetos são compostos por mais de uma célula. Essa grande quantidade de objetos compostos dificulta a memorização. Além disso, percebe-se que os atributos são muito mais homogêneos na musicografia Braille. Enquanto a notação em tinta apresenta diversas formas, tamanhos, posições e orientações, a única variação que se nota na escrita Braille é a de posição. Essa falta de contraste também pode ser um fator que dificulta a memorização. Percebe-se também que a notação em tinta apresenta uma diversidade maior de relações objeto-objeto que a musicografia Braille. Na primeira, verificam-se relações de agrupamento, separação por um separador, alinhamento e conexão por um conector. Já na segunda a relação mais expressiva é a de agrupamento; o alinhamento se dá apenas pela organização linear das células, e é possível falar em contenção por um container dos pontos dentro da célula. Na notação em tinta, verificam-se elementos esquemáticos que representam a melodia, e elementos verbal-numéricos para informações como o título da peça, número dos compassos etc. Na escrita Braille, todas as informações são grafadas com as células do alfabeto Braille. Na notação em tinta, as figuras são posicionadas no pentagrama de acordo com uma metáfora de verticalidade. O que significa que as notas mais agudas serão grafadas em posição superior, e as notas mais graves, em posição inferior. Além disso, notas que soam juntas são escritas utilizando um mesmo eixo Y. Esses fatores facilitam a leitura, pois propiciam uma visão clara do todo. Já na musicografia Braille não é possível representar essa verticalidade, e as células são posicionadas linearmente, uma após a outra.


O Quadro 4-01 abaixo sintetiza os resultados da análise gráfica. Nas colunas, podem-se ver os aspectos positivos e negativos de cada notação (em tinta e Braille), e nas linhas os itens avaliados.

NOTAÇÃO EM TINTA

MUSICOGRAFIA BRAILLE

Positivo

Positivo

Negativo

Negativo

Objetos gráficos

Quantidade adequada de objetos

Grande quantidade de objetos

Forma

Diversidade de formas

Forma fixa

Tamanho

Diversidade de tamanhos

Tamanho fixo

Posição

Variação da posição segue uma metáfora de verticalidade

Variação da posição é aleatória

Orientação

Variação da orientação de alguns objetos

Orientação fixa

Textura

Não apresenta textura

Apresenta textura

Agrupamento

Agrupamento entre figuras

Agrupamento entre pontos, agrupamento entre células

Separação por separador

Consta

Não consta

Conexão por conector

Consta

Não consta

Alinhamento

Alinhamento das figuras em linhas interrompidas

Modo de simbolização

Esquemático e verbal-numérico

Alinhamento das figuras em linhas interrompidas Apenas verbal-numérico

Quadro 4-01: Síntese dos aspectos positivos e negativos dos sistemas de notação

4.6 Conclusões e considerações da análise Concluiu-se, portanto, que a musicografia Braille apresenta limitações de codificação, a saber:

• Pequeno número de objetos elementares; • Grande número de objetos compostos; • Homogeneidade de atributos visuais; • Poucas relações objeto-objeto; • Utilização de componentes verbais para representar uma linguagem esquemática; • Linearidade.

O pequeno número de objetos elementares na musicografia Braille, juntamente com a homogeneidade de atributos visuais, impede que se crie uma diversidade gráfica em que a forma do objeto demonstra claramente sua função. Por outro lado, o excesso de objetos compostos cria um léxico extenso que o músico deve memorizar para dominar o sistema.


A notação em tinta consegue transmitir as mesmas informações com um número reduzido de objetos (quinze objetos analisados contra os sessenta e quatro objetos compostos possíveis na musicografia Braille). Para isso, se utiliza das relações objeto-objeto. As figuras são posicionadas no papel de acordo com um eixo X, que representa a sucessão no tempo, e um eixo Y, que representa a altura das notas. As relações de agrupamento, separação, conexão e alinhamento na notação em tinta tornam clara a visão holística da peça. A musicografia Braille, ao contrário, apresenta poucas relações objeto-objeto, sendo perceptíveis principalmente o agrupamento (dos pontos em uma célula ou das células em um bloco) e o alinhamento (sucessão linear das células). Os sinais utilizados para representar a linguagem musical na musicografia Braille são os mesmos do alfabeto Braille; ou seja, componentes verbais sendo utilizados na representação de uma linguagem esquemática. Isso contraria um princípio do Design da Informação, pois utiliza um mesmo recurso com duas funções sintáticas diferentes.

4.7 Sumarização Nesse capítulo, foram apresentados dois excertos de peças para realização da análise gráfica: a Sonata V em Ré Maior de Mancini, na notação em tinta, e Carinhoso de Pixinguinha, na musicografia Braille. A análise foi realizada segundo o modelo de Engelhardt, classificando os objetos gráficos e as relações entre eles em seus aspectos sintáticos e semânticos. Verificou-se que a notação em tinta é mais rica em objetos elementares e relações, enquanto que a musicografia Braille apresenta um número muito maior de objetos compostos, o que pode configurar um problema. Para verificar se os problemas encontrados na análise gráfica realmente interferem na leitura e escrita da musicografia Braille foram realizadas consultas aos usuários, que serão descritas a seguir.


capítulo 5

estudo com usuários

Este capítulo traz consultas aos usuários da musicografia Braille para verificar se os problemas encontrados na análise gráfica realmente ocorrem na prática, tanto na transcrição para a musicografia Braille quanto no uso do sistema notacional por músicos cegos. Primeiramente é apresentado um questionário com quatro músicos, sendo três cegos, sobre a importância da música em suas vidas. Em seguida, uma entrevista realizada com um pianista cego sobre a musicografia Braille. A última consulta é com um tradutor de musicografia Braille. Em seguida são discutidos e confrontados os resultados das consultas.

5.1 Consulta sobre a importância da música para deficientes visuais 5.1.1 Objetivo Essa consulta tem como objetivo investigar a importância que os deficientes visuais dão ao aprendizado da música, a fim de contribuir para o presente trabalho e oferecer subsídios para futuras pesquisas. 5.1.2 Participantes Foram consultados três músicos cegos de diferentes idades, cidades e formações musicais, de modo a poder comparar os resultados. Danilo1, de 16 anos, mora em Contagem (na região metropolitana de Belo Horizonte, MG) e estuda piano e musicografia Braille há quatro anos na Escola de Música Inclusiva Santa Cecília. Lucas (Figura 5-01), 20 anos, mora em Curitiba, estuda Ciências da Computação na Universidade Federal do Paraná, toca guitarra e está aprendendo violino, porém não conhece a musicografia Braille. Spencer (Figura 5-02), 22, mora em Brasília e estuda Direito. Toca violino há onze anos e violoncelo há sete, e conhece a musicografia Braille. Além desses, foi entrevistado um músico vidente. Caio, 23 anos, mora em Curitiba e toca principalmente violão, mas também baixo, gaita, piano e flauta.

1

Nome fictício, por se tratar de um participante menor de 18 anos.


Figura 5-01: Lucas

Figura 5-02: Spencer

5.1.3. Material As consultas foram realizadas principalmente por internet, e apenas uma por telefone. Os materiais foram apenas o próprio telefone, o e-mail e o programa Word para registro das respostas. As perguntas foram adaptadas de acordo com a experiência de cada participante, mas os assuntos abordados foram:

• Que instrumento toca? Há quanto tempo?

• Pensa em trabalhar com música profissionalmente?

• Tem interesse em compor?

• Conhece a musicografia Braille?

• Qual a importância da música na sua vida?

5.1.4 Procedimento Apenas com Danilo foi realizada entrevista semi-estruturada por telefone, e as respostas foram registradas em Word simultaneamente. Aos demais participantes foi enviado um questionário por e-mail, que eles responderam individualmente. Embora não tenha sido estipulado um prazo, todos responderam o questionário no mesmo dia em que o receberam. 5.1.5 Resultados Danilo considera a música muito importante em sua vida. Em suas palavras: “A música pra mim... eu esqueço tudo, todos os tipos de problema. Quando eu sento no piano eu esqueço todas as coisas ruins”. Ele tem planos de seguir carreira profissional na música, tocando em orquestra.


Também se interessa por composição, dizendo que já tem alguns projetos e ressaltando a importância da musicografia Braille para o registro das ideias. Segundo ele, a dificuldade de encontrar professores de musicografia é um fator que pode desencorajar os deficientes visuais no estudo da música. Lucas descreveu a música como “uma forma de enriquecer minhas experiências, memórias e momentos de lazer”. Não tem planos de trabalhar com música profissionalmente, mas se interessa por composição e gostaria de participar de uma banda. Não conhece a musicografia Braille nem uma escola que ofereça o ensino, mas tem muito interesse em aprender. Spencer também atribui grande importância à música. “Me emociono, relaxo, todos os meus sentimentos vêm à tona. É simplesmente algo maravilhoso. Música é a minha vida.” Apesar de seu grande interesse pela área, acha difícil fazer carreira com música no Brasil e prefere atuar como advogado. Quando retomar os estudos de música, tem interesse em compor. Estudou musicografia Braille e considera fundamental esse conhecimento teórico, porém prefere utilizar a audição para aprender músicas novas. Ele afirma que aprendeu a musicografia por dever, mas sempre evitou utilizá-la porque “simplesmente não conseguia ler uma nota e guardar aquilo na cabeça, formando uma melodia; algo que faço muito melhor com o ouvido, é algo que me permite ter um mapa mental completo da música a ser decorada”. Para Caio, a música é “uma das coisas que tornam a vida um pouco mais tolerável”. Tem grande interesse em composição, inclusive se considera mais compositor que instrumentista. Não conhece a musicografia Braille, mas imagina como seja por ter ouvido falar. Considera que a maior dificuldade no aprendizado da música por um deficiente visual seja a escassez de material teórico em Braille ou em áudio. O quadro abaixo sintetiza as respostas dadas por todos os participantes às perguntas principais.

Assunto

Questão

Essência da resposta Danilo

Lucas

Spencer

Caio

Estudo

Que instrumento toca? Há quanto tempo?

Piano, há 4 anos.

Guitarra e violino há 7 meses.

Violino há 11 Violão há 14 anos e violonce- anos, e também lo há 7. baixo, gaita, piano e flauta.

Importância da música

Qual a importância da música na sua vida?

Muito importante, faz com que esqueça todos os problemas.

Importante, enriquece as experiências.

Muito importante, traz todos os sentimentos à tona.

Trabalho

Pensa em traba- Sim, tocar em lhar com música orquestra. profissionalmente?

Não, mas tem Não, acha cominteresse em to- plicado seguir car em banda. carreira no Brasil.

Sim.

Composição

Tem interesse em compor?

Sim, já compõe.

Sim.

Sim.

Sim, já compõe.

Musicografia Braille

Conhece a musicografia Braille?

Sim, trabalha com ela.

Já teve contato mas nunca aprendeu.

Sim, mas evita utilizá-la.

Não, mas imagina como seja.

Quadro 5-01: Síntese da consulta “importância da música”

Importante, torna a vida mais fácil.


Todos os participantes concordaram que a música é importante em suas vidas, sendo eles cegos ou não, conhecendo a musicografia Braille ou não. Embora nem todos tenham planos de trabalhar profissionalmente com música, os quatro alegaram interesse por composição, sendo que Danilo e Caio já compõem. Danilo e Spencer, que aprenderam a musicografia, atestam sua importância no estudo musical, ainda que Spencer prefira não a utilizar. Lucas nunca aprendeu a musicografia e não conhece nenhum professor que a ensine, mas tem muito interesse em aprender. A partir da constatação da importância do aprendizado da música para os deficientes visuais, inclusive como forma de se expressar através da composição, e da importância do estudo da musicografia Braille para aprimorar esse aprendizado, foi realizada uma pesquisa mais aprofundada com o pianista Danilo, como será visto a seguir.

5.2 Estudo com músico cego 5.2.1 Objetivo O principal objetivo dessa pesquisa é verificar como se dá a leitura de uma peça musical em musicografia Braille. Serão avaliados os seguintes aspectos:

• Tempo de leitura antes da execução; • Facilidade/dificuldade de leitura; • Satisfação com o sistema.

5.2.2 Participante Participou desse estudo o pianista Danilo, 16 anos, que já foi apresentado no item anterior (5.1.2 Participantes) e que foi escolhido pelo perfil adequado aos objetivos da pesquisa, e também considerando a dificuldade de encontrar estudantes de musicografia Braille. 5.2.3 Material Os materiais utilizados nesse estudo foram apenas papel, caneta e uma câmera filmadora para registro da entrevista., que seguiu o seguinte roteiro: • Como é o processo de leitura e execução de uma peça? • Quantas vezes, em média, é necessário ler uma peça para memorizá-la? • Quais as dificuldades e facilidades da musicografia Braille? • Qual o seu grau de satisfação com a musicografia Braille? (Escala de 1 a 5, em que 1 é o mínimo de satisfação e 5 é o máximo) • Você conhece a notação musical tradicional? O que você sabe sobre ela? • Você considera a Musicografia Braille a melhor solução para a escrita musical? Por que? Se não, conhece/imagina algum outro sistema? Como seria? 5.2.4 Procedimento A técnica adotada nesse estudo foi de entrevista semi-estruturada. As perguntas foram feitas oralmente ao participante segundo o roteiro acima, e podiam ser alteradas ou acrescentadas no decorrer da entrevista conforme a necessidade.


5.2.5 Resultados Danilo começou a entrevista afirmando que possui ouvido absoluto, ou seja, consegue identificar as notas que ouve. Assim, iniciou o aprendizado de música tocando “de ouvido”, e apenas em 2009 começou a estudar a musicografia Braille. Ele só tem acesso às partituras através de seu professor, Leandro, que é fluente no sistema Braille. O professor faz o ditado das peças, figura por figura, e Danilo as registra utilizando um reglete2. O aluno explica que muitas vezes o professor ensina apenas uma parte da música, mas ele é curioso e procura “tirar a música toda de ouvido”. Assim, ele afirma que lê cada peça diversas vezes antes de executá-la no piano. Quando perguntado sobre o número de vezes, ele respondeu “Ah, é muito... não dá nem pra contar”. As peças mais simples são assimiladas com facilidade; as mais longas, porém, são desmembradas e memorizadas em partes. Segundo ele, o primeiro contato com a partitura pode assustar: a escrita Braille gera partituras mais volumosas, o que sugere que a peça seja mais longa do que realmente é. Questionado sobre as dificuldades e facilidades da musicografia Braille, Danilo diz que “no começo é complicado, mas depois acaba aprendendo”. Ele afirma que hoje, após quase três anos de estudo, lê com facilidade nesse sistema, porém não o considera um sistema fácil. Segundo ele, o aprendizado da musicografia Braille exige, além de um grande poder de memorização, muita dedicação – se os estudos são interrompidos por um período, o aprendizado regride. Outra dificuldade citada por ele são as particularidades de escrita para cada instrumento. O pianista explica que teria que aprender quase que um novo código se quisesse tocar violão. No entanto, Danilo prefere ler as partituras em Braille a aprender as peças puramente pela audição. Justifica que é mais fácil aprender pela partitura, que ele pode consultar a qualquer momento, ler por partes, além de ter acesso a todas as informações corretas da peça original. Seu grau de satisfação com a musicografia pode ser considerado razoável, visto que atribuiu o valor 3 (escala de 1 a 5), justificando que o sistema pode ser confuso mesmo para quem já o domina. Muitas vezes, segundo Danilo, é preciso interromper a execução de uma peça para consultar a partitura, o que quebra o raciocínio. Com partituras novas é difícil localizar a parte que se deseja na mesma, tal dificuldade só diminui à medida que a familiaridade com a partitura/música aumenta. Sobre o sistema de escrita/notação, Danilo acredita que se figuras em relevo fossem utilizadas dificultaria a leitura. Para ele, o fato de a musicografia utilizar os mesmos sinais do alfabeto Braille é uma vantagem, pois torna o código mais fácil de memorizar. Ele não conhece a notação em tinta, pois já nasceu cego. Sua sugestão para aperfeiçoar a musicografia seria “criar um sinal para diminuir essa confusão”, pois o sistema traz sinais iguais com funções diferentes. No entanto, ele admite que seria mais difícil de memorizar um número maior de sinais. No quadro 5-02 abaixo é possível observar uma síntese dos resultados desta entrevista. Danilo se mostra apenas razoavelmente satisfeito com o sistema, que considera confuso e de difícil aprendizado. No entanto, considera adequado o uso do alfabeto Braille, e se mostra resistente a propostas de mudança no modo de codificação. Para comparar suas opiniões com as de outro usuário do sistema foi realizada também uma consulta a um tradutor de musicografia Braille, descrita a seguir.

2

Instrumento utilizado para escrita manual de Braille, em que os pontos são furados um a um na folha.


Assunto

Questão

Essência da resposta

Processo de leitura

Como é o processo de leitura e execução de uma peça?

Obtém as partituras através do ditado do professor. Lê diversas vezes antes de executar, e memoriza por partes.

Memorização

Quantas vezes, em média, é necessário ler uma peça antes de memorizá-la?

Muitas vezes, de acordo com a complexidade e tamanho da peça.

Facilidades e dificuldades

Quais as facilidades e dificuldades da musicografia Braille?

Uma facilidade é o uso do alfabeto Braille, e as dificuldades são a memorização e as particularidades de escrita para cada instrumento.

Satisfação

Qual seu grau de satisfação em relação à musicografia Braille? (escala de 1 a 5 em que 1 é ruim e 5 é bom)

Razoável (3), pois o sistema é confuso mesmo para quem o domina.

Notação em tinta

Você conhece a notação musical em tinta? O que sabe sobre ela?

Não conhece, pois já nasceu cego.

Melhoria do sistema

Você tem alguma sugestão para melhoria do sistema de musicografia Braille?

Diminuir a confusão de sinais iguais com funções diferentes.

Quadro 5-02: Síntese do estudo com músico cego

5.3 Consulta ao tradutor de musicografia Braille 5.3.1 Objetivo O objetivo dessa pesquisa é verificar como se dá a tradução de uma peça em notação tradicional para a musicografia Braille. Serão abordados os seguintes aspectos:

• Tempo da tradução; • Tomadas de decisão do tradutor; • Uso dos softwares.

5.3.2 Participante O participante desse estudo foi o músico Rafael Vanazzi (Figura 5-03), 29 anos, graduado em composição pela Universidade Estadual de Campinas. Foi escolhido devido ao amplo envolvimento com a musicografia, tendo escrito diversos artigos e ministrado cursos sobre o tema.

Figura 5-03: Rafael


5.3.3 Material A pesquisa foi realizada pela internet, e teve como material apenas o questionário em formato .doc enviado por e-mail para o participante. O questionário apresentou as seguintes questões: A) Participante • Nome: • Idade: • Formação acadêmica:

B) Musicografia Braille – Transcrição • Como é o processo de transcrição de uma peça, do momento em que você a recebe até a partitura final em Braille? •Que software é utilizado na transcrição? •O que pode ser feito pelo software e o que depende do transcritor? Quais são as suas tomadas de decisão? •Na musicografia Braille, algumas situações podem ser grafadas de diferentes maneiras. Nesses casos, qual o critério usado para decidir? •Quanto tempo leva, em média, uma transcrição? É possível medir o tempo por página? O tempo está relacionado ao tamanho ou à complexidade da peça? •Quais são as facilidades e dificuldades no processo de transcrição? •Na sua opinião, quais são as facilidades e dificuldades na leitura da musicografia Braille? •Você tem alguma sugestão para melhoria do sistema de escrita musical em Braille? •Gostaria de acrescentar algum comentário?

5.3.4 Procedimento O questionário foi enviado por e-mail para ser respondido individualmente pelo participante no prazo de uma semana. Ele preencheu o documento e respondeu no mesmo dia. 5.3.5 Resultados Sobre o processo de transcrição, Rafael afirmou que primeiro decide que formato usar e verifica se precisará consultar alguma regra no Manual Internacional de Musicografia Braille. No decorrer da transcrição, algumas vezes é preciso alterar as decisões iniciais, pois nem tudo pode ser previsto com antecedência. Depois de transcrever é preciso revisar, o que algumas vezes despende mais tempo. Rafael utiliza na transcrição o Braille Fácil, um software destinado à escrita textual. Sendo assim, toda a transcrição é feito de modo “manual”, e o software é usado apenas para registrar as células


Braille. Segundo o músico, o layout do software não é bom, pois não mostra com clareza as células Braille que ele está escrevendo, o que dificulta a percepção de erros na revisão. Ainda segundo ele, o software MusiBraille, destinado à escrita musical, não é muito bom pois “reconhece apenas as funções básicas da musicografia e qualquer partitura mais mediana, ou de alguns instrumento como o piano, violão, são impossíveis de serem escritas”. Nas situações ambíguas, em que há mais de uma maneira correta de grafia, o músico opta por se manter o mais fiel possível à escrita em tinta, como recomenda o Manual de Musicografia. Quando decide alterar algo, normalmente é porque acredita que a passagem foi mal escrita já na notação em tinta. De acordo com o Rafael, o tempo de transcrição de uma peça depende de sua complexidade. Uma peça escrita para um instrumento melódico, como a flauta, pode ser transcrita em poucos minutos, ao passo que uma escrita para o piano demandará muito mais tempo. Não é possível medir o tempo por página da peça, pois muitas vezes a revisão toma mais tempo que a transcrição em si. O músico afirma que memorizar as células Braille e ter fluência para escrever nesse sistema facilitam o processo de transcrição. A dificuldade citada por ele é o tamanho reduzido das células na tela do computador, obstáculo que o músico não conseguiu transpor ao procurar outros softwares. Quanto à leitura da musicografia Braille, Rafael diz que a facilidade é a organização padrão do registro das informações musicais, característica básica desse sitema. A maior dificuldade citada por ele é a memorização. “De um modo idealizado, eles [os músicos cegos] precisam ter na ‘tela mental’ a partitura desenhada, assim como pessoas com visão normal olham uma partitura ou uma foto.” Quando perguntado se uma escrita com figuras em relevo facilitaria a criação dessa imagem mental, o transcritor responde que tem dúvidas pois, independente do método, a memorização ainda é um fator forte. Portanto, seria mais justo utilizar um método mais de acordo com as particularidades do sistema Braille. Rafael afirma que dificilmente alguém poderia sugerir melhorias para a musicografia Braille. Segundo ele, apenas cegos poderiam fazer isso, e com profundo conhecimento do sistema. Ele cita as alterações efetuadas na musicografia durante a vida de Louis Braille e por mais de cem anos depois, realizadas por diversos congressos internacionais. O transcritor encerra sua participação com o seguinte comentário: Atualmente não há nenhuma pesquisa que aprofunde esse assunto da forma como merece. Devido a falta de bibliografia especializada, os trabalhos gerados atualmente tem dificuldades em se aprofundar com boas fundamentações teóricas, precisando buscar essa fonte em outros campos de estudo, além de coletar dados importantes nas práticas acerca da musicografia Braille.

No quadro 5-03 estão sintetizadas as respostas do tradutor.


Assunto

Questão

Essência da resposta

Processo de transcrição

Como é o processo de transcrição de uma peça, do momento em que você a recebe até a partitura final em Braille?

Primeiro decide que formato usar. No decorrer da transcrição, às vezes é preciso alterar as decisões iniciais. Por último, faz a revisão.

Software

Que software é utilizado na transcrição?

BrailleFácil, um software destinado à escrita textual e cujo layout não é bom, porém é melhor que o software existente para escrita musical o MusiBraille.

Tomadas de decisão

O que pode ser feito pelo software e o que depende do transcritor? Quais são as suas tomadas de decisão?

Toda a tradução é feita “manualmente”, ou seja, todas as tomadas de decisão ficam a cargo do tradutor. O software é utilizado apenas para registro das células.

Situações ambíguas

Na musicografia Braille, algumas situações podem ser grafadas de diferentes maneiras. Nesses casos, qual o critério usado para decidir?

O que se aproxime mais à escrita em tinta, como recomenda o Manual Internacional de Musicografia Braille.

Tempo

Quanto tempo leva, em média, uma transcrição? É possível medir o tempo por página? O tempo está relacionado ao tamanho ou à complexidade da peça?

Depende da complexidade da peça; quanto maior e mais complexa, mais demorada a transcrição. Não é possível medir o tempo por página, já que muitas vezes a revisão é mais demorada que a própria transcrição.

Facilidades e dificuldades

Quais são as facilidades e dificuldades no processo de transcrição?

Ser fluente no sistema Braille facilita o processo. A dificuldade é o uso dos softwares, pouco apropriados.

Quais são as facilidades e dificuldades na leitura?

A facilidade é a padronização do registro da informação musical no sistema Braille. A maior dificuldade é a memorização.

Você tem alguma sugestão para melhoria do sistema de escrita musical em Braille?

Não, e acredita que dificilmente alguém poderia fazer alguma sugestão sem conhecer profundamente o sistema.

Melhoria do sistema

Quadro 5-03: Síntese da consulta ao tradutor de musicografia Braille

Apesar de admitir as dificuldades de memorização da musicografia Braille, Rafael não faz críticas a esse sistema, e mostra-se resistente às sugestões de mudança. Suas principais insatisfações dizem respeito aos softwares de transcrição. Em vista dos resultados das três consultas descritas nesse capítulo, a seguir será realizada uma discussão geral.

5.4 Discussão dos resultados Realizadas as consultas, alguns pontos merecem ser destacados. Primeiramente, verificou-se a grande importância da música na vida dos participantes (embora apenas dois considerem atuar profissionalmente como músicos). Pode-se supor que muitos deficientes visuais se dediquem à música com o mesmo entusiasmo demonstrado pelos participantes desse estudo. Contudo é possível, como cita o pianista Danilo, que grande parte deles sofra um desestímulo a prosseguir no aprendizado musical devido à escassez de professores, escolas inclusivas e à complexidade da musicografia Braille.


Tanto o músico cego consultado, Danilo, quanto o tradutor, Rafael, concordam que a memorização do sistema é a principal dificuldade da musicografia Braille. Também mencionam as particularidades de notação para os diferentes instrumentos: Danilo lamenta precisar aprender quase um novo código para poder executar outros instrumento, e Lucas menciona a diferença de complexidade na transcrição para instrumentos melódicos (como a flauta) e harmônicos (como o piano). Ambos também mencionam a grande quantidade de tempo despendida no uso do sistema, seja para ler e memorizar a partitura, seja para realizar e revisar a transcrição. Rafael cita também a deficiência dos softwares de escrita em Braille, enquanto Danilo sequer faz uso de softwares, registrando todas as peças manualmente, com o auxílio de um reglete. O tradutor faz poucas críticas à musicografia Braille, enquanto Danilo afirma estar apenas moderadamente satisfeito, pois o sistema pode ser muito confuso mesmo para quem o domina. Ambos, no entanto, acreditam que o uso do alfabeto Braille seja um fator positivo, por facilitar a memorização. Danilo sugere que seja criado um sinal para “diminuir essa confusão”, enquanto Rafael mostra-se mais cético quanto a melhorias no sistema. No quadro 5-04, pode-se ver uma comparação dos três estudos.

Questão

Estudo 1

Importância da música

A música foi considerada importante na vida dos deficientes visuais.

-

Estímulo para o aprendizado

A escassez de professores podem ser um desestímulo para o aprendizado do código.

-

Memorização

-

A musicografia Braille é difícil de memorizar.

A musicografia Braille é difícil de memorizar.

Diferenças de notação

-

É preciso aprender as diferenças de notação para cada instrumento.

É mais fácil transcrever peças para alguns instrumentos (como flauta) que outros (como piano).

Tempo

-

Danilo precisa de muito tempo para memorizar as peças antes de executar.

Rafael precisa de muito tempo para realizar a transcrição das peças.

Materiais

-

Danilo utiliza apenas um reglete para registrar as peças manualmente.

Rafael utiliza o software BrailleFácil, que não considera satisfatório.

Satisfação

Spencer não está satisfeito com o código.

Danilo está moderadamente satisfeito.

Rafael está satisfeito.

Uso do alfabeto Braille

-

Positivo

Positivo

Sugestões

-

Diminuir a confusão, pois muitos sinaisiguais são usados com funções diferentes

Dificilmente alguém poderia fazer alguma sugestão sem conhecer a fundo o sistema

Importância da música

Quadro 5-04: Síntese da discussão geral dos resultados

Estudo 2

Músico cego

Estudo 3 Tradutor


A partir desses resultados, podem-se levantar algumas questões: • A melhoria da musicografia Braille poderia aumentar o estímulo dos deficientes visuais a estudar música? • A melhoria da musicografia Braille poderia aumentar a facilidade de memorização? • É possível padronizar a musicografia Braille para que possa ser usada igualmente para todos os instrumentos? • A melhoria da musicografia Braille poderia diminuir o tempo necessário para memorizar e/ou transcrever peças? • A melhoria da musicografia Braille poderia aumentar a satisfação dos usuários com o sistema? • O alfabeto Braille é o melhor sistema de codificação para representar informação musical? • É possível aprimorar a musicografia sem abrir mão do alfabeto Braille? • A melhoria ou reformulação da musicografia Braille encontraria boa aceitação entre os usuários? A resposta definitiva a essas questões ultrapassa o alcance desse trabalho, no entanto elas serão abordadas a seguir.

5.5 Conclusões do estudo com usuários Constatada a importância atribuída à música pelos deficientes visuais participantes dessa pesquisa, é preciso que esse aprendizado deve ser incentivado e facilitado o máximo possível. É sensato supor que um possível aprimoramento da musicografia Braille propicie a capacitação de um número maior de professores, difundindo o ensino e aumentando o estímulo ao estudo. Esse aprimoramento deve ser realizado de forma a favorecer a memorização, que é um estágio fundamental do aprendizado dos deficientes visuais. Pode-se induzir que um código mais simples e de memorização mais fácil gere maior satisfação nos usuários. A princípio, o alfabeto Braille não parece o melhor sistema de codificação para esses propósitos, pois seus recursos limitados não oferecem o dinamismo necessário para representar o discurso musical. No entanto, esse estudo detectou uma tendência a resistência por parte dos usuários à mudança do sistema. Essa resistência talvez se deva ao fato de que o deficiente visual não se sente seguro em face ao desconhecido, e se vale muito da memória para reconhecer padrões. Assim, é preciso explorar ao máximo o sistema Braille para atender as necessidades da notação musical ou desenvolver um novo sistema que tão vantajoso que seja capaz de romper essa resistência inicial.


5.6 Sumarização Nesse capítulo, foram realizados restes com os usuários do sistema musicografia Braille, sendo três músicos cegos e um tradutor vidente. Foi consultado também um músico vidente a fins de comparação. No primeiro estudo, realizado entre os três músicos cegos e o músico vidente, foi verificada a grande importância da música nas vidas dos deficientes visuais, tanto na execução de instrumentos quanto na expressão por meio de composição. O segundo estudo, realizado com o pianista cego Danilo, demonstrou como se dá o processo de leitura e memorização de uma peça, as facilidades e dificuldades da musicografia Braille e o nível de satisfação do músico. O terceiro estudo foi realizado com o tradutor e descreveu o processo de transcrição de uma peça, as facilidades e dificuldades e o uso de softwares. O próximo capítulo traz a discussão geral do trabalho, comparando os resultados da análise gráfica com as consultas com usuários, e propõe requisitos gráficos para o sistema.





capítulo 6

discussão geral e requisitos gráficos para o sistema

Este capítulo apresenta a discussão geral do trabalho, que confronta os resultados do estudo analítico e do estudo com usuários da musicografia Braille, verificando em que se assemelham e em que diferem. A partir dessa discussão serão propostos requisitos gráficos para o sistema.

6.1 Estudo analítico e consulta com usuários No estudo analítico, foi feito um levantamento sintático dos elementos gráficos das notações musicais em tinta e em Braille. Ao se comparar os resultados, concluiu-se que a musicografia Braille apresenta alguns aspectos negativos: (a) Pequeno número de objetos elementares – Enquanto a notação musical em tinta apresenta um número considerável de objetos elementares (Figura 6-01), cuja diversidade gráfica contribui para o reconhecimento fácil de suas funções, a musicografia possui apenas o ponto (Figura 6-02).

Figura 6-01: Objetos elementares da notação musical em tinta

Figura 6-02: Objeto elementar da musicografia Braille

(b) Grande número de objetos compostos – O único objeto elementar da musicografia Braille, no entanto, forma um número elevado de objetos compostos, que devem ser memorizados para domínio do sistema (Figura 6-03).


Figura 6-03: Objetos compostos da musicografia Braille

(c) Homogeneidade de atributos – Ao contrário da notação em tinta, em que se observam variações de forma, tamanho, posição e orientação, na musicografia o único atributo que não se mantém fixo é a posição espacial. (d) Poucas relações objeto-objeto – A musicografia Braille explora pouco as relações entre objetos, dificultando a percepção holística das peças. (e) Utilização de componentes verbais para representar uma linguagem esquemática – O alfabeto Braille é muito limitado para representar com exatidão o dinamismo do discurso musical. (f) Linearidade – Talvez a maior limitação da musicografia seja a linearidade imposta pelo sistema Braille, ou seja, a escrita horizontal de um sinal após o outro, que dificulta a compreensão de notas ou linhas melódicas simultâneas (Figura 6-04).

Figura 6-04: Linearidade, dificuldade de representar notas simultâneas

A partir desses aspectos gráficos, inferiu-se que o usuário teria dificuldades para memorizar o código, bem como ter uma percepção holística e clara da peça e das relações entre seus elementos. Concluiu-se também que o uso do alfabeto Braille para a escrita musical poderia ser um fator negativo, uma vez que contraria o princípio de design da informação em que o mesmo recurso não pode ser usado para desempenhar diferentes funções sintáticas. Todavia, no estudo com os usuários, a primeira surpresa foi constatar que tanto o músico cego, Danilo, quando o tradutor, Rafael, consideram positivo o uso do alfabeto Braille. Segundo eles, o uso de um sistema com o qual já se está familiarizado facilita a memorização. Essa resistência pode vir da insegurança que os deficientes visuais parecem sentir frente ao desconhecido, e que é perfeitamente compreensível, uma vez que eles dependem da memória como os videntes dependem dos olhos. Qualquer proposição de novo sistema, portanto, deverá oferecer grandes vantagens a ponto de romper essa resistência inicial. Ambos os usuários consultados rejeitaram a sugestão de uma escrita alternativa que utilizasse figuras em relevo. Segundo Rafael, as figuras em relevo dificultariam a formação da “tela mental” de que o músico necessita para compreender e memorizar uma peça.


Danilo, no entanto, afirmou que a memorização do sistema é difícil e exige dedicação e estudo constantes – o que confirma a questão levantada pela análise gráfica. Também citou um problema que não havia sido detectado pelo estudo analítico: a musicografia possui sinais específicos para a notação de cada instrumento. Assim, se o pianista quisesse aprender a tocar violão, precisaria aprender praticamente um novo código. A análise gráfica havia apurado o problema da linearidade na musicografia Braille; ou seja, a necessidade de escrever uma nota após a outra, horizontalmente, sem o eixo Y que existe na notação em tinta. No estudo com usuários, constatou-se que a linearidade gera partituras mais extensas. As notas escritas de maneira linear ocupam mais espaço que o seu correspondente em tinta, no pentagrama. Danilo afirma que muitas vezes o tamanho da partitura assusta, mas a música não é tão comprida ou complexa quanto parece. A linearidade dificulta também a percepção holística da peça – Danilo relatou que, quando precisa consultar uma passagem na partitura, muitas vezes demora a encontrá-la, problema que só é resolvido quando ele se familiariza com aquela peça em específico. Em suma, a maior parte das limitações verificadas na análise gráfica demonstraram-se problemas no uso do sistema – exceção feita à utilização do alfabeto Braille, pois os usuários a consideram positiva. No quadro 6-01 abaixo, é possível ver um resumo da comparação entre os dois estudos.

Questão

análise gráfica

estudo com usuários

Número de objetos gráficos

Pequeno número de objetos elementares (apenas o ponto) e grande número de objetos compostos.

Dificuldade de memorização, necessidade de dedicação constante para não esquecer o código.

Linearidade

Os sinais são escritos um após o outro, horizontalmente.

As partituras são mais extensas que as escritas em tinta; é mais difícil localizar uma parte específica na partitura.

Situações ambíguas

Verificada a existência de sinais Código considerado confuso pelo que assumem diferentes significa- usuário. dos de acordo com o contexto.

Uso do alfabeto Braille

Considerado negativo na análise gráfica.

Considerado positivo no estudo com usuários.

Quadro 6-01: Análise gráfica e estudo com usuários

6.2 Requisitos gráficos De acordo com os fatores explanados acima, alguns requisitos gráficos podem ser propostos para uma possível melhoria do sistema da musicografia Braille. Em primeiro lugar, a princípio não deve ser interrompido o uso do alfabeto Braille, que conta com grande aceitação dos deficientes visuais. Deve-se tentar, portanto, adequar o alfabeto Braille aos princípios de funcionalidade do design da informação. Seguindo as diretrizes de Petterson (2007), deve-se: 6.2.1 Definir o problema O primeiro passo de qualquer processo de design é conhecer todos os fatores envolvidos: o emissor, o receptor pretendido, a mensagem e o meio. Nesse caso, o objetivo é transmitir uma infor-


mação musical a um deficiente visual por meio tátil. Esse trabalho já deu início à definição do problema, descrevendo os usuários do sistema, o teor das mensagens e o contexto de uso. É necessário, no entanto, que sejam feitos estudos mais aprofundados com uma amostragem maior e análise de tarefa para que se possam determinar com exatidão as características das pessoas a quem a mensagem se destina, em que contexto elas estão inseridas e como essa mensagem chegará a elas. Quanto ao conteúdo da mensagem (a peça musical), ela deve informar: • Dados da peça (título, autor, data); • O(s) instrumento(s) a que a peça se destina; • Andamento; • Tonalidade; • As linhas melódicas de todos os instrumentos, e como elas se relacionam; • Elementos de dinâmica e interpretação; • Ornamentos. A escrita musical deve representar essas informações de forma que sejam facilmente compreensíveis apenas com o conhecimento prévio do instrumentista, sem que sejam necessárias explicações adicionais. 6.2.2 Proporcionar estrutura É função do design explicitar com clareza a estrutura da mensagem, de modo a facilitar a percepção, interpretação, compreensão, aprendizado e memorização do conteúdo informacional. Assim, o posicionamento dos símbolos na notação musical deve desvelar a estrutura da peça. É preciso repensar a linearidade da escrita, pois essa não favorece a compreensão do discurso musical; e reorganizar as relações gráficas entre os objetos de forma a melhor representar as relações entre os sons. Devem-se buscar alguns fatores: • Hierarquia: Para desenvolver uma estrutura consistente é preciso hierarquizar a informação, ou seja, dividi-la em diversos níveis de importância. A hierarquia pode ser representada na notação por diversos recursos, como tamanho ou posição relativa. • Agrupamento: O agrupamento deve estabelecer grupos de informação, unindo elementos de natureza semelhante, de modo que a peça possa ser facilmente compreendida como um todo. • Alinhamento: Na musicografia Braille o alinhamento aparece apenas na sequência dos sinais, dispostos lado a lado em linhas horizontais. Na notação em tinta, ao contrátio, é possível observar alinhamentos horizontais que indicam as alturas das notas, e alinhamentos verticais que indicam a posição no tempo (notas que soam juntas sempre estarão alinhadas verticalmente). É preciso buscar um uso mais expressivo do alinhamento na notação tátil para facilitar a compreensão da peça. 6.2.3 Proporcionar clareza Clareza diz respeito à legibilidade de uma mensagem gráfica. No sistema Braille, pode-se citar o tamanho dos pontos, distância das entrelinhas, espaçamento das margens, a espessura e textura do papel, entre outros. No que diz respeito ao sistema Braille, não é preciso estabelecer requisitos de clareza pois o próprio sistema já possui regras que devem ser seguidas.


6.3.4 Proporcionar simplicidade Simplicidade diz respeito à leiturabilidade de uma mensagem gráfica, ou seja, à adequação do conteúdo da mensagem aos destinatários. É importante proporcionar simplicidade para aumentar a eficiência da percepção, processamento e memorização da mensagem. A simplicidade na musicografia Braille só será atingida através do trabalho do designer com envolvimento dos usuários do sistema – para isso é fundamental que se cumpra o primeiro requisito (definir o problema), e se mantenha o envolvimento do usuário durante todo o processo de design. Simplicidade também diz respeito à quantidade de sinais de uma notação. Foi visto que a musicografia Braille apresenta uma grande quantidade de sinais, e que isso exige um grande poder de memorização do usuário. É preciso, pois, simplificar o código diminuindo o número de componentes. 6.3.5 Proporcionar ênfase O princípio da ênfase está relacionado à hierarquia, e prega que se deve dar destaque às informações mais importantes da mensagem para atrair, direcionar e manter a atenção do receptor. O sistema Braille não apresenta muita possibilidade de ênfase, pois não permite variações de tamanho, peso ou, evidentemente, cor. É preciso, portanto, proporcionar ênfase de alguma outra maneira, para orientar a leitura da peça de forma clara e intuitiva. 6.3.6 Proporcionar unidade As mensagens devem ter unidade e coerência global para não confundir os receptores. Seguidas as recomendações acima, a peça resultante terá unidade proporcionada, inclusive, pelo sistema Braille, que é bastante consistente.

6.3 Sumarização Nesse capítulo, foram confrontados os resultados dos estudos analítico e experimental. Muitas das inferências feitas no estudo analítico mostraram-se corretas no estudo experimental, como a dificuldade de memorização do código e a dificuldade de representar o discurso musical em uma estrutura linear. A principal divergência foi a suposição de que o sistema Braille não seria adequado para a escrita de música, contestada tanto pelo pianista Danilo quanto pelo tradutor Rafael. Foram também propostos requisitos gráficos para a melhoria do sistema, seguindo as diretrizes de Petterson, em que se deve: (a) definir o problema; (b) proporcionar estrutura; (c) proporcionar clareza; (d) proporcionar simplicidade; (e) proporcionar ênfase; e (f) proporcionar unidade. No próximo capítulo, serão feitas as considerações finais em relação a esse trabalho.





capítulo 7

Considerações finais

Este capítulo traz considerações de ordem metodológica a respeito desse trabalho, além de comentar suas limitações e desdobramentos. O objetivo geral do presente trabalho foi compreender a musicografia Braille como código gráfico na perspectiva linguagem gráfica tátil, e se desdobrava nos seguintes objetivos específicos: 1. Identificar os componentes e as relações gráficas da musicografia Braille em comparação à notação em tinta; 2. Determinar diferenças e semelhanças de codificação entre a notação musical em tinta e a musicografia Braille; 3. Identificar dificuldades encontradas pelos usuários (cegos e tradutores) do sistema de musicografia Braille; 4. Propor requisitos gráficos para possível melhoria da musicografia Braille a partir das necessidades dos usuários. Para atingir esses objetivos, foram respondidas as seguintes questões: (a) Quais as características e relações gráficas da notação musical em tinta e da musicografia Braille? Nos capítulos 2 e 3, componentes da fundamentação teórica, as notações musicais em tinta e em Braille foram descritas em seus aspectos musicais. Já no capítulo 4, de análise gráfica, cada uma dessas notações foi analisada segundo o modelo de Engelhardt (2002). Utilizando-se dois excertos de peças musicais (Sonata V em Ré Maior, de Francesco Mancini, e Carinhoso, de Pixinguinha) como amostra representativa do sistema, foi feito um levantamento sintático dos objetos e relações gráficas. Os objetos elementares foram classificados de acordo com seus atributos (forma, tamanho, posição espacial, orientação e cor), funções semânticas (informacional, referencial e decorativa) e sintáticas (nó, rótulo, separador, conector, localizador e linha de grid). As relações gráficas entre objetos foram classificadas em agrupamento, separação, alinhamento, conexão e contenção. (b) Quais as limitações representacionais da musicografia Braille? Ainda no capítulo 4, após a análise gráfica foi realizada uma análise qualitativa da musicografia Braille de acordo com os princípios do Design da Informação, em que foram detectados as seguintes limitações representacionais: pequeno número de objetos elementares;


grande número de objetos compostos; homogeneidade de atributos visuais; poucas relações objeto-objeto; utilização de componentes verbais para representar uma linguagem esquemática; e linearidade. (c) Que dificuldades são encontradas pelos músicos cegos ao utilizar a musicografia Braille? No capítulo 5, foram realizados estudos com usuários do sistema de musicografia Braille. O pianista Danilo, que estuda música há 4 anos, foi consultado e relatou suas dificuldades. Segundo ele, a musicografia Braille não é fácil e pode ser confusa mesmo para quem já a domina. Também citou a dificuldade de memorização, disse que precisa ler uma partitura muitas vezes antes de executá-la, e que é necessário dedicação constante para não esquecer o código. Mencionou também a existência de sinais que podem assumir diferentes significados de acordo com o contexto, o que prejudica a compreensão. (d) Que dificuldades são encontradas na transcrição da notação em tinta para a musicografia Braille? Ainda no capítulo 5, foi feito um questionário com Rafael Vanazzi, um tradutor de musicografia Braille. Suas principais queixas são referentes aos softwares disponíveis no Brasil. Não fez críticas à musicografia Braille, e considera que dificilmente alguém poderia efetuar melhorias ao sistema. Assim, ficam respondidas as questões propostas no início do trabalho. A seguir são descritas as dificuldades encontradas no decorrer da pesquisa.

7.1 Dificuldades e limitações da pesquisa A principal dificuldade na realização desse trabalho foi a escassez de informações sobre o tema. Embora existam diversos artigos, teses e livros sobre a musicografia Braille, até a data de conclusão dessa pesquisa não foi encontrado um estudo que relacionasse a notação musical tátil ao design. Também se demonstrou muito difícil encontrar escolas ou professores de musicografia Braille, músicos fluentes no sistema ou mesmo partituras em Braille para análise. Pretendia-se aplicar um teste de realização de tarefa com o músico Danilo, o que infelizmente não foi possível devido à dificuldade de obter as referidas partituras. Outros fatores limitantes foram o tempo curto para a realização do trabalho, e as barreiras geográficas (uma vez que não foi encontrado nenhum músico que conhecesse a musicografia Braille em Curitiba).

7.2 Desdobramentos Pode-se dizer que esse trabalho de conclusão de curso deu início a uma pesquisa promissora que, contudo, não está concluída. Estabeleceram-se os alicerces para futuras investigações, mais profundas e meticulosas. Com base no levantamento sintático dos sistemas notacionais, pode-se agora realizar uma análise gráfica mais detalhada, verificando o uso dos elementos em diferentes partituras. Pode-se também desenvolver estudos experimentais com um grupo representativo de usuários do sistema. Pretende-se, por fim, oferecer soluções de design que aprimorem a notação musical tátil, de acordo com os requisitos gráficos propostos aqui.


É necessário atentar, contudo, à resistência verificada nesse estudo. Qualquer alteração realizada no sistema, por benéfica que seja, pode não ser bem aceita pelos usuários. Para evitar isso, é preciso que haja envolvimento dos usuários durante todo o processo de design, e que o resultado seja tão vantajoso que rompa a resistência inicial. Esse trabalho foi desafiador por abordar um tema pouco ou nada estudado pelo campo do design, com pouca literatura para servir de base; mas foi também muito recompensador por sua grande relevância social. Espera-se prosseguir a pesquisa para atingir resultados concretos para o sistema notacional. Em futuras pesquisas, pretende-se responder à seguinte pergunta: Como o design pode aprimorar a escrita musical tátil, favorecendo o aprendizado e a memorização por parte de deficientes visuais?



Referências

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LOPES, Maria Olinda. Proposta de bula de medicamentos em braille direcionada ao usuário cego. Curitiba, 2009. MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia científica 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004. MARINA, Neida. Biografia de Louis Braille. Disponível em: http://nossosaopaulo.com.br / Data de acesso: 05/05/2011 MASINI, Elcie F. Salzano. O perceber e o relacionar-se do deficiente visual: orientando professores especializados. Brasília: CORDE, 1994. NEIVA, Miguel. ColorAdd: color identification system. Disponível em: http://coloradd.net / Data de acesso: 11/10/2011 OLIVEIRA, Tiago. Análise das notações usadas na representação de mecanismos de reações químicas orgânicas sob o prisma do Design da Informação [artigo]. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2011. PECE, Carlo A. Z. ; PADOVANI, Stephania ; ALMEIDA, Sérgio F. M. Critério para avaliação de notações de engenharia fundamentados em princípios do design da informação: estudo preliminar. Infodesign (SBDI), Brasil, v. 2, n. 1, p. 9-16, 2005 PECE, C. A. Z. ; Spinillo, C. G. ; PADOVANI, S. . Proposta de Método para Avaliação dos Aspectos Gráficos-Informacionais de Notações de Engenharia. Ação Ergonômica, v. 5, p. 59-65, 2010 PETTERSSON, Rune. It Depends: ID – Principles and Guidelines. Institute for Infology, 2007 READ, Gardner. Music notation: a manual of modern practice. New York: Taplinger Publishing Company, 1979. SEGD - Society for Environmental Graphic Design. Guidelines, Best Practices and Innovation for the Blind and Visually Impaired. Disponível em: http://www.segd.org / Data de acesso: 03/07/2011 SENA, Sabrynne Sampaio de. A musicografia Braille na formação do músico cego [artigo]. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2007 SOUZA, Rafael M. V de. Diferenças na notação musical em tinta e em Braille: suas implicações na sala de aula. In: XIII ENCONTRO REGIONAL DA ABEM - SUL, 2010, Porto Alegre TOMÉ, Dolores. Introdução à musicografia Braille. São Paulo: Global, 2003. TWYMAN, Michael. A schema for the study of graphic language, in Kolers, P.A., Wrolstad, M.E. e Bouma, H. (ed.), Processing of visible language, 1979, New York. pp. 117-150 UNIÃO MUNDIAL DOS CEGOS, Subcomitê de Musicografia Braille. Novo manual internacional de musicografia Braille / coordenação geral Maria Glória Batista da Mota - Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2004.




Apêndice 1 Consulta sobre a importância da música 1. Danilo, 16 - Cego Qual a importância da música para você? A música pra mim... eu esqueço tudo, todos os tipos de problema. Quando eu sento no piano eu esqueço todas as coisas ruins. Você pensa em praticar música como profissão? Sim, quero tocar em orquestra. Você tem interesse em compor músicas? Sim, inclusive já tenho vários projetos, só falta escrever. Por isso é importante a musicografia Braille, quando a gente tem uma ideia e não escreve acaba esquecendo. E você acha que a dificuldade em encontrar professores de musicografia Braille pode diminuir o interesse dos cegos que queiram aprender música? Com certeza, eu só conheço o Leandro [professor da Escola de Música Inclusiva Santa Cecília] aqui que ensina, se não fosse ele eu também não teria aprendido.

2. Lucas, 20 - Cego Que curso você faz? Bacharelado em Ciências da Computação na UFPR Que instrumento toca? Guitarra e comecei violino há 7 meses. Qual a importância da música na sua vida? Para mim a música é uma maneira de enriquecer minhas experiências, memórias e momentos de lazer. Pensa em trabalhar com música profissionalmente? Profissionalmente, não, mas gostaria muito de ter uma banda. Conhece algum lugar ou alguém que ensine musicografia Braille? Não. Tem interesse em aprender musicografia Braille? Bastante.


Spencer, 22 - Cego Que curso você faz? Direito. Que instrumento toca? Há quanto tempo? Fiz violino, de 2000 a 2007 e em 2004 iniciei também meus estudos no Violoncelo. Deixei a música por conta da faculdade. Qual a importância da música na sua vida? Penso que a música, em especial a erudita, é algo complexo de mais para ser posto em palavras. me emociono, relaxo, todos os meus sentimentos vem à tona. é simplesmente algo maravilhoso. música é a minha vida. Pensa em trabalhar com música profissionalmente? Não. por mais que tocar e ouvir música sejam as duas coisas de que realmente gosto, aqui no Brasil não há muitas formas de se obter ganho com a música erudita. Eu poderia tentar uma bolça de estudos nos EUA ou na europa, onde a música clássica é muito valorizada e há mercado, mas optei por seguir outra carreira, garantindo um pouco mais minhas independência e segurança financeira no futuro, mas pretendo retomar os estudos na música, tão logo esteja com a vida estabilizada. Tem interesse em compor? Composições fazem parte dos quesitos para quem quer se tornar um grande músico e hoje em dia, são raros os que conseguem produzir algo surpreendente e bonito. Se daqui a alguns anos voltar aos estudos musicais, quem sabe... Conhece a musicografia Braille? Caso não conheça, tem interesse em aprender? Embora eu realmente prefira utilizar meus ouvidos para decorar uma música ou fazer arranjos e improvisos, estudei musicografia braille e, para todo músico que se preze, é importante conhecer támbém a teoria Caio, 23 – Não cego Há quanto tempo você estuda música? Que instrumento? Estudo música há 14 anos, tenho 23. Comecei com violão, depois fui tendo noções de outros instrumentos como baixo, gaita, piano e flauta. Qual a importância da música na sua vida? É uma das coisas que tornam a vida um pouco mais tolerável. Gosta de/tem interesse em compor? Sempre compus, mesmo quando ainda não sabia tocar direito, cheguei ao ponto que me considero mais compositor do que instrumentista. Conhece a musicografia Braille? Na sua opinião, qual a maior dificuldade enfrentada por um cego que queira estudar música? Só ouvi falar, mas nunca vi como funciona de fato, embora imagine como seja. Imagino que grande quantidade de livros considerados importantes para o aprendizado musical não existam em braille, ou mesmo no formato audiobook.


Apêndice 2 Consulta com tradutor de musicografia Braille Nome: Rafael Moreira Vanazzi de Souza • Idade: 29 • Formação acadêmica: Graduado em música - composição Como é o processo de transcrição de uma peça, do momento em que você a recebe até a partitura final em Braille? Primeiro escolho qual formato irei usar, se há alguma regra que precisarei conferir no Manual de Musicografia, como irei escrever certas passagens. Quando a transcrição está sendo feita, as vezes algumas mudanças das decisões iniciais são necessárias, pois nem tudo é possível ser previsto antes, de qualquer forma, é nesse momento que as questões mais decisões mais sutis aparecem. Depois de transcrever é preciso revisar, o que leva as vezes mais tempo que transcrever. Que software é utilizado na transcrição? Utilizo o BrailleFácil. O que pode ser feito pelo software e o que depende do transcritor? Quais são as suas tomadas de decisão? O BrailleFácil é um programa basicamente de texto. Há o MusiBraille, mas ele não é bom para transcrever. Ele não reconhece apenas as funções básicas da musicografia e qualquer partitura mais mediana, ou de alguns instrumento como o piano, violão, são impossíveis de serem escritas. Desse modo, toda a transcrição é feita “manualmente”, sem auxílio de softwares. O layout desse programa que não é bom, pois na revisão preciso ver as celas braille que estou digitando, não seu correspondente em tinta. Para isso, ele mostra em uma barra pequena na parte inferior da tela, o que dificulta a correção, as vezes deixando passar pequenos erros de digitação. Na musicografia Braille, algumas situações podem ser grafadas de diferentes maneiras. Nesses casos, qual o critério usado para decidir? O critério que uso é o mais próximo possível da partitura em tinta, como pede o Manul de musicografia. Há casos em que é possível omitir alguma informação ou alterar a forma como foi escrita. As vezes tomo uma decisão de mudar algo, o que nesses casos, considero que na partitura em tinta tal passagem musical também foi mal escrita. Quanto tempo leva, em média, uma transcrição? É possível medir o tempo por página? O tempo está relacionado ao tamanho ou à complexidade da peça? Uma partitura de instrumento melódico pode levar apenas alguns minutos, mas e de piano pode levar muito mais por exemplo. Não é possível medir o tempo por página, pois a revisão pode ser as vezes mais demorada que a própria transcrição. Certamente que o tempo está relacionado à complexidade da partitura, já 20 compassos de flauta demoram muito menos que 20 compassos de uma peça de Chopin.


Quais são as facilidades e dificuldades no processo de transcrição? As facilidades são quando o transcritor tem todas as celas de cor, sem precisar consultar o Manual de Musicografia e ter boa habilidade para digitar em braille. As dificuldades são as celas serem pequenas no monitor do computador, como no BrailleFácil, que é o que uso. Procurei outros programas para resolver isso, mas não foram suficentes. Há um americano, PerkyDucky, no entanto, o formato diferente do BrailleFácil, sendo que esse é um formato que as entidades brasileiras geralmente usam. Na sua opinião, quais são as facilidades e dificuldades na leitura da musicografia Braille? A facilidade é a organização padrão do registro das informações musicais, característica básica desse sitema. As regras para repetição de compassos são notavelmente mais interessante que nas partituras em tinta, no entanto, não servem para serem usadas em tinta devido justamente à dificuldade da Musicografia. Essa dificuldade é a memorização, que deve ser trabalhado em alunos que estudam essa grafia. De um modo idealizado, eles precisam ter na “tela mental” a partitura desenhada, assim se decorar uma poesia ou pessoas com visão normal olham uma partitura ou uma foto. Você tem alguma sugestão para melhoria do sistema de escrita musical em Braille? Dificilmente alguém poderia fazer uma sugestão dessas, principalmente se conhecer a fundo essa grafia. Apenas pessoas cegas poderiam realmente fazer isso, e com grande conhecimento nesse campo. As alterações para sua melhora foi feita durante toda a vida de Louis Braille (que também foi quem criou as bases da musicografia como é hoje) e por diversos congressos internacionas, tendo os primeiros em 1888 e o último em 1996. Gostaria de acrescentar algum comentário? Atualmente não há nenhuma pesquisa que aprofunde esse assunto da forma como merece. Devido a falta de bibliografia especializada, os trabalhos gerados atualmente tem dificuldades em se aprofundar com boas fundamentações teóricas, precisando buscar essa fonte em outros campos de estudo, além de coletar dados importantes nas práticas acerca da Musocgrafia Braille.




Anexo 1 Alfabeto Braille


Anexo 2 Carinhoso (Braille)

.carinhoso -- .choro .can&>o .letra de .jo>o de .barro .m)sica de .pixinguinha >/l < #b4 v!h= >ds +a <7s`c [!h= s`c [y*j! n`c ?y*j! .p`c $&%e& h=&e( eyzd= d))iz i(!h= s`c [(g( q #1v!h=<2 #2v.&=&z<k +b * yzy)!)!( =(!)y)!) [$ v!)yz &zy!(!)y z&z!y)!( ?<: *:$<k < q`c =fzyi= $%\ *w$ :?`c yj!(i) s`c [%hi .}&g& :yey w!j! (!)y<eg !%h! ?yh! q >to >ds >ao >fim >fim ?!h=<k .cifra


.introdu&>o3 .f#g.m .d#i .g#ac .c#i.d</.e< .d<#g.m .gm#g/.c .m)sica3 +a .c#g .f .f#e6 .f#f .f#e6 .f#g.m .f#e6 .f#f .f#g .am .am#e6 .am#f .am#e6 .am .am#e6 .am#f .a#g .dm#g .g#g .c#g .f#g .b< .d/.a .gm/.b< .gm .g .b</.c .c#i.f .b<m#f/.c .f +b .e .am .am/.g .d/.f .e#g .am#g .am#i .am/.c .d#g .g#g .c#g .c%#g .g/.d .c#g .f .dm/.b .e/.g% .gm#g .c#ac .f .b</.c .c#i.f#g.m .d/.f .a#g .dm#g .f/.c .b< .d#g .gm .b<m/.g .f .f%dim .gm .c#g<2<k .letra3 .meu cora&>o1 n>o sei por-


qu<1 bate feliz1 quando te v< e os meus olhos ficam sorrindo e pelas ruas v>o te seguindo mas mesmo assim1 foges de mim444 .ha6 .se tu soubesses como eu sou t>o carinhoso e muito muito que te quero1 e como = sincero o meu amor eu sei que tu n>o fugirias mais de mim1 vem1 vem1 vem1 vem1 vem sentir o calor dos l(bios meus $ procura dos teus vem matar esta paix>o que me devora o cora&>o e s+ assim ent>o serei feliz1 bem feliz4


Anexo 3 Carinhoso (Tinta)


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