Edição Especial
NeoMondo
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um olhar consciente
Ano 2 - Nº 14 - Setembro 2008 - Distribuição Gratuita
Os Desafios da
Amazônia Legal Agenda Criança
Ministro Mangabeira: 26
Conheça o PAS
Boi Bumbá
Prioridade na Amazônia
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O Valor da Cultura Popular
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m e s a c i t รก r P e d l a Espaรงo Re sua empresa em rto para u c is a m o h in m a oc
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Neo Mondo - Julho 2008
: e d a d i l i b a t n Suste
ade id il b a t n e t s u s à o direçã
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para Sustentabilidade em as ic át Pr de al que Re sca de negócios bu Criamos o Espaço em a ad rn jo a s de longo de noss conhecer história de e aprendemos ao qu ém o al , ar te ilh si rt o N pa . m co m s e ambientais presas que també onômicos, sociai em ec s de e do a lta di su are adi m equilibra ade em seu ações do a sustentabilid os on-line, inform an rs lic cu ap r o ra tã nt es co e en qu i pessoas por cios, você va m blog atualizado jeito de fazer negó nu u o se iã in do op an a nt su ve o in estão re ssos icipar colocand objetivos com no s e vai poder part ia os m tíc es no m s, ra os st do le sobre pa e mpartilhan nco, uma sociedad ste movimento. Co ba ne s um do r ja ui ga tr en ns co es líder os capazes de parceiros, serem e s rio ná io nc fu , clientes hor para todos. es. e um planeta mel , pelo Financial Tim stentável do Ano” Su o “O Banco mais Iniciative (GRI). undialmente com Global Reporting lo pe , ” do un M � Reconhecido m biental”. ilidade do ório de Sustentab o de Tecnologia Am categoria “Projet � ”2º Melhor Relat na , ” 08 20 y log no Tech êmio “The Banker � Vencedor do pr
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Seções Perfil 08 O Arcebispo Verde Dom Moacyr minimiza choque cultural, sobrevive a acidentes e avisa: a Amazônia tem futuro; basta entender o povo. MEIO AMBIENTE 13 Museu Vivo da Amazônia Museu encravado na Floresta Amazônia promete ser um Centro de Conhecimento. 16 Legado que transcende Xapuri Chico Mendes - A luta do mais célebre seringueiro.
Economia & Negócios Os conflitos do Desenvolvimento na Amazônia Pesquisa aponta que bioindústrias atuam com bases sustentáveis.
14 SEGURANÇA 18 Biopirataria esbarra na falta de um marco legal Crime causa prejuízos morais e econômicos ao país. EVENTO As Amazônias: Verdade Mitos e Lendas Exposição trouxe a São Paulo os encantos e as curiosidades da mata.
22 ESPECIAL 26 A Estratégia está lançada O Ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger fala sobre os desafios do Plano Amazônia Sustentável.
29 Artigo: A Amazônia e as certificações exigidas no comércio internacional Regras do comércio internacional ditam barreiras não tarifárias.
33 Artigo: Sem Direitos Básicos Sem documentos de identificação, crianças na Amazônia são invisíveis para a sociedade.
34 Povos da Floresta Isolados dos grandes centros, populações tradicionais tentam fazer valer a Constituição.
36 Artigo:Amazonas: Do Mito Greco Romano às Lendas do Novo Mundo. A aventura que batizou a Amazônia. 44 Raio X da Amazônia Conheça os principais indicadores da região.
CULTURAL 38 As cores de Parintins Quando a Amazônia se divide entre o azul e o vermelho.
Expediente Diretor Executivo: Oscar Lopes Luiz Conselho Editorial: Oscar Lopes Luiz, Takashi Yamauchi, Liane Uechi, Livi Carolina e Eduardo Sanches Redação: Liane Uechi (MTB 18.190), Livi Carolina (MTB 49.103-59) e Gabriel Arcanjo Nogueira (MTB 16.586) Revisão: Instituto Neo Mondo Diretora de Redação: Liane Uechi (MTB 18.190) Diretora de Arte: Renata Ariane Rosa Projeto Gráfico: Instituto Neo Mondo
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10 De Olho nos Sojicultores Com a prorrogação da Moratória da Soja produtores ajudam a controlar o desmate e a manter as exportações.
21 Guarda-costas da Amazônia Quem são os responsáveis pela segurança da Floresta? 23 Artigo: A Amazônia e o Japão Ainda há muito a conhecer sobre a Amazônia. 24 Registrar para Preservar Alguns Animais que compõem a fauna amazônica sob o olhar de PaulaLyn. SOCIAL A Criança na Agenda Amazônica Um esforço para incluir a criança na pauta de prioridades.
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ESPORTE 42 Surfe na Selva A pororoca é a responsável pela nova modalidade do surfe e tem atraído turistas de todo o mundo para a região.
Publicação Correspondência: Instituto Neo Mondo Rua Caminho do Pilar, 1012 - sl. 22 Santo André – SP Cep: 09190-000 Para falar com a Neo Mondo: assinatura@neomondo.org.br redacao@neomondo.org.br trabalheconosco@neomondo.org.br classificadosolidario@neomondo.org.br Para anunciar: comercial@neomondo.org.br Tel. (11) 4994-1690 Presidente do Instituto Neo Mondo: oscar@neomondo.org.br
A Revista Neo Mondo é uma publicação do Instituto Neo Mondo, CNPJ 08.806.545/0001-00, reconhecido como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), pelo Ministério da Justiça – processo MJ nº 08071.018087/2007-24. Tiragem mensal de 20 mil exemplares com distribuição nacional gratuita e assinaturas. Os artigos e informes publicitários não representam necessariamente a posição da revista e são de total responsabilidade de seus autores. Proibido reproduzir o conteúdo desta revista sem prévia autorização.
O Animal da Floresta* De madeira lilás ( ninguém me crê ) se fez meu coração. Espécie escassa de cedro, pela cor e porque abriga em seu âmago a morte que o ameaça. Madeira dói?, pergunta quem me vê os braços verdes, os olhos cheios de asas. Por mim responde a luz do amanhecer que recobre de escamas esmaltadas as águas densas que me deram raça e cantam nas raízes do meu ser. No crepúsculo estou da ribanceira entre as estrelas e o chão que me abençoa as nervuras. Já não faz mal que doa meu bravo coração de água e madeira. Thiago de Mello
O poeta Thiago de Mello é um pilar da poesia social brasileira. Nasceu na cidade de Barreirinha, no coração do Amazonas, no dia 30 de março de 1926. É conhecido internacionalmente por sua luta em prol dos direitos humanos, pela ecologia e pela paz mundial. Suas obras foram traduzidas para mais de trinta idiomas. Dentre elas estão: Silêncio e Palavra, 1951 , Faz Escuro, mas eu Canto, 1965; Os Estatutos do Homem, 1977 (com desenhos de Aldemir Martins); Mormaço na Floresta, 1984; Vento Geral – Poesia 1951-1981, 1981; Num Campo de Margaridas, 1986; De uma Vez por Todas, 1996. * Publicação do poema autorizada e sugerida pelo próprio autor.
Editorial
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o prepararmos essa edição especial da Revista Neo Mondo, aprendemos bastante sobre uma região, muito discutida, mas pouco conhecida de fato, a Amazônia. O desmatamento acentuado chamou a atenção do mundo, que voltou seu olhar para esse manto verde. Mas sob ele, estão 25 milhões de pessoas que vivem a discrepância entre a riqueza de biodiversidade e a pobreza social. Prova disso, é que divide com a região Nordeste, os piores indicadores sociais nacionais, que apontam que os direitos fundamentais à vida, ali ainda estão longe de ser alcançados. Entramos na floresta pelo caminho mais legítimo, o do coração de sua gente, daqueles que conhecem suas alegrias e tristezas, daqueles que defendem que a floresta em pé vale mais do que grama. Ouvimos representantes das comunidades tradicionais (indígenas e quilombolas) e locais, autoridades, especialistas, pesquisadores, empresários, famosos e anônimos, que nos relataram os planos, sonhos e desafios a serem vencidos. Num lugar de tantas contradições, a grandiosidade está presente no esforço constante de mostrar seu valor, como pode ser observado em projetos como o Museu Vivo da Amazônia, ou ainda a Festa de Parintins, quando o município encanta o mundo, com uma pequena mostra da riqueza de sua cultura e tradição popular. O leitor poderá conhecer através de obras indígenas e de comunidades tradicionais um pouco do talento desse povo. Talento este, também presente na abertura da revista, na participação de um dos maiores nomes da poesia nacional, o amazonense Thiago de Mello, que nos brindou com a sugestão
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de um poema de sua autoria, para representar a região. Longe dos grandes centros urbanos dos estados que compõem a Amazônia, conhecemos as dificuldades causadas pelo isolamento de comunidades, que ficam sujeitas a condições inseguras de locomoção, de alimentação, de saúde, de educação, de informação e também pela falta de regularização documental, da certidão de nascimento ao registro das terras. Essa carência por direitos tão básicos, mas essenciais à cidadania e ao sistema de oportunidades reais, colocam esses brasileiros à margem do desenvolvimento e pior ainda, alimentam a ilegalidade, a violência, a impunidade. Conhecer a Amazônia é compreender o verdadeiro significado da palavra diversidade. É perceber que, para alcançar o sonho do máximo desenvolvimento com a floresta em pé, será necessário um profundo conhecimento da região. A Amazônia não é um bloco geográfico com uma única característica e não poderá ter um modelo único de desenvolvimento. Cada célula amazônica possui aptidões, riquezas naturais, culturas, etnias e necessidades diferentes que precisam ser consideradas dentro de um planejamento, que para ser exemplar deve ainda, levar em conta as vozes, o conhecimento e a sabedoria de sua gente. Esperamos que as informações aqui tratadas possam fazer refletir sobre o que queremos para a Amazônia, sem esquecer que a resposta implícita é o que queremos para o Brasil. Boa leitura! Liane Uechi Diretora e Redação liane@neomondo.org.br
Instituto
Neo Mondo Um olhar consciente
Chegou a Revista
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UM MUNDO DIFERENTE
Ano 1 - Nº 1 - Setembro/Outubro 2008 • R$ 8,50
A Primeira Revista Infantil periódica do Brasil destinada às causas socioambientais Assinatura Anual R$51,00 (6 Revistas) Assine e receba onde desejar
De olho no Universo
Gente do Bem
Conheça os Animais Astronautas
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Um papo com Mauricio de Sousa
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Intervalo Cultural De presente, um divertido jogo radical
Gente do Bem,
! ! ! á j e n i s s e faça parte de A um mundo diferente assinaturakids@neomondo.org.br 11 4994-1690 Neo Mondo - Agosto 2008
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Perfil
O Arceb VER
Dom Moacyr minimiza choque cultural, sobrevive a acidentes e avisa: a Amazônia tem futuro; basta entender o povo. Gabriel Arcanjo Nogueira
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máxima popular: “Vá se queixar ao Bispo” é mais verdadeira do que se possa imaginar. Prova disso está na atuação do Arcebispo Dom Moacyr Grecchi, de Porto Velho (RO), conhecido não apenas por ouvir, mas por falar pelo amazônida. É uma autoridade com muita história. Primeiro presidente nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), durante 8 anos; ocupante de cargos importantes na direção da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entre eles a Comissão Espiscopal Nacional (CEP), órgão coordenador de toda a Conferência, durante 4 anos; e da Comissão Episcopal para a Amazônia há cerca de 6 anos; um dos três em atividade no País a participar das três principais conferências episcopais latino-americnas - Puebla, Porto Rico e Aparecida. Escolhido pela Revista Neo Mondo para ser o personagem desta edição espe-
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cial, Dom Moacyr reluta - “com a idade a gente vai tendo preguiça de falar” -, e depois nos prestigia com sua entrevista. Abençoada entrevista! Dom Moacyr é quem podemos chamar de arcebispo verde, tais a sua identificação e compromisso com a Amazônia. Nascido no litoral catarinense, aprendeu a amar as terras amazônicas, onde está há quase quatro décadas. “Fui recebido muito bem. O povo me manifestava confiança, carinho, apoio. Pouco a pouco comecei a conhecer e amar esta terra e este povo com suas belíssimas qualidades humanas e os defeitos que todo mundo tem. O Acre e Rondônia tornaram-se minha terra e extensão de minha família”.. Debilitado fisicamente, em conseqüência do último acidente automobilístico sofrido, o arcebispo conserva, aos 72 anos, a clareza e a sabedoria necessárias para assumir o papel de porta-voz dos oprimidos
Quase tudo nessas regiões acaba na casa do bispo Neo Mondo - Setembro 2008
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da região contra a devastação das matas, descaso com índios e outros problemas nacionais. Tem a voz mansa, mas firme, e avisa: “A Amazônia tem futuro; basta entender o povo”. DA SACRISTIA PARA A FLORESTA Ainda bispo de Rio Branco (AC), teve de se submeter a escolta policial de agentes federais, até quando oficiava cerimônias religiosas. Constrangedora, a situação não durou para ele mais do que cinco meses. Decidiu dispensar a proteção e se tornou amigo dos policiais. Nem as ameaças o fazem perder o senso de humor: “Se alguém quiser me matar, é fácil: sou grande e distraído”. Os dois acidentes que o vitimaram, Dom Moacyr os atribui a barberagens. E nem por isso deixa de fazer as suas viagens, mesmo em estradas ruins, a lugares difíceis e distantes. Faz parte da missão pastoral percorrer esses caminhos. O arcebispo reconhece que não tem competência técnica em certos assuntos, mas autoridade moral não lhe falta, além da eclesiástica. Explica os ingredientes da sua guinada da sacristia para a floresta: “A confiança dos pobres no bispo em situações de injustiça e a persistência nesta confiança. A desco-
ispo
Neurimar Pereira/Pastoral Arquidiocese
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Arcebispo Dom Moacyr Grecchi, de Porto Velho (RO).
berta de que os ricos, autoridades e sulistas compradores de terra me enganavam e, para isso, até usavam de meu pouco conhecimento da população local e de meu relativo preconceito quanto ao povo da região. A descoberta pessoal, direta, de que o povo não mentia nem exagerava quando falava do que sofria da parte dos `paulistas` com total conivência das autoridades. Atrás de tudo isso eu vejo, agora, a mão de Deus tentando me converter. Na presidência da CPT, durante a ditadura militar, aprendi muitas coisa também” – revelou. SEM ACOMODAÇÃO A receita do arcebispo pode ser prescrita para quem almeje desenvolver equilibradamente aquela vasta região: “Basta entender o povo”. Porto Velho, em certo aspecto, não difere muito das badaladas capitais dos grandes centros urbanos quando o assunto é miséria. Lá também a pobreza é mais vista na periferia, e os motivos de preocupação do arcebispo não param por aí. Rondônia saltou de 80 mil para 1,4 milhão de habitantes nos últimos 30 anos. A capital do Estado vai dobrar sua população, lembra. “Hoje o atendimento médico, as escolas, a
segurança, a infra-estrutura de água encanada, rede de esgotos, enfim, tudo aqui é extremamente precário”, diz. É preciso dar dignidade a tanta gente, assim como ver a melhor maneira de resolver questões polêmicas de desenvolvimento. Dom Moacyr distingue a Amazônia Legal da restrita à bacia amazônica, com base nos seus 38 anos na região. “Sempre fomos tratados como colônia: borracha para os outros, ouro para os outros, terra para outros, madeira para os outros, boi para os outros, soja para os outros, energia para os outros... Nada se faz aqui em vista da Amazônia em primeiro lugar. A energia do Rio Madeira, por exemplo, é toda em vista do Sul”, constata. E aponta como saída o alerta, recém-saído do forno, do Debate sobre Políticas Públicas e o Futuro da Amazônia, Documento-Guia da CNBB: “As relações entre o Estado Nacional e a Sociedade Brasileira configuramse até agora como análogas às relações de dependência entre colônia e metrópole. Em consonância com este modelo, a Amazônia está tão-somente a serviço dos interesses nacionais e não dispõe de condições básicas de se desenvolver a partir de seu dinamismo próprio e de se constituir como macro-região mais plenamente integrada”.
JUSTIÇA SURDA Sobre o Plano Amazônia Sustentável (PAS), o arcebispo pensa que, em si, ele é bom. E, de novo, não entra no mérito técnico do conteúdo. Mas alfineta: “Aqui, o projeto é sustentável ou não serve. O problema é controlar, cobrar, convencer, exigir. A justiça, como está, não responde às necessidades e muitas vezes favorece os fortes, que têm muitos e `bons` advogados. O Incra não funciona a contento e não se entende com o Ibama, a Polícia Florestal é pequena. Em geral, os órgãos ligados à terra não se entendem”. O incansável arcebispo verde procura, em benefício da gente que nele confia, estar sempre em contato com autoridades. Ele cita ministros, notadamente do Meio Ambiente, ainda na gestão anterior, para conhecer as verdadeiras intenções e projetos do governo; Ministério Público Federal e Estadual, em casos de conflitos, de violência dos grileiros, madeireiros, prisões arbitrárias; Incra local e nacional; Ibama; órgãos ligados à Justiça e Direitos Humanos, mediante a Comissão e Justiça e Paz. Dom Moacyr sintetiza: “Quase tudo nessas regiões acaba na casa do bispo”. Neo Mondo - Setembro 2008
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Economia & Negócios
Os conflitos do desenvolvimento na Pesquisa aponta que bioindústrias atuam com bases sustentáveis. Liane Uechi
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necessidade do desenvolvimento sustentável da Amazônia é um consenso no Brasil. Todos os segmentos da sociedade concordam que não há mais espaço para modelos predatórios que contribuem para a destruição dos recursos naturais, até porque a história já provou que essa prática não promove equidade. Se existe consenso, faltam soluções claras de como aplicar esse novo conceito, que se convencionou chamar de sustentável. O geomorfologista Aziz Ab’Saber, maior referência viva da geografia brasileira, em conversa telefônica, disse que uma proposta para a Amazônia só será possível, se for efetivamente baseadas no conhecimento das realidades territoriais e sociais. O professor que considera o termo sustentabilidade completamente banalizado e inadequado, explicou que para cada uma das 23 células da Amazônia é preciso avaliar a saúde, a educação, o transporte, as aspirações das populações, o saneamento básico, a produção cultural, etc, com embasamento científico e crítico. Segundo ele, é necessário conhecimento para respeitar as enormes diferenças existentes, e assim, obter um planejamento para atingir a “utopia” de máximo desenvolvimento com a Floresta em Pé. Ele fala com conhecimento de quem estuda a região há muitas décadas e realizou um estudo de zoneamento da Amazônia, conferindo de perto o que a maioria dos brasileiros acompanha pelas notícias: conflitos fundiários, violência, descaso
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EFS Advocacia
Amazônia ecológico e os mais altos índices de problemas sociais do país. Essas mesmas notícias mostram que a economia da região Amazônica continua a se expandir de modo insustentável nas atividades exploratórias da madeira, na mineração, na agricultura e pecuária. Um estudo de uma pesquisadora da USP, a geógrafa Laís Mourão Miguel, mostrou, no entanto que dois setores da bioindústria: cosméticos e fitoterápicos, estão conseguindo desempenhar atividades produtivas em bases sustentáveis, com articulações de pesquisa e desenvolvimento com centros e instituições de pesquisa; utilização de matéria-prima certificada e geração de desenvolvimento para as comunidades tradicionais. Suas pesquisas foram realizadas junto a doze bioindústrias, de diferentes portes, instaladas na Amazônia. REDE DE COOPERAÇÃO CIENTÍFICA Segundo ela, foi possível constatar a formação de uma rede de cooperação para pesquisa e inovação pelas principais instituições de pesquisa da Amazônia, que promovem o aproveitamento do potencial da biodiversidade local. As instituições que mais participam, segundo o estudo, são: o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), o Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG) e a Universidade Federal do Pará (UFPA). A pesquisadora explicou que as empresas estudadas buscam desde o início da cadeia de produção fazer o uso sustentável da biodiversidade regional, através da certificação da matéria-prima, conhecida como Selo Verde. Ela constatou ainda que o setor tem inserido nesse processo produtivo, as comunidades tradicionais, que passaram a se organizar em cooperativas de extração, produção e processamento. As matérias-primas amazônicas se transformam em insumos 73 para Centro a fabricação senador Flaque,
Rua Santo André - SP CEP 09112 180
de medicamentos fitoterápicos, produtos de higiene pessoal, perfumaria, extratos padronizados, produtos alimentícios, enzimas de interesse industrial, corantes e conservantes derivados de plantas, animais e microrganismos. SELO VERDE Possuir o selo verde, uma das exigências do comércio exterior, significa estar dentro de normas e padrões estipulados por organismos nacionais e internacionais que prevêem fatores ambientais, de manejo conservacionista e aspectos sociais. Conforme explicou Alexandre Harkaly, diretor de negócios de certificação, do Instituto Biodinâmico - IBD, reconhecido internacionalmente, ao buscar esse Selo Verde, cria-se um processo de mudança da cultura extrativista. É necessário elaborar um projeto de manejo, onde são mapeados, inventariados e estimados a produção, bem como apresentar o estudo dos recursos naturais a serem utilizados. “Eles precisam demonstrar que estão respeitando a capacidade de regeneração natural, sem o risco de exaurir a espécie” – disse. Também é necessário adotar novas práticas, uma vez que não é permitida a queimada da superfície do solo. No caso de ocorrer fogo acidental, a certificação é temporariamente suspensa para discussão junto à certificadora sobre as medidas a serem adotadas. Do mesmo modo, devem ser respeitados os caminhos preferenciais da fauna local, assim como as trilhas e corredores de fauna existentes, áreas alagadas, além da vegetação que os protege. Mas ele diz que há muito ainda o que avançar nessa questão. “Além de muito marketing empresarial, ainda há ceticismo nas comunidades sobre a importância da certificação. Muitos que sempre viveram da atividade extrativista não entendem que o processo permitirá que a atividade seja feita com mais responsabilidade e
Erick Rodrigues Ferreira de Melo e Silva ADVOGADO
Rua Senador Fláquer, 73 - Centro Santo André - SP - CEP 09010-160 Tel.: (11) 4436-4111 - Cel.: (11)9798-1341 A Neomondo - Setembro 2008 efsadv@aasp.org.br
Economia & Negócios
conhecimento” – disse. Harkaly explicou que normalmente são as indústrias que requerem a certificação, mas já há casos de cooperativas e até de comunidades indígenas que aderem ao Selo Verde.
ASPECTO SOCIAL – GANHOS PARA A COMUNIDADE Um dos demonstrativos mais convincentes de sustentabilidade está na inserção das comunidades tradicionais no sistema de desenvolvimento. Uma das empresas que vem mantendo relacionamentos bem sucedidos com essas comunidades é a bioindústria de cosméticos Natura.
A Natura mantém 19 contratos de fornecimento de ativos naturais com comunidades tradicionais da Amazônia formadas por grupos de agricultores familiares ou de extrativistas. Em agosto, assinou com o Governo do Amapá os dois primeiros contratos de repartição de benefícios para acesso ao patrimônio genético do uso da castanha-do-brasil e da copaíba. Os recursos serão repassados ao governo estadual e sua aplicação será definida pelo Conselho Deliberativo, formado por representantes da Natura, das comunidades e do Governo, devendo obrigatoriamente estar vinculada a iniciativas e projetos de benfeitorias e
CASO IRATAPURU Situada na floresta amazônica do Estado do Amapá, a remota comunidade de Iratapuru é parceira da Natura. Há várias gerações essa população vive da colheita da castanha-do-Brasil. São 30 famílias, que se organizaram através da Cooperativa Mista dos Produtores Extrativistas do Rio Iratapuru, e vendem, hoje, óleo de castanha bruto para uma empresa beneficiadora que refina a essência e a entrega à Natura, para uso na fabricação de xampus, condicionadores e sabonetes. A comunidade é remunerada duas vezes, no começo da cadeia produtiva, a título de fornecimento, pela venda do óleo, e no final, com uma percentagem sobre a venda dos produtos Natura. O preço do insumo e o percentual sobre a venda foram definidos em várias assembléias comunitárias com a participação de lideranças familiares, de profissionais da Natura e de funcionários da empresa beneficiadora. 12
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desenvolvimento sustentável da reserva de onde serão extraídos os produtos. A empresa já possui também a autorização, junto ao Conselho de Gestão do Patrimônio Genético - CGEM, para utilização e repartição de benefícios de outros ativos: breu branco, candeia, cupuaçu-manteiga, extrato de erva-mate, extrato aromático de erva-mate, maracujá-proteína, pariparoba e sesbânia. “Esse processo de reconhecimento do direito de provedor das comunidades representam grandes avanços na afirmação da cidadania e importantes fatores de inclusão social”, ressalta Rodolfo Guttila, diretor de Assuntos Corporativos e Relações Governamentais da Natura.
CRITÉRIOS PARA OBTENÇÃO DO SELO VERDE De acordo com as “Diretrizes para o Padrão de Qualidade Orgânico IBD”, considera-se sustentável a coleta/extração de produtos silvestres ou naturais retirados em quantidades nunca acima do ganho de biomassa do produto colhido no período entre ciclos de corte, no caso de material vegetativo. A quantidade retirada também não pode comprometer a freqüência de ocorrência da espécie no ambiente em questão, no caso de coleta de sementes.
Em quatro anos, os recursos provenientes dos contratos e dos investimentos da Natura na comunidade permitiram a construção de uma fábrica de extração de óleo na comunidade, processada por ela mesma. A Natura pagou pela contratação da Imaflora, a representante no Brasil da Forest Stewardship Council, que certificou a produção de castanha, com o “selo verde FSC”, em 2004. Para evitar a dependência da comunidade com a empresa, e o risco de uma relação de assistencialismo, parte do percentual recebido pela venda dos produtos foi direcionada para a criação de um Fundo de Desenvolvimento Sustentável. Seu propósito é fomentar outras iniciativas econômicas da comunidade, fortalecendo sua capacidade de gestão técnica e comercial, traçando suas próprias metas de desenvolvimento sustentável, sem prescindir do apoio da Natura.
Ainda segundo as Diretrizes, não são passíveis de certificação:
Fonte: Natura
Fonte: IBD
a) produtos silvestres coletados em locais onde forem observados sinais de degradação por excesso de população em relação à área de exploração, isto é, que ultrapasse o limite da capacidade de suporte do ecossistema; b) produtos coletados em áreas onde não se observe sua regeneração em níveis satisfatórios; c) produtos cujo manejo prejudique a estrutura ecológica preexistente, inclusive da fauna; d) produtos obtidos por meio de processamento, utilizando substâncias ou benfeitorias que interfiram negativamente sobre o ambiente; e) produtos oriundos de projetos não suficientemente isolados, que possam permitir a contaminação por pesticidas agrícolas.
Meio Ambiente
Museu Vivo
da Amazônia Museu encravado na Floresta Amazônia promete ser um Centro de Conhecimento Liane Uechi
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Amazônia Brasileira irá ganhar um museu vivo, que terá o tamanho da importância da região. Esta é a garantia do Secretário Executivo de Ciência e Tecnologia do Estado do Amazonas, professor Marcílio Freitas, que diz que a iniciativa irá alavancar soluções para os problemas da região, uma vez que se tornará um Centro de Conhecimento. Trata-se do Museu da Amazônia (Musa), iniciativa da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Amazonas (Sect) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), que já tem endereço. Será instalado em uma área de 15 km², dos quais 10 km² correspondem à Reserva Adolpho Ducke, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em
Marcilio de Freitas, secretário executivo da Ciência e tecnologia do estado do Amazonas
Manaus. Na coordenação desse grandioso projeto está o professor Ennio Candotti. O conceito aplicado a esse empreendimento prevê um ambiente inovador, com um Museu encravado numa floresta primária, onde serão instaladas 20 torres de observação, permitindo visualizar por cima das copas das árvores e também em vários outros planos de observação. “O Museu será diferente de tudo que existe hoje, irá permitir o estudo, articular conhecimentos e disponibilizar a história e cultura dos povos da região” – disse Freitas. Pelo projeto, serão construídos laboratórios de biodiversidade, equipados para utilização de pesquisadores e alunos, bem como ambientes para estudos animados, ecologia, ciência atmosférica, artes, filosofia e representação dos povos. A estrutura física, apesar de já possuir planos e diretrizes ainda aguarda um projeto arquitetônico mais detalhado. A tecnologia será item importante nessa nova concepção de museu. O monitoramento feito por câmeras especiais em diferentes freqüências de luzes ultravioleta e infravermelha, captarão imagens, em tempo real de espécies da flora e fauna e serão disponibilizadas por rede, via internet e também, em ambientes de visitação no próprio museu. Também estão previstas as construções de um grande aquário para a manutenção de espécies de animais aquáticos da Amazônia e de trilhas para passeios e observação da floresta.
Não apenas a natureza estará inserida nesse contexto. Segundo o secretário, também será um espaço para o estudo da complexidade histórica e cultural dessa tão importante região, representada nos conhecimentos tradicionais da população, quase sempre desconhecidos do resto do país. As idéias são muitas, mas como diz Freitas, um museu vivo precisa estar em construção contínua e funcionar como um centro de pesquisa, interligado a escolas, meios de comunicação e demais instituições. O projeto que deve custar em torno de 100 milhões, está na fase de construção jurídica e de captação de recursos junto às agências nacionais e internacionais públicas e privadas. A esperança é que em até 12 meses, já possa abrir à visitação. “Esperamos receber no primeiro ano de funcionamento, 1 milhão de visitantes. Já estivemos mais longe desse sonho...que começa a se realizar” – anunciou o secretário.
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Já estivemos mais longe desse sonho Neo Mondo - Setembro 2008
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Meio Ambiente
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Com a prorrogação da Moratória da Soja, produtores ajudam a controlar o desmate e a manter as exportações. Livi Carolina
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cada ano a Amazônia Legal perde milhares de hectares da maior floresta tropical do mundo. Segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia - Imazon, somente no mês de junho, o Brasil viu cair por terra mais do que o equivalente a um campo de futebol por minuto em função do desmatamento. Dados que contradizem a atual preocupação ambiental e que se opõem ao mercado de exportação cada vez mais exigente. São leis e normas, barreiras não-tarifárias que limitam o crescimento de organizações que não se adequam a nova realidade socioambiental da economia mundial. Com base nesta preocupação, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais – Abiove uniu-se a outras associações, ONGs e empresas, formando o Grupo de trabalho a Soja – GTS e anunciaram, em 24 de julho de 2006, uma moratória de dois anos para a compra de soja proveniente de novas áreas desmatadas na Amazônia e a exclusão de fazendas que usavam mão-de-obra escrava. A iniciativa, que será prorrogada por mais um ano, busca melhorar a governan14
Neo Mondo - Setembro 2008
ça no Bioma Amazônia e inclui o compromisso das empresas do setor de não comercializar soja que seja produzida em áreas desmatadas no Bioma. De acordo com o presidente da ABIOVE, Carlo Lovatelli, a proposta da moratória fez parte do trabalho desenvolvido para a melhoria da sustentabilidade e nestes dois anos já atendeu aos anseios de mercado, estimulados por algumas organizações não governamentais. “Embora a presença da soja na Região Norte seja pouco expressiva, ocupando apenas 3 milésimos do chamado Bioma Amazônia, o complexo soja é o principal item das exportações brasileiras. E com a Moratória evitou-se uma deterioração da imagem dos produtos oleaginosos brasileiros no exterior, e um eventual rechaço do nosso produto por alguns compradores europeus” – observa o Lovatelli. Em sua avaliação, os avanços alcançados nos dois primeiros anos da Moratória foram significativos e positivos, porém ainda existem desafios que deverão ser en-
frentados na próxima gestão para melhorar a sustentabilidade na região. “Precisamos de muito mais ações de governo através do aperfeiçoamento de mecanismos de ação e controle. Mas isso deverá ocorrer com a participação direta do Ministério do Meio Ambiente” – destaca o presidente. Monitoramento Uma das preocupações do GTS para a próxima etapa é dar continuidade ao mapeamento e monitoramento das áreas de desmate. Conforme afirma Lovatelli, foi feito um mapeamento e monitoramento da Moratória da Soja, com base nos dados do sistema PRODES/INPE, levantados no período de agosto/2006 a julho/2007, que verificou in loco as informações geradas pelo sistema. Foram realizados sobrevôos que identificaram que não houve plantio da soja nas áreas desmatadas, porém, um ano passou-se e é preciso fazer nova vistoria. Além disso, outro fator de atenção para a nova etapa é o cadastro das propriedades
nos
cultores rurais e a regularização fundiária, de responsabilidade do Governo, que Lovatelli julga ser “necessária e urgente para resolver os problemas socioambientais que ocorrem hoje no país, em especial na região do Bioma Amazônia”. E acrescenta: “Sem a regularização fundiária, o sucesso de outras ações poderá ser comprometido.” Contudo, no evento de prorrogação da Moratória, o Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, comprometeu-se em priorizar o cadastro rural nos municípios produtores de soja. Mais terras O crescimento mundial no consumo de carne também tem afetado o setor da soja, cultura usada para a produção da ração bovina. Sendo assim, cresce também a demanda por mais terras para plantio de exportação. Mas como resolver este impasse? De acordo com Lovatelli, esse processo vem acompanhado da aplicação de mais e me-
lhores tecnologias nas propriedades rurais que proporcionam o aumento de produtividade nos plantios. Assim como, a possibilidade de se utilizar áreas degradadas por outras atividades, não passíveis de recuperação para uso agrosilvipastoril*. “A ABIOVE projeta que a safra brasileira de soja passe dos atuais 61 para 105 milhões de toneladas em 2.020 para atender a demanda mundial por proteínas. Serão necessários mais 7 milhões de hectares, que em grande parte virão de áreas ocupadas por pastagem. Espera-se que a pecuária libere 33 milhões de hectares até 2.020, em função de ganhos de produtividade” – diz o presidente. * Conjunto de sistemas e práticas de uso do solo, que envolve a interação sócio-econômica e conservacionista aceitável de árvores e arbustos, com culturas agrícolas, pastagens e animais, de forma seqüencial ou simultânea de tal maneira que alcance a maior produtividade total em regime sustentável.
Fim da vigência Segundo Lovatelli, a continuidade do trabalho da moratória após a segunda vigência dependerá do trabalho conjunto entre os órgãos governamentais brasileiros, as entidades que representam os produtores rurais e a sociedade civil, para: ABIOVE e ANEC: • Realizar o monitoramento no Bioma; • Sensibilizar os sojicultores a atenderem o disposto no Código Florestal Brasileiro; • Colaborar e cobrar do Governo Brasileiro a definição, aplicação e cumprimento de políticas públicas (Zoneamento Econômico-Ecológico) sobre o uso da terra na região. ONG’s: • Cooperar com o aporte de informações e assessoria técnica especializada ao GTS; • Defender interna e externamente a criação de mecanismos de remuneração por
prestação de serviços ambientais e preservação de florestas. MMA: • Promoção e apoio à implementação do cadastro e licenciamento ambiental das propriedades rurais, com prioridade para os municípios produtores de soja no bioma Amazônia, em conjunto com os órgãos estaduais de meio ambiente; • Apoio e promoção à implementação do Zoneamento Econômico Ecológico nos estados da Amazônia Legal em conjunto com as instâncias estaduais; • Assegurar a produção do mapa do Bioma Amazônia na escala adequada para o monitoramento das propriedades rurais nele inseridos; • Cooperação com os demais órgãos de governo, propugnando em fóruns internacionais pelo desenvolvimento de programas de incentivo à produção sustentável, inclusive com remuneração.
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Meio Ambiente
Legadoque tran “Chico Mendes tinha visão de futuro: jovens são agentes de um mundo melhor” Gabriel Arcanjo Nogueira
Q
uando se fala em Chico Mendes, a unanimidade não é burra (como queria Nelson Rodrigues), mas consciente. Tanto que o seringueiro, o marido, o sindicalista, o pai, o homem da floresta é referência nacional e internacional. Basta ver o reconhecimento alcançado em prêmios que recebeu em vida e por ter, ele próprio, se transformado em “Medalha Chico Mendes”. Isso se não bastassem as inúmeras organizações e locais que ostentam o seu nome, a exemplo de parques, museus e comitês. Em Xapuri, a Fundação Chico Mendes é ponto de parada obrigatório para pessoas que do Brasil e do exterior visitam a cidade para saber mais sobre a vida e a obra do líder dos seringueiros e do que podem fazer para dar continuidade a seus ideais. Quem conta é Ilzamar Gadelha Mendes, a companheira de todas as horas. “Mais que o bom pai e o bom marido, o legado de Chico Mendes vale pelo exemplo de luta em defesa da vida e da floresta. Para mim, isso é o mais importan-
te. Meu marido iniciou um trabalho, em que tinha a preocupação de deixar aos jovens a mensagem de se tornarem os agentes de um futuro melhor”, diz, ao lembrar de uma Carta aos Jovens, escrita por ele. Consciente de que as pessoas são únicas em sua existência, Ilzamar acredita que, hoje, “cada um deve dar continuidade, de seu jeito, ao legado de Chico Mendes. O importante é o despertar da consciência, que atinge pessoas de todos os níveis, até mesmo de poder, e camadas sociais, seja no Brasil seja no mundo”. Aí incluídos lideranças sindicais, trabalhadores rurais, ribeirinhos, estudantes. “Fico muito feliz ao ver que, nas escolas, crianças e jovens se dedicam a olhar para a questão ambiental de maneira a aprender com a mensagem e o exemplo que meu marido deixou”, afirma. EMPATES E RESERVAS A Medalha Chico Mendes de Resistência é uma dessas referências marcantes
Claudio Avallone
Chico Mendes durante a criação do sindicato de Xapuri.
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num país carente de heróis. Foi criada em 1988 pela ONG Tortura Nunca Mais, como homenagem à sua memória e para servir de condecoração a pessoas e instituições comprometidas na luta pelos Direitos Humanos e por uma sociedade mais justa. Desde 1989 já contemplou centenas de personalidades no País. Uma das formas de luta mais célebres dos seringueiros eram os empates - reação pacífica ao desmatamento que exigia muita coragem e mobilização dos participantes. As pessoas organizavam passeatas para impedir o abate de árvores, seja pelo diálogo seja pelo seqüestro de motosserras ou ainda por abraço nas árvores ameaçadas. O primeiro deles contou com 60 seringueiros e peões, em 1976, num movimento em que as mulheres tiveram papel muito importante, bem como as crianças, que iam na linha de frente. Muitos desses empates resultaram na criação de reservas extrativistas e, em 1988, era contabilizada a primeira delas, chegando em 2007 a 35 reservas existentes. O termo serve de título a um livro que ajuda a entender a Amazônia, “O empate contra Chico Mendes”, obra de um dos escritores mais ilustres da região: Márcio Souza. Sozinho na floresta em noite avançada Firme nas convicções e aberto ao diálogo; nunca violento. Dessa maneira é que o professor Otávio Destro, hoje em São Caetano, no ABC Paulista, vê Chico Mendes. Destro recorda seus tempos de Acre: oito anos no total, três deles em Xapuri. E relata um episódio que fala por si:
PaulaLyn Carvalho
Buffet
scende
R$25,00
Xapuri - Frei Destro, você pode fazer um favor? - Fala, Chico! - Tem uma pessoa doente e vieram chamar o ¨curador¨ para indicar o chá para ela se curar. Se ele for a pé, vai demorar muito tempo. Dá para ir de jipe até perto da casa do doente.O senhor pode levar? Eu vou junto para voltar com o senhor. Levantei da rede, pois já era adiantado da noite e lá fomos de jipe em plena floresta, pela ¨estrada velha¨. Deixamos o ¨curador¨. Ele embrenhou-se pelo ¨varadouro¨ em plena escuridão. Fiquei impressionado. Um homem sozinho em plena floresta, e noite avançada. Eu estava em Xapuri há poucos dias e era a primeira vez que entrava na floresta. Chico Mendes me disse que ¨ao clarear do dia¨ a gente voltava para buscar o curador porque ele ia ser padrinho de várias crianças. Eu, acostumado na ¨cidade¨, queria saber a ¨hora¨ e apontava o relógio. Para mim, ¨clarear do dia¨ nada significava, e insisti com o Chico Mendes para saber a hora exata. - Não se preocupe, Frei Destro, na hora certa eu chamo o senhor. Meio descrente, pensando que poderia atrasar a cerimônia da manhã seguinte, acabei dando um voto de confiança ao Chico Mendes. Ainda escurinho, o Chico me chama e saímos. Quando chegamos no ¨varadouro¨, não havia ninguém. Fiquei pessimista. Caminhei pelo ¨varadouro¨, não mais de um minuto, e comecei a voltar, morrendo de medo. E já era claro! De repente escuto atrás de mim: - Ô, seu vigário! Já chegaram? Era o curador. Esse fato sempre me encucou. Como é difícil para um ¨estudado¨, que vive em socie-
por pessoa
dade dita desenvolvida, entender e respeitar a vida, a experiência, o conhecimento do povo mais simples, que vive outra realidade e tem outra sabedoria! Por que impor a nossa cultura? Por que não respeitar a deles? Este fato mostra o espírito de Chico Mendes. Ele era procurado por quem dele precisava: corria atrás para resolver o problema de quem estava em necessidade. Chico valorizava o seu conhecimento de homem da floresta, as noções de justiça social e direito dos seringueiros que aprendia nos sindicatos, na igreja, nas leituras e no diálogo com todos. Chico não era violento, mas firme nas suas convicções. Era homem de diálogo, com autoridades e mesmo com fazendeiros. E sabia organizar o povo da floresta, os seringueiros, para defender seus direitos e a preservação da floresta que estava sendo derrubada indiscriminadamente para formação de fazenda de gado, expulsando seringueiros sem nenhuma indenização. Esta sabedoria de Chico Mendes transcendeu Xapuri, o Acre e espalhou-se pelo Brasil e pelo mundo. Não era uma sabedoria teórica, abstrata. Era prática, dividida com seus conterrâneos necessitados.
s Salada
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Grelhados
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LINDO PÔR-DO-SOL Os fins de tarde em Xapuri, a 180 km de Rio Branco (AC), são de beleza que se renova a cada dia, descreve o livro “A Amazônia que não conhecemos”. Depois de escapar de seis emboscadas, Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, é assassinado a tiros, em 16 de dezembro de 1988. Por que tinha de ser justo numa tarde dessas, quando o sol acabara de se pôr?
Doces Todos os Dias Festival de Fondue. Na compra do fondue de queijo e o de chocolate, ganhe a garrafa de vinho*
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Segurança
Biopiratar esbarra na falta de um Crime causa prejuízos morais e econômicos ao país. Liane Uechi
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história da biopirataria no Brasil remonta ao tempo da colonização. Já nessa época, o país provocava a curiosidade de países estrangeiros, que realizavam “aventuras científicas”, coletando amostras e o conhecimento sobre o uso da flora e fauna nacional. Os exemplos mais famosos são do pau-brasil, cujo segredo de extrair a pigmentação vermelha foi absorvida dos povos indígenas, e o caso das sementes de seringueira levadas pelo inglês Henry Wickham para colônias britânicas na Malásia, tornando-a a principal exportadora de látex. Esses são apenas dois casos, dentre tantos outros, que além dos prejuízos de ordem moral à soberania brasileira ainda abalaram a estrutura econômica do país. A biodiversidade foi por muito tempo tida como um bem da humanidade. Isso mudou a partir da publicação da Convenção sobre Diversidade Biológica - CDB”, na Eco 92, que passou a considerar biopirataria a apropriação ilegal de diversas formas de vida da flora e da fauna e também dos conhecimentos das populações tradicionais, a respeito de ativos e propriedades terapêuticas ou comerciais dos recursos naturais. Desse modo, esses recursos passaram a ser compreendidos como ativos do patrimônio genético nacional, que entretanto,
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Flor de Árvore Pau Brasil
ia marco Legal necessitam de uma regulamentação de uso, estabelecido pelo país. É nesse ponto que se concentra um grande problema. Desde 92, o Brasil não conseguiu ainda aprovar uma legislação definitiva e clara sobre o assunto. A gestão do patrimônio genético brasileiro está regulada por Medidas Provisórias 2.052 -00 e 2.186-16, de agosto de 2001. Com elas, criou-se o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), colegiado governamental responsável pelo controle do acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais a eles associados. A diretora do CGEN, Celeste Emerick, se mostrou bastante contrariada com a demora na definição de um Marco Legal para o assunto. “Vivemos uma insegurança jurídica. Isso inibe a pesquisa e não protege adequadamente o conhecimento das comunidades tradicionais” – disse ela. A difícil interpretação jurídica e as atuais exigências burocráticas para autorização de pesquisas de campo sobre biodiversidade, de acordo com a diretora, desestimulam o desenvolvimento científico e econômico, impedindo o objetivo maior que é repartir benefícios para todas as cadeias que participaram da geração daquele conhecimento. Outro ponto fraco da Medida Provisória é não possuir
interfaces com outras leis como a Lei de Inovação, dos Fundos Setoriais, de Políticas Industriais. “Tudo isso nos coloca numa situação de extrema fragilidade”. De fato, conforme relatou o presidente da ONG Amzonlink, Michel Franz Schmidlehner, em 2002, a entidade descobriu e denunciou que alguns produtos brasileiros já tinham suas marcas registradas. Foi o caso do “cupuaçu” e “cupulate”, que já estavam patenteadas na União Européia, Japão e EUA pela empresa japonesa Asahi Foods. Descobriu ainda registro da marca “açaí” e de patentes da copaíba, andiroba, ayahuasca e outros casos. O fato acirrou as discussões e a indignação dos brasileiros. Em 2003, o governo determinou ao CGEN a elaboração de um Anteprojeto de Lei, aberto à participação da sociedade civil, a ser encaminhado ao Congresso. Celeste disse que o projeto de “Lei de Acesso a Recursos Genéticos, Conhecimentos Tradicionais e Repartição de Benefícios” foi concluído em 2007 e aberto à consulta pública, para que as comunidades tradicionais e locais, organizações não-governamentais, institutos de pesquisa, empresas, entidades da sociedade civil organizada e provedores individuais encaminhassem suas contribui-
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Segurança
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O Brasil é considerado megadiverso, mas conhece muito pouco desse imenso potencial natural e cultural
ções ao novo marco legal. “Foram cerca de 60 respostas, mas houve a solicitação de reuniões presenciais junto às comunidades tradicionais, por dificuldade de acesso das mesmas” – disse. Desse modo, somente após essa consulta presencial, o anteprojeto será encaminhado ao Congresso. Segundo a diretora, a esperança é que seja apreciada ainda em 2008 e que se sobreponha ao conflitos de interesses. A nova lei irá definir o acesso aos recursos genéticos e derivados, remessa de material biológico, acesso e proteção de conhecimentos associados, e ainda a questão dos direitos dos agricultores e a repartição de benefícios. Ela acredita que a falta de regulamentação atual impede até mesmo uma fiscalização eficiente e o pior, paralisa a pesquisa científica no Brasil, impedindo o conhecimento real da biodiversidade e da sociobiodiversidade brasileira, que na Amazônia Legal é representada por mais de 200 etnias, com um conjunto de comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, caiçaras e outros. “Nossa produção científica é muito pequena. O Brasil é considerado megadiverso, mas conhece muito pouco desse imenso potencial natural e cultural” - afirmou.
Açaí
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”
Entidades ambientais estimam que o Brasil perca cerca de 5 bilhões de dólares por ano com o tráfico de animais, produtos da flora, madeira e conhecimentos das comunidades tradicionais. O pior é que para coletar material biológico, não há necessidade de grandes aparatos, basta retirar um pedacinho da planta, acondicionar num saco plástico e pronto. Justifica-se aí a importância do conhecimento da nossa biodiversidade, até para conseguir resguardá-la. Celeste cita como fundamental, além da regulamentação e da fiscalização, a conscientização das comunidades tradicionais. Schmidlehner concorda: “A população é o legítimo guardião desse conhecimento e deve ser orientado sobre como fazer isso” - defende.
Cupuaçú
Conforme o relatório conclusivo da CPI da Biopirataria, que analisou além dos casos já citados, denúncias de venda de animais e madeira, será necessário uma mudança social profunda para eliminar esse crime que explora a pobreza, a desigualdade e a exclusão.
MADEIRA ILEGAL Da Redação com pesquisa de Caio Martins O maior problema encontrado, hoje, na Amazônia é a extração ilegal da madeira. Cerca de 85% são retiradas da mata de maneira criminosa, o que provoca um desperdício de 70% do produto e ainda destrói tudo que está à sua volta. Para cada árvore extraída, outras 59 são danificadas, abrindo imensas clareiras. Em junho de 2008, o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) registrou 612 quilômetros quadrados de desmatamento na Amazônia Legal. Isso representa um aumento de 23% em relação a junho de 2007 quando o desmatamento somou 499 quilômetros quadrados. No acumulado do período (agosto de 2007 a junho de 2008), o desmatamento totalizou 4.754 quilômetros quadrados. Segundo dados do IMAZON – Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, divulgados em 2007, a floresta já havia perdido quase 20% do seu tamanho original - 700 mil quilômetros quadrados.
Nessa atividade, madeireiros abrem milhares de quilômetros de estradas não-oficiais em terras públicas facilitando a grilagem (posse de terras alheias). Além da questão do desmatamento e todas as suas conseqüências ambientais, a atividade ainda aumenta as mazelas sociais. Levantamento do Imazon mostra que os indicadores de qualidade de vida nessas regiões desmatadas em muitos casos são piores que de áreas preservadas. O pseudoenriquecimento, que na verdade atinge a pouquíssimos, se vai junto com as toras e carvão, deixando no lugar um solo infértil, especulação, assassinatos por disputas de terra e uma pobreza maior do que antes da derrubada da floresta. A comunidade de áreas devastadas deixa de ter os serviços gratuitos da natureza como ervas para cura, fribras, frutos, peixes, etc... Fonte: Dados do IMAZON
Aquilino Cesar
Segurança
Guarda-costas
da Amazônia Tecnologia e participação das comunidades podem ser as soluções para a segurança. Da redação
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roteger 5.033.072 Km² da Amazônia Legal é uma tarefa árdua que necessita de cooperação e parceria entre governos, organizações e comunidades locais. Sua imensidão de riquezas naturais atrai os olhos ambiciosos de todo o mundo, em busca da variedade de produtos que a biodiversidade da Amazônia pode oferecer. A atribuição constitucional de proteção ambiental da Amazônia pertence à Polícia Federal, que atua em consonância com o IBAMA, órgão fiscalizador com poder de aplicar multas contra crimes ambientais, porém sem autonomia para aplicar a lei diante de um flagrante. Para atender a demanda de trabalho, a Polícia Federal tem priorizado o envio de novos agentes à Amazônia, numa tentativa de conter o registro de violações. No entanto, os números são preocupantes. Existem somente 10.329 mil agentes para cobrir todo Brasil. Na Amazônia Legal atualmente estão instalados apenas 12 postos de atendimento e 10 delegacias, além da Superintendência Regional do DPF em cada Estado. Junto com o envio dos formandos estão previstas a reforma das instalações e a manutenção dos demais equipamentos de inteligência, na tentativa de aumentar a capacidade de monitoramento. Mas estrutura insuficiente não é o único problema, o isola-
mento e as áreas inabitadas também são fatores facilitadores da ação de práticas criminosas, como a biopirataria, onde se incluem a extração de madeira ilegal, de ativos da fauna e flora, grilagem, dentre outros. Essa baixa densidade demográfica, de apenas 3,3 habitantes por Km², torna a Floresta mais vulnerável e o trabalho de segurança ainda mais complexo. Fica claro, que a fiscalização depende de um aparato tecnológico, capaz de fornecer informações precisas, em tempo real. E este é o papel do Sistema de Proteção da Amazônia – SIPAM. De acordo com José Neumar Silveira, gerente do Centro Técnico e Operacional de Porto Velho, o Sistema tem a missão de integrar informações, monitorar, coletar dados e analisá-los para desenvolver produtos e serviços que desempenham a função de ampliar o conhecimento e orientar de forma específica a atuação e as políticas públicas para a região. “Somos o suporte da Polícia Federal, geramos informações para que ela aja com maior eficácia. Mas também auxiliamos os municípios a fazerem melhor planejamento de suas atuações oferecendo softwares simples para o levantamento de dados precisos sobre a região” – explica Silveira. Para produzir estas informações, o SIPAM conta com um serviço de inteligência de sensoriamento remoto para a fiscalização da superfície terrestre através de quatro sen-
sores aerotransportados que operam nas faixas de microondas, visível e infravermelho. Segundo Silveira, estes e outros equipamentos são capazes de verificar quase que em tempo real o que ocorre na região. “Além dessa tecnologia, nosso centro criou um projeto de monitoramento de áreas indígenas, podendo fazer um trabalho preventivo. Com ele, verificamos a movimentação que antecede a motosserra e passamos nota de alerta aos órgãos responsáveis para as medidas necessárias” – ressalta. Conforme disse o gerente, mesmo com todo serviço de inteligência, um dos recursos mais eficientes no combate aos crimes ambientais são os Terminais de Usuários Remotos, compostos de uma antena VSAT, um telefone/fax e um computador. Eles permitem a integração com reservas indígenas, postos do Ibama, da Receita Federal, Forças Armadas e prefeituras da região. “Há pouco tempo, em Roraima, um nativo utilizou o terminal para avisar que havia um homem suspeito na mata, com a denúncia, o alemão foi pego em flagrante cometendo biopirataria” – relata. Para Silveira, permitir que os povos da Floresta, que são os maiores interessados na preservação e os guardiões legítimos de toda essa riqueza natural, participem e auxiliem as autoridades na proteção da Amazônia é a melhor solução.
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Evento
As Amazônias: Verdades, Mitos e Lendas Exposição trouxe a São Paulo os encantos da Amazônia Da redação
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Vaso de cariátides da cultura tapajônica Coleção Raimundo Cardoso (PA)
Urna da cultura Maracá Coleção Raimundo Cardoso (PA)
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omo se empenhar em proteger algo que não se conhece a fundo e que está longe dos olhos? De acordo com o diretor da Pró Cultura Marketing e Eventos, Mauro Peret, este foi o questionamento que levou à produção da mostra “As Amazônias: Verdades, Mitos e Lendas”, que aconteceu na segunda quinzena de agosto no Pavilhão da Bienal do Parque Ibirapuera. O evento é parte do projeto Ecos do Planeta, cujo objetivo é levar para a população as grandes questões ambientais, homenageando um bioma brasileiro, desenvolvido pela Pró Cultura Marketing e Eventos e pelo Instituto Brasil Com. A exposição que levou 72 mil pessoas a visitar o espaço gratuitamente, entre elas, 33 mil crianças da rede pública e particular de ensino, diferenciou-se por investir em um cenário com aromas, sons, utensílios da população amazônica, fotos e a atmosfera úmida da floresta que encantou quem passou por lá. “Escolhemos os biomas brasileiros para exposição, porque é um assunto ainda restrito a estudiosos, profissionais e com pouco destaque na sala de aula. Então, queríamos motivar a população a se apaixonar e a buscar mais informações, e assim, entender a importância da floresta para as cidades” – declara Peret. O cenógrafo J. C. Serroni, responsável pela mostra, levou o visitante “a navegar” sobre o rio Amazonas conferindo a paisagem de cada um dos sete módulos que dividiram a exposição: Floresta, Água, Astronomia, Arqueologia, Aldeia, Diversida-
de Cultural e Terra do Amanhã. Cada um deles trabalhado com uma atividade cultural e uma oficina interativa. De acordo com o Peret, a mostra foi pensada para atingir principalmente às crianças, dando a elas a oportunidade de aprender de forma lúdica, tirando-as do ambiente metódico da sala de aula e fazendo com que elas interajam com o cenário repleto de atrativos. Segundo o diretor, o papel dos eventos Ecos do Planeta é popularizar a questão da ecologia para que a sociedade possa cobrar mais atitudes do Governo. “A intenção é dizer: Acorda! As cidades só poderão sobreviver se houver mata em volta dela, senão haverá falta de chuva, mais poluição, mais doenças... O paulistano perde anualmente um ano e meio de vida por causa desta situação. Precisamos despertar!” – alerta.
Utensílios indígenas
Dilma de Melo Silva
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Correspondente especial de Quioto – Japão
AMAZÔNIA eo
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s dados são conhecidos: a Amazônia representa 61% do território nacional do Brasil e o desmatamento constitui um dos problemas mais graves. Foram vários ciclos sucessivos de invasões: primeiro a agropecuária, depois as madeireiras, logo agora a soja e no intervalo de tudo isso, os negócios amazônicos. Mas, aqui no Japão, a maioria dos japoneses ignora esses e outros fatos relevantes; para eles a Amazônia diz respeito a água, rios, árvores, e, sobretudo, indígenas sem contato com o mundo dos brancos; a rede de televisão local, a NHK, mostra sempre essas imagens reiterando que essa parte do globo constitui o pulmão do Planeta e os brasileiros não sabem cuidar dela. Alguns, mais informados, conhecem alguma coisa sobre os 75 anos da história dos imigrantes japoneses que foram para Amazônia em 1923,no período final do ciclo da borracha. Cerca de 300 famílias foram para esse local e se dedicaram ao cultivo da pimenta-do-reino; seus descendentes ainda vivem na região, na qual estão muitas empresas japonesas, principalmente nas Zonas Livres de Macapá e Manaus,
JAPÃO
por exemplo: Honda, Panasonic, Yamaha, Sony, Panasonic, Citzen, Orient, Fuji e Konica Minolta. Sobre as origens das madeireiras que destróem a floresta amazônica, nunca ouviram falar... e, uma das madeireiras mais importantes é a multinacional japonesa EIDAI Inc., pertencente ao grupo Mitsubishi, com sede em Osaka,Japão. A empresa no Brasil sofreu 71 autos de infração,e, em 2000 foi multada pelo Ibama em R$ 3,4 milhões pelo corte ilegal de madeira. A multa recebida pela Empresa no Brasil teve repercussão no Japão uma vez que, no Porto de Kobe, um grupo de quatro ativistas do Greenpeace ocupou, em julho de 2000, o navio “Manzanillo”, carregado com 11 contêineres de madeira nobre extraídos ilegalmente da Amazônia pela madeireira japonesa. Outro caso que saiu muito pouco na mídia daqui foi sobre o litígio judicial Brasil X Japão, a respeito do nome cupuaçu. O registro de patente e o direito de uso exclusivo do nome foi conseguido pela empresa japonesa Asahi o que levantou protestos do governo brasileiro e de organizações não-governamentais (ONGs) em todo o mundo, uma vez que cupuaçu é o nome
de uma fruta amazônica, assim chamado há milênios por índios do Brasil e do Peru. O problema teve início em 2000 quando Makoto Nagasawa, diretor da Asahi Foods e titular da empresa americana Cupuaçu International, registrou no Japão, EUA e Europa, a marca com o nome da fruta. Somente após cinco anos a batalha pelo nome cupuaçu, travada entre o governo brasileiro e a empresa japonesa Asahi Foods, chegou ao fim. Por decisão da Cancellation Division da União Européia, o registro do nome feito pela companhia nipônica foi cassado em todas as nações integrantes do bloco. A União Européia era o último mercado que ainda mantinha a concessão de uso da marca para a Asahi Foods. Ainda há muito a conhecer sobre a Amazônia por aqui. Professora doutora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, socióloga pela FFLCH\USP, mestre pela Universidade de Uppsala, Suécia e Professora convidada para ministrar aulas sobre Cultura Brasileira na Universidade de Estudos Estrangeiros. Neo Mondo - Setembro 2008
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Especial
Registrar para preservar Alguns animais que compõem a riquíssima fauna Amazônica. Da Redação
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or maiores que sejam as informações recebidas sobre as riquezas da região Amazônica é no flagrante das lentes fotográficas e cinematográficas que a exuberância dessa grande fatia do Brasil chega às demais regiões e ao mundo. O papel desses profissionais em captar a beleza e muitas vezes, também o pedido silencioso de socorro dessas espécies, é imprescindível para conscientizar sobre a importância de ser manter a floresta em pé. A fotógrafa PaulaLyn é uma dessas profissionais que emprestam a sensibilidade e técnica, a serviço da defesa do meio ambiente. Com um trabalho voltado
à essa causa, vem realizando ensaios e exposições sobre o tema. São dela as fotos da fauna amazônica, expostas a seguir. Agumas dessas imagens fizeram parte da exposição “Sentir Brasil”, que aconteceu em junho na Câmara Municipal de São Paulo. A maioria das imagens foi captada no Parque Ecológico de Januari, em Manaus, no Amazonas e no Instituto de Pesquisa da Amazônia (INPA), em janeiro de 2008. Paula é motivada pela sua paixão pela natureza. “Olho a lua, o sol, o mar, as árvores, os rios, os animais, como se os estivesse vendo pela primeira vez. São, para
mim, respostas a todas as minhas perguntas.” – disse. A fotógrafa acredita que cada um pode contribuir com ações que estão ao seu alcance. “A minha contribuição é através das imagens. Quero poder tocar o coração de cada um através do meu olhar, usar um sentido humano tão valorizado na contemporaneidade para despertar os outros sentidos e a consciência. Registrar para preservar” – concluiu. Se o mundo precisa da Amazônia para minimizar os efeitos ambientais do aquecimento global. Para esses animais, que somam milhares de espécies, a Floresta é sinônimo de vida.
Arara As araras estão entre os pássaros mais belos da fauna brasileira. São aves grandes e possuem e um bico curvo resistente usado para quebrar frutos e sementes. As araras vivem em casais nas copas das árvores mais frondosas e fazem seus ninhos em ocos de árvores.
Bicho-Preguiça O Bicho-Preguiça é considerado um animal muito sossegado. Dorme o dia todo nas árvores, pendurado num galho de costas para o chão e com a cabeça pendida sobre o peito. É um mamífero de hábitos noturnos. Orienta-se pelo olfato, pois tem uma visão muito fraca. Alimenta-se apenas das folhas, frutos e brotos de algumas árvores. É um animal inofensivo.
Gavião-real O gavião-real, também conhecido como harpia ( Harpia harpyja), é a maior ave de rapina do Brasil e do mundo, podendo atingir 2,5 m de envergadura. Seus hábitos são diurnos. Alimenta-se de moluscos, crustáceos e peixes até serpentes, lagartos, alguns pássaros e alguns mamíferos, como a preguiça (seu alimento favorito) que captura no solo.
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Jacaré O jacaré é um dos maiores répteis brasileiros. O jacaré amazônico chega a alcançar até 5 metros, mas em geral não ultrapassa 2 metros. A temperatura do seu corpo varia de acordo com o meio em que ele está, por isso precisa ficar exposto ao sol a fim de captar calor.
Macaco-de-cheiro O Macaco-de-cheiro é um primata que gosta de viver no topo das árvores mais altas da floresta, geralmente a 30 ou 40 metros do chão. São animais de extrema agilidade. Sua comida preferida são insetos, mas alimenta-se também de frutos e da seiva das árvores. Na Amazônia, os ribeirinhos costumam domesticá-los. São peraltas e brincalhões.
Macaco-aranha O Macaco Aranha possui como habitat as florestas tropicais chuvosas e tem hábitos diurnos. Vive em bandos de até 30 indivíduos e pode chegar até 33 anos. Os animais atingem de 6 a 8 quilos. Alimentam-se de frutas, sementes, folhas, insetos e ovos.
Tartaruga A tartaruga da Amazônia passa os dias nos rios de águas calmas, nadando, alimentando-se e de vez em quando sai para respirar e tomar um pouquinho de sol a fim de manter a temperatura do corpo São ovíparas, colocando seus ovos nas praias, durante a noite, em buracos que escavam na areia. São animais de vida longa, podendo atingir centenas de anos.
“Um Olhar Consciente” em “Este Mundo é Meu” Em continuidade ao projeto “Um Olhar Consciente”, PaulaLyn participará com painéis fotográficos no evento “Este mundo é meu 2008: integração sócio-ambiental”, que irá ocorrer no Centro Cultural São Paulo, de 08 a 29 de outubro de 2.008. Com ênfase nas questões ambientais, nas ações da sociedade em defesa da cidade, de si própria e de tudo que gira em seu entorno. A programação permitirá reflexões por meio de palestras, com convidados de várias especialidades na área de meio ambiente, bem como, oficinas e instalações.
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Especial
A estratégia
LANÇ
O Ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger fala sobre os desafios do Plano Amazônia Sustentável. Gabriel Arcanjo Nogueira
1 - O Plano Amazônia Sustentável foi elaborado levando em conta um conjunto adequado de saberes, opiniões, propostas e expectativas setoriais? Costumo dizer que a Amazônia é mais do que simplesmente uma floresta. Um programa abrangente para a região carece dos instrumentos para lidar com todos os muitos problemas de transporte, energia, educação e indústria existentes. Não sou eu que vou definir o plano de desenvolvimento da Amazônia. Esta é uma obra coletiva. Minha tarefa é ajudar a coordenar um trabalho de equipe, numa lógica de coautoria dentro do governo, dentro da Amazônia e dentro da Nação. 2 - O Sr. defende que o Brasil recomece da Amazônia. Como isso é possível a curto, médio e longo prazo? A Amazônia deve ser encarada como uma fronteira da nossa imaginação, um espaço privilegiado em que a Nação pode se encontrar e dar os primeiros passos para a construção de um novo país. Na Amazônia, o Brasil pode se revelar ao
“
Brasil. O bioma amazônico representa pelo menos um terço do território nacional e atrai a atenção do mundo todo, por ser a maior selva úmida do planeta, com 20% da água doce da Terra e por conter a maior reserva de biodiversidade. Além disso, está ligado, como vítima e como solução, ao debate mundial a respeito de mudança de clima. A discussão do destino da Amazônia serve como alavanca de pressão do mundo sobre o Brasil, mas pode também abrir espaço para o Brasil no mundo. Para isso, temos de mostrar como - ao reafirmar nossa soberania na Amazônia - podemos fazê-lo a serviço não só do Brasil, mas de toda a humanidade. Uma iniciativa nacional a respeito da Amazônia tem o poder de esclarecer e de comover o país, em uma narrativa de libertação nacional. O espírito da empreitada deve ser o de definir a Amazônia como vanguarda, não como retaguarda. As soluções para os problemas da região terão de ser inovadoras; não serão fáceis de extrair do repertório de políticas públicas conven-
Pensar o Brasil a longo prazo é missão inadiável, e nessa empreitada a Amazônia é centro das atenções
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cionais nem de situar no espectro das posições ideológicas conhecidas. 3 - Desenvolvimento sustentável seria utopia? O problema todo é que a convergência sobre a tese do desenvolvimento sustentável continua a ser uma convergência sobre uma abstração. Falta suficiente conteúdo prático. Por isso, o meu esforço, nessa fase inicial de coordenação do Plano Amazônia Sustentável, tem sido trabalhar, com os meus colegas ministros e, sobretudo, com os governadores dos nove Estados da Amazônia Legal, para definir sete grandes eixos de iniciativas práticas. 4 – E por onde começarão essas iniciativas? O primeiro eixo do projeto é resolver o problema da terra e fazer o zoneamento ecológico e econômico. O problema número um na Amazônia é o da regularização fundiária. Toda a Amazônia Brasileira é um caldeirão de insegurança jurídica. Enquanto não tirarmos a Amazônia dessa situação, em que menos de 5% da terra na posse de particulares têm a sua situação jurídica esclarecida, nada mais funcionará. A solução para o problema fundiário tem, necessariamente, três componentes. O primeiro componente é o Estado brasileiro afirmar o seu controle efetivo sobre o que é seu - as terras públicas. Para controlar é preciso conhecê-las. O segundo componente é redesenhar e equipar as insti-
Antonio Cruz/ABr
está
ADA tuições federais e estaduais responsáveis pela regularização fundiária e organizar o procedimento de colaboração federativa entre as organizações federais e estaduais. O terceiro componente é mudar as nossas leis, simplificá-las, para estabelecer um caminho largo e acelerado que leve da posse insegura para a propriedade plena. 5 - E quanto aos outros eixos, o que está sendo discutido? O segundo eixo é persistir e até mesmo radicalizar nas medidas contra o desmatamento. Esse compromisso exige, primeiro, a construção de um regime jurídico regulatório e tributário que faça a floresta em pé valer mais que a floresta derrubada. Segundo, a organização e o financiamento dos serviços ambientais avançados e, terceiro, o municiamento das unidades de conservação com quadros e com meios técnicos para que não permaneçam natimortas no papel. O terceiro eixo deste projeto é assegurar alternativas de produção economicamente viáveis e ambientalmente seguras para as populações de pequenos produtores que atuam nas zonas de transição entre a floresta e o cerrado. Hoje, há dois principais focos de desmatamento na Amazônia. O primeiro é a invasão das terras públicas e o segundo é o desespero dos pequenos produtores. A eles, precisamos garantir essas alternativas: um amplo espectro de lavouras perenes de cultivo de
O Ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger. peixes, de plantio de árvores, de produção para o biodiesel - atividades que terão de ser apoiadas técnica e financeiramente e não bastarão. Precisamos também assegurar a essas populações uma remuneração adicional aos ganhos de sua produção em troca das obrigações que assumirão de monitorar e de prestar contas e, com isso, sacramentar o vínculo delas com as alternativas legítimas. Aí, sim, poderá haver um aparato de monitoramento pelo Estado brasileiro, que funcione como complemento de uma agenda econômica construtiva e não como substituto dessa agenda. 6 - Há, também, uma preocupação com a agricultura na região? Sim. É disso que trata o quarto eixo do projeto: a reorganização da agricultura e da pecuária brasileira na Amazônia dos cerrados, fora da floresta. Na Amazônia dos cerrados, temos a oportunidade de liderar o projeto revolucionário de construção da agricultura brasileira sob o seguinte princípio: o Brasil pode dobrar a área sob cultivo e triplicar o seu produto agrícola sem
tocar uma única árvore. Para isso, precisa começar a superar o contraste ideológico e desorientador entre a grande agricultura empresarial e a pequena agricultura social ou familiar. O desenho de uma agricultura moderna e democratizada é um só. Para superar esse contraste, temos que executar simultaneamente duas obras: a primeira é uma obra física de combinação de uma pecuária intensiva que substitua a pecuária extensiva por uma lavoura de alto valor agregado. Tenho como pressuposto a superação da nossa absurda e ruidosa dependência da importação de fertilizantes. E a obra institucional passa pela reorganização dos mercados agrícolas para fortalecer os produtores fragmentados diante dos fornecedores e compradores cartelizados. Há também uma preocupação com o soerguimento da indústria nas cidades e periferias urbanas tanto da Amazônia florestada quanto da Amazônia dos cerrados, que faz parte do quinto eixo do projeto. Na Amazônia da floresta, precisamos de indústrias que transformem produtos madeireiros e não madeireiros e, sobretudo, Neo Mondo - Setembro 2008
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Especial
que fabriquem tecnologia apropriada ao manejo de uma floresta tropical, muito mais heterogênea do que as florestas temperadas, para o manejo das quais foi criada quase toda a tecnologia florestal disponível no mundo hoje. Na Amazônia dos cerrados, precisamos de indústrias que transformem os produtos agropecuários e minerais e que, sob o regime adequado de incentivos, sejam capazes de subir na escala de valor agregado. O sexto eixo é a organização do transporte multimodal na Amazônia, de tal maneira a resolver os problemas logísticos na região e apontar o caminho para o país, integrando os elementos rodoviário, ferroviário e hidroviário. 7 - E a meta de qualificação do nosso povo? O PAS prevê isso? O sétimo eixo tem a ver com ciência e capacitação. Um grande avanço científico para abordar este vasto laboratório natural que é o bioma amazônico. E uma solução para o problema crucial do ensino brasileiro hoje, que é a escola média. Uma nova escola média que combine o ensino geral, porém de orientação analítica e capacitadora, com um ensino técnico e profissional que não seja apenas o antigo ensino vocacional e especializações rígidas. 8 - No seu entender, desenvolvimento e preservação caminham juntos. Como conciliar as duas questões? Veja, nós temos na Amazônia, hoje, quatro grandes problemas subjacentes que não são enfrentados ou sequer des-
critos. Precisamos enfrentá-los com clareza e coragem. O primeiro problema é que nós construímos, ao longo do tempo, uma série de proibições legais para as atividades produtivas. No Bioma Amazônico em sentido estrito e na Amazônia Legal como um todo. Isso é um esforço admirável. Nós não encaramos a Floresta Amazônica como fronteira agrícola. Nós estamos determinados a preservá-la. Mas temos de ter certeza de que o regime legal seja um regime factível, não seja só para aparecer, mas para de fato ser executado. Se somássemos todas as proibições legais, de acordo com alguns cálculos, sobraria muito pouco espaço, tanto no Bioma Amazônico como no Cerrado, para atividades produtivas legítimas. Há cálculos - eu considero exagerados - que dizem que, no bioma, seriam menos de 7% e, na Amazônia Legal como um todo, menos de 13%. A primeira preocupação, portanto, é a seguinte: precisamos de um regime legal que não fique apenas no papel, ou seja, ter certeza de que o regime das leis seja um regime dentro do qual possamos viver. 9 - E quanto aos outros problemas? O segundo problema é que, de acordo com a lei, nós construímos um sistema de reservas legais. Então, na Amazônia florestada, temos 80% de reserva, 20% abertos à produção, independentemente do tamanho da propriedade. Em muitos casos, isso pode levar a uma espécie de microtabuleiro: áreas pequenas demais quer para preservação, quer para produção.
Precisamos construir, pouco a pouco, um sistema que assegure áreas coerentes de produção e de preservação. Também é preciso resolver o problema da ilegalidade maciça e retrospectiva em que foram colocadas algumas populações, em algumas partes da Amazônia, por conta dessas regras. O terceiro problema é o desnível que existe entre a relativa ineficiência econômica das atividades sustentáveis e a relativa eficiência econômica das atividades devastadoras. Enquanto persistir o desnível, continuaremos a depender de proibições legais e, inclusive, de sanções criminais para proteger a floresta. Esta é uma situação intrinsecamente precária e transitória. A única maneira de resolver esse problema é aumentar a eficiência econômica das atividades sustentáveis, passando pelo binômio tecnologia/escala. O quarto grande problema que temos na Amazônia é que, em algumas partes dela, temos um conflito, uma espécie de guerrilha, entre produtores e grupos que procuram defender os índios, os negros ou os valores da preservação. Muitos dos grupos querem que o governo federal se posicione no conflito entre eles. O que eu tenho dito é que uma solução duradoura não pode ser construída de cima para baixo, por uma imposição do governo central. Ela tem que ser construída também de baixo para cima. Somente dessa maneira faremos do Plano Amazônia Sustentável um projeto de Estado, não apenas um projeto de governo. Um projeto que possa sobreviver aos governos e ser abraçado pela Nação.
Plano Amazônia Sustentável (PAS) * Lançado em 8 de maio de 2008, por iniciativa conjunta do governo federal e dos governadores dos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, que compõem a região amazônica. * Objetivo: definir as diretrizes para o desenvolvimento sustentável da Amazônia brasileira. * Estratégico: o plano contém as diretrizes gerais e as recomendações para sua implementação, de modo a resultar em ações operacionais previstas em planos sub-regionais. * Cinco grandes eixos compõem o plano: produção sustentável com inovação e competitividade; gestão ambiental e ordenamento territorial; inclusão social e cidadania; infra-estrutura para o desenvolvimento; novo padrão de financiamento. * A coordenação do Conselho Gestor do PAS é do ministro Mangabeira Unger .
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A Amazônia
Terence Trennepohl
e as certificações exigidas no Comércio Internacional
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ue o mundo é plano1 e a globalização uma realidade, isso não mais se discute. O que importa para os mercados mais preparados é atentar para a forma socialmente responsável de participar desse processo, interagindo da melhor maneira e, se possível, servindo como exemplo no contexto econômico. A globalização não foi um processo simples e que ocorreu somente no breve século XX. Ao contrário. O século XX de breve não teve nada. Foi pautado em idéias e conceitos que remontam às antigas cidades-estados italianas, a exemplo da Veneza do século XVII. O comércio internacional já fincava suas raízes numa época em que sequer se ousava sonhar com suas dimensões atuais. A aproximação dos mercados e o consumo como fim da produção também percorreram demoradamente a obra de Adam Smith, ainda em fins do século XVIII. No palco do mercado internacional, onde os países de primeiro mundo ditam as regras comerciais, não há meio de fugir deste enredo e manter os limitados parâmetros locais, sob pena de perder, cada vez mais, espaço para os mais rápidos e competitivos. Nos primeiros momentos da globalização participaram principalmente ameri-
canos e europeus; agora, figuram nesse cenário chineses, indianos, árabes, coreanos e brasileiros, todos com parcelas significativas de mercado. Essa tendência moderna de competição pressupõe vários figurantes. Nesse contexto, a Amazônia brasileira parece não mais nos pertencer!! Ledo engano o nosso pensar em aproveitar – de maneira desenfreada e não-sustentável! – os renováveis recursos disponíveis em sua vastíssima extensão. Temos que preservar para compensar os erros do passado... pelos quais não fomos responsáveis! A globalização e a ‘institucionalização’ das relações internacionais promoveram uma integração sem precedentes ao longo do século XX, sob os auspícios de um conjunto de normas de regulação, de cunho liberal, fiscalizados por órgãos internacionais, a exemplo da Organização Mundial do Comércio – OMC. Para ingressar no mercado, e no cenário econômico internacional, o Brasil deve levar em conta algumas barreiras não-tarifárias que cercam determinados produtos. Um desses produtos é a madeira, cuja extração em larga escala, segundo o próprio Ministério do Meio Ambiente, emprega quase 2 milhões de pessoas, respondendo por quase 4% do PIB brasileiro. O que preocupa é que mais de 85% da extração de madeira no Brasil é feita irregularmente. Recentemente, porém, o aumento da fiscalização ao desmatamento ilegal está derrubando a produção ilegal da indústria brasileira de madeira. Segundo dados do IBGE, o setor madeireiro foi responsável por significativo impacto negativo nos resultados industriais. No mês de julho, a queda foi de 13,7% na produção, se comparada ao mesmo período de 2007. O aumento do desemprego chegou a 8,2%. Isso se deve, principalmente, às exigências internacionais por madeiras certificadas. No Brasil, o selo que garante a extração legal é fornecido pelo Conselho Bra-
sileiro de Manejo Florestal, o FSC. O selo FSC (Forest Stewardship Council) certifica áreas e produtos florestais. Essa certificação florestal serve para garantir que a madeira utilizada em determinados produtos foi originada dentro de processo de manejo sustentável, de forma ecologicamente correta, atendendo a toda legislação ambiental vigente. Atualmente, essas certificações internacionais buscam homogeneizar certas categorias produtivas, servindo como barreiras não-tributárias impostas pelo mercado a fim de selecionar o ingresso de produtos nos territórios de países desenvolvidos. Exemplo disso são as certificações da Organização Internacional para Padronização (comumente chamadas ISO, pois em inglês International Organization for Standardization), que servem de limitadores mercadológicos. O Brasil é representado na ISO pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT); os EUA pela American National Standards Institute (ANSI); e a Alemanha pela Deutsches Institut für Normung e.V. (DIN). A observância a esses standards deve orientar a atuação empresarial, haja vista o irreversível mundo globalizado em que se vive, pois o comércio internacional virou prática corriqueira para qualquer consumidor em potencial. Assim, participar e, principalmente, ter padrões de competitividade, pressupõe adequação à ordem mundial. Num futuro não muito distante, somente produtos com certificação de origem ambientalmente correta terão espaço no competitivo comércio internacional. 1 Referência ao best seller “O Mundo é Plano”, de Thomas Friedman.
Advogado de Martorelli e Gouveia Advogados Professor da UFPE Mestre e Doutorando em Direito (UFPE) E-mail: tdt@martorelli.com.br Neo Mondo - Setembro 2008
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Social
A Criança na agenda
da
amazônia
Um esforço para incluir a criança na pauta de prioridades Liane Uechi
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Amazônia Legal Brasileira vem sendo motivo de repercussão nos meios de comunicação de todo o mundo, que volta seu olhar e preocupação para esse ponto verde do planeta. Mas nem só de florestas, minérios, riquezas
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e biodiversidades é feito esse lugar. Há gente ali no meio. Brasileiros de muita dignidade e que vivem diante de desafios que grande parte do país e do mundo nem imagina. A criança talvez seja uma peça fundamental nesse contexto, pois é
a representação óbvia do futuro da região. Garantir seus direitos fundamentais é algo ainda mais complexo, em função das especificidades do local. O Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância, desenvolve na região um trabalho que objetiva incluir
PaulaLyn Carvalho
VOTE
a criança e o adolescente na Agenda de prioridades da Amazônia. A “Agenda Criança Amazônia” é um processo de mobilização social, onde foram convidados nesse primeiro momento, 70 municípios dos estados do Amazonas, Pará e Maranhão. Ao aderir à Agenda, cada município compromete-se a melhorar, até 2012, importantes indicadores sociais, como taxa de pobreza, mortalidade infantil e materna, desnutrição infantil, registro civil, acesso ao pré-natal, gravidez na adolescência, violência e trabalho infantil, incidência de aids e malária, acesso à água potável, acesso e permanência na escola, entre outros. DIREITOS FUNDAMENTAIS Quando se fala em direito à escola em qualquer outra região do país, são discutidos aspectos como número de vagas, quali-
dade de ensino, equipamentos adequados, merenda, transporte escolar, etc. Conforme explicou o coordenador do UNICEF Belém, Fábio Moraes, na Amazônia Legal a preocupação antecede essas questões e esbarra muitas vezes na impossibilidade de deslocamento por via terrestre, o que impõe a várias comunidades uma vida de isolamento, sem acesso sequer a informações básicas e onde o principal meio de transporte é a tradicional embarcação pluvial. “Os conceitos precisam ser repensados sob a ótica do lugar” – explicou ele. “No estado do Pará, a viagem de algumas cidades até Belém, por exemplo, podem levar cerca de 19 horas de barco” – disse Moraes. Nesse esforço de entender os desafios locais, a Unicef identificou problemas como as condições das embarcações utilizadas no transporte de crianças. “Precisamos considerar os cuidados de segurança, evitando
Fernando Gomes
PSDB PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA
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VEREADOR
PaulaLyn Carvalho
Social
novos casos de escalpelamento de crianças (cujos cabelos e couro cabeludo são arrancados após serem tragados pelos motores das embarcações)” - explicou. O exemplo que pode parecer exótico para as demais regiões do país é uma mostra de como os problemas precisam ser encarados, analisados e combatidos de forma singular. OPERACIONALIZAR AS IDÉIAS Moraes traz na bagagem experiência semelhante desenvolvida há quatro anos no Semi-árido brasileiro. Ele explica que é um trabalho de mobilização social com a participação efetiva dos atores envolvidos. Isso significa colocar num mesmo espaço de discussão, autoridades constituídas, entidades e, sobretudo, membros das diversas comunidades. Para ele, definir metas, estabelecer soluções é muito bonito no papel, mas a operacionalização disso só é possível com o envolvimento de toda a sociedade local.
Entra ai a metodologia da Unicef, onde o grande mérito está em esclarecer e tornar acessíveis informações antes inatingíveis para a população. Dessa forma, oferece a mais poderosa ferramenta social: o conhecimento. Com a apresentação de forma didática, as comunidades passam a conhecer sua situação e a entender que fazem parte das soluções. “O Unicef tece redes e oferece condições para que eles próprios encontrem suas saídas” – afirmou. Moraes esclareceu que são definidos articuladores, pessoas da comunidade, que fazem a ponte entre a população, autoridade e instituições. Nesses encontros estabelece-se o diálogo, onde todos podem ser ouvidos e onde todos passam a ser coresponsáveis pelas melhorias e soluções. CONTROLE SOCIAL Exemplificando, cita a questão do orçamento municipal. “Sem conhecimento técnico, um cidadão comum não consegue
Como Vive a Criança na Amazônia Nove milhões de crianças e adolescentes vivem na Amazônia Legal Brasileira, representando praticamente 40% da população da região – a mais jovem de todo o País. Ao lado do Nordeste, a Amazônia tem hoje os piores indicadores sociais brasileiros, apesar dos avanços nos últimos anos. Enquanto o nível de pobreza das crianças e dos adolescentes – aqueles que vivem com famílias com renda per capita de menos de ½ salário mínimo mensal – é de 50% para o Brasil como um todo, esse percentual sobe para 61% na Amazônia Legal Brasileira, chegando em alguns Estados da região a superar 65% (IBGE, 2006).
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Com a taxa de mortalidade infantil o quadro repete-se: na Região Norte, 25,8 crianças morrem antes de completar o primeiro ano de vida em cada grupo de mil nascidas vivas, sendo que a média brasileira é de 24,9 e da região Sul é de 16,7. Em relação ao direito de aprender, a disparidade também permanece: os Estados da Amazônia ainda têm as menores proporções de crianças em creches e pré-escolas, respectivamente, 8% e 64,2%. Nessa região, mais de 92,2 mil adolescentes são analfabetos e cerca de 148 mil crianças e adolescentes, entre 10 e 14 anos, estão fora da escola. Fonte: Unicef
entender o orçamento de um município. O que fazemos é decodificá-lo e torná-lo claro para as pessoas” – revelou Moraes. Assim é feito com todos os demais dados e indicadores que envolvem aquela comunidade. São índices de mortalidade, de analfabetismo, de moradia, de renda, etc. Segundo ele, quando uma pessoa que não sabe sequer ler passa a entender a situação do lugar onde vive, tudo muda! Tudo se transforma! “Ela passa a participar como co-responsável pelos esforços dessa melhoria. Passa a ter um sentimento de pertencimento àquele lugar” – afirmou. Para ilustrar essa compreensão, cita o caso da depredação de escolas e patrimônios públicos, comum a todo país. Quando a comunidade percebe o quanto isso custa e o quanto isso impede a aplicação de recursos para outras necessidades, passa a atuar nessa situação. Da mesma forma, na limpeza pública, cujo custo pode ser reduzido com uma nova postura da população. São exemplos simples que servem aos demais aspectos e que permitem, segundo Moraes, o controle social, que deixa de ser responsabilidade exclusiva da autoridade governamental. As ações junto a essas comunidades também procuram resgatar a história do lugar e os contadores dessas histórias, pessoas que precisam ser valorizadas e que geram à comunidade um acréscimo de auto-estima. Para o Unicef, o mais importante é conseguir com essa mobilização, garantir melhores condições para a criança e o adolescente e desenvolver competências locais para a solução dos inúmeros problemas. “Quem mais conhece do lugar, são as pessoas do lugar” – enfatiza o coordenador.
Selo Unicef Município Aprovado Em 2009, será lançado o Selo Unicef Município Aprovado, na Amazônia. Depois de um período de acompanhamento, os municípios que demonstrarem avanços na garantia dos direitos da criança e adolescente receberão esse reconhecimento do UNICEF. O Selo já é utilizado no Semi-Árido Brasileiro e funciona como um motivador na busca por melhorias contínuas nas políticas públicas.
Sem direitos
teen palavra
Básicos
por Marina Mergulhão Luiz
Sem documentos de identificação, crianças na Amazônia são invisíveis para a sociedade.
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ados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) apontam que os indicadores sociais, que são estatísticas sobre aspectos da vida de uma nação que, em conjunto, retratam o estado social dessa nação e permitem conhecer o seu nível de desenvolvimento social, como taxa de pobreza, de analfabetismo, mortalidade infantil e materna, registro civil, desnutrição infantil, acesso ao pré-natal, gravidez na adolescência, violência e trabalho infantil, incidência de aids e malária, acesso à água potável, acesso e permanência na escola, entre outros, mostram que ainda há muito o que se fazer pela Amazônia. Um exemplo é a taxa oficial de crianças pobres na região de 61% enquanto a média nacional é de 50,3%. O que é contraditório, pois é a região mais rica em biodiversidade do planeta. Em maio desse ano, a Unicef criou uma proposta de compromissos, denominada Agenda Criança Amazônia 2009-2012, para mobilizar os governos e sociedade civil com a intenção de priorizar crianças e adolescentes da região na construção de políticas públicas e participação na preservação e desenvolvimento sustentável da região. Desta forma, assegura a conquista de um presente e um futuro mais digno e sustentável.
alho
PaulaLyn Carv
A etapa inicial envolve 70 municípios do Amazonas, Maranhão e Pará e pretende até 2012 atingir todos os municípios dos nove Estados (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins). Por meio de minhas pesquisas para a construção desse texto, pude perceber mais uma vez, o quanto nosso país é marcado por profundas desigualdades sociais, enquanto eu tive e tenho meus direitos básicos garantidos, e meu lugar na sociedade, há muitas crianças e adolescentes que não tiveram a primeira garantia de cidadania e seus direitos como brasileiros, a Certidão de Nascimento, documento
que permite o acesso do cidadão em todos os serviços públicos, ou seja, sem eles, são invisíveis para a sociedade. Termino com a frase do discurso da representante do Unicef no Brasil, Senhora Marie-Pierre Poirier, Fórum de Governadores da Amazônia, “ O futuro melhor que todos desejamos, certamente será conseqüência do agora. Por isso o nosso tempo é o presente. Queremos e precisamos avançar já.” Marina Mergulhão Luiz Tem 15 anos, está cursando o 1º Ano do Ensino Médio do Colégio Singular
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Social
Povos
da Floresta
Isolados dos grandes centros, populações tradicionais tentam fazer valer a Constituição. Livi Carolina
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ntre a imensidão das árvores, dos rios e dos animais na Floresta Amazônia existe muito mais do que os olhos podem ver através de vídeos, fotos e livros - como é conhecida pelo restante do Brasil. Ali habitam populações que têm suas raízes arraigadas àquela região, longe dos grandes centros, da tecnologia e muitas vezes, à margem da cidadania, essa população ainda precisa lutar por direitos fundamentais, assegurados na constituição. Comunidades remanescentes de povos indígenas e quilombolas e inúmeras comunidades locais caiçaras, babaçueiros, jangadeiros, ribeirinhos/caboclo amazônico, ribeirinhos/caboclo não amazônico (varjeiro), sertanejos/vaqueiro, pescadores artesanais, extrativistas, seringueiros, camponeses, dentre outros compõem um rico mosaico de diversidade cultural, social e étnico. Há 1500 anos os indígenas somavam um número incerto, mas grandioso, en34
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tre um e dez milhões de habitantes. Hoje, segundo dados da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, vivem cerca de 460 mil índios, distribuídos entre 225 sociedades indígenas, sendo aproximadamente 0,25% da população brasileira. Redução que se deu pela contração de doenças antes desconhecidas, pela miscigenação e pelos constantes conflitos por seus direitos e terras. Batalha que persiste até os dias atuais. Conforme explica a antropóloga Alcida Rita Ramos, em sua publicação Sociedades Indígenas, “para os povos indígenas, a terra é muito mais do que simples meio de subsistência. Ela representa o suporte da vida social e está diretamente ligada ao sistema de crenças e conhecimento. Não é apenas um recurso natural - e tão importante quanto este - é um recurso sócio-cultural”. É da terra que os nativos retiram sua subsistência, para tanto, é necessário demarcar o território, direito registrado na
Constituição Federal de 1988, na qual se determina que é dever da União resgatar uma dívida histórica com os primeiros habitantes destas terras, propiciar as condições fundamentais para a sobrevivência física e cultural desses povos e preservar a diversidade cultural brasileira. No entanto, fora do papel, a morosidade provocada pela burocracia governamental na execução direta das ações nas áreas indígenas, a falta de preparo das comunidades e o preconceito, que ainda permeia a sociedade brasileira, impedem que a legislação seja aplicada nessas comunidades. “Um dos maiores problemas que o povo indígena enfrenta é a mentalidade discriminatória e antiga de que, por causa da nossa cultura diferente, somos inferiores e por isso, discriminados. E infelizmente, muitas vezes, aqueles que fazem com que a lei seja cumprida, também pensam assim” – declara o responsável geral pela
Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão – COAPIMA, Lourenço Krikati. Segundo Krikati, em função desta discriminação, não há pudor em invadir as terras que já foram homologadas, para exploração da madeira e pesca predatória. Além disso, não há fiscalização para garantir a proteção destas reservas. “O que as pessoas não entendem é que não só dependemos da terra para sobreviver, como também conhecemos e cuidamos dela. Durante anos éramos nós nesta terra e mesmo caçando e explorando nunca a destruímos. Então, quando defendemos o nosso espaço, defendemos também a natureza em favor de todos” – destaca o indígena. Uma das críticas às reivindicações dos nativos é que a área solicitada representa “muita terra para pouco índio”, mas Krikati rebate dizendo que, mesmo restrito à sua área de direito, o entorno interfere em sua subsistência. Ele diz que geralmente as áreas vizinhas fazem cultivo de soja, eucalipto e outros, e o fazem utilizando agrotóxicos contaminando o solo e a água dos rios, que percorrem as suas terras levando doenças à comunidade. “E estamos isolados, na maioria das aldeias não chega o atendimento à saúde” – ressalta. Investimento na educação Para reverter este quadro, a COAPIMA tem investido, junto aos governos estaduais, para promover a educação de melhor qualidade nas aldeias. “Temos que ter um ensino diferenciado, que valorize também a nossa cultura, a nossa história e a nossa língua, para que os nossos jovens dêem
continuidade às tradições indígenas. Mas também tenham base para lutar por nossos direitos, formando profissionais como advogados, juízes, promotores...” – declara Krikati. Segundo ele, hoje existem 2.600 indígena nas faculdades. Outros povos A Amazônia também abriga outras populações que enfrentam problemas similares aos dos indígenas, como os quilombolas, descendentes de negros escravos que vivem nos chamados Quilombolas ou Quilombos, cujo maior desafio é a permanência nas terras dos seus ancestrais. De acordo com o responsável geral da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ, Francisco da Conceição, conhecido como o Diomar, boa parte das terras que são requeridas hoje pelos negros foram heranças deixadas pelos senhores das fazendas. Porém, os documentos que comprovariam isto não foram regularizados, por falta de conhecimento da comunidade e deixaram de ter validade, permitindo a invasão e posse de fazendeiros e empresas. “A fazenda onde é a minha comunidade, Santa Maria dos Pretos/Itapecurumirim, foi doada aos nossos antepassados pela sinhazinha da fazenda. Na época eram 82 negros e 13 mil ha, hoje temos somente 6.602 ha” – ressalta o coordenador. Assim, como os indígenas, os quilombolas retiram da terra sua subsistência e também lutam por diretos fundamentais: alimentação, moradia, saneamento básico e educação.
Conheça os termos que designam algumas populações tradicionais: • Babaçueiros: Extrativistas que têm como base de subsistência a exploração do babaçu, uma espécie de palmeira oriunda do Norte do Brasil; • Caboclos: mestiços de negros e índios que vivem em comunidades rurais; • Caiçaras: mestiços de índios e portugueses. São pescadores tradicionais; • Seringueiros: Sua principal atividade é a extração do látex, matéria-prima da borracha, embora possam também praticar alguma agricultura e criação de gado. As primeiras Reservas Extrativistas criadas no País foram em grande parte resultantes das ações dos seringueiros; • Quebradeiras de Coco: Mulheres de comunidades extrativistas do Maranhão, Tocantins, Pará e Piauí que coletam e quebram o coco da palmeira de babaçu, utilizando para a produção de óleo e sabonete de coco, por exemplo. Fonte: Almanaque Brasil Socioambiental
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AMAZONAS: do mito greco-romano às lendas do novo mundo
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uase meio século após o grande feito de Colombo, o Frei Gaspar de Carvajal atravessava por sua vez o Mar Tenebroso, vindo da Espanha para fundar o primeiro convento dominicano em terras do Peru. Dirigindo-se a Lima, a fim de defender interesses de sua Ordem, encontrou-se com Gonzalo Pizarro, que por ali passava em direção a Quito, no Equador, aonde ia tomar posse do governo. Esse encontro quase acidental marcaria a vida do religioso, fazendo que seu nome ficasse para sempre ligado à história da Amazônia. Integrado à comitiva do irmão de Francisco Pizarro, o famoso aventureiro espanhol, conquistador do Império Inca, o Frei de Carvajal, acabaria tornando-se o cronista oficial da primeira expedição a percorrer o rio Amazonas, desde os Andes até o Oceano Atlântico. Ao assumir o governo de Quito, em 1541, Gonzalo tinha em mente explorar as vertentes orientais dos Andes, em busca do lendário país do Eldorado ou, pelo menos, do reino da canela, especiaria de grande valor comercial no século XVI. Havia-se juntado à cobiçosa campanha do Governador o grupo do capitão Francisco de Orellana, que já tomara parte na conquista do Peru. Mas quando, no final daquele ano, concluíram a penosa travessia dos Andes gelados, não encontraram nem ouro nem canela que pudessem compensar os desastres da emprei-
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tada. A espantosa mata espessa não revelava sua riqueza aos exploradores exaustos e famintos. Gonzalo Pizarro determinou que construíssem um barco para navegar o rio a procura do que comer. Orellana e mais cinqüenta e sete homens partiram, então, rio abaixo, no barco e em canoas, com o propósito de retornar tão logo encontrassem alimentos. Entre eles estava o Frei Gaspar, que registrou em seu diário uma viagem só de ida rumo à foz do rio mais importante do planeta pelo volume de suas águas. Do Coca ao Napo, do Napo ao Ucayali, no Brasil chamado Solimões, foram descendo, arrastados pela violência da corrente, e desistiram de tentar a volta. Diante da penúria de alimentos, chegaram a comer os próprios cintos e as solas dos sapatos cozidos com algumas ervas. Ao atingir a confluência do rio Madeira, de acordo com o relato do cronista dominicano, foram atacados por Amazonas, em junho de 1542. Revivia-se assim, no coração da selva tropical recémdescoberta pelos europeus, o antigo mito das mulheres guerreiras. Na Antiguidade Clássica, as Amazonas eram mulheres que governavam-se a si mesmas, excluindo os homens de seu convívio. Encontravam-se ao norte da Grécia, nas vizinhanças do Ponto Euxino, como era chamado o atual Mar Negro. Conta-se que, de vez em quando, elas uniam-se a estran-
geiros apenas para garantir a preservação da própria raça, educando as meninas em seu meio e renegando cruelmente os filhos do sexo masculino. Exímias caçadoras, adoravam a deusa Ártemis ou Diana. Sempre belicosas, seriam descendentes do deus da guerra, Ares ou Marte. Em compensação, por outro lado, eram vistas também como provindas da ninfa Harmonia. Costumavam combater montadas a cavalo, mas não era raro comparecerem a pé nos campos de batalha. Vestiam peles de animais ferozes, que, lhes caindo até o joelho, estavam presas ao ombro esquerdo, deixando a nu a parte direita de seus corpos. Usavam escudos em forma de meia lua, a qual, como se sabe, é símbolo universal da feminilidade. E diz-se que, para melhor manejar o arco e a flecha, bem como a lança e o machado, armas em que eram destras, cortavam um dos seios, fato que explicaria o nome que as caracterizava – do grego, a-mazon, “sem seio” (muito embora, nas obras de arte apareçam sempre de busto perfeito). Jovens e belas, algumas rainhas Amazonas ficaram famosas na literatura mitológica dos antigos gregos e romanos. Pentesiléia, liderando um contingente de guerreiras, socorreu Tróia, na peleja contra os gregos. Distinguiu-se não menos pela coragem do que pela formosura. Foi morta por Aquiles, que, ao vê-la ferida,
PaulaLyn Carvalho
Márcio Thamos
por ela apaixonou-se. Hipólita usava um cinto, presente do próprio deus da guerra, que simbolizava o poder que ela tinha sobre o povo das bravas mulheres. Hércules foi incumbido de roubar-lhe este cinto, na seqüência de aventuras conhecida como “os doze trabalhos”. De bom grado, já se dispunha a rainha a entregar-lhe o que queria, quando levantou-se uma rixa entre as Amazonas e a comitiva do herói. Imaginando-se traído, Hércules matou Hipólita. O relato do Frei Gaspar de Carvajal sobre a aparição das Amazonas em terras brasileiras, ao tempo das Grandes Navegações, mexeu com a imaginação do colonizador europeu, afeito à tradição clássica: “Essas mulheres são muito brancas e altas, têm cabelo muito comprido, entrançado e enrolado na cabeça, são muito robustas e andam nuas em pêlo, tapadas as vergonhas, com seus arcos e flechas nas mãos, fazendo tanta guerra como dez índios; e, em verdade, houve uma delas que encravou um palmo de flecha num dos bergantins, e outras pouco menos, de modo que nossos barcos pareciam porcoespinho” – registrou em seu diário o Frei, que na aventura teve um olho vazado por uma flecha. Nesse mesmo escrito, Carvajal informa que eram dez ou doze as Amazonas que por eles foram vistas, sendo que sete ou oito delas foram mortas na batalha. E acrescenta detalhes a respeito de seus cos-
tumes, que teriam sido fornecidos por um índio então capturado. O capitão Orellana lhe perguntava que mulheres eram aquelas, e o índio ia dizendo que eram mulheres que moravam terra adentro, a sete jornadas da costa. Eram casadas? O índio disse que não. E como viviam? Recebendo tributos de muitas províncias vizinhas, que a elas estavam sujeitas. Eram muitas? Sim, e contavam, segundo sabia, setenta povos. Povos de palha? Não, mas de pedra e com portas; e estavam ligados uns aos outros por caminhos bem guardados, de modo que ninguém pudesse entrar em seu território sem lhes pagar direitos; e pariam, pois se uniam aos índios de tempos em tempos, e se tinham filhos, lhes matavam, e se filhas, lhes criavam nas coisas da guerra; tinham uma rainha chamada Conhori, e muita riqueza em ouro e prata; e templos adornados, onde adoravam o Sol; e andavam vestidas com roupas de lã muito fina; e possuíam animais como camelos e outros do tamanho de cavalos; e tinham nessa terra duas lagoas de onde tiravam sal; e uma lei que, ao pôr-do-sol, não havia de quedar-se índio macho em suas cidades... Um índio decerto bem falador esse que era interrogado pelo capitão. Mesmo na época houve quem considerasse um disparate o que disse Frei Gaspar sobre a existência de Amazonas naquele rio. E, hoje, os mais céticos acreditam que
a expedição foi atacada por índios de cabelos compridos, cuja aparência fez supor aos forasteiros que se tratava de uma tribo de mulheres guerreiras. Mas o fato é que a lenda se espalhou e aquele que era chamado o “Mar Doce”, passou a ser conhecido como o rio das Amazonas, derivando-se daí não só o nome da floresta como o de toda a região. Em 26 de agosto de 1542, aproximadamente um mês depois do incidente fabuloso que marcou a travessia completa do Amazonas, Orellana e mais quarenta e oito sobreviventes atingiam afinal a foz do imenso rio, adentrando no Atlântico pelo Pará. Há quem queira imaginar que Orellana não fechou de mãos vazias a aventura. Embora sem ouro e sem canela, haveria de ter levado consigo um Muiraquitã, a pedra verde da felicidade que, segundo a lenda, as Amazonas entregavam àquele que, a cada ano, com elas tinham parte, ficando assim protegido de todo malefício.
Doutor em Estudos Literários. Professor de Língua e Literatura Latinas junto ao Departamento de Lingüística da FCL-UNESP/CAr. Coordenador do Grupo de Pesquisa LINCEU – Visões da Antiguidade Clássica.
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Cultura
Os Bois-Bum
Pari
A Ilha deixa o clima provinciano para viver dias de Livi Carolina
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os três últimos dias de junho, Parintins deixa de ser uma pacata cidade marcada pela simplicidade de seu povo, cuja economia baseia-se na pesca, na agropecuária e no comércio, para dar lugar a uma das maiores festas
populares do País, o Festival Folclórico de Parintins, mais conhecida como a Festa dos Bois-Bumbá . Nesses dias, os protagonistas da folia, os bois Garantido (vermelho e branco) e Caprichoso (azul e preto), dividem
Karyne Medeiros, porta-estandarte do Boi Caprichoso.
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corações e proporcionam ao povo parintinense momentos de euforia ao deixar a calmaria do anonimato para dar espaço à exaltação do meio ambiente, às suas raízes culturais e à criatividade que transformou uma lenda nordestina em roteiro cultural internacional. Quem acompanha de longe esta festa não consegue compreender o que acontece em Parintins. A população da cidade entra em estado de êxtase: casais de torcidas contrárias se separam, quem torce por um Bumbá não pronuncia o nome do outro - chama-o apenas por “contrário”, pessoas pedem demissões para aproveitar a festa. Mas o fanatismo não pára por aqui: os jurados são sorteados na véspera do Festival e todos vêm de outros estados e, para evitar favoritismo, a cor da tinta da caneta usada por eles durante a votação, é verde. Até mesmo uma multinacional do ramo de refrigerantes, principal patrocinadora do evento, cujo invólucro é vermelho, entrou no ritmo da Ilha e fabricou uma em-
bás de
ntins glamour durante o festival dos Bois. balagem especial em azul para também agradar os ‘caprichosos’. Para a porta-estandarte do Bumbá Caprichoso, Karyne Medeiros, o Festival Folclórico de Parintins é a representação dos costumes e tradições de um povo que tem orgulho de sua cultura e de ser caboclo. “É acima de tudo uma festa passional, o amor e o ódio em luzes, cores e espetáculo, que cresceu muito nos últimos anos, mas conservou sua essência primordial que é o amor por um boi e por uma cor” - declara. A antiga Ilha Tupinambarana, com apenas 7.042 km², 102.044 mil habitantes e com distância de aproximadamente 400 Km de Manaus, onde só é possível chegar via área, com uma hora e meia de viagem, ou de barco, após uma aventura que pode durar entre 8 e 24 horas, a cada edição do Festival, chega a receber cerca de 80 mil turistas, 30% estrangeiros. O Bumbódromo - Centro Cultural e Esportivo Amazonino Mendes, construído especialmente para o Festival, com espaço
para 35 mil espectadores sentados, fica lotado de brincantes ansiosos para assistir a ópera dos Bois. De acordo com a coordenadora da Secretaria de Turismo de Parintins, Carla Garcia, o evento é considerado a segunda maior festa cultural do Brasil, tendo os artistas dos Bumbás uma participação significativa na condução artística do carnaval do Rio de Janeiro e São Paulo. “O Festival Folclórico já representou o Brasil em diversos Eventos na América e Europa. Desta forma o Festival é a maior fonte de renda e Marketing do Estado do Amazonas e do Município de Parintins” – destaca. Ópera a céu aberto Baseada na história do Bumba-meuboi, trazida do Maranhão pelos imigrantes da época da borracha, o espetáculo a céu aberto acrescentou à lenda maranhense personagens de sua cultura. Com três horas de duração, durante as três noites do Festival, cada Boi conta
de forma e enfoque diferente a lenda de Mãe Catirina, que grávida deseja comer língua de boi. Com medo de que seu filho não nasça, Pai Francisco mata o boi preferido do dono da fazenda para satisfazer o desejo de sua esposa. Ao descobrir o que havia acontecido, o fazendeiro manda seus empregados prenderem Pai Francisco e pede a um pajé para ressuscitar o boi. O boi renasce e se inicia a grande festa. A apresentação é baseada na lenda, mas cada boi tem um tema a desenvolver. “O Futuro é Agora” foi o tema campeão de 2008 apresentado pelo Bumbá Caprichoso e “O Boi da Preservação” foi o mote desenvolvido pelo Garantido. Dividida em autos encenados através de personagens, rituais e lendas que remetem aos habitantes da floresta amazônica e às questões ecológicas e sociais que os afligem, os mestres de cerimônia apresentam os astros da festa, que fazem suas evoluções sob o controle do “tripa” (homem que manipula o
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Cultura
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Só de falar me arrepio. É algo fora do comum. Emociona, as lágrimas caem, você dança, grita, curte e vive intensamente a cada ritual, a cada toada, a cada noite... É inesquecível
boi), embalados pela toada (música que dá o tom da festa, tocada por mais de 250 tambores). Durante a encenação, as tribos de dançarinos formam um tapete de cor em movimento, junto com as gigantescas alegorias, que se mexem e se articulam, construindo um cenário apoteótico para a apresentação das figuras de destaque na história parintinense: a graciosa Cunhã-poranga, a rainha do folclore, a porta-estandarte, a sinhazinha da fazenda e o poderoso pajé. Mas o ápice da encenação é a aparição do boi, que emociona e tira lágrimas da galera. Silvia Padilha, uma amazonense que mora em São Paulo há 13 anos, tenta descrever esta emoção: “Só de falar me arrepio. É algo fora do comum. Emociona, as lágrimas caem, você dança, grita, curte e vive intensamente a cada ritual, a cada toada, a cada noite... É inesquecível”. No entanto, mesmo com tamanho envolvimento com a encenação, durante a apresentação são proibidas vaias, palmas, gritos ou qualquer outra demonstração de expressão quando o “contrário” se apresenta. Este respeito, segundo o Coordenador de Cultura, Eduardo Gomes, acontece porque um boi se prepara para o outro. “Um Bumbá não existiria sem o outro. Houve uma época em que outros bois tentaram se apresentar, mas não conseguiram agradar o público, que já nasce e cresce, tradicionalmente, com o coração vermelho ou azul” – diz. Karyne Medeiros, completa: “Nos respeitamos muito nos bastidores, é uma relação amistosa, tenho amigos e familiares “contrários” e a rivalidade chega até a ser um tempero nessas relações”.
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Particularidades da Festa dos Bois-Bumbá
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• Apresentador: Mestre de cerimônia, que apresenta todo o espetáculo e anima a Galera. • Amo do Boi: É o dono da fazenda e pai de Sinhazinha. Ele exige que seus vaqueiros cuidem e protejam seu boi. No Festival de Parintins, entoa versos exaltando o boi. • Batucada: Nome dado aos músicos do Boi Garantido. • Cunhã-Poranga: A mulher mais bela da tribo, que encanta o coração dos guerreiros indígenas; sacerdotisa. Cunhã Poranga: Moça bonita - cunhã = moça, poranga = bonita. • Curral: Local onde acontecem os ensaios. Cada um dos Bois tem o seu próprio curral, o da Batucada - Garantido e o da Marujada - Caprichoso • Evolução: Quando o boi de pano está se apresentando, na arena do Bumbódromo. • Galera: Torcida organizada de cada um dos bumbas. Parte integrante do Boi, também é julgada no quesito animação. De acordo com o regulamento, durante a apresentação de um boi, a torcida contrária deve ficar em completo silêncio. • Jurados: Os jurados são sorteados na véspera do Festival e todos vêm de outros estados. O requisito é ser estudioso da arte, da cultura e do folclore brasileiro. Eles também fazem parte da festa: a caneta utilizada por eles não pode ser azul ou vermelho. Para evitar favoritismo, a cor da tinta é verde. • Marujada de Guerra: Nome dado ao conjunto de músicos que acompanha a evolução do Boi Caprichoso. • Pajé: Chefe espiritual das tribos indígenas. No Festival de Parintins, durante a evolução do Bumbá, o Pajé é o índio feiticeiro, uma das figuras mais importantes da apresentação - figura central no ritual do boi -, que por meio da pajelança, conjunto de danças e invocação de espíritos, encontra a receita para a cura. • Ritual: Cerimônia conduzida pelo Pajé. É o ponto mais esperado da apresentação quando fogos de artifício e efeitos luminosos irrompem no Festival. Geralmente apagam-se as luzes do bumbódromo enquanto os participantes, que assistem o espetáculo, acendem candeias -pequenas luzes - proporcionando um espetáculo à parte. Originalmente, o objetivo era ressuscitar o Boi morto. Na temática indígena do Festival de Parintins, este é o momento que o Pajé luta contra as forças do mal. • Sinhazinha da fazenda: A filha do Amo, dono da fazenda. A moça bonita, considerada o mimo da casa, é uma das figuras tradicionais do Boi bumbá e sempre um dos destaques da evolução. A coreografia inclui um movimento em que ela coloca as mãos sob o rosto, espalmadas para baixo, dando-lhe extrema graciosidade. • Tribos: Dezenas de Tribos Masculinas e Femininas, com suas cores vibrantes, compõem um cenário tribal delirante, de coreografias deslumbrantes.
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Esporte
e f r u Sna selva A pororoca é a responsável pela nova modalidade do surfe e tem atraído turistas de todo o mundo para a região. Livi Carolina
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uve-se um barulho estridente e inconfundível. É a luta entre a água doce que corre forte pelas curvas do rio, contra a imensidão do mar. Após um período, finda o barulho e logo se pode ver o mar enfurecido empurrando o rio, que sobe resistente em direção à sua nascente, dando origem à pororoca. Nesta batalha entre as águas, formam-se ondas que podem chegar a até 6 metros, a uma velocidade de aproximadamente 30 km/h. Um paraíso para corajosos surfistas que ousam conhecer de perto um dos mais temidos encantos da natureza Amazônica. Formada pela mudança das fases da lua, mais intensamente nos períodos de lua cheia e nova, ela aparece diariamente apenas uma vez durante cinco dias, o que a torna ainda mais almejada. Intrigante e perigoso, desde 1997, quando Guga Arruda (SC) e Eraldo Gueiros (PE), surfaram pela primeira vez a pororoca no rio Araguari (AP), o fenômeno tem atraído surfistas de todo mundo que desejam sentir a adrenalina de deslizar sobre o duelo do rio contra o Atlântico. 42
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Para Serginho Laus, recordista mundial de permanência na pororoca, a sensação é incrível. “Estamos no meio da floresta, em um fenômeno que proporciona percorrer distâncias nunca imaginadas antes. Essa é a onda mais longa do mundo e surfar por 15 ou 30 minutos, sem parar, é comum. Mistura adrenalina com medo e ansiedade com alegria”.
De aventura à competição Dois anos após a pororoca ser surfada pela primeira vez, foi no município de São Domingos do Capim, a 130 quilômetros de Belém onde a prática se consolidou como Surfe na Pororoca. Desde então, a Secretaria de Estado de Esporte e Lazer - Seel, em parceria com a prefeitura de São Domingos do Capim, organiza o Festival de Surfe na Pororoca que acontece no primeiro semestre
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do ano e busca valorizar o esporte e a cultura da região. Durante o Festival são classificados apenas os atletas locais que garantem vaga no Circuito Nacional de Surfe na Pororoca. Segundo o secretário de Esporte e Lazer do Pará, Carlos Alberto da Silva Leão, a prática do surfe abriu caminho para o turismo na região e para o incentivo de outras modalidades esportivas. “Hoje temos o Projeto Navegar que atinge cerca de 1400 crianças e adolescentes, que praticam: vela, canoagem e remo. Isso possibilita uma nova política de esporte no governo do Estado” – diz. De acordo com o responsável pela Federação Paraense de Surfe, Roberto Eduardo Bastos Lisboa, São Domingos do Capim “ganhou uma estrada de 60 km toda asfaltada e muito dinheiro é internalizado no município durante as competições.
Essa é a onda mais longa do mundo e surfar por 15 ou 30 minutos, sem parar, é comum
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Nos outros Estados acredito que esteja acontecendo o mesmo. Localidades que mal apareciam no mapa, agora têm destaque por causa da pororoca”. Laus, que também é presidente da ONG Maré Amazônia, destaca que o maior benefício para as regiões onde acontece a pororoca, foi o intercâmbio cultural entre o Brasil e mundo. Além disso, possibilita uma renda extra nos períodos de grandes marés.
Perigos É preciso ter cautela e uma equipe de apoio especializada para surfar na pororoca. Laus dá as dicas: Os principiantes devem ter um nível de surfe médio para conseguir controlar o seu equipamento (prancha) em situações de perigo, como: desviar de um pedaço de pau, tronco, plantas e etc; É preciso estar com pessoas que conhecem muito bem o local e que estejam com equipamentos de primeira qualidade para não ficar perdido no meio da floresta. Hoje em dia o surfe na pororoca está acessível para qualquer pessoa, basta estar acompanhado por profissionais dessa área para não correr riscos desnecessários.
Maré Amazônia Com o objetivo de levar uma consciência de preservação e incentivar a prática esportiva, a ONG Maré Amazônia ensina práticas sustentáveis para a população local. “Procuramos sempre levar uma consciência ecológica para a população ribeirinha, que muitas vezes não se preocupa com a questão do lixo e muito menos com a coleta seletiva” – destaca Laus. A ONG também ministra palestras sobre a importância de preservar a região do entorno da pororoca e tem treinado surfistas locais para a inclusão na nova modalidade esportiva. “O surfe na pororoca é perigoso. E por isso existe a dificuldade de adeptos mas já estou com um projeto em que podemos utilizar algumas partes da pororoca para criar um centro de treinamento e assim formar surfistas ribeirinhos. Já estou trabalhando com dois e o resultado está sendo positivo, esse experimento em breve deve se estender a outros locais. Mas hoje em dia apenas surfistas de outros estados e do exterior é que praticam com mais domínio o surfe da pororoca” – ressalta Laus. 37
RX da Ama Estatísticas apontam disparidades entre riqueza de biodiversidade e indicadores sociais. Da Redação
Abrangência: A Amazônia é a região definida pela bacia do rio Amazonas, que nasce na cordilheira dos Andes e estende-se por nove países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela e onde se localiza a maior cobertura vegetal de floresta tropical, a Floresta Amazônica. Bacia Hidrográfica: Tem muitos afluentes importantes tais como o rio Negro, Tapajós e Madeira, sendo que o rio principal é o Amazonas. Temperatura: A temperatura média anual é de 28ºC. Amazônia Brasileira: Sessenta por cento da Amazônia está em território brasileiro, em área chamada Amazônia Legal , constituída por 750 municípios distribuídos em nove Unidades Federativas: Amazonas (62), Amapá (16), Acre (22), Roraima (15), Rondônia (52), Pará (143), Tocantins (139), Maranhão (160) e Mato Grosso (141), perfazendo um total de 5.033.072 km2, o que representa 61% do território brasileiro.
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População: 24,5 milhões de habitantes correspondendo a 12% do contingente populacional brasileiro. Em cada quilômetro quadrado da região tem-se, em média, 3,3 habitantes enquanto que no restante do país essa proporção é de 21,4 habitantes por km2.
dio desenvolvimento humano, com um IDH igual a 0,705.
Diversidade social: A região é a segunda do país em registros de remanescentes de quilombos, bem como é onde se concentra a maior parte da população indígena, representando 49% do total. É também onde se encontra o maior percentual de projetos de assentamentos da reforma agrária e diversas comunidades locais, como: caiçaras, babaçueiros, jangadeiros, ribeirinhos/caboclo amazônico, ribeirinhos/caboclo não amazônico (varjeiro), sertanejos/vaqueiro, pescadores artesanais, extrativistas, seringueiros, camponeses.
Biodiversidade: • Reúne quase 12% de toda a vida natural do planeta; • Concentra 55 mil espécies de plantas superiores (22% de todas as que existem no mundo); • 524 espécies de mamíferos; • Mais de 3 mil espécies de peixes de água doce; • Entre 10 e 15 milhões de insetos (a grande maioria ainda por ser descrita); • Mais de 70 espécies de psitacídeos: araras, papagaios e periquitos; • Grande variedade de ecossistemas, dentre os quais: matas de terra firme, florestas inundadas, várzeas, igapós, campos abertos e cerrados; • Jazidas minerais de metais nobres dos mais variados tipos, acumulando recursos da ordem de US$ 1,6 trilhão.
PIB: Em 2004, o PIB da região foi de R$ 137,9 bilhões (US$ 64,7 bilhões), o que representa 8% do PIB nacional. IDH: Em 2000, a região apresentava mé-
Principais Ameaças à Floresta: Grilagem (posse ilegal de terras mediante documentos falsos), Desmatamentos, Queimadas, Atividades extrativistas pre-
zônia laudos e perícias cálculo estrutural hidráulica e elétrica datórias (madeireiras, pesca, caça ilegais e biopirataria), Expansão da fronteira pecuária e agrícola (soja, principalmente, no Mato Grosso) e Fiscalização insuficiente. Indicadores Sociais: • Analfabetismo: Entre os maiores do Brasil, em 2005 chegava a 10,3% (maiores de 15 anos) e 13% (menores de 15 anos). • Insegurança Alimentar: 35% da população da Amazônia viviam, em 2005, em domicílios onde havia insegurança alimentar média ou grave • Mortalidade infantil: 25,8 crianças na Região Norte morrem antes de completar o primeiro ano de vida em cada grupo de mil nascidas vivas, sendo que a média brasileira é de 24,9 e da Região Sul é de 16,7. • Registro Civil (Certidão de nascimento): O estados amazônicos ainda concentram as piores taxas, chegando a superar 40% em algumas regiões. • Saúde: A taxa da incidência de AIDS , em 2004, subiu dez vezes, chegando a 12,4 por 100 mil habitantes. A Amazônia responde pela quase totali-
dade dos casos registrados de malária no país. Entre 2002 e 2004, o número de casos aumentou 32% e a taxa de incidência subiu 19% na região. • Saneamento Básico: A porcentagem da população que vive em domicílios com abastecimento adequado de água aumentou de 48%, em 1990, para 68% em 2005, contra a média de 88% no resto do Brasil. A porcentagem da população que vive em domicílios com instalações adequadas de esgoto na Amazônia aumentou de 33%, em 1990, para 48%, enquanto a média brasileira é de 67%, em 2005. Somente na Amazônia, 11,7 milhões de pessoas vivem em residências sem coleta de esgoto. • Assassinatos Rurais: A Amazônia lidera casos de assassinatos rurais (60%) dos 386 ocorrências (1997 a 2006). • Trabalho Escravo: A região é campeã em trabalho escravo, com 66% dos casos. Só em 2006 foram libertadas 12 mil pessoas do regime escravo. Fontes de Pesquisa: Conservation International, IBAMA, Silvan, Câmara dos Deputados, Unicef, Imazon e Datasus
Av. Portugal, 1418 Sto. André - SP Tel: 4990-8778 www.arthca.com.br Neomondo - Setembro 2008
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Dica
Sugestões de Livros FAUNA E FLORAS BRASILEIRAS Araquém Alcântara Editora Bei Comunicão
Fauna e flora brasileiras reúne belas e impressionantes imagens de 89 espécies da fauna e da flora, acompanhadas por textos explicativos e bilíngües. Selecionadas principalmente do acervo do fotógrafo Araquém Alcântara, um dos mais importantes do país, as imagens foram produzidas em expe-
dições realizadas nos últimos cinco anos. O livro conta também com fotos do gaúcho Zé Paiva. O volume traz ainda uma relação de lugares (parques, unidades de conservação, hotéis de selva etc.) onde se pode apreciar de perto a natureza brasileira em toda sua diversidade.
A FERROVIA DO DIABO Manoel Rodrigues Ferreira Editora Melhoramentos Este livro narra a saga da construção da Estrada de Ferro Madeira- Mámore em meio à Selva Amazônica, contornando o trecho não-navegável dos rios Madeira e Mamoré. A obra, uma das mais ambiciosas e trágicas de engenharia realizada no Brasil foi a alternativa encontrada para o escoamento dos produtos brasileiros e bolivianos
para o Atlântico. Trabalhadores de mais de 40 nacionalidades vieram se aventurar nos confins da selva amazônica, no atual Estado de Rondônia. Poucos retornariam: entre 1872 e 1912, mas de 1500 operários faleceram tentando vencer a selva. Até hoje, a ferrovia é conhecida como a mais trágica da América.
A AMAZÔNIA QUE NÃO CONHECEMOS MILTON CLARO Editora Ordem dos Servos de Maria A visão dos habitantes da floresta, suas aspirações, seus desejos, seus anseios pelos direitos sobretudo com saúde e educação são mostrados nesse livro. Os amazônidas têm suas vidas entrelaçadas com a floresta, que lhes garante a subsistência. O autor diz que o mundo quer que, sozinho cada amazônida tome conta de 22 hectares de floresta, para preservá-la em
benefício dos 6 bilhões e meio de habitantes da Terra. Mas como defendê-la da exploração descontrolada do solo, da madeira, da fauna e das riquezas naturais? No livro são apresentadas diversas crônicas relatando depoimentos e que retratam uma gente alegre, de grande amor pela natureza e com uma responsabilidade instintiva de preservação do meio ambiente.
Sem dúvida A tivos Naturais: Os ativos naturais são caracterizados pelos recursos que a natureza proporciona aos seres humanos em forma in natura (produtos medicinais, frutas naturais), serviços naturais (práticas hedônicas e de recreação em um parque nacional), ou como matéria-prima (produtos da natureza a serem manufaturados) para as atividades econômicas.
de forma ecologicamente adequada, socialmente justa e economicamente viável, e no cumprimento de todas as leis vigentes.
respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema objeto do manejo.
C ooperativa:
Originário, natural, ou próprio de um país ou de uma localidade; aborígine, autóctone.
É uma associação autônoma de pessoas que se unem, voluntariamente, para satisfazer aspirações e necessidades econômicas, sociais e culturais comuns, por meio de uma empresa de propriedade coletiva e democraticamente gerida.
N ativo/Indígena:
P ororoca:
“Bio” significa “vida” e diversidade significa “variedade”. Então, biodiversidade ou diversidade biológica compreende a totalidade de variedade de formas de vida que podemos encontrar na Terra (plantas, aves, mamíferos, insetos, microorganismos...).
G rilagem:
Do tupi “Pororoka”, gerúndio de “Pororog”, que significa “estrondar”. Grande onda de maré alta que, com ruído estrondoso, sobe impetuosamente rio acima, principalmente no Amazonas.
É o processo de apropriação de terras públicas de forma ilegal por meio da falsificação de documentos ou da corrupção.
Local de refúgio de escravos no Brasil.
C ertificação:
M anejo ambiental:
B iodiversidade:
A certificação é a garantia que os produtos são oriundos de um processo produtivo manejado
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Administração da floresta para a obtenção de benefícios econômicos, sociais e ambientais,
Q uilombo: Q uilombola: Escravo ou escrava refugiado em quilombo.
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