Edição 60, março / 1994

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PROPOSTA DE UMA POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA ALTERNATIVA João Ricardo W. Dornelles

Enfrentar a questão da violência e participar na elaboração de uma proposta de atuação no campo da segurança pública, mais do que nunca, passou a ser uma tarefa do conjunto da sociedade civil, principalmente dos movimentos populares. Assim, o tema passou a ser estratégico na realidade das sociedades conte mporâneas. A violência demarca de forma bem precisa dois modelos de sociabi lidade e duas concepções de práticas sócio-políticas. Por um lado, temos todas as diferentes experiências conservadoras que poderíamos definir como "Concepções da Ordem", que centraram a sua atuação no campo da manutenção da ordem pública priorizando mecanismos de repressão direta, buscando reproduzir um determinado modelo de sociedade. Por outro lado, temos as diferentes propostas que partiram da concepção de que não pode existir separação entre segurança pública c cidadania (essas experiências e propostas partem da noção de que a população, no exercício da cidadania, é o titular do direito à segurança pública). A partir da primeira concepção é que se apresentam as propostas de recrudescimento do aparato repressivo do sistema penal: introdução da pena de morte, criminalização de novas condutas, aumento da penali7ação dac; condutas já criminalizadas, redução da idade penal, militarização da segurança pública etc. Da segunda concepção aparecem propostas com base nas medidas preventivas, nas políticas públicas de cunho social e no respeito aos princípios de direitos humanos. Proposta

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60 março de 1994

É aqui que começa o problema. Como construir um caminho diferente? E as experiências implementadas em outras realidades? Como articular duas necessidades imperiosas: a) uma política de médio e longo prazo que minimize no futuro o impacto da violência, centrada nas medidas preYentivas, nas reformas de caráter social, na distribuição de renda etc e b) uma política de implementação imediata que dê resposta a problemas reais do cotidiano enfrentado pelo conjunto da população? O problema reside aí. A população requer medidac; imediatas. Não quer ser assaltada, 'iolenlada, morta, seqüestrada , a meaçada pela crim inalidade social ou pela criminalidade policial. Não quer se sentir no meio de um fogo cruzado entre polícia e bandido, produto da impunidade, da com1p<rão e da falta de uma política g lobalizadora que articu le o tmtamento da Yiolência criminal com a transformação do papel das políciac;, com uma norn Justiça Criminal, com

Enfrentar a questão da violência e participar na elaboração de uma proposta de atuação no campo da segurança pública passou a ser uma tarefa do conjunto da sociedade civil e dos movimentos populares.

prá ticas efetivas de natureza social que incorporem o conjunto da sociedade civil na busca de medidas alternatirns às diferentes manifestações da violência. Aqui estamos falando de uma série de coisas: capacitação policial para o desempenho das funções de proteção dos cidadãos; relacionamento da corpornção i:x1licial com a comunidade: a atuação policial centrada nas práticas de im·estigação, atra\éS da criminalís lica, ao im és da ,·iolência repressin1 ; remuneração adequada; plano de carreira; efetirn atuação dac; Defensorias Públicac; c dos Ministérios Públicos em conjunto com a sociedade etc. Estamos falando de medidas que possibilitem uma ruptura da cadeia crime-violência policiali m punidade-corrupção.

O desafio da violência e a busca de estratégias não repressivas Iniciando a nossa re11exão é imporlanle buscar uma ddinição doutrinária sobre o problema da segurança pública - no sentido restrito do lermo. Isto porque as políticas públicas , independente de se rem transpassadas por interesscs conl1 itantes - por vezes antagônicos também são definidas a partir de determinados pontos de vista consolidados (paradigmas) onde existe a tendência à concentração de uma

JO.:\O RICARDO

w.

DORNELLES -

Profes-

sor de

Crimin ologia e Direi tos Humanos na PUC-RJO e das Faculdades CTmdido l\,tendes

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