Consciência Cívica & Mobilidade Sociocultural

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Consciência Cívica & Mobilidade Sociocultural POR UMA NOVA ORDEM MUNDIAL

Painel CEHC América Latina Marta Novaes Tereza Nuñez J. C. Macedo Celine Abdullah João Barcellos Carlos Firmino Maria C. Arruda


Em resposta a questões sobre a mobilidade política da sociedade através dos meios eletrônicos da comunicação social, o historiador e escritor João Barcellos disse, em 13.6.2013, o seguinte: “Todo o poder institucional vira nada quando o povo sai às ruas e massifica o seu grito de insatisfação diante das políticas públicas que servem somente os poderosos.” Em análise à mobilidade sociocultural que dos egípcios chegou aos norte-americanos e, agora, agita os brasileiros, o poeta e jornalista J. C. Macedo escreveu, em 19.6.2013, o seguinte:

Quando os egípcios, em 2011, ocuparam a Praça Tahir, no Cairo, estavam longe de supor que dessa acção surgiria uma óptica diferenciada de visualizar a insatisfação diante das políticas corruptas. No mesmo ano, a revista Adbusters, do Canadá, seguindo aquela óptica de mobilização pública apartidária pelas redes sociais electrónicas (do computador ao telefone móvel), fomentou a ´onda´ OWS, ou, Occupy Wall Street, movendo e unindo milhares de pessoas contra a desigualdade socioenómica, a ganância e a corrupção, seja ela privada ou pública, com ponto em Zuccotti Park, região financeira de Manhattan. E a onda ´occupy´, qual tsunami sociocultural e político, alargou-se na geografia e deu início a um novo mapa de acções geopolíticas fora dos centros partidários e sindicais habituais. 1 Entre os egípcios o sonho de dar fim a uma ditadura feroz e próIsrael (e logo, pró-USA e UK), fez ecolidir a Revolução Árabe, com a juventude em contactos directos com outros jovens de Paris, New York, Lisboa, Tel-Aviv, Roma, Atenas, São Paulo, Buenos Aires, México, Cidade do Cabo, etc., e, subitamente, a metrópole brasileira São Paulo é sacudida, em 2013, pela mesma onda ´occupy´. Um susto de fazer mijar e cagar os políticos tradicionais de esquerda e de direita nas cuecas, onde escondem e transportam dinheiros furtados do Erário Público. Em nota oficial a secretaria de Estado do governo federal do Brasil diz não entender o movimento


(?!...), mas a presidente Dilma é mais inteligente e saúda a ´onda´ em tom de ou fazemos por entender essa gente ou vão passar por cima de nós. Obviamente, tanto o seu gabinete quanto ela entenderam perfeitamente o recado de milhares e milhares de pessoas que, de São Paulo, logo foram às ruas em Recife, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Cotia, Sorocaba, Brasília, Florianópolis, Curitiba, Belo Horizonte, Fortaleza [regiões que juntas são maiores que a Europa...]: a nova geração que assume a ´onda´ é filha das classes que do nada passaram a ter acesso ao consumismo e à educação através dos programas de acção [renda] solidária iniciados no governo de Fernando Henrique e copiados e alargados no governo Lula e, agora, no governo Dilma. O busílis da questão está no seguinte: que adianta sair do nada, ter crédito para comprar geladeira e televisão, ver os filhos adentrarem uma universidade, se os impostos embutidos em tudo não resultam em transporte público, saúde e educação de qualidade?! Eis a insatisfação da nova geração que alimenta a onda ´occupy´ brasileira. E nem é uma Primavera Árabe, somente “uma onda sociocultural nos meandros das políticas que geram corrupção e má fé, hipocrisia e banditismo que beiram o terrorismo d´Estado”, como diz a médica Johanne Liffey. São jovens. Sim, são jovens. Agora, e publicamente, Dilma lamenta que o Partido dos Trabalhadores [PT] tenha se afastado tanto dos anseios da juventude. Mas, entenda-se, o problema de Dilma e de Lula não é esse, o problema é que aos jovens juntou-se uma juventude de todas as idades e profissões e credos: é o Brasil a fazer ecoar das ruas a acção de um Povo enganado pelo consumismo barato que lhe dá uma educação ridícula e uma saúde pior ainda, a par de um transporte público simplesmente indecente. 2 Os desmandos económicos dos governos Lula e Dilma são tão conhecidos como os do governo Fernando Henrique, mas este último teve a ousadia de estabilizar a moeda brasileira, contra o que se opuseram radicalmente Lula e os sindicatos na época – e foi Lula quem mais se beneficiou dessa política de estabilização: primeiro, porque se agarrou aos programas sociais e fez valer o dinheiro em caixa, segundo, porque ao levar as populações de baixíssima renda ao patamar do consumismo barato logrou hipnotizá-las eleitoralmente... até agora. E agora, os filhos dessa gente, que Dilma e Lula chamam de “nova classe média” (?!...), com o coro dos partidos aliados, os mesmos que deram suporte ao “mensalão” que corrompeu em massa o congresso nacional,


querem o melhor do ´bolo´, i.e., querem a sociedade e a ordem social que foi prometida aos pais – a saber: a democracia feita com políticos honestos e corruptos condenados, o dia a dia feito com educação, empregos e saúde de alta qualidade, sim, no mesmo patamar dos pesados e injustos impostos que o governo arrecada de cada pessoa. Se somos classe média, queremos tudo o que a classe média tem..., grita o Povo agora, diante da inércia dos governantes mijados e cagados, amedrontados em seus gabinetes luxuosos. 3 Pacificar favelas para-turista-ver é o mesmo que distribuir postos policiais feitos pontos de informação e abrir escolas sem professorado qualificado e com salários ridículos, enquanto os políticos têm subsídio até para comprar roupa; é o mesmo que perceber que o salário não rende até o fim do mês e ter que fazer ´bicos´ para a comida não faltar em casa; é o mesmo que organizar grandes eventos da FIFA [futebol], do Vaticano [jornada da juventude] e do COI [jogos olímpicos] com dinheiro público e não ver qualquer legado para as comunidades; é o mesmo que verificar que a Justiça sentenciou, mas parece que não tem como enjaular os corruptos políticos e empresários do “mensalão” ligados ao lulismo e aos seus partidos de base. Ou seja, o Brasil foi tomado por um corporativismo jurídico e político que prejudica a Nação por inteiro. Só o Brasil? Não, mas a falar da lusofonia, por exemplo, sabemos que a filha do presidente de Angola é a primeira bilionária africana, quando a Unicef diz que precisa de quatro milhões de dólares para ajudar as crianças angolanas subnutridas; por outro lado, sabe-se, como diz a editoralista Clara Ferreira Alves [do jornal ´Expresso´], que “Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso, apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção. Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo ´normal´ e encolhem os ombros”. E isto são apenas exemplos... Resumo desta ópera...? Não tem resumo. Ela mesma se diz em todas as variantes criativas possíveis no imaginário dos políticos corruptos. Diante do golpe d´Estado de 25 de Abril de 1974, o ditador salazarista Macello Caetano só pedia ao general Spínola “não deixem o poder cair nas


ruas”... O problema dos políticos e religiosos corruptos e dos sindicatos afins, em todas as nações, é este: se o Poder cair nas ruas o que vamos fazer?! Diante de tais realidades os povos têm é que fazer das ruas o seu palco sociocultural e político, passar por cima dos “cientistas políticos” de plantão (que servem e são bem pagos pelos governos e a imprensa engajada aos mesmos através de publicidade milionária). O filósofo Manuel Reis, em seu livro “Caminho Novo” (em torno de Spinoza), editado em Portugal e no Brasil pela Edicon e o CEHC, a certo passo lembra-nos que... “O horizonte actual do neoliberalismo capitalista global é sobejamente manifesto para quem abra os olhos: ao comando, encontram-se as multi-transnacionais ditando a sua actuação imperial/imperialista. Às anteriores formas de Estado chamaram-lhes, perfidamente, ´Estado-Providência´; em consequência disso, preconizaram e impuseram um ´Estado mínimo´. Em conclusão destes processos, os cidadãos e os trabalhadores, em geral, ficaram muito mais desamparados e sem proteção jurídica; e estes estigmas estão alastrando a um número cada vez maior de trabalhadores e de cidadãos.” Ora, alguém duvida que a mobilização geral dos povos de hoje é uma resposta ao neoliberalismo capitalista politicamente selvagem?!... Falta a muitos políticos e acadêmicos observarem que foram ´educados´ com base na ideologia colonial, que não admite sequer sombra ao poder nela constituído – e pior: “[...] muitos políticos que foram oposição às ditaduras fascistas, até em atos de guerrilha urbana, quando eleitos para o poder trataram se de acomodar economicamente e esquecer as políticas públicas que antes defendiam e, paradoxalmente..., alguns deles pedem indenizações milionárias ao Estado por tê-lo combatido, e o Estado paga com dinheiros do Erário Público...! Pode se dizer que o fascismo do capitalismo liberal tratou e trata de fazer do todo político e eleitoral uma bagunça consumista com gargalhada democrática”, como analisa Maria do Carmo Arruda.


Entretanto, quer face a uma ditadura polimil quer face ao consumismo, “os povos começam a perceber que o capitalismo liberal fez deles uma massa de manobra, reduziu-os a meros objetos e, politicamente, a rebanhos no curral eleitoral dos partidos chefiados por bandidos de colarinho branco e igrejistas”, como retrata o professor Carlos Firmino. É preciso reanalisar a função do Partido Político, a função do Estado e a função da Igreja (todas elas) na sociedade que somos. Por isso, a mobilidade sociocultural e política da Pessoa em Consciência Cívica é a única arma letal que as elites capitalistas temem... O que é preciso? Continuar o diálogo entre os povos e alargar a ´onda´ popular até se tornar um tsunami político e formar uma nova Ordem Mundial.

Junho de 2013

CENTRO DE ESTUDOS DO HUMANISMO CRÍTICO / CEHC América Latina

Grupo de Debates NOÉTICA www.noetica.com.br


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