Petrobras Magazine Global Connections #64

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Atlântida brasileira Expedição oceânica investiga a história do planeta

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Bem-vindo à nova Petrobras Magazine Global Connections

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Vai além da edição impressa. A versão para tablet é dinâmica e interativa. Você também pode acessar a revista na web. Acesse e participe! Revista impressa —

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stamos felizes em apresentar o novo projeto editorial da Petrobras Magazine. A energia que move globalmente a Petrobras em sua atuação inovadora em exploração e produção em águas profundas e em novas fronteiras exploratórias, como o pré-sal, é fonte de inspiração para esse novo momento. Queremos estar cada vez mais próximos de nossos públicos, trazendo conteúdo relevante, compartilhando ideias e debatendo as grandes questões sobre o futuro da energia. Também estamos abrindo mais espaço para momentos de inspiração, boas histórias e visões inovadoras de pessoas que têm feito diferença no mundo. Nosso desejo de interligar essas diferentes visões passou a ser demonstrado até mesmo no nome da nossa revista: acrescentamos a expressão “Global Connections” ao Petrobras Magazine. Nossa revista já tem 20 anos de existência, numa jornada marcada pela constante inovação. Hoje, o que nos inspira nessa nova fase é poder ampliar nosso diálogo com múltiplas visões, desenvolvendo nossa participação em plataformas diversas e enriquecendo os debates em torno das grandes questões sobre petróleo, gás e o mundo da energia.

Essa edição 64 apresenta novas seções e um novo projeto gráfico, seguindo a identidade global da Petrobras. Para nós, é um prazer apresentar matérias como Dialogues – com os especialistas Mauricio Guedes, diretor do Parque Tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e John McLaughlin, presidente da Associação Histórica Vale do Silício, nos EUA, que nos proporcionam um interessante debate sobre o futuro dos hubs tecnológicos; Over The Seas, que traz um diário de bordo exclusivo sobre uma intrigante expedição submarina no Oceano Atlântico, que contou com a participação de geólogos da Petrobras e instituições brasileiras e internacionais; e a arte instigante da criativa Sarah Morris. Inovadoras e empreendedoras, essas pessoas mostram caminhos inspiradores ao compartilhar um pouco de suas experiências. Convidamos você a conhecer também a nova revista na versão tablet, com mais interatividade e galerias de fotos, vídeos e áudios inéditos. Esperamos que goste do projeto e que possamos ampliar nossa conexão. Boa leitura, Equipe Petrobras Magazine Global Connections

STAFF GERENTE EXECUTIVO DE COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL: Wilson Santarosa | GERENTE DE COMUNICAÇÃO INTERNACIONAL: Eraldo Carneiro da Silva | GERENTE DE PROJETOS ESPECIAIS: Patricia de Mello Dias | EDITORA E COORDENADORA: Estephani Beiler Zavarise | EDITORES: Carlos Aurélio Werneck de Miranda e Silva e Leonardo Queiroz de Sá | EDITORA DE IMAGENS: Suzana Fuhrken Peixoto | ESTAGIÁRIAS: Rafaela da Rocha Costa, Valquíria Helena Duarte da Costa e Caio Santana CONSELHO EDITORIAL ABASTECIMENTO: Gustavo Melione Abreu | ÁREA INTERNACIONAL: Raphael Dias de Souza | CENTRO DE PESQUISAS: Liza Ramalho Albuquerque | EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO: Tarcísio Valente Lima | ENGENHARIA, TECNOLOGIA E MATERIAIS: Michele Nunes Lima | GÁS E ENERGIA: Sandra Vasconcellos Chaves | IMAGEM CORPORATIVA E MARCAS: Alexandre Henrique Pott |IMPRENSA: Paula de Oliveira Almada Moraes | MULTIMEIOS: Leonardo Bruno Bocks Avellar | PETROBRAS BIOCOMBUSTÍVEL: Rodrigo da Costa Coutinho | RELACIONAMENTO COM PÚBLICO INTERNO: Patricia Alves do Rego Silva | RESPONSABILIDADE SOCIAL: Elizete Pompa Antunes Vazquez | RELACIONAMENTO COM INVESTIDORES: Orlando Costa Gonçalves Junior | SEGURANÇA, MEIO AMBIENTE, EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E SAÚDE: Jose Carlos Coelho Cidade | PATROCÍNIO CULTURAL E ESPORTIVO: Fabio Jose Melo Malta


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Exploring PMGC Editorial

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Dialogues

Hubs em nome do futuro tecnológico

12 16 All Over

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Em Davos, um novo índice de energia

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Energy Geek À frente do relógio

Prisma

Mudança Radical & Máxima de Existenz

Over The Seas

Um mergulho no mistério da Atlântida brasileira

Spiral

A bola rola de Norte a Sul

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Inside Story Superligas para o pré-sal

Art Book

Provocações em diagramas

REALIZAÇÃO PUBLISHER: Llorente & Cuenca | EDITOR: Anatricia Borges | JORNALISTA RESPONSÁVEL: Natalia Pacheco | PRODUTOR VERSÃO TABLET: Víctor Valverde | REVISÃO: Raquel Abrantes | TRADUÇÃO: Batata Comunicações | FOTOGRAFIA: Francisco de Souza | EDIÇÃO E COORDENAÇÃO DE ARTE: Yolanda Yebra | DESENHO, ILUSTRAÇÕES E ARTE DIGITAL DA FOTOGRAFIA: Tres Simple | INFOGRÁFICOS: Nicolás Diez, Sebastián D’Aiello e Pini Day A revista Petrobras Magazine Global Connections não é vendida. Para solicitar assinatura, informações e enviar cartas ou sugestões, entre em contato com a redação: Petrobras / Comunicação Internacional Avenida República do Chile 65, sala 1001 - Rio de Janeiro - RJ CEP: 20031-912 Brasil E-mail: petromag@petrobras.com.br Site: www.petrobras.com/magazine O conteúdo desta edição foi fechado em 25/04/2014 A reprodução parcial ou total dos artigos desta publicação é autorizada mediante menção à fonte. Copyright 2014 por Petrobras. Afiliada à Associação Brasileira de Comunicação Empresarial


DIALOGUES

Hubs em nome do futuro tecnológico A cultura empreendedora e a inovação geraram uma espécie de Renascença contemporânea com a criação de hubs tecnológicos em todo mundo. Do Vale do Silício, nos EUA, ao Parque Tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Brasil, estes centros de inteligência têm surpreendido com o desenvolvimento de tecnologias que estão impulsionando o progresso da sociedade


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Global Connections

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as mais de 150 entrevistas que o presidente da Associação Histórica do Vale do Silício, John McLaughlin, realizou com empreendedores da região, entre as décadas de 80 e 90, poucos fundadores de empresas estavam focados em ganhar dinheiro. Steve Jobs, da Apple, John Warnock e Charles Geschke, da Adobe, queriam mesmo exercer um impacto positivo na civilização com a criação de novas tecnologias. O

empreendedorismo impulsionou negócios multimilionários – Apple, Google, Yahoo, Facebook, e-Bay – e resultou numa revolução digital que ditou novos padrões de comportamento na sociedade. Uma Renascença contemporânea que inspirou outros hubs tecnológicos, como o Parque Tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no Brasil, que se tornou um dos principais centros de desenvolvimento de tecnologias relacionadas à área de óleo e gás no mundo.

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Para entender melhor os impactos dos hubs tecnológicos na sociedade, a Petrobras Magazine Global Connections conversou com o cientista político americano John McLaughlin e o carioca Mauricio Guedes, diretor do Parque da UFRJ. Nessa entrevista exclusiva, eles destacam a cultura empreendedora e a inovação desses locais e o que pensam sobre o futuro dos hubs no século XXI.


DIALOGUES

A INSPIRAÇÃO PMGC: Como o Vale do Silício exerceu influência em suas vidas? McLaughlin: Minha família se mudou para o Vale do Silício na década de 50, quando eu tinha 12 anos. Meu pai trabalhava como projetista de foguetes da Marinha no Novo México e iria assumir o cargo de engenheiro chefe de uma startup em Palo Alto. Terminei o ensino médio na época da guerra do Vietnã (1959-1975), e a opção era ir para a faculdade ou lutar na guerra. Fui cursar Ciências Políticas na Universidade de Oregon e me especializei na modernização de sociedades. No final dos anos 1970, voltei ao Vale para uma reunião de colegas do tempo da escola. Percebi que eles tinham se envolvido com uma nova cultura empreendedora, que influenciaria inicialmente os Estados Unidos e, posteriormente, o mundo.

Guedes: Me formei em Engenharia de Produção, em 1975, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e passei toda minha vida profissional na área de ciência e tecnologia. Não como cientista, mas na interação de atividades de pesquisa e empresas. Nos anos 90, começamos a discussão na UFRJ sobre a criação de um parque tecnológico dentro da universidade -classificada como um dos centros de excelência do país. Nossa inspiração era a Universidade de Stanford que, em 1950, havia criado seu parque industrial homônimo. O modelo foi o embrião do Vale do Silício. Nesta época, eu atuava na Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (Coppetec), após ter trabalhado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e na Secretaria de Tecnologia Industrial do governo brasileiro.

PMGC: Para vocês, qual é a importância dos hubs tecnológicos? McLaughlin: Nos hubs, a presença do capital, a troca de ideias e o constante brainstorming criam vantagens competitivas que você não encontra fora de um ambiente como esse. Surgem ideias, como a dos painéis solares para energia, a conexão da internet sem fio e a popularização do uso de drones - não para fins militares, mas para transporte de mercadorias -, como a Amazon já anunciou. Ou seja, você pode ter uma empresa completamente isolada e autossuficiente em qualquer lugar, mas a troca de ideias se perde. E os hubs permitem o intercâmbio contínuo. Guedes: Víamos as experiências bem sucedidas do Vale do Silício e sonhávamos, eu e os pesquisadores da UFRJ, com um ambiente que reunisse

Herdeiros homônimos O nome Vale do Silício (Silicon Valley) tornou-se inspiração para outros centros de tecnologia no mundo. Em Nova Iorque, a área da cidade que concentra as empresas de tecnologia passou a ser chamada de Beco do Silício. A região de Cambridge, na Inglaterra, ganhou o apelido de Pântano do Silício. A cidade indiana de Bangalore, com suas empresas de software, também é chamada de Vale do Silício da Índia. No Brasil, a cidade de Santa Rita do Sapucaí, no estado de Minas Gerais, que concentra empresas de tecnologia no entorno do Instituto Nacional de Telecomunicações, recebeu o apelido de Vale da Eletrônica. JOHN MCLAUGHLIN NASCEU EM EL PASO, NO TEXAS, EM 1949. É cientista político e um dos fundadores da Associação Histórica do Vale do Silício. Criada em 1992, a instituição tem o objetivo de documentar a evolução da região e promover debates sobre o assunto. McLaughlin é autor de vários livros e artigos sobre a história do Vale do Silício e a importância do hub para a evolução da tecnologia mundial, além de diretor de mais de dez documentários sobre empreendedores da região, entre eles “Steve Jobs: Secrets of Life”.

Foto: Cortesia da Fundação Histórica do Vale do Silício


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instituições de pesquisas, centros científicos e empresas inovadoras para desenvolver conhecimento e estimular novas tecnologias. Para mim, os hubs (ou think thanks, como gosto de chamar), além de inspirar o empreendedorismo entre os estudantes, garantem às empresas um acesso diferenciado a laboratórios, profissionais de alta qualificação, a pesquisas de ponta e a novas oportunidades de negócios.

RENASCENÇA CONTEMPORÂNEA PMGC: Os empreendedores já tinham ideia de que os hubs iriam acelerar o desenvolvimento científico e tecnológico da sociedade desta forma? McLaughlin: A introdução de novas tecnologias criou condições para mudanças sociais revolucionárias. Em meados de 1980, eu estava escrevendo um romance com uma máquina de escrever, e um amigo me vendeu um velho Mac Plus. Esta máquina alterou minha dinâmica de trabalho. Eu me vi extremamente imerso na investigação dos efeitos das novas formas de comunicação sobre a civilização. Via jovens, como Jobs e Nolan Bushnell, da Atari, recém-saídos da universidade, montarem negócios sem dinheiro que viriam a ser multimilionários. Era uma espécie de Renascença contemporânea, imbuída de um espírito do ethos [expressão que pode ser traduzida como o caráter ou conjunto de hábitos de uma

determinada comunidade] inovação. Passei a registrar estas mudanças em documentários e, posteriormente, fundei a Associação Histórica do Vale do Silício. Guedes: Sabíamos que o hub da UFRJ ia acelerar o desenvolvimento tecnológico. Não tínhamos dúvida disso. A presença de uma companhia, do porte da Petrobras, iria atrair empresas da cadeia. E a reunião desses empreendedores em um parque tecnológico, naturalmente, desenvolveria o conhecimento técnicocientífico de forma mais acelerada.

A CORRIDA PELO OURO PMGC: Para empreender, é necessário que alguém compre sua ideia. Atrair investidores foi difícil? McLaughlin: No Vale do Silício, as pessoas estavam movidas pelo ethos e focadas em empreender. Eu havia vivido em outros lugares, em Oregon e San Diego, e não era assim. Quando eu apresentava uma ideia de negócio, a resposta que sempre obtinha era: “Onde alguém já fez isso antes?” Ninguém demonstrava interesse em inovar. Mas o ethos da inovação no Vale contaminara a todos. Era difícil explicar isso a alguém no estado do Kansas, por exemplo, mas no Vale do Silício sempre havia quem pensasse: “Vamos fazer de um jeito diferente”. Os primeiros milhões de dólares atraíram investidores de todo o planeta. Você ia

MAURÍCIO GUEDES NASCEU NO RIO DE JANEIRO, EM 1953. É engenheiro de Produção e mestre em Planejamento Energético. Foi um dos fundadores do Parque Tecnológico da UFRJ, no Rio de Janeiro, em 2003, onde atualmente é diretor. Tem uma trajetória profissional com atuação em importantes instituições acadêmicocientíficas do Brasil, como a Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (Coppetec), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e a Secretaria de Tecnologia Industrial do governo brasileiro.

Foto: Francisco de Souza

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“A PRESENÇA DO CAPITAL E A TROCA DE IDEIAS CRIAM VANTAGENS COMPETITIVAS QUE VOCÊ NÃO ENCONTRA FORA DE UM AMBIENTE COMO ESSE”, CONTA MCLAUGHLIN —


DIALOGUES

a uma lanchonete e o gerente dizia que só estava trabalhando lá para conseguir dinheiro para montar uma empresa pontocom, porque muita gente estava ficando rica rapidamente e qualquer ideia era financiada pelo venture capital. Guedes: A Petrobras foi a grande impulsionadora do Parque Tecnológico da UFRJ. Em uma visão empreendedora na década de 60, a companhia decidiu instalar seu Centro de Pesquisas (Cenpes) próximo ao campus da UFRJ, para desenvolver pesquisas e projetos com a universidade. A parceria deu certo

na superação de desafios históricos da companhia, como a exploração em águas profundas. Era um convite para os outros atores privados e públicos da sociedade. O parque foi inaugurado com uma incubadora, seis empresas e um laboratório, para fomentar ciência e tecnologia. Hoje são mais de 40, entre pequenas, médias, grandes empresas e startups, num total de investimentos de mais de R$ 1 bilhão (cerca de US$ 440 milhões) até 2013. Grandes players mundiais do setor de óleo e gás estão se instalando no parque. A General Electric, por exemplo, optou por montar

seu quinto maior complexo industrial do mundo aqui. PMGC: Podemos atribuir a escolha da localização de um hub como a definidora de sua vocação e da capacidade de atrair mais investimentos? McLaughlin: Mais importante do que a localização é o ethos. E, no Vale do Silício, ele é difícil de ser codificado. Só uma catástrofe, guerra mundial ou epidemia global seria capaz de destruir isto. Porque é uma ideia que

O Parque Tecnológico da UFRJ em cifras • Cerca de US$ 440 milhões

em investimentos em 10 anos

• 12 grandes empresas

a maioria do setor de óleo e gás, entre elas, Halliburton, Schlumberger FMC Technologies e Baker Hughes

• • • •

9 pequenas empresas 22 startups 4 laboratórios da UFRJ 3.000 pesquisadores

trabalham nas companhias localizadas no complexo

Fonte: Parque Tecnológico da UFRJ

O Parque Tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro, fundado em 2003, ocupa 350.000 m2 Foto: Genílson Araújo/Divulgação Parque Tecnológico da UFRJ


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continua a replicar em si mesma. Há muitos projetos que saíram daqui e não chegaram a lugar nenhum. Mas os que deram certo inspiraram uma infinidade de outros. Os empreendedores que são atraídos para o Vale do Silício, ou que cresceram aqui, têm um objetivo em comum. Nas mais de 150 entrevistas que fiz para a Associação Histórica do Vale do Silício e para meus livros, poucos fundadores de empresas estavam focados em ganhar dinheiro. A maioria, como Steve Jobs, estava decidida a exercer um impacto positivo na civilização por meio da tecnologia.

O dinheiro é consequência de uma boa ideia empreendedora.

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tecnológica e o desenvolvimento científico. E os investimentos aumentam com o êxito dos projetos.

Guedes: O Parque Tecnológico da UFRJ foi impulsionado por dois fatores fundamentais: a presença de uma empresa âncora, a Petrobras, e a descoberta da camada de petróleo do pré-sal anunciada em 2007. Outro ponto importante é a criatividade do brasileiro, somos reconhecidos internacionalmente por nossa capacidade criativa. Qualquer parque tecnológico, para ser bemsucedido, tem que ter afinidade com as vocações regionais, acadêmicas e econômicas do local. Para mim, o principal resultado social das atividades do parque é o surgimento de novos negócios e novas empresas, de serviços e produtos impulsionados pela inovação

RISCOS E DESAFIOS PMGC: Em 2001, o estouro da bolha das empresas pontocom provocou uma retração nos investimentos e um repensar sobre o modelo dos hubs. O empreendedorismo ainda é muito condicionado ao capital? McLaughlin: No auge da bolha da internet (1990), qualquer um com um MBA e uma ideia minimamente decente conseguia capital de investidores para desenvolver projetos. Havia um excesso de otimismo. Aí a bolha estourou em 2001 e os investimentos escassearam.

O Vale do Silício em números • US$ 12,125 bilhões

em investimentos em 2013

• 1.826 empresas

de tecnologia em 2013, entre elas as megacorporações Apple, Google, Facebook, Linkedin e Twitter

• 46,9% das patentes

registradas nos Estados Unidos procedem do Vale do Silício

• 1,42 milhão

de pessoas trabalham no Vale do Silício

Fonte: Silicon Valley Index

O Vale do Silício abrange várias cidades do estado da Califórnia, como Palo Alto e Santa Clara. Se estende por 3.000 Km2 Foto: Cortesia da Fundação Histórica do Vale do Silício


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“NO VALE, AS PESSOAS ESTAVAM FOCADAS EM EMPREENDER”, CONTA MCLAUGHLIN —

1. Steve Wozniak e Steve Jobs, fundadores da Apple 2. Prédio do laboratório da Coppe LAMCE, Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia, no Parque Tecnológico da UFRJ 3. O chip criado pela Intel, em1978 4. Um dos primeiros teclados de computador 5. “Traitorous Eight”, grupo de oito engenheiros que criou a Fairchild Semiconductor, empresa que produziu o primeiro circuito integrado comercialmente disponível

1. Foto: Cortesia da Fundação Histórica do Vale do Silício

Eu tive vizinhos que tinham negócios de US$ 30 milhões e, no dia seguinte, valiam US$ 2 milhões. As grandes inovações, no entanto, permaneceram. O que ocorreu é que os investidores ficaram muito mais criteriosos. Em consequência, tivemos outra mudança significativa: as ideias deveriam ter um sólido fundamento e um atrativo e realístico plano para fazer dinheiro. Em 2008, a recessão econômica americana promoveu outra reflexão sobre o modelo dos hubs, mas empresas inovadoras, como o Google, a Apple e o Facebook, se adaptaram. Numa sociedade dinâmica como a da informação, novas ideias sempre vão surgir e alguém vai investir. Guedes: Um dos desafios de um hub é manter sempre o cerne da inovação. Mas esses espaços precisam atrair um grande número de empresas de pequeno e médio porte, que dependem dos investidores para empreender, e de grandes empresas, que promovam um ambiente sinérgico de estímulo à criatividade. Em 2003, já havíamos acompanhado a curva das empresas pontocom. Fazendo um paralelo com o Vale do Silício, precisamos evoluir na cultura de aceitação do risco, que ainda é algo recente no Brasil. E a aversão ao risco é um fator que desacelera o processo de inovação. Mas não o vejo como um delimitador. Estamos avançando com linhas de investimento com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento

2. Foto: Parque Tecnológico da UFRJ / Divulgação

Econômico e Social (BNDES), dos fundos privados e da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), e, cada vez mais, atraindo investidores de venture capital.

ERROS DE PERCURSO PMGC: Mas os hubs não apresentaram somente êxitos, existem relatos de erros históricos em seu percurso. É um risco do empreendedorismo? McLaughlin: Toda ideia empreendedora oferece riscos, mas é preciso ver anos à frente, talvez séculos. A Xerox ganhava bilhões de dólares com a venda de copiadoras e, principalmente, dos materiais químicos necessários para a realização de cópias, tinha um complexo de pesquisa em Palo Alto. Eles tinham ethernet [arquitetura de interconexão para redes locais] dentro da empresa e já mandavam e-mails uns pros outros. Mas a Xerox temia que a popularização dessas tecnologias competisse com as copiadoras. John Warnock e Charles Geschke, que trabalhavam lá, deixaram a companhia frustrados porque viam aquela tecnologia incrível, mas o foco em outro lugar. Saíram e fundaram a Adobe. A Hewlett-Packard achou que jogos eletrônicos em relógios de pulso eram o futuro. Essa ideia não deu em nada, e a companhia descontinuou o projeto e seguiu adiante. Guedes: Empreender contempla assumir riscos. Prevê-los é uma das bases da matriz de gestão de projetos. No entanto, em dez anos, temos mais histórias de êxitos do que de insucessos. Ano passado, a Petrobras recebeu o Prêmio de Inovação Tecnológica concedido pela


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Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), em reconhecimento ao desenvolvimento do Sistema de Separação Submarina Água-Óleo (SSAO), instalado no campo de Marlim, na Bacia de Campos (RJ). O protótipo dessa tecnologia foi desenvolvido pela companhia e a FMC Technologies, uma das empresas do complexo. Temos vários exemplos de criação de novos produtos e serviços, principalmente no âmbito das startups. Um deles é o oil finder, um software de modelagem matemática, que rastreia vazamentos de óleo no leito do mar. Estes projetos representam avanços significativos para a indústria de óleo e gás.

riscos. Em Tel Aviv, um dos mais bem sucedidos paralelos do Vale do Silício, eles já avançam com base nessa cultura empreendedora. Acho que a dinâmica social deste século vai exigir seu contínuo repensar, mas as experiências já comprovam que o hub é um modelo bem sucedido. A inspiração ainda é a do jovem desenvolvedor que cria um aplicativo, como WhatsApp, e vende por US$ 16 bilhões para outro gigante tecnológico, o Facebook. Guedes: Não vejo ameaças e sim evolução. Um parque tecnológico tem que ser um local criativo, estimular o conhecimento e unir atores diferentes. É um think thank para o desenvolvimento de uma vocação local. Nossa experiência tem demonstrado isso. Os grandes players de óleo e gás têm atraído muitos pesquisadores e profissionais de todo o mundo. É algo que só tende a crescer. Em nosso parque estão instalados centros de pesquisa de pelo menos 12 grandes empresas, quatro laboratórios da UFRJ, nove pequenas empresas, além de 22 startups - localizadas na incubadora da universidade. Cerca de três mil pesquisadores trabalham nas companhias do complexo. Precisamos de mais pesquisadores e eles vão chegar.

O FUTURO PMGC: Nos últimos meses, alguns teóricos afirmaram que o Vale do Silício passa por um novo renascimento e pela ameaça da criação de outros modelos de desenvolvimento tecnológico. A dinâmica social exige repensar continuamente o papel dos hubs? McLaughlin: Agora parece que a roda girou novamente. Eu conversei recentemente com um grupo de escoceses que vêm tentando dar início a um Vale do Silício entre Glasgow e Edimburgo por anos. Eles buscam engenheiros elétricos nas universidades escocesas, oferecem dinheiro para eles criarem empresas... Encontram bons estudantes, com bons históricos e com a esperança de construir um novo Google, uma nova Apple e um novo Facebook, mas eles têm medo de assumir os

3. Fotos: Cortesia da Fundação Histórica do Vale do Silício

PMGC: O que vocês arriscariam falar sobre o futuro dos hubs? McLaughlin: Em qualquer atividade, timing e oportunidade são absolutamente cruciais. E, infelizmente, esses fatores não dependem em nada de nós. O que nós podemos fazer é estar no lugar certo, na hora certa, com as

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ferramentas adequadas. Eu não tenho a menor dúvida de que ainda vão sair coisas incríveis do Vale do Silício, que vão mudar o mundo pelos próximos cem anos. Guedes: O futuro do parque tecnológico é muito promissor. Amplia a posição do Brasil como grande desenvolvedor de tecnologia. Na verdade, já somos reconhecidos pelo êxito na exploração e produção de óleo e gás e por nossas reservas. Obviamente, os próximos anos vão gerar mudanças, algumas vão exigir nossa adaptação, mas muitas serão impulsionadas por nós.

“UM PARQUE TECNOLÓGICO DEVE SER UM LOCAL CRIATIVO, ESTIMULAR O CONHECIMENTO E UNIR ATORES”, AFIRMA GUEDES —

5.


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Em Davos,

um novo índice de energia

é reorganizar esta arquitetura, ajudando os governos e líderes do setor a identificar e priorizar áreas que precisam ser otimizadas, adotando o índice como um padrão de gerenciamento”, disse Arthur Hanna, diretor-gerente de Energia da Accenture, no painel The Energy Context (O Contexto da Energia).

T

rês painéis debateram o tema energia na 17ª edição do Fórum Econômico Mundial (WEF), realizado entre 22 e 25 de janeiro em Davos, na Suíça. Com a presença de chefes de Estado, empresários e líderes de opinião, a edição do fórum teve como destaque a apresentação do relatório The Global Energy Architecture Performance Index 2014 (Índice de Desempenho da Arquitetura Global da Energia 2014), elaborado pela comissão de energia do WEF e a consultoria Accenture.

No documento, os especialistas propõem um novo índice de eficiência energética a partir da análise do sistema atual global – baseado nas demandas e ofertas de energia e seus impactos ambientais em 124 países. “Um dos maiores desafios dos países é conciliar crescimento econômico e sustentabilidade. Hoje, temos uma arquitetura global de energia muito complexa, em função de economias em estágios distintos, dos recursos energéticos disponíveis e de culturas de consumo diferenciadas. Nossa proposta

A primeira etapa do estudo, que durou três anos para ser concluído, exigiu o desenvolvimento da metodologia para a formulação dos indicadores de avaliação e classificação do desempenho dos países. “Chegamos à conclusão de que deveríamos fundamentar o índice em três dimensões-chave, que denominamos de triângulo da energia. Avaliar, em cada país, o crescimento e desenvolvimento econômicos, a produção e o consumo de energia sustentável e segura, além de seu acesso universal. Na segunda etapa, definimos parâmetros para mensurar como o grau da estrutura energética do país soma ou subtrai valor à economia, o impacto ambiental entre sua oferta e


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A PROPOSTA É REORGANIZAR A ARQUITETURA GLOBAL DE ENERGIA, ADOTANDO O ÍNDICE COMO UM PADRÃO DE GERENCIAMENTO — consumo de energia e as perspectivas de acesso seguro às novas fontes. Isto viabilizou a definição de indicadores econômicos e ambientais como, por exemplo, a quantidade de dióxido de carbono emitido pela indústria de energia de cada país e o preço de biocombustíveis em cada mercado”, ressaltou Roberto Bocca, diretor de Energia do Fórum Econômico Mundial.

O índice de eficiência energética considerou, ainda, a divisão dos países em blocos – América do Norte, União Europeia, Oriente Médio e Norte da África e Brics. O relatório aponta que a União Europeia e os países nórdicos conseguem as melhores pontuações na relação entre desenvolvimento econômico e baixas emissões de carbono. Já entre os Brics, o Brasil

é destaque, apresentando a menor emissão de carbono em função de sua matriz de geração de energia elétrica, baseada principalmente em hidroeletricidade. Mas o relatório alerta que mesmo os países mais bem colocados – Noruega, Nova Zelândia, França, Suécia, Suíça, Dinamarca, Espanha e Letônia – estão distantes de um sistema energético equilibrado.

O painel sobre o contexto energético global foi apresentado na reunião anual de 2014 do Fórum Econômico de Davos

Foto: Rémy Steinegger / Cortesia do Fórum Econômico de Davos


ALL OVER

O DESEMPENHO MÉDIO DOS PAÍSES —

O evento contou com a presença de líderes de governo, empresários e formadores de opinião de mais de 120 países

Referência: América do Norte Oriente Médio e Norte da África

União Europeia Brics

(ín di

Porcentagem d de lidade que usa co a popula Qua imento de mb ç c e sólidos para ustíveis ão Im n a c i r r fo rgia elét cozin p har ene de orta e ç elé ner ões tri gia ca

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Ene rgi e aa n uc ltern lea at r iva

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de Eco ca com nom rro b ia d e p ust m as í sa

OS DEZ PAÍSES MAIS EFICIENTES

OS BRICS

Posição

Posição

1º Noruega 2º Nova Zelândia 3º França 4º Suécia 5º Suíça

Contagem 0,75 0,73 0,72 0,72 0,72

eletricidade Exportaçõe os de combus s de Preç a a indústria tível par

6

30

Ga s Nív olin el a P d r de e di em pr sto i eç r os

l de s íve o - N reç el de p es Di rção o um ão dist ç

e ção dara p ifica Segurança e acesso Im ers rtidas v i por D rapa tação hl) à energia elétrica combtações t or a d p n n fi im ustí de co r e H vel ice (índ de 5 a ) id ES ahl s r ve TP nd Di de erfi H ce

Posição 6º Dinamarca 7º Colômbia 8º Espanha 9º Costa Rica 10º Letônia

Contagem 0,71 0,70 0,67 0,67 0,66

Contagem

1º Brasil 2º Rússia 3º África do Sul 4º Índia 5º China

FONTE: The Global Energy Architecture Performance Index Report 2014. O Fórum Econômico Mundial e Accenture. © 2013

0,64 0,62 0,54 0,48 0,45

Fotos: EFE

Para Bocca e Hanna, a receptividade em Davos ao novo índice foi positiva. O próximo passo trata da elaboração de uma agenda de trabalho com representantes dos governos e de grandes companhias do setor de energia, com o objetivo de orientar investimentos, promover análises, definir estratégias e avaliar a eficácia das ações conjuntamente. “Podemos estar mais próximos de uma nova configuração mundial de energia e de uma transição eficaz, que redesenhe e reoriente em direção a uma nova arquitetura global sustentável e de acesso seguro e universal a todos os países”, disseram os especialistas.


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Novo desafio tecnológico A Petrobras está de volta às pistas de Fórmula 1, como parceira técnica da Williams Martini Racing. Em fevereiro, a companhia fechou contrato de parceria tecnológica com a equipe, marcando o retorno da colaboração entre as empresas, que começou em 1998 e durou 11 anos, durante os quais a equipe utilizou os combustíveis da Petrobras. Desta vez, Petrobras e Williams Martini Racing trabalharão em conjunto com a fornecedora de motores da equipe para o desenvolvimento de combustíveis e lubrificantes, que poderão ser usados a partir da temporada 2015. Em 2014, a Petrobras terá sua logomarca posicionada na lateral do chassi do Williams FW36 e em todo o ambiente e vestuário da equipe. Este ano, a Williams Martini Racing é representada pelo piloto brasileiro Felipe Massa e pelo finlandês Valtteri Bottas. A chefe-adjunta e diretora comercial da equipe, Claire Williams, que assinou o contrato na sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, ressaltou a importância da parceria. “Quando estávamos procurando o fornecedor de combustível, é claro que queríamos fazer parceria com o melhor. E a Petrobras é uma das melhores empresas de combustíveis do mundo. Sabemos que eles vão entregar um produto muito forte para fazer nossos carros correrem mais rápido. E também esperamos ajudar na melhoria de seus produtos. Assim, os consumidores no Brasil poderão se beneficiar.” Desde 2009, a companhia também é patrocinadora e dá nome ao Grande Prêmio Petrobras do Brasil de Fórmula 1.

Foto: Antonio Milena / Banco de Imagens Petrobras

Graça Foster, presidente da Petrobras, e Claire Williams, chefe-adjunta e diretora comercial da equipe

Eventos para ampliar a network RIO OIL & GAS

Realizada a cada dois anos, a Rio Oil & Gas Expo and Conference – principal evento de petróleo e gás da América Latina – acontecerá no Rio de Janeiro, de 15 a 18 de setembro. Desde sua primeira edição, em 1982, o evento colabora na consolidação do Rio de Janeiro como “capital do petróleo”, já que o estado concentra 80% de todo o óleo produzido no país e 50% da produção de gás. Além do estande da Petrobras, representantes da companhia participarão de uma série de plenárias, fóruns, sessões especiais e mesas redondas sobre o cenário atual e as perspectivas globais do setor. Veja a programação no site www.riooilgas.com.br

SÃO FRANCISCO MONEY SHOW

De 21 a 23 de agosto, os maiores especialistas em finanças vão falar sobre suas estratégias para obter os melhores lucros no mercado de ações. Os experts irão fornecer informações aprofundadas sobre o mercado financeiro, ações e setores de alta performance. Além disso, dezenas de empresas vão enviar seus representantes para apresentar suas perspectivas e conversar com o público. O evento será realizado no Hilton San Francisco Union Square. Mais informações no site www.moneyshow.com


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À frente

do relógio Conheça como a Petrobras criou um programa de redução de custos que adiantou o relógio da produção do pré-sal e gerou economia de US$ 344 milhões em 2013

Foto: Thinkstock / Banco de Imagens Petrobras


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OS DESAFIOS Na área de Exploração e Produção (E&P) da Petrobras, os ponteiros do relógio adiantaram com a descoberta do pré-sal, em 2006. Os grandes volumes de petróleo, que poderiam mais do que dobrar as reservas da companhia, haviam colocado a Petrobras à frente de um grande desafio: perfurar mais poços em menos tempo. Nos anos seguintes, a demanda por sondas, prestação de serviços e projetos aumentou rapidamente, e a tendência é de um crescimento contínuo – até 2020, a Petrobras planeja mais do que dobrar sua produção, alcançando 4,2 milhões de barris de óleo por dia. O número de poços marítimos perfurados por ano, que, entre 2007 e 2011, atingiu a média de 87, deve chegar a 133 até 2016. Já a frota de sondas de perfuração cresceu 150% entre 2003 e 2013, de 28 para 70 unidades. A grande carteira de poços, a quantidade de equipamentos necessários e os desafios exploratórios eram fatores que criavam, em 2013, um cenário de elevados custos na construção de poços, representando 32% (US$ 75 bilhões) de todos os investimentos previstos no Plano de Negócios e Gestão da companhia na época (2013-2017), e 51% de todos os investimentos em exploração e produção (E&P) no Brasil. “No pré-sal, o custo diário das sondas chegava a US$ 600 mil. Na Bacia de Campos, era de US$ 300 mil. Enquanto os poços da Bacia de Campos levavam 90 dias para serem perfurados, os do pré-sal exigiam 200. E os gastos representavam 50% de todo o investimento em um projeto”, explica Renato Pinheiro, gerente geral de Construção e Manutenção de Poços/ Desenvolvimento e Produção 1, da área de E&P.

A CRIAÇÃO DO PRC-POÇO Em função deste cenário, a Petrobras lançou o Programa de Redução de Custos de Poços (PRC-Poço) em maio de 2013. Atualmente, o programa tem como meta reduzir em cerca de US$ 6,3 bilhões os custos com construção de poços até 2018. Para isso, é fundamentado em 23 iniciativas, divididas em três grandes diretrizes: a redução de custos unitários, a otimização do escopo de projetos e os ganhos de produtividade. A primeira diretriz está diretamente relacionada à diminuição dos valores pagos, sobretudo com sondas, por meio da otimização das embarcações e a contratação de unidades mais simples. A segunda, de otimização do escopo de projetos, trata dos processos de análise e seleção de informações para tornar a aquisição de dados mais objetiva e os projetos mais simples. E a terceira, relacionada aos ganhos de

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CERCA DE 80% DA REDUÇÃO DE CUSTOS VIERAM DA OTIMIZAÇÃO DOS POÇOS DO PRÉ-SAL, E OS OUTROS 20% DOS PROJETOS DO PÓS-SAL — Plataforma de perfuração SS-69 operando no campo de Lula, na Bacia de Santos Foto: Manuel Aguiar / GALP / Banco de Imagens Petrobras


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TECNOLOGIA DOS POÇOS DO PRÉ-SAL —

O Programa de Redução de Custos de Poços tem três grandes diretrizes: a diminuição dos valores pagos, sobretudo com sondas, por meio da otimização das embarcações e a contratação de unidades mais simples; a otimização do escopo de projetos, que trata dos processos de análise e seleção de informações para tornar a aquisição de dados mais objetiva e os projetos mais simples; e os ganhos de produtividade utilizando uma metodologia para aproveitar melhor a experiência adquirida – como a repetição de casos bem sucedidos de perfuração e completação de poços.

TORRE DE PERFURAÇÃO

SONDA SEMISSUBMERSÍVEL Perfura e completa poços de petróleo no mar

BARCO DE APOIO

COLUNAS DE SUSTENTAÇÃO com função de estabilidade

RISER DE PERFURAÇÃO Comunica o poço no fundo do mar com a sonda de perfuração O

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POÇO VERTICAL Coluna de produção, responsável por trazer o óleo dos reservatórios até a Árvore de Natal Molhada


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produtividade, utiliza uma metodologia para aproveitar melhor a experiência adquirida – como a repetição de casos bem sucedidos de perfuração e completação de poços.

NAVIO PLATAFORMA FLUTUANTE DE PRODUÇÃO - FPSO Recebe a produção dos poços, armazena petróleo e exporta gás e óleo

NAVIO SONDA Perfura e completa poços de petróleo no mar

BARCO DE APOIO

TORRE DE PERFURAÇÃO

MENOS TEMPO, MAIS ECONOMIA O relógio da Petrobras começou a adiantar. “Se, na média, os poços do pré-sal no primeiro projeto do campo de Lula levaram 205 dias para serem perfurados e completados, em outros dois projetos – um no campo de Sapinhoá e outro em Lula – a projeção já nos leva a apenas 163 dias de média, com viés de redução”, explica Pinheiro. Em janeiro deste ano, a Petrobras concluiu o poço SPH-5, no campo de Sapinhoá, em apenas 109 dias, incluindo perfuração e completação – o recorde obtido até então. Este poço situa-se na Bacia de Santos, em lâmina d’água de 2.126 metros e com profundidade total de 5.334 metros.

RISERS DE PRODUÇÃO/INJEÇÃO Conecta os poços ao FPSO RISER DE PERFURAÇÃO Comunica o poço no fundo do mar com a sonda de perfuração ÁRVORE DE NATAL MOLHADA

POÇO HORIZONTAL Aumenta a área de exposição do reservatório ao poço

“Um dos pontos importantes do PRC-Poço foi a criação da metodologia de curva de experiência, para viabilizar a transferência do aprendizado aos projetos de E&P. Usamos o conceito da indústria e adaptamos ao pré-sal. Como há grande quantidade de poços em águas ultraprofundas, o novo método foi aplicado ao processo de perfuração e depois expandido para a área submarina, que contempla a interligação de poços e conexões”, diz Pinheiro.

BOP – BLOWOUT PREVENTER 1- Sistema de válvulas de controle para garantir a segurança na operação do poço 2- Controla fluxo do poço durante intervenção com sonda 3- O equipamento pode pesar até 400 toneladas e ter 15 metros de altura

FONTE: Petrobras

De maio a dezembro de 2013, a economia com o PRC-Poço atingiu US$ 344 milhões, 11% a mais que o planejado para o período (US$ 310 milhões). “Cerca de 80% da redução vieram da otimização dos poços do pré-sal, e os outros 20% dos projetos do pós-sal”, destaca Pinheiro. “Nossa pretensão é entregar poços mais baratos, com qualidade, segurança e menor duração no tempo de construção, tentando antecipar a entrega para que tenhamos um reflexo na curva de produção da companhia”, resume.


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EM JANEIRO DE 2014, A PETROBRAS CONCLUIU O POÇO SPH-5 EM APENAS 109 DIAS, O RECORDE ATÉ ENTÃO — SOLUÇÕES EMPREENDEDORAS Os efeitos do programa só foram possíveis pelo empreendedorismo da equipe e o ineditismo do conjunto de soluções implantado, como a utilização de embarcações especialistas, por exemplo, e muito uso da engenharia. “As lições aprendidas dos poços anteriores e o uso intensivo da engenharia permitiu a redução de fases de quatro para três e completações mais baratas. Esse modelo está em fase de implementação. Mas como cada dia custa em torno de US$ 1 milhão, incluindo sonda, materiais e serviços, cada dia economizado vale muito a pena. São valores expressivos”, ressalta Pinheiro.

A implantação do Pronova – sistema online de acompanhamento das operações de todas as sondas em atividade – também contribuiu para os resultados. Os parâmetros por turno e tarefas são monitorados para a avaliação do desempenho médio de cada área, com o objetivo de criar um padrão operacional para as sondas e, assim, aperfeiçoar o processo de perfuração. O Pronova está associado ao programa Coaching – ainda em implantação –, que prevê a atuação de uma equipe nas unidades para monitorar in loco toda a ação do grupo de trabalho e operação. O programa já está sendo testado em 25 sondas e será reproduzido em toda a frota. INTEGRAÇÃO DE EQUIPES No PRC-Poço, a parceria com as outras áreas também é crucial. A de Logística, por exemplo, é fundamental para garantir a disponibilidade dos insumos necessários à perfuração e completação no tempo adequado, evitando ineficiência no processo de construção de poços. A área coordena os serviços e o atendimento a

A área de E&P solicitou à Universidade Petrobras a criação de um programa de capacitação para projetistas de perfuração e completação de poços

Foto: Bruno Veiga / Banco de Imagens Petrobras


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Foco na capacitação O crescimento do número de sondas marítimas e a necessidade de melhorias nos projetos levaram a área de E&P a solicitar à Universidade Petrobras a criação de um programa de capacitação destinado aos projetistas de perfuração e completação de poços. Além de suprir a carência de especialistas na área, o objetivo do programa, que tem duração de quatro meses, é adequar a mão de obra às novas tecnologias e aos ajustes implantados nas operações, além de aumentar a interação com áreas, como as de geologia, reservatórios, elevação, operações de produção e equipamentos.

Foto: Taís Peyneau / Banco de Imagens Petrobras

Foto: Geraldo Falcão / Banco de Imagens Petrobras

O curso, criado em 2007, formou 121 projetistas de perfuração e 57 de completação até 2013. Um dos resultados do programa foi o desenvolvimento do projeto True One Trip (TOT), que tem como objetivo reduzir o tempo de completação nos poços injetores. O sucesso do programa levou a Universidade Petrobras a criar outros cursos similares, com turmas previstas para 2014 e 2015.

todas as sondas, plataformas de produção, os portos e o processo de unitização das cargas (acondicionamento de volumes) – atividades que vêm crescendo com o aumento das operações na área do pré-sal. “Construção de poços não é uma tarefa só de uma área, é uma ação que envolve toda a cadeia interna. O processo passa pela definição do escopo na área de reservatório; por um bom modelo geológico, que vai gerar um prospecto

de elaboração do projeto de perfuração; e pela área de Suprimentos, que vai fazer as contratações e as negociações com os fornecedores. Depende ainda do cronograma de sondas, com mais de 100 poços para perfurar por ano. Ou seja, é uma combinação de muitos fatores. O PRC-Poço é o resultado de um trabalho conjunto e não apenas da equipe de poços”, ressalta Pinheiro. Atualmente, 400 profissionais estão envolvidos no programa.

O objetivo da Petrobras é entregar poços mais baratos, com qualidade, segurança e menor duração no tempo de construção


PRISMA

Mudança Radical Máxima de Existenz

&

Por Francesco Morace —

M

udança Radical - a enorme transformação global que ocorre em todo o mundo – é visível a todos hoje em dia. As empresas agora precisam aprender a navegar estrategicamente de acordo com as direções das alterações tecnológicas e sociais que estão tornando essa mudança global inevitável. Uma metamorfose que está afetando todas as gerações e classes sociais: o Brasil, nesse sentido, torna-se uma espécie de laboratório a céu aberto.

PERFIL Sociólogo, escritor e jornalista, Francesco Morace trabalha há 30 anos no campo de pesquisa sociológica e de mercado e é o presidente do Future Concept Lab. Ele leciona na Domus Academy e na Politecnico, em Milão, e atua como consultor estratégico para várias empresas italianas e estrangeiras. Já ministrou cursos e seminários em 25 países. É autor de mais de 20 livros e escreve colunas regularmente para Adv, Interni, Mark Up e outras revistas e periódicos internacionais especializados. Siga Francesco no Twitter: @francescomorace Saiba mais informações sobre Francesco Morace e o Future Concept Lab em www.futureconceptlab.com

Gestores e criativos brasileiros terão de depender cada vez menos das centenas de tendências que surgem todos os dias na Internet e, em vez disso, precisarão se concentrar mais estrategicamente no futuro de seus negócios, por meio da adoção de métodos de abordagens/respostas à Mudança Radical em curso, e de acordo com os paradigmas do futuro: sustentabilidade, compartilhamento, experiências felizes e singularidade. Esses são os valores para os quais as gerações mais novas estão voltadas hoje em dia.

O novo cenário de existência individual em um período de mutação radical é marcado por uma mentalidade de “não se acomodar” e é constituído nesses territórios integrados, entre o real e o virtual, que moldam a sociedade atual, exatamente como ocorre no Brasil. Esse panorama marca uma aceleração inesperada da nova direção da Máxima de Existenz: uma orientação que estabelece que a mais elevada satisfação decorre da intensidade de ideias vitais, as quais não têm custo e são fáceis de compartilhar. Por exemplo, é nessa dimensão que a noção de Freemium tem obtido sucesso; uma experiência gratuita que depois se transforma em um modelo de negócios que proporciona experiências privilegiadas aos consumidores, as quais são tanto de preço elevado quanto de valor. Assim como no mundo da música: compartilhamento de arquivos gratuitos e, em seguida, shows ao vivo, que às vezes são muito caros para frequentar. Essa é uma nova forma de acessibilidade e de democracia: tudo imediatamente disponível para todos, sem


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progressividade. Os comportamentos diários dos consum-autores estão, portanto, se movendo cada vez mais em direção ao que uma vez foram as experiências mais

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ousadas do avant-garde do século XX: explorar o universo das redes sociais, agora habitado por bilhões de pessoas, equivale a uma viagem ao mundo dos nossos sonhos; com estética, línguas, hábitos e oportunidades que, por vezes, ultrapassam até mesmo as imaginações selvagens de Magritte ou de Max Ernst. Dessa forma, e sem qualquer custo, desaparece o contraste entre nicho e comercial (mainstream), e as cidades inteligentes são conhecidas por excentricidades pessoais. Isso ocorre porque as novas tecnologias viabilizam uma explosão espontânea de singularidade criativa e intensidade máxima de experiências no cotidiano: as pessoas estão aprendendo a preencher o espaço que a Internet lhes oferece com conteúdos relacionados aos seus talentos pessoais e às suas histórias biográficas, os quais são posteriormente transferidos às suas vidas reais, aos seus relacionamentos e aos seus trabalhos, através da onipresença das redes sociais. O “novo realismo” dos consumautores afeta as oportunidades na vida que são reinterpretadas ao máximo de seu potencial, de uma forma livre e criativa e, no futuro, os brasileiros poderiam se tornar os campeões da Máxima de Existenz, não só por meio de samba, Bossa Nova, futebol e carnaval, mas também através de suas marcas e de seus produtos.


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Um mergulho

no mistério da Atlântida brasileira


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Uma expedição científica nipo-brasileira no Oceano Atlântico investiga a Elevação do Rio Grande, um gigantesco planalto submerso em águas internacionais. A pesquisa na região, que está sendo apelidada de Atlântida brasileira, e em áreas próximas poderá ajudar a esclarecer episódios da história do planeta, mudar limites marítimos e influenciar a produção de recursos minerais

A MITOLÓGICA ATLÂNTIDA Nos escritos do filósofo grego Platão, Atlântida é uma rica e lendária ilha, habitada por uma civilização que conquistou muitas partes da Europa Ocidental e da África por volta de 9.600 anos antes de Cristo. Porém, após uma tentativa fracassada de invadir Atenas, afundou, por castigo dos deuses, no oceano em um único dia e noite de infortúnios. Em 2013, uma expedição oceanográfica nipo-brasileira à Elevação do Rio Grande – um gigantesco planalto submerso no meio do Oceano Atlântico, situado a cerca de 1,5 mil quilômetros da costa sul do Brasil – trouxe à tona o sonho mitológico do arquipélago perdido para pesquisadores japoneses e brasileiros, que apelidaram a região de “Atlântida brasileira”. A hipótese é de que o elevado era parte de um continente e afundou após a América do Sul e a África se separarem, há 130 milhões de anos. A expedição, que começou na costa africana rumo à margem brasileira, recolheu informações geológicas em diversos pontos do Oceano Atlântico. Esses indícios poderão ajudar a esclarecer o processo de ruptura dos continentes, que deu origem à formação atual dos oceanos. Os resultados dos estudos – que abrangem também pesquisas de vida marinha em

ambientes extremos – poderão ainda levar ao aumento do domínio marítimo científico do Brasil, fornecer importantes informações para a investigação de petróleo e gás e tornar a Elevação mais uma fonte de recursos para o país. Os principais momentos destes expedicionários foram relatados em um diário de bordo exclusivo à Petrobras Magazine Global Connections. DAS ROCHAS AO MAR Os 33 anos do geólogo Adolpho Augustin, pesquisador do Centro de Excelência em Pesquisa e Inovação em Petróleo, Recursos Minerais e Armazenamento de Carbono (Cepac) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), revelam uma trajetória profissional extensa para alguém de sua idade. Nos últimos três anos e meio, Augustin trabalha com pesquisa em mar para projetos em parceria com a Petrobras. Participou de várias missões e embarques marítimos, mas sempre ficou no navio ou, no máximo, olhava as profundezas por meio de uma câmera instalada em um robô que submergia. As missões marítimas também não eram uma novidade para o experiente

geólogo Fernando Freire, de 52 anos, que trabalha no Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), no Rio de Janeiro. Assim como a relação com pesquisadores japoneses. Freire fez doutorado no Japão e tem bastante experiência na utilização dos ROVs (veículos de operação remota). Os dois geólogos participaram da expedição Iatá-Piuna – nome dado à etapa brasileira do projeto oceanográfico internacional “Quelle 2013 – Busca pelos Limites da Vida”. A iniciativa global liderada pela Agência Japonesa de Ciência e Tecnologia da Terra e do Mar (Jamstec) busca formas de vida em ambientes marinhos extremos por todo o mundo com o auxílio do submarino Shinkai 6500, capaz de submergir a 6,5 mil metros de profundidade. As indicações de Adolpho e de Freire partiram de Adriano Viana, geólogo sênior da Petrobras, de 54 anos e 32 de profissão, que também atua no Cenpes. A companhia havia sido convidada a participar como consultora da expedição pelo governo brasileiro porque é a detentora da expertise de águas profundas no Brasil. E Viana já havia atuado com os japoneses, que costumam consultar a Petrobras em função da sua experiência na perfuração do sal.


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Cooperação tecnológica internacional A expedição do Shinkai é decorrente do acordo de cooperação técnica celebrado entre a Agência Japonesa de Ciência e Tecnologia da Terra e do Mar (Jamstec) e os ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação e das Relações Exteriores do Brasil, a CPRM, o Instituto de Oceanografia da USP e as universidades do Vale do Itajaí e Federal do Espírito Santo. A Petrobras atuou como consultora. Segundo Roberto Ventura, da CPRM, o Ministério de Relações Exteriores do Brasil decidiu participar do projeto internacional para levar o país cientificamente ao mar – não apenas em pesca e turismo, mas também para a soberania científica e econômica dos recursos presentes. “O objetivo do programa é produzir informações geológicas do território brasileiro, incluindo a plataforma continental jurídica e as áreas oceânicas adjacentes, e ampliar o conhecimento sobre os recursos minerais para estimular investimentos em pesquisa e produção de bens minerais”, contou Ventura. As pesquisas com as rochas encontradas na expedição à Elevação ainda estão em andamento, mas já se sabe que são rochas ricas em ferro, manganês e cobalto. A ideia é explorar esses recursos minerais no futuro.

Foto cedida pelo geólogo Fernando Freire

O PLANEJAMENTO DA MISSÃO A investigação científica cresceu com a ideia de levar o submarino – que inicialmente desceria apenas em áreas rasas – a submergir a milhares de quilômetros da costa para analisar a Elevação do Rio Grande, a Dorsal de São Paulo e o Platô de São Paulo. No planejamento inicial da expedição, o Shinkai 6500 iria operar no Brasil a partir de indicações de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), que apontavam a presença de algumas formas de vida marinha interessantes para o projeto em áreas relativamente rasas. Ao analisar o potencial do Shinkai 6500, a Petrobras e o Serviço Geológico do Brasil (também conhecido como CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais) propuseram sua utilização numa investigação bem mais ampla, em áreas de grande interesse científico. A Elevação do Rio Grande – localizada na margem sul brasileira, em frente aos estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul – desperta a curiosidade de cientistas há décadas e teve seu interesse redobrado desde que a CPRM descobriu, em uma dragagem na região há dois anos, que algumas rochas apresentavam características continentais e não apenas vulcânicas, como se supunha. A pesquisa dos geólogos apontava que o material encontrado na Elevação tinha afinidade com outros típicos do continente, e poderia ser um pedaço perdido no

processo de separação entre a América e a África. Na Petrobras, o alvo principal de investigação era coletar indícios para estudar aspectos da evolução da margem continental brasileira. “As nossas bacias foram formadas durante esse período, e entender o processo tem uma relevância muito grande para as atividades de óleo e gás. Ver a extensão mais mar afora da margem continental brasileira e saber que tipo de material existe lá ajudaria na calibragem dos modelos de evolução geológica que estamos desenvolvendo, apontando para algumas linhas de pesquisa que permitam dimensionar melhor o potencial de petróleo dessas áreas”, explica Adriano Viana. “O termo Atlântida brasileira, apesar do fundo de misticismo, de lenda, associando-a à história de Platão, foi concebido em analogia àquela lenda. Sua abordagem, porém, é muito científica. Nossos pesquisadores embarcaram na missão, não apenas para buscar novas formas de vida extremófilas, mas para investigar a existência desse possível continente perdido e de seu potencial em abrigar reservas minerais”, ressaltou o geólogo.

À direita, o geólogo do Cenpes, Fernando Freire; abaixo, um dos braços robóticos do submarino Shinkai 6500


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“SE PUDESSE VOLTAR, VOLTARIA. É UM ORGULHO TER ESSA FAÇANHA NO CURRÍCULO”, CONTA FERNANDO FREIRE —

Foto: Francisco de Souza

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Foto: Francisco de Souza

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Foto Fotocedida cedidapelo peloge贸logo ge贸log Fernando Freire

Foto cedida pelo ge贸logo Adolpho Augustin


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A EXPEDIÇÃO RECOLHEU INDÍCIOS QUE PODERÃO AJUDAR A ESCLARECER O PROCESSO DE RUPTURA DOS CONTINENTES E FORNECER INFORMAÇÕES PARA A INVESTIGAÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS — O INICIO DA EXPEDIÇÃO A Petrobras teve direito a duas vagas – uma para cada etapa da viagem. Para o trajeto entre a Cidade do Cabo e o Rio de Janeiro, o lugar foi cedido à PUC-RS – instituição que mantém uma estreita colaboração científica com a companhia, representada na missão por Adolpho, que já tinha grande experiência em operações de pesquisa marítima, incluindo expedições fora do país, no Egito. O objetivo da primeira etapa (ou pernada, como era chamada) era entender alguns aspectos evolutivos relacionados à ruptura do supercontinente Gondwana – formado pela África, América do Sul, Antártida, Austrália, Madagascar e Índia no período Jurássico, há 200 milhões de anos, e que se separou há 130 milhões de anos, dando origem ao Atlântico Sul. A expedição partiu da Cidade do Cabo, na África do Sul, onde Adolpho embarcou no navio oceanográfico japonês Yokosuka, base do Shinkai 6500, para uma viagem de 24 dias que cruzaria o Atlântico até a cidade do Rio de Janeiro. “Durante todo o tempo em que estávamos viajando, fazíamos workshops para nos programar, ver o que cada um faria em seu mergulho, para aprender. Quem desce tem que fazer tudo, porque vai apenas um pesquisador e dois pilotos no submarino. O pesquisador tem que decidir o que coletar, quando coletar e como”, relatou Adolpho.

A interação entre os cientistas se intensificou durante a travessia. Augustin conheceu os colegas japoneses e brasileiros com quem trabalharia dia e noite, principalmente com a proximidade dos primeiros mergulhos e a preparação para finalmente embarcar no Shinkai 6500. “Todo mundo era experiente na área, já tinha embarcado. A maioria era biólogo. Tinha eu de geólogo e mais um, Eugênio Frazão, da CPRM. E um japonês, com formação em biologia, que foi o coordenador da primeira etapa”, detalhou Adolpho.

1. Adriano Viana, da Petrobras, foi um dos consultores da expedição 2. O submarino tripulado Shinkai 6500 pode mergulhar a profundidades de 6, 5 mil metros 3. Equipe de geólogos e biólogos que participaram da primeira etapa da expedição no Brasil 4. Fernando Freire participou da segunda pernada da missão brasileira

Na pernada, foram realizados no total nove mergulhos na Elevação do Rio Grande e na Dorsal de São Paulo – uma cadeia de montanhas mais próxima do litoral. O de Adolpho ocorreu em 25 de março de 2013. Por motivos meteorológicos, ele não desceu na Elevação, mas

4. Foto: cedida pelo geólogo Fernando Freire


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“DURANTE O MERGULHO, O PESQUISADOR TEM QUE DECIDIR O QUE COLETAR, QUANDO E COMO”, RELATA ADOLPHO —

Foto: Francisco de Souza

Adolpho Augustin embarcou no navio japonês Yokosuka para uma viagem de 24 dias que cruzou o Oceano Atlântico

sim na Dorsal, ao norte. “Havia uma tempestade e tivemos que desviar para poder retornar e fazer todos os mergulhos” relatou. Os momentos anteriores à entrada no submarino trazem recordações tensas à sua mente. “Ainda sem sair do navio, eles ensinaram as instruções básicas dentro do Shinkai, mostraram os equipamentos, porque as instruções são no idioma japonês. Se trancar tudo, você pressiona esses dois botões. Se não acontecer nada, pressiona esses dois. Nessa hora, eu pensei: aonde vim me meter? Isso ocorreu dois dias antes do mergulho, aí que caiu a ficha”, disse o geólogo.

Dentro do submarino, as tarefas eram divididas entre o piloto, que comandava o veículo e coletava os materiais com os braços mecânicos; o copiloto, responsável pela navegação e localização do Shinkai; e o tripulante pesquisador. “Tive receio apenas quando fechamos e começamos a colocar o oxigênio (O2). Nada vai para fora. O O2 sai do cilindro e o hidróxido de lítio absorve o gás carbônico (CO2) dentro da própria esfera. Tem os monitores de CO2 e de O2. Um número começou a subir e fiquei assustado! Perguntei e disseram que não era nada. Você está em um ambiente fechado, três pessoas, é fácil desmaiar (por causa do CO2). Mas foi tudo muito tranquilo. Eles fazem isso há muito tempo”, afirmou o geólogo. A colaboração era contínua porque o trajeto feito em um mergulho não pode

ser repetido depois. Além disso, se o mar estivesse sem condições no dia em que um pesquisador fosse descer, ele perdia a vez. “Todo mundo pesquisa para todos. Você não está lá só por você. O pesquisador tem que coletar animal se encontrar, sedimento, rocha, água. Você coleta de tudo para ter um material para cada pesquisador. Biólogo coletava rocha, geólogo coletava bicho, todos tentavam tirar foto ou fazer vídeo, porque isso também é documento”, contou Adolpho. O PLATÔ DE SÃO PAULO A segunda etapa da expedição ocorreu em maio do mesmo ano e durou 16 dias. Os seis mergulhos do Shinkai 6500 foram realizados entre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, na costa sudeste do Brasil. O objetivo foi investigar o Platô de São


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Descoberta da Atlântida brasileira

UMA AVENTURA CIENTÍFICA —

A pesquisa oceanográfica nipo-brasileira procura respostas sobre a formação da África e da América e sobre formas de vida em ambientes extremos. É possível que se obtenham dados importantes sobre reservas minerais. MINAS GERAIS

N ÁREA AMPLIADA

SÃO PAULO

A expedição é decorrente do acordo de cooperação técnica celebrado entre a Agência Japonesa de Ciência e Tecnologia da Terra e do Mar (Jamstec) e os Ministérios de Ciência, Tecnologia e Inovação e das Relações Exteriores do Brasil, o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), o Instituto de Oceanografia da Universidade de São Paulo e as universidades do Vale do Itajaí e Federal do Espírito Santo. A Petrobras atuou como consultora.

ELEVAÇÃO DO RIO GRANDE 2 imersões com Shinkai 6500 1 imersão com Deeptow (câmera)

PARANÁ

SANTA CATARINA

COOPERAÇÃO CIENTÍFICA —

PLATÔ DE SÃO PAULO 6 imersões com Shinkai 6500

RIO DE JANEIRO

RIO GRANDE DO SUL

DORSAL DE SÃO PAULO 5 imersões com Shinkai 6500 1 imersão com Deeptow (câmera) Oceano Atlântico

PRIMEIRA ETAPA (DE 12 DE ABRIL A 5 DE MAIO DE 2013)

SEGUNDA ETAPA (DE 9 DE MAIO A 24 DE MAIO DE 2013)

Total de dias no mar: 24 dias Viagem: desde a Cidade do Cabo (África do Sul) até o Rio de Janeiro (Brasil) Local das imersões: Elevação do Rio Grande e Dorsal de São Paulo Número de imersões: 9

Total de dias no mar: 16 dias Viagem: desde o Rio de Janeiro até Santos, na costa sudeste brasileira Local da imersão: Platô de São Paulo Número de imersões: 6

Submergível Shinkai 6500 Tripulação: dois pilotos e um pesquisador. Construído no Japão, em 1991

Barco de apoio: Yokosuka Tripulação: 60 pessoas Construído em 1990

- 318 metros A) Início da imersão, duração de 2 h 30 min

- 3.500 metros A profundidade máxima alcançada foi de 4.250 metros durante a primeira etapa da expedição, na Dorsal de São Paulo

- 6.500 metros

B) O submergível chega à planície abissal

P L ATA F O R M A C O N T I N E N TA L FONTE: Agência Japonesa de Ciência e Tecnologia da Terra e do Mar (Jamstec)

D) Retorno à superfície a 45 metros por minuto

C) Observação do fundo durante 3 horas

PLANÍCIE ABISSAL


OVER THE SEAS

ANÁLISE LABORATORIAL CONFIRMOU QUE AS ROCHAS RETIRADAS DO PLATÔ DE SÃO PAULO DATAVAM DE CERCA DE 50 MILHÕES DE ANOS — Paulo, localizado nas bacias de Campos e do Espírito Santo, que estão entre as principais bacias petrolíferas do Brasil. O representante da Petrobras nesta etapa foi o geólogo Fernando Freire. A equipe de pesquisadores era composta, em sua maior parte, por biólogos e o seu foco estava mais na busca por formas de vidas exóticas do que por achados geológicos. “Era interessante porque, se tivesse uma montanha de ouro ali, eles não ligariam. Prestariam mais atenção em um siri que estivesse perto. Da mesma forma que, se eu visse um elefante lá, ficaria

O Shinkai 6500 —

COMUNICAÇÃO sonar de observação e hidrofone acústico de posicionamento

mais tentado a estudar a rocha embaixo dele”, comparou. Assim como Augustin, essa também foi a primeira vez que Freire submergiu de fato. “Na noite anterior, quase desisti. Quando vi o tamanho do submarino, pensei nas várias formas de morrer lá dentro. Desde uma morte instantânea, se houvesse algum problema com a pressão, até uma morte lenta no caso de uma pane elétrica”, recordou.

PROPULSOR HORIZONTAL para o deslocamento no fundo do mar, onde só é possível avançar na horizontal

Cada mergulho durava cerca de oito horas, sendo pouco mais de duas para descer, o mesmo para subir e as três restantes para as operações. “Mas

As camadas salinas

CÂMERAS para filmar vídeos em alta definição

Não é de hoje que a Jamstec tem um interesse especial pelo conhecimento da Petrobras. A agência possui um navio sonda que faz perfurações científicas em todo o mundo e busca aprender a operar em águas profundas onde existam grandes camadas de sal, daí a aproximação. “O Japão tem projetos no Mar Mediterrâneo e em outras áreas onde também há sal muito espesso. Assim como no Atlântico Sul, o Mediterrâneo recebeu a deposição de espessas camadas de sal em sua história geológica. O sal é um isolante impermeável e tudo que está abaixo dele recebe pouquíssima interferência do que está acima. Eles querem descobrir se há algum tipo de indicação de vida em ambientes extremos que pode estar associada ao sal, ou saber que tipo de mundo era este antes dele se depositar”, ressalta Viana. Há cerca de seis milhões de anos, quando movimentações tectônicas juntaram o norte da África ao que hoje se conhece por Península Ibérica, o Mediterrâneo foi separado do Oceano Atlântico por uma cadeia de montanhas. Em seguida, entrou num processo acelerado de evaporação, favorecido pela extrema salinidade de suas águas. Restou dele uma planície quase seca e estéril, cerca de 1,5 mil metros abaixo do nível do mar. O período histórico da reversão do processo de evaporação ainda é uma dúvida para os pesquisadores.

CESTAS MÓVEIS

LUZES DE INSPEÇÃO possui sete, que iluminam até dez metros na escuridão total do fundo


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É o único submergível tripulado que consegue descer até 6.500 metros. Em 1991, começou a realizar pesquisas topográficas

e geológicas e a procurar organismos vivos em ambientes extremos dos oceanos. Até 2012, ja tinha realizado 1.300 imersões.

Foi o principal equipamento da expedição "Quelle 2013 – Busca pelos Limites da Vida". Tem a capacidade de recolher amostras.

DIMENSÃO — TANQUES que carregam 1.200 quilos de lastro

PROPULSOR PRINCIPAL possui dois propulsores com hélices

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Comprimento: 9,7 metros

Altura: 4,1 metros

Largura: 2,8 metros

SENTIDO DE MERGULHO

2 metros d ed iâm et

ro

ESPECIFICAÇÕES — Duração de uma exploração...................................8 horas Duração do suporte vital...................................129 horas

CABINE ESFÉRICA na sua parte inferior tem uma janela de resina de metacrilato

Profundidade máxima alcançada..............6.500 metros Pressão a 6,5 km de profundidade.......681 atmosferas Carga útil...................150 quilos (peso no nível do mar) Cabine de liga de titânio.............73,5 mm de espessura

CASCO DE PRESSÃO

BATERIAS dispõe de duas baterias de íons de lítio

PROPULSOR VERTICAL dois propulsores elevam o Shinkai a 45 metros por minuto

O espaço habitável do Shinkai está no casco de pressão, que tem diâmetro interno de apenas dois metros. Este espaço pode acomodar dois pilotos e um pesquisador. Vários instrumentos são também instalados no casco de pressão, tornando a área habitável ainda menor.

PESO E VELOCIDADE —

26,7 toneladas

é o peso do submergível

BRAÇOS ROBÓTICOS para recolher amostras e cestos móveis que podem transportar até 100 quilos de materiais FONTE: Agência Japonesa de Ciência e Tecnologia da Terra e do Mar (Jamstec)

5 quilômetros por hora é a velocidade máxima dos deslocamentos


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agachado quase o tempo todo (só uma pessoa pode ficar em pé por vez) e as janelas eram próximas ao chão. Precisava ficar curvado, senti dores nas costas por dois dias depois. Este submarino não pode dar a marcha à ré. Então, quando passávamos por algo interessante muito rápido, eu precisava pedir para o piloto dar a volta. Isso pode ser um pouco chato com o tempo”, explicou.

Foto cedida pelo geólogo Fernando Freire

No total, foram realizados 15 mergulhos durante a expedição na costa brasileira

imagine se algo dá errado e você tem que passar cinco dias num lugar escuro, fechado e com temperatura média entre dois e cinco graus até ser encontrado? Se é que vai ser resgatado! Não há como ignorar o receio de entrar num submarino deste tipo”, disse Freire. Apesar de garantir que oito horas de mergulho passam voando, Freire confessou que o trabalho foi cansativo. “É um ambiente complicado. Você fica

As voltas que Freire obrigou o piloto a fazer não foram em vão. A análise laboratorial realizada após a missão com o material coletado em seu mergulho confirmou que as rochas retiradas da área do Platô de São Paulo datavam de cerca de 50 milhões de anos, o que permitirá estudar aquele período, quando ocorreram importantes mudanças climáticas na Terra e em seus oceanos. “A importância da descoberta e da datação das rochas é relativa à exploração de petróleo e ao conhecimento científico sobre a tectônica da área”, explica Freire. Além disso, segundo os biólogos, os microfósseis coletados também apresentavam uma excelente qualidade de preservação, o que vai facilitar muito os estudos posteriores. Apesar de todas as dificuldades, Freire diz que faria tudo novamente. “Se pudesse voltar, voltaria. Vou guardar na memória para sempre esta expedição. É um orgulho ter essa façanha no currículo. Sou um dos únicos pesquisadores brasileiros que esteve naquele lugar até hoje”, disse.

O supercontinente de Gondwana A fragmentação do supercontinente de Gondwana teve início no período Jurássico Superior e culminou no Cretáceo Inferior, há cerca de 110 milhões de anos. Com a quebra do continente surgiram duas placas, a Placa Sul-Americana e a Placa Africana, que se movimentaram lentamente em sentidos opostos, distanciando-se alguns centímetros por ano. À medida que se abriam, provocaram fenômenos de vulcanismo e terremotos e formaram as bacias sedimentares – depressões onde se acumulam sedimentos transportados pela ação dos rios, do vento e do mar. A separação das placas Sul-Americana e Africana gerou uma depressão alongada de direção norte-sul, limitada por falhas paralelas e formada pelos esforços distensivos localizados na camada mais superficial do planeta: a Crosta. A ruptura final dos continentes se realizou entre o nordeste brasileiro e a região da Nigéria-Gabão, na África. (Fonte: CPRM – Projeto SINGRE 2013) Foto cedida pelo geólogo Adolpho Augustin


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PERFURAÇÃO É O PRÓXIMO PASSO Missões parecidas com as que levaram os geólogos brasileiros ao fundo do mar podem acontecer em breve. De acordo com Viana, a ideia é voltar à Elevação do Rio Grande em 2017 ou 2018, para finalmente realizar as perfurações e confirmar se estamos realmente diante de uma parte do continente nas profundezas do mar. Segundo ele, já existe tecnologia para a perfuração, mas o custo é muito alto e seria necessário fazer a empreitada em parceria com outras instituições e órgãos científicos internacionais, que já se demonstraram muito interessados em participar de uma operação conjunta com as instituições de ciência e tecnologia brasileiras, além da Petrobras e da CPRM. “Estamos começando a desvendar um segredo. É preciso investir mais em pesquisa. Além do interesse geológico, o local pode ter abrigado outras formas de vida capazes de resistir a condições extremas”, completou Viana. Há ainda o interesse econômico e a ideia de explorar os recursos minerais da área em um futuro próximo. A CPRM solicitou à Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISBA), órgão da ONU, a delimitação da área de prospecção mineral da região da Elevação do Rio Grande.

Foto cedida pelo geólogo Fernando Freire

“Com essa delimitação, será possível estudar a área pelos próximos 15 anos para checar a viabilidade econômica. Após a realização dos estudos e, se os resultados forem positivos, poderemos solicitar a ampliação da extensão marítima brasileira. A Elevação do Rio Grande está em uma área internacional, que não tem dono”, explicou Roberto Ventura, diretor de Geologia e Recursos Minerais da CPRM.

Acima, Fernando Freire durante o seu mergulho; abaixo, rochas encontradas na primeira pernada da missão Veja imagens do fundo do mar feitas durante a expedição na versão tablet e no site www.petrobras.com/ magazine


SPIRAL

A BOLA ROLA DE NORTE A SUL Brasileiro nasce com o jogo na alma. As crianças aprendem geometria antes mesmo de entrar na escola. As noções de matemática espacial estão no retângulo do campo e no diâmetro da bola. É fácil calcular por que o país, o único cinco vezes campeão mundial, é um dos que mais formam jogadores no mundo Foto: Francisco de Souza


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Apesar de seu pequeno porte, o município tem enfrentado problemas sociais comuns em grandes cidades, e que restringem o futuro dos jovens que, ao concluírem o ensino médio, não têm recursos para ingressar na faculdade mais próxima (a 200 quilômetros), na cidade de Sobral.

N

o ano em que o Brasil é o anfitrião do maior torneio de futebol do mundo, a Petrobras Magazine Global Connections viajou por todo o país para entender como a paixão nacional se tornou uma poderosa ferramenta de inclusão social de crianças e adolescentes e contar, um pouco mais, sobre essa “Pátria de Chuteiras”. A BOLA ROLA NA SUÍÇA BRASILEIRA Nossa viagem começou por Fortaleza, capital do Ceará, no Nordeste do Brasil, a 360 quilômetros do primeiro destino: Viçosa do Ceará. Município incrustado na Serra de Ibiapaba, apelidado pelos moradores de Suíça Brasileira por ter a maior altitude e o clima mais ameno do estado. As imagens pelo caminho dão uma amostra das múltiplas paisagens do país. Ora sertão árido, ora um verde exuberante. É uma cidade pequena, com 40 mil habitantes, onde a zona rural concentra a maior parte da população. As casas são simples, com tijolos ou cimento colorido, nas quais predominam o rosa, o laranja e o verde-água. A constância de cores é interrompida apenas pela divisão da rodovia CE-187.

OS ÍDOLOS O centroavante Hernane, o goleiro Felipe e o lateral-direito Leo Moura, do Flamengo (time de maior torcida do Brasil), têm muitos torcedores por lá. Apesar de o Ceará ter dois times grandes (Ceará e Fortaleza), Dayane Silva, de 17 anos, afirma: “Já nasci flamenguista”. Ela não pretende ser jogadora, embora tenha vencido o último torneio de futebol feminino da cidade. “Quero ser psicóloga e ajudar outras crianças. É difícil, mas a gente tem que aprender a superar as dificuldades. Pensar rápido na jogada e driblar os zagueiros rumo ao gol”, diz a menina, que perdeu o pai há dois anos. A relação do futebol com a vida, feita pela jovem, encontra ressonância com os valores passados pelo projeto “Entrando em Campo”, da única associação social da cidade, a Santo Expedito. Dayane integra o time de 151 meninos e meninas que tentam reproduzir os passes dos ídolos. E também aprendem princípios para ajudá-los a ter um futuro mais certeiro diante das adversidades. O curioso é que o “Entrando em Campo” foi criado por Nakeida Carvalho, que nunca teve intimidade com a bola. “Tentei uma vez só, mas sou perna de pau mesmo”, diz. Ela chegou a Viçosa há 20 anos com o marido, que queria voltar à sua cidade

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natal. Mas a aposentada do Banco do Brasil, acostumada à agitação de Solonópole, cidade em que vivia, buscava uma atividade. Numa tarde, ao olhar um grupo de meninos jogando uma pelada (como o futebol é apelidado no Brasil), teve a ideia: “É o futebol que deve ser usado como ferramenta educacional para mudar as histórias dessas crianças”. Elaborou o projeto “Entrando em Campo” e o inscreveu na seleção pública de Projetos Educacionais do Programa Petrobras Esporte & Cidadania. Nakeida conta que sonhava com uma ligação de alguém da companhia. Este dia chegou e o projeto foi contemplado em 2012. Para encontrar a garotada, basta ir a um dos campos. Um fica ao lado de um curral e um galinheiro – um frango é a mascote do time. O outro é no lado oposto da rodovia CE-187, com dimensões maiores que as de um campo oficial e um solo de terra e areia de montes irregulares, que não é problema para a garotada. Sob a supervisão do professor Caetano José, de 50 anos – um verdadeiro multiespecialista em esportes –, tentamos descobrir o motivo da unanimidade do futebol entre todas as classes sociais de Norte a Sul do país. “Muitas vezes discuti com minha namorada por conta da bola. Passei a infância, a juventude e continuo fascinado pelo futebol. Não tem explicação, é uma emoção vibrante”, diz Caetano.


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As atividades desenvolvidas no projeto vão muito além da habilidade com a bola. Todos os dias, antes de entrar em campo – conforme o contraturno escolar –, a garotada participa durante uma hora de uma roda de conversas, com atividades pedagógicas e apoio complementar

ao ensino. “Estamos falando em formação de pessoas, que preparamos com valores para encarar o mundo”, explica o professor. O projeto usa a vocação nacional como ferramenta de educação, estimulando

UMA VIAGEM FUTEBOLESCA DE NORTE A SUL 1. FORTALEZA

(Capital do Ceará)

2. VIÇOSA DO CEARÁ

360 km percorridos

(Serra de Ibiapaba) “Entrando em campo”

1.200 km percorridos

2012 151

3. CAMAÇARI

(Próxima a Salvador – capital do estado da Bahia) “Educando com a bola: as viabilidades pedagógicas do futebol” 6.260 km percorridos

2013 200

Programa Petrobras Esporte & Cidadania Segmento Esporte Educacional

5. NITERÓI

(Rio de Janeiro) “Diferentes Talentos” 2012 500

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projetos no Brasil

60.000

3.600 km percorridos

beneficiários

Nome do projeto apoiado pela Petrobras Data de início Meninos e meninas integrados no programa

4. SÃO LEOPOLDO

(Vizinha a Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul) “O esporte educacional construindo cidadania, resgatando vidas” 2012 200

a socialização, mas também trabalha com os sonhos dos meninos de serem craques do futebol. É o desejo dos gêmeos da Silva, Ivanildo (lateral esquerdo) e Ivanilson (goleiro), de 14 anos. “A vida dos jogadores mexe com a gente, mas se não der, vou ser dentista, e meu irmão, policial”, conta Ivanilson. O DESCOBRIMENTO No dia seguinte, rumamos 1.200 quilômetros para Camaçari, cidade próxima a Salvador, capital do estado da Bahia. Lá encontramos Cristóvão Colombo, um descobridor do futebol na cidade. Ele comanda, junto com Valdemir Ribeiro (conhecido como “Macarrão”), o Clube Academia de Futebol (CAF) – instituição social que gere o projeto “Educando com a bola: as viabilidades pedagógicas do futebol”. Era dia de distribuição dos uniformes. Os pais aguardavam a vez na fila para receber o kit com chuteiras, calções e meiões. No campeonato estadual, dois times imperam: Bahia e Vitória. Ricardo Miranda, de 11 anos, é tricolor baiano – apelido carinhoso do time do Bahia dado pelos torcedores. Há três anos no projeto, ele também treina, há dois, na divisão infantil de base do seu time de coração. “O projeto oferece formação por meio do esporte. Nossos mil meninos também têm aulas de informática e atividades pedagógicas, que reforçam valores importantes”, ressalta Macarrão. Cristóvão perde a conta de quantos jogadores do CAF despontaram para times da primeira e segunda divisões do campeonato brasileiro. A associação tem duas sedes, uma com atividades de futsal – que começaram este ano após uma reforma na quadra – e outra, inaugurada com o patrocínio da Petrobras, em 2012, que fica em um campo com coqueiros sob um céu azul digno dos romances do escritor baiano Jorge Amado. “O país têm evoluído de forma acelerada, mas os problemas também, e as crianças são vulneráveis a eles. Muitos chegam com medo de se relacionar, mas, ao iniciar as atividades no projeto, começam a desenvolver a sociabilidade”, conta Macarrão.


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O REFÚGIO Mais 3.600 quilômetros ao Sul e chegamos a São Leopoldo, cidade vizinha a Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. Rumamos a São Miguel, bairro com alto índice de violência. Logo na chegada, a criançada nos rodeou. Em pouco tempo, foi possível perceber que muitas tinham uma história para contar. A primeira delas – que inspirou a criação do Instituto Lenon Joel pela Paz, em 2006 – é a do casal Noli e Sanaile Backes. Eles perderam o filho, Lenon Joel, de 16 anos, assassinado em um assalto ao mercado da família em setembro daquele ano. O instituto representou a superação, oferecendo atividades esportivas, escolares e profissionalizantes para crianças de sete a 17 anos. Entre todos os projetos, a maior procura é pelo futebol. Realizadas toda quinta e sábado, as aulas reúnem até cem crianças por dia. Meninos e meninas jogam no campo do Obras e Viação Futebol Clube. O campo tem dois vestiários, dois bancos de madeira e uma mesa de plástico. Quando as crianças chegam, chuteiras de todos os tamanhos ficam espalhadas pelo chão. Cada uma procura o seu par e vai para o aquecimento em campo. Nathielle Silva, de 12 anos, ajuda na organização dos times. É a líder do grupo e, mesmo sendo da minoria feminina, todos a obedecem. Nath, como é chamada, também joga bola muito bem. Dá olé em muitos garotos e tem uma certeza: “Quero ser a próxima Marta (eleita cinco vezes consecutivas a melhor jogadora do mundo), da seleção brasileira feminina de futebol”. Ela hoje se dedica ao colégio e ao futebol. “Estudo, pratico e ajudo outras crianças da ONG”, conta. Pausa para beber água. Na fila do bebedouro, um menino, Paulo César. Há um ano está na oficina de futebol do

A paixão pelo futebol viabiliza o desenvolvimento de crianças e adolescentes em várias regiões do país Fotos: Francisco de Souza

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SPIRAL Fotos: Francisco de Souza

Jogadores profissionais no Brasil ATÉ 18 ANOS:

2.094

8

Brasileiros

Estrangeiros

ACIMA DE 18 ANOS:

12.484 112 Brasileiros

Estrangeiros

Fonte: Confederação Brasileira de Futebol (CBF), 2013

Instituto Lenon e, só agora, participa dos outros projetos da ONG. Por ter histórico de violência familiar, sua adaptação foi difícil. Continuou por se identificar com o futebol. Hoje, é um dos primeiros a chegar. Torce pelo Internacional (um dos principais times do Rio Grande do Sul), mas seu ídolo e referência é o argentino Lionel Messi, do Barcelona. Ele bebeu água em 30 segundos e foi para o meio do campo. Já posicionado, pronto para o recomeço da partida. Fez vários gols. Num deles, olhava para a arquibancada, querendo dizer: “viu o meu gol?”. Alguém fez um sinal positivo para ele, alegre com o reconhecimento. A coordenadora do projeto, Fernanda Appelt, conta que o futebol favoreceu uma troca de atitude por parte de Paulo. “Isso é o esporte educacional construindo cidadania e resgatando vidas”, diz. “A postura corporal e a forma de falar já mudaram. Ele

não é mais violento, é o que mais joga e faz gols. Nessa mudança, vemos claramente o mecanismo de inclusão da atividade”, aponta. As palavras de Fernanda servem como indicadores para a Gerência de Investimentos Sociais da Petrobras – responsável pela gestão do segmento “Esporte Educacional” do Programa Petrobras Esporte & Cidadania. “Nosso programa visa democratizar o acesso dos recursos a projetos, em todo o país, que promovam a inclusão social por meio do esporte. Esperamos que os resultados contribuam para o fortalecimento de políticas públicas de afirmação do esporte e da educação como um direito, colaborando para o desenvolvimento do Brasil”, explica Rosane Aguiar, gerente de Investimentos Sociais da Petrobras. A Petrobras lançou uma nova Seleção Pública ainda este ano para destinar R$ 45 milhões (cerca de US$ 19,9 milhões) a projetos de atendimento direto a crianças e adolescentes por meio do esporte.


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COORDENAÇÃO MOTORA E RENDIMENTO ESCOLAR Após percorrermos 6.260 quilômetros, terminamos a viagem em Niterói, no Rio de Janeiro. Era o reinício das aulas, após as férias coletivas, e a ansiedade das crianças transbordava. O professor Armando Alves, do projeto “Diferentes Talentos”, da Associação Niteroiense de Deficientes Físicos (Andef), pegava o material (uniformes, cones, apito e bola) enquanto os pequenos improvisavam uma partida, usando uma garrafa d’água plástica como bola. Eles correram para o campo, escolheram o maior colega como goleiro e começaram a jogar. Não era uma disputa entre times. Cada um chutava quando podia. O professor voltou com todos os apetrechos e as crianças nem perceberam. Até que o apito do juiz encerrou o jogo e todos colocaram os uniformes e ajudaram na organização dos cones. O professor segurou a bola, que só foi liberada quando o campo ficou

EM VIÇOSA DO CEARÁ, O FUTEBOL TORNOU-SE UMA FERRAMENTA PEDAGÓGICA PARA MENINOS E MENINAS — pronto, o que demorou menos de cinco minutos. Era só o juiz apitar para a partida começar. As crianças, ordenadas em filas, desviavam dos cones, num zigue-zague em direção à bola. Tudo era narrado pelo professor, que também se fazia de comentarista: “Davi, o atacante internacional, se prepara e joga para o gol. Uh! Na trave!” Davi Rocha, de nove anos, tem Síndrome de Down e é o mais fominha – jogador ávido pela bola - do grupo, que tem cerca de dez crianças. Via a bola e corria desesperado. E não só no campo da Andef. “Ele não pode ver uma bola. Começa a jogar dentro de casa. O gol, determinado por ele, é o quintal vizinho. Quando a bola cai lá, a partida acaba. Ele fica triste porque o jogo acabou, mas feliz pelo gol”, diz seu pai, José Carlos Rocha.

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O Programa Petrobras Esporte & Cidadania busca contribuir para a democratização do acesso às práticas desportivas Rocha conta que a coordenação motora, a capacidade de socialização e de cognição e o rendimento escolar do filho melhoraram muito com o futebol. Davi está há dois anos no projeto “Diferentes Talentos” e fala que vai jogar no Barcelona, como o ídolo Neymar.

Saiba mais sobre o Petrobras Esporte & Cidadania na versão tablet e no site www.petrobras. com/magazine

Veja uma galeria dos campos de várzea pelo Brasil


INSIDE STORY

SUPERLIGAS

para o pré-sal


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Petrobras desenvolve aços resistentes para superar os desafios da produção de petróleo nas bacias brasileiras

N

ão é difícil entender porque o nome de Carlos José Bandeira de Mello Joia é referência em inúmeras teses de mestrado e doutorado em engenharia das universidades brasileiras. Formado em engenharia Metalúrgica e de Materiais, Joia (como é conhecido pelos colegas) tem 35 anos de Petrobras, 21 deles no Centro de Pesquisas da companhia (Cenpes). Há cinco é o responsável pelo desenvolvimento e seleção de materiais para os equipamentos usados nos campos do pré-sal. Uma atividade complexa que tem contribuído para a geração de soluções inovadoras, que permitem à Petrobras superar os desafios da produção em águas profundas. As bacias brasileiras estão entre os ambientes mais adversos do mundo para ação de agentes corrosivos nos equipamentos de produção de óleo e gás, em função de suas diferentes profundidades, temperaturas e pressões. Condições que tornam a atuação de Joia, à frente da equipe do Laboratório de Corrosão e Seleção de Materiais, cada vez mais fundamental para o alcance das metas da Petrobras. Ao mesmo tempo em que planeja aumentar a produção, atualmente em cerca de 2 milhões de barris por dia no Brasil, para 3,2 milhões em 2018 – 52% oriundos do pré-sal –, a companhia tem como meta aumentar a produtividade, reduzindo custos operacionais. “Pelas grandes demandas do pré-sal, precisamos acelerar o desenvolvimento de materiais anticorrosivos que aumentem a sobrevida ou apontem para o uso de novas ligas, ao mesmo tempo em que a questão de redução de custos é primordial”, diz Joia.

Joia é o responsável pelo desenvolvimento e a seleção de materiais para os campos do pré-sal Foto: Francisco de Souza e André Motta de Souza / Banco de Imagens Petrobras

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O engenheiro que, no início de 2013, passou a integrar o grupo de 45 consultores máster da Petrobras – função de reconhecimento aos profissionais que possuem maior expertise e abrangência de atuação, desenvolvendo soluções inovadoras em atividades estratégicas – perdeu a conta dos inúmeros projetos que ele e sua equipe desenvolveram e que culminaram em patentes para a Petrobras. Esses projetos têm gerado soluções inovadoras a partir de uma grande sinergia com a indústria metalúrgica e os centros acadêmicos - parceiros no desenvolvimento de ligas, resistentes e de alta tenacidade, que atendam à demanda acelerada do pré-sal, em preço e prazo de entrega. Focam, ainda, o estudo para aumentar a sobrevida dos equipamentos utilizados nos campos de produção. Entre 2010 e 2012, eles concluíram, em parceria com a indústria metalúrgica internacional, o desenvolvimento do aço inoxidável 17 Cromo e a avaliação da adequação do uso do aço inoxidável Super Martensítico 13Cr para as condições do pré-sal. As duas ligas já foram aplicadas em campos do pré-sal na costa sudeste do Brasil, gerando uma economia de US$ 300 milhões à Petrobras. Na tarde de uma segunda-feira, nossa equipe de reportagem conversou com Joia, em meio a uma mudança provisória de seu Laboratório de Corrosão e Seleção de Materiais para o prédio da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), para uma ampliação em suas instalações.


INSIDE STORY

“PELAS GRANDES DEMANDAS DO PRÉ-SAL, PRECISAMOS ACELERAR O DESENVOLVIMENTO DE MATERIAIS ANTICORROSIVOS”, CONTA JOIA —

PMGC – Por que as bacias brasileiras são consideradas ambientes tão desafiadores para a produção de petróleo? Joia – Podemos dizer que as condições de nossos campos são únicas. No pré-sal, por exemplo, estamos falando de múltiplas pressões e temperaturas que determinam os tipos de agentes corrosivos que atuam sobre os equipamentos de produção. Eles agem em colunas, linhas rígidas, dutos flexíveis e chapas, entre outros componentes da linha de produção, e sempre de forma variada, provocando graus distintos de corrosão.

PMGC – Eles variam conforme o campo nas diferentes bacias petrolíferas do Brasil? Joia – Sim. No caso da Bacia de Santos, estamos falando de profundidades e lâminas d’água maiores, que significam pressões mais altas e reservatórios mais fundos. Ou seja, quanto maior a pressão, maior a ação corrosiva. Ao mesmo tempo, em virtude das características dos reservatórios e de como o petróleo foi obtido, os teores de contaminantes são muito altos, como particularmente é o caso do C02 (gás carbônico). De campo para campo, em uma mesma bacia, chega a variar de 5% a 20%. E estou falando apenas da parte de colunas de produção, sem contar as linhas e dutos conectados à árvore de natal, além do riser que sai do fundo do mar até a plataforma, que apresentam outro tipo de corrosão.

ESPÍRITO SANTO

MINAS GERAIS

BACIA DE CAMPOS

RIO DE JANEIRO

N

SÃO PAULO

O

E S

BACIA DE SANTOS

Área pré-sal

m m 100

1.0

00 m

50

m

00

2.0

FONTE: FONTE:Petrobras. Petrobras.Informações Informaçõesdede15/1/2014 15/1/2014

0

100

Km 200

Campo de Libra Petrobras + Parceiros pré-sal Petrobras + Parceiros pós-sal Petrobras pré-sal Petrobras pós-sal

PMGC – Cada campo de petróleo exige o reconhecimento destes agentes para a definição de ligas e materiais mais resistentes. Como são as etapas deste processo? Joia – Quando se descobre um novo campo de produção, é preciso extrair amostras de petróleo e gás do fundo do reservatório e levar para avaliação. Quando se extrai petróleo, vêm associados gases ácidos, como o C02 e o H2S (sulfeto de hidrogênio), além de água. Essa junção de água e gás ácido causa a corrosão dos metais. Nossa função é selecionar a liga metálica de menor custo adequada ao sistema de produção ao longo da vida do campo. É importante ter uma avaliação da velocidade do processo corrosivo e conhecer o desempenho dos materiais nessas diversas condições para indicar o mais adequado e durável. PMGC – Quanto tempo leva uma pesquisa como esta? Joia – De dois a três anos, às vezes até quatro. Na verdade, é um processo que caminha em função do ambiente. Os testes devem reproduzi-lo até reconhecermos os fenômenos e iniciar o desenvolvimento de uma liga. A primeira dificuldade é precisar o ambiente corrosivo, um processo muito complexo. Só para dar uma noção, a Bacia de Santos, onde estão localizadas as maiores reservas do présal, vai do Sul do estado de São Paulo até o Espírito Santo. A diversidade de ambientes corrosivos é muito grande e, mesmo prevendo todos os cenários, ainda somos surpreendidos.


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FOI O TEMPO DA PESQUISA DO CR17 — O CR17 E O 13CR JÁ GERARAM

US$ 300 MILHÕES

DE ECONOMIA À PETROBRAS — PMGC – O Super Martensítico 13 já está sendo aplicado no pré-sal da Bacia de Santos, substituindo um material mais caro. Como foi a avaliação do seu desempenho? Joia – A pesquisa durou quase quatro anos. Chegamos ao aço inoxidável Super Martensítico, tipo de aço que substitui o super duplex aplicado em condições de alta corrosão, que tem custo mais elevado. Descobrimos que a liga que normalmente não é utilizada em campos com teores mais elevados de CO2 poderia ser utilizada nos materiais para colunas de produção e revestimento, em condições com teores mais elevados de CO2 em função do processo de interação existente entre as rochas do reservatório e a água de formação, que torna o processo corrosivo menos severo. Além de mais barato, o aço tem um prazo de entrega menor dado pelos fornecedores, mais adequado às demandas do pré-sal.

52% DA PRODUÇÃO DA PETROBRAS EM 2018 SERÃO ORIUNDOS DO PRÉ-SAL —

PMGC – E o desenvolvimento do Cr17? Joia – O Cr17 exigiu quatro anos de pesquisa e vem dando muito retorno à Petrobras no pré-sal, onde a liga já está sendo utilizada. É um tipo de aço inoxidável projetado para revestir as paredes de poços e colunas de produção do pré-sal. Os primeiros testes indicaram a fabricação deste aço, que contém 25% de teor de cromo, além de adições de níquel e molibdênio, uma composição bastante cara. Em todo o mundo, somente os japoneses produzem um aço similar. Entramos em contato com fornecedores e uma empresa japonesa, que já havia desenvolvido uma liga menos nobre que a duplex de 25% de teor de cromo já existente no mercado, foi a que nos respondeu mais rápido. Fizemos o programa de testes com eles e foi interessante porque os japoneses normalmente chegam com o produto pronto e, no caso do Cr17, eles aceitaram fazer o desenvolvimento da liga junto com o nosso programa de testes. PMGC – As parcerias, então, são fundamentais para a inovação na Petrobras e o sucesso dos projetos? Joia – Hoje, sozinho não se vai muito longe. O Cenpes foi criado há 50 anos próximo a uma renomada instituição de ensino, a UFRJ, consolidando uma visão de que a ciência e a tecnologia devem atuar sempre juntas. Somos parceiros de

outros centros de excelência, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). É muito importante trabalhar em equipe de forma multidisciplinar. No caso do Cr17 e do 13Cr, a interação com o pessoal do Laboratório de Reservatórios e o envolvimento do parceiro internacional foram cruciais. Toda essa sinergia impulsiona a indústria brasileira também para atender à demanda e ao cronograma do pré-sal, diferente do que ocorria no passado. Com o tempo e os resultados, o respeito pela Petrobras aumentou. Hoje, há um intercâmbio contínuo de conhecimento e, para mim, essa é a grande liga.

Foto: Thinkstock / Banco de Imagens Petrobras

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Provocações em diagramas — A arte de Sarah Morris instiga a percepção de novas experiências do olhar

A

obra da artista inglesa Sarah Morris convida a um novo olhar sobre as cidades e seus protagonistas. São telas de formas geométricas sinuosas e cores fortes, imagens e fotografias que contextualizam o cotidiano e a arquitetura das urbes. Em sua mostra “Rio”, Sarah apresenta sua visão sobre as múltiplas e complexas camadas da mais contraditória das cidades, o Rio de Janeiro.

Sarah nasceu em 1967 na Inglaterra e cresceu nos Estados Unidos. Suas incursões no Brasil começaram ainda na adolescência, em uma viagem com a família ao Rio de Janeiro, no início dos anos 80. As imagens da cidade ficaram registradas em sua memória. Ao retornar, em 2011, as intervenções arquitetônicas ocorridas nas últimas três décadas promoveram um incômodo no olhar da já consagrada artista contemporânea.


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Foto: Ben Westoby / Cortesia da White Cube

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“Petrobras [Rio]”, elaborado em 2012, com uso da técnica household gloss sobre tela. Tamanho: 2,14 m x 2,14 m


Foto: Ben Westoby / Cortesia da White Cube

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A exposição “Bye, Bye Brazil”, na White Cube, ocorreu de julho a setembro de 2013 em Londres

Foto: Christopher Burke, New York / Cortesia da White Cube

“July 2013 [Rio]”, produzido em 2013


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Foto: Ben Westoby / Cortesia White Cube

“Parque Guinle - Nova Cintra [Rio]”, 2013 Foto: Ben Westoby / Cortesia White Cube

“Jockey Club Brasileiro [Rio]”, 2012

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“Sambódromo da Marquês de Sapucaí [Rio]”, 2012

Fotos: Cortesia da White Cube


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“Globo [Rio]”, 2013

TELAS DE FORMAS GEOMÉTRICAS SINUOSAS E CORES FORTES CONTEXTUALIZAM A ARQUITETURA DO RIO DE JANEIRO NA VISÃO DE SARAH MORRIS — Instigada, Morris foi buscar referências. Encontrou-se com o arquiteto Oscar Niemeyer, mergulhou nas obras da artista italiana naturalizada brasileira Lina Bo Bardi e do paisagista Roberto Burle Marx. Suas impressões resultaram na criação da mostra “Rio” (2012), composta de um longa metragem homônimo, de 88 minutos, de uma série de 16 telas e de uma coletânea de fotografias, que ilustraram a exposição “Bye, Bye Brazil”, em julho de 2013, na White Cube – uma das mais expoentes galerias de Londres. As telas e imagens de Morris provocam novas percepções sobre as interferências arquitetônicas e a vida nas cidades que visita, no que ela intitula tipologias urbanas. São provocações em diagramas e imagens, como as obras “Sambódromo”, palco do samba no Brasil; o Posto 8 de Ipanema, com sua visão sobre a sensualidade do Rio de Janeiro; e a suntuosidade das linhas concretas do prédio da sede da Petrobras, interpostas pelos jardins projetados por Burle Marx. “Praça da Apoteose [Rio]”, 2012


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Cena do filme “Rio”, exibido na galeria White Cube, em Londres

Morris escolheu a tela “Petrobras [Rio]” para ser capa de uma das edições do Pocket Tube Map (2012), mapa de bolso do metrô de Londres distribuído a milhões de pessoas nas estações. É um diagrama que sugere movimentos e interações, de cores intensas. “O edifício nos remete a uma viagem e não a um caminho linear”, diz a artista, que integra a comissão de curadoria do Art on the Underground – programa do metrô londrino que apresenta obras de arte contemporânea para os passageiros.


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AS IMAGENS DA ARTISTA PROVOCAM NOVAS PERCEPÇÕES SOBRE O AMBIENTE E A VIDA NAS CIDADES QUE VISITA —

Fotos da artista Sarah Morris retratam o cotidiano da cidade

Fotos: Cortesia da White Cube


ART BOOK Fotos: Cortesia da White Cube

Exposição “Judicial Non-Tesselation”, no Tribunal Federal de Berga, na Noruega, em 2012

A artista Sarah Morris com o arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer em entrevista para o filme “Rio”, em 2011

Sarah Morris é graduada em Semiótica e Filosofia Política na Brown University (EUA) e cursou o Programa de Estudo Independente do Whitney Museum of American Art em Nova Iorque. Participou de inúmeras exposições individuais e coletivas em grandes galerias e museus dos Estados Unidos, Europa e Ásia. Sua obra compõe os acervos dos principais museus do mundo, como o Solomon Guggenheim, em Nova Iorque; o Victoria and Albert, em Londres; e o Centre Pompidou, em Paris. A artista vive e trabalha entre Nova Iorque e o Reino Unido.

Veja mais fotos e vídeos sobre a exposição “Bye, Bye Brasil” na versão tablet e no site www.petrobras.com/ magazine

PARA ENTENDER O RIO, MORRIS MERGULHOU NAS OBRAS DE OSCAR NIEMEYER, LINA BO BARDI E DO PAISAGISTA ROBERTO BURLE MARX — As imagens de Sarah mostram aspectos do dia a dia do Rio de Janeiro, como uma barraca de frutas numa feira, uma reunião de trabalho e uma garota na praia


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