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Fatores de Risco Associados à Desnutrição em Pacientes
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RESUMO: O objetivo deste estudo foi revisar, de acordo com a literatura científica, os principais fatores de risco associados à desnutrição em pacientes hospitalizados. O estudo é uma simples revisão da literatura a partir de buscas nas bases de dados Lilacs, Scielo, Google Scholar, Google e Pubmed. Pelos achados, podemos perceber que os fatores de risco que mais se destacaram foram: perda de peso recente e involuntária, idade acima de 60 anos, patologia apresentada (câncer ou infecção grave), baixo consumo calórico e proteico no período de internação, sintomas gastrointestinais (náuseas e diarreia) e maior tempo de internação, outros fatores menos relatados também aparecem no estudo, como diagnóstico de admissão, falta de apetite, osso aparente e baixo IMC. O tratamento da desnutrição constitui um desafio relevante, onde um diagnóstico adequado é essencial para que uma terapia nutricional possa ser iniciada o mais cedo possível e proporcione um tratamento dietoterápico eficaz.
ABSTRACT: The objective of this study is to review, according to scientific literature, the main risk factors associated with malnutrition in hospitalized patients. The study is a simple review of the literature based on searches in the Lilacs, Scielo, Google Scholar, Google and Pubmed databases. From the findings, we can see that the risk factors that stood out the most were: recent and involuntary weight loss, age over 60 years, the pathology presented (cancer or severe infection), low caloric and protein intake in the period of hospitalization, gastrointestinal symptoms (nausea and diarrhea) and a longer hospital stay, other less reported factors also appear in the study, such as admission diagnosis, poor appetite, apparent bone and low BMI. The treatment of malnutrition constitutes a relevant challenge, where an adequate diagnosis is essential so that a nutritional therapy can be started as soon as possible and provide an effective diet therapy treatment.
................. Introdução
A alta prevalência mundial de desnutrição em pacientes internados tem sido amplamente documentada nas últimas quatro décadas. Os diversos estudos que observam a desnutrição hospitalar correlacionam sua presença a consequências como aumento na frequência de complicações clínicas e mortalidade, impacto em custos e tempo de internação. Além disso, quanto maior o período de permanência do paciente no hospital, maior o risco de agravar-se a desnutrição (AQUINO; PHILIPPI, 2011). A desnutrição em pacientes hospitalizados ainda possui uma alta prevalência em maioria dos hospitais, variando de 15% a 60%, dependendo da população estudada, o tipo
de hospital, e os métodos utilizados para a investigação do estado nutricional (LEANDRO MERHE; AQUINO, 2012). Em um estudo, publicado por CORREIA; PERMAN; WAITZENBERG, 2017, avaliou 66 publicações latino-americanas (12 países, aproximadamente 30.000 pacientes) e confirmou a manutenção da alta prevalência de desnutrição em pacientes hospitalizados. Dado semelhante foi publicado em 1998, extraído do inquérito brasileiro, difundido mundialmente e conhecido como IBRANUTRI. Este estudo, promovido e realizado pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (BRASPEN), avaliou 4 mil pacientes internados na rede pública hospitalar de vários estados brasileiros e do Distrito Federal. A prevalência da desnutrição foi de 48,1%, sendo que 12,6% dos pacientes apresentavam desnutrição grave e 35,5%, moderada. As regiões Norte e Nordeste tiveram maior prevalência, chegando a 78,8% na cidade de Belém do Pará. Há 20 anos estes dados foram publicados e o cenário permanece o mesmo até os dias atuais (TOLEDO et al., 2013). A identificação da desnutrição constitui importante objetivo de atenção ao tratamento global ao paciente internado. Um diagnóstico adequado é essencial para que uma terapia nutricional individualizada seja iniciada o mais breve possível. A identificação de fatores de risco é imprescindível para a ação da equipe de saúde em benefício do paciente (AQUINO; PHILIPPI, 2011). O objetivo deste estudo é revisar conforme literatura científica os principais fatores de risco associados à desnutrição em pacientes hospitalizados.
.................. Metodologia .................
Revisão simples da literatura a partir de busca nas bases de dados Lilacs, Scielo, Bireme, Google Acadêmico, Google e Pubmed de estudos. Foram realizadas buscas bibliográficas nos idiomas inglês, português e espanhol, utilizando-se os seguintes descritores: estado nutricional, fatores de risco, hospitalizados, desnutrição e seus respectivos em língua estrangeira. Foram incluídos trabalhos completos correspondentes a casuísticas (artigos originais) com seres humanos. Foram excluídos trabalhos com base em experiências em animais, trabalhos incompletos ou que não se referiam à temática do trabalho. ................ Resultados .....................
As principais causas da desnutrição hospitalar são a patologia e seu tratamento com suas complicações. Existem fatores isolados ou que interagem entre si que aumentam o risco de maior tempo de hospitalização, maior desnutrição e um desfecho desfavorável levando esse paciente ao óbito (FRAGA; OLIVEIRA,2016). A desnutrição possui uma significativa correlação com diversos fatores sociais, cuidados, nível de escolaridade, idade, doenças subjacentes, neoplasias e tratamento com múltiplas drogas que acabam influenciando o estado nutricional do paciente. Entre essas causas, a patologia do paciente é um dos fatores principais, visto que pode interferir com a absorção dos nutrientes devido às alterações de mecanismo fisiológicos, como: infecções, mudanças no metabolismo, perda de apetite ou distúrbios digestivos. Outras causas também podem influenciar o estado nutricional como: saúde dental, isolamento social, vícios, doença mental, distúrbios da deglutição, mudanças na percepção do paladar e até mesmo a incapacidade de comprar ou preparar alimentos (BOTTONI et al., 2014). Waitzberg e colaboradores 2001 conduziram um grande estudo epidemiológico transversal e multicêntrico conhecido como IBRANUTRI, onde avaliaram o estado nutricional e a prevalência de desnutrição em 4000 pacientes internados a partir de 18 anos, atendidos pelo sistema de saúde brasileiro. A desnutrição estava presente em 48,1% dos pacientes e a desnutrição grave em 12,5% dos pacientes. A desnutrição se correlacionou com o diagnóstico primário na admissão, idade (60 anos), presença de câncer ou infecção e um maior tempo de internação (WAITZENBERG et al., 2001). Um estudo transversal realizado por Aquino e Philippi (2011) com objetivo de identificar os fatores associados ao risco de desnutrição em pacientes internados em um hospital geral de São Paulo com uma amostra de conveniência de 300 pacientes adultos, com idade entre 18 e 64 anos. Para isso, foi aplicado um questionário estruturado, constituído por informações antropométricas, clínicas e dietéticas, e os pacientes foram classificados e dicotomizados em desnutridos e não desnutridos. Para a identificação dos fatores associados à desnutrição foi conduzida uma regressão logística múltipla e foram selecionadas as variáveis preditivas. A desnutrição ocorreu em 60,7% da amostra, e as variáveis encontradas associadas à
desnutrição foram a presença de: perda de peso recente e involuntária, ossatura aparente, redução de apetite, diarréia, ingestão energética inadequada e gênero masculino. Merhe e Aquino (2012), avaliaram 235 pacientes de ambos os sexos, hospitalizados em uma enfermaria cirúrgica de um hospital universitário em Campinas. Neste estudo, 20% dos pacientes apresentaram desnutrição, a maioria (75,7%) apresentava doenças benignas e 24,3% apresentavam doenças malignas. Cerca da metade (50,6%) relatou ter problemas dentários (uso de prótese, falta de dentes, etc.). Quase um terço (27,5%) dos pacientes relatou perda de peso antes da admissão, 24,9% relataram ganho de peso e 47,6% relataram nenhuma alteração de peso nos poucos meses antes da admissão (6 meses). Na tentativa de identificar o melhor modelo para a análise da desnutrição, foi realizada uma análise de regressão logística múltipla para o estudo da desnutrição estimada pelo processo de seleção gradual, com ou sem tipo de doença. No modelo com tipo de doença, a presença de doença maligna aumentou quatro vezes a chance de desnutrição (P = 0,0002; OR = 3,855; IC95% = 1,914; 7,766). Fragas e Oliveira (2016) conduziram um estudo transversal que envolveu 397 pacientes internados em hospitais da rede pública de Manaus na Amazônia. Foi realizada avaliação antropométrica e avaliação subjetiva global (ASG). A maioria era do sexo masculino (59,7%), 35,26% apresentou desnutrição, destes 32,24% eram moderadas ou moderadamente desnutridos e 3,02% estavam gravemente desnutridos. Os fatores de risco associados a desnutrição como tempo de internação superior a 15 dias, analisado isoladamente, quase triplicou a chance do paciente desnutrir. Entretanto as variáveis com maior associação foram às mudanças persistentes na dieta, presença de sintomas gastrointestinais, perda de peso recente e nos últimos seis meses, câncer e idade superior a 60 anos. No estudo transversal de Merhe e colaboradores (2019), avaliaram 138 idosos e adultos internados. A maioria (57,97%) apresentou algum tipo de neoplasia (câncer), e 57,25% tiveram tempo de internação maior de dias, Quanto á triagem nutricional, 21,01% apresentaram desnutrição pela Avaliação Subjetiva Global (ASG), 34,78% risco nutricional pela Nutritional Risk Screening (NRS) e 11, 59% baixo peso pelo Índice de Massa Corporal (IMC). Os pacientes em risco eram mais velhos, com menor consumo de energia total, baixa contagem de linfócitos, menores valores de IMC e circunferência da panturrilha. Já Agnis e colaboradores (2016) avaliaram em um estudo longitudinal retrospectivo, 117 pacientes internados em um hospital público de Santa Maria-RS. Avaliaram adultos e idosos divididos em três grupos. Foi identificado que pacientes com tempo de internação >15 dias perderam peso, reduziram o IMC e aumentaram o percentual de perda de peso e parâmetros bioquímicos. A partir dos achados dos respectivos estudos podemos verificar que os fatores de risco que mais se destacaram foram: A perda de peso recente e involuntária, a idade superior aos 60 anos, a patologia apresentada (câncer ou infecção grave), baixa ingestão calórico-protéica no período de internação, sintomas gastrointestinais (náuseas e diarreias) e um tempo maior de internação. Pacientes que internam no hospital já apresentando perda de peso, idosos, com câncer, apresentam um maior risco de desenvolverem desnutrição ao longo da internação. Pacientes que ficam hospitalizados por um maior período e que tem uma baixa ingestão calórica durante esse período de internação também apresentam grandes chances de desnutrir.
.................. Conclusão ....................
Tendo conhecimento sobre os principais fatores de risco que estão associados à desnutrição, tornam-se necessárias estratégias para se identificar sistematicamente, prevenir, e tratar a desnutrição tanto no ambiente hospitalar, como na pós-alta. Considerando o número considerável de pacientes hospitalizados que apresentam desnutrição, cabe ao profissional de saúde, especialmente ao nutricionista, estabelecer critérios de diagnóstico do estado nutricional, visando a intervenção e a reabilitação deste paciente. É essencial que o profissional, durante a realização do processo de avaliação nutricional, conheça os hábitos alimentares, a aceitação e tolerância da dieta oferecida, além de verificar os dados antropométricos e os sinais clínicos de má nutrição. A identificação deste diagnóstico no momento da internação, e o acompanhamento de forma adequada deste paciente se tornam imprescindível para um desfecho positivo. Faz-se necessária a padronização das condutas de acordo com o processo fisiopatológico, sendo assim possível contribuir para a recuperação do estado nutricional, em conseqüência haverá a melhora do prognóstico, a redução do tempo de internação deste paciente e da taxa de mortalidade. O tratamento da desnutrição compõe um relevante desafio, onde um diagnóstico adequado é fundamental para que uma terapia nutricional seja iniciada o mais rápido possível e proporcione um tratamento die-
toterápico eficaz. Reconhecer os principais fatores de risco que estão associados à desnutrição é de fundamental importância na prevenção e ou tratamento deste evento. A equipe multiprofissional deve estar capacitada para também estar atenta ao estado nutricional dos pacientes. Assim, é possível contribuir para uma redução na prevalência de pacientes desnutridos em leitos hospitalares.
Sobre os autores Dra. Cintia Aparecida de Oliveira Flores - Nutricionista pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos-UNISINOS. Pós Graduada em Nutrição Clínica em Patologias pelo Instituto de Pesquisa Ensino e Gestão em Saúde-IPGS. Nutricionista na Fundação Hospitalar Educacional e Social de Portão. Dra. Rayane Lemos Farias - Nutricionista pelo Centro Universitário São Camilo. Pós graduada em Gestão de Alimentos e Alimentação Coletiva pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (EMESCAM). Nutrição Clínica em Patologias pelo Instituto de Pesquisas Ensino e Gestão em Saúde (IPGS) . ........................................................
PALAVRAS-CHAVE: Estado nutricional. Fatores de risco. Desnutrição. KEYWORDS: Nutritional status. Risk factors. Malnutrition. ........................................................
RECEBIDO: 17/9/20 – APROVADO:10/10/20
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