Edição 60, março / 1994

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EDITORIAL

AS TENDÊNCIAS DA VIOLÊNCIA NA VIDA SOCIAL BRASILEIRA

I

dentificamos o desenvolvimento de formas de generalização da violência organizada e difusa dentro e fora do Estado e avaliamos que diversas tendências se desenvolvem na vida social brasileira. Dentre elas está a questão do et1wcídio social ou processo seletivo de extermínio de segmentos sociais pobres e miseráveis, realizado sob as mais variadas formas, visando quase sempre grupos étnicos raciais definidos: negros, nordestinos etc. Outra tendência torna visível uma cultura da violência que é justificadora no plano ideológico, aterrorizadora no plano psicológico e favorável ao desenvolvimelllo de soluções autoritárias no plano da ordem social como, por exemplo, a violência dentro dafamt7ia que assume formas hierarquizadas de relações sociais. Assim destacamos a questão da infância e da juventude como um centro de inlimeras disputas simbólicas e de poder em torno das quais a cultura da violência e as formas de crime difundem a tendência ao incremento da violência. Uma terceira tendência diz respeito ao desenvolvimento das formas capitalistas na estrutura do crime organizado: narcotráfico, comércio e contrabando de armas, extorsão, seqüestro e corrupção cujos modos de organização envolvem estruturas e segmentos do aparelho policial, judiciário e do Estado. O crime hoje está infiltrado dentro de setores da representação política participando, portanto, das instâncias de legitimização do poder. Isso fa z com que a violência organizada e difusa, combinada com a crise econômica, enfraqueça os processos organi-::,ativos, até mesmo substituindo-os, produzindo um refluxo na organização associativa e comunitária particularmente nos bairros pobres e periferias urbanas. A quarta tendência baseia-se na indlÍstria cullllral de massas, na mídia e nos processos de forma ção de opinião plÍblica através dos aparelhos privados de hegemonia que acabam sendo polarizados pelo apelo ao uso da força como instrumento instaurador da segurança, desestruturando ainda mais os aparelhos policial e judiciário. A questão do aparelho judicial e das estruturas policiais se enl'ontra entrelaçada com a crise do Estado e do bloco no poder afetando diretamente os cenários sociais. Os casos do Rio de Janeiro e de Maceió são emblemáticos nesse se11tido. Mas podemos identificar na ação organizada e nas formas de violência direta e simbólica cenários parciais que são análogos a esses macro-cenários de visibilidade nacional. A disputa de poder político no Brasil se apresenta na lura pela cidadania e pelo "direito a ter direitos" em confronto com as ideologias que clamam pelo controle policial e militar do espaço público. A partir da identificação da violência como obstáculo podemos pensar nas estratégias de direitos e na luta pela justiça como instrumentos e valores-chave para barrarmos o genocídio social da era neo-liberal. Frente à urgência da ampliação e democratização neste debaJe e frente à exigência de elaboração de projetos estratégicos alternativos, a revista PROPOSTA espera poder colaborar na discussão política com este número sobre genocídio social. O 3


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