Pausa

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para ser lido nos intervalos BELO HORIZONTE AGOSTO DE 2008 NÚMERO SEIS


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mais u e j. ., k e d åbula prosa a f me e iz s r e p u s ensaio rda a w d e e m a d a tradução m ate poema bo


A fábula de K., J. e mais um K. estancou os passos e entornou seus horrores com uma fúria patética. Num dia quente, cismou em não, morrendo encolhido num hospital de loucos. Sabia ser assombroso e ofereceu, muitas vezes, a quem passasse na rua, um corpo servil. E mais um terço partido. Tinha sempre as contas negras desfiadas sobre a mão: “Dê-lhe, a esse Deus longínquo, os teus martírios”. Atravessava todos os dias uma ponte em desuso, uma neblina fina. “E ainda as tuas parcas finanças”, insistia aos ralos transeuntes. Virava-se, em vertigem, para o céu alto. Aves migratórias evaporam ao norte: “Transmita-Lhe o que guarda nessa bagagem. Receba, então, conserve no bolso o perdão”, girava o corpo sobre a própria indigência. “Venha por baixo, contra o movimento sombrio das águas de julho. Escorregue até o dique onde tudo se interrompe”, assustava os espectadores, com um sorriso súbito. Acena longe outra estação, veja só, tentavam curá-lo. Vozes anônimas agitarão seus cabelos, que depois. Estava escrito um destino secreto. “Errei o seu nome, J. Porque escolhemos

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assim. Que não o tivesse. Que não fosse mais.” Para mendigar um trago da névoa que invade os ares do meio-dia. Para dissolver as sombras, o retorno de quem vai. “Regardez-vous, ils sont des chats noirs: os que agora arriscarão outros metros.” Eram aves a descontinuar o seu caminho. E traziam dias claros no corpo em fuga. Este corpo por que. “Desapareço.” Recue, K., ouvia. “Reveja a forma dos pássaros, a mancha dos bandos que o céu reconstela. E todos os seus horrores desditos.” Ambíguos. Encolha. Loucos. “Meu terço se parte: te rezo, J., te conto.” Nessa opacidade branca, perpetuando o instante. “Não chore, ofereça isto”, com o rosário sob os olhos. Eu sei, era impossível, arredio, espalhado. “Encare o rosto vasto dos expulsos, os átomos em partida”, sucumbia devagar. - Não fabricara filhos nem pai. - Era a pura renúncia em figura, o abandono do nome. Uma ruína sem duração. Altivez e penúria, ouviu-se dizer na ocasião de sua morte, edificam precisamente a mesma casa erma do homem que para ela inventa uma língua própria.

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Embora A. O. Scott, do New York Times, tenha faltado à reunião dos críticos e publicado em abril uma apreciação pela obra do maior crítico americano vivo (certamente o mais popular), Roger Ebert, todos os outros sites, revistas e blogs aderiram à pauta e apontaram que a crítica cinematográfica está em crise. No mesmo passo que a produção aumentou, a sua importância caiu. Sites que agregam críticas de diversas fontes levaram a uma nova maneira de se avaliar e categorizar filmes, como o Rotten Tomatoes, que dicotomiza os filmes em “fresh” ou “rotten”, e o Metacritic, que atribui médias numéricas, transformando a crítica em uma mera contagem de pontos. Volta e meia, então, temos filmes, como o novo veículo de Al Pacino, “88 Minutos”, já taxado de o “terceiro pior filme de todos os tempos” devido à sua nota inferior a 10% no Metacritic. Nessa forma de raciocinar, certamente “Sangue Negro” mereceria o Oscar, com sua média de 92 pontos, contra os 91 de “Onde os Fracos Não Têm Vez”. Devemos lembrar que esse sistema proporciona uma pluralidade de opiniões extremamente salutar, e fica fácil ler sobre os lados bons e ruins, achar uma crítica que endeusa o filme e outra que o compara ao último da Paris Hilton, tudo isso em poucos segundos. Mas os números e os tomates podres ainda estão lá, e é difícil ignorá-los.

A alternativa, porém, não se mostra mais inteligente. Claro que o acesso a dúzias de sites e blogs sobre cinema ajuda, mas fica cada vez mais difícil filtrar a quantidade de informação. Até dava para confiar no bom gosto de uma equipe editorial como a da Folha de S. Paulo, mas o acesso livre à informação e a facilidade de publicação, ao invés de subirem o nível, proporcionaram uma proliferação desmedida de porcarias. Até os melhores jornais estão fazendo sua parte para correr atrás. Aquele crítico com quem você sempre concordava e gostava de ler? Hoje fala uma quantidade absurda de asneiras, da preferência sexual de John Ford ao penteado da Lana Turner (asneiras sobre os clássicos são ainda piores: você acha que está lendo sobre

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Contigo). Por a, mas o conteúdo é de em cin do ro ou de era a muito lixo pra e você vai ter que ler qu vio ób é e, ad ilid ab com sua prob eodore Sturgeon já dizia Th e. nt ge eli int o alg não encontrar pura porcaria. Mas isso é isa co r ue alq qu de “lei” que 90% serve de desculpa. blicar as recente da Folha, de pu ão cis de da tão en er O que diz quinta ou sextaustrada”, que saíam na críticas de cinema da “Il picadas ao longo as do fim de semana), feira (véspera das estréi de semana, vá ao cinema este fim o Nã te? uin seg a an Inácio da sem ser que saia o texto do de po do an qu , ça ter e que espere até Não deve ter muita gent ”. ge va Sa lia mí Fa “A e Araújo sobr interesse em se admitissem a falta de pensa assim, mas é como do publicam, dores de opinião. Quan ma for de l pe pa o rir cump l descrevem dois parágrafos que ma de tos tex cro mi a se limitameúdo. correm com algum cont o filme, quanto mais dis blogs seminaquela meia dúzia de iar nf co ser de po ão luç a daquele A so uma imagem modernos têm s no me lo pe e qu os que anônim in no cabeçalho. Pode ser dd Ma y Gu do a or ad cê filme que vo as chances? Uma a dizer, mas quais são eles tenham algo legal a aumentar a da qualidade talvez sej lem ob pr o ra pa ão luç so o espaço outra eixo. Na mídia impressa, tro ou em e qu só e, ad e o a quantid gráfico é minúsculo, ato em cin o ári nt me co dedicado ao generalizações. o obrigados a partir pra articulista e/ou editor sã escrever textos usar da internet para ab , tão en o, nã e qu r to, maior Po que, quanto maior o tex de a nç era esp vã na istiria maiores, o bom? Pelo menos ex alg ir sa de e ad ilid ab será a prob expressão, já a tecnologia a favor da a possibilidade de usar s ou de clipes de palavras, de imagen ite lim tem o nã g blo e scar uma qu plorar esses recursos e bu ex ra pa até ria Da s. vo da sala ilustrati e ficaria mais próxima qu a um a, tic crí em ag nova lingu et não deve ser sala de cinema. A intern de aula ou até mesmo da ntes. nal: as regras são difere só um substituto do jor que a são muito melhores do nia mô rci pa e o isã nc co Claro que demos a usá, mas acho que desapren enxurrada que proponho sua vida em 140 a onipresente na internet: or ag , er itt tw o de Vi . las fragmentos ado é uma avalanche de ult res O s. no me ou s tentar toque erente. Será o prazer em ref ou do eú nt co sem s, desconexo de tentar definir preguiça (do blogueiro) preencher as lacunas, ou sustentam. Em que os extremos não se é o nt po O to? ex nt co o mais provável ers e nano-críticas, é itt tw de as en nt ce a palavras meio z textos longos. 14 mil de em e nt ge eli int a vid que haja s; a diferença é tanto quanto 140 toque sobre Kiarostami valem outro não. Dou em cinco segundos, o o ad git ur reg foi um e qu tempo infinito, vida, afinal, dado um dú da io fíc ne be o s rever, a ele os com máquinas de esc ad nd ve s, co ca ma de e um mont escreveriam Hamlet. 8 II Pedro Groppo


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Há, segundo o pensamento de Georges Bataille, uma importante distinção entre a experiência e o projeto. O projeto existe apenas dentro dos limites da linguagem. Há, nele, a necessidade racional do discurso; ele é da ordem do dia, do mundo profano do trabalho, da medida e da regularidade. Há sempre um sujeito que fala sobre algo. A experiência, ao contrário, parte da necessidade de levar o homem aos limites do seu ser – levá-lo “ao extremo do possível, onde o próprio Deus não sabe mais, desespera e mata”, como diz Bataille, em A experiência interior. Estamos, parece-nos, diante de um dilema: se a experiência não cabe no projeto, o qual, da ordem do dia, responde a uma exigência discursiva, como comunicála? Essa experiência interior é, paradoxalmente, uma abertura para o que há de mais longínquo e exterior; ela só pode ser comunicada na transgressão da linguagem, a fim de que ela se projete para o seu fora. Assim, a experiência é comunicada justamente na negação do discurso racional: a palavra tomada da maior violência contra a linguagem, de forma que o sentido se perca e a verdade se re-vele, num instante inapreensível, como o clarão de um raio no meio da noite. Em outras palavras, essa experiência só pode ser comunicada por meio da palavra poética, já que “a poesia não descreve nada que não deslize para o incognoscível”. 10 II Rafael Reis


Fragmentos de Madame Edwarda MINHA ANGÚSTIA É ENFIM A SOBERANA ABSOLUTA. MINHA SOBERANIA MORTA ESTÁ NA RUA. INAPREENSÍVEL – EM TORNO DELA UM SILÊNCIO SEPULCRAL –, ESCONDIDA NA ESPERA DE ALGO TERRÍVEL – E, NO ENTANTO, SUA TRISTEZA SE RI DE TUDO.

* Au coin d’une rue, l’angoisse, une angoisse sale et grisante, me décomposa (peut-être d’avoir vu deux filles furtives dans l’escalier d’un lavabo). A ces moments, l’envie de me vomit me vien. Il me faudrait me mettre nu, ou mettre nues les filles que je convoit: la tiedeur de chairs fades me soulagerait. Mais j’eus recours au plus pauvre moyen: je demandais, au comptoir, un pernod que j’avalais; je poursuivis de zinc en zinc jusqu’à... La nuit achevait de tomber. Na esquina de uma rua, a angústia, uma angústia suja e enervante, me descompôs (talvez por ter visto duas garotas furtivas na escada dum lavabo). Nesses momentos, vem-me uma vontade de vomitar. Seria necessário ficar nu, ou despir as garotas que desejo: a tepidez das carnes tenras me aliviaria. Mas recorri ao meio mais vulgar: pedi, num balcão, um absinto que eu emborcava; e eu seguia de balcão em balcão, até que... A noite acabava de cair.

* ......................................................................................................................... ......................................................................................................................... ............................................................ les glaces que tapissaient le mur, et dont le plafond lui-même était fait, multipliaiet l’image animal d’un accoupliment: au plus légere mouvement, nos coeurs rompus s’ouvraient au vide où nous perdait l’infinité de nos reflets. .......................................................................................................................... ......................................................................................................................... ............................................................ o espelho que cobria a parede, do qual se fazia também o teto, multiplicava a imagem animal de um cruzamento: ao mais ligeiro movimento, nossos corações rompidos se abriam ao vazio onde nos perdia a infinidade de nossos reflexos. Rafael Reis II 11


II Renata Cabral

olho quilhão 38 assalta todo o espaço daquele corpo 02:45 tempo suficiente para algum romance.

boate


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