TGI II - IAU USP - Interlocus ou tudo que há entre dois atos

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iau.usp trabalho de graduação integrado

INTER_ LOCUS

ou tudo que há entre dois atos

reflexões sobre entre-lugares na cidade de limeira

JUNHO 2017 PAUL NEWMAN DOS SANTOS



INTER_ LOCUS

ou tudo que hรก entre dois atos

membros da comissรฃo de acompanhamento permanente

David Moreno Sperling Joubert Jose Lancha Lucia Zanin Shimbo Luciana Bongiovanni M. Schenk coordenador de grupo temรกtico

Ruy Sardinha Lopes

banca examinadora tgi ii

Paul Newman dos Santos

Lucia Zanin Shimbo

Ruy Sardinha Lopes


fotomontagem pelo autor


RESUMO O estado de desenvolvimento urbano da cidade contemporânea se pauta em uma lógica de transformações contínuas e tem como resultado a intensa modificação da paisagem urbana em prol a consolidação de um espaço urbano fragmentado. As sobreposições de modificações e ajustes do espaço da cidade para responder a demandas de ordem momentânea alimenta o fenômeno de geração de espaços entre. Investigado e nomeado diferentemente por vários autores, esses espaços respondem a uma lógica intersticial e são elementos residuais que existem no entre-lugares, na pausa, no caminho. Muitos se propõem a compreender os processos que se estabelecem nessas áreas urbanas para a retomar esses espaços para a paisagem urbano. De modo que, o princípio a ser trabalhado nesse Trabalho de Graduação Integrado gira em torno de adentrar a multiplicidade desses espaços intersticiais (ou entre-lugares) e se trata de debater o ato de projeto e as possibilidades que esses espaços urbanos dispõe enquanto potencias de serem condensadores sociais. Para isso, escolhe-se um viaduto na cidade de Limeira, interior de São Paulo, para fazer esse ensaio. A proposta de intervenções tem a intenção para além de criar um espaço funcional, criar espacialidades que possibilitem a convivência pública coletiva. De modo que, o projeto cria diferentes áreas que podem ser utilizadas oras com a função designada, oras com uma liberdade de apropriação. Assim, se trata de entender o espaço intersticial para além de um simples resultado do relação de partes e entender que esse elemento, esse hiato urbano, é resultado de uma complexidade de relações que se estabelecem nas fronteiras de espaços e lugares. entre-lugares; espaços intersticiais; baixio de viaduto; viaduto; Limeira PALAVRAS CHAVES:



Nesse momento de fechamento de um ciclo, dedico e agradeço à: Minha família, pelo apoio e pela confiança colocadas em mim; Minha turma 011, por ser a melhor; Simone e Castral, por serem mentores bases na minha formação; Lúcia e Ruy, pelo direcionamento ao longo do ano; Victor e Willian, pelo companheirismo; Mateus, pela amizade única; Renan, pelo apoio e carinho. Aos amigos que fizeram parte desses anos de curso e puderam construir comigo memórias e afetos que levarei ao longo da vida.



INTER_ LOCUS

ou tudo que há entre dois atos

Intelocus. Intermédio, Interstício e Interlúdio. Aquilo que está no

entre, que não está aqui nem lá, não é passado e também não é presente. Não deixou de ser momento anterior, mas não é momento que há de vir. Espaço que sonha com o quer ser, mas ainda não esqueceu do que já foi. É dois lugares ao mesmo tempo, mas também é nenhum. É pausa, espera, caminho. É sobra. Percurso, ligação e conquista. É nada e é registro de tudo. É silencio. É existência.


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

pri mei ro, uma breve inter locu ção

Acho prudente começar esse trabalho expondo a questões que levaram a nomeá-lo como “Interlocus ou tudo que há entre dois atos”. A ideia de trabalhar com o prefixo Inter e o termos Locus advém de um anseio de pensar conceitualmente a poética do projeto urbano para espaços residuais. Falar, então, de um elemento espacialmente Inter é expor uma vontade de encarar esses espaços não como sobras e tão pouco como novos lugares. Se trata de pensá-los como Intermédio, Interstício e Interlúdio. Entender o seu caráter de influências multiplas e seu potencial de estabelecer relações entre os lugares que o tange. O princípio a ser trabalhado nesse Trabalho de Graduação Integrado gira em torno de adentrar a multiplicidade do i


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{ parate 0 : intelocução }

que se nomeia como espaço intersticiais ou entre-lugares. Entretanto, para além de definir uma linha teórica e referencial, se trata de debater o ato de projeto e as possibilidades que esses espaços urbanos dispõe enquanto potencias de serem condensadores sociais. Para isso, escolhe-se um viaduto na cidade de Limeira, interior de São Paulo, para fazer esse ensaio. A hipótese de se trabalhar com um viaduto pauta no entendimento de que este objeto é, além de uma utilidade de mobilidade urbana, um grande condensador de fluxos e por consequência um condensador de encontros. Somando a essa característica, o fato do viaduto, um elemento de conexão, ser um gerador de espaços residuais (ou entre-lugares) e um silenciador de temporalidades e territórios. Assim, os espaços que se relacionam com ele demonstram ter uma possibilidade de intervenção para comentar a ideia do Inter (Intermédio, Interstício e Interlúdio). A proposta aqui é de criar uma intervenção que explore as possibilidades desse espaço como um entre-lugar, e que possa conter para além de uma função programática, imaginários de apropriação e de coletivização urbana. Ao adotar o termo Interlocus, se propõe pensar que este espaço com o projeto irá se reconfigurar, mas não a ponto de se consolidar como um lugar, tampouco ainda permanecer apensar como um entre-lugar. Irá ser uma Interlocução urbana. Um local de interação, que apesar de seus usos programáticos ainda se mantem como uma área de conexão, mas agora com um outro caráter, evidenciando tudo que há entre os dois atos urbanos que o viaduto interliga.


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02. 18. 26. 30. 48. 54. 84. 86.

rexlexões de uma mente citadina Arquitetura dos Entre-Lugares VIADUTOS COMo ENTRE-LUGAr um viaduto, uma cidade SOBRE proceSsos e ESCOLHAS interlocus por fim referências >>



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reflexões de uma mente citadina >>

É o ser humano que defini o que está fora. //

Dentro do plano teórico, esse trabalho se contextualiza em um debate de tentar entender os princípios e diferenças entre o que é espaço e o que é lugar. Para além disso, perceber como esses termos se relacionam e como se derivam, por exemplo para a noção de espaços intersticiais, entre-lugares ou não-lugares. Sem tentar adentrar em uma discussão teórica e definir questões é valido situar onde conceitualmente esse trabalho se insere, ao menos, antes de expor a proposta de projeto. Assim, nesse capítulo trago um conjunto de debates que tratam da possível diferença entre espaço e lugar, da ideia de interstícios urbanos e por fim a uma discussão sobre invenção de lugares. Essa parte teórica será importante para entender os princípios do projeto e o próximo capítulo que trata de Arquitetura de Entre-Lugares.

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Em um primeiro momento para esse trabalho é importante discutir e reconhecer o registro da experiência urbana, tanto fenomenológica quanto materialmente e entender o caminhar enquanto exploração e formação do território humano.

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Montagem por super-estúdiuo

_ ESPAÇO COMO LUGAR


Francesco Careri (2002) aponta o andar como primeiro gesto de conquista e modificação do espaço feito pelo homem; dispõe que o transitar é meio de conquista e de exploração e, de certa forma, é a primeira tentativa desde o homem primitivo de registrar e perceber a paisagem e, portanto, é o início do pensar a cidade e a conquista de território.

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“O caminhar, mesmo não sendo a construção física de um espaço, implica uma transformação do lugar e dos seus significados. A presença física do homem num es-

paço não mapeado – e o variar das percepções que daí ele recebe ao atravessá-lo – é uma forma de transformação da paisagem que, embora não deixe sinais tangí-

veis, modifica culturalmente o significado do espaço, e, consequentemente, o espaço em si, transformando-o em lugar”. Careri (2002, p.51)

Sendo assim, o ato de se mover, com ou sem destino, marca uma importante ferramenta para o ser humano por potencializar a configuração e reconhecimento dos limites do seu próprio território. O ato de percorrer se coloca como elemento da arquitetura que modifica os significados do espaço atravessado e dá valor a paisagem viabilizando a construção imagética do caminhar como forma de invenção urbana. Portanto, introduz-se a essa perspectiva uma outra esfera de discussão pertinente ao trabalho: a dicotomia entre espaço e lugar. Careri ao colocar que o caminhar modifica culturalmente o sig-

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nificado do espaço, e, consequentemente, o espaço em si, transformando-o em lugar revela não apenas uma distinção entre os dois termos mas um ato de consequência, de efeito sequencial. A modificação simbólica do elemento espaço resulta numa conversão dele mesmo em um outro elemento (o lugar), sendo que essa modificação só é possível partindo de um ator externo, pois o espaço não mapeado se faz lugar a partir da presença física do homem. Longe de tentar reduzir essa dualidade a uma definição rasa, é interessante notar que essa afirmação coloca valores simbólicos distintos aos dois termos. O espaço existe independente da vontade e intenção humana, enquanto o lugar é possível como consequência de uma modificação humana. Entretanto, o que pode-se entender como espaço e como lugar? Se analisarmos a origem etimológica dos termos, como colocado por Reis-Alves, temos que a definição para o termo espaço (do latim spătĭum) é a “distância entre dois pontos, ou a área ou o volume entre limites determinados” enquanto o termo lugar (do latim locālis, de locus) é o “espaço ocupado, localidade, cargo, posição”. Logo, o espaço ganha significado em uma razão puramente espacial, enquanto o lugar, ao se colocar como espaço ocupado, se mostra como um elemento dentro da própria noção de espaço e para além do mesmo; a ideia de ocupar acrescenta uma influência simbólica ou física da ação humana de habitar. A ideia de lugar como um espaço ocupado (ou habitado) expõe uma possibilidade de entender a noção de lugar como um espaço dotado de um certo valor. O ato de habitar está intrinsecamente


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relacionado à ação de pertencer e de reconhecer em um dado limite seu território simbólico (mesmo que momentaneamente). O lugar se coloca, então, como consequência de uma conduta que gera uma transmutação e, assim, “o espaço transforma-se em lugar à medida que adquire definição e significado” (Tuan apud. Reis-Alves, 2007). Tal debate, naturalmente divergente, tem como conclusão que o lugar é o espaço dotado de valor pelo homem, e o primeiro está contemplado na existência do segundo. O lugar está ligado a uma noção relativa de temporalidade específica da cultura e da reminiscência humana, à medida que o espaço não se liga necessariamente ao tempo ou a presença física e/ou simbólica da experiência humana. Dessa forma, para continuar a discussão, propõe-se a definição de Norberg-Schulz que diz: “o lugar é a concreta manifestação do habitar humano” (Norberg-Schulz apud. Reis-Alves, 2007). Ao adotar essa definição, vale salientar que não se coloca espaço e lugar como elementos opostos em uma definição, como se lugar fossem vinculados apenas à presença do homem, enquanto o espaço, à sua ausência. Essa definição estabelece uma relação de consequência anteriormente citada: o espaço se dota de valor e se transforma. Consequentemente, qual seria o avesso do lugar? A ideia de um espaço que será um “não lugar” é explorado por diferentes autores mas encontra em Marc Augé a sua definição mais recorrente. Ao apontarmos o lugar como o espaço dotado de valor simbólico, temos no seu inverso o espaço onde se faz negação dessa valoração. Augé traça um conjunto de discussões

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que irão formar a ideia de um espaço que, apesar da presença do homem, trabalha em uma lógica de negar a influência cultural e transformadora citada por Careri; serão espaços onde a noção de pertencimento local e histórico não existem e se pautam em uma neutralidade existencial. A virtualidade do não-lugar traçada por Augé se diz do “espaço dos outros sem a presença dos outros, o espaço constituído em espectáculo” (Augé, 1994b, p. 167); ou seja, são os espaços não identitários, não históricos e não relacionais, são os locais vinculados a uma relação contratual de consumo onde “prevalece a liberdade (indivíduo) sobre o sentido (sociedade)” (Sá, 2014, p. 215). Tratam-se então de espaços comerciais, infra estruturais ou de grande fluxo onde as funções se sobrepõem e não se estabelecem em um vínculo simbólico; é o espaço que poderá vir a ser; do que ainda não é, do que, um dia, talvez terá lugar (Augé apud. Sá, 2014, p. 215). Portanto, pode se notar o carácter instável desse universo urbano que é o não-lugar do que, um dia, talvez, terá lugar ou que ainda não é. Implica numa incerteza que concretiza uma ausência de temporalidade, ausência de uma relação ou intenção, digamos programática ou simbólica; vai para além de uma noção, por exemplo, da ausência de uma presente, e caminha pela ausência de uma definição passada e futura. Ou seja, não é história, não marca rastros, não explicita a ausência ou presença de algo. Além do mais, vale ressaltar essa neutralidade temporal, justamente para entender essa dicotomia que existe entre lugar e não-lugar, e para além disso, entender a possibilidade de pensar o elemento


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urbano que é centro de debate desse trabalho. De volta novamente a Careri, o autor constrói uma narrativa onde mais que lugares de início e destino, o caminho é que tem potencial de transformação da paisagem revelando, dessa forma, que os pontos de partida e de chegada têm um interesse relativo, uma vez que o espaço do ir é onde se encontra um potencial de reconhecimento simbólico. Tendo isso em mente e traçando um paralelo com as definições aqui adotadas como discurso, é interessante notar que o espaço do ir de Careri se coloca em uma categoria distinta das mencionadas aqui a priori, está além de um espaço com ou sem identidade simbólica, não é a concreta manifestação do habitar humano, tão pouco a consolidação de um espaço constituído em espectáculo e consumo; é algo mais livre, que possui laços simbólicos mais efêmeros e abertos. Beira a uma terceira existência, que é tão instigante e incerta quanto estes termos tratados aqui: entre ou interstícios. Assim como a própria noção de lugar, a ideia de um espaço intersticial é amplamente debatida no meio teórico. O debate apresentado surge de uma tentativa de entender os resultados do processo de transformações múltiplas e aceleradas que constituem o espaço urbano contemporâneo. A ideia de interstício urbano provém da sobreposição de desenvolvimentos da cidade dentro da rápida absorção de novas lógicas e dinâmicas urbanas. Como consequência, temos a criação desses espaços que são vazios, são hiatos, espaços residuais, subutilizados, intersticiais. Após introduzida essa questão, vale reafirmar: o debate a respeito da noção do termo de espaço, lugar e suas correlações

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_ INSTERTÍCIOS urbanos Independente de definições e princípios teóricos, até este ponto tende-se a uma certa clareza que existe uma distinção entre a ideia de espaço e a ideia de lugar. Do mesmo modo que existe um terceiro elemento, que a priori foi aqui colocado somente como entre ou interstícios, que é o elemento que dá conta desse território, dessa paisagem, dessa espacialidade que não é um espaço consolidado programático, tampouco necessariamente é valorado simbolicamente para ser um lugar. É um elemento, como certa disposição de ter um estado instantâneo ou residual. Então, num primeiro momento, há de se dispor que existe um entendimento da existência de espaços que são resíduos de processos urbanos. Resíduos não no sentido apenas de lixo, mas no seu sentido mais amplo: de tudo aquilo que é esquecido, deixado de lado, o resto ou a espera. É aquilo que se constitui entre a construção e a reconstrução do território urbano. Ou seja, o espaço residual é um resultado de uma inerente sobreposição e possível hibridização de processos distintos.

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é divergente, e longe de reduzir a definiçòes limitantes, a lógica desse texto se trata de apontar caminhos para os quais esse trabalho se guiou e se pautou. Discorre, portanto, sobre construir um raciocínio básico para poder dialogar e debater questões mais pertinentes ao presente trabalho. Assim sendo, dadas as relações conceituais básicas, vale aprofundar-se nessa condição implícita da cidade contemporânea que são os elementos intersticiais.


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Atentando que o princípio da existência de um entre coisas, e mais especificamente a ideia de um entre urbano não se restringe ao âmbito contemporâneo. Já nos anos 60, por exemplo, Aldo Van Eyck, com seus projetos de parques infantis em espaços de meio de quadras, discute, senão outra coisa, a própria ideia de intervenção em espaços entre. De modo que, mesmo que o debate acerca da existência e da necessidade de uma resposta a ela é algo relativamente contemporâneo, a possibilidade de compreender a existência desse elemento intersticial não se limita ao hoje. Inclusive, a existência desses espaços é intrínseca à lógica de constituição da cidade contemporânea, pois é de se pensar que o estado de desenvolvimento urbano se pauta em uma lógica de transformações contínuas e tem como resultado a intensa modificação da paisagem urbana em prol a consolidação do espaço urbano. Se constituindo um campo de desordem, que vai caracterizar o desenvolvimento da cidade, como colocado por Fariña (2008), por uma entropia provisória. Assim, as sobreposições de modificações e ajustes do espaço da cidade para responder a demandas de ordem momentânea alimenta o fenômeno de geração de espaços entre, pois a existência de um vetor de modificação no desenvolvimento da cidade até um estado instantâneo ou de modificação permanente, tem como manifestação a consequente e profunda aparição de espaços residuais entre essas modificações. Considerando que por estar dentro uma lógica de simultaneidade de processos, esse espaço residual responde a uma lógica intersticial. Aqui vale tentar esclarecer, se existe essa resposta, o que se trata dizer interstícios Urbanos? O que são esse entre urbanos?

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A ideia de interstício está ligada a uma hipótese de influências duplas. É o elemento que há entre duas ou mais situações. De tal modo que o interstício é aquilo que assimila o valor mais puro do seu prefixo [inter]: é a relação, a conexão, aquilo que é e está em duas ou mais coisas ao mesmo tempo. A hipótese de entender e intervir nesses espaços intersticiais é uma grande fonte de investigação tanto teórica quanto projetual, a ponto que, a definição do que é esse elemento, inclusive qual o termo adequado, irá ser tão instável quanto a própria existência desses espaços. No campo da arquitetura, vários autores vão tratar desse elemento tanto conceitualmente quanto projetualmente. seja a ideia de Soleira utilizada por Hertzberger, In-Between do Aldo van Eyck, Espaço Basura de Rem Koolhaas, Terrain Vague de Solà Morales, ou até mesmo o Não-lugar de Augé; todos vão tratar de um princípio básico de uma espacialidade que se perfaz através de uma lógica intersticial, que é condição implícita na cidade contemporânea. Ou seja, Mesmo que cada um tenha suas especificidades teóricas, há o entendimento comum da existência desse elemento espacial resultante da problemática intersticial nos territórios gerados pela hibridização urbana. Farinã (2008) irá tratar dessa multiplicidade de abordagens no debates adotando inicialmente uma condição genérica para a ideia de interstício, dizendo que este elemento é, “desde a condição genérica e no campo da arquitetura , o efeito da diferença entre uma entidade territorial anterior (expirada ou obsoleta) e outra nova que a sobrepõe, resultando na hibridização material


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ou fenomenológica original de um determinado espaço” (Farinã, p.6, 2008). Esse definição abre para a possibilidade de entender que a princípio a ideia da existência de um interstício está relacionada a um questão de temporalidade, que se faz coerente ao retomar que o espaço entre é resultado da interação de processo urbanos distintos. Nesse ponto vale citar que que para além dessa definição Farinã (2008) vai estabelecer 3 categorias de interstícios que de certo modo se relacionam ao princípio de temporalidade; os interstícios instantâneos, que são espaços com caráter degradado e com uso subvertido; os interstícios históricos, que são relacionados a ideia de patrimônio sem degradação ou abandono; e, interstícios os compostos, que apresentam um hibridização entre o carácter do instantâneo e do histórico. A partir disso Farinã (2008) irá classificar as diferentes abordagens teóricas dentro dessas 3 categorias e traçar possíveis entendimento de agrupamento de diferentes autores que trabalham a ideia do entre. Contudo, o que é mais relevante nessa discussão proposta pelo autor é a relação estabelecida entre a ideia de um intercício urbano de carácter material, um outro de carácter fenomenológico, e por fim a hibridização desses dois termos. É interessante notar que mesmo que o interstício seja resultado unicamente de uma relação entre partes, há de se questionar se a origem desta partes tem um carácter material ou simbólico. Por exemplo o Terrain Vague de Sola Morales se establece como um espaço remanescente e materialmente abandonados, enquanto a Espaço Basura de Rem Koolhaas, trata da consequência das continuidade infraestrutura de mobilidade e a degradação

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e apropriação irregular desses espaços não pertencíveis (como pontes ou viadutos). Nessa abordagens fica claro que enquanto Sola Morales irá partir de um princípio primordialmente material, Rem Koolhaas irá traçar um panorama mais vinculado ato fenomenológico. Mesmo que um ou outro tenha de fato uma hibridização entre a noções materiais e simbólicas, é possível pensar em predominâncias. Assim, consequentemente entender que o espaço intersticial para além de um simples resultado do relação de partes se trata de entender que esse elemento, esse hiato urbano, é resultado de uma complexidade de relações que se estabelecem nas fronteiras de espaços e lugares. Nota-se que para esse trabalho, assim como não se trata de estabelecer definiçòes de espaço e lugar, também não se trata de definir o que é espaço-entre ou interstícios urbanos. Se trata de entender as possibilidade de abordagens desse elemento, como ele se consolida dentro do território e seus desdobramentos projetuais. Entretanto essa dualidade de material e simbólico abre a possibilidade de um entendimento mais direcionado. A de entender para além de de valor genérico do Interstício Urbano, entender o que é estar entre dois atos simbólicos, ou seja, o que é estar Entre-Lugares. A ideia de algo que está na fronteiras de elementos simbolicamente qualificados e pensar no que se constituem na inter-relação de dois espaços que se caracterizam pela a concreta manifestação do habitar humano. Esse recorte, mais que estabelecer uma definição de entre é pensar que “estar entre as coisas, entre lugares, diz respeito a não ser isso nem aquilo, um ou outro, mas a chance de vir a ser outro possibilitando justa-


mente por essa indefinição” (Guatelli, p14, 2012). Se diz de estar no entre-lugares é viver a imprevisibilidade; e viver a imprevisibilidade, é viver aquilo que chega sem ser anunciado.

fotografia de um projeto de aldo van eyck

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_ INTERLOCUS: INVENÇÃO DE LUGARES

Como já dito anteriormente, muitos são os termos utilizados para designar o espaço-entre. Espaço Basura, In Between, Entre-Lugares, Não-Lugar, Terrain Vague, cada um abordando a questão de uma perspectiva diferente. Contudo, essencialmente a questão explorada por esse trabalho pretende ir além de uma busca conceitual pela definição do que é tal espaço e refletir o

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que é intervir ele. Portanto, ao adotar o título Interlocus para esse trabalho, o que é posto em evidência é a tentativa de não se alinhar necessariamente a uma corrente teórica mas tentar trabalhar projetualmente no sentido mais amplo da noção do Interstício Urbano em seu sentido mais genérico adotado por Farinã; o resultado de dois processos distintos que se suceden. Logo, se trata de falar da invenção sobre esse espaço e não apenas da sua existência.; mais que falar do seu caráter de Entre, falar do seu aspecto de Inter. No entendimento de que a palavra entre, mesmo que etimologicamente possa ser relacionada com intra, apresentasse uma possibilidade de se ler num certo grau de neutralidade. Desta forma, como a ideia de uma soleira onde o entre é o que antecede e sucede ao mesmo tempo mas possui sua existência neutra sem a influência de ambas as partes que ele divide; não é casa, nem rua. A ideia do INTER, se relaciona com a ideia de interação, com um princípio predisposto que já se pressupor a influência de partes constituintes. O princípio da existência desse espaço intersticial, como explicitado por Guatelli é sua existência pautada na imprevisibilidade; sendo assim, é de se pensar nas múltiplas possibilidades que ele pode oferecer projetualmente. Entendo que não há funcionalidade em sentir o que há no entre-lugares, visto que é espaço que está na ausência e margem de elementos funcionais. Desta maneira, este trabalho parte do entendimento da necessidade subjetiva do habitar a cidade e de entender e pensar essa espacialidade que é gerada por meio da


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hibridização dos processos urbanos. A partir desse debate podemos pensar uma invenção de um novo lugar nessa interação, nesse vazio, nessa interlocução, atentando para que esse espaço tenha atributos suficientes para se constituir simbolicamente no território coletivo mas evidenciando a sua própria natureza, sem que ele mesmo possa se caracterizar como um novo lugar passível de gerar novos espaços residuais. Se trata, portanto, de pensar e questionar a dimensão na qual esse espaço se insere, que não é apenas uma simples pausa entre dois atos dentro da cidade mas sim um meio com espacialidade e eventos resultantes de nada mais do que a interação entre esses mesmos atos que este entre liga. Assim sendo, para além de entender a espacialidade do meio, esse trabalho propõe refletir sobre a invenção de algo que evidencia como um novo lugar mas ao mesmo tempo se mantenha no seu carácter de possibilidades e imprevisibilidade de um entre-lugar. No sentido de revelar a potencialidade coletiva e social que esses espaços possuem para que eles sejam mais do que um meio ou um entre-lugares, sejam interlocutores de duas partes, de duas ações, de dois cotidianos.; sejam frutos da interação de existências urbanas, sejam um terceiro elemento. Seja uma intersecção, um interlocus.

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fotomontagem pelo autor

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Arquitetura dos EntreLugares Projetar em uma área de interstício é entender a sua potência dentro do território e que o ato de projeto em uma área assim é, para além de uma resolução de um vazio urbano, conceitual e questionador. // >>

O título deste capítulo remete claramente ao livro de Igor Guatelli: Arquitetura dos Entre-lugares - Sobre a Importância do Trabalho Conceitual; nesse seu trabalho o autor irá apontar uma relação com os espaços-entre com uma linha pós estruturalista e irá fazer isso através de uma análise projetual de diferentes obras que trabalharam (mesmo que não conceitualmente) em espaços-entre. A análise do entendimento desses projetos é essencial para refletir sobre as diferentes posturas projetuais e compreender as possibilidades de atuação nestes mesmos espaços. Portanto, trago aqui um breve relato de três referências projetuais que apesar de não serem necessariamente em viadutos ativos trazem

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fonte http://vitruvius.com.br/

_ Academia Cora-Garrido Igor Guatelli Baixio do Viaduto do Café, 2007 São Paulo, SP - Brasil

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questões pertinentes a entender a noção do entre. As referências utilizadas, no caso, seriam: o projeto para a Academia Cora-Garrido, do próprio Guatelli para o Baixio do Viaduto do Café em São Paulo; o conjunto habitacional no viaduto Spittelau da Zaha Hadid em Vienna; e o Metropol Parasol de Jürgen Mayer H. Architects em Sevilha.


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Este projeto de nível conceitual foi desenvolvido para um Baixio de um viaduto localizado no centro de São Paulo em um local de disputa e de tensão territorial. parte de baixo do viaduto abriga uma academia de boxe em conjunto com alguns outras estruturas como áreas de estares e uma biblioteca, tudo feito por iniciativa de pessoas da região que viram no viaduto um potencial para abrigar essas atividades coletivas O projeto em questão propôs entender essa dinâmica do lugar e potencializar o espaço como suporte das situações já existentes. Sendo assim, antes de negar ou inventar novos usos, optou-se por criar um espaço de multiplicidades, combinando espaço de maior especificidades programáticas como bibliotecas, com espaços mais fluidos, como áreas livres. A partir desse projeto identificamos a intenção clara de enfatizar as dinâmicas existentes e potencializar o caráter simbólico que o lugar adotou na mentalidade da população e, mesmo assim, sem negar um viés invertido e propositivo de novas apreciações desse lugar. Por meio de uma articulação de um conjunto de propostas pontuais, se baseia numa lógica assistencialista que se concretiza mais com uma espacialidade de influência territorial na escala do baixo do que como um marco de influência propriamente urbana. A intervenção se concentra praticamente na área do baixio e entendo o viaduto como uma grande cobertura que contém todas as dinâmicas, buscando concretizar espaços flexíveis que abriguem a característica marcante de um entre-lugar: a possibilidade de imprevisibilidade.

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fonte http://vitruvius.com.br/

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_ Viaduto Spittelau Zaha Hadid Conjunto habitacional, 2005 Viena - Austria

Ao norte da cidade de Viena, o projeto foi implantado sobre uma estação de metrô e sobre um viaduto desativado, hoje utilizado como ciclovia. Inicialmente previsto para ser habitação social, destina-se hoje à habitação estudantil. Um projeto paradigmático, assim como muitos projetos de Zaha, procura na exploração formal o seu sentido mais notório . Ao propor blocos atrelados sobre a estrutura do viaduto, tenta criar uma relação de simbiose entre o existente e o proposto de tal forma que a mescla cria um impossibilidade de compreender a exis-

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tência de um sem a presença do outra. Quase como um conjunto de influências formais duplas, o projeto se associa espacialmente ao viaduto e revela uma intenção de se marcar com um “rastro” no território. Desta forma, revela sua presença sem minimizar o seu objeto de implantação (o viaduto); pelo contrário, de certa forma enfatiza a sua condição existencial de algo que um dia foi e permanece reminiscente. O projeto se estabelece dentro de uma lógica de entre-lugares marcando um jogo de temporalidades; se consolida dentro um espaço que é residual e condizente a uma situação de hibridização urbana, e mesmo que possua certas críticas ao seu exagero estético formal para uma habitação, acredito que há de se relevar o significado de estabelecer sobre esse objeto um programa de extrema permanência e relação simbólica que é a habitação. Vale ressaltar o peso conceitual que há em propor um conjunto de habitação que estabelece uma dinâmica de permanência e estritamente vinculado ao tempo individual, a um elemento marcante de fluxos coletivos e de temporalidades efêmeras. A proposta se estabelece dentro de um conflito que evidencia o caráter múltiplo e complexo de um espaço-entre.

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Projeto polêmico desde sua concepção, o Metropol na cidade de Sevilha recebe desde seu anúncio de construção críticas relacionadas a sua forma, custo e relação com a cidade. Se establece na Plaza de la Encarnación, dentro da trama do casco histórico da cidade, e tem como proposta formal o contraste de seu entorno. Para além disso, como espaço urbano propõe estabelecer-se a partir de uma série de atividades recreativas, com um museu, um mercado, uma praça elevada, bares e restaurantes, além de um mirante. Dentro do contexto contemporâneo, principalmente na produ-

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fonte: acervo do autor

Metropol Parasol Jürgen Mayer H. Architects Mirador e marquise, 2007 Sevilla, Andalucía, España


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ção arquitetônica espanhola, as críticas que esse projeto recebe são extremamente válidas, principalmente relacionadas à sua concepção formal e custo. Entretanto, uma vez construído, há de se analisar também as suas potencialidades urbanas.; ele se estabelece em um área que, apesar de já estar ligado historicamente a existência de um mercado, estava em um caráter residual de degradação. Ao analisar a presença do objeto hoje dentro do tecido urbano de Sevilha, é inegável a sua influência em revitalizar e criar uma nova centralidade cultural para a cidade. A criação de espaços culturais e comerciais e de livre apropriação foram essenciais para consolidação de um novo território central sevillano. Para além de ser um elefante branco no centro de uma cidade histórica, pela sua presença como marco da cidade, se fez possível a ampliação territorial da região central e a ligação de duas áreas coletivas da cidade, a Região da Catedral Giralda e a Alameda Hércules, ambas regiões de grande fluxo e permanência que antes territorialmente eram totalmente desvinculadas. Por meio dessa lógica, é totalmente possível entender o seu potencial como espaço intersticial, não apenas por se estabelecer entre duas áreas, mas dele em si se tornar um novo lugar, sem perder seu caráter de interlocução urbana. _ qual a relação OS 3? Apesar dos três projetos apresentados se colarem em maneiras distintas, acredito que o conjunto apresenta um ensaio das possibilidades de intervenção em espaços residuais (ou entre-lugares). Os projetos possuem abordagens diferentes e entendimentos

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{ parate 2 : arquitetura dos entre lugares }

diferentes do que é esse espaço intersticial, entretanto, é compreensível que os três apresentem princípios que se apropriam da ideia de espaços-entre. Mesmo que sejam propositivos quanto a sua forma ou uso, propiciam uma abertura de entendimento e apropriação do espaço. As propostas inventam novos lugares sem perder a oportunidade de marcar a potência desses espaços como espaços intersticiais. Assim sendo, mais do que remodelar e criar algo novo, eles propõem permanecer nesse momento entre até mesmo no seu carácter inventivo; esses projetos, mais do que referências formais, foram referências conceituais de modo de operação de projeto. As diferentes posturas de encarar esse objeto intersticial e a forma como relacionar ele com o meio urbano fez-se entender as possibilidades de como intervir nessas áreas e entender o potencial que há nessas áreas para projeto.


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

A ESCOLHA Da área: VIADUTOS COMo ENTRE-LUGARES a escolha se deu pela possibilidade de enfrentamento dessas relações de modo que elas contruibuissem para o fortalecimento do projeto como condesador de coletividades. // >>

A hipótese de trabalhar com com espaços residuais sempre foi algo latente dentro do meu processo de TGI. Mesmo antes de ter consolidado a minha base teórica e adentrar nessa discussão de Intertícios Urbanos ou Entre-Lugares, a ideia de trabalhar em espaços subutilizados da cidade foi algo intrigante. No processo de reconhecimento do território na busca de áreas possíveis para intervenção em conjunto com o processo de desenvolvimento teórico sobre Intertícios Urbanos, a imagem do viaduto aparece como um elemento latente na paisagem da

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{ parate 3 : A ESCOLHA da área: VIADUTOS COMo ENTRE-LUGARES }

cidade para ser trabalhada. O viaduto em si não necessarimante é um espaço residual, mas sempre é atribuido a ele um conjunto de espaços de sobra urbana que foram extremamente intrigantes para se fazer projeto. O viaduto, e seus espaços adjacentes, são grandes condesadores coletivos e carregam em si o potencial do encontro e da imprevisibilidade que há no espaço-entre. Ele em sua essência de objeto de conexão carrega um carácter nato intertísial que se pontencializa ao pensar nas áreas residuais adjacentes a ele. Um viaduto nada mais é do que um gesto humano de vontade ou necessidade de ligar dois lugares; é ligar o aqui e o lá, e nessa ligação ultrapassar uma fronteira ou expandir a paisagem e o território, é um elemento não apenas de transpor um limite, como um rio ou ferrovia mas também de conquista e de expansão de fluxo para apropriar-se de uma outra permanência. A questão é que com essa ligação algo fica no entre, abaixo dele, esquecido. As áreas e os ritmos que ficam sob o viaduto nesse gesto de conectar, se tornam residuais. O viaduto é então um criador de entre-lugares, ou seja, tudo o que há entre as duas partes que esse gesto conecta são espacialidades silenciadas e apagadas da vivência coletiva. A existência do viaduto em si é feita para ser esquecível e apagada. Espera-se dele ser apenas um elemento construído para atingir sua função máxima unicamente de conter um grande fluxo, de ser apenas um gargalo a ser utilizado por um segundo para conectar duas áreas de real valoração. Sendo assim, é sistêmico que


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

o viaduto, mesmo se tratando de uma estrutura robusta que interfere na paisagem e território da cidade, tem seu esvaziamento de potencial e extrema objetificação. Entretanto, como já colocado, é de se notar que para além dessa função específica, esse objeto tem um grande potencial de circulação de pessoas, de cruzamento e fluxo; ou seja, tem um grande potencial de coletivização. Atualmente, dentro da discussão do urbanismo e de projeto, as áreas do viaduto e adjacentes a ele são focos de interesse de revitalização, visto que num urbanismo contemporâneo que prioriza a concentração e compactação das cidades, os espaços residuais são de grande interesse para projeto. Desta maneira, para além de um processo de revitalização, o que é pensar um projeto em uma área dessas? O que é 44


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{ parate 3 : A ESCOLHA da área: VIADUTOS COMo ENTRE-LUGARES }

registro de um morador de rua que usou do viaduro como cobertura para montar o seu prórpio “lar/ fonte: folha de sao paulo

propor uma utilização para espaço que, a priori, é feito para não ter uma utilidade além da conexão? Escolher a área de alocação de um viaduto como objeto de projeto é inverter a lógica de apropriação da cidade; é convidar a pessoa que geralmente utiliza esse objeto por alguns segundos para permanecer um tempo a mais para poder perceber o potencial que os espaços atrelados a esse objeto têm no espaço urbano. Portanto, utilizar especificamente o baixio do viaduto para o projeto é tensionar esse fluxo horizontal tão direcionado e propor uma permanência coletiva, espaço que de certa maneira já é coletivizado. Portanto, a ideia é que os projetos desenvolvidos para esses lugares utilizem dessa lógica coletivizante para tensionar o espaço cotidiano, de modo que os projetos potencializem as dinâmicas públicas e que façam com que os espaços residuais atribuídos a esse elemento tão ordinário possam se tornar um novo lugar, passível de conter as relações e sociabilidade entre as pessoas. Num recorte mais espefícico, o viaduto escolhido para ser trabalhado na cidade de Limeira, dentre todos os outros analizados no território urbano, se mostrou o que teria a possibilidade mais interresante de se trabalhar a hipótese do viaduto e as área residuais como espaços interticiais de potência coletivizadora. Uma escolha arbitrária, mas direcionada, o viaduto em questão (que será apresentado no próximo capítulo) apresenta um conjunto de relações possíveis muito intrigantes para um ato de projeto, principalmente com os equipamentos próximos (rodoviárias e faculdades). Assim, a escolha se deu pela possibilidade de enfrentamento dessas relações de modo que elas contruibuissem para o fortalecimento do projeto como condesador de coletividades.


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

um viaduto uma cidade LIMEIRA (SP) a cidade o interior paulista ao passo que vivencia a vontade de ser urbano e se desenvolver rumo a uma metrópole, também vivencia dinâmicas próprias de uma cidade pequena.// >>

Ao se pensar em uma lógica de cidade onde as relações urbanas se dão a partir desse universo cotidiano, uma cidade de médio porte revela se pautar em uma existência conflituosa. O caminho ao trabalho, ao mercado, a ida a praça em uma cidade de médio porte fica o entre ser cidade pequena e metrópole, pois nessas cidades, o tempo das relações são marcados por um passado de vila atingido por um futuro metropolitano. A escolha pela cidade de Limeira no interior de São Paulo, se fez, então, por entender que, no contexto de uma cidade do interior paulista, o conflito da vivência cotidiana fica num entre-tempo. A dimensão de duas temporalidades coexistindo no espaço urbano faz como que seja um território interessante para comentar sobre as relações de entre-lugares e a configuração do espaço cotidiano da cidade por esse espaços. 46


47 { parate 2 : UM PÉ DE LARANJA CHAMADO LIMEIRA (SP) }

VIADUTO


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

UM RESUMO DA CIDADE DE LIMEIRA A cidade de Limeira, no interior de São Paulo surge da Vila Tatuibi e está localizada a 150 km da capital. Hoje faz parte da região metropolitana de Campinas e conta com aproximadamente 290 mil habitantes. Diferente do que é comum em cidade do interior paulista, o que é considerado centro da cidade hoje não é onde está a igreja central, mas a região de um eixo comercial onde está localizado uma grande praça, que é um dos maiores referenciais centrais do espaço urbano e é onde está o teatro municipal. A cidade conta com um Anel Viário, criado nos anos 1970, que junto com as duas rodoviárias, a municipal e a intermunicipal, localizada na região da cidade chamada baixo-centro, faz com que a cidade em geral seja bem articulada em termos de mobilidade e fluxo. Ademais, a cidade com 4 grandes áreas livres referenciais. O Parque da Cidade: localizada a leste e onde está vários equipamentos municipais como a biblioteca. O Parque do Lago, um parque de bairro. O Bosque, um antigo zoológico que hoje é um grande parque na área central. E, o Horto Florestal, uma região de uso público para atividades culturais e de Lazer.

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{ parate 4 : um viaduto uma cidade }

VIADUTO

Limeira: um município brasileiro situado no Centro-Leste do estado de São Paulo Área: 581 km²

POPU. 298.701 hab

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506 hab km²

FundA. 1826


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

ESQUIPAMENTOS E A ÁREA DE INTERVENÇÃO A cidade, mesmo com algumas deficiências em regiões mais recentemente constituídas no espaço urbano, conta com uma boa distribuição de equipamentos de saúde e ensino públicos. A parte cultural, em geral, está articulada com as áreas educacionais mas apresenta uma maior distribuição no eixo centro-leste, possuindo em concentração de atividades de convivência de bares e restaurantes concentradas em 4 ruas centrais. Os espaços culturais públicos são em geral assistencialistas, o

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que faz com que a parte cultural da cidade realmente coletivizada se concentre em áreas privadas na região central. Todavia, devido a recente articulação entre as rodoviárias municipal e intermunicipal criou-se na cidade um nó de mobilidade na região do baixo centro que faz uma articulação entre regiões que torna a dispersão dos equipamentos culturais algo não tão tumultuada.

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{ parate 4 : um viaduto uma cidade }

indicação de paradas e linhas de ônibus


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

VIADUTO

Localizado na região da rodoviária esse viaduto tem uma característica de estar localizado próximo ao baixo centro e está bem no meio de uma área de interesse de reforma urbana segundo o plano diretor. Apensar de não estar na área que mais possui vazios urbanos, está inserido dentro uma área onde há uma concentração de espaços residuais marcados pelas diferentes temporalidades do lugar 52


53 { parate 4 : um viaduto uma cidade }

VIADUTO


dois atos e tudo há entre eles

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

ÁREA PARA O PROJETO Localizado na região da rodoviária esse viaduto tem uma característica única de possuir uma saída anexada a ele que faz com que sua forma seja um Y ao invés de ser linear como os outros. Liga o baixo centro a uma grande área residencial e está ao lado de uma ruína da primeira indústria de Limeira, (Indústria Máquina). Ele também está em proximidade com o FAAL (Faculdade de Administração e Artes de Limeira) e um Senac. Além disso, cruza o Ribeirão Tatu e a linha férrea e está aos arredores do Bosque Municipal. Localizada a menos de 1 km do centro, hoje seu baixio é utilizado como estacionamento de ônibus pela empresa de mobilidade da cidade.

VIADUTO

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55 { parate 4 : um viaduto uma cidade }


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{ interlocus ou tudo que hรก entre dois atos {


57 { parate 4 : um viaduto uma cidade }


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

A

B

C

E D

ÁREAS RESÍDUAIS RELACIONADAS AO VIADUTO

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D

A

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E { parate 4 : um viaduto uma cidade }

C

B


{ interlocus ou tudo que hรก entre dois atos {

Ele possui proximidade com o centro e diferentes equipamentos, bem com proximidade com o bosque da cidade ed arodoviรกria. 60


{ parate 4 : um viaduto uma cidade }

Por sua priximidade com a Rodoviรกria e o terminal urbano, possuie um intenso fluxo de pedestres, carros e onibus, e se consolida com uma gargalo de fluxos 61


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

Nota-se que sua localização é no meio de um grande vazio urbano, quase não possuindo edificações a sua volta, tampouco verticalizações 62


{ parate 4 : um viaduto uma cidade }

Se acrescentarmos aos vazios, as áreas subutilizadas, ou de usos de curculação para veículos com ruas e estacionamentos, reforça-se seu caráter residual. 63


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

SOBRE proceSsos e ESCOLHAS O viaduto possui uma existência essencialmente horizontal, tendo 3 planos, o acima dele, a estrutura e o baixio. // >>

Antes de começar a área de projeto e ser propositivo, tentei entender um pouco o que é intervir em uma área de viaduto e para além disso, qual seria a minha postura de projeto tomada frente a esse objeto. Procurei sistematizar um conjunto de referências de intervenções em viadutos que foram feitas e perceber como esses projetos atuam frente a essa questão urbana. Vale ressaltar o potencial que esses projetos de requalificação atingem ao propor espaços coletivos que fazem do viaduto um marco territorial, atribuindo a ele usos que envolvem questões de cultura, esporte e lazer, utilizam a estrutura do viaduto, como marquise, cobertura e estar. Dentro dos projetos que pude observar, o viaduto sempre surge sob uma lógica de sistema, onde a intervenção dele se estrutura

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{ parate5 : PROPOSTA }

junto a um grupo de ações projetuais. E nesse ponto podemos dizer, a grosso modo, que surgem dois grandes grupos de atuação de projeto: um que irá encarar o viaduto como potencial de estrutura e propor ações que usem-no como suporte de um elemento construído e um outro que terá a proposta de projeto mais vinculada às áreas próximas ao viaduto do que sobre o próprio. A partir disso, antes de melhor refletir qual será minha postura projetual é importante definir qual é o meu entendimento do que é um viaduto e quais elementos que desejo considerar no ato da proposta. O viaduto, para além de um elemento de ligação é essencialmente uma cobertura com uma estrutura robusta, ele propicia a criação de uma ambiência coberta que pode se relacionar com áreas residuais do seu entorno; possui uma existência essencialmente horizontal, tendo 3 planos, um primeiro é acima dele onde se condensa o fluxo, um segundo que é a própria estrutura e um terceiro que é a área de baixio, que geralmente é a área mais residual. Para melhor entender tal dinâmica entre planos e pensar nas minhas possibilidades de ações tanto formais quanto espaciais, propus realizar uma série de experimentos em modelos tridimensionais para tentar afinar as minhas possibilidades. A princípio, parti de um modelo genérico do que é um viaduto, ou seja, um plano simples que liga dois lugares; em seguida , comecei a investigar como se dariam essas relações com materiais diferentes, com planos, verticalização e outras possibilidades. Por meio desse, processo pude tensionar o que imagino como ato de projeto, logo, se iria intervir somente embaixo do viaduto ou tam-


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maquetes de estudo para tentar entender as posturas e dinâmicas de projeto para um viaduto

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

bém em cima, se iria verticalizar, qual a relação de um volume construído ao lado, embaixo e em cima do viaduto, se iria utilizar planos, blocos, se iria ser próximo ou distante dos limites do viaduto. Por fim , nesse processo de trabalhar com o modelo pude encarar diferentes abordagens e pude refinar o que julgo por interessante ou não para minha ação de projeto. A primeira questão definida é que mais do que usar o viaduto em si como ator de projeto se trata de entender as espacialidades que são geradas a partir dele. Dessa forma, o conjunto de gestos projetuais, antes de evidenciar a magnitude do objeto em si, deveria potencializar as áreas residuais relacionadas a ele. Segunda questão é que achei pertinente evidenciar a característica horizontal bilateral do viaduto, portanto, nos elementos muito verticalizados ou que tenham formalmente um peso muito forte e que desalinhe essa bilateralidade deveriam ser evitados. Terceira questão, como o princípio de projeto parte de entender esse espaço silenciado sob o viaduto e sua relação com o cotidiano das pessoas que circulam sobre ele, a proposta deveria centrar na área embaixo do viaduto, tentando não descaracterizar seu uso no seu primeiro plano, visto que isso é interessante para manter a noção de conflito. E, por fim, a quarta questão reflete sobre como o viaduto tem que abrigar um elemento potencializador de coletividade minimamente programática, para que haja um desejo de permanência no local e que se garanta a livre apropriação dos espaços adjacentes e potencialize a requalificação do seu entorno.


67 { parate5 : PROPOSTA }


{ interlocus ou tudo que hĂĄ entre dois atos {

ENTRE LOCUS

estar entre as coisas, entre-lugares, diz respeito a nĂŁo ser isso nem aquilo, um ou outro, mas a chance de vir a ser outro" (Guatelli, p14, 2012)

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ATENTO: nas próximas páginas será apresentada a proposta de interveção para o viaduto, recomenda-se que a leitura seja feita acompanhada

das pranchas de projeto. Caso esteja vendo a versão digital as pranchas

INTER_ LOCUS estar NUM INTERLÚDO NUM ENTRE IMAGINADO CRIADO MOMENTÂNEO COLETIVO VIVENVIAR A POSSIBILIDADE PERMANCER ENTRE

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{ parate5 : PROPOSTA }

então no anexo página 103


interlocus a cidade vive por meio do corpo dos sujeitos em um cotidiano que é apenas o caminho entre dois atos //

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

>>

Interlocus. Inter, de Interstício, Interlúdio, Interação; Locus, de lugar. Esta proposta pensa a criação de uma espacialidade que seja interlocutora de partes, de ações, de cotidianos. Usando o viaduto como âncora, se cria um conjunto de intervenções capazes de constituir simbolicamente um território coletivo, e assim, revelar a potencialidade social que esse espaço possui. Se mantém o carácter de possibilidades e imprevisibilidade de um entre-lugar, articulando funções programáticas fixas, como midiateca e oficinas, e suportes para eventos hipotéticos, como feiras e teatro arena. Se propõe, deste modo, criar um complexo cultural que para além de atender demandas funcionais, possa ser um espaço de invenção de novos lugares; de interações coletivas; e de vivências urbanas vinculadas ao espaço público

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71 { parate5 : PROPOSTA }


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

RELAÇÕES E PRINCÍPIOS

A área em que o viaduto de localiza está situada em uma região de grandes vazios urbanos e faz próximidades com diferentes elementos urbanos, como rodoviária, rio e linha férrea. Durante o processo de projeto, entre todas as relações possíveis analizadas, algumas foras neutralizadas e outras incorporadas. 1. optou-se por não invertir no “braço” do viaduto pela sua localização entre linha ferrea o rio, o que dificultaria o acesso e segurança. 2. Do mesmo que optou-se por demolir uma edificação exitente entre o viaduto e o terminal para gerar uma visualidade entre os dois. 3. Existe uma proximidade com alguns galpões industriais que não foram incorporados no projeto pelo entendimento o foco seria nas áreas relacionadas diretamente com o viaduto. 4. O fluxos do projeto foram estabelecidos de acordo com a circulação entre os equipamentos existentes (faal, rodoviária, terminal e senac). 5. Opta-se por manter o riacho existente que desagua no ribeirão tatu tamponado por conta de sua qualidade de água, do mesmo modo que opta-se por não intervir na região muito próxima a linha férrea por quesões de segurança. 6. Mesmo não sendo foco, se explorou a relação com a presença da água do Ribeirão Tatu. 7. As áreas de intervenção se pontuam em 3 regiões, na base próxima a rodoviária, na região sob o ribeirão e na base próxima a FAAl. 8. Foi incorporado ao projeto as ruínas existentes da antiga indústria Machina bem como a região que elas se inserem. EQUIPAMENTOS EXISTENTES

ÁREA RESIDUAL PATRIMONIAL

ÁREA DE INTERVEÇÃO

ÁREA DEMOLIDA

ÁREA NEUTRALIZADA

RIO FLUXO

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73 { parate5 : PROPOSTA }


programatize

>> A intenção é fazer desse local um potencial atrativo de coletividade e de interação entre as pessoas // { interlocus ou tudo que há entre dois atos {

>>

Historicamente podemos detectar um desejo do arquiteto em controlar e definir o espaço de projeto; existe uma propensão para que haja uma adequação entre forma e conteúdo e consequente rigidez da apropriação programática, algo que se manifesta seja na escala do edifício ou no da cidade. A dimensão de especialização dos espaços urbanos clama pela vinculação entre os significados propostos e significados surgidos, ou seja, há sempre a preocupação de estabelecer limites daquilo que parece ser mais adequado para aquele lugar ou situação temática” (GUATELLI, p. 31, 2012). Entretanto,”passamos a ter de lidar com o florescimento, cada vez mais frequente, de eventos, de acontecimento, verificados nas mais diferentes escalas, que parecem causar certos desajustes ao romperem com o originalmente proposto”. (GUATELLI, p. 31, 2012). Existe, portanto, uma necessidade atual de se estabelecer uma flexibilidade na proposição do programa, no sentido de fazer uma arquitetura que seja possível de se abrir a esses

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{ parate5 : PROPOSTA }

eventos e desajustes. Desta forma, não se trata de propor necessariamente uma arquitetura sem programa mas de se entender a ideia do que é exatamente esse algo programático em um objeto arquitetônico. Ao pensarmos em um programa para um lugar de interstício devemos levar em consideração alguns fatores: pensar mais em uma intenção do que em um direcionamento; pensar o mínimo como estratégia geradora de dinâmicas territoriais e, desta maneira, propor um espaço aberto para interpretações e apropriações múltiplas, algo que seja potencializador de coletividades e de situações mas vinculadas a algo minimamente programático, que garanta um vínculo simbólico com o espaço. Consequentemente se faz válido entender um pouco as dinâmicas e demandas da cidade para estabelecer o mínimo programático que garante esse potencial coletivizador. Partindo dessa perspectiva e voltando o olhar especificamente para a cidade de projeto, me deparei com três situações que puderam me nortear nas escolhas programáticas das minhas intervenções urbanas; levando em conta que minha intenção é fazer desses locais potenciais atrativos de coletividade e de interação entre as pessoas, fazer destes entre-lugares, espacialidades que reflitam a dimensão coletiva que um viaduto representa. Sendo assim, a escolha programática, assim como a formal, estabelecem espaços propícios para que as ações socializantes possam se manifestar.


1. a bibiloteca

A biblioteca da cidade era localizada em um edifício patrimonial na região central da cidade, até que, por questões de reforma desse edifício, teve que ser mudada de local provisoriamente para uma outra área municipal ainda central. Infelizmente o edifício original da biblioteca demorou a ter sua reforma finalizada, o que fez ela ser desativada por um tempo. Hoje, novamente ativa, está em um galpão no chamado Parque da Cidade, o principal parque de Limeira. Mesmo que seja interessante a articulação desse equipamento com um parque, o local atual da biblioteca não é dos mais adequados para ela, além de não possuir um bom acesso.

2. a feira

A cidade de Limeira, assim como outras do interior paulista possui uma forte cultura de feira tanto de frutas e verduras quanto de produtos em geral. A cidade possui áreas em diversos postos designados para feiras de rua que funcionam em certos dias da semana. No mesmo local onde antes era a biblioteca central, existia uma grande feira que foi desativa, também por conta da reforma. Hoje, essa feira não possui outro local para ser realizada, deixando então de existir nos dias de hoje.

3. a OFICINA

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

três situações da cidade de limeira, um programa integado posssível

A cidade tinha um espaço gerido pela secretaria da Cultura que oferecia diferentes tipos de oficinas de artes, dança e música. Localizada na região central, foi encerrada no final de 2016, tendo como justificativa por parte da prefeitura que atividades ali oferecidas seriam descentralizadas nas áreas institucionais como escolas e parques e seriam geridos por demandas privadas ou locais. A descentralização acarretou em uma diminuição ou no cancelamento da maior parte dessas oficinas e hoje, com a falta de um lugar adequado elas já não ocorrem com tanta frequência. 76


programa integrado

midiateca bar ocifinas café feira-livre +apropriações

diagrama de distribuição do programas

diagrama de distribuição do programas ao longo do dia 77

{ parate5 : PROPOSTA }

Relevando as demandas existentes na cidade e tentando incorporar ao projeto um programa que seja possível de ser simbolicamente aceito pelos cidadãos. Optou-se por criar um programa integrado que articulasse essas três situações mencionas ao longo da área do viaduto, para que se alcance minimamente um giro de pessoas em diferentes horários e momentos do ano. Dessa forma, propõe-se a criação de um complexo de intervenções que articulem funções programáticas, como Midiateca, Bares e Oficinas; coma suportes para apropriações para eventos espontâneos, como mezaninos livres, estruturas para feiras e arquibancadas.


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

PROPOSTA

O projeto se constitui em um conjunto de invervenções em áreas distindas ao longo do viaduto e áreas adjacentes, articulados por uma passarela que fica ao nível da viga do viaduto. O gesto de projeto se vincula a criação de espaços fechados e abertos pela utilização de antemparos, mezaninos e vedações. Pode-se dizer que a proposta se consolida em 5 micro-áreas: A. Pátio das Laranjeiras – essa parte conta a presença de um pomar com áreas de estares que marca a conexão entre rodoviária e o viaduto. B. Midiateca – consolidada no baixio do viaduto e na área anexa de ruínas, com áres de estudo, consulta, acervo e reuniões, além de um bar com funcionamento noturno na reigão do mezanino. C. Região Machina – área com suportes para receber eventos exporádicos como feiras e oficinas externas. D. Sobre o Ribeirão – consta um café somado a um espaço cowork elevado sobre as águas, contando também com uma arquibacada ao nível do rio. E. Oficinas e Atelies – aproveitando a proximidade com a Faculdade de Artes, propõe-se um espaço com estrutura para esposições e oficinas culturais de dança, música, teatro e artes. 78


79 { parate5 : PROPOSTA }


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diagrama de fluxo { interlocus ou tudo que hรก entre dois atos {


Ao ligar duas áreas, o viaduto faz-se um gargalo de circulação e um grande potencializado de coletividades e encontro. A ideia de circulação do projeto e nas áreas de entorno reforça a horizontalidade do objeto tendo o fluxo principal vinculado ao eixo bilateral do viaduto. O movimento é articulado em 3 pontos de acesso por localizadas nas extremidades do viaduto, ademais, conta com 3 pontos de circulação vertical que se estabelecem nas regiões chaves das intervenções. Situa uma relação direta com o terminal rodoviário, articulando dois fluxos de entrada que se localizam no eixo rodoviária-viaduto, tanto ao lado do rio, quanto ao lado da linha férrea. Para aqueles que vem do terminal, da rodoviárias ou da região central, eles articulam uma circulação rotativa e cria um percurso intuitivo para vivenciar o projeto sem a necessidade de percorrer sempre o mesmo sentido. 81

{ parate5 : PROPOSTA }

FLUXO E MOVIMENTO


detalhe da relação entre passarela e baixio do viaduto - sem esc.

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

vierendeel

2,6X2,6M

PLÁSTICA

VIGAS I PILAR H

VEDAÇÃO

CHAPAS PERFURADAS

PINTURA

CHAPAS EM LARANJA

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{ parate5 : PROPOSTA }

diagrama indicando a forma da passareala

a passarela A passarela é o elemento que liga as áreas do projeto e se vincula do fluxo horizontal do viaduto. Propõe-se que a circulação que hoje acontece pela calçada no viaduto seja deslocada para a parte do baixio, para sim, além de criar um percurso sombreado, ter-se uma relação visual e material com as áreas de intervenção no cotidiano de quem utilizada esse elemento. A passarela é feita em viga Vierendeel e é estruturada por apoios entre vãos de 27 metros no alinhamento dos pilares. É vedada por uma chapa metálica perfurada com pintura em laranja e sua forma segue o alinhamento do formato do viaduto.

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{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

materialidade plástica e usos Como materialidade pensou-se em uma exploração formal e plástica de conflito, tentando estabelecer uma relação entre programas, intenções e usos com a estética do material. Optou-se então por três elementos: a taipa, estrutura metálica e pedra, um mais “pesado”, ou outro mais “leve”, e um intermédio. A taipa se relaciona com intenções de estares e permanências mais prolongadas, a estrutura metálica com fluxo e usos fluidos e a pedra com elementos de contenção, seja de pessoas, ruído ou terra. A escolha da taipa se deu pela vontade destoar do material do viaduto, mas ao mesmo tempo dialogar com existência de concreto. Além de marcar uma densidade material e plástica que condiz com a ideia de permanência. Ao passo que para a áreas fluidas, a estrutura metálica surge como elemento oposto a essa densidade da taipa. 84

pedra

caracteristica: materialidade

rígida e contida. processo de contrução marca conteção relação: centenção de usos, material e fluxos. Usos: Teatro arena, muro de contenção, barreira sonora


taipa estrutura metálica

{ parate5 : PROPOSTA }

Muro de Pedra

TAIPA

caracteristica: materialidade

rígida e densa. processo de contrução marca um tempo lento relação: permanencia e concentração, uso fixos Usos: Midiateca, áreas de estudo, auditórios, oficinas.

metal

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caracteristica: materialidade

rígida e fluida processo de contrução marca tempo rápido relação: fluxos, usos temporários, movimento Usos: passarela, feiras, e mezaninos


D.

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

ALGUNS pontos A proposta de intervenções tem a intenção para além de criar um espaço funcional, criar espacialidades que possibilitem a convivência pública coletiva. De modo que, o projeto cria diferentes áreas que podem ser utilizadas oras com a função designada, oras com uma liberdade de apropriação. Assim, vale focar em alguns pontos que são cruciais para entender as potencialidades da intervenção e demostrar a intuito de se criar um suporte para invenção de lugares e de permanecias nesse espaço-entre. Demonstrando assim, o caráter multidimensional do complexo de intervenções, a medida que os usos se modificam de acordo com intenções e não se fecham em programas meramente funcionais. 86

A.

pág x E.

f.


B. { parate5 : PROPOSTA }

C.

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88

{ interlocus ou tudo que hรก entre dois atos {


89

{ parate5 : PROPOSTA }

A. midiateca O espaço da midiateca se consolida parte no baixio no viaduto, parte em uma estrutura existente ao lado do viaduto. Dentre as intervenções desse projeto, este é o que é mais rígido no quesito programática, entretanto, a hipótese que se trabalha é que estar parte da intervenção irá garantir uma rotatividade de pessoas. Para além disso, a proposta de trazer um equipamento deste para o baixio do viaduto é tencionar as suas funções programáticas e tentar relacionar ela com outros equipamentos de cultura. Sua materialidade é que mais atribui à Taipa, justamente por ser a área do projeto que tem maior permanência e ser de certa forma, o elemento marco do projeto.


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

b. café + ribeirão O espaço para café fica localizado no meio do viaduto sobre o Ribeirão. A ideia é que esse local funcione como um espaço de uso coletivo voltado para atividades de estudo, reuniões de trabalho ou para profissionais independentes. A hipótese é manter esse espaço com um princípio de interlúdio urbano, onde qualquer pessoa que precise de um lugar para usar o próprio notebook, reunir com os amigos para um debate ou simplesmente tomar um café, possa se sentir confortável. Sob a estrutura do café e próximo ao rio, ainda há uma arquibancada alagável onde as pessoas podem ter contado com a água do Ribeirão.

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91 { parate5 : PROPOSTA }


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

c. oficina - ateliês As áreas de atelier e oficinas buscam dar conta da demanda de ter um espaço de uso livre pela população para atividades, combinadas com oficinas gerenciadas pela prefeitura. Este espaço tem a intenção de ser um território de livre apropriação para contemplar atividades de arte, dança, música e teatro. Mantem na sua imagem o carácter de imprevisibilidade que um entre-lugar possui. Espaço de possibilidades, tem sua proximidade com a Faculdade de Artes e pode servir como espaço de exposição.

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93 { parate5 : PROPOSTA }


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

d. pátio das laranjeiras Para estabelecer um imaginário lúdico e histórico, na entrada do projeto, próximo ao terminal rodoviário, se propõe o plantio de laranjeiras. Além de remeter ao nome e a história da cidade, a ideia é criar um espaço com árvores onde as pessoas podem usufruir rapidamente enquanto esperam o ónibus, podem permanecer por um tempo e comer as frutas. A modulação e o desenho do piso seguem a ideia do plantio de laranjas, contendo pequenas canaletes que levam a água da chuva para as árvores e para uma fonte central. A ideia é marcar esse local como território de águas, já que existe um pequeno córrego canalisado que passar próximo as laranjeiras.

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95 { parate5 : PROPOSTA }


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

E. Feira livre + terraço O terraço da mediateca, além de conter um pequeno bar, possui uma relação de nível com a área que hoje são as ruinas da antiga indústria Machina. A proposta mantém os pilares de concreto existente hoje bem como as ruinas da antiga fábrica. Se inclui uma estrutura metálica cúbica que para além do seu caráter escultórico, pode ser apropriada para realização de feiras noturnas que se relacionam com o bar no mezanino, ou eventos e feiras esporádicas, que são características da cidade de Limeira.

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97 { parate5 : PROPOSTA }


{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

f. baixio + bar Além da entrada para a midiateca no nível terreno, no mezanino na parte do baixio no viaduto na região próxima a rodoviária, é proposto um bar com funcionamento noturno. A ideia é que isso possa garantir um uso noturno para o local de movo a gerar dinâmicas diferentes da que ocorre de dia. A proposta não é estabelecer um conflito de usos, mas garantir a multiplicidade da intervenção em um espaço-entre e que isso possa contribuir para encontros e sociabilidade na região.

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{ interlocus ou tudo que hรก entre dois atos {


{ parate 6 : por fim}

sobre a proposta: plantas cortes e detalhes

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por fim

A ideia de interstício está ligada a uma hipótese de influências duplas. É o elemento que há entre duas ou mais situações. De tal modo que o interstício é aquilo que assimila o valor mais puro do seu prefixo [inter]: é a relação, a conexão, aquilo que é e está em duas ou mais coisas ao mesmo tempo.// { interlocus ou tudo que há entre dois atos {

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Acredito que este trabalho, mesmo que tenha uma investigação técnica, tem como intuito ser um comentário do pensar e fazer a cidade. Mais que dar uma solução a um espaço complexo e instável, minha proposta é de colocar em debate as possibilidades que um espaço como este dispõe. Acredito que a partir do imagético dos entre-lugares, independente da sua nomeação e matriz teórica, é essencial compreender que intervir em um espaço como esse, de caráter intersticial, é essencialmente compreender as dinâmicas que já existem, mesmo que temporárias, e potencializar para que esse espaço-entre se consolide como um lugar simbólico, mas sem perder as suas qualidades de possibilidade, de multiplicidade e de imprevisibilidade. Portanto, é de se entender que projetos para espaços assim não se limitam apenas ao caráter de intervenção funcional. Projetar em uma área de interstício é entender a sua potência dentro do território e que o ato de projeto em uma área assim é, para além de uma resolução de um vazio urbano, conceitual e questionador.

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fotomontagem por moholy nagy

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bibliografia complementar BAUMAN, Z. De peregrino a turista: o una breve historia de la identidad. In: HALL, S.; DU GAY, P. (Org.). Cuestiones de identidad cultural. Tradução de Horacio Pons. Buenos Aires : Amorrortu, 2003. p. 40-68. CERTEAU, M. G. A invenção do cotidiano: artes de fazer. 18.ed. Tradução de Ephraim Ferreira. Petrópolis, Vozes, 2012. 316 p.

{ interlocus ou tudo que há entre dois atos {

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Referências bibliográficas CARERI, Francesco. Walkscapes. El andar como práctica estética. Land&Scape, 1º edición, Barcelona, Gustavo Gili, 2009. FARHADY, Maryam; NAM, Jeehyun . Comparison of In-between Concepts by Aldo Van Eyck and Kisho Kurokawa: Through Theories of ‘Twin Phenomena’ and ‘Symbiosis’. Journal of Asian Architecture and Building Engineering, [S.l.], v. 8, n. 1, p. 17-23, maio. [2009 ]. FARIÑA, Femando. El intersticio urbano. : La construcción de una herramienta para su lectura e interpretación en el territorio. Estudios del Hábitat, [S.l.], n. 10, p. 5-14, fev. 2008. GUATELLI, Igor. Arquitetura dos entre-lugares. Sobre a importância do trabalho conceitual. São Paulo, Senac São Paulo, 2012.

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___________ . Condensadores urbanos: Baixio Viaduto do Café: Academia Cora_Garrido . 1. ed. São Paulo: MackPesquisa, 2008. 86 p. v. 1.


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