Cadeira vazia

Page 1

CADEIRA VAZIA Paulo Calhau


2


CADEIRA VAZIA Monólogo poético-gráfico

PAULO CALHAU 2012

3


4


A água A terra O fogo O ar Eu.Tu Sempre tu! No tempo No espaço Tu. Sempre tu. Sem Tempo Sem Espaço Uma Cadeira Vazia

A água A terra O fogo O ar EU TUu. Sempre TU! No Tempo No Espaço TU Sempre TU. Sem Tempo Sem Espaço Uma Cadeira 5


1 Faz

no

tempo

tempo que estou aqui sentado.

Sinto que o frio começa a agarrar-se à pele e a travar-me a O

tempo

Vivi

6

língua.

minha

sempre foi importante na minha vida.

sempre em função do tempo.


Do

tempo

Sempre

e da

tempestade

.

gostei da tormenta.

A força da chuva. O bulir do

O

forte

vento.

compasso dos

Quando

havia

lançar

trovĂľes

trovĂľes.

acalmia logo me aprontava para do

alto

do meu Olimpo.

7


Faz tanto tempo

sentado.

Tanto que

tempo que

que estou

não me lembro se foi aqui

morri!

Tão pouco me lembro quando ou se

morri.

Às vezes sinto que foi

Hoje mesmo!

8

aqui

morri,

ontem.


Ainda

agora sentia percorrer-me o corpo. As

palavras

determinadas,

o sangue quente a

forte, a jorrarem da minha

boca.

Sinto-as fortes e cheias meus primeiros anos.

como nos

Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. Sinto-as fortes e cheias como nos meus primeiros anos. 9


As vezes penso que n茫o morri.

s贸 estou Como TU. Que

ausente.

Sempre ausente. O TeMPo sempre foi importante na minha vida. Nas nossas vidas.

10


Faz

Tempo

que estou aqui sentado.

Tanto

Tempo

que me esqueci. Que

d

Me

perdi!

v

Sempre a olhar para esta Ca eira azia. Sempre a esperar por ti.

Ainda a

esperar por ti!

11


N茫o me lembro

Sei

quando

morri.

que morri algures nesta vida.

O tempo fez-me esquecer o tempo em que parti. Vou desfiando mem贸rias de s茅culos. E a cada mem贸ria cortando o

12

f

io da vida.


Lembro-me pouco de mim. As mem贸rias tornam-se turvas quando nos sentamos por muito tempo. Lembro-me pouco de Lembro-me de Lembro-me o

mim.

ti! que vivi.

Houve

tempos intensos. Outros, menos fortes.

Houve tempos em que a cadeira n茫o estava

vazia.

Houve um tempo em que te senti em mim. Houve tempos em que noutros te encontrei e com

eles

te percorri.

Houve ainda tempos em que em houve o dia em que

parti.

ti

morri e,

13


14


2

da

àgua

Sinto

fortes os passos na água mansa Lá fora. Sinto o castigo da água no meu teto apertado.

Sinto-me

cego no brilho do dia.

Tento enfrentar-te.

Olhar-te. Afogar-te no chão d’água que nos rodeia. Tento em

Vão.

O corpo rejeita o movimento na lenta preguiça da espera.

Sei Sei

que não voltarás!

que o escuro do teu corpo continuará agarrado aqui. Na

minha

Na minha Nesta

casa.

água.

Cadeira.

15


A Uma

água água

inunda que

o

a

minha tempo

respiração ainda não

lenta. levou.

A água inunda a minha respiração lenta. Uma água que o tempo ainda não levou. A água inunda a minha respiração lenta. Uma água que o tempo ainda não levou. Uma água que o tempo ainda não levou. Uma água que o tempo ainda não levou. Uma água que o

A água inunda a minha respiração lenta. A água inunda a minha respiração lenta. A água inunda a minha respiração lenta. tempo ainda não levou.

A água inunda a minha respiração lenta. Uma água que o tempo ainda não levou. A água inunda a minha respiração lenta. Uma água que o tempo ainda não levou.

A água inunda a minha respiração lenta. Uma água que o tempo ainda não levou. 16


Dizem

os Outros que a

.

água

nos limpa.

Purifica.

. . . . .

Que sabem os tolos de nós! Puros foram os dias em que naquela água forte nos envolvemos.

nos perdemos. Nos perdemos!?

Como

S

empre. Nessa água forte.

me banhei. Me embriaguei.

me benzi.

Te

benzi.

te adorei.

te pari.

17


18


Sinto

És

os passos fortes da

água

no chão.

tu que voltas.

Sinto

a água a

subir.

Mais uma vez me afogas, me na pureza liquida.

cortas a

vida

19


E

eu

espero.

Afogado. Aqui. Aqui. Aqui.

Nesta

20

R

caDei

a.

Aqui.


21


22


3 Cravo As

da

terra

os dedos na Terra

unhas

raspam as cinzas que a ĂĄgua pousou.

Gela ainda verde a pele estridente da A

molhada.

queimada

no grito

F

ĂŠnix.

Terra.

23


A

cura

repetida acalma as raízes grossas

que se cruzam num eterno As

raízes

que nos unem.

Que nos prendem a este

Que

Labirinto.

lugar.

te afastam.

Cortá-las seria curar mas a cura é tardia. Sinto os pés enraizarem-se na

Cuidadora.

Protectora.

Doentia.

24

sempre

Terra

mãe.


A água passada

a molhada.

deixou-

Empapada de ti. Nutrida. Recuperada.

Fecunda. Na

A

ânsia desorientada de terra mãe aceitou-te

ferozmente O teu corpo. O teu suor. O meu suor.

te receber.

te.

devorando-

A tua bruma de vida sugada pela terra Espalhada em cada grão. Infiltrada nas Nas

A

minhas

tua bruma

Virgem.

raízes.

raízes.

soprada

em mim.

em mim

em mim em

mim

25


Sinto o cheiro de Terra molhada. Intenso.

Forte.

o teu cheiro áspero e embriagante. A cada cópula de Terra e Água sinto-te aqui.

Sinto-te

Sei que não Estamos

em mim.

estás!

sós.

Sempre

sós.

Eu, tu. A Terra. E esta cadeira vazia.

26


Racham-me as veias no estalar da

Quando

passa a chuva a E

eu,

madeira.

terra

seca.

seco-me de

ti. 27


Raspo

a terra

pés te encontro.

com os e não

Fecundo-me na memória do prazer Sabes como a rachar?

custa

antigo.

a madeira

Solto o gemido impuro a cada vez que As

raízes

Esventram o Cruzam-te. Agarram-te.

te

ço.

alcan

espalham-se.

solo.

Embalam-te no arrepio forte da

28

Morte.


29


Sei que não estás.

Sei

que partes quando a terra seca.

Sei

que voltarás.

Sei

que curar seria perder.

Agarro-me ao cheiro da Terra molhada. Enraizado no solo Espero por

ti.

seco

Fecunda-me!

30

éril.

e est


A

Terra

secou.

Fico aqui.

Nesta sombra.

Eu. Tu. E uma

cadeira VAZIA.

31


32


4

do

fogo Queimas-me! O calor rodeia

os nossos corpos puros no eterno devir da chama.

Queima-me a boca ao tocar-te. Percorro a tua incandescĂŞncia

lascivamente.

Vorazmente.

Bebo de ti. Bebo de ti. Bebo de ti.

33


Os

teus

lรกbios

marcam-me a cada

beijo. Arrancam-me a pele queimada e flamejante.

Tenho-te! As tuas mรฃos contorcem-me ainda

quente.

QUEIMAS-ME 34


Rasga-se a carne rija ao sabor das

chamas. Intensas. Fortes. Que me derretem.

Que me moldam.

Que me apartam. Derreto-me em

ti.

FUNDO-ME 35


Somos

solda encarnada a borbulhar. Crescente onda

de fogo.

Tens-me! As chamas vivas alucinam no nosso grito. Tudo Ê baço, quente.

Sufocante. Respiramos num choro seco ao violento espancar da chama. Sinto o teu suor a queimar-me

a carne.

Sinto-me nele. 36


37


O cheiro

do fogo que nos queima torna-se espesso. É o teu aroma que me torce o rosto.

Derretes-te em mim.

Gritas

o fogo preso.

Vórtice

de prazer.

Queimo-te! O teu corpo procura o intenso rodopiar da fogueira.

O meu fogo.

38


Derretemos juntos

massa flamejante. numa

Sinto-me em ti. Rasga-se a carne oprimida. A pele reclama

o

calor.

As nossas bocas respiram

o

suspiro de Nero.

Somos

fogo voraz que se

alimenta

em

si. 39


Juntos

nos moldamos sem

em

contorno.

Fundidos lava quente, isolada. Somos

a

fogo quente cada madrugada. E em cada gota

derramada

me encontro em ti.

Te encontro em mim.

Tenho-te. Tens-me. 40


Tenho-te Tenho-te Tens-me Tenho-te Tenho-te Tens-me Tens-me Tens-me Tenho-te Tenho-te Tens-me Tens-me 41


42


5 Brisa

do

ar

fresca

sábia que

É o ar que

Ventos

tudo

acalma o

repõe

calor.

no seu lugar.

magníficos de uma nortada

certa.

Sentes o frio? 43


Levam-te daqui.

Espalham-te na

Voas ao sabor do

mem贸ria que

noite passadas.

meu sonho.

Sentes o ar

que te despega de

Tento prender-te no golfar tr谩gico do

amargo pranto.

44

restou das

mim?

meu


O Vejo a

cadeira rodar

à minha

ar voltou. volta.

Tu não estás. E

o

fogo acabou. O

Levou-

vento

trouxe a brisa

fresca.

nos daqui. Limpou-me de

ti.

Fico eu. E esta

cadeira vazia.

45


46


6

no

espa莽o

Procuro reconhecer onde estou, preso numa cegueira branca.

Muda. Austera. Olho em redor esmagado pela omnipresente cor.

Estou s贸. Agarro-me ao reconhecer.

desespero alvo

para me

Para te resgatar.

Estou s贸.

47


Tudo é O

branco e cru.

espaço

eu

perdeu-se do

perdi-me de

tempo

e,

ti.

Não sei onde estou. Falta-me a tua cor neste branco impuro.

Estou cego. Aprisionado num espaço sem forma.

Sem Com

tempo. memória.

Comigo. Contigo.

48


Agarro-me

perturbado a esta

cadeira

vazia.

Ela está aqui!

Tu também estás? Ensurdeço. Olho o

branco

Espero por

Estás

infinito.

ti.

aqui?

49


Tenho sede.

รกgua.

Quero

Sei que voltarรกs! Com a Com a

chuva. รกgua.

Entรฃo

50

voltarรกs.


51


É quando eu sinto o violento espancar da tua chama. O fogo que me penetra e me faz explodir.

file:///G|/Textos/textos/cadeira%20vazia.pdf


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.