ThyssenKrupp - de Düsseldorf a Guaíba

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ThyssenKrupp De Düsseldorf a Guaíba

DGB BILDUNGSWERK


Índice

Observatório Social

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Como se comportam os grupos multinacionais no Brasil?

“O mais importante é a qualidade”

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Richard Slosarek, trabalhador na fundição em Wuppertal

“Hoje só fico distribuindo trabalho”

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Paulo Daljares dos Santos, Chefe de Departamento na ThyssenKrupp Elevadores em Guaíba

Da fabricação de talheres ao conglomerado

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ThyssenKrupp - 200 anos de história da indústria alemã

Um grupo global

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A ThyssenKrupp no Brasil

“Já não é mais tão fácil jogar os trabalhadores contra os colegas de outras unidades”

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Entrevista com Gerold Vogel, da Comissão Européia de Trabalhadores

Novas contratações no lugar do quarto turno

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Achim Helsper, presidente da comissão de trabalhadores na unidade de fundição de injeção sob pressão Fritz Völkel

“Mais perto dos companheiros”

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Anna Kapetanaki, delegada sindical da IG Metall

“Não basta fazer barulho”

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Bernd Lange, secretário da IG Metall em Wuppertal

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“Sou leal à empresa”

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Ralph Labonte: de sindicalista a ’Diretor de Trabalho’

Horas extras até a exaustão

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O trabalho sindical na fundição em Barra do Piraí

Pragmatismo no lugar de palavras de ordem

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Os sindicalistas brasileiros efetuaram uma correção de rota

O executivo dos trabalhadores

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Thomas Schlenz, Presidente da Comissão de Trabalhadores do Grupo ThyssenKrupp

O ’balcão central de atendimento’ dos representantes dos trabalhadores

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Peter Scherrer, responsável pelo acompanhamento do grupo ThyssenKrupp no Sindicato dos Metalúrgicos (IG Metall)

“Na Alemanha ninguém precisa passar fome”

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Elisandro Marques, sindicalista

“Eles ficaram mais próximos de nós”

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Annette Wille, integrante da comissão de trabalhadores

“Um passo importante”

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Sindicalistas criam uma rede para as unidades sediadas no Brasil

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Observatório Social E Como se comportam os grupos multinacionais no Brasil?

O Brasil é um campo de atuação preferencial para os grupos multinacionais. 1.200 filiais de empresas alemãs atuam somente nesse país. A Thyssen Krupp também se faz presente no Brasil. Uma das suas várias sucursais situase em Campo Limpo, nas imediações da capital paulista, e produz virabrequins para a indústria automobilística. A ThyssenKrupp Fundições mantém duas unidades, uma em Minas Gerais, outra no Rio de Janeiro. E a ThyssenKrupp Elevadores tem sua sede e unidade de produção no Brasil Meridional, no município de Guaíba, cobrindo o território nacional com uma rede de trabalhadores especializados na prestação de serviços. Como se comporta a ThyssenKrupp no Brasil? Os padrões sociais nas sucursais brasileiras são iguais aos praticados na Alemanha? Qual é o relacionamento entre a ThyssenKrupp e outras empresas multinacionais atuantes no Brasil e os trabalhadores brasileiros e as suas representações sindicais? Eis as perguntas centrais de uma pesquisa realizada pelo Observatório Social Europa.

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O Observatório Social Europa é um projeto de cooperação mantido por instituições européias e brasileiras. Nasceu em 2001 como organização irmã do Observatório Social no Brasil e está sediado em Amsterdã. No Brasil, as suas entida-

des mantenedoras são a Central Única de Trabalhadores (CUT) e as confederações dos sindicatos dos metalúrgicos e químicos (CNM e CNQ). Na Europa, a Confederação Sindical dos Países Baixos FNV e o seu maior sindicato afiliado, o FNV Bondgenoten, bem como a IG Metall (Sindicato dos Metalúrgicos da Alemanha), a IG Bergbau, Chemie, Energie (Sindicato dos Mineiros, Químicos e Trabalhadores do Setor Energético) e o DGB Bildungswerk (Instituição de Formação Sindical da Confederação dos Sindicatos da Alemanha), na Alemanha. Dialogando com a direção das empresas, os trabalhadores e sindicatos no Brasil e na Europa, o Observatório Social Europa quer prover as relações trabalhistas de um fundamento construtivo, de resultados, para obter melhorias concretas para os trabalhadores nas empresas envolvidas. Isso pressupõe que o respeito e reconhecimento recíprocos entre trabalhadores, seus representantes e a direção das empresas européias atuantes no Brasil se tornem elementos naturais na cultura das empresas e das representações dos trabalhadores. Em cooperação com o Observatório Social no Brasil foram pesquisadas as unidades de produção das empresas alemãs ThyssenKrupp, Bayer e Bosch, bem como as filiais das empresas holandesas Akzo Nobel, Philips e Unilever no Brasil. O nosso interesse concentrou-se aqui na observância das normas fundamentais de trabalho (core labour standards) da Organização Internacional do Trabalho (OIT):


Europa no local de trabalho. • liberdade de organização sindical e negociações de contratos coletivos de trabalho • proibição da discriminação de raça e gênero • proibição do trabalho infantil • proibição do trabalho escravo • segurança e saúde no local de trabalho Acordou-se com a direção das empresas que os problemas e os déficits constatados nas pesquisas seriam discutidos com os sindicados e sistematizados num catálogo de medidas para a melhoria da situação. No caso da ThyssenKrupp, isso diz respeito especialmente à fundição em Barra do Piraí (RJ), onde o Observatório Social constatou índices mais elevados de acidentes de trabalho. Entrementes a direção da empresa reagiu e elaborou um programa de investimentos, além de uma nova concepção de segurança

O Observatório Social Europa fomenta contatos entre os trabalhadores das diversas unidades brasileiras das empresas e seus colegas europeus. Promove para tal fim seminários internacionais e oferece programas internacionais de intercâmbio para membros de comissões de trabalhadores e sindicalistas no Brasil e na Europa. Apoiamos a formação de redes nas unidades e entre elas, para promover o intercâmbio de informações sobre a empresa e a atividade sindical e acordar atividades conjuntas, evitando assim que os trabalhadores e sindicatos sejam jogados uns contra os outros. Um passo importante nessa direção é a fundação de uma Comissão de Coordenação Brasileira dos sindicatos atuantes na ThyssenKrupp, ocorrida em agosto de 2004. Com a presente publicação, editada também em português, queremos apresentar um retrato do Grupo Thyssen Krupp do ponto de vista dos trabalhadores na Alemanha e no Brasil. Queremos contribuir assim para uma melhor compreensão da situação dos assalariados da ThyssenKrupp nos dois países. Esse é o pré-requisito do desenvolvimento futuro de uma plataforma para ações conjuntas.

Karen Brouwer Coordenadora do Observatório Social Europa

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“O mais importante Richard Slosarek é trabalhador na fundição em Wuppertal

Para Richard Slosarek o turno da manhã sempre começa as 5:50 hs, dez minutos antes do início do seu turno, nos quais ele conversa com os colegas do turno da noite sobre como as máquinas operaram durante a noite. Nessa manhã fria de fevereiro surgem problemas. Richard precisa desligar as máquinas. Algumas peças de alumínio estão com falhas. As chapas cor de prata, pelas quais passa um labirinto de calhas estreitas, são peças para engrenagens automáticas para a Mercedes. À primeira vista elas não se distinguem das peças sem falhas, empilhadas de forma ordeira num carro fechado com grades. Mas Richard conhece os seus produtos. Ele sabe onde deve olhar, onde as falhas aparecem com maior freqüência. O trabalhador de 41 anos aponta para um buraco no lado da peça da engrenagem: “Esse entalhe não deveria estar aqui.“ Ele não precisa procurar muito tempo até encontrar a causa. Um pedaço de alumínio ficou colado em uma peça metálica da prensa. Uma vez puxado para fora da peça prensada, ele deixa um risco no alumínio ainda quente. Com ajuda de uma lima, Richard Slosarek elimina o alumínio e a máquina volta a funcionar. Imediatamente um ruído ensurdecedor enche o pavilhão sombrio da Unidade de Fundição de Injeção sob Pressão Fritz Völkel em Wuppertal, que pertence à empresa ThyssenKrupp Fahrzeugguss GmbH.

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Mesmo durante o dia o pavilhão não fica realmente claro. Richard Slosarek está postado no fim da máquina. Toma cada peça da engrenagem na mão, viraa e olha-a de todos os lados. Regularmente ele retira uma peça, dirige-se a uma outra mesa de trabalho e mede a peça. “O mais importante é a qualidade“, diz o torneiro mecânico. “Se uma peça apresenta uma falha, o cliente devolve o lote inteiro.“

Uma tonelada por turno Depois de pouco tempo as mãos de Richard estão pretas de tanto girar e virar as peças das engrenagens. Durante o dia, o macacão também muda de cor, passa do azul ao preto cinza. Apesar disso, Richard não quer fazer outra coisa. Gosta do seu trabalho. Quando os clientes ficam satisfeitos, ele também fica satisfeito. Há 14 anos Richard Slosarek trabalha na Unidade de Fundição de Injeção sob Pressão em Wuppertal. Há 14 anos ele veio com a esposa grávida da Polônia para a Alemanha. A sua entrevista na Thyssen foi a primeira e única da sua vida. Quando lhe perguntaram se pretendia trabalhar como torneiro mecânico ou fundidor, ele respondeu apenas: “Tanto faz, importa ter um emprego.“ Dois dias depois começou a trabalhar na fundição. Nos últimos catorze anos seu local de trabalho passou por transformações. No início, Richard precisava retirar cada peça manualmente da máquina de fundição de injeção sob pressão, depositá-la para que esfriasse e colocá-la em seguida na prensa. Depositava e recolhia 200 peças por dia: no fim de cada turno ele tinha movimentado uma tonelada. Hoje esse trabalho é feito por um robô. Em termos de esforço físico, o trabalho de Richard ficou mais leve, mas ele ainda cansa, pois as máquinas com controle numérico precisam ser supervisionadas. O monitor indica constantemente a velocidade, temperatura, pressão e o tempo do ciclo. Richard Slosarek deve ter presentes todos os índices de tolerância e não pode perder de vista o monitor. Ao primeiro desvio de um índice a máquina precisa ser parada. “Importa ter um emprego“: Richard Slosarek, operário na fundição


é a qualidade“

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Ganhar um milhão na loteria Quando Richard chega em casa, não pode simplesmente esticar as pernas. “Tenho dois filhos“, diz ele. Os dois meninos, Andreas, com 14 anos, e Roland, com 5 anos de idade, já es-

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peram pelo pai. A família vive em uma residência alugada de quatro cômodos em Wuppertal, no bairro de Langerfeld. No verão Richard quase sempre faz um passeio com os filhos, durante a tarde. Às vezes eles prendem as bicicletas no carro da família, um Ford Mondeo de seis anos, e visitam um pequeno lago na proximidade. Em fins de agosto, no início da estação dos cogumelos, o pai vai com os filhos nos fins de semana à


região em torno de Münster, distante mais de 100 km, para colher cogumelos. “Quase sempre rende um jantar“, diz ele. Durante o inverno o pai olha às vezes o mais novo jogo de computador de Andreas, que se ufana de ter seu próprio micro. Os dois meninos possuem também um videogame, o caçula já se interessa pelos jogos. Roland gosta de fazer perguntas intermináveis ao pai. “Ele quer saber tudo sobre o meu trabalho, para onde vão as peças, o que a Mercedes faz com elas.“ Mas Richard Slosarek não deseja que seus filhos trabalhem na fundição. Uma profissão que exigisse gravata certamente seria melhor, diz ele e faz um sinal no pescoço, em meio a risadas. O pai de família não tem grandes desejos. “Saúde, sobretudo saúde“. Ele ri e acrescenta: “Quem sabe, ganhar um

“Se uma peça apresenta uma falha, o cliente devolve o lote inteiro“: Richard Slosarek com uma peça da engrenagem

milhão na loteria. Mas mesmo então eu continuaria trabalhando.“ Uma vez por ano a família viaja nas férias. Já foi duas vezes à Itália e uma vez à Holanda. Nesse ano a família Slosarek resolveu visitar a terra natal: irá à Polônia, mais especificamente à Masúria, por duas semanas. Mesmo na profissão, Slosarek prefere ser modesto. Quer fazer um trabalho bem feito. O pai de família não se sente atraído por outro emprego, com maior responsabilidade. Há cinco anos a empresa lhe propôs trabalhar como preparador. Nesse caso ele teria sido responsável por catorze máquinas e sete colegas. Richard não aceitou o convite. “Teria tido menos tempo para a minha família.“ Também não se interessa pela organização dos trabalhadores. Richard prefere o trabalho na máquina. Aqui ele pode entregar um trabalho de qualidade, para que o cliente fique satisfeito.

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“Hoje só fico distribu

Paulo Daljares dos Santos é chefe de departamento na Thys

“Trabalho há 35 Jahren na empresa, desde janeiro de 1969. Primeiro a fábrica foi vendida a japoneses, depois aos alemães. Quando comecei a trabalhar, o meu departamento era muito ’insalubre’, havia muitas máquinas. Mas depois, quando estudei, passei para setores melhores, na produção, coordenação e programação das peças. De 1970 a 1974 freqüentei um curso técnico. Durante o dia eu trabalhava, de noite eu estudava. Chegava em casa à meia-noite, à uma hora da madrugada, e isso sempre de segunda a sexta-feira. Foi bom para mim, fui subindo aos poucos. Afinal de contas, comecei com o grau primário completo, comecei varrendo o chão. Depois me ofereceram um curso de datilografia, mas nunca me senti atraído pela administração. Desde então fui formado em várias áreas: em Mecânica, Desenho Técnico, Matemática. Consegui terminar a escola com ajuda da empresa. Desde 1980 sou chefe de departamento. Hoje conheço tudo na empresa, por isso eles não querem que eu saia. Só meu chefe está mais tempo do que eu, há 36 anos. Ele sabe fazer tudo. Tenho ainda um colega, que sempre está viajando para montar elevadores, há 40 anos. Ele responde pela compra de máquinas. A fase mais estressante, na qual a gente precisa pegar no pesado, já passou para mim. Agora digo apenas: ’Faz isso, faz aquilo’. Distribuo o trabalho, dou dicas, afinal de contas não quero levar o meu conhecimento para o túmulo, mas passálo adiante. Há 20 anos estou filiado ao sindicato. Nunca tive problemas por causa disso, mesmo quando o sindicato era mais radical do que hoje.“

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“Tudo está informatizado“ “Trabalhamos 44 horas por semana. Em outra empresa eu poderia ter ganho mais, mas nunca quis sair daqui. A viagem a Porto Alegre me teria consumido cada dia duas a três horas. Aqui tudo é prático, levo dez, quinze minutos de ônibus da minha casa até a fábrica. Tomo o ônibus às 6:45 hs da manhã, chego às 7:00 hs, tomo um café. Oficialmente, o trabalho começa às 7:25 hs, vai até o meio-dia, para continuar das 13:00 até as 17:23 hs. Sou responsável pela definição dos processos de produção. Recebemos projetos, eu tenho a minha equipe. Tudo está informatizado, precisamos ver como isso funciona na prática, pensar nos parafusos, em tudo o que é necessário para um elevador. Pensamos no número de peças necessárias, no material do qual elas devem ser feitas, onde elas são compradas, no revestimento de aço da cabine ou nos cabos, nos contrapesos, e tudo isso de olho na redução dos custos. Somos dezesseis pessoas na equipe, da qual também faz parte uma mulher. Um elevador simples instalado custa R$ 30.000,00. Mas as exigências são mais elevadas nos produtos para a exportação. Incluímos todos os extras, produzimos cerca de 300 elevadores por mês. Já recebo uma aposentadoria, mas ainda estou trabalhando. Quem trabalha em uma atividade ‚insalubre’ precisa parar ao atingir a idade da aposentadoria. Só se pode trabalhar por um certo período numa atividade desse tipo. Mas quem muda de área pode continuar trabalhando.


uindo trabalho“

ssenKrupp Elevadores em Guaíba

“Fui subindo aos poucos“: Paulo Daljares dos Santos, chefe de departamento

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Eu poderia parar a qualquer momento, mas o dinheiro não é suficiente. Ganho R$ 2.500,00 por mês e a aposentadoria, que ganho desde 1998, não chega nem à metade desse valor. Tenho um filho desempregado, que vive de bicos. Pago-lhe um curso de publicidade. Além disso tenho ainda três netos, por isso o dinheiro não basta. Seria suficiente para mim e minha senhora, mas não para toda a família... Cada ano eu tiro férias durante 30 dias. Viajamos então à nossa casinha de veraneio e fim de semana em Camaquã, a cerca de 150 km daqui, à beira da Lagoa dos Patos. Jogamos futebol, churrasqueamos e tomamos chimarrão. Outros passatempos preferidos são pesca e andar de bicicleta. Em Camaquã consigo descansar com a família.“

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“Quando comecei a trabalhar, o meu departamento era muito ‚insalubre’“: A fábrica de elevadores em Guaíba


“Trabalhamos 44 horas por semana“: A fábrica de elevadores em Guaíba

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Da fabricação de talh ThyssenKrupp - 200 anos de história da indústria alemã

A industrialização na Alemanha e a ascensão econômica da Região do Ruhr estão estreitamente ligadas aos nomes Thyssen e Krupp. Em 1811 Friedrich Krupp funda a sua fábrica de aço fundido em Essen. 60 anos depois August Thyssen funda em Mühlheim an der Ruhr a sua primeira fábrica de fitas de ferro e aço gusa. À semelhança de muitos pioneiros do seu tempo, Friedrich Krupp começa sem muita sorte nos negócios. Ajudado por apenas sete trabalhadores, produz sobretudo talheres e panelas para cozinhar. Ao morrer em 1826, deixa ao filho Alfred uma empresa endividada. Alfred Krupp continua os negócios com ajuda da mãe. Graças a processos modernos de produção e algumas inovações técnicas, consegue pôr a empresa na rota do progresso. A vitória no mercado vem com a invenção de um aro de roda para rodas de trens, sem costura e resistente a rupturas. A empresa aumenta sua gama de produtos, fabricando peças para as indústrias ferroviária e naval. Em algumas décadas Alfred Krupp expande a empresa do pai, transformando-a num grupo internacional. Em 1887 a Krupp emprega 20.000 trabalhadores. Como muitos empresários patriarcais da sua época, Krupp também está imbuído do senso de responsabilidade social diante dos seus assalariados. Constrói habitações para os trabalhadores e cria padrões de serviços sociais, exemplares na época. Assim os “kruppianos“ recebem uma ajuda na aposentadoria e um auxílio-doença. Mas o empresário não age sem interesse próprio. Por um lado, quer vincular os trabalhadores e preservar o seu conhecimento e as suas habilidades para a empresa. Por outro,

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Desde cedo uma empresa internacional: a fábrica de Alfred Krupp em 1861


heres ao conglomerado

Bem-sucedido desde o comeรงo: August Thyssen por volta de 1917

Responsabilidade social pelos trabalhadores: o patriarca Alfred Krupp

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Pedidos lucrativos no setor de armamentos

De Rheinhausen até a cúpula do grupo: Gerhard Cromme, presidente do Conselho Fiscal da ThyssenKrupp quer barrar a influência dos sindicatos e dos partidos dos trabalhadores na sua empresa. Seus assalariados recebem alguns benefícios adicionais em matéria de assistência social, mas são obrigados a conviver com as condições insalubres de trabalho nos laminadores.

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Na década de 1860 Krupp começa a produzir armas. O governo alemão se torna o seu cliente mais importante e Krupp passa a ser o mais importante fornecedor de armas. Até o início da 1ª Guerra Mundial, a Krupp se transforma na terceira maior empresa alemã, posicionada logo depois dos correios e da rede ferroviária.

August Thyssen se dá bem nos negócios desde o começo. A partir de 1871, ano de fundação do Império Alemão, a Alemanha experimenta um forte surto de crescimento econômico. Muitos empresários se beneficiam das oportunidades dos assim chamados ’anos de fundação’. Um deles é August Thyssen, que já no primeiro ano vende 3.000 toneladas de fita de ferro, instalando quatro linhas de laminadores de fita de ferro em apenas três anos. Em 1877 seu irmão ingressa como sócio na empresa. Nos anos seguintes os dois irmãos ampliam a fábrica de Mühlheim, acrescentandolhe uma aciaria, uma usina de laminados em forma de tubos e chapas com uma unidade de zincagem, uma fundição e um departamento de construção de máquinas. Juntamente eles criam um grupo que integra o setor siderúrgico e carbonífero, cobrindo o espectro da extração do carvão até a construção de máquinas, passando pela produção de aço e culminando na comercialização. No início do séc. XX Thyssen se expande além da Região do Ruhr, instalando usinas siderúrgicas na Lorena e na Normandia. Entrementes, a Thyssen ocupa ao lado da Krupp uma posição de liderança na indústria siderúrgica da Alemanha Ocidental. O faturamento cai no início da 1ª Guerra Mundial, mas os pedidos de armamentos, como a produção de cápsulas para projéteis e de sistemas ferroviários, oxigenam novamente os negócios. O fim da guerra acarreta modificações profundas para os dois grupos. A Thyssen perde todas as suas participações no exterior, mas continua controlando na Alemanha uma empresa em condições de funcionamento. Na Krupp,


a passagem da produção de armamentos para a construção de locomotivas e caminhões e as perdas resultantes das operações de desmonte impostas pelos vencedores provocam uma crise séria em meados dos anos 20. A empresa implementa medidas de saneamento, recupera-se e supera também a crise econômica mundial depois de 1929.

Arranjo com os nazistas A tomada do poder pelos nazistas melhora a situação dos dois gigantes do aço na Região do Ruhr. Sobretudo Krupp se arranja com os novos donos do poder, entra na produção de armamentos e emprega mão-de-obra forçada nas suas unidades de produção. Dezenas de milhares de pessoas são obrigadas a trabalhar aqui em condições sub-humanas. Em 1937 Hitler nomeia Krupp para o cargo de ’comandante da economia de defesa’ [Wehrwirtschaftsführer]. Na Thyssen, o filho do fundador, Fritz Thyssen, assume os negócios. De início, ele também apóia os nazistas e se filia ao partido. Nos anos seguintes, porém, ele se distancia dos nazistas, emigrando em 1939 para a Suiça. Seu patrimônio é confiscado. Preso em 1940, Fritz Thyssen é encarcerado. Depois da derrota em 1945, os dois empresários são acusados pelos aliados. Thyssen é condenado como “culpado em grau menor“. Devolvem-lhe a sua empresa já em 1950, mas ele falece um ano mais tarde. Como Gustav Krupp não está mais em condições de responder a um processo, seu filho é acusado pelo Tribunal Internacional de Nürnberg, que o condena a doze anos de prisão pelas suas relações estreitas com os nazistas e pela exploração de trabalhadores forçados. Já em 1951 ele é posto em liberdade e consegue reassumir a direção da sua empresa dois anos depois. No início dos anos 60 a empresa começa a pagar indenizações a antigos trabalhadores for-

Ekkehard Schulz, presidente da diretoria da ThyssenKrupp: egresso do grupo Thyssen çados. Em 1999 o grupo ThyssenKrupp, resultante da fusão das duas empresas, é uma das primeiras empresas aderentes à Fundação para a Indenização de Trabalhadores Forçados. Depois da guerra, as duas empresas perdem parte das suas instalações de produção. Para a Thyssen, o desmonte termina em 1949 com o Acordo de Petersberg, à semelhança de muitas empresas da Alemanha Ocidental. Três anos depois os aliados cancelam todas as restrições de produção e em 1953 a August-Thyssen-Hütte AG é fundada novamente. Nas décadas seguintes a Thyssen amplia a sua produção mediante a aquisição de e participações em outras empresas. Ao lado de aços perfilados e aços planos, a Thyssen produz também arames laminados, aços inoxidáveis, tubos de aço e cha-

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Hoje um conglomerado: a produção de aço inoxidável na ThyssenKrupp


pas grossas. Somente no fim da década de 1960 a empresa se expande também na dimensão vertical. A fusão com o Hüttenwerk Oberhausen AG integra agora também a produção de matérias-primas nas áreas de atuação da Thyssen. A August-Thyssen-Hütte AG é então o maior produtor europeu de aço bruto, ocupando o quinto lugar no ranking mundial. Alfred Krupp reassume a direção da sua empresa com restrições de vendas, impostas pelos aliados. Depois de algumas alienações, as empresas mineradoras e siderúrgicas remanescentes são integradas em 1960 nas “Hütten- und Bergwerke Rheinhausen AG“ Em 1965 a fusão com o “Bochumer Verein für Gussstahlfabrikation AG“ S.A. resulta no novo grupo Fried. Krupp Hüttenwerke AG. O ciclo da empresa familiar chega a termo em 1967. Depois da morte de Alfried Krupp, seu filho desiste da empresa, criando a Fundação Alfried-Kruppvon-Bohlen-und-Halbach, que passa a ser sócia única da empresa.

A crise do aço

Rheinhausen, os trabalhadores das aciarias e os mineiros de toda a Região do Ruhr respondem com uma paralisação. Mas as ações de protesto resultam apenas em poucos anos de sobrevida para a empresa Rheinhausen. Em 1989 e 1990 os altos-fornos são fechados, em 1993 a empresa é fechada definitivamente. Em 1997 as duas empresas Thyssen e Krupp acabam fusionando a sua produção de aço. A ThyssenKrupp Stahl AG é um dos maiores produtores mundiais de aço. Dois anos mais tarde, os dois grupos realizam a fusão definitiva no grupo ThyssenKrupp AG. O presidente do Conselho Fiscal da sociedade anônima é Gerhard Cromme, responsável pelo fechamento da aciaria da Krupp em Rheinhausen; o presidente da diretoria é Ekkehard Schulz, egresso do grupo Thyssen. Um dos maiores produtores de aço do mundo: trabalhador na ThyssenKrupp

Em meados da década de 1970 a indústria siderúrgica alemã entra em crise. A concorrência internacional e a substituição do aço por outros materiais dificultam os negócios dos produtores de aço da Alemanha. A Thyssen transforma-se num conglomerado, com ênfases na produção de aço, de bens de capital, comércio e serviços. A empresa amplia a sua orientação internacional e adquire em 1978 um fornecedor de autopeças nos EUA. Os efeitos dramáticos da crise do setor do aço se manifestam apenas alguns anos mais tarde. Na Região do Ruhr o sinônimo dessa crise é a empresa Rheinhausen. Quando a Krupp Stahl AG comunica em 1987 a sua intenção de fechar a unidade de laminados em Duisburg-

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Um grupo global A ThyssenKrupp no Brasil

Na condição de grupo de empresas de capital alemão, a ThyssenKrupp atua em escala mundial. Produzimos na Alemanha 36% do faturamento do grupo; 64% do faturamento resulta de exportações a clientes no exterior. Os Estados-membros da União Européia sem a Alemanha e a Região do NAFTA (EUA, Canadá e México) são segmentos de central importância para as nossas operações comerciais, com uma participação de 25% resp. 22% no mercado. Em muitos mercados internacionais, as empresas da ThyssenKrupp ocupam posições de liderança com os seus produtos. O grau de internacionalização do nosso grupo aumenta em muitas áreas. 90% do faturamento do Segmento Elevadores já são gerados fora da Alemanha, o percentual do faturamento no exterior no Segmento Automotivo está em 76%. O nosso grupo emprega 191.000 pessoas no mundo inteiro. As cerca de 700 sociedades estrangeiras da ThyssenKrupp

e as participações por associação empregam aproximadamente 88.000 pessoas. Isso significa que quase um em cada dois trabalhadores da ThyssenKrupp tem seu emprego fora da Alemanha Site da ThyssenKrupp A ThyssenKrupp S.A. está estruturada nos assim chamados Segmentos ou Unidades Operacionais: Aço, Fornecedores da Indústria Automobilística, Elevado res,“Tecnologias“,“Materiais“ e Serviços. As dezessete filiais sediadas no Brasil distribuem-se transversalmente por esses segmentos. Assim a fundição em Barra do Piraí no Estado do Rio de Janeiro fornece desde 1973 grandes peças metálicas para diversas áreas da indústria. Nela são moldados anualmente 5.500 toneladas de ferro. Com um total de aprox. 1.500 assalariados, a ThyssenKrupp é o maior empregador da região. Muito conhecidos são os elevadores do grupo ThyssenKrupp. Por meio da sua estratégia exitosa de adquirir fábricas de elevadores em bom funcionamento no mundo inteiro, o grupo conseguiu ascender à posição de líder no mercado internacional, detendo 29% do mercado. A fábrica de Guaíba, situada nas imediações de Porto Alegre, é um bom exemplo disso.

Uma fábrica „latino-americana“ Por razões culturais, Portugal, a Espanha e a América Latina formam uma unidade de negócios à parte no Segmento Elevadores. “Sabíamos já em 1994 que necessitávamos na América Latina de uma base industrial, por razões de custos e de

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Maior empregador da região: Trabalhador da ThyssenKrupp Fundições


“Contra a transferência de capacidades de produção para o exterior„: Elevador externo da ThyssenKrupp na Galeria Horten

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proximidade dos mercados“, relata Manuel Ventura, o diretor da ThyssenKrupp Elevadores. Durante muitos anos ele viajou entre Madri e Guaiba. Agora reside no Brasil. “Escolhemos como parceira a empresa Elevadores Sûr – por causa dos produtos de alta qualidade e por causa do pessoal.“ Em 1999 teria sido efetuada uma fusão “não-traumática, sem atritos e choques culturais“. “Naturalmente os trabalhadores alemães não apreciam a transferência de capacidades de produção para o exterior“, diz Ventura, que afirma ser um “adepto do Estado de Bem-Estar Social“. Mas para manter a competitividade, o grupo

foi obrigado a reposicionar-se: “Quando me dizem que o nível salarial no Brasil é inferior ao da Alemanha, respondo: Na Tailândia ele ainda é mais baixo.“ De Guaíba, a ThyssenKrupp não exporta apenas para outros países latinoamericanos, mas também para a África do Sul – até a Ásia está no programa de exportações. Manuel Ventura tem consciência de que há muitos preconceitos contra produtos brasileiros: “Os visitantes nos dizem freqüentemente que a nossa fábrica parece ser ’européia’ – e eles dizem isso como se fosse um elogio. Mas é uma fábrica latino-americana, brasileira!“

“A nossa fábrica é uma fábrica brasileira“: Manuel Ventura (dir.) e Paulo Weber, diretores da empresa

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LĂ­der internacional em elevadores: Trabalhador da ThyssenKrupp Elevadores

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„Já não é mais tão fác contra os colegas de

Entrevista com Gerold Vogel, da Comissão Européia de Traba

“Os franceses não fazem uma idéia positiva da co-gestão praticada na Alemanha“: Gerold Vogel, presidente da Comissão Européia de Trabalhadores

Há várias décadas as fronteiras nacionais já não representam mais nenhum obstáculo nas decisões comerciais de muitos grupos. Os trabalhadores reagem a essa evolução com a criação de comissões européias ou comissões mundiais de trabalhadores. Na ThyssenKrupp existe desde 1996 uma comissão européia de

mais cinco Estados-membros. Mas na opinião de Gerold Vogel ainda há um longo caminho a percorrer até uma co-gestão no plano europeu. Ele integra a da Comissão Européia de Trabalhadores desde 1996 e é seu presidente há três anos. Quais foram as razões que levaram vocês à criação da Comissão Européia de Trabalhadores? Vogel: “Por um lado dispúnhamos em 1996 das possibilidades jurídicas para a constituição de uma Comissão Européia de Trabalhadores. Por outro, não queríamos depender apenas dos empregadores, quando se tratava de obter informações sobre evoluções econômicas em outros países.“ Foi difícil criar a Comissão Européia de Trabalhadores na ThyssenKrupp?

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trabalhadores. Até agora ela tinha representantes de onze Estados-membros da União Européia. Com a ampliação da UE na direção do Leste Europeu, ocorrida em 2004, entraram representantes de

Vogel: “A fundação foi relativamente simples. Em alguns países demoramos um pouco mais até chegar a um consenso sobre o representante. No nosso país, na Alemanha, a comissão de trabalhadores do grupo envia um membro para a Comissão Européia de Trabalhadores. Nos países vizinhos inexistem comissões de trabalhadores, tais como as conhecemos na Alemanha. Em contrapartida, há outras formas de representação dos trabalhadores. Em alguns países o “presidente da comissão de trabalhadores“ é simultaneamente gerente da empresa. Acordamos que o membro da Comissão Européia de Trabalhadores seja um trabalhador, mas não um funcionário em cargo de liderança. Em tais casos, os sindicatos representados na empresa chegam a um consenso acerca do envio de um representante sindicalizado dos trabalhadores à Comissão Européia de Trabalhadores. Mas muitas vezes não é apenas um único sindicato que tem competência para a empresa. Assim,


cil jogar os trabalhadores outras unidades“

alhadores

para citar um exemplo, esse número pode chegar a quinze na Itália, onde a orientação dos sindicatos cobre o espectro do comunismo ao fascismo. Nesses países também levamos muitíssimo tempo até que os sindicatos chegassem a um consenso quanto ao representante.“ Que mudanças a Comissão Européia de Trabalhadores trouxe para os assalariados nos diferentes países? Vogel: “Já não é mais tão fácil jogar os trabalhadores contra os colegas de outras unidades. No passado a direção da empresa podia dizer nos que a nossa produção de molas para automóveis era excessivamente cara, que seria possível produzir a custos menores nas unidades localizadas na Espanha ou na Grã-Bretanha. Por medo da transferência da produção, nós cedíamos e fazíamos concessões. O resultado foi apenas o aumento do lucro da empresa. Agora não mais nos podem contar esses contos da carochinha. Sabemos quais são os padrões sociais em outros países e podemos responder a tais argumentos: ’O que vocês nos contam não é verdadeiro.’“ Será que hoje ainda é suficiente que os representantes dos trabalhadores cooperem no plano europeu? Vocês mal começaram a atuar no plano europeu, e o grupo já atua há muito tempo em escala mundial. Assim ele agora poderia ameaçar vocês não com a transferência da produção para a Espanha, mas com a transferência para a China.“ Vogel: “Isso está correto. Como comissão de trabalhadores, sempre ficamos um pouco a reboque dos acontecimentos. O grupo se reestrutura constantemente. Ocorre que se nos adaptássemos sempre a essas reestruturações, nós nos ocuparíamos apenas conosco mesmos e com a nossa comissão e não com os temas de política econômica do grupo.“

Mas será que um grupo que atua em escala global não necessita de uma comissão mundial de trabalhadores? Vogel: “Penso que na ThyssenKrupp é mais difícil fundar uma comissão mundial de trabalhadores que funcione do que na Volkswagen. Nas montadoras da Volkswagen são construídos automóveis, no mundo inteiro. Já a ThyssenKrupp tem cinco setores diferentes. Precisamos conversar sobre as condições de trabalho nas fundições, nas fábricas de elevadores ou nos fornecedores do setor automobilístico. Afinal de contas, não importa ter qualquer interlocutor no outro país, e.g. no Brasil, mas o interlocutor certo. Isso já é bastante difícil no plano europeu, embora tenhamos aqui um convívio mais estreito e condições de vida similares.“ Quais são as dificuldades da cooperação na Comissão Européia de Trabalhadores? Vogel: “As barreiras lingüísticas são o menor problema. Em todos os encontros temos sempre dois intérpretes para cada país. Mas há também mentalidades muito distintas nos diferentes países. Assim os franceses não fazem uma idéia positiva da co-gestão praticada na Alemanha. Os colegas sempre me dizem: ’No nosso país cada um pode entrar em greve quando quiser – vocês sempre precisam de uma decisão de 75% em favor da greve’. A participação de representantes dos trabalhadores no conselho fiscal também é uma coisa impensável para muitos colegas. Eles nunca sentariam numa mesa com um capitalista. Ainda estamos muito distantes de uma idéia comum do perfil da co-gestão na Europa.“ Por que você considera necessária uma forma comum de co-gestão? Vogel: “De momento a Comissão Européia de Trabalhadores tem apenas direitos à informação e de consulta. Aqui

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precisamos avançar de qualquer modo e ser incluídos também na tomada de decisões – não importa que nome se dê a essa forma de participação. Aqui não se trata simplesmente de fazer com que os colegas de outros países vistam a camiseta da co-gestão praticada na Alemanha. Muito pelo contrário, precisamos integrar as vantagens dos sistemas dos diversos países europeus.“ Qual é aqui o papel do projeto do Observatório Social? Vogel: “Ele cria sobretudo caminhos para os nossos colegas sindicalizados do Brasil, para que eles possam entrar nas fábricas. Penso que o projeto não deve conduzir a uma situação na qual os colegas brasileiros assumam as nossas estruturas. Eles devem encontrar uma forma de co-gestão que funcione no seu país. Para nós o projeto cumpre um papel relevante, pois estamos atualmente formulando um Código de Condutas para o grupo ThyssenKrupp, que e.g. exclua o trabalho infantil e admita a livre atuação de sindicatos e comissões de trabalhadores. Para tal fim naturalmente precisamos também de informações do Brasil.“

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“Sabemos quais são os padrões sociais em outros países“: Tabalhador da ThyssenKrupp Federn em Alemanha


A co-gestão no estabelecimento Na Alemanha, a co-gestão no estabelecimento é regulamentada pela Lei sobre a Organização das Empresas, que faculta aos assalariados o direito de eleger uma comissão de trabalhadores. A comissão tem direito ao voto, quando a contratação, demissão ou transferência de trabalhadores estão na pauta. Mudanças no estabelecimento que afetem os direitos dos assalariados carecem da anuência da comissão. Uma das suas tarefas mais importantes é a configuração da jornada de trabalho, tal como prevista no contrato coletivo de trabalho. Além disso, ela deve zelar pela observância do princípio do tratamento igual e cuidar de problemas cotidianos – dos postos de trabalho, nos quais é proibido fumar, até a instalação de sanitários, passando pela utilização do estacionamento. Nas matérias de gestão comercial a comissão de trabalhadores não tem direito ao voto. O empregador tem apenas o dever de informá-la. A Lei sobre a Organização das Empresas foi reformada em 2001, ampliando-se a co-gestão nos estabelecimentos. Desde então os estabelecimentos com cinco assalariados já podem eleger sua comissão. O tamanho da comissão depende do número de trabalhadores com direito ao voto. Assalariados em estabelecimentos com cinco a vinte trabalhadores elegem um representante para a comissão. O número de membros da comissão aumenta proporcionalmente ao número de trabalhadores. Assim em estabelecimentos com 701 a mil trabalhadores ela é composta por treze membros. Em estabelecimentos com 200 a 500 trabalhadores um membro da comissão

pode ser completamente dispensado do trabalho. O número dos membros da comissão dispensados do trabalho aumenta com o número de assalariados. As comissões de trabalhadores sempre são eleitas para um estabelecimento. Se uma empresa possui várias unidades com comissões de trabalhadores, a lei faculta a criação de uma comissão de trabalhadores da empresa. Esta não tem uma posição hierárquica superior; muito pelo contrário, ela se ocupa de todas as questões que dizem respeito a toda a empresa ou a várias partes da mesma. Em grandes grupos empresariais existe ainda a comissão de trabalhadores do grupo. Ela assume tarefas referentes ao grupo inteiro ou a partes dele. Assim a comissão de trabalhadores do grupo pode, para citar um exemplo, celebrar acordos válidos para todo o grupo. Em conformidade com uma diretiva da União Européia de 1994, empresas com mais de mil trabalhadores e dois ou mais estabelecimentos com 150 trabalhadores em dois ou mais Estados-membros da União Européia podem instituir uma comissão européia de trabalhadores. Ela se reúne ao menos uma vez por ano. Não tem direitos de co-gestão, mas deve ser informada pelo empregador. Comissões de trabalhadores representam 40% dos assalariados na Alemanha. Nos últimos anos, existe uma tendência regressiva no setor privado. Há também diferenças significativas entre estabelecimentos grandes e pequenos: ao passo que quase todas as grandes empresas com mais de mil assalariados têm uma comissão de trabalhadores, apenas 12% das empresas com 5 a 100 assalariados contam com uma comissão. A participação de sindicalistas nas comissões de trabalhadores também apresenta uma tendência ligeiramente regressiva.

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Novas contratações n Achim Helsper é presidente da comissão de trabalhadores na unidade de fundição de injeção sob pressão Fritz Völkel gociar para os colegas demitidos 70% do salário mensal por cada ano de trabalho.

Horas extras sem pagamento para manter os empregos: Achim Helsper, presidente da comissão de trabalhadores na Fundição Fritz Völkel

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Mais difícil o começo praticamente não poderia ter sido para o novo presidente da comissão de trabalhadores. Quando Achim Helsper foi eleito presidente em 1998, a unidade de fundição de injeção sob pressão Fritz Völkel, de Wuppertal, uma empresa da ThyssenKrupp Fahrzeugguss GmbH, estava à beira da falência. Premidos pela necessidade, as colegas e os colegas confiaram mais uma vez no experiente sindicalista, que já defendera seus interesses nos anos de 1974 a 1985. Helsper, então com 58 anos de idade, estava no cargo há seis semanas contadas quando o patrão anunciou demissões. “Os tempos eram ruins, e no plano das decisões comerciais não há direitos à cogestão“, lembra-se o presidente da comissão de trabalhadores. 46 assalariados ficaram sem emprego no início de 1998. Helsper não pôde evitar as demissões; pôde, contudo, negociar as condições. Cuidou da observância de critérios sociais na seleção e negociou um plano social. Em tais casos o pomo de discórdia é quase sempre o valor da indenização, não prescrito pela lei. Helsper conseguiu ne-

Mas com isso o tema do fechamento da fábrica ainda não tinha saído da agenda. Para salvar a fábrica e os empregos, o presidente da comissão de trabalhadores fez muitas concessões à direção da empresa. Eis a sua proposta: durante quinze meses os aproximadamente 200 assalariados trabalhariam 40 horas por semana, mas seriam pagos apenas por 35 horas. Até o secretário do Sindicato dos Metalúrgicos de Wuppertal, cuja anuência se faz necessária em alterações do contrato coletivo de trabalho, endossou essa proposta. Houve problemas apenas com a direção da empresa, que queria que apenas os trabalhadores da indústria trabalhassem mais, conforme conta Helsper. “Dissemos então: ou todos trabalham mais tempo, ou ninguém.“ Só depois da mudança da direção da empresa, o presidente da comissão de trabalhadores conseguiu impor a sua exigência. No fim, todos os assalariados trabalharam durante quinze meses cinco horas extras por semana, sem uma remuneração adicional.

A “hora extra do presidente da comissão de trabalhadores“ Na época, nem todos ficaram entusiasmados com o acordo. Alguns perguntaram a Helsper: “Para que votamos em ti? Primeiro a direção da empresa põe gente na rua, e agora precisamos trabalhar mais tempo.“ Helsper conta que alguns colegas chegaram a chamar o trabalho a mais em cada dia a “hora extra do presidente da comissão de trabalhadores“. A irritação se desfez rapidamente, uma vez que a fábrica está prosperando novamente há três anos. Quando


no lugar do quarto turno a situação econômica melhorou, o presidente da comissão de trabalhadores exigiu: “Agora parte do êxito deve retornar aos bolsos dos assalariados. Afinal de contas cada um abriu mão de aprox. 5.000 euros, quando a empresa andou mal das pernas.“ Juntamente com o Sindicato dos Metalúrgicos o presidente da comissão de trabalhadores desenvolveu um novo sistema de prêmios. “Até então pagava-se prêmios por tonelada produzida, independentemente de se tratar de uma tonelada de refugo ou de uma tonelada de produtos de qualidade.“ Somente em 1998 a fábrica produziu 12% de refugo. O presidente da comissão de trabalhadores e o Sindicato dos Metalúrgicos empenharam-se por um sistema de prêmios pela redução de falhas e custos. Se uma determinada cota de refugo não é ultrapassada na produção média anual, os trabalhadores ganham mais dinheiro. Helsper relata: “Com o novo sistema o pessoal dobrou os prêmios, e o percentual de refugo hoje está apenas entre 4 e 5%.“

Banheiros limpos no turno da manhã Mesmo quando não importa salvar empregos, a comissão de trabalhadores tem muito o que fazer. Para Helsper, ferramenteiro de formação, as medidas de qualificação sempre são um tema importante. Nos últimos anos a evolução técnica mudou o perfil das tarefas em muitos locais de trabalho. “Precisamos cuidar aqui não apenas para que as pessoas sejam qualificadas e possam cumprir bem essas tarefas, mas também para que elas sejam correspondentemente remuneradas“, diz Helsper. Somente no último ano ele assegurou para 153 assalariados a inclusão em outra faixa salarial ou a reclassificação salarial.

O presidente da comissão de trabalhadores é um interlocutor importante também na solução de outros problemas. “O pessoal chega se queixando de miudezas, e.g. da aspereza do papel higiênico“, diz Helsper. Freqüentemente surgem também conflitos, quando um assalariado é transferido a outro local de trabalho. Helsper fala então com o chefe do setor e procura encontrar uma solução. Lembra-se que durante muito tempo um dos seus sucessos foi a limpeza das dependências de uso comum. Como os trabalhadores do primeiro turno quase sempre encontravam os banheiros sujos, Helsper se empenhou para que eles não fossem limpados apenas à noite, mas também de manhã depois do turno da noite. A retomada do crescimento econômico trouxe novas tarefas para o presidente da comissão de trabalhadores. Entrementes, os livros de encargos estão repletos de pedidos até 2007, mas a direção da empresa não pensa em ampliar a fábrica. Por isso introduziu-se um novo sistema de quatro turnos na fundição. “Se tudo tivesse sido feito segundo a vontade da direção da empresa, estaríamos trabalhando com o mesmo número de pessoas 24 horas por dia.“ O presidente da comissão de trabalhadores não aceitou essa solução, mas obteve a contratação de 30 novos trabalhadores e a adesão voluntária ao turno adicional na tarde de sábado. Seis anos depois da crise ninguém mais fala do fechamento da unidade de fundição de injeção sob pressão em Wuppertal. Em contrapartida, a ThyssenKrupp está pensando agora em vender a fábrica. A comissão de trabalhadores precisa tomar posição e formular as suas condições para a venda. Mesmo depois de 37 anos de trabalho na empresa, Achim Helsper ainda tem muito o que fazer.

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Mais perto dos compa Anna Kapetanaki é delegada sindical do Sindicato dos Metalúrgicos (IG Metall)

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Para muitas pessoas Anna Kapetanaki é a primeira interlocutora, quando ocorrem problemas. “A minha denominação já diz isso: sou a delegada sindical“, informa a sorridente trabalhadora de 52 anos. Um caso típico ocorreu recentemente, quando houve irritação entre os trabalhadores, pois todos queriam uma vez mais tirar férias ao mesmo tempo. Chegou um colega, cujo pedido de férias tinha sido rejeitado. Anna Kapetanaki falou com colegas que não têm filhos em idade escolar. Com sua ajuda, ajeitou as semanas de férias no calendário, até que o maior número possível de pessoas ficasse satisfeito. Anna Kapetanaki está entre os 19 delegados sindicais da IG Metall na unidade de fundição de injeção sob pressão Fritz Völkel. Os delegados sindicais são uma espécie de extensão do sindicato no estabelecimento. São eleitos para mandatos de quatro anos pelos trabalhadores sindicalizados. Anna Kapetanaki é delegada sindical há 24 anos. Uma das suas tarefas consiste em informar os trabalhadores sobre a atividade dos sindicatos. Para tal fim Anna Kapetanaki visita regularmente o escritório da IG Metall em Wuppertal, onde se abastece de informativos, que distribui depois na empresa. Na maioria dos casos ela visita pessoalmente o seu departamento, o de acabamento, entrega a cada trabalhador um exemplar do informativo e responde a perguntas. No fundo ela só poderia fazer isso fora do seu turno de trabalho, pois os delegados sindicais não gozam da mesma proteção jurídica dos membros da comissão de trabalhadores. Mas a relação com a direção da empresa é boa. “Nunca tive problemas quando tive de ir ao sindicato e precisava me ausentar do trabalho por algumas horas.“ A delegada sindical ajuda também a comissão dos trabalhadores. Quatro vezes por ano os delegados sindicais discutem em uma reunião os temas mais importantes, preparando a discussão na assembléia geral dos trabalhadores. “Eles trabalham nos diferentes departamentos, simples-

mente estão mais perto dos companheiros“, diz Achim Helsper, presidente da comissão de trabalhadores. Por isso os delegados sindicais são quase sempre os primeiros a descobrirem o que a direção da empresa está planejando. Para muitos trabalhadores o caminho mais rápido é falar sobre um problema com a companheira que trabalha a uma distância de três mesas. E esse sempre é também o caminho para esclarecer os conflitos, antes deles se converterem oficialmente em problema.

Até os trabalhadores em funções dirigentes paralisaram as atividades Quando os colegas se queixam de que os chefes não cumprem os acordos e incluem-nos em turnos, nos quais eles não estão obrigados a trabalhar, Anna Kapetanaki faz primeiro um esforço para intermediar no plano das relações interpessoais. “Quando os colegas vão à comissão de trabalhadores, a coisa passa a ser um caráter oficial. Recorre-se então às leis e às normas e o problema é processado nos trâmites previstos“, explica ela. Nas suas tentativas de intermediação, Anna Kapetanaki, nascida na Grécia, tem a vantagem de dominar ao lado do alemão e do grego também o idioma turco. Na fábrica há muitos companheiros e muitas companheiras da Turquia. “Penso que muitas coisas são melhor compreendidas pelas pessoas, quando eu as explico na sua língua materna.“ Mas há também temas que exigem a mobilização da comissão de trabalhadores, como aconteceu na introdução do novo sistema de prêmios: depois da mudança do sistema, registrava-se em cada local de trabalho a quantidade de refugo produzida. Adicionalmente, porém, descontava-se genericamente 2% de refugo a cada dia, segundo o sistema antigo.


anheiros

Uma extensão do sindicato na empresa: a delegada sindical Anna Kapetanaki Quando alguns colegas se deram conta disso, falaram com Anna Kapetanaki. Ela encaminhou o problema à comissão de trabalhadores, que acabou por alterar a cláusula correspondente no acordo celebrado com a empresa. Os delegados sindicais cumprem papéis especiais em tempos de negociações de contratos coletivos de trabalho. São apenas eles, não a comissão de trabalhadores, que podem conclamar os trabalhadores à greve. Quando em janeiro de 2004 ficou claro que alguns empregadores no Estado Renânia do Norte-Vestfália não queriam assumir o contrato coletivo de trabalho negociado no Estado de Baden-Württem-

berg, a IG Metall acabou conclamando os trabalhadores à greve. Os delegados sindicais foram ao escritório do sindicato, buscaram os volantes com o chamamento à greve e distribuíram-nos em seus departamentos. Anna Kapetanaki visitou os departamentos de fundição e acabamento, entregou a cada trabalhador um volante e explicou por que essa greve seria importante. A capacidade de convencimento dos delegados sindicais evidenciou-se no dia da greve. Às 10:00 hs, nada menos de 80 trabalhadores do primeiro turno estavam na frente da fábrica. Até alguns funcionários dirigentes paralisaram as suas atividades naquele dia.

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Os sindicatos alemães Na Alemanha, os pioneiros foram os trabalhadores do setor fumageiro: fundaram um sindicato já em 1848, nos tempos da industrialização incipiente, quando as condições vigentes nas fábricas eram terríveis. Jornadas de trabalho de doze a dezessete horas eram tão comuns como o trabalho infantil. As condições de trabalho eram catastróficas; em parte envolviam riscos de vida.

diminuição do número de membros. Atualmente a Confederação dos Sindicatos Alemães (DGB), que integra os sindicatos, conta com 7,3 trabalhadoras e trabalhadores afiliados, que perfazem cerca de 20% de todos os assalariados. A tarefa mais importante dos sindicatos é a celebração de contratos coletivos de trabalho. Só eles podem celebrar esses contratos para seus membros, não os membros da comissão de trabalhadores. E só os membros do sindicato têm direito ao pagamento do salário de acordo com o contrato coletivo de trabalho. Na prática, os empregadores quase sempre pagam também os trabalhadores não-sindicalizados de acordo com o contrato coletivo de trabalho. Do contrário eles engrossariam as fileiras dos sindicatos – e nisso eles não estão interessados. Nas negociações os representantes dos sindicatos enfrentam a correspondente associação patronal: assim, por exemplo, os negociadores do Sindicato dos Metalúrgicos (IG Metall) enfrentam os representantes da associação patronal Confederação das Indústrias Metalúrgicas (Gesamtmetall). Uma vez celebrado, o contrato coletivo de trabalho vale para todas as empresas filiadas à associação patronal. Mas o sindicato pode celebrar também contratos coletivos com empresas individuais, os assim chamados contratos coletivos por estabelecimento.

Só os delegados sindicais podem conclamar à greve: a delegada sindical Anna Kapetanaki

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O que começou com um punhado de operários enfurecidos alastrou-se rapidamente num movimento de milhões de pessoas. Até hoje os sindicatos continuam sendo um importante fator de poder social, em que pese a

Às vezes as negociações se estendem por semanas a fio. Na fase final, as reuniões decisivamente importantes não raras vezes entram noite adentro. Os contratos coletivos de trabalho não definem apenas quanto dinheiro os assalariados deverão ganhar. Contemplam também os dias de férias, a duração da jornada de trabalho ou os


planos de previdência. Tais condições gerais são fixadas nas assim chamadas convenções coletivas sobre as condições de trabalho.

evitar a fragmentação dos sindicatos. O sindicato tem assim mais poder para enfrentar o empregador, pois repre-

Na falta de um consenso nas negociações, o sindicato pode consultar seus membros sobre a conveniência de uma greve. Durante a greve, os grevistas sindicalizados recebem um auxílio de greve do sindicato. Conflitos trabalhistas duram às vezes apenas alguns dias, às vezes também muitas semanas, como no caso da greve pela introdução da semana de 35 horas na indústria metalúrgica em 1984. O sindicato não pode conclamar à greve a qualquer momento. Uma vez assinado o contrato coletivo de trabalho por ambas as partes, existe o dever de manter a paz. Somente depois de expirada a vigência de um contrato coletivo – em regra depois de um ou dois anos – a greve é novamente permitida. Ao lado da sua tarefa mais importante, a negociação dos contratos coletivos de trabalho, os sindicatos oferecem outras ajudas aos seus membros – assim a assistência jurídica em conflitos com o empregador. Os membros pagam uma contribuição mensal fixa, em média 1% do seu salário bruto. Contrariamente a outros países, vale na Alemanha o princípio do assim chamado ’sindicato unitário’. O sindicato representa todos os trabalhadores de um setor. De acordo com o princípio „uma empresa – um sindicato“, ele representa na empresa todos os segmentos profissionais, do funcionário da portaria até o eletricista e os funcionários da administração. A Alemanha desconhece sindicatos constituídos segundo a visão de mundo, como na França ou na Itália. A vantagem da unidade sindical está em

“Com o novo sistema o pessoal dobrou os prêmios“: Achim Helsper, presidente da comissão de trabalhadores senta todos os assalariados em grau igual. Na Alemanha, a introdução do princípio da unidade sindical foi uma resposta às experiências feitas durante o período nazista, quando o movimento operário estava profundamente dividido por conflitos internos e pôde ser desbaratado sem delongas.

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“Não basta fazer bar Bernd Lange, secretário do Sindicato dos Metalúrgicos (IG Metall) em Wuppertal entrementes a metade do seu tempo de trabalho é absorvida pela análise da situação econômica das empresas.

Os contratos coletivos de trabalho são a tarefa principal do sindicato: Bernd Lange, secretário da IG Metall

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Quando Bernd Lange assinou o seu contrato de secretário da IG Metall em Wuppertal há treze anos, não sonhou com a perspectiva de reunir-se regularmente com consultores empresariais e banqueiros. “Tinha idéias bastante claras acerca do meu trabalho. Quis ocuparme de política salarial e cursos de reciclagem, preparar os membros da comissão de trabalhadores para que pudessem desempenhar bem o seu trabalho e elaborar acordos razoáveis com as empresas.“ Bernd Lange continua fazendo isso, mas

Quando ocorrem crises e os membros da comissão de trabalhadores ou a direção de um estabelecimento batem à porta do secretário sindical, o contrato coletivo de trabalho, a tarefa principal dos sindicatos, sempre está na pauta. Quase sempre os empregadores querem negociar horas extras não pagas ou cortes no adicional pago no Natal ou no salário para as férias. Quando vinculados por um contrato coletivo de trabalho, só podem cortar esses benefícios com a anuência do sindicato. “Obviamente podemos encastelar-nos na posição de que não vamos mexer no contrato coletivo de trabalho“, afirma Lange. “Mantemos então os nossos direitos e perdemos os empregos.“ Para o sindicato, não adianta fazer barulho e xingar os capitalistas sórdidos. Em vez de desfraldar a bandeira vermelha e dar uma volta ao redor da fábrica, para somente depois assinar o plano de benefícios sociais, o Sindicato dos Metalúrgicos adota uma outra estratégia desde o início dos anos 90 em Wuppertal. “Quando as empresas são recuperáveis, abrimos também mão de algumas cláusulas dos contratos coletivos de trabalho, embora por tempo limitado.“ Entrementes é um segredo de polichinelo que o sindicato de Wuppertal está aberto ao diálogo. Algumas empresas pensam que podem tirar proveito disso, alegar dificuldades econômicas e cortar benefícios. Recentemente, no fim de 2003, um empregador foi falar com o sindicato, informando que não teria condições de pagar o adicional de Natal. Lange se declarou disposto a conversar sobre o assunto, mas exigiu primeiro examinar os registros contábeis da empresa. Perguntava sempre de novo pelos balanços e não recebia nenhuma resposta. No fim, o empregador recuou e disse: “Tudo bem, pagaremos o adicional de Natal.“


rulho“

“Não é necessário reinventar a toda em cada caso“: trabalhadora na fundição

Não é necessário reinventar a roda em cada caso Quando uma empresa está com a água até o pescoço, o sindicato contrata auditores para um exame dos livros contábeis. Só quando a situação financeira é efetivamente apertada e há perspectivas de recuperação, o sindicato concorda em abrir mão de algumas cláusulas do contrato coletivo de trabalho. Assim acon-

teceu há seis anos no caso da unidade de fundição de injeção sob pressão Fritz Völkel: durante quinze meses todos os assalariados trabalharam cinco horas extras por semana sem a correspondente remuneração. A recuperação deu certo, e hoje a empresa está novamente em boas condições. Mas só o trabalho adicional não-remunerado não teria salvo a empresa, conforme afirma Lange. “Insistimos que se trabalhasse também em cima das causas da crise.“ A fábrica tinha grandes problemas com a qualidade e a produtividade. Agora a empresa já está treinan-

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do novos trabalhadores – e só contrata mão-de-obra do setor metalúrgico. O secretário do sindicato não se ocupa diretamente de tais questões. Nas fases de recuperação, a comissão de trabalhadores deve assumir esse trabalho. Lange enfatiza: “Pouco podemos fazer se os delegados sindicais não tiverem uma posição forte.“ A falta de anuência do sindicato não impede alguns empregadores de cortar benefícios. Mas contratos coletivos de trabalho são sagrados, ao menos para os membros da IG Metall: para eles o secretário sindical deve lutar, a fim de garantir que os seus direitos sejam respeitados. Ao lado disso Lange precisa ocupar-se também dos negócios cotidianos. Depois das grandes rodadas de negociação dos contratos coletivos de trabalho, ele tem muito o que fazer. O verdadeiro trabalho começa nos escritórios regionais da

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IG Metall somente depois da assinatura do acordo por parte dos empregadores e sindicalistas, no fim de uma longa maratona de negociações. “Explicamos o contrato coletivo de trabalho em todos os seus detalhes, para que cada assalariado saiba que conseqüências o acordo produz no seu contracheque.“ Lange conversa com os membros da comissão de trabalhadores e explica-lhes os detalhes do acordo. A jornada de trabalho é sempre de novo um tema nas fábricas. O contrato coletivo de trabalho somente fixa a semana de 35 horas – mas não a distribuição das horas durante a semana, cuja definição é uma tarefa das comissões de trabalhadores. Estas freqüentemente desenvolvem modelos de jornada de trabalho juntamente com o secretário do sindicato, que conhece também os modelos de outras fábricas. “Não é necessário reinventar a roda em cada caso.“


“Trabalhar em cima das causas da crise“: Fundição Fritz Völkel, em Wuppertal

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O Sindicato dos Metalúrgicos (IG Metall) Até poucos anos o Sindicato dos Metalúrgicos podia vangloriar-se de um título todo especial: era o maior sindicato individual do mundo. Somente depois da associação de cinco sindicatos alemães no novo Sindicato Unificado dos Trabalhadores do Setor de Prestação de Serviços (ver.di), a IG Metall perdeu esse primeiro lugar. Apesar disso, a IG Metall, que conta com 2,5 milhões de afiliados, ainda é um dos sindicatos mais influentes e combativos em escala mundial, pois representa os trabalhadores e funcionários da administração em setores especialmente importantes da economia. A indústria metalúrgica – formada pelos grupos do setor automobilístico, empresas construtoras de máquinas e instalações industriais e produtores de aço – é a coluna vertebral da economia alemã. Assim IG Metall representa também os trabalhadores das mecânicas de automóveis, da indústria madeireira e de materiais sintéticos, e da indústria têxtil e de confecções. Em muitas grandes empresas alemãs o índice de sindicalização é elevado. Assim, para citar um exemplo, mais de 90% dos trabalhadores da

Volkswagen são membros da IG Metall. Na negociação dos contratos coletivos de trabalho o sindicato freqüentemente indica a linha a ser seguida. Assim os resultados acordados na indústria metalúrgica repercutem também em outros setores. O que a IG Metall não consegue impor dificilmente será alcançado por outros sindicatos alemães. Em meados dos anos 80 o sindicato comemorou um dos maiores sucessos da sua história. Na época ele conseguiu impor a introdução da semana de 35 horas, depois de enfrentar a resistência acirrada dos empregadores em uma greve de várias semanas. Desde então a jornada de trabalho foi reduzida passo a passo nas empresas metalúrgicas alemãs, de 40 a 35 horas semanais. Ao lado de vitórias, o sindicato também contabilizou derrotas. A última foi o fracasso da greve na Alemanha Oriental em 2003. A IG Metall quis impor finalmente as reduções da jornada de trabalho, vigentes há muito tempo na Alemanha Ocidental. Errou, contudo, na avaliação da disposição combativa dos trabalhadores nas fábricas. Quando ela se viu obrigada a por termo à greve, houve uma luta pelo poder na cúpula sindical, que resultou na saída do presidente Klaus Zwickel e na eleição do seu substituto Jürgen Peters para a presidência.


“A proteção no local de trabalho é uma questão de imagem“: Unidade de proteção da ThyssenStahl AG

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“Sou leal à empresa“ Ralph Labonte: de sindicalista a ’Diretor de Trabalho’

De saída, Ralph Labonte desfaz um mal-entendido: “O Diretor de Trabalho não é nomeado pela comissão de trabalhadores ou pelo sindicato. De acordo com a Lei de Co-gestão de 1976, essas duas instituições não têm nem o direito de propor um candidato.“ Labonte é Diretor de Trabalho da ThyssenKrupp Steel AG e membro da diretoria da ThyssenKrupp AG. “Ainda sou membro do sindicato“: Ralph Labonte, Diretor de Trabalho

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Durante décadas consolidou-se um ritual que sempre segue o mesmo padrão: os sindicatos e as comissões de trabalhadores escolhem os seus candidatos, mas

a decisão está exclusivamente nas mãos do conselho fiscal. Nele o Diretor de Trabalho deve ser eleito, como todos os outros membros da diretoria, com maioria de dois terços. Quem decide são os votos dos acionistas e dos representantes dos trabalhadores. “No nosso grupo sempre fizemos um esforço para que o candidato fosse apoiado por ambas as partes.“ Labonte conhece esse procedimento ainda dos seus tempos antigos de secretário do Sindicato dos Metalúrgicos em Duisburg. E acrescenta em seguida que ele mesmo não teria sido o preferido


pelo seu sindicato. Se Labonte fala sobre isso hoje, ele transmite a impressão de um esfriamento visível das relações com o sindicato: “Ainda sou membro do sindicato, mas tenho minhas dúvidas acerca da efetiva capacidade de ação da IG Metall.“ As relações de Labonte com o sindicato datam de mais de 30 anos. Filiouse pouco depois de começar a sua formação de mecânico de automóveis em 1968 e engajou-se na sua empresa como representante dos aprendizes. Seu engajamento não foi visto com bons olhos

automóveis no comércio varejista. Mais uma vez ele se tornou representante dos aprendizes e se engajou na política sindical. Freqüentou em 1975 um curso de secretário sindical no Sindicato dos Comerciários, Bancários e Securitários. Quatro anos depois mudou-se para o Sindicato dos Metalúrgicos (IG Metall) em Duisburg, ingressou em 1987 no escritório siderúrgico da IG Metall em Düsseldorf e tornou-se responsável pelo acompanhamento do grupo Thyssen AG. Há dez anos ele foi eleito pela primeira vez para a diretoria da então Thyssen Guss AG como Diretor de Trabalho. “Os índices estatísticos sobem verticalmente quando cada polegar roxo é contabilizado“: Ralph Labonte por ocasião da visita à fundição em Barra do Piraí

pelo chefe e encerrou precocemente a sua carreira de mecânico de automóveis. Concluída a formação, ele não foi contratado pela empresa nem encontrou trabalho em outras empresas. “Na época ainda não havia nenhuma proteção jurídica para os representantes de aprendizes.“ Ralph Labonte mudou de área e passou a vender acessórios para

“O que mais o grupo ainda deve fazer?“ Ralph Labonte já não trabalha mais nas comissões da IG Metall. O Diretor de Trabalho diz que foi necessário optar, e ele optou: “Sou leal à empresa.“ Natu-

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ralmente ele também dá valor à estabilidade dos empregos, embora não pense apenas nos empregos dos trabalhadores alemães. Ralph Labonte se considera o advogado de todos os trabalhadores do grupo ThyssenKrupp – em escala mundial. Mas como membro da diretoria, ele não quer fechar os olhos diante de coações impostas pelo desenvolvimento econômico. “Tive de participar na decisão sobre vários fechamentos de unidades produtivas. Mas sempre anuncio pessoalmente as medidas dolorosas e desagradáveis. Nunca deleguei essa tarefa a outras pessoas. Essa responsabilidade eu mesmo preciso assumir.“ Isso aconteceu também no caso da fábrica de elevadores em Mylau/Saxônia. Enquanto a comissão de trabalhadores do grupo lutou pela manutenção da fábrica, Labonte votou pelo seu fechamento. “A decisão foi economicamente correta.“ O futuro dos trabalhadores não lhe foi indiferente. Labonte empenhou-se em oferecer outros empregos a todos os trabalhadores demitidos. Decepcionou-se quando alguns não aceitaram a oferta, pois os locais de trabalho ficavam a várias centenas de quilômetros de Mylau. Labonte lembra aqui que a Thyssen ofereceu todas as ajudas possíveis, de pagamentos compensatórios na venda de propriedades até a ajuda de custos para a mudança. “O que mais o grupo ainda deve fazer?“ A resposta do Diretor de Trabalho já ressoa na sua pergunta. Ele não acredita que uma empresa deva e possa fazer mais.

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Ralph Labonte é de opinião que os assalariados deveriam tornar-se mais flexíveis. Isso vale tanto para os sindicatos quanto para as comissões de trabalhadores. Não é aceitável que as pessoas trabalhem pouco em uma unidade e que em outra unidade a 30 km de distância falte mão-de-obra. “Do ponto de vista puramente jurídico, não podemos

transferir essas pessoas a uma outra unidade.“ Na perspectiva de Labonte, trata-se de obstáculos burocráticos a serem eliminados. Na condição de Diretor de Trabalho e membro da diretoria, Labonte define as diretrizes da discussão de muitos temas. Assim, para citar um exemplo, quando se trata de acordos na empresa sobre a informatização ou sobre medidas de qualificação profissional, ele junta os diferentes departamentos especializados. Atualmente ele se ocupa com o tema da participação dos trabalhadores. Um aspecto desse tema são as ações subscritas pelos trabalhadores. “Elas deveriam dar ao trabalhador a sensação de trabalhar em uma empresa cotada na Bolsa de Valores“, diz Labonte. Além disso o grupo está elaborando um modelo que assegure aos assalariados a participação nos resultados da empresa; assim, por exemplo, quando cai o número de dias não-trabalhados por motivo de doença, quando melhora o sistema de propostas ou cai o número de acidentes de trabalho. A segurança no local de trabalho é importante para Ralph Labonte. “Discutimos cada acidente grave na diretoria.“ Quando as pesquisas evidenciaram que em uma unidade no Brasil o número de acidentes estava aumentando muito, ele cuidou pessoalmente do assunto. Labonte pensa que tais problemas às vezes não derivam da falta de segurança no local de trabalho, mas do modo de elaboração das estatísticas: “É claro que os índices estatísticos sobem verticalmente, quando cada polegar roxo é contabilizado como acidente de trabalho.“ Para ele não há como comparar a situação no Brasil com as empresas alemãs. “A discussão sobre segurança no local de trabalho e sobre técnica no Brasil não pode ignorar o nível educacional extremamente baixo dos trabalhadores.“


“Sempre anuncio pessoalmente as medidas dolorosas“: a central do grupo ThyssenKrupp em Düsseldorf

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A co-gestão no conselho fiscal Ao lado da co-gestão no estabelecimento, os trabalhadores alemães também dispõem da possibilidade de influir no encaminhamento de decisões sobre os negócios da sua empresa. As comissões de trabalhadores e os sindicalistas têm assento nos conselhos fiscais das empresas. Sociedades anônimas e cooperativas devem ter um conselho fiscal; o mesmo vale para as sociedades de responsabilidade limitada, desde que atendam a determinados pré-requisitos. Todas as outras empresas podem ou não instituir um conselho fiscal. Fazem parte das tarefas do conselho fiscal a eleição dos diretores e o controle da gestão dos negócios da empresa. O conselho fiscal analisa a prestação de contas e determina que operações comerciais importantes somente podem ser realizadas com a sua anuência.

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A forma de participação dos trabalhadores no conselho fiscal depende do tamanho da empresa e do respectivo setor. Existe, porém, um denominador comum: a maioria sempre é formada pelos acionistas da empresa. A participação dos trabalhadores é mais pronunciada no setor de mineração e na indústria siderúrgica. A assim chamada Lei de Co-gestão na Indústria do Carvão e do Aço (1951) vale para as empresas do setor siderúrgico e carbonífero que empregam mais de 1.000 trabalhadores e são sociedades anônimas ou sociedades de responsabilidade limitada. A lei prevê a participação de um ‚diretor de trabalho’ na direção da empresa. O número dos membros do conselho fiscal depende do tamanho da empresa.

A metade dos representantes dos assalariados trabalha no estabelecimento. Em regra, a outra metade é proposta pelas cúpulas sindicais. Mesmo na indústria do carvão e do aço os empregadores detêm a maioria dos votos. Um dos representantes dos assalariados representa os funcionários em cargos de liderança. Ocorrendo um empate, o presidente do conselho fiscal, sempre nomeado pelos acionistas, exerce o voto de Minerva. A redução do número de empresas mineradoras e siderúrgicas resulta na diminuição progressiva da importância do sistema de co-gestão vigente na indústria do carvão e do aço. Em todo o grupo ThyssenKrupp, outrora um representante clássico das indústrias siderúrgica e carbonífera, existem hoje ainda cinco empresas regulamentadas pela Lei da Co-gestão na Indústria do Carvão e do Aço. São elas a ThyssenKrupp Stahl AG, a Krupp Edelstahl Profile (KEP), Edelstahlwerke Witten/Krefeld (EWK), Hoesch Hohenlimburg e a participação na empresa Hüttenwerke Krupp-Mannesmann (HKM). Até meados dos anos setenta, todas as outras empresas conheceram uma participação na ordem de um terço no conselho fiscal. De acordo com essa regra, dois terços dos assentos eram ocupados pelos acionistas e um terço pelos representantes dos trabalhadores. Essa forma de participação vale ainda hoje em empresas com menos de 2000 assalariados. Para estabelecimentos com um número maior de assalariados o legislador prevê desde


1976 uma composição quase paritária dos conselhos fiscais. Isso significa que os assentos no conselho fiscal se distribuem pela metade entre os representantes dos trabalhadores e os representantes dos acionistas. Empates são, porém, decididos pelo presidente do conselho fiscal, nomeado pelo empregador.

“Necessitamos de uma estratégia própria“: membros da comissão de trabalhadores

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Horas extras até a ex O trabalho sindical na fundição em Barra do Piraí

Metade da vida na Thyssen: o sindicalista Braguinha

Barra do Piraí, 14:00 hs. Fim do primeiro turno na ThyssenKrupp. Trabalhadores cobertos de fuligem e estafados saem da fundição, situada no interior do Estado do Rio de Janeiro, a uma distância de apenas duas horas de automóvel da cidade do Pão de Açúcar. Valmir Braga, diretor do sindicato local dos metalúrgicos, aqui conhecido como Braguinha, montou um sistema de som na frente do portão da fábrica. “Assinem, para que possamos negociar em nome de vocês na próxima rodada de negociações salariais“, ele grita no microfone. Alguns trabalhadores sentaram nos bancos e escutam o sindicalista, outros atendem ao seu chamado.

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Em poucos dias Braguinha consegue juntar 500 assinaturas. Em outras empresas da região ele consegue outras 1.200 assinaturas, o suficiente para que o sindicato possa conduzir as negociações com a associação patronal. Mas Braguinha está insatisfeito com o resultado na fundição, na qual só 300 dos 1.500 traba-

lhadores estão sindicalizados: “A maioria dos companheiros praticamente não tem formação escolar – quando muito, eles completaram o primário. Por isso o número de trabalhadores sindicalizados é tão reduzido.“ Seu colega Luís Tito Velasco, que sucedeu-lhe no cargo de presidente do sindicato há um ano, complementa a informação: “Enfrentamos dificuldades na fábrica, os trabalhadores se sentem pressionados, muitos evitam o contato conosco.“ Além disso a maioria dos trabalhadores simplesmente não dispõe de tempo para um engajamento voluntário. Na opinião de Velasco, que já trabalha há dezoito anos na Thyssen, o problema mais grave está nas condições “insalubres“ do trabalho: “Em muitos departamentos sofremos com os cheiros fortes, além disso é barulhento e quente. Um problema particularmente grave é a poeira.“ Anualmente ocorrem mais de 200 acidentes de trabalho.


xaustão Novos mecanismos de comunicação “Nos últimos anos, as nossas relações com a empresa melhoraram sensivelmente“, diz Braguinha, atualmente com 39 anos de idade. Ele trabalhou a metade da sua vida na Thyssen, dos quais 16 anos como membro ativo do sindicato. Homem de estatura pequena, mas seguro de si, Braguinha cuida dos contatos entre o sindicato brasileiro e o sindicato alemão. Em 1996 foi iniciado o primeiro projeto com os sindicalistas jovens da IG Metall, quatro anos mais tarde Braguinha visitou a unidade matriz da ThyssenKrupp em Duisburg. Ele não tem a menor dúvida de que o intercâmbio sindical sobre as condições de trabalho nas unidades brasileiras da ThyssenKrupp contribuiu para uma nova abertura por parte da direção da empresa. Com relação aos trabalhadores, ele

faz uma autocrítica: “Antigamente não tínhamos maior interesse no diálogo, só reclamávamos.“ Pouco a pouco seriam desenvolvidos “novos mecanismos de comunicação“, assim e.g. na comissão de segurança no local de trabalho, prescrita por lei. Mas ainda haveria uma profunda desconfiança de ambas as partes. “Na fábrica, o trabalho sindical ainda continua enfrentando dificuldades, mas na frente do portão da fábrica podemos atuar sem problemas.“ A direção da empresa acaba de apresentar um plano detalhado de ações e prometeu investir nos próximos cinco anos quatro milhões de euros na melhoria das condições de trabalho.

“Antigamente só reclamávamos“: Braguinha visita a ThyssenKrupp na Alemanha

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“O número de trabalhadores sindicalizados é muito reduzido“: Distribuição de volantes na frente do portão da ThyssenKrupp Fundições

Brancos e ricos, pobres e negros

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Na avaliação de Braguinha, dois terços dos trabalhadores que fazem o trabalho pesado na fundição são negros. Já os funcionários dirigentes são todos pessoas de pele clara. O sindicalista, que é mulato, avalia essa realidade da seguinte maneira: “Por trás disso não há nenhuma política intencional de discriminação, mas as coisas são assim no Brasil: os ricos são brancos, os pobres negros.“ Para os próprios trabalhadores a cor da pele não seria um tema: “Falta consciência“, afir-

ma Braguinha. O interesse maior é “que o trabalho se torne mais agradável – e os salários sejam aumentados.“ 90% dos trabalhadores na fundição ganham no máximo R$ 1.000,00 por mês pela semana de 44 horas, a metade deles não chega nem a R$ 600,00. Quando necessário, o trabalhador recebe um adicional por “insalubridade“ na forma de um valor fixo de R$ 52,00, no turno da noite ele recebe um adicional de 28%.


Braguinha, que trabalha no setor de manutenção, ganha por mês um saláriobase de 880,00.

jovens querem fazer horas extras, pois isso significa para eles um ganho adicional de 65 a 100%.“

Salários tão baixos dificultam colocar em pauta o tema da redução da jornada, diz o presidente do sindicato dos metalúrgicos, Luís Velasco. “É claro que a semana de 40 horas é um dos nossos objetivos, pois os companheiros da produção já estão trabalhando no limite da exaustão, e na passagem de um turno a outro o ritmo biológico também fica afetado. Mas muitos trabalhadores mais

Braguinha e Velasco admitem também ser especialmente difícil entusiasmar os trabalhadores jovens para que se engagem no sindicato. O núcleo duro dos ativistas está em torno dos 40 anos, não existe um grupo de trabalhadores jovens. Braguinha arrisca uma esperança: “Talvez isso mude quando eles se derem conta de que as condições de trabalho efetivamente melhoram.“

“Os companheiros estão trabalhando no limite da exaustão“: trabalhador na fundição de Barra do Piraí

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Pragmatismo no lug Os sindicalistas brasileiros efetuaram uma correção de rota

O grupo ThyssenKrupp mantém 17 filiais com aprox. 8.500 trabalhadores e trabalhadoras no Brasil. No mercado sul-americano mais importante para uma multinacional, ele está representado em todos os seus assim chamados segmentos. De especial importância é o seu papel de fornecedor da indústria automobilística – a fábrica em Campo Limpo (São Paulo) já foi fundada em 1959. Nos Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais o grupo mantém duas fundições. A fábrica de elevadores na proximidade de Porto Alegre é uma das maiores do Brasil. As empresas no Brasil não estão, porém, subordinadas a uma holding nacional, mas à respectiva direção do seu setor de negócios na Europa.

Lento processo de democratização: Ventura (à direita) com sindicalistas alemães e brasileiros

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A estrutura extremamente múltipla, descentralizada, e as grandes distâncias no Brasil dificultam muito o intercâmbio entre os trabalhadores das diferentes unidades. Acresce também a estrutura muito heterogênea dos sindicatos brasileiros: eles não estão organizados por empresas, mas regionalmente, segundo setores, e multiplamente fragmentados segundo a orientação política (existem atualmente aprox. 12.000 sindicatos individuais). Os assalariados da ThyssenKrupp Elevadores com a sua fábrica e as dez unidades de manutenção e administração distribuídas por todo o território brasileiro estão organizados em 29 diferentes sindicatos.

Além disso os sindicalistas brasileiros têm poucos direitos em comparação com os seus colegas europeus: a legislação não prevê a atuação dos sindicatos nas empresas, de modo que esta somente é possível em casos excepcionais. “Os nossos empresários são muito conservadores“, diz Clóvis Scherer do instituto de pesquisa sindicais Observatório Social. E as multinacionais norte-americanas também estão interessadas em manter reduzido o poder dos sindicatos. Em comparação com essa atitude, a posição de Manuel Ventura afigura-se progressista. À semelhança da sua pátria espanhola, o Brasil teria passado por um lento processo de democratização. Tanto os empresários quanto os trabalhadores teriam “amadurecido“, conforme acredita o diretor da ThyssenKrupp Elevadores em Guaíba. No lugar da agitação política, o pragmatismo seria hoje a atitude predominante. Elisandro Marques, do sindicato local dos metalúrgicos, confirma essa avaliação. “Hoje não se consegue nada com palavras de ordem banais“, afirma o ativista sindical de 29 anos. Ele espera pela consolidação de uma parceria social entre os trabalhadores e a direção da empresa, “tal como a existente na Alemanha“. Mas o caminho a ser percorrido ainda é muito longo: só cerca de 20% dos trabalhadores da ThyssenKrupp na Região de Porto Alegre estão sindicalizados. Na opinião de Manuel Ventura, a posição relativamente fraca do sindicato dos metalúrgicos é uma conseqüência dos benefícios sociais progressivamente implantados pela empresa, mas também do número reduzido de sindicalistas experientes. “Isso muda aos poucos, e o intercâmbio com os companheiros alemães e holandeses sem dúvida contribuiu positivamente nesse processo“ – eis o elogio de Ventura ao projeto do Observatório Social.


gar de palavras de ordem A ThyssenKrupp representada em todos os ’segmentos’: tambores de freio em Barra do Piraí

12.000 sindicatos individuais: trabalhadores de fundição num bate-papo

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O executivo dos trab Thomas Schlenz é o presidente da comissão de trabalhadores do grupo ThyssenKrupp

presidente da comissão de trabalhadores do grupo. Faz questão de dizer que não está viciado em trabalho. Na condição de representante dos trabalhadores, Schlenz tem assento no conselho fiscal da ThyssenKrupp AG, onde ele discute em pé de igualdade com a diretoria. Talvez seja necessário adaptar-se aos hábitos de trabalho da outra parte, para não ser eliminado de saída do campeonato. Schlenz sempre precisa estar a par das muitas coisas que acontecem no grupo: “O que ainda são negócios centrais na ThyssenKrupp às 11:55 hs, talvez não o sejam mais às 11:57 hs.“ E na iminência de decisões importantes os companheiros querem saber o mais tardar às 12:00 hs em que direção o grupo se move. Schlenz se compreende como um prestador de serviços para os seus colegas das comissões de trabalhadores dos cinco segmentos empresariais do grupo. Na sua opinião a comissão de trabalhadores do grupo funciona como um computador central: “A nossa missão mais importante é coletar informações e distribui-las aos canais competentes, para que os destinatários possam reagir à altura.“ Num grupo com 100.000 assalariados e 800 empresas individuais apenas na Alemanha esse trabalho consome muito tempo. “É necessário conhecer os lugares mais recônditos do grupo.“ Falando em pé de igualdade com a direção: Thomas Schlenz, presidente da comissão de trabalhadores do grupo

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Thomas Schlenz nunca trabalha menos de doze horas por dia. Procura ficar livre nos fins de semana, mas isso também está se tornando cada vez mais difícil nos últimos tempos. Seu carro de serviço percorre aprox. 75.000 km anuais pelas autoestradas alemãs. A isso se acrescentam incontáveis milhas voadas. No último ano ele se concedeu duas semanas de férias sem interrupção e foi com seus irmãos à Croácia. “Mas depois de uma semana eu já fiquei novamente agitado“, diz ele. Esse homem com agenda de trabalho de um executivo de primeiro escalão é o

Schlenz não só trabalha como um executivo do primeiro escalão. Às vezes ele também fala assim. Torneiro mecânico de formação, ele prestidigita com conceitos como agência de rating, mercado de capitais ou avaliação de riscos, como se nunca tivesse feito outra coisa na vida. Familiarizou-se com a matéria. O presidente da comissão de trabalhadores do grupo deve saber o que está sendo discutido, quando e.g. em 2003 a agência de avaliação norte-americana Standard & Poor’s contabilizou repentinamente na conta das dívidas as provisões do grupo para o pagamento de aposentadorias, o


balhadores que resultou em uma avaliação mais negativa da empresa e na queda das ações. Schlenz reagiu com indignação e falou de „mudança das regras no meio da partida“. Agora ele precisa lidar com as conseqüências dessa avaliação. Depois dessa mudança das regras o conselho fiscal anunciou que a ThyssenKrupp pretende desfazer-se de 33 empresas espalhadas pelo mundo inteiro, por razões estratégicas. O presidente da comissão de trabalhadores do grupo vê isso com outros olhos: “Os constrangimentos impostos pelo mercado de capitais induzem a empresa a essas vendas. Não se trata de nenhuma medida de caráter estratégico.“ Juntamente com os representantes dos trabalhadores no conselho fiscal, Schlenz elabora pareceres sobre as vendas planejadas. Se os acionistas estiverem a favor das vendas, ele e seus companheiros não poderão evitá-las, pois os outros detêm a maioria dos votos no conselho fiscal. “Podemos, porém, condicionar as vendas“, afirma Schlenz, que tem idéias bastante precisas acerca do perfil dessas condições. O grupo deverá procurar um “best owner“, que garanta, no caso ideal, que os assalariados não percam o seu emprego.

Até a última bala Schlenz se faz presente onde os companheiros e as companheiras temem pelos seus empregos. Freqüenta assembléias de trabalhadores nas empresas e participa de manifestações de protesto. O presidente da comissão de trabalhadores do grupo luta com os colegas, e às vezes ele também precisa admitir a derrota, como no caso da fábrica de elevadores em Mylau/Saxônia. Quando a ThyssenKrupp anunciou o fechamento, o presidente da comissão de trabalhadores do grupo entrou em ação. Desenvolveu uma concepção, de como a operação poderia ser continuada com a redução do quadro de

pessoal e subsídios de fomento. Não obstante a fábrica foi fechada. Só mais tarde Thomas Schlenz soube de que decisão não fora motivada por motivos econômicos, mas estratégicos. “Lutamos até a última bala“, diz ele, e suas palavras soam como se ele ainda não tivesse absorvido inteiramente a dor da derrota. Há, porém, também êxitos. No âmbito de um programa interno de otimização o presidente da comissão de trabalhadores do grupo propôs a elaboração de um programa intitulado “TK the best inhouse“: “Com ele nós conseguimos manter empregos e evitar a terceirização.“ Quando a fábrica Krupp Automotive System, sediada na Saxônia, quis contratar trabalhadores terceirizados, foi possível repassar o encargo a um prestador de serviços da ThyssenKrupp AG. O grupo estaria também racionalizando a reserva e compra de passagens para viagens de serviços: “Antigamente comprávamos as passagens em 102 agências de viagens. Hoje trabalhamos com duas, uma das quais pertence à ThyssenKrupp.“ O tema central do presidente da comissão de trabalhadores do grupo são os assalariados na Alemanha. Mas Thomas Schlenz viaja regularmente para o exterior: “No conselho fiscal se discute sobre decisões e investimentos em escala mundial; precisamos estar em condições de participar dessa discussão.“ Quando o projeto do Observatório Social estava na pauta, Schlenz viajou também para o Brasil, para convencer a direção das empresas pesquisadas da conveniência de uma cooperação. Além disso ele combinou com a direção do grupo o envio de um especialista em segurança no local de trabalho, para examinar as causas mais profundas do acúmulo de acidentes de trabalho em Barra do Piraí. Thomas Schlenz acredita que a atitude de cooperação em tais atividades é também “uma questão que diz respeito à imagem da empresa“.

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O ’balcão central de dos representantes d Peter Scherrer é responsável pelo acompanhamento do grupo ThyssenKrupp no sindicato dos metalúrgicos (IG Metall)

Poucas pessoas na ThyssenKrupp conhecem os cantos mais recônditos do grupo. Do lado dos trabalhadores, duas são essas pessoas: Thomas Schlenz, presidente da comissão de trabalhadores do grupo, e Peter Scherrer, responsável pelo acompanhamento do grupo ThyssenKrupp no sindicato dos metalúrgicos (IG Metall). “Visto nessa perspectiva, sou uma parte da dupla Schlenz/Scherrer“, comenta Peter Scherrer. O sindicalista trabalhou duramente para acumular esse conhecimento. Está na sua nova função há um ano e meio e passou a maior parte do tempo aprendendo. A ThyssenKrupp cresceu por meio de várias fusões. A empresa compõe-se atualmente de cinco grupos individuais, nos quais operam 43 conselhos fiscais. É difícil orientar-se nessa barafunda, formada só na Alemanha por aprox. 800 empresas individuais. Entrementes Peter Scherrer conhece bastante bem as diversas regras de co-gestão. Nas empresas oriundas da indústria produtora de aço, sujeitas à Lei de Co-gestão da Indústria do Carvão e do Aço, a participação das comissões de trabalhadores e dos sindicatos é um fenômeno perfeitamente normal para os empregadores. “Nessas empresas há um sentimento muito pronunciado em favor da co-gestão“, diz Scherrer. Em outras Responsável pelo acompanhamento de 800 empresas individuais: Peter Scherrer com membros da da comissão de trabalhadores da ThyssenKrupp no Brasil

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áreas, assim na produção de elevadores, as relações predominantes em algumas unidades lembram um verdadeiro faroeste. Sobretudo nas empresas pequenas os assalariados muitas vezes estão mal organizados.

Conselhos fiscais de composição paritária Em algumas unidades nem há comissões de trabalhadores, vale a lei do mais forte. Aqui o diretor da fábrica eventualmente apresenta uma proposta aos assalariados que Scherrer somente consegue qualificar como “obscena“. Assim um produtor de elevadores para deficientes físicos está momentaneamente negociando com seus vendedores uma redução do salário fixo. Até agora os vendedores estavam trabalhando em parte segundo o sistema de comissões, recebendo um salário mensal fixo definido em contrato coletivo de trabalho, no valor de aprox. 2.200 euros. O empregador pretende reduzir esse salário fixo a 1.000 euros. Mas como a empresa está vinculada ao contrato coletivo de trabalho, ela só consegue fazer isso mediante


atendimento’ dos trabalhadores A influência dos trabalhadores não deveria ser subestimada: Produção de escada rolantes em Hamburgo a anuência do sindicato. Tais conflitos não necessariamente devem ser enfrentados pelo responsável pelo acompanhamento do grupo. Normalmente os secretários da IG Metall fazem isso no lugar. “Mas quando temos a sensação de que isso poderia repercutir no grupo, eu vou até o local e participo das negociações“, diz Scherrer. Com relação à sua tarefa mais importante enquanto responsável pelo acompanhamento do grupo, o sindicalista se define como ’balcão central de atendimento’ dos representantes dos trabalhadores no grupo ThyssenKrupp, quando se trata de regulamentar a co-gestão. Afinal de contas a IG Metall, o Sindicato dos Metalúrgicos, é o parceiro da empresa, por força do contrato. Assim o sindicato acertou com a diretoria da empresa que os acionistas cedessem parte dos seus mandatos a representantes dos trabalhadores. Por isso muitos conselhos fiscais na ThyssenKrupp apresentam uma composição paritária, enquanto a Lei de Organização das Empresas prevê apenas um terço dos mandatos para os trabalhadores. Scherrer acha que a influência dos trabalhadores não deveria ser subestimada. Até agora ele não vivenciou nenhuma votação de enfrentamento no conselho fiscal. Já houve votos contrários isolados aqui e ali, mas não um conflito de verdade: “A direção da empresa faz questão que as decisões no conselho fiscal sejam tomadas com a máxima unanimidade possível“. Não se deve esquecer que a ThyssenKrupp é uma empresa

cotada na Bolsa de Valores. Conflitos no conselho fiscal nunca repercutem bem na bolsa e podem fazer cair as ações.

Grupo de Monitoramento Conjunto Os conselhos fiscais discutem as estratégias e os planos de investimentos da empresa. “Se quisermos fazer valer aqui os nossos interesses, necessitaremos de uma estratégia própria“, diz Scherrer. Isso só funcionará se os representantes dos trabalhadores promoverem um intercâmbio de experiências e informações. Como os conselhos fiscais individuais se concentraram até agora na parte do grupo que lhes diz respeito, o sindicalista sugeriu a criação do Grupo de Monitoramento Conjunto. Há um ano encontram-se aqui os membros dos conselhos fiscais dos diversos segmentos da ThyssenKrupp. “Preciso saber também olhar para além da cerca da ThyssenKrupp“, enfatiza Peter Scherrer. Quando o produtor de aço Arcelor quis reduzir capacidades de produção na sua unidade em Bremen, a IG Metall se pronunciou contra demissões de trabalhadores. Para a ThyssenKrupp a redução das capacidades de produção do concorrente em Bremen talvez até tivesse sido vantajosa. Mas Scherrer acha que um sindicalista não deveria pensar assim: “Afinal de contas, estou lutando para preservar todos os empregos.“

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“Na Alemanha ninguém precisa passar fome“ O sindicalista Elisandro Marques trabalha na fábrica de elevadores em Guaíba

tanto no trabalho com a geração jovem quanto nas comissões de trabalhadores. Para mim esse é um modelo de Primeiro Mundo. Parece um sonho para nós, pois ainda estamos muito distantes disso. Os empresários alemães têm também uma visão distinta da dos brasileiros. Na VW nos disseram que se os trabalhadores ganham bem, eles podem consumir mais, comprar mais automóveis, o que resulta em mais trabalho e maior renda. As relações entre os sindicatos e as empresas também são diferentes. Aqui o sindicato fala mal da empresa na frente do portão da fábrica. Na Alemanha também, mas penso que a empresa aceita melhor o sindicato e trata-o com maior respeito. Ao menos essa foi a impressão que tive durante a minha permanência de três semanas na Alemanha. A Alemanha é um país muito rico, que dá aos seus cidadãos a possibilidade de viver de forma mais ou menos decente. Ao menos o mínimo está garantido. Nenhum desempregado precisa passar fome.

“Fiquei muito impressionado com a pontualidade“: Elisandro Marques, sindicalista

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“Penso que o sistema sindical alemão já deveria ter sido introduzido há muito tempo no Brasil. Os sindicatos alemães estão muito bem organizados,

Fiquei muito impressionado com a pontualidade dos alemães. Mas talvez eu não seja muito objetivo nesse tocante, pois também tenho antepassados alemães. No meu trabalho eu dou muito valor à pontualidade das pessoas. De resto e em geral, os alemães nos trataram de forma imensamente simpática. Aqui sempre se ouve dizer que eles seriam frios e distanciados. Eu não tive essa impressão. Fizemos amizade com os companheiros que nos acompanharam durante os vinte dias na Alemanha. Isso foi muito tocante.“


“Eles ficaram mais próximos de nós“

Annette Wille é integrante da comissão de trabalhadores e delegada sindical para portadores de deficiências graves na unidade de fundição de injeção sob pressão Fritz Völkel

“Quando penso no Brasil, penso em florestas tropicais, palmeiras e praias. Deve ser um país muito bonito, mas também um país cheio de contrastes. Penso que lá existe a pobreza extrema, mas também a riqueza extrema com toda a ostentação e todo o fausto que se pode imaginar. A visita dos companheiros brasileiros me conscientizou plenamente das deficientes condições de trabalho vigentes nesse país. Há discriminação racial no preenchimento de vagas, trabalho infantil e trabalho forçado. A segurança no local de trabalho também não pode ser comparada com os nossos padrões. A existência de mais de 12.000 pequenos sindicatos no Brasil certamente é uma das causas dessas condições ruins. Se tivéssemos na Alemanha dez sindicatos diferentes apenas no setor metalúrgico, a situação aqui seguramente também seria diferente. A conversa com os brasileiros mostrou-me que todos somos companheiros. Eles ficaram um pouco mais próximos de nós.“

“Adquiri consciência das deficientes condições de trabalho no Brasil“: Annette Wille, membro da comissão de trabalhadores

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“Um passo importan Sindicalistas criam uma rede para as unidades sediadas no Brasil

dades da ThyssenKrupp criaram em São Paulo uma rede que cobre todo o território brasileiro. O tema central do encontro foi a continuação da cooperação dos representantes dos trabalhadores. “Na Alemanha existem estruturas efetivas e eficazes de defesa dos interesses no interior de um grupo de empresas“, afirma Scherer. “Queremos criá-las também para as companheiras e os companheiros no Brasil.“ A coordenação da rede foi assumida por Elisandro Marques da ThyssenKrupp Elevadores de Guaíba e por João Cardoso da fábrica de virabrequins em Campo Limpo. No topo da agenda figura o intercâmbio permanente de informações entre os sindicalistas sobre o que acontece nas unidades da ThyssenKrupp no Brasil. No gigantesco país tropical a comunicação eletrônica é o meio mais qualificado e confiável para esse intercâmbio. A partir de agora um Boletim Mensal online deverá assegurar a transmissão de informações rápidas e diretas. Uma vez por ano os integrantes da rede pretendem encontrar-se, para discutir temas referentes às suas empresas, tais como salários, preservação dos empregos e segurança no local de trabalho, formação e qualificação, bem como a participação dos trabalhadores.

“Acomodar as correntes distintas debaixo de um teto“: Clóvis Scherer, Coordenador do Projeto do Observatório Social

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“Não foi fácil acomodar as correntes distintas debaixo de um teto“: eis o balanço de Clóvis Scherer, diretor do projeto realizado pelo Observatório Social. “Mas demos um passo importante.“ Em agosto de 2004 sindicalistas de seis uni-

O encontro em São Paulo tinha sido precedido de uma pesquisa realizada pelo Observatório Social, que procurou verificar se as normas fundamentais do trabalho internacionalmente vigentes estão sendo observadas nos grandes grupos empresariais. A ThyssenKrupp foi uma das primeiras grandes empresas alemãs que se declarou disposta a cooperar na realização desse projeto de pesquisa. A pesquisa verificou as condições de trabalho e as possibilidades de defesa dos interesses dos trabalhadores. Foi formulada uma crítica inequívoca com relação à proteção da saúde dos trabalhadores na fundição em Barra do Piraí.


nte“ “O aumento dos acidentes de trabalho evidencia a necessidade de medidas urgentes“, enfatiza Clóvis Scherer. A direção da ThyssenKrupp Automotive reagiu prontamente. Gerd Kappelhoff, Diretor de Trabalho nesse segmento do grupo, viajou ao Brasil e informou-se in loco. Pouco tempo depois a empresa apresentou um programa de ações para melhorar a segurança no local de trabalho. “Esse programa está sendo implementado coerentemente e consolidado com os investimentos necessários“, informa Kappelhoff. A direção da empresa reforçou as atividades de treinamento no trato com máquinas e materiais, adquiriu também máscaras protetoras melhores e sapatos protetores. Um meio para evitar acidentes são as “conversas diárias sobre segurança“, que objetivam informar de forma tópica os trabalhadores na fundição, que atuam em lugares com riscos de acidentes especialmente elevados. Um comitê de segurança, do qual participam o diretor da empresa e representantes dos traba-

lhadores, realiza reuniões semanais para desenvolver e implementar propostas e idéias. O grupo ThyssenKrupp está investindo mais de seis milhões de euros em um programa de proteção ambiental. “Alegra-me constatar que a diretoria da ThyssenKrupp revela um espírito tão pronunciado de cooperação e apóia as atividades dos trabalhadores, disse Thomas Schlenz, presidente da comissão de trabalhadores do grupo que veio especialmente a São Paulo. A legislação trabalhista brasileira não prevê um fundamento jurídico para a nova rede. Mas os trabalhadores sindicalizados puderam participar do encontro de dois dias sem sofrer cortes salariais. A Thyssen Krupp assumiu também outras despesas do encontro. Eis a avaliação de Thomas Schlenz: “Na Alemanha se afirma com freqüência cada vez maior que a co-gestão não figura na parada de sucessos das exportações, mas tudo sugere que as empresas apreciam as vantagens de uma participação qualificada dos trabalhadores nos processos decisórios.“ Elevado risco de acidentes: local de trabalho na fundição

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Expediente Observatório Social Europa Naritaweg 10 1043 BX Amsterdam Países Baixos Fone.: 0031 20 5816 651 Fax: 0031 20 6844 541 e-mail: Karen.Brouwer@vc.fnv.nl www.observatoriosocialeuropa.org DGB Bildungswerk Rede Norte–Sul Hans-Böckler-Straße 39 40476 Düsseldorf Alemanha Fone.: 0049 211 4301 592 Fax: 0049 211 4301 500 e-mail: manfred.brinkmann@dgb-bildungswerk.de www.nord-sued-netz.de Sindicato dos Metalúrgicos na Alemanha - IG Metall Lyoner Straße 32 60528 Frankfurt Alemanha Fone.: 0049 69 66932 282 Fax: 0049 69 66932 028 e-mail: claudia.rahman@igmetall.de www.igmetall.de

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Redação Karen Brouwer Manfred Brinkmann

Textos Gerhard Dilger, Fabienne Melzer, Peter Scherrer, Karen Brouwer, Manfred Brinkmann

Revisão Thomas Gesterkamp, Peter Naumann

Fotografias Thomas Range, Gerhard Dilger, Karen Brouwer, Manfred Brinkmann, Manfred Vollmer, ThyssenKrupp

Illustrações Frank Maia

Editoração gráfica Gerhard Weiland

Tradução Peter Naumann

Impressão Tiragem 3.000 exemplares Publicado em janeiro de 2005 Publicado com apoio financeiro da União Européia e do Ministério de Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha

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