O projeto Leitura no Metrô, que conta com 400 textos literários, tem conquistado novos leitores durante o percurso para os passageiros. Pág. 5
GUSTAVO ANDRADE
GUYANNE ARAÚJO
GUSTAVO ANDRADE
Grifes mineiras driblam barreiras encontradas no mercado de produção de moda e buscam maneiras de conquistar espaço em Belo Horizonte. Pág. 6
ONG Pró-Reis assiste em média a 40 pessoas que enfrentam muitas dificuldades fornecendo abrigo temporário em Nova Lima. Pág. 4
marco jornal
Ano 36 • Edição 263 LaboratóriodeJornalismodaFaculdadedeComunicaçãoeArtesdaPucMinas•LaboratóriodeJornalismodaFaculdadedeComunicaçãoeArtesdaPucMinas•LaboratóriodeJornalismodaFaculdadedeComunicaçãoeArtesdaPucMinas Dezembro • 2008
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Ciclista percorre 1.301 quilômetros para ver o mar YONANDA DOS SANTOS
CHUVAS AUMENTAM RISCO PARA 500 MIL MORADORES VICTOR CORRÊA
O vigia do Museu Histórico Abílio Barreto José de Castro (foto acima) viajou, de bicicleta, de Belo Horizonte a Florianópolis. O fato de não conhecer o mar foi decisivo na escolha do trajeto, percorrido em 20 dias. Página 15
Alimento que conquista cada vez mais os mineiros JOELMIR TAVARES
n
Na Regional Noroeste, a preocupação é com a Vila São José. Apesar dos reassentamentos já feitos, ainda há moradores em risco. Página 2
TRAJETÓRIA RECONHECIDA LUIZ CARLOS OLIVEIRA
Indispensável à mesa de muitas famílias mineiras, o queijo é uma tradição gastronômica de Minas Gerais. Em Belo Horizonte, o Mercado Central é opção para quem deseja comprar o queijo canastra, o mais procurado e famoso devido ao seu sabor. Muitos comerciantes encontraram no produto uma forma de garantir a renda familiar, como é o caso de Aristeu Mozzer (foto). Junto com a esposa Salomé, ele deu seqüência ao negócio familiar, iniciado há quatro décadas e que hoje recebe clientes de diferentes origens. Para evitar a ameaça a essa tradição, produtores e governo buscam manter o preço acessível ao consumidor. Página 12 nestaediçãonestaediçãonestaediçãonestaediçãonestaediçãonestaedição
No começo, a idéia era criar uma forma de tirar de casa mulheres do Alto Vera Cruz, na Zona Leste de Belo Horizonte. Foi assim que nasceu o Lar Feliz, que iniciou como espaço de bate-papo, passou para a produção de artesanato, grupo de expressão corporal até chegar ao atual formato do Meninas de Sinhá. O conjunto passou a fazer shows e apresentações por vários lugares do Brasil, mostranto ao públicos cantigas de rodas e um pouco do folclore mineiro. Hoje, com 35 integrantes, além de uma terapia para as mulheres que participam, o gr upo também é ganhador de prêmios e já garantiu a continuidade do seu trabalho, com o Netinhas de Sinhá. Página 16
Abrigo São Paulo completa trinta anos O Abrigo São Paulo foi criado em 1978 pela Sociedade de São Vicente de Paulo e chegou a receber até 500 pessoas desabri-
gadas pelas chuvas, tornando-se referência em Belo Horizonte. Hoje, o abrigo é um ponto de apoio essencial para moradores
de rua, migrantes à procura de emprego, de tratamento de saúde e até de pessoas que vivem atrito familiar. Página 3
2 Comunidade
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Dezembro • 2008
EDITORIAL
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Retrospectiva de fatos marcantes e compromisso
PERÍODO DE ALERTA NAS ÁREAS DE RISCO Técnicos e voluntários trabalham para minimizar os perigos das chuvas; população deve estar atenta aos sinais de risco
n LORENA KAROLINE MARTINS, 3º PERÍODO
n GUYANNE ARAÚJO,
Estamos no final de mais um ano, num momento em que a equipe do MARCO convida você, leitor, a fazer uma reflexão de como simples atitudes geram grandes feitos na nossa vida. Ao longo deste ano, contamos histórias de exemplos de solidariedade. Mostramos que inclusão social e calor humano andam juntos, possibilitando a abertura de novos caminhos. Retratamos pessoas que, por meio de simples idéias, apostaram na criatividade, nos sonhos e conseguiram mudar a vida. É o caso do barbeiro Evandro Lima, ganhador de vários títulos na queda de braço, e da faxineira "Betinha", apaixonada por literatura. Neste mês, contamos a história do cicloturista José de Castro, que pedalou durante cinco dias até Florianópolis com o objetivo de conhecer o mar, levando na bagagem, além dos objetos essenciais para a viagem, um conjunto de expectativas que marcaram para sempre a sua vida. Ouvimos o prefeito eleito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), em mais um passo no acompanhamento que o MARCO tem feito do processo de construção da nova Rodoviária no Bairro Calafate; ouvimos moradores a fim de discutirem os melhores caminhos para se chegar a um acordo. E é esse tipo de compromisso que o MARCO se dispõe a continuar buscando. Valorizando o seu caráter comunitário, o MARCO divulgou o incentivo de novos projetos como o Centro Dia do Idoso, mostrando que aquelas pessoas com mais idade encontram, além do conforto, uma série de oportunidades como as oficinas, algumas em parceria com a PUC Minas, que puderam revolucionar vidas. Além disso, o jornal também fez matérias que procuraram conscientizar a população para a importância da prevenção contra a dengue. Leitores mostram cada vez mais que têm voz no MARCO, como é o caso dos moradores do Bairro Coração Eucarístico que entraram em contato conosco para reclamar do incômodo causado por um banheiro público devido ao mal cheiro e que foi retirado do local, perto da Via Expressa. Acompanhamos fatos vistos por outros olhos, famílias que encontraram um recomeço de vida após uma série de obras de desapropriação da extinta Vila Vietnã e puderam conviver harmoniosamente em suas novas casas no Bairro 1º de Maio. Processos de humanização são vistos também na reportagem das Meninas de Sinhá, grupo de folclore mineiro destinado principalmente à mulheres da terceira idade, que possibilitou o resgate da auto-estima que estava perdida por causa da depressão. Terminamos 2008 com a idéia de que sempre há mais o que fazer para que o próximo ano também seja marcado por fatos que influenciam mudanças e que resultam na melhoria da qualidade de vida. É esse o objetivo do MARCO, que há 36 anos cumpre seu compromisso com os leitores por meio do bem mais precioso: a informação. Desejamos a todos um Feliz Natal e um ano novo repleto de realizações.
EXPEDIENTE
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jornal marco Jornal Laboratório da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas www.pucminas.br . e-mail: jornalmarco@pucminas.br Rua Dom José Gaspar, 500 . CEP 30.535-610 Bairro Coração Eucarístico Belo Horizonte Minas Gerais Tel: (31)3319-4920 Sucursal PucMinas São Gabriel: Rua Walter Ianni, 255 CEP 31.980-110 Bairro São Gabriel Belo Horizonte MG Tel:(31)3439-5286 Diretora da Faculdade de Comunicação e Artes: Profª. Ivone de Lourdes Oliveira Chefe de Departamento: Profª. Glória Gomide Coordenador do Curso de Jornalismo: Profa. Maria Libia Araújo Barbosa Coordenadora do Curso de Comunicação / São Gabriel: Profª. Daniela Serra Editor: Prof. Fernando Lacerda Subeditor: Profa. Maria Libia Araújo Barbosa Editor Gráfico: Prof. José Maria de Morais Editor de Fotografia: Prof. Eugênio Sávio Monitores de Jornalismo: Camila Lam, Cíntia Rezende, Guyanne Araújo, Diana Friche, Laura Sanders, Lorena Karoline Martins, Patrícia Scofield, Alba Valéria Gonçalves (São Gabriel) Monitores de Fotografia: Gustavo Andrade e Yonanda dos Santos Monitor de Diagramação: Marcelo Coelho Fotolito e Impressão: Fumarc . Tiragem: 12.000 exemplares
6º PERÍODO
Desde o início do período chuvoso, em outubro, 96 famílias foram removidas de suas moradias em toda a capital, sendo 78 de forma definitiva e 18 temporárias. Durante um dia de trabalho, no dia 16 de dezembro, por exemplo, houve a remoção de duas famílias da Vila São José e mais sete no restante da cidade. “A encosta nunca desce sem dar notícias; material descendo, escorrendo, trinca, são sinais”, alerta Rosely da Rocha, chefe da Divisão de Área de Risco da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel). As áreas de risco são aquelas onde pode ocorrer inundações e deslizamentos. Na Regional Noroeste, de 19 vilas e favelas, uma das áreas de maior preocupação é a Vila São José. "Na Vila São José tem as duas situações, o alagamento e deslizamento de encostas", Rosely da Rocha. Essa vila está passando por um processo de reassentamento por meio do qual vão ser entregues 1408 apartamentos, sendo que desses, 688 já estão sendo construídos com verba do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC). SINAIS Rosely da Rocha alerta que quem mora perto de encosta ou barranco deve estar atento e observar se há ocorrência de trincas nas paredes das casas, se desce material próximo à moradias e em caso positivo, sair de suas residências e procurar a Urbel ou a Defesa Civil de Belo Horizonte. Outra orientação que os moradores podem seguir é
reparar o movimento de árvores e postes ao redor, que podem despertar a análise e contastação de riscos. Para quem mora em locais vizinhos de córregos, deve-se ficar atento para a elevação do nível da água, sua cor, e caso percebam algo peculiar, as famílias devem ir para um local aberto e seguro e não tirar nada de suas casas. "As pessoas não devem ter essa preocupação. Na vida, nada volta atrás. As pessoas devem se preocupar com a vida delas e de suas famílias", pondera Rosely. RESISTÊNCIA A chefe da divisão de área de risco da Urbel conta que uma das dificuldades do trabalho é quando a situação de risco é diagnosticada e a família se recusa a sair do local. Ela comenta que entende a situação das pessoas, mas diz que não podem se apegar e permanecer no lugar. Ao todo são cinco equipes compostas por um engenheiro, um sociólogo e um técnico social que fazem as vistorias nas casas e avaliam sua situação ao longo do ano, mas quando a condição se agrava, em períodos chuvosos, esse número aumenta para oito equipes. BALANÇO De acordo com dados da Urbel, no primeiro diagnóstico de áreas de risco na capital mineira, em 1994, a cidade possuía 15 mil moradias em áreas de risco. Dez anos depois, em 2004, o mesmo diagnóstico atualizado por técnicos da Urbel constatou 10.250 mil moradias em áreas de risco. Atualmente, as equipes de técnicos estão fechando um novo levantamento que aponta a redução de 60% de
áreas de risco alto e muito alto em relação a 2004. "Essa redução se deve, sobretudo, às ações que a prefeitura vem executando nos últimos 16 anos nas vilas e favelas, urbanizando essas áreas e erradicando as áreas de risco geológico", explica Pedro Veríssimo, assessor de imprensa da Urbel. PREVENÇÃO De acordo com o levantamento da Urbel, as regionais que mais causam preocupação e que possuem maior recorrência de casos são: a Regional Leste (Taquaril, região com alto número de risco), a CentroSul (Aglomerado da Serra e Santa Lúcia), a Nordeste (Paulo VI), e a Oeste (Morro das Pedras e Cabana do Pai Tomás). Em Belo Horizonte há 209 vilas e favelas e 200 são consideradas em áreas de risco. A estimativa é que 500 mil pessoas vivem nessa condição, representando 22% da população total da cidade e 6% da área do município. Para reduzir o perigo e os prejuízos, são realizadas ações preventivas durante todo o ano, que são intensificados no período das chuvas. As moradias de risco alto e muito risco alto são vistoriadas e as famílias retiradas preventivamente, conforme as necessidades. Elas podem ser retiradas definitivamente e levadas para reassentamento igual ao da Vila São José, ou temporariamente, situação em que as famílias são alojadas em abrigos municipais ou recebem uma bolsa moradia de 240 reais mensais de aluguel até que possam retornar a suas casas de origem, a depender da avaliação e autorização do técnico. Outro projeto que a
prefeitura desenvolve em parceria com a comunidade são os Núcleos de Defesa Civil. Atualmente são 47 integrados por 400 voluntários capacitados pela Urbel. Esses voluntários ajudam a identificar tipos de risco geológico e aprendem a agir em situações de emergências provocadas pela chuva. Desde 2004, a prefeitura implantou sete Centros de Referencia(Crear), que são postos avançados próximos da comunidade com o objetivo de agilizar e aproximar o atendimento para a população de alto risco. Esses locais possuem colchão, cobertores, televisão, e servem para refúgio momentâneo das famílias de risco alto e muito alto de grande incidência de risco geológico identificadas pelos técnicos. Os sete centros se encontram nas vilas do Taquaril, Aglomerado da Serra, Santa Lúcia, Cabana do Pai Tomás, Vila Pinho (no Barreiro), Vila Apolônia (Contagem) e Paulo VI. MAIS CHUVA De acordo com o meteorologista do MG Tempo-Cemig/PUC Minas, Ruibran dos Reis, o ano de 2008 pode ser considerado o mais chuvoso dos últimos três anos. "Atrasou a chegada das chuvas, mas está mais forte", garante. Ele informa que os três primeiros meses de 2009 podem registrar de 20% a 30% a mais de chuvas em relação ao volume do último período. A previsão é mais um alerta, especialmente para os moradores de áreas de risco. Para vistorias, o morador deve entrar em contato com a Urbel pelo telefone 3277-6409, de 8h às 18h. Para emergência, discar 199, para a Defesa Civil, disponibilizado 24 horas.
Uma vida dedicada à comunidade ALEXANDRE CARNEIRO
n ALEXANDRE CARNEIRO SOARES, 4º PERÍODO
Maria das Graças Borges dos Santos, 55 anos, conhecida como Lia Borges pelos moradores da Vila 31 de Março, onde reside há 15 anos, é líder comunitária na Região do Dom Cabral, sendo uma das delegadas do Orçamento Participativo. "Estou vivendo melhor é agora”, garante Lia, que fabrica e vende bolsas na Feira de Artesanato da Avenida Afonso Pena e que foi presidente do Conselho Fiscal da Associação dos Moradores e Amigos do Bairro Dom Cabral. A história de Lia Borges começa na cidade de Teófilo Otoni, sua terra natal, localizada no Vale do Mucuri. Aos 11 anos, ela se mudou para Belo Horizonte por causa da transferência de seu pai, que era carpinteiro da Rede Ferroviária Federal. Na adolescência, começou a costurar, e quando conheceu o futuro marido, sapateiro, começou a fazer cintos e sapatos por conta própria. Na década de 70, casou-se e abriu uma fábrica de calçados com o cônjuge. “A fábrica chegou a ter 100 funcionários", lembra Lia. Mas no fim da década de 80, após
Como delegada do OP, Lia Borges tenta melhorias para o Bairro Dom Cabral dez anos de funcionamento, Lia foi obrigada a fechar o negócio, por problemas financeiros e matrimoniais. Divorciou-se e abriu um depósito de pães no Coração Eucarístico, que vendeu mais tarde para comprar sua atual casa. Lia é mãe de cinco filhos, um deles
morto aos 26 anos, em 21 de julho de 2002, dia do aniversário da mãe, vítima de infecção hospitalar. O envolvimento de Lia Borges com obras sociais começou quando ela se estabeleceu na vila, que faz parte do Dom Cabral. Para sustentar-se e aos filhos, voltou a pro-
duzir sapatos e cintos, além de bolsas, produto que se tornou exclusividade. "O que eu ganhava com o trabalho manual me deu condições de ajudar outros moradores", disse. A artesã começou a dar presentes para meninos e meninas da comunidade, no Natal e no dia das crianças. A iniciativa partiu dela e de uma vizinha, Agda Maria de Souza, chamada de Daguinha pelos moradores. Ao longo dos anos, a ação se tornou conhecida e passou a receber ajuda de outras pessoas, por meio de doações. Além de líder comunitária e artesã, Lia Borges também é cantora. Foi entre os idosos do Esperança e Vida que passou a freqüentar e a ajudar por causa de sua mãe, Laurinda de Oliveira Santos, que ela conheceu os integrantes do Grupo Seresteiros de Prata. Na época, o conjunto musical se chamava Coroas da Terceira Idade. O nome atual foi dado, segundo ela, "por causa dos cabelos brancos". Os músicos não eram integrantes oficiais do Grupo Esperança e Vida, mas freqüentemente apareciam nas reuniões e eventos promovidos pela entidade. A líder comunitária propôs aos seresteiros a formação do novo conjunto, no qual é vocalista.
Dezembro • 2008
Comunidade • Campus
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APOIO PARA RECONSTRUIR A VIDA Criado para receber desabrigados vítimas das chuvas que causavam tragédias na capital, o Abrigo Sào Paulo tornou-se fundamental também na vida de moradores de rua e migrantes ANTÔNIO ELIZEU DE OLIVEIRA
n ANTÔNIO ELIZEU DE OLIVEIRA, 3º PERÍODO
Ao completar 30 anos, o Abrigo São Paulo, localizado no Bairro 1º de Maio, Região Nordeste de Belo Horizonte, é referência na capital como ponto de apoio às vítimas de enchentes, pessoas carentes e moradores de rua. O local tem sido fundamental para centenas de pessoas que ali encontram ajuda para enfrentar as dificuldades da vida, como atesta Marco Antônio Bonifácio, 43 anos, solteiro, desempregado. “Há mais de três anos estou aqui no abrigo. Prefiro ficar aqui enquanto trato de uma gastrite. Aqui é muito bom”, diz. O abrigo, criado pela Sociedade de São Vicente de Paulo (SSVP), tem 26 funcionários e capacidade para receber 60 mulheres e 120 homens. A estrutura física é composta de quartos e banheiros, divididos em duas alas, a feminina e a masculina, cozinha industrial, consultórios para atendimentos psicológicos e assistência social, biblioteca, lavanderia, amplo quintal com uma frondosa mangueira, área de descarga de materiais e área administrativa. Seja na condição de abrigo, albergue ou casa de passagem, essa entidade filantrópica acolhe moradores de rua, migrantes à procura de trabalho, pessoas para tratamentos de saúde e desabrigados de chuva a partir de uma triagem conduzida pelo Serviço de Assistência Social. A administradora, Ana Vicentina, 58 anos, aposen-
Desabrigados da chuva são foco inicial da obra
Além dos dormitórios, os abrigados têm acesso à biblioteca, à lavanderia, e total apoio para tratamentos de saúde tada é voluntária e exemplo da dedicação dos Vicentinos com o projeto. “Às vezes fico mais aqui do que em casa”, conta Ana Vicentina.
ACOLHIDOS “Estou aqui no abrigo enquanto trato da minha doença. O abrigo funciona muito bem e, melhorando, vou procurar emprego”, justifica Ramires Alvarenga Souza Silva, 43 anos, armador da construção civil, abrigado desde agosto último quando estava perambulando pelas ruas, pedindo nas casas, com erisipela e foi acolhido para fazer tratamento. Ele completa dizendo que deseja se recuperar rapidamente para procurar emprego. O pedreiro Luiz de Almeida, 42 anos, também reconhece o trabalho do abrigo. “Meu pai muito correto, minha mãe totalmente correta, estou aqui por uma necessidade,
culpa minha, para enxergar a realidade. Graças a Deus estou tendo apoio, enfatiza o pedreiro, se recuperando de uma fratura no braço direito. “Damos apoio até o extremo à pessoa para fazer tratamento de saúde, para conseguir uma colocação de trabalho e, no caso de tratamento, liberamos apenas depois de receber alta do médico”, informa a administradora.
CONFORTO Entre os funcionários há também o reconhecimento da qualidade dos serviços prestados pelo abrigo. Marco Antônio da Silva, 43 anos, foi admitido há seis meses na função de porteiro do abrigo. Desde os 15 anos trabalhou aprendendo várias profissões como pedreiro, pintor, bombeiro hidráulico e eletricista. Como estava cansado, resolveu fazer curso de porteiro e vigi-
lante para ter um serviço mais leve, apesar da remuneração no atual ser bem menor que a anterior. Ele vê o Abrigo São Paulo como um lugar de privilégios. “Há fartura nas alimentações, roupas de cama e banho limpas, produtos de higiene para cada abrigado... É como um hotel cinco estrelas para o pobre. Em casa eu não tenho a fartura que há aqui, onde são oferecidas variedades de frutas, café, sucos, refeições de qualidade”, comenta. Marco Antônio diz que há dificuldades, citando, por exemplo, “que há normas aqui no abrigo; às vezes chegam pessoas querendo desrespeitar essas regras, fazendo ameaças de agressões. Aqui na portaria fico muito exposto. Mas todos os funcionários são muito unidos, ajudando a resolver atritos que por ventura surgirem”.
Belo Horizonte vivia, décadas atrás, graves problemas de transbordamentos dos córregos que cortam a cidade, principalmente o Ribeirão Arrudas, e, conseqüentemente, sofrimento das famílias desabrigadas. Foi nesse quadro que no dia dedicado pela Igreja Católica à Nossa Senhora da Conceição, padroeira da SSVP, 08 de dezembro de 1978, foi fundado o Abrigo São Paulo pelo Confrade Jairo Siqueira Azevedo, então presidente do Conselho Central da Sociedade São Vicente de Paula de Belo Horizonte. O objetivo inicial era atender prioritariamente parte da população proveniente dessas enchentes e chegou, nessa época, a abrigar 500 pessoas. Hoje as enchentes deste porte são coisas do passado. A capital progrediu e o atendimento é direcionado a moradores de rua, migrantes à procura de uma colocação no mercado de trabalho ou tratamento de alguma doença ou mesmo pessoas com atrito familiar. “Nesse seguimento, não é só pessoas de baixo poder aquisitivo que procuram o abrigo. Temos registros de atendimentos à pessoas letradas, formadas, que por um motivo ou outro se desentendeu, brigou com familiares, passando pelo Abrigo São Paulo, onde encontrou apoio”, conta Antonio Fernando Gomes do Nascimento, 54 anos, Gerente Administrativo do Con-
selho Central de Belo Horizonte da SSVP. O abrigo tem parceria com a Prefeitura de Belo Horizonte, convênios com clínicas médicas e com o Centro de Formação Profissional Divina Providência, Unidade Nita Chaves, que funciona no prédio ao lado e onde são oferecidos aos abrigados cursos de padeiro, confeiteiro, costureiras, dentre outros. “Desabrigados e moradores de rua são de responsabilidade da prefeitura, que firmou convênio, permitindo que o Abrigo São Paulo preste relevante serviços na esfera municipal”, salienta Antônio Fernando. O gerente conta que à época do prefeito Patrus Ananias eram feitas duas campanhas anuais, uma no fim do primeiro semestre, a Campanha do Agasalho, e a outra no final do ano, de alimentos, móveis e utensílios, quando o abrigo angariava os materiais em função do aumento da demanda nesses períodos do ano. As campanhas, que tinham o apoio do Corpo de Bombeiros, da Defesa Civil e de várias entidades não existem mais, ressalta Antônio Fernando. Para o atual período de chuvas, a casa já está estruturada para acolher possíveis vitimas das áreas de risco da capital, “sendo que nesse época apenas preparamos maior quantidade de alimentação e de, roupas de cama”, afirma a gerente do abrigo, Ana Vicentina.
YONANDA DOS SANTOS
Projeto cria CD ROM para surdos e é premiado em Brasília n LUCAS LEÃO, 4° PERÍODO
A aluna do curso de graduação em Filosofia da PUC Minas, Terezinha Cristina Costa Rocha, recebeu recentemente o Prêmio Jovem Cientista pela criação de um CD ROM para surdos. O CD ROM contém verbetes da filosofia e visa incluir o surdo no estudo da disciplina por meio da Língua Brasileira de Sinais LIBRAS. O prêmio foi concedido à estudante em reconhecimento ao desenvolvimento do projeto e produto final, elaborado por ela em parceria com os professores orientadores Heliane Alves de Carvalho Costa e Pedro Perini, do curso de Comunicação Assistiva da PUC Minas. Terezinha
recebeu o prêmio das mãos do governador Aécio Neves e também viajou à Brasília junto com outros premiados por conta de sua criação.
APOIOS A professora Heliane colaborou auxiliando no processo de como lidar com o surdo, área em que possui ampla vivência e desenvolve suas atividades e projetos. Já o professor Pedro Perini, doutor em Lingüística pela UFMG, colaborou com questões de ordem lingüística e considera que o projeto é uma resposta à demanda crescente de inclusão de pessoas com alguma dificuldade no sistema de ensino brasileiro. Ainda de acordo com o professor, a PUC Minas têm se mostrado amplamente disposta a colaborar com iniciativas como esta.
A idéia inicial do projeto partiu da própria estudante, que também é tradutora de LIBRAS e percebeu que um manual eletrônico poderia auxiliar o surdo no estudo da filosofia. No futuro, Terezinha acredita que o CD ROM pode incentivar o desenvolvimento de outros produtos similares que auxiliem e estimulem os surdos no estudo das mais diversas áreas do conhecimento.
CONTEÚDO Segundo Terezinha, o CD ROM é de fácil compreensão. Seu formato auto-explicativo permite ao usuário o acesso em português usual e em LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais . Nele, estão contidos verbetes da filosofia essenciais para compreensão da disciplina de forma facilmente com-
Terezinha acredita no incentivo à produtos que auxiliem os surdos no estudo das diversas áreas do conhecimento preendida pelos usuários. O objetivo do CD é trazer facilidades diretas aos surdos no estudo desta disciplina que é de ordem obrigatória no ensino médio brasileiro e, uma das mais necessárias à compreensão do mundo de ontem e de hoje. O CD ROM está em
fase de finalização com o apoio da PUC Minas. A princípio, o acesso ao produto será através de instituições credenciadas que o receberão por intermédio de parceiros, os quais a estudante ainda está buscando. A idéia é que toda a rede de ensino brasileira possa ter este
acesso, viabilizando, desta forma, a inclusão dos surdos no mundo de saberes proporcionados pela filosofia e outras futuras disciplinas contempladas por iniciativas como esta, que busca traduzir os conteúdos por meio da Língua Brasileira de Sinais.
4 Cidade
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Dezembro • 2008
ABRIGO PARA MULHERES EM RISCO A ONG Pró-Reis, que já funcionou nas instalações de um hospital desativado em Nova Lima, hoje ocupa o prédio de uma escola e atende, em média, 40 pessoas com moradia temporária GUSTAVO ANDRADE
n CÍNTIA REZENDE, LAURA SANDERS PAOLINELLI,
pal é o planejamento. “Nossa dificuldade é a dificuldade de um lar”, comenta.
7° E 4º PERÍODO
Ricardo Souza Freitas conheceu a ONG Pró-Reis há dez anos através de um amigo. Ele era aposentado e dava aulas de inglês quando começou a se interessar por trabalho voluntário. Trabalhou em um hospital, mas a rotina triste, que o deixava deprimido, fez com que ele buscasse outro lugar para doar suas energias. Foi no Pró-Reis, uma instituição que, na época, chegou a abrigar cem mulheres, que ele se envolveu. Há quatro anos, Ricardo mudou-se para o local para poder se dedicar integralmente à ONG e hoje diz ter aprendido muito com o trabalho “muito humano” que beneficia a comunidade. Localizada no Bairro Barra do Céu , município de Nova Lima, a ONG PróReis atualmente assiste, em média, a 40 pessoas, já que muitas delas se abrigam no local temporariamente. A iniciativa do casal de pastores Maria das Graças Barreto e Domingos Sávio Barreto tem como proposta abrigar mulheres jovens, em risco, com idade entre oito e 18 anos. Com a falta de um abrigo público no município, a ONG vem atendendo outras demandas, como mulheres com saúde debilitada, adultas com filhos, entre outros casos. “Nós abrigamos criança em último caso”, afirma Maria das Graças. Ela conta que atualmente são sete crianças acompanhadas das mães no projeto. “Foi muito bom vir para cá, eu fiquei muito feliz em saber que aqui também recebia mães”, define Luiza Carla Palumba que há oito
Luiza Palumba mora há oito meses na ONG com seus filhos Larissa e Gabriel, pois sua casa se encontrava em área de risco meses mora na ONG com seus dois filhos, Gabriel, de cinco anos, e Larissa, de um ano e oito meses. Luiza relata que ao separar do marido foi morar com os filhos em uma casa no Bairro Santa Rita, localizado na cidade de Nova Lima. Ela conta que durante o período de chuvas a defesa civil decretou que sua casa estava em estado de risco, fato que fez com que ela tivesse que buscar outro lugar para morar. Na espera por outra moradia, que será doada pela Prefeitura de Nova Lima, Luiza conta que na ONG ela faz de tudo, mas que tem grande afinidade com as tarefas de cozinha e também como lavadeira, atividade que desempenhava antes de ir para o local. “Enquanto a minha casa não sai eu vou esperar aqui com
meus filhos, porque aqui é bom demais”, relata. Luiza conta que a atenção com seus filhos e com ela é constante e que isso a faz ficar mais tranqüila quanto ao fato de não ter uma casa. “Tem dia que eu tô triste aí o pessoal conversa comigo e eu fico bem melhor”, desabafa. ESTRUTURA As mulheres abrigadas ficam em quartos coletivos, cada um com um banheiro. Maria das Graças diz que a intenção era ter quartos com duas pessoas no máximo, mas com a atual estrutura a média é de seis pessoas por cômodo. Para aumentar a capacidade do abrigo, as camas também tem a possibilidade de virar beliche. Na casa, as mulheres tem acesso à internet e televisão, mas alguns programas
são vetados, já que se trata de uma instituição evangélica. Maria das Graças conta que no Pró- Reis a rotina das mulheres é livre, muitas delas passam o dia no trabalho ou estudando. “A gente só fecha o portão quando a última pessoa chega”, ela conta, explicando que algumas das moradoras estudam no período da noite. O pastor Domingos Sávio Barreto de Oliveira diz que tenta não institucionalizar muito as atividades da casa, e busca manter um ambiente familiar. “Temos regras, temos as reuniões, psicólogos, terapeutas, mas a rotina é livre”, explica. Apesar disso, há esquemas de horários para limpeza e três refeições principais. Quanto às dificuldades enfrentadas na casa ele diz que a princi-
ABRIGO Patrícia Aparecida Diniz, de 39 anos, que está há seis meses na casa com suas duas filhas acredita que a ONG é um lugar para ficar temporariamente, enquanto se está passando por um momento mais conturbado da vida. Ela procurou o casal depois de um desentendimento familiar, quando estava deprimida e revoltada. “Não é um lugar para vida toda, mas para se reestruturar”, comenta. Como não é evangélica, Patrícia conta que elas não assistem alguns programas da televisão aberta, como as novelas e também que algumas músicas não são permitidas. Outra abrigada, Patrícia Carmem Pereira é considerada pelos integrantes da ONG como um verdadeiro milagre. Ela lembra que chegou ao local em estado debilitado devido ao fato de ter sofrido uma aneurisma cerebral quando tinha 15 anos. Patrícia conta que perdeu parte dos movimentos e que por isso não era capaz de realizar determinadas tarefas, fato que deixava sua mãe e avó muito irritadas. “Elas me batiam e falavam que eu tava com preguiça”, desabafa a menina. Há quase três anos no local, Patrícia diz que hoje já consegue realizar diversas atividades, graças ao incentivo e carinho que recebe. Ricardo, o voluntário, relembra que Patrícia sempre pedia para ir estudar e que ele uma vez disse que se ela desse conta de ir e voltar a escola sozinha, ele a deixaria retomar os estudos. “E não é que ela foi”, relembra Ricardo. “Demorou quase
uma hora para ir e voltar, mas ela foi”, conta emocionado. Hoje, ela conta com a ajuda de um ônibus viabilizado pela ONG para que ela possa ir e voltar da escola com segurança. “Estou na sexta série e pretendo continuar a estudar”, confessa . Sâmara Bernardo Pereira de 15 anos conta que veio para a ONG há pouco mais de dois meses em busca de ajuda. Namorando um rapaz de 23 anos usuário de drogas, ela relata que percebeu que a relação não ia dar certo, mas que precisaria de ajuda para se separar do mesmo. “Eu vim para cá para tentar esquecê-lo”, desabafa Sâmara. Dividindo o quarto com mais seis meninas, ela relata que a permanência no local tem sido ótima e que agora ela pretende sair dali só quando atingir a maior idade. “Só saio daqui quando me casar ou quando fizer 18 anos”, conta. Para o ano que vem, Sâmara fala que pretende retomar os estudos tendo em vista que ela não concluiu neste ano a 5ª . FUTURO Depois do abrigo provisório, muitas das mulheres se reintegram novamente em outras casas, se casam ou formam-se na faculdade. “Elas ficam aqui até resolver sua situação”, acrescenta Maria das Graças. Ricardo conta que muitas das moças voltam para o Pró-Reis com uma família para visitar o local e inclusive há um quarto na ONG para essas visitas. O bom relacionamento com algumas empresas também facilita na indicação de mulheres abrigadas para empregos.
GUSTAVO ANDRADE
Violência contra menores motiva criação da ONG A idéia de se criar uma instituição com atendimento voltado à mulheres e crianças em estado de risco veio a partir do momento em que uma das fundadoras do local, Maria das Graças Barreiro, passou a receber em casa alguns casos de mulheres, em sua maioria vítimas de violência doméstica. Maria das Graças lembra que ao longos destes 14 anos recebeu muitas meninas. Uma das primeiras chegou a sua casa graças a indicação de um amigo. Maria lembra que a menina decidiu sair de casa porque o pai, além de alcóolatra, também a agredia. Hoje ela relata que a moça que a procurou está casada e que também possui emprego fixo. “Eu tentava ajudar na medida do possível. Assim como esta menina, foram várias que apareceram na
minha casa”, conta Maria das Graças. ADAPTAÇÕES O Pró-Reis funciona em uma escola desativada, construção cedida pela prefeitura, porém antes de ser transferido para lá, chegou a funcionar em um antigo complexo hospitalar. Segundo Maria das Graças, as adaptações do hospital foram grandes, a fim de que as atividades pudessem ser realizadas no local. Ela relata que as enfermarias foram transformadas nos quartos e os outros ambientes, pouco a pouco, passaram a fazer parte do abrigo. Foi nesta época que os organizadores perceberam que devido a falta de um lugar apropriado para o recebimento de pessoas carentes e em processo de recuperação, a ONG teria que ampliar suas atividades.
“Inicialmente a gente queria trabalhar com mulheres e crianças em estado de risco, porém a falta de um espaço adequado para acolher as diversas pessoas aqui em Nova Lima fez com que a gente tivesse que ampliar as atividades”, relata Maria das Graças. DIFICULDADES Quando mudou-se para ONG, Ricardo Souza Freitas conta que no começo da sua estadia, a insegurança quanto ao futuro do local era grande. “A gente não sabia se ia ter comida no outro dia”, desabafa. Ricardo relembra que uma vez chegou uma mulher pedindo um pacote de açúcar, porém só haviam dois na dispensa. Preocupado, ele peguntou a Maria das Graças o que deveria fazer, e para sua surpresa ela lhe respondeu que
podeira doar o saco de açúcar à mulher. “Eu não entendi mas ela (Maria das Graças) me disse que para a gente este pacote duraria dois dias, mas para esta mulher duraria quase um mês, e que, no mais, Deus daria outro”, relata. Ricardo conta que, para sua surpresa, no mesmo dia parou um caminhão com doações e um dos itens que mais tinha era açúcar. “Chegava a escorregar no chão de tanta açúcar”, conta emocionado. Hoje a instituição tem apoio de diversas instituições e empresas que também ajudam a manter a ONG, dentre elas a Prefeitura de Nova Lima e uma construtura do município, além de doações recebidas na conta da instituição. Ricardo e Maria das Graças contam que tudo é aproveitado, e as doações que sobram são distribuídas na vizinhança, que
Idealizadores da ONG, o casal de pastores tem a ajuda de voluntários também é muito carente. O lugar também conta com ajuda de seis voluntários e cinco cumpridores de pena alternativa. Em função do aumento da demanda da comunidade, a ONG pediu ajuda da prefeitura local para expansão das atividades e tam-
bém para implantação de um projeto psicopedagógico, que já foi aprovado pela Conselho Municipal da Criança e do Adolescente e será implantado em janeiro. A idéia é oferecer oficinas dentro da casa para ajudar na formação e ocupar os integrantes da ONG.
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Dezembro • 2008 jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas • jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas • jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas • jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas
PASSATEMPO NO METRÔ É BEM ACEITO O projeto Leitura no Metrô é uma boa alternativa para passageiros que desejam se distrair durante o trajeto. Os 400 textos literários são direcionados a pessoas que passam a viagem em pé GUYANNE ARAÚJO
n GABRIEL DUARTE, ISABELLA LACERDA, 2º PERÍODO
Observar a paisagem durante o trajeto da viagem no metrô era uma das únicas distrações da técnica de enfermagem Luiza Helena, de 46 anos, que utiliza esse meio de transporte todos os dias, entre a estação Carlos Prates e Venda Nova. Desde outubro último, quando foi implantado o projeto Leitura no Metrô, o trajeto de cerca de 30 minutos ficou menos monótono”. Lendo os textos não vemos o tempo passar”, afirma a passageira. Luiza Helena é uma dentre os 150 mil usuários que, em média, utiliza esse transporte coletivo. Apesar de ser uma nova forma de passar o tempo, em uma viagem feita entre as estações Gameleira e Minas Shopping, quando os carros do metrô receberam 86 pessoas, somente uma leu os textos que estavam dependurados nas colunas de apoio aos passageiros, enquanto outras, mesmo em pé, leram jornais e revistas ou, até mesmo, ficaram de costas para as publicações. O projeto, implementado pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) em parceria com a Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (FALE-UFMG) em outubro desse ano, em todos os 25 trens da frota, já recebeu mais de 400 textos de diferentes gêneros literários e autores. “O projeto está sendo muito bem aceito. Temos
recebido várias cartas e ligações elogiando”, diz a gerente de atendimento ao usuário e integração da CBTU, Heloísa Doche. Ela conta que nunca houve reclamação a respeito do conteúdo dos poemas, somente pedidos para aumentar o tamanho das letras e a disposição dos textos de forma que, quem esteja assentado, também possa ler. “Isso já é mais difícil, pois o projeto é para aquelas pessoas que estão em pé, sem conforto, sem ter como segurar os textos. E quem está assentado normalmente está lendo um livro próprio, estudando, no conforto”, explica. ARTE E INCLUSÃO A campanha Leitura no Metrô está inserida dentro do Projeto Estação Arte e Cidadania, promovida pela CBTU, e que abrange diferentes formas de promoção às artes e inclusão social. Heloísa argumenta que esse projeto tem um caráter mais permanente do que os outros desenvolvidos, além disso, afirma que é necessária a manutenção dos textos por um determinado tempo nos trens para que as pessoas tenham vontade de lê-los. “Os textos têm que ficar certo tempo dentro dos trens para provocar a vontade de ler nas pessoas. Às vezes as pessoas não estão com vontade de ler naquele dia, ou começam a ler e depois param. Então tem que dar tempo a elas”, comenta. A idéia de implantar os textos surgiu da experiência de Maria Antonieta Pereira, pós - doutora em Letras pela UFMG e coordenadora do Projeto Leitura para
Durante o percurso os passageiros podem ter contato com os poemas do projeto do Estação Arte e Cidadania Todos – projeto de divulgação de textos nos ônibus da capital – que em 2003, enquanto estava na Argentina estudando, percebeu que os usuários do metrô de lá liam muitos livros e jornais. Então ela, a partir dessa experiência, promoveu campanhas com o objetivo de possibilitar a publicação de textos nos meios de transporte coletivo. “Em 2003/2004 implantamos o projeto-piloto na linha circular de ônibus e ele foi muito bem recebido pelos usuários”, relembra a coordenadora. Maria Antonieta explica que a escolha de se publicar os textos primeiramente nos ônibus, deu-se
por esse transporte ser mais popular entre os cidadãos mineiros. Após o sucesso nos ônibus, tornouse possível a disseminação da idéia nos metrôs. “O professor Antônio Augusto, do curso de letras aqui da Federal, que propôs que o projeto fosse para o metrô. A gente conseguiu que o projeto fosse recebido por toda a população”, comenta. PUBLICAÇÕES A coordenadora e idealizadora do Projeto Leitura para Todos, que abrange a publicação nos ônibus e no metrô, explica que, desde a criação do projeto, a equipe da FALE já recebeu textos de mais de 300 autores diferentes.
A equipe, que tem a função de selecionar e implantar os textos, publica as criações de jovens escritores ainda desconhecidos, mas também obras de autores que são referência na literatura brasileira, como Olavo Bilac e Lima Barreto. A escolha dos textos se dá pela qualidade literária e não pelo assunto. “Publicamos não só textos, como poemas, haikai, crônicas. Não é nada específico de uma época”, diz Maria Antonieta, que ainda complementa explicando que são feitas algumas modificações antes da publicação dos materiais. “Publicamos visando aproveitar o espaço e com letras
que facilitam a leitura. Além disso, fazemos algumas revisões gramaticais quando necessário”, completa. Maria Antonieta ainda explica que os textos chegam via correio eletrônico ou a equipe seleciona os de domínio público, que são disponibilizados pelo governo. De acordo com ela, há uma tentativa de se publicar pelo menos um texto de cada autor, mesmo aqueles que não são de grande qualidade. “O projeto é uma grande oportunidade”, ressalta. Márcia Araújo, de 42 anos, que escreve textos desde os 12, é um dos casos de pessoas que enviaram seus textos via e-mail. Ela teve dois textos escolhidos pela equipe da FALE e já teve alguns de seus escritos publicados em livros. “Essa oportunidade era o que eu estava precisando. Já tinha até esquecido que havia mandado seis textos para o projeto quando me informaram que dois dos meus foram escolhidos”, comemora. A escritora explica que usa de várias inspirações para escrever seus textos, como sua cidade natal, seus familiares, lugares que gosta de freqüentar e, até mesmo, escritores já consagrados, como Cecília Meireles. Márcia também ressalta a importância do projeto, que serve para aguçar a vontade de ler nas pessoas, além de divulgar novos escritores brasileiros. “Os textos estão ali de graça, então a pessoa deve aproveitar e ler. Lá você encontra desde Márcia Araújo a Machado de Assis”, brinca a autora.
Projeto teve o primeiro teste em linhas de ônibus O Projeto Leitura para Todos, idealizado pela professora Maria Antonieta Pereira, com o apoio da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (FALE-UFMG), teve seu primeiro teste nas linhas de ônibus, com a fixação de diversos textos sobre os mais variados assuntos e, em seguida, nos metrôs da capital. Entretanto, devido às diferenças desses transportes, o projeto foi implantado visando às características específicas de cada um. Segundo Maria Antonieta, as
diferenças se iniciam já na quantidade de textos afixados em cada um desses meios de transporte. “São 18 lâminas em cada ônibus. Elas são colocadas antes e depois da catraca, banco sim, banco não”, diz. Já nos metrôs, Heloísa Doche, que coordena esses projetos nesse transporte, afirma que a quantidade varia entre sete e oito lâminas. Entretanto, a principal diferença entre esses meios de locomoção é na questão da depredação das lâminas. De acordo com ambas as coorde-
nadoras, há muito vandalismo, mas ele é mais notado nos ônibus. “O nível de vandalismo no metrô é menor. Nos ônibus as pessoas arrancam, amassam, rasgam. O povo do metrô é muito mais organizado e rígido, então é mais fácil a conservação. Além disso, no metrô as lâminas são mais resistentes e são fixadas de modo que todos que estão ali dentro conseguem vê-la, o que inibe a ação desses vândalos”, comenta Maria Antonieta. Uma outra diferença é o patrocínio que esses projetos
recebem. Nos ônibus, como afirma Maria Antonieta, as empresas de transporte não dão nenhum incentivo. “Não temos financiamento do governo, só da BHTrans. Nem as empresas de ônibus se interessam. No metrô, a própria Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) é responsável pelo patrocínio”, salienta. Esse patrocínio diferenciado acaba gerando diferenças nas qualidades das lâminas. “Há diferenças nas lâminas dos metrôs em relação aos ônibus. Quando fomos procurados pela
FALE quisemos investir em uma coisa mais moderna, até pelo visual moderno que o metrô já tem”, explica Heloísa. Como forma de incrementar ainda mais o projeto, as coordenadoras afirmam estar elaborando campanhas de conscientização da população usuária de ambos os transportes. “Esse é um projeto que requer muito dinheiro para funcionar. Então estamos começando, nesse semestre, uma campanha nos ônibus e metrôs, com a ajuda de nossos monitores, para explicar o
projeto e pedindo para que não destruam as lâminas”, comenta Maria Antonieta. Como projetos específicos para o metrô, Heloísa Doche ressalta a idéia de se instalar câmeras dentro dos carros para ajudar a evitar vandalismo e alguma forma de tornar as lâminas ainda mais atrativas. “Também queremos incrementar as lâminas colocando, a partir do ano que vem, quadrinhos e charges. Coisas mais divertidas e que incentivem outros artistas que também estão começando”, conta.
CÍNTIA REZENDE
Poemas que aliviam o estresse e fazem o pensamento viajar n ALINE SCARPONI, 3º PERÍODO
Quando José de Fátima Guedes sai de casa, o dia mal começou. O porteiro que mora no bairro Santa Mônica e utiliza o ônibus da linha 1207C para se deslocar, afirma precisar sair até uma hora mais cedo de casa, para conseguir chegar ao prédio comercial em que trabalha, sem se atrasar. Um percurso, segundo ele, muitas vezes estressante e improdutivo. Essa situação mudou em função do projeto Leitura para Todos. O que antes era para José somente um percurso tenso e barulhento, virou uma oportunidade para ter contato com a literatura brasileira e se distrair. “Tenho até a 8ª série e já li muitos
livros na época de escola, mas depois que a gente cresce, tem família e começa a trabalhar, muita coisa muda. Agora, assim que eu entro no ônibus, escolho um poema que ainda não tenha lido e viajo duas vezes, no ônibus e no pensamento” afirma o porteiro. Segundo Rodrigo Magalhães, assessor de Marketing da BHTrans, apoiar essa iniciativa é muito interessante para a instituição devido à característica de incentivo a cultura que o projeto demonstra. “A BHTrans procura proporcionar aos usuários uma viagem agradável. Isso envolve lotação, limpeza dos ônibus e enriquecimento cultural”, comenta o assessor. Além disso, Rodrigo afirma que nos casos de engarrafamento as lâminas de literatura são
ainda mais úteis. “Com o aumento atual do tempo gasto nas trajetórias em Belo Horizonte, o passageiro do transporte coletivo, se ocupado em alguma atividade, acaba se distraindo e ficando menos irritado com os engarrafamentos”, diz. A escolha das linhas que irão participar do projeto é realizada seguindo critérios definidos pela BHTrans. “Escolhemos linhas geograficamente dispersas, para não abranger apenas uma única região. Mesclamos linhas de periferia e centrais”, explica Rodrigo Magalhães. Atualmente existem 24 linhas de ônibus, somando um total de 280 veículos que já participam desse projeto. De acordo com a professora da UFMG, Maria Antonieta Pereira, a meta é
abranger toda a frota de ônibus da Região Metropolitana e ir expandindo gradativamente para todo o Estado de Minas Gerais. “Já existem projetos-piloto em outras cidades como Diamantina, Contagem e São João Del Rei, mas o projeto só vingou mesmo em BH e São João Del Rei, onde leva o nome de Leitura Itinerante”, esclarece Antonieta. A manutenção das lâminas de literatura é realizada por 11 monitores, alunos da UFMG, que contratados pela BHTrans, visitam os ônibus e repõem as lâminas danificadas. “Vinte por cento das lâminas necessitam ser trocadas a cada 3 meses”, afirma o assessor de Marketing. Os motivos mais comuns das danificações são apontados por
Usuários da linha 1207C tem a oportunidade de leitura de poemas no ônibus Rodrigo como sendo resultado da limpeza interna e externa, realizada através de fortes jatos de água, a que são submetidos os ônibus nas garagens e a depredação por parte dos usuários. A estudante e usuária de ônibus da linha 3302A, já inserida no projeto, Fernanda
Aparecida, 16 anos, diz apreciar tanto poesia que acabou por levar para si uma das lâminas. “Tinha uma poesia que falava de amor e de dúvidas que a gente sente. Não resisti e levei para colocar no quadro de fotos e avisos que tenho no meu quarto”, revela a menina, sorrindo.
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GUSTAVO ANDRADE
DIFICULDADES EM FAZER MODA Apesar dos obstáculos, grifes vão em busca de conquistas na cidade de Belo Horizonte n LÍVIA ALEN, SÍLVIA ESPESCHIT, 2º PERÍODO
Ronaldo Fraga, Victor Dzenk, Renato Loureiro, Tereza Santos, Elvira Matilde, Apartamento 03. Grifes como essas são fortes representantes da moda mineira no cenário nacional. Mas, para se manter na vanguarda no setor, as empresas são obrigadas a superar diversos problemas. O estilista Luiz Cláudio Silva, da Apartamento 03, considera a indústria mineira defasada em relação à matéria-prima e maquinário. Segundo ele, alguns recursos utilizados para facilitar a produção em série não são encontrados em Belo Horizonte, sendo necessária a terceirização em outros estados. "Uma máquina de bordar avançada é muito cara. Trazer isso demanda uma grana. Acaba então que concentra isso em São Paulo, onde a mão-de-obra é mais barata", explica. A designer Gabriela Demarco, proprietária da
grife Elvira Matilde, compartilha da opinião de Luiz Cláudio. "Tem crise, tem poucas estamparias, lavanderia é um problema", revela se referindo a lavagens especiais, utilizadas para dar efeitos diferenciados nos jeans produzidos pela marca. "A gente manda lavar a roupa, o jeans, no Espírito Santo", conta a publicitária Emília Giuzio Pádua, filha de Gabriela. Gabriela Demarco e Luiz Cláudio Silva também apontam a dificuldade de se encontrar mão-de-obra, especificamente costureiras. "Está com crise de mãode-obra especializada", diz Gabriela. O estilista explica que "a moçada nova não quer saber disso", completando que "é desvalorizada, a profissão". Ele também conta que trabalha com pessoas de meia idade, como Rosa Maria José Fernandes de 58 anos e que costureiros na faixa dos 30 anos, como Viviane Cristina Almeida, 33, são raros. DESCOBERTA Dona Rosa
trabalha na grife Maracujá, para a qual Luiz Cláudio desenha, ela aprendeu o ofício na "roça", no município de João Pinheiro, há mais de 30 anos com a sogra. Nessa época, ela não usava moldes de papel, como faz hoje, mas as roupas é que serviam de molde. Costurava para ajudar no sustento da família, "O jeito que tinha para ajudar meu esposo a manter a obrigação da casa era minha costura", relembra. Ao se mudar para a capital, em 1981, foi ser empregada doméstica, mas fazia costura para os outros em sua casa. Por sugestão de uma vizinha, que percebeu seu talento, procurou uma confecção para ter a carteira assinada. Assim, se tornou costureira profissional. "Eu sustento minha casa com meu trabalho", ressalta. Viviane Cristina Almeida, 33 anos, também começou a costurar jovem, aos 16, quando fez um curso para costurar calça jeans no Espro, entidade que ministra cursos a menores aprendizes. Ini-
O estilista Luiz Cláudio Silva aponta a dificuldade para se encontrar mão-de-obra para a indústria de moda mineira cialmente, ela não tinha vontade de fazer, mas gostou "tanto que quis aprender mais ainda", diz. Especialista em roupas de festa ela conta que é apaixonada pelo que faz. "É a paixão da minha vida. As meninas que estão vindo não querem saber de costura", afirma Viviane. "Elas não sabem o que estão perdendo", acrescenta. Predominantemente de estrutura familiar, de acordo
com professor da Pós-graduação em Design de Moda da FumecBH, José Coelho de Andrade Albino, as grifes mineiras passam por dificuldades no processo produtivo, devido à precariedade no gerenciamento. "Existem mais de 400 cursos de design de moda. O que falta é curso de gestão de moda", diz ele, completando que também há deficiência no jornalismo de moda brasileiro, que, para ele ,hoje é apenas "mera descrição" de peças e coleções.
Segundo Albino, que também é professor de Comunicação Social da PUC Minas, o ideal seria que houvesse um administrador nas grifes, e que este fosse tão criativo quanto o estilista. Assim, não se prejudicaria o processo inventivo, já que trabalhariam em sintonia. Entretanto, isso não ocorre na prática. "Na hora de ter concorrente, o fato de não ser profissionalizada quebra (a empresa)", afirma.
Caixinhas dos Correios alimentam hábitos antigos LORENA KAROLINE MARTINS
n LORENA KAROLINE MARTINS, 3º PERÍODO
“Bom, eu uso a caixa amarela porque compro selos a rodo para não precisar entrar em fila na agência. Se sua carta já tiver selada, você põe na caixa amarela”, revela a estudante Flávia Lages, moradora do Bairro Gameleira, na Região Oeste da Capital. Como ela, outros moradores de Belo Horizonte utilizam-se das 614 caixas de coleta instaladas em diversas áreas de Belo Horizonte, principalmente em frente às agências de correios ou em locais de grande fluxo de pessoas. Flávia revela que escreve em média quatro cartas por mês para seus amigos e utiliza a caixa de coleta localizada em um supermercado do seu bairro. “É uma coisa que funciona, é legal”, completa. Alexandre Luiz Couto, 20 anos, conta que com a instalação de uma caixa de coleta perto de uma loja em seu bairro o acesso a esse tipo de atendimento foi facilitado já que onde mora não existe uma agência dos correios. Morador do Bairro Tupi, Região Norte da capital, Alexandre garante que as caixas são práticas. “Os selos são comprados nas bancas de revistas e em lojinhas do bairro mesmo”, informa. Alexandre conta que sua mãe também utiliza as caixas e mesmo não deixando de lado o uso de correios eletrônicos, gosta de enviar cartas a parentes e amigos. “Uso sempre que tenho que enviar cartões de aniversários e Natal para amigos e parentes, ou qualquer documento que não precisa ser registado”, revela. O designer Daniel Palhares, 20 anos, morador do Bairro
Limite à carta social para manter foco
Daniel Palhares já usou as caixas de coleta mas prefere enviar cartas por meio de agência por achar mais seguro Sion, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, conta que já mandou cartas algumas vezes por meio das caixas de coleta mas que na maiorias das vezes a carta voltou para sua casa. “Eu nunca sei quanto custa o certo a carta simples então eu não sei a quantidade de selos é preciso colocar para cada lugar”, afirma. Em vez de usar a caixa de coleta, Daniel prefere utilizar uma agência dos Correios. “No meu caso tenho um correio aqui perto de casa e sempre vou no horário mais vazio, é mais prático”, acrescenta. INSTALAÇÃO Para a instalação de uma caixa de coleta é necessário que o local seja plano e que, preferencialmente, proporcione de alguma forma uma proteção contra fatores meteorológicos. E quando houver interesse por parte do responsável de
algum estabelecimento, a caixa de coleta poderá também ser instalada em espaços comerciais. É o caso do conjunto de lojas localizado à Rua Dom José Gaspar, no Bairro Coração Eucarístico, Região Noroeste de Belo Horizonte. O antigo proprietário da gráfica DrawMinas, Luiz Alberto Ferreira, 54 anos, conta que a caixa foi instalada devido ao grande fluxo de pessoas, uma vez que, junto à gráfica, existem outras lojas, dentre elas, papelaria e lanchonete e também um banco. Dono há três anos da lanchonete “Açaí Lanches”, Carlos Hebert comenta que não vê muitas pessoas utilizando a caixa de coleta. “Acho que a pessoa não vê, a caixa fica meio escondida”, acredita. Carlos declara que não a utiliza porque não precisa do serviço, embora o tenha
disponível. “Tem dias que dá até dó do carteiro, ele abre a caixa para recolher as cartas e não tem nada, só teia de aranha”, brinca. FLUXO Embora ainda sejam utilizadas para o envio de cartas simples, as caixas de coletas são mais freqüentes em épocas festivas como a Páscoa e o Natal, onde os Correios elaboram os aerogramas com temas relacionados a essas datas, custando R$1,50 cada. “Nessas épocas, cerca de 50 cartas são recolhidas diariamente”, afirma Helder Lúcio da Silva Soares, funcionário dos Correios há quatro anos, e há dois da Agência localizada à Rua Pernambuco, na Região da Savassi. Para as cartas simples, Helder explica que os selos podem ser comprados nas Agências dos Correios pelo preço de R$0,65
As famosas cartas cujo selo custava apenas um centavo ainda existem. Mas, a venda dos selos sociais não é mais permitida. Antes podia-se adquirir esse tipo de selos em qualquer agência, colar no envelope com o endereçamento feito de forma manuscrita e depositar em qualquer caixa de coleta. Hoje, para se remeter a carta social não se pode utilizar mais a caixa de coleta e os selos são adquiridos no ato do envio. “As pessoas não respeitavam, haviam empresas que usavam o selo social e assim estava saindo fora do foco”, conta o funcionário dos Correios, Helder Lúcio da Silva Soares. Segundo ele, em princípio a idéia era incentivar a troca de cartas com limite máximo de peso até 10 gramas, entre pessoas físicas (remetente e destinatário) e facilitar o acesso aos serviços postais às camadas
para cartas de zero a 20 gramas. E, para quem acredita que as cartas enviadas por meio das caixas de coleta demoram mais, o funcionário garante que o tempo é o mesmo para quem enfrenta fila nas agências. “As cartas são recolhidas diariamente às cinco horas da tarde e aquelas enviadas depois das cinco serão entregues só no outro dia”, informa.
menos favorecidas da população. Além disso, a proibição também se dá ao fato de que a postagem máxima é de cinco cartas por pessoa, e com a compra dos selos sociais, pessoas colocavam mais do que o número permitido dentro das caixas de coleta, diariamente. MAIS UTILIZADA De acordo com uma pesquisa feita pela Assessoria de Comunicação dos Correios (Ascom), a caixa de coleta com o maior número de cartas recolhidas em Belo Horizonte, neste ano, é a situada em frente à agência central, localiza na Avenida Afonso Pena, no mesmo quarteirão da Prefeitura, com média diária de 30 objetos postais. O resultado é devido ao grande número de pessoas que transitam diariamente no centro da cidade e utilizam a agência.
Helder acredita que as caixas de coleta vieram para facilitar a vida da pessoa e que hoje, o fluxo de usuários das caixas diminuiu devido principalmente à internet. “A carta tem a emoção, o cheiro, a letra. São infinitos sentimentos que a mensagem de celular ou o e-mail não dão conta de transmitir”, expressa.
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MINISTÉRIO AMPLIA SEDE NA CAPITAL Ministério do Trabalho e Emprego ganha posse do prédio ao lado, onde funciona a Faculdade de Ciências Econômicas, para melhorar o atendimento. A reforma começa em fevereiro GUSTAVO ANDRADE
n CAMILA LAM, GUSTAVO ANDRADE, 4º E 6º PERÍODO
Escadas estreitas, pessoas esperando e corredores tumultuados. Glaydson Nunes, 15 anos, foi pela primeira vez ao Ministério do Trabalho e Emprego, no Centro de Belo Horizonte, para tirar sua carteira de trabalho. Estudante do primeiro ano do ensino médio, ele teve de ir duas vezes ao local para conseguir o protocolo que garantia a emissão do documento. Na primeira vez, Glaydson chegou às 14h, mas as senhas já haviam se esgotado desde as 10h. Na segunda tentativa, o estudante esperou durante três horas para pegar o protocolo. “Demorou muito. Cheguei tarde em casa e tive que ir pra escola sem almoçar, senão iria perder prova”, comenta. Com o protocolo ele pôde buscar sua carteira dentro do prazo prometido, três dias. “A estrutura aqui da sede é de 1950, o mercado de trabalho há 50 anos era uma realidade bem diferente da de hoje, mas esse prédio aqui do lado, da FACE (Faculdade de Ciências Econômicas), já é nosso, nós obtivemos posse dele”, explica o superintendente Alysson Paixão de Oliveira Alves, da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais (SRTEMG). Ele revela que a reforma do imóvel
começará em fevereiro.
EVOLUÇÃO Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de Belo Horizonte em 1950 era de 352.724 habitantes em 2007 eram 2.412.937 habitantes. Esse crescimento não foi acompanhado pela estrutura do ministério na cidade. Alves afirma que a agência do Barreiro dá suporte à sede, mas não alivia a demanda, pois devido à sua localização a agência recebe pessoas daquela região. Ele ainda diz que o espaço físico do Ministério do Trabalho em Belo Horizonte não mudou desde sua inauguração. Segundo o superintendente, são emitidos aproximadamente 8 mil carteiras de trabalho por mês e essa demanda está ligada ao aumento da criação de novos postos de trabalho em Minas Gerais. De acordo com a última pesquisa mensal do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), foram gerados em Belo Horizonte 58.958 postos de emprego, e em Minas Gerais foram 252.705 novos postos de trabalho, número que representa um crescimento de 8,11%. “Com a mudança, além do aumento diário, terá mais conforto para o cidadão, trabalhador. Hoje, a fila é em pé, nas escadas. Lá vamos ter uma agência
com senha digital e cadeirinha para esperar”, afirma Alves. Apesar de as obras estarem previstas para começarem em fevereiro do ano que vem, o superintendente espera resolver o problema do atendimento nos setores da carteira de trabalho, seguro de desemprego e homologação, pois são os setores que lidam com o maior número de pessoas por dia. Esses serviços funcionam em espaço físico limitado e conseqüentemente os funcionários não conseguem atender bem o público. “Chegam muitas pessoas extremamente nervosas. Mas o desgaste aqui do pessoal (funcionários) também é muito grande”, relata Jane Azevedo Souza, chefe do Setor de Identificação e Registro Profissional.
ROTINA No setor de emissão de carteira de trabalho o atendimento começa às 7h pela triagem, processo que consiste em verificar os documentos das pessoas que estão na fila. A triagem é importante para que aqueles que não estão com todos os documentos necessários não precisem esperar inutilmente. Ao todo são 18 funcionários que atendem de 8h às 17h, revezando-se no horário do almoço para que o atendimento seja ininterrupto. “São entregues de 350 a 400 senhas por dia”, resume Jane. Por hora, há uma média de 75
Por dia, cerca de 400 senhas são distribuídas no ministério para aqueles que desejam tirar a carteira de trabalho a 100 senhas distribuídas e o atendimento não pára. Segundo Jane, não existe um padrão para a distribuição das senhas, pois enquanto tem dia que as senhas duram até de 15h, tem dia que elas acabam na parte da manhã e só podem ser distribuídas novamente após todas as pessoas serem atendidas. “Chega início de novembro, até fevereiro é essa inconstância, por causa do trabalho temporário”, revela Jane.
ESPERA A história da estudante de fisioterapia Ana Luiza Moreira Pauferro foi diferente da de Glaydson. Para tirar a carteira pela primeira vez foi tranqüilo. “Não fui
atendida de imediato, mas o tempo de espera não foi muito”, diz ela. A estudante precisava do documento para ser contratada para um trabalho no período de férias da faculdade e, após três dias, buscou a carteira de trabalho. A sala de espera comporta aproximadamente 75 pessoas, por isso as senhas são limitadas, assim é comum ver pessoas esperando no corredor e nas escadas. “O espaço físico é muito restrito. Um dos problemas é que vêm muitos jovens, com isso vem o pai, a mãe ou avó. Aí fica tudo tumultuado, tem pai que quer entrar com o filho porque ele é menor de idade, mas mesmo sendo menor, ele
pode tirar carteira”, explica Jane. Na porta da sala de espera há um aviso quanto à proibição da entrada de acompanhantes para evitar ter esse tipo de problema, mas que acarreta em outro, acompanhantes esperando do lado de fora. Uma das supervisoras do Setor de Identificação e Registro Profissional da SRTEMG, Marcilene Gonçalves do Valle, concorda que a mudança trará benefícios no atendimento. “O prédio da FACE permitirá um amparo melhor para as pessoas e até para o nosso trabalho. O novo prédio vai revigorar o ministério”, constata ela.
Livro ensina educação constitucional a cidadãos GUSTAVO ANDRADE
n THAÍS MOTA, 4º PERÍODO
A Constituição Federal Brasileira é referência mundial e é exemplo para outros países, mas é desconhecida pelo seu povo. Em outubro deste ano ela completou 20 anos e o advogado, psicólogo e escritor Rodrigo Costa Vidal resolveu escrever o livro "Educação Constitucional, Cidadania e Estado Democrático de Direito", que foi lançado no último mês de novembro. O objetivo maior do seu livro é denunciar que após 20 anos de Constituição o povo brasileiro ainda a desconhece. Segundo Rodrigo Vidal, a nossa constituição é "riquíssima" em direitos e também em deveres, mas as pessoas não conhecem o direito que têm. "Então, é como se ele não existisse", observa. O autor propõe ainda o exercício da Educação Constitucional que tem objetivo básico dar educação e informação sobre os direitos e deveres de cada um e sobre a for-
O advogado Rodrigo Vidal é o autor do livro que objetiva denunciar o desconhecimento da população sobre a constituição mação do Estado, para o exercício pleno da cidadania. "A proposta é levar a constituição para o povo, para que ele se torne verdadeiramente cidadão",
afirma o autor. CIDADANIA A idéia é fazer com que o brasileiro se torne cidadão através de uma educação reflexiva e
crítica. E essa idéia está na base da própria Constituição, pois, segundo o artigo 64, todos têm direito de receber do governo um exemplar da Cons-
tituição, e isso não está sendo cumprido. "O próprio Estado não cumpre com o que a Constituição está mandando e nunca vai cumprir se o povo não cobrar. Os políticos só obedecem à cobrança do povo", afirma Rodrigo Vidal. Sua proposta é implementar em todos os níveis do ensino brasileiro, ou seja, nos ensinos fundamental, médio e superior, um estudo da Constituição Federal, para que os cidadãos tenham realmente consciência dos seus direitos e dos seus deveres, saibam como funciona o Estado brasileiro. "O objetivo é tornar o cidadão consciente de seus direitos, consciente de como que o estado funciona e consciente também assim de que o Estado lhe pertence", afirma Rodrigo Vidal. Ele diz ainda que a educação constitucional pode contribuir, e muito, para o exercício da democracia. Conhecendo a constituição, o cidadão poderá fiscalizar melhor para onde vai o dinheiro
que paga em tributos ao governo, como está sendo gasto o orçamento anual de sua cidade e cobrar as promessas dos governantes. Segundo ele é necessária mais participação dos cidadãos na fiscalização dos gastos do governo e aplicação das verbas públicas, afinal essas verbas não pertencem ao governo, mas ao povo brasileiro. Segundo Rodrigo, "a base da democracia é a educação constitucional, porque como é que você vai ser um cidadão participativo se você não conhece a constituição? Porque é na constituição que está a consciência política, a consciência dos nossos direitos e deveres, dos mecanismos de participação do povo no poder", argumenta. A educação constitucional, segundo Rodrigo Vidal, é um dever primeiro do Estado, mas é essencial a colaboração da sociedade civil, das empresas, das instituições de ensino, das instituições religiosas e dos meios de comunicação, divulgando a constituição e a cidadania.
8 Cidade • Justiça
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Dezembro • 2008
DONAS DE CASA PRODUZEM ECOBAGS Oficina de sacolas reutilizáveis, apelidadas de “Vai-e-Vem”no movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais, busca passar adiante preocupação com meio ambiente n CÍNTIA REZENDE, LAURA SANDERS, 7º E 4º PERÍODOS
Há 25 anos associada ao Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais (MDC-MG), Francisca Heleni Franco, 68 anos, recebeu há cinco meses um convite da presidente do movimento, Lúcia Pacífico, para freqüentar a oficina de sacolas de pano reutilizáveis, também conhecidas como ecobags. Francisca conta que a preocupação com a questão do lixo sempre esteve presente em sua casa, já que tem uma filha que é bióloga. Agora ela está repassando essa consciência para todos da sua família. “A preocupação de todos lá em casa é grande. Eu só vou para o sacolão com a minha sacola.”, relata. Animada com a iniciativa, a aposentada conta que conseguiu mudar os hábitos de sua casa e hoje reduziu o uso de sacolas plásticas. Além da proposta de conscientização, Francisca encontrou nas oficinas um espaço para fazer novas amizades e se distrair. “Nesta idade a gente fica muito sozinha, por isso a oficina é muito importante”, acredita. Todas as sextas-feiras, dez mulheres se reúnem na sede do MDC-MG para confeccionar as sacolas, que ganharam o apelido de “Vai-e-Vem, o cuidado de preservar”. A presidente do Movimento conta que a idéia da oficina surgiu a partir de um seminário que assistiu do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, o Inmetro, onde foram discutidas questões sobre o plástico no meio ambiente. “Essa tomada de consciência quanto ao uso das sacolas é o que vai nos levar a um meio ambiente melhor”, afirma Lúcia. Além do aumento do volume de lixo, Lúcia aponta outros problemas da utilização da sacola plástica no dia-a-dia. Ela conta que chegou a escutar na palestra que atualmente estaríamos vivendo na chamada “era do plástico”, porém ela vê muitos
problemas na sua utilização tais como acidentes envolvendo crianças, entupimento de bueiros, pouca resistência das sacolas, além do tempo maior que o material leva para degradar. ALTERNATIVA “Há muito tempo eu ouço a Lúcia falando da sacola de plástico, que a gente devia fazer alguma coisa para conter isso”, conta a sócia fundadora do movimento, Maria Aparecida Corrêa de Carvalho. Ela conta que sempre mexeu com artesanato de forma geral e agora está ajudando na confecção das sacolas. Maria Aparecida diz que tem uma ecobag e usa, mas na sua casa não é ela que faz as compras, e por isso muitas vezes a utilização das sacolas plásticas passa despercebida. Ela argumenta que sua família já está muito acostumada com esse sistema e que também não acha justo pagar pelas sacolas do supermercado e não levá-las para casa. Quem também se mostrou preocupada com o volume de sacola plástica em circulação foi a também participante das oficina
de ecobags Cassilda Maria Almeida, aposentada. Ela conta que além de pouco resistentes as sacolas plásticas também trazem outros problemas no dia-dia como o entupimento de bueiros e até o fato de o cachorro rasgálas e espalhar o lixo pela rua. Com quase 20 sacolas produzidas, ela conta que só utiliza a sacola Vai-e-Vem para fazer suas compras e que acredita que esta é a melhor saída para redução de plástico no meio ambiente. “As pessoas acham que é prático mas não é. A sacola de plástico aumenta o volume de lixo no meio ambiente”, acrescenta. PRÁTICA Afinidade com o corte e com a costura não é problema para a aposentada Maria José Viana. Maria conta que desde muito cedo trabalhou como costureira e assim como fazia há anos, hoje ela também aproveita retalhos para decorar suas peças. Pouco a pouco ela mostra os pequenos pedaços de pano virando fuxicos, que posteriormente serão colocados por outra pessoa nas bolsas. Para a aposentada, a importância do trabalho
que realiza tem reflexo primeiro na sua vida e depois no meio ambiente. “Eu acho este trabalho muito importante. O dia que eu venho para a oficina é o dia mais feliz da minha vida”, conta. Mesmo sem saber costurar, Vera Lúcia Chaves participa da criação das bolsas com idéias e aplicação de bordados. Ela explica que muitas das sacolas já vêm prontas e outras são produzidas na própria oficina. O material é doado pelas participantes ou pelo MDC-MG. Vera sempre gostou de trabalhar com reciclagem e acha muito importante a iniciativa. “Cada um está expondo suas idéias nas sacolas”, relata. Apesar de estar a menos de um mês participando das oficinas, Neuza Diniz conta que está gostando muito do trabalho que realiza. A preocupação dela com o grande volume de utilização de sacolas plásticas também é grande e já reflete nos seus hábitos em casa. “Eu preocupo demais. Eu estou usando menos sacola de plástico”, relata. O objetivo final da oficina é que as mulheres possam vender
GUSTAVO ANDRADE
Participantes das oficinas de ecobags do Movimento das Donas de Casa preocupam-se com a questão ambiental
seus trabalhos e passar adiante a questão da preservação ambiental. Para isso, o movimento está organizando uma feira, a ser realizada ainda no mês de dezembro, na porta do supermercado Extra do Bairro Santa Efigênia, onde as donas de casa irão abordar as pessoas na rua e incentivar o uso das sacolas. Além da abordagem, as mulheres também terão a participação de um coral que se apresentará no local como forma de chamar mais atenção das pessoas que passarem por lá. Lúcia conta que cada
sacola Vai-e-Vem será vendida por um preço que varia entre de R$5 a R$15. A renda será revertida para compra de material e para o movimento. Apesar de a feira encerrar um ciclo de produção, Lúcia Pacífico diz que a iniciativa terá continuidade e que as oficinas ainda acontecerão por muito tempo. Ela ressalta que o projeto é aberto a todos. “A oficina vai continuar. Elas colocaram essa atividade na rotina de vida delas”, acrescenta.
Transformar objetos que iriam para o lixo Passar a questão da consciência ambiental adiante, seja em casa, na rua e também no seu ciclo de amizade se tornou uma meta fixa para as mulheres do Movimento das Donas de Casa e Consumidores. A idéia que começou com a oficina de ecobags agora ganha espaço em outras atividades dentro do movimento e nem o amigo oculto escapou da onda de reutilização. Lúcia conta que a mudança de hábito das mulheres tem sido tão positiva que elas pretendem fazer um amigo oculto com objetos que antes iriam para o lixo tais como caixinha de leite, a lata de massa de tomate, dentre outros. Objetos que mas mãos das mulheres do movimento passam a se tornar embalagem de presente e enfeites. “Elas são agentes multiplicadores desta idéia de conscientização”, acredita Lúcia. Feliz, Maria José Viana mostra que também se sentiu tocada com a onda criativa da reutilização. Ela mostra que os retalhos de
feltros velhos que provavelmente iriam para o lixo agora se tornaram portas copos e pratos. Em formato de frutas, Maria José mostra às demais colegas o trabalho que ela, carinhosamente, deu o nome de “forrinho ecológico”. “Eu estava em casa e acabei criando estes forrinhos”, confessa com timidez ao ouvir os inúmeros elogios das companheiras. E se inovar é a moda, Francisca Heleni Franco também conta que já andou criando um kit com uma sacola e um pano de cabeça que ela agora distribui aos amigos e parentes. “Eu fiz um kit e dei para minha filha e para mais umas amigas”, conta. Ela conta que a iniciativa não ficou só na confecção de artigos ecologicamente corretos mas que ela também vem repassando os ensinamentos adquiridos nas oficinas aos filhos e netos. “Estou ensinando meus filhos e netos a abrirem a cabeça para a questão ambiental”, ressalta.
Processos criminais são paralisados pelas vítimas n LUÍSA MELO, POLLYANNA DIAS, 1º PERÍODO
A análise feita por Eduardo Batitucci e Andreia Santos, respectivamente coordenador e pesquisadora do Núcleo de Estudo em Segurança Pública (NESP), da Fundação João Pinheiro, constatou que aproximadamente 90% dos 610 processos investigados no Juizado Especial Criminal de Belo Horizonte (Jecrim) terminaram com o desinteresse da vítima em dar prosseguimento ao caso. Os dados de 2006 destacaram que embora haja assistência o que sobressai é a burocracia, fenômeno que intitula o trabalho como "Fábrica de Carimbos". Para a socióloga Andreia Santos, o motivo para o alto índice de desistência é o desconhecimento do cidadão em relação à Justiça Especial Criminal e o reconhecimento de que a polícia é a responsável imediata para apaziguar os conflitos. "A pessoa faz uma
denúncia, gera um boletim de ocorrência (BO) e, quando chega à frente do juiz, o motivo daquele conflito social perde o sentido. Quando as pessoas chegam a reclamar, elas querem reclamar para a polícia", afirma Andreia Santos. Segundo a socióloga, a intimidação ao atrelar o nome a um processo judicial, mesmo sem o peso dos processos convencionais de justiça, faz com que a vítima tente apaziguar, esquecer ou resolver em outra circunstância o seu problema. A pesquisadora aponta que essa justiça ainda é fraca. "Apesar de ter um volume absurdo, com 17 mil processos ao ano, o Jecrim está trabalhando mais burocraticamente do que dando assistência às pessoas", comenta. Andreia dos Santos disse ainda que normalmente, quando a reconciliação se efetiva, o juizado consegue reparar o conflito. "A reincidência é pequena", ressalta. A juíza Regina Célia Silva Neves do Jecrim de Belo Horizonte, disse, em outubro, que seis juízes para cerca de 45
mil processos são distribuídos em três secretarias para efetivar a justiça. Somado aos juízes, os promotores, os conciliadores e defensores públicos auxiliam as conciliações e audiências. De acordo com Rogério Eustáquio de Jesus, coordenador do setor de conciliação do Jecrim, são feitas audiências simultâneas. "Temos 8 audiências a cada meia hora. Aproximadamente 130 audiências por dia", comenta. Diante do grande número de processos, o coordenador da conciliação pondera que tenta dar tratamento melhorado às pessoas, embora não possa ser individualizado. "Aqui deixamos as pessoas se manifestarem. O juiz e o promotor vão às salas para orientar. Tentamos encontrar soluções em 30 minutos. Não podemos frustrar o outro que está aguardando audiência. Se preciso, interrompemos e remetemos ao setor psico-social. Lá terá atendimento individualizado e visita domiciliar, caso necessite", acrescenta. Andreia considera que a decepção é muito mais cultural
e social do que com o andamento da justiça. "Estar à frente da autoridade ainda é culturalmente caro para o brasileiro. Temos medo da polícia, da justiça e de como as coisas são feitas. E a justiça não é tão cega", lembra a socióloga ao explicar os resultados do trabalho acadêmico apresentado em junho de 2008, na 26ª Reunião Brasileira de Antropologia: Desigualdade na Diversidade, na cidade de Porto Seguro, Bahia. ATRIBUIÇÃO O Juizado Especial Criminal, o Jecrim, inaugurado em 1995, foi criado para tratar exclusivamente das infrações penais consideradas de menor gravidade - como, por exemplo, crimes de desordem pública, problemas de vizinhança e perturbação sonora. No Jecrim, crimes e contravenções com penalidades inferiores a dois anos, sem possibilidade de o acusado ser encarcerado, são solucionados por meio de audiências para conciliação dos envolvidos. Para tal, os danos sofridos pela vítima
devem ser reparados e as penalidades alternativas cumpridas. O Juizado Especial Criminal ampliou o acesso à justiça com os processos gratuitos e encaminhados sem alcançar longos prazos. Mas críticas sobre desentendimento e descompromisso são relatados por vítimas e denunciados. Segundo o cobrador de ônibus de 39 anos, Rogério da Costa Vieira, o problema dele está sendo mal interpretado pelos conciliadores. "Tive a impressão que o conciliador queria que eu desistisse. Senti que ele estava desprezando o que havia acontecido comigo". Incrédulo, enquanto aguardava no Jecrim sua segunda reunião de conciliação, Rogério, que denunciou a agressão física que sofreu durante o trabalho de uma usuária do transporte público, destacou uma das frases fixadas na parede do Jecrim que diz: "Não existe causa maior ou menor". O cobrador salientou a possibilidade de desistir da continuidade do processo. "Penso em desistir. Eu fui vítima. No relato diz que
nós dois nos agredimos, o que não é a verdade. A base disso tudo está errada. Eu me defendi, isso não é retornar a agressão", disse. Regina Célia Silva Neves, juíza do Jecrim, falou que desistências em continuar o processo são possíveis porque, na maioria dos casos, dependem do interesse da vítima. "Muitas vítimas acabam por desistir da justiça por ter conseguido a pacificação social ou por não terem interesse em retornar aqui. Mas na maioria das vezes essa desistência vêm por meio da conciliação, feita no próprio setor", disse a juíza do Jecrim. O coordenador do setor de conciliação, Rogério Eustáquio de Jesus, explica que o registro de desistência é feito durante o período de observação para saber se a conciliação se efetivou. "Quando estabelecida uma solução, por cautela, o juiz aguarda o processo em aberto por seis meses. Se neste período a vítima não vier reclamar, entendemos que a pacificação social ocorreu. Então, não é uma desistência", explicou.
Cidadania Dezembro • 2008
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SONHO REALIZADO COM DIFICULDADE Em buca da casa própria, 5 mil famílias se uniram para construírem o Bairro Metropolitano há 12 anos que ainda têm problemas como a falta de asfalto, rede de esgoto, acúmulo de lixo e mato n AHIMSA NOVAES, CAMILA ALVARENGA, ORLANDO JÚNIOR,
Barreiras durante o caminho do projeto
7º PERÍODO - TEXTOS E FOTOS
No caminho para o Bairro Metropolitano, Ana Maria de Menezes Campos, 50 anos, e Maria Lúcia Alves dos Santos, 65, lembravam com nostalgia do tempo em que este lugar, em Ribeirão das Neves, era apenas a Fazenda Castro, e elas iam com o padre Luigi Bernareggi, mais conhecido como padre Piggy, junto com integrantes do Movimento dos Sem-Casa para o local todos os finais de semana e feriados. O movimento, formado por aproximadamente 5 mil famílias, partia de ônibus de vários bairros de Belo Horizonte em busca da realização de um sonho, a construção da casa própria. Na mata fechada da fazenda, debaixo de chuva ou de sol forte, os Sem-Casa abriam ruas com a força dos braços, na foice e no facão, sempre com o incentivo de padre Piggy aos berros chamando-os de molengas e preguiçosos. “Era muita empolgação, tínhamos esperança, saíamos de casa com marmita, água e café para ficar o final de semana todo trabalhando na fazenda, quem tinha mais condições, levava comida para quem não tinha, existia também, solidariedade”, relembra Maria Lúcia, que há dois anos não ia ao bairro que ajudou a levantar com as próprias mãos. Ana Maria, que também participava do movimento, conta que o grupo era bem organizado. “Na hora de entrar no ônibus reunia todo mundo na frente da Igreja da Glória, no Bairro 1º de maio. O coordenador tinha uma lista com o nome de todos os associados, a chamada era feita na hora da saída e na hora da chegada”, explica. Os ônibus eram conseguidos com a ajuda de políticos e empresários ou por meio da contribuição dos próprios integrantes do movimento. Ainda durante o percurso de 40 minutos, de Belo Horizonte até o Metropolitano, Ana e Maria contavam histórias sobre o surgimento desse bairro. Muitas pessoas do movimento morreram antes de conseguir um lote, outras acamparam em lonas no meio do mato, para garantir a posse e outras desistiram. Ana e Lúcia fazem parte do grupo de pessoas que, por
Bairro Metropolitano é a moradia de 5 mil famílias desde 1997 e foi feito pelos próprios moradores da comunidade questões diversas, não moram no bairro que ajudaram a levantar. Ana Maria começou a construir uma casa no local, mas precisou vendê-la e hoje mora nos fundos da casa de sua sogra. Maria Lúcia já possuía casa própria antes de entrar para o movimento, entretanto participou do empreendimento porque fazia parte da paróquia do padre Piggy, no Bairro 1º de maio, além de simpatizar com a causa. As duas retornavam ao local para rever os antigos amigos do movimento após passarem muito tempo sem vê-los. As impressões que ficaram, diante de um bairro sem calçamento, tratamento de esgoto, com lixo pelas ruas e muito mato, foram de um grande projeto que poderia ter dado certo, mas por várias interferências e descasos do poder público, o Metropolitano de hoje se diferencia bastante daquilo que foi projetado e sonhado pelas pessoas do Movimento dos Sem-Casa. DIFICULDADES Mais de dez anos se passaram, desde 1996, quando foi feita a compra da Fazenda Castro. De acordo com a Associação de Moradores, da qual Vanda Lúcia Aguiar já fez parte, hoje 23 mil pessoas moram no local. “Apesar das dificuldades, não posso dizer que não valeu a pena. Para muita gente que não tinha onde morar,
o Metropolitano foi uma bênção, deu casa própria para eles”, conta Vanda, que chegou em Belo Horizonte aos 12 anos. Há seis, conseguiu finalmente se mudar para o lote que comprou na fazenda. A moradora se referiu a problemas que ainda não foram solucionados. Basta uma caminhada pelo Metropolitano para constatar muitos buracos nas ruas, pequenas valas que saem das casas levando o esgoto sem destino certo, a terra solta na estrada, levantando poeira. “É direto gente doente, é muita poeira, para limpar todo dia”, comenta Sônia Bebiano, outra moradora do bairro. Como ela mesma se orgulha de dizer, foi a primeira moradora do Metropolitano. “Quando embargaram em 1997, eu já estava debaixo da lona”, relata. “Mas, o pior é nos tempos de chuva, a terra vira lama e é impossível chegar até as casas localizadas no alto do morro. A estrada é pura lama. Nos ônibus, todo mundo aparece com sacola de plástico no pé, tudo sujo de barro”, reclama Vanda Lúcia. Apesar dos caminhões de lixo que passam pelas ruas e avenidas todas as segundas, quartas e sextas-feiras, muita sujeira é jogada pelos próprios moradores nas encostas dos morros e nas matas, que ainda dão um tom esverdeado para o bairro.
A questão de segurança é outra dificuldade. Atualmente, o bairro está incluído numa ronda policial, que patrulha também os bairros Veneza, Florença e São Genaro. A assessoria do 40º Batalhão de Ribeirão das Neves informou que há a possibilidade de um veículo fixo para fazer a Patrulha de Prevenção Ativa específica no Metropolitano. A falta de médicos no posto de saúde também preocupa os moradores. “A minha maior tristeza com relação ao meu bairro é porque não temos médico aqui”, lamenta Sônia. Mesmo distante do bairro que ajudou a fundar, o padre Piggi ainda participa de ações no local, como da construção do teto da igreja que, até hoje, não foi finalizada. “Sempre que posso venho aqui ajudar, mas hoje, quem trabalha pelas conquistas do Metropolitano são outras pessoas”, esclarece o padre. Quando questionado sobre o porquê do bairro não ser o que eles desejaram no princípio, o senhor de 69 anos foi pragmático. “Mesmo com toda a polêmica e pressão do poder público que não nos queria lá e, não nos apoiou, quase metade dos associados ao movimento desistiu de lá por causa da distância do local da capital. Era muito complicado o deslocamento das famílias”, explica.
Motivadas por experiências que deram certo, como os Bairros Vila Califórnia e Felicidade, Ana Maria Campos, Maria Lúcia Santos e mais 20 mil pessoas se organizavam para procurar fazendas e escolher o melhor lugar para construírem. Como não teriam ajuda do governo, seria preciso comprar o terreno e o material para a construção. “Os governos eram muito diferentes. Na década de 80, o Felicidade recebeu a desapropriação do terreno do governo e dinheiro federal para aquisição do material, mas já com o governo FHC (Fernando Henrique Cardoso) foi diferente, não tivemos ajuda”, lamenta o padre Piggi. O destino foi a fazenda da Família Castro, em Ribeirão das Neves, Região Metropolitana de Belo Horizonte, espaço suficiente para alojar as cinco mil famílias. Organizada pelo padre Piggy, a cooperativa de moradores, que mais tarde se tornaria a Central Metropolitana dos SemCasa, realizava o cadastramento de seus participantes, verificando sua necessidade e condições de pagar o valor pela terra. Seria cobrado, durante um ano, o valor de R$ 30 mensais pela terra e, posteriormente, R$ 20 mensais para a compra dos materiais de construção. Levantar as casas era o próximo passo. Uma grande barreira encontrada por eles foram as condições impostas pela prefeitura municipal. Alegando poucas condições para alojar mais cinco mil famílias carentes em um município sem muitos recursos, os governantes de Ribeirão das Neves não aprovaram, logo no início,
a criação do que seria o Bairro Metropolitano. Além das casas, os integrantes teriam que construir espaços públicos, como escolas, postos de saúde e áreas de preservação ambiental. Para garantir que ocorresse dessa forma, a prefeitura exigiu parte da terra como garantia de que os moradores iriam investir em infra-estrutura. As terras seriam devolvidas à medida que as obras fossem sendo feitas. Já não havia espaço suficiente para as cinco mil famílias. Os desistentes foram se retirando do projeto e recebiam seu dinheiro de volta. Enquanto ocorria a construção do bairro, padre Piggy e a coordenação do movimento persistiam na negociação com a prefeitura. O projeto inicial do padre Piggy era que o Bairro Metropolitano fosse um condomínio fechado, todo construído e habitado pelas famílias envolvidas no programa. De acordo com Maria do Carmo Freitas, assessora da Prefeitura de Neves, o município recebeu a maior verba da Região Metropolitana da capital no orçamento do PAC (Plano de Aceleração de Crescimento) deste ano, mas o Bairro Metropolitano não estava incluído em nenhuma dessas obras. “Temos três ações sendo realizadas no Metropolitano pela prefeitura, uma pavimentação na Rua Um, vamos pavimentar todos os itinerários dos ônibus, em parceria com o DER (Departamento de Estrada de Rodagem), e dependemos da Copasa para realizar as obras de saneamento básico”, comenta Maria do Carmo.
Padre Piggi e sua dedicação às questões sociais da comunidade Atualmente, Pier Luigi Bernareggi, o padre Piggi, continua suas obras trabalhando com a população de baixa renda em Belo Horizonte. Com uma equipe que varia de oito a dez pessoas, ele orienta trabalhos nas principais favelas da capital em parceria com a Igreja Católica. "Dom Walmor de Oliveira montou um projeto de próprio punho, para atingir, ao longo de 2009, todas as favelas da cidade, uma base de 60 favelas. Se Deus quiser, nós teremos condições de montar pequenas comunidades cristãs. E, através dessas comunidades criar um movimento de luta pelos direitos dos favelados. No início deste ano, a Arquidiocese de Belo Horizonte nos passou o projeto para começar
os trâmites", explica padre Piggi. Ele divide seu tempo entre esses projetos e a Paróquia de Todos os Santos, localizada no Bairro 1º de Maio, Região Norte da capital. A história do padre Piggi começa em 6 de junho de 1939, dia em que nasceu em Milão. Mas, é no ano de 1963, quando um grupo de bispos de Belo Horizonte vai até a Itália e convida para vir ao Brasil jovens seminaristas, que padre Piggi inicia sua trajetória como benfeitor no país que escolheu para viver. Nessa época tinha apenas 24 anos. Algum tempo depois, após concluir o seminário no Bairro Coração Eucarístico, se tornaria o Padre Piggi. Incitado a conhecer a realidade brasileira, Padre Piggi
assim o fez. Desde a época de seminarista dava assistência à Vila 31 de Março, localizada no bairro Dom Cabral, Região Noroeste de Belo Horizonte. "A partir daí já tive oportunidade de conhecer o mundo favelado", declara Piggi. Após ter sido pároco na cidade de Contagem e no centro de Belo Horizonte, em 1977, padre Piggi assumiu a paróquia do Bairro 1º de Maio, onde se encontra até hoje. Em toda sua trajetória, sempre teve contato com a população sem-casa. Há 31 anos, participou da criação da Pastoral de Favelas, na diocese da capital. O fechamento da Pastoral oito anos após sua criação não desmotivou Piggi. Em 1985, criou a Associação dos Moradores de
aluguel da Grande Belo Horizonte (Amabel), já de maior abrangência. Nesta época, foi criado o Bairro Felicidade, na Zona Norte de Belo Horizonte. Com o terreno e materiais doados pelo poder público, o bairro foi construído sem muitos problemas. O mesmo não ocorreu com o Bairro Metropolitano, criado no ano de 96 em Ribeirão das Neves. Segundo o Padre Piggi, o verdadeiro motivo é a grande distância do local da ocupação até a cidade. Razão pela qual cerca de um terço das cinco mil famílias envolvidas no projeto desistiram da construção de suas casas. “Se tivesse alguém doente, não tinha como levar ao hospital era muito longe. Além disso, o Bairro
Padre Piggi afirma que um terço das cinco mil famílias desistiram da construção Metropolitano era muito longe do trabalho e da escola de muitos moradores”, afirma Piggi. O projeto de criação do bairro baseava-se na autoconstrução. Os moradores não exigiam as terras e materiais do governo, tudo seria comprado com o dinheiro do
próprio movimento. Segundo ele, a intervenção governamental neste caso não iria ajudar, a burocracia e o envolvimento com empreiteiras e financiadoras contratadas do governo só iria aumentar a dependência financeira dos moradores.
10 Educação
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Dezembro • 2008
TEMPO INTEGRAL PARA A EDUCAÇÃO Alunos têm a oportunidade de participar de atividades complementares depois do turno escolar. Essas atividades contribuem para melhorar o desempenho e tirar os estudantes do risco social ANNITA VELASQUE
n ANNITA VELASQUE, THAÍS PIMENTA,
Professores recebem capacitação na PUC
7º PERÍODO
Não muito tempo atrás, D.R.S, de 17 anos, era conhecido na escola em que estuda como o garoto rebelde. Quebrava vidros das janelas, pichava carteiras e vivia suspenso das aulas. “Aquele vidro ali, fui eu que quebrei”, ele aponta para uma janela da Escola Estadual Mário Elias de Carvalho, em Contagem, uma das primeiras a implantar o Projeto Escola de Tempo Integral, do governo do Estado. Pelas diretrizes do projeto, o aluno freqüenta as aulas em um turno e participa de atividades complementares em outro. Aulas de reforço em português e matemática, além de aulas de arte, educação física e informática entram no currículo dos alunos, que estão, em sua maioria, em situação de risco social. O trabalho começou em 2005 nas escolas participantes do Projeto Escola Viva, Comunidade Ativa, e levava o nome de Aluno de Tempo Integral. Em 2007, passou a fazer parte do Projeto Estruturador do Governo do Estado, e foi rebatizado como Escola de Tempo Integral. Desde então foi expandido para outras instituições da rede estadual em diversos municípios. “O projeto começou atendendo cerca de 20 mil alunos, em 180 escolas da Região Metropolitana de BH e Uberaba. Hoje, já atendemos 108 mil alunos em 1.834 escolas, em todo o estado”, afirma Gustavo Nominato Marques, gerente executivo do projeto da Secretaria de Estado de Educação. O processo de implantação do Escola de Tempo Integral é simples. “As escolas requerentes devem possuir uma estrutura física adequada para receber os alunos no contra-turno,
A dupla de vôlei Marco Aurélio Santos e Leandro Ayres da Silva tem o sonho de um dia jogarem profissionalmente tal como sala ociosa, quadra coberta ou outro espaço coberto, quadra da comunidade, biblioteca, laboratório, enfim, ambientes que possam ser reorganizados para a utilização dos alunos”, conta Gustavo Marques. “É muito importante também que toda a comunidade escolar deseje ingressar no projeto, para que ele possa funcionar em consonância com os objetivos da SEE”, diz ele. RESULTADOS “Para mim, o melhor resultado é tirar os meninos da rua, onde eles só podem aprender o que não devem. Apesar de o objetivo principal do projeto ser o de reforço da matéria aprendida em sala, o fato de eles estarem na escola e não na rua é o principal ganho”, diz Juliana Araújo, diretora da E.E. Mário Elias de Carvalho, que tem 330 alunos, 136 de Tempo Integral. “Antes do projeto, eu não fazia nada o dia todo. E quando estava na escola, só fazia bagunça. Hoje me sinto mais tranqüilo, mais à vontade na escola. Além de ter melhorado as minhas notas, principalmente em Português”,
concorda D.R.S. Maria da Conceição e Silva é professora de alfabetização do projeto desde que foi implantado e seu contato com os alunos é muito próximo. Ela vê resultados que vão além do reforço escolar. “O que eu mais noto neles é a melhora na auto-estima. Com a melhora dentro de sala de aula e com o tempo e a atenção que recebem dos professores, eles passam a acreditar que apesar da dificuldade de aprender, eles podem melhorar de verdade”, afirma. “É muito melhor fazer o para casa na escola. Em casa, quando tenho dúvidas, meus pais não sabem responder. Aqui, tiro todas direto com o professor”, conta Alicy Caroline Batista, 12 anos, aluna da 6ª série. CRITÉRIOS Para participar do projeto, o aluno deve ter autorização por escrito dos pais. “Alguns alunos não são autorizados pelos responsáveis a fazer parte do projeto por terem que ajudar em casa ou olhar irmãos mais novos. Isso acontece principalmente com as meninas”, conta Juliana Araújo. Porém, há
quem precise do projeto por não ter com quem deixar os filhos. “As famílias que autorizam estão satisfeitíssimas com a permanência dos alunos na escola, pois muitos já viram o resultado da melhoria de seu filho tanto no processo ensino-aprendizagem, como dentro de casa”, afirma Jeniffer Otoni Lima, diretora da Escola Estadual Mário Casassanta, do bairro Nova Granada, onde o projeto existe desde 2005. Marco Aurélio Santos e Leandro Ayres da Silva, alunos da 7ª série da E.E. Mário Elias de Carvalho formam a melhor dupla de vôlei da escola. “Começamos a jogar juntos no projeto. Agora aproveitamos todo o tempo disponível para treinar”, conta Marco Aurélio entre um saque e outro. “A gente vai ser profissional, temos espaço e apoio para treinar”, completa Leandro Ayres da Silva. No horário em que estão no projeto, os dois dominam a quadra. “Com esse apoio, até podemos sonhar com o esporte no nosso futuro”, diz a dupla.
Em 2008, a Secretaria de Estado de Educação passou a oferecer capacitação para os professores da rede estadual que atuam no projeto Escola de Tempo Integral. O último aconteceu no mês de agosto, na PUC Minas do Bairro Coração Eucarístico. Professores da capital e de outras cinco superintendências regionais participaram de oficinas de dança, capoeira, brinquedos e esportes. “Quando chegamos em qualquer escola e perguntamos aos alunos que aula eles mais gostam, a resposta é sempre em coro: Educação Física. Daí a enorme necessidade de trazer um diferencial para estas aulas, para cativar ainda mais os alunos”, comenta Gustavo Nominato Marques, gerente executivo do projeto Escola de Tempo Integral. O objetivo da SEE é que outro módulo da capacitação em Educação Física seja oferecido ainda em novembro de 2008. Em 2009 será a vez dos alfabetizadores receberem treinamento direto do Governo. A capacitação é oferecida desde 2007, porém no início os primeiros treinamentos não foram um contato direto da Secretaria de Estado de Educação com os profissionais. Como a abrangência do projeto é extensa, foram formados pólos de capacitação em cidades estratégicas. “O número de profissionais que atuam no Escola de Tempo Integral é muito elevado. Por isso, descentralizamos as capacitações para os pólos, como foi o caso do treinamento de professores de Educação Física em 2007. A SEE capacitou os coordenadores de cada Superintendência Regional de Ensino, que repassaram o conteúdo para os profissionais da sua jurisdição que atuam no Projeto”, explica Gustavo. Para os professores, a experiência é nova e colabo-
ra para aumentar o repertório de atividades que eles têm a oferecer. “Todo o conteúdo passado nas oficinas é visto na graduação. Mas a iniciativa é importante para estimular os professores a levar estes conteúdos diferenciados para as aulas e direcionar mais o trabalho”, afirma Virgílio de Faria Almeida, professor de Educação Física no projeto Escola de Tempo Integral da E.E. Mário Elias de Carvalho. “O aluno do projeto tem que ser cativado, pois ele não está ali por obrigação, por cobrança de nota, mas para ter acesso a algo mais que a escola pode oferecer”, completa o professor que inclui até aulas de jump na programação. “Um ganho que temos nas oficinas é o contato e a troca de experiências com outros professores da área. É interessante conhecer a realidade de outras escolas. O que posso notar é que da teoria para a prática, todos temos um longo caminho para percorrer”, afirma Vanda Bicalho, professora da Escola Estadual Presidente João Pessoa. Para Juliana Araújo, diretora da E.E. Mário Elias de Carvalho, o professor deve ter um perfil específico para trabalhar no projeto. “Antes, nós mesmos fazíamos uma seleção entre os professores da escola. Já conhecíamos o perfil de cada um e acertávamos nas escolhas. Hoje eles devem ser indicados diretamente pela SEE, o que dificulta um pouco o nosso trabalho aqui na escola”, afirma. “O professor do contra-turno deve ser mais paciente e dedicado aos alunos, tem que saber como cativar a atenção deles. E nisso a capacitação com certeza vai nos ajudar”, completa.
ANTÔNIO ELIZEU DE OLIVEIRA
Escola de arte em Nova Lima oferece atividades culturais n ANTONIO ELIZEU DE OLIVEIRA, 3º PERÍODO
A Escola Casa Aristides Atelier de Artes e Ofícios, criada há mais de uma década na Praça Coronel Aristides, s/nº, Centro de Nova Lima, Região Metropolitana de Belo Horizonte, tem sido um espaço fundamental na vida de centenas de pessoas de diferentes idades. Segundo Cláudia Datto, coordenadora administrativa do projeto, a Escola Casa Aristides foi pioneira no ensino de arte produzida com material reciclado no Brasil, utilizando papel, retalhos, garrafas pets e embalagens de leite. “No entanto, a falta de interesse
da população, tanto para o aprendizado quanto para oferecer os materiais, alterou a meta da Escola Casa Aristides, que hoje oferece, além de cursos de reciclagem, oficinas de Aquarela, Modelagem em Cerâmica, cerâmica (terras de Nova Lima), Culinária, Desenho de Criação, Desenho de Histórias em Quadrinhos, Desenho de Observação, Estamparia, Marchetaria, Papel Artesanal, Pintura Acrílica, Pintura em Madeira, Pintura a Óleo e Pintura em Porcelana”, relata Cláudia. O projeto, implantado em 1997 pela Prefeitura de Nova Lima e executado pela Secretaria Municipal de
Cultura, conta com duas coordenadoras, uma administrativa e outra de cursos, cinco funcionários e 16 professores. Atualmente, são mantidos quinze cursos que oferecem, em média, 340 vagas ao público com idade variada, a partir de 12 anos. “Estou aqui na Casa Aristides há mais ou menos dez anos; é sempre um desafio, turmas de 12 a 80 anos, heterogêneas, de idade e de nível social; é muito bacana e cada ano há turmas diferentes, não tem igual”, relata Isaura Penha, professora de desenho geométrico e nanquim preto e branco, formada na Faculdade de Belas Artes, da UFMG, lecionando também
na Escola Guignard, em Belo Horizonte. Além do aprendizado, o ambiente da escola faz com que alguns alunos como Sônia Gomes Pacheco vejam o espaço como uma oportunidade de alívio do stress da sua rotinas. “A Casa Aristides é uma terapia, venho aqui para descansar do dia-a-dia, da luta, do trabalho todas terças e quintasfeiras. Estou fazendo uma máscara. Eu adoro aqui”, conta Sônia, 49 anos, aluna do curso de cerâmica da Casa Aristides e professora em Escola de Ensino Especial. A opinião é compartilhada por Priscila de Castro Teixeira, 53 anos,
Cláudia Datto coordena casa pioneira de ensino de arte com material reciclado secretária desempregada. “A Casa Aristides está funcionando para mim como uma terapia, oportunidade de futura fonte de renda”, afirma Priscila, que é apoiada pela sua irmã, Cristina de Castro Teixeira, 58 anos, aposentada,
também aluna do projeto. “A Casa Aristides é uma das melhores descobertas de minha vida. Vim de Belo Horizonte para conhecer Nova Lima e estou preparando para mudar pra cá”, destaca Cristina, entusiasmada.
Tecnologia Dezembro • 2008
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DE OLHO N0 TEMPO PARA VOAR BEM Com o avanço tecnológico, a previsão do tempo é ralizada hoje a partir da troca de informações entre vários países. O Brasil já tem 400 estações meteorológicas e pode chegar a ter 550 n ANA LETÍCIA LEÃO, LÍGIA MAIA, MELINA ALKMIM, NANY MATA, 7ºPERÍODO
"A meteorologia para nós é essencial. A gente planeja e classifica a rota de viagem com base no cálculo de combustível, até para traçar rotas alternativas a fim de evitar fenômenos atmosféricos, como chuvas, ciclones, ventos e turbulência", conta o comandante da TAM, Adriano Pandolfo, há 12 anos na companhia. Junto ao seu plano diário de vôo, ele recebe dados meteorológicos sobre seu percurso, como direção e intensidade do vento, variação de pressão e temperatura, além da possibilidade de ocorrer tempestade. Antes que essas informações cheguem às mãos do comandante Pandolfo, são feitas conexões com modelos climáticos do mundo todo, utilizados equipamentos de alta tecnologia e existem equipes formadas por profissionais que trabalham 24 horas por dia. Mas, de fato, como a meteorologia funciona? A palavra meteorologia vem do termo meteoro e se refere ao estudo de qualquer fenômeno da superfície ligado à atmosfera ou, até mesmo, ao que ocorre na própria atmosfera. Ou seja, é baseada em observações que apontam variações de temperatura, pressão, umidade relativa do ar e velocidade do vento. A partir disso, é possível prever o comportamento do tempo em determinado instante e local.
Horizonte, são realizadas em duas estações meteorológicas, uma na Região da Pampulha, a estação automática (que faz medições de hora em hora e já envia os dados a um computador) e uma estação convencional, localizada na Região Centro-Sul da capital. É nessa última que são feitas as análises da atmosfera nas quatro horas definidas anteriormente, todos os dias, como uma receita de bolo. Um técnico, geralmente um geógrafo do instituto, vai ao local onde estão os aparelhos, mede a temperatura, a velocidade do vento, a umidade do ar, a pressão, dentre outros. Depois, levam os dados aos meteorologistas que já iniciam a análise, ao mesmo tempo em que os colocam para rodar nos modelos no computador, para serem, logo em seguida, enviados aos centros meteorológicos de referência. "Às nove horas, por exemplo, é feita a leitura no Inmet e os dados são enviados para Brasília e Washington. No máximo às nove e meia eles já começam a rodar um modelo que fica pronto em duas horas e vai para todos os centros do mundo", explica. Já o Instituto de Meteorologia MG Tempo/PUC Minas, também em Belo Horizonte, usa as estações meteorológicas convencionais para a coleta dos dados apenas às 9h e às 15h, sendo que o restante é medido pelas estações automáti-
cas, que trazem resultados ao instituto de hora em hora. "Não usamos mais como base a convencional, porque não temos como fazer esse trabalho de madrugada, mas comparamos os horários em que verificamos nas duas estações", ressalta Adelmo Correia, meteorologista do MG Tempo/PUC Minas. Da mesma forma, depois que os dados forem coletados pelas estações automáticas, eles serão enviados aos centros de referência. Enfim, a troca mundial de informações já foi realizada e os modelos divulgados, mas a previsão ainda não está pronta e, seja em estações automáticas ou convencionais, o que conta mesmo é o crivo do meteorologista. PERITOS Em cada centro meteorológico uma equipe se reúne para analisar os modelos divulgados e dar a previsão do tempo de acordo com essa análise, levando em consideração fatores locais como o relevo, uma característica que influencia diretamente no deslocamento dos ventos. "Em Minas Gerais temos a Serra do Espinhaço, onde os ventos do litoral deixam grande parte da umidade apenas no leste do estado, fazendo com que o oeste sofra com a baixa umidade relativa do ar no inverno", exemplifica Gabelha. Ele acrescenta que, por isso, é essencial que o profissional conheça muito bem todos os
aspectos físicos e climáticos da região em que trabalha, a fim de garantir mais credibilidade das informações. Para o comandante Pandolfo, a previsão do tempo realizada pelos meteorologistas é fundamental para averiguar, antes da partida, se há probabilidade de utilizar rotas alternativas. "Quando vamos para a Cordilheira dos Andes, consultamos um site especializado para saber como está o tempo e se pode haver alguma turbulência. Por isso a importância de uma previsão correta e bem feita", exemplifica. Antonio Divino de Moura, diretor do Inmet e pHd em meteorologia pelo Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT), acredita que a melhor previsão é aquela com base em vários modelos, pois permite ao meteorologista combinar o que há de melhor em cada um e retirar os possíveis erros, fazendo uma análise mais profunda. Ele ressalta que a partir de modelos antigos é possível saber quantas vezes determinado modelo errou ou acertou, para dar qualidade e confiabilidade à população. SATÉLITES Tudo o que foi previsto pelos meteorologistas pode ser confirmado com a utilização de satélites para o monitoramento das condições atmosféricas e, por isso, eles completam a previsão meteorológica. "Esse monitoramento é
importante, especialmente para eventos menores. Quando a gente recebe a informação via satélite de que começou uma chuva no Sul de Minas Gerais e que ela se deslocou para o oeste em duas horas, é possível prever que ela chegará em BH no fim da tarde", conta Gabelha. Apesar da grande confiabilidade nos modelos meteorológicos, com o passar dos dias a previsão do tempo pode apresentar falhas. Para os dois meteorologistas, Adelmo e Alexandre, quanto mais distante da hora inicial em que o modelo foi rodado e analisado, maior será a margem de erro. Por isso, a confiança no modelo é de apenas quatro dias, apesar dos modelos poderem rodar a previsão para até 15 dias. Segundo Gabelha, o instituto busca uma previsão com 80% de acerto e em até quatro dias a frente é possível fazê-la. "O índice de erros e acertos varia de acordo com a época do ano", salienta Adelmo. Para o meteorologista, na estação chuvosa é mais complicado fazer a previsão do tempo e a grande dificuldade é prever as chuvas isoladas. E, ao contrário, no período das secas, o índice de acerto fica bem próximo a 100%. EVOLUÇÃO As equações que fazem a previsão do tempo hoje são conhecidas desde a década de 50, mas o grande passo na área da
ESTAÇÕES As observações dessa atmosfera terrestre são realizadas em pontos fixos do globo, conhecidos como estações meteorológicas. Elas funcionam como um marco inicial para análise e, a partir dos dados coletados, são feitas as previsões do tempo para determinada região. Nas estações, essas observações ocorrem no mesmo horário no mundo inteiro, os chamados horários sinóticos. São eles, de acordo com a hora local: 3h, 9h, 15h, e 21h. A atmosfera é analisada naquele momento e as informações são enviadas aos centros meteorológicos de referência nos Estados Unidos e na Alemanha, onde são produzidos os modelos globais de previsão. De acordo o meteorologista Alexandre Gabelha, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) de Belo Horizonte, esses centros globais recolhem todos os dados recebidos e fazem um modelo que será enviado para o mundo inteiro. As medições do Inmet, em Belo
meteorologia foi a evolução tecnológica. "Não tínhamos as máquinas para fazer os milhões de cálculos de previsão, eles eram feitos à mão", conta Gabelha. Segundo ele, a maior diferença foi a modelagem numérica com a chegada dos computadores, ou seja, o uso dos modelos, a partir de 1970. Ele acrescenta que os modelos permitiram maior credibilidade às informações, pois além da previsão do tempo feita pelo meteorologista, os dados fornecidos pelos modelos também passaram a ser analisados. Antigamente, lembra Jorge Moreira, chefe da seção de previsão do tempo do Inmet, o processo era feito de forma mais manual. Primeiramente, eram analisadas três cartas sinópticas ao dia (às 12h, 18h e 0h), que forneciam informações sobre as condições meteorológicas de determinados pontos. A partir dos dados, uma equipe fazia as análises com mapas sobre uma mesa de luz. "Assim, só conseguíamos fazer a previsão para 24h, era impossível você fazer para 48 ou 72 horas. O trabalho era diário", conta. Moreira acrescenta que todo esse trabalho manual exigia equipes bem maiores. Mesmo se tratando de uma evolução das estações meteorológicas, as automáticas não tendem a substituir as convencionais, pois estas funcionam como padrão mundial que alimenta os modelos globais nos Estados Unidos e na Alemanha. "As automáticas estão sendo colocadas ao lado das convencionais para ver se a diferença dos sensores é grande ou não. Como meteorologista, acredito que uma completa a outra e, por isso, as convencionais não devem ser substituídas", expõe Gabelha. No Brasil, a utilização de estações meteorológicas automáticas é algo recente, com início em 2002. Sua principal vantagem é a obtenção de dados diretos via computador de hora em hora. "Na década de 70, a meteorologia no Brasil era digna de riso, além de feita no mesmo dia e com muitos erros. Mas o Brasil investiu bem, formou bons profissionais, os melhores da América do Sul. Está bem instrumentado e as previsões têm um bom prazo de garantia", lembra Antônio Divino Moura, diretor do Inmet. Os investimentos continuam e existem no país hoje mais de 400 estações automáticas, e a intenção é que esse número chegue a 550 no próximo ano.
Como as previsões interferem na vida das pessoas Não é apenas para o comandante da TAM, Adriano Pandolfo, que a previsão meteorológica é essencial, mas para agricultores, membros da construção civil, produtores de eventos e a toda população, que também está sujeita às mudanças climáticas. "A previsão hoje já não deixa mais a gente na mão. Ela marca certo tipo de chuva e quando vai chegando perto da época e o tempo muda, ela nos avisa da mudança. A chuva não nos pega de
surpresa", conta Carlos Roberto Morais, técnico agrícola da Cooperativa Agropecuária do Noroeste Mineiro (Coanor), de Unaí. Ele explica que as mudanças no clima são informadas com tempo suficiente para que ele e seu pai, o produtor de grãos Sebastião Caetano de Oliveira, se preparem. Por isso, ao fazer o planejamento para o plantio de grãos, grande parte das escolhas de Sebastião são feitas com base em dados verificados por seu filho no Centro de Previsão de
Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC). Segundo Carlos Roberto, a época de plantio depende, principalmente, dos índices pluviométricos da previsão do tempo. "Sem ela a gente trabalha no escuro. E hoje já não dá para trabalhar assim. O produtor precisa de mais certeza para poder plantar", expõe Morais. Apesar da facilidade em se obter informações meteorológicas, nem todos os agricultores se preocupam em consultar
a previsão do tempo antes de iniciar algum plantio. Dei Junior, especionista agropecuário da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) de Campo Belo, município do centro-oeste de Minas esclarece que seu trabalho é guiar produtores rurais sobre qual a melhor época para se plantar determinada cultura e, por interesse próprio, faz questão de checar a previsão de sua região todos os dias para fornecer aos agricultores. "Eles não procuram saber
a previsão, eu é que corro atrás e passo as condições do tempo. Acho que o pessoal não fica ligado nisso, mas deveria", lamenta Junior. A previsão a longo prazo ainda apresenta deficiências, como explica o meteorologista Alexandre Gabelha, já que uma medição feita com mais de quatro dias tem margem de acerto inferior a 80%. Por isso, Léo Ziller, produtor da Multimusic Eventos, responsável por grandes festas ao ar livre como a
XXXperience e Creamfields, prefere não confiar nas previsões meteorológicas. "Hoje, 95% dos ingressos dos eventos que fazemos são vendidos antecipadamente, aí também não dá para checar a previsão antes", relata. Léo admite que a melhor opção para não estragar suas realizações é prevenir. "No caso da Creamfields, que acontece no próximo mês, as 4 pistas são cobertas. A previsão é de 20 mil pessoas e tem lugar coberto para as 20 mil pessoas", diz.
12 Comportamento
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Dezembro • 2008
SABOR E RENDA QUE VEM DO QUEIJO Essencial no dia-a-dia dos mineiros, o queijo é um dos símbolos mais conhecidos da cultura do estado; o tipo canastra tornou-se vício, rompeu fronteiras e encanta consumidores de todo país JOELMIR TAVARES
n JOELMIR TAVARES, 3º PERÍODO
Muitos mineiros “vivem do queijo”. E outros tantos não vivem sem o queijo. Esse ícone gastronômico e histórico do estado, registrado como patrimônio cultural imaterial brasileiro e vendido para os mercados interno e externo, é fonte de sustento para muitas famílias, especialmente as que se especializaram em trabalhar com o mais tradicional dos queijos artesanais de Minas, o canastra – conhecido pela consistência, sabor e durabilidade. “Queijo é a comida que eu aprendi a comer desde pequeno”, diz o pedreiro Manoel Domingos, de 60 anos. “Lá em casa nós não conseguimos ficar sem ele”, resume a doméstica Neide Pereira Cardoso, 47, moradora do Bairro Canadá, em Contagem. “Eu compro três por semana”, conta Maria Cecília Silva, 53, do Bairro Monsenhor Messias, Região Noroeste de Belo Horizonte. Frases como essas demonstram o “caso de amor” do mineiro com o produto. Manoel, por exemplo, passa no Mercado Central de Belo Horizonte todas as sextas-feiras para comprar o queijo que será consumido ao longo da semana pela família, no Bairro Saramenha, Região da Pampulha. O centro de compras é procurado por
Salomé e Aristeu Mozzer criaram seus três filhos com a renda da loja de queijos, localizada no Mercado Central boa parte dos consumidores de canastra na capital e Região Metropolitana, além de turistas interessados no tradicional alimento das Gerais. O comércio de laticínios de Aristeu Faria Mozzer, 60 anos, tem quatro décadas de história no mercado e recebe clientes de várias cidades. O proprietário criou a família com a renda da loja. Seus três filhos hoje são bem-sucedidos médicos. A mulher, Salomé das Graças Mozzer, 58 anos, foi ajudar o marido na banca depois que os filhos estavam “criados”. Na loja, o casal vende queijos de quase todas as regiões produtoras do estado. Grande parte vem
da área da Serra da Canastra e cidades como Carmo do Paranaíba e Serro. “Herdei o ponto da minha família. Na minha opinião, estou no melhor lugar do mercado. Eu gosto do movimento, de atender bem os fregueses e dar continuidade a essa tradição”, relata Aristeu, que também comercializa doces de diferentes tipos.
PRIMEIRA VEZ Em outro canto do Mercado Central, um aposentado olha, pega e prova o queijo curado característico de Minas. “É, realmente ele possui um sabor diferente, além de ter muita fama. Dizem que é o melhor do Brasil”, descreve o curitibano Elias Cardoso, de 62 anos, logo depois de
conhecer o canastra. O turista voltou para o Paraná com um exemplar na bagagem e justificou que o queijo do sul do Brasil “não é tão corado, nem tão gostoso quanto o daqui”. Elias foi levado para experimentar o queijo pelo amigo Josias Almeida, de 46 anos. Mas Josias não é grande apreciador da iguaria. “Saí da Bahia para morar em Belo Horizonte há dois anos e ainda preciso aprender a gostar do queijo. Só trouxe o Elias porque ele queria conhecer o item mais comentado da cozinha de Minas”, revela o anfitrião baiano. Se quem chega nem sempre se acostuma rápido à culinária típica,
quem vai embora dificilmente se esquece das raízes. O publicitário Rodrigo Magalhães Amaral, de 30 anos, mudou-se de Belo Horizonte para São Paulo, mas, nas vindas mensais à capital mineira, compra pelo menos três canastras. “Levo principalmente por conta dos amigos, que adoram. Minha família aqui também consome muito. Não tem jeito, queijo faz parte da vida dos mineiros”, conclui Rodrigo. E existem muitos exemplos desse “vício”. O aposentado Nicodemos Neto, de 66 anos, morador do Bairro Padre Eustáquio, Região Noroeste, “devora” sozinho um queijo inteiro por semana. “Não passo nem um dia sem”, destaca. No Bairro Paraíso, Região Leste, os quatro filhos do comerciante Adão José de Oliveira, de 49 anos, reclamam se faltar o artigo na mesa do café da manhã ou do lanche da tarde.
AT R AV E S S A D O R E S Para chegar até os principais pontos de venda na capital, como o Mercado Central e a Feira dos Produtores, no Bairro Cidade Nova, o queijo passa pela mão dos chamados atravessadores, que fazem o contato entre fabricantes e vendedores. Um dos intermediários, Marcelo José Moreira Vargas, de 42 anos, sai duas vezes por semana de Carmo do
Paranaíba, no Triângulo Mineiro, com a produção de quase 40 queijeiros, para revendê-la a 20 donos de lojas no Mercado Central. Ele inicia a viagem por volta de meio-dia, em um caminhão equipado com arrefrigerado, e dorme na capital, para, no dia seguinte, bem cedo, entregar as encomendas. O revendedor transporta até 8 mil quilos por semana. “Eu vivo do queijo há 16 anos. Sempre fazendo esse caminho”, diz o comerciante, que também degusta regularmente o produto. “Nem dá para comparar o sabor dos queijos crus ao dos précozidos, que são destemperados”, opina Marcelo, fazendo propaganda de sua única fonte de renda. Ele tem mesmo que torcer para as vendas serem boas, principalmente agora que a filha decidiu prestar vestibular para medicina. Cristiano Colares Araújo, de 33 anos, também revende queijos artesanais do interior na capital. O produtor rural, da cidade de Água Boa, no Vale do Rio Doce, faz o percurso há apenas dois meses, mas já percebeu que a lista de encomendas cresce a cada semana. “Muitas pessoas preferem os nossos produtos, sem ingredientes químicos. Já estou com 18 clientes em Belo Horizonte”, comemora o atravessador.
JOELMIR TAVARES
Canastra mais caro coloca em risco a tradição do produto
Mesmo morando fora de Minas, Rodrigo Amaral sempre compra o queijo RAPHAEL NASCIMENTO
A dificuldade dos queijeiros em vender o canastra a um preço suficiente para cobrir os gastos de produção e garantir margem de lucro ameaçou a tradição, de acordo com o presidente da Associação Mineira dos Produtores de Queijo Canastra, Luciano Carvalho Machado, de 43 anos. Para ele, a exigência maior em relação ao tempo de maturação – fixado em 21 dias – tende a beneficiar os fabricantes, apesar de encarecer o produto nas bancas. “O consumidor deve entender que nem sempre o que é mais barato é melhor. Às vezes é preciso pagar mais para ter uma peça de qualidade e procedência certa”, argumenta o presidente da associação, que tem sede em Medeiros, na Região Oeste de Minas. Segundo ele, o autêntico canastra necessita do período exato de exposição ao ambiente para se adaptar às normas de segurança alimentar e ser aprovado em
análises bacteriológicas. Luciano explica que o queijo maturado por menos tempo desagrada aos compradores de melhor poder aquisitivo, que o vêem com desconfiança. Com isso, o consumo fica limitado às classes mais baixas, atraídas pelo preço acessível. “Se não fizéssemos nada para mudar esse quadro, dificilmente íamos conseguir sobreviver. Muitos iam desistir da atividade e passar a vender todo o leite das fazendas para as grandes empresas”, analisa. O grande estímulo para os queijeiros veio quando órgãos estaduais determinaram o prazo adequado para a massa maturar. Outra ação, anunciada pela Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, é a implementação de centros de maturação de queijo artesanal no estado, com o objetivo de proporcionar melhores condições de controle sanitário. Os dois primeiros centros serão
construídos em Medeiros, onde existem mais de 400 produtores, e Rio Paranaíba, no Triângulo. “Os centros serão importantes por terem estrutura própria para o armazenamento. Fazer isso nas próprias queijarias é muito difícil”, considera Luciano Machado, que em sua fazenda produz 20 queijos por dia. Conforme o presidente, as normas colaboram para dar mais força aos queijeiros, e não para transformar o processo artesanal em industrial. “Somos contra a idéia de ‘linha de produção’, pois, se isso acontecer, os pequenos produtores podem sofrer as conseqüências”, expõe. FRESCAL X CURADO O presidente da Associação Mineira dos Produtores de Queijo Canastra afirma que o prazo de maturação é decisivo no sabor e textura. Cumprindo o período ideal, os ruralistas se sentem seguros para colocar o queijo à venda. Graças aos
critérios adotados durante a fabricação, a associação acaba de fechar contrato com uma rede de hipermercados para revenda do produto. “Vamos atingir um novo grupo de compradores. Quem come só queijo frescal não conhece nem metade do que é o curado”, assegura o produtor. Na hora de definir normas para os laticínios artesanais, os órgãos públicos pedem consultoria dos produtores rurais, já que pesquisas de controle sanitário são mais comuns na legislação para os processos industriais. De acordo com Luciano, é preciso negociar algumas regras com o governo. “Não podem, por exemplo, querer que o canastra seja embalado, porque ele é um queijo ‘vivo’. Também estamos batalhando para alterar uma lei federal que pede desnecessários 60 dias de maturação. Se conseguirmos, Minas vai poder exportar para outros estados”, prevê.
Comportamento Dezembro • 2008
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BRASIL VOLTA A SER OPÇÃO TURÍSTICA A alta do preço do dólar e a insegurança em relação ao futuro da economia, por causa da crise, levam turistas brasileiros que planejavam passar o inverno no exterior a optarem pelo país GUSTAVO ANDRADE
n ISABELLA LACERDA, 2° PERÍODO
O sonho da médica Ivana Giesbrecht, de 34 anos, era conhecer a Europa e o frio dos países europeus. Em setembro deste ano começou a planejar sua tão sonhada viagem, que seria feita no início de 2009, entretanto, a crise norte-americana estragou seus planos. “Sempre tive vontade de conhecer a cultura européia. Estava aproveitando que meus amigos também iriam viajar para planejar a minha viagem. Mas essa crise me pegou de surpresa. Há pouco tempo, o dólar estava custando entre R$ 1,60 e R$ 1,70 e em menos de um mês chegou a R$ 2,40”, explica. Ivana não é exceção. Muitas pessoas, nessa época do ano, trocam o verão nas praias brasileiras pelo inverno no exterior. Porém, a crise acabou mudando essa tendência. Segundo Lázaro Geraldo Rezende, gerente geral da empresa de turismo Belvitur, localizada no Bairro de Lourdes, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, as pessoas têm optado por viagens nacionais ou pelo cancelamento das viagens internacionais. “Muitas pessoas que antes iam para a América do Sul, Europa e Estados Unidos, agora estão procurando o nordeste brasileiro. Antes da crise, as viagens, principalmente para a América do Sul, eram muito procuradas, pois estavam com preços muito bons e muito em conta. Mas com a alta do dólar, isso mudou”, diz. Empresas de turismo como Belvitur, Trans Japa, CVC e Exodus informam que estão sentindo os reflexos da crise mundial e que ela já tem causado problemas mais sérios. “Planejamos as viagens de férias de verão com um ano de antecedência. Agora, a gente sem vender viagens se vê obrigado a reduzir número de funcionários, diminuir os gastos. Enfim, é como um efeito cascata, porque a gente não pode levar prejuízo”, ressalta Andréia de Aguiar, supervisora de lazer da empresa Exodus, que fica na Avenida do Contorno, Região Central de Belo Horizonte.
Planejamento garante viagem para o exterior
O gerente da Belvitur, Lázaro Rezende, comenta que a crise atraiu turistas para viagens dentro do território nacional Ainda de acordo com Andréia, o principal problema da crise não é só o aumento do preço do dólar, pois a moeda americana alguns anos atrás chegou a atingir o valor de R$ 3, mas a insegurança que essa alta tem causado às pessoas. Ela afirma que, em sua agência, os consumidores têm se mostrado inseguros, uma vez que não sabem o que ainda está por vir. Ressaltando o que disse Andréia, Lázaro Geraldo afirmou que os interessados em viajar estão querendo economizar. “Pelo medo da recessão, as pessoas estão economizando. Quem viaja a negócios não cancela as viagens, mas quem viaja para turismo acaba cancelando, pois as considera um supérfluo”, diz. Ivana Giesbrecht explica que o que mais a assustou foi o aumento no valor das passagens. “A partir do preço que as empresas aéreas me passaram, calculei, juntamente com meus outros gastos na viagem, o quanto a mais eu gastaria. Percebi que precisaria de muito mais dinheiro para viajar. Então acabei me vendo obrigada a desistir”, lamenta. Entretanto, não são somente as viagens para fora do país que aumentaram de preço. “As viagens nacionais aumentaram e ainda vão aumentar os preços. O Brasil também
sofre impactos, até porque, mesmo sendo usado aqui o real, o combustível é comercializado em dólar”, adverte Andréia. As agências de turismo que fazem o transporte para a retirada de vistos para viagens internacionais admitem que também vêm sentindo as conseqüências da crise mundial. Sandra Lúcia de Mattos, diretora da Trans Japa, localizada no Bairro Sagrada Família, Zona Leste da capital mineira, afirma que a empresa já teve que tomar algumas medidas. “Agora só agendamos os pedidos nas embaixadas. Não incluímos o transporte no pacote. Isso porque, como as viagens internacionais têm diminuído, a necessidade de vistos também diminuiu”, comenta. ALTERNATIVAS Aumentar os parcelamentos das passagens de avião, procurar destinos e hotéis mais baratos, e diminuir os gastos supérfluos das viagens são algumas dicas que as empresas de turismo têm dado a seus clientes. “Porto Seguro e Salvador ainda são uma ótima opção, pois lá se têm muitas opções de hotéis e pousadas. Comprar passagens fora do pacote também ajuda muito. Alternativas sempre têm,
desde que se procure”, diz Andréia de Aguiar. De acordo com ela, os donos das agências de turismo têm reclamado do governo, que não tem buscado soluções para amenizar os impactos da crise. “O governo nada tem feito para as empresas de turismo. Pelo contrário, as companhias aéreas aumentaram os preços das passagens e cortaram as promoções com as agências”, alerta. A supervisora de lazer da empresa Exodus ainda acrescenta que, dessa forma, as empresas de turismo não podem fazer nenhum tipo de promoção para atrair clientes. “Não podemos bancar as despesas dos clientes”, conta. Eliane Boechart, empresária e dona da Tia Eliane, agência de turismo localizada no Bairro Funcionários, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, diz que as promoções que sua empresa tem conseguido fazer são apenas com viagens de navio e com o uso de empresas aéreas recentes no mercado. “Tenho indicado para as pessoas o novo vôo que vai direto para o Panamá, da empresa Copa Airlines, que é mais barato e uma ótima opção de destino para as pessoas que querem viajar para fazer compras”, ressalta.
Quem começou a planejar as viagens de verão desde o início do ano não está sofrendo tanto os impactos da crise mundial. Esse é o caso da estudante de publicidade Larissa Cristina Ramos Ferreira, de 19 anos, que no final de novembro viajou para a Virgínia do Sul, nos Estados Unidos. A estudante, que está trabalhando em um programa de emprego temporário para jovens no exterior, conta que não chegou a pensar em desistir da viagem. “Não pensei em cancelar minha viagem, pois eu já havia assinado o contrato. Mas se a crise tivesse começado no início do ano, com certeza eu não iria”, afirma. Ela revela que quem mais se assustou com a chegada repentina da crise foi seu pai, uma vez que é ele quem está bancando a sua ida e deixou para pagar grande parte da viagem mais perto do embarque. “Meu pai enlouqueceu quando ficou sabendo. Ele achou que o dólar ia baixar no final do ano”, lembra Larissa, acrescentando que ele passou a acompanhar
diariamente a cotação e a cada pquena queda, ele corria e pagava mais uma parte da viagem. Larissa revela que seu grande sonho sempre foi conhecer o frio e, até mesmo, a neve, e que por isso não está lamentando perder o verão brasileiro. “Na Virgínia faz frio, em torno de 10° C, mas não neva. Eu queria mesmo era ir para uma estação de esqui, porque nunca vi a neve. Mas só é contratado para esse tipo de emprego quem pode passar mais tempo viajando”, lamenta. Assim como Larissa, a também estudante de publicidade Izabel Matos, de 20 anos, viajou para trabalhar na Virgínia do Sul (EUA), nessas férias. Ela conta que a crise a obrigou a economizar dinheiro no Brasil, uma vez que a viagem ficou muito mais cara. “Minha viagem já estava paga desde que fechei o contrato no início do ano”, comenta, mas, como o dólar ficou mais caro, ela teve que sair menos em Belo Horizonte, antes do embarque, para economizar.
Após a aposentadoria, o retorno para a escola n AMANDA NAVARRO, BEATRIZ FREITAS, 7º PERÍODO
Dados da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apontam que 154 alunos com idade acima de 50 anos estavam matriculados em cursos da graduação no segundo semestre de 2008. Grande parcela desse grupo se encontra em cursos de licenciatura, como pedagogia, geografia e letras, que é o mais procurado por essa faixa etária, totalizando 19 graduandos matriculados. “Os fatores que levam uma pessoa mais velha voltar à graduação são muito pessoais e não podemos generalizar. Mas a maioria que entra na universidade já está com a vida encaminhada, os filhos criados, com tempo e boa condição financeira", aponta a psicóloga e professora Maria Alice Lima. "Hoje, a pessoa aos 50 anos não está no fim da vida e da carreira", afirma Maria Alice Lima. Com a expectativa de vida
aumentando, o brasileiro com mais idade vem buscando novas alternativas para não parar após a aposentadoria e retomar os estudos, muitas vezes, pode ser a solução para não perder o ritmo. Cleunício Ferreira, 48 anos, reformado da Polícia Militar há oito meses, conta que sempre foi seu desejo ingressar no curso de direito, mas preferiu se dedicar inteiramente à carreira. "Depois que me aposentei, vi nos estudos uma forma de alcançar novas perspectivas. Hoje, posso fazer o curso com mais dedicação", diz o aluno do segundo período da PUC Minas. Nem sempre regressar às salas de aulas é uma tarefa fácil. As principais dificuldades encontradas por alunos maduros estão relacionadas à adaptação ao grupo mais jovem, ao ritmo acelerado das aulas, imaturidade dos colegas e conciliar o tempo dedicado à família e aos estudos. A jornalista Maura Eustáquia de Oliveira, 60 anos, que está estudando direito, con-
sidera benéfica a diferença de idade entre ela e seus colegas de turma. "Amo meus colegas. Eles me remoçam, me enchem de gás. Tenho o privilégio de conviver com pessoas que me alegram e me respeitam", relata. Cleunício, que virou o "conselheiro" da turma, enxerga sua maturidade como facilitador na hora do aprendizado. "Tenho uma maior facilidade de compreensão, por já ter um conhecimento agregado relacionado a minha antiga profissão", lembra. Como outros benefícios, a psicóloga Geisa Moreira observa que os jovens buscam o estudo para entrar e se consolidar no mercado de trabalho muito mais do que para se educar. "A pessoa adulta busca o contrário. O estudo pelo prazer", ressalta a cidadã honorária de Belo Horizonte, que recebeu o título pelo trabalho realizado com os idosos e a preparação do contribuinte para a aposentadoria. O adulto, pelo puro deleite de estudar, se compromete mais com a universidade, com sua formação e com o curso. "O
aluno mais velho é mais aplicado, leva os compromissos escolares com mais seriedade. É um estudante cuidadoso", acredita Maria Alice. Para que o aprendizado seja realmente eficaz, é preciso pensar como deve ser o método educacional para cada grupo, respeitando a diversidade etária de cada aluno. Segundo a coordenadora da Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Colégio Padre Eustáquio (CPE), Schirley Rodrigues, a grade curricular para pessoas adultas deve levar em consideração não só as disciplinas básicas, mas também discussões que ampliem a visão de mundo dessas pessoas. "As expectativas de um adolescente de 15 anos que cursa o ensino regular são diferentes das expectativas de uma pessoa adulta e que ficou 30 anos fora da escola. Então, a grade deve privilegiar aquele educando", esclarece. Geisa também aposta em um método específico como fator de sucesso dentro das salas de aula. "É preciso pensar o modelo de educação para pessoas
idosas e maduras de forma diferenciada, levando em consideração também a educação cidadã", explica. INCLUSÃO SOCIAL Com o objetivo de alfabetizar pessoas de baixa renda que não completaram o ensino fundamental e médio, a EJA surgiu no Brasil na década de 50 com o trabalho de Paulo Freire. Diferente de outros programas, a EJA foi criada não só para ensinar a codificar e decodificar os signos verbais, mas levar ao aluno uma reflexão sobre cidadania e ética. "Ele passa a perceber que faz parte desse mundo, que é sujeito ativo, que pode transformar o mundo", pontua Schirley, coordenadora da EJA do CPE há cinco anos. Assim como em um curso de graduação, são muitos os fatores que levam os alunos a voltarem aos estudos. Porém, neste caso, os estudantes nem sempre são aposentados e dispõem de tempo livre. Para Geraldo Martins, 43 anos, encarregado de hortifrutigranjeiros, a volta aos estudos ocasionou três promoções no tra-
balho em apenas dois anos e meio. "Na empresa que eu trabalho tinha muitas oportunidades. Então, eu pensei: Vou ter que vencer na vida também, porque eu não posso ficar parado no tempo. A evolução vai e eu não quero ficar", reflete o estudante da 8ª série. Além do salto profissional, Geraldo avalia outros ganhos. "Quando temos estudo, as pessoas passam a nos respeitar, a nos tratar como ser humano", alegra-se. As aulas da EJA acontecem de segunda a sexta no período noturno. O aluno cursa cada série em apenas seis meses. Josefina Vilela, 52 anos, que estava há mais de 32 anos fora das salas de aulas, cursa a 5ª série do ensino fundamental e diz que a EJA foi uma grande oportunidade para voltar aos estudos. Apesar das dificuldades, a estudante não pretende abandonar a escola novamente. "Mesmo com o trabalho cansativo, não me deixo abater. Essa é a oportunidade da minha vida e não pretendo largar", assegura Josefina.
14 Meio Ambiente
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Dezembro • 2008
MAIOR RESPONSABILIDADE AMBIENTAL Consumidores e empresas de variados portes se preocupam cada vez mais com o uso consciente dos recursos naturais e pensam formas de reaproveitar materiais que antes eram jogados fora DIANA FRICHE
n DIANA FRICHE, 3º PERÍODO
A responsabilidade ambiental passou a fazer parte da filosofia de várias organizações, de pequeno a grande porte. Apesar de possuir poucos recursos para realizar projetos ambientais, empresas menores fazem sua parte apostando em pequenas ações. É o caso da Vina Gestão de Resíduos Sólidos e Locação de Equipamentos, que em 2006 montou o Escritório Reciclado e Reutilizado, um projeto do Departamento de SócioAmbiental. Cláudia Pires Lessa, coordenadora do Departamento, conta que a idéia surgiu quando a empresa, em 2002, viu a necessidade de dar sua contribuição à sociedade através de ações que dessem apoio e incentivo à pesquisa e à inclusão social. O setor foi crescendo e, em 2005, surgiu a necessidade de se criar um espaço na empresa que fosse coerente com o seu objetivo e foi aí que surgiu o Escritório Reciclado. O escritório possui o ambiente todo montado com móveis e acessórios reutilizados e reciclados e foi produzido com inclusão social. Parte dele foi produzido pela Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Material Reaproveitável (Asmare) e outra parte pelo Instituto Reciclar T3,
Cláudia Pires Lessa mostra peças do Escritório Reciclado, ambiente montado com acessórios reutilizados e reciclados organização não governamental que promove o desenvolvimento de produtos eco-sustentáveis. Cerca de 90% do escritório foi produzido com resíduo, gerando renda para grupos de inclusão social. “Nosso foco principal é a educação, pois não adianta
desenvolver tecnologias 'limpas' se quem for utilizá-la não tiver incutido valores sócio-ambientais, como o consumo consciente e a não geração de resíduos”, conta Cláudia. Ela acredita que as pessoas estão mais conscientes da importância da reciclagem, mas
precisam agir mais. “Precisa passar do discurso para as pequenas práticas do dia-a-dia. Aos poucos a onda vem crescendo. Está na moda a consciência ecológica e, aos poucos, está causando transformações e quebrando paradigmas”, completa.
A ArcelorMittal, maior siderúrgica do mundo, é um exemplo de como uma empresa grande pode obter sucesso investindo em responsabilidade ambiental. A empresa implementou sistemas de gestão ambiental em todas as suas unidades de produção. A siderúrgica é referência quando o assunto é a realização de atividades com baixo impacto ambiental. Além de aplicar estes ideais nas ações, a empresa faz uma grande divulgação de sua política de preservação do meio-ambiente para seus funcionários. “A AcelorMittal divulga para a gente sua política através do jornalzinho de circulação interna. Para o público externo, ela promove alguns concursos, como o desenho para as crianças, que aborda o tema”, conta Marcelo Cardoso, funcionário em uma das usinas da empresa. Ele completa dizendo que todos os empregados da ArcelorMittal tem consciência sobre a necessidade de preservação do meioambiente. Alguns consumidores procuram buscar informações do histórico da empresa, para verificar se há projetos relacionados ao tema meio-ambiente. Atualmente, este tipo de consumidor recebe o nome de con-
sumidor responsável. A advogada Ângela Fonseca, 51 anos, faz parte deste grupo de pessoas. Ela conta que observa nos rótulos e embalagens dos produtos a existência de práticas para diminuir os impactos no ambiente. “Como eu faço as compras de supermercado lá para a casa, procuro observar os produtos, principalmente os de limpeza”, afirma. Ângela diz ainda que sua família também é adepta da coleta seletiva, separando o lixo orgânico, como restos de comida, das latas, vidros e papéis. O estudante de biologia André Lopes de Oliveira, 22 anos, conseguiu colocar em prática algumas formas de preservação aprendidas em sala de aula. André conta que, desde que se conscientizou quanto aos estragos que o homem pode fazer na natureza, ele mudou alguns de seus hábitos. “Passei a comprar só papel reciclado para fazer trabalhos da faculdade. É mais caro, mas vale a pena”, enfatiza. André espera que, nos próximos anos, a população tenha mais responsabilidade com o ambiente em que vive. “Não consigo entender como até hoje tem gente que joga lixo no chão. Acho que, para preservar a natureza não é necessário grandes ações, deve começar com essas pequenas coisas”, diz.
Blog mostra alternativas sobre economia solidária O Blog do Desperdício, criado em 2007, é um site elaborado pela arquiteta Lúcia Martins Campos, que mora em Santo André, no ABC paulista, e possui vasta experiência na área ambiental. O blog trata de assuntos relacionados a reciclagem, mostrando dados, curiosidades e alternativas para o problema. Lúcia começou a pensar no assunto há dez anos, quando assistiu o curta-metragem “Ilha das Flores”, que retrata a
sociedade do consumo. “Fiquei totalmente impactada ao assistir o filme. Estava preparando uma tese de mestrado sobre outro tema, mas percebi que precisava colaborar com problemas como este”, conta. Pouco tempo depois de ver o filme, a arquiteta foi trabalhar em uma empresa de consultoria de engenharia ambiental, que fazia projetos de aterros sanitários e projetos de reintegração paisagística de áreas
degradadas pela disposição incorreta de resíduos domésticos, industriais e urbanos. “Foi quando eu comecei a entender sobre o problema ambiental e as tecnologias que estão sendo desenvolvidas hoje em dia”, recorda. Lúcia lembra que a criação do blog foi incentivo de um amigo economista que trabalha com o tema “economia solidária” e que tem um blog sobre auto-gestão. “Ele me mostrou como era fácil e inte-
ressante. Não tinha vontade de fazer um diário pessoal num lugar público como a internet. Mas achei bom tornar pública minhas preocupações”, afirma. O Brasil é o primeiro país no ranking de reciclagem de alumínio, com 94,4% do material reaproveitado, segundo dados da Associação Brasileira de Alumínio (Abal). Lúcia considera este fator muito importante para o país, já que através da reciclagem as
empresas não precisam extrair a matéria-prima da natureza. “O dado é legal, mas reflete como a reciclagem no Brasil é um mercado apropriado sobretudo pela população de baixa renda, que infelizmente não encontra alternativas para sobreviver, vão catar latinhas nas ruas e as vendem por preços muito baixos”, ressalta. Ela diz ainda que este fator se deve à praticidade do material. “O alumínio foi apropriado pois ele é um dos ouros da reciclagem.
É um material que não se mistura, é fácil de ser limpo, armazenado e comercializado”, garante. Sobre o blog, Lúcia conta que não tem controle sobre as pessoas que o acessam e que só fica sabendo quem leu quando elas retornam com comentários, que podem ser feitos ao final de cada matéria. Porém, ela acredita que a interação dos leitores poderia ser maior. “Apesar de eu buscar essa troca quando escrevo, ela ainda não aconteceu como eu esperava”, declara.
Qualidade do ar em BH pode reduzir a expectativa de vida n BRUNA SANTOS, MARCELA CARVALHO, VICTOR HUGO ANTINOSSI, 7ºPERIODO - TEXTO E FOTO
“Meu deus, é muita coisa”, afirma assustada a estudante Jordana Dornas ao saber que pode viver até um ano e meio a menos por causa da poluição atmosférica. Esse dado consta do resultado de uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), que analisa a qualidade do ar em Belo Horizonte e outras cinco capitais brasileiras. Jordana não vê, mas sente na pele os problemas causados por essa poluição. Em certas épocas do ano, e em dias muito secos, ela já sabe o que a espera: “Dor de cabeça, olhos e nariz irritados e espirros o dia inteiro. E não sou só eu, é a família inteira”, conta. A rinite da estudante e outras doenças relacionadas à condição atmosférica das cidades levantam
a questão: sobre como está o ar respirado pelos belo-horizontinos. De acordo com a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), a qualidade do ar na Região Metropolitana é boa na maior parte do ano e regular nos períodos de inversão térmica (julho e agosto, principalmente). Dez estações monitoram o ar da capital o dia inteiro com motores que captam partículas PM-10 – ou seja, de tamanho dez vezes maior que a milésima parte de um milímetro, que é conhecida como PM. É aí que está o problema. De acordo com o coordenador da pesquisa em Belo Horizonte, o professor da Faculdade de Medicina da UFMG, Geraldo Brasileiro Filho, as partículas mais prejudiciais à saúde são aquelas abaixo desse índice. “São as partículas inferiores a PM-2,5 que penetram nos alvéolos, no fundo dos pulmões, e provocam doenças graves como asma e bronquite”, explica o professor. No final de 2006, a Organização Mundial de Saúde
(OMS) divulgou novos padrões de análise da qualidade do ar. A média diária de partículas presentes no ar passou de 150 micrômetros por metro cúbico (g/m³) para 50. Os novos padrões, porém, ainda não foram adaptados ao Brasil. Em Belo Horizonte, com os aparelhos que captam as partículas de PM10, a taxa fica em torno de 30 g/m³. Porém, com aparelhos que medem PM-2,5, como o usado pela pesquisa, constata-se que os índices ficam muito acima do recomendado pela OMS. Era isso que os pesquisadores queriam descobrir. “Queríamos saber como realmente está o grau de poluição atmosférica para saber se está no limite dos valores recomendados”, diz Geraldo Filho. A pesquisa começou em abril de 2007 e acontece também em Curitiba, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. A coleta de material é feita através de uma bomba de sucção de ar, de forma que as partículas ultra-finas ficam coladas em um filtro, presente no aparelho. “A estimativa, de acordo
com os dados preliminares cruzado com dados da própria OMS, é que a expectativa de vida seja reduzida em até um ano e meio”, constata o pesquisador. Álvaro Martins, da Gerência de Qualidade do Ar da Fundação Estadual do Meio Ambiente, alerta que os maiores responsáveis pela emissão de poluentes na atmosfera de Belo Horizonte são os veículos, sejam eles carros, motos, ônibus ou caminhões. Na comparação com as indústrias, por exemplo, os veículos emitem mais de 97% do óxido de nitrogênio e monóxido de carbono presentes no ar da capital. A saída, segundo o técnico, está na inspeção veicular, uma vez que veículos desregulados são grandes contribuidores para a poluição do ar. Além disso, o incentivo de transportes alternativos e a construção de veículos que emitam menos poluentes também ajudam. Por fim, a velha receita da carona e do ônibus também continuam valendo. “Sempre que possível, faça o uso mais racional do veículo particular, buscando sempre dar carona
Geraldo Filho é coordenador da pesquisa realizada sobre a qualidade do ar para conhecidos. Sempre que puder, utilize também o transporte coletivo”, finaliza o técnico. "A mucosa do aparelho respiratório é muito sensível e a exposição é muito grande", afirma o pneumologista Eliazor Caixeta. Segundo ele, o resultado da pesquisa já é esperado porque o aumento da poluição gera processos alérgicos - respiratórios ou dermatológicos - causando inflamações irritativas. Eliazor também cita a questão dos idosos. Segundo ele, as pessoas da terceira idade sofrem mais com o aumento da
poluição por apresentarem outras complicações. As lesões no sistema respiratório causadas pelos processos irritativos podem levar ao remodelamento das vias aéreas. Além disso, "20 a 50 % dos casos de pneumonias levam à morte", diz Eliazor. Segundo ele, não há dúvidas quanto aos resultados parciais da pesquisa realizada pela UFMG, em parceria com a USP. "Está registrado na bibliografia internacional que o aumento da poluição acarreta em aumento das doenças respiratórias e, conseqüentemente, na qualidade de vida das pessoas", diz.
Esporte
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Dezembro • 2008 jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas • jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas • jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas • jornalmarcolaboratóriodocursodejornalismodapucminas
DE MINAS AO SUL EM UMA BICICLETA O cicloturista e vigia do Museu Histórico Abílio Barreto, José de Castro, se aventurou a percorrer de BH à capital catarinense, Florianópolis. Para chegar ao seu objetivo, ele pedalou 1301 km. YONANDA DOS SANTOS
Blumenau (SC), Balneário de Penha (SC), Balneário Piçarras (SC) e Curitiba (PR). “Antes da viagem a Floripa, a maior que eu havia feito de bicicleta era de 370km até Santo Antônio do Porto, próxima a Governador Valadares”, ressalta.
n PATRICIA SCOFIELD, 6º PERIODO
O visitante que passa pela portaria do Museu Histórico Abílio Barreto, na Regional Centro-Sul de Belo Horizonte, não imagina que o vigia terceirizado de 33 anos, José de Castro, se dedique, há 9 anos, a uma atividade que exija tantos movimentos com as pernas, preparo físico e resistência: o cicloturismo, modalidade de ciclismo voltada para o esportista conhecer cidades turísticas. Lá no museu, ao contrário, José exige pouco de seu vigor físico. Fica a maior parte do tempo sentado por detrás da bancada na recepção, olhando a movimentação registrada pela câmeras de circuito interno de tevê, recebendo pacotes de encomendas e encaminhando os visitantes. Em suas férias em julho e agosto deste ano, José viajou de bicicleta de Belo Horizonte até Florianópolis (capital do estado de Santa Catarina, sul do Brasil), numa viagem que durou vinte dias, sendo que só para ir, ele pedalou durante cinco dias, exceto nos horários da noite. A proporção real da distância pedalada José revela ter percebido apenas na volta, em um ônibus de viagem, durante 15 horas. “Escolhi um lugar bem longe porque quis
O cicloturista José de Castro exibe a companheira de aventura, a bicicleta ficar pedalando todo os dias”, explica José. E completa: “Não tinha a noção de que estava longe. Só percebi quando fiquei preso entre as 'paredes' do ônibus. As pistas são muito boas”, destaca, referindo-se pelas rodovias por onde passou: BR-381 (Rodovia Fernão Dias),
BR-116, BR-367 e BR-101. DESCOBERTAS A aventura teve 1301km até a capital de Santa Catarina. José aproveitou a oportunidade para conhecer mais locais no sul do país, a exemplo de Joinville (SC), Balneário de Camboriú (SC),
VER O MAR A escolha do destino teve outros motivos especiais para ele. José não conhecia o mar e quis planejar esse momento de forma que acontecesse em um lugar bem bonito. “Meus amigos me falavam que Floripa é muito bonito mesmo e que vale a pena ir. Juntei isso com o fato de eu não nunca ter ido ao mar”, comenta. A princípio, José pensou em ir pedalando para alguma praia do estado do Espírito Santo, conhecidas como “praias de mineiro”. “Eu não queria ser mais um nessas praias que mineiro vai, então escolhi Florianópolis”, diz. A experiência de conhecer o mar foi linda, segundo José de Castro. “Eu pus a água na boca para ver se é salgada mesmo como dizem”, relembra. Ele conta, achando graça, que entrou no mar com a bermuda de ciclismo, com vergonha de mostrar as pernas parte bronzeadas, parte brancas.
“Se eu fosse de sunga, o pessoal ia me perguntar se eu não ia tirar a meia-calça. Fiquei constrangido de usar no meio de muita gente”, adianta, sorridente. José salienta que conheceu todas as praias da ilha de Florianópolis, e que gostou tanto que nadou só um dia, em Balneário de Camboriú, tendo preferido fotografar os pontos turísticos nas cidades por onde passou. “Já fiquei até acostumado em ver olhos azuis e verdes”, comemora. Só nessa cidade, ele pedalou 400km de um ponto turístico a outro. José recorda da sorte que teve nessa viagem, em relação ao tempo. Não choveu dia nenhum e o frio ele só sentiu
no último dia da aventura. José de Castro relembra que aprendeu a pedalar na exFebem, Fundação do BemEstar do Menor, quando era criança. Ele foi deixado lá pela mãe, que, de acordo com José, parece ter perdido os laços maternais em relação a ele e não demonstra interesse pela atividade esportiva do filho. Apesar disso, José não a critica. “A mãe nunca dá bola, não tem nem interesse em ver foto, mas é o jeito dela. Já o meu jeito de viver é radical”, explica. Hoje, José mora com a mãe e a sustenta juntamente com a irmã, Cristina. Dos irmãos que moram em São Paulo, ele sequer tem notícias.
RAPHAEL NASCIMENTO
A meta é gastar pouco e ter história para contar Durante o planejamento da viagem, José de Castro pesquisou pousadas ou hotéis com diárias baratas, de R$30 ou R$40 e tratou logo de verificar se era permitido guardar sua companheira de viagem, a bicicleta de corrida que custa R$3 mil, dentro de seu quarto – pré-requisito para que ele se hospedasse. O custo total foi de R$1.600, sendo que ele fazia duas refeições por dia, com o gasto de R$10 no almoço e outros R$10 no jantar, além do refrigerante. O esportista contou com o apoio da Belotur (Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte), que pagou parte de suas despesas em dez dias, tempo que ela havia programado para ficar por lá e voltar, inicialmente. Ele recebeu uma camisa com a
frase “BH espera por você”, e brinca que fez uma baita propaganda para a cidade nos locais onde passou. José esclarece que a volta foi em ônibus porque o dinheiro dele já havia ficado escasso, já que acabou ficando no sul brasileiro por quase 20 dias, em vez dos somente 10 dias que ele foi patrocinado pela Belotur. José também teve uma ajuda material de uma loja de esportes radicais localizada quase em frente ao Museu Histórico Abílio Barreto: duas camisas específicas para a prática de ciclismo. Outro “amigo” do esportista que o ajudou a pensar nessa viagem, já está velhinho e o acompanha todos os dias no serviço no museu. É uma revista de mapas, já até sem capa, que
ele ganhou de um amigo. “É um livro que mostra o Brasil inteiro, mais interessante porque mostra a distância entre municípios e capitais em outros estados do país, apesar de ser bem antigo. Já até arranquei a capa”, confirma. BAGAGEM O cicloturista revela os cuidados que teve para a viagem: em apenas uma pochete ele carregou três camisas (duas da loja de turismo de aventura e outra dada pela Belotur), uma bermuda, um frasco de 200ml de protetor solar fator 30, escova de dente e a pasta dental, máquina fotográfica digital e o carregador de pilha, celular e o carregador de bateria de celular, além de garrafinha com água. “Pedalo quase 50km sem beber água,
e como só depois de uns 100km pedalados”, afirma José, destacando sua resistência. Ele revela que nunca fez exames médicos regulares, apesar de saber da importância dos mesmos. “Busco muito Deus, e sinto que estou bem de saúde”, expressa, tentando justificar o motivo da falta de check-up. EM FAMÍLIA No início, foi a irmã Cristina quem o ajudou, com um cheque, a comprar uma bicicleta em uma loja de conveniência de um shopping em BH. “Minha irmã gosta do meu hobby, acha maravilhoso”, garante o esportista. Cristina de Castro acrescenta que o irmão tem costume de viajar, mas não para tão longe quanto Florianópolis. E completa: “Ele é muito aventureiro, fico
até preocupada porque ele viaja sozinho. Para ele é bom, porque ele gosta, mas para a gente é ruim pela segurança”. Cristina, que afirma não saber pedalar, revela ainda que os locais que o irmão dela costuma ir pedalando, ela nunca conheceu nem de carro. ENTRE AMIGOS “Zé da bike” (bicicleta, em inglês), como é conhecido por alguns amigos do serviço, virou tema de assuntos no museu. Um amigo de José, motoboy, estacionou sua moto em frente à portaria exclusivamente para saber detalhes da última viagem do amigo, que preferiu marcar um batepapo para dois dias depois, no dia em que pudesse levar uma cópia das fotos digitais que ele fez durante as férias.
A auxiliar do ateliê de restauração e conservação do Museu Histórico Abílio Barreto, Luciane Machado, ficou de longe observando o colega de casa contar seus relatos. Mais tarde ela se aproximou e quis saber onde ele pedalava na falta de um acostamento na estrada, quantas marchas tinha a bicicleta que ele pedalou e quais os bichos que ele viu pelo caminho. “Já vi na tevê outras pessoas que fazem esse esporte, é muito individual. Achei muito interessante a disposição dele de fazer uma viagem tão longa, que é a primeira vez que ele sai do estado (Minas Gerais)”, expressa Luciane. “Eu gostaria de acompanhá-lo, mas não tenho preparo, resistência”, salienta, com um sorriso largo.
Paixão por pedalar leva porteiro a planejar viagem até Porto Alegre A próxima aventura de José é pedalar ainda mais longe, até a capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Até a capital gaúcha, são 1.715km a serem pedalados nas próximas férias em que não haja chuvas por lá. O roteiro já está pronto e dividido em sete etapas que abrangem paradas a cada 200km, aproximadamente, nas cidades de Três Corações (MG), São Paulo (SP), Cajati (SP), Joinville (SC),
Paulo Lopes (SC), Vila Conceição (SC), além da própria cidade de Porto Alegre. A previsão de gastos é de, em média, R$70 /dia. “Quero agora é conhecer lugares bem mais distantes, tudo de bicicleta pela primeira vez, enquanto eu tiver força e saúde”, garante José. E as metas não são nada modestas: Fernando de Noronha (PE), divisa do Rio Grande do Sul com a Argentina e com o Uru-
guai, dentre as imaginadas pelo ciclista. Mas sair do Brasil já é o limite para ele, que teme pela “destruição, pelas guerras, além de não saber como funciona a moeda de cada país”. O encantamento de José pelo sul do Brasil o faria até mesmo morar na cidade que ele mais admirou pelas paisagens: Curitiba, capital do Paraná. A explicação, para ele, é bem simples: “Lá é tudo largo, parece
que não tem engarrafamento, e as ruas são todas com flores. Se eu tivesse emprego em Curitiba, não voltava mais para cá”. O ciclista resume sua experiência das férias de julho com fascinação. “A natureza floresce com mais vida no sul do Brasil”. E completa: “Acho o Sul a maior riqueza. Tem muito luxo nas construções e o jeito de falar é bem diferente”, imagina.
16 Cidadania
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Dezembro • 2008
MÚSICA TRANSFORMADORA DE VIDAS Grupo de folclore Meninas de Sinhá, que começou como oportunidade de distração para suas integrantes, gerou frutos diversos como apresentações fora de Minas, premiações e gravação de CD n LUIZ CARLOS OLIVEIRA, ROSSANA SOUZA, TACIANA LEMOS,
tive dois filhos só e eles saiam para a rua e eu ficava sozinha. Até que um dia eu resolvi ir. No início, eu ficava só reparando, só de longe. Depois, eu comecei a enturmar. Hoje, eu me sinto bem no meio. Só de sair de casa, já está distraindo”, afirma.
7º PERÍODO - TEXTOS E FOTOS
Maria Gonçalves, 70 anos, ocupava todo o seu tempo cuidando de um filho. Já Maria das Graças vivia uma fase delicada em sua família e chegou a ter depressão. A história de vida dessas duas mulheres mudou depois que entraram para o grupo “Meninas de Sinhá”, que conta hoje com 35 integrantes e já viajou por vários lugares do Brasil levando o resgate das cantigas de roda e do folclore mineiro. Além disso, as Meninas de Sinhá também já gravaram um CD e ganharam prêmios. “Se você me perguntar como a gente chegou até aqui, eu não sei te dizer. Não pensava que fosse acontecer isso tudo. Eu não sei explicar como a gente conseguiu prêmio, viagem, reconhecimento”, afirma Valdete da Silva, 70 anos, idealizadora do grupo, que surgiu no Bairro Alto Vera Cruz, na Zona Leste de Belo Horizonte, inicialmente como forma de tirar as mulheres de casa e lhes dar uma ocupação que pudesse reduzir doenças. “Entrei no grupo não foi tanto por causa de problema. Eu era uma pessoa alegre. Eu ficava dentro de casa mesmo, porque eu tenho um menino
Maria Gonçalves e Maria das Graças contam que o grupo lhes deu a oportunidade de ocuparem o tempo fora de casa que tem problema. Eu só olhava o lado dele, não olhava o meu. Achava que só ele precisava de carinho, que eu não precisava sair. Então eu ficava ali”, conta Maria Gonçalves, que um dia foi a uma aula de expressão corporal. Logo no primeiro dia Valdete lhe deu uma roupa do grupo. “Fiquei muito alegre. Aí, falei ‘Nossa! Agora vou entrar nesse grupo mesmo’. Aí, eu comecei. Tinha uma apresentação fora, aí eu cheguei e falei ‘não vou nessa não, porque ainda não estou bem’. Aí, eu ia,
olhava a apresentação delas e ficava doidinha para entrar, dançando sozinha e elas lá na roda. E depois que eu comecei a acompanhar. Entrei na aula de expressão corporal, entrei na percussão, comecei a tocar, hoje eu toco zabumba”, contou Maria Gonçalves, que há oito anos é uma das integrantes do conjunto. Para Maria das Graças, o grupo Meninas de Sinhá, ajudou na recuperação de sua depressão, porque possibilitou a vivência de momentos de alegria e descontração que não aconteciam em casa.
“Quando eu entrei no grupo, eu ainda estava naquela fase de não querer ver ninguém na minha frente e sinto ainda um pouco até hoje. Eu ficava muito presa dentro de casa e podia chamar quem fosse que eu não abria a porta. E tinha o hábito de por qualquer coisa chorar. Às vezes só de ouvir a música, eu já chorava”, lembra. Ela conheceu o grupo por meio de uma vizinha que a convidou. Por ser muito tímida, Maria das Graças conta que custou a aceitar. “Ela me via chorar sozinha, porque eu
LONGA CAMINHADA Até o grupo Meninas de Sinhá se tornar realidade o trajeto percorrido foi longo. Tudo começou quando Valdete da Silva constatou que muitas mulheres do Alto Vera Cruz iam ao posto de saúde local para tratar de depressão à base de medicamentos. “Elas saiam do centro de saúde com sacolas de remédios. E eu ficava preocupada, pensando porque que essas mulheres tomam tanto remédio”, conta Valdete, que passou a conversar com elas para entender o que acontecia. Valdete revela que ficou com isso na cabeça e com uma vontade grande de ajudar. Como era vice-presidente da Associação Comunitária levou o caso para a diretoria da entidade. O passo seguinte foi chamar as mulheres para “bater papo” na associação. Com dificuldade, depois de muitas idas ao Centro de Saúde, Valdete conseguiu reunir três senhoras, já que a maioria não aceitava seus convites, que trocavam experiências e
falavam de seus problemas. Mais mulheres foram se unindo ao bate-papo, mas Valdete percebeu, no entanto, que somente conversar não estava dando resultado, já que elas continuavam a tomar seus remédios. Buscando outra alternativa para melhorar a auto-estima daquelas mulheres, Valdete sugeriu que fosse feita uma oficina de artesanato. Procurando saber a habilidade de cada uma para o trabalho manual, as senhoras começaram a produzir bonecas e tapetes. “Elas começaram até a vender, ganhar um dinheirinho e tal. Mas não estavam melhorando”, relata Valdete, que se incomodou com um ponto. “Estava tirando as mulheres de casa, porque elas trabalhavam o dia inteiro e estava trazendo para trabalhar de novo”, explica Valdete, que concluiu que as mulheres precisavam de alguma coisa diferente do que estavam acostumadas a fazer. Foi aí que ela fez uma aula de expressão corporal em uma Ação Global, evento assistencial promovido pela Rede Globo no Alto Vera Cruz, e com a ajuda da professora passou a trabalhar isso com as mulheres do seu grupo, que a essa altura se chamava Lar Feliz.
A descoberta do estilo para interpretar cantigas Em um evento chamado Tambor Alto, que aconteceu no Alto Vera Cruz, o grupo Lar Feliz foi convidado a se apresentar, em um palco montado para exibições de dança e música. “Quando a gente estava esperando para se apresentar, uma das senhoras chegou perto de mim e falou: ‘Valdete, nós não vamos subir ali não. De jeito nenhum’. Então, eu respondi: ‘Nós vamos sim. É a primeira vez que vamos apresentar, vamos subir lá no palco e mostrar nossa
expressão corporal e vamos ser muito aplaudidas’. Eu falava isso da boca para fora, porque dentro de mim, estava igual a elas, morrendo de medo do que poderia acontecer”, conta. Apesar de toda a insegurança, Valdete lembra que ao término da apresentação veio o aplauso. “O pessoal gritava e batia palma. E a senhora que menos queria se apresentar virou para mim, pôs a mão na cintura e falou: ‘Viu minha filha, nós somos artistas’”, recorda. “E
daí em diante, a gente passou a apresentar expressão corporal nas conferências. A gente fazia a expressão corporal e o povo todo fazia com a gente. A prefeitura ia chamando a gente e íamos apresentando”, acrescenta. As cantigas de roda entraram no grupo depois que Valdete propôs, após uma reunião, que elas brincassem como na infância. “Comecei a notar que quando falava roda todo mundo queria. Eu falei: ‘gente, não é que a roda está presente
na vida dessas mulheres’. Porque a maioria delas é da cidade do interior. São poucas que são de Belo Horizonte. Então, eu propus para elas que a gente combinasse de formar um grupo de brincadeiras de roda. E elas aceitaram”, conta. As músicas cantadas passaram a ser gravadas, para que o grupo criasse um repertório. Depois, foi feita uma apostila. Cada senhora integrante do grupo relembrou as músicas de roda da
infância e contribuiu para a montagem da apostila. “A gente ensaiava os versos, ensaiava os cantos de roda. E ia gravando. Foram trazendo mais músicas de canto de roda. Nós começamos, toda sexta-feira a gente ensaiava as cantigas de roda”, afirma Valdete. “Quando já estava tudo pronto, ensaiado e tal, falaram comigo assim: ‘Valdete, nós temos que mudar o nome do grupo, esse nome Lar Feliz não serve para gente mais’. Aí,
eu pedi para elas fazerem uma pesquisa de um outro nome e nessa pesquisa foi descoberto que tinha um grupo, aqui, no Alto Vera Cruz, de dança de Makulele, que eu lembro que meus filhos participaram desse grupo, que chamava Meninos de Sinhá. E o grupo acabou. Ai elas falaram: ‘Vamos pôr meninas? Em vez de meninos, Meninas de Sinhá”, relembra Valdete.
Grupo Netinha de Sinhá recebe incentivo das avós Ao ver suas próprias netas brincando e cantando cantigas de roda, Valdete da Silva deu a idéia de fazer um grupo das “netinhas de sinhá”. Débora Cordeiro dos Santos, 21 anos, é a atual monitora do grupo das netinhas e conta que elas viam a apresentação das avós e tiveram vontade de montar um grupo, formado, atualmente, por 20 meninas entre 8 e 14 anos. Débora afirma que, quando conheceu o grupo as meninas estavam tristes, não dançavam e nem cantavam com vontade. Depois começaram a trabalhar e montaram coreografias. Perceberam a diferença e levaram para a família ver. “Acreditavam que estavam no caminho certo e acabaram
criando o próprio espaço”, diz. “O que mais conta é a emoção de cantar e de continuar o trabalho das avós, o carinho e a união do grupo”, acrescenta. Neta de Valdete, Débora organiza as apresentações, faz as marcações e vai aos lugares. Conta que aprendeu com a avó Valdete. Fez muitos anos de dança e colocou a dança no grupo, combinando coreografias de dança infantil e as brincadeiras. Misturou também a dança afro com as cantigas de roda. Para ela, as cantigas de roda são do tempo das avós e para ter uma cara atual, das Netinhas de Sinhá, precisava de outros ritmos, como o funk e a dança afro. “Tem percussão, coreografia
e agora, durante as apresentações, elas dançam”, diz No começo, as meninas tinham medo do preconceito das pessoas do bairro, mas logo perceberam a admiração delas e até o aumento pelo interesse de outras netinhas. É assim que elas se organizam, as mais velhas vão ensinando às mais novas, e possuem até uma lista de espera. “Como o grupo possui uma capacidade, e também horários de ensaio, fizemos uma lista de espera, que só aumenta o número de interessadas”, afirma. Kênia Severina, 12 anos, participa há cinco do grupo e conta que desde pequena já acompanhava a avó. Acha que se desenvolveu rápido e que
A monitora do grupo Netinhas de Sinhá, Débora Corediro dos Santos acompanha os ensaios do grupo de 20 meninas aprendeu muito cantando, dançando e fazendo oficinas de bordado. Já foi muito tímida, principalmente durante as apresentações. “O funk é o mais legal, e fala da nossa identidade, de onde a gente mora, e do nosso orgulho”, revela.
Jucilane Jales, 13 anos, entrou com apenas três para o grupo. Participava dos ensaios porque na época o pai havia falecido e não havia ninguém para cuidar dela. Dona Valdete conversou com sua avó e a colocou no grupo. A
menina conta que acha bom estar no grupo atualmente, porque aprendeu a se abrir mais com os amigos e com a família. Os colegas falam, caçoam, mas ela diz que primeiro tem que conhecer o grupo para saber como é.