Litere-se
Ano 01 - Edição 03 - Abril 2017
Equipe Editora Chefe
Colunistas
Perla de Castro
Alberto Neto Alexandre D’Assumpção Beatriz de Castro Danie Ferreira Diego Guerra Elves Boteri Emily Del-Vecchio Glau Kemp Jhefferson Passos Luanna Mello Pedro Cotrim Perla de Castro Raquel Rasinhas
Conselho Editorial Alberto Neto Alexandre D’Assumpção Glau Kemp
Projeto Gráfico Perla de Castro
Ilustração Capa Marcelo Oliveira (UCM Comics)
www.revistaliterese.com contato@revistaliterese.com parcerias@revistaliterese.com
Índice
6 Evento Multi 7 Concurso de Microcontos 8 Coluna : História da Estória 10 Recursos digitais para a criação de
quadrinhos
12 Você quer fazer quadrinhos no Brasil? 13 Entrevista com Ana Recalde 16 Pioneirismo Moaçy Cirne 18 Coluna: O Velho Caolho 19 Perfil 21 Contra Crítica 39 Coluna: Escuridão Profunda e Vazia 40 Coluna: O lado agridoce da Poesia 41 Entrevista com Antony Magalhães 44 Coluna: Contos, onde eu os encontro? 46 Entrevista com Jean Carlo Barusso 48 Resenha 51 Lançamentos 52 Indicação
Editorial Chegamos na nossa terceira edição e lhe convido a relembrar os tempos de criança e mergulhar no mundo das HQs e quadrinhos. Preparamos este número com muito carinho e pedimos que apreciem sem moderação. Agradeço aos escritores que cada vez surgem mais e mais com interesse em participar de nossas edições. Sentimos muito orgulho de saber que existem muitas pessoas querendo tocar o barco junto de nossa equipe. É por nossos leitores e escritores que buscamos sempre oferecer o nosso melhor em cada nova edição. Estamos aproximando do nosso aniversário de 1 ano e até outubro traremos muitas surpresas para comemorar com cada um de vocês que ajudam esse sonho a se realizar. A Revista Litere-se está de cara nova em todos os sentidos. Todas essas mudanças tanto no nosso visual como no conteúdo que trazemos a vocês é nossa infinda busca por evolução e melhora para o escritor e leitor. Puxe a cadeira, pegue aquela xícara de café e vem com a gente embarcar nesse mundo dos quadrinhos! Sintam-se em casa!
Perla de Castro Editora Chefe
Escritores nesta edição
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Ana Ferrari Beatriz de Castro Johan Henryque Liliane Oliveira Lisa Hallowey Lisi de Castro Madu Dumont Mickael Alves da Silva Omar Va Elabo Pedro Cotrim Perla de Castro Thais Rocha Washington Soares
Evento Multi
A Revista Litere-se tem o orgulho de anunciar a realização da primeira feira multicultural da cidade de Queimados com o apoio da Luva Editora e da Prefeitura Municipal de Queimados. O evento acontecerá do dia 13 ao dia 15 de julho no CEU - Rua Macaé, s/n - São Roque - Queimados/RJ. Serão três dias de oficinas literárias, palestras e debates com escritores e editores, contação de histórias para crianças e muitas outras atrações. Se você é escritor e mora no Rio ou Baixada Fluminense e tem um livro para expor para vendas ou precisa fazer um lançamento de seu livro, temos espaço para você! Entre em contato até dia 28/04/2017 e garanta seu espaço e o melhor ainda, tudo gratuito! Contato: eventosculturais@revistaliterese.com
Acompanhe tudo sobre o evento nas nossas redes sociais! Esperamos por todos vocês!
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Concurso!!!
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Coluna: A História da Estória Nascimento dos quadrinhos Em meio a heróis como o Capitão Marvel, Tochahumano e toda uma legião de justiceiros, a Marvel Comics criou o Capitão América sob a batuta de Stan Lee e Jack Kirby. Com seu uniforme inspirado na bandeira americana se tornou a personificação da luta contra o nazismo.
Quem nunca leu uma HQ do Super-Homem, Batman, Homem Aranha, Xmens e tantos outros heróis, a turma da Mônica ou seu mangá favorito enquanto crescia e pensou: “Como eles surgiram?” História em quadrinhos, quadrinhos, gibi. Existem várias nomenclaturas para essa que é conhecida como a “Nona Arte”, isso graças a Riccotto Canudo. As HQs servem para narrar uma história de forma sequencial com as imagens e os textos interagindo entre si, geralmente pu -blicadas em formato de revista, contendo uma ou mais histórias de um mesmo personagem.
Curiosidade: Na mesma época em que foi criado o Capitão América e a revista Mad (uma sátira as histórias clássicas), Will Eisner criou o personagem The Spirit cuja importância foi tão grande que hoje, o maior prêmio do mundo dos HQs, o Oscar dos quadrinhos, se chama Prêmio Will Eisner.
Agora pode imaginar o quão antiga é essa arte?
Agora completamente fora do controle dos jornais e com suas próprias revistas, os quadrinhos ficam cada vez mais violentos, foi então que pais e educadores de todo o mundo levantaram a voz contra eles. Diziam que as HQs estavam influenciando de forma negativa as crianças e queriam proibir as publicações. A coisa ficou tão feia que o governo Norte Americanos chegou a censurar vários quadrinhos de heróis. A guerra acabou, a justiça estava perseguindo ferozmente e isso fez com que as vendas de revistas em quadrinhos despencasse. A criação de códigos de ética e de postura por parte das editoras, para combater a censura, só foi dar resultados alguns anos mais tarde. A década de 60 marcou a recuperação do mercado de heróis com as editoras lançando novos heróis com características mais humanas e filosóficas, com dramas psicológicos e problemas cotidianos.
Já na pré-história, os homens das cavernas faziam uso de pinturas para narrar os acontecimentos do seu dia a dia, mas pensando em um sentido mais moderno do termo HQ começou de maneira definitiva em 1895, pelas mãos do artista norte-americano Richard Outcault. Aparecendo primeiro nos jornais sensacionalistas de Nova York, a primeira história em quadrinhos que se tem registro foi “Yellow kid”. A novidade logo se espalhou pelo mundo, encontrando terrenos férteis para material de HQ e surgindo muitos cartunistas célebres no início do século XX. Nessa época os quadrinhos se tornaram material indispensável nos jornais diários. A década de 30 trouxe criações quase imortais para os quadrinhos, introduzindo a aventura como tema principal. Flash Gordon, Dick Tracy e O Fantasma são apenas alguns exemplos. E foi em 1933 que Funnies on Parede, primeira revista americana de quadrinhos surgiu, depois vieram a Famous Funnies, Tip Top Comics, King Comics, Action Comics (onde Jerry Siegel e Joe Shuster criaram o Super-Homem) e Detective Comics (onde Bob Kane, em 1939, criou o Batman). Veio a segunda guerra e muitos personagens, sobre tudo os heróis, passaram a se envolver em tramas de violência, guerra, democracia e paz.
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Nas últimas décadas do século XX, os heróis se firmaram e ganharam mais revistas. Os criadores, roteiristas e desenhistas passaram para o nível de celebridades mundialmente famosas e seus nomes estão nos créditos das histórias, passando a contar tanto quanto o nome de um ator famoso em um filme. O século termina consagrando McFarlane como um dos grandes nomes das HQs, ao lado de gênios como Alan Moore (que criou a obra-prima dos quadrinhos e mini-série Watchmen), Frank Miller (autor de Batman - Cavaleiro das Trevas e Demolidor - homem sem medo) e do desenhista
Alex Ross (que ilustrou as obras Marvels, Reino do Amanhã e Super-Homem - Paz na Terra), dando uma realidade nunca antes vista nos desenhos das HQs. Em terras tupiniquins, no ano de 1884, o cartunista italiano, radicado no Brasil, Angelo Agostine foi responsável pelos primeiros quadrinhos brasileiros de longa duração com As aventuras do Zé Capoeira. Em 1905 veio a revista TicoTico e com ela o lançamentos de outras histórias em quadrinhos nacionais. Em meados de 1930, Adolfo Aizen lançou o Suplemento Juvenil, com o qual introduziu no Brasil as histórias americanas e em 1937 Roberto Marinho entrou no ramo com O Globo Juvenil. Dois anos depois lançou o Gibi, nome que passou a ser também um dos sinônimos das HQs. Em 1950 a editora Abril começou a publicar as histórias em quadrinhos da Disney. Chegando a década de 60, multiplicaram-se as publicações e os personagens brasileiros.Destaque para Pererê, de Ziraldo (que mais tarde criaria O Menino Maluquinho) Maurício de Sousa que criou toda uma série de personagens, dentre os quais, Mônica, Cascão e Cebolinha.
Antes as únicas formas de ler uma tirinha ou uma HQ eram as revistas e jornais, os cartunistas precisavam de uma editora para publicar e seguir suas diretrizes, com a internet todas as barreiras vieram a baixo. Um excelente exemplo é o brasileiro Fábio Yabu, criador dos Combo Rangers que nasceram do seu site na internet e ganharam legiões de fãs. Chegamos ao final de mais uma jornada, hoje pelo universo das HQs. Espero ter ajudado a sanar as dúvidas sobre essa arte literária tão única e inspirados futuros cartunistas e sonhar mais alto e se arriscar em seus sonhos. Nos vemos na próxima edição de Litere-se.
Por, Raquel Rasinhas
Curiosidade Maurício de Sousa é o maior nome dos quadrinhos nacionais. Foi o único a viver exclusivamente dos lucros de suas publicações. A Turma da Mônica é o maior sucesso do ramo no país, em todos os tempos. Virou linha de produtos que vão desde sandálias, a macarrão, passando por material escolar, roupas, etc. Também já foram produzidos desenhos animados e longa-metragem com os personagens. A Editora Abril passa a publicar os heróis da DC e Marvel Comics no Brasil, em 80 os grandes jornais começam a postar tirinhas de autores nacionais, algo que antes era exclusivamente território gringo. Nos anos 90 o mercado brasileiro cresce, novas revistas passam a ser editadas no país. Chegamos ao século XXI, o mercado de quadrinhos ainda em expansão, a Editora Globo mantendo o grande sucesso dos gibis da Turma da Mônica e a Abril com os HQs de heróis das grandes comics norte americanas. Esse mercado está crescendo dia a dia, no Brasil e fora dele com a internet como uma ferramenta muito útil para postagens e divulgações.
www.iluminerds.com.br
Recursos digitais para a criação de quadrinhos Dentre as novas tecnologias que são desenvolvidas mais a cada ano, os quadrinhos e mangás também não ficaram fora deste meio e ninguém melhor para comentar sobre o uso ou não desses recursos do que os próprios quadrinistas. Para este artigo, convidei três ilustradoras para darem sua opinião sobre o que mudou com o uso dessas técnicas, seja para um lado positivo ou negativo. A primeira entrevistada, que atende pelo apelido de Haru, é formada em Artes Visuais e tem como foco o desenho mangá feito à mão. As imagens feitas por ela ilustram sua saga de livros, tendendo sempre para o estilo do mangá japonês. Segundo ela, os recursos digitais foram muito úteis em um momento importante do desenvolvimento do desenho: “Eu sempre gostei de fazer linearts, mas tinha dificuldade em colorir. Nisso, os recursos digitais me ajudaram bastante! Uso o programa Photofiltre para limpar e colorir minhas linearts. Então, desenho as linearts à mão, scaneio, e limpo e aplico as cores pelo Photofiltre. Isso acelera muito o processo além de deixar os desenhos mais padronizados”. Ela diz que embora esteja iniciando nesse modo de criação de quadrinhos, indica o Photofiltre que é um programa gratuito e mais simples que diversos outros disponíveis no mercado.
A nossa segunda entrevistada, Letícia Pusti, é criadora do Another Art Book, que traz tirinhas sobre problemas do cotidiano, problemas sofridos pela maioria das pessoas e até mesmo textos de apoio para pessoas que estejam passando por algum tipo de difilcudade. Com uma linguagem leve e algumas brincadeiras. De acordo com esta ilustradora, as novas tecnologias para quadrinhos são mais positivas do que negativas: “Acho que os recursos mais ajudam do que atrapalham, quando atrapalham é mais por falta de disciplina. As informações são muitas e constantes, independente da relevância, por isso é importante saber filtrar. É do meio digital que surge muito conteúdo para o meu trabalho e é dele que vem 90% (ou mais) do retorno. Os memes surgem no meio digital, é praticamente uma nova forma de se comunicar e se a gente souber usar bem eles, os assuntos em alta, isso pode ser revertido para atenção ao meu trabalho e a produção de vários outros artistas também, claro”.
Tirinha da página “Another Art Book” de Letícia Pusti.
Ilustração da obra “A Chama da Esperança” de Haru.
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Para a quadrinista, apesar disso tudo os equipamentos ultramodernos, como mesas digitalizadoras, não são tão necessários, estando em segundo plano na hora de produção das tirinhas: “O que faz o meu trabalho funcionar é comunicar bem uma ideia, se não existir uma história bem contada, se não houver um esforço para tentar isso, não adianta ter a tecnologia e materiais de ponta”. Nossa última ilustradora entrevistada é Lúcia Lemos, autora da série de livros Aika, que trata a história de uma jovem mestiça no japão que adentra em um mundo fantástico habitado pelos personagens de seu mangá preferido e une-se a eles na luta contra os vilões da história. Na opinião dela, os recursos, que ainda são tabu para muitos ilustradores que ainda acreditam que a forma tradicional de desenho à mão seja a mais correta de ilustrar, foram um modo de facilitar o trabalho não só do quadrinista quanto do leitor de quadrinhos: “Você tem mais facilidade para trabalhar As mesas digitalizadores estão mais sensíiveis. Tem muitos locais que vc pode subir sua série e em alguns você ganha dinheiro, tem um serviço de streaming de quadrinhos (comentarei sobre isso melhor) em que se paga uma quantia por mês e pode ler quantos quiser.” Além disso, a ilustradora comenta que existem muito mais formas de aprender e compartilhar material, mas que infelizmente a maioria das video-aulas e vendas de e-books ainda é em inglês. O serviço comentado por Lúcia se chama Social Comics, que através de um pagamento mensal, assim como todo serviço de streaming, libera uma grande gama de conteúdo, neste caso de quadrinhos e mangás. Criado por uma dupla de cearenses, o site é uma ótima forma de acompanhar as histórias sem pagar por um valor muito alto em cada revista. Algo foi unânime para todas as autoras que foi a possibilidade de atrair um público cada vez maior para suas obras. Utilizando ou não mesas digitalizadoras, programas que auxiliem no aprimoramento da imagem ou inserção de diálogos, a tecnologia vai estar sempre mais presente no dia-a-dia de todos, então cabe a nós aproveitarmos essas oportunidades.
Caso desejem conhecer melhor o trabalho das ilustradoras, no final deste texto estão os nomes das páginas delas. Não deixem de apoiar os artistas brasileiros, a falta de apoio faz com que muitos talentos sejam perdidos e isso seria prejudicial para todos nós. * “A Chama da Esperança”: * Lúcia Lemos * Another Art Book
Por,Beatriz de Castro
Você quer fazer quadrinhos no Brasil?! “Os quadrinhos estão morrendo! Vá fazer outra coisa da sua vida”! Ouvi essa frase no final dos anos 80 quando pedi um conselho a um artista experiente. Numa época de transição antes da internet, os profetas do fim do mundo pareciam fazer sentido. Algumas editoras estavam fechando, muitos artistas estavam desesperados e ninguém tinha bola de cristal para prever que nossa conversa viraria futuro do pretérito. Poderia ter sido o fim, mas não foi. Surgiram coletivos de artistas, editoras independentes que publicaram uma nova leva de artistas, estúdios e agentes que negociavam contratos com editoras do exterior e a internet, o que não só mudou a forma como nos comunicamos como a forma como produzimos e divulgamos nossas ideias. Como bons cidadãos do mundo, passamos a consumir RPG, Mangá e “quadrinho europeu” da mesma forma que consumíamos tudo que já vinha pra cá. Os quadrinhos não morreram, se adaptaram aos novos tempos e fomos introduzidos a uma série de novos formatos e interpretações da nona arte. A maioria aproveitou a chance e fez experimentos que deram certo. Muitos desses novos nomes migraram da internet para o impresso e serviram de exemplo para uma nova geração que aprendeu com seus erros e acertos abrindo novas trincheiras. Teria o mundo mudado para a melhor? Em 2017, dezessete anos após esse boom da internet que nos trouxe todas as facilidades citadas, ainda tem gente dizendo que ninguém valoriza o quadrinho nacional, que ele vai morrer em um ano e etc. Muitas vezes esse discurso é usado por pessoas que não acreditam em seu material ou que não vendem tanto quanto gostariam. Segundo um artista reconhecido moderno, só não vende seu material quem não souber divulgá-lo. A internet facilitou a comunicação e o autor não só passou a ter formas de se comunicar com outros autores e possíveis contratantes de todo o mundo como pode vender visualizações de seus quadrinhos através de sites como o Social Comics e bancar sua publicação física através de sites de financiamento coletivo ou de patronagem e depois de produzidos, os mesmos quadrinhos podem ser vendidos nos
vários eventos Nerds/Geeks existentes. E se o autor não conseguir o financiamento, ainda tem editoras que editam uma quantidade mínima de vinte revistas. Isso sem contar que vermos cada vez mais grupos locais, alguns dando caras regionais ás suas produções, outros apenas divulgam seu lugar de origem, mas todas garantem a diversidade típica da cultura brasileira. Você quer fazer quadrinhos no Brasil? Se joga! Vivemos um bom momento em que as supostas dificuldades de se fazer quadrinhos caíram por terra. Não dependemos de uma editora poderosa que seleciona uma suposta elite, o que permite o surgimento de diferentes traços e narrativas e com um computador razoável você pode não só produzir seus próprios quadrinhos como divulgá-los e até comercializá-los.
Por, Alexandre D’Assumpção
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Entrevista Ana Recalde é do Mato Grosso do Sul e residente do Rio de Janeiro. Começou como quadrinista no lançamento da revista Patre Primordium, em 2009. Em 2011 iniciou a webcomic Beladona, que no final de 2014 se tornou livro através de financiamento coletivo e ganhou o Troféu HQMix como melhor webquadrinho de 2014. Também participou de várias coletâneas como Quadrinhópole, Petisco Apresenta, Clássicos Revisitados: Monstros Noir e Feitiço da Vila. Atualmente é editora do selo Pagu Comics.
A Pagu Comics completou um ano, realizando projetos incríveis e dando visibilidade para artistas mulheres. Já dá para dizer que existe uma mudança no cenário e que hoje o momento é mais favorável para a mulher que faz quadrinhos? Ana Recalde : Então, eu não acredito em mudanças rápidas em problemas estruturais. O machismo é um problema generalizado e afeta todas as mulheres, e a consciência social muda muito devagar. Se formos pensar no âmbito dos quadrinhos, temos muitas autoras que vem brigando há anos por espaços e quebrando barreiras e a Pagu colhe frutos disso. Eu fico feliz de imaginar que estarmos juntas no selo pode gerar uma visibilidade umas para as outras, e esse é nosso objetivo. Então se eu for pensar em 2009, quando comecei, hoje temos muito mais espaço e estamos mostrando muito mais o nosso trabalho. Nesse um ano de Pagu eu gostaria de imaginar que colocamos a nossa contribuição ao lado de tantas mulheres fantásticas que temos no mercado brasileiro. Agora, sobre quadrinhos em geral e cultura, eu não diria que é um momento favorável, não apenas para as mulheres, mas para sermos vistos como importantes. O quadrinho, apesar de ser uma arte muito importante, tem uma visão muito restrita por parte do público. Então quando vemos coisas absurdas acontecendo na cultura em todo o país, entendemos que precisamos ser uma arte de resistência, continuar lutando pelos espaços. O FIQ quase não acontecer é uma grande prova disso.
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Eu acredito que minha história influencia sim nas escolhas que eu faço como editora, assim como o gosto pessoal. É complicado investir seu trabalho em uma obra que não se acredita. Eu sou muito apaixonada por todos os títulos da Pagu. Mas eu também sempre busco expandir os meus horizontes como editora e consumidora. Não dá pra parar de conhecer e pesquisar. Levar os quadrinhos a sério e de forma profissional envolve dedicação, até para apurar o próprio gosto e senso estético.
Como você analisa o mercado editorial de quadrinhos nacionais e fazendo um balanço dos últimos cinco anos podemos ser otimistas para o que vem pela frente? Ana Recalde : Em relação às artistas e editoras eu fico otimista. Podemos ver dentro do próprio FIQ o crescimento de lançamentos. Outra forma fácil de medir é olhar para artistas brasileiros no Artist’s Alley da CCXP. Na primeira edição faltou mesa e nosso espaço continua crescendo. Ver que o investimento vai para outros lugares do país, fora do sudeste também é empolgante. A CCXP Tour tem tudo pra ser um arraso. Muitas editoras pequenas também surgiram nesses cinco anos! Nossa, artistas e editoras estão fazendo um grande esforço pro mercado continuar crescendo de forma saudável, ou seja, com aumento dos leitores e de qualidade. E o que vem pela frente continuará tanto quanto a força de todos esses artistas independentes e editoras pequenas. Precisamos sempre ir desbravando esses espaços de consumidores e apresentando o quadrinho brasileiro para um público que ainda não o conhece. Mas não tenho grandes ilusões que isso será fácil, além de ser construído no agora. Deve ser uma batalha travada todo o tempo.
Com o debate sobre o Jabuti incluir quadrinhos na premiação, muito se falou de alternativas que pudessem incentivar o crescimento do mercado de HQ nacional. Qual sua opinião sobre assunto? Um prêmio exclusivo para mulheres seria valorização ou segmentação? Ana Recalde : O prêmio Jabuti tem muito prestígio, então incluir quadrinhos eu vejo como uma boa forma de incentivo. Mas não acredito em um prêmio apenas para mulheres. Se tivéssemos uma diferença muito grande de formação entre artistas mulheres e homens, não seria contra. Porém, nenhuma das mulheres produzindo hoje, devem em nada para nossos colegas homens. Os prêmios servem e ajudam muito na divulgação de uma obra, então participar, ser indicada ou ganhar um prêmio adiciona um crivo ao leitor(a). Por isso acredito em investir nos prêmios que temos e estimular a diversidade de indicados e categorias. Afinal temos um mercado de quadrinhos enorme, é realmente impressionante a quantidade de títulos sendo lançados todos os anos.
Como leitora de quadrinhos quais são suas referências? E como suas referências e gosto pessoal interferem no seu trabalho de editora na seleção de novos artistas? Ana Recalde : Meu pai era colecionador de quadrinhos, então desde muito cedo eu tive contato com dois ramos bem interessantes, DC/ Marvel e europeus. Lia muito Asterix, Turma da Mônica e Batman, ao mesmo tempo. Era uma infância interessante (risos). Aos 18 anos conheci a obra do Neil Gaiman e posteriormente os trabalhos japoneses. Todas essas influências são muito vivas dentro da minha cabeça. Gosto tanto de Sakura Card Captors quanto de V de Vingança. Depois fui conhecer mesmo o quadrinho brasileiro depois de 2009 e aí sim que meus horizontes se abriram para novos traços e histórias.
O que você pode adiantar sobre as novidades de 2017? E para quem sonha em fazer parte da equipe qual é melhor caminho para ser publicado pela Pagu Comics? Ana Recalde : Nossa, milhares de planos! Bom, primeiro vamos terminar em 2017 os títulos atuais da Pagu, completando 5 edições cada. Isso vai ser legal de ler, pois é um universo compartilhado e vai dar as bases para uma história em conjunto para 2018.
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Ainda em 2017 vamos publicar diversas autoras que se inscreveram para a nossa convocatória em histórias curtas, todas para ser lançadas em dezembro. Além do lançamento do título novo, Violeta. Também estamos com uma comunidade de autoras mulheres no G+, para entrar tem que pedir a autorização no link: https://plus.google.com/u/0/ communities/101196199905472056589 Para fazer parte da Pagu, basta nos mandar contato pelo pagucomics@gmail.com, mandar portfolio e vamos entrar em contato. Mas estamos com várias artistas na agulha já, para serem lançadas ainda em 2017, então aguardem e confiem.
Por, Glau Kemp
Pioneirismo - Moacy Cirne
Poeta conhecido por ser um dos fundadores do poema-processo ao lado de Wlademir Dias Pino, Neide de Sá e Álvaro de Sá entre outros nomes (movimento derivado do concretismo que foi a mais potiguar das vanguardas), se dedicou as narrativas gráficas e a poesia tendo escrito diversos livros sobre essas duas linguagens:
Conheci o conterrâneo Moacy Cirne através do texto de um amigo em um site falando sobre o poema-processo, e fui surpreendida ao saber que esta vanguarda aconteceu no país apenas no Rio de Janeiro e em Natal simultaneamente. Há pouco tempo atrás em conversa informal com outro amigo descobri que Moacy também havia sido o pioneiro em estudos de quadrinhos no Brasil. E é por esse motivo decidi escrever sobre ele na Litere-se edição especial sobre HQ’s.
1970- A explosão criativa dos quadrinhos| 1975-Vanguarda: um projeto semiológico| 1979A poesia e o poema do Rio Grande do Norte | 1979-Objetos Verbais | 1982- Uma introdução política aos quadrinhos| 1983-Cinema Pax| 1988-Docemente Experimental |1990- História e critica dos quadrinhos brasileiros| 1998Rio Vermelho | 2000- Quadrinhos, sedução e paixão|2003- Cinema Cinema | 2004- A invenção de Caicó | 2006- A escrita dos quadrinhos| 2007- Poemas Inaugurais | 2013- Seridó Seridós, foi o último livro lançado com memórias, fotos, poemas e listas de livros e filmes.
Moacy Cirne nasceu em São José do Seridó - Natal / Rio Grande do Norte (1943-2014), foi um poeta/escritor, jornalista, apaixonado por cinema, torcedor do fluminense, artista visual e um dos maiores pesquisadores das histórias em quadrinhos no Brasil introduzindo o gênero nas Universidades. Foi professor (aposentado) do Departamento Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense, onde lecionou disciplinas sobre histórias em quadrinhos e ficção cientifica. Editava e distribuía o fanzine de uma única página, O Balaio Porreta.
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Sua obra diversificada na linguagem dos quadrinhos procurou valorizar em suas análises, publicações nacionais como “O Pererê”, de Ziraldo e os personagens de Mauricio de Souza. Enquanto muitos estudiosos relutavam em analisar a narrativa dos quadrinhos, Cirne inovou sendo um acadêmico da área de comunicação envolvendo o tema da cultura de massa. Como Marxista ele se empenhou em defender as produções artísticas em geral como função social, relacionando o fazer artístico com o materialismo histórico. A sua contribuição foi muito importante contra o preconceito de que os quadrinhos era uma leitura superficial por ser dita como “mais fácil”. (O poema processo é uma produção poética gráfica-visual que transborda as regras convencionais do que é poesia. Incorporando formas geométricas, desenhos, quadrinhos e texturas.) Cirne morreu aos 70 anos no dia 11 de janeiro de 2014 em Natal, após sofrer uma parada cardíaca depois de uma cirurgia, Moacy havia descoberto um câncer de fígado no final de 2013.
Por, Maluz Medeiros
Coluna: O velho Caolho “Numa cidade de setecentas pessoas, eu e minha filha estamos sozinhas.” – Hilda. “Hail, Midgard! Hail, filhos de Midgard! Hail a todos os Deuses!”
O suspense toma conta quando, por meio de uma votação da assembleia local, decidem fechar os portões para que a praga não se alastre. Mas, enquanto os portões são fechados e a temperatura despenca, fica claro para todos que a verdadeira ameaça está dentro das muralhas… Gunborg, um líder local, começa uma brutal campanha de intimidação. Boris, o forasteiro com uma teoria sobre doenças contagiosas, tenta resistir a ele. Os doentes são banidos e a tensão só vai aumentando. Seria realmente a mortal praga o maior problema dos setecentos nórdicos do Volga?
Hail, meus queridos amantes das terras gélidas e de seus grandes guerreiros e das grandiosas sagas!! Trago a vós mais uma história dos povos nórdicos! O que os senhores estão para ler retrata a era em que estes povos dominavam as terras de gelo, um conto muito bem explorado e cheio de detalhes. Uma série da linha Vertigo, escrita por Brian Wood (ZDM – Terra de Ninguém).
Violência, fome, frio, mortes e motim. Brian Wood explora de maneira criativa e incontestável a Era Viking sem falar nos estudos de anos que realizou pra conceber estas obras de arte. Você não vera elmos com chifres ou homens que só pensam em comer e realizar pilhagens. São histórias meticulosamente bem escritas, com a linha de pensamento em seguir os padrões da época, porém, com histórias e personagens fictícias. A Viúva do Inverno é um conto de suspense narrado pelo ponto de vista de uma solitária mãe e sua filha de oito anos, que lutam para se manter vivas em meio à adversidade. Brian Wood (ZDM – Terra de Ninguém) e Leandro Fernandez (Justiceiro MAX) nos brindam com essa aventura épica, que traz uma abordagem criativa e original da Era Viking, marcando um dos melhores momentos da série Vikings. Vikings: A Viúva do Inverno é uma excelente leitura. E caso você também escute os conselhos dos Deuses, procure o encadernado da Vertigo e não se arrependerá.
Na série Vikings (Northlanders) nos é mostrada a difícil vida dos nórdicos, suas ideologias, sistemas de comercio, navegações. Em A Viúva do Inverno (que traz as edições 21 à 28 de Northlanders), acompanhamos uma comunidade nórdica aos redores do rio Volga, por volta de 1.020 d.C; que é assolada por uma praga, onde todos ou pelo menos em maioria, são adeptos da ideologia cristã (após anos de guerras), mas que ainda em seus íntimos, guardam as antigas tradições e crenças pagãs. Hilda é a protagonista e voz que narra o conto, uma bela e jovem mulher que teve seu marido levado pela peste. Ela e sua filha precisam sobreviver em meio à doença contagiosa, ao rigoroso inverno que dura praticamente sete meses sem contar os crimes e assassinatos dentro da comunidade. Wood explora bem as características e personalidade dos personagens principais, a ignorância da época em relação às doenças, seguindo sempre suas morais religiosas, o ambiente e tudo que pode acontecer e tudo com possibilidades fortes e reais. Além disso, nos banha com a rica história da época, com desenhos que ornam com o tema, de Leandro Fernandez (artista de Justiceiro Max) que faz jus ao trabalho.
Por, Elves Botéri
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Perfil Nessa edição especial de HQ eu convidei um artista nacional de quadrinhos para falar um pouco de sua trajetória e como é vida de alguém que está se estabelecendo no mercado. Essa mini biografia resultou em um perfil muito verdadeiro e temos a impressão de conhecer um artista assim. Esse é o Chibi um cara comum de uma comunidade do Rio de Janeiro que faz arte e roteiro. Por, Glau Kemp Meu nome é Fábio Santos, sou carioca, moro na Comunidade do Alemão no Rio de Janeiro, tenho 24 anos e desenho desde minha infância. É difícil precisar quando exatamente eu comecei a rabiscar minhas primeiras ilustrações e porque eu o fiz, já que isso me parece muito intrínseco, mas consigo afirmar quando e porque eu comecei a me interessar em contar histórias. Foi quando assistia aos clássicos animados que eram transmitidos pela TV aberta no fim dos anos noventa até parte dos anos dois mil. Clássicos como Dragon Ball Z, Digimon, Cavaleiros do Zodíaco, Hunter x Hunter, Fullmetal Alchemist, Naruto... (Sim, percebe-se que minhas tardes e manhãs eram recheadas de animações japonesas). Eu amava aquelas narrativas, aqueles personagens e seus mundos peculiares. Isso cultivou em mim um amor que crescera e se manifesta de maneiras diferentes até o dia de hoje. Ainda quando criança eu era daqueles que ao brincar com meus bonecos de ação criava roteiros, dava papéis aos personagens, inventava todo um contexto fora da realidade dos heróis que eu usava nas brincadeiras (Batman deixava de ser Batman e virava outro ser totalmente diferente). Às vezes eu até me incluía nessas histórias como um personagem a mais e interagia diretamente com os bonecos (Sim, parece estranho, mas tinha um primo que brincava comigo para eu não ser o único humano). Quando mais velho, no colégio, um amigo meu, Eduardo Gonçalves, me apresentou outra forma de contar histórias que era divertida e interessante: o RPG. Um jogo incrível que te permite estreitar laços de amizade e treinar sua criatividade ao mesmo tempo. A partir dessas duas experiências eu criei histórias que mais tarde me inseriram ao mundo dos quadrinhos. Minhas brincadeiras com meu primo deram origem ao meu primeiro mangá independente: Holy.
Uma história onde todos aqueles personagens antes retratados nos meus bonecos ganharam os papéis em aventuras próprias. E meus dias de RPG deram origens a personagens que hoje ilustram meus mangás, ideias que incorporei a minhas histórias e roteiros que futuramente transformarei em HQs para meu público. Diria que fui moldando desde cedo essa paixão por contar histórias e desenvolver meus próprios mundos. Quando eu finalmente decidi criar meu primeiro mangá que seria direcionado ao público (Uma vez que Holy só estava acessível para meus amigos mais próximos), surgiu High Deathnition. Na época, meados de 2008, eu ia trabalhar nela junto ao meu amigo Eduardo, já mencionado aqui, ele cuidando do roteiro e eu da arte. Porém, com o fim do ensino médio a ideia foi engavetada.
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Em 2011 eu ingressei num curso de desenho no Studio Mangaka, na Tijuca, RJ, onde aprimorei minhas habilidades e cresci como artista durante meu período de estudo. High Deathnition permaneceu guardado até 2014, quando eu decidi trabalhar a história por mim mesmo e disponibiliza-la para leitura online. Fiz o primeiro capítulo e nessa mesma época, enquanto participava de um curso gratuito de produção audiovisual, conheci Paulo Ballado, meu atual editor. Ele viu a história, se interessou pelo potencial e me ofereceu a oportunidade de lançála em versão física através de sua recém-fundada Editora Guardião. Minha real imersão no mercado de quadrinhos foi, e ainda é, uma luta constante. Por muitos fatos já conhecidos por quem está dentro desse mundo. Conquistar o público, conquistar espaço, conseguir se destacar e mostrar que as pessoas podem achar material bom nacional são coisas difíceis e muitas vezes abaixo das expectativas. As pessoas dificilmente buscam por material brasileiro, principalmente os mais jovens que são alimentados pelo que está em destaque na mídia, coisas em sua maioria internacionais, e isso às vezes nos isolam, pois o público tem receio de arriscar consumir coisas feitas em sua terra natal. Mas a mudança já é visível e graças a isso tem sido cada vez mais gratificante produzir HQs. Seja de forma independente, ou não, muitos novos quadrinistas têm surgido para mostrar suas histórias ao mundo. O que só ajuda aos que já estão na área e encoraja os futuros aspirantes. Eu mesmo conheci muitos artistas que se unem para fazer do quadro de HQs nacionais uma referência, como já foi um dia. Atualmente estamos no quarto volume de High Deathnition, que está para ser lançado em breve. A série pode ser encontrada no Social Comis e no Smocci e comprada no site da editora (guardiaoeditora.wixsite.com/guardiaoeditora). Eu estou trabalhando em paralelo em outra série para leitura online chamada Dreamlander (que pode ser lida no site Smocci). Uma série de aventura e magia que promete agradar um público mais apegado aos conteúdos mais mainstream. Recentemente fomos, a editora Guardião e eu, homenageados pela Academia Brasileira de Histórias em Quadrinhos (ABRAHQ),
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em sua segunda cerimônia de premiação, pelo trabalho social e os destaques que temos ganhado em meio aos profissionais do ramo. Eu só tenho a agradecer ao Paulo e a Roberta Pauletich pela oportunidade incrível de realizar um sonho e aos amigos quadrinistas e não quadrinistas que me apoiam e encorajam a seguir e conquistar a cada dia mais vitórias. Minha estrada está somente começando e todos que estiverem interessados em me acompanhar nela podem fazê-lo através da minha página no Facebook em @Chibifabioart, no Instagram e Twitter por @Chibifabio e me encontrando em eventos nos quais eu estarei para bater um papo e mostrar um pouco mais do meu trabalho.
Coluna: Contra Crítica
Está faltando o quê? A cena é propícia para o crescimento da produção nacional de HQs, mas ela ainda é bastante tímida e não conseguem das grandes editoras, o espaço que merecem. HQs vêm ganhando espaço nas prateleiras das livrarias. É mais um momento delas, principalmente impulsionada pelos heróis quem saíram dos quadrinhos e ganharam as telas dos cinemas, com grandes bilheterias. Além disso, vivemos uma época em que culturas nerds, cults ou geeks ganham muitas evidências. É um momento bem interessante para a indústria dos quadrinhos, porém, não são tantas flores assim para os quadrinistas brasileiros. As nossas produções ainda penam para conseguir algum espaço entre o que vem de fora e, mais ainda, para ter alguma visibilidade nas grandes editoras. Para estas editoras, acaba sendo mais viável, financeiramente, trazer publicações de fora, uma vez que não têm nenhum gasto com produção e muito pouco com divulgação (são personagens consagrados, com público formado e cativo), do que investir nas HQs nacionais. Não é que elas perdem dinheiro, investindo nas produções internas, mas o problema é que praticamente não tentam abrir espaço para os nossos artistas. Mas, enquanto as gigantes do mercado editorial brasileiro só tem olhos para o que vem de fora, muitas outras, de menor expressão e independentes, apóiam e incentivam a produção nacional. E, na base do ‘faça você mesmo’, usando, principalmente, as ferramentas que a web oferece, os artistas brasileiros vêm conquistando seu público e o fidelizando.
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Agora é hora de fortalecer este mercado e, independente dos olhos das editoras estarem ou não voltados para as HQs brasileiras, aproveitar os meios que existem e conquistar cada vez mais público. E, o mais importante, unir público, artistas, profissionais envolvidos com os quadrinhos nacionais, criando uma grande corrente de divulgação, fortalecendo cada vez mais a produção independente. Pois assim, as nossas HQs se consolidarão de uma vez por todas.
Por, Pedro Cotrim
A Memória Examinando meu passado de forma aleatória, Eu poderia me deter em momentos memoráveis e esquecíveis, Mas ainda assim não conseguiria me desfazer de nenhum dos dois. A memória tem seus caprichos de amante. Ela pode nos proporcionar momentos maravilhosos, ou frustrantes. Amante voluptuosa. Como ser inconstante, A Memória merece muita atenção, Mas nunca sabemos o quanto. Por isso, assim como fazemos com as criaturas indecifráveis, Corremos como loucos atrás da Memória. Amante ingrata! Pintamos quadros e paredes, Compomos músicas, Esculpimos, Escrevemos livros, Tiramos fotos, Filmamos. Nada é suficiente para saciar a sua fome milenar. A Memória continuará nos atormentando até o fim do tempo. Até o último ser humano, Até o último suspiro, Até a última batida do último coração partido. Amante insaciável! Não se contenta com menos do que a morte, Para que possa se entregar complemente, Num último abraço quente, Rumo ao completo esquecimento.
Por, Washington Soares
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Ele conferi todos os seus materiais: lápis, borracha, grafite, papel, lápis de cor, régua. Coloca na mochila, e vai para a aula. **** Entra no prédio de cabeça baixa. Sobe as escadas e para por um momento no corredor, mentalizando novamente seu plano. Caminha em direção a sala, e antes de entrar, olha primeiro ao redor para ver se não havia ninguém pelos corredores, depois olha para a placa um pouco acima da porta: Aulas de desenho em quadrinho. Um sorriso, meio que de lado, surge em sua face. Calmo, entra e tranca à porta da sala, disfarçadamente. “O senhor está atrasado!” – Repreende o professor, sem tirar os olhos da lousa. Ele ignora as palavras, e vai para seu lugar no fundo da sala. Alguns dos alunos, o encaram e começam a cochichar. Ele passa por eles. “Isso vai acabar hoje” – ele pensa, esbarrando em uma das mesas de propósito, derrubando alguns lápis no chão. “Idiota” - diz o rapaz, de olhos azuis que estava sentado ali. Ele não responde, e continua andando. Chega em sua mesa, e senta-se, colocando a mochila no chão. O rapaz ainda o encara. E ele, para provocar, lhe mostra o dedo. O rapaz ia se levantar para tirar satisfação, mas seu amigo que está do lado, coloca a mão em seu ombro, e faz sinal com a cabeça, em direção ao professor. O rapaz, então, permanece em seu lugar, voltando sua atenção para a aula. Ele observa, com um olhar de deboche. Espera alguns minutos, até ver todos distraídos. Pega sua mochila, e coloca no colo. Abre o bolso da frente e tira um objeto. Dá um sorriso, e olha em direção ao professor, que está de costas, desenhando alguns círculos, no quadro, enquanto explica. “Professor!” – Ele diz, com a voz calma. O homem vira-se, encarando os alunos: “Quem me chamou?” “Eu...” Bang... Bang... Os alunos olham assustados. Gritos e desespero. De repente, silêncio... **** Ele abre o caderno de desenho. Coloca os lápis de forma ordenada na mesa. E antes de começar a desenhar seu HQ, vai até à frente da sala e ajeita a cena que planejou durante todo o verão. Seus “modelos” tem que estar perfeito, nada pode dar errado. Sete corpos banhados de sangue. O professor sentado em sua mesa, e seus “queridinhos” ao lado, segurando seus cadernos de desenho. Sempre foi reprovado por aquele ser desprezível. Ele sempre dizia a ele, que seus personagens não tinham “personalidade”. Que lhe faltava criatividade e talento. Pois iria lhe provar que tinha muito talento e criatividade. Só era uma pena o professor não poder ver isso, já que estava no inferno agora. Claro que isso teria consequências graves, mas deixaria para pensar nisso depois. O importante naquele momento, era sua concentração em desenhar cada traço, cada detalhe sem deixar passar nada. Aquilo seria seu legado para o mundo dos quadrinhos. Ele admira a cena com um sorriso de satisfação. Vira-se para ir até sua carteira, quando ouve um barulho. Olha para trás e vê um dos alunos mexendo-se. É aquele metidinho, “filhinho de papai” de olhos azuis, que o chamou de idiota. Ele olha em sua direção. Os olhos do rapaz estão arregalados de pavor. celular e escolhe uma música: Dance Macabre – Scalene. Deixa o som invadir o ambiente. Fecha os olhos, por um momento. Suspira, abrindo-os novamente, e começa a desenhar sua obra de arte.
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Ele olha sério para sua vítima, admirando o medo estampado naquele rosto todo sujo de sangue. “A bala deve ter passado de raspão, e ele apenas deve ter desmaiado” - ele pensa. E antes que o rapaz pudesse ter qualquer tipo de reação, ele tira o revólver do bolso do moletom e dá um tiro certeiro no meio da testa. Os olhos azuis do rapaz se fecham para sempre. Novamente, ele volta para perto dos cadáveres e ajeita a cena de novo. “Pronto, agora sim está tudo certo” - diz, guardando a arma novamente. Retorna para sua mesa, pega seu celular e escolhe uma música: Dance Macabre – Scalene. Deixa o som invadir o ambiente. Fecha os olhos, por um momento. Suspira, abrindo-os novamente, e começa a desenhar sua obra de arte.
Por, Lisa Hallowey
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Confidência Não sei escrever poesia para ti, meu amor. É intermitente esta insuficiência que me faz tactear ilusões e cair nesta tremenda inferência Múltiplas vertentes derramam meus sentimentos… Minha razão, decadente impede-me de sintetizar tudo que reside cá, por dentro Por dentro, lá no fundo no cerne dos meus versos reside um grande amor que de leve, eleva-me e traduz meus firmamentos Por dentro, confesso. Meu afrouxado coração construiu um mundo e tu Ivete, resides nele meu grande amor.
Por, Omar Va Elabo
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Pour Elise Adentrou o palco sem ver. Não era a escuridão, ou a velha técnica de olhar o infinito fingindo encarar a plateia. Não. Sua visão estava embaçada pelas pequenas poças que se formavam embaixo de seus olhos. Toda a plateia lhe parecia uma única massa disforme de seres respirantes. Aquilo importava? Não, não importava. Posicionou-se em seu lugar no palco. Os braços delicadamente sobrepostos e sustentados, a perna esquerda esticada atrás en croisé. A entrada delicada de Pour Elise começou e passou então a se mover ao som dela, a contagem de oito um mero fundo em sua mente, guiando seu tempo e seus passos. Talvez fosse uma boa coisa, não conseguir enxergar a plateia. O que veria lá, afinal? Entre as pessoas com rostos de admiração e paixão pela dança haveria o rosto daquela pessoa. Nunca achara Pour Elise uma música triste – era delicada demais, mimosa demais para ser triste. Mas não agora. As notas pareciam rasgar sua carne por dentro, passando por todos os outros órgãos até chegar ao coração. Será que ainda batia, ou estava tão dormente que nem se percebia? Graças ao treinamento impecável e ensaios intermináveis, seu corpo sabia exatamente o que fazer, para onde ir, qual movimento executar. Ainda bem. As lágrimas rolavam por seu rosto, quentes, paralisadoras. Mas a expressão era impecável. Será que as pessoas na primeira fileira conseguiam perceber seu choro? Provavelmente não. Era um palco grande, e a coreografia fazia que estivesse sempre em movimento. A música parou. Congelou-se em sua pose final por um momento. Sorriu ao receber seus aplausos e se aproximou para agradecer ao caloroso público. Reconheceu o rosto entre a multidão, um círculo nítido em meio ao borrão, longe, quase na saída. Abriu um sorriso triste, mas não havia lágrimas nos olhos. Claro que não. Levantou-se do agradecimento e saiu do palco. Em sua mente, apenas música ecoava. Pour Elise. Pour Elise.
Por, Thais Rocha
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Então chegamos lá De repente, quando ela resolveu falar do amor, era como se pertencesse a um outro mundo, insuportavelmente vazio, regido por critérios pelos quais ela só podia sentir desprezo. Ainda era uma mulher, seu desejo ainda era latente, sua alma também pulsava como quando tinha vinte anos, ou pulsava muito mais, pois tinha consciência de quanto agora seria mais difícil, seus amores, suas fantasias... Aquele corpo repleto de marcas do tempo, não havia envelhecido nem um único dia no prazer. Das inúmeras experiências que viveu, conseguia agora traduzir em apenas uma palavra fortuita e sem o merecido cuidado: velhice. Mas foram essas experiências mudas, algumas ocultas, outras imperceptíveis, que deram à sua vida forma, colorido e melodia. Os pensamentos se deslizam para fora de sua vivência e o que resta neste papel é um sem número de contradições, de preconceitos. Ela chega a acreditar que isso é um defeito, algo que devia ser esquecido: o desejo do prazer. Talvez o tamanho deste desconcerto entre o desejo, a fantasia, o amor e preconceito (muitas vezes pessoal) é o tamanho, a maneira exata para compreender essa experiência do corpo e da alma, ao mesmo tempo conhecida e enigmática. Então se é verdade tudo que acontece dentro dela e que só pode viver uma pequena parte, a dúvida permanece: O que fazer com o resto? Tem a sensação de que pela primeira vez está atenta e lúcida com relação a ela mesma, ao seu mundo mágico e ainda juvenil no seu interior. Sentia-se como se houvesse embarcado em um avião para, poucas horas depois, aterrissar em um mundo externo completamente diferente, sem ter tido tempo de absorver as imagens que passaram durante o longo caminho. É uma mulher, uma mulher que não suporta pensar que todas aquelas marcas, as das dores, as dos amores, as mais profundas, assim como as mais superficiais, tenham sido em vão. A pele do seu rosto, seus seios, os cabelos brancos que agora além da cabeça, nascem no sexo, a barriga um pouco mais volumosa... As imagens nas vitrines desse mundo moderno, são grandes e nítidas, mas do outro lado do vidro, ela não tem como não sentir orgulho de ser quem é, de ser como é. Os homens, não a olham mais, os vendedores a chamam de senhora, as crianças de tia ou vovó. A família espera o bolo de banana, que era receita de sua não se sabe qual tataravó... Mas ela sabe, tem certeza, que seu lugar não é o forno, que seu desejo não é a gritaria das crianças. 27
Seu desejo é sexo, amor, toque, um longo beijo na boca, como se tivesse sido o primeiro, um abraço cheio do tesão igual àquele quando sua carne era dura, mas seu universo interno quase nada sabia do amor. Hoje ela sabe tudo, dar e receber afeto, hoje não existe mais pudor, hoje não é mais o sexo pelo sexo, hoje é o sexo que foi para sempre, aquele que esteve guardado por tanto tempo nas cicatrizes de sua pele. Hoje ela sabe ser completa, sente o sangue de seu homem, aquele que não está mais alí, correr nas suas veias, mesmo quando está acendendo a luz do forno para determinar o ponto do bolo, da tataravó, da avó, que tem certeza, também desejavam determinar, ao invés do calor do forno, o calor do sexo de seu homem. Agora ela sabe mais que tudo, que não tem a menor ideia de como será essa coisa do desejo de viver um amor novo, em uma época que não conhece mais. Só sabe que não cabe nenhum adiamento. seu tempo está bem mais próximo do fim, do que do início, e pode ser que não reste muito. Agora já não é entre milhões de pedras preciosas que abriria a porta do palácio de seus sonhos, mas sabia que podia ser a libertação de uma imagem de si mesma, aquela que na vitrine mostrava seus limites. Será que há um mistério sob a superfície da vida humana? Ou as pessoas são exatamente como se revelam através de suas ações. Está resolvida, tudo completamente claro, não precisa de bagagem, não precisa de nada que não seja apenas ela mesma, nem dinheiro, nem realidade, nem família, nem problemas, nem soluções. O circo chegou à cidade, pobre, pequeno, o fotógrafo tirou uma foto dela, mostrou em um monóculo, sorriu e gostou da imagem que viu. Foi aí que ela decidiu, de uma vez por todas, e para sempre, fugir com o circo, exatamente como sonhou na infância: Pois o palhaço quem é? É ladrão de mulher...
Por, Madu Dumont
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Existência Penso que emocionar Seja transparecer Um jeito de amar Mas, quem dera escrever Exigisse mais liberdade Talvez, uma Centelha de criatividade Há tanto escondido Amores separados por distância Tantas coisas inúteis Ganhando importância Sentimentos Que mal cabem Em pensamentos Há tantos sonhos Desejos e planos Abandonados por angústia Ou pequenos danos Tenho pena de quem Pensa poder apagar Momentos e lembranças Como fotos em um celular Vejo aqueles Corações afogados Por palavras não ditas Que agora, rabiscam recados Rabiscos Presos ao peito Quebrando paradigmas Ou qualquer conceito Livre Espero poder Compartilhar essa essência Antes que chegue o fim De nossa existência. Por, Johan Henryque
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Prisão da alma Dela fugi, noites e dias Dela fugi, mente fóbica. Dela me ocultei, no meio de lágrimas Pelos caminhos dos labirintos Trevas e temores Mãos que me seguiam, seguiam após mim. Uma voz insistia: “Trata-se de uma busca incansável”. Salva-me, salva só a mim?
Eu floresço em ti Choro pétalas de sangue Mentiras em rosas que sangram lentamente na raiz (Coração) Ventania de incertezas Perdida no tronco da imaginação Preciso de terra firme Quando planto a semente Eu floresço em ti.
Por, Liliane Oliveira
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Variáveis verdades Anseio somente a alcunha de bom moço Desalentado estou entre os sonhos e o ócio Distopia ingênua segue meus passos Sou heroi do contrário Naveguei perante a lacuna do honorário Racionalizando o resto Exclamei:- Quem dera fosse eu feto abortado Perante o silêncio, sou mestre dos dias arcaicos Matei o destino por fatalidade Reivindicando o símbolo O prestígio da saciedade Onde eu sendo vivaz Para além das covas da cidade Por, Mickael Alves da Silva
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Heroína sem Quadrinhos Quando criança passava eras lendo histórias em quadrinhos, os homens e mulheres que eram super, suas habilidades fora do normal e como eles sempre triunfavam e salvavam a todos. Eu ficava imaginando como seria ter uma vida como aquela. Eu tinha muito medo de passar a vida toda e não ter feito nada para deixar uma marca, que ninguém se lembrasse de quem eu sou ou de algo que eu fiz. Na infância, colocava a minha capa e a minha máscara, lutava com os vilões imaginários e salvava reféns. Eu era sempre corajosa, tinha poderes, sequer imaginava quais eram os reais vilões. Sendo uma garota, muitos diziam que eu era estranha, que aquelas brincadeiras não eram para meninas, mas meusque meus pais sempre me apoiavam e pude ser a heroína dos meus brinquedos. Conforme fui crescendo, me interessava por romances policiais e séries. Terminei o ensino médio e comecei a estudar para passar na prova para a polícia, focada com o dia que colocaria o uniforme, estando pronta para servir e proteger. O grande dia, então, chegou, o resultado da prova! Eu tinha passado e não houve alegria maior para mim e minha família, meus pais estavam orgulhosos, eles viram na filha o resultado de acreditar em dias melhores. Eu realmente acreditei que seria tudo perfeito. Entrei primeiro apenas com papelada e só queria me ver livre daquela mesa e de todos aqueles arquivos, queria estar nas ruas, ajudando a diminuir o crime e impedindo que coisas ruins acontecessem com as pessoas. Depois de um tempo, passei para os registros e comecei a sentir que finalmente útil, pois podia fazer algo pelas pessoas, entretanto, comecei a perceber que não era assim que as coisas funcionavam. Por mais que eu tentasse pegar os casos, meus superiores descartavam os B.O.s dizendo que não dariam em nada. Comecei a me entristecer. Quando não aguentava mais, eis que surgiu a minha oportunidade de trabalhar nas ruas. Na minha primeira patrulha, prendi alguns menores que encontrei roubando. Levando-os para delegacia, me surpreendi aos vê-los sendo soltos logo em seguida. - Senhor, eles possuem ficha, não serão nem ao menos detidos por algumas horas? - Para quê? Daqui alguns anos, tudo deles será apagado e não vai adiantar de nada. Eu acreditava que as pessoas poderiam mudar, mas que deveriam pagar pelos seus erros. Entretanto, meus pensamentos começavam a se desmantelar, pois eu via que estava em um beco sem saída. Se eu prendesse alguém, ele iria para a cadeia e não melhoraria em nada ou ainda seria solto e nada aconteceria. Se eu não prendesse, estaria me omitindo do meu dever, além de deixar que alguém continuasse seus atos. Em um momento de total dúvida sobre o que fazer, comecei a conversar com alguns colegas.
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- Oras, mas é por isso que a gente acaba com eles logo, não vai dar em nada se os prendermos… - comentou um dos meus colegas, enquanto ria. - Acabar com eles? - questionei, temendo o que ele quis dizer. O homem vendo que eu não estava bem, respirou profundamente e disse: - Você ainda está muito verde, não entende como as coisas funcionam… - Eu sei exatamente como as coisas funcionam! Se eu mato alguém estou cometendo o mesmo crime ao qual eu deveria combater! Só atirarei em último caso!- me exaltei. - E vai fazer o quê? Deixar eles matarem um cidadão de bem? Quem você prefere que morra? - o cuspe dele caindo no meu rosto. Entretanto, não me abalei ou movi um músculo. - Eu vou fazer a minha parte para que ele pague pelo seu crime, não farei algo assim. Defenderei e servirei, mas dentro da lei. - Pfff… não vai durar nem um ano. - disse me deixando sozinha. Depois daquele dia, os meus ideais ficavam cada vez mais confusos. Não sabia o que era certo e errado mais e tive que permanecer forte nas múltiplas vezes em que vi colegas se tornarem cada vez mais corruptos e se venderem. Vi muitas coisas que me fizeram duvidar, ou se no final tudo seria entregue à barbárie e tudo teria sido inútil. Até que um dia, em uma patrulha com um colega desconhecido, encontramos um homem que estava assaltando uma mulher e com a nossa chegada, usou-a como escudo para que não atirássemos. Naquele momento, as palavras do policial que rira de mim voltaram a mim e congelei. O meu colega, entretanto, conseguiu atirar na perna do assaltante e quando ele se dobrava em dor, corri, tirando a moça dos braços dele, enquanto o meu colega o algemava. Mais tarde, procurei o policial que estivera comigo e perguntei. - Por que você atirou na perna dele e não em um ponto vital? - Não é porque encontramos bandidos todos os dias que temos que nos tornar como eles. Se um dia eu precisar tirar uma vida pelo bem maior, eu farei, mas não se eu tiver outras opções. Eu sorri para aquilo e pude acreditar novamente em nosso heroísmo. Poderíamos, sim, fazer o que é certo e sempre há um caminho correto a percorrer, por mais que seja o mais difícil.
Por, Beatriz de Castro
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Farol Vermelho Uma gota de suor escorreu da minha têmpora esquerda até o meu queixo, preguiçosamente eu a enxuguei enquanto via o semáforo fechar. Coloquei o carro em ponto morto e considerei ligar o ar condicionado por alguns minutos, só enquanto o farol estava fechado, mas meus olhos encararam o medidor da gasolina, e com pesar eu respirei fundo, arrumei o cotovelo na janela aberta e apoiei minha cabeça em minha mão. “Ovo, pão, leite e bananas... Ovo, pão, leite e bananas... Ovo, pão, leite e bananas” Eu repetia em uma tentativa de não esquecer a lista que minha mãe tinha dito pelo telefone, ela tinha oferecido mandar por mensagem, mas isso implicaria em eu passar vinte minutos explicando a ela passo a passo de como se usava o celular, para no final ela dizer que era muito complicado e que se eu não conseguia decorar uma simples lista, deveria comer mais peixe. Foi com o canto do olho que eu reparei no motorista do carro do lado, o excesso de movimentos me chamou atenção e eu me virei completamente encontrando um homem nos seus vinte anos cantando e balançando a cabeça freneticamente ao som de alguma música que as janelas fechadas me impediam de escutar. Eu ri me divertindo com aquela cena, ele estava tão concentrado naquilo, que eu tinha certeza que nunca passou pela cabeça dele a ideia de alguém estar observando. Automaticamente meus olhos viraram para o outro lado, e em um susto encontraram a motorista do carro a minha direita, a princípio ela sorria e olhava na minha direção, mas ao perceber que eu olhava de volta, virou o rosto imediatamente. Eu mantive o olhar intrigado, enquanto ela parecia debater consigo mesma o que fazer, por alguns instantes segurou o volante com mais força, e então virou o rosto em minha direção novamente, e acenou sem graça. Ela apontou para mim e percebi que indicava o menino do carro do lado, eu olhei para ele de novo e vi que agora ele batia no volante como se fosse uma bateria profissional, olhei de volta para ela sorrindo e tentando dizer apenas com linguagem corporal: “jovens não é mesmo?”, ela retribuiu o gesto e o sorriso. De relance eu vi que o semáforo de pedestres tinha ficado vermelho, tínhamos menos que um minuto até que o nosso ficasse verde. Eu tentei pensar em alguma forma de saber mais sobre ela, mas o semáforo abriu e ela acenou ainda sorridente e eu fiz o mesmo, seu carro virou a direita enquanto eu segui reto atravessando a avenida.
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Aquele seria um bom momento para acreditar em destino e pedir para um ser cósmico fazer com que nossos caminhos se encontrassem de novo. Talvez nos encontrássemos algum dia em um shopping e ela diria: “você é o homem simpático do carro ao lado?” para o que eu responderia: “ você é a mulher simpática do carro ao lado?” e nós dois iriamos rir e então iriamos tomar um café, e dentro de alguns meses estaríamos morando juntos e eu estaria escrevendo meus votos de casamento e lembrando desse mesmo dia em que paramos lado a lado no farol. No semáforo seguinte não tinha nenhum carro do meu lado, eu fechei as janelas e liguei o ar condicionado olhando fixamente para frente. “ Ovo, leite, pão e...Droga, o que mais?” Pensei irritando percebendo que teria que ligar novamente para minha mãe. “Melhor aproveitar e comprar mais peixe”. Considerei esperando o semáforo ficar verde.
Por, Ana Farias Ferrari
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Des Gostava de ver você animada, pulando e dançando, no final de cada missa de domingo. Sempre me perguntava o motivo daquela euforia e mais ainda, como alguém conseguia ser tão feliz assim em um domingo de manhã. Não, domingo não combina com alegria, mas você, você também não combinava com nada que não ela. Ontem, ao cair da tarde, aquela tinta acinzentada tomava conta do dia, uma fina garoa molhava as roupas curtas desavisadas que transitavam pelas calçadas. Fora de repente, uma mudança no tempo, coisas de São Paulo, cidade de tempo completamente imprevisível, mais até que o meu humor. Aqui da janela do quarto, ria mentalmente, a cada gritinho de surpresa, causado pela temperatura que diminuíra consideravelmente, foi nessa hora que me veio a imagem da sua alegria, das missas no interior, eu nem era católico, nunca fui, mas me dava vontade de frequentar as suas missas, descobrir mais sobre essa fé que tinha nas cores, na vida. Mas não pude deixar de lembrar daquele dia, nossos poucos momentos juntos, minha euforia, o seu desespero. A sua vontade de não ser. Foi a primeira vez que a vi enegrecida. Suas maçãs continuavam vermelhas, mas a escuridão vinha de dentro, sentia o medo que estava em você. Eu, tentando driblar a minha loucura. Há tanto tempo esperava para estar tão perto de você e agora estávamos ali, juntos, mas sem poder gozar nem um momento. Você rezava, rezava muito, eu, estava arrependido de não ter nunca sido fiel a nenhum credo, nunca soube rezar, ainda não sei. Talvez, fosse a forma única de nos unirmos em alguma coisa, a oração inundava o ambiente, sensação estranha de paz, envolta a um turbilhão de tensão, gritos de ordem e ameaças. Foi quando você se ajoelhou, olhou para mim, seus olhos nadavam nas lágrimas que nasciam do seu medo. Por mais que evite, aquela cena sempre me revisita, na verdade, eu sempre estarei vivendo-a, seus cabelos sendo puxados, você, sem forças para gritar e eu, paralisado diante de tudo aquilo. Foi neste momento que eu descobri que as cores podem ser apagadas. Por , Pedro Cotrim
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Direção Estava tudo lá, mas para encontrar tive que me aproximar, e mesmo assim não consegui achar. Dei passos largos para alcançar, senti um calor me guiar Curiosidade a me equilibrar, um deslize para logo chegar De repente algo a me tocar, para me embaraçar ou ajudar, só veio es-quentar, meus passos direcionar Minha mente clarear Quando por um relance parei, os olhos escancarei e pude constatar... Você estava lá, como um anjo a me fitar com aqueles olhos de mar Por, Lisi de Castro
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Coração Relicário álbuns de foto Debaixo do assoalho Pisar nas memórias Quem sabe elas adentram reverso Pelas portas dos pés Talvez faça mais sentido Pois a cabeça falha não tem mais juízo
Por Perla de Castro
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Coluna: Escuridão Profunda e Vazia - Uma página sombria
Eu achava graça na mania do meu filho: engatinhar até a cômoda e esparramar as fraldas da gaveta pelo chão. Um dia, voltando pra casa com ele dormindo no colo, vi as fraldas espalhadas pela casa toda. Não teve graça. Por, Jhefferson Passos “Se sair do quadrado que desenhei ali no chão da sala, enquanto tomo banho, o Bode Velho vem te pegar”, diz a mãe. Ao voltar, soltou um grito desesperado: em vez da filha no quadrante, havia a marca de um casco de bode.
Por, Jhefferson Passos Sempre faço de joelhos, ao pé da cama, as minhas orações. Noite passada, ao me benzer no final, uma voz debaixo da cama respondeu: Amém! Por, Jhefferson Passos Em Araraquara, tem um casarão do século 19 assombrado por escravos. Pessoas alegam ouvirem vozes ou gritos de agonia vindos de um porão. Eu quis saber a verdade e com uma câmera resolvi passar a noite naquele casarão. Hoje faz um mês que não consigo encontrar a saída do porão. Grito, mas os visitantes não me ouvem. Por, Jhefferson Passos
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Coluna: O lado agridoce da Poesia Corrompida Ela só queria poder correr livremente sem medo de ser atacada. Ela queria poder andar nas ruas sem se sentir ameaçada. Ela queria dormir tranquilamente e não ter mais um daqueles seus terríveis pesadelos. Ela queria poder desabar e não ser julgada pela sua dor. Ela queria ter uma vida normal como as outras pessoas. Ela queria ser tudo aquilo que sonhou um dia... Mas o sonho virou pesadelo, e hoje o medo a assombra todos os dias. Por, Luana Melo
“Rabiscando a própria Alma”
Eu comecei rabiscando a própria alma. Eu comecei abrindo meu coração. Eu comecei sem nem entender o que rabiscava. Eu apenas me doava. Numa folha de papel, O coração sangrava. A dor era sentida, A alma era rasgada. Foi desse jeito torto que comecei minha primeira terapia. Essa mesma que eu pratico todos os dias. Foi escrevendo que cultivei a arte da paciência. Foi escrevendo que descobrir meu lugarzinho no mundo. Foi poetisando que me desfiz dos meus medos obscuros. Foi poetisando que voltei a sonhar. Foi poetisando que aprendi a lutar. Foi poetisando que voltei a viver. Eu sou feita de versos. Eu sou feita de estrofes. Eu sou palavras poéticas, Sempre serei poesia. Poetiso pra desabafar, Poetiso pra escrever De forma simples E sincera a minha alma poética. Poetiso porque sou pura poesia. Por, Luana Melo
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Entrevista Muito em breve a Luva Editora lançará sua primeira obra de Ficção Científica, o livro Anacrônico, do autor Antony Magalhães. Enquanto o livro está em produção, confira uma breve entrevista com Antony, em que ele fala sobre sua carreira, o Anacrônico e mais.
Crédito : Leo Cavalheiro
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Lançamento Conte um pouco sobre sua carreira literária. Antony M.: Sempre li muito desde cedo. Era louco por revistas e gibis e já dizia que seria escritor e jornalista. A “Turma da Mônica” fez com que tomasse gosto pela leitura. Visitava a biblioteca da escola todos os dias e estava sempre com um livro novo enfiado na mochila. Comecei a escrever com 14 anos. É a história que muitos jovens escritores contam, mas comecei a escrever por causa de Harry Potter. Queria muito ler os livros e, como não tinha condições pra comprar, decidi que iria escrever os meus. Por anos fui começando livros e projetos e nunca terminava. Quando estava com 17 anos, um editor disse que publicaria meu livro se eu o terminasse no prazo. Deixei até de ir pra escola e dormir, mas consegui escrever “Éden: Morte no paraíso” no tempo previsto. Ele nunca publicou o livro, mas isso me deixou mais confiante. Sabia que se sentasse iria escrever. Depois disso escrevi um livro atrás do outro. E como surgiu a inspiração para escrever Anacrônico? E como foi a experiência de escrevêlo?
Anacrônico toca em questões importantes e sensíveis, como a desigualdade social. Poderia falar um pouco sobre isso?
Antony M.: Anacrônico surgiu da junção de várias ideias. Tinha ideias pra uns quatro livros e percebi que poderia juntar tudo em uma história só. Um universo bem rico acabou surgindo e fiquei bem feliz com o resultado. Tenho 8 originais prontos. Livros que escrevi desde que finalizei “Éden” aos 17 anos. Cada livro foi importante para o amadurecimento da minha escrita. Escrever o romance “As palavras que ninguém mais diz”, por exemplo, mostrou que eu conseguia emocionar se quisesse. Não precisava de explosões e pessoas usando poderes pra narrativa fluir e ser interessante. Escrever Anacrônico provou que eu estava pronto de verdade. Que tinha maturidade pra contar histórias complexas e maduras e que minha narrativa estava em um novo patamar. É como se Anacrônico fosse meu primeiro livro. Após Anacrônico, me sinto um escritor diferente.
Antony M.: Seja nos roteiros ou livros que escrevo, procuro sempre prezar pela representatividade. Se for pra escrever livros com personagens iguais aos da maioria dos livros, prefiro nem escrever. De diversas formas Anacrônico é uma crítica aos problemas da nossa sociedade. Diversidade sexual, de gênero e cor estão presentes no livro e quando tratamos de representatividade é inevitável não falar sobre racismo, machismo, homofobia. Espero que muitos leitores se sintam representados no livro e se identifiquem com a personagem Maria. Uma brasileira corajosa que luta pra conseguir o que deseja.
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Lançamento Luva Editora Quais escritores você mais admira? Eles influenciaram sua escrita de alguma forma? Além de J.k Rowling e Agatha Christie, gosto muito de Marcelo Rubens Paiva. Estava começando a escrever meu primeiro livro quando li “Feliz ano velho”. Li e percebi que poderia falar sobre sexo e drogas com naturalidade. Não era “proibido” usar palavrões ao escrever. Eu ainda tinha uma visão de que a literatura deveria ser toda certinha e que haviam assuntos proibidos. Mesmo lendo bastante, tinha essa visão e certo receio de ser julgado pelo que escrevia. Quando li Marcelo Rubens Paiva aprendi algumas lições que mudaram minha forma de escrever e enxergar a literatura. Em um Brasil pós-guerra, a escravidão é um negócio lucrativo, o ar é tóxico, as temperaturas são altas e as pessoas vivem em cidades tecnológicas protegidas por redomas de vidro. Nessa sociedade que passa seu tempo diante da TV e entorpecida com drogas fornecidas pelo governo, vive a jovem escrava Maria. Comprada por uma família poderosa quando criança, aos poucos ela demonstra ser uma escrava diferente. Ela quer saber mais sobre seu passado e poder controlar seu futuro. Maria quer vingança.
Em breve, o Anacrônico entrará em prévenda. Fique atento às redes sociais da Luva para garantir logo o seu.
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Coluna : Contos, onde eu os encontro? Vermelho Tomate Seus olhos arderam diante daquele tom vermelho que cobriu a sua vista, as risadas invadiram a sua mente, ele ficou desorientado e tropeçando nos próprios sapatos de bico largo caiu com o rosto colado no assoalho de madeira. Mas o show tinha de continuar então ele enxugou o salgado das lágrimas misturado ao molho rubro e disse – Nossa está muito temperado! – enquanto elevava o rosto para observar aquela plateia que se degustava de suas lagrimas – do jeitinho que eu gosto – comentou lambendo os lábios e fingindo alegria apesar do líquido vermelho que borrava sua maquiagem. As vaias que se seguiram também não o intimidaram, ele contou aquela anedota do “bêbado dançarino” e ouviu de alguém da plateia – conta aquela do palhaço patético! – e foi o seu fim, ele se viu em silêncio no meio da piada como se tivesse levado uma picada de abelha (alérgico que era) – você acha que é fácil? – disse em resposta aquele estranho que sequer conseguia localizar naquela sala pequena mas escura de bar – ficar aqui me expondo apenas para tentar fazer você rir? E assim mais uma noite terminava e ele voltava para casa de ressaca moral imaginando se adiantava seguir esse caminho. Seu apartamento era tão pequeno que apesar de sua baixa estatura ele tinha de se agachar. Foi imediatamente ao banheiro se encarar. O rosto sempre cuidadosamente pintado maculado com aquele tom vermelho, foi aos poucos tirando a camada de tinta revelando o humano por de tras do artista lembrou que a sua mãe como toda a boa genitora elogiava a sua aparência. Ele costumava ser um rapaz alegre na adolescência do tipo que ria dos próprios problemas até que surgiu um que lhe quebrou o sorriso perpetuamente e o seu palhaço virou um personagem realmente bastante caricato do jeito que Jeannine gostava – faz o Poncho – pedia e ele imediatamente a atendia pintando o rosto com tinta acrílica e sorrindo torto, mas agora o que ela acharia do Ponchito? que se tornou um palhaço patético exatamente como se referiu o desconhecido. Ele tirou a roupa, ligou o chuveiro e enquanto aquela água fria envolvia seu corpo lembrou da última vez em que viu Jeannine. Foi em uma noite fria e de chuva e eles discutiram, não se lembrava exatamente quais as palavras dela, apenas de seu rosto angustiado e ele sabia que não importava a piada que contase não iria provocar nela aquele mesmo sorriso de tantas vezes. E nunca mais soube dela. É engraçado como um – até logo – pode soar como um – adeus – talvez não fosse engraçado mas ele como palhaço que era nunca perdia a oportunidade de contar uma piada mesmo que fosse para si mesmo. E quando deitou na sua cama envolvido pelo lençol foi como entrar em uma lona de circo. Em seus sonhos ouvia as pessoas conversando ansiosas pelo seu número, escutou o anfitrião devidamente caracterizado com seu terno desbotado anunciar – Com vocês o filho de Pirro nosso querido Ponchito! – ele então avançou orgulhoso de si mesmo e reverenciou o seu público que o recebeu aos aplausos ansioso pelo que ele iria lhes apresentar essa noite. A cada piada que desferiu ouvia alto o som das risadas escandalosas que chegava a balançar o picadeiro a elas se misturaram aplausos quando ele usando de uma habilidade malabarística se pos no ar feito um ginasta enquanto fingia estar tonto de bêbado e quando foi executar o salto novamente rompeu a lona e ouviu o som de rasgar. Então percebeu o buraco que fizera em seu lençol enquanto dormia o despertador ainda não apitará, apesar do sonho bom ele não tinha vontade de voltar a dormir.
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Saiu da cama e começou a sua rotina, ensaiava as falas com o rosto já maquiado de frente para o espelho treinando ao mesmo tempo as caretas, um palhaço precisa ter os músculos faciais tão elásticos quanto uma massinha de modelar. Fingiu um sorriso, na verdade, fazia tempos em que não abria um sorriso que não fosse mecânico mas sentia tamanha satisfação em seu trabalho que apesar de tudo, de todos os tomates não conseguia se imaginar em outro papel e bem – Tomate faz bem pra pele – disse e repetiu com a cara marcada de vermelho para a parca plateia daquele mesmo estabelecimento que dessa vez riu e este pode então prosseguir com as suas anedotas por que até mesmo para ele a vida se tornará dramática demais.
Por, Alberto Neto
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Entrevista primeiro livro, Viva a/à Poesia. Acredito que o caminho seja, primeiramente, dedicar-se ao máximo à escrita. É importante estudar ortografia, o gênero textual que pretende produzir etc. Depois disso também acredito que é muito importante ter uma boa identidade visual. Se a pessoa não souber fazer isso conta própria, sugiro que procure um designer. Também é primordial saber quem é o seu público, onde ele se encontra e como chegar até ele. Falando um pouco do seu livro: “Viva a/à Poesia”, qual foi sua principal experiência em realizar sua própria publicação? E por que fez essa escolha? Não buscando a publicação por editoras.
Jean Carlo Barusso, é escritor natural de Arapongas, Paraná, tem 23 anos é formado em publicidade e propaganda e atualmente cursa Letras. O poeta começou a publicar seus textos autorais em 2015 e foi publicado pela editora Madrepérola em 2016 com seu livro de poesia: “Viva a/à poesia”. Jean, primeiramente, gostaria que contasse um pouco mais pra gente como começou a sua página no Facebook, que hoje conta com mais de 45 mil curtidas, como você estruturou esse projeto? Qual é a principal dica que você dá aos novos autores para que alcancem uma página de tamanha visibilidade? Jean: Comecei a publicar meus textos em um blog e nas mídias sociais em março de 2015. Inicialmente eu era apenas uma pessoa que gostava de escrever e que queria expor seus textos. No começo eu publicava dois textos por semana (naquela época eram crônicas), depois mudei o gênero textual e passei a escrever poemas. Com o passar do tempo aumentei a periodicidade para três textos por semana, quatro, cinco, até que cheguei no padrão atual, que são publicações de segunda a sábado. Ao longo da caminhada cada vez mais pessoas liam o que eu escrevia e tudo resultou na publicação do meu pri-
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Jean: Acredito que a publicação independente foi importante para conhecer todo o procedimento de publicação de um livro. Contratei a editora Madrepérola para fazer o registro de ISBN e código e também para auxiliar nas negociações com as gráficas. Antes de fazer a publicação já havia feito orçamentos com algumas editoras, mas nunca encontrei nenhuma proposta interessante porque havia uma certa limitação artística e também porque o custo era mais alto, então resolvi fazer do meu jeito. É mais difícil, é muito mais trabalhoso, mas, para o meu caso, acredito que tenha sido a melhor opção. Sabemos que administrar o tempo é muito difícil, e no seu caso, Jean, você teve que vender os seus livros sozinhos, e também reconhecemos que a maior dificuldade após a publicação do original é de fato a venda. Como você planejou a primeira tiragem, e as vendas? Acredita que as mídias sócias ajudaram na distribuição da obra, como? Jean: A publicação do livro não estava, inicialmente, nos meus planos. Como disse anteriormente, eu só queria escrever e expor meu trabalho. Conforme o número de seguidores crescia, aumentava também o número de pessoas que perguntavam se eu tinha algum livro publicado, pois elas gostavam dos meus textos e gostariam de comprá-lo. Enxerguei naquelas mensagens uma grande oportunidade. A minha formação em publicidade contou muito nesta hora. Montei um banco de dados com os nomes das pessoas que
afirmaram ter interesse em adquirir meu futuro livro, reuni o material para a publicação e comecei a fazer orçamentos. Quando o banco de dados atingiu um número de pessoas que já era suficiente para pagar a tiragem foi o momento em que senti segurança para poder efetivamente lançar o livro. As mídias sociais são de extrema importância. Sem elas eu acredito que nem estaria escrevendo até hoje. O apoio dos leitores e as mensagens que recebi e recebo até hoje sempre servem para incentivar a produção. E como as mídias sociais são os principais veículos de comunicação contemporâneos, encontrei nelas a melhor forma de disseminar meu trabalho. Praticamente todas as vendas foram feitas pelas mídias. As pessoas entravam em contato comigo, eu informava os procedimentos de compra e fechávamos por ali mesmo. Inicialmente eu usava o Mercado Livre para poder proporcionar pagamentos em boleto e cartão, mas atualmente faço isso pelo PagSeguro. Os livros estão à venda em apenas uma livraria, numa cidade da minha região. Você realizou lançamento da obra? Se sim, como conseguiu organizar e produzir esse evento para ser bem sucedido? Jean: Sim. Fiz um sarau lançamento do livro na biblioteca da minha cidade (Arapongas, PR). Utilizei tanto as mídias sociais quanto as tradicionais para convidar as pessoas da região. Fui a algumas rádios, TV’s, jornais etc. Com a ajuda de amigos, montamos a decoração e também houve apresentações artísticas de músicos e de alunos de uma escola de teatro.
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Para uma segunda tiragem ou um novo livro, continuaria de modo independente, ou procuraria uma editora? Recomenda o self-publish? Jean: Já negociei com a Madrepérola a segunda tiragem do meu livro, que provavelmente ficará pronta no começo de março. Também tenho ideias para publicar um novo livro ainda este ano, mas ainda não sei como será a publicação. Quanto ao modo de publicação, acredito que não há uma fórmula que se aplique atodos que pretendem publicar. Há métodos que funcionam melhor em um caso, há outros que funcionam melhor em outros. Cada autor deve considerar quais são as suas necessidades e possibilidades e depois procurar a melhor forma de suprí-las. Por, Diego Guerra
Resenha - J.R.R. Tolkien ~ O Senhor da Fantasia
Título: “J.R.R.Tolkien ~ O Senhor da Fantasia Autor: Michael White Ano de Publicação Original :2013 Relançamento de Edição Comemorativa de 125 anos de Tolkien: 2017 Editora: DARKSIDE Número de Páginas: 275 Em comemoração aos 125 anos do nascimento de J.R.R. Tolkien, a editora Darkside resolve dar de presente aos fãs uma edição mais que especial, lindíssima e luxuosa em capa dura num tom verde com uma aparência rústica e um pôster exclusivo da terra média. O livro é um relançamento da biografia de Tolkien escrita por Michael White que a editora já havia lançado em 2013. Essa biografia em especial contou com uma rápida participação da equipe do site Tolkien Brasil fornecendo informações sobre a bibliografia, aspectos da vida de Tolkien e detalhes. Por isso vale muito mesmo a pena ler o livro e tê-lo já que esta edição está mais para um presente para os leitores que o livro em si. Segundo o jornal “The Independent” esta biografia apresenta Tolkien como alguém vivaz e amante do riso...uma biografia cativante. Essa edição comemorativa de 125 anos é limitada e só estará a venda nas lojas Submarino e Americanas.
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Quem é Michael White? Michael White é autor de mais de 20 livros e ex-editor de ciências da revista britânica GQ e colunista do Sunday Express em Londres. Entre suas obras estão os Best-Sellers internacionais Stephen Hawking - Uma vida para a ciência, biografia sobre C.S Lewis, Maquiavel, Galileu e Isaac Newton. J.R.R. Tolkien Sou completamente suspeita para falar de Tolkien porque sou fã de suas obras desde os 9 anos de idade. Mas me atrevo mesmo assim pois acho que como fã e como resenhista posso ser a porta voz de muitos de vocês leitores. Eu e você fã de Tolkien ou você que só ouviu falar ou que está conhecendo mais desse escritor fantástico sabemos que as obras dele ainda impressiona e influencia milhares de mentes por todo o mundo. Existe uma diversidade infinda de pessoas que admiram as aventuras pela terra média ou que alguma vez já sonhou em viver as aventuras de O Hobbit com Frodo e seu Tio Bilbo no condado. Quem nunca quis ter uma amigo fiel como Sam ou andar pelas terras dos Elfos, lutar com dragões ou mesmo carregar o anel. O que talvez vocês nunca pararam para se perguntar ou mesmo pensar é...quem será Tolkien? Sabemos que foi ele quem escreveu todas essas histórias fascinantes e que por inúmeras vezes me fez viajar para a Terra Média e muitos de vocês também...mas quem era ele? Como se tornou esse gênio da Literatura Fantástica, o Senhor da Fantasia e influenciou e influencia tantas gerações? Ele foi Professor meus caros, e um dia corrigindo provas, inclinou-se para trás em sua cadeira e olhando em volta da sala, de repente, seus olhos foram atraídos pelo carpete próximo a um pé da mesa. Ele observa um minúsculo buraco no tecido e fixa-se nele por um longo momento, sonhando acordado. Então ele volta a atenção para o papel à sua frente e começa a escrever: “em uma toca no chão vivia um hobbit...” e assim dá inicio a essa história fantástica que abre as portas para o mundo que nos foi apresentado como O Hobbit, Silmarillion e O Senhor dos Anéis e Contos Inacabados. Tolkien dedicou mais de 60 anos de sua vida para esta criação única. Mas quais foram as influências que desencadearam a criação? E o que manteve Tolkien imerso e absorvido por tanto tempo? Essas questões são complexas e alguns aspectos, difíceis de explicar, mas devemos ao menos tentar seguir o pensamento de Tolkien e procurar as raízes e os estímulos. (pg 81) Um dos aspectos mais surpreendentes da mitologia de Tolkien é que, como as antigas tradições nas quais se baseava, ele descreve um mundo destituído de cristianismo. A Terra Média é um mundo que, em linguajar cristão, havia ‘caído em desgraça”, mas não havia se redimido. Em outras palavras, é o mundo da primeira infância de Tolkien, um tempo e um lugar anterior ao encontro de sua mãe com a igreja; Sarehole talvez, ou Bloenfontein, mundo no qual sua mãe é jovem e saudável, um mundo onde eles estão juntos. Em seu subconsciente, a cada noite em que Tolkien retomava seu manuscrito, a cada noite que deslizava o papel por sua máquina de escrever, ou começava uma ilustração com tinta e aquarela, ele retornava para os braços de sua mãe. Mas quem poderia censurá-lo? A morte de sua mãe e suas razões foi algo inconsciente, isso não iria nos dar apenas a Terra Média pois ele encontrou a força para seguir a diante em seu escritório tarde da noite pois retornava ao começo de sua infância moldando uma mitologia inteira, produzindo personagens e enredos convincentes e então estruturar uma vasta variedade de material da forma mais legível possível. (pg 86, 87)
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Essa Biografia conta a vida até a morte de Tolkien em detalhes fascinantes os quais nos causa ainda mais admiração pelo professor que nos cativou com sua Literatura Fantástica. Deixo a curiosidade de vocês aguçada para que o que mais quiserem saber sobre esse grande Escritor e essa obra maravilhosa vocês possam conferir no Livro.
Por, Danie Ferreira
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Lanรงamentos
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Abril 2017