Revista Neo Mondo - Edição 57

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Ano 7 - No 57 - Setembro/Outubro 2013

ENERGIAS ALTERNATIVAS

Exemplar de Assinante Venda Proibida

R$16,00

Rogério Cezar de Cerqueira Leite 10

Iluminado por natureza

Energia Eólica 28

Vai de vento em popa

Círio de Nazaré 38

Devoção e fé

Neo Mondo - Julho 2008

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Fi Sarcodina Filo Parasita que sobrevive ao extrair meios de um outro organismo, Pa conhecido como hospedeiro. co Este processo, conhecido como parasitismo, costuma degradar Es bastante o hospedeiro e até levá-lo à morte. ba Normalmente, ao m do processo, o parasita também morre. No

Ho Homo Sapiens Pa Parasita que sobrevive ao extrair meios de um outro organismo, co conhecido como hospedeiro. Es Este processo, conhecido como parasitismo, costuma degradar ba bastante o hospedeiro e até levá-lo à morte. No Normalmente, ao m do processo, o parasita também morre.

Imagens 4 Grupo Keystone Neo Mondo - Julho 2008


ESTÁ NA HORA DE AGIR COMO A ESPÉCIE INTELIGENTE DO PLANETA.

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Neo Mondo - Julho 2008

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Sem espaço para sequer esticar as asas No Brasil, mais de 70 milhões de galinhas poedeiras são confinadas em gaiolas em bateria, espaços tão pequenos que elas não conseguem andar, empoleirar-se ou sequer esticar as asas. Diga NÃO a esta crueldade. Acesse o nosso site para saber mais.

Proteção e respeito a todos os animais

hsi.org/compaixao 6

Neo Mondo - Julho 2008


Neo Mondo - Julho 2008

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Seções

Editorial

Perfil 10 Rogério Cezar de Cerqueira Leite Iluminado por natureza

ESPECIAL ENERGIAS ALTERNATIVAS 18 Vem da lama mas é limpa Lodo gera energia ESPECIAL ENERGIAS ALTERNATIVAS 20 Energia que vem das cinzas Usinas flutuantes

ESPECIAL ENERGIAS ALTERNATIVAS O sol brilha para todos Energia do astro rei

25 Artigo: Márcio Thamos A invenção da humanidade 26 Artigo: Dra. Dilma de Melo Silva Energia pura

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22 ESPECIAL ENERGIAS ALTERNATIVAS Energia Eólica Matéria publicada na edição no35 Vai de vento em popa Saúde

Cultura

34 Fitoterapia A medicina sustentável

38 Círio de Nazaré Devoção e fé

Cultura

41 Artigo: Humberto Mesquita Água cinza ÁGUA Solução para Cabo verde Dessalinização da água

Prezado leitor é com satisfação que preparamos mais uma edição de NEO MONDO. Nela, trazemos uma matéria especial sobre a maior manifestação religiosa católica do Brasil, o Círio de Nazaré. Anualmente, no segundo domingo de outubro, milhões de fiéis tomam as ruas de Belém do Pará (PA), para homenagear e render graças às bençãos concedidas por Nossa Senhora de Nazaré, uma comovente reunião de fé, devoção e superação. Outro destaque é o Especial Energias Alternativas, em que abordamos algumas fontes renováveis de geração de energia complementares ao modelo tradicional, tanto pela sua disponibilidade quanto por seu menor impacto ambiental. Estima-se que mais de 19% do consumo energético mundial venha hoje de fontes renováveis. Esperamos, com este especial, continuar contribuindo para a disseminação deste importante tema. E, como estamos falando do poder da natureza, o tratamento de doenças por meio de plantas medicinais também é destaque nesta edição, em especial o enorme arsenal terapêutico da flora brasileira.

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Gilvan Barreto Papel social da fotografia

Tenha uma leitura. NEO MONDO, tudo por uma vida melhor!

46 48 Artigo: Denise de La Corte Bacci O calor que vem de dentro

ÁGUA 50 Banana is my Business Descontaminação da água

Reports in english 14 Rogério Cezar de Cerqueira Leite Enlightened by nature

Expediente

Publicação

Publisher: Oscar Lopes Luiz

Diretor de Relações Internacionais: Marina Stocco

Diretora de Redação: Eleni Gritzapis (MTB 27.794)

Diretora de Educação – Luciana Mergulhão (mestre em educação)

Conselho Editorial: Oscar Lopes Luiz, Eleni Gritzapis, Marcio Thamos, Dr. Marcos Lúcio Barreto, Terence Trennepohl, João Carlos Mucciacito, Rafael Pimentel Lopes, Denise de La Corte Bacci, Dilma de Melo Silva, Natascha Trennepohl, Rosane Magaly Martins, Pedro Henrique Passos e Redação: Eleni Gritzapis (MTB 27.794), Rosane Araujo (MTB 38.300) Revisão: Instituto Neo Mondo Diretora de Arte: Renata Ariane Rosa Projeto Gráfico: Instituto Neo Mondo Tradução: Fernanda Sgroglia Tel.: 55 11 99630-6887 8

Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

Oscar Lopes Luiz Presidente do Instituto Neo Mondo oscar@neomondo.org.br

Diretor de Tecnologia – Roberto Areias de Carvalho Correspondência: Instituto Neo Mondo Rua Ministro Américo Marco Antônio nº 204, Sumarezinho – São Paulo – SP – CEP 05442-040 Para falar com a Neo Mondo: assinatura@neomondo.org.br redacao@neomondo.org.br trabalheconosco@neomondo.org.br Para anunciar: comercial@neomondo.org.br Tel. (11) 2619-3054 / 98234-4344 / 97987-1331 Presidente do Instituto Neo Mondo: oscar@neomondo.org.br

A Revista Neo Mondo é uma publicação do Instituto Neo Mondo, CNPJ 08.806.545/000100, reconhecido como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), pelo Ministério da Justiça – processo MJ nº 08071.018087/2007-24. Tiragem mensal de 70 mil exemplares com distribuição nacional gratuita e assinaturas. Os artigos e informes publicitários não representam necessariamente a posição da revista e são de total responsabilidade de seus autores. Proibido reproduzir o conteúdo desta revista sem prévia autorização.


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Perfil

Iluminado pela própria Professor emérito da Unicamp, pesquisador emérito do CNPq, conselheiro federal em Ciência e Tecnologia, falar de – e com – energia é com ele mesmo

Divulgação

Da Redação

Cerqueira Leite: “a melhor opção para o Brasil ainda é a cogeração em usinas de álcool e açúcar... a redução de emissões beneficiará o Brasil e o resto do planeta”

Neo Mondo: A saída para o Brasil é insistir na construção de hidrelétricas? Por quê? E em que medida esse tipo de usina pode acrescentar como alternativa de energia limpa?

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uma edição que trata das alternativas de energia limpa, NEO MONDO foi buscar uma das maiores autoridades não só no tema do nosso Caderno Especial, mas também em assuntos de múltiplo interesse socioeconômico pela sua carreira caracterizada pela diversidade de atuação: da docência acadêmica a participações como conselheiro, passando pela gestão de instituições privadas e públicas. Rogério Cezar de Cerqueira Leite é físico, professor emérito da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), membro do Conselho de Ciência e Tecnologia da Presidência da República, presidente do Conselho de Administração da ABTLuS (Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron) e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo. A ABTLuS administra o Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais, que congrega os quatro laboratórios nacionais (Síncrotron, Biociências, Nanotecnologia e Etanol). Cerqueira Leite tem participação importante no desenvolvimento da ciência, especialmente em São Paulo, por ser membro fundador da Academia Paulista de Ciências

e atuar, durante 6 anos, como membro do Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Na qualidade de pesquisador, foi também presidente do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), de 1985 a 1997, onde ainda atua como presidente do Conselho de Administração. Fazem parte de sua trajetória atividades como a presidência da Companhia de Desenvolvimento do Pólo de Alta Tecnologia de Campinas, a vice-presidência executiva da Companhia Paulista de Força e Luz, a participação em 1976, como consultor, da Conferência de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento, da Organização das Nações Unidas (ONU), e a participação em missões da Presidência da República do Brasil para acordos de cooperação internacional em tecnologia industrial. Cerqueira Leite não deixou de lado nenhuma das questões levantadas e é ao mesmo tempo visceral e bem-humorado quando trata de assunto que é a bola da vez: a construção de Belo Monte. “ ’Ignocentes’ veem a árvore, mas não percebem a floresta em que ela está inserida”, diz. Vale a pena ler a entrevista que gentilmente nos concedeu.

Cerqueira Leite: No médio e longo prazo o problema ambiental fundamental será o do aquecimento global; todos os demais serão insignificantes perto deste. Isto, se não tomarmos providências sobre a emissão de gases

do efeito estufa (GEE), e a hidrelétrica ainda é a opção que emite menor quantidade de CO2 e outros gases GEE. Principalmente a longo prazo, pois o tempo de vida de uma usina dessas é de mais de 100 anos.


É claro que outras opções, principalmente a eólica, podem ser adicionadas a sistemas em que não sejam majoritárias. Isto devido à baixa confiabilidade inerente ao regime de ventos. Neo Mondo: Por que se investe tão pouco, no país, comparativamente, nas modalidades eólica e solar: Falta vontade política? Falta interesse do setor privado? Falta planejamento? Ou não compensa mesmo? Cerqueira Leite: Investimentos em hidrelétricas são de retorno muito longo, e empresários brasileiros estão acostumados a recuperar seus capitais em poucos anos. Eis porque não são comuns investimentos privados em hidrelétricas no Brasil. A solução continua sendo investimento público, ou privado com empréstimos a baixos juros. Mesmo assim o empresário brasileiro tem outras opções de retorno rápido. Neo Mondo: Como estão esses investimentos no mundo ou nos países em que há mais avanços? Há casos em que possamos nos espelhar e aplicar as soluções aqui? Cerqueira Leite: Em outros países o setor financeiro não oferece retorno tão generoso como no Brasil e, por isso, o setor de energia tem alguma atratividade para o setor privado. Isto ocorre principalmente nos Estados Unidos, mas não na Europa, onde o setor público se ocupa da produção de energia.

Neo Mondo: Investir em energia significaria também contribuir para mitigar os efeitos do aquecimento global? Se sim, como? Ou uma coisa não tem a ver com a outra? Cerqueira Leite: É claro que investir em eletricidade produzida por meio de combustíveis fósseis é o mais atraente do ponto de vista estritamente financeiro, principalmente porque o período de construção dessas usinas é muito menor, ensejando retornos mais rápidos. Todavia, se torna um atraso essa escolha devido à enorme emissão de GEE. Hoje, do ponto de vista financeiro e ecológico, a melhor opção para o Brasil ainda é a cogeração em usinas de álcool e açúcar. De fato, é um atraso que apenas um percentual muito baixo desse potencial já existente seja atualmente aproveitado. Esse potencial poderá ser ele mesmo aumentado quando o Brasil vier a exportar álcool, o que terá uma dupla vantagem financeira e ecológica, pois a redução de emissão de GEEs que vier a ocorrer nos países importadores de álcool beneficiará igualmente o Brasil e o resto do planeta. Neo Mondo: O senhor vê como positivas as iniciativas de grupos como a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), que estão avançados no aproveitamento do potencial que o setor sucroenergético possui?

Cerqueira Leite: Considero que as iniciativas do grupo Unica e outras têm sido eficientes para derrubar barreiras baseadas em falsas premissas que foram erguidas na Europa e em outras partes do universo. Embora o governo federal e alguns governos estaduais tenham feito algum esforço no mesmo sentido, o resultado é muito inferior àqueles dos setores sucroalcooleiros. Neo Mondo: Como estamos no Brasil em relação a outros países em pesquisas, projetos e realizações para incrementar a oferta de energia limpa? O senhor pode citar exemplos bem-sucedidos ou pelo menos bem encaminhados? Cerqueira Leite: O Brasil domina e está na dianteira quando se trata de tecnologias como as de hidrelétricas e de produção de álcool, mas está atrasado no que se refere a vários tipos de aproveitamento de energia solar e eólica. Também no que diz respeito a energia nuclear; apenas recentemente percebeu o Brasil que é necessário um esforço de pesquisa em ciência e tecnologia nuclear, e não a aquisição de pacotes fechados e reatores de grande porte. É um engano imperdoável achar que o Brasil terá alguma competência tecnológica em energia nuclear comprando mostrengos como Angra 3. Se o Brasil tem hoje alguma competência no setor é porque, opondo-se,

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Perfil

Aquecimento global é o problema ambiental; todos os demais são insignificantes. E a hidrelétrica ainda é a opção que emite menos gases, no longo prazo

embora timidamente, a influências externas, desenvolveu seu próprio sistema de enriquecimento de urânio. Devido a interesses puramente financeiros o setor sucroalcooleiro desenvolveu com muita competência a tecnologia de produção de açúcar e álcool de primeira geração. Isto ocorreu, sobretudo, devido à criação ousada do Centro de Pesquisa da Copersucar. Todavia, embora um pouco tardiamente, mas não tarde demais, o governo federal decidiu criar um centro de pesquisas dedicado principalmente à tecnologia do álcool de segunda geração, isto é, álcool produzido a partir da celulose, inclusive bagaço de palha de cana. Este esforço é concomitante aos que são realizados atualmente pela Petrobrás e pela Embrapa. Neo Mondo: Belo Monte parece ser a bola da vez. O que há de mito e realidade na relação custo/benefício neste empreendimento? Cerqueira Leite: Que carnaval estão fazendo ambientalistas e ecopalermas em torno da futura usina de Belo Monte, a ser implantada no médio Xingu, na Amazônia. Esse exército extemporâneo de Brancaleone é composto de conservacionistas de diversas espécies. Além de uma tribo de índios locais e de bem-intencionados, porém mal informados, estudantes e intelectuais, veem-se artistas de Hollywood e de outras culturas, malabaristas, fanfarrões e pseudointelectuais. Será que esses senhores deixaram de comprar móveis de mogno, ou se manifestaram perante seus governos, ou boicotaram a carne e a soja produzidas na Amazônia? Será que percebem que a área alagada pelo projeto Belo Monte corresponde a tão-somente 0,01% da Amazônia brasileira e que bastaria 12

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0,025% do rebanho nacional de gado para invadi-la, dentro da média atual de ocupação? Ou seja, da maneira como está planejada, Belo Monte, usina de fio d’água, não há no Brasil melhor opção do ponto de vista de sustentabilidade, que combine condições ecológicas e também financeiras. Que bênção seria se tivéssemos mais uma meia dúzia de Belo Monte!

Neo Mondo: Como assim, professor. Só há benefícios? Cerqueira Leite: Os mais inteligentes e bem-intencionados “ignocentes” (neologismo composto por 50% de inocência + 50% de ignorância) dirão: e a biodiversidade? Ora, qualquer espécie que esteja espontaneamente restrita a um território de 500 km2, excetuando-se algumas confinadas a pequenas ilhas, já está em extinção. Só um ignorante pode pensar em perda de biodiversidade nessas circunstâncias. E é claro que muitos espécimes vão sucumbir, milhares, se não milhões de formigas, carunchos e talvez até alguns mamíferos. Em compensação, 20 milhões de brasileiros poderão ter luz em suas casas, muitos outros locais passarão a ter benefícios do progresso, poderão ver pela TV o Programa do Ratinho. Indústrias geradoras de emprego serão implantadas. É isso que os “ignocentes” não percebem. Eles veem a árvore, mas não percebem a floresta onde ela está inserida, sem a qual não pode a árvore sobreviver. Quanto à questão social, é preciso lembrar que o caso de Belo Monte é muito diferente do de Três Gargantas, na China, onde a densidade da população ribeirinha era extremamente elevada. O governo chinês admite que precisou realocar 1 milhão de habitantes; outras organizações falam em 2 e até 3 milhões.

Neo Mondo: A seu ver, como está a convivência e até mesmo a parceria entre órgãos públicos, como o Ministério das Minas e Energia e seus derivados ou equivalentes nos estados e municípios, com o setor privado, ONGs, sociedade em geral? Cerqueira Leite: Em casos como esse, em que uma nova oportunidade surge, a ansiedade inicial causa algumas diferenças de opinião; por exemplo, certo constrangimento entre o setor público e o privado ocorreu no que diz respeito à tecnologia do álcool, o que é uma pena, pois o objetivo do setor público é apenas desenvolver tecnologias que sejam aproveitadas pelo setor privado. A mesma falta de entendimento existe entre órgãos do próprio governo federal e entre estes e alguns dos órgãos estaduais. Parece ser uma questão apenas de disputa de espaços. É uma pena. Todavia, essa competição vem aos poucos se amenizando graças a intervenções do Ministério de Ciência e Tecnologia. Neo Mondo: O que tem de ser feito para o Meio Ambiente tornar-se matéria obrigatória nas escolas em todos os níveis, seja nas particulares seja nas públicas? Cerqueira Leite: Algumas escolas secundárias têm introduzido a questão ecológica em seus cursos. Obviamente só haverá disciplinas específicas com a conscientização da questão ambiental em diversos setores da sociedade, inclusive governos estaduais, ministérios e a sociedade como um todo. Neo Mondo: O senhor participa de instituições de relevância no cenário nacional. Seria possível resumir o que cada uma delas faz de significativo na questão energético-ambiental? É possível apresentar para nossos leitores os resultados mais expressivos? Cerqueira Leite: A questão da sustentabilidade está-se tornando um problema de toda a sociedade, e creio que cada uma das organizações em que atuo, como o Conselho de Ciência e Tecnologia, órgão da Presidência da Republica, tem-se mostrado sensível à questão. O problema atual é que ambientalistas apaixonados com seu extremismo dogmático e pseudocien-


Neo Mondo: No caso da mídia, em recente evento internacional, em Manaus, ela foi cobrada por não fazer da questão ambiental uma bandeira, em vez de tratá-la apenas como notícia. O que o senhor acha disso? Cerqueira Leite: É claro que todo mundo acha que é o outro o culpado pelos problemas ambientais. A imprensa não é mais culpada do que qualquer outro setor. Durante cinco ou seis anos mantive uma coluna da Folha de S. Paulo denominada “O todo e a parte” e não tive muito sucesso. O amadurecimento em relação à questão ambiental está-se acelerando nestes últimos anos, principalmente na Europa. Acredito que no Brasil isso ocorrerá tanto mais cedo quanto a sociedade vier a perceber os exageros de suas militâncias. Se um jornal nesse momento fizer uma campanha de esclarecimento, ela não deve ser excessivamente contundente. A capacidade de absorção pela população quando se trata de problemas de longo prazo é também lenta. Não devemos esperar milagres. Neo Mondo: O que cabe a cada um de nós fazer para termos melhor qualidade de vida, a partir dos cuidados socioambientais: o indivíduo, a família, a escola, as ONGs, as empresas, as instituições acadêmico-científicas? Cerqueira Leite: Hoje creio que ninguém mais defende o desmatamento. Ele ocorre já no âmbito da marginalidade. Mas devemos lembrar que qualidade de vida não melhora sem uma melhor distribuição de renda no país, sem melhores salários, sem empregos; e esta será consequência de melhorias na educação, no saneamento básico e na infraestrutura. A questão ambiental virá como consequência dessas outras melhorias. Neo Mondo: Obrigado pela entrevista. Fique à vontade para deixar seu recado para os leitores de NEO MONDO.

Cerqueira Leite: A questão da biodiversidade está-se tornando uma religião e não mais um tema de natureza cientifica. Ambientalistas e até mesmo cientistas vêm defendendo a Amazônia devido ao valor financeiro de suas riquezas bioquímicas, de sua biodiversidade, o que é uma reversão histórica. A farmácia até 1950 teve de fato como fonte de seus produtos e de conhecimento a natureza. Hoje, dentre as várias dezenas de milhares de fármacos, apenas um é extraído da natureza. O extrativismo foi a forma inicial de que se valeu a humanidade para sua sobrevivência em seus primórdios; depois vieram a agricultura, a revolução industrial, a informática etc. O homem usa hoje a sua inteligência para criar moléculas para toda e qualquer finalidade. Colocar as esperanças do desenvolvimento do Brasil em extrativismo, em biodiversidade é um retrocesso inaceitável para um país moderno. Devemos lutar contra o desmatamento da Amazônia e de outras áreas que devem ser preservadas, principalmente devido ao fato de que contêm elas o carbono que pode vir a ser um desastre para a humanidade, pois a quantidade de CO2 que seria produzida com a destruição da Amazônia é equivalente àquela devida a todo petróleo que já foi utilizado, mais aquele que ainda resta nas reservas conhecidas. Temos que mantê-la também devido à sua influência no regime de chuvas, essencial para nossa economia Devemos ainda manter a Amazônia porque é parte integrante da identidade nacional.

Títulos e obras Divulgação

tífico tornam difícil uma conscientização racional dos problemas do meio ambiente. Isto é natural em todo o início de revolução cultural, mas já é tempo de ambientalistas, cientistas e governos se fazerem entender.

Para o professor e pesquisador eméritos, Brasil não terá competência em tecnologia nuclear comprando mostrengos como Angra 3

Rogério Cezar de Cerqueira Leite Entre outros títulos recebeu: • a Ordem Nacional do Mérito da França • a Cátedra da Universidade de Montreal, no Canadá • o de Professor Emérito da Unicamp • o de Pesquisador Emérito do CNPq • a Ordem Nacional do Mérito (Gran Cruz) É autor de cerca de 80 trabalhos em revistas especializadas que receberam cerca de 3 mil citações em revistas indexadas.

Instituições de ponta desde estudante • Engenheiro eletrônico pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) • Doutor em Física de Sólidos na Universidade Paris • Professor do ITA e da Unicamp • Diretor do Instituto de Física e coordenador geral das Faculdades na Unicamp

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Profile

Enlightened by his own Professor Emeritus of Unicamp, Emeritus CNPq Researcher, and Federal Science &Technology Counselor; when it comes to ‘energy’, he knows – and shows – what he’s talking about

Divulgation

From the Editor

Cerqueira Leite: “the best option for Brazil still is the cogeneration of alcohol in sugar mills… reduced emissions would equally benefit Brazil and the rest of the planet”

NEO MONDO: Is insisting in the construction of hydroelectric plants the alternative for Brazil? Why? To what extent can this type of energy generation aggregate value as a source of ‘clean energy’ on a medium and long term basis? 14

Neo Mondo - September/October 2013

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n a month is which we are covering clean energy alternatives, NEO MONDO sought advice from one of the greatest authorities in the field, not only for our Special Section article, but also for issues of multiple social and economic interests – in light of his expertise and diversified career: Cerqueira Leite has been a scholar and a Technology Counselor, besides having successfully run both private and public institutions. Rogério Cezar Cerqueira Leite is a Physicist; Professor Emeritus of the State University of Campinas (Unicamp), member of the Science & Technology Council of the Presidency of the Republic, President of the Administrative Board of ABTLuS (Brazilian Synchrotron Light Technology Association), and member of Folha de São Paulo’s Publishing Board. ABTLuS runs the National Energy and Materials Research Center, which is made up of four national labs (Synchrotron, Bio-Sciences, Nanotechnology, and Ethanol). Cerqueira Leite plays an important role in the development of science, especially in São Paulo, for also being a member and co-founder of the Academia

Paulista de Ciências (Science Academy of São Paulo), besides having acted, for six years, as member of the Higher Council of The São Paulo Scientific Research Support Foundation (Fapesp). As a researcher, he also chaired the National Synchrotron Light Laboratory (LNLS) from 1985 to 1997, where he still works as President of the Administrative Council. His track record encompasses activities such as chairing the Campinas Higher Technology Pole Development Company, the Executive Vice-Presidency of the São Paulo Light and Energy Company, consulting jobs for the United Nations (UN) Science and Technology Conference in 1976, and participation in missions on behalf of the Presidency of the Republic of Brazil for international Industrial Technology cooperation deals. Cerqueira Leite did not dodge any of our questions, answering them in a visceral and witty fashion, especially with regard to the issue in the spotlight these days: the construction of ‘Belo Monte’. ‘“Ignocently”, they see a tree, but can’t notice the forest around it”, he says. The interview he kindly granted us is well worth reading.

Cerqueira Leite: On a medium and long term basis our essential environmental issue is global warming; all other issues seem insignificant compared to it. In other words, if we don’t effectively find an alternative to reducing Greenhouse Gas Emissions

(GGE), hydroelectric power will carry on being the alternative with the lowest CO2 generation and other GHG emissions. And the main impact is clearly in the long run, since a hydro-energy plant is built to work for over 100 years.


Of course other options, especially wind power, may be added to systems as secondary energy sources. I say secondary because of the undependability of this type of energy production; the behavior of the wind is inherently hardly ever accurate. NEO MONDO: Why is there, comparatively, so little investment in wind and solar energy in this country: lack of will on the part of the politicians? Lack of interest from the private sector? Lack of planning? Or is it simply not worthwhile? Cerqueira Leite: Investments in hydroelectric plants and similar types clean energy generation take long to break even and Brazilian entrepreneurs are used to recovering their investments in just a couple of years. That’s why investments in hydroelectric plants from the private sector are scarce in Brazil. The solution continues being investments from the public sector or loans made to the private sector at very low interest rates. But Brazilian businessmen have many other investment options of quicker ROI. NEO MONDO: What’s the investment scenario like in the world or in more developed countries? Are there case studies worth replicating and whose solution would be applicable here? Cerqueira Leite: In other countries, interest rates don’t favor speculative investments as generously as in Brazil.

Consequently, the energy segment is somewhat more attractive to the private sector. That’s particularly true in the North America, but not quite so in Europe, where the public sector still runs the energy generation sector. NEO MONDO: Do investments in energy also mean contributing to mitigating the effects of global warming? If so, in what way? Or is there no correlation between the two things? Cerqueira Leite: Investing in fossil fuel energy is obviously the most attractive alternative from a strictly financial standpoint, especially because the time to build such plants is relatively shorter, meaning quicker ROI. However, such choice becomes onerous if GGE is added to the equation. Today, from both a financial and environmental standpoint, the best option for Brazil still is the cogeneration of alcohol in sugar mills. As a matter of fact, it’s a shame that only a tiny share of this potential is actually used and that we still don’t take full advantage of it. This potential might be leveraged when Brazil starts exporting ethanol, which brings a two-fold advantage to the world – financially and environmentally speaking – since reduced emissions in importing nations would equally benefit Brazil and the rest of the planet. NEO MONDO: Do you consider positive the initiatives of companies such

as The Industrial Union of Sugar Producers (Unica), who are well advanced in exploiting the potential of the sugar production segment? Cerqueira Leite: I think Unica initiatives and those of other groups have been effective in overcoming barriers set by false assumptions that originated in Europe and “elsewhere in the universe”. But even though the Federal government and some State governments have made an effort, however mild it may have been, to fight such backward ideas, the result is still way below the expectations of the sugar-ethanol production sector. NEO MONDO: When it comes to ‘clean energy’, how do we fare, in Brazil, in relation to other countries, in terms of research, projects, and achievements? Cerqueira Leite: Brazil is at the forefront in terms of hydro energy and sugar-cane ethanol production technology, but we lag behind in terms of solar and wind energy alternatives. Also, when it comes to nuclear power, Brazil has only recently realized that an effort towards incrementing research into science and nuclear technology is necessary, instead of acquiring large-scale energy production projects from abroad. It’s an unforgivable mistake to think that Brazil will ever be competent in nuclear energy technology if we keep on buying outdated white elephants such as Angra 3. Neo Mondo - September/October 2013

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Profile

Global warming is an environmental issue; all other issues seem insignificant compared to it. Hydroelectric power will carry on being the alternative with the lowest CO2 generation and other GHG emissions in the long run

Brazil is only somewhat competent in that field because we went against – though a subtle, shy manner – foreign interests by developing our own uranium enrichment system. On account of local interests, which were purely financial, the sugar-cane processing segment very competently developed the 1st generation of refined sugar-ethanol coproduction technology. This happened, above all, because of the bold creation of the ‘Copersucar’ Research Center. However, later on – but not too late – the Federal government decided to create a dedicated research center focusing mainly on the 2nd generation of ethanol production technology i.e.: alcohol produced from cellulose including sugar-cane straw. This initiative is concomitant with the developments brought about by Petrobrás and Embrapa. NEO MONDO: Belo Monte seems to be in the spotlight these days. What’s myth and what’s fact about the cost-benefit ratio of this endeavor? Cerqueira Leite: The hissy fits these environmentalists and “eco-morons” are having and the tantrums they’re throwing in public are totally out of line. Belo Monte is but a hydro-energy plant to be built on the Xingu River in the Amazon. This modern version of Brancaleone’s army is made up of rebel-rousing conservationists “of many a species” supported by students armed with good intentions and poor education and the scholars who educated them. Hollywood stars can easily be found in their midst, “amongst other creatures”, alongside myriad foreign and local jugglers, acrobats, and pseudo-intellectual buffoons. I wonder how many of them haven’t ever bought any mahogany furniture. Have they ever taken a formal manifest to their governments? Would they boycott beef or soybeans produced in the Amazon? Don’t they realize that the area to 16

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be flooded by Belo Monte represents only 0.01% of the Amazon and that 0.025% of our cattle would easily use up an equivalent area within the current occupation rates? That means that, as it was planned, Belo Monte, with its running water production technology, has no better option than to be built there, nor is any other location better in terms of sustainability, combining financial advantages and environmental impact minimization. What a blessing it would be if we had not one, but a dozen Belo Monte!

NEO MONDO: What do you mean, Professor? Are there only advantages? No downsides? Cerqueira Leite: The most intelligent good-willed “ignocents” (neologism meaning 50% ignorant; 50% innocent) would say: what about biodiversity? Please! Any species spontaneously restricted to a 500 Km2 territory, except for those few confined in restricted islands, is already in extinction! Only an uneducated simpleton would ever consider loss of biodiversity under these circumstances. And of course many species will succumb; thousands, if not millions of ants, worms, and maybe even a couple of mammals. On the other hand, 20 million Brazilians will have electricity in their homes, countless places will be entitled to a little progress and their people will finally be able to watch the ‘Ratinho’ show on TV. Companies will be attracted to those remote regions and create jobs where today there’s mass unemployment. That’s what our “ignocent” whiners fail to realize. They see a tree, but fail to notice the forest around it, without which the tree can’t survive. As for the social issue, one must remember that the Belo Monte Case is very different from that of the Tree Gorges, in China, where the population living alongside river banks was enormous. The Chinese government

admits having to relocate 1 million inhabitants; but other organizations claim they were 2, or even 3 million. NEO MONDO: In your point of view, how good is the relationship and even the partnership between public agencies, such as the Ministry of Mining & Energy and its State and municipal counterparts with the private sector, NGOs, and society at large? Cerqueira Leite: In cases such as that, in which a new opportunity arises, the initial anxiety brings about some conflicting opinions – for example; there was some friction between the public and private sectors with regard to ethanol technology. That’s unfortunate, since the private sector’s objective is merely to develop technologies which may be used by the public sector as well. The same lack of understanding is present between Federal and State government agencies themselves. It seems to be a matter of territorial dispute, which is truly a shame. Nonetheless, such competition has been slowly losing momentum thanks to the intervention of the Ministry of Science & Technology. NEO MONDO: What must be done for environmental studies to become a mandatory subject at all levels of both public and private schools? Cerqueira Leite: Some high schools have added general environmental issues to the courses they teach. Obviously specific subjects will only be formally introduced when several social segments, including State governments, Ministries, and the population at large, become fully aware of the importance of environmental issues. NEO MONDO: You’re a member of important institutions in the national scenario. Would it be possible to briefly describe the key things each of them does with regard to the energy/ environment issues? Cerqueira Leite: Sustainability is becoming a growing concern for all society. And I believe that each of the organizations in which I participate, such as the Science & Technology Council – an agency of the Federal government – has been showing interest in this issue.


NEO MONDO: Regarding the media, during a recent international event in Manaus, the press was asked why they don’t turn environmental issues into one of their flagships instead of treating them as common news. What do you think about that? Cerqueira Leite: Of course, we all like to put the blame for environmental issues on others. The press isn’t any guiltier than any other sector of the economy. For five or six years I had a column in the Folha de São Paulo newspaper named “The Whole and the Fragment”, which didn’t do very well. Maturity towards environmental issues has been gaining momentum in the last few years, especially in Europe. But in Brazil I believe this will only happen once society realizes the hindrance posed by environmentalist radicalism. If a newspaper now made an awareness campaign clarifying the issue it would bear no fruit. The population can’t promptly grasp the importance long-term issues. We shouldn’t expect any miracles. NEO MONDO: What part does each of us have to play to have a better quality of life from a social-environmental point of view; that is: individuals, families, schools, NGOs, companies, and academic-scientific institutions? Cerqueira Leite: I believe that nowadays no one’s openly in favor of deforestation anymore; it’s become a criminal activity. But we must remember that quality of living is directly proportional to better income distribution in the country, better salaries, enough jobs and it’s also a direct consequence of effective investments in education, basic sanitation, and infrastructure. Environmental awareness will surface as a by-product of these other improvements.

NEO MONDO: Thank you for the interview. Feel free to leave your message to the readers of NEO MONDO. Cerqueira Leite: The biodiversity issue is becoming a religion rather than an issue of scientific nature. Environmentalists and even scientists are defending the Amazon on account of the economic value of its biochemical resources, of its biodiversity, which is like looking back in time. The pharmaceutical industry, until 1950, truly depended on its knowledge of nature to survive. Today, of all pharmaceutical products, only one in tens of thousands is extracted from nature. Exploiting natural resources was the primal means of survival for humanity in its early evolutionary stages; which was then followed by agriculture, the industrial revolution, computer science, etc. Humans use their intelligence today to synthesize any molecule they might need to meet any imaginable purpose. To think all hopes for Brazil lie on extracting natural resources and on our biodiversity is an unacceptable setback for a modern nation. We must fight against the deforestation of the Amazon and other areas that should be preserved mainly because of the carbon they contain, which, if turned into CO2 through deforesting fires, would be equivalent to burning all petroleum ever used to-date plus all reserves known and yet to be exploited – and that would be a disaster for humanity. We must also preserve such areas in light of their influence on the rain, which is essential to our economy. Last but not least, we must preserve the Amazon because it’s an essential part of our national identity.

Awards and achievements Divulgation

The problem these days is that passionate environmentalists filled with dogmatic and pseudo-scientific radicalism make it hard to foster rational awareness of true environmental issues. This is only natural at the beginning of any cultural revolution, but it’s about time environmentalists, scientists, and governments tune up to the same wavelength and start understanding each other.

For the Emeritus Researcher and Professor, Brazil will not be competent in nuclear energy buying outdated white elephants, such as Angra 3

Rogério Cezar de Cerqueira Leite Among other awards and titles: • National Order of Merit of France • Professor of the University of Montreal, Canada • Professor Emeritus of Unicamp • CNPq Emeritus Researcher • National Order of Merit (Gran Cruz) Author of over 80 works in specialized magazines, which have been quoted over 3,000 times in other publications.

At the forefront of education ever since a student • Electronic Engineering degree from the Air-force Technology Institute (ITA) • PhD in Physics – Solids – University of Paris • Professor at ITA and Unicamp • Director of the Physics Institute and General Faculty Coordinator of Unicamp

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Especial - Energias Alternativas

Vem da

lama,

mas é LIMPA

Pesquisadores da Fundação Universidade Rio Grande (Furg), do Rio Grande do Sul, vão aproveitar lodo do porto para geração de energia

A

mesma lama que pode atrapalhar navios e outras embarcações de trafegarem pelo Porto do Rio Grande, localizado no município gaúcho de mesmo nome, agora contribuirá para alimentar veículos e equipamentos do próprio porto. Projeto desenvolvido pelo Laboratório de Controle de Poluição da Fundação Universidade Rio Grande (Furg) utilizará a lama dragada do oceano como fonte de geração de energia para baterias utilizadas nesses equipamentos. O processo aproveita os elétrons envolvidos na respiração dos micro-organismos encontrados na lama, que durante a queima (oxidação) da matéria orgânica liberam elétrons, que são captados por um eletrodo, gerando uma corrente elétrica. Associado a este reator, um circuito elétrico converte a voltagem desta reação para valores comerciais tradicionais (110 ou 220 volts). “Em escala industrial, estima-se que possam ser gerados até 580 MW, considerando que a dragagem do Porto produz 1,5 milhão de metros cúbicos de sedimentos ao ano”, explicou o professor Dr. Fabricio Santana, que coordena a pesquisa ao lado da professora Dra. Christiane Saraiva Ogrodowski. 18

Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

Alan Bastos

Da Redação

Coordenadores da pesquisa Furg, Fabricio Santana e Christiane Ogrodowski mostram a lama retirada do porto


A geração de energia seria suficiente para abastecer uma cidade de até 600 mil habitantes. Segundo Santana, o objetivo é criar uma Unidade de Tratamento de Sedimentos de Dragagem, cuja previsão para início das atividades é janeiro de 2011. Há dois anos, o processo de bioconversão da lama em energia elétrica vem sendo estruturado pelos pesquisadores que contam com o apoio de outros profissionais participantes de convênios com órgãos de fomento estaduais, federais e privados. O projeto conta com financiamento da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, que investirá R$ 300 mil, e do Porto do Rio Grande, que injetou R$ 60 mil, além do custo estimado em R$ 300 mil que será pago pela Furg pelo trabalho dos pesquisadores. “Atualmente, encontra-se em fase de laboratório, estão sendo realizados experimentos para o dimensionamento da planta piloto, próxima etapa do estudo”, revelou.

Menor impacto A lama retirada dos portos contém uma parte inerte (areia), que corresponde a 96% e pode ser comercializada. O restante do sedimento, onde estão presentes micro-organismos capazes de gerar eletricidade, é armazenado e depois despejado no oceano, em áreas onde causa menor impacto ambiental.

Segundo o professor Santana, a lama do Porto do Rio Grande pode ter sido beneficiada pelo fato de ser este canal uma ligação natural da Lagoa dos Patos com o oceano, proporcionando maior teor de matéria orgânica e criando características diferenciadas. “Mas isso não impediria a aplicação desta tecnologia a outros portos”, garantiu. Ao menos no Porto do Rio Grande, o segundo do país e um dos mais importantes da América Latina devido à sua posição geográfica e extensão, a geração de energia limpa é uma questão de tempo. Para o professor Santana, mesmo a geração biológica não sendo a alternativa mais desenvolvida atualmente, em comparação à eólica, solar e hidráulica, por exemplo, somadas, essas tecnologias podem incrementar a matriz energética do país. “Sabe-se que a solução para a escassez de energia não está associada com o uso de apenas um tipo de tecnologia ou fonte e sim com o aproveitamento pleno destas possibilidades”, encerrou. Divulgação

Alan Bastos

A estimativa é que e, em escala industrial, possam ser gerados até 580 MW

Assim que implantada, a Unidade será a única do gênero no mundo, já que as outras iniciativas de que se tem conhecimento visavam utilizar o sedimento oceânico para geração de energia, mas sem removê-lo da superfície marinha. “Esta alternativa é muito questionada, já que pode provocar um desequilíbrio no meio ambiente”, contou Santana. O projeto gaúcho, ao contrário, é totalmente seguro à vida marinha, pois utiliza o material já retirado, oferecendo solução para um problema de esfera mundial, que é a destinação desses sedimentos.

Porto do Rio Grande é considerado um dos mais importantes da América Latina devido à localização estratégica

Energia a partir da lama 1º passo – Dragagem As dragagens removem sedimentos que se acumulam com o tempo no fundo do mar, a fim de manter ou aumentar a profundidade dos canais portuários, garantindo o acesso seguro dos navios. O material retirado é separado, parte vira areia e é comercializada e a outra parte, que seria despejada de volta no oceano em profundidades maiores, vai para a Unidade de Tratamento.

2 º passo - Unidade de Tratamento de Sedimentos A parte dos sedimentos onde estão instalados os microrganismos capazes de gerar energia é utilizada na geração de energia por meio da queima da matéria orgânica (oxidação).

3º passo – Utilização da energia A energia gerada é utilizada para carregar as baterias de equipamentos e veículos do próprio Porto do Rio Grande.

Representação da geração de energia a partir da instalação da Unidade de Tratamento

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Especial - Energias Alternativas

Alternativa que vem

das cinzas

Usinas flutuantes de biomassa reaproveitam sobras de materiais e renovam comunidades inteiras no Pará Da Redação

A

queno para atender a demanda de comunidades isoladas da ilha. “Até então, essas pessoas contavam com geradores a diesel para ter energia elétrica – a pouca renda que tinham ainda tinha que dar para a compra do combustível. Nós entendemos a dificuldade em gerar energia”, afirma o coordenador Gonçalo Rendeiro. O especialista em energia de biomassa explica que as usinas se adequam ao perfil e à demanda de cada comunidade e aproveitam os resíduos locais – “um vetor de desenvolvimento acoplado a um processo produtivo.” O projeto, que tem apoio do Ministério das Minas e Energia, do CNPq, da Eletrobrás e da Rede Celpa, proporciona duas vantagens que se destacam. Além

Divulgação

clássica pergunta “o que você levaria para uma ilha deserta” pode agora ser projetada em outro contexto – esse sim, muito mais real. O cenário é a Ilha de Marajó, localizada na foz do rio Amazonas, considerada a maior ilha fluvial-marítima do mundo. Em vez de itens de beleza, tecnologia e entretenimento, o Grupo de Energia, Biomassa e Meio Ambiente, da Universidade Federal do Pará, decidiu levar aos moradores da ilha um item de difícil acesso, mas essencial: energia. O grupo, criado com o intuito de desenvolver pesquisas e projetos aplicados na área de produção de energia a partir da queima direta de biomassa, foi responsável pela criação de usinas de porte pe-

Projeto Usina Flutuante: potência de 50 kW acoplada a uma fábrica de extração de óleo vegetal

da possibilidade de gerar energia a partir de restos que iriam para o lixo (como óleo vegetal, lascas de madeira, folhas, frutos e até lixo), economiza-se o dinheiro anteriormente destinado para compra de óleo diesel - vendido exclusivamente por empresas sediadas no Centro-Sul do país e causador de impactos ambientais, como chuva ácida e emissão de gases estufa. O sistema tem um ciclo sustentável redondo: além de não agredir a natureza, as usinas aproveitam resíduos extrativistas, ajudam no desenvolvimento econômico da região e ainda beneficiam os trabalhadores responsáveis pela plataforma, que são treinados e acompanhados até serem capazes de gerenciar o processo de forma independente.


Com informações de Beira do Rio

Fábrica de extração de óleo Vegetal

Divulgação

Usina de 200kW

Projeto Enermad/Buriti: usina de de 200 kW. estufa para secagem de madeira e uma Fábrica de Extração de óleo vegetal

Divulgação

Tudo novo, de novo O primeiro projeto voltado para atender as demandas de energia elétrica em locais distantes aconteceu em 2004. As duas primeiras usinas eram de alvenaria e levaram pouco mais de um ano para ser construídas. No meio desse processo, surgiram os obstáculos. “Havia dificuldade em encontrar mão-de-obra e material, além do problema do transporte – aqui os rios são as estradas”, conta Rendeiro. Por isso, a equipe criou plataformas flutuantes. Além de levar menos tempo para construir (seis meses apenas), esses tipos de usina podem deslocar-se facilmente por rios e atracar em comunidades ribeirinhas, que vão de 80 a 300 pessoas. Segundo o coordenador, três unidades já funcionam e cinco irão ficar prontas ainda neste ano. Uma delas, responsável pela geração de 50kW de energia, atende a comunidade de Santo Antônio e fornece eletricidade para uma fábrica de gelo, uma fábrica de extração de óleo e uma câmara frigorífica que armazena produtos agrícolas e pescado. Com esse sistema é possível tornar praticamente todos os tipos de resíduo em biomassa para produção de energia – até lixo. Rendeiro conta que atualmente essa possibilidade passa por análise da prefeitura local e garante a viabilidade desse tipo de aplicação. “Com o auxílio das usinas, é possível diminuir a quantidade de lixo e ainda gerar energia elétrica. E ainda existe o benefício de que esse projeto pode ser aplicado em qualquer lugar”, conclui.

Fábrica de Gelo e Câmara Frigorífica

Fábrica de Óleo Vegetal

Usina de Geração de Energia Elétrica

Projeto Marajó: usina de 200 kW, fábrica de gelo com câmara frigorífica e fábrica de extração de óleo vegetal

Divulgação

Como funciona a biomassa Cada unidade é constituída basicamente por uma caldeira, uma turbina, um gerador, um condensador, um tanque de condensados, um sistema de bombeamento e um sistema de tratamento de água. Quando a biomassa é queimada na fornalha da caldeira, gera-se calor. O calor, ao entrar em contato com a água, se transforma em vapor que, por estar em alta pressão e alta temperatura, gira as pás da turbina. A rotação da turbina aciona o gerador, que produz energia suficiente e estável para o funcionamento da usina e para a comunidade.

Usina de 1 kW para atendimento de 5 residências isoladas

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Especial - Energias Alternativas

O S l brilha para todos Os benefícios, novidades e perspectivas proporcionados pela energia do astro-rei Da Redação

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uem diria que toda a tecnologia relacionada à energia solar, uma das vedetes responsáveis por oferecer uma alternativa limpa e renovável, pode ser comparada ao funcionamento de organismos presentes num jardim - as plantas. Por meio da clorofila (substância verde das folhas semelhante à hemoglobina do nosso sangue) esses organismos são capazes de capturar os raios de sol e transformá-los no próprio alimento. Este mesmo conceito pode ser aplicado aos painéis solares, que utilizam o sol para aquecer ou gerar energia elétrica.

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As vantagens desses tipos de sistema vão do bolso do consumidor até o meio ambiente. Não é à toa que cerca de 1 milhão de estabelecimentos (dos quais 66% são residências) já adotaram esse mecanismo, de acordo com a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento / Departamento Nacional de Aquecimento Solar (Abrava/Dasol). Com o aquecimento solar é possível economizar até 70% de energia elétrica ao ano - por ser capaz de substituir o gás e a eletricidade - e recuperar o preço do investimento entre 2 e 3 anos, segundo a fabricante Soletrol. Além

disso, o fato de ser um tipo de energia renovável e que não agride a natureza pode beneficiar a consciência de muita gente que deseja contribuir com a causa sustentável. Apesar dos benefícios, a energia fotovoltaica ainda engatinha aqui no Brasil. Os principais motivos são a inexistência de uma política nacional que viabilize a produção em larga escala e os obstáculos para a produção de silício grau solar. Este tipo específico de silício, elemento básico para a produção das células fotovoltaicas, caracteriza-se pelo elevado custo de produção e pela alta pureza, que aumenta sua pro-


priedade de semicondutor elétrico e ramifica seu uso para chips e outros componentes eletrônicos. O professor Paulo Roberto Mei, do Departamento de Engenharia de Materiais, da Unicamp, explica que o mercado nacional ainda foca no silício metalúrgico, a forma impura do mineral, que é facilmente encontrado na natureza e que é usado nesse setor principalmente para dar liga metálica no aço, latão e bronze. Por esses motivos, o Brasil atualmente importa placas fotovoltaicas de marcas como Kyocera, Sharp, Sanyo e SS Solar. O gestor da Dasol Marcelo Mesquita afirma que os pontos de maior dificuldade são o valor de produção e a pouca maturidade do setor. “Apesar da redução do IPI e da devolução do ICMS, [o custo] ainda é um impeditivo para a competição no mercado de aquecimento de água. A desverticalização do setor, por sua vez, requer desenvolvimento de toda a cadeia e a formação de profissionais instaladores para atender a demanda crescente.” Além disso, Mesquita acredita que o desenvolvimento da cultura ecológica na sociedade seja um ponto vital. “A conscientização da população pode ser considerada como desafio, apesar de já estar acontecendo de maneira acelerada.” Uma nova era solar? As expectativas para a mudança do cenário atual são grandes. O especialista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Ricardo Ruther afirma que o aumento dos custos de produção de energia elétrica e a futura redução das despesas de fabricação das placas fotovoltaicas serão um verdadeiro impulso para a área. “Temos boa insolação e a maior reserva de quartzo do mundo, de onde se extrai o silício, usado nas células solares. Desenvolver o setor é questão de dez anos”. Para Mesquita, uma das novidades positivas no setor é a busca da utilização do sistema de aquecimento solar em projetos habitacionais, como nos programas da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), das Companhias de Habitação (Cohab) e das casas construídas pelo programa da Caixa Econômica Federal Minha Casa Minha Vida. “As vantagens em usar o chuveiro solar híbrido são grandes, pois os chuveiros elétricos ficam desligados como reserva para eventuais situações de longo período sem sol.” Embora cogitada como item obrigatório no início do projeto, as placas solares serão opcionais e chegarão a apenas uma

parte do 1 milhão de casas que o governo pretende construir. O grupo de trabalho, que tem representantes dos ministérios do Meio Ambiente, de Minas e Energia, das Cidades, além da Caixa Econômica Federal, do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) e empresários do setor, ainda não definiu metas ou o número mínimo de unidades habitacionais que deverão receber o sistema de aquecimento solar. De acordo com Vânia Soares, coordenadora de Energia e Meio Ambiente da Secretaria e Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente, essa iniciativa irá depender das construtoras ou das prefeituras. Saindo do papel “A legislação vem-se consolidando e aperfeiçoando suas aplicações. À medida que o aquecedor solar é implantado em municípios, aumenta a obrigatoriedade nas edificações e em alguns segmentos produtivos da sociedade”, destaca Mesquita. A maior dificuldade, de fato, é aprovar e aplicar o que está no papel. Algumas das iniciativas nacionais que ainda tramitam no Congresso Nacional são o Projeto de Lei 630/03, que institui um fundo especial para financiar pesquisas e fomentar a produção de energia elétrica e térmica a partir da energia solar e da energia eólica, de autoria do deputado Roberto Gouveia (PT-SP); o Projeto de Lei do Senado 311/09, que institui o Regime Especial de Tributação para o Incentivo ao Desenvolvimento e à Produção de Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Reinfa) e estabelece medidas de estímulo à produção e ao consumo de energia limpa, de autoria do senador Fernando Collor (PTB-AL); e o Pro-

jeto de Lei do Senado 336/09, que concede isenção do Imposto de Importação às células solares fotovoltaicas, assim como suas partes e acessórios, de autoria do senador João Vicente Claudino (PTB-PI). Apesar da lentidão do processo legislativo e da demora pela aprovação dos referidos projetos de lei, o advogado Diego Medina explica que ainda é possível contar com outras formas de fomento à energia limpa. De créditos especiais em bancos privados, bolsas, editais e subsídios até programas de órgãos governamentais que podem investir em novas tecnologias (como a Financiadora de Estudos e Projetos - Finep, do Ministério da Ciência e Tecnologia), benefícios fiscais ou Terceiro Setor, opções não faltam. “Há estados que concedem isenções tributárias nas operações com equipamentos e componentes para o aproveitamento das energias solar e eólica. Por isso, quem quer investir em energia limpa deve estar atento à legislação nacional e regional”. Eventos de grande porte como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 também prometem impulsionar e disseminar a aplicação dessa tecnologia. Mesquita afirma que o seminário Copa do Mundo de 2014: normatização para obras sustentáveis, promovido pela Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA), apresentou o aquecimento solar como uma importante contribuição para a infraestrutura necessária aos eventos por ser limpo, com um excelente potencial energético e economicamente viável. “Temos uma verdadeira usina solar limpa e gratuita, funcionando o ano todo, em todas as regiões. Por isso, prevemos aplicações em hotéis, alojamentos,

Placas solares são cogitadas em projetos habitacionais e podem aparecer em obras da Copa do Mundo e Olimpíadas

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Especial - Energias Alternativas restaurantes, hospitais, lavanderias, vestiários, piscinas, entre outros.” Apesar da localização privilegiada do Brasil, que permite uma boa taxa de insolação em várias regiões no ano todo, o país ainda está no 10­º lugar no ranking de utilização da matriz solar como fonte de energia – ficamos atrás de China, Israel, Áustria, Índia, Turquia, Alemanha, Japão, Estados Unidos e Austrália. Com metas de longo prazo, o Plano Nacional de Eficiência Energética é outra

novidade do setor. Ainda em fase de consultas com empresas do setor energético, órgãos do governo e empresas de conservação de energia, o projeto tem como pontos principais a conscientização da população, do setor público e medidas que possam trazer benefícios financeiros e fiscais (como leilões de eficiência energética, estímulos para indústrias, programas de etiquetagem, entre outros). A elaboração do plano tem passado atupor grandes complexidades devido a

O que nos falta Segundo o Estudo Prospectivo para Energia Fotovoltaica, desenvolvido pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), o Brasil precisa seguir alguns mandamentos para que se torne uma das principais lideranças no setor de energia solar:

• Laboratórios modernos • Centros de referência integrados

• Investir em desenvolvimento de tecnologia (para obter energia solar fotovoltaica a baixo custo) • Estabelecer um programa de distribuição de energia com sistemas que conectem casas, empresas, indústria e prédios públicos • Especialistas para o mercado – estima-se que o mundo irá precisar de 37 milhões de profissionais para atuar no setor até 2030

Fonte: EcoDesenvolvimento

uma série de alinhamentos que precisam ser feitos para garantir o não aumento de tarifas, o respeito a contratos existentes (principalmente das concessionárias com o governo e dos consumidores com as distribuidoras), a expansão rápida do acesso à rede elétrica em todas as regiões do país e integração sul-americana. Apesar disso, o diretor do Departamento de Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas Energia, Hamilton Moss, afirma que o plano será anunciado antes do final de 2010 e estará alinhado com a meta de reduzir em 10% a demanda por eletricidade no país até 2030. Para ele, o Brasil, comparado a outros países, tem menos urgência para implementar ações na área devido aos números atuais relacionados à eficiência energética: cerca de 70% da matriz elétrica e 48% da matriz energética total brasileiras provêm de fontes renováveis.

Com informações de Revista Sustentabilidade, Inovação Tecnológica, Soletrol, Planeta Sustentável, SuperInteressante, EcoDesenvolvimento, Energia

Irmãos de sol Além de depender da energia solar, ambos os processos precisam de placas específicas que serão responsáveis por captar e transformar a energia. Entenda em detalhes como funciona a energia solar: As placas para aquecer água são escuras com o intuito de absorver o máximo possível de radiação solar. O calor é então passado para as serpentinas internas da placa (geralmente feitas de cobre, um material altamente condutor), que contém água fria proveniente de um reservatório ligado à caixa d’água. Após passar por esse tubo, a água esquenta e vai para o boiler, um reservatório térmico específico para manter a temperatura. Dessa forma, a água chega muito quente aos chuveiros da casa, o que explica a necessidade de ter uma torneira para cada tipo de água (quente e fria), para poder atingir uma temperatura agradável. A energia fotovoltaica, por sua vez, requer placas compostas por células feitas de materiais semicondutores, como o silício (já citado anteriormente). Quando partículas de luz solar (fótons) se chocam com os átomos do material que reves-

te a placa, elétrons se deslocam, e essa energia gerada carrega uma bateria. A tecnologia requerida por este processo vem sendo aprimorada com o tempo, já que em 1839 o físico francês Edmund Becquerel descobriu o efeito fotovoltaico em uma experiência com eletrólitos (substâncias que se tornam condutoras de eletricidade com a adição de um solvente ou aquecimento). Trinta e oito anos depois, W.G. Adams e R.E. Day construíram a priboiler

(reservatório térmico de água quente)

meira célula solar com selênio, elemento que converte luz diretamente em eletricidade, mas com baixíssimo rendimento. O silício grau solar para fins industriais só veio a ser desenvolvido em 1940/1950, quando o método Czochralski (nome de um cientista polonês) foi desenvolvido para fins industriais. Atualmente, cada metro quadrado de coletor fornece 170 watts - pouco menos que três lâmpadas comuns de 60 watts. coletor solar

caixa d’água da residência

sistema auxiliar elétrico

(para dias em que o sol não aquece a água plenamente)

água quente água fria

Com informações de Soletrol, Guia da Energia Solar e artigo de Miguel C. Brito e José A. Silva, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa 24

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Marcio Thamos

Mitologia clássica: a invenção da

HUMANIDADE

N

o limiar do terceiro milênio, vemos o surgimento de uma preocupação socioambiental auspiciosa. Uma outra ordem, mais democrática, mais sensível, mais humana, gradualmente parece impor-se no mundo globalizado, ao mesmo tempo em que, com os rápidos avanços da ciência e da tecnologia, vislumbramos, fascinados, um novo nível civilizacional que a humanidade estaria apta a atingir. Mas uma ampla consciência ecológica só poderá ser alcançada mediante esforços contínuos visando a uma educação que favoreça decisivamente o processo de interação do homem com o meio ambiente. Ao insistir na necessidade de colaboração internacional para a preservação da vida e para a elevação da qualidade de vida no planeta, a ideia de uma fraternidade universal naturalmente tende a se reforçar. Assim, o conceito de humanidade se expande na medida em que o espírito humano encontra condições para se desenvolver (eis aí o que parece um importante ganho do nosso tempo). A ciência e a tecnologia, no entanto, não podem por si mesmas apontar esse caminho para a evolução do homem. Tudo o que com elas se faça depende e dependerá sempre de escolhas ditadas por valores socialmente construídos, lenta e moralmente arraigados. A ciência e a tecnologia em si mesmas não são boas nem más – são possibilidades que se colocam à disposição da vontade humana, crian-

do novos meios que podem influir tanto na elevação quanto na dissipação da inteligência. Tudo depende do uso que deles se faça. Daí a necessidade de alimentar continuamente o espírito, educando a sensibilidade. Daí a importância da cultura e da imaginação, fundamentais na estruturação do pensamento. Por conta de um pragmatismo e de um imediatismo crescentes nos dias de hoje, o estudo da cultura clássica, base de todo o humanismo, foi sendo relegado em nossas escolas a ponto de desaparecer dos currículos oficiais do ensino fundamental e médio. Em consequência, o acesso ao legado do antigo mundo greco-romano e o despertar para os valores clássicos, sobre os quais se assentou a sociedade ocidental desde o Renascimento, tornou-se mais difuso e pouco sistemático para as jovens gerações. A perda que daí advém para a formação do espírito é certamente incalculável. E, por isso mesmo, num tempo em que tudo escoa pelo crivo simplista e quantificador das planilhas de avaliação, não podendo ser reduzido imediatamente a números, esse prejuízo passa despercebido. Ninguém menos do que Einstein afirmava que a imaginação é mais importante que o conhecimento (uma vez que o progresso do conhecimento, o que de fato importa, depende de nossa capacidade criativa). A invenção da humanidade – isto é, o reconhecimento de características específicas do homem, que nos distinguem como

seres no mundo, a valorização de nossa própria natureza e a consciência de que pertencemos a um grupo maior, ao qual permanecemos ligados por laços intrínsecos – se deu inequivocamente na Grécia Antiga, após um imemorial processo de evolução do pensamento primitivo. Perscrutando o mistério da existência, a imaginação do povo helênico criou uma série praticamente inesgotável de relatos míticos que sobreviveram por muitas gerações e foram o tesouro dos poetas antigos. Assimilado e enriquecido pelos romanos, esse patrimônio cultural jamais deixou de influenciar as artes e as ciências das épocas posteriores, no mundo que se reconstruiu sobre os fundamentos da cultura greco-romana. Na essência, ainda somos o que fomos desde então. Por isso estou pensando em recontar aqui um pouco dessas fábulas que incrementaram nossa imaginação no decorrer dos tempos e, de certo modo, levaram à invenção do que chamamos humanidade. Doutor em Estudos Literários. Professor de Língua e Literatura Latinas junto ao Departamento de Linguística da UNESP-FCL/CAr, credenciado no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da mesma instituição. Coordenador do Grupo de Pesquisa LINCEU – Visões da Antiguidade Clássica. E-mail: marciothamos@uol.com.br Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

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O cosmos é em movimento

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stive em Hiroshima, em Nagasaki, cidades bombardeadas por ordem do presidente dos EUA, Harry Truman. E também em aldeias africanas destruídas por napalm por aviões da Otan por ordem dos generais de Salazar. Nesses locais, totalmente destruídos pela insensatez de poderosos, a natureza deverá trabalhar milhares de anos para que o meio ambiente volte a ter vida,para que a terra novamente frutifique.Foram experiências marcantes que nunca irei esquecer. O que me faz refletir sobre a origem da vida, e nossa sobrevivência neste planeta. A terra é a fonte primeira da energia e devemos preservá-la, com a seriedade dos líderes sioux quando discutem se podem ou não derrubar uma árvore, e se esse ato irá ou não prejudicar a oitava geração. Precisamos aprender com a sabedoria milenar do taoísmo, budismo, xintoísmo, dos povos africanos e pré-colombianos de Nossa América. Os pressupostos de seus

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ensinamentos – confirmados pela física contemporânea – afirmam que o mundo é constituído de energia vital, de uma força presente nos seres humanos, nas coisas animadas e inanimadas, no mundo existente e no preexistente. Os homens/mulheres são poderosos, pois são a força com inteligência capaz de manipular a força destituída de inteligência (ou seja, todo o meio ambiente que nos cerca). Assim, cabe a nós, seres vivos, com domínio sobre a natureza, cuidar dela, mantê-la, preservá-la afinal, fazemos parte da mesma. Como nos ensina F.Capra(1), fazemos parte do universo, somos parte constituinte do mesmo (leiam a obra “O tao da Física” ou “Ponto de mutação); esse cientista nos recomenda cuidar do planeta como um animal cuida de seus filhotes, e jamais nos arriscarmos a destruir a energia viva existente no mesmo. Nessa obra, faz um paralelo entre a Física Moderna e o pensamento oriental levando a uma

nova visão de mundo seja no contexto científico seja sociológico, onde a característica unilateral é a concepção da unidade e da coexistência e alternância de valores opostos. Esse pensamento em física surge com a teoria da relatividade, enquanto que nas tradições filosóficas do Oriente a maior parte de seus conceitos inclui o tempo e a mudança como elementos essenciais. Essa concepção é a parte integrante da visão da realidade que se torna à base das tecnologias, sistemas econômicos e instituições sociais. Daí a necessidade de dominar e de controlar o conhecimento científico para uma atitude de cooperação e não de violência na sociedade, ou ao meio ambiente. Nós, enquanto seres vivos, observamos e estudamos a movimentação da energia vital em nosso planeta; os avanços da Física no século XX, com a descoberta dos quanta, pode nos ser extremamente útil, pois aponta para o papel do observa-


Dilma de Melo Silva

dor na constituição da realidade, a importância dos processos cognitivos relacionados às estruturas sociais. Autores como Maturama, Varela, Capra, Pregogine, Morin são alguns dos que apontam para a importância do observador na constituição da realidade, já que o mundo nos é dado através da experiência do sujeito, o meio e suas interações estão referidos a esse sujeito. Todos os sistemas vivos são unidades de interações,interagimos entre nós – seres vivos, animados, com inteligência/consciência – e também com os demais seres vivos, sem inteligência, sem consciência de si. A realidade é feita de inter-relações dos diferentes níveis de concretude da força/energia vital, dentro e fora de nós. Nas primeiras décadas do século XX o avanço cientifico passa ter uma alteração complexa, surgindo em primeiro plano o princípio da complexidade. A Física Contemporânea com o principio da incerteza/complexidade/complemen-

taridade de Bohr e de Heisenberg introduz o observador na observação. O objeto da ciência não é mais um objeto, mas um sistema com atividades autorreguladoras, cada elemento último esperado pela Física não é encontrado, mas sim o incerto, o contraditório – a partícula ora se comporta como onda, ora como corpúsculo. Após a descoberta do átomo, tivemos a descoberta da partícula, e depois a descoberta dos quanta, que nos remete ao principio da incerteza. Desde Heráclito de Éfeso (século V a.C.) temos uma visão processual da realidade como um vir-a-ser, como um movimento, como metamorfoses, como mutações, essa linha de pensamento propõe uma visão processual da realidade, num permanente fazer-se. Como nos bem ensinou Ruy Galvão de Andrada Coelho, valendo-se de Husserl, a realidade não se dá a conhecer em sua totalidade, em sua essência, mas através de manifestações, de fenômenos através do quais o real se apresenta à consci-

ência humana(2). O conhecimento resulta do encontro do objeto – naquilo que ele se dá à percepção – com a consciência intencional do homem. Assim, sujeito e objeto se fundem; existe uma relação recíproca entre noese e noema, entre os fatores constituintes e constituídos no processo de conhecimento. Torna-se, assim, imprescindível perceber a subjetividade como fator partícipe da formação do conhecimento; a própria afirmação: visão de mundo pressupõe a existência de um sujeito e, desse modo, reconhecer o papel indispensável da consciência no processo cognitivo, nos vermos como ser-no-mundo, fundidos e interligados uns com o(s) outro(s) e com a natureza. O mundo é feito de energia, o cosmos é feito de energia pura, energia em movimento, num caos de incertezas, no qual está imersa a vida. E o equilíbrio é instável, cabendo a nós seres humanos a tarefa de mantê-lo. Citações: CAPRA, F. O ponto de mutação, Cannes: 1990 (vídeo) O tão da física,SP:Ed. Cultrix,1983 COELHO,R.G.A. Ficção e Realidade in Revista Arte Cultura da América Latina.SP: CESA,2004

Professora doutora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, socióloga pela FFLCH\USP, mestre pela Universidade de Uppsala, Suécia, e Professora convidada para ministrar aulas sobre Cultura Brasileira na Universidade de Estudos Estrangeiros, no Japão, em Kyoto. E-mail: disil@usp.br

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Especial - Energias Alternativas

de vento em popa

Usina eĂłlica na cidade de Walla Walla, Estados Unidos. PaĂ­s lidera a lista dos que mais geram este tipo de energia


Sparktography

Publicado na edição 36

Emissão reduzida de CO2 e matéria-prima abundante são alguns dos atrativos da modalidade que cresceu 77,7% no país, em 2009 Da Redação

D

ados divulgados pelo Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês), em fevereiro, apontaram que a produção de energia eólica no Brasil cresceu mais do que o dobro da média mundial, que registrou 31%. O crescimento brasileiro foi maior, por exemplo, que o dos Estados Unidos, que teve aumento de 39%, o da Índia (13%) e o da Europa (16%), mas menor que o da China, cuja capacidade de geração ampliou-se em 107%. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Ricardo Simões, o aquecimento do setor é reflexo de um processo que vem desde 2002, quando o governo federal instituiu o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa). “Vários parques eólicos participantes do Proinfa entraram em operação no ano passado. Contudo, o grande fato foi o Leilão de Energia de Reserva que contratou 1.800 MW de potência instalada para entrada em operação em 2012”, explicou. O leilão, realizado em dezembro, foi o primeiro exclusivo de energia eólica e os 1.805 MW comercializados se dividirão em investimentos a serem realizados em cinco estados brasileiros: o Rio Grande do Norte com 657 MW, o Ceará com 542 MW, a Bahia com 390 MW, o Rio Grande do Sul com 189 MW e Sergipe com 30 MW. “Foi uma mudança de paradigma. Para que se tenha uma ideia, hoje a capacidade instalada de energia eólica no Brasil é de 700 MW, entre o final deste ano e início do próximo passaremos para 1,4 mil MW e já em 2012, como consequência do leilão, teremos 3,4 mil MW de capacidade de ge-

A eólica é irmã siamesa da energia hidráulica e absolutamente complementar a esta

ração de energia eólica. Isso significa dizer que iremos quadruplicar a capacidade instalada em relação a 2010. Mas isso não é muito, e o que impressiona é que esse volume corresponde apenas a 2,5% da capacidade instalada no país”, completou Simões. Se no território nacional, a força dos ventos ainda é pouco representativa, em termos mundiais a participação do Brasil é ainda menor. Mesmo com tanto crescimento, o país ainda representa cerca de 0,38% da produção mundial. Segundo Simões, um dos principais entraves para o desenvolvimento do setor é o peso da carga tributária. “Para enfrentar essa dificuldade é necessário um regime tributário específico que contemple a cadeia produtiva como um todo, e não com benefícios fiscais isolados e temporários”, opinou. Neste sentido, a Abeeólica vem discutindo com o governo federal a implementação do Renovento, regime tributário especial para desonerar desde a matéria-prima até a operação dos parques eólicos. Simões prevê quadruplicar capacidade até 2012

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Divulgação Petrobras

Especial - Energias Alternativas

Turbina da usina localizada em Macau, no Rio Grande do Norte, pertencente à Petrobrás

Mas por que a opção eólica, se o Brasil tem tanto potencial hidráulico para gerar energia? A resposta, segundo Simões, está na diversificação. “Temos o privilégio de possuir recursos hidráulicos extraordinários e, assim, por muitos anos a nossa matriz continuará sendo predominantemente da forma que conhecemos hoje - com as hidroelétricas - e é bom que seja assim, porque essa é a mais competitiva de todas

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as fontes. Mas a eólica é irmã siamesa da energia hidráulica e absolutamente complementar a esta”, afirmou. Segundo ele, a característica complementar pode ser verificada até em termos de sazonalidade. “Os ventos são mais fortes e mais constantes justamente quando não está chovendo, nos períodos em que os reservatórios de água das hidros estão secando”, explicou.

E é justamente neste ponto que, segundo ele, o crescimento da oferta de energia calcada em bases hidráulicas e eólicas, dada a complementaridade e contrasazonalidade, faz com que o Brasil tenha uma condição extremamente diferenciada e competitiva, em comparação com outros países. Como estimulante da competitividade, o Leilão de Energia de Reserva (LER) funcionou bem já que também estimulou o aumento da escala na fabricação de equipamentos e componentes de geração eólica. Por isso Simões destaca a importância desta política. “A continuidade de leilões específicos para energia eólica pode tornar o Brasil uma plataforma de domínio tecnológico desta rota de geração”, opinou. Ao menos na edição do LER 2010, que será realizada em agosto, as eólicas terão que dividir espaço com termelétricas movidas a biomassa (bagaço de cana-de-açúcar, resíduos de madeira e capim elefante) e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Até agora, porém, segundo informações da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), as usinas movidas a vento são a grande maioria: representam 82% das 517 usinas cadastradas para concorrer ao leilão de fontes alternativas destinadas ao fornecimento de energia em 2013. Juntas, todas as cadastradas terão uma capacidade instalada de 15.774 megawatts (MW), sendo que as 425 eólicas têm capacidade para 11.214 MW. Mesmo com dados tão promissores, o setor ainda tem desafios pela frente. Para que a energia que vem dos ventos se firme de vez em solo brasileiro é preciso resolver uma importante questão: o alto custo de produção. A energia gerada por essa alternativa custa entre 60% e 70% a mais que a mesma quantidade oriunda de uma usina hidrelétrica. Segundo Simões, o processo para baixar este custo já começou. “A energia eólica no Brasil está em fase de ampliação da sua competitividade. Basta comparar o preço praticado no Proinfa e o preço médio do Leilão de 2009. No Proinfa os valores são de R$ 260/MWh, enquanto no leilão o preço médio foi de R$ 148/MWh”, destacou. Segundo ele, a melhoria na qualidade dos projetos, a percepção de risco dos investidores com o contrato ofertado no leilão, a situação cambial do ano passado e os efeitos da crise de 2008 influenciaram na redução dos custos.


A Força dos ventos Como funciona? Energia eólica é a energia cinética contida nas massas de ar em movimento (vento). Seu aproveitamento ocorre por meio da conversão da energia cinética de translação em energia cinética de rotação, com o emprego de turbinas eólicas, também denominadas aerogeradores, para a geração de eletricidade, ou cataventos (e moinhos), para trabalhos mecânicos como bombeamento d’água. As primeiras tentativas de geração de eletricidade surgiram no final do século 19, mas somente cerca de um século depois é que foram desenvolvidos equipamentos para produção em escala comercial.

TOP 10 – CAPACIDADE TOTAL INSTALADA 2008 Resto do mundo

Estados Unidos

Portugal Dinamarca Inglaterra França

Itália Índia

Alemanha

Fonte: Aneel – Agência Nacional de Energia Elétrica

Vantagens A energia eólica atende às três principais preocupações em termos de geração de energia sustentável: • Segurança de suprimento – ao contrário de combustíveis fósseis, como o petróleo, a energia eólica utiliza-se de matéria-prima permanentemente disponível em praticamente todos os países do mundo; • Independência de preços externos do petróleo e do gás natural - Cada quilowatt / hora gerado por energia eólica tem potencial para substituir importações de combustíveis fósseis, melhorando a segurança do abastecimento e da balança comercial dos países; • Emissão reduzida de CO2 – o setor energético é a maior fonte de emissões de CO2, representando cerca de 40%. Na opção eólica, porém, a emissão é baixíssima: três a seis meses de atividade de uma turbina eólica compensam as emissões geradas durante a fabricação da própria turbina. Diferencial As três vantagens acima podem ser observadas também nas usinas hidrelétricas. O grande diferencial das eólicas refere-se ao baixo impacto ambiental que provocam. O equipamento ocupa 1% da área da usina eólica e o restante pode ser ocupado por lavoura ou pastagem. Além disso, é possível a uma distância de 400 metros das usinas eólicas sem que seu ruído cause danos ou perturbações ao ser humano. Desvantagens O custo da energia gerada por essa alternativa é entre 60% e 70% mais alto do que a mesma quantidade produzida em uma usina hidrelétrica. Programas governamentais de incentivo estão tentando mudar esta realidade. Pelo mundo Os Estados Unidos ocupam o topo da lista dos países com maior capacidade instalada em comparação com o potencial energético, somando 20,8%. Em seguida, vem a Alemanha, com 19,8%. Fonte: Conselho Global de Energia Eólica (GWEC)

China Espanha MW

%

EUA

25,170

20.8

Alemanha

23,903

19.8

Espanha

16,754

13.9

China

12,210

10.1

Índia

9,615

8.0

Italia

3,736

3.1

França

3,404

2.8

Inglaterra

3,241

2.7

Dinamarca

3,180

2.6

Portugal

2,862

2.4

Resto do mundo

16,693

13.8

Total TOP 10

104,104

86.2

Total mundo

120,798

100.0

No Brasil O país tem posição destacada no contexto regional, pois terminou o ano de 2009 com uma capacidade instalada de 606 MW, tendo apresentado um crescimento de 77,7% sobre os 341 MW instalados até o final de 2008. Geração Eólica no Brasil Capacidade instalada Ano MW

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 22

29

29

29

237

247

341

606 1423*

*projeção com a finalização do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (PROINFA)

Fonte: Abeeólica

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Especial - Energias Alternativas USINAS do tipo Eólica em Operação Usina Eólica de Prainha Eólica de Taíba

Potência Fiscalizada Destino (kW) da Energia 10.000 PIE

Proprietário

Município

100% para Wobben Wind Power Industria e Comércio Ltda

Aquiraz - CE São Gonçalo do Amarante - CE

5.000

PIE

100% para Wobben Wind Power Industria e Comércio Ltda 100% para CEMIG Geração e Transmissão S/A

Eólica - Elétrica Experimental do Morro do Camelinho Eólio - Elétrica de Palmas Eólica de Fernando de Noronha Parque Eólico de Beberibe Mucuripe RN 15 - Rio do Fogo Praia do Morgado Pirauá Eólica de Bom Jardim Foz do Rio Choró

1.000

REG

2.500 225 25.600 2.400 49.300 28.800 4.950 600 25.200

PIE REG PIE REG PIE PIE PIE REG PIE

Praia Formosa

104.400

PIE

Eólica Olinda

225

REG

Eólica Canoa Quebrada

10.500

PIE

Lagoa do Mato

3.230

PIE

Parque Eólico do Horizonte

4.800

REG

Eólica Icaraizinho

54.600

PIE

Eólica Paracuru

23.400

PIE

Eólica Praias de Parajuru Pedra do Sal Parque Eólico Enacel Macau Canoa Quebrada Eólica Água Doce Parque Eólico de Osório Parque Eólico Sangradouro

28.804 18.000 31.500 1.800 57.000 9.000 50.000 50.000

PIE PIE PIE REG PIE PIE PIE PIE

Taíba Albatroz

16.500

PIE

100% para Bons Ventos Geradora de Energia S.A.

PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE PIE

100% para Ventos do Sul Energia S/A 100% para Bons Ventos Geradora de Energia S.A. 100% para Eólica Gravatá - Geradora de Energia S.A. 100% para Eólica Gravatá - Geradora de Energia S.A. 100% para Eólica Gravatá - Geradora de Energia S.A. 100% para Eólica Gravatá - Geradora de Energia S.A. 100% para SPE Millennium Central Geradora Eólica S/A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A 100% para Vale dos Ventos Geradora Eólica S.A

Parque Eólico dos Índios Bons Ventos Xavante Mandacaru Santa Maria Gravatá Fruitrade Millennium Presidente Camurim Albatroz Coelhos I Coelhos III Atlântica Caravela Coelhos II Coelhos IV Mataraca Total: 45 Usina(s)

50.000 50.000 4.950 4.950 4.950 4.950 10.200 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500 Potência Total: 794.334 kW

100% para Centrais Eólicas do Paraná Ltda 100% para Centro Brasileiro de Energia Eólica - FADE/UFPE 100% para Eólica Beberibe S.A. 100% para Wobben Wind Power Industria e Comércio Ltda 100% para Energias Renováveis do Brasil S.A. 100% para Central Eólica Praia do Morgado S/A 100% para Eólica Pirauá Geradora de Energia S.A. 100% para Parque Eólico de Santa Catarina Ltda 100% para SIIF Cinco Geração e Comercialização de Energia S.A. 100% para Eólica Formosa Geração e Comercialização de Energia S.A. 100% para Centro Brasileiro de Energia Eólica - FADE/UFPE 100% para Rosa dos Ventos Geração e Comercialização de Energia S.A. 100% para Rosa dos Ventos Geração e Comercialização de Energia S.A. 100% para Central Nacional de Energia Eólica Ltda 100% para Eólica Icaraizinho Geração e Comercialização de Energia S.A. 100% para Eólica Paracuru Geração e Comercialização de Energia S.A. 100% para Central Eólica Praia de Parajuru S/A 100% para Eólica Pedra do Sal S.A. 100% para Bons Ventos Geradora de Energia S.A. 100% para Petróleo Brasileiro S/A 100% para Bons Ventos Geradora de Energia S.A. 100% para Central Nacional de Energia Eólica Ltda 100% para Ventos do Sul Energia S/A 100% para Ventos do Sul Energia S/A

SP - Serviço Público PIE - Produção Independente de Energia Fonte: ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica 32

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Gouveia - MG Palmas - PR Fernando de Noronha - PE Beberibe - CE Fortaleza - CE Rio do Fogo - RN Acaraú - CE Macaparana - PE Bom Jardim da Serra - SC Beberibe - CE

REG - Registro

Camocim - CE Olinda - PE Aracati - CE Aracati - CE Água Doce - SC Amontada - CE Paracuru - CE Beberibe - CE Parnaíba - PI Aracati - CE Macau - RN Aracati - CE Água Doce - SC Osório - RS Osório - RS São Gonçalo do Amarante - CE Osório - RS Aracati - CE Pombos - PE Gravatá - PE Gravatá - PE Gravatá - PE Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB Mataraca - PB


desArME-se

NEO MONDO não pretende explicar a violência urbana. Apenas faz um apelo às pessoas para que não se isolem à frente de um computador; saiam de si mesmas e convivam mais; eduquem-se para o Bem; cerquem-se de pessoas sempre melhores do que elas próprias; busquem o conhecimento na pesquisa, no estudo, na troca de ideias e de experiências positivas seja no campo pessoal seja no coletivo; cuidem-se e cuidem dos mais fracos, dos mais carentes, das crianças e adolescentes, dos idosos, das plantas, dos animais. Somente pessoas de mentes e corpos sadios saberão salvar o Planeta do fim dos tempos. O gênero humano e a Terra agradecem!


Saúde

Fitoterapia

a medicina sustentável

O Brasil ainda não despertou para a riqueza incalculável de suas espécies terapêuticas. Da Redação

G

inseng, carqueja, guaraná, confrei, ginko biloba, espinheira santa, sene, guaco, boldo....difícil encontrar quem nunca utilizou ou pelo menos ouviu falar dessas plantas medicinais, tão eficazes e em muitos casos, acessíveis. Elas integram um rol de plantas cujas substâncias podem ser utilizadas com finalidade terapêutica. Muitas delas são, inclusive, matérias-primas para o preparo de medicamentos sintéticos. O uso de plantas medicinais remonta a própria história da humanidade, permanecendo até os dias atuais como a base da terapêutica moderna, porém, no Brasil ainda há pouca aplicabilidade se comparado a outros países, como a Alemanha, onde 75% da população já utiliza fitoterápicos. Por aqui, sobretudo nos grandes centros, os médicos e muitas vezes, os próprios pacientes, resistem ao uso desses medicamentos, que possuem eficácia comprovada e agregam inúmeros valores sociais, econômicos e ambientais, que os levam a serem considerados pelos seus defensores como os biocombustíveis da saúde, pois po-

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Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

deriam representar fonte de riquezas e divisas incalculáveis para o país. De todo modo, ainda ouviremos falar muito sobre Fitoterapia. Ela foi recomendada pela Organização Mundial de Saúde como medida estratégica para universalizar os direitos à utilização de medicamentos e tem recebido amplo apoio do Ministério da Saúde brasileiro. O médico Luiz Sérgio Passos Alves (*), especialista em Plantas Medicinais e responsável pelo módulo de medicina na pós de fito da Universidade Federal de Lavras, explicou que a política nacional, que define as regras e os recursos destinados à Fitobrasil, é ainda muito recente, mas que a quantidade de pós-graduações e cursos universitários já quadruplicou, trazendo no seu rastro trabalhos científicos de boa qualidade.

Apesar desse movimento favorável, ele diz que a fitoterapia ainda não conta com a adesão do Conselho Regional de Medicina. “O médico, ainda conhece pouco sobre esta opção terapêutica. Mas estamos melhorando” – esclareceu ele. Alves explicou que o medicamento fitoterápico é aquele obtido exclusivamente de matérias-primas vegetais, processado tecnologicamente, com benefícios comprovados nas finalidades curativas, profiláticas ou diagnóstica. Fonte de Riqueza Além do aspecto que envolve a saúde, estamos falando de um mercado que movimenta US$ 22 bilhões/ano, sendo US$ 8,5 bilhões, na Europa e US$ 6,3 bilhões nos Estados Unidos. O Brasil tem a parcela de apenas US$ 400 milhões.

A fitoterapia é a grande chance do Brasil embarcar definitivamente na milionária rota tecnológica da indústria farmacêutica


Publicado na edição 4

A Alemanha detém 39% do mercado europeu, apesar de possuir apenas 20 plantas endêmicas (próprias da região), contra 25.000 espécies brasileiras. Porém, os alemães formaram o maior centro de pesquisa mundial em fito (Comissão E). O tema é matéria curricular obrigatória nas faculdades de medicina, sendo prescrita por 70% dos médicos, contra 3% no Brasil. “Possuímos a maior grife ecológica do Planeta. Um hectare da Floresta Amazônica tem mais espécies de plantas do que todo o Continente Europeu (200 a 300)” – confirmou o especialista. No entanto, como 65% das Indústrias Farmacêuticas instaladas no Brasil são multinacionais, 80% dos Fitoterápicos produzidos aqui são feitos com plantas exóticas (não-nativas do Brasil). Nos raros casos onde o produto brasileiro é valorizado, como o açaí e a castanha-do-pará, torna-se possível oferecer emprego para mais de 30.000 pessoas. Para Alves, “a fitoterapia é a grande chance do Brasil embarcar definitivamente na milionária rota tecnológica da indústria farmacêutica”. Isso sem contar

a questão da sustentabilidade e qualidade que poderia reverter um triste panorama brasileiro: a saúde pública. Biodiversidade e Biopirataria A união da grande biodiversidade com a falta de um controle efetivo de nossos recursos naturais, faz do Brasil a maior vítima mundial da Biopirataria. A CPI da Biopirataria acusa diversos países por patentes indevidas de nossas plantas nativas: cupuaçú, biribiri, mandioca selvagem, açaí.... Calcula-se que o conhecimento sobre a biodiversidade brasileira tenha um valor de US$ 2 trilhões (quatro vezes o PIB nacional). “Um exemplo disso é que entre os anos de 1983 e 1994, 60% dos antineoplásicos descobertos vinham diretamente das plantas. A folha da graviola que nasce e cresce em abundância no Brasil (subespontânea) demonstrou ser eficaz no tratamento do adenocarcinoma de cólon” – disse o médico. O mundo científico vasculha o Brasil em busca de plantas para tratamento do câncer, AIDS, hepatite B, herpes e gripe.

Neo Mondo - Junho 2008

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Saúde

INSTINTO DE SOBREVIVÊNCIA Estudos apontam que o uso de plantas como medicamento faz parte do extinto de sobrevivência animal. Dentre os inúmeros exemplos está o chimpanzé, que consome 16 tipos de ervas, que não possuem nem saFARMÁCIAS VIVAS Os fitoterápicos produzidos com tinturas e extratos vegetais custam de duas a quinze vezes menos que os remédios industrializados. Muitos estados brasileiros (Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, etc) possuem Farmácias Vivas, onde se planta, manipula e dispensa gra-

bor agradável nem valor nutricional, apenas terapêutico. Também o gavião, que quando picado por cobra, ingere folhas de guaco, cujas propriedades antiofídicas foram recentemente comprovadas pela ciência. Já o homem que, desde a antigüidade, utilizava plantas com fins terapêuticos, traçou rumos diferentes. Com a evolução da química e a possibilidade da síntese de medicamentos a nível industrial, a fitoterapia caiu no descrédito total, até que nos anos 60, com o advento da Talidomida ¹, se percebeu uma nova doença desastrosa: o efeito colateral e os riscos oferecidos pelo uso indiscriminado de medicamentos sintéticos. O mundo então voltou seu olhar, novamente, para as alternativas naturais.

tuitamente fitos, prescritos pelos médicos locais. Este já pode ser considerado um reflexo positivo da implantação da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, que tem o objetivo de garantir o acesso seguro e o uso racional, visando a sustentabilidade desses recursos naturais.

Em 2004, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publicou uma resolução (RE 89) que facilitava o registro de 34 fitoterápicos, com a intenção de incentivar a produção e baratear o custo ao usuário. “Infelizmente esta lista só continha três plantas nativas do Brasil (guaco, espinheira-santa e guaraná)” - diz Alves.

Plantas medicinais 1) Guaraná, simboliza os olhos de um pequeno índio prodígio da tribo Mauê, que foi morto perversamente pelo Deus do mau. Seus olhos foram arrancados e plantados por ordem do Deus Tupã, onde nasceu o primeiro pé de guaraná, que significa força e vigor. Veja que a semente do guaraná parece com olhos mesmo; 4) Catharanthus roseus. Dela se extrai a vincristina e a vimblastina, quimioterápico para o tratamento de linfomas e leucemias;

7) A flor do nosso Pequi usado para curar gripes e resfriados;

2) Cordia verbenacea, o 1º fito Brasil, antiinflamatório para entorses;

3) Maytenus (espinheira santa) para gastrites; 5) Mikania glomerata, (guaco) bronco dilatador e expectorante;

6) Passiflora Edulis, potente ansiolítico;

8) Bixa orelana, semente do urucu (coloral), usado nas dermatoses; 9) ritual do Santo D’aime, com a erva que altera o nível de consciência e é a grande novidade da ciência para o tratamento do Mal de Parkinson.

contato com o médico Luiz Sérgio Passos Alves : fitomania@globo.com A talidomida (C13H10N2O4) é uma substância usualmente utilizada como medicamento sedativo, anti-inflamatório e hipnótico. Se usada durante a gravidez, pode causar má-formação ou ausência de membros no feto

(*) (1)

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Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013


Evolução Terapêutica nos Últimos 4000 Anos: Queixa: dor de ouvido; Tratamento proposto:

2000 aC: coma esta raiz;

1000 dC: raiz é pagã, reze esta oração;

1800 dC: oração é crendice, tome esta poção;

1900 dC: poção é veneno de bruxa, engula esta pílula;

1950 dC: pílula é paliativa, use este antibiótico;

2000 dC; antibiótico é prejudicial à saúde, coma esta raiz.

Complexidade Mas não tem sido tão simples assim. As plantas possuem seu próprio laboratório de síntese. Tão perfeito e complexo que o homem jamais conseguiu imitar. Talvez esteja aí o grande desafio desse resgate ao natural, que precisa estar adaptado às necessidades do mercado: padronização, uniformidade, produtividade contínua, quantidade, qualidade, tamanho, aspecto, homogenidade, freqüência, etc. “Não é tarefa fácil. Por isto, a Fitoterapia é uma ciência eminentemente interdisciplinar. Não adianta o médico prescrever sem a mobilização de biólogos, taxonomistas, agrônomos, químicos, farmacêuticos e, principalmente, a agregação do conhecimento popular” – considerou o especialista. Riscos Nas últimas décadas, a fitoterapia ganhou notoriedade mundial por ser considerada segura, eficaz e com baixa incidência de efeitos colaterais. Contudo, é preciso desmistificar o dito popular: “É natural, não faz mal”. Alves cita o exemplo do confrei, que foi utilizado indiscriminadamente para prevenção e tratamento de leucemias, mas acabou provocando inúmeros tumores hepáticos malignos. Outros agravantes são: a incidência de contaminação (bactérias, mofo, coliformes fecais, insetos e metais pesados), a adulteração intencional e a identificação errônea das ervas, assim como a manipulação e preparo de forma inadequada, que podem levar a resultados desastrosos e perigosos. A associação entre fitos e sintéticos também pode oferecer riscos ao paciente. Por isso mesmo, a prescrição médica é indispensável.

Plantas Terapêuticas As 34 ervas com registro facilitado no MS/ANVISA são: • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •

castanha-da-india: fragilidade capilar, varizes; alho: hipertensão arterial leve, dislipidemia e prevenção da aterosclerose; babosa: queimadura térmica grau 1 e 2 e de radiação; uva-ursi: infecção do trato urinário; calêndula: cicatrizante e antiinflamatório dermatológico; centela asiática: insuficiência venosa dos membros inferiores; cimicifuga racemosa: sintomas do climatério; alcachofra: estimulante da função hepática; echinácea: preventivo e coadjuvante na terapia de resfriado e infecção do trato urinário; ginkgo biloba: vertigens e zumbidos, insuficiência vascular cerebral; hypericum: estados depressivos leves e moderados; camomila: anti-espasmódico, antiinflamatório tópico, distúrbios digestivos, insônia leve; espinheira santa: dispepsia e coadjuvante no tratamento de úlcera gástrica; melissa: anti-espasmódico, carminativo, distúrbios do sono; hortelã: cólicas intestinais, carminativo, expectorante; ginseng: fadiga física e mental, adaptógeno; passiflora: sedativo; guaraná: astenia, estimulante do SNC; boldo-do-chile: estimulante hepático, distúrbios gastrintestinais espásticos; anis: antiespasmódico, carminativo, expectorante; kava-kava: ansiedade, insônia, tensão nervosa, agitação; cáscara-sagrada: constipação intestinal; salgueiro: antitérmico, antiinflamatório, analgésico; sene: laxativo; saw palmeto: hipertrofia benigna de próstata; confrei: cicatrizante tópico; tanaceto: profilaxia da enxaqueca; gengibre: profilaxia dos vômitos causados por movimentos e pós-cirúrgicos; valeriana: insônia leve, sedativo, ansiolítico; guaco: expectorante, broncodilatador; hamamelis: hemorróidas e equimoses; poligala: bronquito, faringite; eucalipto: antitussígeno e antibacteriano das vias aéreas superiores, expectorante .

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Cultura

Devoção e fé

Fotos: Ascom Basílica Santuário de Nazaré

Anualmente, milhões de fíeis se reúnem, em Belém do Pará (PA), na maior manifestação religiosa católica do Brasil, o Círio de Nazaré Eleni Gritzapis

A

cada ano, em Belém do Pará (PA), milhões de fiéis de todas as idades, etnias e classes sociais, muitos de olhos marejados e mãos estendidas, se reúnem pelas ruas da capital paraense em torno de um mesmo objetivo: homenagear Nossa Senhora de Nazaré. Relatos de fé, vitórias, conquistas, superações e solidariedade marcam os mais de 200 anos de história do Círio

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Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

de Nazaré, a maior manifestação religiosa católica do Brasil e um dos maiores eventos religiosos do mundo. Celebrada, desde 1793, no segundo domingo de outubro, o Círio atrai, a cada ano, mais e mais devotos. Em 2012, mais de dois milhões de pessoas se reuniram em torno da corda do Círio, em uma caminhada de 3,6 quilômetros, com várias paradas, para homenagear a Santa. E, em

2013, é esperado um novo recorde. Por sua grandiosidade, o Círio de Belém foi registrado, em setembro de 2004, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), como Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial. A introdução da devoção à Senhora da Nazaré, no Pará, foi feita pelos padres jesuítas, no século XVII. A origem da procissão está ligada à lenda da descoberta da


imagem de Virgem de Nazaré. Em 1700, às margens do igarapé Murucutú, o caboclo Plácido José de Souza encontrou a imagem de Nossa Senhora. Ele levou a estátua para sua cabana, mas, no outro dia, ela não estava mais lá. Plácido a achou novamente no igarapé onde a havia encontrado no dia anterior. Este é considerado o primeiro milagre da Virgem de Nazaré. Assim, o Círio refaz há mais de dois séculos o caminho da imagem. O local onde Plácido a encontrou é hoje a Basílica de Nazaré. Assim, na noite de sábado, uma procissão a velas, chamada de transladação, leva a imagem da Basílica de Nazaré para a Catedral da Sé, no centro histórico de Belém,

próximo de onde ficava a cabana de Plácido. Na manhã de domingo, acontece a principal procissão quando a imagem sai da Catedral da Sé e segue para a Basílica de Nazaré, onde a imagem da Virgem fica exposta para veneração dos fiéis durante 15 dias. O termo “Círio” tem origem na palavra latina “cereus” (de cera), que significa vela grande de cera. Além da procissão de domingo, o Círio agrega várias outras manifestações de devoção, como a trasladação, a romaria fluvial e diversas outras peregrinações e romarias. A festa tem ainda vários eventos e comemorações, que duram cerca de quatro semanas.

Apesar de o Círio de Nazaré de Belém ser o mais conhecido, o Círio mais antigo do Brasil data de 8 de setembro 1630 na cidade de Saquarema, no Rio de Janeiro. Procissões semelhantes são realizadas em várias outras cidades do Pará e do Brasil. As mais famosas são o Círio de Soure, o Círio de Vigia, além das procissões realizadas em Castanhal, Breves e em outras cidades paraenses. A cidade do Rio de Janeiro realiza a procissão no mês de setembro, em Copacabana. Brasília, Manaus e Macapá são algumas capitais onde o Círio de Nazaré foi introduzido por paraenses que moram em outros estados.

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Cultura

Fé e solidariedade O Círio de Nossa Senhora de Nazaré é experiência de fé, mas é também fonte de solidariedade.

passa por uma triagem. Tudo é vendido para empresas e grupos e a renda é dividida igualmente entre os catadores.

O lixo recolhido durante as romarias do Círio de Nazaré se transforma em renda para famílias de catadores da capital paraense. Em 2012, foram recolhidos mais de 770 toneladas de lixo durante as procissões; sendo cerca de 400 toneladas de materiais recicláveis.

Além disso, grande parte da arrecadação da Festa é investida nas Obras Sociais da Paróquia de Nazaré (Ospan). Milhares de pessoas são beneficiadas anualmente em seus projetos de atendimento médico e odontológico, distribuição de sopa, creches infantis e iniciativas para o desenvolvimento da comunidade, como o programa de inserção no mercado de trabalho e o programa adolescente trabalhador.

Todo o material que pode ser reciclado é levado até um galpão localizado no bairro de Val-de-caes, em Belém, onde

Símbolos da tradição O Círio de Nazaré é cercado de objetos e rituais simbólicos. Conheça, abaixo, os principais:

As crianças, tradicionalmente vestidas de anjos

A corda, espaço de pagamento de promessas dos romeiros e pesa aproximadamente 700 quilos, de puro sisal torcido. Foi incorporada à celebração em 1868.

As novenas, ciclos de orações realizadas durante as semanas que antecedem a festividade, por devotos que realizam pequenas romarias pelas casas de vizinhos.

O manto, sempre com uma conotação mística, relatando partes do evangelho. A cada procissão, há sempre um novo manto envolvendo a figura de Nossa Senhora. Sua confecção é feita com a ajuda de doações, quase sempre anônimas.

O almoço com a família, realizado no domingo da procissão, como um ato de comunhão. Tradicionalmente é composto de Pato no Tucupi e Maniçoba, pratos tradicionais da região.

Os carros de promessas ou dos milagres, que recolhem os ex-votos ilustrativos das graças alcançadas pelos fiéis.

Os brinquedos feitos de miriti, uma palmeira típica do Norte do Brasil.

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ÁGUA CINZA,

Humberto Mesquita

uma grande solução

A

água é a peça mais importante nesse quebra-cabeça que se chama Planeta Terra, porque toda e qualquer forma de vida aqui está relacionada com este recurso natural. Muito se fala a respeito das reservas de água do mundo e segundo as estatísticas mais respeitáveis existe um milhão, trezentos e oitenta e seis quilômetros cúbicos de água na terra, e permanecem constantes nesses últimos milhões de anos. Só que dessas reservas, 97,5% constituem mares e oceanos, e os restantes 2,5% de água doce, sendo que dessa minúscula parte grande quantidade está congelada nas calotas polares e nas geleiras. O pouco que resta para o consumo diário sofre processo de degradação pela ação nociva do homem que já conseguiu obstruir a chegada de água potável a algumas regiões do planeta. Nesses últimos 50 anos triplicou o uso da água no mundo, e hoje muitos paises africanos sofrem com a falta de água. A previsão é de que mais de 200 milhões de africanos sofrerão com a escassez de água em 2025. Nesse mesmo ano, 3 bilhões de pessoas viverão em países com completa falta de água, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Hoje sabemos que a água potável salva mais vidas que todas as instituições médicas do mundo e ao mesmo tempo essa mesma água, sendo contaminada, é responsável por 80% das doenças do Planeta. Tudo isso nos leva a uma reflexão mais profunda a respeito da necessidade de medi-

das que devam ser adotadas para se economizar o precioso líquido. As campanhas são intensas e todas no mesmo sentido da conscientização de todos para o risco do fim da água boa que possa abastecer as populações. Todo esforço é importante, mas nós queremos aqui abordar um método que está sendo disseminado no mundo inteiro que é o aproveitamento da chamada água cinza, aquela proveniente de chuveiros, banheiras, lavatórios, máquinas de lavar e até mesmo das piscinas. Ela difere da água negra usada em sanitários ou pias de cozinha que podem conter algum tipo de coliforme fecal ou bactérias com potencial patogênico. Essa água cinza pode ser coletada e reutilizada na casa em outras formas, para fins que exigem qualidades não potáveis, como irrigação dos jardins, lavagem de veículos e na irrigação de campos agrícolas e pastagens. Para viabilizar tal procedimento e reutilizar a água de uma residência ou centro comercial é importante separar a água cinza da negra, com a instalação de um equipamento de tratamento capaz de fornecer um sistema de irrigação adequado e direcionado. As águas cinzas podem ser esterilizadas nas residências a partir da instalação de dois tipos de tratamento: o primeiro é a irrigação por infiltração subterrânea, onde as águas não passam por nenhum tratamento específico; apenas os sólidos suspensos devem ser retidos e a água é armazenada corretamente

e bombeada para a irrigação. O outro processo é a irrigação superficial, onde as águas cinzas de reúso devem ser tratadas, envolvendo basicamente filtragem para retirada de odores e esterilização. O mais certo é instalar esses procedimentos ainda na fase da construção da casa ou do edifício para se planejar o que há de mais correto. O reúso da água cinza é muito importante sob o ponto de vista ambiental porque num plano maior diminui a demanda por novas estações de tratamento de água e esgoto, além dos proveitos econômicos pela redução dos gastos de água. No Brasil esse procedimento é ainda incipiente, mas em cidades como Tóquio, o reúso das águas é obrigatório para prédios grandes com potencial de reúso de 100 metros cúbicos por dia. Os Estados Unidos e a Austrália também adotam uma rigorosa política de reúso da água. O Brasil tem buscado essa fórmula no laboratório Casa Autônoma de Arquitetura Sustentável, que mantém uma pesquisa para o reúso das águas. A grande verdade é que o mundo acordou para a necessidade de se buscar medidas que possam proteger o meio ambiente, definindo novas regras em favor de uma vida mais limpa e mais sustentável.

Jornalista, Escritor e Editorialista. Apresentador de TV e Rádio. Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

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Cultura

Foto: Gilvan Barreto

O Olhar Social pelas

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Publicado na edição 6

lentes de

Gilvan Barreto O papel social da fotografia, numa sociedade que supervaloriza as imagens. Da Redação

C

ada vez mais, as imagens assumem um papel de relevância na comunicação. Fotos de catástrofes urbanas, ondas destruindo cidades, vítimas da violência, cenas do sertão, o padrão de beleza estampado em outdoors, a exuberância ou a miséria, circulam o mundo e ficam registrados na história e na mente das pessoas. A mídia, a publicidade, a comunicação empresarial exploram com muita competência essa ferramenta, que invade nossas retinas em todo momento. Estudos na área apontam que inconscientemente, as pessoas entendem as imagens como uma verdade inequívoca do acontecimento. Por trás de todo esse poder “documental”, estão os profissionais da fotografia que focam e definem os fragmentos da realidade a ser registrada. Assim, numa sociedade “viciada em imagens”, a responsabilidade

social desses profissionais cresce na mesma proporção que o uso desenfreado desse recurso visual. O fotógrafo Gilvan Barreto, que traz na bagagem o registro de imagens dos cantos mais remotos do mundo e, possui o olhar treinado para captar os diversos elementos que compõem uma fotografia, acredita que de fato, ela possui o poder de sensibilizar e de transformar opiniões públicas. Advindo da escola de jornalismo, o fotógrafo crê que esse tipo de trabalho deve possuir uma carga ética, ideológica e humanitária. “Vamos a lugares e situações de pouco acesso, onde o cidadão comum nem sempre chega. É nossa função revelar essa realidade e se possível provocar reflexões, gerar mudanças ou pelo menos quebrar preconceitos” – explica.

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Fotos: Gilvan Barreto

Cultura

Barreto, que presta serviços para Ongs como a Oxfam International, a Unicef e o Greenpeace, percebe que o Terceiro Setor, no exterior, já entendeu a força desse recurso e investe na documentação fotográfica, inclusive das questões sociais brasileiras, das quais, já encomendou inúmeros trabalhos. Ele revela que as organizações nacionais, com exceções daquelas muito bem estruturadas, ainda não utilizam muito essa ferramenta. TRABALHOS Com foco social, tem realizado alguns trabalhos na América Latina. Em 2007, fotografou a colheita de café orgânico nas montanhas de Honduras, um dos lugares mais pobres do mundo. Ainda há outros

projetos de cunho social, envolvendo a África e a Ásia. “Tudo isso é muito estimulante, saber que as grandes organizações dão importância a esse tipo de fotografia”. – afirmou. Sua profissão também o levou ao Nepal onde conheceu o trabalho desenvolvido por uma mestre de yoga, em penitenciárias de Katmandu. O projeto dessa nepalesa humanizou e amenizou as condições daquelas pessoas e a reportagem fotográfica de Barreto é um dos poucos registros dessa experiência. Nas suas imagens o ser humano é a fonte principal de inspiração. Ele, que se considera um retratista, diz que ao fotografar pessoas busca extrair a essência delas. Para isso, a aceitação de quem está sendo fotografado é muito importante

Não concordo em exibir seres humanos em estado degradante

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e essa confiança precisa ser adquirida com conversa, com aproximação, com a disposição de entrar no mundo particular de cada um. “O que busco é que o retratado entenda que sua imagem poderá servir de exemplo para outras pessoas. Que ele possui algo de especial para ser mostrado”. – disse. Em se tratando de um trabalho com abordagem social, essa compreensão já é a primeira mudança conquistada: a valorização desses personagens da vida real. O conteúdo dessas imagens extrapola a estética, pois há outros valores envolvidos nessa composição. “Um retrato verdadeiro é aquele que conta a história das pessoas” – afirmou. Apesar de fotografar em locais muito remotos, por vezes pobres e desfavorecidos, Barreto tem uma visão diferenciada e não explora a estética da miséria. Faz uso de um olhar positivista, como forma de resguardar a integridade dos retratados. “Não concordo em exibir seres humanos em estado degradante”. Para ele, há alternativas mais eficazes, respeitosas, instigantes e até mesmo bonitas para tratar o assunto e provocar mudanças. As marcas de sofrimento, a rudeza da vida, a pobreza, podem estar presentes, mas a dignidade, o brilho de esperança no olhar, a grandeza e o melhor de cada um também coexistem como elementos desses documentos sociais.

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Água

Solução para

Cabo Verde Engenheiro da Universidade de São Paulo desenvolve processo sustentável de dessalinização da água Da Redação

C

Fotolia

abo Verde é um país africano com pouco mais de 500 mil habitantes – e com um dos maiores problemas do mundo atual. Embora não tenha dados oficiais sobre o acesso à água potável, o conjunto de ilhas sofre com a escassez deste recurso. Mas a ajuda pode estar a caminho, vinda do outro lado do Atlântico. Um sistema mecânico capaz de transformar água do mar em água potável foi desenvolvido na Escola Politécnica da USP. O autor, Juvenal Rocha Dias, nasceu em Cabo Verde e realizou as pesquisas durante o mestrado e o doutorado na Universidade. E o melhor: o processo funciona a partir de energias renováveis, com um custo final menor do que o dos processos conhecidos atualmente. Explicar a falta de água no mundo nem sempre é muito fácil. Qualquer crian-

ça, ao tomar conhecimento do problema, logo pergunta: “Mas a Terra não é o Planeta Água?”. Na verdade, é. Mas não da água potável. Apenas 0,007% da água do mundo pode ser consumida. O resto está nas geleiras, no subsolo e, sobretudo, nos mares e oceanos. Transformar a água salgada em algo próprio para ser ingerido é um grande desafio. Não só pela tecnologia, mas pelo custo e pelo impacto que o processo gera. Atualmente, os processos de dessalinização utilizam a energia elétrica e o diesel como combustíveis. Em média, esses processos gastam 10 kWh para produzir 1 m³ de água potável. O sistema de Juvenal, por outro lado, promete gastar apenas 2,8 kWh para a mesma quantidade de água, utilizando a energia eólica como combustível.

O processo funciona como um grande filtro. “A dessalinização começa com o bombeamento de água salgada para a parte superior de uma grande coluna, onde há um reservatório”, conta. Com o acúmulo de água, o reservatório pressiona uma espécie de êmbolo, que, por sua vez, “empurra” um segundo reservatório cheio d’água salgada. A água contida nele é forçada a passar por uma membrana, que funciona como filtro: os sais ficam retidos, enquanto apenas a água consegue passar. Com isso obtém-se a água potável. Como utiliza basicamente as leis da física no processo, a dimensão da coluna está diretamente ligada à quantidade de água a ser purificada. Uma coluna de 25 metros, por exemplo, consegue produzir água potável para 10 pessoas ao longo de um dia (aproximadamente 5 mil metros cúbicos).


Longo prazo O custo final e o impacto sobre o meio ambiente são menores, mas o processo desenvolvido por Juvenal não é um milagre. É preciso encarar a dessalinização como um projeto a longo prazo. Afinal, colunas de aço de mais de 20 metros não brotam do dia para a noite. “Os gastos com a construção e instalação do sistema podem ser caros. Porém, o investimento pode valer a pena a longo prazo”, diz a orientadora do estudo, professora Eliane Fadigas. Segundo ela, os governos de países subdesenvolvidos que sofrem com a escassez de água, como Cabo Verde, podem redirecionar o dinheiro da compra de diesel para a implantação do projeto, por exemplo. Os estudos na Poli foram feitos completamente em escala. Em vez de monumentos de aço, estruturas menores de papelão e concreto foram utilizadas para construir a coluna. Com isso fica difícil dizer com absoluta certeza o grau de eficácia do processo. Perdas por atrito, por exemplo, não foram calculadas. Outro problema é a própria energia eólica. Mesmo sendo mais limpa e ecológica, os ventos também podem se tornar inimigos. “Uma vez que é movido a energia eólica, depende das condições dos ventos. Há também a limitação de espaço. Quanto mais cataventos, mais potência – mas nem sempre isso é possível”, relata Juvenal. Mesmo assim o engenheiro está otimista com os resultados das pesquisas. Segundo ele, a coluna de dessalinização pode ser utilizada para outros fins, como despoluir rios. Basta uma pequena adaptação em seu funcionamento: com a utilização de filtros específicos, em vez de filtrar

Processo de Dessalinização R1

água do mar

mangueira extensivel

Água do mar Salmoura

V1

T1

Água potável Válvula T - Trava R - Reservatório R2 COLUNA DE DESSALINIZAÇÃO

V2 CATAVENTO

R5

V5

água dessalinizada

câmara C R4 V4

T2

AR

água de alimentação

o sal, a coluna pode separar poluentes da água. “Poderíamos utilizá-la ainda como fonte de água para a agricultura ou na produção de energia elétrica”, acrescenta a professora Eliane. Porém, não basta separar o sal da água e não saber onde descartá-lo. Jogá-lo no solo ou em aterros sanitários seria um desastre, uma vez que provocaria a salinização de todo o local. Então, o que fazer? A solução encontrada foi devolver o sal ao

R3

D

V3

módulo de membrana

mar. “Esse ‘resto’ deve ser devolvido ao mar, mas de uma forma controlada”, revela o engenheiro. Com isso o processo consegue minimizar os efeitos negativos sobre o ecossistema. Como ainda não há uma previsão para a implantação em larga escala, países como Cabo Verde continuam reféns de processos não-sustentáveis de dessalinização. Mas, se depender de Juvenal, por pouco tempo.

Não é fácil o processo de dessalinização, mas é preciso fazer algo para aumentar o potencial de água potável disponível no Planeta, que não chega a 1% Neo Mondo - Setembro 2008

A


O Calor que vem E

m termos de energia térmica, o interior do nosso planeta é uma fonte inesgotável, considerando a escala de tempo humano. A transferência de calor da Terra ocorre por meio de três mecanismos: Condução: que acontece pela transferência de calor entre moléculas pelo contato físico entre elas. A condução depende da estrutura molecular do material. Convecção: que é a transferência de calor pelo deslocamento de um fluido, que ocorre no núcleo externo da Terra. Radiação: os objetos emitem radiação eletromagnética. Esse processo pode ocor-

rer quando os dois mecanismos acima são impossíveis, pois independe do contato molecular e torna-se particularmente eficiente quando a temperatura ultrapassa os 1.000o C. Esse é o mecanismo principal de transferência de calor do núcleo da Terra para as camadas mais periféricas. A conversão do calor natural do interior da Terra em energia (geotérmica) para aquecimento e geração de eletricidade é usada desde o início do século XX. No entanto, o interesse por esse tipo de energia aumentou na década de 70, com a crise do petróleo. Constitui-se numa fonte de energia limpa, uma vez que o vapor e a água

Potencial anual de energia geotérmica (EJ) Categoria Recursos acessíveis Recursos acessíveis sem utilidade

Energia 140 000 000 600 000

Recursos (porção dos recursos acessíveis que tem expectativa de se tornarem econômicas em 40 -50 anos)

5 000

Recursos (porção dos recursos acessíveis que tem expectativa de se tornarem econômicas em 40 -50 anos)

500

Fonte: Palmerini, 1993; Bjornsson et al, 1998. 48

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geotermal não produzem resíduos e geralmente contêm baixa quantidade de CO2. O aproveitamento dessa fonte exige regiões com fluxo alto de calor, onde a fonte é relativamente próxima da superfície (3-10 km). Locais apropriados são onde ocorrem gêisers com atividade vulcânica recente ou outros pontos quentes como, por exemplo, os do Parque de Yellowstone (EUA). Os gêisers se caracterizam como uma atividade ligada à interferência de calor do magma com a água subterrânea, caracterizado por jatos intermitentes de água quente e vapor que surgem através de fraturas na crosta da Terra. Os vapores geotermais são empregados em usinas de produção de eletricidade em regiões da Europa, Nova Zelândia, Japão, Islândia, América Central, América do Norte e América do Sul. O maior campo de exploração localiza-se na costa da Califórnia (EUA), com uma produção atual de 1.200 MW de energia, suficiente para abastecer uma cidade de 1 milhão de pessoas. No Brasil as águas quentes são usadas em algumas regiões com a finalidade de lazer, em balneários com piscinas aquecidas por essas fontes naturais. Presidente Pru-


Denise de La Corte Bacci

de dentro dente (SP), Termas do Rio Quente (GO) e de Gravatal (SC) são locais bem conhecidos. Dependendo das características geológicas locais, os sistemas de aproveitamento das fontes geotermais são diferentes. Os mais conhecidos são aqueles que compreendem reservatórios naturais de água e vapor em profundidade, que recebem o calor constante do magma. Próximo à superfície, onde a pressão é menor, a água flui na for-

ma de vapor superaquecido que é captado e canalizado para turbinas que produzem a energia elétrica. Nesse sistema, a recarga de água subterrânea lenta permite que as rochas quentes convertam a água em vapor. O aproveitamento geotérmico se dá pela captação de água quente em perfurações feitas a até 2 mil metros. Através dos poços, o vapor é conduzido até a central elétrica geotérmica. Tal como numa central elétrica nor-

Usina Geotermal Turbina

Gerador

Referência Bibliográfica Taioli, F. Recursos Energéticos e meio ambiente. In: Teixeira, W.; Fairchild, T.R.; Toledo, M.C.M.; Taioli, F. Decifrando a Terra. Companhia Editora Nacional, 2ª edição. 2009. São Paulo. Cap 18. (p. 486-507).

Vapor de isobutano

Ar e vapor de água Condensador Isobutano Ar Trocador de calor

Água

Torre de resfriamento

Ar Água

Fluido frio

Fluido quente Bomba Furo de produção

mal, o vapor faz girar as lâminas da turbina como uma ventoinha. A energia mecânica da turbina é transformada em energia elétrica através do gerador. A diferença destas centrais elétricas é que não é necessário queimar um combustível para produzir eletricidade. Após passar pela turbina o vapor é conduzido para um tanque onde vai ser resfriado. A fumaça branca que se vê saindo das usinas é o vapor que se transforma novamente em água no processo de resfriamento. A água é de novo canalizada para o reservatório onde será naturalmente aquecida pelas rochas quentes. Os impactos ambientais provenientes do aproveitamento intensivo das fontes geotermais são menores que os de outras fontes, considerando sua extensão e que não é necessário o transporte de matéria prima ou beneficiamento de combustível. No entanto, seu aproveitamento ocorre em locais muito particulares, nos quais os condicionantes geológicos são favoráveis. Os impactos, dessa forma, também são locais, constituindo em ruídos e geração de gases. No entanto, não há queima ou disposição de resíduos na geração de energia.

Reinjeção da água

Denise de La Corte Bacci Graduada em Geologia pela UNESP, Campus de Rio Claro, mestrado em Geociências e Meio Ambiente pela UNESP e doutorado em Geociências e Meio Ambiente pela UNESP. Estágios na Università di Milano e University of Missouri_Rolla. Pós-doutorado em Engenharia Mineral pela POLI-USP. Atualmente é docente do Instituto de Geociências da USP. E-mail: bacci@igc.usp.br Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

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Água

Bananas is my business Da Redação

P

oucos, ao longo da história, foram mais maltratados do que a casca de banana. A cena é repetitiva: alguém vem andando – geralmente um mocinho bem-apessoado, embora variantes do quadro sejam bem-aceitas – quando ela surge no meio do caminho. E aí, tombos burlescos dignos de comerciais de pomada anti-inflamatória se tornam quase obrigação. Pois a maior inimiga dos distraídos recebeu sua carta de alforria e foi liberta da condição de vilã. A responsável por isso é a pesquisadora Milena Boniolo. Doutoranda da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), Milena descobriu que é possível descontaminar água poluída com metais pesados, utilizando, para surpresa geral da nação, a casca de banana. E ainda de um jeito barato. O processo é bastante simples. Antes de tudo, colocam-se as cascas sob o sol para que elas possam secar. Depois, inicia-se o processo de moê-las. Quando o resultado é um pó bem fino, chega a hora de passá-lo por uma espécie de peneira, para que fique homogêneo. Só depois é misturado à água contaminada. Com isso os metais se unem ao pó de banana, permitindo sua extração. “Por meio de alguns testes, descobri moléculas específicas na casca de banana que possuem cargas elétricas negativas. Elas têm afinidade pelas cargas positi-

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Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

vas dos metais”, conta Milena. Para cada 100 ml de água contaminada, utilizam-se cerca de 5 mg do pó de casca de banana. Todas as pesquisas foram feitas com contaminação por urânio. Mas, segundo a pesquisadora, outros metais pesados como cádmio, níquel, crômio e chumbo também podem ser removidos. “É importante dizer que as cascas de banana não são queimadas antes de se fazer o pó. Se fosse assim, qualquer coisa teria o mesmo efeito”, diz. Um dos problemas da nova técnica é a porcentagem de purificação. Nos testes, em média 65% dos metais pesados foram removidos da água. Quando questionada sobre a eficiência do projeto, Milena já tem a resposta na ponta da língua. “De que adianta uma remoção de 100% em um milésimo de segundo se o processo é caro?”. E outra: o índice de descontaminação de 65% é o mínimo obtido em um processo. De acordo com a pesquisadora, é possível elevar essa porcentagem repetindo a purificação inúmeras vezes, até chegar próximo à descontaminação desejada. Mas repetir o processo significa torná-lo demorado – o que pode inviabilizar o projeto em escala industrial. Contudo, os testes em maior escala ainda não foram feitos. “Quando as indústrias me procuram, elas imaginam que é só chegar e instalar.

Na verdade, preciso de uma oportunidade para testar tudo isso em escala industrial antes de sair ‘vendendo’ a ideia”, conta. Por enquanto, o certo é que as cascas de banana têm um grande potencial. Mas, para viabilizar economicamente o processo, são necessários mais testes. Apesar dos inconvenientes, as cascas de banana resolvem outra grande questão por tabela. É claro que a contaminação da água por metais pesados gera um grande desequilíbrio ambiental, ocasionando sérios danos ao ecossistema. Contudo, a solução proposta pela pesquisadora para esse desequilíbrio propicia saídas para outro impasse: o problema do lixo. “Ao trabalhar com as cascas de banana, tratamos dois problemas de uma só vez: despoluímos a água com as cascas que iriam parar no lixo. Assim temos o chamado desenvolvimento sustentável”, diz orgulhosa. Apenas na Grande São Paulo, cerca de 4 toneladas de cascas de banana são simplesmente descartadas por ano. Como é um produto praticamente sem valor econômico agregado, algumas empresas já até se disponibilizaram a doar suas cascas para Milena. Com isso o volume de lixo orgânico diminui. E pode, inclusive, gerar renda e agregar valor a um produto que antes era sinônimo de lixo. E de vilão. Isso sim é desenvolvimento sustentável.


Neo Mondo - Setembro 2008

A


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