REVISTA ODISSEIA DA MEDICINA ED.02

Page 1



EDITORIAL

O “

que move o mundo não é a razão, mas a paixão” defende a filosofia. “O coração tem razões que a própria razão desconhece”. É o que afirmava o físico, matemático e escritor francês, Blaise Pascal, num misto de discurso parecido com o de Shakespeare que dizia: “Há mais mistérios entre os céus e a terra do que pressupõe a vossa vã filosofia”, confirmando a máxima: “A vida tem coisas que a própria razão desconhece”. Para ele, “todas as graças da mente e do coração se escapam quando o propósito não é firme”. A vida em sociedade traz matizes dos mais variados e a mente é que dita o ritmo da relação social. Odisseia da Medicina traz, nesta edição, o descompasso psíquico-emocional, por meio do artigo escrito pelo pós-doutor em Direito, Kléber Veloso, que faz uma análise sobre psicopatia e sociedade. O escritor traça importantes informações que delineiam o perfil psicopático no contexto social. Saúde é uma dádiva. Uns a têm em abundância, enquanto outros correm para conquistá-la. Para uns, a vida está por um fio e se agarram a ela sempre à mercê das benesses, dos desafios e conquistas da ciência. Diante de uma enfermidade, todos preferem que o diagnóstico venha, pelo menos,

P

hilosophy advocates that “passion, rather than reason, moves the world”. Similarly, the writer, mathematician and physicist Blaise Pascal wrote that “The heart has reasons that reason cannot know.” He echoes a famous quote by Shakespeare: “There are more things in heaven and earth, Horatio, than are dreamt of in your philosophy.” Along his line of thought, one could say that life has things that even reason cannot know. Life in society brings various nuances and mind dictates the rhythm of social relationships. In this issue, Odisseia da Medicina brings an enlightening discussion about the mismatch between psyche and emotion. In this article, Kléber Veloso, post-doctoral Law fellow, analyzes the relationship between psychopathy and society. He points out important elements that define the typical psychopathic profile in a social context. Good health is a gift. Some of us have it in plenty. Others strive to achieve it. Those with less fortune keep life like they are at the brink of losing it. They cling themselves on to every achievement of science that can extend their life. When facing a fatal disease, we always expect the diagnostic will

em 30 minutos ou, se não for possível remediar o que remediado está, que a dor seja amenizada. Em meio a conquistas e desafios, investimentos tecnológicos são cada vez mais necessários. Tal conquista é abordada em artigo assinado por Joel de Sant´Anna Braga Filho, Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia de Goiás. Chegado recentemente da Rússia, fala sobre a busca e conquista de parcerias para a condução de um processo de ponta para incremento da política de radioterapia no Estado. Falar sobre saúde deve reportar, também, ao termo vitalidade. Odisseia da Medicina dá destaque à sexualidade, seja no trato psicológico das disfunções ou na divulgação de inovações, como é o caso da reposição hormonal também para o homem, assunto que, para muitos, ainda é tido como um tabu a ser quebrado ou driblado. Seria a ciência hipocrática guerreira na busca incessante de respostas a desafios históricos, como desatar o Nó Górdio, narrado tão brilhantemente pelo Dr. Evaldo D´Assumpção? Ele instiga à análise que perpassa o código de deontologia médica, ao tratar do impedimento

ético da utilização de técnicas inovadoras em doentes terminais, na promoção de melhoras momentâneas ou evitando sofrimentos ainda mais drásticos. Nesse contraponto, entra ainda a pressão da indústria farmacêutica, que investe pesado, tal como o procedimento da indústria mecânica. No último caso, lançam máquinas capazes de manter vivo um corpo doente, além do previsível, à revelia do relógio biológico. Todavia, andam na contramão do que apregoam os defensores da vida, a todo custo. Até onde deveriam prevalecer tais investidas contra a ética? Argumentos consistentes permeiam o artigo “Ética: a ponte entre a filosofia e a biologia”, assinado, com propriedade, por Divina Marques, jornalista, doutora em Ciências Ambientais, mestre em Filosofia/Ética e especialista em Políticas Públicas. Mente e corpo são alvos diretos de atenção da Medicina e, portanto, são temas que merecem e ganham destaque especial na edição que você, leitor, tem em mãos.

somehow give us hope or, at least, that it will bring us some relief to our pain. In a world of endless challenges and achievements, continued funding in science and technology is more and more necessary. The current status of funding is discussed by Joel de Sant’Anna Braga Filho, Secretary of Science and Technology of the State of Goiás. Returning from a recent trip to Russia, he tells us about the search and construction of partnerships within the overall policy for radiotherapy in Goiás. When we talk about health, we cannot omit the issue of vitality. Odisseia da Medicina therefore reserves space for sexual health. That includes the psychological treatment of dysfunctions and the dissemination of new treatments, such as hormone replacement therapy for men, which is unfortunately viewed as a taboo subject among many, to be surmounted. Dr. Evaldo D’Assumpção brilliantly poses the question: is the Hippocratic science a tireless warrior seeking solutions to historical challenges, such as the Gordian Knot? In his article, he incites a discussion around the code of medical deontology

and exposes the ethical issues regarding the use of innovative techniques in terminal patients, which can bring brief improvements possibly at the cost of increased suffering. Adding to this conflict between improvements and pain, the pharmaceutical and equipment industry invests massively in new machines that can keep a failing body alive, against its biological clock, even beyond the original expectation of survival. Nevertheless, these technological achievements are being questioned by groups that defend life above everything. Where should we draw the boundaries between science and ethics? Sound arguments are found in the article “Ethics: a bridge between philosophy and biology”, signed by Divina Marques, journalist, doctor in Environmental Sciences, master in Philosophy and Ethics, and specialists in Political Sciences. Mind and body attract the attention of Medicine. These subjects receive deserved special attention in the present issue that you, reader, have in hands.

Boa Leitura!

Enjoy the reading!

03


ODISSEIA COMUNICAÇÃO Ano I número 2 JANEIRO-2010 www.odisseiacomunicacao.com.br Editor Kléber Oliveira Veloso Jornalista Responsável Coordenação Editorial Sueli Raul - DRT-GO/ 011263JP Redação Técnica Natércia Fonseca Tradução Murilo Louzeiro Tiago DESIGNER GRÁFICO ELBER FERNANDES Fotógrafo Edmar Wellington - MTb 1842 Marketing e Assinaturas KELLY CHRISTINA SILVA 00 55 (62) 9985-0808 MICHELLY LORETO 00 55 (62) 8417-4741 redação e correspondência odisseiadamedicina@gmail.com O disseia da M edicina é uma p u b l icação M E N S A L da A g ê n cia de Pu b l icidade e P r o pa ganda Odisseia Comunicação. A revista não se responsabiliza pelos conceitos emitidos nos a r t igos assinados . N E N H U M A PA RT E des ta r e v is ta p ode r á se r r e p r odu z ida ou t r ans mi t ida p o r q uais q ue r meios em p r egados, sem a au to r i z a ção p r é v ia , p o r esc r i t o, da agência, COM CRÉDITO DA FONTE.

04

05 ESPECIAL Transtorno da personalidade psicopática

17 Educação Crítica aos cursos “caça-níqueis” na área da saúde

08 SUS O trabalho médico e o Sistema Único de Saúde

18 Endocrinologia Falta de proteína exclusiva do cérebro desencadeia epilepsia

09 sintomatologia Cientistas encontram nova maneira de reduzir as dores causadas pelo câncer

19 HospitaIS DE GRIFE Excelência em atendimento

10 leucemia Chilenos descobrem tratamento que pode CURAR A LEUCEMIA 11 Ciência e Tecnologia Know-how a serviço do cidadão 13 DIAGNÓSTICO Descoberta da causa de doenças em 30 minutos 14 psicologia Tratamento para as disfunções sexuais 16 Odontologia Dente impactado afeta a saúde bucal

20 imunoterapia Além da quimioterapia e da radioterapia, há outra opção para tratar o linfoma 21 SAÚDE Aumento do número de idosos reflete MAIOR expectativa de vida 22 ORTOTANÁSIA A síndrome do “nó górdio” 24 UROLOGIA Reposição hormonal no homem 26 Cafeína A droga preferida 31 MASSOTERAPIA A importância da massagem 32 Ética A ponte entre a filosofia e a biologia


ESPECIAL

TRANSTORNO DA PERSONALIDADE PSICOPÁTICA KLÉBER OLIVEIRA VELOSO

O

transtorno da personalidade psicopática é um desequilíbrio psíquico grave que faz a pessoa se comportar contra os

padrões estabelecidos pela sociedade. É uma variação mórbida da personalidade. Dito de outro modo, é uma deformação das qualidades morais do caráter. Esse distúrbio, em termos acadêmicos, é sinônimo de personalidade antissocial ou sociopática. Apesar de existir desde muito, é recente o seu conceito. Esse transtorno alcança, em maior ou menor escala, a população mundial na ordem de 4%. Desse percentual, 1% é do sexo feminino e 3% do sexo oposto, diferença semiológica ainda não decifrada. A Organização Mundial de Saúde o considera uma patologia e encarta a Classificação Internacional de Doenças. O córtex órbito-frontal, o córtex pré-frontal e toda a complexa engenharia do sistema límbico

Kléber Oliveira Veloso. Pós-doutor em Direito Penal pela UFSC. Doutor e mestre em Direito Penal pela Universidade de Barcelona. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela UFGO. Graduado em Direito pela UCGO. Membro das Comissões do MEC/SESu/INEP para avaliação, autorização, supervisão, credenciamento e reconhecimento dos cursos de graduação e de pós-graduação em Direito. Membro Fundador da Academia Goianiense de Letras. Avaliador Técnico do CEE. Professor.

hospedam esse distúrbio psíquico. Ele se ancora

comportamentais adequados. O portador do

pela inativação do sistema nervoso simpático,

na hipofunção das amígdalas, interligadas aos

distúrbio não traz consigo, face a essa insu-

situando-o à margem da normalidade psicoe-

hemisférios cerebrais. Ao estabelecer a comu-

ficiência psíquica, sentimentos nobres, como

mocional. É, portanto, imperturbável, indiferente

nicação entre as amígdalas e a região límbica,

o amor e a compreensão.

e sem inquietação.

ocorre um déficit na transmissão das conexões

A semiologia do transtorno se estabelece

O psicopata é blindado por um ego-

cerebrais, desviando-se do seu curso normal, ao

pela ausência de um comportamento neuro-

centrismo extremo, buscando sempre a

conduzir os impulsos magnéticos. Isso provoca

cognitivo pró-social. O psicopata é desprovido

satisfação, única e inconfessável, dos seus

um desencontro entre a decisão a ser tomada e

da capacidade de estabelecer e de assimilar

interesses. Ele está inserido em todos os

o comportamento reputado coerente. Não há,

conexões emocionais com quaisquer pessoas,

tecidos sociais, constitui família e, não

por esse motivo, uma perfeita sintonia entre as

de aprender com as máximas da experiência,

raras vezes, é admirado por sua beleza,

emoções, elaboradas no sistema límbico, e a

bem como de obstar os seus impulsos asso-

inteligência, carisma e pelo seu dinheiro.

sua razoabilidade, formada nos lobos frontais.

ciais. Isso resulta na impossibilidade de ele

Frequentemente, utiliza-se desses atribu-

Essa deficiência neurocognitiva não aciona os

se emaranhar num legado transpessoal, pois

tos para ludibriar pessoas, dissimulando

marcadores somáticos, o que isenta a conduta

o seu mecanismo psíquico diverge daquele

sua atroz personalidade, conjugando, por

a ser adotada de constrangimento moral, de

de uma pessoa normal. Ele não tem noção do

exemplo, dotes intelectuais ou artísticos,

escrúpulos e, por isso, destoa dos repertórios

bem comum e os laços sentimentais inexistem

com um desequilíbrio real de afetividade. 05


ESPECIAL

O distúrbio impede a pessoa de sentir remorso pelo erro praticado, de aprender com ele, apesar de essas conformações variarem entre os seus portadores. Assim, é incapaz de se colocar no lugar do outro, de sentir afeto e emoção, de modo que a desgraça ou sofrimento alheio não lhe diz respeito. Daí, a emissão de julgamentos morais apressados, superficiais e descaridosos, decorrente dessa dinâmica antissocial. O amor ao próximo está longe, muito longe, de se considerar uma das suas virtudes. A sintomatologia do transtorno se manifesta durante toda a vida da pessoa. Ela se inicia na infância, tonifica-se na adolescência e perpassa a vida adulta. Esse distúrbio pode ser abúlico, amoral, astênico, compulsivo, delinquente, explosivo, fanático, hipocondríaco, histérico, inadaptável, inseguro, ostensivo, sexual, dentre outros. Os perfis leve e moderado de gravidade do transtorno, se identificados precocemente, podem ter o seu avanço impedido por meio de regras educacionais e religiosas, chegando ou não a modulá-los. O perfil severo é incorrigível e, se a pessoa tiver traços perversos e

>> Psicopatia: a ausência de perfeita conexão entre as amígdalas e os hemisférios cerebrais impede a ativação do sistema nervoso simpático.

indômitos, pode evoluir para o canibalismo e

comportamento fantasioso, em que se tenta

face à multiplicidade de parceiros sexuais;

para outras degenerescências.

adaptar a realidade à imaginação; exacerbado

dificuldade para construir e manter amizades;

Na infância, esse desequilíbrio psíquico se

zelo com as emoções e os interesses pessoais

estilo de vida parasita; “frieza” comportamental;

manifesta como alterações comportamentais

e nenhum com os alheios; fascinação pelo

incapacidade de se responsabilizar por suas

perceptíveis: afeição às brigas, às intimidações,

poder; incapacidade de elaborar sentimentos

ações, em particular pelos compromissos

às humilhações e à violência física contra amigos

nobres; iniciação ao uso de drogas; insensi-

financeiros e morais; inconstância nos empre-

e animais; caráter dissimulado; desrespeito à

bilidade emocional; megalomania; mitomania;

gos; manipulação de estados mentais alheios

autoridade dos pais e dos professores; desapego

prática de atos de vandalismo; propensão a

para alcançar o que deseja; prática de crimes

aos sentimentos familiares; fácil colerização;

falecer prematuramente por meios violentos;

bárbaros; quando pais, utilizam os filhos para

imediatismo; indisciplina; mentiras contumazes;

rebeldia; sexualidade exaltada; trapaças pelo

atingir os seus objetivos, não lhes respeitando

reduzida tolerância à frustração; trapaças para

prazer, para citar alguns.

as escolhas; reduzida intuição; violência do-

obter vantagens em jogos pueris, dentre outras.

O adulto portador do distúrbio mantém

A adolescência é um estágio da vida em que

uma cadência de comportamentos, sendo:

o transtorno mais se evidencia. Essa etapa se

agressões diversas; ausência de ansiedade, de

O Direito brasileiro não considera esse

potencializa pelos seguintes comportamentos:

baixa auto-estima, de depressão, de piedade,

transtorno uma doença e, se o psicopata co-

abandono frequente do lar; ausência de remorso

de sentimentos éticos e altruístas; chantagens

meter ilícito, será responsabilizado. Ele tem a

e de empatia com os sentimentos alheios; baixo

emocionais; desembaraço comportamental e

capacidade de entender - libertas intellectus – e

controle da impulsividade; busca de excitação;

loquacidade; dificuldades conjugais severas

de se determinar – libertas propositi – sobre o

06

méstica; vivência isolada e, quando realizada em grupo, busca lhe exercer o domínio.


ESPECIAL

ato que pratica, apesar de não se autodetermi-

topograficamente. Constataram-se alterações

dos caracteres hereditários, de modo que

nar com relação ao seu entendimento face aos

morfológicas e foram localizadas as regiões

filhos de psicopatas têm cinco vezes mais

déficits neurológicos existentes no lobo frontal.

onde residem as deficiências. Isso permite

chances de desenvolver o mesmo distúrbio.

Tem, portanto, hígida a sua curvatura cognitiva

elaborar medicamentos para atenuar, modular,

Apesar disso, a etiologia dessa insuficiência

e a exata consciência do seu comportamento

ou eliminar a anomalia. Possibilita, também,

afetivo-emocional ainda não foi devidamente

sociopático, não apresentando deficiência

estimular as regiões cerebrais específicas para

esclarecida, mesmo em se tratando de uma

algorítmica. Em função dessa desorganização

uma alteração comportamental, além da proba-

categoria nosológica que sempre despertou

afetivo-emocional, ele tem a sua própria lógica,

bilidade de microcirurgias neurofrontotalâmicas.

interesse nos estudiosos.

“definindo” o que é lei, o certo e o errado. Ele

As tentativas de tratamento – e aqui se incluem

O Brasil, na contramão de países mais

maquia a sua índole infratora.

as terapias – nem sempre potencializam efeitos

bem sedimentados culturalmente, ainda não

Cesare Lombroso (1835-1909), estudando

concretos, pois os psicopatas não lhes são

elaborou procedimentos capazes de identificar

antropologia criminal, disciplinou a personalidade

responsivos. É impossível tratar a ausência de

psicopatas e de ajudá-los por meio de um

psicopática como egressa de um determinismo

emoção, de afeto, de piedade e, mesmo, de fé!

planejamento institucional, inclusive de lhes

biológico. Nesta linha de raciocínio, indaga-se:

Um número significativo de atuais pesquisas

obstar o ingresso em determinadas categorias

a pessoa nasce criminosa? Sim, o psicopata

sugerem multideterminados fatores responsáveis

profissionais. O distúrbio é complexo e muito

infrator é o exemplo e, ao mesmo tempo, a

pelo transtorno. Dentre eles, destacam-se os

mais grave do que se imagina, pois é crescente

exceção. Seguramente, alguns crimes violentos,

sociais (extrínsecos, acidentais), os biológicos

o seu aumento em todas as sociedades e,

no mundo, são praticados por ele, como: cor-

(endócrinos, fisiológicos, hipofisários) e os

principalmente, pelos efeitos produzidos pelo

rupções várias, estupros, homicídios em escala

genéticos (genótipos). Estes têm prevalecido

comportamento dos seus portadores.

(serial killers), latrocínios, liderança de crimes

sobre os demais, pois se vinculam à manutenção

organizados, sequestros, terrorismo, torturas,

do código vital pela transmissão bioquímica

Eis, aí, um dos maiores desafios para a Medicina!

tráfico e vícios em drogas, dentre outros. Nem todos os psicopatas são criminosos e a recíproca é verdadeira. A maioria deles não é violenta e controla os seus impulsos comportamentais dentro de padrões toleráveis. Na senda criminal não há alcance psicológico se o psicopata for apenado. Ele não possui circuitos cerebrais suficientes para associar a reprimenda à supressão do comportamento ilícito, não dimensionando subjetivamente o dolo e nem a culpa. Por essa desconexão, é incapaz de se intimidar, de aprender e de modificar o seu comportamento, com a pena que cumprir! Daí as reincidências criminais. Na esfera cível, de igual modo, não há resultado efetivo e, condenado a indenizar a vítima, ele continuará agindo associalmente face à sua deficiência neurocognitiva. Graças aos estudos filogenéticos do distúrbio, bem como aos recentes avanços de investigação neurológica, por meio de neuroimagens, os cérebros de alguns psicopatas foram mapeados

>> Esse distúrbio neurocognitivo impede a elaboração de sentimentos nobres como o amor e a compreensão. 07


SU S

O TRABALHO MÉDICO E OS DESAFIOS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE JOSÉ GOMES TEMPORÃO

O

recém-comemorado Dia do Médico impõe uma reflexão sobre as atividades dos profissionais no Sistema Único de Saúde e desafios que temos a vencer. Temos empreendido esforços em qualificar a formação médica, melhorar suas condições de trabalho, buscar uma remuneração adequada e fixar os profissionais em áreas que não contam com a assistência desses profissionais. Inegavelmente, o SUS avançou: reduzimos a mortalidade infantil, nossas coberturas vacinais são referência para o mundo, fomos o primeiro país em desenvolvimento a universalizar a terapia antiretroviral, temos o maior programa público de transplantes do mundo. São avanços sanitários incontestáveis, por trás dos quais está o trabalho anônimo de profissionais, entre os quais estão, de forma muito particular, os médicos. Trata-se de uma qualificada massa de trabalhadores, formada num aparato escolar que cresce a cada dia, mas que, ao mesmo tempo, preocupa pela expansão desordenada. Uma comissão nomeada pelo Ministério da Educação, da qual participam o Ministério da Saúde e entidades médicas colocou sob supervisão as escolas menos consistentes. Mais de 50 escolas médicas recebem subsídios do Ministério para habilitar profissionais a trabalhar alinhados à importância de se pensar a promoção à saúde e à prevenção. Outra medida importante é o reconhecimento dos estudos dos brasileiros que, seja por quais motivos forem, estudaram no exterior. A primeira iniciativa para garantir regras claras e objetivas para todos foi a publicação de uma matriz de equivalências de conhecimentos e habilidades, envolvendo especialistas reconhecidos e universidades. Um projeto experimental funcionará ainda neste ano. 08

Ao lado da graduação, a especialização é tratada com igual importância. Temos que buscar uma ressonância entre a oferta de vagas na residência médica e as necessidades de saúde do país. Por isso, estamos lançando com o Ministério da Educação o Pró-Residência, por meio do qual poderemos chegar até a mil vagas adicionais de residência médica em curto período de tempo. Sou médico e conheço a realidade de muitos colegas que trabalham em condições precárias para atender longas filas de pessoas com sofrimento agudo. Venho discutindo com as entidades médicas a repactuação do trabalho médico, de forma a atribuir maior equidade entre os profissionais e melhores condições de trabalho. Evidentemente, isto não se dará sem um substantivo incremento do financiamento do SUS. Estou consciente de que não se formulam políticas de saúde corretas sem contar com aqueles que conhecem as necessidades de saúde de nosso povo. Por tal razão, tenho defendido vigorosamente a presença permanente de representação da categoria médica no Conselho Nacional de Saúde. O SUS tem o desafio de garantir a prestação de serviços nas áreas pobres, periféricas e desassistidas. Um conjunto complexo de intervenções, como a proposta de uma carreira nacional para cobrir estas áreas, o reforço à Estratégia de Saúde da Família, os incentivos ao repagamento de empréstimos educacionais são exemplos de medidas que estamos conduzindo. Mesmo com as dificuldades que temos, já fixamos dezenas de milhares de profissionais na Saúde da Família. Aproximamo-nos neste momento de mil pontos do Telessaúde, que permite o acesso a cursos de capacitação e ensino, além do recebimento de auxílio no diagnóstico de doenças, com troca de informações e exames, o que só era possível em grandes centros urbanos. Vamos aumentar as ofertas de especialização por Educação à Distância, bem como de atualizações e

aperfeiçoamentos. Esperamos fazê-lo em estreita parceria com as entidades médicas. Tenho defendido uma estrutura mais ágil de gestão das instituições públicas. A proposta de criação das fundações estatais de direito privado que está no Congresso Nacional permitirá uma remuneração melhor e a valorização das especialidades, bem como a apreciação pelo bom desempenho do profissional. O Ministério da Saúde reconhece a deterioração histórica das condições de trabalho dos profissionais de saúde e tem trabalhado para revertê-las. Não tenho dúvidas de que os avanços obtidos até agora são resultado do esforço cotidiano daqueles que, na ambulância, no posto de saúde, na residência do paciente, no consultório, no centro cirúrgico, na pesquisa ou na gestão nos ajudam a fazer do SUS uma das políticas sociais mais bem-sucedidas do mundo.

José Gomes Temporão. Ministro de Estado da Saúde. Doutor em Saúde Coletiva pela UERJ. Mestre em Saúde Pública pela FIOCRUZ. Especialista em Doenças Infecciosas e Parasitárias pela UFRJ. Especialista em Planejamento e Saúde e, em Saúde Pública, pela FIOCRUZ. Graduado em Medicina pela UFRJ. Membro do “Center Control Advisory Committee - World Health Organization”.


SINTOMATOLOGIA

CIENTISTAS ENCONTRAM NOVA MANEIRA DE REDUZIR AS DORES CAUSADAS PELO CÂNCER

P

esquisadores da Universidade de Heidelberg, no sul da Alemanha, descobriram a possível origem de fortes dores provocadas por cânceres. Os tumores liberam duas moléculas que deixam as células nervosas especialmente sensíveis e potencializam o crescimento do tumor, segundo um artigo publicado no site “Nature Medicine”. Os resultados da pesquisa, dirigida pela doutora Rohini Kuner, do Instituto Farmacológico da Universidade de Heidelberg, dão início a um novo enfoque no desenvolvimento de remédios para os pacientes de câncer.

A dor muito forte causada pelo câncer, cujas causas ainda são desconhecidas, é difícil de ser atenuada com remédios tradicionais como os opiáceos, que requerem altas doses, o que cria tolerância e efeitos colaterais. Os cientistas examinaram tecidos de ratos e determinaram as substâncias dos tumores: duas moléculas que, até agora, eram conhecidas como fatores de crescimento para as células-tronco que formam o sangue. O contato com essas moléculas faz com que as células nervosas próximas ao tecido cance-

roso sejam “consideravelmente mais sensíveis à pressão”, o que coincide com as descrições dos doentes que diziam que um simples toque na região afetada doía muito. Além disso, o crescimento do tumor também provoca dor, pois o tecido se expande e produz pressão. Os pesquisadores injetaram anticorpos nos tecidos dos ratos para bloquear as áreas de contato entre essas moléculas e as células nervosas, o que reduziu tanto o crescimento do tumor, quanto a sensibilidade das células. Agora será necessário fazer novas pesquisas para ver se o uso também é possível em tecidos humanos e, caso o resultado seja positivo, “seria concebível injetar essas ‘proteínas bloqueadoras’ diretamente no tumor e reduzir a dor e os efeitos colaterais”. Fonte: Agência EFE

09


LEUCEMIA

CHILENOS DESCOBREM TRATAMENTO QUE PODE CURAR A LEUCEMIA

U

ma pesquisa realizada por cientistas chilenos descobriu uma nova forma de tratamento para a leucemia que lança projeções otimistas para uma cura eficaz, já que os tratamentos contra a doença ainda são insuficientes. O hemato-oncologista chileno

dias, foi firmado um convênio, e a empresa investirá US$ 160 mil em dois anos para que os cientistas continuem a pesquisa. Anteriormente, Nervi havia iniciado os estudos em laboratórios da Universidade de Washington, em Saint Louis, nos Estados Unidos, onde permaneceu três anos

e cause menos danos. “Estamos buscando novas maneiras, além da quimioterapia, para injetar as substâncias, como de forma oral”, projetou, estimando que o estudo alcance ainda um modelo possível de se aplicar em outros tipos de tumor, como os intestinais,

Bruno Nervi e uma equipe de pesquisadores descobriram que as células precursoras da enfermidade - que se escondem na medula óssea dos indivíduos - devem ser extraídas da região e atacadas quando chegarem à corrente sanguínea. Segundo Nervi, “o câncer se origina porque algumas células normais da medula óssea ficam ‘loucas’. Utilizando ratos como cobaias, descobrimos que, quando a leucemia está em seu nicho, o lugar onde vive na medula óssea, ganha proteção dada pelo ambiente onde se encontra. Se somos capazes de desprender a leucemia da medula óssea, já podemos deixá-la mais vulnerável à quimioterapia”. O cientista justifica ainda que a pesquisa comprovou, por meio de uma droga, que as células da doença, transitoriamente, por algumas horas, se desprendem da medula óssea. “Quando elas se soltam e entram na circulação, ao injetar a quimioterapia medicamentos que entram pelo sangue -, as células precursoras da leucemia morrem. Nos próximos anos, estaremos aprendendo mais com estes mecanismos para entender se podemos usá-los em humanos, chegando à cura de mais pacientes”, afirmou. O avanço foi observado pela companhia Genzyme, empresa líder em biotecnologia no mundo, que se interessou pela investigação do doutor Nervi e seus colaboradores da Pontifícia Universidade Católica de Santiago. Há alguns

com outro grupo e retornou ao Chile em 2006. Nervi e sua equipe tentam, agora, encontrar um tratamento que seja mais efetivo

hepáticos e de mama.

10

Fonte: Jornal do Brasil


CIÊNCIA E TECNOLOGIA

KNOW-HOW A SERVIÇO DO CIDADÃO assistência aos seus pacientes, agregando pesquisa aos respectivos protocolos de tratamento. O centro tecnológico tem, dentre os seus muitos objetivos, o de melhor dimensionar os efeitos da radiação no corpo humano e as possíveis sequelas, face ao emprego terapêutico dos raios ionizantes, no tratamento de doenças cancerígenas. Há, também, o propósito de mapear as ciências nucleares, estabelecendo parcerias nacionais e estrangeiras, bem como a permuta de tecnologias transdisciplinares na área de radioterapia, de radiobiologia e de medicina nuclear. Com essas ações, os tratamentos oferecidos pelo centro tecnológico estarão aferidos pelos padrões internacionais de qualidade e de segurança, circunstâncias que repercutem diretamente na sua eficácia. Desse modo, serão criadas oportunidades para que novas pesquisas e conhecimentos sejam produzidos e colocados à disposição da sociedade, qualificando a vida e o bem-estar do cidadão, que dele irá se beneficiar.

JOEL DE SANT´ANNA BRAGA FILHO

O

avanços radiodiagnósticos, como a densitometria óssea, mamografia, radiologia digital, ressonân-

Governo de Goiás tem se comprometido

cia magnética, tomografia computadorizada,

com todas as políticas públicas que

ultrassonografia, dentre outros, utilizando-os

beneficiam os segmentos sociais, em

adequadamente e de forma otimizada. Equipa-

especial com o SUS. A Secretaria de Ciência e Tecnologia (Sectec)

sabe que Goiás, referência nacional em saúde,

mentos de última geração serão utilizados na área de produção de imagens para os serviços de saúde no Estado.

face à significativa demanda social, tem muitas

Goiás terá um moderno centro tecnológico de

conquistas a comemorar, dentre elas a sua

pesquisa, especializado em radioterapia, aliado à

renovação tecnológica e a modernização dos

tecnologia de ponta da CNEN, do INCA e do CNPq.

serviços radiodiagnósticos.

Possuirá, ainda, um acelerador linear, equipamento

Os programas coordenados pela Secretaria

de ponta, utilizado no tratamento de carcinomas.

de Ciência e Tecnologia estão mudando o perfil

Esse centro, um complexo científico avançado,

científico e tecnológico do Estado. A pasta tem

contará com equipamentos capazes de oferecer

a incumbência de dotar e de acompanhar os

melhor qualidade de vida às pessoas, ampliando a

Joel de Sant´Anna Braga Filho. Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia de Goiás. Especialista em Políticas Públicas. Graduado em Odontologia. Membro da Academia Goianiense de Letras. 11



DIAGNÓSTICO

DESCOBERTA DA CAUSA DE DOENÇAS EM 30 MINUTOS

U

m novo sistema de diagnóstico molecular capaz de avaliar simultaneamente até cem indivíduos, diagnosticar até cem doenças e gerar resultados em cerca de 30 minutos está sendo desenvolvido por uma rede de instituições de pesquisa e desenvolvimento tecnológico brasileiras. A rede é formada pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Biomanguinhos) da

Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) e o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP). Denominado microarranjo líquido, o teste é fruto de uma iniciativa de nacionalização de insumos e testes para diagnóstico. O estudo teve a etapa de laboratório concluída e já foi aprovado na prova de conceito. Atualmente, os pesquisadores estão na fase de desenvolvimento de protótipo.

Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Instituto Carlos Chagas (ICC), o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), a Empresa Brasileira de

A expectativa é que o primeiro protótipo seja finalizado até o final deste ano e, em 2010, estão previstos os estudos piloto e multicêntrico

necessários à validação e ao registro do produto na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Dentre os elementos que compõem o novo sistema de diagnóstico molecular estão uma placa com cem poços, sendo que cada poço possui cem tipos diferentes de esferas de cinco micrômetros de diâmetro, além de um equipamento que separa as microesferas individualmente, identifica o tipo de cada uma e verifica se são positivas ou negativas. No microarranjo, cada tipo de microesfera tem uma cor específica e pode ser revestido com material genético de um determinado patógeno, o vírus ou microrganismo causador de doenças. Como há cem tipos de microesferas, de cem cores distintas, o sistema pode testar até cem patógenos diferentes de uma só vez. Em cada poço da placa, as microesferas se misturam com o soro dos indivíduos e, como há cem poços por placa, até cem pessoas podem ser testadas por vez. Se um indivíduo foi infectado por um ou mais patógenos, seu soro apresenta anticorpos que se ligam às proteínas dos patógenos encontradas na superfície das respectivas microesferas. Uma terceira classe de molécula é adicionada ao poço e sua função é reconhecer e se ligar aos complexos formados pelo anticorpo e pela microesfera: a ligação dessa terceira molécula caracteriza uma microesfera como positiva. Todas as microesferas de cada poço são analisadas por um equipamento que emite dois tipos de raios laser. O primeiro identifica o tipo (ou a cor) da microesfera, enquanto o segundo verifica se ela é positiva ou contém o anticorpo e, portanto, houve infecção, ou negativa, quando não contém o anticorpo. Fonte: Envolverde/Agência Fapesp 13


PSICOLOGIA

TRATAMENTO PARA AS DISFUNÇÕES SEXUAIS MARGARETH DE MELLO F. DOS REIS

Muita gente deixa de procurar o trabalho psicoterápico ou não confia inteiramente em sua eficácia pelo simples motivo de não conhecê-lo. Fantasias e preconceitos, então, se misturam às origens psicogênicas do problema, dificultando a busca de soluções. O trabalho psicoterápico baseado na queixa sexual psicogênica não assume um caráter único e exclusivo de conduta terapêutica. A avaliação deste tipo de trabalho como simplista ou incompleto pode ter origem tanto na falta de informação como no preconceito a respeito de tal prática. 14

É fato que ele se distancia de outras condutas terapêuticas, uma vez que concentra esforços na solução do problema sexual. Isto porque o trabalho específico com a sexualidade (surgido no final do século passado com publicações de Havelock Ellis e desenvolvido neste século com a aplicação de abordagens comportamentais na década de 50, e por meio da realização de estudos sobre fisiologia sexual, de William Masters e Virginia Johnson, na década de 60), aprimorou recursos de intervenções práticas para a solução deste problema específico. Porém, não representa o limite do trabalho.

Desde a avaliação psicológica diagnóstica, que tem por finalidade detectar fatores emocionais potencialmente envolvidos na queixa, sejam eles primários ou secundários à disfunção, até a terapia sexual propriamente dita, o profissional acumula um material sobre a subjetividade do paciente, de fundamental relevância para o curso do tratamento. A tônica na condução desse processo reside na organização prática que o psicoterapeuta faz daquilo que o paciente oferece sobre o seu sofrimento psíquico (e os meios que já utilizou para tentar resolvê-lo), propondo uma intervenção inicial focada no sintoma principal (disfunção sexual), ou nos aspectos emocionais impeditivos de um resultado


PSICOLOGIA está utilizando a partir dos resultados obtidos no decorrer das sessões. Sob esta ótica, a proposta de tratamento visa também uma integração nas formas de pensar, sentir e agir do paciente, com ganho inevitável no plano da sexualidade. Mesmo que o problema repouse apenas na dificuldade sexual, observando-se que todas as outras áreas (social, familiar, afetiva, profissional ou acadêmica) mantêm-se preservadas, o trabalho tem que oferecer, para cada paciente, aquilo de que ele especificamente necessita para alcançar o seu bem-estar emocional. Se a meta para isso não incluísse um propósito mais amplo e consistente para o paciente, seria desnecessária a presença de um psicólogo. Bastaria que um indivíduo com disfunção sexual seguisse as instruções que manuais de técnicas sexuais apresentam ou, ainda, que qualquer profissional de outras áreas o instruísse a esse respeito. Ainda que muito bem intencionado, tal profissional estaria realizando um trabalho educativo, terapêutico, informativo, pois a psicoterapia, além destas intervenções, visa trabalhar as questões subjacentes ao problema apresentado pelo paciente, para que ele possa alcançar liberdade e discernimento emocionais em todos os planos de sua vida. E isso somente ao psicoterapeuta compete realizar. mais positivo em suas experiências sexuais (sem perder, obviamente, de vista, o problema sexual que aflige o paciente). A atenção do psicoterapeuta está voltada para uma variedade de aspectos individuais do paciente, tais como: assertividade, flexibilidade, relacionamento interpessoal, avaliação particular que ele faz dos acontecimentos, expressão emocional, bem como para os meios de que o paciente se utiliza para estabelecer os seus envolvimentos afetivo-sexuais. De forma metafórica, nesta perspectiva, as técnicas sexuais ocupam o palco quando o elenco já está preparado para o espetáculo; caso contrário, elas aparecem nos ensaios, corrigem e acertam detalhes que prejudicam o script ou, até mesmo, aguardam nos bastidores, se for o caso, até o momento oportuno para a sua apresentação. O que certamente não retrata este processo é mostrar o psicólogo desvinculado de sua formação

mais ampla (ciência do comportamento), ocupandose apenas de um aspecto das dificuldades do “ser” humano: neste caso, o sexo. Tanto o ser humano não tem esse aspecto isolado de outros que, juntos, lhe dão um perfil característico. Quanto ao psicólogo, ao fazer uma abordagem de tratamento voltada apenas para a sexualidade, estaria descartando o conhecimento adquirido durante seus anos de formação sobre a complexidade do desenvolvimento humano e sobre as mais variadas formas pelas quais o ser humano expressa suas insatisfações emocionais. O trabalho em sexualidade conta com uma abordagem técnica específica, e sua aplicação varia de acordo com a demanda que o paciente apresenta. Tendo em vista os pontos que desencadearam ou mantêm uma disfunção sexual, o psicoterapeuta poderá planejar a sua atuação e, ao longo de seu desenvolvimento, avaliar os recursos que

Margareth de Mello F. dos Reis. Psicóloga. Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Mackenzie–SP. Terapeuta Sexual e de Casais no Instituto H. Ellis. margareth@instituto-h-ellis.com.br 15


ODONTOLOGIA

DENTE IMPACTADO AFETA A SAÚDE BUCAL

P

reocupação dos dentistas, um dente

últimos dentes a se desenvolverem na boca.

dente até sua posição normal no arco dentário)

impactado (encravado), que não consegue

A erupção é dificultada por falta de espaço e o

para conservar o dente. Para terceiros molares

romper o tecido mole da gengiva para

dente encravado entorta, inclina ou se desloca

(dentes do siso) que estão presos (encravados)

surgir na cavidade bucal ou não possui espaço

enquanto tenta emergir, resultando em modifi-

por causa da densa camada de tecido mole, um

suficiente para se acomodar na boca, pode

cações na arcada dentária, podendo até causar

corte na gengiva já adianta. E, para os molares

representar mais do que uma simples irregula-

dor. Outro fator que não podemos descartar é

que não conseguem a erupção, a extração é a

ridade dental. A imperfeição pode comprometer

o excesso de tecido mole que também pode

melhor medida”, conclui o doutor.

a saúde bucal se não for detectada a tempo.

representar um obstáculo para o nascimento

A mordida pode ser modificada (desalinhada)

do dente”, enfatiza o especialista.

pelo dente impactado que, por falta de espaço

Qualquer dente pode não erupcionar (nascer)

para nascer, pode empurrar os dentes vizinhos

e ficar impactado. Os mais comuns são os dentes

-apinhar os dentes – e, muitas vezes, chegar

do siso e os caninos superiores. Por isso, os

a reabsorver (corroer) a raiz do dente mais

dentistas são unânimes ao recomendarem a

próximo. E, quando semi-impactado (emergiu

odontologia preventiva para impedir outras

parcialmente), pode armazenar comida, placa

causas mais sérias, pois, se a membrana que

e outros detritos no tecido mole ao seu redor,

circunda um dente impactado ficar inflamada,

causando mau hálito, inflamação, sensibilidade

pode formar um cisto na arcada dentária. “A

da gengiva e cárie pelo acúmulo de alimento

melhor maneira de se constatar o distúrbio e

e difícil higienização.

evitar que ele vire problema sério é a prevenção

O Dr. Sidnei Goldmann, especialista em

– radiografias e acompanhamento odontológico.

implantondontia, ressalta que o distúrbio,

A formação de cisto é sinal de estado crítico,

muitas vezes, é ocasionado por deficiência

caso de cirurgia”, revela Goldmann.

do crescimento ósseo da arcada dentária,

O implantondontista Goldmann ressalta os

que não alcança o tamanho necessário para

cuidados. “O tratamento do dente impactado,

abrigar todos os dentes. “Essa anomalia tem

auxiliado por radiografias, pode ser, nos cani-

maior probabilidade de acontecer com os

nos, um tracionamento ortodôntico (tração do

16

Sidnei Leonard Goldmann. Odontólogo. Especialista em Implantes Dentários. Membro da Sociedade Brasileira de Estética Dental. Membro da “American Academy of Osseointegration”. Professor de Implantologia e Cirurgia Avançada no IAP. www.goldmannodontologia.com.br


EDUCAÇÃO

EVOLUIR É BEM DIFERENTE DE VENCER: PARECE MAIS COM TORNAR-SE MELHOR IVAN CARLOS FERREIRA ANTONELLO

A

té há pouco, as boas universidades/faculdades se ocupavam em qualificar seus processos de ensino e aprendizagem e em desenvolver a prática educativa formal com intencionalidade e metas definidas. As não tão boas se estabeleciam e diplomavam estudantes, mesmo sem atingir os objetivos mínimos indicados pelo senso comum. E assim se vivia, educando aos trancos, como se não fosse função do Estado o auxílio, reforço ou mesmo extinção daqueles que repetidamente não alcançam o proposto. Neste cenário, abriram-se as veias para a inoculação e proliferação de cursos caça-níqueis, sem atenção para a qualidade da educação superior e, tampouco, orientação ou controle da expansão de sua oferta. É inegável a importância assumida com a criação da avaliação do ensino superior, inicialmente pelo Provão, que avaliava o egresso e, após, pelo Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (SINAES) com seus três principais componentes: avaliação das instituições, dos cursos e do desempenho dos estudantes. Criado pela lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, o SINAES passou a ter a incumbência de avaliar todos os aspectos que se referem aos cursos de graduação do país. Por aí, parecia que estava se iniciando um processo que traria ordem, qualidade e razão para a educação superior do país. No entanto, mais rapidamente do que se imaginava, o ensino superior e sua avaliação se tornaram populares. Muito populares. Criou-se o campeonato brasileiro da educação superior. Nestes dias, passou a ser prioritária uma nova ocupação, aliás, uma preocupação: organizar alunos e professores para um campeonato. É um campeonato que, aos moldes do Brasileirão de futebol, tem times, ranking e, mais do que isso, há os que correm o risco de cair para a segunda divisão. Há, inclusive, escolas que, num arreme-

do de pré-temporada, começam a preparar seus alunos para a realização de um dos componentes do SINAES, o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE). Não mais para exercer a profissão-fim do curso. Tudo acompanhado pelos jornais, rádio e televisão. E os dirigentes, quando interrogados sobre sua posição na tabela divulgada pelo MEC, explicam - surpresos - que venceram pela excelência de seus quadros e condições de ensino. Ou – aturdidos - que perderam por razões ainda não examinadas. Se não há nenhum viés, o resultado destas comparações, em geral, premia os cursos em que ingressam, pelo vestibular, os alunos mais bem preparados: escolas públicas onde a procura é maior e não há pagamento individual pelo curso. Ranking de ingressantes e de concluintes não difere no geral. Mas esta é uma longa discussão para que me atreva a abordá-la mais extensamente em poucas linhas. O que se deve salientar é que educar não é participar de um campeonato, de uma competição ou sucessão de competições que resultam na seleção de um competidor ou equipe com desempenho comparativamente superior, denominado “campeão”. Não estamos todos em um concurso de miss, corrida de cavalos ou luta de boxe, atividades importantes em uma sociedade plural, mas cujos objetivos principais diferem daquele esgrimido pela universidade. Não têm sido discutidas universidades, cursos, avaliação e os próprios instrumentos em si. O que se discute é o ranking que, mesmo não assumido, é estimulado pelo Estado. É este que mostra uma classificação numérica e não de competências, para gáudio de uns e tristeza de outros. Que gera notícia, entrevistas e explicações. Vazias para quem está no topo, mas geradoras de ressentimento para quem esteve mal na foto. Precisamos refletir sobre o que acontece num momento singular da história da educação superior no Brasil. Momento

em que se busca maior qualidade dos cursos, para que haja foco no profissional que desejamos ou necessitamos formar para a sociedade. E não para o ENADE. O exame deve adequar-se para bem medir a qualidade da formação. Avaliação é necessária e fundamental para a educação em geral e para a educação superior, em particular. Avaliar cursos e universidades é o caminho, não há dúvidas. Estamos nele e isto é ótimo! O que penso temerário é expor classificações públicas com detalhes numéricos que chegam à discriminação da unidade (417, 439...), baseadas em instrumentos ainda em discussão. A pressa em dar mídia às avaliações por vezes leva à análise inadequada de instituições sérias e produtivas. Pior do que isso, fragiliza o poder de uma necessária e, virtualmente, poderosa reestruturação da educação superior no país.

lvan Carlos Ferreira Antonello. Doutor em Medicina e Ciências da Saúde pela PUC-RS. Mestre em Nefrologia. Especialista nas seguintes áreas: Nefrologia, Cardiologia, Medicina Interna e Medicina do Trabalho. Aperfeiçoado em Qualidade Total em Saúde. Professor Titular do Departamento de Medicina Interna da PUC-RS. Membro da Câmara Técnica de Nefrologia do CRM-RS. Membro do Conselho Consultivo do Sindicato Médico do RS. 17


ENDOCRINOLOGIA

Foto: Hugo Finoco

FALTA DE PROTEÍNA EXCLUSIVA DO CÉREBRO DESENCADEIA EPILEPSIA

O

s sinais neurais “enlouquecem” em ca-

alterações funcionais do PRG-1 podem ser causas

na atividade cerebral. Embora as conexões neurais

mundongos sem uma proteína localizada

ainda não reconhecidas da epilepsia.

no cérebro dos animais tenham aparentado estar

apenas no cérebro, causando ataques

Nitsch e seus colegas foram os primeiros a

completamente normais em sua estrutura, estavam

epilépticos em animais ainda com pouco tempo

descobrir a nova classe de proteínas PRG e ficaram

excitáveis ao extremo. Quando o PRG-1 foi restaurado

de vida. Pesquisa da Universidade de Medicina

particularmente intrigados pelo padrão particular de

em neurônios específicos, as atividades neurais

de Berlim detalhou o que ocorre quando a prote-

atividade do PRG-1: ele não aparece em nenhum

voltaram ao normal. A habilidade moderadora do

ína codificada pelo gene PRG-1 se perde e revela

outro lugar do corpo, nem mesmo em outros pontos

cérebro foi perdida quando a porção do PRG-1,

um importante mecanismo de sintonia fina para

do cérebro. Ele só dá as caras nos terminais de um

que interage com o lipídio conhecido como ácido

as funções cerebrais. O artigo foi divulgado em

só tipo de neurônio. “A maioria das moléculas são

lisofosfatídico (LPA), foi alterada. O LPA, em si,

setembro pela revista especializada “Cell”.

mais ou menos localizadas na maioria das células”,

não é um neurotransmissor, mas aparentemente

Os cientistas mostraram que a “influência

explicou Nitsch. “Algumas são mais confinadas,

promove sintonia fina da liberação de glutamato,

calmante” do PRG-1 no cérebro depende da

mas apenas um grupo muito pequeno é confinado

que é o mais prevalente dos mensageiros químicos

interação adequada com uma classe particular

em tipos particulares de células em organismos

cerebrais. Sem glutamato, as funções do cérebro

de lipídios, conhecidos como fosfolipídios, que

particulares.”

podem simplesmente parar. O LPA atua no lado

atuam como importantes sinalizadores celulares.

No novo estudo, eles demonstraram que o

A equipe, liderada por Robert Nitsch, investigou

camundongo com deficiência de PRG-1 desenvolve

se mudanças na sinalização via fosfato lipídico e

convulsões muito severas por causa de alterações

18

remetente das sinapses, enquanto o PRG-1 atua como recipiente. Fonte: www.g1.com.br (Ciência e Saúde)


HOSPITAIS DE GRIFE

EXCELÊNCIA EM TECNOLOGIA E ATENDIMENTO

ILDO MEYER

L

ogo que surgiram, os hospitais funcionavam como áreas de confinamento. Asilos onde indigentes e doentes graves eram depositados em quartos superlotados, úmidos e escuros enquanto, pacientemente, esperavam a morte. Médicos e enfermeiras da época, sem grandes recursos para diagnóstico e tratamento, faziam o que estava ao seu alcance para aliviar o sofrimento dos internados. A imagem do hospital foi passando de geração em geração como um lugar onde, em geral, as pessoas não desejavam estar. Até mesmo partos eram realizados em casa, tamanha a aversão à instituição hospitalar. Vários fatores contribuíram para esta repulsa: u Ao entrar em um hospital, automaticamente, o paciente perdia o controle da situação, sua voz não era mais soberana e a autoridade do médico e do corpo de enfermagem passava a ser inquestionável. u Pacientes eram despidos, manipulados, tocados, examinados, puncionados sem maiores esclarecimentos. u Procedimentos eventualmente causavam dor, gerando tensão e medo. u Contato com amigos e familiares passava a ser restrito. u Clima de insegurança quanto ao tempo de internação e eficácia do tratamento. u Maioria dos óbitos acontece dentro de hospitais, e a associação passou a ser inevitável.

Embora estas características sejam inerentes a uma situação de doença e nem sempre possam ser minimizadas ou evitadas, o grande desafio na área da saúde é fazer com que pacientes e familiares mudem seu enfoque e procurem hospitais não somente por necessidade absoluta de enfermidade grave, mas sim por desejo de permanecerem saudáveis. Para que isto aconteça, é preciso escutar o que pensam e desejam pacientes e clientes. Pesquisas demonstram que, na visão dos pacientes, hospitais deveriam possuir organização, higiene, reputação, bons médicos, conhecedores de tecnologias avançadas e dos melhores procedimentos e, sobretudo, calor humano para que pudessem se sentir seguros e confortáveis na situação nada agradável de estarem doentes. Com os dados coletados, parece simples estabelecer uma estratégia de captação de pacientes pela contemplação dos desejos relatados. Parece, mas não é. É preciso que todos os setores do hospital compreendam e estejam comprometidos com a importância de uma reeducação interna e sejam conscientes da difícil tarefa de transformar uma situação não planejada, nem desejada, em algo digno, confortável e sem maiores traumas. Em um meio onde doença, insegurança, medo e ansiedade predominam, alguns hospitais, depois de atingirem excelência em conhecimento e tecnologia, passaram a buscar uma referência em atendimento. Hotéis serviram de inspiração para

que acomodações e cuidados diferenciados fossem implantados, visando um suporte mais adequado à restauração da saúde. O desafio foi conseguir, por intermédio do respeito à dignidade e ao sofrimento do outro, transmitir com clareza a noção de amparo e atenção máxima às demandas individuais. Pouco a pouco, pacientes e familiares sentiram a mudança de atitude, reverteram a situação e transformaram tais hospitais em grifes. E como todos sabem, grifes são objetos de desejo.

Ildo Meyer. Médico. Especialista em Anestesiologia. Pós-graduado em Filosofia Clínica pelo Instituto Packter. Ex-Presidende da Sociedade Brasileira de Anestesiologia (RS). Escritor e palestrante motivacional. 19


IMUNOTERAPIA

ALÉM DA QUIMIOTERAPIA E DA RADIOTERAPIA, HÁ OUTRA OPÇÃO PARA TRATAR O LINFOMA

A

recente exposição do linfoma no cenário nacional traz um grande benefício para a população: a importância e disseminação dos sinais e sintomas da doença, fundamentais para a detecção precoce, que aumenta, e muito, as chances de cura. Por outro lado, para que essa cura seja possível nos casos mais comuns de linfoma, que correspondem a 80% dos casos da doença no mundo ocidental– os chamados linfomas de células B -, habitualmente o tratamento não deve ser feito apenas com quimio e radioterapia. Denominado de imunoterapia, este tipo de tratamento inovador atinge seletivamente as células linfomatosas e detém a multiplicação das células malignas. A imunoterapia no tratamento do linfoma alia o anticorpo monoclonal, chamado MabThera (rituximabe), aos regimes de quimioterapia tradicionais. “É consenso mundial que a utilização do rituximabe, associado à quimioterapia, aumenta consideravelmente as chances de cura dos pacientes com linfoma de células B. A chegada deste tratamento, há 10 anos, foi um marco no tratamento da doença. Destaca-se o tratamento do linfoma difuso de grandes células B,

do folicular, da zona do manto e, mais recentemente, da leucemia linfocítica crônica. Diversos países da Europa, Estados Unidos e até África adotaram o medicamento como protocolo de tratamento, afirma o Dr. Cármino Antônio de Souza, médico hematologista e professor titular de Hematologia e Hemoterapia da Unicamp. No Brasil, segundo os últimos dados do INCA (Instituto Nacional do Câncer), em 2004, foram computadas mais de 3 mil mortes no país devido somente aos cânceres do sistema linfático. Uma média de 8,5 mortes por dia devido à doença. “Devido a esse número de mortes e com a incidência cada vez maior no Brasil, é importante que as autoridades federais deem a devida atenção ao tratamento do linfoma, já que sabemos que a cura é possível em grande parte dos casos”, completa o Dr. Cármino. Lançado no Brasil há 10 anos, MabThera vem proporcionando a cada ano novos benefícios para os pacientes com linfoma de células B. Até o momento, mais de 1,5 milhão de pacientes foram

tratados com o medicamento em todo o mundo. Além disso, este foi o primeiro anticorpo monoclonal aprovado pelo FDA em 1997 (Food and Drug Administration – agência norte-americana responsável pelo controle dos medicamentos) para o tratamento de câncer e representou um avanço na Medicina ao desenvolver o conceito de terapia dirigida a um alvo. Diferente da quimioterapia clássica que mata não somente as células doentes, mas ataca células sadias, esse medicamento age exclusivamente sobre as células doentes.

Desafios além da Medicina Apesar de todos os avanços terapêuticos, existem outros desafios no combate à doença: o desconhecimento sobre o linfoma e a dificuldade para a realização do diagnóstico precoce. Para se ter uma ideia, uma pesquisa realizada pelo DataFolha, em 2008, apontou que mais da metade dos brasileiros (66%) nunca ouviu falar do linfoma, que é o quinto tipo de câncer mais frequente no mundo. Um dado ainda mais preocupante é que 89% dos que mencionaram ter ouvido falar dos linfomas (34%), desconhecem os sintomas da doença. O sintoma inicial mais comum do linfoma é um aumento indolor dos linfonodos no pescoço, axilas, abdômen, virilha ou do mediastino (região entre o coração e os pulmões). Outros sintomas incluem febre, suor, principalmente à noite, perda de peso e coceira. O baço e/ ou o fígado podem estar aumentados. Fonte: Ketchum Estratégia

20


SAÚDE

AUMENTO DO NÚMERO DE IDOSOS REFLETE MAIOR EXPECTATIVA DE VIDA

O

aumento da expectativa de vida do brasileiro tem contribuído para alterar o perfil das causas de morte da população, antes caracterizado por doenças típicas de jovens. Nos últimos 40 anos, entretanto, tem aumentado o número de casos de enfermidades crônicas que, atualmente, atingem 75,5% das pessoas acima dos 60 anos. Entre os jovens, o percentual é de 9,3%. A informação consta de pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o documento, apesar da alta prevalência deste tipo de doença, apenas 29% dos idosos no país tem plano de saúde. Por outro lado, o atendimento na rede pública para pessoas com mais de 80 anos custa cerca de R$ 179,00. “O custo da internação per capita tende a ser maior à medida que a idade aumenta, passando de R$ 93,00 por idosos na faixa etária de 60 a 69 anos, para R$ 179,00 entre aqueles com 80 anos ou mais”, esclarece o texto da pesquisa.

Entre os idosos, os 20% mais pobres apresentam índices menos elevados para essas doenças. De acordo com o IBGE, isso pode significar falta de acesso ao atendimento médico qualificado e baixos índices de educação. “Em momento algum podemos afirmar que os idosos mais pobres têm menos doenças crônicas”, explicou a pesquisadora Isabel Parahyba. “O indicador mostra que essas pessoas, às vezes, não têm a percepção da doença. Por falta de escolaridade ou dificuldade de um diagnóstico qualificado”, completou. De acordo com a pesquisa, o aumento do número de idosos e a consequente mudança no perfil da população requer melhorias nas políticas públicas, com mais oferta de atendimento geriátrico e gerontológico, assim como medidas no âmbito da Previdência. Doenças crônicas atingem 75,5% dos idosos. Em menos de 40 anos, o Brasil passou de um perfil de mortalidade típico de uma população jovem

para um desenho caracterizado por enfermidades complexas e mais onerosas, próprias das faixas etárias mais avançadas. O fato marcante em relação às doenças crônicas é que crescem de forma muito importante com o passar dos anos: entre os de idade de 0 a 14 anos, foram reportados apenas 9,3% de doenças crônicas, mas, entre os idosos, este valor atinge 75,5% (69,3% entre os homens e 80,2% entre as mulheres). Os 20% de idosos mais pobres apresentaram prevalência estatisticamente significativa menos elevada (69,9%) de doenças crônicas. Os demais declararam proporções semelhantes (de, aproximadamente, 75%). O Brasil envelhece rapidamente, mas os grandes centros urbanos, embora já apresentem um perfil demográfico semelhante ao dos países mais desenvolvidos, ainda precisam melhorar a infraestrutura de serviços para dar conta das demandas decorrentes das transformações demográficas vigentes.

Cerca de 29% dos idosos no Brasil têm plano de saúde A cobertura dos planos de saúde entre os idosos é de aproximadamente 5 milhões de pessoas de 60 anos ou mais de idade, representando 29,4% do total da população nessa faixa etária. A clientela dos planos de saúde é predominantemente composta de pessoas de renda mais alta, ocorrendo o inverso entre os idosos que possuem apenas cobertura pelo SUS. Entre os idosos usuários do SUS, apenas 5,8% apresentavam um rendimento domiciliar de mais de três salários mínimos per capita, enquanto que, entre os idosos que possuíam planos privados, esta proporção alcançava 42,8%. Fonte: Isabela Vieira - Agência Brasil

21


ORTOTANÁSIA

A SÍNDROME DO

“nó górdio” EVALDO A. D´ ASSUMPÇÃO

C

onta a lenda que, no século VIII, um imperador da Frígia, chamado Górdio, em louvor a Zeus que lhe teria proporcionado ser rei quando era um camponês e conduzia carro de bois, amarrou este mesmo carro numa coluna, no templo do deus maior, dando um nó tão complexo que ninguém seria capaz de desatá-lo. Quinhentos anos depois, Alexandre Magno passa pela região e lhe falam de uma profecia pela qual quem desatasse o nó conquistaria toda a Ásia Menor. Foi ao templo e, observando a complexidade do nó, não titubeou: desembainhou a espada e o cortou ao meio, desfazendoo. Certo ou errado, o fato é que poucos anos depois ele conquistava toda aquela região. Muitos séculos são passados desde então e, neste segundo milênio, um novo “nó górdio” é colocado, agora diante dos médicos, como um terrível desafio. Refiro-me aos enfermos portadores de graves doenças ou lesões traumáticas, pelas quais suas condições vitais estão séria ou definitivamente comprometidas. São, então, submetidos a tratamentos heróicos, em que a tecnologia de ponta – sofisticada e caríssima – é utilizada, porém, a resposta terapêutica permanece praticamente inalterada. Mercê desta mesma tecnologia, o quadro mórbido não evolui, nem para uma melhora – por ser praticamente impossível – nem para o desfecho fatal. Por meses e até longos anos, esses enfermos permanecem em unidades de terapia intensiva. Outros, mais felizes, são levados para áreas de internação onde seus familiares podem permanecer ao seu lado em tempo integral. Outros, em número bem menor, são liberados para retornar às suas 22


ORTOTANÁSIA

casas onde uma verdadeira unidade de tratamento intensivo é montada, mantendo-os estáveis em sua agonia, por tempo indefinido.

Nesses casos, não se prolonga a vida, e sim a morte Depois de longo período, a família, exaurida física, emocional e financeiramente, começa a pressionar os médicos por uma solução. Os médicos, quase sempre já acomodados com aquele quadro inalterado e inalterável, se angustiam por uma tomada de decisão, imaginando qual será a mais adequada. Aí está a síndrome do “nó górdio”. Familiares e médicos contemplam o enfermo tal e qual se contemplava o famoso nó da mitologia. Como desatá-lo? O código de deontologia médica, em seu artigo 130, deixa claro o impedimento ético da utilização de novos tratamentos em enfermos incuráveis, especialmente se não trazem esperança concreta de melhora e ainda impõem ao enfermo sofrimentos adicionais. Contudo, a pressão dos laboratórios farmacêuticos que lançam novas e caríssimas drogas, a pressão das indústrias que fabricam aparelhos capazes de manter um corpo aparentemente vivo, enquanto a pessoa há muito já morreu, é forte demais. E àquela pressão se juntam outras, oriundas de grupos defensores da vida a qualquer preço, mesmo que seja apenas um simulacro de vida. Pergunto-me se, para eles, se aplicaria essa mesma argumentação. Não em malabarismos verbais, quando a realidade lhes está distante, mas no momento azado de sua própria agonia. Em muito boa hora, o Conselho Federal de Medicina editou a resolução de nº1.805/06, que abria as portas para a ortotanásia, ou autanásia (auto = por si só, tanatos = morte), como creio ser mais apropriado dizer, que recebeu a aprovação moral da CNBB, sempre olhada com reservas pelos médicos. Teve, porém, vida breve, com o surpreendente embargo pelo Poder Judiciário, até então amplo defensor de avanços terapêuticos e

tecnológicos, nem sempre moralmente válidos. Curioso paradoxo. Um dos pioneiros da Tanatologia no Brasil, estudando-a há mais de trinta anos e dando suporte a enfermos em fase terminal e familiares enlutados, aprendi a respeitar a evolução natural da vida que, existindo num meio permeado pela impermanência de tudo e de todos, limitada pelo espaço e pelo tempo, somente nas oníricas fantasias dos prepotentes deve durar para sempre. A vida é um dom precioso e, ao mesmo tempo, extremamente frágil. Deve ser cuidada carinhosamente com mãos hábeis, suaves e compassivas. Contudo, se não vem acompanhada de predicados essenciais ao seu sentido maior, que é a felicidade genuína (não me refiro ao hedonismo nem às suas variações, que rejeito), não há porque prolongá-la artificialmente, pela intransigência da tecnologia, cujo maior objetivo é o êxito de suas ações e não necessariamente o bem-estar da pessoa por ela manipulada. O médico tem de perder a noção de que a morte é sua inimiga. Ao contrário, ela é sua aliada e sua mestra na medida em que lhe ensina a fragilidade da vida, a imediatidade dos nossos atos, a transitoriedade de tudo e de todos, a impermanência que rege nosso tempo enquanto neste mundo de surpresas, de paradoxos, de interrogações. Oxalá a resolução de nº 1.805/06 seja reavivada

e volte para libertar os que sofrem absurdamente, proporcionando-lhes um suave caminhar da vida em transformação. Oxalá nós, os médicos, tenhamos a coragem de defender sempre a dignidade da vida, tanto quanto a dignidade da morte. Sendo sempre, porém, agentes da vida digna, jamais soturnos agentes da morte.

Evaldo A. D´Assumpção. Médico. Tanatólogo e biotanatólogo. “Senior-Member of ADEC–Association for Death Education and Counseling” (EUA). Presidente do Conselho Superior da SOTAMIG – Sociedade de Tanatologia de MG. Membro do Instituto Mineiro de História da Medicina, da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores e da Academia Campo-belense de Letras. Professor. 23


UROLOGIA

REPOSIÇÃO HORMONAL NO HOMEM: NECESSÁRIA?

SIDNEY GLINA

da globulina de transporte dos andrógenos (SHBG)

do hormônio do crescimento diminui 14% por

e, consequentemente, diminuição da testosterona

década após a puberdade e, finalmente, ocorre

bastante conhecido que, à medida que o

biodisponível, além da diminuição significativa da

redução da produção de melatonina.

homem envelhece, ocorrem várias alterações

dehidroepiandrosterona (DHEA) e de sua forma

Muitos autores chamam esta fase da vida do

em sua homeostase hormonal. A produção

sulfato (DHEAS). Ainda no homem mais velho,

homem de andropausa, androclise, deficiência

de testosterona total e livre diminui, sendo que

existe perda do ritmo circadiano da produção de

androgênica do envelhecimento masculino ou

20% dos homens saudáveis entre 60 e 80 anos

testosterona, a resposta testicular ao estímulo da

deficiência endócrina do envelhecimento mas-

apresentam testosterona total abaixo do normal.

gonadotrofina coriônica está diminuída, assim

culino e comparam-na à menopausa. Nesta, as

Além disto, em todos os homens ocorre aumento

como a amplitude dos pulsos de LH; a secreção

repercussões clínicas são muito evidentes na

É

24


UROLOGIA mulher; ocorre a interrupção das menstruações,

o que fala contra um desequilíbrio hormonal (cerca

de hipogonadismo, micro-pênis na criança e

diminuição significativa da produção de estrógeno;

de 90% dos homens com mais de 50 anos tem

atraso puberal, após avaliação endocrinológica. É

existe infertilidade e pode surgir osteoporose,

espermatogênese preservada à biópsia testicular).

recomendada quando há diminuição de libido com

Não apenas o envelhecimento poderia explicar

testosterona total e/ou livre abaixo do normal (e

Quando, por alguma razão, existe parada da

um nível de testosterona mais baixo. Singer F.

prolactina normal) e é controversa (aguardam-se

função testicular (por exemplo: orquiectomia

e Zumoff B., em trabalho publicado na revista

estudos controlados para confirmação) quando

bilateral) aparecem algumas manifestações

Steroids, 1992,57:86-9 encontraram que o nível

existe disfunção erétil e testosterona total e/ou

clínicas evidentes (manifestações clínicas do

de testosterona dos residentes, durante período

livre nos limites inferiores da normalidade e

hipogonadismo pós-puberal): diminuição da

de plantões seguidos, era significativamente

nos casos de osteoporose.

libido, disfunção erétil; infertilidade, irritabilidade,

mais baixo que o do resto dos funcionários do

Não existem trabalhos, cientificamente bem

dificuldade de concentração, depressão, perda da

hospital no mesmo período. Os autores con-

elaborados, que mostrem benefícios na reposi-

massa e força muscular, osteoporose, perda dos

cluíram que o stress era o fator causal desta

ção do DHEA, DHEAS e melatonina no homem

pelos axilares e pubianos, diminuição do volume

alteração. Por outro lado, Steiger A. et al, em

mais velho. A administração de hormônio de

e consistência testicular (quando a causa não é a

trabalho publicado no J. Psychiatry Res.,

crescimento está associada à incidência maior

remoção cirúrgica dos testículos), ginecomastia e

1991, 25:169-77 mostraram que o nível de

de diabetes mellitus e neoplasias. Desta maneira,

instabilidade vasomotora. Entretanto, a andropausa

testosterona total de homens com depressão

a reposição hormonal deve ser avaliada caso a

não se caracteriza como uma entidade clínica

endógena era baixo antes do tratamento para

caso e só está indicada quando os benefícios

marcante. A grande maioria dos homens, embora

depressão, normalizando-se após o mesmo.

forem evidentes e ultrapassem os riscos.

atrofia genital.

tenha níveis de testosterona menores do que na

Depressão e ansiedade são condições

juventude, continua com esta produção dentro

bastante comuns na velhice e podem explicar

da faixa da normalidade.

algumas das situações atribuídas à andropausa.

A andropausa teria início lento e insidioso em

Por outro lado, não fica claro se a reposição de

que ocorreria diminuição da libido e qualidade

testosterona ou outros hormônios corrige os

das ereções, principalmente noturnas; alterações

sintomas relacionados à possível deficiência

de humor com diminuição concomitante da

hormonal do envelhecimento. Existem poucos

atividade intelectual, orientação espacial, fadiga,

estudos controlados a este respeito, a maioria

depressão e raiva, além de diminuição da massa

são estudos de curta duração, com populações

corpórea, com decréscimo associado da massa e

reduzidas e sem uniformidade.

força muscular, diminuição da densidade mineral

Desta maneira, quando deve ser feita a reposição

óssea resultando em osteoporose, perda de pelos

hormonal? A doutora Lisa Tenover, no trabalho

e alterações de pele e aumento da gordura visceral.

“Male hormone replacement therapy including

Porém, alguns dados falam contra a existência de

andropause”, publicado no Endo Metabol Clin

um declínio hormonal significativo como o que

N Am, 27:969-983, 1998, sugere os seguintes

ocorre na mulher, e que esta situação hormonal

padrões: quando a testosterona total estiver 1 a

seria responsável exclusiva pelos sintomas

2 desvios-padrão abaixo da faixa normal para o

descritos. Outros possíveis fatores causais são

adulto jovem, ou entre 7 a 12,2 mM/L (200 a 350

comuns no homem mais velho e poderiam ser

ng/dL) associado a quadro clínico. Testosterona

considerados como fatores etiológicos para estes

total abaixo de 7mM/L equivale a hipogonadismo,

sinais e sintomas, entre eles o stress, depressão,

e a reposição é obrigatória. O Consenso Brasileiro

doenças, má nutrição, obesidade, medicamentos,

sobre Disfunção Erétil, realizado pela Sociedade

drogas, falta de parceria sexual. Além disto, a

Brasileira de Urologia, em 1998, considerou que

grande maioria dos homens idosos continua fértil,

a reposição de testosterona é formal nos casos

Sidney Glina. Doutor e especialista em Urologia pela USP. Aperfeiçoado em Infertilidade Masculina e Urologia pela “Cleveland Clinic Foundation”. Chefe do Departamento de Urologia do Hospital Ipiranga. Diretor Administrativo do Projeto Alfa. Livre Docente da Faculdade de Medicina da Fundação do ABC. Professor da Faculdade de Ciências Médicas de Porto Alegre. Membro do Comitê de Padronização, Publicação e Nomeação da “International Society of Sexual Medicine” – ISSM. Membro do corpo editorial do “International Journal of Medical Robotics and Computer Assisted Surgery”. Médico do Instituto H. Ellis, do corpo clínico do Hospital Sírio-Libanês e coordenador do Hospital Israelita Albert Einstein. Fonte: www.arquivoshellis.com.br. 25


CAFEÍNA

A DROGA PREFERIDA

A

cafeína é a droga mais consumida em todo o mundo. Gostamos tanto, que uma de nossas refeições diárias foi nominada em sua homenagem: café-da-manhã. Esta droga pode ser encontrada no café, chá, chimarrão, refrigerantes e no chocolate. A grande maioria dos brasileiros adultos consome doses diárias de cafeína superiores a 300 mg, e muitos são viciados. Você já se perguntou o que torna a cafeína tão popular? Por que milhões de pessoas usam esta droga? A cafeína é a 1,3,7-trimetilxantina - um pó branco cristalino muito amargo. Na medicina, a cafeína é utilizada como um estimulante cardíaco e um diurético. Ela também produz um “boost” de energia, ou um aumento no estado de alerta - por isso motoristas e estudantes tomam litros de café para permanecerem acordados. A cafeína é uma droga que causa dependência - física e psicológica. Ela opera por mecanismos similares às anfetaminas e à cocaína. Seus efeitos, entretanto, são mais fracos do que estas drogas, mas age nos mesmos receptores do sistema nervoso central.

A ação da cafeína no organismo A ligação da adenosina, um neurotransmissor natural, aos seus receptores diminui a atividade neural, dilata os vasos sanguíneos, entre outros efeitos. A cafeína se liga aos receptores da adenosina e impede a sua ação sobre o SNC. A cafeína estimula a atividade neural e causa a constrição dos vasos sanguíneos, pois bloqueia a ação da adenosina. Muitos medicamentos contra a dor de cabeça, tal como a Aspirina Forte, contêm cafeína - se você estiver sofrendo de uma dor de cabeça vascular, a cafeína irá contrair os vasos sanguíneos e aliviar a dor. Com o aumento da atividade neural, a glândula pituitária (localizada sobre os rins) “pensa” que algum tipo de emergência está ocorrendo e libera grandes quantidades de adrenalina, que causa uma série de efeitos no corpo humano, como a taquicardia, aumento da pressão arterial, abertura dos tubos respiratórios (por isso muitos medicamentos contra a asma contêm cafeína), aumento do metabolismo e contração dos músculos, entre outros.

Outro modo de ação da cafeína é o bloqueio da enzima fosfodiesterase, responsável pela quebra do mensageiro cAMP, então os sinais excitatórios da adrenalina persistem por muito mais tempo. Repare como as estruturas da cafeína, adenosina e cAMP são similares. A cafeína também aumenta a concentração de dopamina no sangue (assim como fazem as anfetaminas e a cocaína), por diminuir a recaptação desta no SNC. A dopamina também é um neurotransmissor (relacionado com o prazer) e suspeita-se que seja justamente este aumento dos níveis de dopamina que leve ao vício da cafeína. Resumindo, a cafeína, em curto prazo, impede que você durma porque bloqueia a recepção de adenosina; lhe dá mais “energia”, pois causa a liberação de adrenalina, e o faz sentir melhor, pois manipula a produção de dopamina. O problema do consumo de cafeína só aparece em longo prazo. O mais importante é o efeito que a cafeína tem sobre o sono. A recepção de adenosina é muito importante para o sono, principalmente para o sono profundo. O tempo de meia-vida da cafeína no organismo é de 6h. Portanto, se você beber um xícara de café (200 mg de cafeína) por volta das 15h, cerca de 100 mg de cafeína ainda estarão em seu corpo lá pelas 21h. Você ainda estará apto a dormir, mas, provavelmente, não irá usufruir os benefícios do sono profundo. No dia seguinte, você precisará de mais cafeína para se sentir melhor, e este círculo vicioso continua, dia após dia. Se você tentar parar de consumir cafeína, você irá se sentir deprimido e, algumas vezes, com uma terrível dor de cabeça - causada pela excessiva dilatação dos vasos sanguíneos no cérebro. Estes efeitos negativos o forçam a correr de volta para o consumo de cafeína. Esta é a principal razão que leva os fabricantes de refrigerantes a adicionar cafeína aos seus produtos - o consumidor se torna viciado e as vendas aumentam!

Letalidade Estudos indicam que o consumo de cafeína durante a gravidez pode ser prejudicial para o feto, 26


CAFEÍNA

porém os cientistas garantem que os males só aparecem se o consumo for exagerado. A cafeína pode ser letal, se ingerida em grande quantidade. A dose necessária para matar 50% de um certo grupo de indivíduos (LD-50) é de 75mg/kg. Para um adulto de cerca de 80 Kg, seria necessário ao equivalente a algo como 150 xícaras de café. Felizmente, ainda podemos continuar tomando nosso cafezinho, com moderação.

Como é feito o café descafeinado? Até 1980, o café era descafeinado com diclorometano, que dissolvia a cafeina, seletivamente, sem “carregar” os açúcares, peptídeos e ingredientes de sabor. O diclorometano, então, extraía a cafeína sem mudar o sabor ou aroma do café. Entretanto, o diclorometano é tóxico, e surgiram evidências de que era carcinogênico. O acetato de etila, então, foi o substituto até o início dos anos 90. Mas este também era moderadamente tóxico. Foi somente a partir de 1990 que um solvente não tóxico e mais natural passou a ser usado: o fluido supercrítico de dióxido de carbono. Acima de 72.8 atm e 304.2 K, a densidade do gás CO2 e de seu líquido é idêntica, e este se torna um fluído supercrítico. O fluido dissolve substâncias como um líquido, principalmente substâncias orgânicas, como a cafeína. O processo de extração é simples: o CO2 supercrítico, sob alta pressão, “lava” os grãos de café e dissolve cerca de 99% da cafeína presente. A cafeína, então, é isolada e vendida para a indústria farmacêutica. E o café descafeinado vai para as prateleiras de supermercados, atendendo a pessoas que apreciam o sabor do café, mas que não querem passar a noite em claro.

A descoberta do café Os historiadores dizem que o café foi descoberto na Etiópia, em torno de 700 a.C., onde a planta

crescia naturalmente. Alguns pastores perceberam que suas ovelhas não conseguiam dormir, à noite, após comerem os frutos dessa planta. Durante o século XIV, alguns pés de café foram plantados na Arábia. Chamaram esta planta de Kaweh, e era usada como alimento, na fabricação de vinho e como remédio. Por volta de 1500, o café já estava na Turquia e na Itália e, em 1720, já estava em Paris. Em 1736, o primeiro pé de café foi plantado em Porto Rico e, menos de 20 anos mais tarde, já era o principal produto de exportação do país (como continua sendo até hoje!). A economia brasileira, por um longo período, teve no café o seu principal produto (o que não é novidade para quem acompanhou a novela Terra Nostra). O país com o maior consumo per capita de café é os EUA, e, lá, as variedades preferidas são as provindas da Colômbia e de Porto Rico.

Doses médias Café coado: 150 mg /xícara Expresso: 350 mg /xícara Instantâneo: 100 mg /xícara Descafeinado: 4 mg /xícara Chá: 70 mg /xícara

Coca-Cola: 45.6 mg /lata Pepsi-Cola: 37.2 mg /lata Diet-Pepsi: 35.4 mg /lata Chocolate: (200g): 7 mg

Fonte: www.qmc.ufsc.br

A química da cafeína A cafeína é um alcalóide. Entre os vários alcalóides existentes na natureza, encontram-se as metilxantinas. Existem 3 metilxantinas particularmente importantes: a 1,3,7-trimetilxantina (cafeína), a 1,3-dimetilxantina (teofilina) e a 3,7-dimetilxantina (teobromina). Todos os alcalóides são derivados da purina (o grupo xantina é a 2,6-dioxopurina) e inibem a cAMP fosfodiesterase. Teobromina e teofilina são duas dimetilxantinas, com dois grupos metilas somente, em contraste com a cafeína, que possui três. Ambas têm efeitos similares à cafeína, porém bem menos acentuados. A teobromina é encontrada no chocolate, no chá, na noz moscada, mas não no café. No cacau, a concentração de teobromina é 7 vezes maior do que de cafeína! A teofilina possui mais efeitos no coração e na respiração, sendo, por isso, mais empregada em medicamento para asma, bronquite e efisemas do que a cafeína. É encontrada, também, no café. No organismo, estes compostos são facilmente oxidados para o ácido úrico e outros derivados.

27



Instituto Panamericano da Vis達o



MASSOTERAPIA

A IMPORTÂNCIA DA

A

massagem

massagem, uma das mais antigas formas de manipulação do corpo humano, tem sido empregada com êxito por muitas culturas como meio de promoção e restauração da saúde. Pode ser entendida como manipulação do corpo com propósitos terapêuticos. Por volta de 3.000 a.C., foi

identificação de algum tipo de anormalidade nas peças ósseas e tecidos moles do corpo. A aplicação correta da massagem ajuda na tonificação e recuperação dos músculos, auxilia no equilíbrio dos órgãos internos e sistema nervoso, aumenta a respiração celular e circulação sanguínea

A duração de uma sessão de massagem depende do objetivo e disponibilidade do paciente. Geralmente, o tempo mínimo utilizado é de 45 minutos, podendo chegar até 2 horas. Durante esse período, são utilizadas várias técnicas de manipulação incluindo deslizamentos, amassaduras, fricção, rolamentos,

utilizada como medida terapêutica científica pelos chineses; também Hipócrates, o pai da medicina moderna, a empregou. O valor da massagem na sociedade atual é tão importante como antigamente. O emprego das mãos no tratamento é bastante eficiente, pois permite o conhecimento mais profundo das partes anatômicas do corpo do indivíduo, diferentemente dos aparelhos, possibilitando a

e também provoca uma ótima sensação de repouso e bem-estar. A massagem permite que o sangue e a linfa velhos saiam dos tecidos e voltem ao coração e aos pulmões com maior facilidade, conduzindo sangue novo e oxigenado para as células. Vários resíduos metabólicos são eliminados com a utilização da massagem, permitindo uma recuperação mais rápida e completa após exercícios físicos extenuantes.

percussão, vibração e golpes nervosos. A ordem de execução dos movimentos depende da linhagem e abordagem que o massoterapeuta possui em seu repertório de ação. A aplicação da massagem pode ser realizada tanto no chão como sobre uma maca apropriada. O importante é que a pessoa se sinta confortável durante a manipulação e utilize uma respiração tranquila que lhe proporcione o total relaxamento do corpo. É recomendável que se utilize óleos como o de andiroba, capim limão, lavanda e amêndoas. Músicas adequadas completam o ambiente perfeito para a sessão. Uma boa massagem é como uma sinfonia, construída lentamente com elevações sutis até um crescente de movimento, terminando com um estado passivo e muito tranquilizante. Experimente um dia e compreenda a energia e grandeza do seu corpo. Professor Tiago Baldez Fisiologista do Exercício e Massoterapeuta CREF 5364-GO/DF tiago.personal@hotmail.com

31


ÉTICA

A PONTE ENTRE A FILOSOFIA E A BIOLOGIA DIVINA MARQUES

Q

uando o homem descobriu o fogo, a vida começou a mudar: menos frio, mais comida, mais estratégias para se defender dos inimigos, dos predadores. A expressão verbal foi outra revolução. Será que era possível pensar sem falar? Ora, o inverso é meio complicado, dificilmente falamos sem que as palavras tomem forma por meio do pensamento, da conexão de idéias. No mínimo, a fala aprimorou o pensamento do homem, passou a exigir vivência, conhecimento, palavras, articuladas na mente antes de serem desveladas. Mas a evolução é pródiga e começamos a escrever - um terceiro momento a partir do pensamento, que exige mais articulação ainda, para não falar de inspiração divina quando o que se quer é tocar os sentimentos das pessoas, transmitir mais do que informação. Benditas sejam a literatura, a música, as artes de maneira geral. Abençoados sejam Michelangelo, Pablo Neruda, Shakespeare, Mário Quintana, Chico Buarque de Holanda, Cora Coralina. Guttemberg é outro marco, pois pensar, falar e escrever tornaram-se possibilidades mais reais de mudança graças à prensa, à multiplicação dos escritos. É preciso reconhecer que Sócrates nunca escreveu nada. Nem Jesus Cristo. Mas as verdades de cada um deles só puderam ser documentadas porque alguém copiou... e publicou.

Questões suscitadas pelas novas tecnologias A humanidade começava a ficar deslumbrada com as novas tecnologias. Alguns impropérios, a exemplo de Hiroshima, Nagasaki ou 32

Chernobyl, suscitaram questionamentos. Santos Dumont se matou quando viu que sua invenção, além de encurtar caminhos, estava sendo utilizada para a guerra. Mas a mesma descoberta que possibilita o genocídio pode salvar vidas, pode tornar o mundo melhor - depende do rumo que damos ao seu uso. Como ignorar as vacinas, os remédios, os

transplantes, o prolongamento da vida? E o conforto, os eletrodomésticos? Podemos abrir mão dos satélites? Queremos jogar fora o celular? E a internet, essa última revolução tecnológica, não é uma maravilha da natureza científica do homem, uma revolução no âmbito pessoal e empresarial? Sim, as novas tecnologias são bem-vindas e


ÉTICA

ninguém, em sã consciência, seria capaz de dizer não ao progresso. No entanto, é preciso nortear, com a ética, o caminho das ciências, permear as novas descobertas com questionamentos a respeito de suas consequências, de seu sentido e, especialmente, do uso que será feito daquilo que inicialmente parece inocente e benéfico. A ética não é a escolha entre o certo e o errado, pois o errado tem punições previstas em lei. A ética depende da consciência de cada um. Ser ético é escolher, entre duas coisas certas, qual a mais conveniente. Ciência e ética devem, portanto, caminhar juntas. O problema é que o desenvolvimento tecnológico, que reuniu as ciências exatas e biológicas, caminhou muito mais rapidamente do que o desenvolvimento das ciências humanas. Esta caminhada suscitou novos termos, como a bioética, criada pelo oncologista norte-americano Van Rensselaer Potter, em

1970. No ano seguinte, ele publicou o primeiro livro sobre o assunto: Bioética – ponte para o futuro. Assim como Hans Jonas, em O princípio responsabilidade, Potter enfocava, em seus estudos, o problema ambiental e o modelo de progresso da forma como ele vem sendo concebido pelas novas tecnologias. Ambos trabalharam por uma civilização sustentável, defendendo, para isso, a ética da responsabilidade no sentido de “cuidar de”. Ambos pregaram a necessidade da interdisciplinaridade, como método fundamental na abordagem de questões relativas ao meio ambiente. Tanto Potter como Jonas se dedicavam, na mesma época, ao mesmo tema: uma ética para o enfrentamento dos problemas emergentes da pós-modernidade, tendo em vista a vida, seja ela do homem, dos animais, da natureza ou da relação entre eles. Estava sendo construída uma ponte entre a biologia

e a filosofia. E isto não significa divagar sobre questões da medicina. O que é filosofar senão buscar respostas para os antigos e os novos questionamentos? A bioética está eivada de questões relacionadas à vida ou dilemas que a medicina passou a enfrentar a partir de situações criadas pela biotecnologia. Nada mais pertinente do que filosofar, por exemplo, sobre o prolongamento da vida. Questões como essa tocam nada menos do que o inteiro sentido da nossa finitude, a atitude diante da morte e o significado biológico geral do equilíbrio entre a morte e a procriação. Questões metafísicas que suscitam outras bem práticas: quem deve ter acesso a essa presumível bênção? Estamos falando de viver mais, o que traz a necessidade de se falar também em viver melhor, pois ninguém gostaria de prolongar uma vida ruim. 33


ÉTICA

A esta altura, podemos enumerar outras questões suscitadas pelas novas tecnologias: remédios para o bom humor, experiências com seres humanos, eugenia, aparelhos que mantêm o paciente em estado vegetativo, doações de órgãos, transplantes. Existem casos em que a parafernália da técnica prorroga, indefinidamente, não propriamente o tempo de vida, mas um tal estado de penúria e sofrimento que o próprio paciente e a família rejeitam. É a hora de se pensar numa “boa morte”, na eutanásia. Os médicos brasileiros, por intermédio do Conselho Federal de Medicina (CFM) assumiram, no final de 2006, uma posição a respeito do assunto. Trata-se de uma doutrina, uma reflexão filosófica em que o CFM reconhece que existe um despreparo para questões dessa natureza: muito se ensina sobre tecnologia de ponta e pouco sobre o significado ético da vida e da morte.

Ética e responsabilidade A medicina ainda não tem a cura para o câncer, para a AIDS. Mas a evolução dos estudos genéticos já permite visualizar uma luz no final do túnel a esse respeito e de muitos outros problemas de saúde. O desenvolvimento da engenharia genética tomou forma nos anos 70. Na mesma década, inicia-se o mapeamento genético do homem pelo Projeto Genoma Humano, cujo sequenciamento foi concluído em 2006, com 99,99% das peças dos quebra-cabeças montadas. Foi aí que os cientistas descobriram que não basta saber onde os genes estão. É preciso saber como funcionam. Parodiando o velho Sócrates, quanto mais o homem sabe, mais consciência tem de que existe muito mais para conhecer. Aqui, o horizonte de atuações que se descortina para a ciência é imenso – eivado de dilemas e incertezas, uma razão a mais para se estabelecerem parâmetros, principalmente éticos. Como dizia Hans Jonas, a ética é o lenitivo da técnica. Considerando-se que o mapeamento genético refere-se aos genes e que eles representam 3% do 34

genoma; considerando-se que os genes seriam as palavras soltas, ainda sem articulação umas com as outras; considerando-se que ainda faltam 97% do genoma para serem desvendados, podemos, sim, fazer coro com o pessimismo de Evely Fox Keller: “Com as descobertas recentes da biologia molecular, o que se percebe é a grandeza do abismo que separa a informação genética do significado biológico”. Ainda falta muito para completar os capítulos e concluir o “livro da vida”. O que se percebe é que a humanidade, dadas as proporções universais assumidas pelas atuais tecnologias, precisa de uma nova ética: a ética da responsabilidade no sentido de “cuidar de”. A quem deve se dirigir esse apelo? Considerando-se que o poder tecnológico é coletivo, para lhe fazer face só o poder político, que é concedido pelos cidadãos. Resta, portanto, a via, institucional ou não, de uma educação geral da consciência por parte daqueles que estão qualificados e que a isso são impelidos pela sua própria consciência. Aqueles que detêm

o conhecimento nos diversos campos – num processo de interdisciplinaridade - devem se reunir espontaneamente nesta missão.

Divina Marques. Doutora em Ciências Ambientais pela UFGO. Mestre em Filosofia/Ética pela PUCCAMP. Especialista em Políticas Públicas pela UFGO. Graduada em Jornalismo pela UFGO. Professora de Ética e Redação na UFGO.




Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.