UMA ANTOLOGIA
15set a 16out / 2016 terça a domingo / 9h às 18h30
UMA ANTOLOGIA
curadoria
Wagner Barja
15set a 16out / 2016 terça a domingo / 9h às 18h30
curadoria
Wagner Barja
Coordenador do Museu Nacional da República/DF
Poucos artistas como Raul Córdula transmitem com sua arte o sentido da inquietude. O impacto produzido por suas obras estremece os alicerces do poder. Na linha de frente da arte política no Brasil, outra voz vinda da Paraíba “desafina o coro dos contentes”. Solta a pantera na sua crítica ao sistema. Confronta com ele, ao lançar mão da sua artilharia de longo alcance e grande força expressiva.
Desde a década de 1960, em constante evolução, atento a crise do mundo contemporâneo, esse inconformista faz ressoar sua palavra/imagem, na obra certeira, impulsionada pelo conflito. O objetivo: atingir alvos – ideologias autoritárias.
Retirar do cotidiano a matéria prima para a construir o castelo da resistência fez de Córdula um bastião estético do Nordeste. A mistura do poeta visual, com a cultura plural da região fez dele o renitente ativista, que navega em brumas poéticas para entender o mundo através do seu ofício.
De afiado vocabulário plástico ungido na narrativa entre o irônico e o icônico, o artista refaz símbolos. Arte não só para ser olhada, mas para olhar e encarar o mundo nos olhos.
Híbrida e metafórica, a obra executada no pendão da Paraíba inspira comentários: NEGO –transformado em EGO, para além do jogo com a inscrição na bandeira rubro – negra: a denúncia da farsa no embate sócio–cultural entre indivíduo e Estado. Nesse ruído em oposição, a negação dentro da negação em manifesto, numa constante reflexão sobre a natureza humana e o poder.
Ao contrário da simples ilustração, a fala subjetiva derivada dessa imagem leva–nos a perceber a indução metalinguística, que paira na estridente oratória das formas contraditórias. Ora EGO... ora NEGO... ora RE – VERSO, Raul faz seu caminho pelo IN VERSO. Ele não leu a bula da obediência. Se leu, não seguiu. Viveu a desobediência de uma geração revolucionária, no enfrentamento da escuridão das Ditaduras.
Em sua ímpar trajetória, a clara noção das rupturas históricas e os seus reflexos na urgência das linguagens. À espreita, em permanente estado de vigília, esse artista descontente ouve da sua trincheira, o som de vozes e imagens da adversidade.
O Museu Nacional apresenta a exposição RAUL CÓRDULA – UMA ANTOLOGIA, em oportuno momento da carreira do artista. ��
Bandeira do Ego
Díptico – Lâmina de chumbo e tela 2005 ∙ 100 x 230 cm
Não só para ser olhada. Mas para provocar sentidos. Não só dada a politizar, mas de mergulhar no humano.
Wagner BarjaBrigada da Hora
Pintura coletiva sobre o que restou do antigo edifício do Cine Duarte Coelho no Bairro do Varadouro de Olinda.
Trabalho proposto em reunião que criou a BRIGADA DA HORA, em homenagem ao escultor pernambucano Abelardo da Hora e espaço de manifestações e reflexões sobre o atual momento político. Integram no primeiro momento a BRIGADA DA HORA os artistas em grande parte grafiteiros, Amélia Couto, Antônio Paes, Cecília Araújo, Demétrio Albuquerque, Felipe Niero, França Bonzio, João Lin, Kátia Fujita, Lucila Falcão, Manoel Quirino, Nando ZV, Raoni Assis, Raul Córdula, Sheila Oliveira e Vinícius Leso.
2016 ∙ 1.000 x 150 cm
João e Anayde
Acrílica e cartão sobre tela
2005 ∙ 70 x 90 cm
Abismando–se, interrogando–se, reinscrevendo–se na paisagem zero além da mimese figurativa e do imaginário abstracionista, a escritura na tela–texto–instauração continua apostando na janela aberta das concreções além e aquém das dualidades.
Jomard Muniz de BritoGrafite
Pintura acrílica e fotografia 2012 ∙ 100 x 330 cm
Córdula pôde, assim, criar uma linguagem própria, numa situação descentrada. Fora do centro ao quadrado: distante dos grandes centros de produção – Rio de Janeiro e São Paulo – e distante do centro de gravidade da cultural local. Sua arte é na origem, literalmente, excêntrica.
Paulo Sérgio DuarteProposta para um céu triangular 5
Impressão
1985 versão 2016
O azul escorregou na meleca
Díptico – Acrílica sobre tela 2012 ∙ 100 x 200 cm
Mesopotâmia
Acrílica sobre adaflex 2010 ∙ 115 x 120 cm
Os quadros de Raul Córdula são paisagens do mundo.Marcus Lontra
Mesopotâmia
Acrílica sobre tela 2001 ∙ 80 x 120 cm
Procura no muro a indicação para o registro: não estará escrito ali “abaixo a ditadura”?
Antônio Dias
Mesopotâmia
Mista
2003 ∙ 80 x 120 cm
O hábitat sempre teve um papel muito importante naprodução de Raul, tendo como ponto de partida grafites nos muros de sua cidade natal...
Tereza ArrudaMemórias nada vaidosamente secretas e já redefinidas por ele mesmo, talvez o melhor intérprete de suas concepções, relendo–se em diálogo com os outros e outras, afins e até dissonantes.
Jomard Muniz de BritoEstêncil e acrílica sobre papel 2010 ∙ 150 x 500 cm
Proposta para um céu triangular 1
Díptico – Acrílica sobre tela
1985 ∙ 120 x 160 cm
A sequência de linhas que nasce na mente de Raul, atravessa seus dedos e chega até o papel, nada mais é do que a base de seu ofício com as geometrias.
Olívia MíndeloProposta para um céu triangular 2
Tinta acrílica e pigmento natural sobre tela 1985 ∙ 180 x 90 cm
Proposta para um céu triangular 3
Tinta acrílica sobre tela
2001 ∙ 120 x 80 cm
Mesmo levando-se em conta a excelente qualidade pictórica, a arte de Raul está mais vinculada a uma poesia visual do que a uma pintura geométrica.
Risoleta CórdulaProposta para um céu triangular 4
Díptico – Acrílica sobre tela 2001 ∙ 120 x 160 cm
(...) Raul Córdula, a sua firmeza, a fidelidade a si próprio, a fé intacta, nos estimula e sustenta. Tenho grande admiração pelo artista que continua a ser ele mesmo, haja o que houver.
José CláudioAcrílica sobre papel
2012 ∙ 150 x 450 cm
Araguaia“Vai ser gauche na vida”, Raul Córdula!Joana D´arc Lima
Pedro e Paulo
Díptico – Acrílica sobre tela
2002 ∙ 120 x 160 cm
Leque aberto e fechado para os hermetismos que nos apavoram e deliciam. Fecundas contradições da lei do desejo no corpo mutante dessas e outras instaurações.
Jomard Muniz de BritoPedro e Paulo
x 180 cm
(...) Raul Córdula, ao pontuar que a “escrita é em si desenho”, faznos perceber como se processa o uso da imagem da palavra na materialidade plasmática de sua obra, em cuja estrutura vê-se que tais ícones descrevem e delineiam a complexidade de seu pensamento...
Sidney Azevedo Díptico – Acrílica sobre tela 2002 ∙ 120Córdula desenvolve uma poética sumamente permissiva do ponto de vista da interdiscursividade, por tratar de temas icônicos não só plástica e politicamente, como também no âmbito das traduções intersemióticas, incorporando em suas obras expressões e ações que traduzem a ironia das convenções históricas e desmascaram os discursos do poder, estabelecidos ideologicamente.
Sidney AzevedoProposta para um céu triangular 6
Impressão
1985 versão 2016
Sidney Azevedo
Mestre em história, crítica e processos de criação em artes visuais. UFPB-UFPE.
Raul Córdula Filho, artista plástico paraibano nascido em 1943 na cidade de Campina Grande, está radicado em Olinda, Pernambuco. Ele se dedica às artes visuais há mais de meio século. Sua obra é constituída por um importante conjunto de trabalhos em suportes diversos, com características do abstracionismo geométrico, do grafismo e da nova figuração brasileira, demarcados pela utilização de linhas, figuras, massas pictóricas, palavras e frases, bem como por trabalhos colaborativos. Desenvolvendo ademais várias atividades no universo das artes visuais, sendo ao mesmo tempo pintor, artista gráfico, cenógrafo, professor, crítico de arte e ativista cultural.
A relação de Raul Córdula com a palavra se estabelece desde o início de suas atividades culturais. Ao pontuar em sua fala que a “escrita é em si desenho”, Raul faz-nos perceber como se processa o uso da imagem da palavra na materialidade plasmática de sua obra, em cuja estrutura vê-se que tais ícones descrevem e delineiam a complexidade de seu pensamento, sinalizado e figurado nestas transmutações semióticas, ocorridas nos processos de hibridização e através dos meios materiais que concretizam as ideias do artista, estabelecendo uma rede inteligível de imagens ambíguas na elaboração de sua poética; subvertendo a ordem simbólica pré-estabelecida nos níveis convencionais das imagens sobre as quais investe.
Deste modo vemos que ele opera, no núcleo mesmo de seu processo criativo, alterações nos sentidos imediatos dos signos gráficos dos quais se apropria como um todo, em elaborações pelas quais condensa suas memórias e seus posicionamentos políticos, expandindo os sentidos dialógicos daqueles signos;
Borborema
Serigrafia
2002 ∙ 50 x 70 cm
(...) a produção estética de Raul Córdula guarda o esboço de sua própria vida, onde o artista se debruça e mergulha em suas memórias e em seu imaginário, permeados de simbolismo coletivo, devaneios e ideologias.
Sidney Azevedoenunciando a potência interdiscursiva destes procedimentos na atualização das inúmeras instâncias relacionais, tanto no nível das palavras, quanto no estágio visual da obra acabada, posta na membrana do mundo da experiência sensório-conceitual coletiva.
O artista se instaura, portanto, no sistema polifônico da cultura contemporânea da imagem, através do fenômeno social da interação verbal; revelando-nos, em seus enunciados, a complexidade de sua idiossincrasia externada em seus discursos estéticos.
Compreendemos assim que Raul Córdula reconhece a arte como um campo dialógico próprio da civilização histórica, ou seja, como grandeza de sentido no contexto da invenção da escrita e seus desdobramentos, da antiguidade até os dias atuais, onde a arte torna-se um ponto de convergência de infinitos discursos.
O artista apresenta-nos, ao longo de sua prolífica carreira, um desenvolvimento intersemiótico amplo e profundo, uma vez que os sujeitos e as falas, bem como os sentidos e os significados interdiscursivos veiculados través de seu trabalho, são condições recíprocas na instituição do dialogismo evidenciado no conjunto de sua obra. Desse modo, ele propicia-nos um mergulho nas imagens que essas memórias evocam a partir do exercício dialógico com outros falantes, tanto visíveis quanto invisíveis, através dos quais o artista potencializa o exercício intensivo da palavra, desde sua ideia nuclear seminal até a concretude da imagem refletida no espelho ideológico que ela representa em sua função de signo.
Percebemos, portanto, que esse processo intersubjetivo torna-se um instrumento autocrítico atualizado no pensamento e nas ações do artista, uma vez que o mesmo traz à tona, desde seu universo “particular”, um imenso cabedal de imagens vinculadas às suas atividades colaborativas e interativas com o meio social em que ele circula e atua efetivamente, revelando-nos as lucubrações do sujeito enquanto editor de sua própria história, num movimento transformador do artista em objeto de sua auto-reflexão.
É importante percebermos também que o processo criativo imbricado na elaboração da obra de Córdula está sedimentado na autoconsciência que o caracteriza e no domínio técnico que ele tem sobre as relações dialógicas estabelecidas com a alteridade, a partir dos contextos espaciais (institucionais, geográficos) e temporais (contextuais e históricos), refletidos em seu trabalho.
Visitando sua biografia, constatamos que Raul Córdula é um artista comumente afeito à interlocução, aos trabalhos colaborativos e à transmutação intersemiótica, quando hibridiza em suas obras signos oriundos de regimes de distintas linguagens. Vemos isto fundamentado desde suas primeiras incursões nos movimentos artísticos de vanguarda da década de 1960. Ele nos diz que:
Coincide com este momento no Nordeste o surgimento de associações e grupos também interessados na modernida-
Borborema
Granito e chapa de acrílico 2015 ∙ 30 x 30 x 60 cm
É sabido que na Serra da Borborema, como em outras serras, se contam histórias. Velhas lendas, longos e tecidos mitos, princesas encantadas e desencantadas por heróis.
Jerusa Pires Ferreirade, e numa produção de arte com linguagem dirigida às questões sociais. (CÓRDULA, 2009, p. 38 e 41).
Seu interesse pelas “questões sociais” da arte revela-nos uma necessidade de congregação com o outro, de envolvimento não apenas com o objeto estético, mas com o homem ético; com o ente que frui e se relaciona com os conteúdos das obras, tornando-se parte conceitual e dialógica da mesma, na esfera permissiva da arte que se abre à volição do fruidor.
Deste modo, Córdula celebra seu ímpeto de explorar profundamente os múltipos significados das linguagens que fluem por baixo dos signos gráficos e pictóricos dos quais se vale em sua verve.
A densidade do meio artístico em que Córdula está imerso, afeito à crítica de arte, é um terreno essencialmente dialógico, o que nos faz pensar, necessariamente, sua produção plástica enquanto interdiscurso proferido e plasmado por um artista crítico, embasado não apenas em questões estéticas, mas também pautado em auto-reflexões de cunho filosófico e ideológico, entendendo estas reflexões como indícios da dimensão expandida que caracteriza a ambiência da arte contemporânea, onde podemos ver englobada, objetivamente, a reflexão sobre a produção artística no tangente ao contexto temporal da obra, ao espaço que ela ocupa e às transformações políticas, sociais e econômicas em que esta se insere.
Deste modo, Córdula desenvolve uma poética sumamente permissiva e iconoclasta, ao tratar de temas icônicos não só plástica e politicamente, como também no âmbito ideológico das traduções intersemióticas, incorporando em suas obras expressões e ações que expressam a ironia das convenções históricas e desmascaramos sistemas do poder estabelecido sub-repticiamente.
Desta forma, entendemos que o dialogismo fomentado em seus trabalhos, através do sintagma “obra de arte”, parece-nos ser a porção incontinente e reverberante que torna sua verve uma fala pluralizada na ágora da consciência simultânea do mesmo e do outro; envolvendo tanto a crítica quanto o público nos sentidos plurilaterais de suas obras postas no mundo, desde os recônditos de foro íntimo aos espaços de fruição de grande circulação e visibilidade.
A imersão na obra de Raul Córdula revelou-nos, portanto, as metamorfoses semânticas e epistemológicas nas quais tanto o artista quanto sua poética, e o fruidor da obra, mesclam-se numa instigante relação dialógica, transitando em vias de múltiplos sentidos interdiscursivos, visto que é neste entremeio que a pertinência da obra do artista se estabelece. ��
CÓRDULA. Raul. Memórias do olhar. João Pessoa: Linha d’água, 2009.
DURAND, Gilbert. As estruturas antropológicas do imaginário. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
GOMES. Diógenes Chaves (organizador). Núcleo de arte contemporânea/Nac. Rio de Janeiro: Funarte, 2004.
MINDÊLO, Olívia. Raul Córdula
50 anos de arte uma ontologia.
Recife: Ministério da Cultura, 2012.
LUCENA, Iveraldo. ALMANAC. Campina Grande: Grafset LTDA, 1979-1980.
MINDÊLO, Olívia. Raul Córdula
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SALLES, Cecília Almeida. Crítica genética – Fundamentos dos estudos genéticos sobre o processo de criação artística. São Paulo. EDUC Editora da PUC-SP, 2008.
TASSINARI, Alberto. O espaço moderno. São Paulo: Cosac Naify Edições, 2001
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