Edição 04 Revista Litere-se - 2018

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Escritores nesta edição Alan Salgueiro Becca Roberto Carlos Carvalho César Manzolillo Djane Fernandes Kelly Lima Lívia Maria C. Sousa Manuela Sena Vitória Machado

Capa ilustrada por Mayara Barros NEWS MAGAZINE

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EDITORIAL

Estamos de volta!!! Olá amigos leitores e escritores! Estamos de volta! E cheios de saudades e novidades para novas edições! Uma das novidades você já verá na capa, que a partir de agora para cada edição lançaremos um concurso para selecionar a ilustração que dará brilho à edição nova! Além de poder ter seu texto aqui, agora também há espaço para ilustradores mostrarem sua arte! E não paramos por aí, ao longo das edições você verá muita coisa nova e um conteúdo mais específico a partir da próxima edição. Você busca mais artigos informativos e dicas que te ajudarão na sua carreira de escritor? Então esse será o lugar que vai te ajudar a tirar dúvidas e descobrir um mundo de possibilidades! Aprecie essa edição sem moderação e aguarde já a próxima que virá recheada de novidades. Bem-vindo de volta!

Perla de Castro Editora Chefe

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HISTÓRIA DA ESTÓRIA

Por Raquel Rasinhas

Olá leitores famintos. Voltamos com a História da Estória e nessa edição vamos falar da festa que para o Brasil e, por que não dizer, o mundo. Carnaval! Já vimos a literatura desfilar nos carros alegóricos, fantasia, bloquinhos de rua, samba enredo que emociona e trazendo grandes nomes da literatura nacional em esculturas gigantescas atravessando o Sambódromo da Marquês de Sapucaí. Mas e quanto ao carnaval na literatura? Ele já apareceu em algum livro? Teve alguma influencia significativa na literatura nacional ou internacional? Vamos do princípio.

Existe uma variedade enorme de livros falando sobre o carnaval, sua história, grandes nomes que tornaram a festa o que ela é hoje e detalhes antes desconhecidos. Nossa literatura também é rica na descrição do Carnaval brasileiro, que foi citado por diversos autores. Em 1919 o autor Manuel Bandeira publicou a coletânea Carnaval, que reunia poemas escritos entre 1918 e o ano da publicação. Um desses textos é Bacanal, cujo título alude à permissividade do período festivo e também a uma suposta origem da festa: as celebrações em homenagem ao deus Baco.

O carnaval não é uma criação brasileira, na verdade a festa remonta à Antiguidade, tanto na Mesopotâmia quanto na Grécia e em Roma. A história do carnaval no Brasil iniciou-se no período colonial. Uma das primeiras manifestações carnavalescas foi o entrudo, uma festa de origem portuguesa que na colônia era praticada pelos escravos.

Quero beber! cantar asneiras No esto brutal das bebedeiras Que tudo emborca e faz um caco… Evoé Baco! Lá se me parte a alma levada no torvelim da mascarada, A gargalhar um doudo assomo… Evoé Momo!

Depois surgiram os cordões e ranchos, as festas de salão, os corsos e as escolas de samba. Afoxés, frevos e maracatus também passaram a fazer parte da tradição cultural carnavalesca brasileira. Marchinhas, sambas e outros gêneros musicais também foram incorporados à maior manifestação cultural do Brasil.era praticada pelos escravos. NEWS MAGAZINE

Lacem-na toda, multicolores, As serpentinas dos amores, Cobras de lívios venenos… Evoé Vênus! Se perguntarem: Que mais queres, Além de versos e mulheres?… – Vinhos!… o vinho que é meu fraco!… Evoé Baco! 6


O alfange rútilo da lua, Por degolar a nuca nua Que me alucina e que eu não domo!… Evoé Momo! A lira etérea, a grande Lira!… Por que eu extático desfira Em seu louvor versos obscenos, Evoé Vênus! (BANDEIRA, 2001, p. 29-30) Aníbal Machado publicou o conto A morte da porta-estandarte, Jorge Amado com seu primeiro romance O país do Carnaval trazia para a literatura brasileira a descrição de uma das principais festas do país. O livro foi considerado subversivo pelo Estado Novo e os exemplares, queimados em praça pública. Em Dona Flor e seus dois maridos Amado usa a festa novamente; dessa vez, para caracterizar Vadinho, o primeiro marido da protagonista, aquele que morrera na festa do Momo.

um crime hediondo, uma fantasia cheia de magia ou para o misterioso que envolve o sobrenatural. Não há limites para a imaginação e o carnaval torna tudo ainda mais incrível com seus mistérios, fantasias e mascaras. Chegamos ao final de mais uma jornada, hoje demos uma volta no bloco de carnaval da Litere-se. Espero ter ajudado a acabar com qualquer dúvidas ou pré conceito sobre essa festa tão enraizada na nossa cultura e inspirados vocês a mergulharem de cabeça na possibilidade de mais uma tela para seus textos. Nos vemos na próxima edição da Litere-se.

O cenário da literatura mundial também se rendeu a festa brasileira, bom exemplo disso vem da famosa Saga Crepúsculo da autora Stephenie Meyer, onde os protagonistas Bella e Edward passam pelo Rio de Janeiro em sua lua de mel em pleno carnaval carioca. Claro, como não pode faltar, no wattpad os novos escritores estão usando e abusando do Carnaval marcando presença na nossa literatura e mostrando que pode sim ser um perfeito plano de fundo para um romance erótico ou baunilha, NEWS MAGAZINE

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“Bolinhos de sangue”.

Provavelmente, você já tenha lido ou ouvido falar sobre Hannibal, Dexter ou Norman Bates. Seus filmes, seriados e livros. Todos esses não passam de ficção, inspirações de casos ou fatos reais que aconteceram em alguma época. Mas que geraram algum tipo de medo nas pessoas. E na vida real? Quem são esses assassinos em série que provocam tanto medo quanto um livro ou filme de terror? E a “Saponificadora de Correggio”, como ficou conhecida, é uma dessas realidades macabras. Leonarda Cianciulli nascida filha de um suposto estupro em 14 de novembro de 1893, Montella, Itália, teve uma infância conturbada com a mãe cheia de ódio. Também tentou suicídio duas vezes durante sua adolescência. Leonarda era uma pessoa supersticiosa e um terremoto, em 1930, destruiu sua casa aumentando sua cisma. Nessa época, ela vivia com Rafaelle Passardi, um atendente de registros civis, com que se casou em 1917 para poder sair da casa dos pais que não aprovaram esse casamento, que acabou sendo preso em 1927 por fraude. E sua superstição a levou a procurar uma vidente, que revelou uma sinistra previsão: perderia todos os seus filhos antes da sua própria morte.

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Mas não parou por aí sua cisma e foi buscar ajuda de uma cigana que revelou algo ainda mais sombrio para seu destino: na mão direita, a cigana leu a sua prisão e na esquerda um manicômio. E as previsões vieram a se cumprir! A italiana engravidou 17 vezes! Três por abortos espontâneos e os outros foram morrendo ao poucos antes da adolescência. Restaram apenas quatro e disposta a mudar a sua má sorte chegou a procurar cartomantes, mas todas revelavam o mesmo destino: não importava quantos filhos tivesse, nenhum sobreviveria por muito tempo. Foi daí que os assassinatos começaram.

E entre 1939 e 1940, matou três mulheres e ficou marcada como uma das assassinas em série mais macabras da história do país por transformar seus corpos em sabão. Faustina Setti, foi a primeira vítima. Com uma promessa falsa de conseguir um bom marido, Leonarda lhe deu vinho com sonífero e a matou com uma única machadada. Depois a esquartejou em nove partes “Eu joguei os pedaços em uma panela, acrescentei sete quilos de soda cáustica, que eu tinha comprado para fazer sabão, e misturei tudo até que os pedaços se dissolvessem em uma pasta escura, que coloquei em vários baldes e despejei em um tanque séptico próximo”, disse a assassina em depoimento. E ela continua: “Quanto ao sangue na bacia, esperei coagular, sequei no forno,desidratei e misturei

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formando uma massa. Fiz muitos bolos que servi às mulheres que iam me visitar, e Giuseppe(filho de Leonarda) e eu também os comemos.” Leonarda só voltaria a matar dez meses depois. Sua segunda vítima, morta em 5 de setembro de 1940, foi Francesca Clementina Soavi. E dois meses depois, em 30 de novembro de 1940, foi Virginia Cacioppo. Ambas acabaram na panela. Leonarda acabou descoberta por causa da irmã da sua terceira vítima que avisou a policia do desaparecimento e acabou presa junto com o filho, Giuseppe. A assassina foi julgada e condenada a 3 anos num hospital psiquiátrico e 30 anos em regime fechado. (PHOTO) Após receber o veredicto e de que seu filho fora inocentado das acusações, Leonarda é possuída por uma felicidade assombrosa, e apesar da sua idade,parecia uma garota, pulando feito uma mola e gritando: “Deus seja louvado! Bendito seja Deus! Viva a Lei! Povo de Reggio, me perdoem e eu perdoo.” E se joga nos braços do filho. Giuseppe chora. O que poucos sabem é que a razão de Leonarda ter assassinado três mulheres, foi para que pudesse fazer um ritual que quebraria de vez a suposta maldição que a sua mãe havia lhe rogado. A Saponificadora acreditava que só assim garantiria a sobrevivência dos seus filhos. “Eu não matei por ódio ou ganância, mas apenas pelo amor de mãe.” Leonarda Cianciulli.

Ela nunca cumpriu sua pena em regime fechado, permanecendo até sua morte, em 15 de Outubro de 1970, no hospital psiquiátrico de Aversa, aos 78 anos.

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Recortes por Diego Guerra

Roupa do Varal Menino! Vai recolher a roupa do varal. A chuva está por vir para desfazer os dias ensolarados; os seus sonhos tornar retalhos e encharcar a sua alma de ácido gelado. Não espere as cinzas nuvens se formarem, arrebatando o céu, pois talvez, seja tarde para recolher os prendedores e puxar os panos. Esconda da água a tua morada e apresente prontidão quando ela arriscar teus bens. Corra, meu bem. Corra! As roupas não te esperarão muito tempo, elas estão a molhar. Decompor. Compondo a tua inglória. Feliz você será ao ver a gota cair com sua roupa segura.

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DICAS E REGRAS

com Beatriz Castro Olá leitores! Hoje vim conversar sobre algo diferente: regras, existem na literatura? De vez em quando eu venho aqui dar umas dicas do que eu, e mais algumas pessoas do meio, vivencio que devem ou não ser feitas em relação à escrita, sempre deixando bem claro quando isso é apenas meu ponto de vista ou se tem algum embasamento maior. Entretanto, vira e mexe vemos circular por aí listinhas, manuais e outras coisas do que se deve ou não fazer em relação à escrita. Seriam eles proveitosos? Vamos lá. Antes de mais nada, não quero dizer com esse texto que todo e qualquer manual deve ser descartado, muito pelo contrário, tanto cursos quanto textos propriamente ditos podem ajudar muito a quem está começando ou quem já escreve há algum tempo, o que devemos sempre ter em mente, entretanto, é o filtro. . O que seria o filtro? Ele não vale apenas para literatura, mas sim para toda e qualquer informação que nos é enviada. Se não paramos para pensar se aquilo se encaixa ou não como o que vemos como verdade ou o que serve para nós, seremos apenas robôs, imitando mecanicamente os outros. Não podemos deixar de lembrar que literatura é uma arte, ela passa pela criatividade e não pode se prender a moldes fixos ou então teríamos apenas o mesmo estilo de história repetida em todos os livros que lemos. Regras e dicas servem para que olhemos para ela e nos perguntemos: “isso se aplica a mim e aos meus textos?” Olhe com calma, seja humilde e se responda. Se sim, ótimo! Você aprendeu algo e eu sempre digo que devemos estudar para os nossos textos. Caso não, abstraia e siga em frente.

Temos que levar em consideração que “regras” às vezes funcionam em uma língua e em outra não, então talvez a dica que seu escritor favorito deu funcione muito bem na língua inglesa, mas não seja tão bem aplicada em português. Além disso, o gosto pessoal também varia demais. Há quem diga que prólogos são perda de tempo, outros acham que é bom dar uma espiada no que pode acontecer no texto (eu por exemplo adoro quando é um pedaço do meio do texto posto antes, mas detesto quando é uma explicação interminável de páginas e páginas, mas vai que alguém gosta?). Para encurtar a história, vamos para uma dica (siga-a se quiser!): leia com atenção e humildade todas as críticas positivas, listas de dicas, ideias e tudo mais, mas não deixe de se lembrar que você é um artista, que cada obra é única e que não existe jeito errado (a não ser que você fira o direito do outro, sendo preconceituoso, incitando violência ou comportamentos errados) de se fazer arte. Use seu filtro. Por hoje é só, gente! Vejo vocês na próxima coluna!

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O lado agridoce da poesia por Luanna Mello

(PHOTO) Cativeiro Sangue amargo no chão, Sangue maldito aí dentro. Lágrimas de tormento do lado de fora, Culpa reprimida aí dentro. Tantas vítimas silenciadas lá fora... Tanto buraco rangendo de dor Tantas sobreviventes clamando por amor. Droga Que droga foi essa que você injetou em mim? Me torturando dessa maneira, Fazendo com que me sinta culpada por não te ter aqui.

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MÁSCARAS

Por Lisi de Castro Caí na folia, dancei, cantei, bebi... Ri da barriga doer, saí em tantos blocos que nem sei! Fiz amigos que pareciam ser de longa data. Muitas fantasias, alegria, folia! Mas chegou a quarta-feira de cinzas. Tudo voltou a ser como antes... A labuta constante, amigos distantes, ninguém se importando com ninguém. Só ordens e gritos do patrão, aquele canastrão! Cinzas viraram meus dias. O cimento da construção, o asfalto quente, eu derretendo dentro de um terno que parece uma armadura com toda essa quentura! Cinzas também eram minhas contas que nunca chegam ao final. Minha casa sem cor, sem graça, sem gente... Só um ser deprimente. Chegou o final de semana, o telefone não toca, tantos na lista para quê? Cada um vivendo sua vida... Resolvi olhar as fotos tiradas no Carnaval e depois de três meses que fui olhar, deu vontade de chorar, aquele não parecia eu... Rodeado de felicidade, vários amigos, uma alegria tão intensa! Me olho agora. Um ser amargurado por não ter um amor ao lado. Todos os dias poderiam ser Carnaval para eu viver afinal... Porque nesses outros dias... Só cinzas.

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QUEM É O MAIOR ESCRITOR DE TODOS OS TEMPOS?

Por Igor Portelada

Pergunta tal que assola a humanidade desde as raízes da mais primitiva literatura. Mesmo na antiga Grécia, onde não haviam produções literárias em tamanha intensidade como hoje em dia, ainda existiam concursos entre as tragédias, para saber qual dramaturgo seria o melhor. Vale lembrar que Sófocles venceu vários desses concursos. Se há 3 mil anos atrás já existia essa dúvida, de quem seria o expoente maior da arte das palavras, com o incrível número de escritores que desenvolveu-se desde então, a pergunta reverbera sempre com mais potência. É certo que isso é algo relativo, na universidade é comum encontrar, por exemplo, aqueles que defendem que Machado de Assis é o maior e melhor escritor que já surgiu no Brasil, pessoalmente, tive um professor que atacava essa ideia veementemente e afirmava com similar veemência que o maior escritor do Brasil, talvez até do mundo, é o poeta sertanejo Patativa do Assaré. Então, de adianto, podemos afirmar que essa é uma questão relativa, varia de pessoa para pessoa, pois varia de gosto para gosto. No entanto, podemos analisar a qualidade das obras, seu teor literário, e mesmo imaginar as dificuldades que foram enfrentadas pelos autores para construí-las. Pois bem, separemos por gênero literário: poesia, prosa e teatro. Sem duvidas o teatro é o mais simples de se ter um nome a ser lembrado, pois apesar de grandes nomes como o já citado Sófocles, Molière, Gil Vicente e Goethe, o inglês William Shakespeare rouba a cena, e pelas palavras de T.S Elliot, é junto com Dante, o fundador da modernidade tal qual a conhecemos.

Na poesia a disputa já não é tão fácil, temos muitos nomes que não poderiam ficar de fora do posto de maior poeta de todos os tempos. Dante e Petrarca são muito citados pelos teóricos da literatura, como sendo os expoentes maiores da poesia, obviamente também aberto a discussão, mas observando do ponto de vista desses teóricos, vemos que a forma mais conhecida de poesia, o soneto tal qual o conhecemos, dois

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quartetos e dois tercetos (apesar de existirem outras modalidades), é a forma mais usada na história para a confecção poética, e o italiano Francesco Petrarca é seu fundador.Dante Alighieri rompe com as fronteiras da literatura, e atinge o ser humano em seus mais diversos níveis de conhecimento. A obra-prima da literatura universal, Divina Comédia, possui influência mesmo nas crenças religiosas que refletem ainda a visão do poeta há 800 anos atrás. Toda a sua conceituação de inferno, purgatório, expiação de pecados, representa ainda a base de muitas religiões, além de na época, ter sido bastante explorada pela igreja católica para o seu domínio medieval. Chegamos então em uma questão ainda mais delicada, pois concerne não apenas opiniões literárias, mas crenças, e todas as crenças devem ser sublimemente respeitadas. Se na poesia a polêmica é grande, na prosa a situação fica ainda mais complicada: quantos romances, contos e crônicas não são incríveis o suficiente para cativar pessoas dos mais diversos ângulos da sociedade, gerando diferentes nomes para o que seria o número 1 desse gênero? Edgar Allan Poe, o famoso escritor estadunidense fundou as ainda hoje presentes, correntes sociais como o gótico dentre outras que seguem costumes de vestimentas negras, e apegação às trevas. Quem nunca teve contato com a frase “Então disse o corvo: nunca mais”. O quase que refrão do famosíssimo conto de Poe “O Corvo”. Há ainda quem afirme que por exemplo, A Terceira Margem do Rio, de Guimarães Rosa, é tão incrivelmente elaborado que poderia mesmo ser classificado como poema. Stendhal, Flaubert, Victor Hugo, Balzac, Camus, erguem a bandeira da França na batalha dos escritores, e merecem ter nomes mencionados em tal disputa. Machado de Assis, Clarice Lispector, Guimarães Rosa erguem a bandeira brasileira, (dentre muitos outros que são fenomenais). A lista é imensa. Felizmente, a literatura é muito bem doada de incríveis gênios que doaram seus conhecimentos para a humanidade, e obviamente, jamais teremos um único nome, uma única pessoa, que seja soberana em uma arte tão complexa e bela!

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O VELHO CAOLHO

Por Elves Boteri

As Kenningar

Muita gente tem dificuldades compreensíveis em acreditar que, um dia, seres humanos realmente acreditaram (e acreditam) em deuses como Thor, Odin ou Loki - mas nossos ancestrais eram ainda mais estranhos que pareciam. Foi dos versos elaborados cerca de mil anos atrás pelos habitantes dessa região (da Islândia, mais precisamente) que surgiu o que Jorge Luís Borges chama de "Uma das mais frias aberrações que as histórias literárias registram": as Kenningar. Até aproximadamente o ano 1000, os thulir, bardos "repetidores anônimos" cantavam versos pela islândia, as histórias de guerras e glórias das nações guerreiras - provavelmente melhor ouvidas numa taverna na qual todo e qualquer objeto é feito de madeira bem rústica, menos as espadas. Mas nessa época, surgiram os skalds, poetas que produziam ao invés de só repetir versos consagrados. Claro, graças à dificuldade de registro, quase nada que cantavam permaneceu, mas restou o suficiente para que se pudesse saber da existência das Kenningar. Essa técnica que os skalds trouxeram bagunçou bastante as coisas. Vou explicar da maneira mais simples possível: Os skalds partiam de determinadas metáforas tradicionais; por exemplo, a palavra "escudo" podia ser referida como "teto do combate"; a palavra "combate" podia ser substituída por "canção de lanças"; e a palavra "lança", por "dragão dos cadáveres". Até aí tudo bem; mas o problema é que começaram a "metakenningar", a fazer essa operação em cima dela mesma; digamos que em algum momento, dissesse "teto da canção de dragões dos cadáveres": você precisaria (enquanto ouve, já que praticamente não havia escrita na época) perceber que "dragões dos cadáveres" são as lanças, "canção de dragões" é o combate, e "teto do combate" é o escudo, e portanto essa bagunça toda significa simplesmente: "escudo".

É fato que as kenningar, de início, não eram uma técnica tão complexa, mas seu uso repetido e sobre si mesmas as deixou cada vez mais complexas, a ponto de torná-las incompreensíveis. Isso é recorrente na literatura: vários movimentos literários foram se tornando tão complexos e incompreensíveis que acabaram se matando por abusar das próprias técnicas. Há muitas grandes obras da literatura mundial que é difícil culpar alguém por não ler - claro, não estou dizendo que isso tira o valor da obra; várias dessas obras originaram filosofias, nos trouxeram novas maneiras de ver o mundo e a linguagem. Mas é inegável que assim elas se isolam, e se afastam da maioria dos leitores. A vocês, Leitores deste Velho Caolho, lhes apresento algumas Kenningar: Sacudidor do freio: o cavalo, Roedor de elmos: a espada, Avermelhador do bico do corvo: o guerreiro, Tingidor de espadas: o guerreiro, Distribuidor de tesouros: o rei, Distribuidor de espadas: o rei, Força do arco: o braço, Perdição das árvores: o fogo, País dos anéis de ouro: a mão, Árvore de assento: o banco, Teto do combate: o escudo. Saga de Grettir: “O aniquilador da prole dos gigantes Quebrou o forte bisão da pradaria da gaivota. Assim os deuses, enquanto o guardião do sino se lamentava, De pouco valeu o rei dos gregos Ao cavalo que corre por recifes”.

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Alan Salgueiro Nas margens do meu travesseiro Aos olhos do Céu Os guardas-chuvas São cogumelos que nos protegem Aos olhos do chão Atando-se plenos à multidão Abrem-se imensos como antenas Aos olhos da rua Naves que flutuam E relam nas testas Na água que propagam Aos olhos do céu Um pingo de gente E a estrela cadente São a chuva andante Quem dera eu pudesse contê-la Como um para-quedas, umbrella Tomado por um devaneio Pra que ela corresse descalça Das linhas dos versos que alaga Pras margens do meu travesseiro NEWS MAGAZINE

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Iariny Carvalho

A loba

(Ou a pequena história de uma libertação)

Como naquele Van Gogh azul de estrelas, era o céu daquela noite. Uma noite quente como todas as outras noites. Acontece que a lua cheia havia entrado em escorpião. Mas ela não sabia disso. Apenas olhava o céu de Vincent pela janela da cozinha, fatiando, monótona, os legumes enquanto a água borbulhava dentro da panela, o macarrão lembrando finíssimas vísceras esbranquiçadas de algum animalzinho estripado. Naquele ambiente de calmaria – a luz amarelo-pálido iluminando todo o ambiente, os azulejos brancos, imaculados, os utensílios, todos eles, dispostos em seus devidos lugares – ela caminhava de um lado a outro. Lenta. Passos firmes e um leve e lânguido movimento no quadril. Era seu jeito de caminhar. Mas naquela noite, com a lua em escorpião, os movimentos eram mais atenuados e havia uma certa sofisticação que não lhe totalmente natural. Com a faca firme, ela fatiava agora em grossos pedaços a carne vermelha, passavalhe algum tempero e levava-a ao forno. Lá fora, na pequena vila onde vivia, as crianças agitavam-se em sua algazarra natural. “Segura a bola! A bola! Chuta!” Os gritinhos estridentes dos meninos misturavam-se às cirandas das meninas e aos murmurinhos seguidos de altas gargalhadas das mulheres, todas acomodadas em suas cadeiras comentando esse ou aquele boato da vida alheia.

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Eram seis horas da noite e mesmo já sendo a Hora do Ângelus, ela não percebeu, não fazendo o sinal da cruz como era seu hábito. Na sala fracamente iluminada pela luz da cozinha, François Hardy cantava alguma coisa que ganhava mais força e ares de cântico ritualísticos na voz da mulher que cozinhava, distraída com o tec. tec. tec. da faca partindo novamente alguma outra hortaliça. E ela acompanhava François, mais para seu íntimo do que para aquele simples ato de cantar. Je ne sais pas pourquoi je reste dans um mer où je me noie. Je ne sais pas pourquoi je rest dans um air qui m´étouffera. Era sua prece cantada em notas mais ou menos desafinadas. Je ne sais pas pourquoi... O marido logo chegaria. O jantar já estaria pronto. Ela estaria vestida do jeito que ele aprovava. Do jeito que ele queria. Nova receita, aquela. Um sorriso discreto arqueava-se nos cantos de sua boca e seus pensamentos vagueavam como um viajante em terras mágicas de pedras e oceanos. Os legumes foram jogados com força para dentro da panela em um rápido movimento com a faca. O calor do vapor ruborizava sua pele mulata e dava-lhe um brilho que ela guardava sempre apenas para si mesma. No ombro direito, um hematoma destacavase como uma grande chaga. Exausta com o esforço de toda aquela sua dedicação superior a dos outros dias, ela enxugou a testa com as costas das mãos e deixou-se escorregar sobre uma cadeira da cozinha, a contemplar a imitação daquela noite estrelada da pintura. Ou seria o contrário? Impossível. “Tão em enquadrado assim na janela... Parece mesmo com a pintura.” Até então nenhuma outra daquelas pinturas maisque-vistas tinha algum sentido para ela, com todas aquelas mulheres tão brancas, gorduchas, nuas ou estranhamente vestidas dos pés à cabeça. . Ou aquelas manchas de tinta que pareciam feitas por criança ou um bêbado. Ela havia visto as pinturas de Van Gogh em um livro – e ela deixou repousar os olhos naquelas cores vivas; o azul profundo e o amarelo intenso daquelas flores - há muito tempo, na casa da avó, uma fugitiva dos tempos de guerra, cuja única posse real era a vida. Talvez nem isso. “Guerras são coisas tão feias...”, repetia sempre naquele seu sotaque arrastado. 17


Seus pensamentos rememoravam a infância, rápida, em momentos específicos, apenas. Suas lembranças não eram como narrativas completas. Fragmentos de memória. A imagem do marido sobrepunha-se às outras. Je ne sais pas pourquoi... Je ne sais pas pourquoi je reste... Logo o relógio marcaria sete horas e o marido chegaria com o ar cansado e exigente de minutos cada vez mais completos para si. Homenzinho egocêntrico, ele. Os vizinhos o olhavam torto e o cumprimentavam com um sorriso descorado. Ela despertaria de seu êxtase momentâneo, a comida estaria pronta, mudaria a roupa. Assim ela o fez. Olhara a lua ainda rapidamente. Grande e amarela, um grande olho felino. O calor da noite agora amenizara e uma brisa fria invadia a casa pela janela aberta. As estrelas pareciam maiores, mais próximas, mais cintilantes. II O jantar já estava disposto na mesa da pequena sala de jantar quando o marido chegara. François Hardy repetia as mesmas canções no rádio, e a mulher cantarolava baixinho. Je ne sais pas pourquoi je rest dans um air qui m´étouffera... Em silêncio, ele largou a pasta sobre a poltrona, tirou os sapatos e sentou-se à mesa. Parada à porta da cozinha ela contemplou a figura do marido por mais alguns instantes, em silêncio. A voz de Hardy parecia mais distante agora, como vinda de um mundo distante. Um mundo de pedras, espinhos e sonhos. Com seus passos lentos e movimentos lânguidos, ela retirou do forno a carne, colocando-a sobre a mesa. “Onde está a faca? Esses pedaços estão muito grandes”. Homenzinho exigente, ele.

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Ela, obediente, passiva, com seu sorriso tão discreto nos cantinhos da boca, escolhera a faca com o melhor fio entre todos os objetos sempre tão bem dispostos em seus devidos lugares. Cantando agora com mais força em seus pulmões, ela repetia. Je ne sais pas pourquoi je reste dans um mer où je me noie. Je ne sais pas pourquoi je rest dans um air qui m´étouffera. Tu es le sang de ma blessure. Afagara os cabelos crespos do marido, puxando levemente sua cabeça para trás. Na inclinação de um beijo, com mão firme, ela abriu um talho profundo na garganta dele. O sangue fugia-lhe com pressa pela boca e pelo corte enquanto ele tentava alcançá-la com as mãos enrijecidas de fúria e pavor. O sorriso dela alargara-se, exibindo os dentes alvos, todos iguaizinhos, emoldurados em seus lábios grossos e voluptuosos. Com passos ligeiros ela caminhou em direção à porta. Ao alcançar a rua, os passos tornaram-se mais largos. Mais largos e rápidos. Suas pernas perderam as proporções humanas, ficaram mais peludas. As costas arquearamse ao limite do chão. As orelhas, grandes e pontudas. E os dentes, antes de uma perfeição simétrica, grandes e afiadas presas caninas. Ela correu para a entrada da vila, esbarrando nas crianças até desparecer noite adentro. Renascida de suas próprias cinzas e ossos, ela correu livre para nunca mais deixar-se aprisionar.

Porque a lua cheia havia entrado em escorpião.

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Elisângela Medeiros Preparava o almoço, com pressa, pegou no freezer 1k de acém congelado. Amolou a faca, pegou a tábua de carne e começou a cortar em cubos, quando olhou, cortou o polegar na junção das falanges. Não sentiu dor. Tinha hanseníase. Dona Zeli e família, recém-chegados do Maranhão, mudaram-se para o Rio de Janeiro para tentar a sorte grande e melhores condições de vida. Instalaram-se em no município de Nova Iguaçu, terra dos laranjais, em uma casa grande, com dois quartos, um para ela e outro para sua irmã, cunhado e sobrinho pequeno. Toda 2ª feira, Dona Zeli, realizava o mesmo ritual. Pegava uma vela virgem, um copo de vidro e enchia o copo com água limpa. Acendia do lado de fora da casa e ao lado da vela colocava o copo com água. A luz da vela serviria para iluminar o caminho e a água era para purificar as almas. Ela fazia um pedido para as almas benditas do purgatório, que acenderia uma vela toda segunda-feira e em troca receberia proteção para a família e assim já se passavam 13 anos e a família permanecia em paz. Certa segunda-feira, para ser preciso, 13 de novembro de 1967, era uma noite chuvosa, ventava muito, quando isso ocorria, era certo de faltar luz. Seu cunhado sem saber acendeu todas as velas pela casa toda. Dona Zeli quando foi à caixa de velas e percebeu o ocorrido, apagou a vela que estava em maior tamanho e foi realizar seu ritual, mesmo na chuva. Levou fósforos e o copo com água. O vento forte a impedia de acender a vela. Tentou inúmeras vezes até que acabaram os fósforos da caixa. Pensou que seria em vão, já que mesmo que conseguisse o vento apagaria a vela, jogou a água fora e voltou para casa toda encharcada .

Trocou de roupa e já era hora de dormir, acendeu o alerta (inseticida em forma de espiral), que ao queimar lentamente, emanava um odor forte, que espantava os terríveis pernilongos que zumbiam o ouvido. Ventava tão forte que o vento parecia assoviar, (PHOTO) a janela de seu quarto era de madeira e tremia com a força do vento, a chuva forte batia na telha de zinco da varanda, o barulho se intensificava ao bater na chapa fina e frouxa que com o vento se desprendeu e ao bater na madeira parecia trovão. A casa era antiga, o telhado era coberto de telhas francesas, com pequenas frestas por onde passavam pingos de chuva, que respingavam o rosto e corpo de Dona Zeli, permitindo se refrescar naquela noite de verão sem ventilador. O sono vinha aos poucos e de longe bem fraquinho ouvia uma voz. Pensou que era sua irmã e seu cunhado conversando no quarto. A voz começou a ficar mais próxima, era uma voz fanha, anasalada, e repetia uma frase, que Dona Zeli não identificava o que era pronunciado, parecia vir do portão e consequentemente na porta da sala. A voz percorria o quintal, e chegou à janela do quarto de Zeli que ouviu perfeitamente: Acenda os seus cabelos, acenda os seus cabelos. Um arrepio percorreu o seu corpo dos pés a cabeça. Zeli sentiu frio, pegou o lençol e se cobriu. Dona Zeli não acreditava no que estava ouvindo, as almas pediram para ela acender os cabelos já que ela não acendeu a vela. A chuva teria o efeito de purificar o caminho. O cabelo acesso seria uma vela humana e sua vida serviria para pagar a promessa de 13 anos. A respiração de Dona Zeli começou a ficar ofegante. A voz que antes estava na janela de seu quarto agora estava na porta da cozinha e repetia a ordem: Acenda os seus cabelos. E

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quando Dona Zeli menos esperava a voz estava na porta de seu quarto. Dona Zeli se lembrou do terço que estava embaixo de seu travesseiro, se apegou ao terço e começou a rezar mentalmente frases que sua bisavó a ensinou. Tentava chamar sua irmã e cunhado e a voz não saia, estava presa em sua garganta. A foz fanha e rouca entrou no quarto, seu corpo estava congelado de medo, começou a sentir seu rosto e cabeça quente, temia que seus cabelos se incendiassem. Quando em um grito de fé e desespero conseguiu se desprender da cama, levantou e gritou: Mais do que Deus ninguém. Um clarão deu no quarto, a luz da casa toda voltou, a voz se calou. Seu cunhado e irmã vieram a ao seu encontro, ambos escutaram a voz e o grito de Dona Zeli e passaram o resto da madrugada em vigília unidos na sala da casa, rezando o terço até amanhecer. Cuidado com o pede e a quem se pede. Não se esqueça de que existem as almas benditas e as malditas, o bem e o mal.

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Becca Roberto Ela é Guerreira Ela... é linda. Ela é demais Faz tudo pra mostrar do que é capaz Não ouse nem tentar Ilusões Ela é capaz de destruir corações Ela... quer um grande amor Mas sempre se machucou Por isso quer tentar esquecer O último que a fez sofrer É... Se levantar depois de uma desilusão não é fácil Assim ela demonstrou Ela é guerreira, ela é ágil Capaz de enfrentar todos os medos Capaz de se preparar para tudo que pode acontecer.

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Becca Roberto Maracatu, jongo, capoeira - Resistência afro-brasileira Assim q a África aqui chegou Fui forçado a esquecer tudo que aprendi em minhas terras. Com saudade ardendo no peito Fé! Maracatu é referência de Rei no Congo... É cortejo em Pernambuco É calunga na mão pra proteção É alfaia, gonguê e xekerê na mão E minha viagem continua... Pra continuar resistindo O batuque rolava Tambores e dois corpos no centro da roda ah!!! umbigada Chegando em Minas, São Paulo, Rio. E até hoje manter o jongo vivo é um desafio Na cara dura !!! Querem nos deixar sem memória Desvalorizar nossa cultura Lua cheia no terreiro Lembranças de Angola, Congo... Mãe África trouxe um dos pais do samba Ele mesmo, o jongo! E a luta, como sempre, continua. Capoeira, aû, rasteira... Malandragem??? Sobrevivência! Consciência Negra !!! É jogo ou arte marcial? Ao pé do tambor, gã e hungu ! Agogô e berimbau!!! Vamos seguir lutando! NEWS MAGAZINE

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César Manzolillo A cartomante do fim da rua 1. A casa do fim da rua ficou vazia por anos. Sete, para informar com precisão. Dizia-se pela vizinhança que algo terrível havia ocorrido no local. As teorias eram muitas, mas ninguém nunca soube direito o que aconteceu lá dentro. Um dia, uma caminhonete estacionou na frente do imóvel e começou a descarregar a mudança: um fogão, uma geladeira, uma cama, uma mesa, algumas cadeiras, duas poltronas e uma ou outra tralha a mais. Exatamente uma semana após a chegada, a nova proprietária fincou no jardim uma placa que dizia: SULAMITA CARTOMANTE. 2. Um mês depois desse dia, Laura resolveu bater na porta. Nem marcou consulta, mas queria muito ser atendida. Eu não liguei, resolvi arriscar, tô muito necessitada dona Sulamita, a senhora tem uma horinha pra me atender, se não tiver eu volto outro dia, moro logo ali embaixo... E ia emendando uma frase na outra, às vezes atropelando o pensamento, outras vezes nem se fazendo entender. Entra, minha filha, tô sentindo que você tá mesmo precisada. 3. Dentro da casa, Laura continuava a falar, problema é que não faltava. Contou, explicou, perguntou, até que dona Sulamita disse: Chega! Já entendi. Parte o baralho. Tira uma carta, tira outra carta. Mais uma. Só mais uma. E ia dando as ordens, igual à cartomante de um filme que Laura tinha visto uma vez na televisão. Amor. Sulamita olhava as cartas e dizia lá o que achava. E acertava. Tudo. Detalhes. Trabalho. O processo se repetia: no alvo mais uma vez. Saúde. Nesse ponto é que Laura ficou impressionada. Não é que a mulher havia descoberto até sobre a cirurgia de vesícula feita no ano passado. Eta cartomante boa, pensou.

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4. Foi aí que Laura tomou coragem e pediu: agora dona Sulamita, eu preciso saber de uma coisa muito importante. Vim aqui mais por causa disso, a senhora compreende? A senhora precisa me ajudar, não sei mais a quem recorrer. E falava, falava... de um modo que irritava até mesmo dona Sulamita, pessoa mais do que preparada para lidar com o desespero alheio. Minha filha, se acalma. O negócio agora é sério. Mas tem jeito, fica tranquila. Tá vendo aquela porta ali? Então, eu quero que você entre lá. Depois, você tem de sentar numa cadeira que fica em frente a um quadro. Não tem erro, é o único quadro do quarto. Olha pra obra e pensa no seu problema que sua mente vai clarear. Depois volta aqui, e a gente completa o serviço com as cartas, entendeu? 5. Acomodado num sofazinho rasgado, um gato preto e branco nem se incomodou quando Laura entrou e se sentou na tal cadeira. Ela achou o quadro meio esquisito, não conseguia identificar nada na pintura. Eram uns rabiscos, umas cores que não combinavam. Parecia que o pintor tinha jogado as tintas ali de qualquer jeito, sem muito critério. Ficou mesmo decepcionada, pois, do modo como dona Sulamita falou, pensou que a obra fosse alguma coisa normal, sei lá, o desenho de uma paisagem, de um bicho, de alguma pessoa. 6. Laura não sabe ao certo quanto tempo se passou. Por um momento, a impressão é que haviam transcorrido meses ou mesmo anos. Ficou ali olhando o quadro e acabou dormindo. Talvez tenha entrado em transe. Quando acordou, decidiu sair do quarto e procurar dona Sulamita. Sentia-se muito cansada. Buscou pela casa inteira, nem sinal da mulher. Até o gato preto e branco não estava mais lá. Dirigiu-se então ao jardim e ouviu uma senhora de lábios grossos e voz fina perguntar diante do portão: dona Sulamita? Preciso muito me consultar, ouvi falar tão bem da senhora... Laura não teve tempo de pensar direito. De modo automático, respondeu apenas: sim, sou eu. E continuou após alguns instantes: pode entrar, tô sentindo que você tá mesmo precisada. Mas tenha calma, querida, o negócio é sério mas tem jeito. NEWS MAGAZINE

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Djane Fernandes Noite de pânico Marco chegou como sempre no horário para assumir seu posto no hospital municipal de Belém. Trabalhava no turno da noite e, geralmente, gostava de seu trabalho. À noite, o hospital não era tão movimentado. A maioria dos pacientes que davam entrada durante o dia há essa hora já estavam acomodados em seus leitos. Mas o que Marco mais gostava em trabalhar à noite era que ele trabalhava uma noite e folgava duas. O que permitia se dedicar as suas outras atividades, escrever, por exemplo. Ele sonhava em ganhar um prêmio Nobel de Literatura devido a seus fabulosos e geniais livros de Fantasia, por isso nas horas vagas, sempre estava lendo ou escrevendo algo. A sala onde Marco trabalhava ficava no final de um dos corredores do segundo andar. De um lado da sala ficavam os elevadores e mais a frente as escadas, e do outro lada, a alguns metros, estava o balcão de atendimento onde as enfermeiras ficavam para atender os pacientes internados naquela ala. Em frente ao balcão ficava a sala de coleta de sangue, que Marco fazia questão de evitar. No primeiro andar, ficava a recepção e do lado de fora, uma guarita de vigilância com policiais militares que durante à noite fazia ronda no quarteirão. A sala ficava posicionada de forma que uma das paredes dava para a rua, e a porta da sala para o corredor do hospital. Da rua, às vezes, era possível ouvir o barulho do motor dos carros, os escapamentos infernais das motos e a conversa de algum transeunte mais alegrinho, que depois de algumas bebidas, andava pela rua declamando seu amor por alguma mulher que provavelmente quebrara seu coração, ou não. Em algumas situações não era possível distinguir de qual lado vinha o barulho, se do corredor do hospital ou da calçada da rua que por acaso se chamava NEWS MAGAZINE

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Corredor Principal, pois era a principal rua da cidade quando ela era apenas uma cidadela. O trabalho de Marco era preencher os formulários no sistema com os dados dos pacientes, e depois de atualizar os cadastros, ele tinha que encaminhar as pilhas de papel para o arquivo. Um trabalho simples, mas que necessitava atenção. Sua sala no final do corredor, geralmente era bem tranquila. Vez ou outra alguém passava para desejar boa noite ou pedir alguma informação. No entanto, em grande parte do expediente, ele ficava sozinho. O que permitia fazer seu trabalho com tranquilidade. Esta noite, no entanto, ele estava ansioso para que o expediente terminasse. Era a última noite antes das férias. Pela manhã, ele entregaria o trabalho para os funcionários do turno seguinte e pelos próximos trinta dias não teria que se preocupar com nada daquilo. Mal podia esperar. Planejou o ano inteiro a viagem que faria. Pensou bem qual seria o destino e decidiu que a vida era muito curta para adiar a realização de seus sonhos. Decidiu que, finalmente, conheceria o Canadá. Já havia juntado dinheiro, comprado às passagens e reservado o hotel, feito a lista dos lugares que desejava visitar, providenciado a documentação e feito às malas. Estava tudo pronto. Tinha apenas que esperar o dia raiar. Já tinha combinado tudo com a namorada. Às seis da manhã, pontualmente, ele largaria seu posto, pegaria a moto e iria correndo para casa. Tomaria um banho, pegaria suas malas e tomaria um táxi rumo a casa dela que há esta hora já deveria estar esperando para ir ao aeroporto. Pegariam o voo às nove horas. Teriam que fazer escala, perderiam um tempão, mas o importante era que, finalmente, ele realizaria seu sonho. Conheceria o Canadá! Era setembro e nessa época do ano, lá estava no outono. A temperatura é agradável, ótimo para as longas caminhadas que ele planejava fazer ao lado de sua amada. NEWS MAGAZINE

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- A cidade deve estar toda colorida com árvores de todas as cores. Divagava Marco falando em voz alta, alimentando seus sonhos e aumentando a ansiedade. No computador, Marco olhava algumas fotos dos lugares que visitaria. Mal podia esperar para ter toda aquela beleza bem diante de seus olhos. Mas o tempo é ingrato. Quando desejamos que ele se arraste para aproveitar mais um pouco o momento pelo qual esperamos a vida toda, tipo aquele show do nosso cantor favorito que só a cada dez anos resolve fazer uma apresentação meteórica no país, ou quando estamos reunidos com nossos amigos e aproveitamos momentos agradáveis, ou quando conhecemos aquela pessoa especial e desejamos conversar e ter tempo para conhecê-la melhor, e quando estamos na companhia da pessoa amada, nesses casos, a eternidade seria pouco; mas nessas horas, justamente nesses instantes preciosos, ele passa na velocidade da luz. Mas quando desejamos que ele voe, o malandro coloca um prego no ponteiro e se arrasta, apenas para fazer galhofa da cara dos mortais, pobres coitados, que vivem a incerteza de cada minuto. Era assim que Marco se sentia cada vez que olhava para o relógio e percebia que apenas alguns minutos tinham se passado. Não havia nada que pudesse distraí-lo. Ele só queria que as horas passassem e que ele pudesse sair para viver sua aventura. Passava das duas da manhã de sábado e, como de costume, muitos funcionários que largavam o expediente mais cedo haviam saído para curtir um happy hour e comemorar o início do fim de semana nos bares da vizinhança. O que aumentava a movimentação nas ruas. De repente, Marco escuta tiros. Não sabe se foram disparados dentro ou fora do hospital.Escuta uma voz masculina perguntar - Para onde foram? e uma mulher com voz trêmula responder — Eles seguiram pelo

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E então mais correria, gritos e tiros. Marco estava assustado. Procurava entender o que estava acontecendo. Procurava distinguir de onde vinha o barulho. Tinha medo de abrir a porta da sala e ser alvejado com um tiro ou ser feito refém. Era o jeito esperar para ver o que acontecia. Fizeram-se alguns minutos de silêncio e então, sons de sirene. Parecia haver vários carros. Apavorado Marco pensou: - Estão cercando o hospital. Os bandidos devem ter feito algum refém. Marco já pensava que participaria de uma daquelas cenas que até então ele só tinha visto nos filmes, com longas horas de negociação e muito pânico. Pensou em sair da sala e correr direto para as escadas, mas e se isso só piorasse a situação? Não, iria permanecer na sala. Trancou a porta e ficou quietinho. E então, mais tiros, mais sirenes. E depois silêncio. E agora o que teria acontecido? Será que os bandidos se entregaram? Será que foram mortos? Será que fecharam todas as saídas e estão mantendo a todos refém? Ai meu Deus, será que ele perderia a viagem? E assim as horas se passavam. A hora de Marco largar o posto finalmente chegou. Mas ele não se atrevia a sair. Foi aí que ele ouviu conversas no corredor, entrou em pânico pensando que finalmente os bandidos entrariam na sua sala. O suor já escorria por sua cara, suas mãos tremiam. Ouviu alguém se aproximar da porta. Nervoso e sem saber o que fazer, pegou um extintor de incêndio e ficou quietinho esperando a porta abrir. Alguém estava girando a maçaneta devagarzinho. Mas a porta estava trancada. Marco esperou para ver se a pessoa ia embora, mas de repente alguém começou a bater na porta. Marco já se preparava para o pior, quando ouviu alguém chamar: — Marco você está aí? Marco sentiu uma onda de alívio inundar seu corpo. Colocou o extintor no chão, soltou um longo suspiro, abriu a porta bem devagar, e colocando a cabeça para fora da porta olhou para os dois lados verificando

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aconteceu? Por que você está tão assustado? Com vergonha, achando que tinha imaginado tudo aquilo, Marco disse: - Acho que cochilei e tive um pesadelo, mas era tão real que ... — Espero que não você tenha dormido e deixado todo o trabalho para mim, disse o funcionário. Marco apenas andou até a mesa, recolhendo a pilha de papel: — Não, a minha parte está toda aqui. Vou levar agora para o arquivo. Pegou suas coisas e saiu antes que o funcionário pudesse lhe desejar boa viagem. Saindo do hospital, caminhou pelo estacionamento até onde tinha deixado a moto. Matutava o que tinha acontecido, mas receava perguntar e descobrir que havia imaginado coisas. Indo para a casa, parou no sinal. Um rapaz estava vendendo jornal. Marco olhou para o jornal e algo lhe chamou atenção. Tirou o dinheiro do bolso, pagou o garoto, pegou o jornal. O sinal ficou verde. Era horário de pico e os carros começaram a buzinar. Guardou o jornal e acelerou a moto. Estacionando na garagem de casa, tirou apressadamente o capacete, abriu o jornal e leu: Polícia mata bandidos que assaltavam na Rua Corredor Principal Nas primeiras horas deste sábado, policiais da força militar que faziam a ronda nas proximidades do hospital municipal de Belém flagrou quando dois bandidos assaltaram um casal que saía de um bar. Segundo o Tenente Castro, o casal Odete Mesquita e Jairo Sales saía de um bar quando Marcelo Bonifácio e Duarte Oliveira, de 23 e 25 anos, os abordaram com armas de fogo. Eles furtavam os celulares das vítimas, quando policiais da força militar os avistaram. Percebendo a proximidade dos PMs,os bandidos começaram a correr sendo perseguidos pela Rua Corredor Principal até a esquina com a Rua Delegado Brilhões onde

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Os meliantes foram atingidos e morreram no local. Eles portavam um revólver calibre 38 e uma pistola semiautomática. Foi então que Marco entendeu o que tinha acontecido, respirou fundo e continuou com seu cronograma de viagem. E como Marco em tudo vê o lado bom, como toda pessoa otimista e como bom contador de história que é, esse episódio lhe renderá boas piadas e quem sabe o seu próximo best-seller.

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Kelly Lima Súplica Queria namorar alguém do movimento Que entendesse meus lamentos e me completasse os pensamentos Que acordasse com a gana pra luta Mesmo após uma noite de labuta Que aceitasse meus devaneios parcos e insensíveis Me incentivando a hastear bandeira e se preciso fuzis Que me fizesse revolução quando não mais houvesse solução Que me virasse do avesso com suas inquietações juvenis Alguém que militasse por mim, pelos meus, pelos seus, pelos nossos Que seja rascunhos, mas também outorgas Que me lave a alma dessa corja Que me brinde com café, cana e melado Que me faça vermelho nessa imensidão azul Que me tire a rabugez e me adoce os lábios Que me preencha o vaso, vazio, rachado e quebrado.

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Lívia Mª Costa Sousa

Carne viva Com a alma em carne viva, Meus olhos beijaram-te. Primeiro silêncio. Depois escuridão. Por fim: consentimento. Como quem acorda de um sonho, Vi na sua inesperada chegada O meu mais leviano encantamento. Como arco-íris após longa chuva, Céu após violência da tempestade, Minha alma virou solo fecundo, floresta feita por um grão. Como um embalo de paz em criança, O coração criou um singular compasso... Que acordes comporiam a insólita música? Que poesias substituiriam a covardia do toque? Que silêncio denunciaria o sentimento?

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Manuela Sena

“Todo carnaval tem seu fim” Se conheceram num bloco de carnaval ao meio dia de uma quarta feira ensolarada. Tudo cheirava à festa e as pessoas tinham na cara e no jeito, aquele típico desespero de quem só tem um dia (o último) para brincar o carnaval, afogar as mágoas e exorcizar demônios. Ela, vestida de anjo que caiu do céu, tinha todos os sonhos do mundo naquele coração rosa, e ele com a farda branca de um marinheiro envolto em mares de festa e bebida, parecia naufragado em suas dores e mágoas. Trombaram um no outro, assim, como quem não quer nada, mas logo em seguida se afastaram, em meio à multidão que cantava e ria e delirava, debaixo daqueles sons todos e daquele turbilhão de confete, serpentina e suor. Era um emaranhado só: gente pequena, gente grande, gente bêbada e gente sã, sem contar aqueles que não eram nem mais gente e sim um turba de porquinhos cor de rosa, coelhinhas da playboy, cachorros, gatos, cobras e até um jacaré. Pois é! No Carnaval podia tudo, pois tudo era permitido. Mas foi só depois que rolou aquela briga entre o capitão e o palhaço que tinha tomado umas e dado em cima da colombina de vestido azul, que em meio aos cacos de garrafa e trambolhões ela disse: Que carnaval mais violento minha gente, esse povo não sabe curtir, enquanto ele de longe, a olhava pelo canto dos olhos e via embevecido, como ela ficava linda quando irritada, levantando a sobrancelha direita e fazendo biquinho. E foi só aí que ele fez a única coisa que lhe restava fazer, e quando a banda tocou aquela música antiga que falava de amor e repetia no refrão que o bom da vida era ser feliz, ele tomou-a pelo braço e no enlaço festivo a cartada final: “Vem comigo que hoje o dia é nosso, a vontade de te beijar é grande e o mundo é pequeno pro meu desejo”. O que veio depois, foram beijos, abraços e amassos sobre um céu abrasador. E dançaram, festejaram, tomaram banho de champanhe e cobriram-se de serpentinas coloridas. De tão envolvidos que estavam, nem perceberam o tempo passar e a noite chegar, trazendo com o seu manto o fim da banda, do carnaval, das colombinas e curtição. E sem o carnaval a rua era só uma rua, os bichos viravam gente comum e até o palhaço não tinha mais graça, com seu sorriso pintado jazendo pendurado naquele rosto sem cor. A vida depois do carnaval era só a vida: comum, real, profundamente palpável e indelével. E permaneceria assim, até quando o próximo carnaval chegasse e trouxesse novamente com ele, aquela outra vida, aquela outra realidade, aquela outra dimensão humana e onírica.

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Vitória Costa

É um vestido bem glamoroso. (Articula minha mãe, que analisa o tecido do vestido; sorrio.) —É. Carol irá completar os seus quinze. Carol e eu nos conhecemos na escola há pouco tempo, mas para quem olha de fora parece que somos amigas há anos. Carol não é a minha melhor amiga, mas eu tenho afeto por ela; temos bastante coisas em comum. Ela divide seus segredos comigo, ela me trata com carinho, e tudo isso é recíproco de minha parte. São só três meses de amizade, mas algo que eu sinto e deposito com toda a minha fé, que é verdadeira, não precisa de cronograma. Decidido, irei à festa de Carol, por que não? Pouco tempo, mas somos amigas, e fui convidada. Tenho um vestido, um salto, e outras amigas que conheço há mais tempo que também irão. Enfim, chegou o grande dia, o dia de Carol, tão comentado na escola, a festa do ano, vamos assim dizer. "Hey! Você está convidado(a) para a minha festa de quinze anos! Venha comemorar comigo essa data tão importante, venha para o meu baile de máscara! Aguardo a sua presença. Dia: 31/01/2012 Local: Rua das Flores. Salão de festa: Gente Feliz Horário: Às 20:00’’ Ouço o barulho do celular apitar. "Vejo você hoje à noite. Na festa. Esteja bem gata, se for possível você ficar mais gata do que já é.’’

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Estou há um mês evitando Alex, o bom partido, mas comprometido namorado de Carol. Talvez fizéssemos um belo casal, se não nos conhecêssemos em uma festa promovida pelo casal, onde foi oferecido vários quitutes e uma aliança...para Carol...dada por Alex. Estávamos todos felizes, o casal, os amigos; até que eu notei o olhar fixo de Alex vindo em minha direção, pensei estar louca, mas não. Alex fazia de tudo para ficar perto de mim, puxava assunto comigo nas raras vezes em que ficávamos sós, eu evitava isso, mas ele insistia, entrava com facilidade nos assuntos das rodas de amigos que eu estivesse; me tratava bem até demais, e a pobre da Carol achando que tudo aquilo era pura bondade. ‘’Vamos marcar para sairmos, comermos alguma coisa, conversarmos, sei lá ’’ Respondi: ‘’Ok. Eu falo ou você fala com a Carol?’’ Alex está digitando... Alex demora muito para digitar. Fico agoniada. ‘’Que tal sairmos sem a Carol, dessa vez?’’ Quê??? Demoro alguns minutos pensando no que Alex digitou. ‘’Como amigos, sem namorada ’’ Não respondo, ignoro Alex. Entendo as suas intenções, e sei que não são das melhores. —Brenda, você veio. Carol me abraça. — Claro, não deixaria de vir. — Aproveite bastante, estou feliz que tenha vindo, você está linda. Só está com a mesma máscara que eu. — Eu também estou feliz, mas a estrela da noite é você. Se quiser eu

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troco a máscara por outra, em algum lugar, eu ligo para a minha mãe se incomodar você, a festa é sua. (Sinto-me constrangida.) — Não...não, não precisa. Somos amigas, e assim pode dificultar um pouco em saber quem é quem. Mistériooo. (Carol sorri.) — Mas os vestidos não são iguais. (Tento suavizar o assunto, percebo que Carol ficou chateada em sua própria festa.) Carol me deu liberdade de frequentar o espaço destinado ao descanso da debutante, estou mega agradecida. O espaço é bem confortável, tem alimento saudável, o que eu mais desejo agora, tem água mega gelada, ventilador, um sofá agradável, um espelho de corpo inteiro, um banheiro aconchegante, tudo para o conforto da aniversariante. Coloco a máscara, quero me ver por inteira. — Bem plena. (Digo a mim mesma.) O vestido é de um singelo prateado, nada chamativo. Longo, que mostra apenas as pontas dos dedos dos pés, o bojo é feito de pedraria nem tão chamativa. A máscara, é igual a de Carol. — Oiii, a debutante mais linda do mundo se encontra? Congelo. QUE DROGA!!! A MESMA MÁSCARA DE CAROL!!! EU DEVERIA TER TROCADO!!! NÃO, NÃO, NÃO PODE SER, EU NÃO QUERO DAR DE CARA COM ELE!!! Preciso agir com mansidão para encarar a fera. Percebo que Alex se aproxima. — Não é Carol, sou eu, a Brenda. Alex demonstra surpresa e sorrir. — Brenda. — Oi Alex, Carol está resolvendo algumas coisas da festa, eu estava olhando a Raquel que passou mal, mas estou saindo. Fica à vontade, avisarei a Carol que você está aqui. Alex me encurrala de costas para uma penteadeira. Alex se aproxima e me beija. Espera, nos beijamos. É errado, mas nos beijamos, é certo

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também, pois mesmo sabendo que ele não vale uma prata se quer, eu gosto dele. Não como Carol gosta, não é com a mesma intensidade, mas eu gosto, o desejo. Não a invejo por tê-lo como namorado, não, Alex quer ficar comigo, junto a mim. É um beijo roubado e dado, é pecador e libertador. Desculpa Carol, mas eu ando sentindo algo, algo forte, e me agarro fortemente aos lábios de Alex. — Alex, é você? Saio de seus lábios, ouço a voz que há três meses chamo e considero a minha amiga. Não sei o que me deu. Um momento de sandice jogou tudo para o ar. Eu sou a pior amiga do mundo, eu sei. Meu Deus, como eu fui tosca!!! Beijei o namorado da minha amiga na festa de quinze anos dela, em seu baile de máscara, eu estraguei o seu sonho de princesa. Definitivamente, Alex é o sapo e eu sou a bruxa má. — Posso explicar Carol. — Alex...(Sua voz sai em um choramingo.) Quem está com você aí? Fico surpresa. A voz de Carol me doía tanto, e ela ainda teria que suportar a traição, a minha traição, a traição de alguém que se dizia amiga dela. Eu nunca deveria ter feito isso com essa menina. — Carol, podemos conversar... — Quem está aí Alex??!! Meu coração dói mais que meus ouvidos. — Eu...

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