Suplemento fogaceiras

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Suplemento Especial | Integra a edição nº 5848 de 20 de Janeiro de 2014 | Não pode ser vendido separadamente

Festa das Fogaceiras | 2014

a tradição reinventada


20.JAN.2014

Primeira coluna

A tradição reinventada De uma actividade que abarca três séculos, no CORREIO DA FEIRA tem sobressaído a ligação à Festa das Fogaceiras, entendida, ainda hoje, como a maior manifestação sociocultural do universo Feirense. A cada ano – e sempre! – este semanário tem sido o principal arauto do sentir das nossas gentes, contando e recontando a história (e as estórias) há 117 anos. E é a esse desiderato que voltámos a propor-nos, este ano, através da edição de mais um trabalho especial dedicado ao evento cultural mais marcante da nossa ancestralidade. Na preparação da edição deste trabalho, inteiramente dedicado à temática das Fogaceiras, surgiu de imediato o primeiro e mais difícil desafio, focado a nível da(s) narrativa(s): apreender a visão multifacetada da cultura focaciana em Terras de Santa Maria, projectando-a (recontando-a) com novas roupagens e/ou interpretações do fenómeno identitário que a todos abrange… tem sido – ano após ano – uma tarefa que pede messas à imaginação, sem transigir. Nesse sentido, acaba por emergir a qualidade do Programa das Comemorações, enquanto gerador de matéria datável, registável e transmissível. Daí que nesta edição se destaque o diversificado leque de actividades com que a autarquia, em boa-hora, entendeu marcar os 508 anos da Festa das Fogaceiras. No entanto, há outras pistas, testemunhos e curiosidades à volata do tema da Fogaça, que ilustram reflexos menos evidentes. No mesmo sentido, se dedica espaço à Confraria da Fogaça, instituição que há uma dúzia de anos vem consolidando uma importância crescente, fortemente impulsionada pela sua “alma mater”, Celestino Portela. Numa perspectiva paralela, mas íntima do tema, apresenta-se uma reflexão sobre o processo de certificação da Fogaça da Feira.

Ficha Técnica: Ante-Título: Especial Fogaceiras 2014 Título: A tradição reinventada Produção: “Trazer Notícias, Lda.” - Deptº. Projectos de Informação Especial Cordenação: Orlando Macedo Equipa: Albino Santos, André Costa, Cíntia Aleluia, Daniela Soares, Pedro Almeida. Nota: No tratamento redactorial dos conteúdos deste Suplemento, observou-se a adopção indiscriminada das antiga e nova ortografias da Língua Portuguesa.

Honrar a nossa tradição e identidade O Município de Santa Maria da Feira volta a honrar a tradição, cumprindo o voto ao mártir São Sebastião, no dia 20 de janeiro. Com grande sentido de responsabilidade, assumirei o papel que nesta ocasião é determinado ao presidente da Câmara Municipal – entidade responsável pela organização da festividade – no programa oficial, em particular na Missa Solene e na tradicional Procissão das Fogaceiras. Para o Município, renovar o voto a S. Sebastião é honrar a nossa história e tradição, mas também o compromisso assumido para com as gentes da Feira e das Terras de Santa

Maria. É certo que as pestes dos nossos dias são outras, mas o simbolismo e o sentido da promessa mantêm-se inalterados. Prezo muito a nossa identidade, as nossas raízes e o espírito de partilha que distingue a Festa das Fogaceiras, espelhado na forma singular como a comunidade se envolve na organização desta festividade, seja no programa de animação – através do movimento associativo –, seja na preparação do programa oficial, assegurado pelos funcionários municipais e entidades parceiras. Uma saudação especial às comunidades portuguesas de Caracas (Venezuela), Rio

de Janeiro (Brasil) e Pretória (África do Sul), que continuam ligadas a nós através desta festa emblemática, recriada anualmente nos três países. São Feirenses no Mundo com quem estamos apostados em fomentar relações de amizade e cooperação em várias áreas. Munícipes, visitantes e diáspora têm, assim, um papel fundamental na preservação desta tradição secular. A todos, o meu sentido reconhecimento. Emídio Sousa, Presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira

Entrevista-rápida a Gil Ferreira

Tradição das Fogaceiras esperança de renovação cultural Com o aroma das Fogaças a invadir os espaços interiores do Castelo de Santa Maria da Feira, era grande a azáfama dos pasteleiros que no início da semana passada ali foram mostrar como se faz a Fogaça da Feira (contudo, nem tudo, que o segredo – mais que alma do negócio – também faz parte da tradição…). A cozedura, essa, estava entregue às virtudes do aclamado Forno do Castelo, “apenas” o melhor-forno-para-cozer-fogaça, a acreditar nos entendidos… Foi num salão cheio de convidados, pasteleiros, dignitários e muitos elementos da Comunicação Social, que quisemos ouvir Gil Ferreira, o novel vereador do pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira (CMF). Correio da Feira – Como é que está a viver esta sua primeira grande prova-defogo, enquanto responsável máximo pela cultura feirense? Gil Ferreira – Com enorme alegria. Para mim, é motivo de um orgulho muito grande intervir no processo de promoção da Festa das Fogaceiras, contribuindo também para perpetuar a fogaça, como produto genuíno e representativo dos nossos valores culturais… Não acha que ao longo dos últimos anos a importância da Festa das Fogaceiras tem vindo a decair, perdendo-se aos poucos o sentimento de pertença, por parte da população do concelho? Não me parece. Tenho vindo a constatar que o sentimento de pertença se mantém e a identidade cultural sai até reforçada, graças ao excelente trabalho que está a fazer o pelouro da Educação, à volta do tema das Fogaceiras. Mas perdeu-se a primazia, face a outras realizações culturais, como o “Imaginárius” ou a “Viagem Medieval”… … são eventos de natureza diferente, realizados em alturas

diferentes do ano… O Programa deste ano parece mais ambicioso, relativamente a outros recentes… O programa sintetiza o ideário da política cultural com que se pretende envolver toda a comunidade; desenrola-se num conjunto de 27 actividades diferentes, com grande variedade de temas, como Desporto, Música, Teatro, Debate… sempre com um traço comum: o contexto identitário, na perspectiva de sociedade vs. história local, com destaque para as produções locais. Qual é a quota-parte de participação de Feirenses no programa? Esmagadora. 25 das 27 actividades são de produção local, concebidas e realizadas a partir das nossa associações. Destaca alguma realização, em especial? O programa das comemorações é extremamente rico e diversificado; mas não posso deixar de assinalar dois eventos, em particular: o regresso do Teatro ao Salão da Casa do Povo e o concerto da Kátia Guerreiro, integrado na sua grande tournée mundial. Diria que estamos perante a perspectiva de uma grande Festa das Fogaceiras?… Sem dúvida. Mas deixe-me dizer que esta tradição também transporta a esperança de renovação do nosso tecido cultural. Acredito muito na Festa das Fogaceiras e nas pessoas e instituições envolvidas…


Festa das Fogaceiras | 2014

a tradição reinventada

“Fogaça around the world”

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Festa das Fogaceiras é celebrada em três continentes Chega a ser comovente o fervor e a persistência com que os “fogaceiros” de além-mar se apegam à celebração das Fogaceiras. Uns, em nome das reminiscências afectivas; outros, por “contágio”. Mas todos irmanados à volta de uma celebração que, já há muito, exige lugar na nomenclatura do Património Cultural e Imaterial… Santa Maria da Feira, Caracas, Rio de Janeiro e Pretória são os vértices de um fervor cultural assente na Festa das Fogaceiras como denominador comum. Todos os anos, o pão doce com quatro coruchéus é, ali, emblema de uma tradição que – por força da saudade e da vontade – conquistou espaços e afectos no seio da diáspora; “aperfilhou” sensibilidades locais; reclamou espaço cultural representativo; e (a)firmouse, ecoando nas (das) reminiscências seculares com raízes em Terras de Santa Maria. Levado pela diáspora feirense, o sortilégio focaciano revive no Brasil, na Venezuela e na África do Sul, a cada domingo sequente a 20 de Janeiro.

• VENEZUELA No país de Simón Bolívar, a primeira comemoração (melhor, rememoração) oficial da Festa das Fogaças, ocorreu no último ano do século passado, a 23 de Janeiro de 2000, por via da Associação Civil Amigos de Terras de Santa Maria (ACATSM) , em que pontuava o escapanense Rodrigo Ferreira. Actualmente, a Direcção presidida por Ernesto Cardoso, é integrada por António Reis, Américo Pinho e Maria de Lourdes de Almeida (Milú), esta que, acerca da comemoração das Fogaceiras na Venezuela, nos refere que a “a ideia surgiu de um grupo de feirenses que todos os anos se reunia num almoço de confraternização para dar a conhecer

Santa Maria da Feira, mais especificamente Escapães, de donde alguns são oriundos”. Apesar de a instabilidade política de 2003 ter marcado a suspensão da Festa, a ideia ressurgiu e nos últimos anos voltou a cheirar a fogaça no Centro Português de Caracas, ponto de passagem obrigatória dos nossos autarcas, ao longo dos anos. Por lá (e pela Casa da Vila da Feira no Rio de Janeiro) passaram, dentre outros, António Topa, Alfredo Henriques, Strecht Monteiro, Celestino Portela e Emídio Sousa, que este ano regressa, investido agora nas funções de presidente da autarquia santamariana. “Veio a primeira vez como vereador da Câmara e vem agora como Presidente, pelo que a comunidade tem grandes expectativas na visita do Dr. Emidio Sousa, que nos deixou muito boa imagem na sua primeira visita”, diz-nos Milú.

Quinze anos de fogaça caliente Habitualmente, excede o meio-milhar o número de participantes nas comemorações venezuelanas, dentre eles as incontornáveis meninas, transportando as fogaças à cabeça e representantes dos corpos diplomático e consular portugueses, naquele país. Apesar de algumas fogaças seguirem de Santa Maria da Feira para a América do Sul, em Caracas e no Rio de Janeiro também se coze o pão doce com coruchéus, como nos indica Milú. Mas também há indicações – ainda que não-confirmadas – de que a fogaça também vai ao forno em Pretória, capital da África do Sul. Sendo tantas as similaridades, quisemos saber se não valeria a pena promoverse o estreitamento de relações, criando um programa de intercâmbio entre as diversas organizações, sedeadas nos três continentes. A secretária da ACATSM assentiu e recordou que houve “oportunidade de partilhar experiências nas comemorações dos 500 Anos das

Fogaceiras, em Santa Maria da Feira”, para revelar ainda a intenção de convidar as suas congéneres “a participar nas actividades dos 15 anos do nosso evento a realizar-se no ano 2015”.

Caracas

• ÁFRICA DO SUL No país de Nélson Mandela, é a Associação da Comunidade Portuguesa (ACP) que assume a tarefa de organizar a Festa das Fogaceiras. Ainda que sem ter havido oportunidade de recolher indicações precisas, acerca da cronologia da festa, há indícios de que a iniciativa sul-africana radica em 1986, realizando-se depois de forma intermitente. No início deste século, a festa reavivou-se mais uma vez animada por feirenses emigrados, que introduziram as “Fogaceiras” no calendário de actividade da ACP. Mas após anos de grande exuberância, a organização foi-se desvanecendo, a ponto de em 2009 e em 2010, não se ter realizado a rememoração da festa. No entanto, em 2011, a ACP de Pretória voltou a festejar a tradição, promovendo um programa de comemorações que contou com a participação do secretário da Embaixada de Portugal na África do Sul e outros dignitários diplomáticos, consulares e culturais. Sem fugir muito a um modelo préestabelecido, a matriz do programa centra-se habitualmente na realização de um almoço de convívio, seguido do ponto alto das comemorações: o desfile das fogaceiras. Com a simbologia a afirmar-se, ainda e sempre, na representação simbólica das 31 freguesias do concelho da Feira, bem expressa nas faixas envergadas pelas jovens que transportam as fogaças, abre o cortejo o Castelo da Feira, logo procedido do estandarte de S. Sebastião. O programa segue depois com outras actividades culturais e recreativas, encerrando com o tradicional baile das fogaceiras.

Pretória

Rio de Janeiro

Festa das Fogaceiras 2014 em Caracas - Venezuela Programa 11:00 - Apresentação da Banda de Música “Francisco de Miranda” 11:30 - Saída do cortejo para a a Capela do Centro Português de Caracas 12;00 - Missa 13:00 - Procissão 14:00 - Almoço de confraternização no Salão Nobre do Centro Português

15:30 - Reconhecimento ao “Feirense do Ano 2014” (Maria Fernanda S. S. Moreira) 16:00 - Baile com o conjunto musical “Junior Band” 17:00- Grupo Folclórico “Os Lusíadas” - Folclore Português Grupo Folclórico “Dos Patrias” - Folclore Venezuelano 18:00- Baile (“Junior Band”) até às 21:00 horas

Casa da Vila da Feira - Futuro está assegurado, diz o presidente Questão: Que faz um minhoto de Vila Chã, à frente das comemorações das Fogaceiras em Terras de Vera-Cruz?... Respostas: a) Cumpre a vontade estatutária da Casa da Vila da Feira no Rio de Janeiro; b) Presta tributo aos valores fogaceiros, enquanto presa do sortilégio focaciano. Ernesto Boaventura é um minhoto de Esposende, que, como tantos outros, rumou um dia às Terras do Fogo, à procura de melhores dias. Estabelecido à sombra do Corcovado, chegou-se um dia ao Centro Português da Guanabara, onde o Rancho Folclórico Almeida Garrett o acolheu e mimou. Durante muitos anos bailou ali, afirmando-se – ele próprio – enquanto elemento interventivo na vida de uma associação que haveria de fundir-se, mais tarde (1971) com a “Casa da Vila da Feira e Terras de Santa Maria” (CVFTSM). Hoje é o presidente da vetusta instituição. De regresso a Santa Maria da Feira, o recém-empossado (2013) membro da Confraria da Fogaça falou ao Correio da Feira acerca da vida da sua instituição. Revelando que o esforço de manter a “Casa” funcional, se ressente do facto de apenas cerca de 200 dos 3.000 associados manterem as quotizações em dia, é ao complexo social e desportivo

que a direcção vai buscar o principal financiamento da sua vida associativa, em que se inclui a promoção anual da Festa das Fogaceiras. Almoços dominicais, sessões de Fado e Folclore, são as actividades que mais marcam a vida da instituição. Inquirido acerca do futuro, o presidente da Casa da Vila da Feira não disfarça a sua preocupação, principalmente pela ausência de valores etnográficos dos novos emigrantes portugueses, que agora aportam ao Brasil. “São gente da ´nova emigração´. São doutores e engenheiros, idos quase todos da região de Lisboa, que não se reveem nos valores do Folclore e da tradição e não querem saber de valores regionais para nada…”, queixa-se Ernesto Boaventura. No entanto, o presidente não teme pelo futuro. “Neste momento, 60 a 70 por cento dos associados, são brasileiros, todos eles conquistados para os valores da cultura familiar e etnográfica. Convivem, divertem-se e saem felizes”, diz, sublinhando que a transmissão de valores está assegurada pelos muitos luso-descendentes e brasileiros que adoram a cultura portuguesa, em especial a santamariana. “Alguns já estão na Direcção da Casa da Vila da Feira e com eles o futuro está assegurado”, revela ainda, confiante.

A ideia de fundar a Casa da Vila da Feira, nasceu de uma visita que o Comendador Manuel Lopes Valente fez a Sanfins, sua terra natal, em 1951/52, depois de uma ausência de 24 anos. De volta ao Rio de Janeiro, contatou amigos como Albertino Alves Ribeiro, José Tomaz dos Reis, José Manuel dos Santos Soares de Sá, Joaquim Marques de Sá, António da Silva Campos e Manuel Correia de Sá com os quais avançaria para a fundação de uma estrutura (à maneira de Consulado das Terras de Santa Maria. À época, M. Lopes Valente integrava a direcção da “Casa dos Poveiros”, cujos membros apoiaram o seu objectivo, a ponto de lhe disponibilizarem instalações para o arranque do projecto. A partir daí, Lopes Valente não mais parou. A 04 de Junho de 1953, Lopes Valente reuniu-se com Albertino Ribeiro, António Campos, José Tomaz dos Reis, José M. Santos Soares no “Bar LUIZ”, na rua da Carioca, nº 39. Nessa altura, a ideia já visava a disseminação, principalmente junto da comunidade feirense, o que justifica a presença de um homem da rádio nesse primeiro encontro. Lançada a semente, a ideia acabaria por germinar numa reunião alargada, já com a presença de dezanove entusiastas (dezasseis feirenses, um sanjoanense, um portuense e um bragantino. Conse-

A BANDEIRA Em 18 de outubro de 1953, Manuel Lopes Valente apresentou o esboço da Bandeira da Casa, da autoria do arquiteto e pintor José Maltieira. Aprovada a simbologia, avançou-se de imediato para a confecção da primeira Bandeira, executada e oferecida José Leite de Pinho, Diretor da Casa Sucena, especialista no ramo. quentemente, a 12 de julho de 1953, era formalizada a fundação da Casa da Vila da Feira. Decorrido pouco mais de um ano, em reunião da Assembleia Geral, de 15 de Setembro de 1954, o Conselho Deliberativo autorizou a emissão de 700 títulos de Sócio-Proprietário, no valor de 10.000,00 Cruzeiros ( moeda brasileira

de então) cada um e também a compra de um prédio que viria revelar-se o verdadeiro “Solar Santamariano”. Entre várias propostas de venda de imóveis apresentadas, foi escolhida a do prédio da rua Haddock Lobo, 195. A compra concretizou-se em 3 de novembro de 1954 e o edifício ainda hoje acolhe a instituição.


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Canção da Fogaceira

Música: Paulo de Sá Letra: Carlos Morais Data: 1942 I Fogaceira linda e nova, Deixa-me tirar a prova Duma fogaça das tuas; Vendendo-as assim a esmo, São pedaços de ti mesmo Que vendes por essas ruas! II Quando vais, ó fogaceira, Vender fogaças à feira, Vais tão cheiinha de graças Que nos gestos e meneios As fogaças lembram seios E os seios lembram fogaças! III Tuas fogaças loirinhas São certamente irmãzinhas Das fogaças do teu peito; Só assim, dessa maneira Se compreende, ó fogaceira, Que as vendas todas a eito! (Estribilho: Fogaceira minha, Que linda que és Com a chinelinha Toda bordadinha Na ponta dos pés; Quando vais andando, Tens o encantamento, De rosas dançando, De lírios bailando Nas asas do vento!) I Fogaceira linda e nova, Deixa-me tirar a prova Duma fogaça das tuas; Vendendo-as assim a esmo, São pedaços de ti mesmo Que vendes por essas ruas! II Quando vais, ó fogaceira, Vender fogaças à feira, Vais tão cheiinha de graças Que nos gestos e meneios As fogaças lembram seios E os seios lembram fogaças! III Tuas fogaças loirinhas São certamente irmãzinhas Das fogaças do teu peito; Só assim, dessa maneira Se compreende, ó fogaceira, Que as vendas todas a eito! Celestino Portela

in www.confraria-fogaca.pt

Confraria A confraria tem uma origem antiquíssima e nasceu com um espírito piedoso, tendo em vista realizar em comum práticas religiosas ou de caridade. O seu desenvolvimento foi grande, com ligação a um Santo e uma Ordem Religiosa. Algumas cometeram abusos e desvirtuaram a sua finalidade, consagrando-se a banquetes e espectáculos. A congregação do Concílio Tridentino (1595) proibiu as Confrarias de Varões nos Conventos das Religiosas. Existem ainda em todas as terras com carácter acentuadamente religioso ou de solidariedade, ligados a Santos e às Misericórdias. A confraria evoluiu no sentido social, surgindo então como um conjunto de pessoas que têm as

mesmas ideias, afinidades ou sentimentos. Visam o convívio social, usam um vestuário que sugere o que era usado pelos Frades das ordens religiosas, como elemento de identificação e de solenidade. As coisas de identidade social são causa de uma intensa proliferação de confrarias, que surgem ligadas a um produto que se deseja promover, defender a sua genuinidade e fomentar o convívio social entre os seus membros. Assistimos ao aparecimento de confrarias em todas as terras, e, naturalmente ao convívio das confrarias entre si, promovendo a sua concentração e o intercâmbio de conhecimentos, culturas, etnografias, culinária, gostos e paladares. A ligação de muita amizade entre

o povo feirense e Fernando Pessa, apreciador e divulgador da Fogaça da Feira, foram o Querer e o Sonho de uma confraria que nasceu a 15 de Abril de 2002, com intenso entusiasmo que faz divisar uma longa e pujante vida. Santa Maria da Feira foi de extrema felicidade ao criar a Confraria da Fogaça da Feira, uma ligação perfeita entre o religioso e o laico, entre a promessa e o cumprimento, o fabrico e o consumo, o Homem e a Mulher, dentro de um Espírito Feirense que asseguram, sem fins lucrativos, a defesa e divulgação da Fogaça da Feira, e a sua relação com a gastronomia e o artesanato, a arte, a ciência e a literatura. Celestino Portela

A Confraria da Fogaça da Feira A 15 de Abril de 2002, foi formalmente constituída a Confraria da Fogaça da Feira, tendo por finalidade promover, estudar e defender a Fogaça, considerando o seu valor histórico, bem b) Divulgação e defesa das caractecomo divulgar e preservar rísticas específicas da genuína fogaça as características específicas da Feira; da genuína Fogaça da Feira. c) Apoio e promoção de iniciativas que visem um melhor conhecimento Com a escritura constitutiva, das relações entre a fogaça e todas culminava-se um processo as tradições ligadas ao domínio de que nasceu da vontade de gastronomia, das artes, de literatura, da história e da cultura. alguns estudiosos e defensores da cultura fogaceira, O Traje e o Selo com especial apontamento A Fogaça é um símbolo centenário para o advogado Celestino das Terras de Santa Maria da Feira. A realização de um traje que marcasse Portela. a solenidade, a herança histórica e a (…) Artigo 4º Objectivos 1 – São objectivos da Associação promover o estudo, defesa e divulgação da fogaça da Feira e a sua relação com a gastronomia e artesanato, a arte, a ciência e a literatura, quer directamente, quer em complemento de outras actividades histórico-culturais. 2 – Para prossecução de tais objectivos, deverá proceder, nomeadamente; a) Promoção, estudo e defesa da fogaça, considerando o seu valor histórico;

grandiosidade desta tradição secular obrigou a uma aturada pesquisa dos costumes e tradições medievos. O solene traje é constituído por uma capa de inspiração quinhentista. O uso de brocado dá-lhe um toque de nobreza e distinção concedendo-lhe ao mesmo tempo, a sua imponência protocolar. O gorro, inspirado nas formas da fogaça, é o complemento chave desta indumentária. Se, por um lado, permite a identificação dos confrades, por outro lado, irá conter os elementos de distinção hierárquica – através do

jogo cromático das cintas. A cor, elemento de extrema importância pela impressão visual que produz, foi escolhida para simbolizar os tons dessa única e afamada iguaria que é a fogaça. As insígnias têm a forma de Escudo, com o Brazão dos Pereiras, em corte vertical, na metade esquerda; no quartel inferior direito, o Castelo, símbolo da Terra de Santa Maria; no quartel superior

A Festa das Fogaceiras in www.confraria-fogaca.pt A “Festa das Fogaceiras” apareceu-nos datada de 1505, altura em que o País foi fustigado por uma “epidemia brava e cruel”, a peste. Então os Condes do Castelo e da Feira, ramo nobre criado em 14 de Janeiro de 1452, apelaram ao Mártir S. Sebastião para que acabasse com o morticínio dos Feirenses, prome¬tendo-lhes a realização de uma festa anual, onde o “voto” seria a “fogaça”! Até 1700 - data em que o Condado do Castelo e da Feira se extinguiu por falta de descendência, passando os seus domínios para a “Casa do Infantado” - a “Festa das Fogaceiras” foi promovida pelos senhores das Terras de Santa Maria da Feira, habitantes do paço intra-muros do Castelo. Daí, e durante quatro anos, a

festa foi suspensa, reatando-se a tradição de seguida, e até 1749, por iniciativa das famílias mais abastadas do Concelho. Verificouse entretanto novo surto de peste e em 1753, por Alvará de 30 de Julho, o Infante D. Pedro, irmão de D. João V, determinou à Câmara Municipal que assumisse definitivamente a realização da

“Festa das Fogaceiras”, para o que dispenderia 30.000 réis! Esta determinação foi justificada com a vontade do povo e a existência “imemorial” do voto. Por isso, o voto foi cumprido pela Câmara Municipal até 1910, altura em que, invocando-se a separação entre a Igreja e o Estado, a festa passou a ser realizada por autoridades civis, a título indivídual, e pela Santa Casa da Misericórdia. No dia 15 de Julho de 1939, a Câmara Municipal deliberou retomar a responsabilidade de realização da festa, decisão que se mantém agora como atribuição assumida pelo poder autárquico concelhio.

direito, o forno e, em movimento giratório, a fogaça, que simboliza a partilha por todos


Festa das Fogaceiras | 2014

veja pormenores em www.cm-feira.pt

O programa da Festa das Fogaceiras desenrola-se até março. Participe

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Município defende a genuína Fogaça da Feira

Certificação poderá ser passo decisivo Numa nota de imprensa dimanada a partir do gabinete de comunicação da autarquia, o presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira, Emídio Sousa, vem recomendar aos turistas e visitantes a opção pela “genuína Fogaça da Feira” e alertar para “as imitações e falsificações que por estes dias proliferam pela cidade e arredores”. Notoriamente, aquela nota – datada de 18 de Janeiro e que surge aparentemente como informação promocional final, junto dos media – aponta mais longe, permitindo vislumbres de concertação com outras tomadas de posição e declarações, como as que abaixo se reproduzem, proferidas pelo presidente do Agrupamento de Produtores da Fogaça da Feira (APFF). Diz Emídio Sousa que “a Fogaça da Feira é o ícone da nossa gastronomia e o símbolo votivo da Festa das Fogaceiras. Tem uma história e um saber-fazer que temos obrigação de preservar; e tem um impacto significativo na economia local e no turismo da região Norte, que podemos potenciar, promovendo e defen-

dendo o produto”. Significativamente, a nota assegura que o autarca tem acompanhado com interesse o processo de certificação do tradicional pão doce de Santa Maria da Feira (conduzido pelo Agrupamento de Produtores de Fogaça da Feira, com o apoio da Confraria da Fogaça da Feira) que visa a obtenção do selo “IGP – Indicação Geográfica Protegida”.

Fogaça vai a França No mesmo texto, em que se sublinha o facto de ser a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira a entidade organizadora da Festa das Fogaceiras, surge outro apontamento significativo, dando conta de que “a autarquia está fortemente empenhada

na preservação e promoção da genuína Fogaça da Feira”, não apenas a nível nacional, onde já é sobejamente conhecida, mas também no estrangeiro. Neste âmbito, a Autarquia está a apoiar a participação de produtores do pão doce secular na “Feira de Tours”, que vai realizarse no próximo mês de Maio, em França. “Portugal é o país convidado de honra da Feira, em que será promovido o que de melhor se faz no nosso País. Para além da indústria de Santa Maria da Feira, teremos, com muito orgulho, representada a Fogaça da Feira no certame, esperando que se revele como uma das grandes atrações gastronómicas”, adianta Emídio Sousa.

Emídio Sousa vai a Caracas A diáspora feirense também comemora anualmente a Festa das Fogaceiras (ver pág. 3) num processo rememorativo em que a ligação às origens se assume como factor importante e decisivo para a preservação dos valores fogaceiros. Ao longo dos últimos anos, o município vem dando mostras de assumir a importância dos eventos da “Fogaceiras” levados a cabo por feirenses (e não só) radicados noutros países, aond tem feito

deslocar representantes da autarquia. É nesse âmbito que o presidente da câmara vai representar o Município na Festas das Fogaceiras de Caracas, no próximo dia 26. “Em Santa Maria da Feira prezamos muito a nossa identidade e as nossas tradições e, acima de tudo, o espírito de união e partilha que caracteriza a Festa das Fogaceiras, que é também celebrada em Caracas (Venezuela), Rio de Janeiro (Brasil) e em Pretória (África do Sul), pelas comunidades

portuguesas”, justifica Emídio Sousa. A nota remata ainda com uma mensagem adequada aos nossos tempos: “Renovar, ano após ano, o voto ao mártir S. sebastião é honrar a nossa história e tradição e o nosso compromisso para com as gentes de Santa Maria da Feira e Terras de Santa Maria, cientes de que as pestes dos nosso dias são outras, mas certos de que o sentido e simbolismo do voto se mantêm inalterados”, sublinha ainda o presidente da câmara.

Agrupamento anda(va) “ser enganado há oito anos”...

Certificação da fogaça condicionada a “ajustamentos” Daniela Castro Soares daniela.soares@correiodafeira.pt

“O que estamos a tentar certificar é a receita, o nome e o feitio da Fogaça da Feira” – explica o presidente do Agrupamento de Produtores de Fogaça da Feira (APFF), Diogo Almeida. Aparentemente, trata-se de uma luta de há muitos anos, que oficialmente começou em 2006, mas, no dizer do actual presidente da APFF, só arrancou verdadeiramente há cerca de dois anos. “Acho que nós, produtores, andámos a ser enganados”, desabafou, para revelar depois que “foi uma firma especializada que ficou de tratar do processo, mas quando comunicámos com o ministério, nada tinha dado entrada. Estivemos a pagar milhares de euros e ninguém tinha conhecimento do processo fogaça da Feira no Ministério da Agricultura...”, lamenta Diogo Almeida. Diz o presidente que, assim que assumiu o cargo, tomou as rédeas do processo, que se encontra agora na fase do acerto de alguns detalhes. “Já tivemos a visita de uma responsável do Ministério da Agricultura e, mais do que nunca, penso que estamos no bom caminho. Agora é uma questão de ajustamentos, porque tudo o que nos pediram é subjectivo”, considera Diogo Almeida, alongando-se ainda em vários exemplos de alterações a fazer, como definir o que é o “saber-fazer local”; não apor validade no produto

e legalizar, para encarar a possibilidade de congelação; ou ainda, distinguir, em termos de datas, a produção de Fogaça (que é mais antiga) da Festa das Fogaceiras. A preocupação revelada com os detalhes deve-se ao facto de que, uma vez certificado o produto, será extremamente difícil fazerlhe alterações. “Tivemos de refazer o processo todo, que tinha 18 páginas e agora tem sete. Já estamos numa parte altamente pormenorizada, em que se vai à vírgula”, conta Diogo Almeida.

Contra a fogaça-brioche Depois de ser aprovado pelo Ministério da Agricultura, o processo vai a Conselho de Ministros e – se tudo estiver em ordem – receberá então a identificação IG (Indicação Geográfica). “É uma certificação em território nacional que estamos a contar conseguir ainda este ano”, diz o presidente do Agrupamento; mas não é tudo. “Depois, o processo segue para Bruxelas, que tem meio ano para responder, para que aprove o IGP (Indicação Geográfica Protegida)”, descreve Diogo Almeida, acrescentando que “o processo é moroso” mas necessário para “separar o trigo do joio”. E avança: “Estamos a certificar para ter a certeza de que as pessoas não são enganadas, para que não comprem ‘fogaça-brioche’; Assim, quando quiserem comprar, vão procurar a fogaça certificada, com

a garantia de que ela é feita conforme a receita tradicional, com qualidade”, defende o produtor, salientando ainda que, “uma vez certificada, não vai ser qualquer um que vai poder fazer fogaça. Vamos fazer com que nem toda a gente possa vender; se quiserem vender, estarão sujeitos às regras. Haverá um caderno de especificações que tem de ser seguido à risca, porque senão haverá inconformidade, sujeita a sanções”, avisa Diogo Almeida. Desvendando mais pormenores restritivos, o presidente do Agrupamento de Produtores de Fogaça da Feira sublinha que é “estritamente proibido adicionar qualquer ingrediente à receita”; e que “as pessoas têm de olhar para uma fogaça e perceber o que é a verdadeira fogaça”. “Se todos os produtores fizessem a fogaça bem feita, ganhávamos todos, porque haveria cada vez mais gente a comprar. Agora, se chega aqui uma pessoa, que não conhece a fogaça, e compra uma porcaria qualquer, a que deram o nome de fogaça, prova e interroga-se: ‘isto é que é a fogaça da Feira? Tanta fama…, mas afinal isto não é nada’. Essa pessoa nunca mais compra fogaça”, afiança Diogo Almeida, que já teve essa experiência com um amigo. A certificação irá evitar tais situações. “É exactamente aí que o certificado vai marcar a diferença”, remata com convicção.

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O executivo da União de Freguesias da Feira, Espargo, Sanfins e Travanca

saúda todos quantos contribuem para fazer da Festa das Fogaceiras um acontecimento ímpar no panorama cultural português


Festa das Fogaceiras | 2014

a tradição reinventada

Um processo… sui generis

07

I.G.P versus D.O.P “Certificação da Fogaça” é um quase-neologismo, em que circuncricção geográfica em apreço. Para requerer registos IGP ou DOP se projecta uma espécie de protecção do produto-fogaça Principais diferenças entre Apesar de o requerimento de registos e da circunscrição da sua área de produção. Mas o que IGP ou DOP estarem praticamente reIGP e DOP está em cima da mesa é o acrónimo “IGP”, significante Aparentemente similares, as certifica- servados a agrupamentos de produtode “Indicação Geográfica Protegida”, pelo qual os res- ções contêm, no entanto, “pequenos” res ou de transformadores (através de denominado Conselho Regulador) ponsáveis pela dita “certificação” parecem ter optado (ou pormenores diferenciadores, que, um não obstante, podem vir a revelar-se em casos excepcionais, a determinar alguém por eles). Mas poder-se-ia ter optado por uma determinantes em certas circuns- caso-a-caso, é admissível a subscrição de um processo por um cidadão, de certificação “DOP” – Denominação de Origem Protegida, tâncias. Enquanto a IGP indica que o vínculo índole jurídica singular. muito mais abrangente e de mais-valia institucional?... A IGP - Indicação Geográfica Protegida

A DOP – Denominação de Origem Protegida

A denominação integra o nome de uma região ou de um lugar determinado (podendo, em casos excepcionais, corresponder a um país) destinando-se a servir de suporte à designação de um produto (alimentar ou agrícola) que seja comprovadamente originário da área geográfica em apreço; que possua qualidades e características específicas e determinadas, dentre elas uma reputação exclusiva, ligadas à origem geográfica; e cuja produção, transformação ou elaboração sejam levadas a cabo – comprovadamente – em tal zona geográfica definida.

A denominação reporta ao nome de uma região, de um determinado lugar, (podendo, igualmente em casos excepcionais, corresponder a um país). Tem como objectivo designar um produto alimentar ou agrícola que seja comprovadamente originário da área geográfica em apreço, tal como a IGP; mas exige que as qualidades e/ou características fundamentais (do produto) sejam consequência directa e exclusiva do meio geográfico, atentando nos seus factores naturais e humanos, intrínsecos; e que a produção, transformação ou elaboração, se efectuem – comprovadamente – na

com o território deve estar plasmado em pelo menos uma das fases do processo de produção, a DOP exige que a denominação de um produto, suas produção, transformação e elaboração tenham lugar na zona geográfica em apreço, sob regras de especialização reconhecida e comprovada, factores que determinam uma vinculação ao território de forma absoluta e determinante, no caso da DOP.

Pistas Para melhor se perceber as condicionantes de um processo de Certificação IGP ou DOP, recolhemos uma série de indicadores obrigatórios; alguns, aparentemente comezinhos, outros a exigir capacitação técnica adequada.

Para se poder exibir a certificação, é necessário: • Nome aprovado do produto, com a denominação de origem ou a indicação geográfica de origem • Descrição do produto e principais características físicas, químicas, microbiológicas ou organolépticas • Delimitação da zona geográfica indicada • Elementos que provem que o produto é originário dessa zona geográfica • Elementos que justifiquem o vínculo entre o produto e o meio geográfico indicado • Descrição do método de obtenção do produto, e se for o caso, dos métodos locais, cabais e constantes, bem

como informação sobre o processo de embalagem efectuado na zona geográfica limitada para salvaguardar a qualidade, garantir a origem, ou assegurar o controlo de qualidade • O nome e a direcção das autoridades ou organismos competentes, encarregados de verificar o cumprimento do indicado na lista de condições aprovada • Qualquer norma específica de etiquetagem para o produto em questão • Eventuais requisitos que devam cumprir-se em virtude de disposições comunitárias ou nacionais.

Importante Em todo o caso, o processo determina-se finalmente no seio da União Europeia, já que o sistema de registo internacional de denominações de origem rege-se pelo Acordo de Lisboa, relativo à Protecção das Denominações de Origem e seu Registo Internacional (este, adoptado em 1958 e revisto em Estocolmo em 1967). O Regulamento do Acordo de Lisboa modificado mais recentemente entrou em vigor a 1 de Abril de 2002.

Escola do Farinheiro recria desfile das fogaceiras

Valorizar a tradição fortalecer laços familiares A Escola Básica do 1.º ciclo do Farinheiro, em Fornos, promoveu uma actividade diferente e divertida para os alunos e respectivos familiares, a pretexto do tema das Fogaceiras.

André Costa andre.costa@coreiodafeira.pt O evento contou com a presença de várias personalidades do concelho, dentre elas os vereadores dos pelouros do Desporto, Educação e Juventude e da Cultura, Turismo e Museus, respectivamente, Cristina Tenreiro Gil Ferreira; da directora do Agrupamento de Escola de Santa Maria da Feira; e das Associação de Pais e direcção da Escola. Cada um dos educandos encarregou-se de elaborar um boneco representativo do desfile desta época festiva para todos os feirenses, num trabalho que teve como objectivo valorizar as tradições e incutir nos mais pequenos a cultura do concelho de forma, ao mesmo tempo, pedagógica e divertida.

Envolver os pais no projecto, foi mais uma forma encontrada para preservar os valores familiares e ajudar a fortalecer laços afectivos. Foram apresentados mais de 30 bonecos, todos eles feitos com materiais reciclados e à espera da avaliação dos convidados. No final, todos eles saíram vencedores, com alguns alunos a dizerem poemas alusivos à Festa das Fogaceiras.

Protagonistas O pequeno Duarte, que mostrava com orgulho o espaço deixado pela queda de um dente, prontamente apresentou o seu boneco. “Fiz o boneco com garrafas grandes velhas; e a fogaça fi-la com garrafas mais pequeninas”, revelando ainda: “A minha mãe é que me

ajudou, porque sozinho era difícil”. Já o rebelde Francisco, também quis ir-se embora sem, por sua vez, explicar como construiu a sua figura. “Eu e os meus pais fizemos o boneco também com garrafas e sacos do lixo”, explica. Leonor, mais envergonhada, lá foi dizendo que foram “a avó a mãe e a tia” que a ajudaram na elaboração da sua fogaceira. No final, o vereador Gil Ferreira mostrava-se satisfeito com a iniciativa. “É uma acção muito oportuna e muito feliz. Reforça o envolvimento na construção que tem por base a nossa história. É precisamente nestas idades que se incutem valores de família e de identidade cultural e vejo esse futuro com grande esperança”, rematou, com convicção.


última

20.JAN.2014

Outras Fogaças; outras lendas; outros padroeiros…

A Fogaça feirense não está sozinha, no universo do paladar focaciano. Acompanham-na as Fogaças de Alcochete e de Palmela, em suas formas mais franzinas, dadas a fantasia na forma (ao caso, da palmelense). Ainda assim, todas elas se afirmam em coincidências várias, nos aspectos simbológicos e votivos. • Fogaça de Palmela A Fogaça palmelense, cuja estrutura e aspecto a relacionam mais com os biscoitos, é um dos produtos gastronómicos mais representativos da região do Sado e está intimamente ligada à história e vivência das gentes palmelenses, que professam, ainda hoje, grande devoção a Santo Amaro. À imagem do que por cá se faz, a 15 de Janeiro – dia que o calendário religioso reservou para o santo nascido em Roma, no século VI – a comunidade palmelense revive a tradicional Bênção das Fogaças na sua Igreja Matriz, recriando um ritual que noutros tempos tinha como objectivo pedir saúde e proteção de colheitas e animais. De acordo com a tradição, os biscoitos eram oferecidos ao Santo como pagamento de promessas, projectando-se nas formas das Fogaças a simbologia do propósito a que se destinavam. Aliás, o que explica a multiplicidade de formas e feitios, deixados ao livre arbítrio (ou inspiração) dos voventes, ao tomar assim, a representação da graça pretendida. O ritual fogaceiro foi recuperado pela Confraria Gastronómica de Palmela, sendo oseus confrades, trajados a rigor, quem leva ao altar as fogaças, numa cerimónia aberta à participação de todos.

A receita Descritas como “muito aromáticas e de sabor inconfundível”, as Fogaças de Palmela chegam até nós através de várias receitas familiares, todas elas cheias de tradição… e segredo. Ingredientes: 1 kg de massa de pão; 1 kg de açúcar; 1 kg de farinha; 50 g de canela; 1 ovo; 50 g de erva doce; ½ cálice de aguardente; sumo de 1 laranja; 100 g de banha. Modo de Preparação: Amassa-se a massa de pão com a banha derretida, junta-se o ovo e a aguardente e o sumo de laranja. Estando bem amassado, junta-se a farinha, canela e erva-doce, ficando uma massa homogénea. Estica-se a massa com um rolo e corta-se em vários feitios, pinta-se com ovo e coze-se em forno a 200º.

O padroeiro Santo Amaro, filho de um senador romano, tinha apenas doze anos de idade quando foi entregue aos cuidados de São Bento, fundador da Ordem

Beneditina. Rapidamente as elevadas qualidades do jovem fizeram dele um exemplo a seguir, acabando o imaginário por reservar-lhe um feito único, premiando-lhe as virtudes do amor, na oração e no silêncio: foi recompensado pela sua obediência, andando sobre as águas. Diz a lenda que São Bento teve a visão de um confrade a afogar-se num açude, sem ninguém por perto que o pudesse ajudar, pedindo por isso a Amaro que o fosse salvar. Num ápice, Amaro pediu a São Bento que o abençoasse, invocou a graça de Deus e sem hesitar, correu e andou sobre as águas sem se afundar. Agarrando o confrade, levou-o para a margem sem se aperceber, sequer, do que conseguira. Quando Amaro se deu conta do que sucedera, atribuiu os méritos ao seu mestre, São Bento. O episódio valeu-lhe a comparação com São Pedro (que, por falta de fé, se afundou nas águas do mar, quando tentou andar sobre elas) e o reconhecimento de seus pares. Factualmente, refere-se que, com alguma naturalidade, foi sendo encarado como o herdeiro espiritual de São Bento e seu sucessor, apontando-se-lhe como principais virtudes as castidade, humilde, caridade e a obediência. Falecido em 584, Santo Amaro é o padroeiro dos transportadores, dos ferroviários e dos galegos em Portugal. A flor de Liz representada no seu escudo, remete para a introdução da Ordem beneditina em França.

• Fogaça de Alcochete A fogaça típica de Alcochete, é uma espécie de pão adocicado apresentando-se como um bolo de simplicidade quase espartana, na linha dos pães doces que se fazem em Portugal. Uma das particularidades marcantes da fogaça alcochetense, assenta no método de cozedura, que a apresenta bem cozida à superfície quase estaladiça, mas algo encruadas no miolo. Ao longo dos tempos, o seu peso tradicional sempre rondou um quilo, mas a adaptação aos tempos modernos tem levado à produção de fogaças mais pequenas, com pesos variados entre os duzentas e cinquenta e os quinhentos gramas. À semelhança da fogaça santamariana, apresenta-se com um sabor óptimo a canela e limão…,

Ingredientes 1 kg de farinha de trigo; 750g de

açúcar amarelo; 250g de manteiga derretida; 250ml de leite; Sumo e raspa de 1 limão; 1 colher de chá de fermento; 4 colheres de sopa de canela; 1 gema de ovo batida, para pincelar.

Preparação Juntar todos os ingredientes numa tigela, com excepção do leite, que se deve ir adicionando aos poucos, visto que o sumo de limão varia na quantidade. Amassar bem até formar uma bola de massa homogénea e que se despegue das mãos. De seguida, dividir a massa nas proporções desejadas e fazer bolas com a mesma. Forrar um tabuleiro de forno com papel vegetal, em que se colocam as bolas de massa, achatando-as um pouco. Pincelar com a gema de ovo e dar uns golpes superficiais com uma faca. Vai ao forno a 200 graus, entre 25 a 35minutos, consoante o tamanho das fogaças e o gosto pessoal.

A padroeira É à Virgem da Atalaia que os alco-

chetenses votivam a sua Fogaça. Há mais de 600 anos que o povo transmite a lenda de que “em tempos idos”, num dos dias em que os pescadores da terra se fizeram ao mar, surgiu inesperadamente um vendaval tão forte, que até as esperanças se perderam! Nessa altura, um barqueiro, sentindo-se naufragar, gritou em desespero pela Virgem Santíssima, pedindoLhe protecção. Garante a lenda que a expressão da fé foi tão grande, que a Senhora apareceu, surgindo do monte da Atalaia... E logo ali o vendaval amainou, permitindo à embarcação chegar com a tripulação, sã e salva, a Alcochete. A fé desses barqueiros consolidouse e como reconhecimento passaram a ir em procissão ao monte da Atalaia, oferecer à Virgem uma bandeira e a miniatura do seu barco. Aparentemente sem ligação directa ao sentimento votivo, a bola morena e adocicada a que deram o nome de Fogaça, acabou por surgir como bolo emblemático associado à romaria da Virgem da Atalaia.

E mais esta… A prima mais afastada da nossa Fogaça, é a Focaccia, uma italiana de reminiscências genovesas, que acabou por se disseminar um pouco por toda a Itália. Para além do nome (assume-se étim) pouco mais tem a ver com a nossa fogaça. Trata-se de uma espécie de bola, achatada e macia, em geral coberta com sal grosso, azeite e alecrim; mas também aceita carnes de conserva, por exemplo. Na Itália é usualmente consumida como aperitivo ou acompanhamento de entradas de refeição.


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