Edição 37, agosto de 1988

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A .lg.reja popular e a Política Entrevista com Pedro Oliveira* PROPOSTA - Dentro da possibilidade institucional e política aberta pela Constituinte, foram desenvolvidos no Brasil um conjunto de trabalhos de esclarecimento; de conscientização; de organização; alguns mais voltados para a Constituinte, mais ligados às emendas, mais ligados ao desenvolvimento de preocupações populares como saneamento, reforma agrária, que se refletiram na luta pelas emendas populares. E de outro lado também se desenvolveram trabalhos preocupados com a auto-organização popular. Existem experiências tipo Vila Velha, no Espírito Santo, onde encenou-se uma Constituinte. Existe o trabalho que Dom Mauro More/li desenvolveu. E tem o trabalho que algumas organizações, não-governamentais, tentaram desenvolver como por exemplo o CEDA C, que atuou dando muitos cursos, na tentativa de situar o que a Constituinte representava naquele momento (até as eleições de 1986).

Então, como você participou dessa preocupação de contribuir para a análise desse momento pol ítico junto a uma série de setores, você poderia me dizer com que setores trabalhou, com que preocupações nessa conjuntura, à luz da relação, talvez, do /SE R com este trabalho, mais particularmente da sua ação. Pedro Oliveira - Bom, primeiramente, houve um trabalho do /SER junto com cinco outras entidades: CEDAC, SEP, Pastoral Operária, CPT, /BASE. No infcio eram seis entidades. Foi um projeto financiado pelo /SE R, para a educação po/ ftica, para o momento Constituinte. Foi um projeto que o /SER apresentou, mas era um projeto das seis entidades em conjunto. • Teólogo, professor, membro do ISER .

No primeiro ano foi coordenado pelo /SER, no segundo ano aumentou o número de entidades e foi coordenado pelo CEDAC. Isto foi no início de 85, quando da convocação da Constituinte e a idéia desse programa era a seguinte: a gente viu que o pessoal da Igreja, bispos da Igreja Católica, estava por fora disso e vimos que havia um vazio e nos perguntávamos: como dar uma formação po1ftica nesse momento da Constituinte? Tenho a impressão que foi por aí que brotou a idéia e saiu esse projeto que está em curso até agora. A minha atividade foi principalmente no ano de 1986, quando fui coordenador do projeto, embora não estivesse- na coordenação • executiva. Nesse trabalho da Constituinte, estiveram presentes duas concepções. Uma concepção que pensava: é preciso influir na produção da nova Constituição. Houve toda uma série de trabalhos onde o CEDAC, o /BASE e a FASE se destacaram para não dizer outros mais, que era como trabalhar a Constituição e cujo resultado foram as emendas populares, a mobilização popular, o plenário próConstituinte que discutiam a Constituição. Houve uma segunda tendência, dentro da qual eu mesmo me situo e dentro da qual o /SE R se situou também. O !SE R menos, foi mais eu pessoalmente com um grupinho de assessoria do /SER, que foi o seguinte: aproveitando a discussão política nacional sobre Constituinte, como é que nós podemos dar uma formação política de mais fôlego a nfvel dos movimentos populares? Foi uma segunda vertente que talvez não tenha um resultado imediato em termos de mobilização em torno da Constituinte, mas foram momentos com cursos, reflexões etc. quase que a propósito da Constituinte,

para não dizer sob pretexto da discussão da Constituinte, onde se discutiu e se fazia formação pol ítica e agitação pol ftica. E foi por aí que eu dei minha contribuição. PROPOSTA - E você atuou basicamente com que tipo de grupos? Pedro - Dei cursos para o pessoal da Igreja. A nossa atuação foi quase sempre voltada para o pessoal da Igreja.

Falar "pessoal da Igreja" é uma coisa meio complica.Jia. Eu estou tentando entender teoricamente esse "pessoal da Igreja". O que é "pessoal da Igreja"? E gente de Igreja sim, mas não é todo mundo de Igreja. E gente de Igreja com uma certa militância pol ftica, um certo trabalho popular que se define muito mais pela sua metodologia de trabalho, do que propriamente por sua crença religiosa. Então, o que a gente fez nos encontros de dois, três dias de reflexão sobre a realidade brasileira com esse pessoal? Na verdade estava-se discutindo o quê? O movimento popular, autonomia do movimento popular, movimento popular e partido, movimento popular e a conquista do poder, a questão do poder, muito mais isso do que unicamente a questão da Constituinte, ou seja, como fazer para defender a reforma agrária na Constituição feita. Então, eu chamaria esse "pessoal de Igreja" uma categoria muito ampla. Evidentemente, não é todo "pessoal de Igreja", não é o pessoal liberal da Igreja, mas é o pessoal de Igreja que está em uma linha de trabalho, em uma linha de libertação, de transformação social, econômica e politica da sociedade e que se define muito mais enquanto grupo de trabalho, pela sua atividade, do que propriamente pela sua expressão de fé religiosa. São pessoas a quem não se per-

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