Barão do Rio Branco: diplomacia para a grandeza do país

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PE R S O N A G E M

Barão do Rio Branco

Diplomacia

grandeza do País para a

Estadista por excelência, historiador e pesquisador incansável, escritor nato, diplomata de tom maior. Por meio de sua excepcional habilidade negociadora, o Barão do Rio Branco resolveu problemas seculares e acrescentou mais de 900 mil quilômetros quadrados ao mapa do Brasil. Sem lutas e com imensos proveitos para o futuro do país. por Ricardo Schaefer

“Ele, apontando para o mapa do Brasil, poderá repetir a frase de Tácito diante das planícies de Roma – eis o meu poema”. Com essa frase, Getúlio Vargas descreveu um dos principais resultados da existência exitosa do Barão do Rio Branco. Sem recorrer às armas, o nosso diplomata maior conseguiu anexar ao Brasil uma área superior ao território de países como a Alemanha, o Japão, a Itália ou a Colômbia. Trabalhador infatigável, pesquisador arguto, escritor virtuoso, estrategista notável, Rio Branco foi responsável por um novo conceito de chancelaria no Brasil, e suas conquistas foram decisivas para o desenho final dos

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limites territoriais nacionais. José Maria da Silva Paranhos Júnior nasceu no Rio de Janeiro, em 20 de abril de 1845. Primogênito de uma prole de quatro irmãos e quatro irmãs, cresceu inebriado pela diplomacia e pela retórica. Filho do Visconde do Rio Branco, grande estadista e negociador do fim da Guerra do Paraguai, vivenciou de perto os discursos, o trabalho e as vitórias diplomáticas do pai. Cursou o Colégio Pedro II, estudou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco e graduou-se bacharel pela Faculdade de Recife. Após ter se formado, passou mais de dois anos na Europa, retornando ao Brasil

em 1869. A partir de então, desempenhou atividades profissionais diversas, como professor de corografia e de história do Brasil, promotor público de Nova Friburgo, e jornalista e diretor do periódico A Nação, no Rio de Janeiro. Rio Branco viajou com o pai para diversas missões diplomáticas. Em 1869, como secretário da Missão Especial, acompanhou o Visconde ao rio da Prata e ao Paraguai. Exerceu a mesma função em 1870 e 1871, nas negociações de paz entre os membros da Tríplice Aliança e o Paraguai. Em 1876, assumiu o cargo de cônsulgeral do Brasil em Liverpool, na Inglaterra,


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Barão do Rio Branco

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grandeza do País para a

Estadista por excelência, historiador e pesquisador incansável, escritor nato, diplomata de tom maior. Por meio de sua excepcional habilidade negociadora, o Barão do Rio Branco resolveu problemas seculares e acrescentou mais de 900 mil quilômetros quadrados ao mapa do Brasil. Sem lutas e com imensos proveitos para o futuro do país. por Ricardo Schaefer

“Ele, apontando para o mapa do Brasil, poderá repetir a frase de Tácito diante das planícies de Roma – eis o meu poema”. Com essa frase, Getúlio Vargas descreveu um dos principais resultados da existência exitosa do Barão do Rio Branco. Sem recorrer às armas, o nosso diplomata maior conseguiu anexar ao Brasil uma área superior ao território de países como a Alemanha, o Japão, a Itália ou a Colômbia. Trabalhador infatigável, pesquisador arguto, escritor virtuoso, estrategista notável, Rio Branco foi responsável por um novo conceito de chancelaria no Brasil, e suas conquistas foram decisivas para o desenho final dos

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limites territoriais nacionais. José Maria da Silva Paranhos Júnior nasceu no Rio de Janeiro, em 20 de abril de 1845. Primogênito de uma prole de quatro irmãos e quatro irmãs, cresceu inebriado pela diplomacia e pela retórica. Filho do Visconde do Rio Branco, grande estadista e negociador do fim da Guerra do Paraguai, vivenciou de perto os discursos, o trabalho e as vitórias diplomáticas do pai. Cursou o Colégio Pedro II, estudou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco e graduou-se bacharel pela Faculdade de Recife. Após ter se formado, passou mais de dois anos na Europa, retornando ao Brasil

em 1869. A partir de então, desempenhou atividades profissionais diversas, como professor de corografia e de história do Brasil, promotor público de Nova Friburgo, e jornalista e diretor do periódico A Nação, no Rio de Janeiro. Rio Branco viajou com o pai para diversas missões diplomáticas. Em 1869, como secretário da Missão Especial, acompanhou o Visconde ao rio da Prata e ao Paraguai. Exerceu a mesma função em 1870 e 1871, nas negociações de paz entre os membros da Tríplice Aliança e o Paraguai. Em 1876, assumiu o cargo de cônsulgeral do Brasil em Liverpool, na Inglaterra,


O Barão do Rio Branco - Carlos de Servi Óleo sobre tela, 81 x 60 cm


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permanecendo por 26 anos fora do país. Neste período, teve a oportunidade de presidir a delegação brasileira na Exposição de São Petersburgo, realizada na Rússia em 1884. Para a ocasião, elaborou Uma Memória sobre o Brasil, um dos mais importantes documentos da história da chancelaria brasileira. Após a Proclamação da República, já com o título de Barão do Rio Branco, foi nomeado superintendente-geral da emigração para o Brasil na Europa, cargo que exerceu entre 1891 e 1893. Nos anos seguintes, tornou-se o personagem central do processo diplomático que culminou com os contornos definitivos do mapa do Brasil. Em 1893, assumiu as negociações com a Argentina na disputa pelo território das Missões, localizado no oeste do Paraná e de Santa Catarina. A questão estava submetida ao arbitramento do presidente norte-americano Grover Cleveland. Rio Branco, advogando o ponto de vista brasileiro, produziu uma documentação valiosa em seis volumes – A questão de limites entre o Brasil e a República Argentina –, fundamental

“Se hoje o povo brasileiro pode viver em paz com seus dez vizinhos na América do Sul, se nossas fronteiras são motivo de aproximação e não de repulsa dos países contíguos, isso se deve, em maior parte, à obra de Rio Branco.”

para que o laudo arbitral proveniente de Washington fosse inteiramente favorável às pretensões brasileiras. Cinco anos depois, foi encarregado de resolver outro importante assunto diplomático – a questão do Amapá, área que a França pretendia anexar à Guiana Francesa. Em 1898, em Berna, expôs em sete volumes os argumentos para a anexação definitiva da região ao território brasileiro. No ano seguinte, o governo

suíço, mediador da questão, deu parecer favorável ao Brasil. Após estas conquistas, Rio Branco foi nomeado ministro plenipotenciário em Berlim, e o seu nome foi colocado em plano de superioridade em relação a qualquer outro político ou estadista brasileiro da época.

INTELIGÊNCIA A SERVIÇO DA CHANCELARIA “Barão foi um vencedor por excelência, tardio se quiserem, mas certeiro e infalível. Uma vez descoberto o caminho do sucesso, dele nunca mais se desviou”, escreveu o diplomata Rubens Ricupero em um texto para o livro Barão do Rio Branco: uma biografia fotográfica. Após seus êxitos diplomáticos na região das Missões e no Amapá, Rio Branco foi convidado pelo presidente Rodrigues Alves, em 1902, para assumir a pasta das Relações Exteriores, na qual permaneceu até a sua morte, em 1912. Logo no início da sua gestão, defrontouse com a disputa pela posse do Acre, território fronteiriço que a Bolívia almejava ocupar. O chanceler resolveu a questão de

Visita do Presidente eleito da Argentina, Roque Saenz Peña, junto ao Presidente Nilo Peçanha, na Praia do Flamengo, em 1910.

Rio Branco e o seu ilustre hóspede, o presidente argentino Julio Roca, a caminho de Petrópolis


de aproximação e não de repulsa dos países contíguos, isso se deve, em maior parte, à obra de Rio Branco”, acrescenta. Além da solução das questões fronteiriças, o chanceler encetou os fundamentos de uma nova política internacional, adaptada às necessidades do Brasil moderno. Entre os seus vários triunfos, estão a criação da Embaixada Brasileira nos Estados Unidos (1905); a obtenção do primeiro Cardinalato sul-americano para o Brasil (1905); a realização da 3a Conferência Internacional Americana no Rio de Janeiro (1906); e o êxito na Conferência de Paz de Haia, por

“Rio Branco fez o mapa definitivo do Brasil e resolveu problemas seculares, traçando a linha que em vão tentaram traçar papas, reis e imperadores.”

meio da brilhante representação de Rui Barbosa (1907).

PAIXÃO PELO CONHECIMENTO E PELO TRABALHO “O traço mais constante da vida de Rio Branco, pode-se dizer, sem exagero, foi o seu amor ao Brasil”, escreveu Aluizio Napoleão na biografia O Segundo Rio Branco. “Procurando rememorar as fases mais decisivas da existência de Rio Branco, iremos encontrar nele, desde os bancos escolares, desde o Pedro II e atravessando a Academia de São Paulo e a Faculdade de Direito de Recife, a necessidade de abarcar o Brasil pelo conhecimento que a história facultava”, complementou o autor. Sua faina de historiador perdurou por toda a vida e foi na Europa, fonte da nossa cultura, que Rio Branco encontrou o maior terreno para cultivar a sua paixão. “Quiseram as circunstâncias que o Barão do Rio Branco passasse na Europa os melhores anos de sua estudiosa mocidade. E foi isso uma felicidade para ele e para o Brasil”, escreveu Eduardo Prado, reproduzido no

Fundação Bibl

forma amigável por meio do Tratado de Petrópolis, assinado em 1903, garantindo ao Brasil 191 mil quilômetros quadrados. A seguir, deu início a negociações com outros países limítrofes, cujas fronteiras com o Brasil suscitavam questões litigiosas. Durante apenas seis anos – e sem qualquer recurso às armas –, costurou importantes e memoráveis tratados com o Equador (1904), com a Guiana Holandesa (1906), com a Colômbia (1907), com o Peru (1904 e 1909) e com a Argentina (1910). Ergueu como bandeira das reivindicações o princípio do uti possidetis solis, segundo o qual tem direito ao território quem o possui, dirimindo, assim, antigas disputas nacionais com quase todos os países sul-americanos. “É dele o trunfo de ter conduzido a política externa brasileira em um de seus momentos de maior intensidade criativa, quando se exigia uma combinação cuidadosa de sensibilidade política e sentido de futuro”, diz o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o chanceler. “Se hoje o povo brasileiro pode viver em paz com seus dez vizinhos na América do Sul, se nossas fronteiras são, no presente, motivo

Assinatura do Tratado de Petrópolis com a Bolívia, em 1903, que resolveu a questão do Acre e assegurou ao Brasil 191 mil km2


livro Rio Branco, de Afonso de Carvalho. “Os gregos iam estudar no Egito, berço de sua civilização; os colonos gregos iam a Atenas, para onde foram mais tarde os romanos; assim como os homens da Renascença iam a Roma. Como podem os americanos deixar de vir beber a ciência à Europa?”, continuou o escritor, membro fundador da Academia Brasileira de Letras, que foi amigo próximo do Barão. Durante sua estadia no continente europeu, produziu várias obras. Além de Uma memória sobre o Brasil para a exposição de São Petersburgo, publicou Efemérides Brasileiras; redigiu Esquisse de l’Histoire du Brésil para o livro Le Brésil, de Sant’Anna Nery; e contribui com textos para a seção relativa ao Brasil da Grande Encyclopédie, de Levasseur. “Todo esse labor visava a um objetivo: a divulgação das nossas coisas, o conhecimento do nosso país. À Inglaterra haviam sido reservadas 40 páginas de La Grande Encylopédie, e Rio Branco, emendando e acrescentando, conseguiu que o artigo sobre o Brasil chegasse a ocupar 51 páginas” descreveu Aluizio Napoleão. Além da inclinação para a história, o Barão possuía uma grande habilidade para a produção textual. “Toda essa massa enorme de mapas, manuscritos, crônicas, ou livros que teve ao seu dispor, graças a um grande e paciente trabalho anterior, seria todavia inútil, sem as suas raras qualidades de expositor e de escritor”, mencionou Alcindo Guanabara, também membro fundador da Academia Brasileira de Letras, em À Memória do Barão do Rio Branco. Guanabara expõe que o êxito obtido nas questões das Missões e da Guiana Francesa foi possível graças à personalidade poliédrica do Barão do Rio Branco. “Certamente, a erudição forneceu-lhe o material, o diplomata aparou e neutralizou os golpes do adversário, mas eles seriam

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Gonipil e imp. Bussod-Valadou e Cie

PERSONAGEM

José Maria da Silva Paranhos Júnior, aos 43 anos, quando recebeu o título de Barão do Rio Branco

incapazes de arrebatar a vitória, se no momento preciso não interviesse o escritor primoroso, capaz de um grande espírito de síntese, de uma admirável precisão, de uma inexcedível clareza e de uma concisão invejável”, descreveu o escritor. Rio Branco foi também presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e membro da Academia Brasileira de Letras. Ao defender qualquer interesse brasileiro que dependesse do seu esforço pessoal, era do feitio de Rio Branco o devotamento completo à causa. Quando se envolvia com uma questão que reputava importante, trabalhava incansavelmente, deixando em segundo plano outros interesses. “O Barão orgulhava-se de dormir muito pouco, sem prejuízo da sua saúde. Afirma o seu filho, Raul do Rio Branco, que, por três vezes, quando das questões das Missões e Amapá, Rio Branco permaneceu em sua mesa de trabalho quatro noites e quatro dias seguidos”, escreveu Afonso de Carvalho na biografia do Rio Branco. A paixão pela própria nação, a grande erudição, a destreza na comunicação e o devotamento ao ofício eram complementados por seu tino para questões

“Esse futuro levava-o a confiar na sua pátria que vira sempre grande, gloriosa e respeitada no cenário do mundo, e os vindouros haveriam de vê-la, maior ainda do que a vemos, como uma das mais poderosas, adiantadas e influentes da humanidade.”

Pasta para documentos com as iniciais entrelaçadas de Rio Branco

estratégicas. Rio Branco possuía “um senso realista pouco comum, que era a razão fundamental dos seus sucessos. Ninguém melhor do que ele empregou essa tendência instintiva, esse faro aguçado, que o fazia divisar e prever os acontecimentos, como demonstra o seu trabalho diplomático, nos pleitos das Missões e do Amapá e, mais tarde, na questão do Acre. O tato aí revelado, ao lado da obra realizada, demonstra as suas aptidões para a carreira que abraçara tão ardentemente”, comentou Aluizio Napoleão.


BRASIL: GRANDE, INFLUENTE E RESPEITADO Rio Branco foi o homem público de maior prestígio do seu tempo. Depois das vitórias em Washington e Berna, o diplomata não parou de ser aplaudido no país. “Como nenhum brasileiro, com raras individualidades humanas, ele encantou e cativou a donna mobile por excelência – a popularidade. Ninguém no Brasil, nem José Bonifácio, o patriarca, nem Feijó, nem Caxias, nem Osório, nem D. Pedro II, nem os próceres do abolicionismo e da República, ninguém angariou tamanha, tão constante, tão duradoura estima popular”, discursou o Conde de Afonso Celso em sessão solene da Academia Brasileira de Letras, em 1917. “Rio Branco fez o mapa definitivo do Brasil e resolveu problemas seculares, traçando a linha que em vão tentaram traçar papas, reis e imperadores”, declarou o deputado Argentino Roca, filho do ex-presidente Júlio Roca, no Parlamento Argentino, por ocasião da morte do chanceler. Em tudo o que fez, Rio Branco esforçou-se para elevar o nome do Brasil. O lema que escolheu, ainda em sua mocidade, para constar em seu ex libris foi Ubique Patriae Memor, que significa “em qualquer lugar, terei sempre a Pátria em minha lembrança”. Essa legenda, que hoje está nas medalhas da Ordem de Rio Branco, condecoração oferecida pelo Ministério das Relações Exteriores, foi vivamente praticada pelo diplomata estadista cuja trajetória significou a concretização do “tudo pela pátria”. Rio Branco é considerado o patrono da diplomacia brasileira. “O fim de sua vida”, revelou Eduardo Prado, descrevendo a existência do Barão, “foi conhecer o Brasil, no seu solo, nos seus produtos, no seu céu, nas suas raças, na sua vida no passado, nas condições de sua existência no presente e na sua capacidade de crescimento e de grandeza no futuro”. O pensamento e a obra de Rio Branco não foram concebidos somente para a sua época. Atravessaram os anos para viverem ainda hoje na consciência do Brasil contemporâneo e, talvez mais ainda, nas aspirações do grande Brasil dos próximos tempos. “Esse futuro”, completou Aluizio Napoleão, “levava-o a confiar na sua pátria que vira sempre grande, gloriosa e respeitada no cenário do mundo, e que havia de continuar a ser o teatro de ações e acontecimentos dignos de figurar com honra nas páginas da História, e os vindouros haveriam de vê-la, dentro dos seus limites presentes, maior ainda do que a vemos, como uma das mais poderosas, adiantadas e influentes da humanidade”.


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