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pOLÍTICAS PÚBLICAS

Educação por trás das grades

na revista digital Vídeo e galeria de fotos com alunos e professores.

Os desafios para garantir o direito de estudar a adultos e adolescentes em conflito com a lei

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pessoa que perde o direito à liberdade não pode ter negado o seu direito à Educação. Nas instituições que recebem adolescentes em conflito com a lei, a continuidade do ensino é uma obrigação e parte integrante da internação. Já entre os presídios, onde estão os adultos, estima-se que metade possua alguma estrutura escolar. Só 8,5% dos encarcerados tiveram alguma atividade educacional em 2012 em todo o país. Embora as legislações para adultos e adolescentes sejam distintas, os desafios enfrentados por professores e alunos nesses contextos são semelhantes. Os entraves começam pelo espaço. Muitos prédios não são adequados para abrigar salas de aula. É comum que elas tenham grades e sejam pouco ventiladas. Inspeções feitas em 2013 pelo Ministério Público em 88,5% das unidades de medida socioeducativa do país encontraram instalações inadequadas em todas as regiões. Rosana Heringer, da Relatoria Nacional para o Direito Humano à Educação, considera a situação precária. “Há tantas violações de direito que, embora a Educação esteja prevista em lei, na prática ela é tratada como um luxo e não é priorizada”, diz. Outro aspecto fundamental é a relação entre as equipes de segurança e de Educação. Muitas aulas deixam de acontecer porque há suspeita de rebelião ou outra ameaça à estabilidade. Presos com mau comportamento ou que entram em conflito com os agentes penitenciários são comumente impedidos de frequentar as aulas. “O trabalho das áreas de Educação e segurança deve ser complementar, não competitivo”, ressalta Beatris Clair Andrade, da Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina.

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fevereiro 2014 novaescola.org.br

Os docentes ainda precisam fazer inúmeras adaptações em sua prática. Os materiais didáticos, muitas vezes escassos, devem respeitar algumas normas. Tesouras, por exemplo, costumam ser proibidas. Há locais em que nem canetas podem entrar. E os livros e vídeos são selecionados para não causar agitações desnecessárias ao ambiente. A situação já foi pior. “O debate sobre a Educação das pessoas privadas de liberdade ficou suspenso no Brasil por mais de 20 anos e só foi retomado recentemente”, diz Roberto da Silva, coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação em Regimes de Privação da Liberdade, da Universidade de São Paulo (USP). Hoje, documentos como o Plano Estratégico de Educação no Âmbito do Sistema Prisional e o Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo estabelecem metas e padrões mínimos, como a separação entre as atribuições dos órgãos de Justiça e Educação. Entre as conquistas para os adultos está a remissão da pena por dias de estudo – antes uma exclusividade de quem trabalhava. Esse benefício já é realidade em presídios como os do Pará, onde a alfabetização também recebe atenção especial. No Rio de Janeiro, a parceria entre as áreas que integram a gestão da unidade resulta no respeito à aprendizagem e até a lição de casa é incentivada. Avanços também são vistos nos locais voltados aos adolescentes. Em Salvador, o cuidado com a documentação durante a internação ajuda na continuidade dos estudos e os agentes de segurança são chamados de orientadores; e, em São Paulo, os jovens são vinculados a uma escola estadual externa à instituição. Conheça a seguir mais detalhes sobre essas histórias.

manuela novais

ANA LIGIA SCACHETTI, de São Paulo, beatriz Vichessi, do Rio de Janeiro, BRUNA NICOLIELO, de Salvador, e ELISA MEIRELLES, de Santa Isabel do Pará, PA elisa.meirelles@fvc.org.br Colaborou LARISSA TEIXEIRA

“Eu fiquei três anos sem estudar e voltei quando cheguei aqui. Os professores são diferentes dos que tive no ‘mundão’. Se alguém tem uma pergunta, eles sentam do lado e explicam. Quando sair, quero estudar e fazer faculdade. Minha mãe está guardando dinheiro para isso.” CARLA*, 14 anos, aluna da 4ª série * Para preservar a identidade dos entrevistados, os nomes são fictícios.


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