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O Ano Litúrgico da Igreja
O ANO LITÚRGICO DA IGREJA
Introdução
Nossa vida se relaciona com o tempo. Organizamos nosso dia a dia de acordo com as horas, os dias, as semanas, os meses, o ano, as estações. A própria natureza nos ensina que o tempo é decisivo no planejamento do dia a dia. Quem vive no campo sabe que as plantas se comportam de acordo com as estações. Há um tempo certo para semear, para cultivar e para colher. O tempo com seu ritmo e ciclos, entre variações e repetições, nos ajuda a viver melhor, de forma mais estruturada. O tempo não é nosso, é fruto da ação divina. Em Gênesis 1, observamos como Deus põe ordem no caos, dando vida ao universo, por meio da organização do tempo: manhãs, noites, dias, estações. O tempo é um presente de Deus! A vida da igreja também se desenvolve por meio da estruturação do tempo. Por isso surgiu o que chamamos de Ano Litúrgico ou, como também é conhecido, Ano Eclesiástico ou Ano da Igreja.
O Ano Litúrgico: como surgiu?
O Ano Litúrgico é a forma como a igreja organiza suas festas e seus dias de culto, incluindo simbologias e cores para cada época e dia festivo. Mas essa organização não surgiu de repente, nem foi criada por uma mente bem-intencionada. Ela possui uma história, uma origem e uma função. Jesus Cristo é o centro da pregação do evangelho e da fé cristã. É sua vida e seu testemunho, desde o seu nascimento até a sua morte e ressurreição, que determinaram a organização do Ano da Igreja. O Ano Litúrgico está dividido em um calendário que apresenta a ordem das celebrações, de acordo com as festas de cada ciclo do Ano Litúrgico. Esse calendário, diferentemente do calendário civil, inicia com o Primeiro Domingo de Advento, período que nos prepara para a primeira grande festa cristã, que é o nascimento de Jesus.
Páscoa: origem do Ano Litúrgico
Após a morte de Jesus, seu grupo seguidor manteve-se unido por causa da fé na ressurreição do seu Senhor. Confiantes de que Jesus estava presente em seu meio pelo poder do Espírito Santo (Atos 2), essas pessoas perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações (Atos 2.42).
Conforme lemos em Atos 20.7 e confirmamos em documentos do primeiro século da história cristã, a reunião comunitária em torno da palavra de Deus e do partir do pão acontecia no primeiro dia da semana, o domingo, o dia da ressurreição! A cada domingo, a comunidade cristã dava testemunho da sua fé no Cristo ressurreto, celebrando-o como uma pequena Páscoa semanal, a primeira e mais importante festa da comunidade cristã.
A partir do século 2, a Páscoa cristã tornou-se a primeira festa anual, sendo fixada no início da primavera (outono para nós). Essa festa anual iniciava com a Vigília Pascal, no entardecer do sábado, rememorando a morte de Jesus, e culminava no alvorecer do domingo com a festa da ressurreição. Nessa ocasião, pessoas eram batizadas, pois o batismo significa mergulhar na morte com Cristo e renascer com ele para uma nova vida. Ainda no século 2, a festa da Páscoa ampliou-se para três dias, surgindo o Tríduo Pascal (triduum, no latim, significa três dias), iniciando na Quinta-Feira Santa que lembra a última ceia de Jesus com seus discípulos, juntamente com o lava-pés, seguido da Sexta-Feira Santa, que enfatiza a morte de Cristo na cruz, culminando com o Domingo da Páscoa.
Pentecostes e Ascensão
Também no século 2, as comunidades cristãs recuperaram outro evento importante ligado à Páscoa. Jesus havia prometido enviar o Espírito Santo aos seus discípulos. O evento relatado em Atos 2.1-41 marca o cumprimento dessa promessa. Como um vento impetuoso e línguas como de fogo, os discípulos e as discípulas de Jesus receberam força e coragem para dar testemunho do Cristo ressurreto. Pentecostes tornou-se a segunda festa mais importante do Ano Litúrgico, sendo comemorado como festa do nascimento da igreja. Pentecostes, originalmente, era comemorado junto com a Páscoa, durante os 50 dias do Tempo Pascal, época em que se celebra efusivamente a alegria do Cristo ressurreto, presente por meio do Espírito Santo. Junto com Pentecostes era celebrada também a Ascensão de Cristo, pois se compreendia que Jesus, antes de enviar o Espírito Santo, foi elevado aos céus, permanecendo invisível, conforme Atos 1.6-11. Mais tarde, no século 4, essas duas festas foram separadas. Pentecostes foi fixado no 50º dia do Tempo Pascal e o dia da Ascensão no 40º dia depois do Domingo da Páscoa.
Resumindo, desde a Quinta-Feira Santa até o 50º dia após o Domingo da Páscoa (dia de Pentecostes) forma-se o Tempo Pascal, que se tornou o primeiro ciclo do Ano Litúrgico. Mais tarde esse ciclo foi ampliado com a Quaresma. O núcleo central desse ciclo é a Páscoa.
Natal e Epifania
Também no século 2, outros fatos da vida de Jesus Cristo passaram a ser recuperados e festejados. A comunidade cristã passou a olhar para os inícios da vida daquele que era o centro da mensagem da Páscoa cristã e fixou as datas de nascimento, apresentação de Jesus no templo, batismo, e primeiro milagre de Jesus. Surgiu, assim, a festa de Epifania (que significa manifestação, revelação), a qual era celebrada em 06 de janeiro.
A partir do século 3, a data do nascimento de Jesus foi separada. Havia uma festa muito celebrada pelo Império Romano, no dia 25 de dezembro, de adoração ao Sol (natalis solis invicti = nascimento do sol invencível). A igreja cristã de Roma fixou essa mesma data como Natal de Cristo, o dia do nascimento do verdadeiro Sol da vida das pessoas cristãs. O dia 06 de janeiro permaneceu como o dia de Epifania, dando ênfase à visita dos magos do Oriente a Jesus e o batismo de Jesus. Epifania e Natal formam, portanto, o segundo ciclo do Ano Litúrgico.
Quaresma e Advento
No século 4, os dois ciclos do Ano Litúrgico, o da Páscoa e o de Natal, foram ampliados. Primeiro surgiu o período de preparação para a Páscoa, chamado Quaresma, iniciando na Quarta-Feira de Cinzas e finalizando no sábado antes da Páscoa. É um período de 40 dias, sem contar os domingos (lembrando que, para a comunidade cristã, cada domingo se celebrava a ressurreição do Senhor!). A Quaresma surgiu com uma função bem específica. As pessoas que seriam batizadas na Páscoa passavam por um processo de preparação intensivo durante a Quaresma, celebrando e aprendendo os principais conteúdos para a vivência da fé. A última semana da Quaresma passou a ter uma ênfase especial, sendo conhecida como Semana Santa. A comunidade cristã celebrava os últimos acontecimentos da vida de Cristo, iniciando com o Domingo de Ramos, lembrando a entrada de Jesus em Jerusalém, a cidade onde ele viveu os seus últimos dias, antes de ser entregue à morte na cruz. Um pouco mais tarde, entre os séculos 4 e 6, à semelhança do período da Quaresma, foi instituído o Advento como preparação para o Natal. Esse é formado pelos quatro domingos antes do Natal. Advento possui duas ênfases: o preparo para receber Deus por meio do menino Jesus e a expectativa pela nova vinda de Cristo e a manifestação final do seu reino.
Outras festas da igreja: o Tempo Comum
Além do Ciclo da Páscoa e o de Natal, a igreja organizou os demais domingos do Ano Litúrgico, dando origem ao ciclo do Tempo Comum. O Tempo Comum está dividido em dois períodos: O primeiro é chamado de Tempo após Epifania, que inicia depois do dia 06 de janeiro e segue até o domingo antes da Quarta-Feira de Cinzas. O segundo período é chamado de Tempo após Pentecostes, que inicia como o Domingo da Trindade, depois do Domingo de Pentecostes, e se encerra com o Domingo Cristo Rei ou Domingo da Eternidade.
Do ciclo do Tempo Comum fazem parte outras festas que variam de acordo com as igrejas. Nas igrejas luteranas celebramos o Dia da Reforma em 31 de outubro, além de outras datas comemorativas que variam de acordo com cada igreja local, nas quais incluímos a festa de Ação de Graças. O Tempo Comum representa a igreja em sua peregrinação diária, com sua missão nesta terra. Esse tempo está ancorado nas grandes festas cristológicas, ou seja, o tempo e a ação da igreja no mundo são iluminados pelo Cristo da Páscoa e do Natal, do crucificado e ressurreto e do encarnado. Resumindo, os três ciclos do tempo litúrgico estão assim distribuídos: Ciclo do Natal: Advento, Natal e Epifania; Ciclo da Páscoa: Quaresma, Semana Santa, Páscoa, Ascenção e Pentecostes; Ciclo do Tempo Comum: domingos após Epifania, Trindade, domingos após Pentecostes, Ação de Graças, Reforma, Domingo da Eternidade ou Cristo Rei.
Refletindo sobre a importância do Ano Litúrgico da igreja
O Ano litúrgico serve para organizar a vida de culto da igreja e orientar sua pregação. Ele ajuda a igreja a não se desviar daquilo que lhe é decisivo. E o mais importante, ao colocar a Páscoa como festa central, o Ano Litúrgico preserva o fundamento da nossa fé: o Cristo crucificado e ressurreto. Isso significa que é a partir desse núcleo que devemos olhar para todas as demais festas da igreja. O Natal só tem sentido se enxergamos no menino da manjedoura o Cristo da cruz. O Espírito Santo, que tomou conta da comunidade seguidora de Jesus em Pentecostes, não é outro senão o mesmo Espírito do crucificado e ressurreto. Com base na experiência da cruz e da ressurreição, a comunidade seguidora de Jesus foi em busca da história do seu Senhor e, à luz dessa sua experiência, ela interpretou todas as passagens da vida de Jesus: seu nascimento, seu batismo, seus milagres, sua pregação, toda a sua vida. A história do Natal está tão relacionada com a história da Páscoa que a igreja, ao organizar o seu calendário, colocou um período semelhante antes da Páscoa e antes do Natal, a Quaresma e o Advento. Ambos com o objetivo de preparar a festa de Cristo, o crucificado e ressurreto, e a criança da manjedoura: o Salvador do mundo, o príncipe da paz. Esse foi o caminho construído pela comunidade cristã das origens. Ela olhou para trás, para a vida de Jesus, e assegurou que o conteúdo central da sua fé fosse passado adiante para gerações futuras mediante uma forma simples e organizada do Ano Litúrgico.
A diversidade do culto por meio das cores e dos símbolos do Ano Litúrgico
Nosso culto é permeado de cores e símbolos. Cada ciclo e festa do Ano Eclesiástico possuem cores e símbolos que ajudam a tornar mais comunicativa a mensagem do evangelho. Os ciclos são caracterizados por uma cor principal. Tradicionalmente, as cores púrpura, cinza, preta, azul (em suas tonalidades escuras e claras) são usadas para os tempos litúrgicos de caráter penitencial e reflexivo como a Quaresma e o Advento. O branco é usado para as festas cristológicas, como Natal e Páscoa, mas o amarelo e o dourado também são válidos para essa ocasião. O vermelho é reservado para as festas relacionadas ao Espírito Santo (Pentecostes, ordenações, Dias da Igreja, Dia da Reforma). E o verde, em tonalidades diversas, é usado para o Ciclo do Tempo Comum. Essas cores são, em geral, utilizadas nos tecidos dos paramentos, mas também podem se expressar nas velas, nas flores e em outros símbolos. O que são os paramentos? São parte da ornamentação do templo, a casa de Deus, e são ricos em significados simbólicos e fazem parte da nossa linguagem tão diversificada. Os paramentos compreendem tanto os antepêndios (peças coloridas que pendem diante da mesa do altar, do púlpito, estante de leitura), como as vestes litúrgicas dos ministros e das ministras.
A palavra “paramento” deriva do latim “parare” que significa “preparar”. Esse significado remete à função dos paramentos nos templos. Eles servem para preparar o ambiente do culto. Contudo, não são “peças decorativas”. Os paramentos são recursos visuais e simbólicos da igreja que estão a serviço do culto e da palavra de Deus. Eles estão relacionados à mensagem do evangelho, de acordo com cada festa e ciclo do Ano Litúrgico. Como seres humanos, temos vários sentidos: visão, audição, paladar, olfato e tato. E Deus dirige-se a nós em toda a nossa integralidade. Cores, símbolos, objetos, vestes também têm a função de comunicar a mensagem do evangelho.
Cat. Dra. Erli Mansk Coordenadora de Liturgia da IECLB São Leopoldo/RS
Arquivo OASE
Grupo de OASE do Sínodo Nordeste Gaúcho
M A R Ç O
Datas importantes
02 – Quarta-Feira de Cinzas 04 – Dia Mundial de Oração 08 – Dia Internacional da Mulher 09 – 1851 – Desembarque dos primeiros imigrantes evangélicos em São Francisco/SC 12 – 1607 – * Paul Gerhardt, maior compositor sacro evangélico 17 – Tomada de decisão da IECLB em cancelar todos os encontros devido à pandemia da Covid-19, sem data marcada para reiniciar
Dia da Pessoa com Deficiência Visual 17-19 – 2017 – Celebração da OASE em Foz do Iguaçu – 500 Anos da Reforma 19 – Dia da Escola 26 – 1946 – Abertura da Faculdade de Teologia, em São Leopoldo/RS
A esperança dos justos é alegria, mas a expectativa dos ímpios perecerá.
Provérbios 10.28