PG 5 SHELL Cresce a polêmica em torno da contaminação de 800 trabalhadores no estado de São Paulo por produtos químicos perigosos.
PG 12 AHOLD O grupo holandês que controla as redes de supermercados Bompreço e G. Barbosa decide se retirar da América Latina, provocando incertezas.
PG 17 INTERCÂMBIO Dirigentes sindicais de sete países vão se encontrar na Holanda para debater estratégias de ação frente à violação de direitos pelas transnacionais.
PG 18 MINERAÇÃO PREDATÓRIA Reportagem especial mostra que meio século de contaminação ambiental no estado do Amapá afetou a saúde de milhares de pessoas.
PG 22 CAFÉ E POBREZA A campanha em defesa dos cafeicultores familiares e assalariados rurais vai à Câmara dos Deputados, com apoio do Observatório Social.
PG 24 ENTREVISTA - JAQUES WAGNER Ministro do Trabalho fala sobre combate ao trabalho infantil e ao trabalho escravo, medidas contra a discriminação de gênero e de raça, programas contra o desemprego e mudanças na legislação trabalhista.
PG 28 ABN AMRO BANK Dirigentes do Sindicato dos Bancários de São Paulo reconhecem o interesse do Banco em ampliar o diálogo, mas cobram avanços concretos.
EM REVISTA
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Esta é a edição número 3 da Observatório Social Em Revista. Nosso objetivo é expor as condições sócio-trabalhistas das empresas, para colocar à disposição dos sindicatos e da sociedade informações consistentes e indispensáveis às negociações coletivas. Queremos que o conceito de Responsabilidade Social Corporativa seja uma realidade concreta. Para o Observatório Social, isso significa garantir a aplicação dos direitos fundamentais no trabalho e proteção ao meio ambiente. Respeitar os direitos mínimos não compromete a competitividade das empresas e das economias. Ao contrário, é uma necessidade para o desenvolvimento econômico sustentado e de longo prazo. A novidade deste número é o aprofundamento da abordagem na cadeia de produção. No caso da Shell, apresentamos problemas trabalhistas e ambientais ainda não resolvidos. Falamos sobre os problemas sócio-ambientais de empresas nacionais e multinacionais na exploração mineral na Amazônia, em particular no estado do Amapá. No caso da produção do café – o Brasil é o maior produtor mundial –, fomos verificar as condições de vida dos assalariados rurais e agricultores familiares. Estas ações começaram a ter eco no novo governo através do compromisso de seus ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário com os que nunca tiveram apoio. A empresa norte-americana Sara Lee - terceira maior comercializadora de café no mundo – em conseqüência do estudo, está se dispondo a negociar com as entidades envolvidas. Apesar das adversidades, a agenda sindical internacional se fortalece e se “transnacionaliza”. Sindicalistas e pesquisadores de sete países vão se reunir na Holanda em junho. O objetivo do encontro é conhecer as estratégias empresarias da Royal Ahold, Unilever, Philips e Akzo Nobel e constituir redes sindicais mundiais para fazer avançar os direitos fundamentais e a proteção em qualquer país. O Observatório Social faz parte desse movimento, monitorando de maneira qualificada e permanente o comportamento social das empresas. Com esta edição, somos desafiados a superar a tradição de muitas publicações que pararam nos primeiros números. Se depender de nós, vamos editar a Observatório Social Em Revista nº 4, nº 5 e muitos outros números, porque temos certeza que estamos contribuindo com a globalização dos direitos e com a justiça social. Conselho Editorial
PG 30 EMPRESAS NORUEGUESAS Pesquisa identificou problemas ambientais e trabalhistas em corporações que atuam no Brasil.
PG 31 AKZO NOBEL Conheça a primeira das quatro corporações holandesas pesquisadas pelo Observatório Social no projeto Monitor de Empresas.
PG 32 ENTREVISTA - JOSÉ OLÍVIO MIRANDA OLIVEIRA O secretário geral adjunto da CIOSL (Confederação Internacional das Organizações Sindicais Livres) avalia conquistas e retrocessos nos direitos trabalhistas.
PG 36 ARTIGO - A GUERRA DO PETRÓLEO O presidente do Observatório Social, Kjeld Jakobsen, aborda os interesses geopolíticos e econômicos existentes por trás da invasão do Iraque.
PG 38 ALMANAQUE
PG 42 CULTURA - BEBA KOLA-MARTE A história da fábrica de refrigerantes em Santa Catarina que na década de 40 concorria com a Coca-Cola vai virar filme.
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Muitos ex-funcionários da empresa no estado de São Paulo afirmam que sofrem de doenças graves causadas pela manipulação de substâncias perigosas. Acusada de negligência, a empresa admite apenas a contaminação ambiental. O caso está na Justiça. Um grupo de trabalhadores já foi beneficiado por ação cautelar, que obriga o pagamento das despesas médicas. Moradores das áreas afetadas também sofrem com o problema.
CRESCE A POLÊMICA SOBRE A CONTAMINAÇÃO DE TRABALHADORES
Shell
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VILA CARIOCA E
Uma grande contaminação causada por elementos químicos danosos à saúde, que afetou a população de dois bairros e também funcionários da multinacional Shell, tornou-se uma das maiores polêmicas ambientais registradas no Brasil nos últimos anos. O primeiro caso aconteceu em Paulínia, cidade localizada 118 quilômetros a nordeste da cidade de São Paulo. Muitos ex-funcionários da empresa relatam que sofrem de doenças graves, por terem sido expostos a uma série de venenos letais durante o exercício de suas atividades profissionais. Essa contaminação, segundo lideranças sindicais, representantes de extrabalhadores, médicos e pesquisadores, ocorreu devido ao descaso da empresa em relação à segurança dos trabalhadores, da população e do meio ambiente.
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O segundo caso é o de Vila Carioca, no bairro paulistano do Ipiranga. Os principais prejudicados são os moradores que vivem no entorno de um terminal de distribuição de combustíveis. Segundo apurou a Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), a empresa enterrou no local, sem nenhuma proteção, resíduos da limpeza dos tanques de gasolina, óleo diesel e pesticidas. O resultado é que o subsolo e as águas subterrâneas e superficiais estão contaminados. A Cetesb informa que no local existem metais pesados como benzeno e tolueno, e organoclorados como aldrin, dieldrin e isodrin – utilizados como venenos agrícolas —, cuja produção e uso estão proibidos em quase todo o
mundo, devido ao alto grau de toxidade e riscos ao meio ambiente e à saúde. “A Shell foi propositadamente negligente, pois tinha conhecimento das conseqüências decorrentes da manipulação incorreta dessas substâncias”, denuncia Osvaldo Bezerra, presidente do Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho (Diesat) e diretor de Saúde e Meio Ambiente da Confederação Nacional dos Químicos. As denúncias, que começaram há dez anos, provocaram uma discussão jurídica que ainda se arrasta nos tribunais, principalmente no que diz respeito à contaminação dos trabalhadores. No caso de Vila Carioca, depois de uma série de provas terem sido apresentadas, a empresa admitiu a contaminação por pesticidas tóxicos, reconheceu sua responsabilidade e se comprometeu a descontaminar uma área de 180 mil metros quadrados até o final de 2003. Em Paulínia, a empresa também
VÍTIMAS DA
PAULÍNIA admite a necessidade de recuperar o meio ambiente, mas nega que os trabalhadores tenham sido gravemente contaminados. “Dos 210 avaliados, nenhum teve até agora diagnóstico confirmado de doenças relacionadas ao trabalho provocadas por atividade funcional da antiga fábrica da Shell Química em Paulínia”, diz um documento da empresa distribuído pela assessoria de imprensa. Apesar dessa versão, em uma audiência pública realizada na Câmara dos Deputados em junho de 2002, e também diante de uma série de evidências apresentadas pelos advogados do Sindicato dos Químicos Unificados, a Shell confirmou que alguns funcionários poderiam estar doentes, mas não admitiu que seria devido à negligência da empresa. “A Shell disse que os problemas não são graves e que tem um ambulatório à disposição”, relata o coordenador da comissão de ex-trabalhadores da empresa, Antônio de Marco Rasteiro. A empresa realmente montou um ambulatório para atender os trabalhadores. No entanto, segundo estudo do Observatório Social
coordenado por Leila Nadim Zidan, alguns ex-funcionários entrevistados disseram que os médicos desse ambulatório evitam fazer qualquer correlação entre os problemas de saúde e as atividades da empresa. “Além disso, os extrabalhadores declararam que não recebiam informações de seu prontuário médico nem relatórios sobre a sua saúde”.
Doenças graves
A fábrica da Shell foi instalada no local em 1977. Em 1995, a unidade foi vendida para a Cyanamid Química do Brasil. Ao tomar posse da fábrica, uma das primeiras medidas da Cyanamid foi fornecer água mineral aos trabalhadores, na tentativa de reduzir os riscos de intoxicação. A empresa estava certa: em 2000, amostras coletadas pela Cetesb, analisadas pelo Instituto Adolfo Lutz, comprovaram a contaminação da água dos poços com níveis até 11 vezes acima do permitido pela legislação brasileira. Em 2000, a fábrica foi vendida para a corporação alemã Basf, que no local produz veneno para uso na agricultura. Dos 844 trabalhadores da antiga unidade da Shell, cerca de 200 permanecem trabalhando na mesma fábrica.
NEGLIGÊNCIA
“Tenho dificuldade de coordenação, pressão alta, perda de memória e perda auditiva”. Antônio de Marco Rasteiro, ex-trabalhador da Shell.
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“A Shell foi negligente, pois tinha conhecimento das conseqüências decorrentes da manipulação incorreta dessas substâncias”. Osvaldo Bezerra, diretor de Saúde e Meio Ambiente da Confederação Nacional dos Químicos.
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Como a Shell não admitia a contaminação dos trabalhadores, apenas a poluição ambiental, e em virtude de vários deles terem apresentado doenças graves e muito parecidas entre si, em 2001 foi criada uma comissão de ex-trabalhadores, coordenada pelo ex-funcionário Antônio de Marco Rasteiro. “A versão da empresa não condiz com a realidade, pois os exames que ela apresenta para sustentar esse argumento estão incompletos”, afirma. Essa posição fez com que a Comissão, apoiada pela regional de Campinas do Sindicato dos Químicos Unificados, entrasse na Justiça para obrigar a Shell a realizar exames detalhados. O Sindicato entrou com a ação em agosto de 2002 e não houve acordo na primeira audiência. A Justiça ainda não apresentou uma decisão final sobre o caso. O que acontece, na opinião do médico Roberto Carlos Ruiz, contratado pelo Sindicato, é que os exames realizados pela empresa são incompletos: “Os trabalhadores estão adoecendo. Entendemos que a consultoria médica paga pela Shell não é isenta e queremos a nomeação de uma junta médica pública que não esteja ligada nem ao
Sindicato e nem à empresa. Queremos que a Justiça nomeie essa comissão”. Um dos exames solicitados pelos trabalhadores – e que a empresa não quer fazer – é a análise do tecido gorduroso, onde se acumulam os organoclorados a base de drins (aldrin, eldrin, isodrin e dieldrin), que são altamente tóxicos. “A situação é gravíssima”, diz Ruiz. “Os trabalhadores apresentam problemas de fígado, de tireóide, dificuldade de coordenação”. Uma pesquisa científica realizada por Ruiz em 11 ex-trabalhadores identificou que 78% deles estão contaminados com alterações de saúde que, no seu entender, são compatíveis com exposição de produtos químicos de origem ocupacional. O médico, contudo, reconhece as limitações do estudo: “O universo total é de 800 trabalhadores. Fiz o que era possível dentro das limitações econômicas. A empresa precisa, agora, examinar o restante do pessoal”. Apenas um dos exames necessários, segundo ele, custa cerca de R$ 6 mil. “Há uns 20 exames para fazer desse nível. E a empresa deve se responsabilizar por eles porque os trabalhadores foram contaminados durante a atividade profissional”.
Palavra da Shell Crime ambiental Antônio de Marco Rasteiro, coordenador da comissão de extrabalhadores, é um dos contaminados: “Tenho dificuldade de coordenação, pressão alta, perda de memória, perda auditiva”. Rasteiro faz parte de um grupo de ex-trabalhadores que entraram com ações individuais na Justiça e foram beneficiados por uma ação cautelar que obriga a Shell a pagar a ele, mensalmente, R$ 600 para custear despesas médicas. “É preciso que seja feita uma avaliação real do estado de saúde dos trabalhadores. É só isso o que queremos, que se façam os exames necessários para ver quem realmente está doente”, diz ele. Arlei Medeiros, diretor de saúde do sindicato dos químicos, afirma que a Shell nunca demonstrou intenção de dialogar sobre o assunto. Segundo ele, a Shell afronta a sociedade ao optar pelo caminho de desqualificar a posição dos trabalhadores. Arlei diz que a empresa cometeu um crime ambiental por não usar os padrões adequados de prevenção. Osvaldo Bezerra, do Diesat e da Confederação dos Químicos, diz que o problema, em grande medida, é decorrente do modelo de desenvolvimento implantado no Brasil na época em que a Shell instalou suas unidades: “Não havia uma legislação rígida e a
Procurada para dar sua versão sobre o caso, a assessoria de comunicação da Shell enviou uma nota ao Observatório Social. Os principais argumentos da empresa são os seguintes: Em Audiência Pública da Comissão de Seguridade e Família da Câmara dos Deputados Federais, foi esclarecido que a empresa contratou clínica especializada em saúde do trabalhador e toxicologia ocupacional, dirigida pelo Prof. René Mendes. Já foram realizadas mais de 2 mil consultas para essas pessoas, tendo em vista que, quando necessário, a clínica permanece acompanhando os ex-trabalhadores avaliados, do ponto de vista médico, visando a aprofundar o diagnóstico e orientar as devidas condutas. Importante ressaltar que essa quantidade de extrabalhadores que já foi atendida equivale a aproximadamente o mesmo número de pessoas que lá trabalhava na época do fechamento da fábrica. Corresponde também a mais de 25% do total dos que trabalharam naquela unidade durante os últimos 17 anos. As avaliações de saúde permanecem abertas para os ex-trabalhadores que atuaram naquela fábrica. A clínica especializada do Prof. René Mendes foi contratada pela Shell para que a condução das avaliações fosse isenta, imparcial e qualificada. A clínica, que conta também com a colaboração da médica toxicologista Dra. Fernanda Livani - atua com a retaguarda de 30 especialistas em várias áreas da medicina, tanto em Campinas quanto em São Paulo, e do conceituado laboratório Fleury para as análises clínicas.
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empresa foi negligente, pois em suas unidades em outros países ela detinha a tecnologia necessária para evitar esse desastre”. Se as graves acusações contra a empresa forem comprovadas, reparar o dano
será não apenas uma questão de justiça para com as vítimas, como também um compromisso de responsabilidade social que precisa ser assumido com esta e com as próximas gerações.
Crimes ambientais corporativos no Brasil Diversas empresas que atuam no Brasil são acusadas de contaminar o meio ambiente e a população com elementos químicos. O Greenpeace, em relatório intitulado Crimes Ambientais Corporativos, fez uma relação dos casos mais graves. Conheça alguns: Bauru (SP): A Indústria de Acumuladores Ájax é acusada de contaminar o solo e o ar de sua unidade de reciclagem de baterias usadas, que funciona há 30 anos na região. Pelo menos 88 crianças que moram num raio de um quilômetro da unidade foram contaminadas. A fábrica foi interditada e a empresa recorreu à Justiça solicitando autorização para reiniciar as operações. Aterro Mantovani (SP): Entre 1974 e 1987, o Aterro Mantovani, instalado no interior de São Paulo, recebeu resíduos de 61 indústrias, entre elas Johnson&Johnson, Mercedes Benz, Basf, Texaco e Du Pont. Em 1987 ele foi fechado pela Cetesb devido a uma série de irregularidades. Resíduos perigosos vazaram para o lençol freático. Belo Jardim (PE): Uma das maiores fabricantes de baterias para veículos do país, a Moura, foi acusada, no início dos anos 90, de contaminar trabalhadores, solo e água com chumbo. Na época, o Sindicato dos Metalúrgicos de Pernambuco denunciou que 62,7% dos operários examinados apresentavam contaminação. No final da década, o sindicato informava que a situação já havia melhorado consideravelmente, mas que o problema ainda não tinha sido eliminado. Belford Roxo (RJ): Numa área de 2 milhões de metros quadrados, a Bayer produz poliuretanos, vernizes e produtos veterinários. A unidade também abriga um incinerador de resíduos perigosos. Em janeiro de 2001, a unidade foi acusada pelo Greenpeace de contaminar o rio Sarapuí com PCBs (bifenilas policloradas) comercialmente conhecidos como ascarel e metais pesados – como chumbo e mercúrio –, originados na incineração de substâncias poluentes. A empresa alega que não existe contaminação. Guarujá (SP): Um terreno da Dow Química apresenta contaminação por tetracloreto de carbono, insumo que a empresa não utilizava desde os anos 80. Segundo a empresa, a questão está sendo discutida com a Cetesb. Em janeiro de 2000, o Ministério Público Federal abriu inquérito para apurar as denúncias do Greenpeace. Cubatão (SP): Em 1999, relatório do Greenpeace divulgou que a Rhodia havia contaminado os rios Cubatão e Perequê, bem como as árvores do entorno. A empresa foi obrigada a restaurar o lençol freático. Em 2001, o Ministério Público instaurou inquérito para apurar contaminação provocada pela Carbocloro Oxypar Indústrias Químicas. Ao longo dos anos, a empresa acumulou três mil toneladas de resíduos mercuriais. A empresa alega que não é a responsável pelo problema, que estaria na represa Billings, localizada nas proximidades. Jundiaí (SP): A multinacional Solvay, de origem belga, foi acusada pelo Greenpeace, em 1999, de poluir a região ao estocar a céu aberto um milhão de toneladas de cal contaminado com dioxinas. A contaminação foi confirmada pelo Ministério da Agricultura. A empresa se comprometeu a contornar o problema. Fonte: www.greenpeace.org.br
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GLOSSÁRIO Benzeno e tolueno: solventes amplamente usados na indústria química e petroquímica. No caso da exposição crônica podem causar leucemia (câncer no sangue). Organoclorados: compostos orgânicos usados como veneno e que contêm cloro. Por se acumularem no ambiente, são de uso restrito ou proibido em mais de 120 países. Drins: proibidos em quase todo o mundo, pertencem ao grupo de poluentes POPs (Poluentes Orgânicos Persistentes). São regulados internacionalmente pela Convenção de Basel, que regulamenta o lixo tóxico. Tireóide: glândula situada na região do pescoço e que apresenta importante papel na formação, renovação e desenvolvimento das células.
O caso Shell na mira do governo Lula
Nilton Freitas é presidente da Fundacentro Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho entidade vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego.
Durante duas décadas (70 e 80) a Shell Química, localizada em Paulínia (SP), contaminou não só a área em que estava instalada e seus trabalhadores, mas também a região vizinha, com substâncias altamente tóxicas utilizadas na fabricação de venenos agrícolas, entre elas os organoclorados aldrin, dieldrin e endrin. Já em 1970, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos havia solicitado a suspensão e o cancelamento de todas essas substâncias. O pedido foi recusado em virtude de recurso interposto pela Shell. Essas substâncias são mais tóxicas que o DDT, pois não se degradam, contaminando suprimentos alimentares e se acumulando nos corpos humanos e animais. Na década de 90, a Conferência de Estocolmo condenou 12 desses produtos a serem eliminados do planeta, por sua toxicidade e persistência no meio ambiente. Dessas 12 substâncias, quatro eram manuseadas pelos trabalhadores da Shell na fábrica de Paulínia. Exames de laboratório realizados pela Prefeitura de Paulínia constataram a intoxicação dos trabalhadores. Um deles, ex-líder de produção da empresa, apresentava problemas hepáticos, perda de parte da audição e olfato e fissuras na tiróide. Antes de contaminar o meio ambiente, esses produtos contaminaram o ambiente de trabalho e os trabalhadores. O descaso com a segurança e saúde do trabalhador levou a contaminação para fora da fábrica, atingindo propriedades agrícolas, animais e pessoas das vizinhanças. O caso da Shell Química, em Paulínia, é um exemplo claro de que não se pode mais abordar a questão do meio ambiente sem que se aborde também o meio ambiente de trabalho. A preservação ambiental passa necessariamente por processos sustentáveis de trabalho. Norteados por essa visão do processo, na última reunião do Conselho curador da Fundacentro, propusemos - e tivemos acolhida nossa proposta – a inserção da questão do meio ambiente nos estatutos da entidade, como mais uma de nossas atribuições. Nossa intenção é colocar todo o know-how adquirido pela Fundacentro nos ambientes de trabalho, durante quase quatro décadas de pesquisa, como mais uma ferramenta a serviço do desenvolvimento sustentável do País.
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AHOLD SAI DA AMÉRICA LATINA
Parlamentares, sindicalistas, trabalhadores e clientes acompanham com interesse o desenrolar do processo de venda das redes de supermercados Bompreço e G. Barbosa, além da emissora de cartões HiperCard, empresas do grupo holandês Royal Ahold. A multinacional anunciou em abril sua intenção de se retirar do mercado latino-americano. Isso significa na América Latina 505 lojas trocando de mãos – entre magazines, hiper, super e minimercados – 156 delas no Brasil. No país, a atuação da rede está concentrada na região Nordeste.
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Analistas concordam que esta operação trará reflexos importantes no desenho do ramo nacional de supermercados, mas o impacto só poderá ser medido a partir da configuração da venda. As lojas poderão ser vendidas em bloco ou em partes, para concorrentes nacionais ou grandes grupos internacionais. A Ahold já anunciou sua intenção de vender a HiperCard separadamente, mas a forma de venda das redes de supermercados por enquanto ainda é pura especulação. Se ocorresse a venda em bloco para uma rede internacional, como Wal-Mart ou Carrefour, isso poderia implicar em uma excessiva concentração no setor varejista regional, pois a Ahold atualmente detém 30% do mercado nordestino, com presença nos nove estados da região. Esta possibilidade alertou os parlamentares brasileiros e a bancada daquela região no Senado, integrada por 23 parlamentares, solicitou providências do Conselho Administrativo de Defesa Eco-
nômica (Cade - órgão do Ministério da Justiça do governo brasileiro), para evitar a venda para um único grupo. Da mesma forma, sindicatos que representam os empregados do grupo se preocupam com a possibilidade de monopólio e também de desemprego na região. Para os sindicalistas, a compra da rede por um grupo que já esteja estruturado na região pode significar desemprego em massa. A Ahold emprega hoje mais de 22 mil pessoas.
Onde tudo começou Presente em 27 países da Europa, Ásia, Estados Unidos e América Latina, a Royal Ahold tem 9 mil lojas e faturou cerca de 73 bilhões de dólares no ano passado. O grupo holandês é considerado a terceira maior rede varejista do mundo e no Brasil chegou ao quarto lugar entre as maiores redes de supermercados, depois do Pão de Açúcar, Carrefour e Sonae. No início deste ano, a cor-
Bye Bye Brasil Os planos da corporação holandesa para deixar de investir em mercados com baixo desempenho já existiam antes do comunicado de fevereiro. Entretanto, após analisar as conseqüências do escândalo contábil nos
Estados Unidos, ela resolveu anunciar metas mais específicas para reduzir a dívida, superior a 12 bilhões de euros. No Brasil, a Ahold adquiriu a rede G. Barbosa com suas 37 lojas em 2001, quando teve a operação questionada pelo Cade. Em julho de 2002, o órgão antitruste suspendeu os efeitos do processo entre as duas redes. Na ocasião foi fechado acordo onde Bompreço e G. Barbosa se comprometeram a não modificar a estrutura logística e de distribuição de produtos, não demitir, não fechar estabelecimentos e não alterar suas marcas até que a fusão fosse julgada. O processo ainda está tramitando. A Bompreço é citada pela imprensa como uma das partes saudáveis do grupo. Em 2002, faturou 3,4 bilhões de reais, com crescimento de 6% em relação ao ano anterior. Já a HiperCard teve um faturamento estimado em 3 bilhões no mesmo ano e tem maior probabilidade de ser negociada separadamente. O resultado da retirada do grupo holandês do Brasil só poderá ser medido quando for estabelecido o seu ou os seus compradores. O ranking das
maiores empresas de supermercado no Brasil, segundo a ABRAS (Associação Brasileira de Supermercados) é composta pelo Pão de Açúcar, Carrefour e Sonae (controladora da rede Big), figurando a Bompreço em quarto lugar. Estas posições podem ser alteradas, ou ainda receberem uma nova participação, como a rede inglesa Tesco. O ABN Amro Bank foi escolhido para intermediar a operação e deverá receber as propostas de compra somente no final de julho ou em agosto. Até lá, analistas, parlamentares, sindicalistas e trabalhadores continuarão debatendo sobre as possíveis conseqüências de uma operação comercial de tamanho vulto sobre a comunidade local. Esta é uma das características da globalização, a atuação das empresas multinacionais ocorre em escala global, mas as decisão estratégicas permanecem centralizadas na matriz: um problema financeiro nos Estados Unidos levou a matriz na Holanda a decidir pela venda. Transnacionalizar as ações dos sindicatos – através dos Sindicatos Globais (Global Unions) –, passa a ser uma necessidade imperiosa.
ahold
poração divulgou um crescimento de 9,2% nas suas vendas em 2002, em relação ao ano anterior, passando de 66,6 bilhões de euros para 72,7 bilhões. Entretanto, depois de anúncios tão promissores, em fevereiro a empresa admitia publicamente incorreções nos balanços de 2001 e 2002 da filial norte-americana. As receitas da subsidiária U.S. FoodService foram artificialmente infladas em pelo menos 500 milhões de dólares. A conseqüência imediata do anúncio das irregularidades nos Estados Unidos foi a queda nas ações da companhia, que despencaram na bolsa de Amsterdã, perdendo 63% do seu valor em um único dia. No início de abril, a desvalorização das ações tinha atingido os 80%. Foi no dia dois de abril que a Ahold anunciou sua intenção de se retirar do mercado latino-americano.
E AGORA?
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Das Diretrizes da OCDE para as Empresas Multinacionais*:
“
IV. Emprego e relações empresariais
(...) 06. Fornecer aos representantes dos trabalho e, quando apropriado, às autoridades públicas competentes, com a devida antecedência, todas as informações que digam respeito à previsível introdução de alterações na atividade da empresa, suscetíveis de afetar, de modo significativo, o modo de vida dos trabalhadores, em especial, no caso de fechamento de unidades que impliquem demissões coletivas; cooperar com esses representantes e com as autoridades, no sentido de mitigar tanto quanto possível os efeitos adversos das medidas em causa; dependendo das circunstâncias específicas de cada caso e na medida do possível, fornecer tais informações antes mesmo de ser tomada a decisão final; poderão ser ainda empregados outros meios, para proporcionar uma cooperação construtiva com vistas a atenuar, substancialmente, os efeitos de tais decisões.
”
* As Diretrizes da OCDE para as Empresas Multinacionais são recomendações dirigidas pelos governos às empresas multinacionais, que estabelecem princípios e padrões de cumprimento voluntário, com vistas a uma conduta empresarial responsável.
PROCESSO DE VENDA
TRABALH QUEREM O Brasil é o terceiro país do mundo em número de desempregados, com 7,7 milhões de pessoas sem trabalho em 1999. De acordo com os dados do IBGE, o país só fica atrás da Índia (quase 40 milhões de desocupados) e da Rússia (9,1 milhões). Estes dados apontam para a importância do impacto que grandes manobras financeiras, como a retirada do grupo holandês Ahold do país, podem causar. Nas 119 lojas da rede Bompreço e 37 da G. Barbosa, o grupo emprega hoje mais de 22 mil pessoas. Sua atuação ocorre nos nove estados nordestinos, sendo que 40 lojas se encontram em Salvador, onde o comércio é uma das atividades que mais emprega. Na região metropolitana da capital da Bahia, em março de 2003 o IBGE estimou em 244 mil o número de pessoas que procuravam trabalho. Na visão dos sindicalistas, este número pode aumentar caso a rede de supermercados seja vendida para outras empresas que já possuam estrutura para administrar o setor. Várias dúvidas se colocam a partir do anúncio de venda do grupo. Para o presidente da Contracs (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Comércio e Serviços, filiada à CUT), Germano Rodrigues de Quevedo, é preciso esclarecer questões como em que moldes se dará a venda e como será tratado passivo trabalhista. “Não sabemos se será uma venda de patrimônio ou uma transferência; se houver o desmanche da empresa, isso poderá rebaixar as condições de trabalho”, afirma.
Ministério do Trabalho Germano Quevedo avaliou que as negociações com o grupo holandês são difíceis: “Nós esperávamos que ao menos eles
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ADORES PARTICIPAR adotassem a postura de cumprir com as normas internacionais, envolvendo os trabalhadores no processo”. A alternativa encontrada pelos sindicatos e Contracs foi de enviar um documento ao Ministério do Trabalho solicitando respeito e negociação com os sindicatos no processo brasileiro de venda. Outro caminho também é a ação internacional, principalmente em conjunto com a central sindical holadesa FNV. Dirigentes do setor farão parte da comitiva de sindicalistas que estará na Holanda para um intercâmbio sindical promovido pela FNV, com o apoio do Observatório Social (veja matéria na página 17). Na oportunidade, será feita visita à matriz da Ahold, onde, de acordo com o presidente da Contracs, será solicitada intervenção no processo brasileiro de venda. Também no Brasil, os sindicatos de comerciários que atuam na região Nordeste foram convidados pelo Observatório Social para participar de um encontro, nos dias 13 e 14 de junho, em João Pessoa (Paraíba). Neste encontro será analisado, com o maior número de dirigentes possível, o relatório da pesquisa realizada na Ahold e a partir disso os sindicalistas irão debater e planejar a estratégia de atuação frente à venda da rede.
dirigentes sindicais também deverão se aliar a outros setores preocupados, como os parlamentares. O senador sergipano Almeida Lima está à frente da bancada nordestina, que já encaminhou ofício ao Cade buscando impedir a venda em bloco do grupo, tentando evitar um monopólio. No documento dirigido ao conselho, o senador afirma que depois de assumir o comando do Bompreço, em junho de 2000, e do G. Barbosa, em 2001, a Ahold “adotou uma prática comercial predatória e cartelizada, maléfica à economia regional”. O que todos procuram parece ser o menor estrago possível na retirada da multinacional, que permaneceu por três anos no país, onde investiu, empregou, lucrou e tomou parte efetiva na sociedade. O debate sobre a responsabilidade social das empresas que se instalam no país já começou a fazer parte da preocupação dos trabalhadores e da sociedade brasileira. A operação de retirada da Ahold despertou o debate sobre a responsabilidade das que se retiram.
Em todas as frentes A influência do grupo Ahold nas relações trabalhistas no comércio varejista do Nordeste é grande, seja nas negociações diretas com os sindicatos, seja por seu peso nas organizações empresariais. Mais um motivo para que os sindicatos busquem instaurar um processo de informação, consulta e de negociação com a empresa sobre o processo de venda e seus impactos. Além da negociação conjunta, os
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O Observatório Social realizou, em duas oportunidades, estudos na rede de supermercados Bompreço. O primeiro relatório foi divulgado em junho de 2001 e está disponível no site www.observatoriosocial.org.br. Em 2002 foi realizada nova pesquisa, cujo relatório está sendo analisado pelos sindicatos e empresa e deverá ser disponibilizado para acesso público proximamente. Como os estudos apresentam o desempenho da Ahold no Brasil, em áreas como o respeito aos direitos trabalhistas, de meio ambiente e de responsabilidade social, o coordenador desta pesquisa acredita que este pode ser um bom instrumento na transição. “Tendo um quadro da ação da Ahold, podemos buscar junto ao novo controlador da rede no mínimo a manutenção deste padrão, sem prejuízo social”, diz Clóvis Scherer. A reportagem do Em Revista ENVIOU à diretoria da Bompreço perguntas sobre sua intenção em incluir sindicatos e trabalhadores no processo de venda; sobre como a Ahold vê a preocupação de parlamentares com a excessiva concentração no setor varejista; e como ela vê sua responsabilidade social perante as populações dos países dos quais está se retirando. Recebemos a seguinte resposta:
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Ahold afirma ter transparência e preocupação social O Bompreço, assim como a sua controladora, a Royal Ahold, vem realizando um esforço consistente e produtivo de maior aproximação com os sindicatos de trabalhadores que congregam seus associados, buscando a melhoria do diálogo e da colaboração mútua. Na base deste esforço está a sempre presente intenção do aperfeiçoamento da relação capital/trabalho, para que seja cada vez mais respeitosa e colaborativa de ambas as partes, em benefício dos trabalhadores e, simultaneamente, da própria organização produtiva. Neste sentido, têm sido realizadas reuniões entre representantes do Bompreço e dos sindicatos de trabalhadores dos nove estados onde a empresa atua, inclusive definindo-se uma pauta de discussões centrada principalmente em avanços na área social. O diálogo nem sempre é fácil e nem sempre se consegue superar divergências, mas existe um esforço consciente dos atores deste processo para que ele seja contínuo e crescente. Como parte dessas negociações, foram estabelecidos canais rápidos, formais e informais, diretos, dos sindicatos com a alta direção da Empresa, para que possíveis problemas possam ser informados, debatidos e corrigidos com rapidez. Também é parte disto a parceria de Bompreço com o Observatório Social para a realização da pesquisa sobre comportamento social e trabalhista. A atual direção do Bompreço vê na pesquisa uma oportunidade de identificar possíveis pontos de melhoria na sua relação com seus associados, podendo servir de base para programas de desenvolvimento dos recursos humanos. Dada a decisão da Royal Ahold de retirar-se dos países da América do Sul, inclusive o Brasil, mediante a transferência do controle acionário das suas empresas, o Bompreço, assim
como a Ahold, teve como uma das suas preocupações prover a correta informação aos seus associados e aos sindicatos que os representam. Agindo com transparência, a Ahold anunciou sua intenção de vender as empresas antes de realizar qualquer gestão para isto. No Brasil, o Bompreço promoveu reuniões de informação a todos os associados, reuniu-se com os sindicatos e também realizou ampla divulgação para a comunidade em geral. Também criou um boletim eletrônico interno, para permanente atualização dos associados, inclusive com seções de perguntas e respostas absolutamente abertas e transparentes. Outra preocupação social está na declaração da Ahold de que tratará da possível venda de forma absolutamente responsável em relação aos associados, inclusive considerando os seus interesses durante o processo de negociação. Isto não surpreende, porque nos sete anos em que a Ahold tem tido o controle parcial ou total da Empresa, sua postura sempre foi ética e respeitosa. Desta forma, os sindicatos são parte do processo e sua atitude positiva poderá ser muito importante para que o resultado seja otimizado. Isto não significa obviamente a participação dos sindicatos nas negociações propriamente ditas, pois tratam-se de conversas reservadas entre acionistas que desejam vender ativos e investidores que desejam comprá-los. Também não poderia a Ahold responder por ações dos futuros controladores em relação aos associados, aos sindicatos ou à comunidade em geral. A Ahold pode e se compromete a colocar estas questões na mesa de negociações, já que as considera relevantes, e espera que os futuros controladores possam dar continuidade a este esforço ora realizado pela Empresa. Raymundo de Almeida, diretor de Relações Institucionais do Bompreço
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Globalizar a luta para ver globalizados os direitos. Este é o caminho inovador promovido pela FNV, central sindical holandesa, que através do projeto Monitor de Empresas inaugura uma nova estratégia de negociação com multinacionais.
Unilever, Philips, Ahold (Bompreço) e Akzo Nobel são empresas holandesas que possuem unidades produtivas na África do Sul, Brasil, Coréia do Sul, Polônia, México e República Tcheca. Em todos estes países foram realizados estudos sobre a atuação das quatro multinacionais. O passo seguinte é promover um encontro entre os dirigentes sindicais, que estarão na Holanda entre 22 e 26 de junho. Lá eles avaliarão os resultados das pesquisas realizadas e visitarão as empresas. Sulafricanos, brasileiros, coreanos, poloneses, mexicanos, tchecos e holandeses de cada uma das corporações também se deverão reunir para elaborar ações conjuntas e buscar mecanismos de intercâmbio e solidariedade sindical.
Divulgação pública As visitas às fábricas acontecerão no dia 24, quando os estudos serão oficialmente entregues às empresas. Dois dias depois será realizado seminário para divulgação pública dos mesmos, com a participação da imprensa holandesa, ONGs, sindicatos, representantes das corporações e governo. O diálogo com as multinacionais e a sociedade, apresentando o resultado dos estudos, tem como meta buscar o compromisso das empresas de melhorar as condições de trabalho nos países onde atuam. Sete dirigentes sindicais brasileiros e um representante do Observatório Social farão parte do intercâmbio. No dia 14 de maio a delegação se reuniu em São Paulo para preparar a viagem.
As pesquisas no Brasil foram realizadas pelo Observatório. O estudo na Akzo Nobel está concluído e já foi entregue para representantes da empresa no Brasil. Os interessados podem encontrá-lo no site www.observatoriosocial.org.br. Já os estudos Unilever, Philips e Ahold serão disponibilizados após a entrega oficial às empresas, assim como os relatórios das pesquisas realizadas nos outros países.
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sindicalismo internacional
SINDICALISTAS EM INTERCÂMBIO NA HOLANDA
Grandes companhias mineradoras estão sendo responsabilizadas por sérios danos sociais e ambientais no estado do Amapá. A poluição teve origem há meio século. Um depósito de rejeitos contaminado por arsênio, bário e manganês coloca em risco a saúde de milhares de pessoas. O problema é agravado pela presença de cerca de 800 garimpeiros em uma área com alta concentração de ouro, o que aumenta a tensão e pode gerar conflitos. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa investigou o caso e apontou os culpados, mas até o momento pouco foi feito. No centro da polêmica está a mineradora Icomi, que chegou ao estado na década de 1950. O Observatório Social, com apoio da central sindical norueguesa LO, realizou um estudo e uma reportagem especial sobre o assunto.
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A Amazônia brasileira abriga um terço das espécies vivas do planeta. Seu subsolo é igualmente rico: o estoque de minério foi estimado por especialistas em 7,2 trilhões de dólares. Existem grandes jazidas de ouro, cobre, cassiterita, titânio, estanho, chumbo, tântalo, zinco, columbita, urânio, nióbio. As grandes mineradoras operam principalmente nos estados do Pará e do Amapá. O Amapá fica em uma das áreas mais preservadas do mundo. Só 1% de sua área de 140.000 km² foi desmatada. Mais de dois terços do estado são ocupados por floresta praticamente intacta. As grandes madeireiras foram impedidas de entrar na região e há uma rigorosa fiscalização para evitar a extração ilegal. As cooperativas extrativistas estão entre as mais organizadas do país e conseguem gerar emprego e renda sem destruir o meio ambiente. Por outro lado, a extração mineral tem um perfil bem diferente: exploração depredatória, poluição, contaminação das águas superficiais e subterrâneas, doença, mortandade de peixes, falta de responsabilidade social por parte das grandes empresas mineradoras. Agrava o problema a exis-
tência de 800 garimpeiros na área da Mineração Amapari, localizada a 200 quilômetros de Macapá, a capital do estado. Segundo técnicos do governo, os garimpeiros estão muito próximos de encontrar um veio tão abundante de ouro que a situação poderá brevemente ficar fora de controle, com uma invasão similar ao que aconteceu na década de 1980 em Serra Pelada, no Pará. Na época, milhares de garimpeiros ocuparam uma área da empresa Vale do Rio Doce e extraíram, em dez anos, 41 toneladas de ouro, deixando para trás problemas ambientais e sociais ainda não resolvidos.
Tragédia ambiental Na Vila do Elesbão, na área portuária do município de Santana, uma usina de beneficiamento de manganês deixou para o povo do Amapá uma das maiores tragédias ambientais da Amazônia: pilhas e mais pilhas de rejeitos contaminados por substâncias perigosas poluem o lençol freático e as águas superficiais. Exames realizados pela Universidade Federal do Pará em 1998 constataram que, de 100 pessoas que doaram amostras de cabelo para análise, 98 apresentaram taxas de arsênio até 20 vezes acima do máximo aceitável. Também na vila do Elesbão,
até agora não foi dada explicação convincente para o fato de o número de crianças que nascem com anencefalia (sem o cérebro) estar entre os mais altos do mundo. No centro da polêmica está a empresa de mineração Icomi, a primeira a chegar ao Amapá, na década de 1950, e que hoje está se retirando do estado pela porta dos fundos. A Icomi, uma empresa do grupo Caemi, deixa para trás um cenário de terra arrasada: não resolveu o problema dos rejeitos na área portuária, não admite a contaminação ambiental e humana, não cumpriu as cláusulas contratuais assinadas com a União para a exploração do manganês, não pagou as multas impostas pelo órgão ambiental. Em 50 anos de operação, a empresa faturou entre 7 e 10 bilhões de dólares e ajudou o grupo Caemi a ser tornar a segunda maior mineradora do Brasil, atrás apenas da Vale do Rio Doce. Agora, a Icomi se retira do Amapá às pressas, ao constatar que sua mina de manganês não é mais lucrativa. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito, instaurada pela Assembléia Legislativa em 1999, apurou que a empresa descumpriu uma das principais obrigações do contrato: 20% do lucro líquido deveria
meio ambiente
Mineração predatória na Amazônia brasileira
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ter sido aplicado em benefício da sociedade local. Segundo a CPI, esse dinheiro nunca foi investido em benefício do povo do Amapá.
Problemas ambientais e trabalhistas Outras duas minas são alvo de polêmica: a Mineração Vila Nova, recentemente vendida pelo grupo norueguês Elkem a uma empresa brasileira, e a Mineração Água Boa, que abandonou a região sem nunca ter pagado as multas advindas de danos causados ao meio am-
bróglio que vai demorar vários anos para ser resolvido: durante o tempo em que esteve à frente da exploração do cromo no Amapá, ela terceirizou praticamente todas as atividades de mineração. Ou seja, foram outras as empresas que, efetivamente, retiraram o minério do subsolo. Essa atitude prejudicou os trabalhadores que atuaram na exploração do cromo sob a gestão da Elkem. As subsidiárias contratadas, Tercam Engenharia e DSI Consult, não reconheceram a legitimidade do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativistas dos Estados
A reportagem investigativa Mineração predatória na Amazônia brasileira, de autoria do jornalista Marques Casara, foi entregue em maio pelo presidente do Observatório Social, Kjeld Jakobsen, ao presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), Marcus Barros. Lançada oficialmente no início de junho durante o 8º Congresso Nacional da CUT, a publicação bilíngüe (português e inglês) é complemento de dois estudos técnicos realizados para o Observatório pelo pesquisador Maurílio de Abreu Monteiro e equipe: A Icomi no Amapá e A Elkem no Amapá. As publicações serão utilizadas pela CUT, Confederação dos Mineiros, ONGs ambientalistas e outras entidades para levar ao conhecimento público a grave situação social e ambiental no estado amazônico. A íntegra dos textos está disponível em www.observatoriosocial.org.br.
biente. A Elkem teve uma passagem meteórica pelo Amapá. Em 1997, comprou do grupo Caemi a Mineração Vila Nova, que detinha os direitos de exploração do cromo. Nas mãos da corporação norueguesa, o pico da exploração se deu em 1999, quando foram retiradas 200 mil toneladas de concentrado de cromo. No segundo semestre de 2001 a produção foi paralisada e a empresa decidiu se desfazer do negócio. Apesar de sua rápida passagem pela Amazônia, a Elkem deixou um im-
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do Pará e Amapá (STIEPA) na defesa dos interesses dos trabalhadores. Para as empresas, o sindicato que deveria representar os trabalhadores – e, por conseguinte realizar a negociação coletiva e receber a devida contribuição sindical – era o da construção civil e não o dos extrativistas. Elas alegaram ter sua atividade ligada à engenharia e não ao setor extrativista. A Justiça não entendeu dessa forma e deu ganho de causa, em primeira instância, aos extrativistas. As empreiteiras recorreram e a questão deve
ainda se arrastar por mais dois ou três anos, tempo estimado para o julgamento do recurso. A corporação norueguesa alega que juridicamente não está envolvida com essa polêmica: “Não agimos de maneira censurável ou ilegal em relação a questões trabalhistas na Mineração Vila Nova”, afirma o diretor da Elkem Participações, Asbjorn Resell Sovik. “Isto é confirmado pelo fato de que as autoridades brasileiras não identificaram nenhuma irregularidade em relação ao uso de empreiteiros na MVN por parte da Elkem”. Contudo, a atitude da empresa não é respaldada pelas práticas da responsabilidade social empresarial. Como contratante da Tercam e da DSI, a Elkem, mesmo indiretamente, é responsável pelo que aconteceu. Ao não pagarem a contribuição sindical à entidade, as empreiteiras isolaram os trabalhadores amapaenses do apoio do sindicato. Esta postura é contrária aos princípios da Convenção 87 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), relativa à liberdade sindical e à proteção do direito social. Além das questões trabalhistas, a corporação teve que pagar pesadas multas em virtude de problemas ambientais decorrentes da exploração do cromo e foi obrigada a recuperar a cobertura vegetal da área onde explorou o mineral. Fiscais do governo do Amapá dizem que a empresa conseguiu reverter os problemas ambientais de maneira satisfatória.
Poluição e doença O envolvimento de grandes mineradoras com danos à natureza é uma prática corriqueira no Amapá e em toda a região amazônica. Distante seis quilômetros da Vila Nova, a Mineração Água Boa teve uma atitude ainda mais irresponsável: simplesmente abandonou a área depois de ter sido flagrada poluindo o meio ambiente. Não pagou a multa de R$ 30 milhões imposta pelo governo do estado e, de quebra, deixou para trás um dos mais perigosos produtos químicos existentes no mundo: o cianeto de sódio, que em contato com a água libera um gás que mata uma pessoa em poucos segundos. A empresa abandonou 120 quilos de cianeto no canto de um antigo refeitório. Outros 300 tambores cheios da substân-
cia foram encontrados recentemente pelos fiscais de Secretaria do Meio Ambiente. Estavam armazenados em um local inadequado, próximo à sede da mineradora. “Na época, o material foi retirado pela Vale do Rio Doce, que mandou especialistas em materiais perigosos. Agora, dependemos do Exército para retirar o material, pois o cianeto é extremamente letal”, informa o chefe da divisão de licenciamento da SEMA, Fábio da Silva Barreiras. A mineração em larga escala no Amapá começou na década de 1940, quando a pequena empresa Icomi venceu grandes mineradoras em uma concorrência para a exploração do manganês, na época um minério estratégico por ser amplamente usado, principalmente no pós-guerra, na fabricação de armas e equipamentos bélicos. O contrato de concessão foi assinado em 1947, com o início das primeiras pesquisas de lavra. Três anos depois, 49% da Icomi já eram da gigante norte-americana Bethlehem Steel Company, hoje uma empresa concordatária e que vendeu sua parte nos anos 80. Atualmente, a empresa é controlada pela Caemi, uma holding de capital aberto com participação em várias empresas do setor de mineração e infraestrutura. Ao longo de meio século, a Icomi retirou cerca de 60 milhões de toneladas de manganês da região denominada Serra do Navio. Essa exploração resultou na produção de enormes pilhas de rejeito tóxico, hoje depositado a céu aberto e que representa um dos maiores problemas ambientais da Amazônia brasileira. Na avaliação de especialistas, a Icomi provocou no Amapá uma tragédia ambiental cuja abrangência ainda não se conhece totalmente. A extração mineral no estado do Amapá seguiu durante várias décadas na contramão do respeito ao meio ambiente e à comunidade. Grandes empresas retiraram e exportaram para todo o mundo milhares de toneladas de riquezas. Para o Amapá e a Amazônia, contudo, sobraram a poluição, o desrespeito aos contratos e uma atitude oportunista e interessada apenas no lucro fácil da riqueza que brota do solo.
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CAFEICULTORES FAMILIARES
GOVERNO APÓIA POLÍTICAS ESPECÍFICAS
A campanha por melhores condições de trabalho e vida nos cafezais avançou no dia 7 de maio com a realização, em Brasília, do Seminário Nacional sobre o Café. Promovido na Câmara dos Deputados pela CUT, Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) e Oxfam com apoio do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), o evento reuniu 150 pessoas, entre agricultores familiares, assalariados rurais, parlamentares, representantes do governo federal, empresas, ONGs e entidades de classe. O governo se comprometeu com a causa e se mostrou disposto a discutir políticas específicas para a cafeicultura familiar. Na oportunidade foi lançada a publicação Café e Pobreza – Sara Lee: teoria e prática na responsabilidade social. Trata-se de um estudo realizado pelo Ob-
servatório Social sobre a multinacional de origem norte-americana Sara Lee e sua atuação no Brasil. A publicação, viabilizada numa parceria entre CUT, Contag, Oxfam e Coalizão Holandesa do Café, se divide em três partes: perfil da empresa, análise econômica e reportagem sobre as contradições entre os compromissos sociais da Sara Lee e a realidade em sua cadeia produtiva no sul de Minas Gerais. O texto está disponível em http://www.observatoriosocial.org.br/almanaque/almanaque.htm Ao final do evento foi entregue a declaração Café com Justiça Social ao presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha. Essa mesma declaração foi entregue em Londres no dia 19 de maio à Organização Internacional do Café e ao Banco Mundial.
Balanço do seminário - O Secretário de Produção e Comercialização do Ministério da Agricultura, Linneu Carlos da Costa Lima, anunciou que a Contag fará parte do Conselho Nacional do Café e do conselho do Funcafé. - O representante da Secretaria de Agricultura Familiar (SAF) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Arnoldo Campos, anunciou que a Secretaria está buscando formas para que os agricultores familiares do café também possam renegociar suas dívidas por causa da queda no preço no ano passado. - O representante da SAF e o secretário de Produção e Comercialização assumiram o compromisso de uma atuação conjunta, para que as políticas nacionais do café definidas pelo Ministério da Agricultura também beneficiem os agricultores familiares. - Parlamentares da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados se comprometeram a dar seguimento ao tema do café e a buscar, juntamente com CUT e Contag, formas de mudar o quadro de condições precárias dos assalariados rurais no setor.
Presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo, recebe o documento Café com justiça social
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- A SAF-MDA está aberta para discutir políticas específicas para os agricultores familiares do café, no que se refere a produção, comercialização e diversificação. - O diretor executivo da Abic (Associação Brasileira das Indústrias do Café), Nathan Herszkowicz, propôs uma articulação entre Abic, Contag, CUT e Oxfam no sentido de encaminhar proposta para que a compra de 1 milhão de sacas de café para a cesta básica seja feita diretamente da agricultura familiar.
Em síntese, as entidades propõem que o governo brasileiro, na condição de maior produtor e exportador de café do mundo: promova iniciativas no sentido de levar a OIC (Organização Internacional do Café) a tomar medidas internacionais que fortaleçam os produtores; adote um Programa Nacional e Estadual de Revitalização da Cafeicultura na Agricultura Familiar, viabilizando o acesso à assistência técnica, a tecnologias adaptadas, a diversificação, a créditos de investimento e ao custeio e instalação de infra-estrutura necessária à produção e comercialização, incluindo produção agroecológica e certificados, além de uma política de preço mínimo; fortaleça o Funcafé, garantindo a participação dos agricultores familiares em sua gestão, investindo parte de seus recursos no Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf), focando na melhoria da produção; implante uma política específica de incentivo à organização dos agricultores familiares com o objetivo de garantir acesso ao crédito, industrialização e mercado, incluindo os nichos de comércio justo e solidário; viabilize instrumento de participação das organizações dos agricultores familiares nos fóruns nacionais e internacionais de discussão e deliberação de políticas para o setor; elabore, aplique e fiscalize através do Ministério do Trabalho políticas e leis que garantam o respeito aos direitos e condições dignas dos assalariados do café; garanta a renegociação das dívidas dos produtores de café da agricultura familiar.
O documento Café com justiça social, subscrito pela CUT , Contag, Federações dos Trabalhadores na Agricultura, Sindicatos de Trabalhadores Rurais, Inesc, Observatório Social e Oxfam, foi entregue no dia 7 de maio ao presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha. A íntegra está disponível em As entidades propõem às grandes empresas proceswww.observatoriosocial.org.br/ sadoras ou que comercializam o café que: download/cafe_justica.pdf .
comércio justo
Café Café Café com com justiça com justiça social justiça social social
se comprometam a negociar com as entidades representativas dos agricultores familiares a compra direta e ou o apoio e investimentos em programas de capacitação ou outros que possam garantir a permanência dos agricultores familiares na produção de café, bem como programas de melhoria da qualidade; assumam compromissos de respeitar os direitos dos assalariados rurais na produção e na indústria, conforme preconiza a legislação trabalhista brasileira ou as convenções internacionais da Organização Internacional do Trabalho (OIT), negociando com as organizações destes trabalhadores mecanismos implementação e monitoramento; divulguem, promovam e apliquem os seus princípios de responsabilidade social, principalmente diante dos seus fornecedores. Por fim, o documento sugere aos governos federal, estaduais e municipais, às empresas e às organizações dos agricultores que promovam conjuntamente campanhas de promoção da qualidade e do consumo do café e de um novo modelo produtivo socialmente justo.
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E
Em entrevista exclusiva ao Observatório Social Em Revista, o ministro do Trabalho e Emprego, Jaques Wagner, expressa a posição do governo federal sobre temas que estão na ordem do dia dos debates brasileiros. Combate ao trabalho infantil e ao trabalho escravo, medidas contra a discriminação de gênero e de raça, programas contra o desemprego e mudanças na legislação trabalhista estão entre os assuntos abordados.
Observatório Social - De que formas o governo federal pretende incentivar as multinacionais que atuam no Brasil a adotar ou ampliar políticas de responsabilidade social corporativa? E como pretende atuar em relação às que ignoram o tema?
Ministro Jaques Wagner - Desde o início do ano, o governo brasileiro vem adotando as medidas para a implementação das Diretrizes para Empresas Multinacionais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, especialmente as voltadas à adoção dos princípios da governança corporativa. Nesse sentido, está constituindo o Ponto de Contato Nacional, sob a coordenação do Ministério da Fazenda, do qual participa ativamente o Ministério do Trabalho e Emprego. As citadas diretrizes se assemelham a um código multilateral de conduta, com ênfase nos aspectos sociais, têm caráter voluntário para as empresas e visam comprometer suas operações com as políticas governamentais, fortalecer o seu relacionamento com a sociedade onde operam, melhorar o clima para o investimento externo e aumentar a contribuição dessas empresas para o desenvolvimento sustentável. OS - Como o governo planeja fortalecer as convenções da OIT no país? Há projetos específicos para reforçar o cumprimento das convenções 100 e 111, que tratam de igualdade salarial entre homens e mulheres e de nãodiscriminação?
Ministro - O governo brasileiro dá fundamental importância ao cumprimento dos instrumentos normativos da OIT. Somos um dos Estados Membros daquela Organização que mais Convenções ratificou e mantém compromisso permanente de aplicá-las. Consideramos o diálogo social mecanismo que permite, com a participação dos atores sociais, alcançar os objetivos traçados pelas normas internacionais. O Ministério do Trabalho e Emprego já possui programa especifico de implementação das Convenções 100 e 111 da OIT – o Programa Brasil, Gênero e Raça, que tem como objetivo principal conscientizar e sensibilizar a sociedade sobre a existência das práticas discriminatórias e seu combate. A meta é intensificar as ações levadas a cabo pelo Programa Brasil, Gênero e Raça, por meio dos 74 Núcleos de Promoção da Igualdade de Oportunidades e de Combate à Discriminação. Pretendemos aumentar para uma centena esses núcleos e condenar com veemente a existência de “listas negras” com práticas discriminatórias. As que mais sofrem são as mulheres, principalmente, as grávidas. Não vamos ter complacência com as restrições às mulheres negras, nem com o assédio sexual, e muito menos com os portadores do HIV, de deficiência ou que enfrentaram reabi-
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litação. Estes tipos de discriminação, assim como outros, resultam em demissão arbitrária e ilegal ou à criação de ambiente hostil no local de trabalho, como forma de forçar pedidos de demissão. O foco da atuação dos núcleos, além do recebimento e à apuração de denúncias de práticas discriminatórias, é o da promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento nas relações de trabalho, em parceria de entidades da sociedade civil e de outras esferas governamentais, na implementação de ações afirmativas. OS - O Brasil vai ratificar a Convenção 87, que trata de liberdade sindical?
Ministro - A Convenção 87 que trata da Liberdade Sindical já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A posição do ministério do Trabalho é favorável à sua ratificação mas essa decisão envolve negociação com as entidades máximas de representação dos trabalhadores e dos patrões. Há 54 anos, desde 1949, o pedido de ratificação desta Convenção tramita no Congresso Nacional, o que mostra a polêmica que domina o tema. Mas a intenção é retomar o debate sobre a sua ratificação. Entretanto, para que tal aconteça é necessário reformar a Constituição, pois o artigo 8º inciso 2 da Carta Magna garante a unicidade sindical do ponto de vista territorial. A discussão sobre a ratificação também deverá ser um dos principais temas de debate do Fórum Nacional do Trabalho, do qual participarão representantes do governo, Centrais Sindicais e entidades patronais. Sem um amplo processo de negociação dificilmente essa questão será aprovada no Congresso. Após a etapa de negociação no Fórum será iniciada a fase de entendimento entre os parlamentares. OS - Que projetos de cooperação o governo pretende desenvolver com o recém-criado Grupo de Apoio da OIT?
Ministro - O governo brasileiro deseja contar com a OIT como parceira para financiamento de vários programas de geração de emprego e renda, além de ajuda para a realização do Fórum Nacional do Trabalho. Entre os programas estão os de combate à informalidade e a favor da assinatura da Carteira de Trabalho, o Primeiro Emprego para a Juventude, a Promoção do Diálogo Social e o Combate ao Trabalho Escravo e Degradante, além da Erradicação do Trabalho Infanfil. OS - Que medidas serão tomadas em curto, médio e longo prazo para combater o trabalho escravo no país?
Ministro – O Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo foi lançado em 11 de março desse ano, re
OS - E para eliminar o trabalho infantil?
Ministro- Da mesma forma, intensificamos a luta pela erradicação do Trabalho Infantil no país. Já na primeira reunião realizada pela Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Infantil, no dia 23 de maio, foi definido um novo plano nacional que tem como meta intensificar o combate ao trabalho infantil. O número de crianças e adolescentes que trabalham e não freqüentam a escola ainda é preocupante, mas o MTE está intensificando suas ações. No primeiro trimestre desse ano, a fiscalização do Ministério alcançou 33.249 trabalhadores com idade inferior a 18 anos, no setor formal da economia e 1.316 no setor informal. Do total, 1.627 estavam abaixo do limite legal para o trabalho, de 16 anos, sendo um terço no setor informal.
Os Grupos Especiais de Combate ao Trabalho Infantil existem em todas as Delegacias Regionais do Trabalho, que coordenam essa ação, feita em articulação com o Ministério da Assistência e Promoção Social. O MTE participou da Campanha Especial de Combate à Exploração Sexual de Crianças e de Adolescente durante o Carnaval desse ano, na Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro. OS - O Sr. defende que, no atual cenário de restrição fiscal, o governo dê ênfase em políticas ativas de geração de emprego e renda. O que o Ministério pretende realizar nesse sentido? Que recursos estão disponíveis?
Ministro – Estamos reestruturando os Programas de Geração de Emprego e Renda, financiados com recursos do FAT. Estamos lutando para descontingenciar os recursos. Junto aos principais agentes financeiros (BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, e Banco do Nordeste) teremos uma política de direcionamento dos recursos, apoiando fortemente os setores intensivos no uso de mão-de-obra. Vamos promover o adensamento das cadeias produtivas, apoiar a agroindústria, no âmbito da agricultura familiar, incentivar a incorporação dos setores sociais excluídos do sistema financeiro tradicional, reforçar o papel do crédito produtivo popular como mecanismo de inclusão social e contribuir para o crescimento das exportações. O Proger, urbano e rural, o Pronaf, o Pró- Trabalho e FAT Habitação realizaram, de janeiro a março desse ano, 121 operações, que resultaram em investimentos no valor de R$ 606 milhões.
entrevista - JAQUES WAGNER
mulando totalmente a estratégia de ação do governo passado e tornando mais rigorosa a atuação dos fiscais. Além das operações realizadas pelas Delegacias Regionais do Trabalho, o Grupo Especial de Fiscalização Móvel do MTE executou, até 7 de maio, 22 operações em 53 propriedades rurais situadas nos estados do PA, MT, MA, TO, BA e SP, beneficiando 4.212 trabalhadores que foram libertados da condição análoga à escravidão. Foram pagas a estes trabalhadores R$ 1,94 milhão em verbas trabalhistas. O governo anterior levou sete anos para chegar a esse resultado. É uma luta intensa que precisa do envolvimento de todos, governo, judiciário, legislativo e a sociedade. Acredito que iremos conseguir erradicar essa chaga da sociedade antes do final do governo.
MINISTRO DO TRABALHO:
“REFORMA VAI ASSEGURAR DIREITOS”
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OS - Esta nova ênfase implica mudanças significativas em políticas passivas como o seguro-desemprego?
Ministro – Vamos executar políticas ativas de criação de emprego e dar novo formato às que aí estão. Nenhuma mudança vai mexer em direitos adquiridos dos trabalhadores, como o seguro-desemprego. Mas ele pode ser aperfeiçoado para ser um instrumento intermediário de um conjunto de políticas de emprego e renda. O Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador Codefat está estudando mudanças para criar o Sistema Público de Emprego e reformatando os principais programas do FAT. A idéia central é de concedermos ao trabalhador chances dele ser recolocado no mercado de trabalho mais rapidamente, depois de ter passado por programas de requalificação profissional. OS - Que mudanças o Ministério defende para o FAT e por quais motivos?
Ministro – Desde que assumimos o Ministério do Trabalho, uma das prioridades foi promover uma nova gestão nos programas e recursos do FAT, contando com apoio de empresários, trabalhadores e demais órgãos do governo. A intenção é realizar uma reformulação geral de todos os programas hoje existentes no FAT. A decisão de reformatar os programas foi submetida e aprovada em reunião do Codefat em (19/02/03) com todos os representantes das centrais sindicais. Estamos ainda redirecionando a aplicação do dinheiro do fundo através de resolução, que fixou critérios para a distribuição dos recursos. O principal é repassar recursos de acordo com metas que comprovem a geração de emprego e renda. Insistimos ainda na criação do Sistema Público de Emprego, integrando todos os programas. E para isso realizaremos novos convênios com os estados e as centrais sindicais. Em janeiro encontramos a existência de vários sistemas paralelos e fragmentados de programas do FAT, que vinha desempenhando fraco papel de repassador de recursos sem um acompanhamento mais rígido de suas ações. Agora teremos maior eficiência na aplicação dos recursos nos programas. Sabemos que a geração de empregos vai decorrer, principalmente, da retomada do crescimento econômico de forma sustentável, mas é preciso também solidificar e integrar as diversas políticas públicas de emprego. Para isso, vamos ampliar a representação dos atores sociais no FAT, hoje cada segmento tem 4 representações e ao mesmo tempo tornar obrigatória em todos os municípios e estados os Conselhos de Emprego na gestão participativa do novo Sistema. Os maiores beneficiários do novo sistema serão os jovens (1º emprego), pessoas acima de 40 anos, mulheres, afrodescendentes e portadores de deficiência. OS - As estatísticas de desemprego entre os jovens são o dobro da média nacional. O Sr. acredita que a renúncia fiscal será um atrativo suficiente para que haja ampla adesão das empresas ao programa Primeiro Emprego?
Ministro - O projeto programa do Primeiro Emprego da Juventude, uma das bandeiras da campanha eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pretende a um só momento criar oportunidades de trabalho para os jovens, como também reduzir a participação destes na criminalidade. Hoje a taxa de desemprego entre os jovens é quase do dobro da taxa de desemprego em geral. Atualmente, os jovens representam cerca de 47% do total
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dos desempregados do país. São 3,4 milhões de jovens desocupados, a maioria oriundos de famílias pobres. Por este motivo o alvo do programa será o jovem de 16 a 24 anos de baixa renda e escolaridade que enfrentam mais dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Por isso, está em estudos dar maior incentivo às empresas que empregarem jovens afrodescendentes, mulheres e portadores de deficiência. O governo repassará R$ 200,00 diretamente às empresas que aderirem ao programa com a criação de posto de trabalho que caracterize primeiro emprego. De seis meses a um ano, a empresa que aderir ao programa será responsável pelo pagamento de um salário mínimo. Os incentivos ainda estão sendo definidos pelo governo. Mas para recebê-los, a empresa precisará assinar termo de adesão ao programa. Não poderá ter demitido nos três meses anteriores e terá que se comprometer a não reduzir postos de trabalho para compensar a vaga criada. Terá que respeitar os direitos trabalhistas, exigir a frequência escolar do jovem, e habilitar-se na Rede de Atendimento do Sine/ Ministério do Trabalho. OS - O Sr. defende uma reforma trabalhista consensual, fruto do acordo entre os poderes e todos os envolvidos no mundo do trabalho. Que pontos dessa reforma são negociáveis pelo Executivo e que pontos são inegociáveis?
Ministro – A Reforma Trabalhista que apresentaremos ao Congresso Nacional não irá representar o barateamento da mão-de-obra. Se for para fazer leilão de escravos, não contem comigo. O Governo não pretende desrespeitar direitos trabalhistas nem fazer reforma para baratear os custos da mão-de-obra. A idéia é aprimorar a legislação resguardando as conquistas constitucionais. Somos contra a flexibilização da CLT, e por isso, retiramos do Congresso Nacional o projeto do governo passado que foi aprovado sem discussão mais ampla entre todos os envolvidos no mundo do trabalho. Porém, achamos que a CLT precisa ser simplificada para facilitar os entendimentos das relações capital e trabalho. Também quero deixar claro que jamais a multiplicação das parcelas de pagamento do 13º salário. O trabalhador que já ganha tão pouco não pode ter redução da sua massa salarial. Estamos ultimando os preparativos para debater as reformas sindical e trabalhista no Fórum Nacional do Trabalho, que contará com a participação de representantes dos trabalhadores, empresariado e do governo. A data da instalação será fixada pelo governo. OS - Qual é a sua opinião sobre o trabalho desenvolvido pelo Observatório Social?
Ministro - As atividades desenvolvidas pelo Observatório Social estimularam a pesquisa como uma valiosa e fundamental ferramenta para o acompanhamento e consulta das tendências do mercado de trabalho e das atividades sindicais. Assim os trabalhos de acompanhamento desses setores envolvidos no mundo do trabalho terão mais qualidade e um melhor parâmetro de compreensão. Era a publicação que faltava para uma análise mais profunda do comportamento de empresas nacionais e estrangeiras, além das ações em defesa dos direitos do trabalhador e da articulação internacional entre os sindicatos. Constatamos o sucesso da iniciativa desde a sua primeira publicação, no 2º Fórum Social Mundial, apontando uma nova visão para a conquista de melhorias trabalhistas e sociais. Estão todos de parabéns.
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ABN AMRO BANK
DIÁLOGO PRECISA AVANÇAR O Observatório Social entregou em abril à Confederação Nacional dos Bancários (CNB), ao Sindicato dos Bancários de São Paulo e Região e à diretoria do ABN Amro Bank o resultado do estudo sobre a atuação, no Brasil, desta transnacional de origem holandesa. Em junho será feita a divulgação oficial ao público, em evento a ser agendado na capital paulista. Na opinião dos dirigentes sindicais, a pesquisa contribuiu para fortalecer os laços internacionais entre os trabalhadores e para uma melhoria na relação com o Banco. Entretanto, os bancários enfatizam que o diálogo com a empresa precisa levar a avanços concretos ainda este ano. Um grande mérito do estudo realizado pelo Observatório Social no ABN Amro Bank é ter contribuído para ampliar a solidariedade internacional, avalia o presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, João Vaccari Neto. O Sindicato representa mais de 100 mil bancários brasileiros, entre eles 60 mil associados. Ele lembra que a solidariedade é um valor presente desde a fundação da própria CUT (Central Única dos Trabalhadores). No Brasil esse tema tem avançado bastante a partir da filiação da CUT, em 1992, à CIOSL (Confederação Inter-
nacional das Organizações Sindicais Livres), que congrega trabalhadores do mundo inteiro. “Temos uma relação antiga com as entidades sindicais da Holanda”, diz Vaccari. “Há
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pelo menos meia década a FNV [maior central sindical holandesa] contribui com projetos de pesquisa, debates com multinacionais e outros projetos. Como as atividades do ABN Amro Bank no Brasil são recentes, ainda não temos conhecimento pleno sobre o funcionamento da empresa. Mas queremos e devemos participar de uma política de conquista de direitos dos trabalhadores e de denúncias sobre os desmandos que o ABN tem cometido”. Vaccari afirma que o estudo realizado pelo OS servirá de exemplo positivo nas nego-
ciações com outros bancos, ao ampliar o debate sobre salários, demissões, saúde e segurança, planos de metas, condições de trabalho e adoção de novas tecnologias. A pesquisa contou com a cola-
boração da empresa, que afirma ter colocado a responsabilidade social e a sustentabilidade como prioridades estratégicas (veja reportagem de capa no Observatório Social Em Revista nº 2, disponível em www.observatoriosocial.org.br). Sétimo colocado no ranking brasileiro de bancos por ativos (R$ 31,8 bilhões no final de 2001), o ABN Amro Bank emprega mais de 22 mil trabalhadores em 1.664 agências e postos de atendimento em todos os estados do país. “Temos tido mais respeito aos dirigentes sindicais nos locais de trabalho, mas é preciso avançar nas conquistas”, diz o presidente do Sindicato. “Responsabilidade social só vai existir quando diminuir a ganância do banco. Senão, serão apenas leves preocupações sociais”.
ACORDO INTERNACIONAL A aproximação entre bancários brasileiros e holandeses permite vislumbrar, em um futuro próximo, a construção de um acordo internacional entre os trabalhadores e a
corda que relacionamento dos trabalhadores com o ABN Amro era muito difícil, mas que a diretoria do banco começou a sinalizar uma mudança de postura a partir de 2002: “O diálogo avançou quando o Banco começou a ser pesquisado pelo Observatório com base em parâmetros internacionais aos quais a empresa aderiu e quando o Sindicato começou
cal e à Proteção do Direito Sindical. O Sindicato foi informado pela diretoria do ABN Amro que há um estudo em andamento para permitir esse acesso. Outra dificuldade é a falta de acesso dos representantes dos trabalhadores a dados sobre os assuntos em pauta nas negociações. “O Banco precisa perder o medo de trazer informações ao movimen-
a utilizar como estratégia o conceito de responsabilidade social”. Um dos problemas que persistem é a dificuldade de acesso dos dirigentes sindicais aos principais locais de trabalho, onde há grandes concentrações de bancários. Esse direito está previsto na Convenção n° 87 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), relativa à Liberdade Sindi-
to sindical”, diz. “Por exemplo, em relação aos problemas de saúde, todos só têm a ganhar, pois a médio e longo prazo o trabalho conjunto de prevenção reduz os custos”. Gonçalves avalia que o ABN Amro tem demonstrado seriedade e interesse genuíno em aprofundar as negociações. Mas ressalta que não basta dialogar: “Precisamos obter avanços concretos ao longo deste ano”.
abn amro bank
direção do ABN Amro Bank, diz Marcelo Gonçalves, dirigente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e funcionário do Banco desde 1991. Ele lembra que os bancários são uma das poucas categorias de trabalhadores brasileiros que conquistaram um acordo nacional. O próximo passo é expandir essa conquista para além das fronteiras, já que a empresa tem atuação transnacional. Para isso, é importante reduzir as distâncias idiomáticas – aprendizado do inglês – e culturais. “Precisamos conhecer melhor a história da Holanda e do movimento sindical holandês, para que se possa evoluir na articulação internacional e manter um bom relacionamento”, ressalta. Uma publicação lançada em janeiro pelo Observatório Social Europa e pelo Observatório Social Brasil visa contribuir para atender essa necessidade: Sindicalismo no Brasil, na Holanda e na Alemanha apresenta a história dos sindicatos, do modelo sindical e da participação dos trabalhadores alemães, brasileiros e holandeses. Marcelo Gonçalves re-
ALGUNS TEMAS A AVANÇAR ·SOBRECARGA DE TRABALHO A jornada é de 6 horas, mas há diversos funcionários fazendo 8 horas ou mais. ·PLANOS DE CARGOS E SALÁRIOS E DE PARTICIPAÇÃO NOS RESULTADOS Os trabalhadores reivindicam mais participação no processo decisório.
·ACESSO DOS DIRIGENTES SINDICAIS AOS LOCAIS DE TRABALHO Esse direito previsto pela OIT não é plenamente exercido na empresa. ·ACESSO A INFORMAÇÕES SOBRE TEMAS RELATIVOS AOS TRABALHADORES A postura de responsabilidade social requer respeito ao Sindicato como legítimo representante dos interesses dos bancários. ·SAÚDE E SEGURANÇA NO TRABALHO As lesões por esforços repetitivos e os distúrbios psicológicos são problemas sérios na empresa.
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empresas norueguesas
Grupo Hydro Agri, Kvaerner, Elkem ASA, Norske Skog, Telenor e Nera. São empresas de energia, agricultura, papel e celulose, minerais, petroquímica e telecomunicações. Em comum entre elas, o capital norueguês e sua presença no Brasil. Durante o ano de 2001, o Observatório Social elaborou estudo sócio-econômico das empresas norueguesas no país, que pode ser encontrado no site www.observatoriosocial.org.br. A pesquisa foi solicitada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Noruega (LO Noruega) e desenvolvida em parceria com o Desep/CUT (Departamento
Poluição ambiental e tercerização
de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos). Questionários aplicados junto aos sindicatos e empresas, sites e fontes secundárias permitiram traçar um perfil das corporações e de sua atuação no Brasil. O estudo abordou superficialmente a questão ambiental, mas os pesquisadores alertam que este setor econômico é grande poluidor e responsável por graves problemas de saúde profissional. “Assim recomenda-se dar destaque a esse tema na continuidade”, aconselham. As relações trabalhistas mereceram mais destaque, e a terceirização da mão-de-obra aparece como um dos principais problemas, concentrada principalmente no setor mineral e de papel e celulose. Além da precarização das condições de trabalho, a terceirização também é utilizada como forma de prescindir do sindicato e da figura da convenção ou acordo coletivo.
GRUPO PAPEL E CELULOSE GRUPO DE EXTRAÇÃO E REFINO DE ALUMÍNIO, ADUBOS, FERTILIZANTES O grupo Norsk Hydro envolve a empresa Hydro Alumínio Acro e a Hydro do Brasil (Mineração Rio do Norte, Alunorte e Adubos Trevo). É a terceira maior produtora mundial de alumínio. No Brasil, suas unidades operam nas áreas de agricultura e metais leves. A Kvaerner é um grupo de engenharia e construção. Opera no Brasil desde 1978, no Paraná, com a divisão de papel e celulose. Conta com parcerias e alianças globais com o grupo Lorentzen (Aracruz Celulose) e com a Norske Skog.
O grupo Norske Skog está entre os maiores produtores globais de papel. São 27 unidades em 16 países. No Brasil, atua através das subsidiárias: Norske Skog do Brasil, Norske Skog Klabin Comércio e Indústria, Fletcher Challenge Produtos Florestais, Pisa Papel de Imprensa e Pisa Florestal. A Lorentzen atua em diversos setores de atividade econômica, como transporte e logística, química, petroquímica, papel, celulose e informática. Tem ações das empresas: Companhia de Navegação Norsul, Carboindustrial, Carboderivados, Vera Cruz Agroflorestal, DSND Consub, Vertex Participações e Lorentzen Empreendimentos. A Aracruz foi um dos principais objetos de análise do estudo. Trata-se da maior empresa de celulose de mercado do Brasil e foi dela que apontaram os maiores problemas sócio-trabalhistas.
GRUPO DE EQUIPAMENTOS E SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO MÓVEL Fundada em 1855, como prestadora de serviços de telegrafia, a Telenor vincula-se ao processo de desenvolvimento das telecomunicações na Noruega. No Brasil, atua principalmente na área de comunicação via satélite. O grupo Nera ASA é líder no desenvolvimento e fabricação de produtos destinados à comunicação via satélite e comunicação de terra via rádio. Atua no Brasil desde 1995 como fornecedor de equipamentos para operadoras de telecomunicações e empresas corporativas.
GRUPO QUÍMICO E MINERAÇÃO
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A multinacional Elkem ASA é a maior produtora mundial de microsílica. Seus principais produtos são metal de silicone, alumínio, carbono e microsílica. Está presente em 12 países. No Brasil, possui duas empresas na área carboquímica: a Carboindustrial e a Carboderivados. Os terceirizados somam 55,5% do total de empregados na Elkem e estes trabalhadores recebem 3,5 vezes menos que os contratados.
AKZO NOBEL
No início de 2003 o Observatório Social divulgou a pesquisa realizada em algumas unidades do grupo Akzo Nobel. Este foi o primeiro de quatro estudos que estão sendo realizados em empresas holandesas que atuam no Brasil, como parte do projeto Monitor de Empresas, desenvolvido pela central sindical FNV (Federatie Nederlandse Vakbeweging) com a parceria do Observatório. A pesquisa sobre a Akzo está disponível no site www.observatoriosocial.org.br e aponta alguns problemas, como a diferença de tratamento dado aos funcionários das diversas unidades. De acordo com trabalhadores e sindicalistas entrevistados, unidades como a Proquímio são uma es-
pécie de “segunda linha” tanto nas condições de trabalho e relacionamento como quanto aos benefícios. Na Akzo, mulheres apresentam média salarial mais baixa que a dos homens em funções semelhantes, assim como ocupam menos cargos de chefias. Os negros estão praticamente fora das chefias e os portadores de necessidades especiais são parcela muito pequena de mão-de-obra. Os sindicatos também encontram dificuldades, principalmente no fluxo de informações, seu conteúdo e morosidade. Alguns trabalhadores afirmaram que existe um banco de horas sem que tenha havido participação do Sindicato na sua definição.
akzo nobel
Tratamento diferente nas unidades
Perfil da Akzo Nobel - Está presente em 80 países; - Sua sede está em Arnhem – Holanda; - Em 2001 empregava 67.800 trabalhadores; - Atua em três setores: farmacêutico, químico e de revestimentos; - O conglomerado ocupa o 12º lugar no mundo entre as indústrias químicas; - Iniciou suas atividades no Brasil em 1940, através da empresa Organon; - São cinco unidades farmacêuticas no país, nos estados de São Paulo e Ceará; - No setor químico são quatro unidades, todas em São Paulo; - No Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul se encontram as cinco fábricas de revestimentos (tintas).
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“BRASIL É Na década de 1990 houve, de maneira geral, um retrocesso na aplicação dos direitos trabalhistas no Brasil. Por outro lado, as pressões sociais levaram a diversas conquistas, como a adoção de códigos de conduta por companhias multinacionais. A avaliação é de José Olívio Miranda Oliveira, membro do Conselho Diretor do Observatório Social. Desde junho de 2002 esse engenheiro civil de 55 anos ocupa o cargo de secretário geral adjunto da CIOSL (Confederação Internacional das Organizações Sindicais Livres), entidade que congrega 231 centrais sindicais de 150 países. José Olívio aborda, entre outros temas, as mudanças na legislação trabalhista, a responsabilidade social corporativa e a articulação internacional dos trabalhadores pelo cumprimento dos direitos. A íntegra desta entrevista está disponível em http:// www.observatoriosocial.org.br/ almanaque/entrevistaolivio.htm
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Observatório Social - De que forma vêm evoluindo as articulações internacionais da CUT em defesa dos trabalhadores após decisão da Central de se filiar à CIOSL em 1992? José Olívio - Com o fim do mundo bipolar a década de 90 trouxe mudanças nos centros de decisão política, enfraquecendo o poder dos estados nacionais. Ao se filiar à CIOSL em 1992, a CUT reconhecia a importância do cenário internacional para a ação sindical e vem agindo em conseqüência. Ajudamos a construir os espaços institucionais do Mercosul, como o Fórum Consultivo Econômico e Social, a Comissão Sócio-Laboral do Mercosul e a Coordenadora de Centrais Sindicais do Cone Sul. Reconhece-
mos a importância da OIT e passamos a integrar o Conselho de Administração, a partir de 1993. Ao mesmo tempo seguimos com a nossa articulação com a sociedade civil, participando da Aliança Social Continental e das mobilizações em torno do tema da globalização. Ajudamos a construir o Fórum Social Mundial, participando de sua organização e ampliando a presença sindical, com duas edições (2002 e 2003) do Fórum Sindical Mundial. Sempre envolvendo e contando com o apoio da CIOSL e da ORIT, que é nossa regional para América Latina. Hoje temos convicção do acerto dessa opção, que visa participar e influir nos espaços institucionais a partir da mobilização dos trabalhadores.
[ ] “O Brasil é réu assíduo da Comissão de Aplicação de Normas da Conferência Internacional do Trabalho, instância máxima da OIT”.
OS - Como o Sr. avalia a aplicação das convenções da OIT (Organização Internacional do Trabalho) pelas empresas transnacionais que atuam no Brasil? JO - O Brasil tem uma legislação trabalhista bastante detalhada, que incorpora muitas convenções da OIT, mas não existe uma tradição de uso das normas internacionais pelos advogados trabalhistas ou pelos juízes nos Tribunais do Trabalho. De um modo geral, na década de 90 constatamos um retrocesso em termos de direitos trabalhistas. A competição e o mercado foram assumidos como valores supremos pelos governos da América Latina, na esteira do Consenso de Washington. Claro que nas empresas maiores, como as multinacionais e as grandes empresas estatais, com sindicatos mais organizados e base mais conscientizada, houve maior resistência. Mas a pior face dessa questão é o aumento da informalidade, que está presente na cadeia produtiva de muitas multinacionais. Ainda está em curso uma ofensiva do empresariado pela flexibilização de direitos, que utiliza inclusive o aumento da informalidade como argumento.
OS - Que convenções da OIT são mais descumpridas e quais têm aplicação mais disseminada? JO - Todo ano a Conferência Internacional do Trabalho, instância máxima da OIT, constitui uma comissão tripartite para avaliar a aplicação das Normas Internacionais do Trabalho. A cobrança é para os países que ratificam as convenções e o Brasil é um dos países com mais convenções ratificadas. É um fato aparentemente positivo, que pode ser negativo se a ratificação não for acompanhada pelo cumprimento dos dispositivos das convenções. Nosso país é um réu assíduo na Comissão de Aplicação de Normas da Conferência. Freqüenta também o Comitê de Liberdade Sindical, que analisa as reclamações referentes às convenções nº 87 (Direito de Sindicalização) e nº 98 (Negociação Coletiva). A maior freqüência de reclamações dizem respeito a negociação coletiva (C98), discriminação no emprego (C111) e trabalho forçado (C29). Mesmo sem ratificar a de liberdade sindical (C87), também aparece o desrespeito à liberdade de organização sindical, em função da unicidade sindical e da inter-
ferência do judiciário trabalhista nas relações de trabalho. Esta convenção trata de um princípio fundamental da OIT, inscrito em sua Constituição, que deve ser respeitado, independente da ratificação. Para tratar de um aspecto positivo, podemos lembrar a Convenção 103, de proteção à maternidade, que exige o pagamento mínimo de 75% da remuneração da trabalhadora durante o período de licença. Este princípio serviu para impedir que nossa Previdência Social adotasse um teto para a licença maternidade.
entrevista - JOSÉ OLÍVIO MIRANDA OLIVEIRA
RÉU ASSÍDUO NA OIT”
[ ] “Ainda está em curso uma ofensiva do empresariado pela flexibilização de direitos, que utiliza o aumento da informalidade como argumento”.
OS - Na sua avaliação, quais são os pontos prioritários a modificar na CLT e que pontos não devem ser mexidos? O Sr. acha que o debate sobre o tema tem se dado de forma equilibrada? JO – Há quem diga que a
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Consolidação das Leis do Trabalho, vigente desde 1943, é velha e ultrapassada, com o objetivo de justificar a flexibilização dos direitos para baixo. Por outro lado, há quem pretenda considerar a CLT como conquista dos trabalhadores, que deve ser preservada a qualquer custo. Não é bem assim. O mundo muda e, com ele, as relações sociais e de trabalho. Para que os direitos fundamentais sejam assegurados na conjuntura atual, alguns pontos precisam ser modificados, enquanto outros devem ser preservados, já que a CLT é o resultado de um processo de acúmulo. Ficaria longo estabelecer aqui uma lista de pontos. Precisamos incorporar as convenções da OIT ratificadas pelo Brasil e os princípios fundamentais da OIT. Para isso devemos preservar muita coisa, mas é preciso modificar o artigo 8º da Constituição e desmontar o título V da CLT, eliminando os artigos que tratam da interferência do governo na organização sindical, totalmente revogada pela constituição de 1988. Para mim, o debate ainda não está acontecendo de uma forma equilibrada. Quem defende a flexibilização para baixo recebe todo apoio dos meios de comunicação e dos governos, enquanto a defesa dos interesses dos trabalhadores e dos direitos sociais é tratada como corporativismo ou como defesa de privilégios.
Mercosul. Mas para conseguirmos resultados práticos temos que investir em formação sindical sobre esses temas, cobrar sistematicamente a aplicação desses instrumentos e apostar no diálogo social como fórmula eficaz para solução de conflitos.
[ ]
OS - O Observatório Social tem constatado contradições entre os códigos de conduta divulgados por várias corporações e a situação vivida por seus empregados e fornecedores. Como governos, sindicatos e consumidores podem pressionar as empresas de maneira mais efetiva a pôr em prática os princípios de
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“Muitas multinacionais adotaram códigos de conduta após sofrerem campanhas internacionais de boicote a seus produtos e serviços”.
responsabilidade social? JO - Devemos elogiar aqueles empresários que se preocupam com a ética nos negócios e definem alguns compromissos básicos com a sociedade e com a preservação do meio ambiente, mas não podemos limitar a responsabilidade social a essa preocupação ou a uma atitude unilateral. Algumas empresas têm no código de conduta apenas um instrumento mercadológico de propaganda da marca. Na medida em que os interesses dos trabalhadores estão envolvidos, temos que explicitar nossas prioridades e estabelecer de forma negociada um acordo marco sobre o assunto. Essa é a proposta das Federações Sindicais Internacionais, que já obteve sucesso com muitas corporações transnacionais. Também apostamos em instrumentos mais abrangentes, como a Declaração de Princípios da OIT sobre Empresas Multinacionais e Política Social, as Diretrizes da OCDE, recentremente traduzidas pelo Observatório Social, a Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, e a Declaração Socio Laboral do
OS - O Sr. pode dar exemplos de pressões sociais bem sucedidas nesse sentido, no Brasil e em outros países? JO - A própria existência e disseminação de códigos de conduta, mesmo adotados de forma unilateral e buscando melhorar a imagem da empresa, já refletem uma pressão social anterior. Muitas companhias multinacionais adotaram códigos de conduta após sofrerem campanhas internacionais de boicote a seus produtos ou serviços. A proposta da ONU de estabelecer um Pacto Global é fruto de pressões do movimento social e sindical, em nivel global, exigindo atenção para os aspectos ambientais e sociais do desenvolvimento econômico. Aqui no Brasil, logramos bons resultados após o processo constituinte de 1988, precedido de ampla mobilização e pressão popular, incorporando as representações dos trabalhadores nas discussões do FGTS, FAT e Previdência, além da constituição de câmaras setoriais e do Conselho Nacional do Trabalho, durante a gestão de Itamar Franco. Os oito anos de governo FHC significaram um retrocesso, mas a constituição do Conselho Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, bem como do Fórum Nacional do Trabalho, indicam que a participação popular e o diálogo social constituem prioridades do novo governo.
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Primeiro o Afeganistão e agora o Iraque. Os bombardeios sobre estes dois países e sua ocupação militar são os resultados concretos da aplicação da Doutrina Bush, que permite às forças armadas dos EUA atacarem preventivamente qualquer país suspeito de ligação com o terrorismo ou de possuir capacidade de molestar a integridade ou interesses norte-americanos. A primeira ação contou com o apoio da ONU e a segunda não. De acordo com os termos da Doutrina, ela se realizou e o mundo se perguntou que razões justificariam solapar desta maneira a autoridade do Conselho de Segurança. A resposta se deve a interesses geopolíticos e econômicos. A ocupação do Iraque deu uma confortável posição geopolítica aos EUA no Oriente Médio e o controle da exploração do petróleo do segundo maior produtor mundial.
A GUERRA DO PETRÓLEO Não nos esqueçamos que Bush assumiu a presidência dos EUA num momento em que o mundo se aproximava de um processo recessivo, que se aprofundou após o 11 de setembro e que foi enfrentado com a injeção de enormes recursos públicos no setor privado. Mesmo assim a economia americana continuou mal, conforme demonstra a queda nos índices de produção industrial e o aumento da taxa de desemprego. É bom lembrar também que sua eleição foi profundamente questionada e que sua campanha esteve entre as mais caras da história, bancada principalmente pela indústria armamentista e de energia, não por acaso as mais beneficiadas pelas atuais políticas de Estado dos EUA. As altas autoridades norteamericanas recusam-se a falar sobre o custo da guerra contra o Iraque. Porém há estimativas, incluindo as despesas para a reconstrução do país, que situam os valores entre US$ 150 e 750
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bilhões (1). Não é sem razão que, uma vez superada na prática a divergência entre os Estados Unidos e França, Rússia e Alemanha sobre a legalidade ou não da guerra, agora se inicia a polêmica sobre quem coordenará a reconstrução do Iraque, com ameaças inclusive de levar o debate à OMC, uma vez que se trataria de uma disputa comercial sobre “compras governamentais”. No entanto, parece que assim como os EUA não se importaram com a opinião da União Européia sobre o ataque, tampouco vão considerar seriamente suas atuais reivindicações de participar da “reconstrução”. O primeiro contrato, para apagar o incêndio em alguns poços de petróleo, já teria sido concedido à empresa Halliburton, que era presidida por Richard Chenney, antes que se tornasse vice-presidente dos EUA nas últimas eleições presidenciais. Também se mencionam outras que seriam beneficiadas, como a Bechtel Group, que tem
como um dos seus diretores o ex-Secretário de Estado de “Bush – Pai”, George Shultz, a Flúor, que tem um diretor que foi diretor adjunto da CIA no governo Reagan, a Parsons e a Luis Berger. Estas cinco empresas são doadoras tradicionais do Partido Republicano. (2) Há outros empresários integrantes de comissões que atuam junto ao Pentágono e outros órgãos do governo norte-americano, como o “Grupo de Política de Defesa” e o “Centro pela Integridade Pública”. Eles são diretores de empresas que ganharam contratos para as forças armadas de mais de US$ 76 bilhões em 2001 e 2002. (3) O próprio general de reserva Jay Garner, nomeado governador do Iraque, foi presidente de uma empresa do setor da defesa, SY Coleman, que teve contratos para instalar sistemas de mísseis em Israel. Porém a grande questão é sobre o futuro dos contratos de exploração de petróleo. Após o
artigos
término da Guerra do Golfo em 1991, a produção iraquiana foi reduzida de 3,5 milhões de barris diários de óleo cru para algumas centenas de milhares, gerando recursos administrados pela ONU e que somente podiam ser utilizados para comprar comida. A gestão da produção petroleira no Iraque era feita pela Companhia Nacional de Petróleo Iraquiano (INOC), que subcontratava a extração para empresas estrangeiras, porém sem nenhuma participação de empresas norte-americanas ou britânicas. Seguramente agora as gigantes Exxon-Mobil e ChevronTexaco dos EUA e a British Petroleum irão dividir o espólio, inclusive com a possibilidade de privatização da própria INOC. Entretanto, retomar o nível histórico de produção iraquiana poderá levar até três anos. Custará ao redor de US$ 8 milhões para recuperar a indústria petroleira e outros US$ 20 bilhões para reconstruir o sistema de transmissão de energia elétrica, ne-
cessário para extrair e bombear o petróleo. Dificilmente os recursos aplicados para a reconstrução do Iraque irão além da recuperação da infra-estrutura petrolífera e do aparato de estado necessário para governar o país. Habitação, saneamento básico, transporte público e outros serviços dependerão da solidariedade e da própria capacidade do povo iraquiano de recuperá-los. Os EUA tornarse-ão autônomos em relação ao petróleo e, ao controlar o volume da produção iraquiana, controlarão inclusive o preço no mercado mundial, o que lhes dará ainda mais influência sobre os países exportadores e principalmente sobre a União Européia, cujos países são muito dependentes do petróleo do Oriente Médio. De certa maneira já fizeram isto ao longo dos últimos doze anos. Quando a guerra do golfo se iniciou, um barril de petróleo valia US$ 15,00, elevandose em seguida a US$ 42,00 e depois caindo para um valor ao redor de US$ 24,00. Neste intervalo de alta, gerou-se um excedente de US$ 60 bilhões, repartidos entre Arábia Saudita e Kuwait pela sua contribuição à guerra e as “Sete Irmãs” do petróleo, sendo que as norte-americanas faturaram US$ 21 bilhões. (4) Agora foi diferente. O valor do barril subiu antes do início da guerra para US$ 40,00, caindo depois, o que significa que nós consumidores já pagamos o preço da guerra antecipadamente e que esta guerra foi um bom negócio somente para alguns poucos.
Kjeld Jakobsen é presidente do Observatório Social
(1)Sadowsky, Yahua. Las causas de la guerra. Le monde diplomatique, Paris, abril – 2003 (2)Morgan, Oliver. Bush’s Repubican guard. The Onserver, Londres, 16 de março de 2003 (3)Herbert, Bob. Em cena, o complexo militar-industrial. São Paulo, O Estado de São Paulo, 11 de abril de 2003. (4)Almodóvar, Antonio Rodriguez. Los demás son cuentos. El Pais, 20 de março de 2003.
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ALMANAQUE
Le nouvel econnomiste cita o Observatório Social
ALMA NA QUE Campanha do café na Holanda
A campanha em defesa da melhoria das condições de trabalho e vida nos cafezais conta com um aliado importante na Europa: a Coalizão Holandesa do Café. Dez organizações de comércio justo, de desenvolvimento, eclesiásticas e sindicais integram essa aliança. Em abril elas iniciaram uma campanha focada no maior torrefador holandês de café, a Sara Lee/Dowe Egberts, que detém mais de 60% do mercado naquele país. Ao alimentar o debate e fazer pressão pública, a Coalizão espera discutir responsabilidade social com a empresa e assegurar respeito aos direitos trabalhistas estabelecidos nas convenções internacionais.
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Em sua edição de março de 2003, a revista francesa Le nouvel econnomiste traz uma reportagem de cinco páginas sobre responsabilidade social na França e no Brasil. O Observatório Social é citado como “uma das raras organizações no Brasil a dispor de informações que vão além de declarações de interesses”. O texto afirma que os trabalhos do Observatório se comparam aos das melhores agências que pesquisam temas sociais e ambientais na Europa. “Com uma diferença importante: a organização, financiada por sindicatos internacionais, não vende suas informações aos investidores financeiros. Ela beneficia seus membros, representantes dos assalariados, com o objetivo de subsidiar as negociações com as direções das empresas”. A reportagem cita entre os trabalhos do Observatório que provocaram efeitos inesperados o estudo sobre a Nokia na Zona Franca de Manaus, que levou a uma aproximação dos sindicatos finlandeses com seus homólogos brasileiros e ao projeto de um comitê sindical global para o grupo. Refere-se ao estudo de problemáticas setoriais, como o da cadeia produtiva do alumínio e o das condições de trabalho dos cafeicultores. Também cita o estudo sobre a Nestlé, que apontou a defasagem entre os compromissos públicos da empresa e a realidade concreta; e ainda o estudo que aponta os persistentes problemas de segurança na Basf.
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Observatório participa com sucesso do Fórum Social Mundial
“Uma usina de idéias”, é o resumo de Cândido Grzybowski (IBASE), membro do Comitê Organizador, para definir o que foi o 3º Fórum Social Mundial. Realizado entre 23 e 27 de janeiro, em Porto Alegre, o evento somou mais de 1.200 atividades, 20.763 delegados credenciados, representando 5.717 organizações de 130 países. O Observatório Social participou através de quatro oficinas e três seminários; um estande em parceria com a Oxfam e outro instalado no Portal da CUT; e exposição fotográfica, que permaneceu aberta para visitação durante o período. O fórum de 2004 está marcado para acontecer na Índia. A idéia é reunir os povos do mundo em diferentes lugares.
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ALMANAQUE
AL NA QU Diretrizes internacionais: modo de usar
A Secretaria de Relações Internacionais da CUT / Projeto CUT/FNV, a FES/ILDES (Fundação Friedrich Ebert), a Rede Global e o Observatório Social realizaram, nos dias 26 e 27 de maio, o seminário As Diretrizes para empresas multinacionais da OCDE - ‘Como utilizar o Guia de Usuário da TUAC’. O evento contou com a participação da TUAC, que é o Comitê Consultivo Sindical para a OCDE. O objetivo é criar familiaridade dos dirigentes sindicais com as Diretrizes e seu valor, além de debater a melhor forma de implementá-las e utilizá-las no Brasil para promoção dos direitos no trabalho. A OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) estabeleceu este conjunto de indicações para serem dirigidas pelos governos às empresas multinacionais. Elas estabelecem princípios e padrões a serem adotados voluntariamente pelas corporações que buscarem ser socialmente responsáveis. Reconhecidas internacionalmente, as Diretrizes também são um instrumento de negociação do movimento sindical.
MA Discriminação de Raça
Termo de Referência apresentado em oficina
Endereço e telefone novos
A sede nacional do Observatório Social mudou. Seu novo endereço é: Avenida Mauro Ramos, 1624, sala 202, Centro, Florianópolis, SC – CEP 88020-302. E o número do telefone e fax é (48) 3028-4400.
Site sobre saúde e segurança O DIESAT - Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho - lançou seu novo site no dia 29 de abril: http://www.diesat.org.br. A entidade, sem fins lucrativos, foi criada para assessorar os trabalhadores e o movimento sindical nas questões relativas à saúde coletiva, saúde do trabalhador, condições e ambientes de trabalho, legislação em saúde e segurança do trabalhador e meio ambiente. O DIESAT vem acompanhando de perto todas as ocorrências que, de alguma maneira, podem afetar a saúde da classe trabalhadora, desde o uso indiscriminado de produtos químicos, falta de equipamentos de segurança, até o surgimento de novas doenças, decorrentes da reestruturação das relações de trabalho.
Identificar, através dos indicadores, se existe discriminação no trabalho e apontar se há políticas de promoção da igualdade de tratamento e oportunidades para homens e mulheres, brancos e negros, é um dos objetivos dos estudos realizados nas multinacionais. Por isso, a Convenção 111 da OIT é o ponto central do Termo de Referência para a observação do tema Raça no Observatório Social. O termo foi desenvolvido pela equipe do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades) e apresentado para a equipe técnica do Observatório durante oficina realizada em São Paulo no dia 20 de maio. Ali, pesquisadores e técnicos receberam informações sobre conceitos de discriminação, sobre o histórico da relação entre raça e trabalho no Brasil e debateram as centralidades e critérios mais indicados para observação das empresas em relação às discriminações de gênero e raça. O evento foi organizado por Maria Aparecida Bento, Édio Santos e Mariana Lisboa, do
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CEERT, com a colaboração de Mércia Silva e supervisão de Clemente Ganz Lúcio, do Observatório Social. Carolyn Kazdin e Paulo Fontes representaram o Centro de Solidariedade da AFLCIO (entidade norte-americana que coopera com o Observatório Social) e Mônica Custódio representou a Comissão Nacional Anti-Racismo da CUT. O Termo de Referência será revisado, a partir do debate realizado na oficina, e fará parte do conjunto de termos que estão sendo desenvolvidos pelo Observatório Social. Liberdade sindical, negociação coletiva, trabalho forçado, trabalho infantil, discriminação de gênero e raça, segurança e saúde do trabalho e meio ambiente são os temas estudados. Os termos de referência estão sendo desenvolvidos por consultores e pesquisadores para consolidar a metodologia dos estudos realizados. Em 21 e 22 de outubro do ano passado foram debatidas as propostas de referência para Segurança e Saúde do Trabalho e Trabalho Infantil.
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Beba Kola-Marte Assim que a Coca-Cola começou a chegar por aqui, achavam que tinha sabor de remédio. Pouca gente gostava. Era muito diferente da gasosa de limão e laranja. Essas que todo mundo já conhecia. Coca-Cola quente nem pensar. Não dá pra dizer ao certo quem disse isso. Muita gente já falou. Eu, que nasci gostando, perguntei pra minha mãe, certifiquei com o meu pai e confirmei com uma tia. É isso mesmo, foi duro naquela época engolir a tal bebida. Mas hoje um litro na mesa é pouco. Traga logo um litrão, por favor. Mas não é exatamente sobre a Coca que desejo falar. Pediram que eu contasse uma história que um dia talvez vire filme. Vou lhe contar sobre a Kola-Marte.
tipos de refrigerantes, na época chamados de gasosa. Faziam também um aperitivo fino, um tipo de cachaça envelhecida no carvalho. Mas a bebida preferida na região da Grande Florianópolis era a Kola-Marte fabricada com essência de cola importada da Suíça. Numa pesquisa de opinião pública realizada em 1952 e publicada no Jornal Diário da Tarde de Florianópolis, seu Vidal Mendes, o irmão mais velho, aparece em primeiro lugar como o empresário que venceu pelo próprio esforço. E a KolaMarte é a grande vencedora na categoria refrigerante de maior aceitação. Tudo parecia bem, até o dia em que seu Vidal recebeu uma carta vinda diretamente dos Estados Unidos da América. A carta era da gigante Coca-Cola. Seu conteúdo exigia que a Kola-Marte deixasse de ser produzida imediatamente, caso contrário a multinacional entraria com um processo. O que a carta alegava? Dizia que o nome cola, seja lá com que grafia fosse, não poderia ser utilizado por nenhuma outra empresa no mundo. Justo naquele instante a Kola-Marte movimentava toda a comunidade com um concurso de tampinhas. E os carnavalescos aguardavam ansiosos o caminhão de bebidas, que trazia no pará-choque a frase: Beba Kola-Marte, se transformar em carro alegórico nos desfiles da capital. Depois da carta o concurso ficou pela metade, o carnaval da Ilha perdeu o caminhão e os irmãos decidiram não mais fabricar o produto. Pensaram que poderiam continuar a sustentar suas famílias com as ga-
[ ] Não conhece a Kola-Marte? Também não conhecia.
Cristiane Mateus é jornalista e roteirista
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Na década de 40, numa cidade bem pequena de Santa Catarina chamada Pássaro Grande pelos povos indígenas e Biguaçu pelos demais, dois irmãos pensavam sobre o que fazer para sustentar suas famílias. Acabaram decidindo pelo ramo das bebidas e construíram sem demora a Fábrica de Bebidas Irmãos Mendes. Os dois homens começaram então a produção de diversos
era o único produto que sabia vender. Muitas pessoas ainda lembram do dia em que a praça foi tomada de bicicletas. Um representante trouxe a novidade e fez negócio com seu Vidal, que fez negócio fiado com toda a gente da cidade que naquela tarde quisesse andar de bicicleta. Mas dessa história, por enquanto, não conto mais nada. Só queria dizer para não imaginar nenhuma grande investigação, porque não sou detetive. O crime, se alguém sabe qual foi, já prescreveu. Depois de tudo, seu Vidal morreu de velho na casa da filha. Longe da cidade onde gostava de viver, não quis mais ver estampado no sorriso de tantos amigos: você fracassou. Porque com o passar dos anos o negócio com as bebidas e todos os outros foram desaparecendo. O poço de onde tirava a água ainda resiste, mas a fábrica já virou outra coisa. Se o filme for ruim, perdoa. Mas pelo menos você vai saber: um dia, por aqui, muita gente sentou num banco de praça embaixo de uma figueira pra namorar e nem ligou para o anúncio que dizia: Beba Kola-Marte. E daí?
CULTURA
sosas coloridas, a cachaça e a groselha que começava a ter boa aceitação. Era uma perda, claro que era. Mas fazer o quê? Muito mais tarde uma das filhas do casal, que hoje é juíza aposentada, ficou sabendo pela boca do Seu Damiani, que era o responsável pela distribuição da Coca-Cola na região, da existência do Mister Kern, um "inglês vindo da Inglaterra". O Mister Kern era o representante oficial da Coca-Cola no estado. Era um senhor já de idade avançada que costumava entrar em tudo que é bar para ver de perto como as pessoas pediam, bebiam e o que achavam do refrigerante. Foi numa dessas visitas que espantosamente deparou-se com uma garrafa desconhecida de rótulo nas cores amarela e vermelha onde se lia: Kola-Marte. Imediatamente ligou para o seu Damiani e lhe falou muito furioso: "Por que você não me disse nada? Por que não me mandou uma garrafa? Todo produto que é similar não deve permanecer no mercado". Podia até fazer um parêntese enorme e contar todas as aventuras do comerciante, porque a bebida não
A história da Kola-Marte obteve o 1º lugar do Prêmio Fundação Catarinense de Cultura/Cinemateca Catarinense para Pesquisa e Desenvolvimento de Roteiro Cinematográfico. O roteiro que vem sendo desenvolvido por Cristiane Mateus dará origem a um filme de curtametragem dirigido por Claudia Aguiyrre, com produção da Ypslon Produções D'artecultura . A idéia original é de João Luiz Mateus.
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