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Entrevista
JOANA MOSCOSO: “Uma cientista apaixonada pela ciência”
Joana Moscoso com raízes nortenhas, nascida e criada em Valença do Minho, cedo descobriu o seu fascínio pelas bactérias e que queria ser cientista. Entrou no curso de Biologia na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. No último ano do curso, partiu para a Universidade de Umeå, no Norte da Suécia, como estudante Erasmus. Estudou na Suécia, Austrália, Reino Unido. E fez-se cientista. Tem um percurso internacional invejável para a sua idade, e várias distinções pelo caminho. Uma delas, o prémio MIT Innovators Under 35, a mais importante distinção da MIT Technology Review, revista publicada pelo MIT – Massachusetts Institute of Technology, que reconhece líderes talentosos em todo o mundo. Tem os pés bem assentes na terra, mas o seu sonho, para além de deixar uma marca positiva no Mundo, é abrir um restaurante.
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EM PRIMEIRO LUGAR, FALE-NOS UM POUCO SOBRE SI: QUEM É JOANA MOSCOSO A TÍTULO PESSOAL?
Por dentro a Joana é uma jovem, alegre, exigente, curiosa, ambiciosa, de pés bem assentes na terra. Gosto de aprender coisas novas, não tenho medo de falar o que penso, sou amiga, sou companheira, sou mãe, sou filha e sou neta. Sou também uma profissional apaixonada. Sou preguiçosa para o desporto.
É UMA APAIXONADA POR CIÊNCIA E INOVAÇÃO. QUANDO DESCOBRIU ESTA SUA PAIXÃO?
Tudo começou aos 9 anos, quando aprendi na escola que existiam uns seres vivos muito pequenos, invisíveis a olho nu, a viver em todo o lado à nossa volta. São as chamadas bactérias. Ter sabido da sua existência mudou a minha vida. Fiquei tão fascinada e curiosa que decidi naquele momento que queria ser cientista para investigar as bactérias, perceber como é que organismos tão minúsculos podem ser tão capazes de nos deixar doentes ou tão engenhosos ao ponto de serem utilizados na produção de várias coisas que nos são úteis, como por exemplo o iogurte. Isto fez-me enveredar por uma carreira ligada à ciência e inovação.
É DOUTORADA EM MICROBIOLOGIA PELO IMPERIAL COLLEGE LONDON (REINO UNIDO), FELLOW DA MARIE SKŁODOWSKA CURIEE, COFUNDADORA DE DUAS EMPRESAS, A NATIVE SCIENTIST E A CHAPERONE, AMBAS LIGADAS À CIÊNCIA. EM QUE CONSISTEM? NO QUE SE DIFERENCIAM OU COMPLEMENTAM?
Ambas dão apoio à ciência e ajudam os cientistas a concretizar o seu trabalho e/ ou carreira. A Native Scientist é uma organização sem fins lucrativos que estabelece ligações entre crianças e cientistas para promover uma educação de ciência justa e de qualidade. Está presente em 9 países e já estabeleceu mais de 20 mil ligações entre crianças e cientistas. Cofundei a Native Scientist com uma colega, a Tatiana Correia, também investigadora, quando vivíamos em Londres. A Chaperone visa democratizar o acesso a serviços de desenvolvimento de carreira na ciência. Através de formações em grupo, sessões individuais, bootcamps ou webinars, junta cientistas e consultores de carreira. É a primeira plataforma online no mundo de apoio personalizado à carreia dos cientistas. Reúne cerca de 40 consultores de carreira que no seu conjunto apoiam os cientistas em mais de 50 tópicos diferentes. Cofundei a Chaperone com um colega, o Pedro Resende, também investigador, quando os dois trabalhávamos no i3S, um instituto de investigação e inovação em saúde no Porto.
RECEBEU O PRÉMIO MIT INNOVATORS UNDER 35, A MAIS IMPORTANTE DISTINÇÃO DA MIT TECHNOLOGY REVIEW, REVISTA PUBLICADA PELO MIT – MASSACHUSETTS INSTITUTE OF TECHNOLOGY, JUNTAMENTE COM TATIANA CORREIA DEVIDO À NATIVE SCIENTIST. QUE SIGNIFICOU ESTE PRÉMIO PARA SI?
Este prémio foi um reconhecimento pelo trabalho feito até à data no âmbito da Native Scientist e uma alavanca para o seu futuro. Foi atribuído na sequência de outros prémios. Considero que os prémios são uma forma de validar os projetos em que estamos envolvidos e uma indicação de que estamos no bom caminho. Dão visibilidade. Abrem portas.
FORA ESTAS DUAS STARTUPS, É AINDA STRATEGIC ADVISOR & MENTOR DE “CARTAS COM CIÊNCIA”. OUTRO PROJETO LIGADO À CIÊNCIA?
A Cartas com Ciência visa promover a literacia científica na lusofonia. Estabelece ligações entre crianças/adolescentes e cientistas através de um programa de troca de cartas e atua nos países de língua oficial portuguesa. Foi fundado pela Mariana Alves e pelo Rafael Galupa, os quais conheci através da Native Scientist.
É TAMBÉM EMBAIXADORA DA PEACH, LIGADA A CRIANÇAS. EM QUE CONSISTE ESTE PROJETO?
Este projeto promove o bilinguismo e multilinguismo em crianças e famílias que usam mais do que uma língua no seu dia-a-dia. Visa dar a conhecer os desafios e benefícios de educar uma criança com mais do que uma língua. É muito relevante no contexto das comunidades migrantes, que naturalmente têm o potencial de ser bilíngues ou multilinguismo, mas onde isto nem sempre é potenciado ou valorizado.
OUTRA DAS SUAS PAIXÕES SÃO AS BACTÉRIAS. ESTUDOU-AS NO IMPERIAL COLLEGE LONDON, NO 3S – INSTITUTO DE INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO EM SAÚDE DA UNIVERSIDADE DO PORTO, E AINDA EM CAMBERRA, NA AUSTRÁLIA. AINDA É UMA COISA QUE A APAIXONA?
Também as estudei na Suécia, e em estadias mais curtas, na Alemanha, Suíça e França. Andei a “colecionar países” à medida que progredia na carreira científica. Ainda me fascinam, sim, mas à medida que me sentia cada vez mais cientista, foi-me apaixonando por outras coisas e dando asas a essas paixões. Encaro esta capacidade de me deslumbrar com coisas novas com naturalidade. A mudança dá-me energia e traz novas oportunidades.
JÁ ATINGIU TANTO E AINDA NÃO CHEGOU AOS 40 ANOS. O QUE AINDA LHE FALTA ATINGIR?
Não faço ideia! Espero que muita coisa, mas se não for assim, está tudo bem na mesma. A verdade é que me foco em viver um dia de cada vez e em fazer a diferença todos os dias da minha vida. Tento contribuir de uma forma positiva para mim, para os que me rodeiam, e para a sociedade. Gosto de me sentir leve e de acordar sabendo que no dia anterior dei o meu melhor.
DURANTE A PESQUISA PARA ESTA ENTREVISTA, DESCOBRI QUE ADORA ESTAR COM A FAMÍLIA E OS AMIGOS E DEGUSTAR UM BOM PETISCO. QUE SONHA EM TER O SEU PRÓPRIO RESTAURANTE UM DIA. AINDA TEM ESTE SONHO?
Sim, ainda tenho o sonho de ter o meu próprio restaurante. Cresci no seio de uma família do ramo da restauração e hotelaria. À conta disso, fui trabalhadora-estudante dos 12 aos 21 anos. Na altura não gostava da “obrigação” de me envolver e ajudar no negócio da família, mas hoje considero essa experiência uma das minhas maiores valias. Ficou entranhado e considero a gestão de um restaurante uma arte.