ENTREVISTA Nilton Vasconcelos defende a qualidade do emprego e sua valorização
N° 06 - Junho de 2011
CAMINHOS PARA A VALORIZAÇÃO DO TRABALHO
REFORMA POLÍTICA Ampliação da democracia
MCC
As mães que lutaram contra a ditadura
índice
DIREÇÃO EXECUTIVA Presidente Wagner Gomes DIRETORIA Nivaldo Santana, David Wylkerson de Souza, Vicente Selistre, Márcia Almeida Machado, Pascoal Carneiro, Salaciel Fabrício Vilela, Vilson Luiz da Silva, Gilda Almeida, Celina Arêas, Joílson Antonio Cardoso, Carlos Rogério Nunes, Severino Almeida, João Batista Lemos, Eduardo Navarro, Raimunda Gomes (Doquinha), Paulo Vinicius Santos da Silva, Valmira Luzia da Silva, Maria do Socorro Nascimento Barbosa, Elias Bernardino, Sérgio de Miranda, Hildinete Pinheiro Rocha, Fátima dos Reis e João Paulo Ribeiro. CONSELHO EDITORIAL Altamiro Borges, André Cintra, Augusto Cesar Petta, Eduardo Navarro, Fernando Damasceno, Gilda Almeida, Madalena Guasco, Joilson Antonio Cardoso, Márcia Almeida Machado, Nivaldo Santana, Umberto Martins, Wagner Gomes. REDAÇÃO Secretário de Imprensa e Comunicação Eduardo Navarro Equipe Celso Jardim, Cinthia Ribas, Fernando Damasceno e Láldert Castello Branco Colaboradores desta edição André Cintra, Maurício Hashizume, Umberto Martins e Verônica Pimenta Diagramação e capa Márcio Lima Ilustração de capa Antonio Berni - 1934 Projeto gráfico Caco Bisol Impressão HR Gráfica Tiragem 10 mil exemplares
Brasil descarta o projeto neoliberal, e agora precisa apostar no desenvolvimento
N
PÁGINA 4
RURAIS
A 17ª edição do Grito da Terra e a sabedoria do campo
PÁGINA 34
Secretário do Trabalho da Bahia defende a qualidade do emprego e sua valorização
PÁGINA 10 TRABALHO DECENTE
Entranhas da escravidão que persiste no país
MOVIMENTOS SOCIAIS
Movimento Contra a Carestia e sua luta nos anos de chumbo
PÁGINA 36 AGENDA SINDICAL
As principais atividades do mundo sindical entre junho e agosto
PÁGINA 40
PÁGINA 16 PRECARIZAÇÃO
ARTIGOS
Os atrasos e os entraves das terceirizações
EDITORIAL
PÁGINA 20
PÁGINA 3
Eduardo Navarro
CONJUNTURA SINDICAL Wagner Gomes
PÁGINA 9 MULHER Raimunda Gomes
PÁGINA 15 REFORMAS
Pela ampliação da democracia – o debate da reforma política
PÁGINA 24
ISSN 2179-829X Av. Liberdade, 113 – 4º andar - Liberdade São Paulo – SP CEP 01503-000 Fone: (11) 3106-0700 E-mail: imprensa@ctb.org.br
Hora de arregaçar as mangas
CAMINHOS PARA A VALORIZAÇÃO DO TRABALHO
ENTREVISTA – NILTON VASCONCELOS
PANORAMA
Os profissionais liberais e o desafio do sindicalismo de profissões
PÁGINA 30
EDUARDO NAVARRO
Visão Classista é uma revista trimestral, publicada pela CTB – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil.
EDITORIAL
JUVENTUDE Paulo Vinicius
PÁGINA 23 TRABALHO INFANTIL Márcia Viotto
PÁGINA 29 MUNDO DO TRABALHO Joílson Cardoso
PÁGINA 42
a última década, o movimento sindical saiu em luta para reconquistar sua capacidade de direção da classe trabalhadora. Essa retomada se deu no curso do próprio processo político, pelo qual o país passou a partir da eleição do presidente Lula. Se por um lado o Brasil cresceu, distribuiu melhor a renda e gerou mais emprego – inclusive com a formalização dessa mão de obra com carteira assinada, por outro, as Centrais Sindicais se fizeram presentes em momentos-chave para “desamarrar o nó” para os trabalhadores. Essa ação foi refletida, por exemplo, na construção das marchas a Brasília pela valorização do salário mínimo; no posicionamento pelo fim do fator previdenciário e do reajuste das aposentadorias; na luta pela redução da jornada de trabalho, entre outras tantas lutas em defesa dos direitos laborais. É bom salientar que este desenvolvimento econômico deve vir acompanhado de valorização do trabalho, fator-chave não só para os trabalhadores, mas também para a maioria da população brasileira. Nesse sentido, muito ainda precisa ser feito para que a classe
trabalhadora tenha maior valorização. Dentro dessa constatação, o governo brasileiro convocou a 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente, que deve debater e formular soluções para questões como trabalho escravo, trabalho infantil e trabalho precário. Ações também deverão ser construídas no tocante à igualdade de oportunidade e de tratamento para mulheres, jovens e população negra, bem como para coibir praticas antissindicais. A revista Visão Classista foi a campo para examinar essas questões que grassam no mundo do trabalho. Uma série de artigos complementa a posição da CTB sobre o trabalho decente. Damos continuidade ao quadro Sindicalismo, o qual apresenta a realidade de diversas categorias profissionais ou segmentos de atuação sindical. Além disso, trazemos para nossos leitores o olhar sobre o sindicalismo dos profissionais liberais, sua importância e suas contribuições para a luta geral. Começamos, a partir deste número, a debater uma série de reformas necessárias para a nação brasileira, com o objetivo de aprofundar a democracia. O primeiro capítulo é a Reforma
Política, que se faz necessária para melhor organizar as regras de participação social nas instancias de poder. Para tanto, ouvimos os partidos políticos com perfil de esquerda e as Centrais Sindicais. As contribuições colhidas pela nossa reportagem junto aos respectivos institutos procuram dar novo sentido à participação política dos trabalhadores e trabalhadoras. Por fim, gostaríamos de destacar outra reportagem que nos orgulha pelo seu exemplo. Trata-se da história do Movimento Contra a Carestia (MCC), ação de um grupo de populares da periferia de São Paulo – composto principalmente de mulheres e de mães de família. Ali nascia um dos movimentos sociais mais fortes de seu período e que veio a se desdobrar em tantos outros que contribuíram para a redemocratização do país. Se formos fazer um paralelo com os dias atuais, o MCC teria as mesmas dimensões do MST ou das Centrais Sindicais. No mais, é hora de arregaçar as mangas para mais uma luta em prol da valorização do trabalho. Mas sem antes se esquecer de fazer uma boa leitura em nossa Revista.
Este desenvolvimento econômico deve vir acompanhado de valorização do trabalho
Eduardo Navarro é secretário de Imprensa e Comunicação da CTB VISÃOClassista
3
CAPA
Caminhos para a valorização do trabalho Ao descartar o projeto neoliberal, Brasil depende agora de uma aposta certeira em seu desenvolvimento Umberto Martins
R
ealizada em São Paulo no dia 1º de junho de 2010, por iniciativa das centrais sindicais (CUT, Força Sindical, CTB, UGT, Nova Central e CGTB), a Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat) apontou um rumo político para a classe trabalhadora brasileira: a luta por um novo projeto nacional de desenvolvimento fundado na soberania, democracia e valorização do trabalho. A bandeira unitária do movimento sindical, que orienta as resoluções aprovadas por cerca de 30 mil lideranças presentes na conferência, é levantada em boa hora. As derrotas políticas e eleitorais impostas ao neoliberalismo desde 2002, reforçadas pela vitória de Dilma Rousseff em 2010, recolocam na ordem do dia a questão do desenvolvimento nacional, deliberadamente ignorada nos anos neoliberais governados pelos tucanos. A instabilidade e crise da ordem econômica mundial também remetem ao debate do tema. Não se trata de ressuscitar o velho nacional-desenvolvimentismo que, em seu tempo, desempenhou um papel progressista no processo de industrialização do país (1930-1980), mas foi liderado por representantes
4
VISÃOClassista
das elites capitalistas, que nos anos 1990 abriram caminho ao neoliberalismo e sustentaram um modelo econômico subordinado aos interesses dos EUA e da banca internacional.
Bandeira política Desta vez a proposta parte de lideranças dos trabalhadores, evidenciando certo amadurecimento do movimento sindical e a elevação do nível político da luta classista. A experiência ensina que as batalhas econômicas isoladas das categorias por melhores salários e condições de trabalho não bastam. É imperioso participar ativamente das lutas políticas nacionais para melhor defender os interesses da classe. A ideia de um novo projeto nacional de desenvolvimento, tendo por fonte a valorização do trabalho, nasce em oposição ao neoliberalismo. Este último traduz, na esfera ideológica e nas práticas políticas, os interesses da oligarquia financeira. Seu fundamento é a desvalorização da força de trabalho, temperada pela ampliação dos laços de subordinação econômica dos países mais pobres aos mais ricos. Na concepção neoliberal, a depreciação do trabalho é o caminho natural para a recuperação dos lucros capitalistas e aumento da competitividade empresarial, sendo parte essencial da receita teórica para o “desenvolvimento”, ao lado da liberalização, privatizações e do (mal) chamado Estado mínimo.
Ideias e interesses de classe A crise contribuiu para desmoralizar tais ideais, mas não era de se esperar que desaparecessem da história porque estão fortemente enraizadas nos
PRIMEIRO PASSO Sai FHC, entra Lula: início de mudanças que ainda precisam ser consolidadas interesses dos grandes capitalistas. Por esses dias, elas se revelam com redobrada virulência nos retrocessos em curso na Europa, onde os governos, sob a batuta do FMI e a pretexto de combater a crise fiscal, uma política econômica cruel, que objetiva o desmantelamento do estado de bem-estar social e impõe o corte de salários e direitos antes considerados símbolos de um capitalismo supostamente democrático e popular, despertando a enérgica revolta dos assalariados. O Brasil já conheceu as consequências nefastas do
neoliberalismo tucano. Aprendeu que este serve aos desígnios do capital financeiro, mas não condiz com os interesses nacionais. Ao contrário do que prometiam seus defensores, as políticas neoliberais não acarretaram desenvolvimento. Foram acompanhadas pelo aumento espetacular das taxas de desemprego, que ultrapassaram 20% nas regiões metropolitanas, baixo crescimento do PIB, redução dos investimentos públicos e maior vulnerabilidade externa. O desemprego massivo, a diminuição de direitos sociais,
o desmanche de serviços e empresas públicas e a crescente precarização das relações de trabalho deprimiram o mercado interno e obstruíram o caminho do desenvolvimento nacional. Observase nos fatos que a depreciação do trabalho serve ao objetivo de elevar os lucros individuais dos capitalistas, mas isto não significa mais investimentos produtivos e crescimento econômico, pois o sacrifício imposto aos assalariados também reduz o consumo da sociedade e, por consequencia, o ritmo das atividades.
Falsas promessas O povo brasileiro não tardou a perceber que as promessas de progresso e modernidade embutidas na mensagem neoliberal eram falsas, como enganosas e calamitosas foram a paridade artificial e o câmbio fixo do Plano Real. A resposta brotou das urnas nas eleições presidenciais de 2002, em que tucanos e aliados sofreram uma derrota histórica e novas forças políticas, lideradas pelo Partido dos Trabalhadores e por Lula, foram alçadas ao Palácio do Planalto. VISÃOClassista
5
CAPA contratos e desemprego em massa, foi interrompido e começou a ser revertido.
Novo cenário político
CONQUISTA Desemprego cai, mas trabalho ainda é desvalorizado A vitória de Lula – um operário formado politicamente no chão de fábrica e na escola do sindicalismo – e do PT, aliados originalmente ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), refletiu o avanço da consciência popular e demonstrou a capacidade e força política da classe trabalhadora. O novo cenário que emergiu do pleito de 2002 abriu espaço aos movimentos sociais e a novas concepções e práticas de governo. O neoliberalismo não foi liquidado, sobrevive e é dominante em aspectos cardeais da política econômica, mas teve o seu caminho interditado em vários sentidos, com destaque para a esfera social e o front externo. O processo de desvalorização da força de trabalho, com flexibilização e precarização crescente dos
6
VISÃOClassista
O primeiro passo nesta direção foi o arquivamento da proposta de reforma sindical encaminhada pelo governo do tucano Fernando Henrique Cardoso ao Congresso Nacional e que chegou a ser aprovada pela Câmara dos Deputados e aguardava votação no Senado. O projeto instituía o primado do negociado sobre o legislado, abrindo caminho para a supressão de direitos como férias, 13º Salário, jornada regulada, licença-maternidade e outras conquistas obtidas ao longo de mais de um século de lutas. O governo Lula legalizou as centrais sindicais, inaugurou um novo relacionamento com as lideranças dos movimentos sociais, democrático, e estimulou a unidade das centrais sindicais. Contemplou demandas importantes da classe trabalhadora, com destaque para a política de valorização do salário mínimo e o programa Bolsa Família. Foi muito diferente de FHC, que iniciou seu governo, em 1995, com uma ofensiva truculenta e reacionária contra os petroleiros, acabou com a política salarial, chamou os aposentados de vagabundos para justificar o arrocho de seus parcos vencimentos e promoveu dezenas de Medidas Provisórias (MPs), leis, decretos e portarias para flexibilizar a legislação trabalhista em detrimento dos direitos dos assalariados.
Mudanças relevantes Também foram efetuadas mudanças relevantes na política econômica, malgrado a orientação conservadora para as áreas fiscal, monetária e cambial. Aparentemente, a ideologia do Estado mínimo foi posta de lado. O BNDES ganhou nova direção e filosofia. Em 2007 foi lançado o Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). A indústria naval foi resgatada do estado falimentar a que foi induzida por FHC. Concomitantemente, a política externa comandada pelo ministro Celso Amorim privilegiou o comércio Sul-Sul, o fortalecimento do Mercosul, a integração latinoamericana, a parceria com a China e outros países que compõem o Brics. Rejeitou a Alca e relegou a segundo plano as relações com as potências que dominam a caótica ordem econômica internacional. O governo deixou de ser dominado pelo chamado espírito de vira-lata, que orientava as relações do Brasil com os Estados Unidos e a União Europeia nos anos inglórios do neoliberalismo. Em diferentes ocasiões, o choque entre as diplomacias do Brasil e EUA ficou visível, como na reação diante do golpe em Honduras, fundação da Comunidade dos Países da AL e Caribe (sem a presença do império) e proposta de acordo com o Irã em torno da energia nuclear.
Conforme já assinalavam pensadores como Adam Smith e Karl Marx, o trabalho é a fonte original de todo valor agregado à economia durante o processo de produção, a substância invisível do lucro, dos salários e outras formas de renda, bem como da moeda, pois o dinheiro, conforme Marx, não é mais que representação de tempo de trabalho, um símbolo de trabalho abstrato. Daí se compreende, por exemplo, a identidade entre emprego e produção. Quanto maior o número de pessoas ocupadas num país, menor será a taxa de desemprego e maior o volume e o valor da produção sob dada jornada e produtividade social do trabalho. Quanto mais gente trabalhando maior será a renda gerada. Fartura de emprego é sinal de prosperidade, enquanto desemprego é o principal sintoma de crise.
Valorização do trabalho e luta de classes
Soberania e desenvolvimento Tal orientação manteve sintonia com a direção dos ventos do desenvolvimento desigual das nações, uma lei do capitalismo moderno que hoje tem por principal característica o progressivo deslocamento do poder econômico mundial do Ocidente para o Oriente, com a decadência das velhas potências capitalistas (EUA, União Europeia e Japão) e a ascensão da China e, em menor medida, da Índia, do próprio Brasil e Rússia. Sinal inequívoco deste movimento histórico, que tem caráter objetivo, é a elevação da China à condição de segunda maior economia mundial, maior exportadora e principal parceira comercial do Brasil a partir de 2009. Ao privilegiar o comércio Sul-Sul e se afastar dos EUA e da União Europeia, a política externa contribuiu para reduzir a
VANGUARDA Agenda da Conclat reúne propostas da classe trabalhadora dependência comercial e financeira da economia brasileira em relação às potências capitalistas que hoje amargam uma fase de declínio. A soberania econômica se revela uma condição fundamental para o desenvolvimento. Fatores como a valorização do salário mínimo, recuperação do papel do Estado na promoção do desenvolvimento (ainda que tímida) e a política externa altiva e soberana, subtraíram a economia da letargia legada pela crise da dívida nos anos 1980 e pelo neoliberalismo que invadiu e dominou a década seguinte. Também foram fundamentais para amortizar os impactos da crise econômica exportado pelos EUA e que por aqui aportou no segundo semestre de 2008. A produção passou a crescer
num ritmo maior a partir de 2004, a oferta de emprego aumentou de modo expressivo, reduzindo substancialmente a taxa de desocupação, os salários reais e a massa salarial subiram. Ao longo dos oito anos de governo Lula foram criados quase 15 milhões de novos postos de trabalho com carteira assinada.
A fonte do PIB A evolução da economia nacional ao longo dos últimos anos indica que, ao contrário das suposições neoliberais, a valorização da classe trabalhadora, com melhores salários, mais direitos e empregos com carteira assinada, é uma fonte e não um obstáculo ao crescimento econômico e ao desenvolvimento nacional.
Por essa razão, políticas que favorecem o pleno emprego demandadas pela classe trabalhadora – como a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais sem redução de salários – tendem a produzir impactos positivos na economia, ampliando o mercado interno e estimulando a produção, mas os representantes do capital, temendo a redução dos lucros, são francamente hostis à ideia. Em geral os interesses da classe trabalhadora estão em harmonia com os interesses nacionais, as bandeiras da classe trabalhadora também podem ser consideradas bandeiras desenvolvimentistas. O mesmo já não se pode dizer da oligarquia financeira, hegemônicos no interior do sistema capitalista, cuja ordem neoliberal, liderada pelos EUA, está conduzindo o mundo ao caminho do retrocesso civilizacional, da barbárie, destruição da natureza e guerra. A defesa do desenvolvimento das forças produtivas nacionais também VISÃOClassista
7
CONJUNTURA SINDICAL WAGNER GOMES
CAPA Joca Duarte
A Agenda da Conclat e o desenvolvimento do país
A
UNIDADE Ato do 1º de Maio reforça protagonismo do trabalhador interessa diretamente à classe trabalhadora, pois é patente que, em um ambiente democrático, contribui para o aumento do emprego, salários e direitos sociais. É esta a mensagem contida na bandeira de luta da Conclat por um novo projeto de desenvolvimento nacional com soberania, democracia e valorização do trabalho. A classe trabalhadora é o verdadeiro sujeito do desenvolvimento e deve ser também seu objeto. Em outras palavras, o crescimento das forças produtivas, o avanço da ciência e da produtividade do trabalho devem servir à maioria da sociedade e não apropriados, como hoje, por uma classe minoritária de grandes proprietários, gerando concentração de renda, com riqueza num polo e miséria noutro. Uma distribuição mais justa da renda, conforme preconizava o economista Celso Furtado, transforma-se num pressuposto do desenvolvimento.
Consciência de classe As resoluções da Conclat apontam o caminho e muitos objetivos da luta sindical em curto e médio
8
VISÃOClassista
prazo. Incluem a denúncia e a rejeição dos fatores que obstruem o desenvolvimento, com destaque para a política macroeconômica (juros altos, superávit primário e câmbio flutuante). Naturalmente, as reivindicações apresentadas pelas centrais são componentes essenciais do novo projeto de desenvolvimento. Em curto prazo, as principais bandeiras unitárias são o fim do fator previdenciário; a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais, sem redução de salários; o fim das práticas antissindicais; a regulamentação das regras da terceirização; a regulamentação da Convenção 151 da OIT; agilidade nos trâmites da Convenção 158 da OIT. Nada disso virá sem luta. O novo projeto proposto pelos trabalhadores não fica restrito à pauta sindical e à mudança da política macroeconômica. Propõe uma agenda mais ampla, destacando a luta por reformas democráticas (política, agrária, educacional, tributária, urbana, midiática) e busca incorporar e representar as demandas progressistas das mulheres, dos negros, dos homossexuais, os anseios da juventude, a defesa do meio
ambiente e da agricultura familiar. É solidário com as lutas dos povos por soberania e democracia, por uma nova ordem mundial e pela paz. As famílias que pertencem à classe trabalhadora compõem uma ampla maioria da sociedade brasileira. Segundo o IBGE, mais de dois terços das pessoas ocupadas no país são empregados, sem propriedade ou controle sobre os meios de produção, forçados a vender sua força de trabalho para sobreviver. O sindicalismo representa apenas parte deste contingente, ao qual se somam milhões de trabalhadores por conta própria e pequenos produtores, sobretudo do campo, que possuem interesses convergentes e podem caminhar unidos sob a bandeira de um novo projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho. Durante os próximos meses, a sociedade brasileira terá a oportunidade de dar um passo adiante neste processo, por meio da 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente. A temática da valorização do trabalho certamente fará parte desse debate – momento que pode vir a se tornar emblemático e colocar um ponto final na história do neoliberalismo no Brasil.
grande mobilização no Dia do Trabalhador deste ano, com o ato unificado promovido pelas cinco das seis centrais sindicais reconhecidas pelo governo federal, mostrou que o movimento sindical coloca como prioridade a Agenda da Classe Trabalhadora, com vistas a um projeto nacional de desenvolvimento que privilegie a soberania, a democracia e a valorização do trabalho. A manifestação do Dia 1º de Maio foi resultado da mobilização conjunta das centrais brasileiras e de seu comprometimento com a valorização do trabalho como caminho para o desenvolvimento, política que vem marcando os últimos anos de luta do movimento sindical. A Agenda obtida pelas centrais a partir da realização da Conclat, em junho de 2010, surgiu pela necessidade de reafirmar uma nova política de desenvolvimento, na qual a classe trabalhadora tenha participação ativa nas grandes decisões do país. Foi a partir desse documento que apoiamos Dilma Rousseff nas eleições
presidenciais e será a partir dele que cobraremos do atual governo novos avanços para o país. Somente em 2010, foram criados mais de 2,8 milhões de novos postos de emprego com carteira assinada – dados que demonstram a economia brasileira em crescimento. A experiência recente mostra que essa transformação econômica é necessária, obviamente, mas não tem sido o bastante para diminuir grande parte das desigualdades sociais do país. O atual cenário político nacional abriu o espaço necessário para que as centrais coloquem em pauta sua Agenda. Nas últimas semanas, o governo abriu uma ampla Mesa de Negociações com o movimento sindical. Além de expormos nossas reivindicações sobre temas como a redução da jornada de trabalho e o fim do fator previdenciário, é preciso deixar claro, por exemplo, nossa visão sobre temas mais amplos, como a condução da política macroeconômica do país – tema que o mercado financeiro e a mídia têm pautado com mais eficiência do que nós e os demais movimentos
sociais. A Agenda da Conclat também precisará ser resgatada ao longo dos próximos meses, no âmbito das discussões da 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente. Nossa pauta precisa ser debatida em cada fórum municipal, regional e estadual. O empresariado e o governo certamente defenderão seus interesses, e será preciso equilibrar essa correlação de forças, sob o risco de sérios retrocessos para os trabalhadores. É preciso termos claro que somente por meio da valorização do trabalho, aliado ao conceito de “trabalho decente”, o país alcançará um nível de desenvolvimento que se traduzirá em melhorias reais do bem-estar social. Os 15 milhões de empregos gerados durante os dois mandatos de Lula merecem elogios, sem dúvida, mas o Brasil só terá motivo para comemorar quando esse crescimento vier acompanhado de todos os direitos trabalhistas, do fim do trabalho infantil e escravo, de um nível mais justo de remuneração, de maiores índices de formalidade e da proteção adequada. Antes disso, nos resta muita luta pela frente!
O atual cenário político nacional abriu o espaço necessário para que as centrais coloquem em pauta sua Agenda
Wagner Gomes é presidente nacional da CTB. VISÃOClassista
9
Fotos Setre
entrevista
Nilton Vasconcelos
É preciso discutir a qualidade do emprego e sua valorização Fernando Damasceno
A
pós um longo período de discussões, o Brasil finalmente vai realizar, em maio de 2012, sua 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente e Emprego. Para o secretário de Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Estado da Bahia, Nilton Vasconcelos, será uma grande oportunidade para que o país dê passos importantes rumo à extinção de pautas como o trabalho escravo e infantil, além de conquistar avanços no que diz respeito à valorização do emprego. Vasconcelos nasceu em Guanambi, cidade do sudoeste baiano, a quase 800 quilômetros da capital Salvador. Casado e pai de quatro filhos, assumiu o cargo de secretário de Estado no dia 2 de janeiro de 2007. Graduado em Arquitetura, cursou Mestrado em Administração no Núcleo de Pós-Graduação da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde elaborou dissertação sobre a modificação de relações de trabalho frente a inovações gerenciais, obtendo o título de mestre. Na mesma instituição, concluiu, em 2001, o Doutorado em Administração Pública com a Tese que abordou o processo de elaboração de políticas públicas de emprego. É professor do curso de
10
VISÃOClassista
Administração do Centro Federal de Educação Tecnológica da Bahia (Cefet-BA), cargo do qual está licenciado desde janeiro de 2007, quando tornou-se secretário de governo. É membro do Conselho Diretor dessa instituição. Vasconcelos também foi secretário de Serviços Públicos, em Salvador, na gestão eleita em 1985, e assessor-chefe do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac), no governo eleito em 1986. Militante do PCdoB desde a juventude, integra o Comitê Estadual do partido. Sua atividade política começou na adolescência, ao participar efetivamente do movimento estudantil. Foi presidente do Diretório Acadêmico de Arquitetura e membro do Diretório Central dos Estudantes (DCE/UFBA). Depois dirigiu o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/BA) por duas gestões. Desde janeiro deste ano, além de ocupar o cargo no governo baiano, Vasconcelos também se tornou presidente do Fórum Nacional de Secretários do Trabalho (Fonset), espaço de diálogo e troca de experiência entre os estados e de negociação junto a órgãos governamentais. Dentre outras finalidades, a entidade tem por objetivo definir e firmar posições em torno de problemas relacionados ao trabalho, como fortalecer a participação dos estados
Teremos melhores resultados na mesma proporção em que for feita mais pressão
na definição de política trabalhista brasileira e colaborar com o Ministério do Trabalho e Emprego com sugestões que proporcionam o aperfeiçoamento e harmonização nas relações do trabalho. Leia a seguir a entrevista: Visão Classista: Qual sua expectativa para os trabalhos da 1ª Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente? Nilton Vasconcelos: Está será uma Conferência atípica, pois foi convocada no ano passado e será realizada somente em 2012 – no final, é um processo que levará quase três anos. Agora em maio começaram as conferências municipais e regionais; as estaduais deverão começar em agosto. VISÃOClassista
11
entrevista Outra característica que chama a atenção é sua composição das delegações: cada setor (empresários, trabalhadores e governo) deve eleger uma proporção de 30% – com os 10% restantes destinados à sociedade civil. É preciso dizer também que nossa agenda se dá com relativo atraso – o tema do trabalho decente, por exemplo, remete ao ano de 2003. Esta, no entanto, é uma etapa nova, na qual se conclama a sociedade para discutir não apenas os temas gerais sobre o trabalho decente, mas para pressionar os diversos setores sobre temas como trabalho escravo e infantil. Teremos melhores resultados na mesma proporção em que for feita mais pressão. Visão Classista: O Brasil está pronto para discutir a questão do
trabalho decente? Nilton Vasconcelos: O Brasil sem dúvida é um dos países mais avançados na discussão sobre esse tema, mas é claro que precisamos avançar muito. Se por um lado o país tem uma Justiça do Trabalho estruturada, uma Procuradoria do Trabalho e um Ministério do Trabalho atuante, além de um sistema público com garantias asseguradas para o grande contingente da população, por outro ainda temos quase 50% dos trabalhadores na informalidade e pouca cobertura previdenciária. Visão Classista: Você consegue vislumbrar em torno de que pontos haverá maiores embates na Conferência? Nilton Vasconcelos: Não que eu tenha a expectativa de que haja esse tipo de polêmica, mas
no próprio Congresso o tema relacionado a direitos e obrigações dos empregadores é uma discussão mascarada sob o custo do trabalho. Isso deverá estar presente. A questão da estabilidade também, assim como a efetiva adoção por parte do Brasil da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Esses serão certamente temas de grandes polêmicas durante a Conferência. Visão Classista: Pelo que você tem observado, como se dará a representação do empresariado nesse processo? Nilton Vasconcelos: Minha impressão é a de que eles vão participar ativamente. Eles vão fazer sua parte dentro do caráter tripartite da Conferência. Eu diria até que os empregadores têm sido muito ativos na defesa de suas
posições, desde a formulação de sua estratégia e também na identificação dos temas. Pelo lado dos trabalhadores, não vamos fugir de apontar a discussão sobre política macroeconômica, embora não seja um ponto especifico do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Também trataremos de questões como seguro-desemprego, cooperativismo, economia solidária. Certamente haverá margem para muitos debates. Visão Classista: Como você tem sentido a participação do governo federal nesse processo? Você acha possível existir algum tipo de choque entre o MTE e outros ministérios? Nilton Vasconcelos: O governo federal tem demonstrado um comando firme nesses primeiros meses de Dilma Rousseff na Presidência da República. É natural que haja divergências internas, mas certamente elas não aparecerão com posições diferentes. Entendo que no momento da Conferência já haverá posicionamentos bem definidos pelo Executivo. Visão Classista: A respeito das conferências municipais/regionais e estaduais, que tipo de mobilização é necessária para o maior desenvolvimento das propostas? Nilton Vasconcelos: As conferências municipais, regionais e estaduais estão sendo marcadas e aos poucos já vão mobilizando diferentes setores da sociedade. Os governadores estão convocando e fazendo seu papel. Aqui na Bahia o governador Jaques Wagner também tem incentivado esse debate, mas temos uma trajetória um pouco diferente, pois já é nossa terceira Conferência Estadual, com uma agenda mais desenvolvida. No entanto, nosso esforço, como presidente da Fonset, é para que todos os estados tenham suas
12
VISÃOClassista
VISÃOClassista
13
MULHER
conferências. É certo também que encontraremos situações bem distintas pelo Brasil afora. Em alguns estados não haverá conferências regionais, mas apenas estaduais. Em outros, certamente as discussões serão mais disseminadas, de acordo com suas particularidades e seus diferentes níveis de mobilização. Visão Classista: A respeito de temas ligados à agricultura familiar e ao emprego rural, que demandas deverão vir à tona na Conferência? Nilton Vasconcelos: Esse é sem dúvida um dos temas fundamentais da Conferência. A agricultura familiar não é uma atividade associada ao emprego, mas ao mesmo tempo ela é impactada por questões como o trabalho escravo e infantil. Outro tema muito próximo tem a ver com falta de oportunidades no ambiente rural, sem falar nos casos de imigrantes – realidade, neste caso, mais comum a grandes centros como São Paulo. A ocupação no campo é um problema expressivo. É preciso trazer contribuições importantes para esse debate. Ao lado de temas típicos, não ligados ao mundo do trabalho – como crédito e a comercialização dos produtos–, mas são limítrofes e interagem com a questão da saúde e segurança do trabalho. Visão Classista: Nesse aspecto, que tipo de participação as centrais sindicais deverão desempenhar junto aos diferentes níveis de debates da Conferência? Nilton Vasconcelos: Algumas centrais sindicais já começam a se preparar, junto de suas bases, para intervir nas conferências. As centrais, antes de qualquer coisa, têm interesse nos temas, obviamente – alguns dos assuntos fazem parte de sua luta habitual. Não será, portanto uma conferência
14
VISÃOClassista
Ainda temos quase 50% dos trabalhadores na informalidade e pouca cobertura previdenciária em que os temas sejam indiferentes. O movimento sindical está mais avançado nessa discussão, sem sombra de dúvida. Diante do novo momento vivido pelo país, com a
criação de 15 milhões de empregos e melhor remuneração, é natural que apareçam novas pautas. Assim, o tema da qualidade do emprego -– e não mais apenas o da quantidade – passa a ser significativo. É natural pensar que haverá uma disputa por uma posição sobre qual caminho deve ser perseguido dentro dessas políticas na área do trabalho. As centrais devem mobilizar e fazer entre elas próprias posicionamentos distintos, mas há muitos que convergem – e é a partir daí que podemos pensar em conquistar avanços significativos. Quando falamos em trabalho decente, trata-se de uma reformulação, de um conceito que já envolve temas tratados há muito tempo, que poderiam ser traduzidos como valorização do trabalho. Seu conjunto é abrangente o bastante para que cada país pudesse ele próprio estabelecer sua agenda.
Raimunda Gomes
entrevista
Trabalho decente também para as mulheres
A
classe trabalhadora em 2011 deve cumprir uma agenda que vai além de suas próprias lutas. No entanto, essa agenda não está dissociada das lutas gerais e se insere na perspectiva de contribuir com as mudanças gerais no seio da sociedade e da organização social do trabalho. Estamos falando das Conferências Nacionais convocadas pelo governo federal em diversas áreas, com o propósito de democratizar e debater com a sociedade civil organizada, por meio dos movimentos sociais, um novo projeto de desenvolvimento para o Brasil. O movimento sindical, em especial a CTB, deve participar ativamente desse processo e estabelecer uma parceria com os demais movimentos sociais para fortalecer as propostas dos trabalhadores e das trabalhadoras. Queremos destacar nesse momento a 1ª Conferencia Nacional de Emprego e Trabalho Decente que ocorrerá em 2012. Sua abrangência é nacional, assim como o seu temário. Seu objetivo é contribuir para a construção, o fortalecimento e a promoção de uma Política Nacional de Emprego e Trabalho Decente a partir das prioridades estabelecidas no Plano
Nacional de Emprego e Trabalho Decente, assegurando a participação das organizações de empregadores e trabalhadores, no sentido de fortalecer o tripartismo, bem como a relação com outras organizações da sociedade civil legalmente constituída. Essa é a primeira Conferência realizada pelo Ministério do Trabalho com tal caráter e deve propor aos governos federal, estaduais, municipais e do Distrito Federal estratégias e diretrizes para formulação e consolidação de uma política nacional de emprego e trabalho decente e empresas sustentáveis, além de políticas que fortaleçam a proteção social aos trabalhadores e trabalhadoras e suas famílias, em especial, dos grupos sociais mais vulneráveis, voltada para o empreendedorismo e a economia solidária priorizando as mulheres e jovens. Deve também propor a realização de campanhas de informação e de prevenção voltadas à eliminação do trabalho forçado e do trabalho infantil, além de monitorar e avaliar as medidas relacionadas ao enfretamento da violência sexual contra crianças e adolescentes. Nesse sentido, a Secretária da Mulher trabalhadora da CTB
chama a atenção das direções estaduais para os prazos estabelecidos nos editais que convocam as respectivas etapas, para se habilitarem a participar em seus municípios, uma vez que a distribuição de vagas para as etapas estaduais e nacional serão compostas por delegações tripartites, distribuídos da seguinte forma: a bancada dos trabalhadores elegerá 30% dos/as delegados/as, os empregadores elegerão 30% e o governo também terá 30%, ficando os 10% restantes para as demais organizações da sociedade civil. Será também considerando o enfoque da igualdade de gênero, raça, etnia e juventude. Cabe aos comitês organizadores incentivar a participação desses segmentos sociais na composição das delegações estaduais e nacional das Conferências, observada a cota de no mínimo, 30% de mulheres. Portanto, nós mulheres devemos, tão logo seja divulgado o documento-base da Conferência, analisálo minuciosamente e estabelecer nossas prioridades, tendo como base a agenda definida na Conclat e no plano de ação da Secretaria da Mulher, sem perder o foco no projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho.
O movimento sindical, em especial a CTB, deve participar ativamente desse processo e estabelecer uma parceria com os demais movimentos sociais
Raimunda Gomes, a Doquinha, é professora, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação do Amazonas e secretária da Mulher Trabalhadora da CTB. VISÃOClassista
15
TRABALHO DECENTE
Entranhas da escravidão que persiste repressiva protagonizada pelos grupos interinstitucionais móveis – formados por integrantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Polícia Federal (PF) ou da Polícia Rodoviária Federal (PRF) – é tida como exemplar. Assim como a crucial elaboração, divulgação e atualização da chamada “lista suja” do trabalho escravo (Portaria 540/2004 do MTE). O cadastro público reúne nomes de empregadores (pessoas físicas e jurídicas) flagrados utilizando mão de obra análoga à escravidão que tiveram as respectivas responsabilidades
reforçadas mediante a conclusão dos processos administrativos conduzidos pela pasta. A “lista suja” facilitou o estabelecimento de regras de cerceamento de financiamento público (que podem ser aprimoradas) e a criação de outra iniciativa elogiada mundo afora: o Pacto Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo. Desde 2005, o Pacto (www.pactonacional. com.br) agrega e orienta companhias e associações privadas comprometidas em eliminar negócios com agentes envolvidos em casos de escravidão.
Ministério Público Federal
devendo?”, indagou a um dos alojados, por curiosidade, o coordenador da fiscalização. “Uns R$ 2 mil”, respondeu o interlocutor, sem pestanejar. Caso operações como essa não existissem, esse trabalhador provavelmente continuaria à disposição para ser explorado criminosamente ainda por muito tempo. O episódio revela o grau de perversidade do trabalho escravo contemporâneo, que dispensa o cerceamento da liberdade de ir e vir. Com a servidão por dívidas, correntes ou bolas de ferro são substituídas por um tipo bem mais sutil de aprisionamento: aquele que fica incrustado na cabeça das vítimas, que se sentem obrigadas a defender a honra como cidadãs e cidadãos honestos e a quitar eventuais “pendências” com os patrões.
ATRASO Sofrimento persiste e responsáveis se lixam
Exploração no campo diminui, mas novos avanços emperram na Justiça e na burocracia do governo Maurício Hashizume
I
ntegrantes do grupo móvel de fiscalização que atuam no combate à escravidão abrem caminho pelo meio da mata, numa distante fazenda de gado do Sudeste do Pará. Eles procuram trabalhadores rurais dedicados à “limpeza” do terreno para a formação de pastagem, serviço popularmente conhecido como
16
VISÃOClassista
Reconhecimento “roço de juquira”. Sob o inclemente calor amazônico, encontram migrantes alojados em casebres de madeira, convivendo com precariedades extremas. A comitiva descobre, então, que está diante de empregados aliciados, que foram trazidos do Maranhão e levados à propriedade distante há menos de três meses. Durante todo esse período, não receberam salários. As cobranças com transporte, aluguel, alimentação e ferramentas estavam sendo acumuladas em dívidas, que viriam a ser descontadas pelo empregador. Por mais complicada que seja a somatória dos valores de mercado para cada item “consumido” até aquele momento, a conta em aberto dificilmente superaria R$ 400 por pessoa. “Quanto você acha que está
Nos últimos 15 anos, mais de 40 mil pessoas foram libertadas de condições análogas à escravidão em território nacional. Aproximadamente 85% dessas libertações ocorreram entre 2003 e 2010. Não há registros oficiais de outra nação que tenha feito tanto para resgatar pessoas escravizadas em tão pouco tempo. Não por acaso, o esforço brasileiro é reconhecido em nível internacional. Basta checar os relatórios globais da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o recente informe especial da Relatora Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para as Formas Contemporâneas de Escravidão. Instituída após pressões sociais que forçaram o reconhecimento da existência do problema por parte do governo brasileiro em meados da década de 1990, a atuação
DE SOL A SOL Nas lavouras, o abuso dos poderosos
Dificuldades Mas não só de loas vive o combate ao crime neste país. Há menos equipes do grupo móvel atuando hoje do que já houve no passado recente. A quantidade de auditores fiscais do trabalho em atividade (cerca de três mil) está bem aquém do que vem sendo recomendado (pelo menos o dobro, seis mil) para um país de economia relativamente diversificada e dimensões continentais como o Brasil. Pelo menos cerca de 200 novos funcionários foram aprovados em concurso, mas ainda não tomaram posse. O contingenciamento de recursos da União também gera reflexos no volume de recursos específicos disponíveis para a erradicação do crime – que bancam as operações dos grupos móveis, coordenados diretamente pela Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) em Brasília (DF). A previsão inicial de R$ 5,3 milhões para este ano caiu para R$ 2,6 milhões, valor 22% menor que os R$ 3,3 milhões gastos em 2010. Dentro desse contexto, estão sendo afetadas especialmente as agendas das Superintendências Regionais de Trabalho e Emprego (SRTEs), unidades estaduais do MTE que promoveram muitas libertações por conta própria ao longo dos últimos anos. As verbas para as diárias e passagens das inspeções trabalhistas gerais, que também permitem as selecionadas incursões das SRTEs no combate à escravidão, foram reduzidas de R$ 23,5 milhões, em 2010, para R$ 11,9 milhões, em 2011. Há registros de cancelamento de averiguação de denúncias de trabalho análogo à escravidão em Estados como Santa VISÃOClassista
17
TRABALHO DECENTE Catarina, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. O vasto rol de lacunas não está apenas nas cifras e pode ser conferido pela simples revisão do conjunto de 66 ações previstas no 2º Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, concluído em 2008. Entre as medidas de enfrentamento e repressão não efetivadas, destaca-se a Ação 21 – que prevê a execução das atividades de Polícia Judiciária pela PF com vistas à facilitação do andamento de processos criminais. Idealizado para dar conta da Ação 30 (que ressalta a necessidade de suprimir a intermediação ilegal de mão de obra), o Programa Marco Zero, apresentado à nação em novembro de 2008 pelo ministro do Trabalho, Carlos Lupi, não evoluiu. Sempre que podem, representantes do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos (CDVDH) de Açailândia (MA), um dos locais escolhidos para abrigar o piloto do Marco Zero, manifestam a falta de conseqüências práticas da promessa de utilização da estrutura do Sistema Nacional de Empregos (Sine) para contratações no meio rural. Na mesma seara repressiva, o acompanhamento de processos relativos a crimes de trabalho escravo (Ação 31) não vem sendo realizado de forma sistemática. A situação é bem mais incipiente, porém, quando se trata das constrangedoras pendências na área de reinserção e prevenção. A Ação 32 do 2º Plano Nacional Política, por exemplo, versa sobre a implementação de “uma política de reinserção de forma a assegurar que os trabalhadores libertados não voltem a ser escravizados”, que incluiria geração de emprego e renda, reforma agrária e educação profissionalizante. Definida como de prazo contínuo, a responsabilidade da ação
18
VISÃOClassista
está atribuída à Presidência da República e a cinco ministérios – Trabalho e Emprego, Justiça, Educação, Desenvolvimento Social e Desenvolvimento Agrário/ Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) - e aos governos estaduais e municipais, com suporte da parceria da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) e da sociedade civil. Muito pouco foi feito também quanto às Ações 33 (que diz respeito à priorização da reforma agrária em municípios de origem, aliciamento e resgate de trabalhadores escravizados) e 38 (sobre identificar e priorizar programas governamentais nas áreas de saúde, educação e moradia municípios reconhecidos como focos de aliciamento). O acesso de resgatados ao Programa Bolsa Família ainda é bastante limitado. Levantamento realizado em dezembro de 2009 identificou que, dos 19,6 mil libertados que tiveram os nomes transmitidos do MTE para o MDS até então, apenas 5,1 mil (26%) estavam sendo diretamente beneficiados pela transferência de renda. A inclusão social e econômica das vítimas da escravidão (Ação 47) avançou pouco até o momento. Praticamente inexistem projetos de escala induzidas pelo poder público nessa linha para além de experiências pontuais realizadas pela SRTE do Mato Grosso.
Sinait
Responsabilidade A exclusão e a vulnerabilidade são fermentos para o trabalho escravo. Metas setoriais isoladas, sem que a pobreza seja encarada de frente, tendem a ter efeito reduzido. Para atacar a desigualdade, não basta exigir interferência decidida do Executivo federal. As pressões voltadas à presidenta Dilma Rousseff, que terá de lançar mão
ENTRAVES Brasil precisa de duas vezes mais auditores
fiscais
de medidas estruturais caso realmente pretenda acabar com a miséria, podem ser estendidas aos governantes estaduais (muitos deles, aliás, signatários da CartaCompromisso Contra o Trabalho Escravo, desde a campanha eleitoral do ano passado) e municipais, que exercem papeis de importância singular na garantia e/ou negação de direitos básicos. São diversas as Comissões Estaduais (Coetraes) que tentam replicar os moldes da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), guardiã das políticas para o setor desde 2003. Houve até a proposta não concretizada de instalação de um Pacto Federativo com o propósito de articular os Estados mais afetados pela escravidão. Tempo e energia são gastos em reuniões pouco produtivas em que conceitos elementares são repetidos à exaustão para estreantes que pousam de pára-quedas. O Legislativo, por sua vez, permanecerá em xeque permanente enquanto não aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Trabalho Escravo (438/2001), que prevê o confisco da terra em que houver escravidão e está estagnada no Plenário desde 2004. A presença de políticos envolvidos em flagrantes, como Inocêncio Oliveira (PR-PE) e Leonardo Picciani (PMDB-RJ), reforçam a imagem negativa do Congresso Nacional, espaço institucional no qual os ruralistas, que insistem com a questionável tese da inconsistência do conceito do trabalho escravo, desfrutam de poder e influência. De todos os Poderes, entretanto, o Judiciário talvez seja aquele em que o combate ao trabalho escravo seja menos perceptível. O Supremo Tribunal Federal (STF) está diante da chance de decidir sobre a consulta para a abertura de processo criminal por trabalho análogo à escravidão contra o
senador João Ribeiro (PR-TO), outro congressista acusado de manter trabalhadores escravizados em área de sua propriedade. Vale lembrar ainda o caso do juiz Marcelo Testa Baldochi, da Justiça Estadual do Maranhão, que também teve fazenda flagrada pelo grupo móvel de fiscalização e continua no cargo. Na esfera da Justiça do Trabalho, a despeito de sentenças assertivas, uma decisão relevante está sendo aguardada. A Cosan, que está unida a Shell numa das maiores empresas sucroalcooleiras do mundo, firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ímpar com a Advocacia-Geral da União (AGU) para que a sua inclusão na “lista suja” por conta de fiscalização que libertou 42 trabalhadores de usina da companhia, não seja mais requerida pelo órgão federal. Falta apenas a homologação da juíza Cilene Ferreira Amaro Santos, da 14ª Vara de Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10), para que o cadastro tenha a legitimidade perigosamente ferida. As condenações criminais por trabalho escravo são ínfimas se comparadas às sucessivas e recorrentes libertações. Recentemente, a Justiça Federal condenou, em primeira instância, o fazendeiro Bertulino Ribeiro do Prado Filho a quatro anos de reclusão por ter mantido 30 pessoas – inclusive adolescentes com menos de 18 anos de idade – em condições análogas à escravidão na Fazenda Triângulo, em Riachão das Neves (BA), em julho de 2006. A pena foi convertida, contudo, em prestação de serviços gratuitos à comunidade e no pagamento de prestação pecuniária de R$ 20 mil. O Ministério Público Federal (MPF) já declarou que não vai recorrer. O réu, por seu turno, recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) e responde o processo em liberdade. VISÃOClassista
19
PRECARIZAÇÃO
Os atrasos e entraves das terceirizações Apesar de avanços no governo Lula, país está longe de se livrar de uma de suas principais mazelas Celso Jardim
O
Brasil pôde comemorar, no início de 2011, uma marca histórica: durante os oito anos do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram criados 15 milhões de novos empregos com carteira assinada, dado completamente diferente do período anterior dominado pelo neoliberalismo (1990 a 2002), quando novas vagas eram escassas e os direitos trabalhistas passaram a ser cada vez mais flexibilizados e desregulamentados. Exatamente na década de 1990, no período caracterizado pelas políticas neoliberais, é que a agenda de flexibilização ganhou maior destaque no cenário nacional, no contexto particular de inserção financeira do país no processo da globalização, com baixo crescimento econômico, desestruturação do mercado de trabalho, fragilização dos sindicatos e a hegemonia de formas liberalizantes. O mecanismo das terceirizações passou a ser usado com maior
20
VISÃOClassista
doenças ocupacionais. Tal problema vem ocorrendo em vários setores da economia.
O drama da construção civil
intensidade como uma técnica moderna de administração, modelo copiado de alguns países do chamado “primeiro mundo”. A partir desse formato, empresas de pequeno, médio e grande porte passaram a transferir para terceiros a incumbência pela execução das atividades secundárias. Acreditando que com a terceirização de serviços ficariam mais ágeis e poderiam conquistar novos mercados, essa prática acabou por criar um grande problema no mercado de trabalho, que passou a ser movido, cada vez mais, por prestadores de serviços terceirizados.
Exemplo histórico Um dos casos mais visíveis de serviços terceirizados – e suas consequências – aconteceu em 2001, no acidente da maior plataforma do mundo em prospecção de petróleo no fundo do mar, a P-36, que afundou após a constatação de falhas humanas e técnicas. Naquela época, a Petrobras chegou a ter em seus quadros cem mil trabalhadores terceirizados, contra 34 mil funcionários próprios. Na ocasião, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) e o Sindicato dos Petroleiros do Norte-Fluminense previam e alertavam que o aumento dos acidentes e incidentes daqueles anos aconteceram por causa do aumento das terceirizações. Para as entidades sindicais, o aumento dos casos decorria pela
DESCASO Em Jirau, péssimas condições resultaram na revolta dos trabalhadores falta de treinamento dos prestadores de serviços terceirizados. Diante de tal quadro, os sindicalistas reivindicavam que a empresa estatal parasse de contratar prestadores de serviços fora de seus quadros. Sua justificativa era puramente racional: os números de acidentes de trabalho na Petrobras daquele período registravam que a cada dez trabalhadores acidentados, oito eram terceirizados.
Precarização O movimento sindical, com os olhos voltados para o trabalho
decente, tem focado seus esforços nos princípios e direitos trabalhistas quanto às condições de profissionais e o elevado número de horas extras realizadas, com destaque para a precarização da atividade da massa trabalhadora por meio das terceirizações As empresas terceirizadas não oferecem planos de cargos e carreiras – e dificilmente o funcionário terá uma promoção da empresa se quiser postos mais altos. Quem é contratado pela empresa terceirizada nem sempre tem os mesmo direitos da empresa contratante, como assistência
médica, odontológica e outros benefícios. A CTB e diversos sindicatos comprometidos com uma visão classista das relações de trabalho têm procurado combater os serviços terceirizados tanto na indústria privada, como também nos serviços públicos – principalmente nos estados comandados por governos em que a postura neoliberal ainda predomina. O aumento da jornada de trabalho e a intensificação da exploração, assim como a maior exposição a situações de risco têm resultado no aumento de acidentes e
O setor da construção civil foi um dos que contribuiu para o aumento de empregos formais em 2010, ano que foi marcado pela criação de 2,5 milhões de novas carteiras assinadas. Apesar de tais avanços, seus trabalhadores enfrentam um paradoxo: de acordo com Miraldo Vieira, secretáriogeral da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria da Construção e do Mobiliário (Contricom), “a construção civil no Brasil é o setor da economia com maior informalidade no mercado de trabalho”. Ele lembra também que o setor é, atualmente, responsável por 11,6% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro – percentagem que deve se tornar ainda maior nos próximos anos, em virtude do déficit habitacional do país. Segundo pesquisa do PNAD/ IBGE, 39,94% dos ocupados na construção civil são autônomos e trabalham por conta própria, enquanto 32,11% trabalham sem carteira assinada. A pesquisa aponta ainda que 4,3 milhões de trabalhadores não têm qualquer tipo de vínculo empregatício. Na construção civil, além da terceirização os operários vivem o drama da quarteirização e até da quinteirização – prática responsável pelos baixos salários, pela precarização da mão de obra e por grande parte dos acidentes de trabalho, de acordo com o dirigente da Contricom.
Rebeliões pelo Brasil Pascoal Carneiro, secretário-geral da CTB, comenta que a precarização trabalhista na construção civil já se tornou um caso típico de terceirização. Ele destaca como VISÃOClassista
21
JUVENTUDE
exemplo dessa relação a situação dos trabalhadores das obras da Usina Hidrelétrica de Jirau, cuja repercussão atingiu fronteiras muito além da região amazônica. Em 15 de março, parte dos cerca de 22 mil trabalhadores da Usina, localizada em Rondônia, levantaramse contra as péssimas condições de trabalho em que viviam. Mais do que isso: muitos compreenderam que o consórcio Energia Sustentável do Brasil, formado pelas empresas Camargo Corrêa, Suez e Eletro, estavam lucrando às custas de sua exploração. Na ocasião, dezenas de veículos foram incendiados e algumas instalações do canteiro de obras acabaram depredadas. Praticamente todos os alojamentos foram reduzidos a cinzas. Segundo os trabalhadores, o estopim para sua reação foi a agressão, por parte de um motorista da empresa que transporta os funcionários, a um operário que fora impedido de embarcar porque não possuía autorização para deixar o canteiro. A situação, então, tornou-
se incontornável. Por causa da manifestação, cerca de 35 trabalhadores foram presos. “Foi uma manifestação espontânea sem liderança, com depredação aos alojamentos, veículos e equipamentos. A manifestação se caracterizou em uma revolta dos trabalhadores contra as condições de trabalho no canteiro de obras da usina hidrelétrica de Jirau, às margens do Rio Madeira, ocasionada pela terceirização desenfreada da mão de obra”, recorda Pascoal. No total, ao longo do mês de março deste ano, quando os operários da construção civil de Jirau desencadearam sua greve, mais de 80 mil trabalhadores paralisaram outras obras de hidrelétricas, refinarias e centrais termoelétricas. Como resultado, as centrais sindicais conseguiram um acordo com o governo e as empreiteiras, no sentido de garantir aos trabalhadores melhores condições de trabalho e a diminuição das terceirizações durante a continuidade das obras.
TRAGÉDIA Na P-36, em 2001, o resultado de uma política inábil
22
VISÃOClassista
O esforço contra as terceirizações A CTB tem concentrado esforços em suas articulações junto ao governo federal e à Câmara dos Deputados para acabar com a terceirização nas atividades-fins. Desde o mês de maio, quando foi estabelecida uma Mesa de Negociações das centrais sindicais com o Palácio do Planalto, o tema foi retomado com a perspectiva de ser levado ainda este ano para um debate mais amplo. O presidente da CTB, Wagner Gomes, tem reafirmado que é totalmente contra os projetos sobre terceirização que atualmente estão em tramitação no Congresso, redigidos pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo deputado Sandro Mabel. “A CTB rechaça completamente esses dois projetos, pois eles não controlam a terceirização. Pelo contrário: eles acabam ampliando seu uso de forma irresponsável e promovem a precarização. Apoiamos a proposta criada pelo Fórum das Centrais e o Ministério do Trabalho, que proíbe a terceirização nas atividades-fins, como defende o enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho”, afirmou Wagner Gomes. Para o dirigente, a regulamentação dessa matéria será importante, mas pode ter seu alcance ainda mais abrangente se ela for combinada com a resolução 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que combate a rotatividade nas empresas. “Se atacarmos essas duas frentes, iremos obter um avanço histórico, tanto no sentido de valorizar mais o trabalho no Brasil, quanto no impacto positivo para o desenvolvimento e a economia do país”, disse o presidente da CTB.
Paulo Vinícius
PRECARIZAÇÃO
Desenvolvimento e Valorização do Trabalho para a Juventude
O
s debates sobre o Trabalho Decente ganham nova dinâmica com a previsão da realização da sua 1ª Conferência, em maio de 2012. O Brasil, ao superar duas décadas de estagnação econômica e marcado por uma vertiginosa urbanização, tem nessa agenda uma tribuna dos trabalhadores: pautar que modelo de desenvolvimento queremos e sua relação com o crescimento econômico. Seu mérito principal é centrar o debate na qualidade e condições de trabalho, dando feição nítida à luta pela sua valorização como exigência do crescimento econômico. Ainda lutamos para que se respeitem normas internacionais do trabalho, princípios e direitos fundamentais, como a liberdade sindical, a efetividade do direito de negociação coletiva, o fim de todas as formas de trabalho forçado, do trabalho infantil e a eliminação das discriminações em matéria de emprego e ocupação. Além da garantia de direitos básicos, estão os desafios da promoção do emprego de qualidade e a luta pela extensão da proteção social – com suas relações com um mercado de trabalho marcado pela informalidade e pela alta rotatividade, o que tem impactos funestos entre os jovens. E o cenário desse
debate, nos conselhos e conferências de políticas públicas, reúne melhores condições para a pressão dos trabalhadores. A Agenda do Trabalho Decente lança luz sobre fatos graves na passagem dos adolescentes para a vida adulta, como sua inserção no mundo do trabalho e sua relação com o estudo, além de explicitar as desigualdades na juventude. O desemprego juvenil, mesmo em crescimento econômico, permanece superior ao das demais faixas etárias. Além de enfrentar a precarização e o desemprego mais duramente, as desigualdades de renda, gênero, raça e região (e também entre campo e cidade) tiram da juventude mais vulnerável as possibilidades de um trabalho decente. As jovens, em especial negras, são mais fortemente atingidas pela “inatividade” laboral, que na verdade esconde uma maior responsabilidade no trabalho doméstico, incompatível com o trabalho e o estudo. A gravidez na juventude e na adolescência, a ausência de creches públicas e de apoio à profissionalização e à inserção no mercado de trabalho demandam intervenção ativa do poder público a combater a reprodução das
desigualdades de renda, gênero e raça a partir da juventude. Inserida a juventude na Constituição, temos um importante marco legal para cobrar políticas públicas. A sociedade luta em melhores condições por políticas específicas que assegurem um melhor ingresso juvenil no mundo do trabalho, sem perda do vínculo entre educação de qualidade e inserção qualificada no mercado de trabalho, em especial da juventude pobre, das mulheres jovens, das periferias, negra e rural. Assegurar à juventude educação de qualidade e protagonismo no desenvolvimento brasileiro se fará pelo trabalho, em especial se qualificado e com inclusão social. As cerca de 3,5 milhões de bolsas de estudos propostas, a expansão da rede de educação técnica e tecnológica, o desafio de conciliar a escolarização com o trabalho são chaves para o trabalho decente na juventude. Todas essas razões apontam para as grandes possibilidades das centrais sindicais, de jovens e estudantes intervirem na 2ª Conferência Nacional da Juventude e na 1ª Conferência sobre o Trabalho Decente, para fazer avançar a unidade em torno de mais direitos para os trabalhadores e a juventude brasileira.
O desemprego juvenil, mesmo em crescimento econômico, permanece superior ao das demais faixas etárias
Paulo Vinícius é secretário Nacional da Juventude Trabalhadora da CTB VISÃOClassista
23
REFORMAS
Pela ampliação da democracia Arquivo CTB
existirem pequenas divergências entre os partidos políticos e as entidades envolvidas nesse debate. “Apesar de aparecerem algumas diferenças pontuais entre nós, é preciso pressionar por aquilo que nos une, naquilo que há consenso”, defende o dirigente da CTB.
Partidos, centrais e movimentos sociais se unem em prol de uma reforma política e eleitoral de caráter progressista
Consensos
Fernando Damasceno
E
ntre março e abril deste ano, o Senado Federal assistiu a uma perfeita mostra de tiro que saiu pela culatra. Na ocasião, o PMDB – ao lado de algumas lideranças do PSDB e outros partidos conservadores – pensou ter visto uma brecha para acelerar uma proposta de reforma política e eleitoral que conviesse a seus interesses. No final das contas, além de não terem conseguido emplacar as prioridades que desejavam, seus parlamentares ainda deram a deixa para que os partidos progressistas pautassem os principais pontos do texto que será agora analisado pela Câmara dos Deputados. Ao invés de conseguir dar visibilidade a propostas retrógradas como o chamado “distritão”, as forças de direita viram seu projeto de reforma perder força, já que o conjunto de sugestões redigido pela Comissão de Reforma Política do Senado inclui o fim das coligações partidárias, o financiamento público de campanha e a mudança do sistema eleitoral para proporcional com lista fechada nas disputas do Legislativo (câmaras federal, estaduais e municipais).
24
VISÃOClassista
REPRESENTATIVIDADE Partidos e movimentos sociais se unem em torno de proposta mais avançada de reforma O fim da reeleição e o mandato de cinco anos também foram incluídos no texto. O documento sugere, ainda, a continuidade do voto obrigatório. Por sua vez, as mulheres da Comissão conseguiram emplacar nas propostas de reforma política as cotas de 50% para candidatas nas listas fechadas. Com isso, as listas alternariam obrigatoriamente um nome feminino e um masculino.
Debate em andamento A brecha aberta pelo Senado resultou na rearticulação de várias
forças progressistas, em torno de uma proposta mais elaborada e democrática de reforma política e eleitoral. A iniciativa principal partiu das fundações de três importantes partidos (PSB, PCdoB e PT), e rapidamente contou com o apoio de diversos movimentos sociais. A CTB desde o início deu total apoio ao movimento, e tem mantido uma constante participação nas reuniões organizadas pelas Fundações João Mangabeira (PSB), Mauricio Grabois (PCdoB) e Perseu Abramo (PT). “É fundamental ampliarmos essa discussão para todo
As mulheres da Comissão conseguiram emplacar nas propostas de reforma política as cotas de 50% para candidatas
o movimento sindical e os demais movimentos sociais”, defende Joílson Cardoso, secretário de Políticas Institucionais da Central. Após algumas reuniões, as entidades conseguiram avançar bastante em torno de uma pauta unitária. Desde o princípio, o presidente da Fundação Perseu Abramo, Nilmário Miranda, defendeu a necessidade de elencar alguns itens para fortalecer essa iniciativa. “Entendo que é preciso fechar em alguns pontos de consenso para manter a unidade”, disse. Joílson Cardoso segue pela mesma linha, ao lembrar que é natural
Basicamente, as discussões realizadas até o final de maio resultaram em uma lista de oito pontos de consenso (ver box na página 28). Além disso, os partidos e as entidades progressistas concordam que a reforma política e eleitoral é algo que diz respeito a todos os cidadãos, por seu caráter de garantir a soberania popular, a ampliação da representatividade e uma participação popular mais democrática. Entre os consensos, destacase a necessidade de acabar com o financiamento privado das campanhas eleitorais. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as eleições de 2010 tiveram um custo (declarado) de R$ 5 bilhões. Também é unânime a opinião de que a democracia é importante demais para ser financiada – e controlada – pelo poder econômico. “O financiamento público de campanhas políticas é condição essencial não apenas para transformar a prática política que impera no Brasil, mas também e principalmente, para neutralizar as possibilidades de interferência dos grandes grupos econômicos na gestão pública. Não parece subsistir dúvida de que as doações privadas (largamente utilizadas no sistema atual) se fazem na expectativa de benefícios futuros”, argumenta VISÃOClassista
25
REFORMAS Carlos Siqueira, presidente da Fundação João Mangabeira. Da mesma forma, é forte o repúdio a qualquer tentativa por parte da direita de tentar implementar no país o chamado “distritão”, modelo eleitoral que
privilegia as individualidades, e não os partidos – além de tornar as campanhas ainda mais dispendiosas. “Para a democracia avançar, é preciso que os partidos se fortaleçam, que seus programas sejam para
valer. Então, julgamos que, para aperfeiçoar a democracia, é preciso mudar o modo de financiamento das campanhas e a forma de escolha dos candidatos”, defende Adalberto Monteiro, presidente da Fundação Maurício Grabois .
“O voto proporcional deve ser mantido e aperfeiçoado. Em vez da atual lista partidária pós-ordenada, defendemos a adoção da lista préordenada, na qual o eleitor vota no partido e em uma lista de candidatos vinculados a compromissos e programas definidos. Ao contrário do que dizem os que a criticam, a lista pré-ordenada não irá sufocar as lideranças. Todas as legendas terão interesses em ordenar suas listas com aqueles que têm o maior respaldo entre os trabalhadores e o povo”, complementa o dirigente do PCdoB.
Entrevista | Fabio Konder Comparato, jurista e professor titular aposentado da Universidade de São Paulo Agência Brasil
Visão Classista: Fala-se bastante de “controle social do processo eleitoral” nas discussões sobre reforma política. Que tipo de ações isso acarretaria? Antes de mexer no sistema eleitoral e partidário, é preciso dar ao povo a soberania que ele nunca teve. Ou seja, é preciso submeter todas as emendas constitucionais e todas as leis eleitorais
ao referendo popular, e instituir o “recall”, isto é, o poder reconhecido ao povo de destituir diretamente aqueles que foram por ele eleitos. Visão Classista: O senhor poderia explicar com mais detalhes como funcionaria esse “recall”? Sua aplicação valeria para que cargos? Tive a oportunidade de oferecer a dois senadores uma proposta de emenda constitucional, instituindo o “recall”. Ela tramita no Senado como PEC nº 73/2005. Seu objeto: permitir que o povo destitua diretamente os que foram eleitos pelo sistema majoritário, isto é, o presidente da República e os senadores; quanto à Câmara dos Deputados, como os seus integrantes são eleitos pelo sistema proporcional, o exercício do recall far-se-ia pela dissolução da Câmara. Em qualquer das hipóteses, seriam convocadas novas eleições. A realização do recall, em minha proposta, seria feita por iniciativa popular. Visão Classista: Até que ponto uma reforma política ampla depende de um processo prévio de democratização da mídia no Brasil? Para que se possa passar da oligarquia atual (só alguns poucos grupos detêm o poder supremo) para uma autêntica democracia, é indispensável que os grandes veículos de comunicação social deixem de ser propriedade de um oligopólio político-empresarial, como acontece
Bola está com a Câmara Finalizado o trabalho do Senado, a discussão sobre reforma política deverá se concentrar nos próximos meses na Câmara dos Deputados, local onde as fragilidades da atual legislação são facilmente perceptíveis. Um número ilustra bem o tamanho da dificuldade de enfrentar determinados interesses do Congresso. Dos 513 deputados da atual legislatura, cerca de cem receberam algum tipo de atualmente. As transmissões de rádio e televisão, notadamente, fazem-se pela utilização de um espaço público, isto é, um espaço pertencente ao povo, que não poderia ser apropriado por particulares. A transformação republicana dos meios de comunicação de massa é, portanto, condição para que se instaure uma autêntica democracia neste país. É indispensável que o povo – não o Estado – possa controlar a atuação dos veículos de imprensa, de rádio e de televisão em nosso país. Sem isto, não haverá democracia verdadeira, pois as diferentes parcelas do povo não podem discutir e debater os assuntos públicos entre si, nem o povo em seu conjunto pode exigir diretamente explicações dos governantes.
Ampliação dos debates Foi instalada no último dia 23 de
Agência Brasil
Visão Classista: Em linhas gerais, que espécie de reforma política é necessária ao país? O que se deve exigir não é uma simples reforma, mas sim uma verdadeira reconstrução política do país. A Constituição Federal declara que “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”. Mas na realidade o povo não exerce poder algum, nem diretamente nem por meio de seus pretensos representantes. Não exerce diretamente a soberania, porque os plebiscitos e referendos só podem ser realizados mediante consentimento prévio do Congresso Nacional (Constituição Federal, art. 49, XV). Ou seja, o mandante tem que se submeter ao poder do mandatário, o que é um completo absurdo. O povo não exerce tampouco o poder por meio de representantes, porque estes têm a prerrogativa absurda de decidir em causa própria – por exemplo, fazem as leis eleitorais de acordo com os seus interesses pessoais e partidários – e são falsos mandatários do povo, porque, uma vez eleitos, não podem ser por ele destituídos.
financiamento de empresas ligadas ao agronegócio. Por outro lado, há somente três representantes diretamente ligados aos interesses dos agricultores familiares. Em tempo: existem cerca de 40 mil grandes latifundiários no país e cerca de 15 milhões de trabalhadores rurais. A mesma relação desigual pode ser facilmente averiguada na porcentagem de negros, mulheres, indígenas e outras minorias que compõem a atual legislatura. Para Carlos Siqueira, a ampliação da democracia é uma tarefa da qual as forças progressistas do país não podem se esquivar. “Queremos aperfeiçoar o sistema. Nesse cenário, o que compete à esquerda?”, provoca. “A reforma política deve se iniciar levando em conta os princípios constitucionais que asseguram a livre organização partidária e o pluralismo político ideológico. É preciso aprimorar a democracia participativa e isso inclui o trabalhador”, diz.
Lula se engaja na campanha pela reforma política O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou de cabeça na campanha por um reforma política progressista para o país. Em 16 de maio, ele se reuniu com os dirigentes das fundações ligadas ao PT, PCdoB e PSB. Em 27 de maio, ele conversou com as centrais sindicais e propôs uma ampla plenária para que a sociedade debata esse tema. Antes, em abril, durante reunião junto a dirigentes do PT, Lula reforçou sua impressão sobre o caminho necessário para pôr em prática algum tipo de avanço nas regras político-eleitorais do país. “É extremamente importante esse processo, mas é preciso um certo consenso com outros partidos políticos, inclusive com o PMDB e outros aliados, pensando em um texto a ser aprovado no Congresso Nacional. É preciso fazer uma análise para que a sociedade brasileira se convença de que a reforma política é muito importante”, afirmou o ex-presidente, em vídeo divulgado por seu partido. “Estou disposto a conversar com todos os partidos, com todos os movimentos sociais e estou disposto a fazer quantos atos forem necessários para contribuir com essa reforma pensando em melhorar a vida política do nosso país”, disse Lula.
BOLA FORA Conservadores viram sua proposta perder força
26
VISÃOClassista
VISÃOClassista
27
TRABALHO INFANTIL
março a Frente Parlamentar Mista em Defesa de uma Reforma Política com Participação Popular, da qual fazem parte 182 deputados federais, 36 senadores e diversas entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a União Nacional dos Estudantes (UNE), a CUT e a CTB, entre outras. Os coordenadores do grupo no Congresso serão a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) e o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Por iniciativa da Frente Parlamentar – e para que mais entidades e novos atores sejam incorporados ao debate –, vêm ocorrendo por todo o país debates estaduais sobre o tema da reforma política. Em seu manifesto público, a Frente se propõe, entre outras medidas, a articular e integrar ações das entidades da sociedade civil sobre o tema e a servir de “ponte” entre o Congresso Nacional e os movimentos sociais Arquivo CTB
SIQUEIRA Pela vontade popular
28
VISÃOClassista
Acervo FPA
Consensos de propostas entre as forças progressistas: • Financiamento público de campanhas eleitorais • Voto em lista préordenada • Fidelidade partidária e programática • Menos entraves para a democracia participativa • Voto obrigatório • Contra o voto distrital • Contra candidaturas avulsas, sem filiação a partidos • Contra qualquer cláusula de barreira
NILMÁRIO Em defesa da unidade pela reforma política. “Vamos estabelecer uma agenda de eventos estaduais para garantir a participação e a pluralidade da sociedade nos debates em torno da reforma política, para evitar que as propostas que tramitam no Congresso sejam aprovadas antes de a sociedade se manifestar”, declarou Erundina, no ato de lançamento da Frente Parlamentar. A pluralidade a que Erundina se refere também é preocupação de Adalberto Monteiro, para quem é necessário um trabalho de diálogo com o povo e os trabalhadores. “É preciso demonstrar aos trabalhadores que, por linhas tortas, hoje o financiamento das campanhas eleitorais já é feito pelo dinheiro público. Do seguinte modo: as grandes empresas financiam as campanhas e depois vão cobrar dos eleitos as duplicatas”, comenta. Ao comentário do dirigente comunista, Carlos Siqueira faz questão de adicionar a necessidade de conquistar novos avanços. “Por definição programática e por
Arquivo CTB
ADALBERTO Por mais democracia força de sua origem no espectro de forças partidárias o PSB milita pelo alargamento da democracia, pela alternância de poder, opondo-se, portanto, a qualquer tentativa de limitar a expressão da vontade popular, sob quaisquer argumentos”, resume.
Márcia Viotto
REFORMAS
Trabalho decente só é possível sem trabalho infantil
O
trabalho infantil reafirma que a criança faz parte de uma cadeia produtiva que comanda o mundo capitalista. Tida como dócil e frágil, ela se demonstra importantíssima para alimentar o parasitismo do sistema, e se soma à exploração do trabalho adulto para produzir enormes lucros. O trabalho infantil é um fenômeno social presente ao longo de toda a história da humanidade. No Brasil, suas origens vêm do regime escravagista. Com o capitalismo e o advento da revolução industrial e suas novas tecnologias, o que poderia resultar numa espetacular melhoria das condições de vida tem aumentado a exploração do trabalhador, gerando exércitos de desocupados, precarização e flexibilização das relações de trabalho, excluindo grandes parcelas dessas transformações e conseqüentemente o trabalho infantil ganha força. São vários os instrumentos jurídicos que, desde 1943, com a CLT, vêm tratando de proteger crianças e adolescentes. Mas foi somente a partir da década de 1980 que o Brasil reconheceu a existência do trabalho infantil perante a comunidade internacional e se comprometeu com sua prevenção e eliminação, sobretudo em suas piores formas, como a exploração
sexual, o trabalho forçado, o tráfico de drogas, o trabalho informal urbano, o trabalho doméstico, entre outros. Ratificadas as convenções 138 e 182 da OIT, o país assumiu o compromisso de eliminar as piores formas até 2015 – e até 2020 por completo. Em nossa sociedade, crianças e adolescentes pobres são obrigados a trabalhar por várias razões, mas a principal delas é a luta pela sobrevivência, invertendo valores, roubando suas infâncias e trazendo consequências graves para a saúde física e mental do chamado “futuro do Brasil”. Infelizmente, o trabalho infantil ainda é entendido como um fator positivo para as crianças que vivem em condições de pobreza, de exclusão e de risco social. Assim, os empregadores acham que estariam fazendo um favor ao dar a oportunidade de “ensiar um oficio”, “ganhar uns trocados” ou aproveitar o tempo em algo “útil”. Por sua vez, as classes desfavorecidas concordam que “lugar de criança pobre é no trabalho”, “melhor do que ficar na rua” ou que “trabalho não mata”. Essa concepção persiste como algo “natural” em largos segmentos da sociedade e está presente também no movimento sindical e entre os trabalhadores – algo que precisa ser superado, sobretudo pelos classistas, cujo compromisso consiste
em transformar a sociedade, rumo ao mundo socialista. O Brasil foi indicado na para sediar a 3ª Conferencia Global sobre Trabalho Infantil, em 2013, devido aos avanços realizados pelo país nesta última década. Já neste ano de 2011, pela primeira vez o Brasil vai discutir, em uma conferência nacional, o que é trabalho decente. Precisamos aproveitar essa oportunidade e contribuir para construir novos conceitos, com o objetivo de termos um país com desenvolvimento e valorização do trabalho. Dentro dessa compreensão, devemos intensificar nossa luta por políticas que garantam, sobretudo, uma escola pública gratuita, laica e de boa qualidade; pela popularização do Estatuto da Criança e do Adolescente e das leis de proteção ao trabalhador adolescente entre os trabalhadores; pelo fim do trabalho infantil; pelo fortalecimento das ações inter-setoriais que tratam de sua erradicação; pela atuação junto às Delegacias Regionais do Trabalho, no sentido de cobrar medidas de fiscalização contra a exploração do trabalho infantil; e também a elaboração de uma cartilha que esclareça para a sociedade a necessidade de lutar contra o trabalho infantil, levando em conta as especificidades regionais do país.
Infelizmente, o trabalho infantil ainda é entendido como um fator positivo para as crianças que vivem em condição de pobreza
Márcia Regina Viotto é socióloga, assessora da CTB e membro-titular do Fórum Paulista de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil. VISÃOClassista
29
PANORAMA
Um desafio chamado sindicalismo de profissões Cerca de 10 milhões de trabalhadores atuam como profissionais liberais, mas a maioria das categorias sofre com a “proletarização” e as dificuldades de estruturação sindical
Priscila Lobregatti
André Cintra
E
m 7 de abril passado, Dia Mundial da Saúde, milhares de médicos, em todo o Brasil, deixaram de atender, por 24 horas, a usuários dos planos de saúde – apenas os atendimentos de urgência e emergência foram mantidos. Cerca de 70% dos médicos pararam no Rio de Janeiro. Em São Paulo, onde a adesão foi de 80% da categoria, mais de mil profissionais saíram em passeata até a Praça da Sé. Já em Curitiba (PR), 85% dos médicos aderiram. A mobilização na Bahia foi ainda maior e envolveu entre 85% e 90% da categoria. O êxito das paralisações se justifica. “A categoria, por muito tempo, não tinha coragem de se ver como assalariada – como proletária mesmo. Mas, com a crescente exploração exercida pela chamada medicina de grupo, o médico já perdeu a ilusão de pertencer a uma profissão plenamente liberal, autônoma. Ele percebe que, como há uma relação de trabalho, a
30
VISÃOClassista
REAÇÃO Médicos se mobilizam em SP contra ações de planos de saúde participação das entidades sindicais é importante”, analisa José Roberto Murisset, diretor do Sindicato dos Médicos do ABC e da Fenam (Federação Nacional dos Médicos). Aos poucos, o Dia Mundial da Saúde de 2011 se converteu no Dia Nacional de Paralisação do Atendimento aos Planos de Saúde. Era o início da campanha promovida pelas entidades médicas nacionais, como a Fenam, “em defesa da saúde suplementar, da prática segura e eficaz da medicina e, especialmente, por mais qualidade na assistência prestada aos cidadãos”. De acordo com a “Carta Aberta à População” distribuída nos atos, “os planos de saúde interferem diretamente
no trabalho do médico: criam obstáculos para a solicitação de exames e internações, fazem pressão para a redução de procedimentos, a antecipação de altas e a transferência de pacientes”. Dos 347 mil médicos registrados no Conselho Federal de Medicina, 160 mil (46,11%) atuam na saúde suplementar, atendendo aos mais de 45 milhões de usuários de planos e de seguros de saúde. Por ano, são cerca de 223 milhões de consultas e 4,8 milhões de internações. Há uma série de restrições impostas aos profissionais de Medicina, como o total desrespeito aos honorários estabelecidos pela Classificação Brasileira Hierarquizada de
Procedimentos Médicos (CBHPM). Dos valores arrecadados pelas empresas com as mensalidades dos planos de saúde, apenas 10% vão para os médicos Para cada consulta, os profissionais recebem um reembolso ínfimo das operadoras. “Existem grupos que pagam apenas R$ 20 por consulta – menos de um terço do valor estipulado pela CBHPM, que é de R$ 62”, denuncia Murisset. “As empresas empurram os profissionais para uma situação-limite. Como não há reajuste real, o médico aumenta o número de consultas e procedimentos. Com isso, gasta mais horas para receber a mesma remuneração, e a jornada de trabalho chega a ultrapassar as 12
Em busca de uma definição A história do sindicalismo de profissões no Brasil está prestes a completar 80 anos. Os primeiros sindicatos do segmento remontam, no Brasil, à década de 1930, enquanto as federações começam a proliferar na segunda metade dos anos 40. Já a quase sexagenária CNPL data de 1953, e a CNTU foi fundada em 2006. Nos dias de hoje, o sindicalismo de profissões registra quase 700 entidades (confederações, federações e sindicatos). Uma única categoria, como a dos contabilistas, soma cerca de 150 sindicatos e oito federações de trabalhadores. Não há consenso, porém, na definição das categorias que integram o sindicalismo de profissões. Sabe-se que a carteira assinada e o vínculo empregatício estatutário caracterizam, respectivamente, o trabalho formal e o serviço público. Quais seriam, então, os pré-requisitos das profissões liberais? A classificação mais flexível – e duvidosa – inclui, entre os profissionais desse tipo, toda e qualquer pessoa responsável pelo próprio negócio. Profissional liberal seria, assim, um sinônimo de trabalhador autônomo – do pipoqueiro iniciante que é dono de seu carrinho até o mais renomado e experiente cirurgião plástico com sua clínica particular. Ora, se atuar “por conta própria” fosse o único critério em consideração, o Brasil já teria ao menos 19 milhões de profissionais liberais – ou pouco mais de 20% da população ativa –, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2009. É evidente que uma listagem tão elástica não dá conta da complexidade do assunto. Quem propõe um “conceito mais rigoroso” é o sociólogo Lejeune Mirhan. De acordo com ele, profissionais liberais são “trabalhadores que podem exercer com liberdade e autonomia sua profissão, decorrente de formação técnica ou superior específica, legalmente reconhecida, com base em estudos e conhecimentos técnicos e científicos. A prática de tais profissões pode se dar com ou sem vínculo empregatício específico, mas sempre regulamentada por organismos fiscalizadores do exercício profissional”. Por essa lógica, diz Lejeune, as profissões mais liberais hoje – ou as menos sujeitas à proletarização – são a dos dentistas e dos contadores. “Mesmo assim, há dentistas assalariados em órgãos públicos, em cooperativas, etc. E os contadores, ao montarem grandes escritórios de contabilidade, podem contratar vários funcionários e se tornarem patrões também. Há escritórios com CNPJ e mais de 200 trabalhadores. São verdadeiras empresas.” Um artigo assinado pelo líder sindical Solomar P. Rockembach agrega que três condições são inerentes ao serviço prestado pelos profissionais liberais: “Liberdade de concepção, independência de opinião e autonomia de execução”. Por mais que diante dessas categorias se imponha o fantasma da proletarização, estudiosos como a professora Marli Diniz, da USP, fazem ressalva às “evidências de crescente assalariamento de algumas das chamadas profissões liberais”. Segundo Marli, “mesmo quando o profissional assalariado perde o controle sobre as condições em que trabalha, ele o mantém sobre o processo do seu trabalho; isto é, ele conserva sua autonomia técnica”. No entanto, a manutenção do status de “profissional liberal” em tais circunstâncias não é suficiente para garantir condições trabalhistas adequadas ao exercício da profissão. VISÃOClassista
31
PANORAMA Divulgação
horas diárias.” Segundo Murisset, os usuários sofreram reajuste de 184% nos planos de saúde nos últimos dez anos, enquanto o repasse aos profissionais aumentou somente 80% em dez anos. Se a consulta custar R$ 42, o médico ficará com somente R$ 16, já que usará o restante em pagamento de encargos. “Há um aviltamento no valor da consulta. O médico passa a produzir uma mais-valia maior para a medicina de grupo”, denuncia o dirigente sindical. Apesar da destacada mobilização da categoria e da justeza das reivindicações, a iniciativa foi duramente golpeada pelo governo federal. Em 9 de maio, a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça instaurou um processo administrativo para restringir os direitos das entidades e proibir os médicos credenciados de usar a CBHPM como base para cobrar por consultas e serviços. A medida já foi parcialmente anulada na Justiça. Em ofício à presidenta Dilma Rousseff, a Fenam exigiu a anulação total do processo e classificou a ação da Secretaria de Direito Econômico como “coercitiva, unilateral e draconiana”.
Proletarização Em boa medida, a repressão ao movimento dos médicos brasileiros exemplifica as dificuldades vividas pelos profissionais liberais para lutar por melhores condições de trabalho. Várias categorias do tipo sofrem, há décadas, um intenso processo de “proletarização”. Em meados dos anos 90, a professora Marli Diniz, da USP, já alertava para os dilemas desses trabalhadores: “Os médicos, por exemplo, ou se tornam assalariados em grandes hospitais ou empresas de prestação de serviços de saúde – sujeitando-se a regras e regulamentos e a critérios de rentabilidade – ou se submetem à mediação de uma
32
VISÃOClassista
PROTAGONISMO Lejeune cobra mais participação terceira parte (empresas de seguro médico ou o próprio Estado, entre outras) em seus contatos com os clientes, perdendo o controle da relação”. Nem por isso convém desprezar tais categorias. “À parte todos os obstáculos, é na base dos profissionais liberais que reside um dos maiores desafios do moderno movimento sindical”, opina o sociólogo e professor universitário Lejeune Mirhan, um dos maiores especialistas em sindicalismo de profissões. Na opinião de Lejeune, ainda que nesse segmento existam duas confederações – a CNTU (Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados) e a CNPL (Confederação Nacional das Profissões Liberais) –, mais de três dezenas de federações e ao menos 650 sindicatos, “boa parte das lideranças não se deu conta de tamanho potencial”. De acordo com estimativas apresentadas pelas confederações, o sindicalismo de profissões exerce a representação de nada menos que dez milhões de trabalhadores, sendo cerca da metade deles registrada em conselhos. No entanto, pouco se escreve ou se formula a respeito.
Livros que tratam do assunto, mesmo que de passagem, praticamente não existem. Uma das poucas exceções é “Compêndio de Direito Sindical” (LTR Editora), escrito pelo professor e jurista Amauri Mascaro Nascimento, que dedica um capítulo ao tema. O enfoque aqui, no entanto, é jurídico. No Google, até meados do mês de maio, uma busca pela expressão “sindicalismo de profissões” resultava em apenas 239 links. A maioria dessas entradas se referia ao pioneiro Seminário Nacional sobre Sindicalismo de Profissões no Brasil, realizado pela CTB, em Salvador, de 14 a 16 de agosto de 2009. O fortalecimento dessa área do movimento sindical e a aproximação com os conselhos autárquicos federais e estaduais foram algumas das principais resoluções do seminário. “Das centrais sindicais, a CTB é, sem dúvida, a mais receptiva ao sindicalismo de profissões. Precisamos pensar numa segunda edição do seminário, e já existem perspectivas nesse sentido”, diz Lejeune, que presidiu a Federação Nacional dos Sociólogos. Mudando uma ou outra palavra no Google, pode-se chegar ao
interessante e recente artigo acadêmico “O Perfil de uma Categoria – Reflexões sobre o Sindicalismo entre Profissionais de Nível Superior”, de Sergio Martins Pereira, da Universidade Federal do Maranhão. Não por acaso, as principais referências teóricas do autor – Whright Mills, Roberto Grun e Lili Kawamura – são todas estrangeiras. Ao tratar especificamente dos engenheiros, Pereira afirma que “os estudos sobre as décadas de 1970 e 80 apontam, no Brasil, um movimento de proletarização da categoria, com base na expansão do assalariamento e, consequentemente, do sindicalismo de perfil mais ‘proletário’”. Já os trabalhos sobre os anos 1990 e 2000, segundo o artigo, “não excluem os engenheiros e suas entidades de classe da sujeição à autonomização consequente dos processos de flexibilização, terceirização, etc. observados nas organizações públicas e privadas, fatos que colocariam suas organizações político-profissionais na defensiva”. Os engenheiros constituem uma das 43 profissões que – a exemplo de advogados, farmacêuticos, dentistas, arquitetos e psicólogos – já são regulamentadas. Com duas federações (uma nacional, outra interestadual), 27 sindicatos e uma de suas lideranças na presidência da CNTU, os engenheiros também formam uma das categorias profissionais com mais tradição sindical. Não se trata, porém, de um caso típico. Num país com seis centrais sindicais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho, é inusitado que certas profissões regulamentadas – geólogos, bibliotecários, estatísticos, fonoaudiólogos e biólogos, por exemplo – não tenham ainda federações nacionais. Situação pior é a de músicos, atuários, geógrafos, meteorologistas e profissionais de Educação Física – categorias que não contam nem sequer com sindicatos. “Com exceção talvez das categorias mais fortes socialmente falando
– mais engenheiros e médicos –, nenhum sindicato de profissão assina acordo coletivo com as particularidades que conhecemos, como os acordos tradicionalmente firmados por metalúrgicos e trabalhadores da construção civil”, diz Lejeune. “Se não assinam acordo – mas precisam justificar sua existência à categoria –, esses sindicatos acabam se dedicando mais à formação e à capacitação profissional extra-acadêmica. Como as reformas curriculares costumam ocorrer, em média, a cada nove anos, os sindicatos podem criar centros de formação e ajudar na atualização profissional.” Para Lejeune, os profissionais liberais, por meio de suas entidades sindicais, também podem participar mais da luta de ideias. “Os conselhos, que são órgãos fiscalizadores, não têm esse papel. Um sindicato dos nutricionistas é que pode – e precisa – ter uma opinião sobre a fome e a miséria. Já os farmacêuticos têm autoridade para opinar sobre políticas de saúde pública, assim como médicos e psicólogos”, exemplifica o sociólogo. É nesse sentido que uma entidade do porte da CNTU ganha peso. “Se o Brasil precisa discutir um novo projeto nacional de desenvolvimento, uma das missões prioritárias da nossa confederação é influenciar nesse processo de formulação de políticas públicas”, afirma Gilda Almeida, secretaria adjunta de Finanças da CTB e vicepresidente da CNTU. Segundo ela, “os profissionais liberais precisam protagonizar, junto à sociedade, a construção dessas políticas em questões fundamentais, como Ciência & Tecnologia. Claro que é importante defender as questões trabalhistas – mas está provado que não nos cabe ficar apenas nesses limites. A CNPL não deu conta desse desafio, e é por isso que a CNTU está na luta.” Como resume Lejeune, “o sindicalismo de profissões tem muito a contribuir para a sociedade”.
A força das confederações – CNPL Nome: Confederação Nacional das Profissões Liberais Fundação: 11 de fevereiro de 1953 Entidades fundadoras: Federacon (Federação dos Contabilistas do Estado do Rio Grande do Sul), Fecontesp (Federação dos Contabilistas do Estado de São Paulo) e FNO (Federação Nacional dos Odontologistas) Presidente: Francisco Antonio Feijó (contabilista) Entidades filiadas: 27 Sindicatos apoiadores: 500 Representação direta: 5 milhões de trabalhadores – CNTU Nome: Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados Fundação: 27 de dezembro de 2006 Entidades fundadoras: Fenecom (Federação Nacional dos Economistas), FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), Fenafar (Federação Nacional dos Farmacêuticos) e FNN (Federação Nacional dos Nutricionistas) Presidente: Murilo Celso de Campos Pinheiro (engenheiro) Entidades filiadas: cinco Sindicatos apoiadores: 100 Representação direta: 2 milhões de trabalhadores
VISÃOClassista
33
Sabedoria do campo 17ª edição do Grito da Terra evidencia capacidade de negociação do trabalhador rural Verônica Pimenta
O
Grito da Terra Brasil, principal articulação dos trabalhadores rurais brasileiros, completou 17 edições neste ano. Estima-se que aproximadamente cinco mil pessoas tenham participado das mobilizações, nos dias 18 e 19 de maio, em Brasília. Mais do que criar estratégias de visibilidade no espaço urbano, o GTB é uma demonstração de força e sabedoria política que vem do campo. Ele é a trincheira cravada para garantir avanços e espaços de negociação efetiva com o governo. Entre os trabalhadores rurais, é comum classificar o GTB como a “data-base” da categoria. Realizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), que abrange aproximadamente 20 milhões de pessoas e quatro mil sindicatos, seus dirigentes ilustram a importância política do evento com o fato de já não ser mais possível conquistar legitimidade em programas no campo sem considerar a pauta formalizada pelos trabalhadores rurais. Para Divino Batista Ramos, diretor da CTB Minas Gerais, “o grande mérito do Grito da Terra é já ter conseguido se impor à agenda do governo federal”. Em 1995,
34
VISÃOClassista
FHC sinalizava o início de uma linha de crédito no valor de R$ 1,5 milhão. Em 2011, a promessa da presidenta Dilma Rousseff é manter os R$ 16 bilhões destinados ao Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf), apesar de cortes financeiros em outras áreas. A “Agenda por um Brasil Sustentável, Sem Fome e sem Pobreza”, encaminhada à presidenta e negociada diretamente com ministros de Estado em 41 reuniões e 17 audiências, foi construída coletivamente. Conforme explica Batista Ramos, as negociações estão inseridas no Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável, que pensa o campo a partir da Reforma Agrária, além de ações socioambientais para melhorar a qualidade de vida e o nível de educação formal, entre outras medidas.
Inclusão social e casa própria Segundo dados divulgados pela Contag, 40% das pessoas que moram e trabalham no campo entre 16 e 32 anos não sabem ler e escrever. Além disso, as condições de vida desse grupo ainda são marcadas pelo enfrentamento de um Brasil contemporâneo frente ao “Brasil profundo”, tradicional e repleto de contradições. Jurassi Moreira Souto, Secretário de Formação e Organização Sindical da Contag, destaca que a tendência é de exclusão ainda maior para os empregados em lavouras que passam pelo processo de mecanização, especialmente a cana-de-açúcar. “A mecanização é uma tendência e inevitável, mas entendemos que a obrigação
Wilson Dias/Abr
RURAIS
do governo e das entidades que representam esse segmento é encaminhar esse povo para alguma atividade produtiva”. Outro ponto crucial é a fixação do jovem trabalhador no campo. Dentre o leque de oportunidades a serem geradas, é relatada a necessidade de aprimorar o Programa Nacional de Habitação Rural. Moreira Souto comemora o fato de os trabalhadores rurais, por meio do GTB, terem conquistado uma superintendência especial na Caixa. Por outro lado, as federações da categoria vinham discutindo o tema nos estados, já que a existência da linha de crédito não significa, necessariamente, acesso pelas famílias à casa própria.
Juventude e reforma agrária Quase metade dos 86 mil beneficiários do Programa Nacional de Crédito Fundiário têm até 32 anos de idade. A grande conquista dessa parcela é a criação da Coordenadoria de Juventude Rural no Ministério do Desenvolvimento Agrário. Maria Elenice Anastácio, secretária de Jovens da Contag, comemora a “institucionalização” dessa presença no governo. “Precisamos de alguém com condições reais de articular e integrar as diversas ações para a juventude”, explica. A manutenção de sistemas de crédito também é uma das conquistas mais significativas Grito da Terra Brasil. Entretanto, as lideranças sindicais entendem que esses são instrumentos complementares de acesso à terra, especialmente nas áreas em que não há propriedades o suficiente para o assentamento das
EXEMPLO Contag mostra mais uma vez sua mobilização em Brasília famílias. Ou seja, o crédito rural é bem-vindo, mas não elimina a prioridade histórica dada à luta pela Reforma Agrária. Sob o guarda-chuva partidário que dá sustentabilidade ao governo, coexistem linhas políticas opostas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e o MDA. Os mais críticos avaliam que uma das grandes contradições das gestões petistas é ter mantido investimentos e pesos políticos diferenciados no setor rural, criando as chamadas “agricultura dos pobres” e “agricultura dos ricos”. O fato coloca em xeque o atendimento a reivindicações como a atualização de índices de produtividade rural e revogação de medidas que
criminalizam os trabalhadores e movimentos de luta pela terra. Segundo Vilson Luiz da Silva, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Minas Gerais (Fetaemg), os rurais pretendem criar um fórum permanente. “Nosso objetivo é não só aprimorar a mobilização, mas capacitar lideranças para avaliar o processo, ter mais poder de negociação e avançar”. Fazem parte desta estratégia as edições estaduais do Grito da Terra, que já acontecem em pelo menos sete estados brasileiros. A tática seria negociar em diversas frentes, mas sempre a partir de uma pauta unificada. É assim que os trabalhadores e trabalhadoras rurais criam
lastros políticos paraconcretizar um modelo alternativo de desenvolvimento, em que podem ganhar cidade e campo.
Principais conquistas do Grito da Terra Brasil 2011 • R$ 16 bilhões para a Agricultura Familiar • Cortes de juros para empréstimos a agricultores de baixa renda • Política de garantia de preços mínimos • Superintendência na Caixa para a habitação rural • R$ 530 milhões para compra de terras da Reforma Agrária
VISÃOClassista
35
MOVIMENTOS SOCIAIS
MCC – As mães contra a ditadura Na década de 70, elas se organizaram em um tempo bicudo, quando o país ainda vivia sob as “barbas” dos militares Cinthia Ribas
N
um Brasil comandado pelo general Emilio Garrastazu Médici, operários e moradores das periferias, através de clubes de mães e associações de bairro do M’Boi Mirim, em São Paulo, deram origem a um movimento que abriu as portas para a organização efetiva dos movimentos populares: o
Movimento do Custo de Vida, que depois passou a se chamar Movimento contra Carestia (MCC). O MCC se iniciou em São Paulo, em 1973, contra o alto custo de vida, mas logo se espalhou pelo Brasil e tomou as ruas contra o arrocho salarial, a alta nos preços dos alimentos, das contas de consumo e por melhores condições de vida.
Tempos difíceis Na época, o ministro Delfim Netto comandou o “milagre econômico”. O país crescia a olhos vistos e quanto mais riquezas eram produzidas, mais difícil a situação ficava para a classe trabalhadora. O ministro pedia para o povo ter paciência. “Temos de esperar o
Acerto Edgard Leuenruth
MOBILIZAÇÃO Tempos difíceis resultaram em insatisfação
36
VISÃOClassista
bolo crescer para depois distribuir os pedaços”, dizia. E quanto mais o país crescia, tanto mais piorava a vida do povo. Com a alta nos preços dos alimentos e o arrocho salarial, a situação do trabalhador se agravou de forma gradativa. A insatisfação crescia, ao passo em que a crise aumentava ano após ano. O modelo econômico era baseado no mercado interno, representado pelos ricos e pela classe média. Estava claro que só havia solução com a distribuição de renda, que ampliaria o mercado ao consumidor – algo que não foi feito. Para a economia não regredir, o Estado começou a tomar empréstimos externos com o intuito de financiar a produção. O novo general-presidente, Ernesto Geisel, assumiu o governo num momento difícil da economia do Brasil e do mundo, em meados de 1974. A crise se manifestava com a queda da proporção dos lucros. Os empresários buscaram lucrar a qualquer custo, subindo os preços e jogando o ônus nas costas dos trabalhadores, que viam os salários estagnarem, enquanto os preços subiam vertiginosamente. “Protestávamos por água e esgoto, por creches, por transporte, ou seja, melhores condições de sobrevivência. Eram as reivindicações das associações de moradores de bairros. No entanto, o arrocho salarial era o elemento que unia a todos e foi exatamente isso que permitiu a unificação das bandeiras e o fortalecimento da luta contra a ditadura”, revela Aurélio Peres,
Acerto Arquivo Nacional
REPRESSÃO Clubes das Mães protestam sob o olhar atento da polícia um dos líderes do movimento, ao lado de Irma Passoni, Ana Martins, Benedito Cintra e outras lideranças populares.
Uma simples carta Aurélio, ex-metalúrgico, atualmente com 78 anos e aposentado, conta que sua atuação se deu na Paróquia Nossa Senhora das Graças de Vila Remo, na região do M’Boi Mirim, na zona sul de São Paulo. “Só que chegou um momento em que veio a pergunta: o que fazer agora? Nós vamos continuar ensinando a costurar, tricotar e mexer com criança? Assim não vamos a lugar nenhum. Então a resposta foi a necessidade de politizar o movimento”, revela o sindicalista. Foi então que os chamados
Clubes das Mães começaram a impulsionar a participação das mulheres contra a ditadura. Somados, eles totalizavam de 500 a 600 núcleos. “Nós nos reuníamos nas casas. Discutíamos o que fazer com o pequeno salário dos maridos. Os salários eram muito baixos e os custos muito altos. Começamos a perceber que o salário subia por escada, enquanto a inflação ‘pegava’ o elevador”, lembra Ana Martins, uma das líderes do movimento, que na época era presidente da Sociedade Amigos da Ponte Rasa. “Percebemos que precisávamos fazer alguma coisa contra o aumento dos alimentos de primeira necessidade. A primeira iniciativa foi elaborar uma carta muito simples, a ‘Carta das Mães da Periferia de São Paulo’, que foi encaminhada às autoridades da época. Assim, em 1973, nasceu o
movimento. Foram as primeiras experiências do que é organizar o povo em seu local de moradia. A ditadura começou a tremer a partir daí”, afirma Ana Martins. A carta lida por Aurélio Peres, em 1º de maio de 1974, no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, deu muito que falar e foi o início de uma perseguição política, que culminou com sua prisão em setembro do mesmo ano, que durou um mês. Apesar de solto, o sindicalista passou a responder o processo em liberdade.
Repressão, violência e descaso Desde seu nascimento, a principal finalidade do MCC foi a organização de um abaixo-assinado pelo congelamento de preços, que seria entregue ao presidente da VISÃOClassista
37
MOVIMENTOS SOCIAIS
ORGANIZAÇÃO Para Ana Martins, MCC teve papel histórico República. Organizado na cidade de São Paulo, a princípio, logo o documento se espalhou pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul. No total foram coletadas 1,3 milhão de assinaturas em todo o país – a previsão era de 1 milhão. Estudantes da USP, da PUC e do Mackenzie também trabalharam na coleta. A disseminação do abaixoassinado abriu um extraordinário debate nas fábricas. Os trabalhadores levavam-no para os locais de trabalho para coletar assinatura, e junto com ele havia uma carta explicando seu objetivo. “A partir desse documento, os operários começaram a promover debates na hora do almoço. As discussões levavam à reflexão. As pessoas começaram a se preocupar com a situação do país. Começaram a entender o que representava a ditadura. Perceberam que o governo não estava disposto a dialogar com a população”, relembrou Ana Martins.
38
VISÃOClassista
Apesar da participação masculina, a frente do movimento era formada pelas mulheres. Enquanto elas coletavam assinaturas em feiras, supermercados, igrejas e praças, o movimento preparava uma grande assembleia para a entrega simbólica do texto, no centro da cidade. “As mães iam andando da Praça da Sé até a República para divulgar o abaixo-assinado e recolher assinaturas. Éramos de 80 a 100 mulheres. As gestantes e com crianças ficavam na frente. A polícia pressionava, mas contras as mães com crianças nada podiam fazer”, salientou Ana Martins. No decorrer de sua trajetória, constantemente o movimento promoveu assembleias, plenárias e reuniões de avaliação. Algumas, realizadas na região central da cidade, tomavam a Rua do Carmo. Em 1976, uma plenária no colégio Santa Maria, chegou a reunir cerca de cinco mil pessoas. Contudo, em quase seis anos de sua existência (1973 a 79), dois atos
ficaram marcados: a assembleia no colégio Arquidiocesano, na Vila Mariana, que deu início ao abaixo-assinado, e foi amplamente divulgada pela imprensa; e o ato de encerramento, em 26 de agosto de 1978, que lotou a Praça da Sé. Uma multidão – composta por donas de casa, jornalistas, estudantes e operários – participou do ato na Praça da Sé, que representou uma das primeiras manifestações públicas, proibidas durante aqueles 14 anos de ditadura e ficou marcado na memória de seus líderes. O ato foi reprimido violentamente pela Polícia Militar com o uso de bombas e cães, que atavam homens e mulheres, sem distinção. Para fugir da brutalidade policial, os manifestantes refugiaram-se na Catedral da Sé. “Lembro até hoje da truculência do Coronel Rigonato – então comandante da Tropa de Choque de São Paulo –, que invadiu e desfilou dentro da Catedral para nos ameaçar”, relembra Aurélio Peres.
A ditadura tremeu Em setembro do mesmo ano, a entrega do abaixo-assinado, que reuniu centenas de manifestantes de todas as partes do país no Congresso Nacional, foi outro episódio cercado por tensão, repressão e violência. “Éramos centenas de pessoas em Brasília, e junto com o apoio de parlamentares, percorremos os corredores do Congresso, nos dirigindo ao Palácio do Planalto. Pela primeira vez, durante a Ditadura Militar, os movimentos sociais chegaram às portas do Palácio. A ditadura tremeu”, relata Carlos Silveira, que participou do MCC em Camaçari (RS). Uma comissão composta por 21 pessoas (17 mulheres e quatro homens) ficou encarregada de
entregar o documento. Após a entrega no Congresso Nacional, o grupo se dirigiu ao Palácio do Planalto. “Aí é que foi o problema”, destaca Ana. “Eles diziam que nós, mulheres, não poderíamos entrar de calça e os homens sem terno. Até que conseguimos invadir o local. Mas tinha muita repressão no caminho. Policiais e fuzileiros armados. Nós negociamos para pelo menos protocolar o documento. Para isso, esperamos de sete a oito horas sob o sol. Conseguimos, mas tivemos que entrar uma por uma para protocolar o abaixo assinado no Palácio do Planalto”. Silveira completa, ao revelar que, hostilizados pelos militares “à paisana”, volta e meia eram agredidos com murros e pontapés. “Dona Maria, de 46 anos, foi atingida no rosto por um soco desferido pelo assessor de imprensa do Palácio, um direitista de nome Alexandre Garcia, que hoje é um dos âncoras dos jornais da Globo. Dona Maria, uma mulher simples, não entendia por que éramos tratados com tanto desprezo”. Apesar de não ter logrado êxito na entrega do abaixo-assinado nas mãos do presidente da República, o MCC foi considerado uma importante porta de abertura para as lutas populares. “A partir de então conquistamos muitas de nossas reivindicações. A construção de 600 creches no Brasil foi uma delas. As mulheres queriam trabalhar fora e para isso precisavam das creches. Foi um passo muito importante para emancipação feminina”, destaca a militante feminista. Precursor de grandes mobilizações e greves, que passaram a estourar a partir de 1978, o MCC mostrou a importância da mobilização a partir de bandeiras amplas. “O trabalho de massa, se não for feito com bandeiras amplas e unidade, tem vida curta”, refletiu Aurélio Peres.
Fundação Maurício Grabois
SOBREVIVÊNCIA Arrocho serviu para unir forças, relembra Aurélio Peres VISÃOClassista
39
AGENDA SINDICAL
DESTAQUE AGENDA
Mavrikos é reeleito secretário-geral da FSM centrais sindicais CTB, CGTB, CUT, For¬ça, NCST e UGT), vai promover nas regiões Norte e Nordeste os seminários regionais “Forta¬lecimento da participação dos trabalhadores na regulação sanitária no Brasil”. Já foram realizados seminários nas regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste.
JUNHO Encontro do Meio Ambiente
JULHO Conselho da CTB
AGOSTO 4º Encontro Sindical Nossa América
8º CONGRESSO NACIONAL DA UBM Nos dias 10, 11 e 12 de junho, a cidade litorânea Praia Grande (SP) será palco do 8º Congresso Nacional da União Brasileira de Mulheres (UBM). Sob o tema “A participação política da mulher e o desenvolvimento do Brasil”, o Congresso terá como principais objetivos eleger a nova direção da entidade para o triênio 20112014 e a efetivação do plano de ação para fazer avançar as metas definidas pela entidade.
Regulação Sanitária no Brasil Durante os dias 14 e 15 de junho, o Fórum Nacional de Saúde e Segurança do Trabalhador, (composto pelas
40
VISÃOClassista
1º Encontro de Defesa do Meio Ambiente A CTB vai promover, entre os dias 15,16 e 17 de junho, o 1º Encontro Nacional de Defesa do Meio Ambiente, sob o tema “Desenvolvimento com Valorização do Trabalho e Sustentabilidade Socioambiental”. O encontro, que acontecerá em Brasília, pretende reunir sindicalistas, ambientalistas, especialistas e representantes dos movimentos sociais, que aprofundarão o debate acerca da preservação dos recursos naturais, dentro do Projeto Nacional de Desenvolvimento defendido para a nação. O principal objetivo é extrair do debate um posicionamento que servirá para nortear a política ambiental da Central.
Conselho Nacional da CTB Com o objetivo de discutir e definir as principais ações para os próximos anos, a CTB vai promover, em São Paulo, de 28 a 30 de julho, a reunião de seu Conselho Nacional. Por determinação estatutária, o Conselho se reúne de quatro em quatro anos e sua principal função é a de atualizar a política da Central. Participam da reunião nacional delegados e delegadas eleito(a)s em plenárias estaduais.
Seminário de Seguridade Social Resultado de uma parceria firmada entre as secretarias de Saúde do Trabalhador, Políticas Sociais e Previdência e Aposentados, durante os dias 10 e 12 de agosto acontece o 1º Seminário Nacional da CTB. O objetivo do evento será fazer um raio-X da atual situação encontrada na seguridade social e a preocupante realidade enfrentada pelo trabalhador brasileiro nos setores como a Previdência e Saúde.
Marcha das Margaridas Considerada a maior mobilização das trabalhadoras do campo, a Marcha das Margaridas será realizada entre os dias 16 e 18 de agosto, em Brasília. Coordenada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), o evento inaugura um novo processo de construção da ação estratégica das mulheres do campo na busca por visibilidade, reconhecimento social e político e cidadania plena.
O
16º Congresso da Federação Sindical Mundial (FSM), realizado entre os dias 6 e 10 de abril, na Grécia, foi marcado pela unidade demonstrada pelos trabalhadores de todo o mundo. Ao final, foi decidida por unanimidade a reeleição de George Mavrikos para o cargo de secretário-geral da entidade. Após ser reconduzido por aclamação pelos 828 delegados de 105 países, Mavrikos afirmou ter cumprido o dever que lhe foi designado. “Decidimos ser soldados da classe trabalhadora na luta pelo desmantelamento do regime imperialista”, declarou. Para o presidente da CTB, Wagner Gomes, durante o Congresso a FSM demonstrou na prática que a unidade da classe trabalhadora é, de fato, a melhor estratégia de luta contra os desmandos do capital. “Vimos de perto que a crise na Europa realmente é grave, mas ao mesmo tempo também testemunhamos a disposição de seu povo em não aceitar pagar uma conta criada pelas instituições financeiras”, afirmou.
Fotos: Arquivo CTB
CONQUISTA Batista é eleito para uma das vice-presidências da FSM Ao final do Congresso, a atuação da CTB no sindicalismo brasileiro e internacional foi reconhecida pela diretoria da FSM: João Batista Lemos, secretário adjunto de Relações Internacionais da Central foi eleito para o cargo de vice-presidente da entidade. Para Batista, sua condução à vice-presidência será de grande importância para o sindicalismo classista brasileiro. “Foi uma grande conquista da CTB. Temos agora
um instrumento maior para nossos objetivos”, afirmou. O presidente da CTB também parabenizou o companheiro João Batista Lemos pelo cargo que passará a ocupar na diretoria da FSM. “Há tempos acompanhamos de perto o trabalho que vem sendo feito por ele no movimento sindical brasileiro e latino-americano. A FSM só tem a ganhar com sua presença entre os vicepresidentes”, disse Wagner Gomes.
4º Encontro Sindical Nossa América Mais de 30 países estarão representados por cerca de 500 sindicalistas no 4º Encontro Sindical Nossa América (Esna), que acontece entre os 25 a 27 de agosto, em Manágua, na Nicarágua. Entre os eixos que serão debatidos estão a integração dos países do continente, a importância da formação dos sindicalistas e a realização de um balanço das atividades promovidas ao longo do último ano, bem como a criação de uma nova agenda para o próximo período.
RESPALDO Mavrikos discursa após reeleição
AVANÇO Wagner destaca a unidade VISÃOClassista
41
JOILSON CARDOSO
MUNDO DO TRABALHO
O combate às práticas antissindicais na Conferência do Trabalho Decente Infelizmente, o trabalho infantil ainda é entendido como um fator positivo para as crianças que vivem em condição de pobreza
Joilson Cardoso é professor, dirigente nacional da CTB e secretário Sindical do Partido Socialista Brasileiro (PSB)
42
VISÃOClassista
C
om a instalação da 1ª Conferencia Nacional de Emprego e Trabalho Decente (CNETD), é de fundamental importância considerar os limites e possibilidades táticas da atuação do sindicalismo classista em todo esse processo. Em primeiro lugar, porque estrategicamente não alimentamos ilusões de resolvermos as contradições das relações entre capital e trabalho nos marcos do capitalismo através da negociação tripartite, sob supremacia do empresariado brasileiro, resistente às mudanças que ampliem os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras; em segundo lugar, porque somos desafiados a influenciar no direcionamento dos conteúdos da 1ª CNETD, o que não deixa de ser uma tática importante, na defesa da Agenda da Classe Trabalhadora, constituída a partir da Conclat. Os chamados eixos da 1ª CNETD: 1) gerar mais e melhores empregos com igualdade e oportunidade; 2) erradicar o trabalho escravo e infantil, em especial nas suas piores formas e fortalecer o diálogo social; 3) o tripartismo como instrumento de governabilidade democrática, em si, anunciam os limites dessas
tentativas de “negociação” envolvendo trabalhadores e empregadores, sob o olhar “neutro” do governo, com vistas à implantação de um plano que leve o país ao ambiente que a OIT resolveu chamar de trabalho decente, mas que, para nós, é o ambiente da disputa com vistas a instituirmos novos conceitos sobre decência nas relações trabalhistas, além da luta pela distribuição de renda, contra a acumulação do capital. Assim, os classistas terão que disputar o conteúdo dessa Conferência taticamente, introduzindo os conteúdos que coloquem as questões estruturais do mundo do trabalho, numa perspectiva da Classe Trabalhadora. Se por um lado os empresários buscarão legitimar os conceitos de empresa sustentável, desoneração da folha (uma espécie de “mantra” que vem seduzindo o governo) e condicionantes para geração de novos empregos, por outro lado teremos que pautar a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas, medida esta que geraria mais de 2,5 milhões de empregos, como também o combate à rotatividade, com a adoção da Convenção 158 da OIT. Teremos que pautar
temas relevantes, como é o do Combate às Práticas Antissindicais, com vistas aos mais elementares direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, como: o livre direito à sindicalização, sem descriminações e perseguições; o direito à vida, cessando as mortes de militantes e dirigentes das entidades sindicais que atingem números alarmantes e inaceitáveis no Brasil; o direito de representação da entidade sindical, tão desprezadas e aviltadas pelo famigerado interdito proibitório e a inexistência dos representantes dos sindicatos nos locais de trabalho; o direito de greve; o direito da estabilidade e licença dos dirigentes sindicais. A partir desses conceitos, é preciso também defender severas punições para os que realizam e patrocinam práticas antissindicais, regulamentadas em Lei, através do PL construído pelas Centrais Sindicais que precisa ser aprovado no Congresso Nacional. Essas são questões que somente as centrais sindicais, com unidade, poderão pautar na Conferência, certamente sob a oposição dos empregadores e o “corpo mole” do governo. Os desafios estão lançados. Façamos o bom combate.