ROYALMAG #1ST YEAR - #1ST ISSUE - JUNE 2013
HOT HITS LENA DUNHAM E SUAS MENINAS
WOW A PRIMEIRA VEZ QUE VIMOS REGINA GUERREIRO
INTERVIEW LUCAS BRÊDA ALAGOANO, MINEIRO E AGORA PAULISTA
NOVOS RUMOS PARA ONDE IRÁ A BALENCIAGA SEM NICOLAS?
EDITORIAL
NOVO COMEÇO N
ossas ambições nunca foram grandes. Julia e eu sempre tivemos em mente um projeto sem pretensão nenhuma, e hoje, olha só, a gente está lançando uma revista. Não poderia estar me sentindo mais realizado nesse momento. Depois de tantos anos de blog, finalmente, vamos poder passar tudo isso para uma plataforma mais profissional e especializada. Espero que a ROYALMAG seja uma experiência para você - leitor que nos acompanhou e apoiou até chegarmos aqui - tão boa quanto foi para gente. Nessa edição, um perfil amigável de Lucas Brêda, nosso colega de sala. Também teremos uma discussão acerca dos novos rumos tomados pela Balenciaga. Você também descobrirá como foi conhecer a Regina Guerreiro em carne, osso e veneno. Boa edição! o
ESPECIAL
BEM-VINDOS À
MUDANÇA por Pedro Camargo
A
cima, Balenciaga. Uma das principais marcas (se não a mais importante) da história da moda na França em três momentos. Na primeira foto, nas mãos do novo estilista Alexander Wang. Na segunda foto, com o predecessor Nicolas Ghesquiére. E a terceira, nas mãos do próprio “pai” da altacostura: Cristóbal Balenciaga. Tô mostrando tudo isso junto que é para vocês entenderem que a história da Balenciaga tem papel fundamental em determinar diretrizes e captar o espírito do tempo da moda como um todo. Lá com o Cristóbal, ela inaugurou belíssimamente o purismo na alta-costura. Inventou peças que são, hoje, fundamentais no guarda-roupa, e praticamente estabeleceu o que era a alta-costura propriamente dita. Até mesmo, educou estilistas notáveis como Hubert de Givenchy. Depois, muito depois, na verdade, vem o Nicolas Ghesquiére. Esse aí surpreendeu todo mundo. Conheceu, aprendeu e entendeu a história da casa de forma a seguir com a mesma
veia de inovação, bem como um respeito pela tradição da maison. Os desfiles da marca, na sua mão eram um desafio após o outro. Instigava os olhares dos editores de moda e dos apreciadores da marca mundo afora. Fazia questionamentos, impunha estéticas, tecia narrativas. Um trabalho imagético e tridimensional dos mais complexos já vistos na moda. Nicolas pertenceu a uma época em que o desfile tinha uma significação que, creio eu, está desaparecendo. Esta história de desafiar, instigar, tá ficando para trás. Sempre que eu estava vendo as imagens de um desfile da Balenciaga do Ghes-
quiére, as pessoas que não são tão chegadas a moda me perguntavam: “Mas quem é que vai usar isso?” “Nossa, que roupa esquisita!” “Não consigo entender o sentido disso”. Bom, o sentido era exatamente esse: encantar pela perplexidade. Você se depara com algo que transcende o vestir, transcende as funções óbvias da moda. Era algo como um espetáculo semiótico. A roupa construindo e desconstruindo símbolos, conceitos, preceitos, preconceitos, paradigmas... Bom, porééém, o que acontece é que essa imagem ultra-complexa, desenvolvida pelo Ghesquiére, não agradava muito o lado financeiro da marca, que hoje
pertence a um dos maiores conglomerados de moda do mundo. Esses conglomerados estão, obviamente e com razão, do lado do lucro. A distância entre a roupa que era desfilada e a roupa que ia para a loja era muito grande. Houston, we have a problem... Então surge uma solução! Diretamente da semana de moda mais comercial do circuito fashion aparece o queridinho da editora-chefe da principal revista de moda do mundo, e por consequência, de todas as suas seguidoras, ele: Alexander Wang. Clientela fiel, super jovem, sempre apontado como o grande prodígio da moda norte-americana.
Vamos à fórmula Wang de se fazer moda: “Despretenção” cool + Influência Sportswear + Uma remontagem do uso do preto pelos japonistas + Tratamento de Luxo = Roupas comerciais de desejo imediato fáceis de usar e de compreender, mas que, ainda assim, surpreendem, de certa forma, o olhar editorial. Ah é! Igual a dinheiro no bolso, também. Daí você para e pensa... Nossa, Paris está ficando cada vez mais parecida com NY. Talvez seja a hora da gente começar a olhar com mais carinho pra NY, será que não? Ou tá na hora de entender que as marcas de Paris estão grandes demais para apostarem em estilistas muito ou-
sados... Ao mesmo tempo, a semana de moda de Londres cresceu e amadureceu, de modo que os estilistas “moderninhos” se tornaram verdadeiramente modernos. Encontraram seu estilo e estão fazendo de Londres o novo spot da “inovação” visual em moda. Pelo menos eu sinto isso, é lógico que eu posso estar falando um monte de bobagem. Mas, repara nisso e depois vem conversar comigo, não quero me sentir tão sozinho... Bom, no fim das contas o que eu real-
mente queria dizer é: A moda está usando o desfile de forma muito mais realista. A passarela tá mais perto do guarda-roupa, e eu acredito que tenda a ficar cada vez mais próxima. Talvez o desfile se torne uma linguagem bem mais simplificada que todo mundo entenda. Com tanto desfile em livestream, tanto blogueiro ganhando influência tão grande quanto editores em veículos tradicionais, as coisas estão mudando. A moda vai mudar estruturalmente também. Eu acho o
WOW
O DIA EM QUE ENCONTREI
REGINA DE
GUERRA por Pedro Camargo
E
ra um dos meus primeiros dias em São Paulo. Tinha acabado de me mudar do interior do estado para a Metrópole, mas eu já estava na correria paulistana. Um milhão de coisas a fazer, sabe como é mudança, né? No meio desse turbilhão de coisas - móveis para trazer, eletrodomésticos para comprar, matrícula para fazer na faculdade, uma batelada de documentos pra organizar e uma rajada de urticária na minha pele por puro nervosismo - achei tempo, ou melhor, inventei tempo para ir a uma exposição. “Mas, que bela merda.” você, queridíssimo leitor, vai pensar. Bom, mantenha a calma. Não parei de fazer esse monte de coisas pra ver uma exposição qualquer. Descobri, assim, meio que sem querer, que o Museu da Casa Brasileira estava expondo uma série de vestidos da Glória Coelho - uma das minhas estilistas favoritas no Brasil, pela delicadeza do detalhe, pelo apuro estético, pela personalidade única. Poderia ir em qualquer outro dia. Fui naquele. A razão era a seguinte: Regina Guerreiro - meu deus, a Regina Guerreiro! - guiaria uma visita à exposição para 15 pessoas. Eu fui a décima sexta a me inscrever. Fiquei numa espécie de lista de espera. Mesmo assim, tentei a sorte... Peguei um ônibus e a única coisa que eu sabia sobre ele é que ele era amarelo. As palavras “Brigadeiro Faria Lima” ainda não faziam o menor sentido, mas era por ali que eu tinha que ficar. De algum jeito, eu consegui me encontrar e cheguei no museu. O horário: 14hrs. Tinha almoçado cedo para ir para lá. Foi uma loucura. Pelo menos, aos meus olhos recém-expostos
a grandiosidade de São Paulo, foi uma loucura. Quando cheguei, estava cansado e adiantado. Cheguei cedo para não deixar ninguém passar na minha frente. não podia perder aquela oportunidade de jeito nenhum. Quando ela chegou: palpitação. Para começar a Diaba não tinha metade da minha altura, e, mesmo assim, congelou os olhares ao entrar no recinto. Inteira de preto, maquiagem pesada e forte, como sempre. Alguns minutos se passaram, os visitantes se aglomeraram, o segurança fez o sinal e finalmente Regina nos guiou pela exposição. Em algum momento da visita, Regina contava dos anos 1970, por alguma razão que não lembro. De qualquer forma, ela dizia que naquela época, as pessoas iam montadas até na padaria. Vestirse não era brincadeira: “Não se pode ficar só no jeans e na camiseta, sabe como?” disse isso apontando para meu jeans e para minha camiseta. Porra, vou conhecer a Regina Guerreiro - meu deus! A Regina Guerreiro... - e esqueço de montar o melhor look do cosmos. Como pude dar uma dessa? Erro, erro, erro, erro, erro. Mas, sabe... Me senti um pouco como os estilistas que ela crítica, que sempre - dramaticamente - argumentam: “ Oh! Ela não sabe do tamanho do meu esforço para montar essa coleção” - no meu caso, troque “montar essa coleção” por simplesmente “chegar nesse museu”. Que bobagem! Foda-se o que eu passei: o resultado não foi bom e isso foi notado. Por isso que, apesar de um pouco constrangido, continuei amando Regina: ela não tem medo de ter uma posição e defendê-la, sincera e honestamente. Talvez isso seja ser um jornalista... Ou talvez não, mas pelo menos, eu acho mais verdadeiro ser assim como pessoa mesmo, “sabe como?”O
CULT PARA DE SER
CHATO P
rimeiro de tudo: não dá pra começar esse post sem pedir desculpas por ter demorado tanto pra postar coisa nova, então... Desculpa, tá? Demorei, mas voltei pra falar de coisa boa e não é de iogurteira toptherm. Vim pra falar de “O Lado Bom da Vida” (tradução bem babaca do título “Silver Linnings Playbook”). Olha aqui, você para de ser chato, pode ser? Chega de ficar falando: “Ah, mas é uma comédia romântica...”, ou então “Ah, nem é muito filme de oscar, né?”. Para com essas bobági, criança! Afoga essas críticas azedas e pseudo-intelectuais em algum lugar bem profundo e distante junto com o seu preconceito e vem assistir esse filme que é extremamente bem feito em vááááários aspectos. Para começar, tem o roteiro. Cara, eu sou encantado por essa coisa de pegar o clichê e reinventá-lo totalmente. É uma comédia romântica? Sim, pode se dizer que é. Pooooorém, uma comédia romântica com um fundo dramático, composta por personagens psicologicamente super bem construídos, e ridiculamente bem interpretados e óóótimos diálogos. Não é por menos que “O Lado Bom da Vida” conseguiu uma indicação para cada uma das categorias de atuação do Oscar.
Daí você vai me dizer: “Ah, mas a colega do Amour era muito mais bafo, sambava na cara da JLaw”. É, pode até ser... Mas a atuação dela no filme é sim muito muito marcante, não deve ser descartada ou desmerecida. A mesma coisa para o Bradley Cooper, meu deus... Quando eu ia imaginar que ele iria dar conta tão bem desse personagem? Foi divertido, cativante, emocional, dramático, psicótico... Gostei mesmo. Sem falar na família poderosíssima composta por Robert De Niro e Jacki Weaver. Vale a pena, gente. De verdade 0
RAZÕES PARA AMAR
T
alvez seja um amor incondicional a tudo que a HBO decide fazer em termos de séries. Foi assim com in Treatment, e é assim com Girls: vício. Acreditem nisso: simplesmente assisti todos os episódios da primeira temporada em um dia! Eu sei, talvez vocês digam “Ah, eu assisti o piloto e não gostei...”, CARA, assiste mais uns dois episódios, você vai se apaixonar eventualmente, sério. Não foi por menos que a série foi indicada a 5 prêmios no Golden Globes e levou dois: de melhor atriz em série de comédia ou musical (Lena Dunham - protagonista AND escritora da série) e melhor série de comédia, se não me engano... Essa aí de cima é - na vida real - uma belíssima escritora,
GIRLS
mas na série ela é Hannah, uma menina como qualquer outra. Uma menina quase de verdade. Também escritora, talvez nem tão bem sucedida... Na realidade, nada bem sucedida. Hannah tem vintee-tantos anos de idade e ainda é sustentada pelos pais até abruptamente eles decidem cortar a grana da garota e ela tem que se virar nos 30 pra conseguir continuar vivendo decentemente em NY junto com sua companheira de quarto, Marnie. Essa aí tem um namorado sufocante, um emprego até que legal e é uma puta amiga da Hannah. Depois tem a Shoshanna... Adooooro a Shosh. Virgem, cômica, robótica, e muuuito divertida! Por fim, tem a modernete sensual, Jessa. A trama corre super bem, sem graaandes desfechos (assim como
é a vida), com algumas situações engraçadas (assim como é a vida), e com dramas particulares mas ao mesmo tempo universais (assim como é a vida). Girls é, de certa forma, o grito desesperado de uma geração encurralada entre a juventude desvaiarada e as responsabilidades de ser fatalmente um adulto numa metrópole efervescente com uma cultura totalmente acelerada pelos meios de comunicação. Sim, estou apaixonado por essas meninas. Ah, e não venha reclamar da Lena aparecer pelada quase sempre... As pessoas ficam peladas eventualmente, ué? E é pra mostrar que, meu, tá acima do peso e tá linda e tá dando. Fica 01 beijo pro seu preconceito.o
THINKING
VIDARARE R
arefeito. [Do lat. rarefactu.] Adj. 1. Que se rarefaz. 2. Pouco denso. Eu nunca, mas nunca mesmo, gostei das aulas de física. Acho que ninguém, realmente, adooora física, mas sei lá, tava divagando sobre a vida e ‘pluft’, sem querer, ela me veio a cabeça. Boatos (boaaatos, hein?) que conforme a gente vai indo para um lugar com uma altitude maior o ar vai ficando menos denso. Sendo assim, vai ficando progressivamente mais difícil de respirar, compreende? “Por isso que os alpinistas tem que usar aquelas máscaras de oxigênio” diz o Wikipédia. Agora vou explicar a relação com meus devaneios... É o seguinte, a gente tá vivendo num estado de ansiedade crônica absoluta, sabe? Sei lá, eu pelo menos percebo isso claramente na maioria dos meus amigos. Tá tudo mundo tão preocupado com o que vai acontecer no futuro, e tão decepcionado com as condições do presente... Daí, acontece que nessa loucura de ficar se planejando a gente tá perdendo cada vez mais a proximidade com a realidade. A vida, meus queridos, é lógico, não tá fácil pra ninguém. Nós temos toneladas de coisas para fazer: faculdade, trabalho, metas, objetivos, desejos... Tanta coisa que a gente se perde, né? Quanto tempo a gente tem pra fazer da gente o que a gente é? Eu sinto que a gente tá que nem aquele alpinista em algum exercício no meio do caderno de física... Precisando de uma máscara para poder respirar e se manter vivo. Tomara que a vista do topo da montanha seja linda, porque se não for... Quanto esforço jogado fora, não é? Então, eu to adotando a seguinte estratégia: adaptação. Respira fundo e devagar, tenta absorver o máximo de oxigênio, mesmo que pouco denso ou rarefeito. To tentando olhar pra cada segundo do meu dia e vivê-lo, talvez não intensamente, mas honesta e verdadeiramente. Inspira. Expira. Inspira. Expira... o
EFEITA por Pedro Camargo
FICTION
N
COLDS
ão se sentia bem naquela manhã de domingo. As vibrações sonoras que atingiram seu corpo na noite passada pareciam, naquele momento, concentradas num esforço conjunto para fazer da sua cabeça o foco dos males de uma ressaca. Sentia náuseas e não vomitava por alguma razão maior do que ela. Talvez fosse por medo de machucar sua garganta dissipando a dor que estava feliz trabalhando em um só local. Talvez fosse por medo de demonstrar fragilidade para si mesma. Cícera tinha apenas uma certeza. Se não vomitava, era por medo de algo. Um agravante para essa situação era o fato de estar na casa de seus pais. A ideia era fazer uma visita para eles. Moravam na mesma cidade, mas em diferentes residências. Cícera morava com duas amigas e um recém-chegado garoto numa república na parte mais perigosa do centro da cidade. O que deixava seus pais, sua mãe em especial, extremamente preocupados. Mas, na família de Cícera, para expressar preocupação usava-se agressividade. “Quando é que essa síndrome de independência vai acabar, menina?” perguntava com frequência a exaltada matriarca, Cláudia à sua filha que sentia em cada sílaba da palavra síndrome uma pontada crescente de desafeto consumindo seu labirinto que a levava à desagradáveis tonturas. No dia anterior, depois de uma semana inteira de insistência perturbadora por parte de seus pais, Cícera cedeu e decidiu por bem que poderia passar aquele final de semana na casa de seus genitores. A casa deles ficava num condomínio de uma classe média que podia jurar ser classe alta. O AppleVillage era lotado de coisas absurdamente inúteis na concepção de Cícera. A primeira delas era o fato de existirem três tipos diferentes de saunas. “Para começar, quem é que se submete a ficar passando calor por vontade própria?” argumentava a jovem contra as visitas naquele jantar a luz de velas cediado pela falsidade passivo-agressiva de
sua mãe. Os convidados tinham reações diferentes àquela menina que usava shorts esportivos muito curtos que revelavam pernas assustadoramente magras e desinibidas, e um moletom bem pesado da sua faculdade suficientemente boa para uma menina que passou a vida inteira com os recursos e oportunidades de um pai cardiologista e uma mãe herdeira de algumas propriedades no interior do país. Uns sorriam e mostravam todos os dentes quando o faziam – o que para Cícera era um sinal claríssimo de mentira – e outros disfarçavam sua expressão facial de indignação tomando mais um gole de algum vinho relativamente caro nas largas e numerosas taças de cristal dos anfitriões. Cícera tinha um relacionamento muito melhor com seu pai, que mesmo não entendendo quase nunca o que se passava com ela, ele tentava, e isso era suficiente para ser, de certa forma, o preferido. Diferentemente do comportamento invasivo de Cláudia, Henrique era distante e perfeito. Porque a distância é claramente capaz de gerar apreciação. O não conhecer era, muitas vezes, uma alternativa muito mais interessante a Cícera do que a aproximação. Intimidade era quase um tabu. Nunca gostou de dividir seus dilemas com os outros, talvez até quisesse fazer isso, mas sempre achou que ninguém gostaria de ajuda-la, ou que as pessoas tinham mais o que fazer do que ouvir as lamúrias de uma garota insípida. O jantar já tinha quase se encerrado. Alguns amigos mais próximos dos pais de Cícera tinham ficado e até tentaram entrar na cozinha para ajudar com a voluptuosa louça. Essa tentativa por parte das visitas deixava Cláudia muito apreensiva por várias razões. Estariam eles lavando a louça de maneira correta? Por um acaso não tem algo de extremamente deselegante em deixar uma visita ajudar com a limpeza? Por isso, enquanto ela tentava veementemente levar os visitantes à desistência, deu, sem querer, a oportunidade que Cícera
SKIN esperou a noite toda. “Estaremos no DaHaus às duas da manhã, conseguimos entrada VIP: ninguém paga e não temos que esperar na fila, não é maravilhoso?” informava a mensagem em SMS que com um estrondoso apito agudo avisava Cícera do paradeiro de suas amigas de infância que há alguns meses não via. Displicentemente olhou para o grande espelho da sala onde estava e percebeu o quão inadequada era a maneira que estava vestida. Isso não a incomodou pessoalmente, mas sabia que as amigas ficariam um pouco chocadas com a coragem ou a preguiça de não se arrumar direito e sair assim. A relação com o guarda-roupa também não era boa. Se achava magra e pequena demais, observava atentamente as suas duas únicas opções de vestidos. Cinco minutos de concentração absoluta para, por fim, chegar a uma decisão aleatória. “Minha mãe mandou eu escolher esse daqui, mas como eu sou teimosa...” e escolheu. O vestido nada mais era que um camisetão preto bordado com lantejoulas douradas escassas e baratas. O sapato não tinha dúvidas porque só um deles tinha salto. Por mais que tivesse praticamente esquecido da existência dessas antigas amigas por alguns meses, a ocasião pedia o sofrimento de um calcanhar inocente. Batendo o salto com força no chão, porque era a única maneira que conseguia andar com ele, Cícera atravessou o corredor com os olhos fechados desejando conscientemente que sua mãe não percebesse, mas inconscientemente talvez desejasse o contrário. Talvez quisesse que sua saída fosse entendida como uma agressão indireta a Cláudia. Cláudia percebeu, e ao invés de ter a reação costumeira de exageradamente dramatizar a saída de sua filha, engoliu a seco o soco psicológico mas rebateu com o chute que o seu silêncio representava. Decepcionou o inconsciente de Cícera. Para conseguir silenciar-se Cláudia começou a
por Pedro Camargo
pensar. Em geral, quando essas divagações eram permitidas ao seu intelecto, ela se prendia a passar horas pensando como a vida podia ser e não foi, ou como a vida seria se ela tivesse feito alguma coisa de diferente no passado. Ela não admitia para si mesma, mas acreditava em um efeito borboleta meio sem sentido. Talvez se ela não tivesse passado manteiga e sim margarina no pão integral que comeu na manhã do dia 25 de janeiro de 1984, sua filha hoje teria longos cabelos lustrosos e agiria como uma verdadeira dama. Cláudia não se considerava machista, porque ninguém se considera machista. Sua filha a alertava, ou melhor, a insultava com uma frequência alarmante e pela primeira vez, ela pensou sobre isso. Cícera também tinha criado um genuíno ódio por todas as coisas frívolas que agradavam sua mãe. Claúdia pensou sobre isso também. Quando o motor do carro que esperava sua filha na porta de casa roncou, ela iniciou uma sessão masoquista de pensamentos. Tentou lembrar de cada coisa que endurecia o relacionamento com sua filha, pensou no seu casamento congelado e rotineiro, pensou na vida profissional que não decolava exatamente por se doar demais à família... Pensou, e se arrependeu. O amargor do café da manhã de domingo se misturou ao amargor de dentro da boca de Cícera. Quieta, já esperava os comentários ácidos de sua mãe sobre seu comportamento, mas eles não vieram. Ela estranhou e abocanhou, ainda muda, um pedaço do delicado bolo que Cláudia havia comprado bem cedo na padaria mais próxima do condomínio. A mãe, por sua vez, tomava um suco de laranja feito na hora com duas colheres de chá de açúcar. Tomou exatamente três copos cheios de suco e não comeu absolutamente nada. Henrique fez perguntas superficiais sobre o dia anterior da filha que o respondeu na mesma superficialidade das suas questões. Era o segundo dia na casa dos Boaventura.O
FOTOGRAFIA
AOS OLHOS DE
IEDAMARIA Mais um amigo, mais uma história. A Ieda é minha amiga faz um tempão e há algum tempo brotou um interesse nela por fotografia. Pesquisa de lá, estuda daqui, participa de um grupo ali, monta um flickr, compra uma câmera, e Tah-dah: surge uma fotógrafa com muito talento. A produção pequena - porém suuuper legal da Ieda
- mistura um pouco de fotografia de rua (que eu adoro) com algumas fotos mais montadas, em geral num classudíssimo preto e branco. Não deixa de passar o flickr dela pra conferir o trabalho como um todo, tem muita coisa bonita! Aqui no blog ficam as minhas preferidas: as mais darks e fantasiosas... Adoro!O
por Pedro Camargo
FOTOGRAFIA
PERFIL
LUCAS
BRÊDA I
nexplicavelmente, nesse dia, o urso que reside no estômago do nosso queridíssimo perfilado, Lucas Brêda, no dia de nossa entrevista - acredito eu - estava adormecido. Digo isso porque ele preferiu que o entrevistássemos antes do almoço e não depois... Quase um milagre, tendo em vista esse menino que come pratos cuja comparação com o monte Everest não pode ser mais realista. E não engorda... Não é pra morrer de raiva? Apesar que ele está criando com carinho e amor uma nova barriguinha que é a piada da turma. Mas, ainda assim, magro. Saímos da aula e fomos para uma das salas isoladas para estudo em grupo da biblioteca. Lógico, pra fazer tudo, menos estudar, como sempre. Testamos o gravador e sem nenhuma preparação prévia, nenhuma pergunta premeditada, zero script, começamos a entrevista. É que, na realidade, o intuito era exatamente esse: deixar registrado que qualquer conversa babaca com Brêda (chamamos ele pelo sobrenome devido a superpopulação de Lucas na faculdade) pode e, provavelmente, será muito divertida.O
PERFIL
P
ara puxar assunto do jeito mais idiota possível, perguntei se hipoteticamente ele estivesse perdido numa ilha deserta e fosse obrigado a levar dois discos, quais seriam... “Vish, que coisa difícil, mas com certeza seria um álbum duplo porque tem mais musicas e com certeza seria ou The Wall [do Pink Floyd] ou White Album dos Beatles.” responde bem-humorado. A partir daqui você já pode perceber que música não é só brincadeira com ele, apesar do bom humor. Só pra você ter noção, escreve para sites grandes de música aqui no Brasil. Primeiro deles é o Rock’n’Beats que custou coragem e sem-vergonhice da parte do Brêda. “Eu entrei na cara dura, eu pensei (...) ‘não adianta eu começar um blog do zero, até porque quem vai ler é a minha mãe’ (...) Aí eu escolhi o Rock’n’Beats, foi o único que eu achei mais acessível” explica. Achou acessível? Tava se subestimando... Aliás, coisa corriqueira entre pessoas interessantes, elas se subestimam para você não se sentir tão inferior. Mas, o fato é: existe gente mais legal que você, só que é chato ficar esfregando na cara a todo momento. Não é por menos que o Brêda conseguiu emplacar um texto tamanho família no SCREAM & YELL. “Foi muito bom, o jornalista Bruno Capela, que eu admiro muito, leu
o texto, me seguiu no twitter, linkou o texto e ainda me elogiou! Isso foi demais... Acho que meu texto no Scream & Yell foi menos lido que no Rock’n’Beats, mas rola uma diferença de publico que - no caso do S&Y - é bem mais crítico e por isso fiquei muito feliz.” tá vendo? Agora, acontece que se a pessoa é toda trabalhada nas boas referências, só ouve boas músicas, só vê bons filmes, aaaii, que preguiça, né? “Eu tenho um puta de um guilty pleasure que é o Roupa Nova” confessa o queridinho provando a sua condição de ser humano. “Começou porque meu pai sempre ouvia (...) E um belo dia meu amigo esqueceu o DVD dele lá em casa e isso foi fatal.” Pra mergulhar ainda mais na escuridão, na infância rolou uma banda com amigos chamada... SAVAGERY! Eles tinham até nome fictício. “O meu era Luck Brandon”, depois dessa declaração foi difícil parar de rir. Trashêra oitentista em garagens despretensiosas... a.k.a. Diversão. Alagoano, mineiro e paulista. Em todas as redes sociais, essa é a sua bio. De alguma forma, essa vida em três lugares o influenciou muito. Ao mesmo tempo que teve experiências das crianças metropolitanas em Maceió, jogou muita bola e deu conta de aprender violão em Iturama em Minas Gerais. De alguma forma, essa vida em três lugares resultou num cara muito legal. Hoje ele tá em São Paulo... com a gente o