Nacapa: Selo de Portugal (1974), comemorativo do 4.' Cenlél1álW éa:"
Gois, grande humanista do século XVI.
Selo do Brasil (1934), comemorativo do 4.° Centenário do na<:
Anchieta, naturalista pioneiro do Brasil.
MUSEU BOCAGE
Museu Nacional de História ?\"atural
A ZOOLOGIA PRÉ-LINEA~\~~ NO BRASIL
CARLOS ALMAÇA
Publicação subsidiada pela Fundação para a Ciência e 3 -=- ~_ Apoio do Programa Operacional Ciência, TecnolOQ::2.
Inovação do Quadro Comunitário de Apoio III~
LISBOA
2 OO2
MUSEU BOCAGE
Museu Nacional de História Natural
A ZOOLOGIA PRÉ-LINEANA
NO BRASIL
CARLOS ALMAÇA
Publicação subsidiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia Apoio do Programa Operacional Ciência, Tecnologia,
Inovação do Quadro Comunitário de Apoio III
LISBOA
2 OO2
A ZOOLOGIA PRÉ-LINEA_Y_'i
NO BRASIL
CARLOS ALMAÇA Museu Bocage*, Departamento de Zoologia e Antro:: r ,_ Centro de Biologia Ambiental *Rua da Escola Politécnica, 58., 1269-102 Lisboa. p,:~:,~~
ISBN 972-98196-4-5
A ZOOLOGIA PRÉ-LINEANA
NO BRASIL
CARLOS ALMAÇA Museu Bocage*, Departameuto de Zoologia e Antropologia e
Centro de Biologia Ambiental
*Rua da Escola Politécnica, 58, 1269-102 Lisboa, Portugal
Índice
Preâmbulo ...................................................... . Introdução ...................................................... , A História natural nos séculos XVI e XVII .. ,.... . Primeiros cronistas ........................................ ,.. ' Naturalistas pioneiros ........................................ , Alguns comentários aos relatos quinhentistas zoologiadoBrasil ....................................... " Os franceses no Maranhão .............................. , Cristóvão de Lisboa e outros naturalistas c=, seu tempo ................................................... .
Naturalistas e artistas no Brasil holandês ............. .
Princípios do século XVIII ............................... '
Comentários finais ............................................ .
Notas ............................................................... .
Bibliografia ....................................................... .
Índice
PreâInbulo ..........................................................
9
Introdução..........................................................
13
A História natural nos séculos XVI e XVII..........
17
Primeiros cronistas..............................................
21
Naturalistas pioneiros ..........................................
27
Alguns comentários aos relatos quinhentistas sobre
zoologia do Brasil .........................................
89
Os franceses no Maranhão .................................
101
Frei Cristóvão de Lisboa e outros naturalistas do
seu tempo .....................................................
111
Naturalistas e artistas no Brasil holandês ....... .......
121
Princípios do século XVITI ..................................
129
Comentários finais ..............................................
131
Notas .................................................................
137
Bibliografia .........................................................
141
7
Preâmbulo
Em vários livros anteriormente editados ~'-c
Bocage se tem declarado ser o ensino
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por Hitoshi Nomura. Não é, aliás, a prime;;',
o autor do presente estudo se refere a )2
Preâmbulo
Em vários livros anteriormente editados pelo Museu Bocage se tern declarado ser o ensino das disciplinas de História do Pensamento Biológico, de Evolução, ou de ambas, um dos seus objectivos principais. Porém, não só. Havia muito para desbravar, e ainda há, quanto à participação portuguesa na ed~ficação da História natural e do Evolucionismo. A investi gação em que estes livros têm sido baseados, demons tra-o claramente. Pensou-se ser conecto não /úrtar aos licenciandos em Biologia, mesmo dos primeiros anos, os resultados de investigação original, desde que estes, sendo de ponnenOl; ntio procurem substituir; ou sequer ofuscar, as linhas fundamentais de deter minado desenvolvinzento. Por isso se tem deixado escorregar para esses livros muita da investigaçtio baseada em fontes primárias. Tal facto lltio pode obstar, naturalmente, a que se publiquem em idioma e revistas mais acessíveis internacionalmente as principais conclusões da investigação. Cabe agora a vez aos animais do Brasil, tal como foram descritos e c01nentados antes de Lineu iniciar a ordenação da natureza. Procurou-se dar mais relevo às observações e interpretações dos naturalistas pré lineanos que a uma exaustiva nomeação das espécies, trabalho, de resto, já realizado com grande mérito por Hitoshi Nomura. Ntio é, aliás, a primeira vez que o autor do presente estudo se refere a naturalistas 9
pré-lineanos e às suas tão ingénuas quanto interes santes especulações sobre os animais (ver C.Almaça, 1998, Baleias,. focas e peixes-bois na História natural portuguesa, Lisboa: Museu Bocage). Porém, da Ásia e da África já os gregos e romanos haviam trazido muitas espécies exóticas que os naturalistas seus coetâneos e, nzaís tarde, árabes e medievais, descreveram e, não poucas vezes, mit~ficaram. Com o Brasilfoi diferente. Tudo era novidade ao chegarem os portugueses. O longuíssimo isolamento em relação aos outros continentes aí propiciou a evolução de linhas muito particulares, que nem a junção mais recente com a América central desvaneceu. F oi um mundo de originalidade que se abriu para quem sabia ver e pensar. Ver bem e pensar - por vezes e atendendo à época -, muíto bem, souberam-no vários naturalistas portugueses. Isso, porém. só tardiamente viria a contribuir para a edificação da História natural. Porquê? Porque nos séculos XVI e XVII não existiu em Portugal um meio cientifico que compreendesse o alcance das descobertas, descrições e comentários desses naturalistas. Ao passo que na Europa central e setentrional, nomeadamente na mais sensível à Reforma e suas muito variadas consequências, se começava a encarar muito seriamente o avanço cientifico. Hoje, Portugal está, felizmente, bem lançado na construção do seu meio científico. Graças a uma 10
decidida participação das universidades, investigação e entidadesfinanciadoras e am::. conseguiu-se um posicionamento inten .. interessante se atendermos ao notável atrc::' que se partiu. E é evidente que isto tem o meio interno, tornando-o mais crítico e Se este livro também contribuir para isso, compensação suplementar para o lv[useu instituição editora e para o autor como i71\'()(~ e professor.
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decidida participação das universidades, institutos de investigação e entidades financiadoras e avaliadoras conseguiu-se um posicionamento internacional interessante se atendermos ao notável atraso com que se partiu. E é evidente que isto tem fortalecido o meio interno, tornando-o mais crítico e exigente. Se este livro também contribuir para isso, eis uma compensação suplementar para o Museu Bocage como instituição editora e para o autor como investigador e professor.
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Introdução
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Animado pelo movimento humanista, sobreL,~_ ~ humanismo cristão de Erasmo de Roterdãc. DJ que reinou entre 1521 e 1557, investiu na que parece, tentou trazer Erasmo para a Cnj\e:;: .:::.., 1526, firmou um acordo com Diogo de G _"" , professor de teologia da Universidade de Paris e._ .. : __ do colégio de Santa Bárbara, e criou 50 escolares portugueses estudarem em Paris.
em Portugal. A Universidade em breve seria e transferida para Coimbra (1537). Damião amigo de Erasmo, ao regressar definitivamen:e c:. ?=_
•
Introdução
Nas primeiras décadas do século XVI ainda prevaleceu em Portugal a perspectiva medieval da vida e da cultura e só a partir dos anos trinta começou a manifestar-se o classícismo renascentista. De fundo literário e comen tarista, o classicismo conferia muito maior importância ao conhecimento dos autores greco-latinos do que à investigação da natureza. Estoutra diferenciou-se em Portugal através dos fa1coeiros e desenvolveu-se conside ravelmente em consequência dos descobrimentos marítimos. Classicismo e descobrimentos convergem, assim, num humanismo global (Mendes, 1993). Animado pelo movimento humanista, sobretudo pelo humanismo cristão de Erasmo de Roterdão, DJoão lII, que reinou entre 1521 e 1557, investiu na cultura e, ao que parece, tentou trazer Erasmo para a Universidade. Em 1526, firmou um acordo com Diogo de Gouveia, professor de teologia da Universidade de Paris e principal do colégio de Santa Bárbara, e criou 50 bolsas para escolares pOltugueses estudarem em Paris. Os estrangeirados André de Resende e Damião de Góis, erasmitas, foram muito bem acolhidos pelo rei. A oração de sapiência proferida por André de Resende na abeltura do ano escolar da Universidade de Lisboa, em 1534, é considerada corno o manifesto do humanismo pedagógi co em Portugal. A Universidade em breve seria reformada e transferida para Coimbra (1537). Damião de Góis, amigo de Erasmo, ao regressar definitivamente a Portugal, 13
em 1545, foi, a despeito da amizade do rei, denunciado ao Santo Ofício e bastante mais tarde, em 1571, processado por este. A refmIDa universitária dependia da criação de colégios autónomos, destinados a um ensino preparatório de qualidade. Assim, em 1547, é fundado em Coimbra o Colégio das Artes, para o qual são chamados como professores bolseiros portugueses no estrangeiro. André de Gouveia, sobrinho de Diogo de Gouveia e dissidente dele, na época principal do Colégio de Guyenne, em Bordéus, é incumbido pelo rei de dirigir o Colégio das Artes. Traz consigo alguns mestres bordaleses, uns portugueses, outros estrangeiros, e incorpora também professores do Colégio de Santa Bárbara. Com perspec tivas filosóficas distintas, os primeiros erasmitas, os 'parisienses' ortodoxos, cedo viriam a confrontar-se. De facto, a partir de 1548, acabada a prestigiada direcção intelectual de André de Gouveia pelo seu prematuro falecimento, desfez-se a integridade do corpo docente do Colégio das Artes. breve o Santo Ofício, acusando os erasmitas de protestantes encobertos, os julgou, encarcerou e dispersou, anulando a valorização cultural que eventual mente trariam ao país. Os contactos desses estrangei rados com o luteranismo e o calvinismo sobrepunha-se ao facto de o erasmismo criticar tanto a legitimidade da Reforma corno a das ordens religiosas (Mendes, 1993). Um potencial luteranismo assustava a sociedade portuguesa, fechada sobre si própria e, ao que parece, esgotada pelas brilhantes inovações que a haviam conduzido aos descobrimentos. 14
No longo período, que se estendeu até 16-+0. e;- .
coroa portuguesa esteve entregue a um rei c
os territórios ultramarinos portugueses cor.,- .. _=- - interesse e a cobiça dos inimigos de Espanha . .:.: . . ~... diversificados. Foi nesta época que se prodez: ..
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Tinha-se inovado na ciência náutica para G::s ..
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descoberto. As consequências da originalid:;.c.:: -~ ~ demonstrada não foram mais profundas por
essenciais. A primeira foi a estagnação cultural ::-:-.~: pela Inquisição. A segunda, o segredo de este::, ..
impunha um notável intimismo aos conhecimerc::, ,
os territórios de além-mar. No domínio da HistÓr:2 .. ":'. poder-se-ia ter chegado muito mais longe
das próprias observações e no reconhecime:-': . ~ ... méritos dos naturalistas pOItugueses, não cidade a que se condenou o conhecimento orrg:
Deve assinalar-se que a zoologia pré-lineana r.':: :::::-:. não foi apenas abordada por portugueses.
durante o período pré-lineano, que, no caso eS;-:: ~: do Brasil, se pode localizar entre 1500 e o lir:ce .
de 1735 data de publicação da primeira e:':
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Santo Ofício, acusando os erasmitas de -:es encobertos, os julgou, encarcerou e 3.TIulando a valOlização cultural que eventual -:2.m ao país. Os contactos desses estrangei ,:) luteranismo e o calvinismo sobrepunha-se erasmismo criticar tanto a legitimidade da - ::GO a das ordens religiosas (Mendes, 1993). .- - ~ial luteranismo assustava a sociedade -- S:'. fechada sobre si própria e, ao que parece, 3.S brilhantes inovações que a haviam ':' ~:JS descobrimentos.
1640, em que a Ko longo período, que se estendeu coroa portuguesa esteve entregue a um rei castelhano, os territórios ultramarinos portugueses concitaram o interesse e a cobiça dos inimigos de Espanha, que eram diversificados. Foi nesta época que se produziram os mais importantes trabalhos sobre História natural pré -lineana do Brasil, da autoria de naturalistas portugueses e estrangeiros. Tinha-se inovado na ciência náutica para descobrir; inovou-se no conhecimento da natureza por se ter descoberto. As consequências da originalidade assim demonstrada não foram mais profundas por duas razões essenciais. A primeira foi a estagnação cultural imposta pela Inquisição. A segunda, o segredo de estado, que impunha um notável intimismo aos conhecimentos sobre os territórios de além-mar. No domínio da História natural poder-se-ia ter chegado muito mais longe no alcance das próprias observações e no reconhecimento dos méritos dos naturalistas portugueses, não fora a priva cidade a que se condenou o conhecimento original. Deve assinalar-se que a zoologia pré-lineana no Brasil não foi apenas abordada por portugueses. Com efeíto, durante o período pré-lineano, que, no caso específico do Brasil, se pode localizar entre 1500 e o limite formal de 1735 - data de publicação da primeira edição de Systema naturae -, dezenas de 'naturalistas' escreveram sobre a fauna brasileira. As contribuições individuais deste copioso número de individualidades têm sido descritas com pormenor por Nomura (1996a,b, 1997, 1998). Este autor tem procurado identificar as 15
especles por eles mencionadas nos seus livros ou manuscritos, atribuindo-lhes nomes lineanos. O trabalho realizado com tanta persistência por Nomura será adoptado no presente estudo: salvo indicação em contrário, são as identificações de Nomura dos táxones brasílicos as aqui referidas sem mais citações. Sempre que uma obra clássica não pôde ser consultada na edição original ou fac-similada, cita-se o ano (e autor e páginas, quando caso disso) da reimpressão ou colectânea de que faz parte entre parênteses rectos. Na bibliografia indica-se também o ano da publicação efectiva da obra para completa integração cronológica do autor e seus conhecimentos no tempo próprio. Ainda que muito desiguais em extensão e profundidade, as contribuições do significativo grupo de naturalistas pré-lineanos do Brasil formam um conjunto relativamente importante que será subdividido em secções no presente estudo. Antes do mais, porém, para melhor avaliação do alcance das contribuições individuais, será interessante considerar os limites e conteúdos da História natural, em particular da Zoologia, no período em referência.
16
A História natural nos séculos XVI e XYII ::\0 estudo da vida desenharam-se desde
duas tendências complementares, porém conceptualmente distintas. Uma respeita à estrutL: diversidade e ordenação desta num sistema coe;'e:-::: _ apreensível pela mente humana. A outra, ocupa-;::e funcionamento dos seres vivos, particularmente humano. Identificou-se a primeira com a HistórÍa " e, com tal conteúdo, abrangeu desde logo natureza inanimada minerais, rochas, fósseis. A cOlTesponde à Fisi ologia/Medicina, desde sempre re' :~:. nada com a História natural, tanto directamente esr:-.:~ ... corpo humano: anatomia como indirectame:-:. diversidade e taxonomia dos fármacos, só no passado gradualmente substituídos por compos:,~ ~ ..::: síntese. Assim, até muito tarde, a formação e naturalistas foi adquirida em estudos médico:;. Durante muitos séculos, os manuscritos de Teofrasto, Plínio e seus tradutores e comente:.I.. _. formaram o essencial do saber histórico-naturaL' --- : os de Hipócrates e Galena constituíram a medicina e os de Dioscórides a do conhecimen=: fármacos. Dezenas, em certos casos centenas. manuscritos copiados e recopiados, totalmec em parte, traduzidos e alterados pelos trac:c __ . parafraseados, corrigidos, etc. -, formaram um ::- sobre a natureza e a vida, acessível a apenas Com a descoberta da imprensa na Europa, em 1:.(";.... : do século Xv, e sua progressiva utilização, estas e .. ..
por eles mencionadas nos seus livros ou atribuindo-lhes nomes lineanos. O trabalho com tanta persistência por Nomura será __co no presente estudo: salvo indicação em .0. são as identificações de Nomura dos táxones -,J5 as aqui referidas sem mais citações. ~::S
uma obra clássica não pôde ser consultada original ou fac-similada, cita-se o ano (e autor quando caso disso) da reimpressão ou de que parte entre parênteses rectos. Na indica-se também o ano da publicação obra para completa integração cronológica seus conhecimentos no tempo próprio.
-::.e: muito desiguais em extensão e profundidade, :-::-:buições do significativo grupo de naturalistas :-.e':::105 do Brasil formam um conjunto relativamente -:: ~ :-::.:-:te que será subdividido em secções no presente . ...!."ntes do mais,porém, para melhor avaliação :.:-:..:e: das contribuições individuais, será interessante .'::e:-:':- os limites e conteúdos da História natural, em Zoologia, no período em referência.
A História natural nos séculos XVI e XVII No estudo da vida desenharam-se desde muito cedo duas tendências complementares, porém perceptiva e conceptualmente distintas. Uma respeita à estrutura, sua diversidade e ordenação desta num sistema coerente e apreensível pela mente humana. A outra, ocupa-se do funcionamento dos seres vivos, particularmente do corpo humano. Identificou-se a primeira com a História natural e, com tal conteúdo, abrangeu desde logo também a natureza inanimada minerais, rochas, fósseis. A segunda corresponde à FisiologialMedicina, desde sempre relacio nada com a História natural, tanto directamente - estrutura do corpo humano: anatomia -, como indirectamente diversidade e taxonomia dos fármacos, só no século passado gradualmente substituídos por compostos de síntese. Assim, até muito tarde, a formação e prática dos naturalistas foi adquiIida em estudos médicos . Durante muitos séculos, os manuscritos de Aristóteles, Teofrasto, Plínio e seus tradutores e comentadores formaram o essencial do saber históllco-natural, como os de Hipócrates e Galena constituiram a base da medicina e os de Dioscórides a do conhecimento dos fámlacos. Dezenas, em certos casos centenas, destes manuscritos - copiados e recopiados, totalmente ou em parte, traduzidos e alterados pelos tradutores, parafraseados, corrigidos, etc. -, formaram um corpo sobre a natureza e a vida, acessível a apenas alguns. Com a descoberta da imprensa na Europa, em meados do século Xv, e sua progressiva utilização, estas e outras
17
obras tornaram-se referências de consulta mais generalizada. Logo em 1469 se imprimiu a História natural de Plínio e, em 1498 e 1499, as versões latina e grega, respectivamente, de De Materia Medica, de Dioscórides (Guyénot, 1941). Os ventos do Renascimento, üTadiando das universidades do norte de Itália, estenderam progressivamente à Europa central e ocidental os seus anseios inovadores. Em 1543, Andreas Vesalius publica em Basileia De Humani COlporiS Fabrica, a primeira anatomia humana resultante de uma investigação profunda sobre a estrutura interna do corpo humano. Entendida a estrutura, podia progredir o conhecimento da fisiologia humana - o que, de facto, aconteceu -, e com ela a medicina, deixando para trás, a pouco e pouco, toda a fisiologia teórica que fizera vida de Hipócrates a Alberto Magno, passando pela observação acti va de Galeno. A anatomia humana, por um lado imprescindível ao desenvolvimento da Fisiologia/Medicina, foi, por outro, inspiradora da investigação sobre anatomia zoológica, principalmente de vertebrados. De passo em passo, o estudo da mOlfologia interna dos vertebrados acabaria por dar origem à anatomia comparada, essencial para o conhecimento da marcha da evolução. Numa perspectiva diferente, criacionista, já muito antes, Pierre Belon du Mans, em um dos marcos da zoologia do Renascimento, Histoire naturelle des Oiseaux (1555), apresentava a comparação entre os esqueletos do homem e das aves. Muitos outros livros de História natural foram impressos nesta época. Cingindo a lista apenas à Zoologia, são de 18
referir, a título de exemplo, de C.Gessner.
animalium (1551 587), !cones
pedum (1553), !cones avium (1560) e
aquatilium animalium (1560); de P. Belon.
tilibus (1553) e o já refelido sobre as aves; de G,R:-- __ ::
De piscibus libri (1554) e Universae aquatiliwi' l':::::
de H.Salviani, Aquatilium animalium historiar:: 1':::
U.Aldrovandi, Ornitholo giae (1599), r,,' .. ollirnalibus exanguibus (1606), De pisciblls (1 qlladrupedibus (1616), etc. Todos, porém, zoologia do Velho Mundo, se exceptuarmos referências a animais americanos já constantes modernos de entre eles. Só a partir de meados ~C_ XVII começarão a publicar-se obras impress:.~ _ dedicadas à Históri a natural do Brasil ou países \ ,. _, :-Ja sua generalidade, estes livros tratam da características habitacionais e comportamenr~7.:s ,_ espécies. As classifieações dos seus diferentes 2.~:: ~ relevam mais dos caracteres ecológicos do estruturais. As utilizações médicas, artesanais e sempre acarinhadas e desenvolvidas. E\::: digressões filológicas sobre os nomes das ê~ acompanham os comentários relativos a autores .::.- -:" riores. O recurso às obras de Aristóteles e PUme' :: :"- geral grande, embora desigual, conforme a mais enciclopédica ou mais naturalista do cC Estabelecendo a transição entre os bestiálios e a literatura zoológica moderna, não deve admi:',:.~ .:. __ alguns descrevam, e até figurem, animais fabulo52s. ; _ \ezes mesmo com indicação da localidade em observados.
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1469 se imprimiu a História natural e 1499, as versões latina e grega, J1ateria Medica, de Dioscórides
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natural foram impressos '"'- c_::'ld apenas à Zoologia, são de
referir, a título de exemplo, de C.Gessner, Historiae animalium (1551 1587), Icones animalium quadru pedum (553), Icones avium (1560) e Nomenclator aquatiliz,urt animaliwn (1560); de P. Belon, De aqua tilibus (1553) e o já referido sobre as aves; de G .RondeI et, De piscibliS libri (1554) e Universae aquatilium (1555); de H.Salviani, Aquatilium animalium historiae (1554); de D.Aldrovandi, Omithologiae (1599), De reliquis animalibus exanguibus (1606), De piscibus (16l3), De quadrupedibus (1616), etc. Todos, porém, limitados à zoologia do Velho Mundo, se exceptuarmos algumas referênci as a animais americanos já constantes dos mais modernos de entre eles. Só a partir de meados do século XVII começarão a publicar-se obras impressas e dedicadas à História natural do Brasil ou países vizinhos . Na sua generalidade, estes livros tratam da morfologia e características habitacionais e comportamentais das espécies. As classificações dos seus diferentes autores relevam mais dos caracteres ecológicos do que dos estruturais. As utilizações médicas, artesanais e outras são sempre acarinhadas e desenvolvidas. Extensas digressões filológicas sobre os nomes das espécies, acompanham os comentários relativos a autores ante riores. O recurso às obras de Aristóteles e Plínio é em geral grande, embora desigual, conforme a tendência mais enciclopédica ou mais naturalista do autor. Estabelecendo a transição entre os bestiários medievais e a literatura zoológica moderna, não deve admirar que alguns descrevam, e até figurem, animais fabulosos, por vezes mesmo com indicação da localidade em que foram observados. 19
A publicação destas obras deconeu em paralelo com a colonização e conhecimento do Brasil. pelo que não é provável que fossem familiares aos que, plimeiramente, escreveram sobre a zoologia brasileira, de resto, em geral, homens de armas ou da igreja. Quando muito, um ou outro, conhecelia Aristóteles, Plínio ou algum clássico. A forma como abordaram e descreveram a fauna brasJ1ica foi, portanto, espontânea e ingénua, muito por comparação com os animais europeus que lhes eram mais familiares. No entanto, em Portugal, algumas obras clássicas e renascentistas de História natural foram conhecidas e utilizadas no século XVI. André de Resende [1996], por exemplo, cita Aristóteles, Plínio, Galeno e outros clássicos, bem como Rondelet (1554), na sua 'inves tigação sobre o asturjão', publicada postumamente em 1593 no Livro II de Libri Quatuor de Antiquitatibus Lusitaniae (ver também Rosado Fernandes, 1986). Porém, silenciado como todos os renovadores, André de Resende refugiou-se na erudição e é duvidoso que tenha exercido alguma influência nos colonizadores.
1______---20----------------___"~__.
Primeiros cronistas
Logo que os navios de Pedro Alvares Cabr.:: no litoral do Brasil se começou a escre'. _ gentes e a natureza para bom conhecime.:-::, ~ Portugal. Pêra Vaz de Caminha (c. 1450-1 armada, enviou longa carta em 1 de ::~:mdo conta dos indígenas e seus tracos é:- :: :·.::levantes, bem assim de alguns animais que. t:· .. . jservara. A esses animais aplicou nomes ;: ~s~lécies portuguesas ou exóticas, masjá .::':1ugueses como, por exemplo, os papagaios '.~ . Nomura (1996a) ensaia a identificação.:..
-.:: Caminha com espécies brasileiras, não
- "':10S casos (papagaios-verdes, pomba-se:
de várias possibilidades que cada um Noutras situações, como por exem;-: "' :'eferem ao 'fura-buxo', ao 'papagaio-\e:~·_. , não parece ter dú vidas em i de:-.. - s;-cctivamente, com P~~ffinus puffinus. A..• e Cacicus haemorrhous. E identicarr:e:- ao 'camarão', 'berbigão' e - -~inha, que Nomura crê conesponderew:' ' .,hiu!1l carcinus, Anomalocardía =- .. Jcoides pectinatus, respectivamente.
=t'-:;Jo de Magalhães (c.1480-1521) també-~ . - . em 1519, concretamente Guan ab ,E';}...:.. •. . . a-o o cronista Antonio Pigafetta i.l-'.:='· .. - eziano que relatou a expedição (Tauna\ ...~ ~ ..::':Tativa1 , Pigaffeta informa sobre produ:\~~ _
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obras deconeu em paralelo com a - _ 2onhecimento do Brasil, pelo que não é familiares aos que, primeiramente, :,re a zoologia brasileira, de resto, em armas ou da igreja. Quando muito, um _--:~e2eria Aristóteles, Plínio ou algum clássico. abordaram e descreveram a fauna . ;,oI1anto, espontânea e ingénua, muito por ,:om os animais europeus que lhes eram .,,"~·e5.
Portugal, algumas obras clássicas e ~--:S::;3 de História natural foram conhecidas e ____ ~ século XVI. André de Resende [1996], •• , ~lLü Aristóteles, Plínio, Galena e outros ~ ~::-:::T:", como Rondelet (1554), na sua 'inves ; - ---e astUljão', publicada postumamente em - ~ =-':"0 II de Libri Quatuor de Antiquitatibus '. er também Rosado Fernandes, 1986). _eíJdo como todos os renovadores, André na erudição e é duvidoso que -.:::::- .::2 alguma int1uência nos colonizadores.
Primeiros cronistas Logo que os navios de Pedro Álvares Cabral ancoraram no litoral do Brasil se começou a escrever sobre as gentes e a natureza para bom conhecimento do rei de Portugal. Pêra Vaz de Caminha (c.l450-1501), escrivão da armada, enviou longa carta em 1 de Maio de 1500 dando conta dos indígenas e seus traços étnicos mais relevantes, bem assim de alguns animais que, entretanto, observara. A esses animais aplicou nomes comuns de espécies portuguesas ou exóticas, mas j á familiares aos portugueses como, por exemplo, os papagaios [Caminha, 1989]. Nomura (l996a) ensaia a identificação dos nomes de Caminha com espécies brasileiras, não podendo, em certos casos (papagaios-verdes, pomba-seixa, rola) ir além de várias possibilidades que cada um desses nomes sugere. Noutras situações, como por exemplo, nas que se referem ao 'fura-buxo', ao 'papagaio-vermelho' e à 'pega' não parece ter dúvidas em identificá-los, respectivamente, com Puffinus puffinus, Ara chloro ptera e Cacicus haemorrhous. E identicamente no que respeita ao 'camarão', 'berbigão' e 'ameijoa', de Caminha, que Nomura crê conesponderem a Macro brachium carcinus, Anomalocardia brasiliana e Phacoides pectinatus, respectivamente. Fernão de Magalhães (c.1480-1521) também tocou o Brasil, em 1519, concretamente Guanabara. Acompa nhava-o o cronista Antonio Pigafetta (1491-1534), veneziano que relatou a expedição (Taunay, 1999). Na Ja narrativa! , Pigaffeta infonna sobre produtos vegetais,
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povos indígenas e seus costumes, casas, barcos, vestuário, tatuagens, ornamentos, vida conjugal, armas, etc., sendo, no entanto, tangencial no que se refere à fauna. Comenta, por exemplo, que a anta, Tapints terres tris, tem uma carne parecida com a de vaca (Pigafetta, 1801) . Legítima preocupação de todos os exploradores das novas terras, para quem era importante registar o que se podia comer. Outros exploradores pioneiros abordaram temas faunísticos, ainda que marginalmente. Um deles foi Uhich Schmidel (c.151O- ?), bávaro que passou duas dezenas de anos na América (entre 1534 e 1554), tendo viajado pelo sul do Brasil. Tudo relatou num livro apenas publicado em 1599 e cujo título, traduzido em português, é: 'História verdadeira de uma curiosa viagem feita por Ulrich Schmidel, de Straubing, na América ou Novo Mundo, pelo Brasil, Rio da Prata, desde o ano de 1534 até 1554'. Com tendência para o fabuloso (Taunay, 1999), Schmidel assegura ter visto na margem do rio Uruguai (Rio Grande do Sul) uma serpente com mais de 11 m de comprimento, que matava, por constrição, índios e veados e outros animais de grande porte de que se alimenta. Trata-se da sucuri, Eunectes murinus, espécie que atinge grandes dimensões. Também Alvaro Nunes Cabeza de Vaca (1490?-1564'1), administrador da colónia da Prata, tocou o Brasil em 1541. Registou algumas observações sobre animais comestíveis de Santa Catarina. Assim, Cabeza de Vaca referiu as lagartas (bicho-da-taquara) da borboleta Myelobia smerintha, grandes, brancas e gordas, que se
comiam fritas; a dourada, Salmínus mcx~~' excelente, cujo caldo cura toda a ; : : '-:: gafeira; o veado-campeiro, Ozotoceros pecaris cateto, Tayassu tacajus, e -, que Cabeza de Vaca designa por ja\ab: Hydrochaeris hydrochaeris, de came E. _ ~ denominada 'porco-de-água' pelo explorz:c,c" .; ~~
Hans Staden (1510 ?- 1576), artilheiro de Hesse, teve uma vida aventurosa por duas vezes ao Brasil (Franco, 1941: uma a Pernambuco (1547), a outra a Sa:1:'::~-_ (1550-1554). Regressado à Europa, pub:i~c~. o relato das suas aventuras, que tem conhe,-_,:::,:
número de edições e de traduções [vg
1988].
:-Ja parte do seu livro que intitula 'Relatól~O ~= -~: . animais daquela terra', que compreende os ;;':::::. 2. 36 [Staden, 1988], apresenta comentário espécies observadas. Reconheceu entre semelhantes aos da sua terra natal, como :eitões, morcegos, embora maiores e hema:6:_= ~-\limentou-se de vários e comenta as c.:':' :Eetéticas: o tatu, Dasypus septemcinctl/s. te: ~orda; a capivara, Hydrochaeris hydrochaer; , :e:-' :om sabor à de porco; as abelhas, .·ngllstllla, Melipona quadrifasciata e " ":lstica, produzem bom mel, sobretudo 2.~ ::,:::: _ :Jescreve a bolsa marsupial da sariguei:l. :;. .::!rita, referindo o número de crias, mais o:; :::~e- ~ .~:.;e nela se protegem. A capivara é maior"':_ - _:
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comiam fritas; a dourada, Salminus maxillosus, peixe e seus costumes, casas, barcos,
excelente, cujo caldo cura toda a espécie de lepra ou omamentos, vida conjugal, armas,
gafeira; o veado-campeiro, Ozotoceros bezoarticus; os :.':~:;::nto, tangencial no que se refere à
pecaris - cateto, Tayassu ta cajus , e queixada, Tpecari ~". ;.x· exemplo, que a anta, Tapirus terres
-, que Cabeza de Vaca designa por javalis; a capivara, ,~,' " :: ::';~e parecida com a de vaca (Pigafetta,
Hydrochaeris hydrochaeris, de carne excelente e : :-:''::' p:~eocupação de todos os exploradores
denominada 'porco-de-água' pelo explorador espanhol. ;; n:iffl quem era importante registar o
__ .__ Rans Staden (1510 ?- 1576), artilheiro alemão natural :,:-:~er.
-- ..:::ores pioneiros abordaram temas -~ cue marginalmente. Um deles foi Ulrich - ,\ :), bávaro que passou duas dezenas ' - -~ .~.:a (e!1tre 1534 e 1554), tendo viajado . Tudo relatou num livro apenas ~ ~99 e cujo título, traduzido em pOltuguês, de uma curiosa viagem feita por Straubing, na América ou Novo -, Rio da Prata, desde o ano de 1534 ~ :c!1dência para o fabuloso (Taunay, :.:.': assegura ter visto na margem do rio do Sul) uma serpente com mais de ':-·::-":.~lento, que matava, por constrição, índios animais de grande porte de que se ~~ :~.-Se sucuri, Eunectes murinus, espécie '::'~~2eS dimensões. ~
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Cabeza de Vaca (1490?-1564?), a da Prata, tocou o Brasil em ~~:g'Jmas observações sobre animais 5.::.::.1 Catarina. Assim, Cabezade Vaca ::,. i bicho-da-taquara) da borboleta ~~. grandes, brancas e gordas, que se
de Resse, teve uma vida aventurosa que o levou por duas vezes ao Brasil (Franco, 1941; Horch, 1994), uma a Pernambuco (1547), a outra a Santa Catarina (1550-1554). Regressado à Europa, publicou em 1557 o relato das suas aventuras, que tem conhecido grande número de edições e de traduções [vg Staden, 1837, 1988]. Na parte do seu livro que intitula 'Relatório sobre alguns animais daquela terra', que compreende os capítulos 30 a 36 [Staden, 1988], apresenta comentários sobre as espécies observadas. Reconheceu entre elas animais semelhantes aos da sua terra natal, como veados, javalis, leitões, morcegos, embora maiores e hematófagos, etc. Alimentou-se de vários e comenta as qualidades dietéticas: o tatu, Dasypus septemcinctus, tem a carne gorda; a capivara, Hydrochaeris hydrochaeris, tem carne com sabor à de porco; as abelhas, Tetragonisca angustula, Melipona quadriJasciata e Scaptotrigona postica, produzem bom mel, sobretudo as pequenas. Descreve a bolsa marsupial da sarigueia, Didelphis aurita, referindo o número de crias, mais ou menos seis, que nela se protegem. A capivara é maior do que uma 23
ovelha e tem cabeça semelhante à da lebre, embora de orelhas curtas. Corre velozmente e refugia-se na água se assustada. André Thevet (1502-1592), franciscano francês, viajou para o Brasil como capelão da expedição de Nicolas Vtllegagnon (1510-1572). Na sequência desta expedição, estabeleceu-se em 1555 um povoamento na Baía de Guanabara, onde hoje se situa Rio de Janeiro: 'França antárctica'. Os franceses cobiçavam as produções brasileiras, nomeadamente plantas tintureiras e medicinais, especiarias, algodão, ouro, peles, plumas e animais exóticos, sobretudo macacos, papagaios c colibris (Morisot, 1975; Magalhães, 1998). A França antárctica teve duração efémera, pois em 1560, os portugueses destroçaram as suas fortificações. Alguns franceses, todavia, permaneceram na região misturados com os índios (Brown, 1994; Perrone-Moisés, 1994). Regressado a França, Thevet publicou o seu relato sobre o Brasil (1558), não sem fantasias, sobretudo iconográficas (Taunay, 1999), que lhe valeram fortes críticas de Jean de Léry. A despeito disso, o livro de Thevet (1558) foi traduzido e reeditado várias vezes (vg Thevet, 1561). Há também tradução moderna em português [Thevet, 1944]. Em Les singularités de la France antarctique, Thevet (1558) relata, de facto, a sua longa viagem por África e América, incluindo Madeira, Cabo Verde, Guiné, Madagascar, etc., de tal modo que só no capítulo 24 atinge a França antáretica. Descreve mamíferos, aves, répteis, anfíbios, peixes, moluscos e insectos do Brasil, publicando figuras, quase todas de muito má qualidade, 24
que permitem duvidar sobre se e~ observou os animais. Referir-se-á. ;::" tucano (p.91), Ramphastus 1 -" desmesurado, com o tamanho do .:::~ , preguiça, Bradypus sp., de face lnr::..:· .. _ com os filhos sobre o dorso, que co Estreito de Magalhães. Insere O~:::· .. ~ sobre os Índios e seus costumes guerra. antropofagia, funerais, etc.) e r. alimentam, prosseguindo depois o re;~::: _ Cuba, Florida, Canadá e Terra No\~:. Taunay (1999) comenta com bonor:1: franciscano. Jean de Léry, porém, Villegagnon ao Brasil, incluído na fracç - '_: que este transportou, considera Tl:~ mentiroso. O franciscano é, com fustigado por Léry nos seus li vros Polémica religiosa e não propriamente . ~ observações de cada um, na opinião de r
A brevidade dos contactos destes com o litoral brasileiro ou a sua outros tcmas - os que respeita\:lr:'. humanas, por exemplo -, não lhes simples menção dos animais comestÍ\e:s , ou conspícuos, que descreveram e comparação com as espécies europe: ::3 ..' que conheciam. Assim, as referêrL':' :" dietéticas do tapir, ou anta, do tatu . ...:., ., bem corno as representações caric os nomes europeus atribuídos às
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semelhante à da lebre, embora de OlTe 'velozmente e refugia-se na água se
1502-1592), franciscano francês, viajou .: :. ~--~:. 2omo capelão da expedição de Nicolas . - ~ 510-1572). Na sequência desta expedição, .. - .:-;~ 1555 um povoamento na Baía de -:-.-::'~ se situa Rio de Janeiro: 'França :: ;'ranceses cobiçavam as produções plantas tintureiras e medicinais, ouro, peles, plumas e animais macacos, papagaios e colibris - 5. "\ICis:alhães, 1998). A Franca , antárctica pois em 1560, os portugueses s ~:~,s fortificações. Alguns franceses, .. _':-.;;": er~1m :1a região misturados com os índios :...:.. ?er:·one-.\10isês, 1994). Regressado a o seu relato sobre o Brasil (1558), iconográficas (Taunay, 1999), de Jean de A despeito 8) foi traduzido e reeditado 1). Há também tradução ~
Thevet
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no capítulo 24
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ClntCll'ctique,
efectivamente, que permitem duvidar sobre se observou os animais. Referir-se-á, em particular, um tucano (p.91), Ramphastus vitellinus, de bico desmesurado, com o tamanho do corpo do animal; a preguiça, Bradypus sp., de face humana; e um animal com os filhos sobre o dorso, que denomina Su Cp. 109), do Estreito de Magalhães. Insere outras observações sobre os Índios e seus costumes (alimentação, magia, guena, antropofagia, funerais, etc.) e plantas de que se alimentam, prosseguindo depois o relato da viagem até Cuba, Florida, Canadá e Nova. Taunay (1999) comenta com bonomia os dislates do franciscano. Jean de Léry, porém, que também foi com Villegagnon ao Brasil, incluído na fracção de protestantes que este transportou, considera Thevet um grande mentiroso. O franciscano é, com efeito, duramente fustigado por Léry nos seus livros (Léry, 1580, 1604). Polêmica religiosa e não propriamente levantada pelas observações de cada um, na opinião de Magalhães (1998). brevidade dos contactos destes primeiros cronistas com o litoral brasileiro ou a sua maior curiosidade por outros temas os que respeitavam às populações humanas, por exemplo -, não lhes permitiu ir além da simples menção dos animais comestíveis ou mais bizan'os ou conspícuos, que descreveram e denominaram por comparação com as espécies europeias ou domésticas que conheciam. Assim, as referências qualidades dietéticas do tapir, ou anta, do tatu, da capivara, etc., bem como as representações caricaturais de Thevet e os nomes europeus atribuídos às espécies mais comuns. 25
Naturalistas pioneiros
Não obstante contribuições desiguais no
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Naturalistas pioneiros Não obstante contribuições desiguais no domínio da Zoologia, este primeiro grupo de naturalistas, todos conhecedores da natureza brasílica do século XVI, foi, por assim dizer, o fundador da História natural do Brasil. Considera-se aqui culminado pela obra de Gabriel Soares de Sousa (c.1540-1592), que observou uma importante quantidade de espécies animais. Atendendo à primeira divulgação, ainda que restrita, das observações sobre os animais do Brasil, é José de Anchieta (1534 1597), o 'naturalista' que tem prioridade. Por isso, se conferirá aqui maior desenvolvimento aos seus comentários, apresentando os dos naturalistas subsequentes desta primeira fase (1560-1587) mais na tentativa de preencher eventuais lacunas do relato de Anchieta. Ainda assim, o texto é repetitivo, não só porque a atracção destes pioneiros se concentrava, por moti vos idênticos, em determinadas espécies, como ainda por certas particularidades de ordem biológica, ou outra, serem tão interessantes, que pareceu vantajoso realçar os pormenores anotados por cada um deles. Respeitou-se, tanto quanto possível, a grafia confelida por cada autor aos nomes tupi-guarani. Isso mostra a forma como soavam aos ouvidos de cada um, adaptados a línguas ou dialectos eventualmente distintos, as nomenclaturas etnozoológicas locais. Para já, a apresentação dos protagonistas desta fase pioneira, na maioria portugueses: José de Anchieta, Pêro de :VIagalhães Gândavo (c.1540 ?), Jean de Léry,
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Femão Cardim (1548? Sousa.
1625) e Gabriel Soares de
José de Anchieta. Foi o primeiro grande naturalista do
Brasil. Natural das Ilhas Canárias, veio para Portugal com anos e estudou na Universidade de Coimbra (França, 1926a). Ingressou na Companhia de Jesus em 1551 e viajou para o Brasil em 1553, instalando-se na capitania de São Vicente. Viveu todo o resto da sua vida no Brasil, sendo nomeado provincial em 1578 (Horch, 1994). Dos seus escritos se depreende que, embora sem qualquer formação específica de naturalista, foi um excelente observador. O que escreveu permaneceu, infelizmente. reservado finais do século XVIII, pois fê-lo sob a forma de cartas enviadas ao padre da Companhia de Jesus. desejava [Anchieta, 1933a] que Anchieta escrevesse "acêrca do que suceder connosco que seja digno de admiração ou desconhecido nessa parte do mundo." Assim, na sua CaIta de 3] de maio de 1560, Anchieta [1933a] refere cerca de setenta espécies animais . Utilizando, umas vezes, nomes portugueses, outras, a nomenclatura dos Índios, ultrapassa no número e qualidade de observação Hans Staden ou André Thevet. Uma preocupação é evidente em Anchieta: esclarecer o padre geral sobre a utilidade ou perigosídade dessas espécies. Com efeito, três quartos das espécies mencionadas são comentadas relati vamente a essas qualidades. 28
\1a1s de metade das espécies referidas algumas delas, como por exemplo o igllaraguá (Trichechus l1Umatlls). I:' (Myrmecophaga tridactyla) e o uc: l/ovemcinctus), de excelente palatabilidadê. - , Pterol1ura brasiliensis, Lutra el1udris e ~ .. '
fomeciam pele para a confecção de cir:tcs.:': anta (7àpirus terrestris), para além de cone uma pele tão dura que com ela os Índios êscudos de defesa. Diversas espécies de por exemplo A1elipona quadrifasciata e T,', émgllstula, fabricam mel que era utilizado co~'.. ~ feridas. Sobre os peixes, diz Anchieta saudaveis nesta terra e podem-se come:' : ' prejudicar a saúde, e na doença, Se~~ sama, que aqui não existe em parte algum~L" papagaios, de diferentes espécies (Pyrrh:<, ::ona C/estiva, etc.), são "todos bc .):nerem [mas] alguns deles produzem p11S;}.:: ave marinha, o guará (Eudocil1111S ru;'C o anotador de Anchieta, ] 933a), exibe da coloração, sendo branca quando jU\ e~: depois, branca menos alva a seguir e, plumas purpúreas, lindíssimas, eram mLr pelos Índios, que com elas se enfeita\un', festivas [Anchieta, 1933a]. Para além das mencionadas, muitas outras boas de comer-se", como escreve o (Caiman latirostris); a capivara : lz.vdroclzaeris); todas as serpentes, wne:- s_,
- 1625) e Gabriel Soares de
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Mais de metade das espécies referidas são comestíveis, algumas delas, como por exemplo o peixe-boi, ou iguaraguá (Trichechus manatus), o tamanduá (Myrmecophaga tridactyla) e o tatu (Dasypus novemcinctus), de excelente palatabilidade. As lontras, Pterollura brasiliellsis, Lutra enudris e L.platensis, forneciam pele para a confecção de cintos. O tapir, ou anta (Tapirus terrestris), para além de comestível, tem uma pele tão dura que com ela os Índios confeccionavam escudos defesa. Diversas espécies de abelhas, como por exemplo Melipona quadrifasciata e Tetragol1ura angustula, fabricam mel que era utilizado como curativo de feridas. Sobre os peixes, diz Anchieta [1933a]: " ...são mui saudaveis nesta tena e podem-se comer todo o ano sem prejudicar a saúde, e até na doença, sem receio de sarna, que aqui não existe em parte alguma." Os papagaios, de diferentes espécies (Pyrrhurafrontalis, Amazona aestiva, etc.), são "todos bons para se comerem [mas] alguns deles produzem prisão de ventre." Uma ave marinha, o guará (Eudocimus ruber, segundo o anotador de Anchieta, 1933a), exibe variação etária da coloração, sendo branca quando juvenil, cinzenta depois, branca menos alva a seguir c, enfim, púrpura . plumas pw-púreas, lindíssimas, eram muito estimadas pelos Índios, que com elas se enfeitavam em épocas festivas [Anchieta, 1933a]. Para além das mencionadas, muitas outras espécies "são boas de comer-se", como escreve o jesuíta: o jacaré (Caiman latirostris); a capivara (Hydrochaeris hydrochaeris); todas as serpentes, venenosas ou não, 29
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após ser-lhes cortada a cabeça; as onças, a que Anchieta chama panteras (Felis cOlIcolor e Panthera anca); os macacos (Alouatta caraya e Cebus robustus) , etc.
ou muçurana (Pseudoboa cloelia). cf:':.::-: ~_ não é mortífera; a sua mordedura pro\c : _ ~ _ no corpo.
Porém, há também muitas espécies perigosas ou nocivas, de que Anchieta deu notícia ao padre geral. Assim, a sucuryúba, ou sucuri (Eunectes murinus), de maravilhoso tamanho e que engole um veado inteiro. Enrosca-se nas presas e mata-as "introduzindo-lhes a cauda pelo anus." Isto, ouvia Anchieta dizer, como ouvia dizer que, por não poderem digerir as grandes presas, lhes apodrece o ventre juntamente com a comida; depois, as rapaces rasgam-lhes o ventre e devoram-no, bem como o conteúdo. A serpente regenera o ventre "e volta a antiga fórma."
Outros animais, sem que a sua morée~ __ :-_ seja mortal, causam, todavia, grandes do::-e~ e Um escorpião, bóiquiba (Tityus bahic': . picada extremamente dolorosa durante - _. horas. Uma lagarta, que Anchieta diz se::- ~e centopeia, é coberta de pelos que, ao to.::-::.-e: produzem dor durante horas. Trata-se dJ·,;~_ que significa "que queima como fogo" I se;.:: anotadores de Anchieta, 1933a), ou l~~-::.:-._ lagarta da borboleta Megalopyge lcm,~:_ .. com Buzzi (1994). Os Índios usavam-na .:::::-: sexual, aplicando-a nas partes genitais: ~e resultavam por vezes infecções incur2.\e~ 1933a].
Perigoso é também o jacaré, que tem agudíssimos dentes e pode engolir um homem. As garras e dentes das lontras podem, igualmente, maltratar as pessoas. Porém, o caso era verdadeiramente grave com as serpentes venenosas. As jararacas (Bothrops jararaca e B.atrox), abundantes em toda a parte, matavam as pessoas mordidas em vinte e quatro horas. No entanto, quem porventura não morresse, adquiria imunidade, como o próprio Anchieta observou por mais de uma vez. A bóicininga, ou cascavel (Crotalus durissus), cuja mordedura paralisa a visão, o ouvido, os movimentos do corpo e, finalmente, provoca a morte. A ibibobóca, ou coral (Micrurus frontalis e M.ibiboboca), mais rara, a bóiguatiára, ou cotiara (Bothrops cotiara), e a bóipeba, ou cobra-chata (Xenodon merremii), todas mortíferas. Já a bóiroiçanga, 30
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Grande diversidade de moscas e mosq~:::: ~ de sangue importunam as pessoas. s:::-: yerão. O marigui (Culicoides spp.). pc:-e~ praga terrível. Habita a beira-mar e as..::: -; yoca um ardor extremamente incomc~::: alguns dias.
Para além destes e outros comentários e ..:e' espécies, por vezes excelentes, Anchiec. ~ ~: a história natural dos animais, freque:-:e observação directa, mais raramente :',::- : Alguns dos seus relatos são muito cur:.,: ~:' descrição da monção de verão, grandes ::-. _- .
a cabeça; as onças, a que Anchieta cOHcolor e Panthera onca); os caraya e Cebus robustus), etc.
ou muçurana (Pseudoboa cloelia), embora venenosa, não é mOltífera; a sua mordedura provoca grande algidez no corpo.
muitas espécies perigosas ou nocivas, deu notícia ao padre geral. Assim, a ,:,u sucuri (Eunectes murinus), de , ~ ~ :J.2lanho e que engole um veado inteiro. _ ,-':: ~2S ores as e mata-as "introduzindo-lhes a - = ' :,:-ClS," Isto, ouvia Anchieta dizer, como ouvia não poderem digerir as grandes presas, o \'entre juntamente com a comida; depois, :::S :-lsgam-lhes o ventre e devoram-no, bem A serpente regenera o ventre "e volta
Outros animais, sem que a sua mordedura ou picada seja mortal, causam, todavia, grandes dores e incómodos. Um escorpião, bóiquiba (Tityus bahiensis), tem uma picada extremamente dolorosa durante vinte e quatro horas. Uma lagarta, que Anchieta diz ser semelhante à centopeia, é coberta de pelos que, ao tocarem no corpo, produzem dor durante horas. Trata-se da tatarana, nome que significa "que queima como fogo" (segundo um dos anotadores de Anchieta, 1933a), ou lagarta-cabeluda, lagarta da borboleta Megalopyge lanata, de acordo com Buzzi (1994). Os Índios usavam-na como excitante sexual, aplicando-a nas partes genitais; de tal prática resultavam por vezes infecções incuráveis [Anchieta, 1933a].
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_ ,,~rbém o jacaré, que tem agudíssimos dentes _ :-:-,:,_ ::r um homem. As garras e dentes das lontras ,,' .; _:.:::.rnentc, maltratar as pessoas. Porém, o caso ;'_.:.:::-::'.::.mente grave com as serpentes venenosas. _"s 'Borhrops jararaca e B.atrox), abundantes
::-.:.:::e. matavam as pessoas mordidas em vinte -~=-as.
0Jo entanto, quem porventura não imunidade, como o próprio Anchieta de uma vez. A bóicininga, ou '. IIS durissus), cuja mordedura paralisa a , :::,J. os movimentos do corpo e, finalmente, -=-='r:e. ibibobóca, ou coral (Micrurus mais rara, a bóiguatiára, ou cmiara), e a bóipeba, ou cobra-chata l. todas mOltíferas. Já a bóiroiçanga,
Grande diversidade de moscas e mosquitos sugadores de sangue importunam as pessoas, sobretudo no verão. O marigui (Culicoides spp.), porém, era uma praga terrível. Habita a beira-mar e a sua picada pro voca um ardor extremamente incomodatívo durante alguns dias. Para além destes e outros comentários e descrições de espécies, por vezes excelentes, Anchieta discorre sobre a história natural dos animais, frequentemente por observação directa, mais raramente por ouvir dizer. Alguns dos seus relatos são muito curiosos. Assim, a descrição da monção de verão, grandes inundações por 31
ela provocadas e a piracéma, ou seja, a 'saída dos peixes', que "se metem pelas ervas em pouca agua para desovar." Quando, no estio, a inundação é maior e 'saiem' em cardumes consideráveis. até à mão se deixam apanhar2 • Descreve, igualmente, a 'entrada dos peixes' - pira-iquê na linguagem dos Índios -, nos estuários e lagunas litorais em que desovam e estabelecem zonas de criação. Segundo o anotador de Anchieta [1933a], trata se sobretudo de espécies de Mugil. Os Índios enCUlTa lavam-nos em cercas e atordoavam-nos com suco de timbó (Paulinia pimwta, uma sapindácea, de acordo com um anotador de Anchieta, 1933a), colhendo-os depois em grandes quantidades.
É igualmente interessante o relato do encontro com uma serpente que Anchieta mata à bastonada. Verifica, estupefacto, que do ventre dela saem as clias, em número de onze. O frade ignorava que a maioria dos ofídios são vivíparos, não saindo os ovos do corpo da mãe, que, assim, os transporta e protege até à eclosão. Ouvira, entretanto, contar que, por vezes, uma serpente fêmea transporta quarenta crias. As aranhas, muito diversificadas, causavam-lhe uma viva repugnância pelo aspecto e odor. Refere que um vespão (Pepsis elevata) as mata e transpOlta para as suas tocas, onde as come. Não é bem assim, pois o vespão depõe a sua postura no corpo da aranha e são as larvas dele que se alimentarão da aranha (segundo um anotador de Anchieta, 1933a). A alimentação e postura de defesa do tamanduá são descritos com pormenor por Anchieta, bem assim os 32
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hábitos do tapiíra, ou anta, e da (Bradypus tridactylus). O marsúpi (Didelphis aurita) também foi obsenad(, que diz já ter morto muitas, uma delas CC'C'. , • bolsa marsupial. Quanto às puas do o~r:~ , l'il!OSUS), dá crédito à ideiajá antiga qualquer objecto, se movimentam ' penetrando-o, sobretudo se for carne. A,', :' ~ _ e resistência que oferece a ser retirado escava são outras particularidades que Também lhe chamou a atenção o bicho-d~:.-~,.. mhú. Vive no interior de um bambu, a tem a grossura de um dedo, sendo mui pelos Índios, que o comem assado. Além diss .. ' com eles uma gordura utilizada para cozin'L:' . ,,:ouros (Buzzi, 1994). Diz Anchieta que se ,,:om o bicho-da-taquara "que em nada de porco estufada." .Ylas, diz mais: "Destes' - , se tornam borboletas, outros saem ratos. a sua habitação debaixo das mesmas porém se transformam em lagartas, que :\creditaria o jesuíta nesta espécie múltipla? Discorrendo sobre a grande diversidade c;:;
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de defesa do tamanduá são por Anchieta, bem assim os
hábitos do tapiíra, ou anta, e da preguiça, ou aig (Bradypus tridactylus). O marsúpio da sarigueia (Didelphis aurita) também foi observado por Anchieta, que diz já ter morto muitas, uma delas com sete crias na bolsa marsupial. Quanto às puas do ouriço (Coendou villosus), dá crédito à ideiajá antiga de que, ao tocarem qualquer objecto, se movimentam por si próprias, penetrando-o, sobretudo se for carne, A força do tatu e resistência que oferece a ser retirado dos buracos que escava são outras particularidades que Anchieta anota. Também lhe chamou a atenção o bicho-da-taquara, ou rahú. Vive no interior de um bambu, a taquara-do-mato, e tem a grossura de um dedo, sendo muito apreciado pelos Índios, que o comem assado. Além disso, obtinham com eles uma gordura utilizada para cozinhar e engraxar couros (Buzzi, 1994). Diz Anchieta que se faz um guisado com o bicho-da-taquara "que em nada difere da carne de porco estufada." Mas, diz mais: "Destes insectos uns se tomam borboletas, outros saem ratos, que construem sua habitação debaixo das mesmas taquaras, outros porém se transformam em lagartas, que roçam as ervas." .-\creditaria o jesuíta nesta espécie de heterogonia múltipla? Discorrendo sobre a grande diversidade de formigas, Anchieta comenta a etno-nomenclatura brasílica, pois, segundo ele, os Índios reconhecem nominalmente as espécies, mas raramente os géneros 3 : " ... assim, não há nome generico da formiga, do caranguejo, do rato e de muitos outros animais; das especies, porém, que são quasi infinitas, nenhuma deixa de ter o seu nome
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proprio..." Uma dessas fonnigas lhe chamou a atenção: arruivada, cheirando a limão quando triturada e cons truindo grandes ninhos subterrâneos. Os Índios chamam lhe içá (Atta sexdens). Anchieta descreve o ciclo dela com imprecisões naturais no seu tempo, assinalando a ansiedade com que os Índios aguardam a saída dos grandes enxames de fonnas aladas, que " ... muitas vezes ... formam uma nuvem, no ar." Após a fecundação, as rainhas procuram no solo lugares adequados à fundação de novas colónias e é nesta altura que os Índios as colhem em grande quantidade. Assadas em vasilhas de ban'o são um excelente petisco, deleitável e saudável na opinião, fundamentada na experiência, de Anchieta. A içá paga também um pesado tributo a várias espécies de aves - três espécies semelhantes a andorinhas, segundo Anchieta -, que lhes devoram o abdomen. Assim, muito poucas formigas aladas escapam, diz o frade-naturalista.
Atta sexdens, içá, ou saúva-limão, vive em fonnigueiros subterrâneos formados por 'panelas' interligadas. As formigas do género Atta cortam plantas (destroem as árvores, segundo Anchieta) e transportam o material vegetal para as colónias, vivendo à custa de um fungo, geralmente Pholiota gongyllophora, que cresce sobre aquele material orgânico (Buzzi, 1994). Içá parece ser um nome mais particularizado para as formas sexuadas e aladas, afinal as que interessavam aos Índios como alimento. Não se alarga muito sobre as aves o excelente jesuíta. Pouco junta às referências dietéticas ou utilitárias já 34
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dietéticas ou utilitárias já
mencionadas. No entanto, também acerca delas insere algumas curiosas notas. Assim, sobre o guainumbf I Colibri serrirostris), que se alimentaria apenas de orvalho. E um dos "géneros" de guaínumbf, segundo se afirmava, gera-se da borboleta. Era a crença do tempo, refere um dos anotadores de Anchieta [1933a]; mas, nem por isso, mais esta referência deixa de legitimar, por parte de Anchieta, a aceitação da heterogonia como possibilidade. Também terá observado a ema (Rhea americana), a que chama avestruz, e a anhíma (Anhíma comuta), que zurra como um asno e é descrita por Anchieta nos seus traços morfológicos e comportamentais mais conspícuos.
A informação de 1585. Não se ficou Anchieta pela carta ao padre geral. Vinte cinco anos depois enviaria, também ao geral da Companhia de Jesus, uma informação sobre o Brasil conhecido [Anchieta 1933b]. Agora, não faltam igualmente referências aos comeres. Na secção sobre 'carnes' realça que só então começaram a chegar animais domésticos do Reino, sendo ainda poucos. Todavia, os "animais da terra", existem em abundância, embora, em geral, não se encontrem para comprar. Também o pescado é abundante, pois todas as capitanias são portos de mar. É abundante e "tão bom que se come sôbre tudo e sôbre leite, e ás vezes sem azeite nem vinagre e dá-se aos enfermos de febre como galinha ou outras aves." Baleias há muitas e grandes por toda a costa. Da janela do seu cubículo, na Baía, Anchieta via-as no mar "andar saltando". Faziam-se grandes
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chacinas de peixes-bois na foz dos rios e a sua carne era muito apreciada: "cozinha-se com couves e sabe á carne de vaca; se com especiaria, sabe a carneiro e tambem a porco ..." Os peixes-bois podiam atingir 450 kg de peso. Havia muitas tartarugas, algumas enormes, "que 20 homens não podiam volver". E capivaras e lontras, bem como mariscos por toda a costa. As ostras eram tantas que havia ilhas cheias das suas valvas. Fazia-se com estas uma cal para os edifícios "tão boa como a de pedra." Na secção que intitula 'Bichos', Anchieta [1933b] adverte dos perigos que representam no Brasil as serpentes venenosas, jacarés e onças. Este clima, diz Anchieta, "parece influir peçonha nos animais e serpentes e assim cria muitos imundos, como ratões, morcegos, aranhas muito peçonhosas." Refere os coatís (Nasua spp.), brincalhões que tudo revolvem e fmtam e "são de estima por estas e outras habilidades que têm.". Torna a mencionar a preguiça, que parece um cão felpudo, como um perdigueiro pOltuguês, e é muito feia: "a cara parece de mulher velha mal toucada." As formigas, inúmeras e diversificadas, são a destruição daquela terra: "minam as casas, as igrejas, as camaras ... se as deixam, em uma noite não fica folha nos roçados de mandioca e nas parras, laranjas, limões, e hortaliças de POltugal ... " Os lavradores tinham que as combater com fogo e água, pois se assim não fosse, não havia cultura que lhes resistisse4 •
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Pêra de Magalhães Gândava. de 1540 e foi professor e humanist:::. :-:. câmara de D.Sebastião, viveu aI 2ntes de 1561 (Horch, 1994), cJntemporâneo de Anchieta. Seguncic :':: Gàndavo viveu na Baía e em Ilhéus._ :'cm essas capitanias. Regressado a ---: ._ "m primeiro manuscrito que ~rovíncia do Brasil' e dedicou à raÍl;!'L:<, :Jepois, retocou e aumentou esse tc\ ~gora 'Tratado da Terra do Brasil' e c::-; :edicatória ao Cardeal D.Henrique ficou ainda satisfeito e aperfeiçoe: .. ~e o novo título de 'História da Cruz' e dedicando-o a D.Lioms ~ovemador de Malaca. Foi este _,ma vez revisto e aumentado, que Lisboa, imprimiu em 1576 -.úmero de exemplares impressos te:'â ;equeno, pois em Portugal, nessa ::1centivava a divulgação de publicações s' Quando se compara o que Gânda\o ... sobre a fauna em 'Tratado da Pro','" ~ editado pela primeira vez em 1965 :mpressa em 1576 ( reeditada em 1ç 5 ~ .mmento significati vo nas suas infolT1c:", ;:' em Gândavo [1958] são dedicados J IX) à fauna. ~o
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Pêra de Magalhães Gândavo. Nasceu em Braga cerca 1540 e foi professor e humani sta insi gne. Moço de câmara de D.Sebastião, viveu algum tempo no Brasil, antes de 1561 (Horch, 1994), pelo que terá sido aí contemporâneo de Anchieta. Segundo Nomura (1996a), Gândavo viveu na Baía e em Ilhéus, pois descreve muito bem essas capitanias. Regressado a Portugal, escreveu um primeiro manuscrito que íntitulou 'Tratado da Província do Brasil' e dedicou à raínha-avó, D.Catarina. Depois, retocou e aumentou esse texto, intituJando~o agora 'Tratado da Tena do Brasil' e consagrando~o em dedicatória ao Cardeal D.Henrique [Gândavo, 1980]. Não ficou ainda satisfeito e aperfeiçoou o texto, dando lhe o novo título de 'História da Província de Santa Cruz' e dedicando-o a D.Lionis Pereira, que foi governador de Malaca. Foi este último manuscrito, mais uma vez revisto e aumentado, que António Gonçalves, de Lisboa, imprimiu em 1576 [Gândavo, 1958]. O número de exemplares impressos terá sido relativamente pequeno, pois em Portugal, nessa época, não se incentivava a divulgação de publicações sobre as colónias .
Quando se compara o que Gândavo [1965] escreveu sobre a fauna em 'Tratado da Província do Brasil' (editado pela primeira vez em 1965) com a versão impressa em 1576 ( reeditada em 1958), verifica-se aumento significativo nas suas informações. Com efeito, em Gândavo [1958] são dedicados quatro capítulos (VI a IX) à fauna. No capítulo 'Dos animaes e bichos venenosos que há nesta província', Gândavo [1958] diz não existirem 37
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animais domésticos antes de os pOltugueses aí chegarem. Depois, levaram de Cabo Verde cavalos e bois, que, na época em que Gândavo visitou o Brasil, formavam já notáveis contingentes5 • "Os outros animaes que na terra se acharam, todos são bravos de natureza, e alguns estranhos nunca vistos em outras partes", escreveu ele. Muitos veados e porcos de diversas espécies " ... monteses como os desta terra ... e outros mais pequenos, que tem o embigo nas costas ... " Estes últimos são os pecaris 6 , actualmente denominados cateto (Tayassu tacaju) e queixada (T.pecari). Mas, Gândavo observou outras espécies: antas (Tapirus terrestris), cotías (Dasy procta azarae), pacas (Agouti paca), tatus (Dasypus novemcinctus) e coelhos (Sylvilagus brasiliensis). De todos aponta caracteres morfológicos e comportamentais mais conspÍCuos e qualidades dietéticas. Assim, considera a came dos veados e porcos muito saborosa e tão sadia que se dava aos doentes; a da anta com o sabor da de vaca; a do tatu a melhor e mais estimada, sabendo quase como galinha, etc. A paca é pelada como o leitão e não esfolada porque a pele é muito tenra e saborosa. Não havia restlições à caça (" ... nam há la impedimêto de coutadas como nestes Reinos...") e um único Índio, se bom caçador, sustentava a sua casa só com carne do mato.
Há, contudo, outros animais sobre os quais Gândavo se alarga por particulatidades não dietéticas. Está neste caso b o _jaauar (Panthera onca), que designa por tigre e de que refere a ferocidade e prejuÍzos causados à caça. Os "cerigões", ou sarigueias (Dídelphis aurita), de que 38
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descreve a bolsa marsupial e a dispos:,,, seu interior, conjecturando sobre a pali~ morfologia e hábitos da preguiça (BrclLi~ ." •. e do tamandoá (Mynnecophaga pormenorizadamente. E ainda os saguis (Leontopithecus e Callithrix). Também se ocupou das serpentes. As 5'...:_ .. ::nuy grãdes), Eunectes murinus, que engc::.::--:' :mimal da terra por grãde que seja". E :~~ \enenosas, umas, Crotalus duriss1l5, rabo huã causa que soa quasi como _ outras, peçonhentas" ... especialmer:e chamam Gerarácas [Bothrops] ... que se.: ::norder alguã pessoa de maravilha iura sam vinte e quatro horas." Nas "lagartos muy grãdes ... cujos testiculos c almisquere "Referia-se aor:J.C l. .atirostris.
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descreve a bolsa marsupial e a disposição das crias no seu interior, conjecturando sobre a parição do animal. A morfologia e hábitos da preguiça (Bradypus torquatus) e do tamandoá (Mynnecophaga tridactyla), que refere porrnenorizadamente. E ainda os bogios (Alouatta) e saguis (Leontopithecus e Callithrix). Também se ocupou das serpentes. As sucuris ("cobras muy grãdes), Eunectes murinus, que engolem "qualquer animal da terra por grãde que seja". E as serpentes venenosas, umas, Crotalus durissus, que "tem na põta do rabo huã cousa que soa quasi como cascavel ... ", outras, peçonhentas " ... especialmente huãs a que chamam Gerarácas [Bothrops] ... que se acertã de morder alguã pessoa de maravilha escapa, e o mais que dura sam vinte e quatro horas." Nas lagoas e rios havia "lagartos muy grãdes ... cujos testiculos cheirão melhor que almisquere "Referia-se ao jacaré, Caiman latirostris . Havia muitos outros animais venenosos que Gândavo não refere, pois seria história muito comprida. E não poderia deixar de os haver " ... pela disposiçam da terra e dos climas que a senhoream ... porque como os ventos que procedem da mesma terra, se tomem inficionados das podridões das hervas, matos, e alagadiços, geram se com a influencia do Sol ... muitos e mui peçonhétos, que por toda a terra estã esparzidos ... " Crença da época esta 'criação' influenciada pelo clima, que, como se verificou, Anchieta compartilhava: animais venenosos espontaneamente gerados da podridão com a partici pação do calor solar. 39
Pêra de Magalhães encontrou grande vatiedade nas finas e alegres cores das aves do Brasil. Porém, apenas trata das "que na terra sam mais estimadas dos Portugueses e Índios ... " Entre as rapaces havia águias, açores e gaviões. As águias (na realidade, a harpia, Harpia harpyja) eram capturadas pequenas, ainda no ninho, e criadas em cativeiro pelos Índios, que se adornavam com as suas penas. "Os Açores sam como os de cá... " escreveu Gândavo [1958], assinalando que dificil mente lhes escapa ave ou outra presa que persigam1, e os gaviões (Accipiter striatus) também destros e atrevidos. São diversas as espécies de aves que "se comem e de que os moradores se aproveitam". Os macucagoás (Tinarnus solitarius), pretos e maiores que galinhas, muito saborosos e estimados. Os jacús (Penelope obscura), de pescoço vermelho e círculo branco na cabeça, também muito gostosos. "Há tambê na terra muitas perdizes, pombas, e rolas como as deste Reino, e muitos patos e adês bravas pelas lagoas e rios desta costa..." É bom de ver que, neste caso, Gândavo aplicou nomes de espécies portuguesas a brasileiras superficial mente semelhantes. Com efeito, no Brasil chama-se perdiz a Rhynchotus rufescens, pomba a Colwnba speciosa, rola a Columbina talpacoti, pato-da-mato a Cairina moschata e aden a Dendrocygna viduata. As cores e capacidades imitativas dos papagaios fascinaram Gândavo. Os anapurús (Amazona aestiva), maiores que açores, de cores muito variadas " ... accomodanse mais á conversaçam da gête que 40
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qualquer outra ave ,.." Por isso e pela s-;::. ~_ beleza valem muito, ", .. entre os lndios ,~_ escravos .. ," Os canindés (Ara araralmaL f0l1110S0S e estimados, são azuis e exibem amarelas nas asas. As aráras (Ara macao '.. semeadas de algumas penas amarelas, con~ . cauda muito longa. Os papagaios verdadeí;'cs pequenos, do tamanho de pombas, mas 05 mais facilmente e melhor. Verdes claros, a cabeça amarela e as espáduas vermelhas. ~~ (Amazona amazonica), verdes escuras e azul, falam dificilmente. Há também uns I~e~ pouco maiores que pardais, os tuyns rostris), que têm penas verdes e finas, caudCl :-:~ e bico e patas brancas. E ainda os ma:'.:: - _ ~ maracana), do tamanho de melros. bico muito grosso, verdes e que "falam co:-:~ - : dos outros." c_
Outras aves notáveis são os goarás (ElIdoc;; marinhas e do tamanho de gaivotas; mvenis, são pardas aos dois anos, pret25 .::_ .::armesim do mais puro finalmente 9 . As americana) têm "mais officio de animaes ~e:-:-e tanta carne como um carneiro grande, ~-\5 -_~ enormes e, por isso, a altura do animal.::: espádua é a de um homem. Pescoço imensa::-.':::-:: e cabeça pequena, como a de um pato. i: pretas, exibem penas muito bonitas que 5:::_. -::hapéus. Pascem ervas e não voam: con::- Jbertas.
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, _.~ espécies de aves que "se comem e de --, ,:::':'es se aproveitam", Os macucagoás ), pretos e maiores que galinhas, . ~':~ e estimados, Os jacús (Penelope coço vermelho e círculo branco na gostosos. "Há tambê na terra - ::-.::-. e rolas como as deste Reino, bravas pelas lagoas e rios desta -_. '::e \er que, neste caso, Gândavo aplicou ~;-= __ e5 pOl1uguesas a brasileiras superficial Com efeito, no Brasil chama-se perdiz -:,'C'5cens. pomba a Columba speciosa, -:,1 ralpacoti, pato-do-mato a Cairina ___ :::ê a Dendrocygna viduata. ;; _ "':1.::idades imitativas dos papagaios - _:1\ Os anapurús (Amazona aestiva), "ores, de cores muito variadas á con versaçam da gête que
qualquer outra ave ... " Por isso e pela sua raridade e beleza valem muito, " ... entre os lndios dous ou tres escravos ..." Os canindés (Ara ararauna), também muito formosos e estimados, são azuis e exibem algumas penas amarelas nas asas. As aráras (Ara macao), vermelhas, semeadas de algumas penas amarelas, com asas azúis e cauda muito longa. Os papagaios verdadeiros8 são mais pequenos, do tamanho de pombas, mas os que falam mais facilmente e melhor. Verdes claros, têm quase toda a cabeça amarela e as espáduas vermelhas. As co ricas (Amazona amazonica), verdes escuras e de cabeça azul, falam dificilmente. Há também uns pequeninos, pouco maiores que pardais, os tuyns (FOlpUS crassi rostris), que têm penas verdes e finas, cauda muito longa e bico e patas brancas. E ainda os marcanaos (Ara maracana), do tamanho de melros, cabeça grande e bico muito grosso, verdes e que "falam como cada um dos outros." Outras aves notáveis são os goarás (Eudocímus ruber), marinhas e do tamanho de gaivotas; brancas quando juvenis, são pardas aos dois anos, pretas depois e carmesim do mais puro finalmente 9 • As hemas ( Rhea americana) têm "mais officio de animaes terrestres" e tanta carne como um carneiro grande, As patas são enormes e, por isso, a altura do animal ao nível da espádua é a de um homem. Pescoço imensamente longo e cabeça pequena, como a de um pato. Pardas, brancas e pretas, exibem penas muito bonitas que se usam em chapéus. Pascem ervas e não voam; correm de asas abertas. 41
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Os animais marinhos ocupam dois dos capítulos que Gândavo dedicou à fauna brasílica. O peixe era abundantíssimo, diversificado, saboroso e saudável. Para começar, Gândavo trata detidamente o peixe-boi (Trichechus manatus), tanto nos seus hábitos como nas qualidades dietéticas 1 o . O peixe-boi é, de facto, um sirénio, grupo que os zoólogos renascentistas, dadas as adaptações à vida aquática exibidas por estes mamíferos, incluiam nos peixes. Entre os verdadeiros peixes, Gândavo realça três espé cies l1 • Os camboropins (Tarpon atlanticus), grandes como atuns, de escamas duras e maiores que nos outros peixes, de paladar excelente e muito saudáveis. Pescavam-nos com arpão e colhendo-os por trás para que o arpão se inselisse entre as escamas e não fosse repudiado pela dura superfície delas. Os tamoatás (Calichthys callichthys), de água doce e do tamanho de sardinhas " ... cubertos de huãs cõchas ... cõ as quaes andam armados da maneira dos Tatus ... e sam muito saborosos ..." Os mayacús (Lactophrys), pequenos e semelhantes a xarrocos, "... muy peçonhêtos ... especialmente a pele ... que se huã pessoa gostar hum só bocado della, logo naquella mesma hora dara fim a sua vida ..." Logo que saem da água "inchão de maneira que parece huã barriga chêa de vêto ... " Também se ocupa das baleias e do âmbar "que dizê que procede dellas." Arribavam muitas à costal 2, bem como grande quantidade de âmbar, o qual enriquecera alguns moradores. Sobre o âmbar, que é produzido no intestino do cachalote (Physeter macrocephalus), Gândavo 42
expande e discute as curiosas hipóteses constituído, diz Gãndavo, pelas conforme acreditavam os Índios: esperma delas; ou ainda, um licor jo mar e que, bebido em excesso pe:_~ :·cgurgitado. Gândavo sabia, poré:-. encontrado âmbar no intestino das -- qualquer semelhança entre ele e as fez:: ~ :enninal. Por isso, não podia ser nem ?ois esperma "he aquillo a que cham:'. :- :: ?or este mar grãde quantidade ... " H:: qualidades: um pardo, a que chamam O pardo, muito estimado, atingia menos odorífero, vale muito menos. ::\0 capítulo seguinte, Gândavo des..:::':;'
marinho que se matou na Capitania " ano de 1564, a hipupiâra, ou demónic-:. \elmente uma otária (Otaria plzalus australis). Gândavo v_ .. :açanha de Baltesar Ferreira, que lutcL: e o matou. Embora aparecesse rararr.e:-: já era conhecida naquelas paragers. " capítulo, Gândavo presta uma mistérios do mar e ao acerto da increé.:::..:. não revelado: "E assi tambem de\'e a', ::~' monstros de diversos pareceres, largo e espantoso mar se escondê. :::: estranheza e adlniraçam: e tudo se po:'e .:~: que pareçã: porque os segredos da me:":: revelados todos ao homem, pera que ~ ':
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.__ :-::é.:.de de âmbar, o qual enriquecera alguns -:; ~ S -=-=-e o àmbar, que é produzido no intestino - .. -:c P seter macrocephalus), Gândavo
expande e discute as curiosas hipóteses do tempo. Seria constituído, diz Gãndavo, pelas fezes das baleias, conforme acreditavam os Índios; para outros, seria o esperma delas; ou ainda, um licor que nasce no fundo do mar e que, bebido em excesso pelas baleias, seria regurgitado. Gândavo sabia, porém, já ter sido encontrado âmbar no intestino das baleias e não haver qualquer semelhança entre ele e as fezes do intestino terminal. Por isso, não podia ser nem fezes, nem esperma, pois esperma "he aquillo a que chamã balso, de que há por este mar grãde quantidade ... " Há âmbar de duas qualidades: um pardo, a que chamam gris, outro preto. O pardo, muito estimado, atingia elevado preço. O preto, menos odorífero, vale muito menos. No capítulo seguinte, Gândavo descreve um monstro marinho que se matou na Capitania de São Vicente no ano de 1564, a hipupiára, ou demónio-d'água, prova velmente uma otária (Otaria flavescens ou Arctoce phalus australis). Gândavo relata com pormenor a façanha de Baltesar Ferreira, que lutou com o monstro e o matou. Embora aparecesse raramente, a hipupiára já era conhecida naquelas paragens. A terminar o capítulo, Gândavo presta uma curiosa homenagem aos mistérios do mar e ao acerto da incredulidade perante o não revelado: " E assi tambem deve aver outros muitos monstros de di versos pareceres, que no abismo desse largo e espantoso mar se escondê, de nam menos estranheza e admiraçam: e tudo se pode crer, por difficil que pareçã: porque os segredos da natureza nam foram revelados todos ao homem, pera que com razam possa 43
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negar, e ter por impossi vel as cousas que não vio, nem de que nunqua teve noticia."
desse país' (capítulo XI); 'Sobre algc-~ ~: comuns entre os indígenas da Amélico. e ~ ,_ de os pescarem' (capítulo XII).
Jean de Léry, Estudante de teologia de nacionalidade francesa, Léry vivia em Genebra quando Calvino aceitou, em 1555, enviar para a França antárctica um contingente de protestantes, a solicitação de Villegagnon (Perrone Moisés, 1994). Léry passou dez meses no Brasil, anotando o que observava, sobretudo o que se relaciona com a vida dos Índios. No entanto, as suas explorações limitaram-se à ilha ocupada pelos franceses na Baía de Guanabara e a algumas léguas em terra firme.
A iniciar o capítulo X, Léry ad"er:e quadrúpede do Brasil é semelhante aos e.::-::: os domésticos eram muito raros. Ka E;-l~ __ ; designação geral dos animais bravios soo.-, :_ ._ = soó. Decide começar as descrições peles -=- __ = para comer'. Assim, o tapiroussoll. oc -.C--. terrestris), com pelo avermelhado e longl~. ::- _ \'aca, meio asno, sendo embora diferente ce _ destes animais. A pele também é valios:: e :-:. fabricando-se com ela escudos para defes.:. " de regresso a França, conta Léry, transpor:.:.- _' "ivos e objectos da cultura local. Poré:-:~. : "i agem demorou excessivamente, a fOIT.e . .' :, era tanta que tiveram de comer os an::-:~ __ ' escudos de pele de anta, depois de grel::--_.:.::: ' da anta é como a de vaca. Os indígen.:.s ;: sobre um aparato de toros de madeira. :, -=- .. :: uoucan. Também o usam para grelha:' ~ e humana.
De volta à Europa, iniciou a redacção do seu li vro em 1563. A primeira edição foi publicada em 1578. Com sucessivas correcções e adições, publicaram-se, até 1611, mais quatro edições. Considerada uma grande obra da literatura de observação, etnográfica e geográfica do século XVI, a 'Viagem' cumpriu um papel que o governo de Lisboa, tentando proteger-se dos estrangeiros, não facilitava aos autores portugueses: a divulgação das terras sob o seu domínio. Com efeito, raramente as edições portuguesas excediam os 300 exemplares (Morisot, 1975). As observações sobre animais do Brasil também são contempladas no livro de Léry (1580)1 3. Distribuem-se por três capítulos de títulos sugestivos: 'Animais, caça, grandes lagartos, serpentes e outros bichos monstruosos do Brasil' (capítulo X); 'Diversidade das aves da América, todas diferentes das nossas: grandes morcegos, abelhas, moscas, mosquitos e outros parasitas estranhos 44
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Carne de boa qualidade têm também L ~ i Ozotoceros bezoarticus, Mazama 5> Blastoceros dichotomus), semelhan::es _ corças, mas de pelo longo como as cab:-:,s, ,Tayassu tacaju), que é o javali deste r~:' :: dorso um poro pelo qual respira e sopra (c:~' : ~em na cabeça, diz Léry); o agouti (Da:>__ .:' .. que é como um lei tão de um mês de :::.:.:::: gostoso; o tapiti (Sylvilagus brasilie71sis , ::' _:::
as causas que não via, nem
desse país' (capítulo XI); 'Sobre alguns peixes mais comuns entre os indígenas da América e a sua maneira de os pescarem' (capítulo XII).
de teologia de nacionalidade e::1 Genebra quando Calvino aceitou, ~. -; :~, _ França antárctica um contingente ,. ,,::-:ícítação de Villegagnon (Perrone _ passou dez meses no Brasil, ~sena\'a, sobretudo o que se relaciona :.Jo entanto, as suas explorações ',_ ocupada pelos franceses na Baía de léguas em terra firme.
A iniciar o capítulo X, Léry adverte que nenhum quadrúpede do Brasil é semelhante aos europeus e que os domésticos eram muíto raros. Na linguagem tupi a designação geral dos animais bravios soava a Léry como soó. Decide começar as descrições pelos que bons para comer'. Assim, o tapiroussou, ou anta (Tapirus terrestris), com pelo avermelhado e longo, parece meio vaca, meio asno, sendo embora diferente de um e outro destes animais. A pele também é valiosa e muito dura, fabricando-se com ela escudos para defesa. Na viagem de regresso a França, conta Léry, transportavam animais vivos e objectos da cultura local. Porém, como essa viagem demorou excessivamente, a fome, a certa altura era tanta que tiveram de comer os animais e até os escudos de pele de anta, depois de grelhados. carne da anta é como a de vaca. Os indígenas grelham-na sobre um aparato de toros de madeira, a que chamam boucan. Também o usam para grelhar peixe e carne humana.
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"::. iniciou a redacção do seu livro em foi publicada em 1578. Com e adições, publicaram-se, até ." ..:_::'::' edições. Considerada uma grande __ :::e observação, etnográfica e geográfica '\'iagem' cumpriu um papel que o 08, tentando proteger-se dos -~,::' ='::.cilitava aos autores portugueses: a _~~ :~:--:'::'S sob o seu domínio. Com efeito, _, ___ ;ões portuguesas excediam os 300 S,)t. 1975). , , :: s , Jre animais do Brasil também são Léry (1580)13. Distribuem-se ~ <2e t1tulOS sugestivos: 'Animais, caça, se:-pentes e outros bichos monstruosos __ ~' -o X); 'Diversidade das aves da __~ . . .:':::-entes das nossas: grandes morcegos, e outros parasitas estranhos
Carne de boa qualidade têm também os seouassous (Ozotoceros bezoarticus, Mazama simplicicornis, Blastoceros dichotomus), semelhantes a veados e corças, mas de pelo longo como as cabras; o tarassou (Tayassu tacaju), que é o javali deste país e exibe no dorso um poro pelo qual respira e sopra (como o golfinho tem na cabeça, diz Léry); o agouti (Dasyprocta aguti), que é como um leitão de um mês de idade e muito gostoso; o tapiti (Sylvilagus brasiliensis), parecido com 45
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a lebre no gosto, mas mais avermelhado que ela; o pag, ou pague (Agouti paca), do tamanho de um cão e sabor a vitela; o sarigoy, semelhante a um toirão, de carne tenra e boa, porém só após lhe terem sido reti rados os rins; quando não, cheira mal; o tatou (Cabassous lugubris, Priodontes giganteus), de carne branca e muito saborosa!". Os Índios fabricavam cofres com as placas dos tatus, os quais designavam por caramemo. Carne comestível encontravam-na os Índios também nuns lagartos cinzentos, os tOUOllS (Tupinambis teguixin); em grandes sapos, que grelhavam inteiros; em serpentes, que, tanto quanto Léry sabia, têm um gosto adocicado. Léry registou muitas outras curiosidades sobre os mamíferos. Uma, particularmente interessante, sobre a preguiça, hay, que nunca ninguém tinha visto comer e, por isso, se acreditava viver do vento. As aves e outros animais voadores são o tema do capítulo XL As comestíveis eram, globalmente, desi gnadas por oura. Os portugueses haviam introduzido a galinha, arignan-miri, cujos ovos, arignan-ropia, os Tupi não comiam por os julgarem venenosos. Nestas condições, a galinha-doméstica multiplicou-se e, mais ainda, por elas também não serem aproveitadas. É que a marcha pesada destas aves fazia-os crer que, se ingerissem a sua carne, ficariam impedidos de correr ao serem atacados por inimigos. Por idênticas razões, também não comiam peixes maus nadadores, como as raias. 46
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carne é a dos iacous (Pe71elop~ _I curinga), que são como faisões; a do /1:,_ :. "ull7enbachii), grande e colorido como (\ ~.::. 'wcacoüa (Tinamus solitanus) e do Crypturellus obsoletus), parecidos com ;randes como gansos e com o gosto dos _-\cerca de duas espécies de papagaios. L:>: : p.150): " ... quanto à plumagem, não se acre':::::. :odo o universo se possam encontrar ·ê~_ :naravilhosa beleza ... não para glorificar a n3.C::'ê::_ =-azem os profanos, mas sim o excelente e Cliador delas."
papagaios, aiourous, de que reconhece espécies, atraem-no pela sua capacidade de -:-:-::_ propósito, cita Plínio e o 'funeral do con-o "e ~ e Thevet, para mais uma vez o contradize::, ~ : alguém diz na sua Cosmografia, [que] ninhos pendurados em ramos de árvores p.:.~_ serpentes não lhes comam os ovos, direi que vi o contrário no Brasil: fazem todos L'S buracos de árvores, redondos e duros _.... w
o tOllcan
(Ramphastos dicolorus), de mais longo que todo o corpo, tem plumas - ::'. pelos Índios. Também o panou (Pyroderos quiampian (Ramphocoelus bresilius) e o 5 (Ramphodon naevius) são aves de plumagem apreciada.
As abelhas, que não são semelhantes às e-.:::-.::-:-e parecem pequenas moscas escuras, depos: :.:.--: (yra) e a cera (vetic) em buracos de ánores =é
mas mais avermelhado que ela; o pag, paca), do tamanho de um cão e semelhante a um toirão, de porém só após lhe terem sido reti , ::-::' s: quando não, cheira mal; o tatou ::?ubris, Priodontes giganteus), de carne saborosa! 4. Os Índios fabricavam cofres tatus, os quais designavam por encontravam-na os Índios também cinzentos, os touous (Tupinambis grandes sapos, que grelhavam inteiros; tanto quanto Léry sabia, têm um muitas outras curiosidades sobre os ,na, particularmente interessante, sobre a nunca ninguém tinha visto comer e, viver do vento. ,:-'.mos animais voadores o tema do .~s comestíveis eram, globalmente, desi ,:ira. Os portugueses haviam introduzido a , ~·i;ml·miri, cujos ovos, arignan-ropia, os ~':-::iam por os julgarem venenosos. Nestas . , .. galinha-doméstica multiplicou-se e, mais •• 2..5 também não serem aproveitadas. É que ~::sada destas aves fazia-os crer que, se _ sua carne, ficariam impedidos de correr ao . .:.':os por inimigos. Por idênticas razões, - .. :: .:omiam peixes maus nadadores, como as
Excelente carne é a dos iacous (Penelope spp., Pilipe jacutinga), que são como faisões; a do nwutou (CrCL,( blumenbachii), grande e colorido como o pavão; a do mocacoila (Tinamus solitarius) e do ynambou-ouassou (Crypturellus obsoletus), parecidos com perdizes, mas grandes como gansos e com o gosto dos precedentes. Acerca de duas espécies de papagaios, Léry escreve (p.l50): " ...quanto à plumagem, não se acredita que em todo o universo se possam encontrar aves de mais maravilhosa beleza ... não para glOlificar a natureza, como fazem os profanos, mas sim o excelente e admirável Criador delas." Os papagaios, aiourous, de que reconhece três ou quatro espécies, atraem-no pela sua capacidade de imitação. A propósito, cita Plínio e o 'funeral do corvo que palrava' e Thevet, para mais uma vez o contradizer (p.154): " ... alguém diz na sua Cosmografia, [que] fazem os seus ninhos pendurados em ramos de árvores para que as serpentes não lhes comam os ovos, direi de passagem que vi o contrário no Brasil: todos os ninhos em buracos de árvores, redondos e duros ... " O toucan (Ramphastos dicolorus), de bico grosso e mais longo que todo o corpo, tem plumas muito estimadas pelos Índios. Também o panou (Pyroderos scutatus), o quiampian (Ramphocoelus bresilius) e o gonambuch (Ramphodon naevius) são aves de grande beleza e plumagem apreciada. As abelhas, que não são semelhantes às europeias, pois parecem pequenas moscas escuras, depositam o mel (yra) e a cera (yetic) em buracos de árvores. Os Índios 47
sabem colhê-los e separá-los. O mel, comem-no; com a cera fazem rolos grossos como braços com os quais vedam os baús de madeira onde conservam as plumagens. Se assim não fizessem, as plumas seriam roídas por insectos que tudo destruem. Os escorpiões (espécie indeterminada) são pequenos, mas a sua picada é dolorosa e pode ser mortaL Léry teve experiência própria, ao ser picado no polegar, que imediatamente inchou. Então, o apoticário da expedição, que tinha escorpiões mortos e conservados em azeite, aplicou-lhe um sobre o ferimento, impedindo assim que o veneno se espalhasse pelo corpo. A despeito das dores que o molestaram durante vinte e quatro horas, Léry escapou com vida a este acidente. Os indígenas actuam da mesma maneira: quando são picados, matam o escorpião e esmagam-no sobre a parte ferida. Pira é o nome que os indígenas dão a todos os peixes. Duas espécies, kurema (Mugil liza) e parati (M. curema), são excelentes para comer, tanto cozidas como assadas. Há outros peixes muito bons como, por exemplo, o camouroupouy-ouassou (Tarpon atlanticus) e o acarapep (Cichlaurusfacetus). O plimeiro é grande (ouassou, em tupi, quer dizer grande ou gordo, declara Léry). Outros, como o acara-bouten (Lutjanus vivanus) e o pira-ypochi (Synbranchus lnarnwratus), não são agradáveis para comer.
Nas águas doces há grande diversidade de peixes de pequenas e médias dimensões, colectivamente designados pelo vernáculo tupi pira-miri (nlÍri significa pequeno). Também os há maiores e de boa carne, como por 48
::\cmplo o tamoa-ata (Calichthys
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Disforme, sarapintado e do tamanho de ..:::-' ~'ocinho enorme e serridentado, de tal ·'ora de água, fazia perigar as pernas das " ~s seus movimentos; carne duríssima, a ::-oder comer-se. Nomura (1966a) identifica-= _. ::-eÍXe-serra (Pristis sp.). ~-=-el71ão
Cardim. Ingressou na Companhia . 556. No Colégio de Évora adquiriu uma ::-Iumanidades. Partiu para o Brasil em 1583 co::-: do padre visitador Cristóvão de Gou\e:.:c esse ano e 1590 visi tou todas as capi tan::::.~. _ ?emambuco a São Vicente, tendo contactado: =:-:' Anchieta. Escreveu vários tratados sobre ::esignadamente o que aqui mais interessa, e terra do Brasil e de algumas cousas no[_ se acham na teITa como no mar'. Segundo '\: ~ 996a), este tratado terá sido escIito em 1" _, ~:..:blicado em português em 1885. Ao _;.lrcUm conhecia os escritos de Plínio, Isidoro ce 5_ Sicolau Monardes e vários navegadores -\zevedo, 1997).
1598 foi enviado a Roma como proc:.:::_..:: ,rovíncia do Brasil e aí permaneceu até 1601. .":'." :: Lisboa foi feito prisioneiro por corsários :::= ~'icando retido em Inglaterra até 1603. Dura:-.:e :: -. em Londres, confiscaram-lhe os manuscritos. q-..:e S ?urchas fez traduzir e publicar em 1625
_:-_-.os e separá-los. Ornei, comem-no; com grossos como braços com os quais . ' - .... _5 de madeira onde conservam as plumagens. , ~- - ,fizessem, as plumas seriam roídas por .~ ,,,rir. destruem. Os escorpiões (espéeie i são pequenos, mas a sua picada é ser mortal. Léry teve experiência picado no polegar, que imediatamente :~,o. o apoticário da expedição, que tinha - .::~ :~:0:1:os e conservados em azeite, aplicou-lhe =':::l~mento, impedindo assim que o veneno se 'e COlpO. A despeito das dores que o .. -..:' é~:'ante vinte e quatro horas, Léry escapou ,. es::e acidente. Os indígenas actuam da mesma são picados, matam o escorpião e soare a parte ferida.
: - :-~e que os indígenas dão a todos os peixes. ~::es.
kllrema (Mugil liza) e parati (M. ':: :::\celentes para comer, tanto cozidas como outros peixes muito bons como, por : • ,[ 11 1OlirGUpouy-ouassou (Tmpon atlanticus) í Cichlaurusfacetus). O primeiro é grande , quer dizer grande ou gordo, declara s. como o acara-bouten (Lutjanus • - ":'ra-:.pochi (Synbranchus mannoratus), \elS para comer.
::::::s há grande diversidade de peixes de as dimensões, colectivamente designados pira-miri (miri significa pequeno). :naiores e de boa came, como por
exemplo o tamoa-ata (Calichthys callichthys). E um de cabeça monstruosa, o pana-pana (Sphyrna tibura) . Léry já vira outro peixe, marinho e monstruoso, em Cabo Frio. Disfolme, sarapintado e do tamanho de um vitelo; focinho enorme e serridentado, de tal forma que, mesmo fora de água, fazia perigar as pernas das pessoas com os seus movimentos; carne duríssima, a ponto de não poder comer-se. Nomura (l966a) identifica-o com um peixe-seITa (Pristis sp.). Fernão Cardim. Ingressou na Companhia de Jesus em 1556. No Colégio de Évora adquüiu uma fOlmação em Humanidades. Partiu para o Brasil em 1583 como secre tário do padre visitador Cristóvão de Gouveia. Entre esse ano e 1590 visitou todas as capitanias, desde Pernambuco a São Vicente, tendo contactado com José de Anchieta. Escreveu vários tratados sobre o Brasil, designadamente o que aqui mais interessa, intitulado 'Do clima e teITa do Brasil e de algumas cousas notáveis que se acham na terra como no mar'. Segundo Nomura (1996a), este tratado terá sido escrito em 1584 e só foi publicado em português em 1885. Ao que parece, Cardim conhecia os escritos de Plínio, Isidoro de Sevilha, Nicolau Monardes e vários navegadores portugueses (Azevedo, 1997) .
Em 1598 foi enviado a Roma como procurador da província do Brasil e aí permaneceu até 1601. Ao voltar a Lisboa foi feito prisioneiro por corsários ingleses, ficando retido em InglatelTa até 1603. Durante a prisão, em Londres, confiscaram-lhe os manusclitos, que Samuel Purchas fez traduzir e publicar em 1625 sob o título 49
I
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A treatise of Brasil written by a Portugal which had long lived there. Esta obra é constituída pelo manuscrito já atrás referido e por um outro intitulado 'Do princípio e origem dos Índios do Brasil e de seus costumes, adoração e cerimónias'. Porém, a autoria do tratado de Purchas foi atribuída, por desconhecimento, a outro indivíduo. A partir de 1604, Fernão Cardim viveu o resto da sua vida no Brasil, de que foi provincial entre 1604 e 1609 (Azevedo, 1997).
peçonha, assim pelas infinitas cobras ~·;:.,'s muitos Alacrás, aranhas, e outros animaIS -:-_: ,:.s lagartixas são tantas que cobrem as pc.:,;: : _~2S, e agulheiros delas." De facto, nenhum ':~:'. -,:.:Jralistas pioneiros' reconheceu tantas ;;~entes como Cardim: dezassete espécies. ê:- . duas de boídeos (gibóias), oito de sete de colubrídeos, das quais três indete=-=-:.:::-_ \"omura, 1996a).
Da leitura do manuscrito de Cardim fica a ideia de que complementou observações próprias, de resto efectuadas sobre assinalável número de espécies (cerca de 150), com descrições e comentários escritos por José de Anchieta. No que se segue, apresentar-se-ão, de forma resumida, excertos de Cardim [1997] que sugerem urna e outra situação. De facto, durante a sua longa estadia em Roma ou pelo contacto directo com Anchieta, ou em ambas as ocasiões, Cardim terá tido a oportunidade de conhecer os relatos de Anchieta.
Porém, não é só nos animais venenosos ou Te:'e_ ~ue a acção do clima se manifesta, pois tambê::: = ..... parece influir formosuras nos pássaros, e ~oda a terra é cheia de bosques, e arvoredos. 255 ~ de formosíssimos pássaros de todo género ée ~
--":1
Cardim [1997, p.78] verificou que a preguiça (Bradypus tridactylus) se alimenta "de certas folhas de figueiras, e por isso não podem ir a Portugal, porque corno lhes faltam, morrem logo." Na realidade, a árvore de cujas folhas se alimenta é, segundo Azevedo (1997), a imbaúba (Cercopia sp.). Recorda-se que haviam contado a Jean de Léry que a preguiça não se alimenta, vive do vento.
_-\cerca do guainumbig, um beija-flor (troqui~íde= qual Nomura apresenta três hipóteses de jiz Cardim (p. 88) que " ... têm dois princípios _= geração; uns se geram de ovos corno outros outros de borboletas, e é cousa para se ':)orboleta começar-se a converter neste ?orque juntamente é borboleta e pássaro e 2onvertendo até ficar neste formosíssimo 20usa maravilhosa, e ignota aos filósofos pois U:::1 .. sem corrupção se converte noutro." Tambér. ::.: aproxima de Anchieta, acreditando - e cc- entusiasmo -, numa forma de heterogonia.
Tal como, anterionnente, Anchieta e Gândavo escreveram, também Cardim considerava a acção do clima essencial nas produções da natureza. Assim, a propósito dos animais venenosos, diz ele (p.84): "Parece que este clima
:\1uito interessantes são as considerações de acerca do peixe-boi (Trichechus l1tanatlls). na secção intitulada 'Dos peixes que há na Aprecia gastronomicamente a sua carne Cp. l ::
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.. : ,',ritten by a Portugal which had :=:;;:0. é constituída pelo manuscrito - :.. - _ ;,c::- um outro intitulado 'Do princípio " >':':C5 do Brasil e de seus costumes, .. Porém, a autoria do tratado de por desconhecimento, a outro -' .,;' de 1604, Fernão Cardim viveu o -,~ Brasil, de que foi provincial entre 1997).
influi peçonha, assim pelas infinitas cobras que há, como pelos muitos Alacrás, aranhas, e outros animais imundos, e as lagartixas são tantas que cobrem as paredes das casas, e agulheiros delas." De facto, nenhum outro dos 'naturalistas pioneiros' reconheceu tantas espécies de serpentes como Cardim: dezassete espécies, entre as quais duas de boídeos (gibóias), oito de víperídeos e sete de colublideos, das quais três indeterminadas (Nomura, 1996a).
de Cardim fica a ideia de que : ~ : ~5e:'yações próprias, de resto efectuadas ::o: :J.úmero de espécies (cerca de 150), , . ': ~ e ,: omentári os escritos por José de :: -:..:.:.: se segue, apresentar-se-ão, de forma , ::-:::: s Cardim [1997J que sugerem uma facto, durante a sua longa estadia ,::' .:on:acto directo com Anchieta, ou Cardim terá tido a oportunidade -e:3.:os de Anchieta.
Porém, não é só nos animais venenosos ou repelentes que a acção do clima se manifesta, pois também (p. 84) "... parece influir formosuras nos pássaros, e assim como toda a teITa é cheia de bosques, e arvoredos, assim o é de formosíssimos pássaros de todo género de cores."
-:" - Sc \'erificou que a preguiça (Bradypus :';; _.: :ner.ta "de certas folhas de figueiras, e ~.: .:'::::,:" II a Portugal, porque como lhes faltam, .:.: ::-ealidade, a árvore de cujas folhas se :: ;":':1 Azevedo (1997), a imbaúba ~orda-se que haviam contado a Jean não se alimenta, vive do vento.
. :;;:- . ~.eme, Anchieta e Gândavo escreveram, ~:::-:5íderava a acção do clima essencial
:atureza. Assim, a propósito dos ele (p.84): "Parece que este clima
Acerca do guainumbig, um beija-flor (troquilídeo) para o qual Nomura apresenta três hipóteses de identificação, diz Cardim (p. 88) que " ... têm dois princípios de sua geração; uns se geram de ovos como outros pássaros, outros de borboletas, e é cousa para se ver" uma borboleta começar-se a converter neste passarinho, porque juntamente é borboleta e pássaro e assim se vai :onvertendo até ficar neste formosíssimo passarinho; cousa maravilhosa, e ignota aos filósofos pois um vivente sem COITupção se converte noutro." Também aqui se aproxima de Anchieta, acreditando - e com que entusiasmo -, numa forma de heterogonia. :'vluito interessantes são as considerações de Cardim acerca do peixe-boi (Trichechus manatus), que inclui na secção intitulada 'Dos peixes que há na água salgada' . Aprecia gastronomicamente a sua carne (p. 130): " ... e 51
no gosto se se coze com couves, ou outras ervas, sabe à vaca, e concel1ada com adubos sabe a carneiro, e assada parece no cheiro, a gordura de porco, e também tem toucinho." Por isto se verifica que o seu paladar não diferia muito do de Anchieta, não obstante explicitação em termos diferentes. Mas, poderia ser consumido em dias de abstinência preocupação maior de todos os frades -, apesar de se lhe chamar peixe? Cardim não sabia bem, pois (p. 130) "já houve alguns escrúpulos por se comer em dias de peixe; a carne é toda de febras, como a de vaca ... " Cardim descreve bem o peixe-boi do litoral brasileiro (Trichechus manatus), diagnosticando-o, inclusi vamente porventura, sem o saber -, do peixe-boi do Amazonas (T inunguis). Com efeito, diz ele (p. 130): " ... tem dois braços de comprimento de um côvado com suas mãos redondas como pás, e nelas tem cinco dedos pegados uns aos outros, e cada um tem sua unha como humana ... " [o itálico é meu]. Também refere os benefícios medicinais e dietéticos do peixe-boi. Assim, considerando as 'pedras' que o peixe boi tem na cabeça, sobre os olhos possivelmente os ossos timpânico e periótico, que se separam muito facilmente dos outros (Almaça, 1998) -, refere que (p. 130) " ... feita em pó e bebida em vinho, ou água, faz deitar a pedra, como aconteceu que dando-a a uma pessoa ... antes de urna hora botou uma pedra como urna amêndoa, e ficou sã, estando dantes para mOlTer." A expulsão de cálculos renais por acção das 'pedras' do peixe-boi já havia sido referida por Anchieta, corno 52
também a saudável qualidade da sua ca:: caracteriza em termos semelhantes -.
peixe é sadio cá nestas partes que 5;: • = leite, e sobre carne, e toda uma quat'es:-:~~ :: nário sem azeite nem vinagre, e não ca~s:c . outras enfermidades corno na Europa. ~:: ~
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_e:"::1da com adubos sabe a carneiro, e -_::: ::-= 2heiro, a gordura de porco, e também isto se verifica que o seu paladar do de Anchieta, não obstante ,_ termos diferentes. Mas, poderia ser :-:-. ;:::1S de abstinência - preocupação maior apesar de se lhe chamar peixe? '::,::':[1 :Jem, pois (p. 130) "já houve alguns ; -' Se comer em dias de peixe; a carne é
. 2000 a de vaca ... " o peixe-boi do litoral brasileiro diagnosticando-o, inclusivamente 5e:::1 saber -, do peixe-boi do Amazonas C~'m efeito, diz ele (p. 130): " ... tem dois :-:'.::,:imento de um côvado com suas mãos e nelas tem cinco dedos pegados cada um tem sua unha como __ '_ s. é meu]. beneficios medicinais e dietéticos do .~'::-:--". considerando as 'pedras' que o peixe . __ ~~3..
sobre os olhos - possivelmente os periótico, que se separam muito ...:tros (Almaça, 1998) -, refere que (p. '. ::::-:: pó e bebida em vinho, ou água, faz - ... 2C''110 aconteceu que dando-a a uma - ::: ~ uma h ora botou uma pedra como _... ~ .,'-'-'-" sã, estando dantes para morrer." .. .,~:culos renais por acção das 'pedras' .. -..l\ia sido referida por Anchieta, como
também a saudável qualidade da sua carne, que Cardim caracteriza em termos semelhantes (p. 130): "Todo este peixe é sadio cá nestas partes que se come sobre leite, e sobre carne, e toda uma quaresma, e de ordi nário sem azeite nem vinagre, e não causa sarna nem outras enfermidades como na Europa, antes se dá os enfermos de cama, ainda que tenham, ou estejam muito no cabo." No litoral, viam-se muitas baleias, por vezes quarenta ou cinquentajuntas, principalmente de Maio a Setembro, quando parem os filhos. São elas que deitam o âmbar que se vê no mar, alimentando-se dele, bem como todos os outros animais. À costa, arribam tartarugas enormes (Chelonia lnydas, Eretmochelys imbricata) - uma delas nem vinte homens conseguiram levantá-la -, de que Cardim descreve a postura, os ovos e a eclosão. Peixes venenosos também os há no litoral brasileiro. Guamayaçú (Spheroides testudineus), itaoca (Lacto phys trigonus) e carapeaçaba (Chaetodol1 striatus) são espécies cuja pele, espinhos, fígado e tripas têm de se evitar, pois a sua ingestão, diz Cardim, é mortal. O purá, ou treme-treme (Narcine brasiliensis), é parecido com a raia; ao tocar-se-Ihe fica-se dormente e dolorido. O caramuru (GymnothorCL,( moringa) é uma moreia como as de Portugal, escreve Cardim, acrescentando (p. 139): "... e dizem que os naturais que têm ajuntamento com as cobras, porque os acham muitas vezes com elas enroscados, e nas praias esperando as ditas morei as." Há ainda o amoreatí (Thalassophryne spp.), que pica as solas dos pés. E mais um animal enigmático, terepo
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monga. Será uma cobra ? Será uma sanguessuga ? Eis as hipóteses colocadas com interrogação por Nomura (1996a) e Azevedo (1997), respectivamente. Cardim diz dele, com o toque de mistério que o desconhecido propicia (p. 140): "É uma cobra que anda no mar ... qualquer cousa viva que lhe toca nela tão fortemente apegada, que de nenhuma maneira se pode bolir ... e assim leva a pessoa para o mar e a come ..." No relato de Cardim não podiam faltar os monstros marinhos, a que dedica uma secção, 'Homens marinhos, e Monstros do mar'. Mais pormenOlizado que os seus antecessores, Cardim descreve a igpupiára, ou demónio d' água, nos seguintes termos Cp. 141): " ... parecem-se com homens ... de boa estatura, mas têm os olhos muito encovados ... as fêmeas parecem mulheres, têm os cabelos compridos, e são formosas ... acham-se estes monstros nas barras dos rios doces." A igpupiára, ou hipupiara (como lhe chamou Gândavo), deve corres ponder ao lobo-marinho (Otariaflavescens), ou talvez ao leão-marinho (Arctocephalus australis), conforme identificação de Nomura (1996a). São ambas espécies meridionais que, acidentalmente, se encontram ao longo do litoral sul-americano. Cardim indica Jagarigpe (Baía) como a localidade em que tinham sido vistas igpupiáras. Mas, vai mais longe no conhecimento dos hábitos do monstro (p. 142): " O modo que têm de matar é: abraçam-se com a pessoa tão fortemente beijando-a, e apertando-a consigo que a deixam feita toda em pedaços, ficando inteira, e como a sentem morta dão alguns gemidos como de sentimento, e largando-a fogem; e se 54
levam alguns comem-lhes somente os olhos. :-l::~ ~~: pontas dos dedos dos pés e mãos, e as geri:::: assim os acham de ordinário pelas praias co:::: ~, cousas menos." Coitado do homem que cedess;: encantos destas formosas criaturas.
No litoral abundavam mmiscos, caranguejos e ribeirinhas. Cardim refere as águas-mortas, ou cs.:: . (Physalia physalis), infinitas em número e ". ls muito dolorosa . Menciona ainda caranguejos. ~=:~' uçá (Ucides cordatus), de que descreve a ;-;-:...:-.::: _ carapaça; e moluscos, como a ostra (Cra.i's ~ rizophorae) , e coraliários, como o coral- ::- ~ (Mussimilia spp.), um e outro muito importa:::e5 produção de caL
Quanto às aves, o guigratéotéo, ou téu-téu (R pterus chilensis), a que Cardim chamava em po:-:..:; _. 'tinhosa', é (p. 149): " ... pássaro que tem acide- s_. morte, e que morre e torna a viver, como quem te~:c " coral, e são tão grandes estes acidentes que muitas '.;:=~ os acham os Índios pelas praias, os tomam nas :r-.:'.. cuidando que de todo estão mortos os botam eles se caindo se alevantam e se vão embc:-::. Descreve a variação etária do guará (Eudocimus i-::: em termos mais explícitos que os naturalistas ': ~ precederam (p. 151): "Este pássaro é do tamar.~-:: _~ uma Pega ... quando nasce é preto, e depois s ~-'--_ pardo; quando já voa faz-se todo branco mais pomba, depois faz-se vermelho claro, et tandem .. :-:- _ se vermelho mais que a mesma grã, e nes~.:. :: permanece até à morte ... "
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levam alguns comem-lhes somente os olhos, narizes e pontas dos dedos dos pés e mãos, e as genitalias, e assim os acham de ordinário pelas praias com estas causas menos." Coitado do homem que cedesse aos encantos destas formosas criaturas. No litoral abundavam mariscos, caranguejos e aves ribeirinhas. Cardim refere as águas-mortas, ou caravelas (Physalia physalis), infinitas em número e de 'picada' muito dolorosa ls . Menciona ainda caranguejos, como o uçá (Ucides cordatus), de que descreve a muda da carapaça; e moluscos, como a ostra (Crassostrea rizophorae) , e coraliários, como o coral-branco (Mussimilia spp.), um e outro muito importantes na produção de cal. Quanto às aves, o guigratéotéo, ou téu-téu (Belono pteros chilensis), a que Cardim chamava em português 'tinhosa', é (p. 149): " ... pássaro que tem acidentes de morte, e que morre e torna a vi ver, como quem tem gota coral, e são tão grandes estes acidentes que muitas vezes os acham os Índios pelas praias, os tomam nas mãos, e cuidando que de todo estão mortos os botam por aí, e eles se caindo se alevantam e se vão embora ... " Descreve a variação etária do guará (Eudocimus ruber) em termos mais explícitos que os naturalistas que o precederam (p. 151): "Este pássaro é do tamanho de uma Pega ... quando nasce é preto, e depois se faz pardo; quando já voa faz-se todo branco mais que uma pomba, depois faz-se vermelho claro, et tandem torna se vermelho mais que a mesma grã, e nesta cor permanece até à morte ..." 55
Na água doce havia peixe diversificado, de grande qualidade e muito saudável, que se dava aos doentes 'como medicina' . Quanto às cobras de água doce refere a sucurijuba (Eunectes murinus), repetindo o relato de Anchieta sobre o apodrecimento do ventre repleto, sua destruição, neste caso pelos corvos, e renovação postetior. PonnenOliza, no entanto, sobre a recomposição do corpo (p. 153): " ... e a razão dizem os Índios naturais é, porque no tempo que apodrece tem a cabeça debaixo da lama ... " Fica-se também a saber que o esterco de jacaré tem proplíedades medicinais, em particular para as belidas, que seriam manchas na córnea, segundo Azevedo (1997). Entre os lobos-d'água havia um chamado baépina (talvez um peixe-boi, segundo ::"Jomura, 1996a), que Cardim define assim (p. 155): "Estes são certo género de homens marinhos do tamanho de meninos, porque nenhuma diferença têm deles; destes há muitos, não fazem mal." E ainda uma rela, guararigeig (talvez Hyla aurantiaca), sobre a qual Cardim diz (p. 157): " ... é cousa espantosa o medo que dela têm os Índios naturais, porque só de a ouvirem, morrem, e por mais que lhes preguem não têm outro remédio senão deixar-se morrer, tão grande é a imaginação, e apreensão que tomam de a ouvir cantar; e qualquer Índio que a ouve morre, porque dizem que deita de si um resplendor como relâmpago." Enfim, refere os animais domésticos que haviam sido introduzidos de Portugal, aclimatando-se bem no Brasil: cavalos, vacas, porcos, ovelhas, galinhas, perus, adens e cães, que existiam todos em abundância. Só as cabras 56
eram poucas. Quanto aos Índios Cp. 1 o género de carnes, ainda de animais :-:':''':' . cobras, sapos, ratos e outros bichos ser;:" _-
Gabriel Soares de Sousa. Ao sair de Sousa integrava uma armada de .., , dirigia a Moçambique. Todavia, o seu bar' ~-= -se e aportou à Baía em 1569. Gostané, :.. pessoa empreendedora, Soares de SCi..S":' empresário açucareiro. Observador ~, naturalista que mais espécies reconhece~;. durante a sua primeira estadia no dezasseis anos -, foram por ele observadas c _ ~ mais de 350 espécies animais. Em 158":'. .::.; seu manusclito '::"Jotícia do Brasil' a CristÓ\ em Madrid. Desse manuscrito fizeram-,,;: cópias anónimas. Agradado com a de Soares de Sousa, Filipe I concece..:.-,, privilégios e, entre eles, licença para a e\ minas de esmeraldas no Brasil. Aí regresse __ iniciou a busca das minas. ::"Jo entanto.. -=-=-:.' seguinte, vítima de doença tropical Academia das Ciências de Lisboa editaL: ;:-', . ' primeira vez de forma completa ':\'or:..... ': " (Albuquerque, 1989; Tavares 1994).
O seu relato zoológico, que é muito e'~ _, grande número de espécies sobre que i1.e:.:::.' . õ reduzido aos aspectos considerados ma:s _ :: O nhandu, ou ema (Rhea americana', _ como as avestruzes de África.
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(talvez se;undo 1\omura, 1996a), que Cardim . ; : ~ 5): .'Estes são certo género de homens _.•.::-:-'c'.nho de meninos, porque nenhuma _-,' '::'e:;::5: destes há muitos, não fazem mal." guararigeig (talvez Hyla aurantiaca), - :':''::lm diz (p. 157): " .. , é cousa espantosa _ _ , , _ .~"H os Índios naturais, porque só de _.. ::-:::-e::::1. e por mais que lhes preguem não deixar-se morrer, tão grande é que tomam de a ouvir cantar; a ouve morre, porque dizem que como relâmpago." domésticos que haviam sido aclimatando-se bem no Brasil: -:' :":05. ovelhas, galinhas, perus, adens e todos em abundância. Só as cabras
eram poucas. Quanto aos Índios 169) " ... comem todo o género de carnes, ainda de animais imundos, como cobras, sapos, ratos e outros bichos semelhantes ... "
Gabriel Soares de Sousa. Ao sair de Lisboa, Soares de Sousa integrava uma armada de três barcos que se dirigia a Moçambique. Todavia, o seu barco tresmalhou -se e aportou à Baía em 1569. Gostando da terra e pessoa empreendedora, Soares de Sousa tomou-se empresário açucareiro. Observador atento, foi o naturalista que mais espécies reconheceu. Com efeito, durante a sua primeira estadia no Brasil - cerca de dezasseis anos -, foram por ele observadas e comentadas mais de 350 espécies animais. Em 1587, apresentou o seu manuscrito '1\otícia do Brasil' a Cristóvão de Moura, em Madrid. Desse manuscrito fizeram-se numerosas cópias anónimas. Agradado com a excelente monografia de Soares de Sousa, Filipe I concedeu-lhe vários privilégios e, entre eles, licença para a exploração de minas de esmeraldas no Brasil. Aí regressou em 1591 e iniciou a busca das minas, No entanto, morreu no ano seguinte, vítima de doença tropical indeterminada. A Academia das Ciências de Lisboa editou em 1825, pela vez de forma completa 'Notícia do Brasil' [Albuquerque, 1989; Tavares 1994).
O seu relato zoológico, que é muito extenso dado o número de espécies sobre que incide, será aqui -eduzido aos aspectos considerados mais relevantes. O llhandu, ou ema (Rhea americana), é tão grande :omo as avestruzes de África. Havia muitos e os 57
malhados de preto, diz Soares de Sousa, não têm tanta penugem como os da Alemanha (7). Na Baía, há uma ave de rapina, oacauã (Herpetotheres cachinnans), que se alimenta de serpentes. Então, [Soares de Sousa, 1989, p. 162], "quando o gentio vai de noite pelo mato que se teme das cobras, vai arremedando estes pássaros para as cobras fugirem." Quanto à tiejuba (Caryothrauste canadensis), é um passarinho pequeno que se alimenta de pedrinhas que apanha no chão. No que respeita à gibóia (Constrictor constrictor), que pode atingir 50-60 palmos, repete a história, com algumas variantes, dos seus antecessores: a constrição das presas e penetração, neste caso do sexo, com a ponta da cauda até à morte da presa; o apodrecimento das presas ingeridas no ventre da serpente; a limpeza do ventre e do resto do corpo da gibóia pelos urubus (Cathartes aura); a recomposição do corpo da gibóia. Isto ouvia-se dizer a muita gente que andava pejo sertão. As boitiapoias (Chironius cannatus) são cobras longas de 50-60 palmos e delgadas, que usam outra estratégia para matar as presas e depressa: enfiam-lhes a ponta da cauda nos ouvidos. Também há serpentes 'vingativas', como a suruCltCU, uma víbora (Lachesis muta). Os Índios capturam-nas em armadilhas (p. 185) " ... e se o macho acha ali a fêmea presa e morta, espera ali o armador com quem se cinge e não o larga até que o mata e toma a esperar ali até que venha outra pessoa a quem morde somente e com esta vingança se vai daquele lugar." Os Índios comiam rãs, algumas muito gostosas na opinião de Soares de Sousa. E sapos, a que chamavam curucus 58
. Bufo marinus); mas, a estes (p. 8 Tipas e fressura de maneira que porque se rebenta fica a came tcC.:: -:: não escapa quem a come ou alguma. .. =ressura." Para além da socaúna, lagarta de i J1egalopyge sp.), com cujo pêlo (p. 1 S~ fazem crescer a natura... ", nos cajueiro~ ~ lagartas (p.189) " ... todas cobertas de pêL::o .-5 sentem gente debaixo, sacodem este aonde chega, se levanta logo tamanha ine:-.'::; ~ que das urtigas, o que dura todo um di a ... " .. vive no cajueiro parece ser Protambll":" pirilampo buijeja (fêmea neoténic2 __ illuminator), que (p. 181) " ... se o toma logo a juntar e andar como dantes " S~ . -se um ... com uma faca em muitos pedaçc s ::: logo ajuntar ... o embrulharam em urr. dias e cada dia o despedaçavam em rr: _ va-se logo a juntar e reviver ... " A formiga usaúbaú (Atta sexdens), lhe merece comentários (p. 190), pois" . senão que trazem espias pelo campo aos formigueiros porque se viu muitas quatro ... e encontrarem outras no ca::-:::--: com elas ..." As içãs, fêmeas da antelior. C~ -:-:-.: pelos Índios, e os cupins, térmitas CC-:-:.. construções em madeira, que Soares distingue das formigas, são outras entre de insectos que este naturalista
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algumas muito gostosas na opinião "" . ~:.. E sapos, a que chamavam curucus
(Bufo marinus); mas, a estes Cp. 187) "tiram-lhes as tripas e fressura de maneira que lhe não rebente o fel porque se rebenta fica a carne toda peçonhenta e não escapa quem a come ou alguma coisa da pele e fressura." Para além da socaúna, lagarta de uma borboleta (Megalopyge sp.), com cujo pêlo Cp. 188) " ... os índios fazem crescer a natura ... ", nos cajueiros criam-se umas lagartas (p.189) "... todas cobertas de pêlo, as quais como sentem gente debaixo, sacodem este pêlo de si e na carne aonde chega, se levanta logo tamanha inchação que é pior que das urtigas, o que dura todo um dia ..." A lagarta que vive no cajueiro parece ser Protambu/ix strigilis. E o pirilampo buijeja (fêmea neoténica de Astraptor illuminator), que Cp. 181) " ... se o fazem em pedaços se toma logo ajuntare andar como dantes ... se viu ... cortar -se um ... com uma faca em muitos pedaços e se tomaram logo a juntar ... o embrulharam em um papel durante oito dias e cada dia o despedaçavam em migalhas e toma va-se logo a juntar e reviver .. ," A formiga usaúbaú (Alta sexdens), destruidora, também ~he merece comentários (p, 190), pois" ... não há dúvida senão que trazem espias pelo campo que levam aviso aos formigueiros porque se viu muitas vezes irem três e quatro ... e encontrarem outras no caminho e virarem com elas ..," As içãs, fêmeas da anterior, comidas torTadas pelos Índios, e os cupins, térmitas demolidoras das construções em madeira, que Soares de Sousa já distingue das formigas, são outras entre as várias espécies de insectos que este naturalista observou. 59
o homem-marinho, ou upupiara, não podia deixar de ser comentado. Nos rios da Baía havia muitos durante o Verão. Conta história idêntica à dos predecessores, com os inevitáveis afogamentos e mutilações produzidas pela upupiara. O peixe-boi, goarágoà, é descrito com pormenor, bem assim as suas qualidades dietéticas e medicinais, já referidas no presente estudo. No mar e na sua orla há enorme diversidade animal, ruscernível pela sua utilidade ou perigosidade. Assim, o baiacu (Lactophrys spp.), peçonhento na pele, fígado e fel, que faz inchar até rebentar a quem comer algumas dessas partes. Em contrapartida, as ostras, leriuaçu (Ostrea puelchana), são enormes e muito gostosas, tanto cruas como assadas ou fritas. E há um molusco teredinídeo, ubiraçoca, que fura a madeira dos navios e (p. 211) " ... para este gusano não fazer tanto dano nas embarcações, permitiu a natureza que o que se cria na água salgada morra entrando na água doce e o que se cria na doce morra na salgada ... " Na água doce há mexilhões enormes (unionídeos 7), mas menos saborosos que os do mar. Em terra, na proximidade da água doce, vive o goanhamu, ou caranguejo-do-mato (Cardisoma guanhumi), muito grande e azul, que é muito gostoso na condição de se lhe retirar o fel.
Outros comenfadores da natureza. ~ais ou menos contemporâneos de Fernão Cardim e Gabriel Soares de Sousa, alguns visitantes deixaram também notícia sobre a fauna do Brasil (Nomura, 1966a). Entre eles, Anthony 60
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Knivet (15607-16207), um corsário por doença no Rio de Janeiro. recapturado várias vezes, viveu no Bras:} do século XVI, regressando a Inglatel--:-:: =- do século XVII. Aí escreveu um relate> [Knivet, 1947J que foi publicado por S~~:- em 1625 (Horsch, 1994). A sua contrib-..::, é, no entanto, mínima. Bem reduzida fo~ igualmente, a particip:c; Afonso (1548-1618), jesuíta. Partiu . Índia em 1596. Por avaria, o seu barco te na Baía, onde o jesuíta fez algumo's zoológicas, muito poucas (França. 19> 1996a).
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_ ~ __ orla há enorme diversidade animal, - • _ S":.l utilidade ou perigosidade. Assim, o <: .5 spp.), peçonhento na pele, fígado - -. ~:J.r até rebentar a quem comer algumas contrapartida, as ostras, leriuaçu c[ são enormes e muito gostosas, tanto ou fritas. E há um molusco que fura a madeira dos navios -:''::'1':1 este gusano não fazer tanto dano -o_s. ;'ermitiu a natureza que o que se cria _-=-_ ~orra entrando na água doce e o que .. --:on~a na salgada ..." I.
enormes (unionídeos ?), -':I::OSOS que os do mar. Em terra, na doce, vive o goanhamu, ou (Cardisoma guanhwni), muito é muito gostoso na condição de se
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natureza. Mais ou menos Cardim e Gabriel Soares de ._'::-.:es deixaram também notícia sobre "'\:':uura. 1966a). Entre eles, Anthony
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Kni vet (1560?-1620?), um corsário inglês, abandonado por doença no Rio de Janeiro. Preso, fugiri vo, recapturado várias vezes, viveu no Brasil na última década do século XVI, regressando a Inglaterra em princípios do século XVII. Aí escreveu um relato sobre o Brasil [Knivet, 1947] que foi publicado por Samuel Purchas em 1625 (Horsch, 1994). A sua contribuição zoológica é, no entanto, mínima. Bem reduzida foi-, igualmente, a participação de Gaspar Afonso (1548-1618), jesuíta. Partiu de Lisboa para a Índia em 1596. Por avaria, o seu barco teve de aportar na Baía, onde o jesuíta fez algumas observações zoológicas, muito poucas (França, 1926; Nomura, 1996a). Mais importante foi o contributo de Francisco Soares (1560-1597), outro jesuíta, que percorreu o Brasil de São Vicente a Pernambuco, anotando o que observava. 1590, escreveu uma narrativa epistolar dirigida ao provincial em Portugal, manuscrito que intitulou 'De algumas coisas notáveis do Brasil e de alguns costumes dos Índios' (Black, 1989). Embora Soares tenha observado uma diversidade animal importante, o seu relato é repetitivo, sobretudo do de Cardim. Assim, as mesmas crenças quanto aos movimentos autónomos das puas de canduguaçu (Coendou prehensilis), a morte das presas por introdução da cauda da jibóia (Boa cOllstrictor), as propriedades medicinais das 'pedras' da cabeça do peixe-boi (Trichechus manatus), o nascimento do âmbar em poças de água do espraiado, a desclição estranhamente minuciosa dos machos (cabelo
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ruivo e boa estatura) e das fêmeas (cabelo longo e formosas) da igpupiara, o apodrecimento, destruição e recomposição do corpo da sucurijuba (Eunectes murinus), etc. Por outro lado, Soares [1989J juntou pormenores interessantes às descrições de autores anteriores como, por exemplo, que: a sarigueia (Didelphis sp.) pode albergar no marsúpio até oito crias; ajararaca (Bothrops jararaca) pode parir sessenta e quatro filhos; as pira nhas (Pygocentrus piraya) arremetem ao homem, podendo comê-lo; a postura do jacaré (Caiman latiros tris) é contituída por 30-40 ovos com o tamanho dos de pata, etc. Também o manuscrito de Francisco Soares ficou esquecido durante séculos, vindo a ser publicado no Brasil em 1923. Entretanto, visitantes estrangeiros, mesmo se permanecendo fugazmente no Brasil, encontravam eco diferente nos seus países de origem, divulgando a nova terra de forma não conseguida em Portugal. Estão neste caso, logo em princípios do século XVII, os missionários franceses que partiram para o Brasil.
62
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De pifce monachihabitu,
Muitos livros do Renascimento, ainda com forte impregnação dos bestiários medievais, descreviam e representavam animais fabulosos, A primeira figura, de Thevet (1558), representa um animal do Estreito de Magalhães, Seria assim que Thevet imaginou uma sarígueia? As três figuras seguintes, de Rondelet (1554), referem-se a animais aquáticos, o "monstro leonino", o "peixe com hábito de monge" e o "peixe com hábito de bispo", respecti vamente, todos descritos no texto do li vro, Enfim, a última representa o "demônio-d'água", um hípupiára, descrito e figurado por Gândavo (1576),
--
r i, I li
A grande e necessária ligação dos Índios brasileiros com a natureza é revelada por formas muito variadas, As figuras representam esculturas zoomórficas em diabase da autoria de paleoameríndios, da costa brasileira, Segundo Castro Faria (1959) representam, respectivamente, um peixe carangídeo, dois peixes (o superior voltado para a esquerda, o inferior para a direita), talvez do gênero Geophagus, uma baleia e um golfinho, As reproduções das figuras devem-se à cortesia do Professor Luís Vicente,
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Sarigueiras Eis como Staden (1557) representou Didelphis allrita e Frei Crist贸v茫o de Lisboa (1627) e Marcgraf (1648) representaram Didelphis mersupialis,
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Tatus Dasypus septemcinctus, segundo Hans Staden (1557). Dasypus novemcinctus em Frei Crist贸v茫o de Lisboa (1627). Dasypus sexcinctus e Tolypentes tricinctus em Marcgraf (1648).
Preguiรงa Brodvpus sp., em Thevet (1558). Bradypu,,- tridactvlus. segundo Frei Cristรณvรฃo de ( 1648).
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Tucanos RamphaSfUs vi!ellúlUs, segundo Thevet (:55S, Pteroglossus bitorquatuJ; segundo Frei ficação de acordo com Oren.
A última figura do Livro rn da obra sobre as ayes de ?::-: (1555) é esta cabeça de ave. que o autor legenda aSSl:I: de ave trazido das terras novas", Jean de Léry ( 1:": figura de Belon, atríbuindo-a a um tucano (Romplitu':,,' Nomura, 1966),
o guainumbi, Agyrtrina leucogasyer (?), segundo \'12.::;;: ~
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Alguns comentários aos relatos quinhentistas sobre zoologia do Brasil Nos último anos, Hitoshi Nomura tem vindo a publicar excelentes trabalhos, metódicos e sistemáticos, sobre quem, e o que, escreveu acerca da zoologia brasílica. Outras contribuições são, por exemplo, as de França (1926 a,b), Almaça (1991a,b, 1993a, b) e Tavares (1993). Estas, porém, são de índole mais restrita, pois se cingem a naturalistas portugueses 1 6 ou apenas ao conhecimento de certos grupos animais, vg mamíferos (Almaça, 1991a) ou crustáceos (Almaça, 1993a; Tavares, 1993). Os conjuntos antes considerados, 'primeiros cronistas' e 'naturalistas pioneiros', são, como se verificou, heterogêneos sob vários pontos de vista. Um destes nos interessa em particular: o da cultura histórico-natural específica de cada um dos seus componentes. Ora, sob este aspecto, nenhum deles parece destacar-se significativamente, a despeito de algum conhecimento de autores clássicos e renascentistas (Plínio, Pierre Belon, etc.) exibido por Jean de Léry e também atribuído a Cardim (Azevedo, 1997). De resto, o humanismo não carreou um interesse científico imediato pela natureza. Na continuidade das preocupações medievais, o interesse conferido aos animais foi de carácter utilitário e o de facultarem um caminho indirecto para atingir o homem e falar dele (Ceard, 1990). O animal era evocado, sobretudo, como representação do sub-humano, privado da dignidade conferida pela razão (Higman, 1990). Entre nós, Gil Vicente glosou muito frequentemente os animais e a sua vida (Lemos, 1922). 89
As descrições e comentários de Jean de Léry afiguram -se tão ingénuas quanto as dos restantes elementos do mesmo contingente. Entende-se bem que este grupo, mesmo aqueles dos seus componentes que frequentaram o ensino superior, não mostre traços de cultura histórico -natural específica. A Universidade portuguesa, tanto em Lisboa como em Coimbra, e os colégios jesuítas do século XVI (e seguintes) não culti varam as ciências experimentai s e de observação, limitando-se a um ensino livresco e escolástico. A desconfiança em relação a Lutero e Erasmo, a xenofobia e a vigilância da Inquisição contribuíram para um isolamento de Portugal relativamente à Europa, talvez mesmo de uma ruptura com ela, que muito poucos conseguiram superar (Rosado Fernandes, 1993). Seja como for, e não obstante essa ingenuidade, os naturalistas do século XVI registaram enOlme quantidade e diversidade de elementos sobre a vida animal no Brasil, o que, noutras circunstâncias sócio-culturais, teria ecoado muito diferentemente na Europa quinhentista. Descre veram grande número de espécies que nunca tinham sido observadas por europeus; levantaram muitas questões que não sabiam ou não podiam na época solucionar; divulgaram muitas crenças e superstições; enfim, pode dizer-se, que estabeleceram as fundações da História natural no Brasil. De alguns destes aspectos se ocupará seguidamente o presente trabalho.
Nomenclatura etnozoológica. Todas as etnias que têm grande dependência dos produtos da natureza para a sua subsistência e sobrevivência são boas conhecedoras 90
das espécies que vivem no seu ambiente e desen\;:' sistemas de denominação que as conceptualizam. no passado recente isto foi verificado: Mayr et al. I ~;. ~:: referem uma tribo de papuas das montanhas da :.; Guiné que reconhecia 137 das 138 espécies existentes no seu território. A ligação dos Índios brasileiros à vida evidentemente, muito intensa. Além disso, antiga, cc:"::".. provam as esculturas animalistas encontradas em_~2.Z:·· arqueológicas costeiras (sambaquis) e represen:.:::- -' sobretudo peixes (Castro Faria, 1950). A nomenc:.::.:·,,:~. tupi para os animais é muito diversificada, -' procurou demonstrar nos relatos dos natt:ra::s~.:.. anterionnente mencionados. Os nomes dos animais f:::-.:.... grafados por cada um deles de forma particular e :lS se manti veram no presente trabalho. Não há que permitam afirmar que todas, ou quase espécies fossem reconhecidas pelos indígenas, porém, recebiam mais do que um nome disti:L consoante a fase de desenvolvimento ou o se:<:c, Atta sexdens). Os relatos dos naturalistas mostram que, em espécies eram designadas por nomes primários SiT:- ~ (Berlin, 1992). Exemplos: iguaraguá, tamalldli;.7, ~ sucuriúba, ibibóca, bóipeba, tatarana, etc, atribuíam nomes primários a fases de desenvohiT::"_e:-: da mesma espécie, como por exemplo, usa:::-_: (obreiras) e içã (fêmeas) deAtta sexdens. Nomes se ~ dários (isto é, com um nome subordinado contra3t.::.:-.~ eram aplicados a conjuntos de espécies (pira-miri,
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das espécies que vivem no seu ambiente e desenvolvem sistemas de denominação que as conceptualizam. Mesmo no passado recente isto foi verificado: Mayr et alo (1953) referem uma tribo de papuas das montanhas da ~ova Guiné que reconhecia 137 das 138 espécies de aves existentes no seu território. A ligação dos Índios brasileiros à vida animal era, evidentemente, muito intensa. Além disso, antiga, como provam as esculturas anímalistas encontradas emjazidas arqueológicas costeiras (sambaquis) e representando sobretudo peixes (Castro Faria, 1950). A nomenclatura tupi para os animais é muito diversificada, conforme se procurou demonstrar nos relatos dos naturalistas anteriormente mencionados. Os nomes dos anímais foram grafados por cada um deles de forma particular e assim se mantiveram no presente trabalho. Não há elementos que permitam afirmar que todas, ou quase todas, as espécies fossem reconhecidas pelos indígenas. Algumas, porém, recebiam mais do que um nome distintivo, consoante a fase de desenvolvimento ou o sexo (vg Atta sexdens). Os relatos dos naturalistas mostram que, em geral, as espécies eram designadas por nomes primários simples (Berlin, 1992). Exemplos: iguaraguá, tamanduá, tatu, sucuriúba, ibíbóca, bóipeba, tatarana, etc. Também atribuíam nomes primários a fases de desenvolvimento da mesma espécie, como por exemplo, usaúbaú (obreiras) e içã (fêmeas) deAtta sexdens. Nomes secun dários (isto é, com um nome subordinado contrastante) eram aplicados a conjuntos de espécies (pira-min, peixes 91
pequenos), a espécies (inambú-uaçú, inambú-grande) ou a fases do ciclo de uma espécie (arinhã-miri, galinha; arinhã-roupiá, ovo de galinha).
Brasil digno de admiração ou desconhecido na ~ Anchieta assim o fez. E assim fizeram com ou ::.;: intenções os que lhe sucederam.
Anchieta [1933aJ queixava-se do abuso de nomes (plimários) na nomenclatura indígena. Segundo o jesuíta, os Índios reconheciam nominalmente as espécies, mas raramente os géneros, não existindo nome genérico da fonniga, do caranguejo, do rato e de outros animais; as espécies, porém, tinham todas nome próprio. É evidente que Anchieta usava 'género' e 'espécie' em acepção aristotélica, ou seja, 'espécie' no sentido de morfoespé cie e 'género' como agregado de morfoespécies com algum tipo de semelhança entre si reconhecido pelo observador.
O modelo seguido por todos eles responde. co;- ; : '~;:~ :-. variantes, às seguintes questões: (1) quais as para comer, (2) quais as de melhor qualidade. ' : devem cozinhar-se, (4) que outros produtos -- extraem do animal (pele, plumas, ossos, dentes. -- quais as espécies venenosas, (6) que oferecem estas espécies, (7) como se tratam ::~ mordeduras ou picadas, (8) quais as espécies :- dati vas, (9) quais as destruidoras de bens, (10 I - :- ~: marinhos e outros, etc. Os inquéritos ~. ~;: te-se, acabam todos por responder a estas
A nomenclatura tupi foi um utensílio poderoso na discriminação das espécies brasileiras ensaiada pelos primeiros naturalistas com objectivos utilitários. Será este o tema que se comentará nas próximas linhas.
Para que servem os animais. Olhar para a natureza para descobrir o útil e o fantástico foi uma preocupação medieval cujas razões plausíveis já foram discutidas pelo autor do presente estudo (Almaça, 2000). Esta intenção projectou-se bem para dentro do Renascimento, só gradualmente cedendo também lugar à procura do conhecimento pelo próprio valor dele, numa revives cência da curiosidade clássica de investigação da natureza. Aquelas preocupações estavam na base do desejo expresso pelo geral dos jesuítas a José de Anchieta: que este lhe escrevesse, relatando tudo o que encontrava no 92
semelhantes.
Uma intenção parece óbvia. Tratando-se de te=:-: : . recém-descobertos pelos europeus, prevenir que:---' de forma a assegurar-lhe subsistência e sobre\'Í\ér:~_ = porém, levanta outra questão. Por que não há dos naturalistas portugueses desenhos ou es:,,-, - . mesmo toscos, dos animais que conheceram e. ;' ::':- descreveram tão minuciosamente? Por qu:: - Gândavo, o único naturalista português que edito;~ :--:-. sobre o Brasil no tempo próprio, não apresent:: -:~::-= iconografia, a não ser a de um 'monstro' nu:- ~ a hipupiára? E Gândavo foi um observador:- ~ rigoroso dos animais brasileiros. Que grande devia ter o fantástico sobre o real, o que pode:- i ~::~ índice de quanto a medievalídade ainda se imI'::-- pOltugueses do renascimento.
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selvem os animais. Olhar para a natureza o útil e o fantástico uma preocupação -:ujas razões plausíveis já foram discutidas pelo presente estudo (Almaça, 2000). Esta intenção -:Xl-se bem para dentro do Renascimento, só ":_::-:1ente cedendo também lugar à procura do - :'r:;.ento pelo próprio valor dele, numa revives 2uriosidade clássica de investigação da natureza. preocupações estavam na base do desejo geral dos jesuítas a José de Anchieta: que .- escrevesse, relatando tudo o que encontrava no .::5
Brasil digno de admiração ou desconhecido na Europa. Anchieta assim o fez. E assim fizeram com tal ou idênticas intenções os que lhe sucederam. O modelo seguido por todos eles responde, com poucas variantes, às seguintes questões: (1) quais as espécies boas para comer, (2) quais as de melhor qualidade, (3) como devem cozinhar-se, (4) que outros produtos úteis se extraem do animal (pele, plumas, ossos, dentes, etc.), (5) quais as espécies venenosas, (6) que perigosidade oferecem estas espécies, (7) como se tratam as suas mordeduras ou picadas, (8) quais as espécies incomo dativas, (9) quais as destruidoras de bens, (10) monstros marinhos e outros, etc. Os inquéritos efectuados, repe te-se, acabam todos por responder a estas questões ou semelhantes. Uma intenção parece óbvia. Tratando-se de territórios recém-descobertos pelos europeus, prevenir quem viesse de fonna a assegurar-lhe subsistência e sobrevivência. Isto, porém, levanta outra questão. Por que não há nos relatos dos naturalistas portugueses desenhos ou esquemas, mesmo toscos, dos animais que conheceram e, por vezes, descreveram tão minuciosamente? Por que é que Gândavo, o único naturalista português que editou um livro sobre o Brasil no tempo próprio, não apresenta qualquer iconografia, a não ser a de um 'monstro' que nunca viu, a hipupiára? E Gândavo foi um observador crítico e rigoroso dos animais brasileiros. Que grande peso relativo devia ter o fantástico sobre o real, o que poderá ser um índice de quanto a medievalidade ainda se impunha aos portugueses do renascimento . 93
Neste aspecto, os naturalistas portugueses atrasaram-se e muito. Só com Frei Cristóvão de Lisboa, cujo manuscrito foi completado na terceira década do século XVII, surgem nomes e descrições acompanhados de iconografia. Os estrangeiros, desde Rans Staden e André Thevet, ambos com obra impressa sobre o Brasil em 1557, apresentam alguns desenhos de animais, embora pouco fiéis os de Thevet e toscos os de Staden. Isso, provavelmente, contribuiu para o grande êxito das obras que publicaram, ambas com várias edições e traduções, o que é uma medida do seu sucesso. Clirna e criação. No século XVI e seguintes ninguém duvidava, pelo menos explicitamente, da criação divina, tal como é descrita no Génesis. Assim sendo, tomava -se problemática a criação de pragas, parasitas e animais venenosos que matavam pessoas por um Deus de bondade infinita. Talvez existissem para castígar os pecadores. Muitas vezes, porém, eram atingidos aqueles que não podiam ser pecadores, por exemplo crianças. Esta contradição gerou tensões muito grandes que, mais tarde, no âmbito da Teologia natural, viriam a constituir uma das motivações para a ideia evolucionista. Porém, se Deus tivesse concedido algum poder criador à natureza, como muito mais tarde foi ponto assente para Lamarck, a formação de espécies perigosas ou prejudiciais não teria a sua chancela directa. No entanto, o fundamentalismo religioso opunha-se tenazmente a qualquer acto de criação por procuração. Quando Jean de Léry (1580, p.150). calvinista, se maravilha com as cores de certas espécies de papagaios, previne 94
imediatamente que o seu panegírico não se glorificar a natureza, como fazem os profanos. ::-:-.::' '. o excelente e admirável Criador delas (o itálico é ::-:-::
A ideia de um poder gerador da natureza ê mui:c --: e documentada, pelo menos, desde os filósorc;; ~: socráticos. O grande propugnador dela foL tc.:::: Aristóteles, que a sistematizou, aliás como a conheceu da natureza ou que reflectiu sobre muito sobre este tema; por isso, se resumidamente as suas idei as acerca dele. . Aristóteles, muito insectos nasceriam a partir em putrefacção e outros no próprio interior dos de dejectos que se acumulam nos orgãos Animais, 539 a); certos peixes a partir do lodo, e de matérias em decomposição que os cobrer:: 569 a). Para Aristóteles, a causa responsá\c' -. geração espontânea seria o movimento e condições climátícas (Geração dos Animais" : Em Anchieta, Gândavo, Cardim e outros enco::-.- ideias muito semelhantes quanto à origem dos venenosos. Para Anchieta [1933b], o responsável pela cliação de animais peçonhentos, as aranhas e serpentes. Gândavo [1958] é mais o clima e os ventos daquela terra, infectaccs podridão das ervas e zonas alagadas gera, por do sol, a diversidade de animais venenosos, E C [1997, p,84] segue caminho idêntico ao atribuir;::c , a causalidade da grande diversidade de serpemes, :_ e aranhas peçonhentas e de outros animais irr:. Para todos em geral é também o clima o respc:-s pelas maravilhosas cores da plumagem de cert2.5
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se Deus tivesse concedido algum poder criador .:.:..:.reza. como muito mais tarde foi ponto assente - _~marck, a formação de espécies perigosas ou não teria a sua chancela directa. No entanto, ..:-_.:.:nentalismo religioso opunha-se tenazmente a ~-=...:.er acto de criação por procuração. Quando Jean =-=r:, 11580, p.150), calvinista, se maravilha com -es de certas espécies de papagaios, previne
imediatamente que o seu panegírico não se destina a glorificar a natureza, como fazem os profanos, mas sim o excelente e admirá vel Criador delas (o itálico é meu). A ideia de um poder gerador da natureza é muito antiga e documentada, pelo menos, desde os filósofos pré socráticos. O grande propugnador dela foi, todavia, Aristóteles, que a sistematizou, aliás como a tudo o que conheceu da natureza ou que reflectiu sobre ela. Escreveu muito sobre este tema; por isso, se apresentarão aqui resumidamente as suas ideias acerca dele. Assim, para Aristóteles, muito insectos nasceriam a partir da terra em putrefacção e outros no próprio interior dos animais, de dejectos que se acumulam nos orgãos (História dos Animais, 539 a); certos peixes a partir do lodo, da areia e de matérias em decomposição que os cobrem (HA., 569 a). Para Aristóteles, a causa responsável pela geração espontânea seria o movimento e calor das condições climáticas (Geração dos Animais, 743 a). Em Anchieta, Gândavo, Cardim e outros encontram-se ideias muito semelhantes quanto à origem dos animais venenosos. Para Anchieta [1933b], o clima seria responsável pela criação de animais peçonhentos, como as aranhas e serpentes. Gândavo [1958] é mais explícito: o clima e os ventos daquela terra, infectados pela podridão das ervas e zonas alagadas gera, por influência do sol, a diversidade de animais venenosos. E Cardim [1997, p.84] segue caminho idêntico ao atribuir ao clima a causalidade da grande diversidade de serpentes, lacraus e aranhas peçonhentas e de outros animais imundos. Para todos em geral é também o clima o responsável pelas maravilhosas cores da plumagem de certas aves. 95
Heterogonia. Também é ideia muito antiga a de que de uma espécie se pode gerar outra, diferente. Não se confunda esta ideia com a de evolução saltacionista, pois a heterogonia é uma questão de origem, não de mutação evolutiva, sistémica ou outra. Na heterogonia, espécies conhecidas teriam, por vezes, Oligem noutras espécies também conhecidas. Aristóteles, inevitavelmente, discorreu sobre a questão. Assim, no mar, nasce da vasa, da areia ou das matérias em decomposição um . peixe miúdo que não cresce nem se reproduz. Em certos locais (H.A., 569 b) este peixe miúdo produzia lampadinha (Sprattus sprattus), esta, por seu lado, célerin (peixe indeterminado), o qual Olíginava sardinha (Sardina pilchardus). Teofrasto dedica muita atenção à heterogonia nos vegetais (História das Plantas, Livro II). Para ele pode ser uma questão de 'lugares e de ares'. Dizia-se que em certos locais a semente de uma planta silvestre originava uma planta cultivada, como se dizia que da cevada podia nascer trigo e vice-versa. Teofrasto considerava estas transformações das plantas contra a natureza e prodigiosas. Assim, a hortelã-de-água (Mentha aquatíca), que vive em valas, rios, águas estagnadas e lugares húmidos, converter-se-ia, segundo Teofrasto, em hortelã (Mentha viridis), espécie doméstica, na ausência de cuidados que o impedissem. Em certas condições, Triticwn monococcum e T. dicoccum originariam o trigo comum. Seria um caso semelhante à modificação produzida nas sementes por mudança de solo: alteravam a sua conformidade consoante o solo em que eram semeadas. 96
Estas hipóteses, que hoje arrecadamos no curiosidades do passado, fizeram vida durante enraizando numa das dificuldades mais persister::e:. Biologia: a definição de espécie l 7 .
A verdade é que para os naturalistas de quinhe:-: ... , heterogonia parecia uma hipótese crível. Para o bicho-da-taquara, lagarta da borboleta smerintha, originava não só a borboleta, como taL. ~e ratos e lagartas que cortam a erva. E uma ,~ _ . colibri ("um dos géneros de guainumbf) uma borboleta. Cardim foi mais longe, pois apreciou, maravilhado, a borboleta a converter-se e'·' colibri, passando em fase intermédia por borbole:_ :: pássaro simultaneamente. Até comenta ser esta ~ ...::' _. vilha - um ser vivo converter-se noutro sem . (o itálico é meu) -, ignorada pelos filósofos. S ~ _::-:' espontaneísta poderia tecer tal comentário. Como se verá, outros naturalistas do Brasil acreditar:::=-:-: - _ heterogonia.
Viviparidade das serpentes. A estupefacçãe ':::.: Anchieta ao ver sair as crias do corpo de uma ser;-e-:: que matara à bastonada é significativa da sua insuEc:e":: formação histórico-natural. Com efeito, é muito an::i;' : conhecimento de que muitos ofídios são vi\Íp:::r::; Aristóteles já fazia a distinção entre animais o\ípar" ~ e vivíparos, considerando nos últimos, dois tipos (Gc:,-..,: dos Animais, 718 b). Ao primeiro, dizia Alistó:e: pertencem o homem, o cavalo, o cão e todos os ani::·.... pelíferos, incluindo os aquáticos, como golfinhos. _.
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Estas hipóteses, que hoje arrecadamos no baú das cUliosidades do passado, fizeram vida durante séculos, enraizando numa das dificuldades mais persistentes da Biologia: a definição de espécie! 7 . A verdade é que para os naturalistas de quinhentos a heterogonia parecia uma hipótese crível. Para Anchieta, o bicho-da-taquara, lagarta da borboleta Myelobia smerintha, originava não só a borboleta, como também ratos e lagartas que cortam a erva. E uma espécie de colibri ("um dos géneros de guainumbí) gerar-se-ia de uma borboleta. Cardim foi mais longe, pois até viu e apreciou, maravilhado, a borboleta a converter-se em colibri, passando em fase intermédia por borboleta e pássaro simultaneamente. Até comenta ser esta mara vilha - um ser vivo converter-se noutro senz corrupção (o itálico é meu) -, ignorada pelos filósofos. Só um espontaneísta poderia tecer tal comentário. Como adiante se verá, outros naturalistas do Brasil acreditaram na heterogonia.
Viviparidade das serpentes. A estupefacção de Anchieta ao ver sair as crias do corpo de uma serpente que matara à bastonada é significativa da sua insuficiente formação histórico-natural. Com efeito, é muito antigo o conhecimento de que muitos ofídios são vivíparos. Aristóteles já fazia a distinção entre animais ovíparos e vivíparos, considerando nos últimos, dois tipos (Geração dos Animais, 718 b). Ao primeiro, dizia Aristóteles, pertencem o homem, o cavalo, o cão e todos os animais pelíferos, incluindo os aquáticos, como golfinhos, baleias 97
e outros cetáceos. Neste grupo, a parturição origina crias que já estavam formadas no interior da mãe. No segundo grupo, constituído por seláceos e víboras, ainda que a cria nasça já forn1ada, as fêmeas produzem, internamente, ovos. E estes ovos são 'pelfeitos', isto é, o embrião desenvolveu-se dentro deles e à custa das substâncias nutritivas contidas no ovo. Os dois grupos de animais vivíparos, distinguiu-os Aristóteles como o dos animais 'internamente vivíparos' e 'externamente vivíparos', respectivamente. Até ao século XX foi comum denominarem-se os animais 'externamente vivíparos' por ovovivíparos, no sentido de indicar que, a despeito dos embriões se desenvol verem dentro do corpo materno, a sua nutrição era assegurada pelas reservas do ovo. As vantagens da ovoviviparidade pareciam óbvias: as fêmeas procuram as presas, transportando a sua postura protegida no interior do corpo, onde é incubada, e sem consumirem energia na alimentação dos embriões. No entanto, todas as formas de transição entre a viviparidade e a ovovivi paridade foram sendo conhecidas, demonstrando graus muito diversos de dependência nutricional entre os embriões e a mãe e estruturas mais ou menos complexas relacionadas com tal dependência. Essas formas de transição preencheram todos os intervalos entre um simples processo de incubação interna de algumas serpentes e a estrutura placentária complexa de celtos tubarões. E assim, o conceito de ovoviviparidade foi abandonado, adaptando-se complementarmente um conceito de viviparidade mais alargado. 98
Crenças e superstições. Para além da heteros:oní:::.. _._ . justificou um tratamento mais particularizado, há __
muito interessantes a comentar nesta secção.
ainda hoje, é de prever serem muitas e variadas as C:-~- _' e superstições entre os indígenas do Brasil,
entre os próprios naturalistas do século XVI.
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Comecemos pelos 'monstros'. A oração co::: Gândavo [1958] termina o capítulo sobre o mc':-,~' marinho, oração que antes se reproduziu, é da admiração pelo misterioso. Os pormenores de Baltasar Ferreira contra a hipupiára, eventual:::e- ,_ um animal grande, mas assustado, que apenas procc' __ fugir para o mar, demonstram o fascínio exercido::: _ . desconhecido nas pessoas. Porém, Cardim vai mais :,;--:-,-_ e, na mesma 'espécie' de monstro, pelo menos no nome, distingue os homens das mulheres. serem formosas, e descreve a técnica de matar. e mutilar as presas. Não lhe ficando atrás, Soare' Sousa repete as histórias e até indica os locais e :c em que as hipupiáras se encontram com freg Jean de Léry, mais discreto, refere apenas cabeças monstruosas, como o peixe-serra. Outras crenças, como por exemplo as das couendou, com movimento autónomo e penetra;-;~e. e :.. das 'víboras vi ngati vas' , j á nessa época eram Relativamente a espécies semelhantes, Alberto registara histórias idênticas (Almaça, 2000). A preguiça que, de acordo com Léry, vive do \e-:-~: pois nunca ninguém a viu alimentar-se, foi durou pouco. Cardim desvaneceu-a, afirmando
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Crenças e superstições. Para além da heterogonia, que justificou um tratamento mais particularizado, há situações muito interessantes a comentar nesta secção. Frequentes ainda hoje, é de prever serem muitas e variadas as crenças e superstições entre os indígenas do Brasil, bem assim entre os próprios naturalistas do século XVI. Comecemos pelos 'monstros'. A oração com que Gândavo [1958] termina o capítulo sobre o monstro marinho, oração que antes se reproduziu, é elucidativa da admiração pelo misterioso. Os pormenores da luta de Baltasar Ferreira contra a hipupiára, eventualmente um animal grande, mas assustado, que apenas procurava fugir para o mar, demonstram o fascínio exercido pelo desconhecido nas pessoas. Porém, Cardim vai mais longe e, na mesma 'espécie' de monstro, pelo menos idêntico no nome, distingue os homens das mulheres, que diz serem formosas, e descreve a técnica de matar, lamentar e mutilar as presas. Não lhe ficando atrás, Soares de Sousa repete as histórias e até indica os locais e épocas em que as hipupiáras se encontram com frequência. Jean de Léry, mais discreto, refere apenas peixes de cabeças monstruosas, como o peixe-serra. Outras crenças, como por exemplo as das puas do couendou, com movimento autónomo e penetrante, e a das 'víboras vingativas' ,já nessa época eram antigas. Relativamente a espécies semelhantes, Alberto Magno registara histórias idênticas (Almaça, 2000). A preguiça que, de acordo com Léry, vive do vento, pois nunca ninguém a viu alimentar-se, foi crença que durou pouco. Cardim desvaneceu-a, afirmando que não 99
podia trazer-se para Portugal por lhe faltarem as folhas da planta de que se nutria. Durante quanto tempo, porém, se acreditou que a tiejuba se alimentava de pedrinhas? E a buijeja que, por mais que se despe daçasse, se reconstituia sempre? Mais geralmente aceite pelos naturalistas, embora com variantes, era a crença de que as serpentes (slIcuryúba, gíbóia, boitiapóia), no acto de constrição, matam as presas enfiando-lhes a cauda no ânus, no sexo ou nos ouvidos. E o apodrecimento do ventre e sua ingestão por aves necrófagas, que só deixariam ficar a cabeça e a coluna vertebral, seguida de reconstituição e revivescência do animal. Muito estranha também a mortal apreensão dos Índios quando ouviam cantar areIa guararigeíg, que tanto espantou Fernão Cardim. Com estranheza, tal vez mesmo uma ponta de superstição, foram observadas pelos naturalistas certas situações sem explicação plausível na época. É o caso da mordedura das jararacas, quase sempre mortal, mas inofensiva para aqueles que já haviam sido mordidos e sobreviveram. Hoje compreendem-se os mecanismos desta imunidade adquirida; na época de Anchieta parecia milagre. Mais difícil de explicar, porém com certa comprovação, o relato de Léry sobre a acção anti-dispersiva do veneno de escorpião proporcionada pelos humores do próprio escorpião. Experiências já antigas (Phisalix, 1922) sugerem a existência de substãncias anti-tóxicas no sangue dos escorpiões, que neutralizam até cerio ponto a acção do seu veneno.
100
Os franceses no :'\Iar8rl., ~ A cobiça que o Brasil de europeus fez com que os malogro da França antárctica, - exploração das riquezas do no\ ~ expedição francesa conseguiu feitorias na costa entre a ilha de :'\1<:::' -, -, De tal forma que o rei de Franç ;;::'. Ravardiere com o propósito de ':: norte uma zona de colonização conhecida por 'França equinociaí' ~,c,c Em Março de 1612, parte para a ' missão de frades capuchinhos cu,: d'Évreux e em que participa\ar:-: Ambroise d'Amiens e Claude d' pouco depois de chegar ao BrasiL doença ou outras razões, perma:;;;:::,::: :-' meses no Maranhão. Claude che Agosto de 1612 e voltou para Fnr';:. :.:~:' mesmo ano, acompanhado de seis em Abril de 1613 estava em antárctica, também a França estoutra aventura francesa ficou , (Magalhães, 1998).
o curto período que Claude d' pennaneceu no Maranhão bastou- ::e -_ interessante crônica sobre a de la mission des peres capucil15 fi: ' . et terres circonvoisins e que foi :;,~,'::'
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Os franceses no :Maranhão A cobiça que o Brasil despertava noutros países com que os franceses, mesmo após o europeus malogro da França antárctica, não desistissem da exploração das riquezas do novo país. 1594, uma expedição francesa conseguiu a fixação de algumas feitoJias na costa entre a ilha de Maranhão e o Amazonas. De tal forma que o rei de França enviou, em 1604, La Ravardiere com o propósito de estabelecer na costa norte uma zona de colonização francesa, a qual ficará conhecida por 'França equinocial' (Magalhães, 1998) . Em Março de 1612, parte para a ilha de Maranhão uma missão de frades capuchinhos cujo superior era Yves d'Évreux e em que participavam Arsene de Paris, Ambroise d' Amiens e Claude d' Abbeville. Arsene mou'eu pouco depois de chegar ao Brasil; os outros frades, por doença ou outras razões, permaneceram apenas uns meses no Maranhão. Claude chegou ao Maranhão em Agosto de 1612 e voltou para França em Dezembro do mesmo ano. acompanhado de seis Índios Tupinambás; em Abril de 1613 estava em Paris. Tal como a França antárctica, também a França equinocial teve vida breve; estoutra aventura francesa ficou liquidada em 1615 (Magalhães, 1998).
o curto período que Claude d' Abbeville ( ? -
1632) permaneceu no Maranhão bastou-lhe para preparar uma interessante crônica sobre a região, intitulada Histoire de la mission desperes capucins en l'isle de Maragnan et terres circonvoisins e que foi publicada em 1614. 101
~este
livro, sem figuras, são dedicados quatro capítulos (39-42) aos animais.
O capítulo 39 ocupa-se das aves, descrevendo o frade mais de sessenta espécies e ainda um morcego hematófago, andheure (Desmodus rotundus). As aves são apreciadas pela qualidade da carne (havia muitas consideradas excelentes por Claude) e beleza da sua plumagem. Para o frade ninguém podia deixar de se encantar e admirar a sapiência e providência de Deus ao contemplar a enorme diversidade e beleza das aves que Ele pós no Maranhão (Abbeville, 1614, p.244). No capítulo referente aos peixes - melhor se diria, aos animais aquáticos, pois comporta mamíferos, répteis, peixes e crustáceos descreve mais de cinquenta espécies, referindo todavia que há uma infinidade de espécies e, por isso, apenas menciona as melhores e mais comuns. Para começar, o peixe-boi, ou ouaraoua (Trichechus manatus), que os franceses denominavam vache de mer, 'peixe' com carne de excelência. Chama a atenção para o perigo de se ser espetado pelo aguilhão da cauda de batóides como o yaüebouyre (Dasyatis guttata) e o narinnary (Aetobatus narinari). Entre os peixes dulciaquícolas relata o choque produzido pela enguia-eléctrica, pourakí (Electrophorus elec tricus), que frustrava e magoava quem tentasse matá-la à espadeirada. Refere também a piranha-amarela, ou pyrain (Serrasalmus nattereri), cujo nome tupi significa 'tesoura' e alude aos dentes cortantes. Dos caranguejos, merece referência o aouara oussa (Ocypode quadrata), branco e grande, que busca âmbar-cinzento no espraiado e o transporta para as suas tocas. 102
O capítulo 41 é dedicado aos boa descrição do tamanduá 01:, tyla), que é bom para comer e cor:s~:-: mais idosos, fica-se a saber que ingerem facilmente a sua carne. É se alimenta de formigas, têm receio coragem para a guerra. Há também '. __ preguiças, unaü (Bradypus tridacry (Choloepus didactylu.s), e a obsen'aç -.::._ atacam uma árvore, só a abandonam ~ todas as folhas. Quanto à serpente boy-été (Crotalz'.' frade (p.233) que ela exibe na por.:.::. bexiga ruidosa, que soa como se es':' ~:: ervilhas, parecendo que Deus e a me..:.. para advertir o homem da sua preseD~ ~ ~ um animal tão perigoso. De facto. ouviam o seu sinal, logo procura\ - _ serpente, embora não a comessem. Bc:.. perigosos. O iouboy (Boa cOl1stric~" . classifica de muito venenosa, cenaee:--. tara-gou.y boy (Cnemidophonls lagarto, perigoso e não-comestÍ\e:. (Liophis miliaris), que, a despeito C:ê Índios comiam. E sapos enormes. c marinus), de carne branca e muito ~ __ fidalgos franceses comerem com gra:-:c:e ~- :: Enfim, um último capítulo zoológícc. 'animais imperfeitos'. O frade avisa (p.25- . a parte há animais pelfeitos e imperfe':::
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.. .::preciadas pela qualidade da carne (havia muitas
· . -s:deradas excelentes por Claude) e beleza da sua
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· - : ":'::-. :~lr e admirar a sapiência e providência de Deus ao
· . - :;:;:-:;plar a enorme diversidade e beleza das aves que ~:..- no Maranhão (Abbeville, 1614, p.244). '. - .:::pítulo referente aos peixes - melhor se diria, aos aquáticos, pois comporta mamíferos, répteis, e5 e crustáceos -, descreve mais de cinquenta referindo todavia que há uma infinidade de e, por isso, apenas menciona as melhores e --_:_.s ,:omuns. Para começar, o peixe-boi, ou ouaraoua ',:,fC!zUS manatus), que os franceses denominavam mer, 'peixe' com carne de excelência. Chama para o perigo de se ser espetado pelo aguilhão de batóides como o yaüebouyre (Dasyatis e o narinnary (Aetobatus narina ri). dulciaquícolas relata o choque produzido iéctrica, pourakí (Electrophorus elec frustrava e magoava quem tentasse matá-la Refere também a piranha-amarela, ou I Serrasalmus nattereri), cujo nome tupi significa ::-~.-. e alude aos dentes cortantes. Dos caranguejos, --;:'ece referência o aouara oussa (Ocypode quadrata), --.:::-._ e grande, que busca âmbar-cinzento no espraiado "':msporta para as suas tocas.
o capítulo 41 é dedicado aos animais terrestres. Após boa descrição do tamandua (Myrmecophaga trídac tyla), que é bom para comer e consumido pelos Índios mais idosos, fica-se a saber que os mais jovens não ingerem facilmente a sua carne. É que, como o tamanduá se alimenta de formigas, têm receio de ficar fracos e sem coragem para a guerra. Há também boas descrições das preguiças, unaü (Brad}pus tridactylus) e unaü ouassou (Choloepus didactylus), e a observação de que, quando atacam uma árvore, só a abandonam após terem comido todas as folhas. Quanto à serpente boy-été (Crotalus durissus), diz o frade (p.233) que ela exibe na ponta da cauda uma bexiga ruidosa, que soa como se estivesse cheia de ervilhas, parecendo que Deus e a natureza lha deram para advertir o homem da sua presença e precavê-lo de um animal tão perigoso. De facto, quando os Índios ouviam o seu sinal, logo procuravam e matavam a serpente, embora não a comessem. Havia outros répteis perigosos. O iouboy (Boa constrictor), que Claude classifica de muito venenosa, certamente por engano. O tara-gouy boy (Cnemidophorus ocellÍ;fer), espécie de lagarto, perigoso e não-comestível. O tarehuboy (Liophis miliaris), que, a despeito de ser temível, os Índios comiam. E sapos enormes, courourou (Bufo marinus), de carne branca e muito boa, que Claude viu fidalgos franceses comerem com grande enlevo. Enfim, um último capítulo zoológico é dedicado aos 'animais imperfeitos'. O frade avisa (p.254) que em toda a parte há animais perfeitos e imperfeitos (incómodos 103
para o homem). Estes últimos são designados por insectos, havendo quem também os chame Armulosa, ou Al1l1ulata. São pequenos animais sem sangue e sem apêndices, segundo Claude. Refere várias espécies do Maranhão e detém-se no bicho-do-pé, ou f 011 (Tunga penetrarlS), cujos malefícios ponnenoriza, aconselhando regras higiénicas para os evitar. Até a predação exercida por um grilo, koeuioup (Gryllus assinzilis) , sobre o bicho-do-pé entra nas considerações do frade, que, a propósito, reflecte sobre o ciclo da natureza Cp. 258): as galinhas e animais semelhantes comem os koeuioup, que por seu lado comem o bicho-do-pé; este incomoda o homem e o homem come a galinha.
impressão, segundo PelTone-Moisés (199-1-) ?'~
incómodo recordar a França equinocial perante ,'~:;:"_ aliança entre França e Espanha (a que a cor
Portugal e, p011anto, o Brasil, estavam ligados). D;:~
se da nota com que François de Rasilly abre a
edição do trabalho de Yves d'Évreux [1985J. L .... , au nord du Brésilfait en1613 et 1614, que o
da primeira, François Huby, terá sido subon:ad.:::- ' proceder àquela destruição. Foi Rasilly quem COr.5;:; ..
recuperar, dois anos e meio após a public
destruição) do li vro, o trabalho de Yves
mutilado da maior parte do prefácio e das pal1e5 _.. ,_
de alguns capítulos. Este recuperado estará na k~
segunda edição, publicada em 1864.
Assim observa e interpreta a natureza o frade de Abbeville. Atendendo a que o seu li vro é o produto de apenas cerca de quatro meses de observações, não se pode deixar de admirar o feito de Claude, que é o primeiro a divulgar a fauna do Maranhão. A sua curiosidade e alguma preparação (Claude mostra-se conhecedor de Alistóteles e Plínio) justificarão a rapidez com que observou, anotou, redigiu e imprimiu o livro sobre o Maranhão. As preocupações dominantes do frade não contrastam com as dos restantes naturalistas: discriminar o que é bom para comer ou perigoso para o homem e o que é belo ou finalizado. Tudo para glória do Deus criador.
Mais filosófico e literário no estilo, mas mau obsec ~_ .
Yves d'Évreux deixou um texto sem figuras e r.~;::
simples de interpretar, em virtude de usar
nomes de espécies europeias para a fauna do
Descreve a variação etária da plumagem de
ruber, chamando-lhe courlis rouge, nome que se .::.:
aos maçaricos (Numenius sp.). Na sequência _'-::_ de Aristóteles, atribui as características da p]um;::;;:_
da pelagem, incluindo a sua coloração, ao .:~= _ alimentação e sua quantidade, excessiva ou n3.". :
corpo. Observou a iguana (Iguana iguana). me-~
nando as cores e hábitos do animal.
Rápido foi, igualmente, o superior da missão, Yves d'Évreux (15707-16307), que, em 1615, teve impressa a sua obra sobre o Maranhão. Ao que parece, todavia, os exemplares do livro foram destruídos logo após a
Em um capítulo, Yves descreve uma pesca comu:-.. :~'::'
dos indígenas do Maranhão e regiões vizinhas.
meses após a época das chuvas - quando as ch:::
desvaneceram, mas não completamente,
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tomem). Estes últimos são designados por - ;:::~(15. havendo quem também os chame Annulosa, São pequenos animais sem sangue e sem ~~.:-es, segundo Claude. Refere várias espécies do ~.~:' ..:"::-:ão e detém-se no bicho-do-pé, ou ton (Tunga cujos malefícios pormenoriza, aconselhando _:-_s :ligiénicas para os evitar. Até a predação exercida .:~ grilo, koeuioup (Gryllus assimilis), sobre o :-do-pé entra nas considerações do frade, que, a reflecte sobre o ciclo da natureza (p. 258): as e animais semelhantes comem os koeuioup, que .:' seu lado comem o bicho-do-pé; este incomoda o .eD e o homem come a galinha. ~,;
impressão, segundo Perrone-Moisés (1994) por ser incómodo recordar a França equinocial perante a recente aliança entre França e Espanha (a que a coroa de Portugal e, portanto, o Brasil, estavam ligados). Deduz se da nota com que François de Rasilly abre a segunda edição do trabalho de Yves d'Évreux [1985], Voyage au nord du Brésilfait en 1613 et 1614, que o impressor da primeira, François Huby, terá sido subornado para proceder àquela destruição. Foi Rasil1y quem conseguiu recuperar, dois anos e meio após a publicação (e destruição) do li vro, o trabalho de Yves d'Évreux, mutilado da maior parte do prefácio e das partes finais de alguns capítulos. Este recuperado estará na base da segunda edição, publicada em 1864,
::1 observa e interpreta a natureza o frade de ~. ~ :::-e\ Atendendo a que o seu livro é o produto de .- ::::"._5 cerca de quatro meses de observações, não se ':e deixar de admirar o feito de Claude, que é o a divulgar a fauna do Maranhão. A sua ..~3:dade e alguma preparação (Claude mostra-se . -~e2edor de Aristóteles e Plínio) justificarão a rapidez observou, anotou, redigiu e imprimiu o livro . :::-:'e o ::\1aranhão. As preocupações dominantes do :;ão contrastam com as dos restantes naturalistas: . s_::minar o que é bom para comer ou perigoso para . ~~em e o que é belo ou finalizado. Tudo para glória . :Je'JS criador.
Mais filosófico e literário no estilo, mas mau observador, Yves d'Évreux deixou um texto sem figuras e menos simples de interpretar, em virtude de usar sobretudo nomes de espécies europeias para a fauna do Maranhão. Descreve a variação etária da plumagem de Eudocimus ruber, chamando-lhe courlis rouge, nome que se aplica aos maçaricos (Nwnenius sp.).:Na sequência das ideias de Aristóteles, atribui as características da plumagem e da pelagem, incluindo a sua coloração, ao tipo de alimentação e sua quantidade, excessiva ou não, no corpo. Observou a iguana (Iguana iguana), mencio nando as cores e hábitos do animal.
foL igualmente, o superior da missão, Yves -"em (1570?-1630?), que, em 1615, teve impressa sobre o Maranhão. Ao que parece, todavia, e\emplares do livro foram destruídos logo após a
um capítulo, Yves descreve uma pesca comunitária dos indígenas do Maranhão e regiões vizinhas. Alguns meses após a época das chuvas - quando as cheias se desvaneceram, mas não completamente, deixando 105
inúmeras poças e valas com pouca água e muito peixe retido -, os indígenas efectuavam a sua pesca anual. Enorme quantidade de peixe era colhido e defumado no local (boucan), sendo depois consumido à medida das necessidades. Na mesma campanha, capturavam-se jacarés adultos, crias e ovos. Os animais grandes eram cortados em pedaços, seguidamente defumados e conservados. As crias cozidas inteiras e logo consumidas, bem como os ovos. Faziam, igualmente, grandes colheitas de tartarugas, que transportavam vivas nas canoas. Yves não saboreava estes cozinhados, que lhe repugnavam e, nas suas locubrações teóricas, seguia Santo Isidoro e Solinus, que haviam escrito sobre animais do Egipto. A caça dos ratos, formigas e lagartos é, seguidamente, considerada. Os Índios desprezavam os ratos domés ticos, embora os caçassem, mas para servirem de alvo ao exercício de arco e flecha dos jovens. Porém, consideravam deliciosos os ratos silvestres (Echimys armatus, Kerodon rupestris). Comiam-nos defumados ou grelhados e preferiam-nos a qualquer outro mamífero. As grandes fonrugas aladas (Atta sexdens) eram também muito apreciadas pelos Índios do Maranhão. Os lagartos marinhos, uns grandes, taroüire (Dracaena guianensis), outros pequenos, tojou (Tupinambis teguixin), viviam no espraiado. Com tanta carne como um coelho ou uma lebre, eram cozidos ou grelhados e um grande petisco para os franceses. Todavia, mais uma vez o frágil Yves se recusou a provar. Os lagartos terrestres (Hemidac tylus mabouia, introduzido de África) eram colhidos nos telhados das habitações e muito apreciados pelos indígenas, que os comiam grelhados. Yves d'Évreux 106
verificou que perdem a cauda, atribuindo tal envelhecimento do animal. Na sua opinião, rIS : ~, regeneram, ainda que Aristóteles, escreve p. 167], tenha dito que sim.
Aranhas, cigarras e mosquitos preenchem UIT. ~ .. capítulos. Para começar, a viúva-negra (LatrolL -. macrans), grande como um punho, lenta, vem1e::--,'::' muito venenosa. Atemoriza os Índios e, segundo o f;-' alimenta-se da 'conupção do ar' [p. 168]. Depois. ' diversidade de espécies, grandes e pequenas, construtoras de teias, acorrendo imediatamente qU2:''::~ alguma presa se emalha e sugando-lhe a cabe~:: o: . corpo. No entanto, o que abundava no Maranhão e- as cigarras, muito diversas no tamanho e no produzido. Yves teve curiosidade em saber corr: " produziam e descreve a sua experiência "primeiro retêm o ar no ventre e dilatam o corpo: qG::':' . as asas externas, fortes, tocam as internas, delgJé:::~ diáfanas, obrigando estas a bater contra os flancos, circula e produz o som." Também havia ' •. espécies de mosquitos e, entre elas, a mais temí\el ::':::~:: os franceses, o marigoin (Culicoides sp.), qCe atormentava quando iam pescar peixes-bois.
Os Índios usavam um grilo, coujou (Grillus assim!' Eneoptera surinamensis), como animal de compar.:-- •.: . Yves tentou estudar este glilo que, segundo ele [p, ~ - .:. nasceria de geração e de corrupção. Porquê de cc-:.- ção? Porque, quando se construía uma cabana e se c':: '::-:-. de palma fresca, rapidamente o tecto ficava cober:. . coujous. O calor do sol, actuando sobre a palma \,
- -::::::-as poças e valas com pouca água e muito peixe ~.:_':' -. os indígenas efectuavam a sua pesca anual. : - =:-::1': quantidade de peixe era colhido e defumado no . =_. bOllcan), sendo depois consumido à medida das -t;:s:dades. Na mesma campanha, capturavam-se _. '::'::-~3 adultos, crias e ovos. Os animais grandes eram em pedaços, seguidamente defumados e As crias cozidas inteiras e logo consumidas, r':-. :0:110 os ovos. Faziam, igualmente, grandes colheitas :.::.::-:arugas, que transportavam vivas nas canoas. Yves 3aboreava estes cozinhados, que lhe repugnavam suas locubrações teóricas, seguia Santo Isidoro ~ ..:nus, que haviam escrito sobre animais do Egipto. i
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dos ratos, formigas e lagartos é, seguidamente, .s:derada. Os Índios desprezavam os ratos domés . embora os caçassem, mas para servirem de alvo ~\ercício de arco e flecha dos jovens. Porém, '::-.s:deravam deliciosos os ratos silvestres (Echimys :;:~IS, Kerodon rupestris). Comiam-nos defumados . --;::lhados e preferiam-nos a qualquer outro mamífero. ,~ ;:.::.ndes fonnigas aladas (Afta sexdens) eram também apreciadas pelos Índios do Maranhão. Os lagartos uns grandes, taroüire (Dracaena guianensis), -::-5 pequenos, tojou (Tupinambis teguixin), viviam s~raiado. Com tanta carne corno um coelho ou urna , eram cozidos ou grelhados e um grande petisco _=- _ ,:5 franceses. Todavia, mais urna vez o frágil Yves . -:: :usou a provar. Os lagartos terrestres (Hemidac . ;!:abouia, introduzido de África) eram colhidos :;::bados das habitações e muito apreciados pelos que os comiam grelhados. Yves d'Évreux
verificou que perdem a cauda, atribuindo tal perda ao envelhecimento do animal. Na sua opinião, não a regeneram, ainda que Aristóteles, escreve Yves [1985, p. 167], tenha dito que sim. Aranhas, cigarras e mosquitos preenchem um dos capítulos. Para começar, a viúva-negra (Latrodectus mactans), grande como um punho, lenta, vermelha e muito venenosa. Atemoriza os Índios e, segundo o frade, alimenta-se da 'corrupção do ar' [p. 168]. Depois, urna diversidade de espécies, grandes e pequenas, muitas construtoras de teias, acorrendo imediatamente quando alguma presa se emalha e sugando-lhe a cabeça e o corpo. No entanto, o que abundava no Maranhão eram as cigarras, muito diversas no tamanho e no som produzido. Yves teve curiosidade em saber como o produziam e descreve a sua experiência [p. 170]: "primeiro retêm o ar no ventre e dilatam o corpo; quando as asas externas, fortes, tocam as internas, delgadas e diáfanas, obrigando estas a bater contra os flancos, o ar circula e produz o som." Também havia diferentes espécies de mosquitos e, entre elas, a mais temível para os franceses, o marigoin (Culicoides sp.), que os atormentava quando iam pescar peixes-bois. Os Índios usavam um grilo, coujou (Grillus assimilis ou Eneoptera surinamensis), corno animal de companhia. Yves tentou estudar este grilo que, segundo ele [p. 172], nasceria de geração e de corrupção. Porquê de corrup ção? Porque, quando se construía uma cabana e se cobria de palma fresca, rapidamente o tecto ficava coberto de coujous. O calor do sol, actuando sobre a palma verde, 107
produziria o animal, visto que, colocando palma seca,já isso não acontecia. Mas, também se reproduzia sexuadamente e de que maneira. A multiplicação da espécie só é limitada pelos seus predadores, que são muitos: lagartos, macacos pequenos chamados sapajous (Saimiri sciums), galinhas e formigas grandes.
-marinhas - que deviam realmente ser lontras brasiliensis) -, tão agressivas quanto as tenes·";;:~ Encontra-se, igualmente, grande diversidade e de macacos, alguns dos quais pescam caranguej mexilhões. A uns e outros partem com pedras se excessivamente rijos para os seus dentes.
Havia um animal do tamanho de um lagarto, a que Yves chama camaleão, mas é uma iguana (Iguana iguana), e descreve, considerando-o [p. 174] portador de um humor excessivo emfrio (o itálico é meu), que o tornaria muito venenoso para algum animal que o comesse. Então, a natureza, para que ele não envenenasse com a sua excessiva frieza os frutos em que toca, fez com que habite os ramos das árvores que apenas servem para queimar. Havia, ainda, uma infinidade de moscas, umas diurnas, outras nocturnas. Entre elas, as moscas-do-mel, cujos ninhos o frade observou, concluindo que a reprodução da mosca é virginal. Também se encontravam vespas, uma das quais, negra, constrói um complexo ninho de ban'o no alto das árvores. Yves observou pormenorizadamente este ninho, mas um dia bateu com a cabeça na câmara da fêmea e ela [p. 178] " ... julgando mal a sua intenção, pensou que ele o fizera por afronta e, então, encolerizada, procurou -lhe os olhos para ferrar ... felizmente Deus desviou-lhe o aguilhão para a sobrancelha do frade ..." Apesar disso, a dor foi enorme, a ponto de o frade cair por terra e permanecer doente vários dias.
1\as terras vizinhas da ilha de Maranhão vêem-se águias, cujas plumas são muito apreciadas pelos Índ~c~ E uma ave de dimensões consideráveis, o ouira-ollas.~-: (Harpia harpija), predadora de macacos, de que S~ levou um exemplar para França. Também araras ~ canindés, de plumas igualmente desejadas, que =~ indígenas capturam vivas e conservam nas suas casas. C processo de captura é muito curioso: fazem esconder-:.: c ~ com folhas de palmeiras no cimo das árvores; as aves se aproximam dão-lhes uma cacetada qüe ::.~ atordoa e cair ao solo, sem as matar. Ainda . . ~ grande quantidade de aves ribeirinhas a que chan. . :::" garças e andorinhas-do-mar e outras que designou ~~- melros. Termina a sua crónica zoológica descre\·e-.;::'·: um colibri e os seus minúsculos ovos.
A onça (Panthera anca) é o animal mais selvagem do Brasil. Solitária, não procura o homem, sendo raras vezes observada. Caça macacos e cães. Também há onças 108
A França equinocial assinalou a última aventura cesa no Brasil. Independentemente da qualidade é _~ estudos produzidos - mais autêntico o de Cl2.~C::;;: d' Abbeville, escolástico e afastado da natureza c c::~ Yves d'Évreux -, é de apreciar a diligência dos capuchinhos, que, em período restrito, viajaram o Maranhão, aí permaneceram alguns meses, regre~ saram a França, escreveram e publicaram as suas sobre o Brasil. Marcaram bem a diferença entre L:-':":
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o animal, visto que, colocando palma seca, já ,- ~.lo acontecia. Mas, também se reproduzia ~ .. .:.:.:::mente e de que maneira. A multiplicação da .. - :-e é limitada pelos seus predadores, que são s: ~agaI10s, macacos pequenos chamadossapajous .,;' sciurus), galinhas e formigas grandes.
-marinhas que deviam realmente ser lontras (Pteronura brasiliensis) -, tão agressivas quanto as terrestres. Encontra-se, igualmente, grande diversidade e quantidade de macacos, alguns dos quais pescam caranguejos e mexilhões. A uns e outros partem com pedras se forem excessivamente rijos para os seus dentes .
.::n animal do tamanho de um lagarto, a que Yves .:amaleão, mas é uma iguana (Iguana iguana), e e. considerando-o [p. 174] portador de um humor em/rio (o itálico é meu), que o tomaria muito _ .':'50 para algum animal que o comesse. Então, a --eza. para que ele não envenenasse com a sua "3~: \;} flieza os frutos em que toca, fez com que habite .. :-::05 das árvores que apenas servem para queimar. ainda, uma infinidade de moscas, umas diurnas, ..s nocturnas. Entre elas, as moscas-do-mel, cujos o frade observou, concluindo que a reprodução da 3_.:. é \írginal. Também se encontravam vespas, uma --~.". negra, constrói um complexo ninho de barro no " ~5 6ryores. Yves observou ponnenorizadamente este ~ _. rT.as um dia bateu com a cabeça na câmara da fêmea ::'. 178J " ... julgando mal a sua intenção, pensou que zera por afronta e, então, encolerizada, procurou ::' ~'S :-lhos para ... felizmente Deus desviou-lhe o '... :::'0 para a sobrancelha do frade ... " Apesar disso, a - ~--:~ enorme, a ponto de o frade cair por terra e -~::.ne.:er doente vários dias.
N as terras vizinhas da ilha de Maranhão vêem-se grandes águias, cujas plumas são muito apreciadas pelos Índios . E uma ave de dimensões consideráveis, o ouira-ouassou (Harpia harpija), predadora de macacos, de que se levou um exemplar para França. Também araras e canindés, de plumas igualmente desejadas, que os indígenas capturam vivas e conservam nas suas casas. O processo de captura é muito curioso: fazem esconderijos com folhas de palmeiras no cimo das árvores; quando as aves se aproximam dão-lhes uma cacetada que as atordoa e faz cair ao solo, sem as matar. Ainda viu grande quantidade de aves ribeirinhas a que chamou garças e andorinhas-do-mar e outras que designou por melros. Termina a sua crónica zoológica descrevendo um colibri e os seus minúsculos ovos.
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Solitária, não procura o homem, sendo raras vezes Caça macacos e cães. Também há onças
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A França equinocial assinalou a última aventura fran cesa no Brasil. Independentemente da qualidade dos estudos produzidos mais autêntico o de Claude d' Abbeville, escolástico e afastado da natureza o de Yves d'Évreux -, é de apreciar a diligência dos frades capuchinhos, que, em período restrito, viajaram para o Maranhão, aí permaneceram alguns meses, regres saram a França, escreveram e publicaram as suas obras sobre o Brasil. Marcaram bem a diferença entre uma 109
intelectualidade aberta, que não tinha nada a perder por isso, e uma política de secretismo, afinal de pouco valendo, pois a comercialização dos produtos do Brasil manteve sempre viva a cobiça dos estrangeiros. Como adiante se verá, Portugal só perdeu com isso, pelo menos dos pontos de vista cultural e científico.
Frei Cristóvão de Lisboa e outros naturalí5t2"; do seu tempo
Cristóvão Severim (1583-1652) tomou o nome ~~ :;:::~ Cristóvão de Lisboa ao tornar-se frade de S:-:- ~ António. Estudou na Universidade de Évora e -::-:-:- . para o Maranhão em 1624. O Maranhão era, na e-::-~. um vastíssimo território que incluía também Ceará. 2::: __ Pará e Amazonas. Aí permaneceu onze anos. Empe:--.- . _ se na elaboração de uma 'História natural e me ~ __ . Maranhão', que continuou a escrever ao regress Lisboa e reuniu em quatro volumes. Parte dest2 -" referia-se aos animais e plantas do Maranhão e n:l.:: autoria de Frei Cristóvão. Terá incumbido algJéc escrever e talvez outra pessoa de fazer os desen:-:c português deste códice revela pouca cultura, ao :--:~ que os desenhos são de boa qualidade; feitos 2. . cobertos, quase todos, de tinta (Walter, 19671. Há razões para acreditar que o códice sobre os ar.: e árvores terá sido separado do resto da 'HistólÍa : "' e moral do Maranhão' e entregue ao gravado:' . Baptista para efeitos de prova e orçamento. duas gravuras e, aparentemente, o códice já n:lc das mãos do gravador e de quem, depois, herdou os seus bens. Presume-se que assim acontecido porque a 'História natural e ~ desapareceu, ao que parece no incêndio que SL:~ ao terramoto de 1755, enquanto o códice em se conservou até aos nossos dias. Foi ~ 1933 e integrado no Arquivo Histórico Colonial. s;::- _:
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._. _-:Jalidade aberta, que não tinha nada a perder por .:ma política de secretismo, afinal de pouco - ~-.~:!. pois a comercialização dos produtos do Brasil -::·.e sempre viva a cobiça dos estrangeiros. Como .-::e se \crá, Portugal só perdeu com isso, pelo menos . :: ':-;[OS de vista cultural e científico.
Frei Cristóvão de Lisboa e outros naturalistas do seu tempo Cristóvão Severim (1583-1652) tomou o nome de Frei Cristóvão de Lisboa ao tornar-se frade de Santo António. Estudou na Llniversidade de Évora e partiu para o Maranhão em 1624. O Maranhão era, na época, um vastíssimo tenitório que incluía também Ceará, Piauí, Pará e Amazonas. Aí permaneceu onze anos. Empenhou se na elaboração de uma 'História natural e moral do Maranhão', que continuou a escrever ao regressar a Lisboa e reuniu em quatro volumes. Parte desta obra referia-se aos animais e plantas do Maranhão e não é da autoria de Frei Cristóvão. incumbido alguém de a escrever e talvez outra pessoa de fazer os desenhos. O pOltuguês deste códice revela pouca cultura, ao passo que os desenhos são de boa qualidade; feitos a lápis e cobertos, quase todos, de tinta (Walter, 1967). Há razões para acreditar que o códice sobre os animais e árvores terá sido separado do resto da 'História natural e moral do Maranhão' e entregue ao gravador João Baptista para efeitos de prova e orçamento. Fizeram-se duas gravuras e, aparentemente, o códice já não saiu das mãos do gravador e de quem, depois, guardou ou herdou os seus bens. Presume-se que assim tenha acontecido porque a 'História natural e moral' desapareceu, ao que parece no incêndio que sucedeu ao terramoto de 1755, enquanto o códice em referência se conservou até aos nossos dias. Foi encontrado em 1933 e integrado no Arquivo Histórico Colonial, sendo 111
exibido em 1934 no Porto, durante a Exposição Colonial Portuguesa (Pina, 1942). O códice parece mais um livro de notas participado por duas ou mais pessoas, do qual se partiria para obra mais apurada. Seja como for, a sua elaboração verificou-se entre 1624 e 1627 (\Valter, 1967) e consta de 198 folhas de papel, das quais 164 com 259 desenhos (116 de peixes, alguns repetidos; 21 de mamíferos e répteis, sem texto acompanhante; 67 de aves; e 55 de vegetais) e nas 30 restantes os comentários sobre as espécies. ainda um frontispício e três folhas iniciais com índice alfabético das espécies. Ao regressar a Lisboa, em 1635, Frei Cristóvão terá procurado obter, sem êxito, subsídios para a publicação da sua 'História natural e moral'. A verdade é que só a parte relativa à História Natural persistiu, sendo publicada com 340 anos de atraso [Frei Cristóvão de Lisboa, 1967]. A impressão transmitida por Walter (1967) no seu valioso estudo sobre este códice é perfeitamente sensível a quem consulte 'História dos animais e árvores do ?vfaranhão'. Figuras de boa qualidade, mas texto que parece sem retoques finais, títulos adequados e português mais fluente e culto. Vejam-se as diferentes secções por ordem da numeração original das figuras.
Peixes do Maranhão. Pelos títulos de secções seguintes se depreende que 'Maranhão' tem aqui o sentido restritivo da província encaixada entre o Pará e o Ceará. Ao estilo da época, Frei Cristóvão (toma-se o patroci 112
nador da obra como seu autor, embora saibam~s não o foi) inclui em 'Peixes' os animais aquáti,>:,~ =: independentemente da sua efectiva ~,'_ taxonómica. A secção 'Peixes do ?vfaranhão' a 55 espécies, todas com denominações vernác 65 figuras inseridas nas primeiras 28 folhas nume:- _~,~
Para começar, as duas figuras da folha 1 guaragua, peixe-boi, ou vaca-do-mar manatus), sirénio que, como se verificou anterior:::::~:;-::: era muito comum em todo o litoral brasileiro e ;;~ apetecido. As figuras são diagnosticamente desenn:::..:_, pois são visíveis as mamas axilares, característic::. .::.: ; sirénios, e as unhas, característica da espécie. A figura da folha 5 representa outro mamífero, um pocosi, ou golfinho-saltador (Stenella longir}'i~,'.-; segundo Nomura, 1996b). TPT','P"'"T'
Os répteis também estão representados nesta se.: - ~: Uma tartaruga, goroana, ou oroana (Dennoct; coriacea), figura na folha 25. E os crustáceos corno o camarão poty (Macrobrachiuln acantluií': nas folhas 25 e 42, e o caranguejo cery (Callil;" _.. bocourti), na folha 26. Ambas as espécies foram ,,---' por Almaça (1993; identificação de L.B.Holthuis I.
À excepção de pocosi, todas estas espécies 53C'. , expressão de Frei Cristóvão, "muito boas de co:-:~=:' assim como os ovos da goroana. As restantes espécies desta secção são peixes. identificados e estudados pormenorizadamen:ê . Carvalho (1964). Preocupação dominante de
em 1934 no Porto, durante a Exposição Colonial (Pina, 1942).
c:.::e parece mais um livro de notas participado por ~~ mais pessoas, do qual se partiria para obra mais Seja como for, a sua elaboração verificou-se 624 e 1627 (Walter, 1967) e consta de 198 de papel, das quais 164 com 259 desenhos (116 :-e:\es, alguns repetidos; 21 de mamíferos e répteis, ~:-:-, :e\.to acompanhante; 67 de aves; e 55 vegetais) - _~ ~o restantes os comentários sobre as espécies. Há -:.:: 'lill frontispício e três folhas iniciais com índice das espécies. Ao regressar a Lisboa, em 1635, - _. Cristóvão terá procurado obter, sem êxito, subsídios .:.:':: :: :;:mblicação da sua 'História natural e moral'. A é que só a parte relativa à História Natural '::'~: 3:1'J. sendo publicada com 340 anos de atraso [Frei de Lisboa, 1967]. .. _.~
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nador da obra como seu autor, embora saibamos que não o foi) inclui em 'Peixes' os animais aquáticos em geral, independentemente da sua efectiva posição taxonómica. A secção 'Peixes do ~aranhão' refere-se a 55 espécies, todas com denominações vemáculas, e 65 figuras inseridas nas primeiras 28 folhas numeradas. Para começar, as duas figuras da folha 1 representam o guaragua, peixe-boi, ou vaca-do-mar (Trichechus manatus), sirénio que, como se verificou anteriormente, era muito comum em todo o litoral brasileiro e muito apetecido. As figuras são diagnosticamente desenhadas, pois são visíveis as mamas axilares, característica dos sirénios, e as unhas, característica da espécie. A primeira figura da folha 5 representa outro mamífero, um cetáceo, pocosi, ou golfinho-saltador (Stenella longirrostris, segundo Nomura, 1996b). Os répteis também estão representados nesta secção. Uma tartaruga, goroana, ou oroana (Dermochelys coriacea), figura na folha 25. E os cmstáceos decápodes, como o camarão poty (Macrobrachium acanthurus), nas folhas 25 e 42, e o caranguejo cery (Callinectes bocourti), na folha 26. Ambas as espécies foram referidas por Almaça (1993; identificação de L.B.Holthuis).
A excepção
,C.' ao Maranhüo. Pelos títulos de secções seguintes
de pocosi, todas estas espécies são, na expressão de Frei Cristóvão, "muito boas de comer", assim como os ovos da goroana.
- _e?:'eende que 'Maranhão' tem aqui o sentido .. :: '. da provínci a encaixada entre o Pará e o Ceará. :: ..10 da época, Frei Cristóvão (toma-se o patroci
As restantes espécies desta secção são peixes, todos identificados e estudados pormenorizadamente por Carvalho (1964). Preocupação dominante de Frei 113
Cristóvão: indicar os que "são bons de comer", na realidade a maioria (três quartos das espécies). A fracção que sobra, um quarto, não presta para comer ou só é parcialmente aproveitável (o fígado, por exemplo) ou após precauções já conhecidas (remoção das vísceras, pele e espinhos).
Peixes de lagos e rios. No códice, o título efectivo desta secção é longo e toscamente redigido: "Agora falaremos de peixes que se tomam de agua doce, em lagos e rios e perizes de agua doce, onde há muito grande quantidade de peixe que não são bons de comer; e nós começaremos primeiro a falar naqueles que são melhores de comer." Nesta secção, que compreende 21 espécies designadas por nomes indígenas e representadas por 20 figuras, também são incluídos crustáceos decápodes e quelónios. O primeiro, poti, já considerado na secção anterior e representado na folha 42. Entre as tartarugas, estão figuradas a gerara (Kinostemum scorpioides) na f. 43, e a matamata (Chelusfimbriata) na f. 44. A primeira e o camarão "muito bons de comer". A matamata "não se come", diz Frei Cristóvão. Os peixes formam a fracção restante e são todos "bons de comer", até o poraque, ou peixe-eléctrico (Electrophorus electricus, segundo Carvalho, 1964), de que algumas pessoas se alimentam. Kotáveis são a piranha (Serrasalmo nattereri, sego Carvalho, 1964), cuja voracidade Frei Cristóvão testemunhou. Interessante 114
também a mosuinha (Tripor:,> c Carvalho, 1964), que Frei C11stÓ\ comer para doente."
Peixes do Pará. Vinte cinco por nomes vernáculos e represem:;c..:., . (fs. 44-60). Entre elas, um cettíc;::. porco-marinho (Inia geoffrel1Sis). e "::-:'" .. (Podocnemis cayennensis), de cuja gordura se fazia manteiga ..-'\' são mesmo peixes e, pelo menos. consideradas "boas para comer".
Mamiferos e répteis. Segue-se um::. (fls. 62-73), sem texto corresponde:-:~~ . dezoito espécies de mamíferos e . comentários de Frei Cristóvão a que ::.:..:~. interesse indicar as espécies figuradas e '·e'~..:: lineanos (Ávila-Pires, 1989; ::\01'1:'::':. mamíferos: capiuara
Hydroc1wé
tamandoai
Cyclops
paca
Das)proct~;
,._
quali suasu soasu
Edoceros Li:. -
tatu
Dasypus
i;
• \3.0: indicar os que "são bons de comer", na
'_Ceie a maioria (três quartos das espécies). A fracção
_.. _, _. um quarto, não presta para comer ou só é - ~. ':::::1ente aproveítável (o fígado, por exemplo) ou .-::- ~ ~ :::-ecauções já conhecidas (remoção das vísceras, .~:: ~
espinhos).
,',~,' ele lagos e rios. No códice, o título efectivo _::~:.:: secção é longo e toscamente redigido: "Agora
_.:::-e:11OS de peixes que se tomam de agua doce, em _:: 5 e rios e peTizes de agua doce, onde há muito .:-.:'e quantidade de peixe que não são bons de comer; .. :'5 .:omeçaremos primeiro a falar naqueles que são
também a mosuinha (Triportheus angulatus, sego Carvalho, 1964), que Frei Cristóvão diz ser "muito bom comer para doente."
Peixes do Pará. Vinte cinco espécies também designadas por nomes vernáculos e representadas por trinta figuras (fs. 44-60), Entre elas, um cetáceo, pira iaguara, ou porco-marinho (Inia geoffrensis), e uma tartaruga,jurara (Podocnemis cayennensis), ambas boas para comer e de cuja gordura se fazia manteiga. As restantes espécies são mesmo peixes e, pelo menos, dois terços delas são consideradas "boas para comer".
-·::::-.ores de comer." secção, que compreende 21 espécies designadas . :"comes indígenas e representadas por 20 figuras, incluídos crustáceos decápodes e quelónios. . ~ "U_H~, poti, já considerado na secção anterior e -;;::,-.:sentado na folha 42. Entre as tartarugas, estão '=":::das a gerara (Kinosternum scorpioides) na f. 43, ":,itall1ata (Chelus fimbriata) na f. 44. A primeira "muito bons de comer". A rnatamata "não
': ;;3'
, diz Frei Cristóvão. formam a fracção restante e são todos "bons ~ omer", até o poraque, ou peixe-eléctrico electricus, segundo Carvalho, 1964), :;; :'je algumas pessoas se alimentam. Notáveis são a .-- ',., (Serrasalmo nattereri, sego Carvalho, 1964), ',Jracidade Frei Cristóvão testemunhou. Interessante
Mamíferos e répteis. Segue-se uma série de 22 figuras (fls. 62-73), sem texto correspondente, representando dezoito espécies de mamíferos e três de répteis. Sem comentários de Frei Cristóvão a que aludir, será de algum interesse indicar as espécies figuradas e respectivos nomes lineanos (Á vila-Pires, 1989; Nomura, 1996b). os mamíferos: capiuara
Hydrochaeris hydrochaeris
tamandoai
Cyclops didactylus
paca
Dasyprocta primnolopha
quari
Nasua nasua
suasu
Blastoceros bezoarticus
soasu
Edoceros dichotomus
tatu
Dasypus novemcinctus 115
paca
Agouti paca
tarnbu
Trichomys apereoides
sapagiou
Mazama americana
maracaya
Fe!is pardalis
machacha
Saimiri sciureus
guariba
A1arikina tamarin
porco tarasu
Tayassll pecari
quasini
Procyon cancrivorus
tarnandua
Myrmecophaga tridactyla
priguisa
Bradypus tridactylus.
E as espécies de répteis representadas são as seguintes (nomes lineanos segundo Nomura, 1996b): synynbu (Iguana iguana), tiuasu (Tupinambis teguixin) e cunara (lloplocercus spinosus) . Como se referiu, não foram conservados os comentários de Frei Cristóvão a estas espécies. Todavia, a avaliar pelos restantes, é plausível que se refelissem à qualidade dietética de cada uma delas.
Aves ribeirinhas. Também nesta secção o arrazoado do códice é bem mais longo: "Começaremos agora pelos pássaros que andam ao longo do mar e lagos e rios de agua doce, assim os que são bons de comer e outros, que são honrados pelas penas." São 22 espécies designadas por nomes indígenas, que correspondem a 21 figuras (fls. 74-87). Frei Cristóvão 116
considera quase todas (quatro qu;ntos ~,~ de comer", os adultos ou os pintos. _-\ : não tem apreciação dietética e inclui ficação segundo Oren, 1990): arase; glossus bitorquatus), guahi tocanc, aphia (Tityra cayana) e vacho. c..: phastos tucanus).
Aves dos matos e campinas. Quarenta ~ __ , são quantas Frei Cristóvão reconhe';: campinas do .Maranhão. Representam-r.2s 88-109). Uma delas (f. 107), most:-2.. ::._ morcego hematófago, amdura (Desl;: segundo Ávila-Pires, 1989). Tal como na secção anterior, Frei Cristó"'~' - C: no registo do número de ovos de cada o maior empenhamento nas aves está 2,: para a beleza da plumagem, capacid~L:; " sons articulados e outros aspectos de Apenas um quarto das espécies é come: qualidade dietética.
No seu conjunto, a obra de Frei confirma inteiramente a opinião que Walter (1967) no seu estudo: descriçõ~s sobre as espécies redigidos em portegués . desenhos de muito melhor qualídaée :: _ permitindo com frequência o diagnós::~.~ '-_ Na globalidade foi descrito e ou figuradc _:-:~ ••
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Tayassu pecari Procyon cancrivorus
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Bradypus tridactylus.
e3pécies de répteis representadas são as seguintes -: ~eS lineanos segundo Nomura, 1996b): synynbu :,;na iguana), tiuasu (Tupinambis teguixin) e (Hoplocercus spinosus) .
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~ -.0 se referiu, não foram conservados os comentários
Cristóvão a estas espécies. Todavia, a avaliar :>.: ·s restantes, é plausível que se referissem à qualidade de cada uma delas.
. ,; í·iúeirinhas. Também nesta secção o arrazoado é bem mais longo: "Começaremos agora pelos ~ _ss~ros que andam ao longo do mar e lagos e rios de assim os que são bons de comer e outros, ~ _: sEto honrados pelas penas." ~
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considera quase todas (quatro quintos das espécies) "boas de comer", os adultos ou os pintos. A fracção restante não tem apreciação dietética e inclui três espécies (identi ficação segundo Oren, 1990): arasari tocano (Ptero glossus bitorquatlls), guahi tocano, ouyta opian, ou aplzia (Tityra cayana) e vadIO, ou tocano (Ram phastos tucanus).
espécies designadas por nomes indígenas, que
.. -:--:~s~cmà.e.m (\'ll t\'S\\t(\~ \f\:i!,.ll\-~l).13te.l Cn~t()\1ãC)
Aves dos matos e campinas. Quarenta e quatro espécies são quantas Frei Cristóvão reconhece nos matos e campinas do Maranhão. Representam-nas 45 figuras (fls. 88-109). Uma delas (f. 107), mostra, de facto, um morcego hematófago, amdura (Desmodus rotundus, segundo Avila-Pires, 1989).
Tal como na secção anterior, Frei Cristóvão é meticuloso no registo do número de ovos de cada espécie. Todavia, o maior empenhamento nas aves está aqui deslocado para a beleza da plumagem, capacidade imitativa de sons articulados e outros aspectos de apreço na época. Apenas um quarto das espécies é comentado quanto à qualidade dietética.
No seu conjunto, a obra de Frei Cristóvão [1967J confirma inteiramente a opinião que sobre ela emitiu Walter (1967) no seu estudo: descrições e comentários sobre as espécies redigidos em português muito pobre; desenhos de muito melhor qualidade e criteriosos, permitindo com frequência o diagnóstico das espécies. Na globalidade foi descrito e ou figurado um importante 117
número de espécies por iniciativa de Frei Oistóvão: duas dezenas de mamíferos, sete de aves, uma de répteis e cerca de uma centena de peixes. Outros naturalistas mais ou menos contemporâneos de Frei Cristóvão consignaram, em doses muito diferen ciadas, elementos sobre a fauna do Brasil. Mencionam -se a seguir os principais.
Ambrósio Fernandes Brandão (c.1560 c.1630). Chegou ao Brasil em 1583 e permaneceu até 1618. Proprietário de engenhos de açúcar ('senhor de engenho') na Paraíba, escreveu um livro 'Diálogo das Grandezas do Brasil' , que apenas foi publicado de forma completa em 1930 (Nomura, 1996b; Paiva, 2000). Nessa obra refere considerável número de espécies: cerca de trinta e cinco mamíferos, setenta aves, uma dezena de répteis, cinco de peixes, uma de crustáceos, alguns moluscos e dois insectos (Nomura, 1996b). Frei Vicente do Salvador (1564 ? - 1639 ?). Nasceu nos alTedores de Sal vador e estudou na Universidade de Coimbra. Ingressou nos franciscanos em 1599. É autor de 'História do Brasil', obra completada em 1627, mas publicada de forma completa apenas em 1899 (Moisés, 1994). Na Baía observou algumas espécies, sete dezenas, sobretudo de aves e mamíferos, que menciona num dos capítulos do seu livro (Nomura, 1996b). Christobal de Acui1a (1597-1675). Nasceu em Burgos e ingressou na Companhia de Jesus em 1612. Enviado ao 118
Chile e Peru, foi designado para acompar' expedição que faria o reconhecimento do Rio ~,\, Saiu de Quito em Fevereiro de 1639 e na\'ego __ _ Pará, onde chegou em Dezembro do mesmo ~" observações efectuadas durante a longa \'iage:-::~ ~ _' inseridas num livro publicado em Madrid em 16-1 ~. teve várias traduções (vg Acuna, 1682) e foi Manuel Rodriguez em obra mais volumosa (Roc::"::;_ 1684), onde forma parte (capítulos VIII-XIIIi cc '.' lI. Aqui refere algumas espécies (cerca de dezena e n'_ de mamíferos, aves e répteis que observou éc -:, descida do Amazonas.
As observações de Acuna são muito interessace ::: exemplo: em relação ao peixe-boi, cujas
alimentares não se cansa de elogiar,já prevê a sm:. e\" - • (Rodriguez, 1684, p. 107). A carência de sal e a
medíocre do seu sucedâneo (cinza de certa
palmeira) obrigavam a conservar a carne das rr..::: .. :- ~ apenas defumada pelo fogo de madeira (bollcm: . .::~
a preservavam por um mês ou pouco mais (Acuf.~ .. .:: : capítulo 25).
Para conservar o peixe vivo, os indígenas faziam: _;: artificiais, pouco profundas e rodeadas de paliçadecs, ~.
as quais orientavam a água na época das
Depois, à paulada na superfície da água, atordo:::.··
peixe, colhendo-o à mão (Rodriguez, p.108).
colheita e conservação das tartarugas igualmente, ardilosa: quando elas se desloca\arr:;,.::. margens onde faziam as posturas, deixa\'arr~ . juntassem muitas; depois, a con-er, iam-nas voltanc.: ~ -:
espécies por iniciativa de Frei Cristóvão: duas . . '::5 de mamíferos, sete de aves, uma de répteis e __ ce UDa centena de peixes. ",. =s
naturalistas mais ou menos contemporâneos de - ~~ C:istóvão consignaram, em doses muito diferen : _==5. eleDentos sobre a fauna do Brasil. Mencionam os principais.
Ferrwndes Brandão (c.1560 - c.1630). ao Brasil em 1583 e permaneceu até 1618. ::::--~,",:etário de engenhos de açúcar ('senhor de ') na Paraíba, escreveu um livro 'Diálogo das do Brasil' , que apenas foi publicado de forma __ :-~?:eta em 1930 (Nomura, 1996b; Paiva, 2000). y:-~) refere considerável número de espécies: "~ .. ', trinta e cinco mamíferos, setenta aves, uma _:ena de répteis, cinco de peixes, uma de crustáceos, _ "::-.5 moluscos e dois insectos (Nomura, 1996b). \ 'ícente do Salvador (1564 ? - 1639 ?). Nasceu l:Tedores de Salvador e estudou na Universidade de Ingressou nos franciscanos em 1599. É autor __ 'Kstólia do Brasil', obra completada em 1627, mas :: _::-::;:ada de forma completa apenas em 1899 (Moisés, . :.,:J..:. é1 Baía observou algumas espécies, sete dezenas, de aves e mamíferos, que menciona num dos do seu livro (Nomura, 1996b). I
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de Acuiia (1597-1675). Kasceu em Burgos : .- --essou na Companhia de Jesus em 1612. Enviado ao
Chile e Peru, foi designado para acompanhar uma expedição que faria o reconhecimento do Rio Amazonas . Saiu de Quito em Fevereiro de 1639 e navegou até ao Pará, onde chegou em Dezembro do mesmo ano. As observações efectuadas durante a longa viagem foram inseridas num livro publicado em Madrid em 1641. O livro teve várias traduções (vg Acufia, 1682) e foi incluído por Manuel Rodriguez em obra mais volumosa (Rodriguez, 1684), onde forma parte (capítulos VIII-XIII) do Libra !I. Aqui refere algumas espécies (cerca de dezena e meia) de mamíferos, aves e répteis que observou durante a descida do Amazonas. As observações de Acufia são muito interessantes. Por exemplo: em relação ao peixe-boi, cujas qualidades alimentares não se cansa de elogiar, já prevê a sua extinção (Rodriguez, 1684, p. 107). A carência de sal e a qualidade medíocre do seu sucedâneo (cinza de certa espécie de palmeira) obrigavam a conservar a carne das matanças apenas defumada pelo fogo de madeira (bO/.lcan); assim a preservavam por um mês ou pouco mais (Acufia, 1682, capítulo 25). Para conservar o peixe vivo, os indígenas faziam lagoas artificiais, pouco profundas e rodeadas de paliçadas, para as quais orientavam a água na época das inundações. Depois, à paulada na superfície da água, atordoavam o peixe, colhendo-o à mão (Rodriguez, p.l 08). A colheita e conservação das tartarugas vivas era, igualmente, ardilosa: quando elas se deslocavam para as margens onde faziam as posturas, deixavam que se j untassem muitas; depois, a correr, iam-nas voltando sobre 119
o dorso; faziam um buraco na carapaça de cada uma, passavam por ele uma corda e conduziam o gmpo para a água, transportando-o amarrado à canoa; em reservatódos artificiais em que, então, as colocavam, alimentavam-nas com folhas e ramos de árvores. A carne, como os ovos, são considerados excelentes alimentos, ainda que os últimos um pouco indigestos; da gordura, sendo salgada, fazia-se a melhor mantei ga. As fêmeas produzem 200-300 ovos, cuja incubação dura 40 dias (Acufía, capítulo 26).
Richard Fleckno (1600-1678). Jesuíta irlandês que permaneceu alguns meses de 1648 no Rio de Janeiro. Na viagem de Lisboa ao Brasil e no Rio de Janeiro observou duas dezenas de espécies de que dá notícia em livro publicado em Londres por volta de 1655 (No mura, 1997). Simão de Vasconcelos (1597-1671). Jesuíta português com longa permanência no Brasil a partir de 1616. Autor de várias obras relativas ao Brasil, numa delas, 'Crónica da província do Brasil', publicada em Lisboa em 1663, insere uma contribuição zoológica diminuta, referindo seis espécies de mamíferos e quatro de aves (Nizza da Silva, 1994; Nomura, 1997).
120
Naturalistas e artistas no Brasil holandÊs
Como se, por si só, as dquezas do Brasil, espe.::: :,:-~ o açúcar e o pau-brasil, não bastassem para arra:r :, ~ : : das potências europeias, a reunião, em 1580.
de Portugal e Espanha no mesmo soberar'.o.
ficou-a e ampliou-a. Portugal e as suas colónias
a compartilhar com a Espanha os inimigos dest2 .. ~.
poderosos. Nomeadamente a Holanda,
do século Xv1I, cuja burguesia mercantilista
Espanha pela independência do país.
O mercantilismo foi também o modo de pene:L:!: . , holandeses no BrasiL Criaram, para isso, em 162 ~. companhia meio pública, meio pdvada, a Compagnie, que viria a conseguir uma fixação brasileiro. Após uma primeira tentativa de Salvador da Baía em 1624, liquidada pelos poc_:;:, __ no ano seguinte, os holandeses conseguiram em Olinda (Pernambuco) em 1630 (Magalhãe5 .. ~ ~
1637, foi nomeado governador e capitão-ge:- Brasil holandês João Maurício (1604-1679), c;::·- __ Nassau-Siegen, que se acompanhar (ou utilize·:..:. - .• serviço) de várias indi vidualidades que retratari:::::-. ~ ~ um a seu modo, o Brasil holandês: Caspar K:::-:.:c: (Gaspar Barléu), historiador; \Villem Pies (Piso l , • Georg Marcgraf, naturalista; Albert Eckhout e Fr::::,~ pintores; Zachru1as \Vagener, despenseiro e pinto::- :::::'- De uma ou outra forma, todos contribuirarr.. divulgação da fauna nordestina, cabendo logicamente, o seu estudo científico.
. ~ : :'aziam um buraco na carapaça de cada uma, ele uma corda e conduziam o grupo para a ::-,::,;-:spOltando-o amarrado à canoa; em reservatórios ~:.::.:s em que, então, as colocavam, alimentavam-nas e ramos de árvores. A carne, como os ovos, . ~ -~.5:cerados excelentes alimentos, ainda que os últimos - =1':0 indigestos; da gordura, sendo salgada, fazia-se - .::. manteiga. As fêmeas produzem 200-300 ovos, -.::.:bação dura 40 dias (Acufia, capítulo 26).
..' Fleckno (1600-1678). Jesuíta irlandês que --..:.:-.eceu alguns meses de 1648 no Rio de Janeiro. Na de Lisboa ao Brasil e no Rio de Janeiro observou .__ ~ c;:;zenas de espécies de que dá notícia em livro em Londres por volta de 1655 (Nomura, 1997). \lasconcelos (1597-1671). Jesuíta português ::1ga permanência no Brasil a partir de 1616. Autor .":5 obras reI ati vas ao Brasil, numa delas, 'CrónÍGa _-;=. \:ncia do Brasil', publicada em Lisboa em 1663, : ~-e '.lma contribuição zoológica diminuta, referindo seis - _::e5 manúferos e quatro de aves (Nizza da Silva, N omura, 1997).
Naturalistas e artistas no Brasil holandês Como se, por si só, as riquezas do Brasil, especialmente o açúcar e o pau-brasil, não bastassem para atrair a cobiça das potências europeias, a reunião, em 1580, das coroas de Portugal e Espanha no mesmo soberano, diversi ficou-a e ampliou-a. POltugal e as suas colónias passaram a compartilhar com a Espanha os inimigos desta, vários e poderosos. Nomeadamente a Holanda, grande potência do século XVII, cuja burguesia mercantilista lutava contra Espanha pela independência do país . O mercantilismo foi também o modo de penetração dos holandeses no Brasil. Criaram, para isso, em 1621, uma companhia meio pública, meio pri vada, a West-Indische Compagnie, que viria a conseguir uma fixação no nordeste brasileiro. Após uma primeira tentativa de assalto a Salvador da Baía em 1624, liquidada pelos portugueses no ano seguinte, os holandeses conseguiram instalar-se em Olinda (Pernambuco) em 1630 (Magalhães, 1998). Em 1637, foi nomeado governador e capitão-general do Brasil holandês João Maurício (1604-1679), conde de Nassau-Siegen, que se fez acompanhar (ou utilizou no seu serviço) de várias individualidades que retratatiam, cada um a seu modo, o Brasil holandês: Caspar Barlaeus (Gaspar Barléu), historiador; Willem Pies (Piso), médico; Georg Marcgraf, naturalista; Albert Eekhout e Frans Post, pintores; Zacharias Wagener, despenseiro e pintor amador. De uma ou outra forma, todos contribuíram para a divulgação da fauna nordestina, cabendo a Marcgraf, logicamente, o seu estudo científico.
121
O governo de João Maurício (1637-1644) foi marcado pelas suas excelentes qualidades de organizador. O domínio holandês alargou-se, chegando a ocupar a faixa costeira desde sul do Recife até oeste de Ceará. Parece, no entanto, que a tolerância religiosa de João Maurício no Brasil holandês coabitavam judeus, calvinistas e católicos -, desagradava aos portugueses, que nunca deixaram de flagelar os novos senhores do nordeste. E, na sequência da independência de Portugal, em 1640, as coisas complicaram-se para os holandeses. Em 1654, já cingidos ao Recife, entregaram a cidade. O Brasil voltou, assim, a ser exclusivamente português (Magalhães, 1998). A divulgação da fauna nordestina pelos holandeses assumiu formas variadas, literárias e ou iconográficas, que se completam, a despeito da sua dispersão por vários centros europeus. Aqui, serão consideradas apenas as principais I 8.
Historia Naturalis Brasiliae. Após regresso à Holanda, João Maurício subsidiou a publicação desta obra, que, de facto, reúne duas de autores diferentes. A primeira, de W.Piso (1611-1678), intitula-seDe Medicina Brasiliensi, libri quator e, portanto, compreende quatro livros (conjuntos de capítulos). A segunda é da autoria de G.Marcgraf (1610-1643), tendo sido publicada postuma mente. Intitula-se Historiae Renan Naturalium Brasiliae, libri oeto. Quatro dos oito livros que a compõem são dedicados aos animais. Numerosas gravuras realizadas a partir de pinturas do próprio Marcgraf e, possivelmente, também de Eckhout, fizeram deI a a obra de referência da 122
fauna brasileira. Não obstante, mesmo compie:::~~ com as descrições de Marcgraf, parte das gra\ " permite identificação segura da espécie, pelo me~ - o crustáceos (Holthuis, 1991; Tavares, 1993). Em Historia RerwnNaturalis o livro quarto é de~~ aos 'Peixes' e aos 'Peixes crustáceos'. Na prin;e~=· .. : (86 gravuras) é descrita quase uma centena de es-e' Os 'peixes crustáceos' (19 gravuras) incluem 3 e.;~e: de crustáceos (Holthuis, 1991) cirrípedes. es:~:::-. podes, isópodes e decápodes -, e uma estrel2.-d,>- O livro seguinte ocupa-se das Aves (57 grZ:.. descrevendo-se mais de uma centena de espécies. sexto refere-se aos 'Quadrupedes e Serpentes', 33 gravuras e descrevendo cerca de sessenta ('5;';; ~ sobretudo de mamíferos (45 espécies), mas t2.:11:-e- répteis. O livro sétimo é dedicado aos insectos. (YJ ~ artrópodes terrestres, pois inclui miriápodes e entre as espécies descritas (mais decinquenta I e :'e-: sentadas (29 gravuras). Enfim, um último livro é cor,s.:c;:-: às regiões e indígenas. De um modo geral, as g~ ::", são de fraca qualidade.
Dez anos mais tarde (1558), Piso publicou ou::' : De lndiae utúlsque re naturali et medica. c.". descreve e representa muitas das espécies já Marcgraf (1648). Foi, por isso, acusado de _ Marcgraf, o que, segundo Holthuis (1991), se bastante injusto.
o
Thierbueh de Zaeharias Wagener. :-: Dresden, Wagener (1614-1668) foi um dos mer.:: e ~
. =--:J ce João Maurício (1637-1644) foi marcado ~"':25 excelentes qualidades de organizador. a
alargou-se, chegando a ocupar a faixa sul do Recife até oeste de Ceará. Parece, : :----:0. que a tolerância religiosa de João Maurício ::: ~ _5" holandês coabitavam judeus, calvinistas e '.::: =,S -, desagradava aos portugueses, que nunca flagelar os novos senhores do nordeste. E, da independência de Portugal, em 1640, ~ ~5':;'S complicaram-se para os holandeses. Em 1654, ao Recife, entregaram a cidade. a Brasil a ser exclusivamente português (Magalhães, da fauna nordestina pelos holandeses assumiu . ariadas, literárias e ou iconográficas, que se ~-::: :=:2:11. a despeito da sua dispersão por vários centros :::'=:'5..-\qui, serão consideradas apenas as principais 18 .
Satllralis Brasiliae. Após regresso à Holanda, subsidiou a pubhcação desta obra, que, de , -;:oúne duas de autores diferentes. A primeira, de 1-1678), intitula-se De Medicina Brasiliensi, .~a;or e, portanto, compreende quatro livros - _:-,",J5 de capítulos). A segunda é da autoria de (1610-1643), tendo sido publicada postuma Histonae Renun Naturalium Brasiliae, -~, Quatro dos oito livros que a compõem são .:c~=s 3.0S animais. Numerosas gravuras realizadas a .::- =-- ;:'lnturas do próprio Marcgraf e, possivelmente, '-~ Eckhout, fizeram dela a obra de referência da
fauna brasileira. Não obstante, mesmo complementadas com as descrições de Marcgraf, parte das gravuras não pennite identificação segura da espécie, pelo menos nos crustáceos (Holthuis, 1991; Tavares, 1993). Em Historia Rerum Naturalis o livro quarto é dedicado aos 'Peixes' e aos 'Peixes crustáceos'. Na primeira parte (86 gravuras) é descrita quase uma centena de espécies. as 'peixes crustáceos' (19 gravuras) incluem 31 espécies de crustáceos (Holthuis, 1991) - cirrípedes, estomató podes, isópodes e decápodes -, e uma estrela-do-mar. a livro seguinte ocupa-se das Aves (57 gravuras), descrevendo-se mais de uma centena de espécies. a livro sexto refere-se aos 'Quadrúpedes e Serpentes', inserindo 33 gravuras e descrevendo cerca de sessenta espécies, sobretudo de mamíferos (45 espécies), mas também de répteis. a livro sétimo é dedicado aos insectos, ou melhor, artrópodes terrestres, pois inclui miriápodes e aranhas entre as espécies descritas (mais de cinquenta) e repre sentadas (29 gravuras). Enfim, um último livro é consagrado às regiões e indígenas. De um modo geral, as gravuras são de fraca qualidade. Dez anos mais tarde (1558), Piso publicou outra obra, De lndiae utiusque re naturali et medica, em que descreve e representa muitas das espécies já incluídas em Marcgraf (1648). Foi, por isso, acusado de plagiar Marcgraf, o que, segundo Holthuis (1991), se afigura bastante injusto .
o
Thierbuch de Zacharias Wagener. Natural de Dresden, Wagener (1614-1668) foi um dos mercenários 123
enviados pela West-Indische Compagnie ao Brasil. Ocupou o cargo de despenseiro de João Maurício. Pintor amador, Wagener retratou a natureza nordestina. Teixeira (1997a) escreveu o seguinte sobre a obra de Wagener: " ... a inesistível atracção da Europa seiscentista pelo exótico e pelo desconhecido parece constituir o principal fio condutor do relato de Wagener ... voltando-se para a divulgação das maravilhas do Novo Mundo em uma esfera bem mais popular, ainda que não exactamente inculta ou desprovida de conhecimentos ..." O Thierbuch encontra-se em Dresden (Kupferstich Kabinett) e é composto por 110 pranchas, precedidas de um curto prefácio do autor. Estão representados 106 animais, 11 vegetais, 8 tipos humanos e 10 mapas, plantas de edifícios e paisagens. É o resultado de sete anos de permanência no Brasil e, ainda que um trabalho sem preocupações teóricas, todas as pinturas são acompa nhadas de notas sobre as espécies. A sua execução é, no entanto, inferior à de outras do período holandês do Brasil e há sugestões (Teixeira, 1997a) de que algumas de Wagener sejam cópias de outras efectuadas na mesma época e inseridas em Libri Principis.
Libri picturariA 32-38. A colecção de pinturas do Brasil reunida por João Maurício não permaneceu toda com ele. Muitas foram oferecidas por João Maurício a soberanos europeus na intenção, ao que parece, de obter favores deles. A parte mais importante coube ao Eleitor de Brandenburg. Outras fracções, mais pequenas, a Frede11co III, da Dinamarca, e a Luís XIV, de França.
A colecção oferecida ao Prínci pe Eleitor foi cc na Biblioteca do Estado da Prússia, em Be,';::-' Segunda Guena Mundial. Os desenhos reunidos em sete volumes, Libri picturati A 3: ,; ~ estes, quatro grandes volumes de pinturc.3 - , (Theatrum) , mais dois volumes de aguare' . Principis, ou Manuais, e um volume pequer.o : • figuras, Miscellanea Cleyeri. Um dos \'o:~:,,-' Theatrum, dedicado apenas às aves, foi dero:--,: !cones Volatiliwn. Durante a guena foram na Silésia e perderam-se. Reapareceram em 1':"- Biblioteca Jagiellon, em Cracóvia (Boeseman er o' Holthuis, 1991).
Aguarelas de Leninegrado. A história das figura3. ::: :-; não fica por aqui. Em 1934, Soloviev descobriu do século XVII, representando animais do Br2.~ arquivos da Academia das Ciências da "Leninegrado. Trata-se de uma importante 145 folhas em que estão pintados 283 animais e r.2.: ~ , folhas de texto. Desconhece-se como forar ::: _:., Leninegrado, a despeito de algumas iniciatí'<, -;_: esclarecimento da sua origem já terem sido tor:~:...::._; século XIX. Após pormenorizadas investigações (Boeseman eta!., 1990), concluiu-se que as Leninegrado são cópias de moderada quali dade _... p311ir dos Manuais e Theatrum atrás referidos. "- estão incompletas, sugerindo cópias apressad:::~. aqui mais interessa é o facto de constin:íre-r:' importante referência para o conhecimento nordestina no século XVII.
124
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West-Indische Cornpagnie ao Brasil. :: argo de despenseiro de João Mauríci o. Pintor ~ -:', \\-agener retratou a natureza nordestina. Teixeira :- -::. escreveu o seguinte sobre a obra de Wagener: _:-::-eslstível atracção da Europa seiscentista pelo desconhecido parece consti tuir o principal :..::or do relato de \Vagener ... voltando-se para a das maravilhas do Novo Mundo em uma esfera """:"" :-:"'_::.:s popular, ainda que não exactamente inculta ou de conhecimentos ..." encontra-se em Dresden (Kupferstich e é composto por 110 pranchas, precedidas -:-:- ::".11'to prefácio do autor. Estão representados 106 """:""-'-:s. 11 vegetais, 8 tipos humanos e 10 mapas, plantas e paisagens. É o resultado de sete anos de ência no Brasil e, ainda que um trabalho sem teóricas, todas as pinturas são acompa T'otas sobre as espécies. A sua execução é, no -:~. in:erior à de outras do período holandês do Brasil .: s:...gestões (Teixeira, 1997a) de que algumas de ::1
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Maurício não permaneceu toda com ele. -J:'am oferecidas por João Maurício a soberanos na intenção, ao que parece, de obter favores _-\ parte mais importante coube ao Eleitor de Outras f1'acções, mais pequenas, a Frederico ::lamarca, e a Luís XIV, de França.
A colecção oferecida ao Príncipe Eleitor foi conservada na Biblioteca do Estado da Prússia, em Berlim, até à Segunda Guena Mundial. Os desenhos haviam sido reunidos em sete volumes, Libri picturati A 32-38. Entre estes, quatro grandes volumes de pinturas a óleo (Theatrurn) , mais dois volumes de aguarelas, Libri Principis, ou Manuais, e um volume pequeno com 35 figuras, Miscellanea Cleyeri. Um dos volumes de Theatrurn, dedicado apenas às aves, foi denominado Icones Volatilium. Durante a guena foram postos a recato na Silésia e perderam-se. Reapareceram em 1977 na Biblioteca Jagiellon, em Cracóvia (Boeseman et al., 1990; Holthuis, 1991).
Aguarelas de Leninegrado. A histólia das figuras, porém, não fica por aqui. Em 1934, Soloviev descobriu aguarelas do século XVII, representando animais do Brasil, nos arquivos da Academia das Ciências da URSS, em Leninegrado. Trata-se de uma importante colecção com 145 folhas em que estão pintados 283 animais e mais sete folhas de texto. Desconhece-se como foram parar a Leninegrado, a despeito de algumas iniciativas para o esclarecimento da sua origemjá terem sido tomadas no século XIX. Após pormenorizadas investigações recentes (Boeseman et aI., 1990), concluiu-se que as aguarelas de Leninegrado são cópias de moderada qualidade feitas a partir dos Manuais e Theatrurn atrás referidos. Algumas estão incompletas, sugerindo cópias apressadas. O que aqui mais interessa é o facto de constituírem outra importante referência para o conhecimento da fauna nordestina no século XVII. 125
Casa de campo do Eleitor da Saxônia. Porém, há mais. Próximo de Dresden, o Príncipe Eleitor da Saxónia, Johann Georg I, mandou construir (1648-1650) uma casa de campo (Hoflossnitz). Para decoração do tecto do salão principal foram efectuadas 80 pinturas a óleo, sem data ou assinatura, de aves observadas no Brasil holandês. O tecto é composto por 80 nichos mais ou menos rectangulares e cada um deles exibe uma pintura representando uma a três aves, num total de 88 exemplares pertencentes a 77 espécies (Teixeira, 1977b). Como Albert Eckhout, o principal pintor animalista de João MaUl1cio, esteve mais tarde, entre 1653 e 1663, ao serviço do Eleitor da Saxónia, tem-lhe sido atribuída a autoria das pinturas de Hoflossnitz. Também estas pinturas são cópias de figuras incluídas em Libri picturati (Tei xeira, 1977b). Outros participantes. Ainda que com representação vestigial, ou quase, na zoologia do Brasil holandês, há a referir a participação de outras individualidades. Começa se por Johan de Laet (1595-1649), director de West Indische Compagnie e responsável pela ida de Marcgraf para o Brasil e pela edição da obra póstuma deste naturalista (1648). Como directorque se preza, sintetizou em obra própria publicada em 1633 o que já se sabia sobre o Brasil através dos relatos de Thevet, Léry e autores portugueses. Nessa obra refere algumas espécies de crustáceos (Tavares, 1993). Gaspar Barléu (1584-1648) escreveu a história do governo de João Maurício, publicada em 1647. Refere algumas
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dezenas de espécies, sobretudo peixes, do nordeste. Tanto Barléu como Laet nunca
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33l'léu (1584-1648) escreveu a história do governo .- . - . :'launcio, publicada em 1647. Refere algumas
dezenas de espécies, sobretudo peixes, do norte e nordeste. Tanto Barléu como Laet nunca estiveram no Brasil. Albert Eckhout (1610 ? - 1664), já muito citado anteriormente, merece, no entanto, referência especial pela representação de qualidade de mais de uma centena de espécies do norte do Brasil, sobretudo aves. Johan Nieuhof (1618-1671) foi enviado pela Companhia ao Brasil, aí permanecendo cerca de nove anos. Escreveu uma obra sobre a sua viagem ao Brasil, publicada em 1682, em que refere algumas dezenas de espécies do nordeste, sobretudo répteis.
Comentário. Para além do que se referiu, o espólio iconográfico de João Maurício encontra-se ainda repro duzido em pintura mural, tapeçaria, livro, etc. É notável o que a orientação de um homem de cultura conseguiu durante a permanência de apenas alguns anos no nordeste brasileiro. Assim se compreende que a iconografia reunida por João Maurício tenha sido o veículo de divulgação de uma fauna tropical e exótica, cuja novidade era apetecida na Europa. E que a obra de Marcgraf, a despeito da pouca qualidade das gravuras, marque o pioneirismo do estudo científico da Região Neotropical. No seu conjunto, os portugueses, bem antes de Marcgraf, haviam descrito muito mais espécies do Brasil e, por vezes, melhor do que ele. Só Gabriel Soares de Sousa ultrapassou Marcgraf no número de espécies de
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mamíferos, répteis, anfíbios e insectos que descreveu e, no que respeita às aves e aos peixes, ficou muito próximo do naturalista alemão. E até já havia boa iconografia de significativo número de espécies do Maranhão antes da que João Maurício reuniu. Porém, Frei Cristóvão não conseguiu publicá-la.
Princípios do século XVIII Conforme se assinalou em 'Introdução', o a::·: ::-. publicação da primeira edição de Systel1lCl 11m;!', ,.' 1735, é tomado como limite da fase pré-lineana. -se-ão, por isso, três naturalistas que, de uma ou fOlma, se ocuparam da zoologia do Brasil nas prime:, décadas de setecentos. Os dois primeiros, Amédée EFrézier (1682 engenheiro militar francês, e George Shelvocke I 1728), marinheiro inglês, observaram ambos. coincidência, espécies da fauna catarinense (Eéz:::,: 1716). As suas contribuições, ainda que modestas. divulgadas em livros publicados em tempo próprio, e outro registaram duas dezenas de espécies, peixes (Nomura, 1998).
O terceiro foi Albertus Seba (1665-1736), alerr:.3.·:_. nascimento que viveu em Amesterdão a maior parte __ _ vida. Comerciante de produtos farmacêuticos. Se:'_ tomou-se um homem muito rico e devotou-se à cc tuição de um gabinete de História natural. Adqu::-::-:_ exemplares de proveniências diversas nos barco~ ~_. aportavam a Amesterdão, Seba reuniu uma extraord::-:.:.c:-: _ colecção de História natural, que vendeu, em 1717. Pedro, o Grande, da Rússia. Começou, de seguida. -:._ nova colecção (Holthuis, 1969). Empreendeu. ec': publicação das descrições e figuras dos exemplares _..:. reunira. A obra foi concebida e publicada em duas . __ simultâneas e em tudo idênticas, excepto na língua: u:::.:.c e- latim e holandês, a outra em latim e francês. Trat2.·5 :::: 128
répteis, anfíbios e insectos que descreveu e, - . -: -- ;espeita às aves e aos peixes, ficou milito próximo alemão. E até já havia boa iconografia de ;-·'::ati\·o número de espécies do Maranhão antes da :yfaurício reuniu. Porém, Frei Cristóvão não publicá-la.
Princípios do século XVIII
Conforme se assinalou em 'Introdução', o ano de publicação da primeira edição de Systema naturae, 1735, é tomado como limite da fase pré-lineana. Referir -se-ão, por isso, três naturalistas que, de uma ou outra forma, se ocuparam da zoologia do Brasil nas primeiras décadas de setecentos. Os dois primeiros, Amédée F.Frézier (1682-1773), engenheiro militar francês, e George Shelvocke (1690 1728), marinheiro inglês, observaram ambos, por coincidência, espécies da fauna catarinense (Frézier, 1716). As suas contribuições, ainda que modestas, foram divulgadas em livros publicados em tempo próprio. Um e outro registaram duas dezenas de espécies, sobretudo peixes (Nomura, 1998). O terceiro foi Albertus Seba (1665-1736), alemão de nascimento que vi veu em Amesterdão a maior parte da sua vida. Comerciante de produtos farmacêuticos, Seba tomou-se um homem muito rico e devotou-se à consti tuição de um gabinete de História natural. Adquirindo exemplares de proveniências diversas nos barcos que aportavam a Amesterdão, Sebareuniu uma extraordinária colecção de História natural, que vendeu, em 1717, ao czar Pedro, o Grande, da Rússia. Começou, de seguida, uma nova colecção (Holthuis, 1969). Empreendeu, então, a publicação das descrições e figuras dos exemplares que reunira. A obra foi concebida e publicada em duas edições simultâneas e em tudo idênticas, excepto na língua: uma em latim e holandês, a outra em latim e francês. Trata-se de 129
uma obra monumental, em quatro volumes com 449 lâminas de soberba qualidade. Em contrapartida, o texto acompa nhante é medíocre (Ho1thuis, 1969). O título varia com a edição, embora o latino, naturalmente, se mantenha. Abreviadamente, é conhecida em toda a parte como 'Thesaurus'. O volume I, que contem a maior parte dos mamíferos, aves e anfíbios, foi publicado em 1734. O segundo, incluindo os répteis, sobretudo serpentes, em 1735. O terceiro, dedicado aos peixes, invertebrados marinhos e algas, em 1759, sendo reeditado com página de título nova em 1761. Enfim, o último volume, consagrado aos insectos, minerais e fósseis, em 1765 (Holthuis, 1969). Seba nunca esteve no Brasil nem foi um naturalista de campo. Qual, então, a sua importância para o conheci mento da zoologia brasileira? Muito simplesmente por as figuras da sua obra, que são magníficas, serem urna referência objectiva frequente na fixação da nomenclatura lineana (Linnaeus, 1758). Por exemplo: as espécies figuradas no primeiro e segundo volumes de Thesaurus (Seba, 1734-1735) são referências, por vezes únicas, de cerca de 65% das espécies lineanas de e anfíbios, e 45% de mamíferos, da América (Linnaeus, 1758).
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Comentários finais
Neste bosquejo zoológico do Brasil na época pré-::-= _. há a realçar, primeiramente, a heterogeneldJ:::= ::.. contribuições, embora, quase todas, apenas de r;::::_~~: faunística 19 • Isso se deve, basicamente, a dois Em primeiro lugar, às diferenças nas próprias pani:::.- ':.::' individuais, pois algumas são vestigiais, outras c::.: - _ mas apesar disso diminutas, outras ainda, coe:- -:: exemplo as de Cardim, Soares de Sousa, Frei -. e Marcgraf, de grande amplidão. Em segundo :-....,; diversidade geográfica delas, que se centraran en~ . - ou regiões diferentes do extenso país que é o Bras~: ::' nada perder da dispersão geográfica dos existentes e também para beneficiar do para o mesmo local ou região, quase sempre a dos naturalistas se dirigiu mais para este grupo animal, se entendeu que, mesmo as mínimas, podiam revelar-se de utilidade neste quali tativo. Eis por que se contabiliza um total de 32 longo do período pré-lineano, ou seja, nos sucederam ao descobrimento do Brasil. A é, naturalmente, representada por história de Portugal e a do Brasil intimamente nesta fase do percurso das duas o contrário é que seria de estranhar. De muito a assinalar que todos os portugueses que escre\"er:1::-' copiosamente, ou menos, sobre a zoologia B-_~ conheceram em primeira mão a natureza do tem de dizer-se, corno a maioria dos naturalistas
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. ~~::JS. minerais e fósseis, em 1765 (Holthuis, 1969).
:: :..:nca esteve no Brasil nem foi um naturalista de Qual, então, a sua importância para o conheci zoologia brasileira? Muito simplesmente por as sua obra, que são magníficas, serem uma objecti va frequente na fixação da nomenclatura - -~;] (Linnaeus, 1758). Por exemplo: as espécies no primeiro e segundo volumes de Yhesaurus .",. 734-1735) são referências, por vezes únicas, de das espécies lineanas de répteis e anfíbios, mamíferos, da América (Linnaeus, 1758).
Comentários finais Neste bosquejo zoológico do Brasil na época pré-Jineana, há a realçar, primeiramente, a heterogeneidade das contribuições, embora, quase todas, apenas de natureza faunística 19 • Isso se deve, basicamente, a dois factores. Em primeiro lugar, às diferenças nas próprias participações individuais, pois algumas são vestigiais, outras maiores, mas apesar disso diminutas, outras ainda, como por exemplo as de Cardim, Soares de Sousa, Frei Cristóvão e Marcgraf, de grande amplidão. Em segundo lugar, à diversidade geográfica delas, que se centraram em locais ou regiões diferentes do extenso país que é o Brasil. Para nada perder da dispersão geográfica dos elementos existentes e também para beneficiar do facto de que, para o mesmo local ou região, quase sempre a atenção dos naturalistas se dirigiu mais para este ou aquele grupo animal, se entendeu que, mesmo as contribuições mínimas, podiam revelar-se de utilidade neste esboço qualitativo. Eis por que se contabiliza um total de participantes ao longo do período pré-lineano, ou seja, nos 235 anos que sucederam ao descobrimento do Brasil. A maioria deles é, naturalmente, representada por portugueses (9). A história de Portugal e a do Brasil entrelaçavam-se tão intimamente nesta fase do percurso das duas nações que o contrário é que seria de estranhar. De muito positi vo, há a assinalar que todos os portugueses que escreveram, mais copiosamente, ou menos, sobre a zoologia do Brasil, conheceram em primeira mão a natureza do país. De resto, tem de dizer-se, como a maioria dos naturalistas referidos 131
neste trabalho; na realidade, apenas três fizeram excepção ao estudo directo - Laet, Seba e Barléu.
por curtos períodos: ingleses (2), italianos (1), (1) e belgas (1).
Restam, assim, vinte e nove 'naturalistas-exploradores', talvez melhor dizendo, 'colonizadores e naturalistas', pois foi quase sempre como actividade secundária que observaram e escreveram sobre a fauna brasílica. Só Marcgraf exerceu, profissionalmente, as funções de naturalista, isto é, foi remunerado para estudar a His tória natural do Brasil. Os restantes, com mais ou menos cultura, talento ou vocação, escreveram o que podiam, sempre, ou quase, com objectivos utilitários muito compreensíveis.
Também se afigura interessante conhecer a funcional no Brasil do contingente de naturalis::::~ ~ referência. Distribuição funcional que tem de naturalmente, com o distanciamento devido aos pelo --:~.~ três séculos que nos separam deles. Verifica-se. ':S5~ que a fracção pesada é de religiosos (13). Cató;:: várias ordens, com predominância de jesuítas. ___ calvinista. O contingente seguinte é o de 'mi:i ~.::.:: aventureiros', que inclui indivíduos (6) de formações e patentes. Depois, em termos de numérica (3), vários grupos: 'médicos e profess - _3 'proprietários e comerciantes' e 'funcionários' . E m2..:s.:: cronistas, um naturalista e um pintor profissionais,
Para além dos portugueses, esperar-se-ia participação significativa de individualidades de países que exibiram reivindicações tenitoriais no Brasil ou ao serviço desses países. Assim foi, de facto. Franceses e holandeses (ou estrangeiros por eles contratados) ocupam o segundo lugar no contingente de observadores da fauna (6). Metade da participação 'holandesa' foi constituída por alemães ao serviço de West-Indisches Compagnie: Marcgraf, Wagener e Nieuhof. Há ainda a referir a presença de espanhóis, que é diminuta (3) relativamente ao período - sessenta anos -, durante o qual Portugal e Espanha compartilharam os mesmos soberanos. Para além disso, é esporádica e tangencial (Cabeza de Vaca e Acufía), se exceptuarmos Anchieta, de longa e bem-querida permanência no Brasil. Os restantes europeus fOllTIam um assorti que a aventura, a religião ou os serviços relacionaram com o Brasil, em geral 132
Se;;:: Quando se pensa que, nos séculos XVI e XVII, muitas as pessoas culturalmente apetrechadas p:'lra o que observavam, e talvez ainda em menor propo::-; .. : :: que emigravam para o Brasil, não é de estranha::- c.' _ fracção mais impOltante seja a dos religiosos.
espírito implica um mínimo de cultura e, por isso. é ;:: _;; religiosos das diferentes ordens passavam pelos cc'
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na realidade, apenas três fizeram excepção directo - Laet, Seba e Barléu.
por curtos penodos: ingleses (2), italianos (1), irlandeses (1) e belgas (1).
::: ':_~. assim, vinte e nove 'naturalistas-exploradores', dizendo, 'colonizadores e naturalistas' ,pois
Também se afigura interessante conhecer a distribuição funcional no Brasil do contingente de naturalistas em referência. Distribuição funcional que tem de apreciar-se, naturalmente, com o distanciamento devido aos pelo menos três séculos que nos separam deles. Verifica-se, assim, que a fracção pesada é de religiosos (13). Católicos de várias ordens, com predominância de jesuítas, e um calvinista. O contingente seguinte é o de 'militares e aventureiros', que inclui indivíduos (6) de diferentes formações e patentes. Depois, em termos de igualdade numérica (3), vários grupos: 'médicos e professores', 'proprietários e comerciantes' e 'funcionários'. E mais dois cronistas, um naturalista e um pintor profissionais.
:r.::oal~o;
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- _~:se sempre como actividade secundária que ~~.;:ram e escreveram sobre a fauna brasílica. Só exerceu, profissionalmente, as funções de ~: __:lsta, isto é, foi remunerado para estudar a His do Brasil. Os restantes, com mais ou menos -:ó. talento ou vocação, escreveram o que podiam, ::re. ou quase, com objectívos utilitários muito : ----::-eensíveis. dos portugueses, esperar-se-ia participação ,2ativa de individualidades de países que exibiram •r.ó2ações territoriais no Brasil ou ao serviço desses , _-\ssim foi, de facto. Franceses e holandeses (ou ',. _:-:geiros por eles contratados) ocupamo segundo lugar de observadores da fauna (6). Metade da _ .::pação 'holandesa' foi constituída por alemães ao '; ce West-Indisches Compagnie: ~1arcgraf, ,.Cf e Nieuhof.
a referir a presença de espanhóis, que é diminuta :.:.ti \amente ao período - sessenta anos -, durante o e Espanha compartilharam os mesmos :: ~ ':::-:05.
Para além disso, é esporádica e tangencial ::-eZ:l de Vaca e Acufía), se exceptuarmos Anchieta, e bem-querida permanência no Brasil. OS -.:C5 europeus formam umassorti que a aventura, a - 0'1 os serviços relacionaram com o Brasil, em geral
Quando se pensa que, nos séculos XVI e XVII, não seliam muitas as pessoas culturalmente apetrechadas pararegistar o que observavam, e talvez ainda em menor proporção as que emigravam para o Brasil, não é de estranhar que a fracção mais importante seja a dos religiosos. Cuidar do espírito implica um mínimo de cultura e, por isso, é que os religiosos das diferentes ordens passavam pelos colégios e universidades. Todavia, a preocupação que espelharam nos seus escritos histórico-naturais em geral e zoológicos em particular, foi muito mais de índole utilitária do que teórica ou reflexiva. Isto é curioso e sugere que o medievalismo ainda se fazia sentir na zoologia brasílica do século XVI e até nos seguintes (AI maça, 1998,2000). Que os aspectos utilitários da natureza constituíssem a preocupação essencial dos naturalistas pré-lineanos é 133
J&
compreensível: elucidar os que viessem sobre as possibili dades da terra. Assim sendo, porém, é menos fácil compreender por que não foram divulgados na época própria pelos portugueses, que afinal formaram o contingente numericamente mais forte dos primeiros tempos. Condicionalismos de vários tipos, nenhum suficiente por si só, o explicarão. Decorrem eles das políticas dos governos e das ordens religiosas e da época. Os sucessivos governos portugueses após 1500 dese jaram, aparentemente, manter o sigilo sobre as capacidades da terra brasileira. A cobiça por parte de outras potências europeias era grande, nomeadamente a de França e de Holanda. Divulgar os 'produtos naturais' - as riquezas do tempo -, pareceria talvez despertar desejos estranhos e ilegítimos. À distância, soa a ingénuo este propósito. Bastava a comercialização dos produtos para divulgar a sua proveniência com amplidão mais que suficiente. Embora limitado o cômputo à literatura em que se divulgaram elementos sobre a zoologia do Brasil, parece que o interesse na publicação das coisas do Brasil no seu tempo próprio esteve, de facto, mais do lado de estrangeiros: Schmidel, Staden, Thevet, Léry, Knivet, Claude d' Abbeville, Yves d'Evreux, Acufía, Fleckno, Piso, Marcgraf, Laet, Barléu, Nieuhof, Frézier, Shelvocke e Seba. Dos nove participantes portugueses somente dois editaram publicações no mesmo período: Gândavo em 1576 e Simão de Vasconcelos em 1665. Outros, como Gabriel Soares de Sousa e Frei Cristóvão, não conse guiram publicar as suas obras.
134
É plausível que, em certas ordens
a informação do Brasil fosse também a re g-:-::.
sido o caso dos jesuítas, em particular .... ___ _ Portugal. Os jesuítas fornecerarr. a maior ccc~ .
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conhecimentos sobre a terra, transmitidos '
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ordem. Facultando-os, naturalmente. ou:rc's·
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Todas estas sugestões - insiste-se na repeti~:'.. suscitadas apenas pela literatura inserindo zoológica. Por isso mesmo, é caso para perguntar :-..::-.}; em Portugal, durante 235 anos, pensou qc.c. não fosse sob uma perspectiva cultural, seria divulgar na Europa conhecimentos em primeir2. ::::'. da fauna do Brasil? Tanto mais que o interess_ _ exotismo e a novidade eram a regra, como iniciativas de João Maurício. Se o poder não \ cultura por si só, nem condimen tada com tanta utilitária a cultura era boa para di vul oa ac ão O peso dos sigilos foi excessivo para os esclarecidos e inovadores? >
elucidar os que viessem sobre as possibili ::.::. terra. Assim sendo, porém, é menos fácil ::~ee:1der por que não foram divulgados na época pelos portugueses, que afinal formaram o numericamente mais forte dos primeiros -
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publicações no mesmo período: Gândavo em :: ~ e Simão de Vasconcelos em 1665. Outros, como ~ _. o.e: Soares de Sousa e Frei Cristóvão, não conse publicar as suas obras.
É plausível que, em certas ordens religiosas, o sigilo sobre a informação do Brasil fosse também a regra. Talvez tenha sido o caso dos jesuítas, em particular dos vinculados a Portugal. Os jesuítas forneceram a maior comparticipação (7) entre os religiosos que viajaram para o BrasiL Os conhecimentos sobre a ten'a, transmitidos epistolannente e acumulados por provinciais e gerais, parecem ter permanecido, pelo menos inicialmente, reservados à ordem. Facultando-os, naturalmente, a outros jesuítas, conforme sugerem a repetitividade de certo tipo de informações (vg Cardim relativamente a Anchieta) ou o seguimento de modelos expositivos idênticos (vg Francisco Soares relativamente a Cardim; Black, 1989). Note-se que, entre os jesuítas que publicaram informações zoológicas sobre o Brasil no período em referência - Acuna em 1641, Fleckno em 1655 e Simão de Vasconcelos em 1665 -, só o último estava vinculado a PortugaL Todas estas sugestões - insiste-se na repetição -, são suscitadas apenas peI a literatura inserindo informação zoológica. Por isso mesmo, é caso para perguntar: ninguém em Portugal, durante 235 anos, pensou que, quanto mais não fosse sob urna perspectiva cul tural, sel1a interessante divulgar na Europa conhecimentos em primeim mão acerca da fauna do Brasil? Tanto mais que o interesse pelo exotismo e a novidade eram a regra, como provam as iniciativas de João Maurício. Se o poder não valorizava a cultura por si só, nem condimentada com tanta di versidade utilitária a cultura era boa para di vulgação pública? Ou o peso dos sigilos foi excessi vo para os portugueses esclarecidos e inovadores?
135
Notas 1 A primeira edição impressa do relato de tradução francesa de cerca de 1525, Le 1'Qyc,ge per les Espaignolz es is[es resumo, sem nome de autor. A despeito dos nenhuma edição foi impressa em sua vida i ';c\'.e::. 2
~
Como o anotador de Anchieta [
Sobre os princípios da classificação etnobiológi.::~ e nomenclatura, uma e outra por vezes comple\..:s .. _ (1992).
3
É evidente que, neste ponto, Anchieta ~::~=.=.; só às formigas (Himenópteros), como sobretud:: (Isópteros). As térmitas, também denomil1aj~, brancas', ainda hoje constituem uma praga '10 ::i ~ responsáveis por elevados prejuízos económÍcos urbanas, monumentos, florestas, pastagens. etc. Sobre o tema ver Fontes e Filho (1998). 5 Esta informação de Gândavo não confere .::c~.
Anchieta muito mais tarde, em 1585. Nesta data . .:::=
apenas começavam a desenvolver-se os
domésticos trazidos do Reino. Como podiam.
contingentes importantes antes de 156P Os '"
referiam-se, possivelmente, a diferentes zoms
Brasil.
Notas ; A primeira edição impressa do relato de Pigafetta foi uma tradução francesa de cerca de 1525, Le voyage et navigation, falct per les Espaignolz es isles Mollucques, que ê apenas um resumo, sem nome de autor, A despeito dos esforços de Pigafetta. nenhuma edição foi impressa em sua vida (Nowell, 1962). 2 Como o anotador de Anchieta [1933a1 correctamente assinala, o 'sair do rio' é uma força de expressão, Os peixes buscam os leitos de montante em que o substrato, a temperatura e a oxigenação da água são adequados à desova, Este instinto é fortíssimo e os mais tênues fios de água são aproveitados para a deslocação rio acima. Os peixes ficam, então, muito vulneráveis a qualquer acto de captura, inclusivamente à apanha directa, à mão, Já observei comportamento idêntico da boga Chondrostoma wíllkommií em afluentes do Guadiana, No princípio da Primavera, grandes cardumes desta espécie empreendem a migração reprodutora e qualquer veio de água, por pequeno que seja, é percorrido pelos peixes. Deixam, então, capturar-se facilmente, até à mão,
Sobre os princípios da classificação etnobiológica e respectiva nomenclatura, uma e outra por vezes complexas, ver Berlin (1992).
3
É evidente que, neste ponto, Anchieta [1933b 1 refere-se não só às formigas (Himenópteros), como sobretudo às térmitas (Isópteros), As térmitas, também denominadas 'formigas brancas', ainda hoje constituem uma praga no Brasil, sendo responsáveis por elevados prejuízos econômicos. Afectam áreas urbanas, monumentos, florestas, pastagens, terras agrícolas, etc. Sobre o tema ver Fontes e Filho (1998), 4
5 Esta informação de Gândavo não confere com a dada por Anchieta muito mais tarde, em 1585. Nesta data, diz Anchieta, apenas começavam a desenvolver-se os contingentes de animais domésticos trazidos do Reino. Como podiam, pois, formar já contingentes importantes antes de 1561? Os dois autores referiam-se, possivelmente, a diferentes zonas geográficas do Brasil.
137
Os pecaris têm uma glândula odorífera dorsal, cuja abertura sugeria a Gândavo 'um umbigo nas costas'. Devido a esta característica, Cuvier, em 1817, criou para eles o nome genérico Dicotyles, que significa 'dois umbigos'. Durante muito tempo, as duas espécies de pecaris permaneceram neste género. Posteriormente, verificou-se que o nome Tayassou, criado por Fischer em 1814, tinha prioridade. 6
Nomura (l996a) não refere qualquer nome Iíneano para os 'açores' de Gândavo.
7
Nomura (1996a) identifica o nome anapurú de Gândavo com o nome actual 'papagaio-verdadeiro', ambos atribufdos a Amazona aestiva. Talvez porque aqueles a que Gândavo chamou 'papagaios-verdadeiros' não fossem senão jovens dos seus anapurús. Ambos, de facto, são referidos por Gândavo como bons faladores, embora o anapurlÍ de tamanho grande ("maiores que açores") e os papagaios-verdadeiros mais pequenos ("do tamanho de pombas"). 8
Note-se que as fases de coloração desta variação etária indicadas por Gândavo não coincidem exactamente com as citadas por Anchieta. 9
Já se referiram extensamente noutra publicação (Almaça, 1998) os comentários de Gândavo sobre o peixe-boi. Por isso, não serão aqui repetidos. lO
Nomura (l996a) não identifica os peixes referidos por Gândavo. Os nomes lineanos que indico são, portanto, da minha exclusiva responsabilidade. Baseei-me nos nomes vernáculos e descrições de Gândavo, de Nomura (l996a ), quando comenta outros naturalistas do Brasil, e de Carvalho (1964), no seu estudo dos peixes de Frei Cristóvão de Lisboa. 11
12 São várias as espécies de cetáceos que se aproximam das costas do Brasil, pelo que seriam incertas as identificações eventualmente indicadas.
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. E a segunda edição (1578) fac-similada do livro de Léry que se segue. Na opinião do seu anotador, Jean-Claude Morisot, esta é a edição que contem o melhor de Léry.
138
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(phisalix, 1922).
15
16 Note-se que tanto França como Almaça ,:: :-.S.~~
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Na realidade, Anchieta é natural das Ilhas Cl:-i~~s,'
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17 Zirkle (1959) apresenta uma lúcida análise
suas relações com os conceitos pré-daf\\'inia':h'1s i8 Para maior aprofundamento do assunto consulte· se. :
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19
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14 Léry assinala não ter visto animais semelhantes ao que Belon figura no fim do terceiro livro das suas observações sob o nome de tatou do Brasil. 15 Não se trata, efectivamente, de uma 'picada', mas antes da descarga de um líquido urticante, composto por fenôis e proteínas e produzido em células particulares aos Cnidários, os cnidoblastos. Estes contêm estruturas intra-celulares, os nematocistos, constituídos por um finíssimo filamento de ponta acerada, e por vezes barbelada, através do qual é descarregado o líquido. Milhares de nematocistos actuando sobre a superfície a que aderiu a colônia, provocam sensação de queimadura e dor. A secreção particular de Physalia foi designada por hipnotoxina, causando torpor e diminuição da temperatura interna (Phisalíx, 1922) .
16 Note-se que tanto França como Almaça consideram nas referidas publicações José de Anchieta como autor português. Na realidade, Anchieta é natural das Ilhas Canárias, português no que respeita a sua educação superior e religiosa e brasileiro quanto à vivência e terra de adopção.
Zirkle (1959) apresenta uma lúcida análise da heterogonia e suas relações com os conceitos pré-darwinianos de espécie. l7
•8 Para maior aprofundamento do assunto consulte-se, por exemplo, Holthuis (1991).
19 No caso particular da zoologia pré-lineana dos crustáceos brasileiros existe já um excelente estudo de Tavares (1993) .
as espécies de cetáceos que se aproximam das Brasil, pelo que seriam incertas as identificações .2::1ente indicadas. c. ;~~unda edição (1578) fac-similada do livro de Léry que
:\a opinião do seu anotador, Jean-Claude Morisot, que contem o melhor de Léry.
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