MAGAZINE • GLS
PÁGINA C4
O TEMPO
BELO HORIZONTE • SÁBADO • 24 DE DEZEMBRO DE 2005
Canal de TV prioriza público GLBT Com conteúdo diversificado, o Logo TV entra no mercado segmentado brasileiro de TV por assinatura _ _ _ _ _ _ S_ORAYA
BE_LU~I
Nem só de conteúdo erótico se faz um canal voltado para o público GLS. Essa é a proposta do Lo, go TV. da empresa Viacom. também responsável por programadores como o Nickelodeon e MTV Hits. e que entrou no ar no mês de novembro. Logo após sua implantação nos Estados Unidos, o México e o Brasil resol\'eram repetir nas suas TVs por assinatura a bem-sucedida experiência. "A empresa enxergou a representatividade da comunidade GLS no mercado. A TV por assinatura é, por princípio. segmentada, atendendo a diferentes interesses. Então. por que não ter um canal para uma comunidade de tanta representatividade e, inclusive. forte apelo econômico? Isso é sinal de que nós temos um mercado de interesse e não se enxergava essa necessidade". explica a gerente de marketing da Viacom Networks Brasil. Carolina Vianna. O Logo TV optou por uma programação diversificada. fugindo da maioria das ofertas do mercado, que oferecem apenas atrações eróticas. "Adotamos o perfil de um canal de comportamento, que exibe um conteúdo variado. que retrata. de alguma maneira. a vida ou situações vividas por personagens que têm orientação sexual gay ou lésbica. Não é muito diferente do que a gente vê nos outros canais: tem filmes, seriados, 'reality show·. documentários. programas de entrevista. Só alguém muito preconceituoso não gostaria do conteúdo. Apesar de ser prioritário para o público GLS. não é exclusivo. É para gays e lésbicas e também para todos que respeitam essa orientação", defende. Carolina Vianna afirma que ainda não foi possível, devido ao curto tempo no ar. contabilizar o retorno financeiro do investimento no Logo TV. mas garante que é bom negócio. "Durante as três primeiras semanas. o acesso foi gratuito e superou muito a nossa expectativa do número ele pessoas que fizeram o procedimento de compra". garante. "Para termos números oficiais, temos que esperar um pouco. até porque há uma proposta de. nos próXimos seis me·es. estudarmos qual o perfil do espectador. qual o gasto médio e o que ele compra. Isso pode orientar os anunciantes". analisa a executiva. Se a publicidade ainda não está no ar. as parcerias começam a se configurar. "Agências de viagens. revistas e sites e outros veículos de comunicação que tornaram conhecimento do canal estão nos procurando para fazermos juntos. Várias vertentes se unindo para oferecer serviços de qualidade a esse público específico". explica. Vendido dentro pelo pay-per-view da operadora Sk)', o canal Logo TV oferece um pacote semanal de seis horas de duração. sendo que. toda sexta-feira estréia um novo bloco. "A partir de sexta. o espectador pode fazer a compra e tem 72 horas de prazo para ver esse conteúdo. O link para compra fica disponível no mosaico da Sky, dentro do menu 'adulto' está a opção Logo TV. A partir do próximo mês. devemos tornar disponível o canal também no menu ·variedades'. já que o conteúdo é tão picante quanto qualquer novela das oito", compara Carolina.
Premiada série aborda a descoberta do sexo
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Cena de "Tipping the Velvet", série de suc'esso na Inglaterra que aborda a descoberta da sexualidade eestréia em janeiro
Juíza do MS permite adoção por gays Um casal de homossexuais conseguiu autorização judicial para a adoção de filhos. A decisão é inédita na Justiça do Mato Grosso do Sul e foi tomada pela juíza da 1ª Vara de Infância e Adolescência. Maria Isabel de :i.tatos Rocha. O casal já entrou na fila e aguarda pela criança que será adotada. Segundo informações do site '"Campo Grande News" e cio jornal "Correio do Estado". o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul informou que o setor de assistência social da Vara da Infância já havia sido procurado por outros casais homossexuais e que foi feito um
A Logo TV lança, a partir do dia 6 de janeiro. a premiada série britânica "Tipping the Velvet". O programa narra a saga de Nancy Astley (Rachael Stirling. de "O Triunfo do Amor"). uma jovem nascida no interior da Inglaterra do século XIX, que descobre sua sexualidade após mudar-se para Londres. Nancy é uma garota que trabalha como cozinheira e garçonete no restaurante à beira-mar de seu pai. Mas tudo muda quando ela presencia a extraordinária performance de uma atriz recémchegada à cidade. Kitty Butler (Keeley Hawes. de "Os Vingadores"). Após um rápido relacionamento com Killy, Nancy experimenta uma alegria eufórica e uma grande desilusão ao mesmo tempo, enquanto embarca numa jornada de sete anos. até finalmente perceber que uma \'ida só de aventuras não é suficiente. A jornada de Nancy a partir de uma vida pro\'inciana numa cidade costeira até uma vida boemia na Londres de 1890 a levam a descobrir que ela é uma mulher que deseja e é desejada. Dirigida por Geoffrey Sax ("Doctor Who - O Senhor do Tempo") e escrita por Andrew Davies ("O Diário de Bridget Jones - 1 o Limite da Razão"). "Tipping the Vel\'et" foi transmitida pela rede de televisão BBC e recebeu indicações ao Bafta e Glaad Awards. além de ter recebido prêmios em festivais como o Austin Gay & Lesbian International Film Festival e o Hamburg Lesbian and Gay Film Festival.
estudo detalhado para analisar a situação da família do casal selecionado. A dupla que obteve a permissão para a adoção pediu à juíza para não ser identificada e evitou comentar a decisão. A juíza i\laria Isabel de Matos Rocha tamMm foi procurada pela redação do Magazine. mas devido ao recesso de fim de ano do poder judiciário do Estado, não Foi localizada. Estatuto da Criança e do Adolescente não admite adoção por casal homossexual. mas não impede que crianças passem a vi\'er em lares formados por pessoas do mesmo sexo. (SB)
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SÁVIO REALE
• Parada GLBT com a ·bênção de Vampeta O jogador de futebol Vampeta foi o padrinho da Parada do Orgulho GLBT de Nazaré das F'arinhas, sua cidade natal. localizada no interior da Bahia. O evento aconteceu no domingo passado. dia 18. e contou com a presença de aproximadamente 30 mil pessoas. reunidas na praça Caxixi. Além de apadrinhar a festa. o atleta cedeu os trios elétricos e as bandas para a parada gay e foi, segundo os organizadores, o principal patrocinador do evento. E. quem não se lembra? Vampeta foi o primeiro jogador de futebol a posar nu para a revista "G Magazine".
AGENDA - A série "Tipping the Velvet" será oferecida aos assinantes a partir do dia 6 de janeiro, às 15h, até o dia 13 de dezembro, às 15h. O acesso à programação de Logo TV se dá por meio do sistema pay-per-view da operadora Sky.
Cultura e cidadania 1ª Conferência Nacional de Cultura. realizada na semana passada, em Brasília, reuniu aproximadamente 1.300 delegados, eleitos em todo o país através de conferências municipais e estaduais. Os principais pontos abordados pelos representantes da sociedade civil e do governo foram as diretrizes para elaboração de um Sistema Nacional de Cultura, a instalação imediata do Conselho Nacional de Cultura e o percentual do Orçamento Geral da União a ser destinado para a área. A diversidade sexual também foi abordada nas reuniões e debates. Entre os aUvistas presentes no encontro estava o secretário da Região Sul da ABGLT e membro do grupo Somos Comunicação, Saúde e Sexualidade, Alexandre Boer. Ele atesta a importância do evento declarando, em artigo elaborado para o site espacogls.com. que trata-se de um marco na construção das políticas públicas para a cultura em nosso país. No encontro, diz, reconheceu-se a transversalidade das políticas culturais e seu papel na construção de po/Íticas sociais voltadas para o respeito à diversidade, ao pluralismo e aos direitos ·humanos. Os ativistas do movimento GLBT participaram de alguns dos grupos de trabalho, mas concentraram atenção no sub-eixo Dii ersidade, 1denlidacJe e Redes Culturais, um dos cinco wupos de trabalho do eixo Cultura é Cidadania. O resu/taâo desse esforço tornou-se uma conquista. pois entre as 20 diretrizes (num toU1I <le 70) aprovadas como
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prioridade, foi inclufdo algumas vezes o termo "orientação sexual". Uma delas anrma que o Estado Brasileiro deve reconhecer. respeitar e apoiar. "política e economicamente, a autodeterminação cultural das populações urbanas e rurais, contemplando os aspectos étnicos e raciais. a pluralidade de gênero e orientação sexual, as expressões religiosas e artísticas e demais populações excluídas ". Outra conquista foi a aprovação. por unanimidade, de três moções relativas ao movimento homossexual. úma delas tratou da transformação do Grupo de Trabalho GLBT do Ministério da Cultura em uma Câmara Setorial, ampliando a parlicipação do movimento homossexual brasileiro e institucionalizando-o como um espaço de interlocução entre governo e sociedade civil. As outras duas moções foram sobre a inclusão do segmento GLBT Junto ao Conselho Nacional de Cultura e da temática GLBT numa Cultura de Paz. Bõer, por nm. salienta a imensa articulação e a solidariedade dos segmentos sociais e culturais presentes na conferência , fundamentais para o apoio e apm1ação das propostas levadas pelos representantes do movimento homossexual brasileiro. 1
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• Após 12 anos de llião, ocartor Dton Jolrl, 58, se casou na mm de quata.feia com oprodutor David Fll1ish, 43. Outros 700 casamentos de casas homossexuéis estavam macados pr.i adata, ~ esse -o de llião se tomou legal na h~laterra
Sávio Reale escreve esta coluna aos sábados. Comentários e críticas devem ser enviados para savioreale@bol.com.br ou Página GLS/Magazine, Jornal O TEMPO
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BELO HORIZONTE• SÁBADO, 24/12/2005
Zialdo liz que seus textos são bate-papos com
seus coaterrinets nineins sobre temas thersificados
DUDA FONSECA
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ai ser difícil competir com a contracapa desse caderno. Aqui, na capa teoricamente a página de maior importância da editoria -. a gente tenta expor um pouquinho mais do escritor. cartunista, ilustrador Ziraldo. aproveitando o "gancho" de mais um livro que ele está lançando. Já na contracapa, do outro lado, é ele mesmo quem se conta. Hoje, fala de uma viagem à Itália, de tantas outras viagens. de "Flicts" - seu primeiro sucesso editorial - e de sua relação com o reconhecimento público. Semana que vem. sabe-se lá qual será o assunto abordado. O certo é que suas pa- lavras. presentes sempre aos sábados, n'O TEMPO, desde meados deste ano, "não são crônicas. são pensamentos vivos". É desse jeito que ele define o conteúdo de sµa mais recente obra. batizada de "O Aspite - Há um Jeito pra Tudo", lançada pela editora Melhoramentos. Para desavisados. tratase de uma seleção de seus escritos publicados desde 2002 na imprensa mineira. O livro já foi lançado no Rio e em São Paulo. Ziraldo quer fazer o mesmo em Belo Horizonte. mas ainda não definiu a data. Aspite nada mais é do que um assessor de palpites. Assim. o autor se define e é definido desde sempre por seu irmão, Zélia, que assina o prefácio do livro. Dotado dessa condição. ele se coloca diante de suas observações. que vagueiam por temas diversos. do campo político ao valor semântico das palavras. de forma livre e incontida. Mais do que palpites, porém. Ziraldo se revela em seus 52 textos. distribuídos em 240 páginas. Ali. ele compila suas impressões do mundo e se coloca como alguém que vê, pensa. assimila e, depois. escreve para o leitor. "São textos autobiográficos. Sem data, sem hora, sem nada", diz.
Papo mineiro Outra definição de seus escritos perpassaria pela palavra hermética. Não é a qualquer leitor que Ziraldo se refere. Diferentemente de suas outras obras editadas pelo mundo afora, suas crônicas semanais são menos ambiciosas. "Nunca quis publicá-las fora
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Ziraldo lança o livro ''Aspite", palavra que ele deD.ne como assessor de palpites; a obra traz crônicas publicadas imprensa mineira desde 2002, parte delas em
de Minas Gerais. A minha conversa é de mineiro e para mineiros. É como se conversasse com um monte de amigos. Não fico procurando assunto, é um bate-papo, mesmo. Sempre estou com idéia na cabeça e, na crônica, é como se falasse livremente disso. Já tive convites para escrever fora do Estado, mas não topo porque minha cabeça é muito mineira e não tenho coragem de me expor. Também não quero dar confiança para o pessoal de fora. Em Minas. eu me sinto em casa, mesmo morando há 50 anos fora daí", conta por telefone, do Rio de Janeiro. O problema é que esse bate-papo tem que ser por meio da palavra escrita. E. ao contrário do que muita gente acredita, mesmo tendo escrito algumas dezenas de livros. a palavra ainda lhe é um martírio. Seja para o público infantil, seja para o adulto a angústia é a mesma. "O negócio é o seguinte: escrever para mim é difícil tanto para um quanto para outro públicos. Dominar a palavra é muito difícil. Enquanto você não tem certeza que o texto está bom, você não avança. O problema é que você nunca acha que ele está bom". Em outro pensamento. ele arrisca uma maneira mais lúdica de se explicar: "A palavra é igual a pedra bruta. por isso que em português ela contém as palavras 'pá' e 'lavra'. É o instrumento e a matéria. Isso é fantástico".
der às perguntas sobre o livro, ele rebate: "Você não quer que eu faça a matéria para você, não é?". "Não, nem tanto". Por outro lado, também palpita no trabalho alheio: "Quero que Você coloque isso" (algo que não pude colocar, mas que ele mesmo colocou na página oito - crônicas também servem para isso: lavagem de roupa suja). Aliás, um espaço semanal na imprensa mineira parece ser mesmo um presente para Ziraldo que, no livro. assume também seu sobrenome, Alves Pinto, assimilando tardiamente um conselho de Fernando Sabino que um dia lhe disse: "Escritor de prosa tem que ter nome e sobrenome, caso contrário ninguém o leva a sério". Agora, assinando com toda a pompa, ele tem a oportunidade de não deixar idéias morrerem, de capturar seus devaneios.
O TEMPO
Assuntos diversos Entrevistar Ziraldo antes de tudo é uma conversa conturbada. não há muita formalidade. Ele responde. interrompe, questiona ... uma festa. Ao respon-
Sacadas E as idéias surgem de várias formas. às vezes por meio de "insights", tema da terceira crônica do livro cuja personagem é sua mãe, Dona Zizinha. Mas "insight" para Ziraldo tem outro nome. se traduz em "sacada". A tradução das palavras também vira tema de suas reflexões. Sobre isso, ele afirma: "Não há como traduzir todas as palavras do mundo. Tem coisa que só esquimó ou alemão sentem". Mas. falando em sacadas. qual foi a maior que você já teve? "Foi essa coisa do Drummond de curtir a palavra. Eu tenho muita preocupação de usar a palavra certa. Tenho uma frase que eu adoro que diz: A palavra é o átomo da alma. A alma é feita da junção de todas as palavras. Isso é verdade". Vira e mexe Drummond também a-
parece em seus textos, seja como base para justificar uma linha de pensamento, seja somente por admiração. Ao que tudo indica, o ano de 2006 será frondoso para o cronista. Acumulando mais essa condição, Ziraldo não vai fugir à luta e. mesmo já tendo vivido o suficiente para ver no país o nascimento e o declfnio de duas ditaduras. movimentos congressistas que vão de encontro às vontades populares. golpes. fraudes e outra penca de acontecimentos nada democráticos. ainda acredita na esperança. Esse tema ele reserva para ser tratado na crônica final de seu livro. no qual diz: "'A esperança é a última que morre'. Esse alexandrino perfeito foi escrito, pela primeira vez. por um poeta brasileiro. Não tenho a menor dúvida". Sustentado por essa lógica. Ziraldo observa que o país está melhor do que antigamente. ·o Brasil melhorou muito. Está cada dia melhor. Esse país era uma merda, um balneário da Argentina. um país muito mais injusto. Hoje, pelo menos. vemos alguns focos de evolução", avalia. Isso não quer dizer, porém, que nada está errado. Pelo contrário, ele se revolta com toda essa bandalheira que vem de Brasflia e propõe: "Vou começar uma campanha em que vou desenhar o Congresso Nacional e escrever embaixo: 'Não reeleja ninguém'. Não se pode deixar deputado solto, é igual pitbull, acabam com tudo. O que eu recomendaria para o próximo ano é colocar pessoas como o Babá, Luciana Genro, esse pessoal que não brinca em serviço. que não quer ficar rico e que fiscaliza as ações do governo. Agora, para presidente, ainda não sei em quem votar. As opções são poucas". O importante mesmo é não deixar de sonhar com o que aparentemente se revela impossível. "Esse pafs é do c.... é o melhor do mundo para se construir uma nação. Só não podemos esquecer das utopias, sem elas a gente está f... ". conclui o cronista que. um dia. quando menino, quis abraçar o mundo com as pernas "era o que minha mãe me dizia". AGENDA - "O Aspite - Há um Jeito pra Tudo", de Ziraldo Alves Pinto, editora Melhoramentos, 240 págs., R$ 19,90.