Edição 59, dezembro / 1993

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ESCOLAS E CRECHES COMUNITARIAS NO RIO: UMA HISTORIA DE "CORRER ATRAS" CONTRA A POLITICA DO "E- PEGAR OU LARGAR" -

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Maria Tereza Goudard Tavares Maria Cristina Martins Rita de Castro Maia

Em nosso cotidiano na assessoria às creches e escolas comunitárias do Rio, ao chegarmos nas unidades perguntando pela ausência de um educador ou liderança comunitária envolvida no trabalho, é comum a resposta: - "Foi à Secretaria, à creche, à CEDAE, à Light, à LBA, foi correr atrás da obra, do material, do processo, de apoio, da água, da luz, de verbas, de saneamento... " Como resposta às suas reivindicações muitas vezes o que asco. munidades obtêm é apenas a não resolução ou o atendimento parcial de suas demandas através do argumento: "Não há verbas!", "Só podemos oferecer isso: é pegar ou largar!", "A decisão é da Comunidade!" Esta é apenas uma ilustração da realidade que parte da população brasileira enfrenta na busca pelos seus direitos básicos de educação, saúde, transporte, habitação e da relação que o Estado estabelece com o cidadão de baixa renda. Tanto o argumento do "não há verbas" como o ilusório discurso da "participação" da comunidade na implantação e sustentação de serviços básicos escamoteiam as questões ligadas à gestão e à aplicação das verbas públicas, além de legitimarem a implantação de políticas de baixo custo. Estas propostas de participação comunitária tomaram corpo no aparelho de Estado a partir da década de 70. Com o avanço do processo de redemocratização do país e da rearticulação dos movimentos sociais, o goverProposta

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no busca legitimação social através dos programas oficiais de ajuda às populações "carentes". A parentemente democratizantes, estas políticas acabaram invertendo o lugar dos usuários dos serviços para o de co-responsáveis pela prestação de serviços que, na verdade, são direitos dos cidadãos.

Tanto o argumento do "não há verbas" como o ilusório discurso da ''participação" da comunidade escamoteiam as questões ligadas à gestão e à aplicação das verbas públicas. É nesta política que as experiências das escolas e creches comunitárias se inseriram. Consideramos estas experiências valiosas do ponto de vista dos movimentos sociais e da pressão por educação pública, mas bastante questionáveis enquanto propostas governamentais porque só serviram para a pulverização e o barateamento dos custos com a educação. O marco histórico da proliferação das escolas e creches comunitárias no Rio é a década de 70. Nesse período, o processo de redemocratização do país levou a uma reorgani-

zação dos movimentos sociais, principalmente das associações de moradores e grupos de mulheres. Eles que encaminharam em suas lutas a priorização da conquista dos direitos básicos - terra, saúde, saneamento, educação - e sua implementação em seus locais de moradia. Em alguns casos, como no da Favela da Rocinha (que desde os anos 60 já realizava trabalhos de educação), essas experiências se organizaram a partir de grupos de alfabetização de adultos e do trabalho com crianças e adolescentes repetentes da escola pública ou que se encontravam fora dela por exclusão ou falta de vagas. Tanto na Rocinha como em outras favelas, essas experiências se concentraram basicamente na área de educação infantil, onde o atendimento pela rede pública era inexistente ou inexpressivo frente à demanda. Segundo dados recentes do IBGE, existem mais de 300 mil crianças em idade pré-escolar (2 a 6

MARIA TEREZA GOUDARD TAVARES -

Pedagoga - Mestre em Educação pela UFF e Técnica de Educação do Depto. de Apoio às Creches e Escolas Comunitárias do Município do Rio de Janeiro. MARIA CRISTINA MARTINS - Professora - Mestre em Educação pela UFF e Técnica de Educação do Depto. de Apoio às Creches e Escolas Comunitárias do Rio de Janeiro. RITA DE CASTRO MAIA - Psicóloga e Psicanalista -IBRAPSI e Técnica de Educação do Depto. de Apoio às Creches e Escolas Comunitáijias do Município do Rio de Janeiro.

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