Boletim informativo alforge maio 2016

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Família: testemunho e exemplo de uma Vida Feliz!

Juan Ambrósio: A família, bem decisivo para o futuro do mundo e da Igreja

Frei Bento Domingues: Alegria do Amor: caminhos para a Igreja

Cristina Sá: A excecionalidade da ternura

Pe. Valter Salcedas: Valorização do CPM

Entrevista com… Pe. Joaquim Marques


Especial Família: Alegria do Amor 02 | O Alforge | maio 2016

Exortação apostólica sobre a família

A Exortação Apostólica do Papa Francisco, “Amoris Laetitia” – a alegria do amor, foi apresentada no passado dia 8 do corrente mês de Abril. Era muito esperada, podendo nós dizer que apareceu em tempo muito breve depois dos dois sínodos sobre a família realizados em 2014 e 2015. Organiza-se em nove capítulos, onde são contempladas as várias dimensões da instituição familiar e também se apontam caminhos de acompanhamento das famílias, assim como tentativas de superação de muitas das suas fragilidades. Um dos capítulos, o penúltimo, tem mesmo o título seguinte: “Acompanhar, discernir e integrar as fragilidades”. Sobre as várias situações de fragilidade, a exortação lembra o princípio geral de que a Igreja deve acompanhar com atenção e

solicitude os seus filhos mais débeis (n.291). Recomenda insistentemente aos pastores disponibilidade para o discernimento pastoral, que, sem prescindir das exigências da verdade e da caridade evangélicas (nº 300), sabe utilizar a lógica da misericórdia pastoral (nº 306). Sobretudo quanto às muito frequentes uniões de facto, com ou sem casamento civil, remete para a lei da gradualidade proposta pelo Papa João Paulo II, na encíclica “Familiaris Consortio”, nº 34. Por sua vez, sobre os divorciados recasados lembra que “o caminho da Igreja é o de não condenar eternamente ninguém” (o Papa cita-se a si mesmo, na homilia pronunciada para os novos cardeais, em 15/2/2015) e tem expressões como esta: “Não se pode dizer que todos os que estão em situação irregular vivem em pecado mortal” (nº 301). Estamos perante um texto de orientações pastorais que vai exigir muito de todos nós pastores para servirmos as famílias na sua caminhada de amor aberto à vida, em situações cada vez mais plurais. +Manuel R. Felício Bispo da Garda

Percurso 1: Loriga - Torre | Partida: 9h30 (distância: 10.250m - dificuldade elevada) Percurso 2: Pista de Ski - Torre | Partida: 13h30 (distância: 3.885m - dificuldade média) Percurso 3: Marco Geodésico - Capela | Partida: 14h30 (distância: 200m - dificuldade reduzida) Atividades: Capela Nossa Senhora do Ar, Torre 14h30 - Confissões 16h00 - Eucaristia Jubilar _______________________________________ Nota 1: Para quem vai participar nos percursos deve levar roupa e calçado confortável, água e alimentos. Nota 2: Há transporte de regresso a Loriga, mediante inscrição. Nota 3: Informações e inscrições para os e-mails: p.caetano@mail.telepac.pt | aminhaparoquia2@gmail.com

Ficha Técnica Propriedade e Administração: Arciprestado de Seia / Zona Oeste Equipa Responsável: António Carlos (Pe.), João Barroso (Pe.), Nuno Maria (Pe.), Paulo Caetano (Dr.), Rafael Neves (Pe.) Colaboradores nesta Edição: Alcides Henriques (Dr.), Alfredo Pinheiro Neves (Pe.), António Carlos (Pe.), Bento Domingues (Frei), Cristina Sá Carvalho (Dra.), Joaquim Marques Duarte (Pe.), Juan Ambrósio (Prof.), D. Manuel Felício (Bispo), Paulo Caetano (Dr.), Rafael Neves (Pe.), Ricardo Garcia (Dr.), Rita Saraiva (Dra.), Valter Salcedas Duarte (Pe.). Morada para Correspondência: Rua de Baixo, n. 2, 6270-213 Santiago Contatos: contacto@oalforge.pt | www.oalforge.pt | 238 085 048


Especial Família: Alegria do Amor 03 | O Alforge | maio 2016

Entrevista ao Presidente do Secretariado Diocesano da Pastoral Familiar Tem sido uma frase muito utilizada pelo papa: “a Igreja tem de estar mais próxima das famílias?”. No seu entendimento, o que dizer com isto? Concretamente como se pode fazer isso? Não podemos esquecer que o tema da proximidade com a família, com as pessoas, com a sociedade, isto é, com o mundo no qual a Igreja está inserida, é uma constante no discurso e na atuação do Papa Francisco. De fato este é o desígnio eterno de Deus cujas delicias é estar com os filhos dos homens ou como diz o livro do Génesis“Ouviram então a voz do Senhor Deus, que percorria o jardim à frescura do dia, e o homem e a sua mulher logo se esconderam do Senhor Deus por entre o arvoredo do jardim” (Gen. 3, 8). Sem este texto do livro do Génesis não perceberemos a intuição e a insistência do Papa com o tema da proximidade da Igreja com a família as periferias o mundo etc. Bom, o fazer às vezes torna-se mais difícil, mas parece-me que além das atitudes de proximidade e de acolhimento por parte da Igreja que deve ter estruturas pastorais de atenção e proximidade às famílias, as próprias famílias também deveriam estar dispostas a integrarem os movimentos e as estruturas onde poderiam ter uma ação mais pertinente na vida da sociedade e uma ação mais evangelizadora da mesma sociedade, uma vez que as próprias famílias são uma primeira e fundamental estrutura e protagonistas da pastoral porque nelas se funda a verdade do plano de Deus sobre o ser humano e a sua vocação ao amor. Muitas famílias vivem hoje momentos “dramáticos” por causa da guerra, da pobreza, do desemprego ou da instabilidade social, especialmente as que foram obrigadas a viver na condição de refugiadas. O que podem contar as famílias com

esta nova realidade proposta pelo Papa Francisco? Penso que nem por parte das famílias nem por parte da Igreja existem grandes novidades. Penso que o mundo sempre foi um grande “drama” à espera de grandes remédios e Deus , plenitude do Amor, é o grande remédio para todos os dramas da humanidade. A grande novidade somos nós e as nossas famílias a viverem, verdadeiros dramas e a passarem pela verdadeira Paixão do Senhor, e, por isso, a Igreja e as famílias cristãs associadas em grupos em movimentos, isto é, organizadas, deveriam apresentar, deveriam ter soluções de intervenção capazes de dar respostas concretas e materiais a essas situações porque respostas só de cariz espiritual não chegam pois já o Apóstolo Tiago escrevia aos primeiros cristãos dizendo : “De que aproveitará, irmãos, a alguém dizer que tem fé, se não tiver obras? Acaso esta fé poderá salvá-lo? Se a um irmão ou uma irmã faltarem roupas e o alimento quotidiano, e algum de vós lhe disser: «Ide em paz, aquecei-vos e fartaivos», mas não lhe derdes o necessário para o corpo, de que lhes aproveitará? Assim também a fé: se não tiver obras, está morta em si mesma” (Tg. 2, 14-17). Porque a família se insere numa sociedade que precisa de alguma mudança, no seu entendimento, que tipo de apoio as famílias precisam para estabilizar e cumprirem o Primado definido pela Igreja? Quanto a mim o apoio de que as famílias necessitam, tirando um caso ou outro, entre nós, em que a intervenção social pela carência em que possam viver requer uma intervenção rápida e pronta, penso que seria um apoio que abrangesse em primeiro lugar a política nas suas “políticas sociais” de apoio, ou falta dele, às famílias, na vertente da fiscalidade e dos impostos, na vertente de apoios

diretos como sejam abonos de família, regalias para famílias numerosas, atenção às condições de trabalho para as famílias com filhos pequenos … quero dizer todo um ambiente social que privilegiasse a família e desse oportunidade a todos os jovens que, sem medo do futuro, investirem na família e no futuro com esperança e com amor. Este é o grande “Primado” da Igreja quanto à familia. De facto, só há um novo e grande mandamento que é o do Amor e este concretiza-se na carne. A família, cristã ou não, deve ser a expressão “na carne” deste Amor tal como Cristo o é, e isto para as famílias cristãs torna-se Sacramento, Mistério. Hoje, infelizmente, vemos uma grande rotura entre a família e a paróquia. Como fazer a aproximação desejada? Como proporcionar um maior acolhimento e acompanhamento? Nesta sociedade o que se pode fazer pelo bem das crianças? Penso que a rotura não é propriamente com a paróquia mas com um paradigma de família a que estavamos habituados e que hoje já não é. O Papa Francisco em 17 de novembro de 2014 no “Colóquio Internacional sobre Complementaridade do Homem e da Mulher” dizia que: “Na nossa época o matrimónio está em crise. Vivemos numa cultura do provisório, na qual cada vez mais pessoas renunciam ao matrimónio como compromisso público… É cada vez mais evidente que a decadência da cultura do casamento está associada ao aumento da pobreza e a uma série de outros problemas sociais que afetam sobretudo as mulheres, as crianças e os idosos… É preciso insistir nos pilares fundamentais que regem uma nação: os seus bens imateriais. A família permanece na base da convivência, como garantia contra a desintegração social. As crianças têm o direito de crescer numa família com pai e

Padre Joaquim António Marques Duarte, nasceu a 17 de junho de 1956. Foi ordenado a 08 de abril de 1982. Atualmente é Arcipreste de Trancoso e tem a seu cargo as Paróquias de Cótimos, Moreira de Rei, Rio de Mel, Trancoso (Stª Maria e S. Pedro), Souto Maior e Valdujo. É Presidente do Secretariado Diocesano da Pastoral da Família, do Centro de Orientação Familiar, do Conselho Pastoral Diocesano e ainda da Comissão promotora e coordenadora do Diaconado Permanente. É Coordenador Diocesano da Pastoral; Membro do Cabido da Guarda e Capelão da Misericórdia de Trancoso. Tendo em conta que a nova exortação ainda está “quente” acabou de sair, iremos procurar, à medida que a formos estudando e conhecendo, que nos ajude a fazer um trabalho adequado aos grandes desafios que hoje se põem às familias e aos jovens que as querem constituir.


Especial Família: Alegria do Amor 04 | O Alforge | maio 2016 Continuação... mãe, capaz de criar um ambiente idóneo para o seu desenvolvimento e o seu amadurecimento afetivo”. A aproximação desejada deve necessariamente passar pela formação humana e cristã dos nossos adultos, e sobretudo dos jovens, investindo todo o esforço na formação para a confiança com que devem viver a vida, a abertura ao amor sem receios do futuro alicerçados numa comunidade paroquial que deveria servir de apoio para essa confiança. Quanto àquilo que se pode fazer pelo bem das crianças penso que o fundamental, como diz o Papa, seria dar-lhes um pai, uma mãe e irmãos, porque tudo o resto é importante: cuidados de saúde, cuidados de educação, cuidados de habitação e lazer; mas o mais importante seria aquilo. A atuação da Igreja perante casos como o das pessoas divorciadas, recasadas ou que vivem em união de facto, foi uma questão que mereceu largo destaque mediático durante os Sínodos. Como integrar estas pessoas na vida da comunidade? Como pode ser feito este trabalho de integração? Quanto a este assunto, que é pastoralmente muito delicado, começo por citar a recente exortação apostólica do Papa Francisco “O Sínodo referiu-se a diferentes situações de fragilidade ou imperfeição. A este respeito, quero lembrar aqui uma coisa que pretendi propor, com clareza, a toda a Igreja para não nos equivocarmos no caminho: “Duas lógicas percorrem toda a história da Igreja: marginalizar e integrar… o caminho da Igreja, desde o concílio de Jerusalém em diante é sempre o de Jesus; o caminho da misericórdia e da integração. … O caminho da Igreja é o de não condenar eternamente ninguém; derramar a misericórdia de Deus sobre todas as pessoas que a pedem

com coração sincero … Porque a caridade verdadeira é sempre imerecida, incondicional e gratuita.” (A.L. 296). O Papa apela depois para a complexidade e a diversidade das situações que merecem toda a atenção dos próprios e dos pastores. A participação destas pessoas diz o Papa que: “pode exprimirse em diferentes serviços eclesiais, sendo necessário, por isso, discernir quais das diferentes formas de exclusão atualmente praticadas em âmbito litúrgico, pastoral, educativo e institucional possam ser superadas. Não só não devem sentir-se excomungados, mas podem viver e maturar como membros vivos da Igreja, sentindo-a como uma mãe que sempre os acolhe, cuida afetuosamente deles e encoraja-os no caminho da vida e do evangelho. (A.L.299) O Papa diz que não vai apresentar uma normativa de tipo canónico e que seja igual para todos, mas apresenta uma nova perspetiva ao dizer: “É possivel apenas um novo encorajamento a um responsável discernimento pessoal e pastoral dos casos particulares, que deveria reconhecer: uma vez que «o grau de responsabilidade não é igual em todos os casos», as consequências ou efeitos duma norma não devem necessariamente ser sempre os mesmos.” (A.L. 300) Este trabalho de integração deve envolver por isso num mesmo processo quer o próprio quer o sacerdote que deve: “acompanhar as pessoas interessadas pelo caminho do discernimento segundo a doutrina da Igreja e as orientações do bispo.” (A.L. 300) Outro aspeto importante na realidade atual, é o acesso aos Sacramentos. Tendo em pano de fundo a nossa realidade, como será feito o acesso aos Sacramentos? Era muito mais fácil para nós que o Papa tivesse dado uma

norma de tipo canónica ou jurídica para estes casos, mas não foi o que aconteceu. O Papa faz-nos passar deste nivel jurídico, o “se é permitido ou não”, para um outro nível de atuação pastoral de tipo mais personalista, existencialista, de proximidade, de acompanhamento, aliás um pouco, ou até muito, na linha do Concilio Vaticano II ou o que é mais ainda na linha do Evangelho ou da maneira de Jesus atuar à qual o Papa recorre frequentemente. Além disso o Papa diz que para este discernimento pastoral ser bem feito: “…não poderá jamais prescindir das exigências evangélicas de verdade e caridade propostas pela Igreja. Para que isto aconteça, devem garantir-se as necessárias condições de humildade, privacidade, amor à Igreja e à sua doutrina, na busca sincera da vontade de Deus e no desejo de chegar a uma resposta mais perfeita à mesma”. (A.L. 300) Assim o Papa, sem descurar a importância e a necessidade das normas gerais volta a insistir na necessidade do discernimento dizendo: “É verdade que as normas gerais apresentam um bem que nunca se deve ignorar nem transcurar, mas, na sua formulação, não podem abarcar absolutamente todas as situações particulares. Ao mesmo tempo é preciso afirmar que, precisamente por esta razão aquilo que faz parte de um discernimento prático duma situação particular não pode ser elevado à categoria de norma.” (A.L. 304) Portanto na nossa realidade, como na realidade de toda a Igreja católica, deve agir-se seguindo estas indicações do Papa; o discernimento pastoral será o grande desafio. “O discernimento deve ajudar a encontrar os caminhos possíveis de resposta a Deus e de crescimento no meio dos limites. Por pensar que tudo seja branco ou preto, às vezes fechamos o caminho da graça e

do crescimento e desencorajamos percursos de santificação que dão glória a Deus. Lembremo-nos de que um pequeno passo, no meio das grandes limitações humanas, pode ser mais agradável a Deus do que a vida externamente correta de quem transcorre os seus dias sem enfrentar sérias dificuldades”. (A.L. 305) “A caridade fraterna é a primeira lei dos cristãos.”(A.L. 306) O desafio dos cristãos é estar ao lado de quem mais precisa. Esta é a atitude do Papa Francisco: estar ao lado, não condenar, procurar o lado positivo da questão e fazê-lo crescer. O que falta para imitar a família de Nazaré? Bom, para imitar a família de Nazaré faltará muita coisa, mas penso que a questão não é essa. Essa seria uma questão muito piedosa e de cariz espiritual, no âmbito da dociliade ao Espírito, mas parece-me que o que verdadeiramente está em questão são as famílias do nosso tempo com as suas dificuldades com as suas sombras e pecados, as suas limitações e dificuldades. Ou seja aquilo de que somos feitos: “pó da terra” mas que é imensamente amado por Deus que fez dele (casal Humano), a sua imagem, a sua semelhança e isto ninguém nos pode tirar. Por outro lado, as nossas famílias são chamadas, pela força do sacramento que as une, a serem o grande testemunho da misericórdia, do amor e da bondade de Deus diante do mundo que muitas vezes e de formas muito variadas e às vezes até “agressivas” rejeita o Espírito de Deus presente no mundo. Depois da realização dos Sínodos, o Papa Francisco deu expressão ao seu pensamento, escrevendo a Exortação Apostólica. Que


Especial Família: Alegria do Amor 05 | O Alforge | maio 2016 Continuação... novidades traz? O que pode mudar na vida das Famílias? Um dia perguntaram a Jesus a sua opinião sobre uma questão familiar, ou seja a do divórcio, (Mt. 19, 3-12) procurando na resposta alguma novidade que pudessem aproveitar para acusar Jesus, mas Ele simplesmente foi “ao princípio” para ensinar que o desígnio de Deus acerca do ser humano se deve manter. Parece -me que nesta exortação a grande novidade é esta: manter a família neste desígnio de Deus. As primeiras palavras da exortação denunciam-no claramente: “A ALEGRIA DO AMOR que se vive nas famílias é também o júbilo da Igreja”. (A. L. 1) Um cunho marcadamente existencialista, personalista e

gratificante do amor humano, vivido nas dificuldades do tempo atual, penso que é a grande novidade, repito, na linha da Gaudium et Spes e, sobretudo, na linha de Jesus e do seu Evangelho. Esta exortação pode, por isso, ser um grande desafio para as famílias cristãs e para os jovens cristãos que devem perceber a família como um desafio à realização integral do ser humano, homem e mulher, que o Papa põe por escrito ao dizer numa linguagem tão poética e tão bela: “ Toda a vida da família é um «pastoreio» misericordioso. Cada um, cuidadosamente, desenha e escreve na vida do outro:”( A. L. 322)

No caso particular da nossa Diocese, como tem decorrido o trabalho do Secretariado Diocesano da Família? Quais as metas para um futuro próximo? Quais as atividade planeadas, tendo em conta a nova Exortação Apostólica? O secretariado Diocesano da família tem procurado animar e coordenar a Pastoral Familiar da Diocese que é responsabilidade de toda a comunidade eclesial, isto é, não esgotamos, nem pouco mais ou menos toda a pastoral familiar até porque a ação pastoral familiar diz respeito a toda a comunidade, é uma ação transversal a toda a vida da Igreja. De facto, a grande protagonista é a mesma Igreja. O Secretariado tem procurado

animar e dinamizar esta vida pastoral sobretudo através de duas grandes ações : A Jornada da Família com caráter formativo e de reflexão e o Dia da Família de tipo mais celebrativo e lúdico. Procuramos também fazer alguma coordenação de outras estruturas ligadas à pastoral familiar, como sejam CPM, ENS e outros. Temos uma grande meta à qual ainda não chegámos mas da qual não queremos desistir que é a da constituição de pequenas equipas da Pastoral Familiar pelo menos a nível Arciprestal e continuar um trabalho de acompanhamento onde formos solicitados.

Carta do Papa Francisco às Famílias... Queridas famílias, Apresento-me à porta da vossa casa para vos falar de um acontecimento que vai realizar-se, como é sabido, no próximo mês de Outubro, no Vaticano: trata-se da Assembleia geral extraordinária do Sínodo dos Bispos, convocada para discutir o tema «Os desafios pastorais sobre a família no contexto da evangelização». Efetivamente, hoje, a Igreja é chamada a anunciar o Evangelho, enfrentando também as novas urgências pastorais que dizem respeito à família. Este encontro envolve todo o Povo de Deus: Bispos, sacerdotes, pessoas consagradas e fiéis leigos das Igrejas particulares do mundo inteiro, que participam ativamente, na sua preparação, com sugestões concretas e com a ajuda indispensável da oração. O apoio da oração é muito necessário e significativo, especialmente da vossa parte, queridas famílias; na verdade, esta Assembleia sinodal é

dedicada de modo especial a vós, à vossa vocação e missão na Igreja e na sociedade, aos problemas do matrimónio, da vida familiar, da educação dos filhos, e ao papel das famílias na missão da Igreja. Por isso, peço-vos para invocardes intensamente o Espírito Santo, a fim de que ilumine os Padres sinodais e os guie na sua exigente tarefa. Como sabeis, a esta Assembleia sinodal extraordinária, seguir-se-á, um ano depois, a Assembleia ordinária, que desenvolverá o mesmo tema da família. E, neste mesmo contexto, realizar-se-á o Encontro Mundial das Famílias, na cidade de Filadélfia, em setembro de 2015. Por isso, unamo-nos todos em oração para que a Igreja realize, através destes acontecimentos, um verdadeiro caminho de discernimento e adote os meios pastorais adequados para ajudarem as famílias a enfrentar os desafios atuais com a luz e a força que

provêm do Evangelho. Estou a escrever-vos esta carta no dia em que se celebra a festa da Apresentação de Jesus no templo. O evangelista Lucas conta que Nossa Senhora e São José, de acordo com a Lei de Moisés, levaram o Menino ao templo para oferecê-Lo ao Senhor e, nessa ocasião, duas pessoas idosas – Simeão e Ana –, movidas pelo Espírito Santo, foram ter com eles e reconheceram em Jesus o Messias. Simeão tomou-O nos braços e agradeceu a Deus, porque tinha finalmente «visto» a salvação; Ana, apesar da sua idade avançada, encheu-se de novo vigor e pôs-se a falar a todos do Menino. É uma imagem bela: um casal de pais jovens e duas pessoas idosas, reunidos devido a Jesus. Verdadeiramente Jesus faz com que as gerações se encontrem e unam! Ele é a fonte inesgotável daquele amor que vence todo o isolamento, toda a solidão,

toda a tristeza. No vosso caminho familiar, partilhais tantos momentos belos: as refeições, o descanso, o trabalho em casa, a diversão, a oração, as viagens e as peregrinações, as ações de solidariedade... Todavia, se falta o amor, falta a alegria; e Jesus é quem nos dá o amor autêntico: oferece-nos a sua Palavra, que ilumina a nossa estrada; dá-nos o Pão de vida, que sustenta a labuta diária do nosso caminho. Queridas famílias, a vossa oração pelo Sínodo dos Bispos será um tesouro precioso que enriquecerá a Igreja. Eu vo-la agradeço e peço que rezeis também por mim, para que possa servir o Povo de Deus na verdade e na caridade. A proteção da Bem-Aventurada Virgem Maria e de São José acompanhe sempre a todos vós e vos ajude a caminhar unidos no amor e no serviço recíproco. De coração invoco sobre cada família a bênção do Senhor.


Especial Família: Alegria do Amor 06 | O Alforge | maio 2016

Dez ensinamentos do Papa Francisco sobre a família No seu pontificado, o Papa Francisco sempre faz questão de ressaltar a importância da família e os valores que devem direcionar as relações familiares. Algumas frases do Papa: 1. “E esta é a grande missão da família: arranjar lugar para Jesus que vem, receber Jesus na família, na pessoa dos filhos, do marido, da esposa, dos avós, porque Jesus está aí.” Audiência Geral, 17 de dezembro de 2014. 2. “Três palavras que devem existir sempre em casa: com licença, obrigado, desculpa. Com licença: para não se intrometer na vida dos cônjuges. Com licença, como te parece isto? Com licença, permite-me. Obrigado: agradecer ao cônjuge; obrigado por aquilo que fizeste por mim, obrigado por isto. A beleza da gratidão! E dado que todos nós erramos, há outra palavra um pouco difícil de pronunciar, mas necessária: desculpa.” Catequese, 2 de abril de 2014. 3. “Aquilo que mais pesa na vida é a falta de amor. Pesa não receber um sorriso, não ser benquisto. Pesam certos silêncios, às vezes mesmo em família, entre marido e esposa, entre pais e filhos, entre irmãos. Sem amor, a

fadiga torna-se mais pesada, intolerável.” Discurso às Famílias, 26 de Outubro de 2013 4. “Sim, ser mãe não significa só trazer um filho ao mundo, mas é também uma opção de vida: o que é que uma mãe escolhe? Qual é a opção de vida de uma mãe? A opção de vida de uma mãe é a opção de dar vida. E isto é grande, isto é belo.” Audiência Geral, 7 de janeiro de 2015. 5. “O pai procura ensinar ao filho aquilo que ele ainda não sabe, corrigir os erros que ainda não vê, orientar o seu coração, protegê-lo no desânimo e na dificuldade. Tudo isso com proximidade, com doçura e com uma firmeza que não humilhe.” Audiência Geral. 4 de fevereiro de 2015. 6. “A família atravessa uma crise cultural profunda, como todas as comunidades e vínculos sociais. No caso

da família, a fragilidade dos vínculos reveste-se de especial gravidade, porque se trata da célula básica da sociedade.” Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, 2013 7. “O verdadeiro vínculo é sempre com o Senhor. Todas as famílias têm necessidade de Deus: todas, todas! Necessidade da Sua ajuda, da Sua força, da Sua bênção, da Sua misericórdia, do Seu perdão. E requer-se simplicidade. Para rezar em família requer-se simplicidade! Quando a família reza unida o vínculo torna-se mais forte”. Homilia da Missa do Encontro de Famílias, que se realizou em Roma em outubro de 2013. 8. “O matrimónio é uma longa viagem que dura toda a vida, e necessitam da ajuda de Jesus para caminhar juntos, com confiança, para se acolherem, um ao outro

todos os dias, e perdoaremse todos os dias; e isto é importante nas famílias, saberem perdoar-se. Porque todos nós temos defeitos. Todos!”. Encontro de Famílias em Roma em outubro de 2013. 9. “Uma sociedade que descarta os seus idosos é uma sociedade sem dignidade, perde as suas raízes e vigor; uma sociedade que não se rodeia de filhos, que os considera um problema, um peso, não tem futuro.” Audiência Geral, 10 de fevereiro de 2015. 10. “A verdadeira alegria vem da harmonia profunda entre as pessoas, que todos experimentam no seu coração e que nos faz sentir a beleza de estar juntos, de apoiar-se mutuamente no caminho da vida”. Missa de encerramento do Encontro de Famílias, em Roma.

perdão é vital para a nossa saúde emocional e sobrevivência espiritual. Sem perdão a família tornase uma arena de conflitos e um reduto de mágoas. Sem perdão a família adoece. O perdão é a assepsia da alma, a faxina da mente e a alforria do coração.

Quem não perdoa não tem paz na alma nem comunhão com Deus. A mágoa é um veneno que intoxica e mata. Guardar mágoa no coração é um gesto autodestrutivo. É autofagia. Quem não perdoa adoece física, emocional e espiritualmente. É por isso que a família precisa de ser lugar de vida e

não de morte; território de cura e não de doença; palco de perdão e não de culpa. O perdão traz alegria onde a mágoa produziu tristeza; cura, onde a mágoa causou doença.

Família, Lugar de Perdão Não existe família perfeita. Não temos pais perfeitos, não somos perfeitos, não nos casamos com uma pessoa perfeita nem temos filhos perfeitos. Temos queixas uns dos outros. Dececionamo-nos uns aos outros. Por isso, não há casamento saudável nem família saudável sem o exercício do perdão. O


Especial Família: Alegria do Amor 07 | O Alforge | maio 2016

MARIA, MÃE DE MISERICÓRDIA “A Sua Misericórdia se estende de geração em geração, sobre aqueles que O temem”. É impensável que algo possa existir sem que esteja abrangido pela essência de Deus, pelo Seu Amor. Deus é Amor. Assim tudo quanto existe é fruto do Amor que Deus é em si. Amor necessariamente eterno. Amor de ontem, de hoje, de amanhã e de toda a eternidade. Ensina-nos bem o salmista no grande Hallel: “ é eterna a Sua bondade” (Sl. 136). Nesta perspetiva, Maria de Nazaré, a eleita de Deus e por Ele consagrada em plenitude de santidade, a Imaculada Conceição, a que uma vez convidada, aceitou ser missão singular, a Mulher única, a Virgem Mãe e a Mãe sempre Virgem, surge como a mais bela criatura gerando-se nela a Misericórdia, o Amor que Deus é. A Sua existência é por si mesma expressão peculiar do amor gratuito, generoso, eterno e omnipotente que se difundirá posteriormente e através dela a toda a criatura e à Criação inteira. Para que tal não cesse de acontecer e se torne sempre manifesto e abrangente, o próprio Deus a consagrou ligando-a intimamente a si e, pelo dom da fecundidade virginal, enaltecendo nela o dom sublime da maternidade, tornou-a mãe do Seu Filho pela força do Amor mútuo e recíproco que os constitui como Pai e Filho. Foi assim que Maria, tornando-se mãe, concebeu o Filho de Deus; gerou-O nas suas entranhas e deu-O à Luz como rosto inefável da

Misericórdia divina. Maria é Mãe do Filho de Deus misericordioso que sendo-o desde sempre, na plenitude dos tempos se corporizou como Verbo incarnado, Jesus, o Qual, sem deixar de ser Deus, se fez homem, unindo desse modo e para sempre o homem ao próprio Deus. Maria é, por graça de Deus, mãe deste Mistério; mãe desta Misericórdia incarnada, deste amor que vem ao mundo e que o reorienta definitivamente no “eixo” misericordioso para o qual fora criado pelo Próprio Deus. Mas Maria torna-se ainda mais “mãe de Misericórdia” graças à fidelidade do seu “SIM” oportunamente manifestado a Deus e n’Ele conservado para sempre. Um “SIM” tão abrangente que o mesmo se envolve com o “SIM” do Filho de Deus a Seu Pai e com o “SIM” do próprio Verbo à Sua mãe na historicidade da Sua existência. Ela recebeuO dentro de si e acompanhou-O até à Sua Páscoa gloriosa, pelo “subir de novo” para o Pai, numa fidelidade sem limites. Foi graças ao “MISTÉRIO” deste “SIM” que a maternidade de Maria se enriqueceu ainda mais e se projetou para um outro significado e para uma nova dimensão. Ela é nossa mãe! É nesta nova maternidade que todos nós fomos e somos envolvidos. “ Mulher, eis o teu filho!” - Disse-lhe Jesus no Calvário. - “E João levou-a para sua casa”. João tornou-se o “novo filho” de Maria. João representou a Igreja e representou-nos a cada um de nós. Deste modo

os novos filhos de Maria somos nós, a Igreja. A Mãe da Misericórdia tornou-se em “maternidade misericordiosa” e que não cessa de nos entregar a Misericórdia de Deus, o seu Filho Jesus. Se o Amor do Pai entregou o Seu Filho (Verbo Eterno) a esta mulher, eleita e agraciada, o mesmo Pai e o mesmo Filho entregam-se a todos nós ao longo da nossa vida, como O Padre Alfredo Pinheiro misericórdia absoluta, Neves nasceu a 22 de através e com o amor janeiro de 1956, em maternal desta mulher, a Manteigas. Foi ordenado mãe sempre virgem que nos Sacerdote a 4 de julho de acolhe e nos protege como é 1981. próprio das mães. Foi Vice Reitor do Seminário A misericórdia de Deus do Fundão. que nos propomos celebrar Atualmente é Pároco da Sé ao longo deste ano jubilar, é e São Vicente, na Guarda. É -nos oferecida pelo Pai no Assistente Geral da Liga dos Seu filho e o amor do Filho Servos de Jesus. não chega até nós senão através desta mãe que generosamente tendo-O concebido, O oferece a Mas Maria torna-se todos. Quem O recebe ainda mais “mãe de constitui-se, por esse facto, Misericórdia” graças à verdadeiro corpo d’Ele e do Qual Ele é a cabeça. É por fidelidade do seu “SIM” isso mesmo que Maria se oportunamente torna nossa mãe na ordem manifestado a Deus e da graça. Mãe desse corpo místico. Não nos inibimos n’Ele conservado para pois de a tratar como Mãe, sempre. nossa advogada, Senhora da Misericórdia, verdadeiramente Rainha e encontra junto de Deus sem nossa Esperança definitiva. Ela nos acompanha no nosso deixar de ser presente às nossas necessidades peregrinar; solícita, vela por imploramos o seu “olhar de nós e de Deus invoca o perdão para as faltas em que ternura e de misericórdia” continuamente caímos. Mãe em nosso favor. Mais que o olhar, queremos que as suas conhecedora do Seu Deus e do Seu Senhor. Conhecedora “entranhas de amor” constantemente gerem para dos nossos mistérios, “neste nós a vida e a presença de vale de lágrimas”, vai-nos Seu Filho, única Porta que recordando a necessidade de fazermos sempre: “ o que nos leva à imensidão do Pai e do Seu Amor. A Eternidade Ele nos disser”. que O constitui. A esta mãe que se


Especial Família: Alegria do Amor 08 | O Alforge | maio 2016

A família, bem decisivo para o futuro do mundo e da Igreja

O Professor Juan Francisco Garcia Ambrósio, nasceu a 22 de Agosto de 1962, em Valência de Alcántara, Cáceres, Espanha. É casado com a Cristina (economista) e pai do André e do Filipe. Licenciado e Mestre em Teologia (tese na área da Cristologia), pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. É membro do Conselho de Direção e investigador do Centro de Estudos de Religiões e Culturas da Universidade Católica Portuguesa. Exerce funções de Coordenação Pedagógica nos cursos de e-learning ministrados pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. É Docente da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa (desde o ano 1991) onde tem lecionado em diversas áreas (destaca-se a área da Cristologia, da Sacramentologia, do Fenómeno Religioso e da Educação Moral e Religiosa Católica). É membro da direção do Instituto Diocesano da Formação Cristã do Patriarcado de Lisboa.

Foi assinada a 19 de março e tornada pública a 8 de abril de 2016 a Exortação Apostólica Pós-Sinodal «A alegria do amor». Com este texto o papa Francisco conclui um processo iniciado em finais de 2013, quando, para surpresa de muitos, enviou um questionário a todas as comunidades cristãs tendo por objetivo implementar uma dinâmica sinodal que seria pontuada por dois momentos fundamentais: A III Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos e a XIV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos. Eram 38 perguntas (com várias alíneas) com as quais o Papa pretendia ficar a conhecer melhor o sentir dos fieis (sensus fidelium) sobre esta temática tão importante e decisiva para a vida da Igreja e do mundo. As respostas não se fizeram esperar e foram chegando a Roma, de uma maneira generosa e entusiasta, vindas de todas as partes do mundo. A partir delas foi possível construir um texto que serviu de base para orientar os trabalhos que tiveram lugar na já referida III Assembleia Geral Extraordinária, que reuniu em Roma de 5 a 19 de outubro de 2014 para refletir sobre «Os desafios pastorais da família no contexto da evangelização». Desta Assembleia resultou um Relatório Final, que, juntamente com um outro conjunto de perguntas novamente dirigido a todos os cristãos, ajudou a preparar a XIV Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, que reuniu em Roma de 4 a 25 de outubro de 2015,

agora para refletir sobre «A vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo». Também no fim dos trabalhos foi elaborado um Relatório Final que foi amplamente divulgado. A partir de toda esta dinâmica é possível identificar algumas linhas de força das quais aponto, em seguida, apenas algumas. Primeiro fica claro o lugar de destaque que a família ocupa no pensamento de Francisco. Com efeito, nestes três anos do seu pontificado a família tem sido uma realidade sempre presente, destacando o papel fundamental que ela é chamada a desempenhar na renovação da Igreja e no cuidado da casa comum. Por outro lado, vê-se também a constante preocupação em ler e interpretar a realidade, ou seja, o Papa quer caminhar tendo em conta a realidade concreta da família, com as suas luzes e as suas sombras, fazendo o exercício - e convidam-nos simultaneamente a fazê-lo também - de ousar olhar para essa realidade a partir dos próprios olhos de Deus. A insistência com que tem falado do carinho, da ternura e da misericórdia de Deus, são disso testemunho inequívoco. Mas se ficou claro o lugar fundamental que a família deve ocupar no Projeto de Deus para a humanidade, também ficaram claras algumas divisões e tensões no seio da comunidade cristã. É verdade que muitas vezes essas tensões foram empoladas e ampliadas por alguma comunicação social, tendo sido com frequência traduzidas, de um modo

simplista, como uma divisão entre conservadores (apresentados como aqueles qua acham que nada deve mudar) e progressistas (apresentados como aqueles que pensam que tudo deve mudar), mas isso não nos deve impedir de reconhecer a sua existência. Toda esta realidade é acolhida pelo Papa na Exortação «A alegria do amor» que é apresentada simultaneamente como um ponto de chegada e um ponto de partida. E com isto o Papa volta a surpreender ao afirmar explicitamente que: "Recordando que o tempo é superior ao espaço, quero reiterar que nem todas as discussões doutrinais, morais ou pastorais devem ser resolvidas através de intervenções magisteriais. Naturalmente, na Igreja, é necessária uma unidade de doutrina e práxis, mas isto não impede que existam maneiras diferentes de interpretar alguns aspetos da doutrina ou algumas consequências que decorrem dela. Assim há de acontecer até que o Espírito nos conduza à verdade completa (cf. Jo16, 13), isto é, quando nos introduzir perfeitamente no mistério de Cristo e pudermos ver tudo com o seu olhar. [...]." (Nº3) O Papa não toma partido por nenhuma das duas tendências anteriormente referidas, nem sequer assume uma posição intermédia diplomática e conciliadora. Porventura escolhe o caminho mais difícil, e convida toda a Igreja a prosseguir numa dinâmica de discernimento para a qual aponta algumas balizas.


Especial Família: Alegria do Amor 09 | O Alforge | maio 2016 Continuação... Devemos partir desta certeza inequívoca: "A alegria do amor que se vive nas famílias é também o júbilo da Igreja. [...], o anúncio cristão sobre a família é verdadeiramente uma boa notícia" (nº 1). "O bem da família é decisivo para o futuro do mundo e da Igreja" (nº 31). Por isso convida-nos a anunciar com toda a clareza e amplitude o projeto de Deus sobre a família, sem 'amaciar' nenhuma das suas exigências nem 'encurtar' o seu horizonte (cf cap I e III). Convida-nos igualmente a partir da realidade concreta que é poliédrica (cf nº4 e

cap II). É certo que essa realidade não coincide com esse horizonte e, muitas vezes, está mesmo muito afastada dele, mas isso não nos deve imobilizar nem paralisar no caminho, pelo contrário, deve impulsionarnos a procurá-lo de uma maneira criativa e ousada, sempre à luz da misericórdia divina, acompanhando, discernindo e integrando a fragilidade (cf. Cap VIII) O Papa tem consciência das dificuldades, bem como do momento fundamental em que nos encontramos e por isso mesmo afirma: "Devido à riqueza que os dois anos de reflexão do caminho sinodal ofereceram, esta Exortação aborda, com

diferentes estilos, muitos e variados temas. isto explica a sua inevitável extensão. Por isso não aconselho uma leitura geral apressada. Poderá ser de maior proveito, tanto para as famílias como para os agentes de pastoral familiar, aprofundar pacientemente uma parte de cada vez ou procurar nela aquilo que precisarem em cada circunstância concreta. [...]" (n7) Não é mesmo o caminho mais fácil. Muitos teriam preferido orientações muito mais definitivas e fechadas, mas o convite é para continuar a caminhar em conjunto, destacando a beleza do amor no

matrimónio e na família (cf Cap IV e V), promovendo a sua espiritualidade (cf cap IX) e olhando de frente os desafios que se levantam (cf Cap VI, também VII). Não tenhamos dúvidas, para o papa Francisco "as famílias não são um problema, são sobretudo uma oportunidade" (nº 7). E por isso, pode concluir: "[...]. Avancemos, famílias; continuemos a caminhar! Aquilo que se nos promete é sempre mais. Não percamos a esperança por causa dos nossos limites, mas também não renunciemos a procurar a plenitude do amor e comunhão que nos foi prometida." (nº 325)

Foi o Ano da Vida Consagrada! E Agora?... Terminámos em fevereiro passado a celebração do Ano da Vida Consagrada convocado pelo Papa Francisco para toda a Igreja. Situemo-nos, recordando aqui os três objetivos que o Papa traçou para este ano na alusiva Carta Apostólica: ‘olhar com gratidão o passado, viver com paixão o presente, abraçar com esperança o futuro’. Em primeiro lugar, é de gratidão que se trata para todos os seguidores de Jesus, consagrados e consagradas. Ao repassar a história dos diversos Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica na Igreja permite-nos verificar que ela está repleta de páginas entusiastas e heroicas que os próprios consagrados e consagradas escreveram. No entanto, não podem os consagrados e consagradas ser apenas «filhos pigmeus de pais gigantes». O Ano da Vida Consagrada pretendeu ser também a ocasião para viver com paixão o presente, aqui e agora. A lembrança

agradecida do passado impele -nos a constatar que a vida dos consagrados e consagradas não foi nunca dirigida unicamente por mãos humanas. Foi o Espírito que criou, recriou, transformou e impulsionou os consagrados e consagradas a viverem sempre fiéis a Deus e ao Seu Povo que caminha, luta, sofre e espera. Por isso nem aos consagrados, nem às consagradas é permitido imobilizarem-se, fecharem-se e viverem de costas voltadas para o mundo. Vivem-se tempos desconcertantes, de incerteza e esperança, é um tempo confuso mas também

apaixonante. Assistimos como processos sociais e culturais radicais mudam o mundo e vemos como surgem novas culturas e estilos de vida novos. Isto interpela os próprios consagrados e consagradas, questiona-os e «obriga-os» a buscarem formas mais significativa para os jovens de hoje. Assim apelava o papa Francisco a um instituto de Vida Consagrada: «A fidelidade, o manter puro o carisma, não significa de nenhum modo fechá-lo numa garrafa selada, como se fosse água destilada, de modo que não seja contaminado a partir do exterior. Não, o carisma não se conserva pondo-o

aparte; é preciso abri-lo e deixar que saia, para que entre em contacto com a realidade, com as pessoas, com as suas preocupações e os seus problemas. E assim, neste encontro fecundo com a realidade, o carisma cresce, renova-se e também a realidade se transforma, se transfigura através da força espiritual que o carisma traz consigo». Concluído o Ano da Vida Consagrada, estamos convencidos de que as vocações de especial consagração são dom do Espírito para a Igreja e para o mundo. Neste sentido a Vida Consagrada tem futuro, mas depende muito dos seus intervenientes, da sua capacidade de renová-la, recreá -la e refundá-la. Os valores evangélicos em que acreditam têm de ser traduzidos e encarnados em símbolos de modo que sejam significativos para os homens e mulheres de hoje numa atenção permanente ao Espírito que «sopra onde quer». Pe. Rafael Neves


Entrevista com... 10 | O Alforge | maio 2016

Entrevista ao Padre Valter Salcedas,

O Pe. Valter Tiago Salcedas Duarte, nasceu a 04 de junho de 1981. Foi Ordenado a 08 de dezembro de 2008. Atualmente é Arcipreste de Alpedrinha e Pároco de Castelo Novo, Alpedrinha, Soalheira, Louriçal do Campo e Atalaia do Campo. É Capelão da Misericórdia de Alpedrinha e Diretor do Departamento Diocesano da Catequese da Infância e da Adolescência, bem como Assistente diocesano do CPM.

O que é o CPM e quais os objetivos o CPM? O CPM é um movimento de leigos, assistido por um sacerdote, que é proposto pela Igreja como um momento e um caminho de preparação para o Sacramento do Matrimónio, estando organizados a nível internacional, com especificidade diocesana e concretização arciprestal. Procura, através de uma metodologia própria, baseada na revisão de vida dos casais que fazem parte da equipa, no seu

testemunho vivencial e no diálogo com os noivos, preparar o matrimónio destes, fazendo-os refletir sobre o seu namoro/noivado e confrontá-los com a validade dos seus projetos de vida, dos seus comportamentos pessoais, sociais e eclesiais. Quem visa/pretende alcançar o CPM? O movimento tem como objetivo chegar a todos aqueles que pretendem celebrar o seu matrimónio. Neste objetivo geral percebemos que, mediante a transformação permanente da sociedade e sendo esta nos nossos dias feita a uma velocidade alucinante, existe uma necessidade cada vez mais premente de chegar, de facto, aos noivos. Procurando despertar ou fazer renascer a fé, dialogando acerca das suas ideias e ajudando-os, a eles próprios, a dialogar entre si e sobretudo preparando-os para a necessária superação das dificuldades, fazendo-os sentir que a construção de um caminho a dois é uma empresa comum e comunitária, isto é, fazendoos reconhecer a necessidade de, tendo o seu espaço pessoal e próprio, concretizado na comunhão de vida, a mesma não pode ser uma realidade isolada da comunidade. Onde se situa Deus no CPM? O movimento, sendo um caminho proposto pela Igreja, tem no seu fundamento último a fé, pelo que, os casais que partilham o seu testemunho de vida o fazem com os seus alicerces profundamente

responsável do CPM na Diocese enraizados no Evangelho de Jesus. Não se coloca, por isso, uma necessidade de especificar onde está Deus no CPM, porque estando Ele na vida daqueles que dele fazem parte, o movimento não tem sentido sem a Sua presença constante e discreta. O CPM não é um momento de catequização, muito menos de “doutrinação”, é sim um momento de encontro dos noivos que, preparando o seu matrimónio, “bebem”, experimentam e experienciam o testemunho de vida daqueles que, vivendo a sua fé na vida em casal, querem propor-se, não como exemplo de perfeição, mas como testemunho de possibilidade de caminho feliz. Qual é a realidade na nossa Diocese? Como tem decorrido e os resultados do CPM na diocese? A nossa diocese foi pioneira na implementação do CPM! Desde muito cedo que se começou a organizar em diversos arciprestados, ao seu ritmo próprio, a realização de encontros do CPM. Neste momento existem dez centros de preparação para o matrimónio, ainda que nem todos com a orgânica do movimento, que pressupõe a partilha de pelo menos sete casais de diferentes idades e experiências de vida, com o intuito de proporcionar uma amplitude testemunhal coerente e sobretudo apelativa, quer na vivência das alegrias, quer na superação das dificuldades. Fazendo transmitir a mensagem que problemas existem que são transversais a todas as

idades, a todas as realidades e em todos os momentos da vida matrimonial, seja ela ainda recente ou já com décadas de caminho. Bem como partilha de alegrias e felicidade que muitas vezes se julgam inatingíveis, uma vez que hoje em dia tudo parece concretizável no imediato. Na vida matrimonial, porque de pessoas se constitui, tudo é uma construção permanente. Os noivos hoje em dia não estão minimamente preparados para essa “espera”. É, também, missão do CPM concorrer para esse despertar. Como tem sido feita a receção dos Casais divorciados? Hoje em dia chegam-nos casais com imensas realidades partilhadas. Uma grande percentagem, para não arriscar dizer a maioria, chega ao CPM com uma caminhada conjunta que já pressupõe a vida em comum e, em alguns casos, a existência de filhos. Dentro desta realidade alguns tiveram já outras uniões civis, que terminaram pelo divórcio, indo celebrar, contudo, pela primeira vez o sacramento do matrimónio. A esses a receção é feita precisamente da mesma maneira que é feita aos outros, tendo em especial atenção a sua situação prévia. Posso testemunhar que no centro de CPM onde sou assistente já se convidaram alguns noivos a dar o seu testemunho de uniões civis que terminaram, partilhando estes, sobretudo, a falta de preparação para assumir o compromisso que tiveram, a dificuldade de adaptação à nova vida a dois, bem como uma certa incapacidade de ultrapassar as dificuldades. Que resultados se têm alcançado com o CPM? Os resultados plenos que se


Entrevista com... 11 | O Alforge | maio 2016

Continuação... têm alcançado com o CPM só Deus os conhecerá. A missão deste movimento não é substituir-se à consciência de cada um, mas concorrer para que, com os testemunhos dos casais pertencentes à equipa, os noivos descubram a beleza do Sacramento que vão celebrar, a exigência do projeto em que se lançam e da sua responsabilidade no mundo e na igreja. Penso que a isto o CPM tem sido fiel e a ressonância da esmagadora maioria dos noivos que por ele passam vai, também, nesse sentido. Tivemos, inclusive, dois casos, que eu conheça, de casais que, terminado o CPM, refletindo seriamente sobre o que de lá tinham recolhido, decidiram adiar o seu matrimónio. Por antagónico que pareça, nestes casos, o CPM cumpriu a sua missão, uma vez que foi auxílio no discernimento e “formador” de consciências!

Como pode a preparação para o Matrimónio ajudar na definição do estilo de vida das famílias atuais? Que estilo de vida preconiza o CPM? Em primeiro lugar é necessário ter presente que o CPM é um momento na vida dos noivos. Pode apenas, no tempo em que os noivos o frequentam, transmitir o testemunho dos casais que dele fazem parte, bem como o seu estilo de vida familiar, que, em maior razão é sempre sustentado pela fé, pela Palavra de Deus e pela comunidade. Depois é igualmente necessário perceber que é na comunidade paroquial, em última análise, que o testemunho de vida familiar deve ser transmitido e vivido, numa atenção permanente e especial aos casais novos. Que desafios para o CPM, no seguimento do Sínodo da Família? Os desafios para o CPM serão os mesmos que serão

colocados a toda a Igreja. A pastoral familiar, a par da formação da fé, deve ser, em sentido estrito, a grande preocupação da vida da Igreja pelo que tudo o que foi construído neste Sínodo será, seguramente, de uma importância redobrada para os centros de preparação do matrimónio. Neste momento não podemos antever que mudanças serão realizadas nos centros mas, seguramente, serão mais ao nível da forma do que do conteúdo. O que pode mudar com este Papa e com a perspetiva de a próxima Exortação Apostólica do Papa Francisco, sobre a preparação do Matrimónio? A grande mudança a realizar com este Papa será sempre, como já referi, na forma como o Evangelho, a evangelização, o acolhimento e a própria comunidade cristã são apresentadas e propostas ao mundo de hoje. Pessoalmente não creio que

se possam esperar grandes mudanças ao nível teológico ou doutrinal mas acredito que poderemos ter algumas surpresas no que ao nível da relação com a comunidade concerne. Quer seja na agilização dos processos de nulidade matrimonial, algo que já está em curso, quer no acolhimento a casais com situações ditas irregulares. O Evangelho é imutável mas a Igreja não e por conseguinte há sempre espaço para melhorar tudo aquilo que tenha a ver com ela e com o Povo que a constrói.

Ciclo de Conferências de Primavera 2016

De acordo com o programa pastoral diocesano vivido sob o lema «Celebrar com verdade e dignidade» e em

sintonia criativa com o Jubileu Extraordinário da Misericórdia (Dez 2015 – Nov 2016), as paróquias de S. Martinho – Póvoa Nova, Santa Marinha – Eirô, do arciprestado de Seia e as paróquias de Paços da Serra, Moimenta da Serra e Mangualde da Serra do arciprestado de Gouveia, promovem pelo segundo ano consecutivo um ciclo de conferências intituladas «Conferências de Primavera». As referidas conferências, abertas à participação de todos os que em cada uma

das paróquias formam a unidade pastoral paroquial, decorreram de acordo com o programa que se segue: «A COMPAIXÃO DE UM ESTRANGEIRO», por D. Manuel Felício, bispo da Guarda, em Paços da Serra, no dia 1 de abril às 21:30. «A MISERICÓRDIA E A JUSTIÇA», por Pe. Vasco Pinto Magalhães SJ, diretor do Centro Universitário da Companhia de Jesus no Porto, em Santa Marinha, dia 8 de abril às 21:00. «FRANCISCO, PAPA DA MISERICÓRDIA», por Pe. Manuel Matos, Vigário Geral

da Diocese da Guarda, em São Martinho, dia 15 de abril às 21:30. «O PERDÃO E A UNÇÃO, SACRAMENTOS DA MISERICÓRDIA», por Pe. José Dionísio, diretor do Secretariado da Liturgia da Guarda, em Mangualde da Serra, dia 22 de abril, às 21:30. «A MISERICÓRDIA DE DEUS NA MISSÃO, UM TESTEMUNHO» por D. Manuel dos Santos, bispo de São Tomé e Príncipe, em Moimenta da Serra, dia 29 de abril às 21:30.


Especial Família: Alegria do Amor 12 | O Alforge | maio 2016

A alegria do amor

Frei Bento Domingues, Op, (Basílio de Jesus Gonçalves Domingues), nasceu a 13 de Agosto de 1934, em Travassos (Vilar – Terras de Bouro). Entrou para o Noviciado na Ordem dos Pregadores (Dominicanos) em 1953. Estudou Filosofia e Teologia em Fátima, Salamanca, Roma e Toulouse. Tomou parte em várias iniciativas de carácter cívico: no lançamento da publicação clandestina, Direito à Informação; pertenceu ao secretariado da Comissão Nacional de Socorro aos presos políticos, do Comité Português Pró-Amnistia Geral no Brasil; foi membro do Conselho Nacional de Imprensa. É membro do Fórum Abraâmico.

Triste seria uma pastoral das falências sem apontar os caminhos para a alegria do amor sem a qual não se pode falar de família.

1. A partir do século XIX, pode-se falar de uma crescente inflação de documentos pontifícios sobre tudo e mais alguma coisa, mas, como já foi observado muitas vezes, ainda não apareceu nenhum sobre o humor. A queixa é muito mais antiga. Humberto Eco, no seu romance O Nome da Rosa, refere um debate monacal para responder a uma pergunta transcendente: Jesus riu ou não? Para o grande historiador, Jacques Le Goff, esse foi um tema constante da Idade Média. Se alguém tentasse fazer uma enciclopédia do humor e do riso provocados pelas figuras da Bíblia, dos evangelhos, da história da Igreja, dos monges do Deserto, da prática dos sacramentos, da vida dos santos, das devoções, do céu, do inferno e do purgatório, nos diferentes países e continentes, teria matéria hilariante para muitas vidas. Pode ser intermitente, mas na área católica, nunca se esgota. Depois do sisudo catolicismo da primeira parte do século XX, foi eleito papa, João XXIII. Passado pouco tempo, perguntaram-lhe: quantas pessoas encontrou a trabalhar no Vaticano? – Mais ou menos metade. Quando é que decidiu convocar o Concílio? – Quando estava a fazer a barba. Os seus Fioretti correram o mundo. Ao angustiado Paulo VI, sucedeu João Paulo I, o abreviado Papa do sorriso. Esquecendo-se de que estava no Vaticano, continuou com o seu costume de chamar a Deus Pai e Mãe e de manifestar,

com bonomia, a vontade de varrer a cúria romana. Não teve sorte. Veio um longo inverno e depois precipitou-se a primavera com um argentino, chamado Mário Bergoglio que, sendo jesuíta, se fez franciscano radical, Francisco. Parece habitado por uma paixão estranha que mistura indignação e misericórdia, bom humor e gestos proféticos, reforma da cúria vaticana e deslocação às periferias mais abandonadas. Desde a primeira Exortação Apostólica até à mais recente, tudo é feito por causa da alegria [1]. 2. A Exortação A Alegria do Amor, sobre a família – uma análise, uma autocrítica e uma proposta – não é de alguém que se julga infalível a definir doutrina ou a ditar leis irreformáveis. Procura que a Igreja, na sua intervenção pastoral, abandone o inveterado mau gosto de lamentar e condenar. No capítulo II, ao apresentar a realidade atual e os desafios que ela representa para a vida familiar, destaca, por um lado, a tentação de querer resolver os problemas atuais, reproduzindo receitas gastas. Nem a sociedade em que vivemos, nem aquela para onde caminhamos, permitem a sobrevivência indiscriminada de formas e modelos do passado [2]. Por outro lado, também não se pode cair na ideia de que tudo é descartável, cada um usa e deita fora, gasta e rompe, aproveita e espreme enquanto serve e, depois… adeus. Entretanto, o Papa não se limita a mostrar que esses

são becos sem saída. Adverte, no entanto, que devemos ser humildes e realistas para reconhecer que, às vezes, a nossa maneira de apresentar as convicções cristãs e a forma como tratamos as pessoas ajudaram a provocar aquilo de que hoje nos lamentamos, pelo que nos convém uma salutar reação de autocrítica. Além disso, muitas vezes apresentamos de tal maneira o matrimónio que o seu fim unitivo, o convite a crescer no amor e o ideal de ajuda mútua ficaram ofuscados por uma ênfase, quase exclusiva, no dever da procriação. Bergoglio lembra que não fizemos o acompanhamento dos jovens casais nos primeiros anos, com propostas adaptadas aos seus horários, às suas linguagens, às suas preocupações mais concretas. Outras vezes, apresentamos um ideal teológico do matrimónio demasiado abstrato, construído quase artificialmente, distante da situação concreta e das possibilidades efetivas das famílias tais como são. Esta excessiva idealização, sobretudo quando não despertámos a confiança na graça, levou a que o matrimónio deixasse de ser desejável e atraente; muito pelo contrário [3]. 3. Na ação pastoral, custanos deixar espaço à consciência dos fiéis, que são capazes de realizar o seu próprio discernimento, mesmo em situações onde se rompem todos os esquemas. Somos chamados a formar as consciências, não a substituí-las.


Especial Família: Alegria do Amor 13 | O Alforge | maio 2016

A excecionalidade da ternura

Cristina Sá Carvalho é psicóloga de formação, professora universitária e diretora do Departamento Nacional de Catequese.

Como facilmente se repara, a exortação apostólica que o Papa Francisco datou de 19 de março é um documento extenso para o qual o próprio autor sugere uma leitura dinâmica, ancorada nas preferências e necessidades do leitor. E também uma leitura empática, baseada na capacidade de este último se colocar no ponto de vista de quem escreve e, sobretudo, atendendo ao seu carácter pastoral, daqueles muitos e variados de quem fala. Exige, pelo menos por isso, um esforço de diálogo com os pontos de vista sugeridos e as propostas veiculadas que não deve ser superficial nem é imediato. Assim, limitar-me-ei a sublinhar, imperfeitamente, algumas questões estruturais vertidas nas primeiras páginas e a enumerar os temas das seguintes que me parecem mais relevantes ou, pelo

(*)

menos, respondem melhor às minhas preocupações. Faço-o em homenagem ao texto mas também porque me parece que deve e pode ser lido, com grande proveito, por qualquer pessoa de boa vontade, sobretudo se exercer funções de responsabilidade em algum sector relevante da sociedade moderna. Não dará o seu tempo por perdido. O documento começa por referir o desejo de família que os jovens continuam a manifestar e propõe uma análise honesta, realista e criativa da sua problemática, uma oportunidade, com o intuito de aumentar a clareza da discussão em seu torno. Recorrendo de novo ao modelo do poliedro, já antes utilizado pelo Papa para ilustrar a sua ideia, positiva, de globalização, refere-se que há maneiras diversas de interpretar alguns aspetos da doutrina e que as soluções devem inculturar-se na tradição local. Pedindo misericórdia e proximidade para as famílias onde o projeto se realiza menos perfeitamente, define a família como o espaço essencial do amor forte e dos valores de generosidade, compromisso, fidelidade e paciência, insubstituível no seu papel educativo e na transmissão da fé. Longe está, pois, o comunitarismo das esquerdas e o individualismo das direitas. Mais adiante, a família (apreciei que ainda fosse designada pelo antigo termo de Igreja doméstica) é referida pela presença do sofrimento, da ansiedade e da tensão, mas também da

ternura, da coragem e da serenidade. E, entre as misérias e os maiores bens da vida familiar, mencionase, com destaque, a necessidade de a Igreja não continuar a ler a família através de teses abstratas, a partir de um ideal teológico distante das possibilidades das pessoas. O texto indica claramente a exigência de uma pastoral positiva, de humildade e realismo: «ideal exigente e proximidade», família e Igreja companheiras de viagem. Naturalmente, os primeiros capítulos também descrevem bem as ameaças a que a família está atualmente sujeita, vista a partir de uma cultura do provisório, do descartável, da afetividade infantil e narcisista, mas também aquela que resulta das representações sobre a natalidade, o inverno demográfico, as migrações, a miséria, o desemprego e a precariedade, a tecnologização das relações, o consumo das drogas, os idosos sem proteção, o desamparo no esforço excecional de educar os filhos portadores de deficiência. Uma decadência cultural que não promove o amor e a doação, mas contribui para o enfraquecimento da família, sociedade natural, o que não é um bem para a sociedade, para o futuro do mundo e da Igreja. Também não é irrelevante que o Papa volte a referir que é preciso defender os ainda pouco firmes direitos das mulheres e que não foi a emancipação destas que conduziu aos problemas da família: «é falso!».

Gostaria de sublinhar a forma clara, acessível e respeitosa como são tratadas questões sensíveis como a ideologia de género, a homossexualidade, as crises familiares e o divórcio, mas também toda a explicação sobre o sacramento do matrimónio e o amor. Este último é explanado a partir do tesouro teológico, religioso e literário que é a lindíssima Carta de Paulo aos Coríntios, num conjunto de parágrafos cheios de sensibilidade, sabedoria e aconselhamento saudável e oportuno sobre o casal e a sua vida familiar. Como referi anteriormente, há um conjunto de temas desenvolvidos nesta exortação pós-sinodal que me é caro. Destacaria o reforço da educação dos filhos, com a necessidade de acompanhar os casais e as famílias, a importância da catequese familiar, a educação para a parentalidade, o sim à educação da sexualidade (num modelo de educação para o amor) e a educação ética e religiosa de cada um, numa lógica de integração e aceitação da fragilidade, que é aquilo que cada um de nós vive na sua própria família. Percebemos que o Papa gosta de nós… e que connosco partilha um texto cheio da inteligência e do realismo que nascem da fé vivida com ternura, capaz de nos oferecer uma esperança responsabilizada e responsabilizante em tempos históricos conturbados. A meu ver, é esse o segredo da sua distinta excecionalidade. (*)

www.rr.pt


Notícias da nossa Ter ra 14 | O Alforge | maio 2016

Homenagem a D. João Saraiva – Bispo de Seia

No passado dia 03 de abril, a Misericórdia de Seia em estreita colaboração com a Diocese da Guarda e a Paróquia de Seia, dinamizou um conjunto de atividades que homenagearam D. João António da Silva Saraiva, bispo natural de Seia, por circunstância dos 40 anos do seu súbito falecimento. Foi celebrada uma missa na Igreja Matriz de Seia presidida pelo Pe. Joaquim Teixeira, em concelebração com o Pe. Virgílio Mendes

Arderius, que fez questão de marcar presença nesta homenagem, pela sua ligação e convivência com o homenageado, no Seminário da Guarda e no Grupo de Escuteiros. D. Manuel Felício, Bispo da Guarda, por questões de agenda não conseguiu estar presente, ainda assim remeteu uma mensagem lida na eucaristia, onde relembrou a ação assistencial e devocional desta personalidade diocesana.

O programa da homenagem culminou no Espaço Museológico da Misericórdia de Seia, com a abertura da exposição: D. João Saraiva – Um Bispo de Seia. Com o apoio da Família Saraiva foi possível criar a narrativa de vida, e ressalvar as principais efemérides desta personalidade com forte vínculo com a Santa Sé. A exposição que conta com vários objetos que pertenceram a D. João Saraiva, e enuncia algumas curiosidades sobre o que é a função episcopal, irá estar presente até 18 de maio. D. João da Silva Saraiva nasceu em Seia, em 20 de setembro de 1923 e morreu subitamente na Figueira da Foz, no decurso de uma visita pastoral a 03 de abril de 1976. Frequentou os Seminários da Guarda e do Fundão e a Universidade Gregoriana de Roma, onde se licenciou em Filosofia. Foi

ordenado sacerdote a 28 de julho de 1946, na Basílica dos Santos Apóstolos, em Roma. Foi nomeado pela Santa Sé a desempenhar funções de Bispo Auxiliar de Évora, lugar que nunca chegou a tomar pose, tendo sido nomeado bispo do Funchal. Em agosto de 1972 foi nomeado Bispo de Coimbra. Participou nas Sessões do Concílio do Vaticano II, tendo também sido nomeado por Paulo VI para a entrega da Rosa de Ouro, ao Santuário de Fátima em 1965. Segundo iniciativa da Loja CTT de Seia, foi lançada uma edição limitada de um selo, da rubrica Meuselo, direcionado para colecionadores. Este elemento de filatelia poderá ser adquirido nos serviços Administrativos Centrais da Misericórdia de Seia, cujas receitas revertem a favor desta instituição.

Visita Pascal na paróquia de Santa Marinha No dia 28 de março, segunda-feira da Oitava da Páscoa, realizou-se na paróquia de Santa Marinha, a Visita Pascal, tradição fortemente enraizada na cultura cristã desta comunidade. A visita pascal, como anúncio festivo da Ressurreição de Jesus, iniciou-se pela manhã com a celebração da eucaristia, sinal da presença de Jesus vivo entre todos. Na circunstância atual, dada a limitação e escassez de sacerdotes, a visita pascal foi presidida por dois

seminaristas. Concretamente, dois seminaristas da União de São João Baptista, em Gouveia, a concretizarem os seus estudos académicos na Faculdade de Teologia da Universidade Católica em Lisboa. Em cada ano esta atividade eclesial interpela as pessoas, congrega as famílias e gera um clima de são convívio do gosto do povo e a saber a Ressurreição!

Atuação do grupo «Jovem Levanta-te» em Santa Marinha O grupo «Jovem Levanta-te» da Quinta da Princesa, paróquia da Amora, diocese de Setúbal, que participou no programa ‘Got Talent Portugal’ da

RTP1 com uma encenação de teatro negro onde é o nome de Jesus que brilha e assume o protagonismo fez uma atuação na paróquia de Santa Marinha, no dia 2 de abril. O grupo «Jovem Levantate» nasceu em 2008, e reúne os seus cerca de 25 elementos aos Domingos à tarde.


Notícias da nossa Ter ra 15| O Alforge | maio 2016

Procissão dos Passos - Misericórdia de Seia De acordo com as obrigações estatutárias e a sua missão social, moral e cultural, a Misericórdia de Seia organizou diversas atividades que decorreram no período final da Quaresma, algumas inseridas no Ano Jubilar da Misericórdia. Desde tempos que ultrapassam, em muito, a memória dos vivos, era hábito a Misericórdia organizar duas procissões no período da Quaresma. Uma no terceiro domingo da Quaresma ou dos Passos, outra a do Enterro do Senhor de Sexta Feira Santa. Apenas esta chegou a nós. Nos séculos anteriores também era organizada a de Quinta Feira Santa. Em Sexta-Feira Santa, pelas 21 horas e 30 minutos, com partida e chegada da Igreja da Misericórdia, centenas de católicos escutaram o sermão do Rev. Padre Teixeira, que presidiu

a toda a cerimónia, alusivo à Paixão e Morte de Jesus Cristo. Seguiu-se o percurso habitual pelas ruas da cidade, na sombra da noite e ao som da Banda Filarmónica de Moimenta da Serra. Viveram-se momentos de profunda concentração e interiorização ao ser relembrado o martírio e a morte de Jesus Cristo. Nesta solene procissão, incorporaram-se as autoridades civis (Câmara, seu Presidente e Vereadores), elementos da União das Freguesias e diversas entidades, desde Escuteiros, Orfeão, Rancho e Bombeiros. A autoridade G.N.R: regulamentou o trânsito e fez a respetiva segurança. No sábado, dia 26, pelas 11:00 horas, o Núcleo Museológico da Misericórdia assinalou o dia dos Centros Históricos. Na cidade de

Seia essa efeméride consistiu em percorrer os pontos da Via Sacra que, noutras épocas, era realizada pelas ruas do Centro Histórico da cidade durante a Quaresma. No sábado de Ramos, na ERPI, o assistente religioso, Padre António Carlos, celebrou missa pelas 15:00 horas na Capela antecedida de bênção dos ramos, que os utentes, idosos, funcionários e familiares empunhavam no trajeto da pequena procissão entre o

átrio e o lugar do culto ou capela. Os residentes sentiram momentos de felicidade com a bênção dos ramos e o cortejo, recordando passagens das suas vivências nas aldeias de onde vieram. A Semana Santa marcou muito, especialmente os idosos. Transporta-os às épocas de maior simbolismo católico que muitos vivem e recordam com muita fé.

Amenta das Almas – Várzea de Meruge A “Amenta das Almas" é uma tradição muito antiga, perdendo-se mesmo na noite dos tempos, e que se vem mantendo de geração em geração. Em Várzea de Meruge, já não se fazia há 60 anos, mas com muito trabalho e esforço, conseguimos levar em frente esta bela tradição. Ao longo de algum tempo e de muita insistência, recuperou-se a tradição de Amenta das Almas em Várzea de Meruge. Este saber devemo-lo a três senhoras das terras de

Várzea de Meruge, que nos transmitiram o seu saber, vindo das nossas gentes e as suas vivências da Quaresma. Este ritual religioso tem lugar na noite de sexta-feira ao longo de toda a Quaresma, a partir das zero horas. Antes dessa hora os grupos começam por se reunir no largo da Igreja. Enquanto um grupo sobe para a torre da Igreja, o outro grupo vai para um local, chamado o “Quintal do Moira” e a “Carvalha do Babô” em lugares mais altos,

para que possibilite ver a torre da igreja, para assim, travarem um "duelo" de cantos, onde evocam e louvam a paixão e morte de Jesus e a salvação da Almas. No principio e fim do cântico toca-se o sino três vezes e reza-se pelas Almas do Purgatório. Assim, no silêncio da noite as vozes dormentes e calmas ressoam pela nossa Aldeia. Passando a citar a primeira e última quadra das catorze em que consiste o cântico da Amenta das Almas:

“À porta das Almas Santas Bate Deus a toda a hora Almas Santas lhe respondem Oh Meu Deus, que quereis agora” “Rezemos um Pai Nosso E uma Avé Maria Em louvor do Anjo da Guarda E da Senhora da Guia”

Ricardo Garcia


ÚLTIMA PÁGINA|O ALFORGE | MAIO 2016 Este número do Boletim Informativo O Alforge, dedicamo-lo à Família, com a feliz coincidência de ter sido publicada, pelo Papa Francisco, a Exortação Apostólica - A Alegria do Amor! Aproveitando esta oportunidade, fazemos a seguinte sugestão de leitura para este mês, dos seguintes livros, que podem ser adquiridos na Galeria Paz de Espírito.

A paz é um bem que supera qualquer barreira, porque é um bem de toda a humanidade. Jesus não é somente um amigo. É um mestre de verdade e de vida, que revela o caminho para alcançar a felicidade. Um cristão nunca pode andar chateado nem triste. Quem ama Cristo é uma pessoa cheia de alegria e que irradia alegria. Adorar a Deus significa aprender a estar com Ele, despojarmo-nos dos nossos ídolos escondidos e colocar o Senhor no centro da nossa vida. Papa Francisco


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