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ANO XXX– Nº 313 – JUNHO/JULHO 2011
CÓDIGO FLORESTAL
Agronegócio tenta flexibilizar lei para devastar o país Páginas 8 e 9
JORNADA
ESPECIAL
A hora da Juventude do MST
Os 30 anos do Jornal Sem Terra
Páginas 3 e 10
Encarte
EDITORIAL Reforma Agrária ainda tem espaço no Brasil e se transforma em medida fundamental
O desafio é arrancar conquistas A REFORMAAGRÁRIA foi abandonada pelos governos federais nas últimas décadas, com a implantação do modelo neoliberal. Nesse modelo não havia espaço para a Reforma Agrária clássica, que tinha como objetivo desenvolver as forças produtivas no campo e transformar o camponês pobre em consumidor de tecnologia, insumos agrícolas e produtos industrializados.
A Reforma Agrária é uma alternativa fundamental para o enfrentamento de dois problemas graves: a questão da produção de alimentos e a questão ambiental. Infelizmente, até agora, parece que a Reforma Agrária não tem espaço no modelo neodesenvolvimentista do governo Dilma. Tanto que no projeto de combate à miséria, ela não está colocada como uma prioridade. Nesse novo modelo, o Estado retoma o papel no desenvolvimento, principalmente investindo em infraestrutura. No entanto, a Reforma Agrária ainda tem espaço no Brasil e é uma medida fundamental para o enfrentamento de dois problemas graves: a questão da produção
de alimentos e a questão ambiental. As grandes empresas que produzem commodities a partir da monocultura já não respondem às novas necessidades, cada vez mais crescentes, de construir um modelo que represente a soberania alimentar. Não conseguem produzir alimentos mais saudáveis, vinculando o hábito alimentar à questão da saúde e à qualidade de vida. Por isso, a agroecologia assume um papel determinante na produção de alimentos, vinculando a produção sem agrotóxicos à questão da convivência com o meio ambiente. A cada dia acontecem mais catástrofes e desastres ambientais, relacionados ao modelo de desenvolvimento agrícola da Revolução Verde. A Reforma Agrária, além de moderna, contemporânea e necessária, é determinante para evitar uma possível crise alimentar e o caos ambiental. Desde abril, estamos em processo de negociação com o governo federal. Apresentamos uma pauta e aguardamos uma resposta. O governo tem subdividido a nossa pauta em dois eixos principais: (1) enfrentamento com o latifúndio (desapropriação de terras e assentamento de novas famílias, que denominam como “obtenção de terras”); e (2) desenvolvimento dos assentamentos. Propomos ao governo uma meta de assentamento de 100 mil famílias por ano. As respostas são sempre as mesmas: falta equipe técnica, falta orçamento, muita
burocracia no processo expropriatório... Na verdade, o governo não tem uma posição firme para enfrentar essa questão. Já em relação ao desenvolvimento dos assentamentos, o governo Dilma criou expectativas positivas, principalmente nas questões voltadas ao “melhorismo social”. Nesse campo, houve alguns avanços, como em relação ao programa de habitação, assistência técnica, programas de comercialização, implementação de agroindústrias e até infraestrutura. No entanto, ainda estamos longe de ter respostas aos problemas centrais para o desenvolvimento da produção nos assentamentos. Nas negociações, vamos apresentar uma pauta enxuta, com poucos pontos, mas que qualifique o debate e quantifique as propostas. Nossa pauta está centrada em cinco questões básicas: 1-Questão da terra: suplementação orçamentária para 2011, para que o Incra possa assentar prioritariamente as famílias acampadas. Apresentar proposta de orçamento para 2012 para assentar 100 mil famílias e cobrar do governo compromissos assumidos, como a atualização dos índices de produtividade. 2-Questão do crédito: propomos resolver de imediato a questão das dívidas, pois o atual nível de endividamento impede as famílias assentadas de acessar novos créditos. Reforçamos a proposta da criação de um novo crédito, disponibilidade
Palavra do leitor O governo deve pensar no Brasil e nas gerações futuras. O Brasil não é somente soja, milho, cana e carne. Não devemos de forma alguma abrir mão da recomposição e da preservação das áreas de preservação permanente, das margens dos rios, lagos, nascentes, mangues e pântanos. Não se deve, de jeito nenhum, deixar de punir aqueles
que por conta de aumentar os seus espaços agropecuários cometeram crimes ambientais. ANTONIO CARLOS DA ROCHA, Taquarussu, no Mato Grosso do Sul
Quebrar barreiras Meu apoio ao MST ultrapassa os limites de minha vida privada. Reconheço que nossa maior luta será
mostrar para a sociedade o outro lado do movimento. Precisamos quebrar as barreiras conservadoras ou blindadas da classe média. Acredito que só através da pressão, da mobilização e do protesto é que visualizaremos algum caminho. Tenho fé em melhores dias para quem historicamente já fora tão excluído e marginalizado neste país. FILIPE MARINHO
Edição: Igor Felippe Santos. Revisão: Aline Scarso, Joana Tavares, Luiz Felipe Albuquerque e Vivian Fernandes. Edição de imagens: Marina Tavares. Projeto gráfico e diagramação: Eliel Almeida. Assinaturas: Mary Cardoso da Silva. Impressão: Atlântica Gráfica e Editora Ltda.. Tiragem: 10 mil exemplares. Endereço: Al. Barão de Limeira, 1232 – CEP 01202-002 – São Paulo/SP – Tel/fax: (11) 2131-0840. Correio eletrônico: jst@mst.org.br. Página na internet: www.mst.org.br. Todos os textos do Jornal Sem Terra podem ser reproduzidas por qualquer veículo de comunicação, desde que citada a fonte e mantida a íntegra do material.
“Eu apoio o MST porque eu penso que a luta do MST é uma luta que pode levar à integração do último setor da sociedade brasileira que precisa ser integrado. O MST é o movimento social mais importante do Brasil no século 20, porque enquanto
Mande sua mensagem para o Jornal Sem Terra
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DIREÇÃO NACIONAL DO MST
FRASE DO MÊS
Código Florestal
Ilustração de Carlos Latuff, especial para o JST
de custeio anual, crédito para a integralização das cooperativas e uma política de financiamento de agroindústrias nos assentamentos no BNDES. 3-Educação: construção de escolas nos assentamentos e não permitir fechamento de nenhuma. Em relação ao Pronera, aumentar recursos, contratação imediata de todos os projetos aprovados e o investimento em projetos para o combate ao analfabetismo; 4-Comercialização: fortalecimento do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e da Conab, disponibilizando mais recursos para operacionalizar e qualificar o programa, aumentando o recurso que cada família individualmente pode acessar. 5-Assistência técnica: garantir a universalização da assistência técnica para atender a todas as famílias assentadas. Discutir os problemas do novo programa de assistência técnica, como a questão da metodologia de contratação e operacionalização dos projetos. O maior desafio que nos cabe hoje é dar centralidade à pauta, às negociações e arrancar conquistas na questão da terra, com a desapropriação de latifúndios e o assentamento de novas famílias. Dessa forma, não vamos cair na “tentação” de discutir os pontos mais cômodos para o governo, como o desenvolvimento dos assentamentos.
todos os segmentos da população
Sua participação é muito importante. As correspondências podem ser enviadas para jst@mst.org.br ou para a Alameda Barão de Limeira, 1232, Campos Elíseos, São Paulo/SP, CEP 01202-002. As opiniões expressas na seção “Palavra do leitor” não refletem, necessariamente, as opiniões do Jornal sobre os temas abordados. A equipe do JST pode, eventualmente, ter de editar as cartas recebidas.
brasileira não estiverem integrados na instrução e na consciência política não haverá democracia real no Brasil” ANTONIO CANDIDO, professor e crítico literário
JORNAL SEM TERRA • JUN/JUL 2011
ESTUDO Reforma política deve dar nova regulamentação a plebiscito, referendo e iniciativa popular
Mais poder para o povo Não queremos a “inclusão” nesta ordem que aí está. Queremos mudar essa ordem. Por isso, a reforma do sistema político é um elemento-chave na crítica às relações que estruturam esse sistema. O patrimonialismo (e o patriarcado a ele associado), o clientelismo (e o nepotismo que sempre o acompanha), a relação entre o populismo e o personalismo (que eliminam os princípios éticos e democráticos da política) e as oligarquias (escoltadas pela corrupção e sustentadas em múltiplas formas de exclusão) são elementos estruturantes do atual sistema político brasileiro que queremos transformar.
JOSÉ ANTONIO MORONI COLEGIADO DE GESTÃO DO INSTITUTO DE ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS (INESC)
Democracia direta A reforma deve dar nova regulamentação aos mecanismos de democracia direta: plebiscito, referendo e iniciativa popular. Esses instrumentos precisam estar nas mãos do povo, e não do Parlamento (que tem exclusividade para convocar plebiscitos e referendos). É necessário definir o que os nossos representantes não têm poder de decidir sem a nossa participação via democracia direta. É necessário simplificar a ini-
Os eixos da construção de uma verdadeira reforma do sistema político: 1 – Fortalecer a democracia direta; 2 – Fortalecer a democracia participativa; 3 – Aprimorar a democracia representativa: sistema eleitoral e partidos políticos; 4 – Democratizar a informação e a comunicação; 5 – Democratização do Poder Judiciário Para mais informações, acesse www.reformapolitica.org.br
de comunicação privados e a dificuldade para o acesso às informações públicas, assim como o isolamento do Poder Judiciário das demandas populares e a sua elitização. É preciso democratizar as relações de poder. Democracia é muito mais que apenas um sistema político formal. É preciso devolver o poder ao povo, de onde ele nunca devia ter saído.
Joka Madruga
A REFORMA POLÍTICA está presente na agenda há vários anos, mas orientada por interesses eleitorais para gerar alterações periféricas. Nas discussões acadêmicas e da mídia, é um objeto a ser pesquisado ou solução dos males do país, melhorando a governabilidade do Estado (manter as elites no poder) para aumentar sua eficiência (atender melhor aos interesses das elites). Na sociedade civil organizada (organizações e movimentos), que defende a radicalização da democracia, esse debate tem um contexto mais amplo, ligado às mudanças no sistema político, na cultura política, tanto na sociedade como no Estado. A verdadeira reforma deve enfrentar problemas de origem, como patriarcado, racismo, patrimonialismo, oligarquia, nepotismo, clientelismo, personalismo e corrupção (entendida como usurpação do poder do povo pelas elites). Reforma política é a reforma do próprio processo de decisão e do poder, da forma de exercê-lo, dentro da relação de quem exerce, em nome de quem se exerce e quais os mecanismos de controle em uma sociedade tão desigual como a nossa. Por isso, deve estar alicerçada nos princípios da igualdade, diversidade, justiça, liberdade, participação, transparência e controle social. E não pode ser apenas reforma eleitoral. Se todo poder emana do povo, reformar o sistema político é pensar como esse poder deve ser devolvido ao povo, que tem o direito de exercê-lo de forma direta, e não apenas por delegação (para quem elegemos). Democracia é muito mais que apenas ter “eleições limpas”. Por isso, é preciso enfrentar as desigualdades de sexo, raça, étnica e de renda nas formas de exercer o poder. Defendemos a radicalização da democracia para enfrentar todas as formas de desigualdades e preconceitos, promovendo a igualdade, diversidade e participação política. Isso significa ampliar as possibilidades de participação, incluindo os sujeitos políticos historicamente excluídos dos espaços de poder.
ciativa popular, diminuindo o número de assinaturas (são necessárias 1,5 milhão de assinaturas para iniciativa popular e apenas 480 mil para se criar um partido político) e criar um rito próprio de tramitação. Precisa também repensar a atual arquitetura da participação (democracia participativa). A multiplicação de espaços como conselhos e conferências não significa automaticamente a partilha de poder. Precisamos caminhar na direção da construção de um sistema integrado de participação que inclua a política econômica e de desenvolvimento. Precisamos aprimorar a democracia representativa, priorizando a democratização dos partidos e a qualificação dos processos eleitorais. A fidelidade partidária, financiamento público exclusivo de campanha, votação em lista fechada (com alternância de sexo e respeito a critérios raciais) e a possibilidade de revogação de mandatos pela população devem ser prioridades. Antes de tudo é necessário criar a equidade nas disputas políticas que se fazem via mecanismos da democracia representativa. Não existe reforma do sistema político sem enfrentar o poder dos meios
Os 18 mil delegados do 5º Congresso do MST, na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em 2007, acusam o Estado
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Xandi/Arquivo MST
ENTREVISTA A Jornada da Juventude Sem Terra pretende desencadear processo de diálogo com os jovens
Trabalho e renda, educação, formação, produção, cultura e saúde. Esses são temas relacionados à vida dos jovens dos assentamentos e acampamentos, que são mais de 500 mil. Para discutir esses assuntos, o Jornal Sem Terra apresenta entrevista de Antônio Neto e Dionara Ribeiro, integrantes do Coletivo Nacional da Juventude do MST. “Nesse momento que o MST está passando, de olhar mais para dentro e construir um processo de mobilização na nossa própria base, os desafios da juventude são também os principais desafios do conjunto do Movimento”, afirma Neto. Em agosto, o Movimento promove a Jornada da Juventude Sem Terra, dentro de um esforço concentrado de trabalho de base com os jovens. “Queremos mobilizar mais de 70 escolas com diversas atividades, potencializar e aproveitar esse espaço para mobilização e organização”, explica Dionara.
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LUIZ FELIPE ALBUQUERQUE SETOR DE COMUNICAÇÃO
Jornal Sem Terra – Em agosto, acontecerá a Jornada da Juventude Sem Terra. Quais os objetivos dessa jornada? Antônio Neto – Queremos mobilizar mais de 70 escolas com diversas atividades, potencializar e aproveitar esse espaço para mobilização e organização. Essa atividade vai ganhar mais força a partir do momento em que cada escola adotar essa jornada no seu calendário. A escola tem que ser o ator principal. Além de tudo, visamos o próximo Congresso Nacional do Movimento, que acontece ano que vem, para que seja um congresso mais jovem. A juventude deve ter mais voz nesse espaço, contribuindo no processo de definição dos rumos do Movimento. Dionara Ribeiro – O objetivo maior da jornada é mobilizar a juventude que está nas escolas dos assentamentos e acampamentos, além dos estudantes das escolas fora desses espaços. Mas, acima de tudo, queremos criar uma mística dentro do Movimento para que agosto seja o mês da juventude. Será um ambiente para exercitar a atuação conjunta de diversos setores em um único espaço. A expectativa é que daí
se desencadeie um processo de organização para além desse espaço. JST – Quais são os maiores desafios do coletivo da juventude? AN – Nesse momento que o MST está passando, de olhar mais para dentro e construir um processo de mobilização na nossa própria base, os desafios da juventude são também os principais desafios do Movimento. Temos o desafio principal de fortalecer os coletivos nacional, estaduais e regionais da juventude. As tarefas da juventude não são apenas para resolver os problemas específicos desse segmento. São tarefas que o conjunto da organização nos coloca para ajudar na resolução dos nossos problemas. Aí estão colocadas algumas bandeiras relacionadas diretamente à juventude. JST - Quais são as bandeiras mais importantes? AN – A primeira é o tema do trabalho e da renda. A possibilidade e a necessidade de construir políticas públicas que ajudem a articular essa questão, como forma de permanência da juventude no campo. Esse é o grande fator que faz com que a juventude saia do campo. Não pela falta de trabalho nos assentamentos. A juventude trabalha na roça
dos pais e, no final do mês ou da semana, a família tem acesso à renda daquilo que foi vendido. Nesse modelo de família patriarcal, onde a figura do pai é central e tudo que se ganha na família vai para dentro de casa, não existe uma forma de repassar os ganhos para o jovem. Essa situação limita a autonomia dos jovens dentro da família. Com isso, o desafio é a construção de experiências de trabalho e de renda específicas da juventude, que sejam alternativas para ficar no campo e permitam criar uma maior autonomia em relação à família. Outro grande desafio é o tema da educação, com a falta de escolas dentro dos assentamentos. Avançamos em alguns espaços, mas nos últimos anos foram fechadas 24 mil escolas no campo. Esse é um dado importante que influencia na possibilidade do jovem ficar ou não no campo. DR – O desafio é conquistarmos dentro das nossas áreas escolas de ensino médio e escolas de ensino técnico, que sejam capazes de mobilizar a juventude para um trabalho voltado para a agricultura. Dentro disso, temos aprofundado bastante o debate com o Setor de Produção, com o desafio de desenvolver a cooperação com a juventude. Tem possibilidades dela se organizar junto com as
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famílias para avançar na questão da cooperação agrícola e no desenvolvimento da agroindústria nos nossos assentamentos. Como nós industrializamos nossos próprios produtos para vender e gerar renda? Como possibilitamos que essa juventude tenha educação e acesso aos bens culturais, para que consiga avançar e permanecer nos nossos territórios? AN- E não é só formar nossa juventude para que ela fique no campo, mas fazer com que também assuma tarefas políticas no conjunto da organização, nas direções dos acampamentos e dos assentamentos, dos setores, dos coletivos e nas direções estaduais e nacional. Para que se insira na vida orgânica do Movimento. Além disso, temos outro objetivo forte que é mobilizá-los para que sejam sujeitos políticos e que ajudem a articular, inclusive, com a juventude da cidade.
o que deve ou não ser feito. É um conjunto de orientações políticas e de temas de formação, para que os estados possam beber e fortalecer aquilo que já existe. Nos locais onde não há nenhum processo de formação, é aproveitar das indicações para iniciar um processo específico.
A escola é o sujeito central no processo porque é o lugar onde os jovens se concentram
Jornada da Juventude tem um jornal especial
JST – Como foi a construção do programa de formação da juventude? DR – A construção desse programa é uma das grandes riquezas que conseguimos fazer. Foi uma construção intersetorial, com contribuições dos setores de produção, educação, comunicação, cultura e formação. Foi um conjunto de companheiros que sentaram para refletir sobre as várias temáticas referentes às demandas da juventude para pensar um conjunto de processos formativos a serem realizados. Um exemplo é a questão da saúde. Como discutir saúde na perspectiva da juventude? Como discutir as drogas e a sexualidade? Já que os companheiros que mais acumularam nesse debate estão no Setor de Saúde, chamamos para que contribuíssem. AN – Estamos indicando a discussão desses temas. O primeiro é esse processo de organização dos jovens que estão nos acampamentos e assentamentos. O segundo é o tema do trabalho e renda. Um terceiro tema forte é a educação. Temos nos últimos anos uma militância que é diferente daquela que iniciou o processo de construção do Movimento. Hoje temos uma militância com um nível de escolaridade maior, que terminou o segundo grau, com um processo contínuo de escolarização, inclusive chegando a fazer mestrado e doutorado. Por fim, os temas ligados à questão da comunicação e da cultura.
Os setores de Comunicação, Cultura, Educação, Formação, Juventude e Produção do MST lançaram a segunda edição do Jornal da Juventude Sem Terra, que foi produzido para contribuir no trabalho de base na jornada da juventude. Essa edição discute trabalho e renda, escolas, cultura, programa agrário, as lutas dos jovens e a necessidade de organização da juventude. Solicite o jornal para a secretaria regional ou estadual do MST!
JST – A questão da identificação do jovem com o campo perpassa a questão da cultura. Como vocês veem essa questão? AN – Uma identidade camponesa, em geral, é permeada por valores e por concepções da sociedade. São valores e concepções de uma sociedade patriarcal, machista, altamente preconceituosa e que coloca as questões individuais em detrimento das
JST – Como fazer o trabalho de base para que os jovens não só fiquem no campo, mas ainda tenham uma participação ativa na militância do Movimento? AN – Ainda estamos no início de um processo, mas já temos algumas pistas. A escola é um sujeito central nesse processo, pois é a partir dela que conseguimos chegar mais facilmente, fazendo esse processo de luta e organização. É o lugar onde os jovens estão concentrados, seja dentro ou fora do assentamento. Precisamos também fazer um processo de formação política com essa juventude e dialogar, até porque estamos em um momento mais de escutar do que de dizer o que eles têm que fazer. Podem se inserir orgânica e politicamente dentro do Movimento nas mais diversas áreas, como na produção, na comunicação, organizando a rádio comunitária ou os coletivos de agitação e propaganda, na
área da cultura, por meio dos coletivos de teatro e nos grupos de música. DR – São várias as formas de participar organicamente. É possível a juventude participar desses espaços que já existem. Tarefas e atividades não faltam. Temos que ajudar, a partir do processo de mobilização, organização e na formação política para desencadear esse processo. A inserção orgânica ajuda a contribuir na luta. Fazer com que a luta pela Reforma Agrária seja uma das nossas principais pautas. JST – E como se dá esse processo? DR – No Setor de Comunicação e Cultura, que aglutina muitos jovens, além do próprio Setor de Formação e Educação. Acredito que o nosso grande desafio agora é fortalecer o coletivo nacional, organizando companheiros e companheiras que tocam esse processo nos estados, para canalizar para esses espaços e conseguir mais unidade política. Temos que fortalecer essas experiências e impulsionar nos locais onde ainda não existam, para que possam dar sequência ao processo. AN – Estamos lançando um programa nacional permanente de formação e mobilização da juventude. Esse programa tem indicações do que podemos fazer nos estados, sem ser um manual que dita
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questões mais coletivas. Temos lidado com essas questões e procuramos sempre combater. Queremos, sim, construir uma identidade Sem Terra, uma identidade camponesa, mas não qualquer uma. Não podemos reproduzir o machismo, o preconceito contra a opção sexual, os valores do individualismo. DR – Tampouco queremos resgatar uma cultura da festa junina tradicional das escolas das cidades. A cultura camponesa não é a que a transforma em “Jeca Tatu”. Queremos resgatar aquela que faz parte da nossa cultura, nas mais diversas formas, trazendo como parte da construção de nossa classe. Paralelamente, temos que criar condições para que as pessoas tenham acesso a outras culturas, como o cinema e a internet, sem gerar essa dicotomia entre o que é do campo e da cidade.
JST – Qual a importância do MST para a juventude, e da juventude para o Movimento? AN – O importante para o Movimento é ter militantes para fazer a luta. Temos uma base muito grande de jovens - hoje são mais de 500 mil na nossa base que se encontram na faixa etária entre 16 e 25 anos - e com perspectivas de continuarem a luta, que não se baseia só na Reforma Agrária. Mas também ter a possibilidade de fazer parte de uma das gerações que construirão uma nova sociedade. A juventude é essencial para o Movimento ter mais gás, possibilitando sua renovação. Para a juventude é a possibilidade real de criar um espaço para se expressar politicamente como classe.
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ESTADOS Mais de 35 toneladas foram entregues à população de três municípios do estado
DIVERSOS assentamentos do MST em Pernambuco doaram 35 toneladas de alimentos para as vítimas das enchentes que atingiram a população da Zona da Mata pernambucana em maio. Macaxeira, milho, feijão, repolho, tomate e hortaliças – produzidos pelas famílias assentadas na região e distribuídas por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foram entregues nos municípios de Água Preta, Palmares e Gameleira. Essas foram as cidades mais atingidas pelas chuvas neste ano, que deixaram mais de 140 mil pessoas desabrigadas. Ilhas de produção de alimentos em meio ao mar de cana-de-açúcar que domina essa região, os assentamentos provam que podem ser a solução para o problema da fome, do desemprego e da destruição ambiental. Assim, a Reforma Agrária se consolida como uma alternativa de desenvolvimento sustentável, em contraponto à miséria e destruição causada pelo modelo do monocultivo.
Famílias desabrigadas receberam macaxeira, milho, feijão, repolho, hortaliças e tomates
Modelo atrasado Ao longo de vários anos a monocultura da cana-de-açúcar transformou a Zona da Mata pernambucana em uma das regiões mais pobres do país. As matas deram espaço à cana e o povo, sem trabalho, sem terra e sem alternativa econômica foi empurrado para as chamadas “áreas de risco” das cidades. Sem essas matas nos topos de morros e nas encostas, que serviam para proteger
Pra soletrar a liberdade RAFAEL SORIANO SETOR DE COMUNICAÇÃO
A PRÁTICA da educação do campo, associada à consolidação da Reforma Agrária, é central na estratégia do MST para ampliar a consciência da classe trabalhadora. Em Alagoas, ao longo da história do Movimento, os Sem Terra puderam aprender a ler, se formaram e chegaram até a faculdade. O MST deu mais um passo firme em direção à escolarização do povo camponês com o lançamento da Ciranda Infantil Dorcelina Folador e da turma do ProJovem Campo Saberes da Terra, na Zona Rural da cidade de Atalaia. Foram anos de mobilizações e negociações com o poder público estadual e municipal para reconquistar o direito à escola. Para a educadora do
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os rios e que formavam barreiras contra os grandes volumes de águas, os rios transbordam e os riscos de enchentes são constantes. No ano passado, as enchentes nessa mesma região causaram 20 mortes e deixaram mais de 26 mil desabrigados e 55 mil desalojados, em 68 municípios afetados. Neste ano, só as primeiras chuvas já deixaram 140 mil pessoas desalojadas. “A enchente foi equivalente à do ano passado, porém com o agravante de que os atingidos permaneciam sem nenhuma mudança es-
Setor de Educação, Luana Pommé, a turma do Saberes da Terra “é um marco, que demonstra nosso desejo e nossa luta para nos reencontrarmos com a escola.” A turma tem 38 educandos de todas as regiões do estado que, nos quinze dias em que estiveram no Centro de Formação Zumbi dos Palmares na primeira etapa do curso, viram conteúdos relacionados com seu dia a dia, suas vidas de homens e mulheres camponeses. “Uma escola construída por nós, para nós, com o rigor científico do qual não abrimos mão e com a nossa pedagogia”, afirmou Luana. “Nas aulas, as lembranças do que já tinham visto na escola e o conhecimento do cotidiano foram ganhando contornos”. Um dos educandos, Toinho, como é conhecido o dirigente estadual do Movimento, comemora o retorno aos
trutural desde a ultima cheia”, afirma Pedro Acioli, secretario de Agricultura de Palmares, durante o ato oficial de entrega dos alimentos doados.A ato realizado em Palmares contou com a presença de cinco secretários municipais e representantes do Rotary Club. O representante da secretaria de Agricultura Familiar do estado de Pernambuco, José Cláudio, avalia que é preciso enfrentar as causas do problema, além de resolver as questões emergenciais que afetam a população da região. “As chuvas serão cada vez mais prejudiciais se não resolvermos o problema do modelo agrícola. Sem monocultura e sem agronegócio, será muito menos perverso”, disse Cláudio.
Arquivo MST
RAUL AMORIM COLETIVO DE CULTURA
Arquivo MST
Assentados fazem doação de alimentos para vítimas de enchentes
Ciranda atende crianças de toda região, com equipe de oito educadores
bancos escolares e desafia as filhas: “estudem, andem logo porque se brincar eu chego na faculdade primeiro que vocês”, brinca. A turma do ProJovem Campo Saberes da Terra foi fruto de um longo processo de articulação com o governo estadual e a Universidade Federal de Pernambuco, uma vez que a Universidade de Alagoas se absteve. A próxima etapa será ainda em julho. O MST lançou no assentamento Milton
Santos, Povoado Ouricuri, em 9 de maio, a Ciranda Infantil Dorcelina Folador, que atende crianças de toda a região, com uma equipe de oito educadoras. O governo de Alagoas foi responsável pela estruturação do espaço, depois da pressão do Movimento desde 2004. A política de atenção educativa à primeira e segunda infância é considerada imprescindível para possibilitar a participação dos pais e mães na produção de seus assentamentos e acampamentos.
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ESTADOS Manifesto cobra educação do campo, infraestrutura, pesquisa científica e assistência técnica
EDUCAÇÃO DO campo desde a primeira infância à universidade, infraestrutura social, incentivo à produção, pesquisa científica, assistência técnica e Reforma Agrária estão entre as políticas públicas necessárias para o fortalecimento da agricultura camponesa agroecológica no país. Essas medidas estão na carta final da 10ª Jornada de Agroecologia, que reuniu mais de 4.000 pessoas, autoridades de âmbito federal, estadual e municipal, no Campus da Universidade Estadual de Londrina, entre 22 e 25 de junho. O documento aponta também a manutenção dos investimentos públicos na expansão do agronegócio e a concentração das terras brasileiras nas mãos de latifundiários como obstáculos para a agroecologia. O ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, participou da jornada e destacou o papel dos agricultores e dos movimentos sociais para pressionar o Estado. “É fácil estar lá em Brasília... Vocês é que estão no fronte de batalha, enfrentando com o suor de vocês o cultivo da terra. Vocês é que estão enfrentando as lutas sociais”, reconhece o ministro.
Mais de 4 mil pessoas participaram da atividade, organizada na Universidade Estadual de Londrina
Para José Damasceno, da coordenação do MST, a atividade “cumpriu o papel fundamental de quebrar preconceitos no debate da agroecologia, ainda mais que Londrina é um dos berços do agronegócio no
Balanço A 10ª Jornada de Agroecologia superou as expectativas de público. De acordo com Diego Moreira, da Via Campesina do Paraná, a organização esperava 3.000 participantes. “Levamos uma boa surpresa, porque ultrapassou em mais de mil o número de pessoas que estávamos esperando”, disse. A coordenadora da jornada, Vanessa Gardim, afirmou que nessa jornada realizada em Londrina foi aberto um importante canal de diálogo na segunda maior cidade do estado. O município possui o maior assentamento metropolitano do Brasil, localizado no distrito de Lerrovile, com cerca de 600 famílias pré-assentadas. “Comemoramos dez anos de luta contra o agronegócio, dez anos de propaganda do Projeto Popular para o campo brasileiro, e principalmente dez anos de articulação dos movimentos populares na construção da agroecologia em toda a América Latina”, afirma a coordenadora. JORNAL SEM TERRA • JUN/JUL 2011
Paraná”. Além das oficinas, seminários e da feira dos produtos da Reforma Agrária, foram compartilhados cerca de 70.000 quilos de sementes e 5.000 mudas de árvores nativas. “A jornada vem se tornando
um espaço importante enquanto construção de um projeto. Tornou-se uma grande feira de troca de experiências e cooperações”, avalia. (Com a colaboração de Fernanda Borges)
Primeira turma de Licenciatura em Educação do Campo se forma no Iterra MIGUEL STÉDILE DO SETOR DE COMUNICAÇÃO
A FORMATURA da 1ª turma de Licenciatura em Educação do Campo, composta por educadores do campo do MST, Pastoral da Juventude Rural e Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), aconteceu em 20 de maio, em Veranópolis. A turma Patativa do Assaré reuniu 33 estudantes da região Sul do país e dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, a partir de uma parceria da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto Técnico de Pesquisa e Capacitação da Reforma Agrária (Iterra) O curso, que começou a ser implantado em 2007 pelas universidades com apoio do Ministério da Educação (MEC), é voltado especificamente para educadores e educadoras do campo. A parceria entre Iterra e UnB foi o primeiro projeto-piloto. Atualmente, há quatro projetos-piloto com apoio do MEC em curso. Os outros três são da Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal da Bahia e Universidade Federal de Sergipe. Segundo a coordenadora do curso Roseli Caldart, do Setor de Educação do MST, a licenciatura se insere no contexto
Fábio Reis
EDNÚBIA GHISI E HUGO KITANISHI. DA EQUIPE DE COMUNICAÇÃO DA JORNADA
Joka Madruga
Jornada de Agroecologia supera expectativas
Turma Patativa do Assaré reuniu 33 educandos da região Sul, São Paulo e Rio
de luta social por políticas de ampliação das escolas do campo, com a criação de alternativas de organização curricular e do trabalho docente. Para ela, o curso aliou a formação dos educadores com um esforço teórico para analisar a realidade do campo. “Isso exige estudar como as contradições sociais do modo de produção capitalista se materializam no campo e como os trabalhadores e suas organizações se movimentam e se formam nesse quadro”, explica. “Os educandos buscaram retomar e transformar sua condição de camponeses, seja fazendo a luta por uma Reforma Agrária Popular seja produzindo alternativas para o avanço da agricultura camponesa”.
O curso incluiu três conjuntos de aprendizados básicos de formação: Linguagens, Artes, Literatura, Ciências da Natureza e Matemática, gestão de processos educativos escolares e atuação pedagógica nas comunidades rurais. Para Rafael Villas Boas, do Setor de Cultura do MST, essa turma proporcionou uma experiência coletiva de crescimento para educadores e educandos. “Espero que o processo de formação que construímos colabore para a consolidação do intelectual orgânico coletivo que os movimentos sociais das classes populares forcejam para desenvolver”, afirma Rafael, que atua também na UnB.
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Agronegócio e agricultura familiar travam embate em torno do Código Florestal SETOR DE COMUNICAÇÃO
O Código Florestal está no centro da disputa entre o modelo do agronegócio e o projeto da agricultura familiar e camponesa e a Reforma Agrária. O palco dessa disputa é o Congresso Nacional, um espaço desfavorável para a classe trabalhadora. O agronegócio venceu o primeiro round desse embate. Foi aprovado na Câmara dos Deputados o relatório do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB), que flexibiliza a lei ambiental, e a emenda 164, que passa para os governos estaduais a responsabilidade de definir o que deve ser preservado. Para virar lei, as mudanças tem de ser aprovadas no Senado Federal, voltam para a Câmara e precisam passar pela aprovação ou veto da presidenta Dilma Rousseff. Essa disputa terá duração prolongada. E precisamos nos preparar para fazer o
enfrentamento e levar o debate para as ruas, envolvendo a sociedade para denunciar os efeitos perversos dessas mudanças e quem está por trás delas. Os primeiros interessados são os latifundiários mais arcaicos que desmataram e que foram multados. Há também o interesse de um latifúndio ligado à grilagem de terra e à necessidade de expansão, que quer incorporar novas áreas. Para isso, será necessário grandes desmatamentos e precisam da anistia. A construção de um campo político de resistência às mudanças vem ganhando força, articulado por movimentos sociais de camponeses, entidades ambientalistas, Igreja católica, cientistas, advogados e o Ministério Público, além de setores do governo federal. O Jornal Sem Terra apresenta as alterações aprovadas na Câmara, as nossas propostas para resolver os problemas da agricultura familiar e quem está contra e a favor das mudanças.
Nossa proposta para resolver os problemas da agricultura familiar A Via Campesina defende medidas concretas para resolver os problemas da agricultura familiar, que não passam pela alteração do Código Florestal. • Promoção de novas práticas produtivas, com a criação de políticas públicas consistentes voltadas para a agricultura familiar pelos órgãos federais e estaduais do meio ambiente e a Polícia Ambiental;
• Política de assistência técnica especializada em sistemas agroflorestais (SAFs) e agrosilvopastoris (SASPs), para a recuperação produtiva das APPs e RLs, e em manejo florestal para áreas onde existam maciços florestais; • Política de fomento e crédito específico para recuperação produtiva com SAFs e SASPs e para manejo florestal comunitário; • Programa de Produção e Aquisição de Mudas e Sementes, que garanta a compra de mudas e sementes e a
doação para áreas de recuperação de APP e RL; • Política de preço mínimo e de compra por meio dos Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); • Política de agroindustrialização voltada para produtos oriundos de manejo florestal; • Suspensão de todas as multas ambientais por desmatamento aplicadas à Agricultura Familiar para aqueles que adiram ao plano de
regularização ambiental das áreas de RL e APP, conforme Programa Mais Ambiente, e sua posterior conversão em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente; • Pagamentos por serviços ambientais especificamente a agricultores familiares, assentados de Reforma Agrária, povos indígenas e comunidades tradicionais que têm seu modo de vida indissociável da preservação e uso sustentável das florestas e suas funções ecossistêmicas.
Quem é quem nesse jogo Pela manutenção do Código Florestal vigente (contra as mudanças propostas)* Via Campesina M ST CUT Fetraf SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência CN B B OAB Instituto Marina Silva
Greenpeace Ministério do Meio Ambiente Ministério do Desenvolvimento Agrário Abong Andes Associação Juízes para a Democracia Marcha Mundial das Mulheres
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A favor das mudanças em discussão Aldo Rebelo/PCdoB Bancada ruralista Ministério da Agricultura Latifundiários (representados pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil - CNA) Empresas transnacionais da agricultura (Bunge, Cargill, Monsanto, ADM, Syngenta) Governo dos Estados Unidos (de acordo com documento do Wikileaks)
*Veja a lista completa em http:// emdefesadocodigoflorestal.blogspot.com/
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Internet
ESPECIAL Disputa terá duração prolongada e precisamos nos preparar para fazer o enfrentamento
Principais mudanças aprovadas na Câmara Saiba o que determina atualmente o Código Florestal, quais as mudanças aprovadas na Câmara dos Deputados e as consequências.
poderão se tornar reservas em recomposição, colocando mais um obstáculo para a democratização da terra. Consequências Criação de um “mercado” de áreas improdutivas qualificadas como recomposição de RLs. Estados sem florestas, aumento da grilagem de terras, expulsão de agricultores.
Diminuição das áreas de APPs (Áreas de Preservação Permanente) Como é Nos cursos d’água de até 10 metros a APP precisa ter 30 metros. Hidrelétricas têm que manter APPs de até 500 metros.
Reserva Legal Multas aos desmatadores Como é Até 90% do valor da multa pode ser negociado, dependendo do histórico do autuado. Novo texto Anistia aos desmatadores, criando um cadastro ambiental rural. Quem se cadastrar nele terá suas multas e crimes ambientais anistiados, caso recupere a área desmatada em 20 anos.
Novo texto As APPs de cursos d’água com até 10 metros passam a ter apenas 15 metros. Hidrelétricas: máximo de 100 metros. Consequências Erosão do solo, assoreamento dos rios, impacto nas bacias hidrográficas, mais agrotóxicos nos rios e impactos sobre os corredores de fauna, por onde migram os animais em tempos de seca.
beneficiados, porque não existe diferenciação de agronegócio e agricultura familiar. Fragilização ambiental e/ou geológica, fragilização da função social da terra (pelo fato da floresta ser um bem de interesse público). Fragilização ambiental e geológica, fragilização da função social da terra (já que APP é uma questão exclusivamente ecológica, e a RL é uma questão agrária e ecológica).
Consequência Impunidade e incentivo a novos desmatamentos. Soma de APPs e Reserva Legal
Compensação da Reserva Legal (RL) em outros estados Como é O proprietário pode recuperar a RL em outra propriedade que esteja na mesma microbacia (no mesmo rio que passa na região, por exemplo). Novo texto O proprietário poderá compensar a RL em qualquer estado do mesmo bioma. O latifundiário de São Paulo poderá comprar uma terra na Bahia e apontar que aquela é sua RL. Dessa forma, áreas improdutivas, que devem ser destinadas à Reforma Agrária,
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Como é O porcentual de RL é de 80% na Amazônia, 35% no cerrado e 20% para o resto do país. Novo texto Propriedades com até quatro módulos fiscais (que vão de 20 a 440 hectares, dependendo da proximidade com centros urbanos) não precisarão mais preservar. Áreas consolidadas até 2008 poderão pagar para um suposto fundo, em vez de recuperar suas RLs, ou então compensar em áreas de qualquer parte do bioma Consequências: • Latifundiários poderão dividir as fazendas para ficar livre de preservar a RL.
Como é As áreas de RL não podem se somar às áreas de APP para chegar na porcentagem prevista na lei, com exceção da Agricultura Familiar, que pode fazer a soma da APP na RL. Novo texto Pode somar as áreas de APP com a RL. Uma demanda da agricultura familiar, que é a soma das áreas de RL junto com a APP, foi estendida a todos os proprietários. Uma reivindicação dos camponeses para resolver problemas causados pela falta de investimentos se transforma em um privilégio para o agronegócio. Consequências Latifundiários serão
• Erosão de terra, deslizamento, perda da fertilidade do solo, perda da biodiversidade, mudança no microclima, diminuição do ciclo hídrico, alteração da umidade do ar e da temperatura, diminuição da produtividade. • Expulsão de agricultores familiares e povos tradicionais, já que as áreas deles são as mais baratas e, portanto, as que serão compradas para compensação.
Responsabilidade da legislação ambiental com estados Como é A legislação ambiental é responsabilidade da União. As regulamentações são feitas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Participam do Conselho o governo federal, estadual, municipal e representantes da sociedade civil. Novo texto Os estados definem quais APPs e RLs precisam ser recuperadas em cada propriedade e como deve ser a recuperação. Consequências Não prevalecerá mais o interesse nacional e coletivo, mas as políticas locais e os interesses particulares. Espécies exóticas Como é O proprietário tem de recuperar a área desmatada com espécies nativas. Novo texto O novo texto permite que a RL possa ser recuperada com até 50% de espécies exóticas, de cultura lenhosa perene (eucalipto), e dendê, voltado para a produção do biodiesel. Consequências Não serão recuperadas as áreas com espécies nativas, modificando o bioma local. Acaba com a RL como mantenedora dos interesses públicos sobre as florestas e a transforma em mais uma área de apropriação privada. Estimula a produção de matéria-prima para as empresas do agronegócio.
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REALIDADE BRASILEIRA Fazendeiros, madeireiros, carvoeiros e empresas da mineração silenciaram lutadores
AYALA FERREIRA DIREÇÃO ESTADUAL DO MST-PA
FAZ MAIS DE trinta dias que tivemos a fatídica notícia dos assassinatos de José Cláudio Ribeiro da Silva e de Maria do Espírito Santo da Silva, além de outras destacadas lideranças que foram assassinadas na região da Amazônia, em uma onda de violência contra trabalhadores rurais (veja box abaixo). Nos últimos 24 anos, o casal se empenhou em implementar no projeto de Assentamento Agroextrativista onde residiam, em Nova Ipixuna, sudeste do Pará, experiências agrícolas com uso sustentável da floresta amazônica. Logo nos primeiros dias após os assassinatos, diferentes versões foram apontadas pelas investigações e divulgadas nos meios de comunicação. Uma delas relacionava o episódio a um “acerto de contas” por desentendimento entre vizinhos. Como nesta região a barbárie social está estabelecida, parece “impossível” imaginar níveis de socia-
Cronologia da violência 24 de maio – Maria do Espírito Santo da Silva e José Cláudio Ribeiro da Silva são assassinados no Projeto de Assentamento Extrativista, Praia Alta Piranheira, no município de Nova Ipixuna 27 de maio – Adelino Ramos, conhecido como Dinho, sobrevivente do Massacre de Corumbiara (agosto de 1995), foi assassinado em Vista Alegre do Abunã, na região da Ponta de Abunã, município de Porto Velho (RO) 28 de maio – O assentado Herenilton Pereira dos Santos, do assentamento Praia Alta Piranheira, Nova Ipixuna, PA, foi encontrado morto. 2 de junho – É assassinado Marcos Gomes, por homens encapuzados na zona rural de Eldorado dos Carajás, no Pará. 11 de junho – É encontrado o corpo do trabalhador rural Obede Loyola Souza, no acampamento Esperança, município de Pacajá, PA. Foi executado dois dias antes com um tiro de espingarda dentro do ouvido. (*Com informações da CPT)
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Fotos: Felipe Milanez
O pano de fundo das mortes na Amazônia
Maria do Espírito Santo e Zé Cláudio foram excutados com requintes de perversidade
bilidade entre as pessoas que não seja pelo uso da violência. O que presenciamos foi a execução sumária com requintes de perversidade de duas lideranças defensoras da floresta e dos camponeses do Pará e da Amazônia brasileira. Eles vinham se contrapondo insistentemente ao modelo de desenvolvimento capitaneado por fazendeiros, madeireiros, empresas de exploração mineral e de siderurgias, tendo o Estado brasileiro e paraense como os seus maiores organizadores. A partir de 1970, a Amazônia brasileira – e em especial o Pará – passou por profundas transformações gestadas e implementadas pelo Estado, que consistiu em grandes obras de infraestrutura (estradas, hidrelétricas e ferrovias), incentivos fiscais e de créditos para a instalação de empresas para exploração dos recursos minerais. Além disso, orientou a migração desordenada para colonizar essa terra tida como região desabitada, atrelando-a em definitivo aos interesses do grande capital. Nas cercanias desses projetos e nas cidades que se expandiram desordenadamente pelo intenso fluxo migratório, houve a substituição gradativa da floresta amazônica e de comunidades tradicionais, que deram espaço para a presença das madeireiras, das fazendas de pecuária extensiva e de monocultivo de eucalipto. Os eucaliptos alimentam os fornos das siderúrgicas que mais recentemente se instalaram na região, uma vez que as carvoarias não davam conta de man-
ter a oferta do carvão vegetal (produzido pelo desmatamento da floresta). Para completar, a utilização de tecnologia de ponta para a extração do principal minério: o ferro, que sai de nossa região sem nenhum valor agregado.
Outro paradigma Pensar e propor alternativas que se contraponham a esse modelo de desenvolvimento hegemonizado no Pará se tornou perigoso, porque confronta os interesses de acumulação de determinados grupos, que têm seus tentáculos na iniciativa privada do grande capital, nos governos e no judiciário. Todos indiscutivelmente agem em comum acordo para manter o status quo, condição indispensável para a continuidade da usurpação da biodi-
versidade amazônica, que a princípio deveria estar a serviço de toda a sociedade. José Cláudio e Maria do Espírito Santo foram silenciados porque discordavam desse modelo de desenvolvimento. Mais do que incorporar o discurso do “desenvolvimento sustentável”, eles ousaram experimentar na comunidade onde residiam práticas extrativistas sustentáveis ambiental e economicamente. Tornaram-se exemplos de que é possível reproduzir a própria existência e desenvolver a região a partir de um outro paradigma. Os fazendeiros, madeireiros, carvoeiros e empresas privadas da mineração, souberam silenciar pelo uso da pistolagem esses bravos companheiros. Conseguiram inseri-los na dolorosa estatística da Comissão Pastoral da Terra, que revela que em 26 anos (1985-2011) na Amazônia brasileira, 795 pessoas foram assassinadas por ousarem pensar e defender outros interesses que não seja o da acumulação do grande capital. Revelar essa realidade que intencionalmente tem sido camuflada, denunciar os riscos e malefícios dos projetos governamentais – como o Programa Terra Legal e o novo Código Florestal –, seguir na organização dos camponeses e na ampliação de experiências agrícolas atreladas ao extrativismo são formas de reconhecer o legado deixado por José Cláudio e Maria do Espírito Santo. E por que não dizer a todos aqueles que por amor a floresta amazônica e aos seres humanos ousaram lutar e doar a própria vida.
O casal ousou colocar em prática uma experiência extrativista sustentável
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REALIDADE BRASILEIRA Tarefa central é organizar, ampliar e consolidar os comitês nos municípios e estados
Os próximos passos da campanha contra os agrotóxicos FERNANDA JATOBÁ SECRETARIA OPERATIVA DA VIA CAMPESINA E DA CAMPANHA CONTRA OS AGROTÓXICOS
AGROTÓXICO MATA! Foi a partir desse alerta que realizamos o Seminário Nacional contra o uso dos Agrotóxicos, em setembro de 2010. Movimentos sociais, ambientalistas, organizações ligadas à área da saúde, pastorais sociais, estudantes e pesquisadores das universidades aprofundaram o debate sobre os agrotóxicos. Daí nasceu a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, que tem a tarefa de articular comitês nos estados, envolver o maior número de organizações, produzir material de agitação, fazer formação e trabalho de base. Na jornada de lutas das mulheres, em março deste ano, a campanha contra os agrotóxicos foi pautada com centralidade. E o Dia Mundial da Saúde, em 7 de
discurso do agronegócio, que não tem como produzir sem utilizar veneno e cada vez tem menos argumentos em sua defesa. Em terceiro lugar, esse tema nos coloca em condições de dialogar com setores da sociedade com os quais não conseguimos por meio de outras pautas. A campanha possibilita também desgastar cada vez mais a imagem do agronegócio com trabalhadores da cidade, que consomem os alimentos envenenados.
Nossas tarefas Cabe aos movimentos sociais da Via Campesina fortalecer a campanha e organizar nossa militância, para que
mentário “O veneno está na mesa”, que acaba de ser finalizado pelo cineasta Silvio Tendler. Nos estados em que fizemos o lançamento, é preciso consolidar e ampliar os comitês com outras forças que ainda não se envolveram. É a partir dos comitês que acontecem as atividades de formação e preparação da militância, distribuição de material e informações, organização das lutas e atividades de agitação. Para isso, os movimentos da Via Campesina têm papel importante. Devemos assumir a tarefa, ter responsáveis e tomar a frente do processo. Temos o desafio de colocar a campanha nas ruas. É preciso fazer a denúncia por
Nossas exigências Conheça a pauta da campanha dos agrotóxicos que será apresentada às autoridades em agosto: 1 – Exigir que o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Banco Central determinem no Manual de Crédito Rural e nos Planos Safra a proibição de utilização dos créditos oriundos do Pronaf para a aquisição de agrotóxicos, incentivando a aquisição/utilização de insumos orgânicos e a produção de alimentos saudáveis; 2 – Exigir da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a reavaliação periódica de todos os agrotóxicos autorizados no país, além de aprofundar o processo de avaliação e fiscalização da contaminação de água para consumo público e ampliar os alimentos;
Temos o desafio de fazer o trabalho político com a nossa base sobre os perigos dos agrotóxicos abril, foi o marco para o lançamento da campanha. Fizemos um grande lançamento nacional com uma marcha em Brasília. A campanha já foi lançada em 12 estados, em todas as regiões do país, com diferentes atividades: audiências públicas no parlamento, feiras de produtos da Reforma Agrária, distribuição de alimentos produzidos sem agrotóxicos, seminários de estudos e atos públicos de denúncia. Acertamos em pautar a questão dos agrotóxicos nesse momento. Primeiro porque o Brasil é desde 2008 o campeão mundial no consumo de venenos e os reflexos estão vindo à tona. Até a mídia está pautando os reflexos dos agrotóxicos para a saúde humana. Segundo, porque essa questão é a maior contradição do agronegócio. A contaminação por agrotóxicos é uma ameaça à saúde e a vida humana e desmascara o
nas marchas e fincá-la nos acampamentos. Será o momento de fazer agitação e propaganda, entrar em cada escola, igreja, associação, envolver os trabalhadores da cidade e conscientizar o povo sobre quem está lutando pela vida e quem age pelo lucro e produz a morte.
3 – Que os governos estaduais e municipais, assembleias legislativas e câmaras de vereadores proíbam a pulverização aérea (feita pela aviação agrícola) de agrotóxicos; 4 – Que o Ministério da Saúde organize um novo padrão de registro, notificação e monitoramento no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) dos casos de contaminações por agrotóxicos; 5 – Que haja fiscalização por parte do governo, IDEC e PROCON para que se cumpra o código do consumidor, garantindo que todos os produtos alimentícios apresentem no rótulo o agrotóxico utilizado na produção, dando opção ao consumidor de optar por produtos saudáveis;
estejamos preparados para enfrentar o desafio de dialogar com a sociedade, assim como enfrentar a reação da burguesia. Nesse sentido, um dos principais desafios é a organização dos comitês. É preciso construir a campanha nos estados e nas regiões, pois é lá que a luta ganha vida. Onde ainda não ocorreu o lançamento, o momento é bastante propício. Podemos associar a campanha ao lançamento do docu-
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meio do enfrentamento com as empresas transnacionais. Somente dessa forma conseguiremos apontar com clareza quem são os inimigos do povo brasileiro e estabelecer a relação entre agrotóxicos e o modelo de produção agrícola. Com esse objetivo, estamos construindo nossa jornada de lutas em agosto, na qual o combate aos agrotóxicos é uma pauta central. Temos a tarefa de levar essa bandeira para todas as capitais, carregá-la
6 – Aumentar a fiscalização do Ministério do Trabalho e demais órgãos responsáveis às condições de trabalho dos trabalhadores expostos aos agrotóxicos, desde a fabricação na indústria química até a utilização na lavoura; 7 – Exigir que os Ministérios Públicos Estaduais e Federal, e organismos de fiscalização do meio ambiente fiscalizem com maior rigor o uso de agrotóxicos e as contaminações; 8 – Exigir dos governos a retirada de isenções fiscais e incentivos dados à produção, importação e comercialização de agrotóxicos no Brasil.
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INTERNACIONAL Agronegócio intensifica ofensiva pela liberação das sementes “suicidas”, inclusive no Brasil
Semente Terminator, o sonho mais desejado das transnacionais SILVIA RIBEIRO* DO GRUPO ETC, DO MÉXICO
Joka Madruga
EM 1998, o grupo ETC (então chamado RAFI) denunciou a existência de patentes sobre uma tecnologia que denominou Terminator. Trata-se de uma tecnologia transgênica para fabricar sementes suicidas: são plantadas, dão frutos, mas a segunda geração se torna estéril, obrigando os agricultores a comprarem sementes a cada estação. Foi desenvolvida pela empresa Delta &Pine (agora Monsanto) com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. A Monsanto não é a única. Cinco das seis transnacionais que controlam as sementes transgênicas plantadas a nível mundial possuem patentes tipo Terminator. A Syngenta é quem tem o maior número delas. As empresas que desenvolvem esta absurda tecnologia a chamam de Sistema de Proteção da Tecnologia, com o objetivo de promover dependência e impedir o uso de sementes sem pagar pela patente. Em seus primeiros folhetos de propaganda, asseguram também que a
tecnologia é para que os agricultores do terceiro mundo deixem de utilizar suas sementes obsoletas. Mostravam então claramente suas intenções: terminar com as sementes camponesas e o irritante fato de que a maioria dos agricultores do mundo (camponeses, indígenas, agricultores familiares) usa suas próprias sementes no lugar de comprar as delas. A tecnologia suscitou de imediato uma rejeição enorme por parte dos movimentos camponeses e organizações sociais, declarações de oposição de instituições públicas de pesquisa e do então diretor da Organização para a Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO), o senegalês Jacques Diouf. Todos afirmaram que é uma tecnologia indesejável. No ano de 2000, o Convênio de Diversidade Biológica das Nações Unidas (CDB) adotou uma moratória global contra a experimentação e o uso da tecnologia Terminator, que continua valendo. Posteriormente vários países começaram a discutir legislações nacionais para garantir o cumprimento da moratória. Brasil e Índia proibiram em suas
Camponeses rejeitam sementes estéreis e produzem suas próprias
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leis o uso da tecnologia. Mas Terminator é um dos sonhos mais desejados das transnacionais sementeiras, que não renunciaram a ele. Traria vantagens enormes em seus monopólios e na dependência dos agricultores. Pouco depois da proibição no Brasil, o agronegócio desse país – clientes e cupinchas da Monsanto, Syngenta e demais transnacionais de transgênicos – apresentaram uma proposta legislativa para eliminar a proibição, rejeitada em várias comissões, mas ainda em trâmite. Além disso, moveram-se agressivamente para terminar com a moratória das Nações Unidas propondo, por meio de governos amigos, como o Canadá, um parágrafo para avaliar a tecnologia Terminator caso por caso, o que daria fim à moratória na 8ª Conferência da CBD em Curitiba, Brasil, no ano de 2006.
Pressão do agronegócio Na sessão da CDB em 2006, o México apoiou o fim da moratória, ironicamente por meio de um representante da Comissão Nacional de Biodiversidade. Casualmente, é a mesma pessoa que a partir da Comissão Nacional Florestal promove projetos REDD, também com um efeito devastador para as comunidades. Foi isolado pelo restante dos países de todo o Sul do globo. Em 2006, no CDB em Curitiba, a Via Campesina e organizações de todo o mundo se levantaram e protestaram massivamente para defender a moratória internacional. Em particular, as ações das mulheres da Via Campesina que interromperam as sessões da ONU em uma comovedora ação pacífica na defesa das sementes. Não obstante, as transnacionais continuam na ofensiva. Agora, afirmam que Terminator é uma garantia da biossegurança, uma falsidade. Na décima conferência da CDB em outubro de 2010 em Nagoya, no Japão, novamente o governo do México tentou eliminar a moratória global contra Terminator, dessa vez como se fosse um tema administrativo, de decisões que já não tinham mais vigência. Não conseguiu porque muitos países impediram, mas lhes revelou que são fiéis.
No Brasil, a proposta do agronegócio se somou a do deputado Cândido Vaccarezza do partido governante (PT) para eliminar a proibição do Terminator. A proposta de Vacarezza foi redigida por uma advogada que trabalha para a Monsanto, segundo denúncias da Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos e também divulgadas pelo MST em dezembro de 2010. A própria advogada reconheceu. A proposta está atualmente em discussão em uma comissão do Congresso, criada especialmente para agilizar a sua discussão. Os movimentos e organizações estão alertas. Em junho de 2011, na 10ª Jornada de Agroecologia da Via Campesina, no Paraná, os mais de 400 participantes de todo o país expressaram sua rejeição a essa proposta. Uma semana depois, rejeitaram as tentativas de se legalizar Terminator nas reuniões internacionais de preparação dos movimentos sociais e da sociedade civil à conferência mundial Rio+20 no Rio de Janei-
O que é REDD é a sigla em inglês para Reducing Emissions from Deflorestation and Degradation (tradução livre: reduzindo emissões provenientes de desflorestamento e degradação). Os países que reduzem as emissões provenientes do desflorestamento são recompensados financeiramente, criando um mercado da “proteção ambiental”.
ro, com centenas de participantes. O Brasil presidirá no próximo ano a Rio+20, uma conferência mundial da ONU que deve revisar os compromissos ambientais 20 anos depois da Cúpula da Terra em 1992. Além disso, Graziano Silva, que vem do governo brasileiro, acaba de assumir a direção da FAO. O mínimo que o Brasil pode fazer por ser responsável por ambos os cargos é manter a proibição da Terminator a nível nacional e internacional por ser uma das maiores ameaças à soberania alimentar e à biodiversidade. Qualquer outra coisa será um suicídio. (*publicado no jornal La Jornada, do México, e traduzido pelo Cepat)
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LUTADORES DO POVO Francisco Julião passou de advogado a líder do primeiro movimento pela terra
Um precursor da luta pela Reforma Agrária ADEMAR “SCHUSK” LUDWIG HISTORIADOR FORMADO PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
FILHO, neto e bisneto de donos de engenho em Pernambuco, Francisco Julião Arruda de Paula nasceu no Engenho Boa Esperança, em Bom Jardim, em 16 de fevereiro de 1915. Já aos 25 anos, decidira usar seus conhecimentos para defender os trabalhadores rurais. Formado em 1939 em Direito, abriu um escritório voltado para a defesa dos camponeses. Ainda moço, seu grande problema era conseguir pagar o aluguel da casa onde morava em Recife. Os seus clientes, pessoas de poucos recursos, muitas vezes não tinham como pagar. Casou em 1943 com Alexina Crespo com quem teve quatro filhos. Precisava se desdobrar para fazer frente à mensalidade da escola das crianças e às despesas da casa. O fim do Estado Novo de Getúlio Vargas, entre 1937 e1945, repercutiu no meio rural e, no final da década de 1940, os camponeses já começavam a se organizar em pequenas associações. Francisco Julião ganhou popularidade em Pernambuco por seu papel junto aos trabalhadores rurais. Ingressou no Partido Socialista Brasileiro (PSB) e foi eleito deputado estadual, em 1954. De advogado passou a líder do primeiro movimento pela Reforma Agrária: as Ligas Camponesas. Apesar de ser
Escritos de Francisco Julião Livros de ficção Cachaça de contos (1951) e Irmão Juazeiro (1961). Livros da militância Até quarta, Isabela! (escrito em forma de carta para sua filha, quando estava na prisão em 1964) O que são ligas camponesas (1962); Brasil, antes y después (1968, coletânea publicada no México) Cambão (1975, inédito no Brasil, mas publicados em vários países). Cartilhas Guia do Camponês, ABC do camponês, Recado do Camponês e a Cartilha do Camponês.
Julião era filho de latifundiários e conhecia como poucos a vida dos camponeses
filho de latifundiários, cresceu junto com os filhos dos trabalhadores rurais e, desde cedo percebeu as injustiças sociais. Os movimentos sociais ganharam com Julião, um importante lutador, que conhecia como poucos o dia a dia do povo do campo. Nesse período, nasceu a primeira associação camponesa de Pernambuco, a Sociedade Agrícola e Pecuária dos Plantadores de Pernambuco. Formada por parte das cerca de 140 famílias que trabalhavam nos 500 hectares de terra do Engenho Galileia, em Vitória de Santo Antão, a entidade se transformou em marco da Reforma Agrária.
Vitória dos camponeses A associação lutava por melhorias em saúde e educação na fazenda. Mas ao ingressar na Justiça, conseguiu legalmente a desapropriação da fazenda, que passou às mãos dos camponeses. Nascia naquele momento um dos mais importantes líderes populares do Brasil, capaz de reunir desde homens de Estado a estudantes e escritores ao redor de sua figura. Com a conclusão do processo de desapropriação do engenho, em 1959, os camponeses ganharam as páginas dos jornais. O movimento passou a ser conhecido como Ligas Camponesas e começava a se estender para outros estados, como Paraíba, Paraná e Rio de Janeiro. Julião continuou defendendo a distribuição de terras e recebeu apoio do voto popular. Em 1958 foi reeleito deputado estadual. As Ligas Camponesas tinham crescido, conquistando projeção nacional e internacional. Em uma época de revoluções, as Ligas Camponesas chamaram a atenção de líderes como Fidel
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Castro e Mao Tsé-tung, com os quais Julião teve encontros pessoalmente. A repercussão chegou também aos Estados Unidos e despertou preocupação no governo norte americano. O presidente John Kennedy enviou seu irmão a Pernambuco para ver de perto o que faziam os camponeses. Temiam que houvesse uma revolução semelhante à cubana também no Brasil. Julião, no entanto, continuava apostando na democracia para mudar a estrutura fundiária do país. Em 1962, foi eleito deputado federal.
Tempos conturbados O presidente João Goulart lançava as chamadas reformas de base, que propunham mudanças na economia com medidas, como a restrição da remessa de lucros das multinacionais aos países de origem, reformas também na educação, na saúde e na questão da terra. Havia, inclusive, uma proposta de Reforma Agrária. Francisco Julião acreditava que esse processo deveria ser mais radical.
No final de março de 1964 veio o golpe militar e vários políticos foram cassados, como Julião, que foi um dos poucos líderes da esquerda que decidiram permanecer no Brasil, em vez de sair imediatamente. Consciente de que seu pescoço estava a prêmio, Julião se escondeu em um casebre no interior de Goiás. Mesmo assim, foi descoberto e acabou preso. A liberdade só chegou um ano e meio depois. De volta às ruas, o líder dos camponeses sentiu na pele os anos de chumbo. Procurou o Partido Comunista e a Ação Popular em busca de proteção, mas a resposta foi sempre a mesma: nada podiam fazer. Ficar no país sem contar com qualquer tipo de ajuda poderia significar a volta ao cárcere. Julião procurou asilo político no México. Por lá se manteve dando palestras e escrevendo artigos para revistas. Suas condições, porém, eram precárias. Ele mal tinha dinheiro para comprar comida. Em 1979, com a anistia, voltou ao Brasil. Em 1986, ensaiou a volta à vida pública, tentando se eleger deputado federal, mas não conseguiu. Desiludido, resolveu deixar a política. Em seu último artigo para a imprensa, em 1986, escreveu: “Saio dessa peleja como entrei: pobre... Não sou um político clássico. Muito menos um faiscador de votos... Não pedi votos. Deram-me. Votos de consciência, de amizade, de qualidade. Pus à prova a minha insignificância. Dei um golpe de misericórdia no meu mito”. Julião voltou para o México e morreu aos 84 anos, de ataque cardíaco, em 10 de julho de 1999. “Ele terminou a vida pobre, e é o único exilado político que permanece fora do Brasil, já que seu corpo ficou no México”, disse seu filho Anatólio Julião.
As Ligas Camponesas despertaram preocupação no governo dos Estados Unidos
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LITERATURA Poeta traz à tona o sofrimento vivido pelos negros vindos forçadamente da África
Castro Alves, cantor dos escravos MARINA TAVARES COLETIVO DE CULTURA
CASTRO ALVES, “cantor dos escravos”, é um dos cânones de nossa literatura. Nascido na Bahia, em 14 de março de 1847, imprimiu em sua poesia o torpor libertário, a marcante solidariedade às lutas por justiça, sobretudo as que se referiam à abolição, efetiva, da escravidão. “Em Castro Alves, cumpre distinguir o lírico amoroso, que se exprimia quase sempre sem ênfase e às vezes com exemplar simplicidade”, disse o grande poeta Manuel Bandeira. Para José Oiticica, o autor foi o criador de três coisas até então inexistentes na poética nacional: a paisagem brasileira, o estilo brasileiro e o tema social brasileiro.
Antônio Frederico de Castro Alves nasceu na Fazenda Cabaceiras, nas proximidades da Vila de Nossa Senhora da Conceição de Curralinho, município baiano que, posteriormente, ganharia seu nome. Aos 17 anos, fundou juntamente com Rui Barbosa uma sociedade abolicionista, dando início a um intenso período de criação literária, impulsionada pelas aspirações políticas e pela luta em prol da abolição da escravatura. Pouco tempo depois, viria a receber grandes elogios de escritores como José de Alencar e Machado de Assis. Viveu em Salvador, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo, cursou a faculdade de Direito e se envolveu em um grande romance com a atriz Eugénia Câmara – fonte de inspiração para alguns de seus principais
poemas líricos. Em 11 de novembro de 1868, feriu-se acidentalmente com um tiro em uma caçada. A partir daí, seria arrebatado por uma série de problemas de saúde. Vítima de tuberculose, faleceu, precocemente, em 6 de julho de 1871, aos 26 anos. O poema Navio Negreiro, pertencente ao livro “Os Escravos”, é considerado juntamente com “Vozes d´África”, o ápice da maturidade de sua expressão poética. Nele, o poeta traz à tona o sofrimento vivido pelos negros vindos forçadamente da África, por meio de uma rica construção de imagens e sensações, mesclando o pensamento sobre a questão social e as condições de vida dos escravos à experiência sensorial e natural, aos mistérios e acalantos do alto-mar.
Leia o trecho V do poema Navio Negreiro, de 1869 Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura... se é verdade Tanto horror perante os céus?! Ó mar, por que não apagas Co’a esponja de tuas vagas De teu manto este borrão?... Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufão! Quem são estes desgraçados Que não encontram em vós Mais que o rir calmo da turba Que excita a fúria do algoz? Quem são? Se a estrela se cala, Se a vaga à pressa resvala Como um cúmplice fugaz, Perante a noite confusa... Dize-o tu, severa Musa, Musa libérrima, audaz!... São os filhos do deserto, Onde a terra esposa a luz. Onde vive em campo aberto A tribo dos homens nus... São os guerreiros ousados Que com os tigres mosqueados Combatem na solidão. Ontem simples, fortes, bravos. Hoje míseros escravos, Sem luz, sem ar, sem razão. . .
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São mulheres desgraçadas, Como Agar o foi também. Que sedentas, alquebradas, De longe... bem longe vêm... Trazendo com tíbios passos, Filhos e algemas nos braços, N’alma — lágrimas e fel... Como Agar sofrendo tanto, Que nem o leite de pranto Têm que dar para Ismael. Lá nas areias infindas, Das palmeiras no país, Nasceram crianças lindas, Viveram moças gentis... Passa um dia a caravana,
Quando a virgem na cabana Cisma da noite nos véus ... ... Adeus, ó choça do monte, ... Adeus, palmeiras da fonte!... ... Adeus, amores... adeus!... Depois, o areal extenso... Depois, o oceano de pó. Depois no horizonte imenso Desertos... desertos só... E a fome, o cansaço, a sede... Ai! quanto infeliz que cede, E cai p’ra não mais s’erguer!... Vaga um lugar na cadeia, Mas o chacal sobre a areia Acha um corpo que roer.
Ontem a Serra Leoa, A guerra, a caça ao leão, O sono dormido à toa Sob as tendas d’amplidão! Hoje... o porão negro, fundo, Infecto, apertado, imundo, Tendo a peste por jaguar... E o sono sempre cortado Pelo arranco de um finado, E o baque de um corpo ao mar... Ontem plena liberdade, A vontade por poder... Hoje... cúm’lo de maldade, Nem são livres p’ra morrer. . Prende-os a mesma corrente — Férrea, lúgubre serpente — Nas roscas da escravidão. E assim zombando da morte, Dança a lúgubre corte Ao som do açoute... Irrisão!... Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus, Se eu deliro... ou se é verdade Tanto horror perante os céus?!... Ó mar, por que não apagas Co’a esponja de tuas vagas Do teu manto este borrão? Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufão! ... JORNAL SEM TERRA • JUN/JUL 2011
“Porecatu: a guerrilha que os comunistas esqueceram” Para não esquecer Julho 17 Guerra Civil Espanhola (1936) 17 Triunfo da Revolução Sandinista (1979) 23 Fundação da Frente Sandinista de Libertação Nacional – FSLN (1961)
No dia 25 de julho, são realizadas diversas manifestações em todo o Brasil, ocupações de terras, marchas, doações de alimentos e outras ações junto à sociedade brasileira para
denunciar as desigualdades provocadas pela apropriação de terras pelos latifundiários, a exploração dos recursos naturais e dos trabalhadores rurais pelas empresas do agronegócio.
24 Nasce Simón Bolívar (1783) 25 Dia dos Trabalhadores Rurais 26 Morre Haydée Santa Maria (1980) 26 Nascimento de Celso Furtado (1920)
Agosto 05 Morre Friederich Engels (1895)
http://www.expressaopopular.com.br/ Autor: Marcelo Oikawa O livro “Porecatu: a guerrilha que os comunistas esqueceram”, do jornalista Marcelo Oikawa, lançado pela Editora Expressão Popular, conta a história do levante dos posseiros em Porecatu, no Paraná, que lutaram de armas nas mãos, com a participação e direção do PCB (Partido Comunista do Brasil). O movimento começou com a instalação de cerca de 300 posseiros em 1940 e chegou ao fim com o envolvimento de 3 mil pessoas, em 1951. Porecatu é um exemplo típico de como se formou a propriedade da terra no Brasil. Essa região paranaense foi palco de disputas pela posse da terra desde o tempo do Tratado de Tordesilhas, no século XVI, entre portugueses e espanhóis.
JORNAL SEM TERRA • JUN/JUL 2011
06 Os Estados Unidos lançam a primeira bomba atômica em Hiroshima, no Japão (1945) 08 Nasce Emiliano Zapata (1879) 09 Massacre de Corumbiara, Rondônia (1995)
“O esforço para compreender o atraso brasileiro levou-me a pensar na especificidade do subdesenvolvimento (...) O subdesenvolvimento é a resultante de um processo de dependência, e que para compreender esse fenômeno era necessário estudar a estrutura do sistema global”
Um dos principais intelectuais brasileiros, o economista Celso Monteiro Furtado nasceu em 26 de julho de 1920, em Pombal, no sertão paraibano, filho de família de proprietários de terra. Seu legado intelectual é uma profunda e vasta obra de análise das causas do subdesenvolvimento, da dependência econômica e do combate destas desigualdades através de mudanças estruturais na economia brasileira, como a reforma agrária.
09 Morre Florestan Fernandes (1995) e Herbert de Sousa, o Betinho (1997) 12 Assassinato de Margarida Alves (1983) 14 Morre Bertold Brecht (1956) 15 Nasce Dom Oscar Romero (1956) Nascido em uma família pobre, Oscar Arnulfo Romero y Gadamez nasceu em 15 de agosto de 1917, em Ciudad Barrios, em El Salvador. Aos 13 anos, já é enviado ao seminário. Em 1977 é nomeado Arcebispo de San Salvador, capital do país. Em 1979, El Salvador sofre um golpe militar. Em apenas três meses, mais de mil salvadorenhos são assassinados pelo regime militar. Romero passou a ter posições cada vez mais duras em defesa dos trabalhadores e de denúncia das violações dos direitos humanos. Foi assassinado em 24 de março de 1980, enquanto rezava uma missa na capela do Hospital da Divina Providência, na capital de El Salvador. Seu assassinado era um atirador treinado na Escola das Américas por militares norte-americanos.
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