Folias de
Reis
Folias de
Reis
agosto /// novembro 2018
Sesc Paรงo da Liberdade Espaรงo das Artes Praรงa Generoso Marques, 189 - Centro | Curitiba - Paranรก
Folias de
Reis
As culturas populares e a salvaguarda do patrimônio imaterial vêm ganhando na atualidade cada vez mais espaço. Até porque, apoiar, documentar, difundir as tradições e dar o merecido valor à memória das festas e dos saberes do povo é uma tarefa inadiável para a construção de um futuro rico em diversidade. Neste caminho de inclusão e de dar força aos saberes populares para um futuro melhor é fundamental olhar o passado. Nele reconhecer, por exemplo, uma profusão de festas populares cujo sentido era comemorar com devoção as etapas vencidas. Etapas que regiam a construção da vida e das riquezas do país. Neste contexto, as Festas de Reis, capitaneadas pelas folias de Reis, tem um papel marcante na história do povo brasileiro. Ao perpetuar esta festa e permitir o encontro da comunidade com sua história a folia de Reis torna-se uma ferramenta importante para revisitar os valores do indivíduo e para despertar esperanças da coletividade na construção de um mundo mais sustentável e solidário.
Aqui, nosso trabalho é dar a conhecer a identidade desta festa popular que é um corpo vivo também chamado de folia, companhia, embaixada, terno, bandeira. Acontece tradicionalmente no período de 24 de dezembro a 06 de janeiro (Dia de Reis). Neste período, um grupo majoritariamente formado por homens, visita casas de devotos cantando em versos a viagem dos três Reis Magos homenageando assim, o menino Jesus recém-nascido. As companhias de Reis, levando à frente uma bandeira, que é símbolo do grupo e dos Reis Santos, percorrem comunidades e casas dos devotos cumprindo a obrigação de cantar toadas e de levar alento a quem aguarda por elas o ano inteiro. Um ritual popular que mistura solenidade e alegria, festa e fé, que é marca de tradição e sociabilidade em muitas partes do Brasil. A tradição de “cantar Reis” ou “cantar as janeiras” provavelmente veio de Portugal para o Brasil no período da colonização e ganhou devotos em diversas regiões do país por conta dos milagres atribuídos aos três Reis Magos: Baltazar, Melchior e Gaspar. Contam alguns foliões que a primeira folia de Reis do mundo foi formada por eles e que os Reis viajavam tocando viola, rabeca e caixa. A companhia de Reis segue sua caminhada pedindo ofertas por onde passa a fim de realizar uma grande festa coletiva no Dia de Reis, para a qual toda a comunidade é convidada e dona da comemoração. Lia Marchi
Contexto A folia congrega não somente a expressão musical e literata do povo, mas um conjunto sociocultural de formas de pensar, viver e interpretar o mundo, marcando na sua caminhada valores como a união, a experiência do homem com o sentido do divino, a partilha por meio da festa comunitária e o rito de passagem de um ano para o outro celebrado no agradecimento sincero e na promessa de continuar cantando Reis. A festa de Reis é um momento ápice de seus devotos que agradecem os milagres concedidos e alimentam a esperança de um futuro melhor. O costume de “tirar” uma folia está intimamente ligado à vida do campo. Nas últimas décadas, as transformações na estrutura da vida rural provocaram
alterações e exigiram adaptações nas companhias de Reis a fim de que continuassem a existir no campo ou na cidade. Enfrentam, entre outros, o desafio de estabelecer um diálogo entre as culturas do mundo rural fortemente ligado às festas comunitárias e um universo urbano aparentemente desligado delas. Trazer às novas gerações o sentido que a folia carrega implica em apresentar a elas o universo da vida comunitária que motiva a festa e que liga a música a uma devoção. Com certeza uma saída para impedir que tamanho conhecimento fique só na memória dos avós e não no cotidiano dos netos. Justa e orgulhosamente presentes na área urbana e rural, os foliões seguem se negando a acreditar em distâncias insuperáveis e nos convidam a participar da história que carregam.
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Deslocamentos Hoje em dia, as folias de Reis estão no campo e na cidade. Ao procurar a zona urbana em busca de melhores condições de vida, o homem do Brasil rural trouxe sua bagagem cultural ainda que tendo que se adaptar a uma outra dinâmica de tempo, de espaço e modos de produção e consumo. Neste universo, a festa coletiva, que nem sempre é tida como imprescindível vai corajosamente se apresentando, vencendo barreiras. As narrativas de fé nos milagres dos Reis, as memórias das colheitas e da vida coletiva, as lendas e causos para contar o inexplicável que acompanham o imaginário sobre jornada da companhia seguem com novas gerações e conseguem perpetuar as folias em novos contextos. As festas de Reis vão se reinventando e ganham novos sentidos conforme a vida dos foliões se transforma. E como a maioria das tradições populares, continua viva porque expressa o seu tempo, dá voz aos seus mantenedores.
Devotos Os devotos dos Reis Santos realizam festas, cortejos, ofertas e banquetes em sua honra, cumprindo promessas por graças recebidas. Para eles é uma alegria e uma necessidade receber a folia em casa e muitas vezes oferecem aos foliões comida e pousada.
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Bandeira A bandeira anuncia a chegada da folia. Abre caminho para a companhia e é recebida na porta da casa pelos moradores que aguardam a visita abençoada e beijam a bandeira em sinal de respeito. Objeto de devoção para os foliões ela carrega imagens como a estrela de Belém, cenas do nascimento com a Sagrada Família e os Três Reis. Decorada com flores e fitas, recebe perfume nas casas em que passa e muitas vezes os devotos penduram notas de dinheiro e fotos em agradecimento a graças recebidas. Os donos da casa costumam levar a bandeira por todos os cômodos como uma forma de proteger sua moradia.
Presépio
Gerson Sobreira, Londrina - 2017
Montar o presépio é uma antiga tradição do ciclo natalino e a folia de Reis canta diante dele nas casas que visita. Por vezes o presépio, ou lapinha, ocupa uma sala inteira e mobiliza toda a família para embelezar a festa. Dizem os foliões que o bom embaixador deve fazer versos para todas as imagens ali representadas. Não raro os devotos colocam no presépio, alem da Sagrada Família e dos Três Reis, imagens de outros santos. Tradicionalmente o presépio é montado em dezembro e desmontado no dia 6 de janeiro, Dia de Reis.
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Componentes
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
A folia em geral conta com um embaixador (ou mestre, capitão, folião de guia) que é o responsável pelo grupo. O contramestre (ou contraguia, entre outros nomes) é a figura que auxilia o embaixador em suas tarefas. Por sua vez, o alferes (ou porta-bandeira, bandeireiro, estandarte) é uma figura essencial da companhia, encarregado de levar a bandeira dos Reis. Muitas folias contam com o palhaço, um brincante mascarado que acompanha o conjunto. Os demais membros são chamados de foliões. Muitas vezes os foliões contam com o auxílio de acompanhantes, em geral parentes, amigos e devotos que se juntam ao cortejo, mas estes não são chamados de foliões, pois não têm a obrigação de seguir a companhia por todo o período das saídas do grupo.
Personagens específicos Palhaço
Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
O palhaço ou bastião é representado pela figura de um mascarado que acompanha a companhia e exerce várias funções importantes: informa o embaixador de pedidos do dono da casa, de situações a serem cantadas no verso, brinca e entretém a audiência com danças de espadas, recolhe as ofertas para a companhia e distribui prendas às crianças. Há folias que tem um, dois ou três palhaços, que podem ser homens ou mulheres (no caso, a bastiana). Contudo, alguns embaixadores acreditam que a folia de Reis não deve ter palhaço e consideram esta figura uma representação do diabo.
Embaixador O embaixador ou mestre, capitão, guia é o líder da folia e estabelece as regras e procedimentos da companhia de Reis. Figura central para o bom andamento do grupo, ele deve saber todos os preceitos da tradição para cantar Santos Reis.
Folião Os foliões são devotos que cantam e tocam, compondo o grupo não só pelas suas habilidades musicais, mas principalmente pela fé e pelo profundo desejo de cumprir a promessa de homenagear Santos Reis.
Cantores e instrumentos Os foliões tocando e cantando auxiliam o embaixador e o contramestre em vozes que recebem diversas denominações. O embaixador inicia (puxa) os dois primeiros versos da quadra, completados (respondidos) pelo contramestre, cantando em dueto. As demais vozes – contrato, requinta, tala, talinha, tipe, contratipe, baixo, entre outras – variam em número e em altura e formam o coro, repetindo todo o texto ou os finais de frases. Assim como a composição instrumental das folias é diversa, a composição vocal dos grupos também não é fixa. Um mesmo folião poderá cantar em diferentes vozes e da mesma forma mais de um folião poderá executar uma determinada voz. Uma folia poderá ser cantada por quatro, cinco, seis ou mais vozes. O nome atribuído às vozes na folia varia de região para região, e por vezes em grupos da mesma região.
Transformação do conjunto instrumental
Em tempos passados, as folias de Reis tinham sérias dificuldades para conseguir instrumentos musicais e até mesmo repará-los. Na zona rural, em localidades pequenas e até isoladas o acesso aos instrumentos era um obstáculo a ser vencido. De toda forma, eles vinham de lutiers, artesãos responsáveis por criar a partir das matérias primas da região violas, rabecas, pandeiros e caixas (espécie de tambor com duas peles e tocados com baquetas). A viola de dez cordas, conhecida como viola caipira ou viola de arame era na maioria das vezes o instrumento do Embaixador. O som da viola era acompanhado pelo violão, pela rabeca, a caixa, o pandeiro e por outras percussões que formavam o conjunto instrumental dos grupos. Com o passar do tempo, as dificuldades foram diminuindo, a facilidade de deslocamento foi aumentando, a possibilidade de comprar instrumentos em lojas passou a existir. O aparecimento do rádio e outros meios de comunicação trouxeram outros padrões musicais. As violas artesanais deram lugar a instrumentos de fábrica. Os violões, cavaquinhos e outros cordofones como por exemplo o bandolim, começaram a ser incorporados pelas folias. A rabeca também foi parcialmente substituída pelo violino industrializado. A sanfona ganhou lugar de destaque em muitos grupos. Entretanto, nos dias atuais, as companhias nem sempre encontram músicos para se dedicar as folias. Gerson Sobreira, Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus. Londrina - 2017
Folias de
Reis
Companhia de Santos Reis Grupo Menino Deus (Londrina)
Textos e pesquisa Lia Marchi
João Pracinha - Embaixador /// Sebastião Ramos Filho - Contramestre /// Verônica Augusta M. Oliveira - Bastiana /// Abílio José Ferreira - Bandeireiro /// Paulo Dionísio - Viola /// Salvador Tobias - Violão /// Welintom Aparecido Maciel de Oliveira - Caixa /// Gustavo Henrique S. Silva - Marungo Onofre Alves Ferreira - Voz
Fotografias Gerson Sobreira Memória (objetos, vestimentas, imagens, instrumentos, toadas) Companhia de Reis (Curitiba) Orlando Maceno – Bandeiras /// Inácio Bello dos Santos – contra mestre / violão /// Benedito Julião contra mestre / violão /// Adriano Bello dos Santos – cavaquinho /// Miguel Marinho Bello dos Santos - cavaquinho /// Ademir Jacinto Filho - cavaquinho /// Osmar Filmo da Silva - pandeiro /// Lucas Gabriel Kovalski – requinta pandeiro /// Matheus Vinicius da Cruz dos Santos – caixa /// Paulo Henrique da Cruz dos Santos – caixa /// Marco Aurélio de Ramos – Caixa /// Deniz Henrique de Ramos Casado – requinta caixa /// Paulo Cezar dos Santos - Bastião Rodrigo Correia - Bastião
SESC PR Presidente do Sistema Fecomércio Sesc Senac Paraná Ari Faria Bittencourt
Grupo Mensageiros da Paz (Londrina) Alexandre Garbosi - Bastião /// André Garbosi Bastião Mirim /// Aparecido José Soares - Contralto / Viola /// Caroline Garbosi - Bastiã Mirim /// Cláudio Azarias - Contramestre / Acordeon /// Francisco Garbosi - Embaixador / Violão /// Francisco Muriel - Bastião /// José Arilson de Jesus - Vende livros da companhia /// Lauro Veiga - Caixeiro /// Luiz Liberato da Costa - Tala (6ª Voz) / Viola /// Maria do Carmo Garbosi - Requinta (7ª Voz) / Pandeiro /// Osmar Ferreira de Oliveira - Violão /// Salvador Silvério de Campos - (5ª Voz) / Violão /// Sandra Maria Garbosi de Jesus - Bandeireira /// Waldemar Eugênio Batista - (4ª Voz) / Viola
Operador de Luz e Som Jerison Soares da Silva
Diretor Regional do Sesc Paraná Emerson Sextos
Assistentes Técnicos Administrativos Edilaine Rech /// Marcos Ricardo Guerra Marjorie Andrade /// Melissa Maciel Paiva Waldir Honório de Carvalho
Divisão de Educação e Cultura Diretora da Divisão de Educação e Cultura Maristela Massaro Carrara Bruneri
Assistentes Administrativos Marcelo Alves /// Roberto José Barbosa /// Teresinha de Jesus Ribeiro Derenievicki
Coordenador geral do Núcleo de Comunicação Cesar Luiz Gonçalves
Sesc Londrina Cadeião Gerente Executivo Alexandre Simioni
Sesc Paço da Liberdade Gerente Executiva Celise Helena Niero Assistente de Gerente Aglair da Cruz Técnicos de Atividades Ângela da Silva Xavier /// Luana Oliveira /// Marcelo Cruz /// Mariza Muniz /// Thiago Estevão Calixto de Castro Orientadores de Atividades Lucas Françolin da Paixão /// Maria Luiza J. Gomes /// Raimundo Luiz dos Santos /// Roger Henrique Wodzynski /// William Machado
Técnica de Atividade Viviane Guilhermino Sesc Paranavaí Gerente Executivo Ubiratan Angelo Fernandes Técnico de Atividades Edson Godinho