Tabela de Conteudos
— Eu sou uma heroına do caralho.
Eu sento com um sorriso satisfeito, admirando minhas realizaçoes.
M&M's verdes sao superiores, e e por isso que passei os ultimos cinco minutos separando todos eles do resto.
Meu barato dura dois segundos antes de eu perceber que estou sem fazer nada enquanto espero pela minha melhor amiga, que esta atrasada para o nosso cafe da manha de domingo novamente.
Soltando um bufo irritado, eu olho para o relogio na parede da lanchonete favorita do bairro que apenas serve comidas de cafe da manha e tortas, que sao muito famosas.
Este e o meu lugar preferido em toda a cidade.
O Gravy Train e uma antiga estaçao ferroviaria que foi transformada em lanchonete e ica localizada no meio de Harristown, Colorado. E um lugar pequeno, nada chique ou extravagante por dentro, e abriga nao so o melhor cafe da manha, mas tambem a melhor torta. E eu adoro torta.
Eles oferecem alguns sabores por dia, e meu favorito – cereja –esta disponıvel tres vezes por semana.
Domingos sao dias de torta de cereja.
Um barulho vem do outro lado da estande que ocupa uma parte consideravel da parte de tras do restaurante.
Lucy, uma colega regular daqui e tambem e a sındica do meu predio, esta encostada na parede do outro lado da longa mesa comunitaria onde gosto de sentar. Ela esta usando um poncho estampado descolado – um visual exclusivo para ela – e seu nariz esta en iado dentro de seu livro de palavras cruzadas. Eu a conheço ha tempo su iciente para saber que sempre que seu livro sai, ela nao vem a tona tao cedo.
— Serio, River? De novo? — Maya West, minha melhor amiga, me encara da ponta da mesa com uma carranca de desapontamento que ela aperfeiçoou ao longo dos anos.
O que ela esperava que eu izesse com meu tempo? Sentar aqui e girar os meus polegares? Eu tinha que me manter ocupada de alguma
forma. Ela deveria me conhecer melhor. Nao sou o tipo de pessoa que faz algo como pegar um jornal ou livro para me divertir. Manter minhas maos ocupadas mantem minha mente sa.
— O que? — Eu coloco um doce verde na minha boca enquanto ela se senta. Engulo com um grande gole do meu cafe agora frio, que e carregado com açucar su iciente para me colocar em coma. Meu pseudo-sobrinho, Sam, desliza para a cadeira ao lado dela. Eu coloco minha lıngua para fora para o meu garoto favorito, e ele retribui o gesto. Eu volto minha atençao para Maya. — Esses bebes preciosos nao pertencem a esse — eu rosno meu labio para as cores ofensivas — lixo.
— Todos eles tem o mesmo gosto — argumenta Maya, como sempre.
— Mentira! — Alguns fregueses olham para mim e fazem cara feia para minhas palhaçadas, e Sam ri, que e o que estou realmente buscando. Agora que ele tem doze e vai para os vinte, esta cada vez mais difıcil faze-lo rir enquanto faz a transiçao para sua adolescencia mal-humorada. Eu sinto falta quando tudo que eu tinha que fazer era cruzar os olhos para ele rir por cinco minutos seguidos.
— Voce e tao estranha. — Ela puxa sua cadeira para mais perto da mesa, jogando seu longo cabelo chocolate para tras do ombro. Nao e de se admirar que nao consiga encontrar alguem para namorar com voce.
Maya nao tem um osso mesquinho em seu corpo, entao suas palavras nao tem a intençao de machucar, mas machucam.
Especialmente depois de outro encontro fracassado na noite passada.
Minha vida de solteira tem sido um assunto um pouco assustador entre nos desde que terminei o icialmente as coisas com meu ex.
Estavamos juntos ha tres anos. Nosso relacionamento nao era muito serio e as coisas estavam paradas ha algum tempo, e um dia, percebi que eu estava pronta para mais, algo estavel, e meu ex nao era. Ele estava constantemente trocando de emprego... e os sofas de outras pessoas, e eu ja passei dessa fase na minha vida. Sabia que precisava cortar minhas amarras e seguir em frente.
Eu pulei de volta na cena do namoro no começo, indo a um encontro por semana pelo menos. Nao demorou muito para perceber o que eu estava querendo: estabilidade.
Nao estou dizendo que estou pronta para uma viagem ate o altar, mas encontrar algo... alguem... que promete um futuro eventualmente seria bom.
Depois de muitos encontros fracassados, eu diminuı o ritmo. Eu so saı com um punhado de caras no ano passado, todos eles fracassados.
Maya acha que estou sendo muito exigente, mas nao acho que tem nada de errado em saber o que voce esta (ou nao) disposto a ceder. E pedir demais que eu encontre um cara engraçado, gentil, que tenha um emprego ixo e seja gostoso?
Nao e como se eu precisasse encontrar o Único, mas orgasmos consistentes que nao vem do meu vibrador e alguem para se aconchegar alem do meu gato Morris soa muito bem, sem mencionar fazer outra coisa alem de trabalhar e sair com Maya e Sam, embora eu os ame profundamente.
— Eu nao sou estranha — digo a ela. — Eu sou... peculiar.
— Voce pode dizer isso de novo. — Ela levanta uma sobrancelha, lançando seus olhos em direçao a pilha de M&M verdes na minha frente. — Falando em namoro, como foi a noite passada?
Eu deslizo meus olhos na direçao de Sam, sem saber se quero derramar os detalhes da minha ultima desventura de encontro na frente do meu a ilhado. Tenho certeza de que ele nao esta prestando muita atençao, mas ainda e estranho, considerando que continuo a velo como uma criança e nao um quase adolescente.
Maya percebe minha hesitaçao. — Ei, garoto, va pegar uma torta para nos, certo? Cereja para sua tia River, e claro. — Ela vasculha a bolsa por muito mais tempo do que o razoavel e, inalmente, coloca o cartao de debito na mao dele. — E um pouco de cafe. Voce sabe do que eu gosto.
Ele pega o cartao. — Voce deveria comprar uma carteira, mae. Nao acho seguro deixar o cartao solto na bolsa assim.
— Ao inves de deixa-lo na minha carteira, onde um ladrao saberia onde esta?
Ele revira os olhos em resposta, e ela sorri em triunfo.
— So para constar — digo enquanto Sam se afasta — estou do lado dele com isso.
— Diz a garota que separa seus M&M's por cor.
— Os verdes sao os melhores!
— Me lembre por que somos amigas mesmo? Nao temos nada em comum.
— E exatamente por isso, mantem as coisas mais interessantes. Alem disso, eu era a unica pessoa la para voce durante todo aquele escandalo de gravidez aos dezesseis anos.
Ela bufa uma risada. — Certo. Isso.
Quando eu tinha oito anos, a famılia de Maya se mudou para a casa ao lado e nos tornamos melhores amigas instantaneamente. Nao importava se eramos totalmente opostos e constantemente brigavamos por coisas ridıculas como qual boy band era melhor – eramos inseparaveis.
Somos amigos ha vinte anos e ja passamos por tudo: drama no colegio, gravidez na adolescencia, casamento, tornar-se parceiros de negocios, divorcio... o que voce quiser. Nao importa o que a vida jogue em nos, ainda somos estupidas como sempre.
Ela e a irma que eu nunca tive e sempre quis.
— Entao, ontem a noite? — Maya franze os labios perfeitamente carnudos, focando os seus surpreendentes olhos cinza em mim.
— Certo, certo. — Eu bato meu queixo. — A noite passada foi... interessante.
— Bom ou ruim?
— Bom... acho.
— Voce esta fazendo um otimo trabalho esclarecendo as coisas para mim — diz Maya.
—Bem, começou quando meu encontro–
— Cheddar! — Ela bate palmas, sorrindo como uma idiota. Admita que esse nome idiota de estudante universitario e meio velho demais para ainda ser usado.
E um nome ridıculo. Na verdade, Cheddar pode ter sido o primeiro cara que Maya nao tentou me convencer a dar uma chance. Saı com ele para provar que nao era tao exigente quanto ela a irma.
Meu erro.
— Tudo começou com o Cheddar derramando sua bebida na mesa.
— O que ele estava bebendo?
— Por que isso e importante?
— Um pedido de bebida diz muito sobre uma pessoa. — Maya acena com a mao com impaciencia. — Vamos ver.
— Daiquiri de frozen de morango.
Assim que as palavras saem da minha boca, me arrependo de dizer a ela.
Ela esta rindo tanto que nem mesmo esta fazendo barulho, enquanto eu sento la jogando adagas em sua direçao. Cruzo os braços sobre o peito, recostando-me na cadeira, deixando que ela termine.
— Voce ja terminou? — Ela nao fez nenhum som alem de sugar o ar por pelo menos trinta segundos.
Finalmente, ela solta um suspiro, enxugando os olhos. — Ele alem de atender por Cheddar, bebe isso. Eu nao posso acreditar que nao se casou com ele na hora.
— Foi realmente estranho quando pedi meu uısque puro.
— Muito bem garota.
Eu sigo em frente. — De qualquer forma, o pedido da bebida e ele ter derramado eram algo que eu poderia superar. Talvez estivesse nervoso? Quem sabe? E quando ele mencionou que ainda morava com a mae? Seja como for, a economia e tudo isso. Mas...
— Por que tenho a sensaçao de que isso vai melhorar?
— Mas entao ele disse – e eu cito, porra – que torta de amora e o melhor tipo de torta.
Ela aperta o peito. — Ele disse o que!
Eu aceno, franzindo meus labios. — Eu tive a mesma reaçao. Na verdade, mandei uma mensagem para minha mae e a iz ligar com uma emergencia para sair de la.
Maya revira os olhos. — Voce percebe que estou zombando de voce, certo?
— O que? Voce sabe que a de cereja e o melhor tipo de torta!
— Voce nao pode continuar empurrando todos os Tom, Dick e Harry para longe por essas razoes estupidas. Nunca encontrara ninguem se continuar assim.
— Em primeiro lugar, eu nunca afastaria um pau.
— River… — Sua voz esta cheia de frustraçao, e eu entendo.
Eu sou meio exigente.
Mas e pedir demais para um cara me deixar... bem, animada?
— Talvez eu seja um pouco particular, mas ninguem me faz ir, sabe? Ninguem faz meu coraçao disparar ou me faz rir. Nenhum deles tem sido o tipo de cara que me faz icar em casa pensando nele. Ninguem me fez formigamento em todos os lugares certos. Nem um unico encontro – ugh.
Na minha visao periferica, eu vejo a maldiçao da minha existencia passar pelas portas do meu restaurante favorito – que frequento ha oito anos – como se ele fosse o dono do lugar.
Suas pernas vestidas com jeans se estendem pelo que parecem quilometros, e eu nem preciso olhar para saber que ele esta usando uma camiseta de alguma banda que nao faz um show ha quase trinta anos. Seu cabelo preto como carvao esta bagunçado como se o vento o soprasse para todos os lados, e seu rosto nao e raspado ha tres dias.
Ele parece desleixado, como se tivesse acabado de rolar para fora da cama e arrancar suas roupas do chao. Mas, de alguma forma, ele ainda e ridiculamente atraente... infelizmente.
— O que? O que esta errado? — Maya espia atras dela para a porta da frente da lanchonete, onde meus olhos vagaram. — Oh. Ele.
— Sim. — Eu enrolo meus labios em desgosto. — Ele.
Ela se volta para mim. — Eu nao entendo o seu problema com ele. Ele e super gostoso.
— Voce nao mora ao lado dele.
O proprio Lucifer nao apenas patrocina meu lugar favorito no mundo inteiro, ele tambem mora no apartamento do lado do meu.
Eu o vejo o tempo todo. Nas caixas de correio. No elevador.
Toda manha.
E exaustivo porque ele é exaustivo.
Como a traidora que e, Maya levanta a mao e acena. Ele abre um sorriso e tenho certeza de que ele pensa que esta derretendo a calcinha e acena de volta enquanto se dirige ao balcao da frente para fazer seu pedido.
Eu bato para baixo. — Pare com isso!
— Voce pare com isso! — Ela puxa a mao de volta. — Nao ha nada de errado com ele. Ele e–
— Super quente – sim, eu ouvi voce da primeira vez. Ele tambem e super irritante.
— Como assim?
— Para começar, ele–
— Ah, Sam. — Meu inimigo mortal se aproxima do limite. — E bom ver voce, mano,
— Aquilo! — Eu praticamente me levanto da cadeira, apontando um dedo acusador para ele. Ele espia a comoçao, sobrancelhas grossas franzidas com a minha interrupçao. — Isso aı! Ele diz coisas assim porque–
— Ei, Dean. — Sam cumprimenta seu antigo professor. — Como vai seu im de semana?
— Por causa disso. Eles sao Sam e Dean. Como os Winchesters. — Eu rolo meus olhos. — Me poupe — eu termino enquanto acomodo minha bunda, observando os dois conversando como velhos amigos.
O que eu acho que eles sao. Um pouco.
No ano passado, quando Maya e seu ex estavam se divorciando, Dean estava la para Sam de maneiras que apenas uma igura paterna pode fazer. Com ele sendo o professor de Sam e vendo-o na escola, os dois se tornaram proximos e, embora seja incrivelmente bobo, isso me deixa com um pouco de ciume.
E com tesao.
Que por sua vez me deixa realmente com raiva.
Eu o odeio. Ele e um idiota. Um idiota total. E por isso nao e meu tipo. Eu nao gosto dele. A atraçao e a falta de um homem esquentando minha cama e conversando, nada mais.
Alem disso, o que procuro não e Dean. Ele pode ter um emprego estavel e parecer estavel, mas isso nao compensa o quanto ele me irrita.
— Sabe, estou começando a pensar que talvez voce so diga que o odeia porque esta secretamente apaixonada por ele.
Eu solto uma risada sardonica. — Por favor. Nao e isso.
— Voce esta dizendo que nao o acha nada atraente?
— Nao.
— Nao, voce nao o acha atraente, ou nao, nao e isso que voce esta dizendo?
Eu mudo na minha cadeira. — Claro que o acho atraente.
— Huh. Interessante.
Eu inclino minha cabeça, juntando minhas sobrancelhas. — O que e?
— Dean te excita.
—O-o que?!— Eu gaguejei, sentando-me ereto. — Ele nao! Por que voce diria isso? Eu nunca disse isso.
— Voce nao precisava. Uma melhor amiga sabe dessas coisas.
— O que…
— Oh, querida. — Olhamos para baixo na mesa em direçao a Lucy, cujo nariz nao estava tao preso em seu livro como eu pensava. E obvio para mim tambem.
— Lucy! Que diabos?!
Ela levanta um ombro, um sorriso, provocando nos seus labios pintados de vermelho. — So estou dizendo a verdade, querida. Alem disso, nao e uma coisa ruim. Voce nao esta sozinho em seus sentimentos – Dean tambem me deixa com tesao.
Meus olhos se arregalam e minhas bochechas esquentam.
— Agora, vamos la. Voces duas nao me olhem assim. Estou velha, mas ainda ha movimento neste oceano, e o oceano esta de initivamente na minha calcinha quando aquele homem passa pela porta.
Ela desliza a lıngua sobre os labios, e eu nunca quis que um buraco se abrisse e me engolisse tanto quanto neste momento, e isso inclui a vez em que caminhei pelo Wallmart com a saia en iada na minha calcinha... uma calcinha io dental.
Lucy toma um gole de cha e volta sua atençao para seu livro... supostamente.
Maya inclina a cabeça em direçao a minha, inclinando-se para sussurrar: — Entao isso aconteceu.
— Infelizmente, sim.
— Olha, nao e uma coisa ruim se voce tem uma queda por ele.
— So porque ele pode – e estou colocando muita enfase nessa palavra – talvez me deixar um pouco excitada nas minhas calças, nao signi ica que seja uma paixao. Posso estar isicamente atraıda por alguem e ainda odiar sua coragem.
— Ou voce pode estar mentindo.
Eu gemo.
— Con ie em mim, não é uma queda, Maya. Eu nem mesmo gosto dele. Na verdade, eu disse muitas vezes ao longo do ano passado que o odiava.
— Mas sem um bom motivo.
— Voce esta brincando comigo, certo? Existem muitos motivos!
— Diga um.
Apenas um? Ha assim muitas razoes para nao gostar do Dean.
Ele e detestavel. Sempre certo sobre tudo. Se intromete no meu cafe da manha com minha melhor amiga todos os domingos.
E sua pior ofensa?
O fato dele morar no apartamento ao lado. Ele esta sempre tocando aquele violao horrıvel em sua varanda ou berrando seu gosto horrıvel para musica a qualquer hora do dia. Gritando com a TV sobre qualquer esporte que ele sempre parece estar assistindo.
Ele e o pior vizinho de todos.
— Ele acorda com a mesma musica todos os dias.
— A maioria das pessoas acordam.
— Mas Old Time Rock & Roll repetidamente? Seu–
Ela aponta o dedo para mim. Essa musica e um classico. Voce nao tem permissao para falar mal disso.
— Classico ou nao, ele tem mesmo que explodir essa musica as cinco e meia da manha, incluindo ins de semana?
— Ele trabalha. Isso e mais do que eu posso dizer sobre metade dos caras com quem voce sai.
— Mas–
— Nao. Sem mas. Ele poderia abaixar a musica? Claro, mas voce nao pode culpa-lo por ganhar a vida, especialmente quando se trata de ensinar e tornar a vida das crianças melhor.
— Voce so esta dizendo isso porque ele e amigo do seu ilho.
— Entao? — Ela encolhe os ombros. — Agora diga outra coisa que nao seja absurda.
— Leo.
— Ah, qual e. Deixe Leo fora disso.
Aponto para Dean, que ainda esta na ila com Sam porque este lugar esta lotado em uma manha de domingo. — Nao posso deixar Leo fora disso quando ele o trouxe aqui.
— Leo e adorável.
— Ele e uma tartaruga!
— Mas–
— Uma tartaruga de apoio emocional!
— Sim, mas–
— Em um maldito restaurante!
Maya bufa. — Voce esta sendo uma desmancha-prazeres.
Eu olho para Dean, que agora esta conversando com outro cliente sobre a referida tartaruga. Eles estao balbuciando para ele como fariam com um bebe. Leo esta atraindo toda a atençao porque ele e tao ruim quanto o seu dono.
— Ele so esta fazendo isso para chamar a atençao.
— Talvez o apoio emocional nao seja para ele, mas para Leo? Voce alguma vez ja pensou sobre isso?
— Voce ja pensou que essa e a segunda coisa mais ridıcula que ja saiu da sua boca? Ultrapassado apenas por quando voce me disse que pode pegar a doença de Lyme comendo limao ruim?
— Eu vi no Facebook!
— Fique longe do Facebook!
— Mas o drama... e tao viciante… — ela murmura. — Pare de me distrair. Estamos falando sobre razoes reais e viaveis para odia-lo.
— Ele... ele e...
— O que? Ela se senta mais proximo, as sobrancelhas levantadas, esperando pela minha resposta. — Atraente? Engraçado? Amigavel? Bom com crianças? Tem um emprego ixo?
— Ele rouba minha torta!
Ela revira os olhos novamente. — Ele nao faz.
— Sim, ele faz. Intencionalmente. Todos os domingos. Sempre acontece.
— Esta exagerando.
— Eu nao estou.
— Voce tem certeza disso?
— Posso estar exagerando um pouco, mas voce sabe que estou certa sobre isso acontecer com frequencia. Ou chegamos tarde demais e ele ja roubou porque e domingo e as tortas boas sempre vao rapido aos domingos, com as pessoas entrando e saindo depois da igreja e levando todas – e exatamente por isso que quero chegar mais cedo — dou a ela um olhar penetrante, e ela encolhe os ombros timidamente — ou ele da alguma desculpa ridıcula para trocar qualquer lixo que ele conseguir para enganar o ingenuo Sam.
— Primeiro, voce pode pedir sem mim.
— Eu nao posso. Entao nao seria um verdadeiro encontro para o cafe da manha. Voce chegando quando eu ja estou com o rosto cheio de torta.
Me ignorando, ela continua. — Segundo, nao ha necessidade de insultos. Sam nao e ingenuo.
— Nao e? Porque ele acreditava que poderia ter febre ao dançar em uma discoteca em um sabado a noite.
— Ele nao acredita. Alem disso, ele esta apenas tentando ser legal com o professor – algo que voce deveria estar fazendo. Dean se inscreveu para treinar o time de futebol este ano, e seu sobrinho gosta de futebol.
— Seu ponto? Sam nao e meu ilho. Eu nao tenho que beijar a bunda de Dean para manter a paz durante o ano letivo.
— Huh. E aqui eu pensando que voce queria beijar a bunda de Dean.
— O que e tudo isso sobre a minha bunda?
E nunca falha.
Faça chuva ou faça sol, River White sempre vai estar no The Gravy Train nas manhas de domingo. Mesmo que sua melhor amiga Maya nao esteja, River esta aqui, porque River adora torta de cereja tanto quanto eu.
Na verdade, eu concluı que ela gosta de qualquer coisa doce. Ela sempre parece estar beliscando M&M's verdes, e como nos compartilhamos o mesmo elevador nos dias de mercearia muitas vezes, estou ciente das coisas que ela compra, mesmo quando nao quero, como daquela vez que ela comprou uma caixa de preservativos do tamanho de um atacado.
No ano em que morei aqui, nao conheci outra pessoa que me irritasse e me intrigasse tanto quanto a minha vizinha. Em um segundo, ela e doce e sorridente. No outro, esta pronta para arrancar a cabeça de alguem.
Normalmente esse alguem sou eu.
Se ha uma coisa sobre River que tenho certeza – alem de seu amor por torta – e seu odio por mim.
Eu deixo meus olhos vagarem sobre ela enquanto ela me encara com um olhar que diz, eu vou te matar, então eu vou ajudar a procurar o seu corpo.
Cheia de fogo e provavelmente um pouco de possessao demonıaca, ela tem pouco mais de um metro e sessenta e cinco. Seu cabelo ruivo escuro – forjado nas profundezas do inferno, tenho certeza – cai solto nas costas, implorando para ser puxado. Hoje ela esta usando o que passei a reconhecer como seu traje de “Tive outro encontro fracassado e comi meio litro de sorvete e meia caixa de biscoitos”: leggings e uma camisa com mais buracos do que queijo suıço.
No entanto, ela ainda e linda de morrer. E essa e a parte que mais me irrita.
Nao importa quantas vezes – e e muito frequente – River deixe seus sentimentos por mim claros, ainda estou inegavelmente atraıdo isicamente por ela, mesmo quando nao quero.
Ela e quase rude. Ela e detestavel. Mandona. E ela e a pior vizinha da porra do mundo inteiro.
Eu so queria que meu pau entendesse tudo isso.
Eu me jogo em um banquinho em frente a minha inimiga.
— Voce estava dizendo algo sobre a minha bunda? — Eu coloco meu prato na mesa e coloco Leo na mesa ao meu lado. Ele mergulha de volta em sua concha, um pouco nervoso com o que esta a sua volta, mas vai voltar assim que perceber que nao ha ameaça. Para uma criatura que normalmente gosta de fazer coisas sozinho, ele e estranhamente amigavel. Ainda mais aos domingos, dia em que o levo ao parque e o deixo explorar.
— Voce esta me zoando?
O murmurio zangado de River me corta... e segue para o sul. Como sempre, eu ignoro.
Nao adianta reconhecer isso. Eu realmente nao gosto dela. E meu pau que gosta dela. Tambem gosto quando vejo uma forma em uma mesa de madeira que lembra uma boceta.
Nao e nada alem do meu pau falando. Nao e absolutamente nada pessoal e tudo mais, sao apenas imagens.
— Vamos, River. Eu nao preciso ouvir sobre suas merdas. Estou tentando desfrutar da minha torta. — Eu esfaqueio minha fatia com meu garfo, empurrando um pedaço saudavel em minha boca.
Ela me encara, com os labios torcidos de raiva.
Eu sorrio para ela em torno dos deliciosos produtos assados.
Nao sei por que ela me despreza tanto, mas eu estaria mentindo se dissesse que nao e divertido irritar ela e obter uma resposta.
Ela ferve, cerrando os dentes. — Te odeio.
— River!
Eu engulo, limpando minha boca no guardanapo. —Esta tudo bem, Maya. Esta nao e a primeira vez que River deixou claro seus sentimentos por mim.
— Voce pode dizer isso de novo. — Lucy, a sındica do predio que me ama totalmente, me apoia sem nunca desviar os olhos de seu livro de palavras cruzadas.
Para minha surpresa, as bochechas de River icam vermelhas. Nao achei que nada a envergonhasse.
— Ignore a minha melhor amiga.
Maya encara River, que encolhe os ombros.
— Eu quis dizer o que eu falei. — Ela cruza os braços em desa io. — Eu o odeio.
— Ela so esta brava porque eu consegui o ultimo pedaço de torta de cereja.
— Conseguiu? CONSEGUIU? — Ela inala profundamente. — Voce quer dizer que enganou um garoto ingenuo por isso.
— Ei! Eu nao sou ingenuo!
— Oh, voce nao e? — River se vira para Sam. — Entao me diga o que ele disse para voce trocar uma fatia de torta de cereja por uma de amora.
— Ele disse que viu uma das atendentes tocar na torta depois que ela cutucou o nariz. Achei que voce nao gostaria de comer torta de meleca, tia River. Eu iz isso por voce. — Ele sorri com orgulho para si mesmo.
Merda, esse garoto e muito facil. Eu disse a ele na semana passada que era ilegal comer torta de cereja naquele domingo em particular. Ele estava com medo de que River fosse presa e implorou para que eu comesse. Idiota.
— Voce nao pensou em questionar quando ele pediu uma torta de meleca para si mesmo?
Eu interrompi. — Eu pedi tudo de uma vez. Eu nao falei sobre meleca ate que estavamos vindo para ca com as tortas.
— Eu tenho tantas perguntas… — Ela estreita os olhos, tentando descobrir para onde isso esta levando.
— Manda ver. Sou um professor – recebo perguntas estupidas o tempo todo.
— Voce disse que nao existem perguntas estupidas. — Sam inclina a cabeça, olhando para mim acusadoramente.
— E eu realmente quis dizer isso para voce, Sam. Voce nunca me faz perguntas estupidas.
— Oh droga. Meu ilho é ingenuo — sussurra Maya, horrorizada. Tento nao rir e dar atençao a River. — Entao?
—
Você pagou pelo cafe da manha?
— Eu sempre pago o cafe da manha.
— Voce nao! Maya e eu revezamos. Em uma semana sou eu, e na proxima e ela. Sempre. Nos nunca deixamos de fazer isso. Nos…
Suas palavras morrem, e tenho certeza de que e porque ela inalmente percebeu que, nas manhas que estou aqui, nunca ha uma cobrança em seu cartao.
Podemos ser inimigos, mas fui criado com boas maneiras.
Alem disso, tenho um pouco de medo da minha mae se ela percebesse que seu ilho esta sendo um idiota, ela gritaria comigo se eu nao estivesse fazendo uma coisa cavalheiresca ao pagar pelo cafe da manha.
— Voce... Voce...
— Eu, eu, o que? — Eu zombo. — Voce ia dizer que eu sou um homem gentil, doce e incrivelmente atraente? Porque eu sei que voce nao estava prestes a me chamar de bundao.
Pego um M&M de seu estoque e jogo na boca, sorrindo.
— Seu bundao!
— Nao. — Eu empurro meu dedo contra a mesa. — Nao. Existem algumas regras na vida que eu obedeço. Se alguem compra uma torta para voce, absolutamente não pode chama-lo de bundao. Essas sao as regras, River.
Ela torce o nariz. — Eu nao me importo se voce me compra torta. Eu ainda te odeio.
— Mas agora um pouco menos, certo?
Ela nao diz nada, mas posso ver em seus olhos.
Eles mudam para Leo, entao rolam para tras em sua cabeça.
— Ei, seja legal com Leo. Ele nao merece sua raiva.
— A serio? Voce trouxe sua tartaruga – sinto muito, tartaruga de apoio emocional – para o cafe da manha. Novamente. Que diabos?
Ela pode ser ma comigo o quanto quiser, mas Leo? Sem chance. O pequenino passou por maus bocados.
— Escute, Sra. Sasshole. Leo nao e minha tartaruga de apoio emocional. Eu sou o seu treinador de suporte emocional. Ele foi ferido
quando morava com o seu ultimo dono. Estou ajudando a trata-lo e a icar saudavel.
Seus olhos se arregalam de surpresa.
Sim, River, não sou um idiota total. Claro, eu posso tocar minha música e roubar sua torta, mas eu tenho um coração.
Ela balança a cabeça. — Voce esta inventando isso.
Eu me inclino para a mesa. — Nao estou.
— Esta sim — ela argumenta, combinando com meus movimentos.
Eu mudo mais um centımetro.
Ela tambem.
Castanhos.
Seus olhos sao castanhos.
Nao sei por que so agora estou percebendo – provavelmente porque e o mais proximo que ja estive dela – mas seus olhos sao a combinaçao mais linda de dourado e verde que ja vi.
Sua lıngua aparece e desliza pelos seus labios, e eu acompanho o movimento.
Eu nao posso desviar o olhar porque foda-se sua boca e tao malditamente beijavel, e ja faz muito tempo desde que beijei alguem.
Isso dura tanto que estou sentado aqui, pensando em diminuir a distancia entre nos, como se nao fosse a porra da River White na minha frente. Como se ela nao me odiasse. Como se eu nao a odiasse.
— Nao estou — eu me forço a dizer em vez disso.
— Esta–
— Voces sabem, queridos, se quiserem seu proprio espaço privado, todos nos poderıamos sair — Lucy interrompe.
Nos nos separamos como se tivessemos sido pegos fazendo algo que nao deverıamos, e Leo volta para sua concha, assustado com o movimento repentino.
— Foi mal cara. — Passo o dedo pela cabana de plastico, tentando acalma-lo.
E a mim tambem.
River e quente e deixa meu pau duro, mas beija-la? O inferno teria que congelar primeiro.
A atraçao esta la, mas ela e minha vizinha que esta constantemente tentando arruinar o melhor apartamento que ja tive, fazendo reclamaçoes e me irritando. Eu amo minha casa demais para começar a namorar minha vizinha, e deixar as coisas se bagunçarem e eu ter que me mudar... de novo.
Eu nunca, jamais beijarei River White. Isso eu posso prometer.
— Vou fazer xixi. — River pula de seu banquinho e praticamente corre para o banheiro.
Ela esta puta comigo por ter pagado o seu cafe da manha.
Bom. Talvez ela pense duas vezes antes de olhar para mim novamente por respirar alto demais para o seu gosto.
— Se isso nao deixar os caras gostosos, nao sei o que deixa. Maya balança a cabeça para as costas de sua amiga.
— Ela com certeza e algo. — Dou outra mordida na minha torta de cereja, que, infelizmente, esta quase acabando.
Foi um pouco mesquinho da minha parte convencer Sam a me dar a ultima fatia de cereja? Certamente.
Eu me arrependo? Nem um pouco.
Foi ela quem começou a guerra entre nos, me denunciando para Lucy com queixas absurdas de barulho uma semana depois que me mudei, em vez de vir e me pedir para abaixar o volume. Eu estava disposto a nos deixar ter uma icha limpa depois da coisa com o gato dela, mas ela nao, aparentemente.
Alem disso, eu nao coloco minhas merda tao alto. Nao havia necessidade de ir para Lucy com aquela merda trivial como ela fez pela quarta vez agora.
Felizmente, Lucy tem pena de mim – tenho noventa e nove por cento de certeza de que ela esta apaixonada por mim – e nao leva as acusaçoes alem de me dar um aviso nao tao severo.
Vou parar de ser mesquinho assim que River tambem parar.
— Entao, Dean, voce esta ansioso para a volta das aulas de verao em algumas semanas? Esta animado para começar a treinar futebol?
Assentindo, engulo e tomo um gole do meu cafe. — Muito, para ambos. A unica parte que gosto no verao e passar mais tempo com Leo. Pre iro estar na sala de aula.
Tambem e verdade.
Eu amo ensinar. Eu amo as crianças e as merdas que dizem. Adoro ver as expressoes em seus rostos quando algo encaixa em sua mente.
E ser treinador? Cara, mal posso esperar para começar. Quando o antigo assistente tecnico do time se mudou no inal do ano letivo, eu fui o primeiro da ila a me candidatar a vaga. Eu adorava jogar futebol no colegio e na faculdade. Eu sabia que nunca fui bom o su iciente para me tornar pro issional, mas isso nao mudou o quanto eu amava o jogo.
Estou ansioso para espalhar meu amor pelo esporte.
— Sam, voce esta tentando, certo?
Ele espia por cima de seu telefone. — Eu nao tenho certeza — ele murmura, os olhos voando em direçao a sua mae, a preocupaçao neles clara como o dia. —Eu, uh, eu nao sei se posso.
Eu nao sinto falta do jeito que o sorriso de Maya vacila.
Ja vi Maya nos inais de semana o su iciente para saber que ela tem lutado desde o divorcio, dedicando horas extras no trabalho enquanto ainda tenta estar ao lado do ilho, e tenho certeza de que isso esta desgastando ela. O futebol e um esporte caro, e tenho certeza de que ela esta preocupada com os aspectos inanceiros tanto quanto com a falta de tempo.
— Eu te disse, vamos fazer funcionar — ela diz a ele.
— Mas seu horario no trabalho...
— Nao se preocupe com o meu horario de trabalho. Alem disso, Tia River pode levar e buscar voce dos jogos e treinos. Vai icar tudo bem. — Ela pisca para o ilho. — Promessa de mindinho, garoto.
Ótimo. Porque mais de River é exatamente o que eu preciso na minha vida.
Ele revira os olhos. — Mae, estou muito velho para promessas de dedo mindinho.
— Cara, voce nunca esta velho demais para promessas de dedo mindinho. Eles sao um contrato obrigatorio, nao importa sua idade.
Ele da de ombros, en iando o rosto de volta no telefone e se perdendo no que quer que esteja na tela.
p q q q j
— Crianças. — Maya bufa.
Eu ri. — Voce esta pregando para o coro.
— Eu nao sei como voce faz isso. Uma sala de aula cheia deles... — Ela balança a cabeça. — Eu mal posso lidar com o que tenho.
— Para ser justo, eu posso ir para casa a noite e ter uma noite livre de crianças, onde estouro minha musica ou toco meu violao. Eu tenho uma folga, voce nao. Essa e a diferença.
— Falando de suas noites... voce sabe que esta deixando River louca com isso, certo?
Eu sorrio. — Oh, estou ciente.
Ela ri da minha falta de remorso. — Por que voce insiste em torturar minha melhor amiga?
Nesse momento, River sai caminhando do banheiro. Nao consigo deixar de admirar a maneira como ela se comporta com con iança, mesmo com suas terrıveis leggings e sua camisa esfarrapada. Ela esta parecendo uma mendiga e meu pau ainda nao recebeu o aviso que nao existe nada de bom em icar animado com ela.
Maya limpa a garganta, chamando minha atençao.
Eu tiro meus olhos de River, fazendo o meu melhor para parecer que nao estou desejando sua melhor amiga.
— Porque ela insiste em me torturar.
Ela levanta uma sobrancelha e posso ver as perguntas se formando em seus labios.
— Voce ainda esta aqui? — River reclama, sem saber, salvandome de tudo o que Maya estava prestes a perguntar. Obrigado, porra. Ela desliza de volta para seu banquinho, olhando para mim. — Achei que se demorasse o su iciente, voce iria embora.
— Partir sem dizer adeus ao meu inimigo favorito? Acho que nao. Alem disso, ainda nao terminei minha deliciosa torta de cereja. E tao quente, tao doce... tão perfeito.
Suas narinas dilatam enquanto eu deslizo uma mordida em minha boca.
— Mmm — eu gemo. — Tao bom.
— Odeio. Voce.
— Voce gostaria de odiar.
— O que isso deveria signi icar?
— Vamos, River. Voce esta obviamente obcecada por mim. Ela torce o labio.
— Voce e nojento.
— Ou eu estou certo.
Ela solta um suspiro exasperado.
— E depois disso, estou saindo.
— O que? Por que? — Maya mostra o labio inferior em um beicinho.
— Ah, tao cedo? — Eu provoco.
Seus olhos gelados pousam em mim enquanto ela reune suas coisas. — Sim, eu quero parar na loja antes que Caroline abra para veri icar algumas coisas. Poderıamos ter passado mais tempo juntos se alguem nao estivesse atrasada...
— Culpe seu sobrinho. — Maya aponta o polegar em direçao ao ilho. — Foi culpa dele.
— E sempre culpa dele.
Ela encolhe os ombros. — Acho que alguem precisa ter um controle melhor sobre ele, entao.
— Esse e o seu trabalho.
— Ugh, nao me lembre. — Ela se levanta e envolve os braços em volta de River, pressionando um beijo em sua bochecha. — Voce nao precisa trabalhar o tempo todo, River. Estamos todos juntas neste negocio agora. Tire um dia de folga.
Nao que eu de a mınima para o que River faz, porque isso implicaria em pensar nela de qualquer forma alem dela me irritar, mas Maya esta certa.
River está sempre trabalhando. E um milagre que ela ate encontre tempo para reclamar de mim com a sındica do predio – ela quase nunca esta em casa.
— Eu sei, eu sei. Mas e meu bebe. Voce tem seu ilho para cuidar e eu tenho o meu. Alem disso, eu gostaria de sair do apartamento e nao pensar na minha pessima vida amorosa.
— Eu vou deixar, mas prometa-me que vai ser rapido. Combinado?
— Combinado. — River devolve o abraço. — Amo voce. Eu te ligo mais tarde. — Ela bagunça o cabelo de Sam, que e do mesmo tom do de sua mae.
— Tchau, garoto. Vou buscar voce para tomar um sorvete amanha de manha, ok?
— Sorvete no cafe da manha?
— Voce e quem manda. — Ela baixa os olhos para o prato vazio na minha frente. — Voce acabou de comer torta de cereja no cafe da manha.
— Tem frutas…
— Ok. Vou me certi icar de que eles joguem alguns morangos em seu sorvete. — Ela da uma piscadela para ele como se eu nao pudesse ve-la. — Morangos extras – sr. Evans disse isso.
Sam torce o nariz. — Pode parar?
— Tchau, Lucy. — River manda um aceno para ela.
— Tenha um bom dia, amor. Seu segredo esta seguro comigo. — Ela pisca e as bochechas de River esquentam novamente enquanto seus olhos correm em minha direçao.
— Que segredo? — Eu pergunto.
— Nao e nada — diz Maya, tentando encobrir a amiga.
— Oh, nao e nada. E uma suposiçao nojenta que estou secretamente apaixonado por voce, o que e absurdo se voce me perguntar. E perfeitamente claro que eu odeio voce.
Lucy acha que River esta se apaixonando por mim?
Interessante…
— Nao e ridıculo? — Ela revira os olhos. — Voce? Por favor. Voce teria tanta sorte.
Meus labios se contraem com sua con iança. Ela e tao segura de si.
— Nao acho que sorte seja a palavra que voce esta procurando aqui.
— Oh, con ie em mim. E.
Eu bufo, empurrando para tras do meu banquinho, empilhando os pratos juntos e equilibrando-os em cima da cabana de Leo. Eu aceno em direçao a Maya e Sam. — Vejo voces na proxima semana. — Eu paro
ombro a ombro com River e me curvo ate que minha boca esteja pairando em sua orelha. — Con ie em mim. Nao e. E nao se preocupe, sua paixao secreta esta segura comigo.
Ela estica o pescoço para olhar para mim, suas orbes verdes e marrons cheias de odio.
Eu sorrio. — Ate mais, River.
— Idiota, idiota, idiota. Con ie em mim. Certo. Eca. Tanto faz. Voce pode en iar o seu sorriso sexy como o inferno no seu–
— Hum, River? Voce esta bem?
Eu olho para cima, parando na porta do Making Waves, a boutique que trabalhei pra caramba para fazer um sucesso.
— Voce esta bem, chefe? — Os olhos azuis bebe de Caroline estao cheios de preocupaçao quando ela me da um pequeno sorriso.
Eu suspiro.
— Sim, eu estou bem. E apenas…
— Dean de novo? — Ela sorri com conhecimento da causa.
— Ele e o pior.
— Foi isso que eu ouvi. — Ela pega outro conjunto de brincos, colocando-os na vitrine. — Embora eu nao tenha certeza de como alguem com uma voz assim pode ser o pior.
— Esse e exatamente o meu problema – você pode ouvi-lo de dois andares abaixo.
Ela ri, balançando a cabeça. Sim, mas nao estou reclamando disso. Cooper tambem nao reclama. Isso faz com que seja dois contra um, sem incluir o resto dos moradores que estao em suas varandas, torcendo por ele...
— Mas voce nao esta bem ao lado dele. E diferente.
— Tenho certeza que sim ela murmura, terminando de organizar a primeira joia e passando para a proxima.
Eu ignoro a maneira como ela diz isso, como se houvesse coisas que ela esta insinuando.
— Como foi o fechamento ontem a noite? — Eu deslizo para tras do balcao, ligando o computador para veri icar as coisas.
— Alguem entrou trinta minutos antes do fechamento e acabou comprando cinco peças. E nos deu o melhor dia do mes.
O alıvio passa por mim.
Comecei a Making Waves sozinha ha cinco anos. Apesar da forma como estou vestida hoje, sempre amei roupas e acessorios. Encontrar a roupa e os sapatos certos pode mudar todo o meu humor – algo que eu deveria ter considerado quando acordei de mau humor – e adoro ajudar os outros a encontrar uma peça que os faça se sentir bem tambem.
Quando me formei na faculdade com bacharelado em administraçao de empresas, sabia que queria fazer aqueles quatro anos cansativos valerem a pena fazendo algo de que gosto.
Abrir uma empresa por conta propria nao foi nada facil. As vezes, era uma merda. Os negocios eram lentos, quase inexistentes no inıcio. Nos primeiros tres anos, era apenas eu. Nao podia me dar ao luxo de contratar mais ninguem. Eu teria morrido de medo nos primeiros seis meses se nao fosse por Maya se voluntariando todo o tempo para me ajudar a manter o novo negocio vivo.
Em um mes, os negocios inalmente aumentaram. Entao aconteceu de novo. E de novo. A tendencia continuou a subir, e eu estava tao sobrecarregada que tive que o icialmente contratar alguem ou teria me queimado completamente.
Caroline entrou cambaleando a procura de emprego na hora certa ha dois anos. Com Maya inalmente se divorciando de seu ex idiota e precisando de um emprego o mais rapido possıvel, eu sabia que ela seria a adiçao perfeita para o negocio tambem.
Houve muito suor e lagrimas, mas nos tres continuamos nossa tendencia de crescimento nas vendas, ate mesmo expandindo para ter uma loja movel para eventos locais, e no inıcio deste ano, começamos a trabalhar online.
Embora haja muitos dias em que sinto que tudo sera arrancado a qualquer momento, estou começando a sentir que realmente vou conseguir. Saber qual foi nosso melhor dia anterior deste mes e superalo... bem, compensa totalmente o fato de Dean ter roubado minha torta esta manha e me deixa irmemente de bom humor.
— Bom. Isso e bom.
— Respire, River. Parece que voce esta carregando o peso do mundo nos ombros. Estamos indo bem – melhor do que bem. Voce pode relaxar um pouco, sabe.
Eu lanço um olhar para ela por cima da tela do computador. Voce parece a Maya.
— Nao diga que eu disse isso, porque ela nunca parara de falar sobre isso, mas ela esta certa.
Eu pego meu telefone e o seguro. — Voce pode repetir isso? Preciso registrar para chantagem futuras.
— Vou leva-lo para o meu tumulo, obrigada. — Ela empurra minha mao. — Mas estou falando serio, chefe.
— Eu ouvi voce — murmuro. — E um top fofo. Um dos seus? — Pergunto para distraı-la, e porque é um top fofo.
Na verdade, toda a roupa dela e bonita. Suas longas pernas icam incrıveis em um par de jeans skinny simples com franjas na parte inferior, levando a um par de sapatos brancos lisos. A verdadeira estrela do show e sua blusa superdimensionada com padrao bloqueado que ica pendurada em um de seus ombros. E moderno e divertido.
Ela parece tao equilibrada, ao contrario de mim.
Que seja. Foi uma noite longa e difıcil, e nao da maneira que eu queria.
Estou quase começando a achar que Maya pode estar descobrindo algo sobre eu ser exigente...
As bochechas de Caroline icam vermelhas com a mudança de assunto. Ela revelou seu talento secreto para desenhar roupas ha cerca de seis meses. Tenho implorado a ela para fazer algumas peças para a loja, mas ela e extremamente tımida quanto a isso. Bem, isso e tudo mais, ao que parece.
Embora sua timidez tenha melhorado desde que ela se mudou para ca, ainda ha algumas coisas sobre as quais ela se cala, sendo suas habilidades de design uma delas.
A unica pessoa com quem a vi icar mais a vontade foi com o seu melhor amigo de infancia e colega de quarto, Cooper. Ela insiste que eles sao apenas amigos, mas eu juro que ha algo se formando entre eles. Nunca vi duas pessoas tao sintonizadas uma com a outra antes, mas acho que o mesmo poderia ser dito sobre Maya e eu, e posso con irmar que nao ha nada acontecendo entre nos.
E apenas minha mente privada de romance tentando encontrar algo que nao esta la.
Ela afasta uma das mechas penduradas no longo cabelo loiro escuro que esta preso em um coque bagunçado no topo de sua cabeça. — E sim.
— Poderia–
— Ficar lindo na vitrine da frente? — Ela sorri. — Eu sei, e amo voce por dizer isso. So nao estou pronta.
Eu ri. — Eu sou tao previsıvel?
— Sim, assim como sei que voce esta prestes a dizer Quando você estiver pronta, você sabe que estou aqui. Como sempre faz.
— Mas–
— River...
— Esta bem, esta bem. — Eu levanto minhas maos. — Nao vou dizer mais nada.
— Bom. Agora, o que voce esta fazendo aqui? — Caroline veri ica o relogio em seu pulso, em seguida, sai do balcao e se dirige para a porta da frente. —Hoje e o seu dia de folga.
— Apenas checando as coisas. — Nao mencionei a ela que tambem estive aqui no inıcio da manha trabalhando no inventario, quando nao consegui dormir e enlouqueci dentro do meu apartamento.
— Voce nao con ia em mim?
— Claro que con io em voce. Eu–
— Surgiu algum pedido grande?
— Nao. Eu–
— Voce precisava entrar?
— Bem, nao. Mas–
— Entao va para casa, River. Ela vira a placa aberta e endireita a blusa de um manequim antes de voltar para o balcao. — Nao ha razao para voce estar aqui. Vive tanto aqui que estou começando a achar que tem uma cama no escritorio. Quero dizer, esta parecendo que voce pode ter dormido aqui...
Soltei um gemido longo e cansado, esfregando os olhos. — Caramba, valeu.
— O seu encontro com o Homem-Cheese foi tao ruim que voce nao conseguiu dormir?
— O nome dele era Cheddar, Caroline. Cheddar! Claro que o encontro foi muito ruim.
— Desculpa. — Ela estremece. — Talvez voce devesse fazer uma pausa. Todos esses encontros fracassados estao te cansando. Quero dizer... — Ela olha para a minha roupa.
Eu suspiro derrotada. — Voce pode estar certa.
Ela puxa o telefone do bolso, estendendo-o para mim. — Voce pode repetir isso? Vou precisar para chantagem mais tarde.
Eu rolo meus olhos. — Lembre-me de novo por que eu contratei voce?
— Porque eu era a unica pessoa desesperada pelo salario insigni icante que voce estava oferecendo? O que me lembra... voce esta me pagando para estar aqui hoje, nao a voce. Entao…
Eu levanto uma sobrancelha. — Sua sutileza precisa ser trabalhada.
— Oh, eu nao estava tentando ser sutil, River. Voce precisa de uma pausa deste lugar. Tire pelo menos uma noite de folga. Nao vai te matar.
— Como voce sabe? Poderia. Nunca tentei e ainda estou viva. Por que arriscar agora?
— Esse e exatamente o problema – voce nunca tentou. Esta tudo bem aqui. Vai para casa.
Eu gemo. — Tudo bem. Eu vou embora.
— E va para casa, onde voce vai icar a noite toda — ela instrui. Quando eu abro minha boca, ela balança a cabeça e aponta o dedo para mim. — Nao. Eu nao quero ouvir isso. E sem ligar tambem.
Eu aperto meus labios juntos, balançando a cabeça, aceitando o meu destino. Pego minha bolsa, contornando o balcao.
— Casa e sem ligar — eu prometo.
— Bom. — Ela me agarra pelos ombros, conduzindo-me em direçao a porta da loja. — Tome um banho ou algo assim. Voce precisa relaxar.
Oh cara. Um banho. Agua tao quente que quase nao aguento. Velas e um bom livro. Isso soa como o paraıso... — Um banho parece bom.
— Tome um uısque. Ou coma um bolo. Comer bolo na banheira sempre me faz sentir melhor.
— Bolo na banheira? Mas torta...
— Entao pegue uma torta. Faça isso. Con ie em mim.
— Qualquer coisa que voce mandar. — Eu envolvo meus braços em torno dela, apertando-a com força. — Obrigado, Caroline. Nao sei o que faria sem voce as vezes. Estou tao feliz que voce disse sim ao salario insigni icante.
Ela ri, me abraçando de volta. — Eu tambem. Agora va para casa.
— Eu pensei que eu fosse o chefe por aqui...
— Hoje nao. Eu te ligo amanha. — Ela praticamente me empurra para fora da porta, fechando a tranca atras de mim.
— E melhor voce se lembrar de desbloquear isso!
Ela revira os olhos, acenando para mim.
Respiro fundo e me viro em direçao ao meu predio, que ica a cinco quarteiroes de distancia.
Lar. Um bom banho. Um copo de uısque. Todos estao chamando meu nome.
Primeira parada, torta.
— Morris! Desça daı agora!
Miau. — Sim. Miau.
—Eu sou sua Dona. E melhor voce me ouvir, rapaz. Miau.
— Droga, Morris! Voce vai cair, enlouquecer e estragar toda essa experiencia para mim.
Isso e o que a minha vida se tornou, discutir com o meu gato enquanto eu tomo um banho, com uma fatia de torta na mao.
O merdinha inalmente pula para baixo, apenas para pular no vaso sanitario e em seu lugar favorito no apartamento: a pia do banheiro.
Ele mia de novo.
— Bom. Estou feliz que voce encontrou o seu lugar. Agora deixeme relaxar em paz. Juro, eu nunca terei ilhos — eu murmuro. — Se um gato e tao exigente, deve ser mais difıcil com as crianças.
Eu entro na banheira, com cuidado para manter minha torta com segurança acima da agua.
Quando eu estava procurando apartamentos pela primeira vez, o numero um na minha lista de itens obrigatorios era uma grande banheira. Pode parecer um requisito meio futil, mas nada se compara a uma boa imersao quando os demonios que vivem em meu utero tentam me matar uma vez por mes.
Ou quando preciso relaxar.
Como hoje.
Pego minha fatia de torta de maça holandesa do The Gravy Train, a minha segunda torta favorita que eles servem. Eu gemo quando o sabor atinge minha lıngua e afundo na banheira, a agua quente ja fazendo sua magica na tensao que esta começando a parecer permanente.
Maya e Caroline estao certas – Eu trabalho demais. So esta semana, eu coloquei mais de cinquenta horas no Making Waves. Tambem nao e a primeira vez que faço isso neste mes. Me sobrecarregar de trabalho e uma falha minha, uma tatica que uso para evitar tudo o mais que eu nao quero pensar.
E por isso que eu o icialmente alcancei um novo nıvel comendo torta e bebendo uısque na maldita banheira as duas da tarde.
Estou sobrecarregado e sem sexo.
Eu poderia ter consertado aquela coisa de sexo na noite passada com o meu encontro, mas nao havia nenhuma maneira de deixa-lo me levar para casa.
Cheddar. Eca. Um nome tao ridıculo. Eu nao deveria ter tentado provar que Maya estava errada e ir ao encontro para irrita-la porque ele era horrível – e nao apenas por causa de seu (falta de) gosto para tortas.
Nunca conheci uma pessoa mais chata em toda a minha vida.
Achei que talvez ele tivesse uma boa historia sobre seu apelido ridıculo, mas nao era nada mais do que ele se recusar a comer qualquer tipo de queijo alem de cheddar e seus colegas de quarto mexendo com ele por causa disso.
Essa foi a grande historia que ele levou quinze minutos para me contar enquanto esperavamos por nossa mesa, porque ele fez a reserva
para mais tarde do que combinamos. Seu raciocınio era: “Você sabe... porque as mulheres.”
Seu comentario misogino, juntamente com ele ser mais chato do que assistir tinta secar, me deixou ciente que eu nao iria a outro encontro com ele.
Foi quando mandei uma mensagem para minha mae para me tirar de la.
Eu mal esperei ate que estivessemos em uma mesa – aquela em que ele derramou sua bebida congelada.
Eca.
Ok, entao talvez eu tenha que parar de tomar decisoes precipitadas para me livrar desses encontros, mas pelo menos eu sei o que eu quero e nao vou me contentar com pouco.
Eu dou outra mordida na torta de maça, tentando me fazer sentir melhor sobre a minha incapacidade de encontrar um cara normal para namorar.
Talvez eu deva desistir.
Eu tenho bons amigos e meu negocio esta prosperando. Estou feliz onde estou na maioria dos dias. Nao ha razao para balançar o barco... mas cara, eu gostaria que alguem balançasse meu barco.
— Pare de reclamar de sua lamentavel vida sexual, River. Voce deveria estar relaxando, nao reclamando e gemendo. Este e um momento de calma, de paz. Relaxar. Des–
— STILL LIKE THAT OLD TIME ROCK ’N’ ROLL!
— Oh, Jesus amado!
Eu pulo e minha preciosa fatia de torta de maça voa.
E cai bem na agua do meu banho.
— Voce esta falando serio?! — Eu grito, olhando para a parede que esta vibrando com a musica horrıvel batendo no apartamento ao lado do meu.
Dean... de novo!
E a mesma coisa que aconteceu da ultima vez que tomei banho –ele estragou tudo como estragou tudo de bom em minha vida. Eu aposto que eu seria dez vezes mais relaxada, se eu nao tivesse ele como um vizinho.
Eu cansei. Estou completamente farta. Me empurro para fora da banheira, a agua espirrando para os lados, mas nao me importo.
Eu estou chateada. Furiosa. Absolutamente cansada de Dean Evans.
— Voce quer ouvir a merda que a nossa mae esta tentando fazer agora?
— Eu preciso de uma maldita cerveja para isso — eu murmuro enquanto coloco minha chave na fechadura e destranco a porta do meu apartamento.
Nao me importo que sejam apenas duas da tarde; o tom da voz da minha irma cheira a desespero, e eu sei que estou prestes a ouvir alguma merda.
— Diga-me quando estiver pronto. — Eu a ouço tomar um gole do que so posso presumir que seja um vinho da tarde, porque conheço minha irma.
— E triste que ja estejamos bebendo tao cedo.
— Ei! Estou no brunch. Nao ha problema em beber durante o dia, se voce chamar isso de brunch.
— As duas da tarde ainda sao brunch?
— Se me permite beber mimosas durante o dia, entao sim. Eu a imagino sorrindo vitoriosamente. — Voce ja esta pronto para isso?
— Deixe-me colocar Leo de volta em seu terrario primeiro. Equilibro o telefone entre a orelha e o ombro enquanto o coloco na bancada, abrindo as travas de sua cabana movel. — Acabamos de voltar do parque.
— Ah, como esta meu amiguinho?
— E o Leo – um merdinha.
— Como pode uma tartaruga ser um merdinha?
Acredite em mim, Holland. — Eu o pego e o coloco em sua casa. — Ele e travesso como o diabo.
—Voce nao parece excentrico, Dean.
—Bem, merda. Eu me sinto muito melhor ouvindo isso de voce.
—Eu não sou excentrica.
— Voce tem tipo, quatro gatos… — Eu faço meu caminho para a cozinha, usando meu cotovelo para abrir a torneira. Eu uso o mesmo
cotovelo para bombear sabao em minhas maos e lavo como se estivesse me preparando para uma cirurgia. Nenhuma salmonella vai me pegar.
— Eles sao gatos adotivos, seu... seu... idiota!
— Os alunos do quinto ano tem respostas melhores do que essa.
— Isso e porque eles sao todos jovens e modernos. Eu sou velha e nao estou na moda.
Eu rio, desligando a agua e pegando o pano de prato pendurado na beirada da pia para secar minhas maos. — Ninguem fala mais que esta na moda, Holland.
— O que prova meu ponto.
— Voce e mais jovem do que eu.
— Por quinze meses! Isso nao conta.
— Isso conta, irmazinha. — Pego o telefone com a mao novamente e estico a dobra que se forma no meu pescoço. Abro a geladeira e pego uma cerveja.
— Isso sao garrafas que eu ouço tilintar?
— Essas sao as minhas cervejas de brunch, sim. — Eu seguro a garrafa contra o abridor que coloquei na geladeira. — E esse e o som da garrafa de cerveja do brunch se abrindo. — Eu abro a tampa e imediatamente tomo um gole forte. Inclinando minhas costas contra o balcao, cruzo uma perna sobre a outra. — Tudo bem, garota, vamos ouvir. O que nossa mae fez agora?
— Voce se lembra de Brett Johnson do colegio?
— Aquele cara que encontrou uma maneira de trazer sua madrasta a tona em todas as conversas e isso começou a se tornar muito assustador? Infelizmente sim.
— Mais que assustador. Acabei de icar cara a cara com a mamae, e adivinha com quem ela me arranjou?
— Nojento. Por que?
— Porque ela me odeia, e por isso.
— Mamae nao te odeia. E apenas óbvio que eu sou o favorito dela.
Minha irma ri levemente, mas sei que esse conhecimento doi, porque me doi tambem.
Nossos pais nao receberam o memorando “voce nao deve escolher favoritos”.
Eu sou o favorito da mamae e Holland e de initivamente a do papai.
Nos percebemos isso cedo e nos acomodamos na realidade, prometendo um ao outro nunca deixar que isso se interpusesse entre nos. Ao contrario de muitos irmaos, Holland e eu nos damos bem como duas ervilhas numa vagem. Nos nao tınhamos escolha a nao ser nos apoiarmos um no outro crescendo na nossa casa. Sempre pareceu que nossos pais eram mais divorciados do que casados. Era difıcil navegar e seu favoritismo nao ajudava em nada para ajudar a aliviar as tensoes.
Ainda assim, nunca permitimos que eles afetassem nosso relacionamento. Alem de meu amigo de infancia Nolan – e acho que Leo, embora eu nunca diria isso a ela – ela e minha melhor amiga.
— Voce vai sair com ele?
— Eu tenho escolha? — Ela geme. — Voce sabe que a nossa mae vai me culpar de qualquer maneira. Pelo menos ela nao me armou com Sutton Barnes — ela resmunga.
Mesmo que ja façamos isso ha anos, ainda sorrio quando ela chama a mamae de nossa mae.
— A menos que… — Holland esta levando a conversa exatamente para onde eu pensei que ela faria.
Ah, entao é por isso que voce ligou – para me pedir para convencer a mamae a deixar voce fora deste encontro.
— E porque voce e meu irmao favorito.
— Uh-huh. — Eu tomo outro longo gole da minha cerveja.
— Por favor, Dean? Por favorzao? Eu nao quero ir nesse encontro porque tenho noventa e nove por cento de certeza de que esse cara esta comendo a sua madrasta. O motivo que a mamae me colocou com ele esta alem da minha compreensao.
— Ola, o sobrenome dele e Johnson. Voce sabe que a conta bancaria dele e grande e a mamae meio que... bem...
— Materialista? Sempre procurando uma maneira de subir na escala social, mesmo que isso signi ique colocar seus ilhos em perigo? Um monstro?
— Holland...
— O que? Voce sabe que nao estou errada, Dean.
A parte triste e que ela esta certa. Nossos pais nao sao pessoas horrıveis. Eles estao apenas... obcecados por dinheiro.
Quando eu tinha treze anos, tiramos a sorte grande. Meu pai ganhou na loteria real e recebeu o pagamento de cerca de cento e cinquenta milhoes. Muito dinheiro para quase qualquer pessoa, mas era especialmente muito dinheiro para nos, uma famılia de quatro pessoas vivendo de salarios bem magros. Nos nao moravamos em The Heights –o bairro que parecia gerar nada alem de criminosos – como Nolan, mas estavamos certos na linha.
O dinheiro veio na hora certa e papai foi inteligente com seus ganhos. Ele reservou o su iciente para a faculdade para mim e para a Holland, depois investiu o resto em uma ideia de negocio que vinha arquitetando ha anos.
Funcionou e, no primeiro ano, ele recuperou o dobro do que havia investido.
Antes que percebessemos, estavamos nos mudando e começando a estudar na parte rica da cidade.
— Quero dizer, sim, voce esta meio certa — eu concordo. Exceto pela parte do monstro. Mamae nao quer te arranjar. Ela apenas–
— Quer en iar o nariz onde nao pertence? Como na minha vida amorosa?
Eu ri. — Isso. Se isso faz voce se sentir melhor, ela faz comigo tambem.
— E veja como isso acabou para voce!
Ela se refere ao meu ultimo relacionamento, que terminou em desastre e minha mudança para uma cidade diferente.
Holland pigarreou. — Desculpa. Eu nao deveria ter dito isso. Mas... isso signi ica que voce vai me ajudar a sair dessa?
Eu quero minha irma namorando um cara que esta obviamente preso em sua madrasta? Nao.
Eu vou me dobrar para tira-la deste encontro? Tambem nao.
Mas vou falar com nossa mae e tentar faze-la ceder. Holland ja tem o su iciente com o nosso pai governando sua vida. Ela nao precisa adicionar a intromissao de nossa mae a mistura.
— Verei o que posso fazer. Voce sempre pode simplesmente nao ir, sabe disso.
— E decepcionar a nossa mae de novo? Ela ainda esta com raiva de mim depois da nossa ultima briga, acho que nao.
— Nao consigo imaginar que estar do lado ruim da mamae seja pior do que estar na lista de merdas do papai.
Que e exatamente onde estou e estive pela ultima vez... bem, sempre, ao que parece.
— Eu nao sei – eu nunca estive la.
— Deve ser legal. — Eu me empurro para fora do balcao e jogo minha garrafa de cerveja vazia na lixeira. — Falando no papai... quando voce vai perguntar a ele sobre a promoçao?
— Hum ... nunca. Ele nunca vai aceitar.
— Nunca se sabe. Nao custa tentar. Alem disso, seria bom. Voce poderia se mudar para ca e fugir daquela cidade, Holland. Isso nao e bom. Suga, mastiga e cospe tudo errado.
— Sabe, quando voce diz coisas assim, esta insinuando que nossos pais nao sao bons, certo?
— Mamae está se intrometendo em sua vida amorosa quando voce tem quase trinta anos.
— Dean… — Seu tom me diz para desistir.
E a mesma velha luta que travamos ha anos. Eu fui inteligente o su iciente para fugir enquanto ainda podia, mas nao a Holland. Meu pai a tem sob seu controle porque ela se sente em dıvida com ele por algum motivo. E por isso que ela ainda vive naquela comunidade infestada de babacas e ainda trabalha como secretaria dele, embora mereça um cargo melhor na empresa.
Como nao estou com vontade de discutir hoje, mudo de assunto a conversa.
— Quando e o seu encontro?
— Sexta-feira a noite.
— Olha, vou ligar para a mamae hoje a noite e ver se posso começar a falar docemente com ela para cancelar.
Ela grita alto no telefone. — Obrigada, obrigada, obrigada. Voce e o melhor irmao mais velho que uma garota poderia pedir.
— Lembre-se disso da proxima vez que eu precisar de algo.
— Por favor, voce sabe que eu sempre cuido de voce, Deanie Weenie — ela brinca.
Eu gemo com o uso do apelido que odeio.
— Agora voce esta abusando da sorte.
— Voce so esta bravo porque nao tem um apelido para me torturar.
Verdade.
— Que seja. Olha, eu tenho que ir. Preciso tomar banho. Estou nojento por ter icado no parque e preciso fazer meu almoço. A torta que eu comi esta manha simplesmente nao me encheu.
— Torta para o cafe da manha de novo?
— Diz a garota bebendo suco de laranja e champanhe.
— Mimosas sao totalmente uma comida para o cafe da manha! Torta nao e.
— Entao por que o Gravy Train vende no cafe da manha? — Eu retruco.
— Em primeiro lugar, esse nome e totalmente ridıculo, e voce sabe disso. Em segundo lugar... voce foi ao restaurante para o cafe da manha, nao foi? Por favor, me diga que voce nao torturou sua vizinha de novo.
Eu sorrio. — Eu nao torturei minha vizinha de novo.
— Mentiroso! Voce deveria ser legal com ela, Dean. Ela e uma garota muito doce. — Como voce sabe? Voce nunca a conheceu.
— Ela mora ao seu lado e de suas travessuras desde o ano passado e ainda nao te matou. Isso e uma grande indicaçao de que ela e muito legal.
Tento nao revirar os olhos sobre o fato de que outra pessoa –nada menos que minha propria irma – esta do lado de River.
Alguma vez eles pararam para pensar que eu torturo River porque ela e ma comigo sem motivo?
Claro, provavelmente estou muito velho para agir como um jovem, mas ela traz isso a tona em mim. A ferida de River esta muito apertada. Ela precisa aprender a relaxar e parar de levar tudo tao a serio. Ela esta se desgastando e descontando em todos os outros.
—
Vou levar isso em consideraçao na proxima vez que estiver planejando alguma vingança.
Holland nao se incomoda em esconder seu suspiro de cansaço. — Voce e demais, irmaozao
— Eu sei disso, irmazinha. Amo voce, garota.
— Tambem te amo... Deanie Weenie!
A linha ica muda.
Pirralha.
Depois de um banho rapido no chuveiro, estou de volta a cozinha retirando os ingredientes para um farto sanduıche de peru grelhado, bacon e queijo. Pego a frigideira do armario ao lado do fogao e ligo o fogo. Preciso que esse bebe se aqueça imediatamente. Estou faminto.
— Robo cantor! — Eu chamo meu dispositivo inteligente. Toque minha lista de reproduçao de Musica Matinal.
O Old Time Rock & Roll de Bob Seger zumbe baixinho pelo apartamento, e meu humor melhora instantaneamente.
Pego duas fatias de pao e coloco manteiga em cada um. Eu colocando peru e queijo, em seguida, coloco minha mao sobre a assadeira, para ver se esta pronto para o bacon.
— Vamos, panela. Voce sabe que estou morrendo de fome. — Eu balanço minha cabeça quando percebo que estou falando com um objeto inanimado. — Posso estar icando louco. Eu deveria pegar outra cerveja.
Pego outra na geladeira e abro a tampa. Eu normalmente nao bebo tao cedo, mas hoje estou dizendo foda-se.
Provavelmente e apenas o calor que me faz sentir tao cansado, mas este dia parece que esta durando cerca de dez anos.
Ou pode ser por eu ter falado com a minha irma. Ou lidando com River esta manha.
Ela sempre tem esse efeito em mim.
Quando a panela inalmente esta pronta, coloco algumas fatias de bacon e deixo que façam o que querem. A gordura começa a chiar e o cheiro faz meu estomago roncar.
Me viro ate a pia e abro a torneira para começar a enxaguar a faca e limpar a pia. Aprendi bem cedo, quando comecei a viver sozinho, que se nao limpar a medida que estou cozinhando, nunca vou terminar.
Nao sou um desleixado, mas poderia melhorar em algumas areas. Tento manter um apartamento limpo para o caso da minha mae decidir fazer uma de suas visitas surpresa – como ela fez na semana passada, quando me atacou por ter uma caixa de pizza na mesa da sala de estar.
— ...acalma minha alma — eu canto baixinho enquanto limpo. — Eu me lembro– Leo, acho que nunca vou me cansar dessa musica. E um maldito classico, nao e?
Ele nao responde.
Nao que nao esteja ouvindo, mas porque ele e uma tartaruga. Se ha uma coisa com que posso contar com o Leo e como ouvinte.
Ou pelo menos e o que digo a mim mesmo quando estou falando com ele sozinho dentro do meu apartamento como um maluco.
Estar sozinho nao me incomoda. Eu pre iro assim. E por isso que iz tudo o que pude para fugir o mais rapido possıvel. Bem, isso e as pessoas – os cretinos ricos que dirigem o lugar e pegam o dinheiro da mamae e do papai.
A escola particular para a qual meus pais nos mandaram depois que tiramos a sorte grande nao era para mim. Os alunos eram todos idiotas elitistas, e tudo o que os professores faziam era beijar suas bundas.
No inal de tudo, acho que devo agradece-los. Eles sao um grande motivo pelo qual eu queria me tornar um professor. Se eu puder salvar algumas crianças de se sentirem tao perdidos quanto eu, icarei feliz.
E e isso que sou: feliz.
Eu ligo meu dispositivo inteligente, deixando as musicas me lavarem, e tomo um gole saudavel da minha cerveja.
— Ahh, muito melhor.
Eu estalo meus labios, em seguida, veri ico o bacon. Esta quase pronto. So mais alguns minutos e entao poderei preparar o resto do meu almoço e partir para o paraıso do sanduıche.
Pego o pano de prato para me ocupar e começo a limpar as migalhas ao lado do fogao.
BANG, BANG, BANG!
Varios golpes fortes acertam minha porta da frente.
— O que…
Eu jogo o pano em direçao ao balcao e vou ate a entrada.
Eu olho atraves do olho magico, mas quem esta la fora esta cobrindo.
Aquilo so pode signi icar uma coisa…
— Que porra e essa, River? Eu abro a porta. — Por que voce esta batendo na minha porta como se fosse a polıcia. Eu estou–
Minhas palavras morrem na minha lıngua quando eu dou uma olhada nela.
River White esta diante de mim em nada alem de uma toalha. Uma pequena toalha.
Tipo tao pequenininha que tenho certeza de que se ela se inclinar, eu veria tudo.
E caramba, eu quero faze-la se curvar. Suas pernas curtas parecem longas no pedaço de tecido e abraça todas as suas curvas, nao deixando nada para a imaginaçao. Os longos cabelos ruivos que geralmente caem nas costas estao presos em um grampo. Sua pele esta umida, como se ela tivesse acabado de sair do banho e nao se secasse adequadamente.
Merda. Agora estou imaginando River no chuveiro...
— Serio? — Seu tom frio me tira da minha fantasia.
Ela cruza os braços sobre o peito amplo, a pequena toalha subindo com o movimento. Seus olhos castanhos estao ixos em mim, formando fendas inas.
River nao esta aqui para me mostrar o quao sexy ela ica com quase nada.
Ela esta chateada e procurando uma briga.
Novamente.
Eu sorrio, encostado no batente da porta.
— River — eu digo friamente. — A que devo — eu sigo meus olhos para cima e para baixo em seu corpo — este prazer?
— Sua musica horrıvel de gente velha arruinou o meu banho... de novo!
Eu rolo meus olhos. — Nao estava tao alto.
— Nos ja passamos por isso varias vezes, Dean. Seu alto e meu alto sao duas coisas diferentes, especialmente quando as paredes sao inas.
— Se elas fossem inas, eu seria capaz de ouvir as suas musicas atraves delas.
— Eu nao escuto musica.
— O que voce quer dizer com nao escuta musica?
— Quer dizer, eu nao escuto. Eu nao sou uma pessoa de musica. Mas esse nao e o ponto. A questao e–
— Voce nao gosta de musica? — Eu enrolo meu labio. — Não é uma pessoa de música? Entao voce e um monstro?
— Nao ouse tentar me tornar um vilao. Você é o idiota nesta situaçao.
— Porque estou ouvindo musica. Isso soa muito parecido com o enredo de Footloose para mim...
— Footloose e sobre dança.
— Nao estou dançando para voce, River.
— O que? Eca! — Ela geme, jogando a cabeça para tras, a toalha escorregando pelos seios apenas uma fraçao de centımetro. — Eu nao quero que voce dance para mim. Pre iro cortar meu dedao do pe com uma colher enferrujada do que ver voce dançar.
— Isso nao e verdade. Voce nunca me viu dançar – eu poderia ter alguns movimentos doces.
— Eu duvido muito, muito disso. Nao ha nada de doce em voce.
— Oh, River, discordo.
— Implore o quanto quiser. E a verdade. — Ela me lança um olhar penetrante. — Basta abaixar a merda da musica, Dean.
— Voce sabe o que? Nao. Eu nao acho que vou.
— Se voce nao izer isso, eu vou–
— O que? Reportar-me a Lucy? Por favor. Essa mulher me ama. Ela nunca faz nada com as reclamaçoes futeis.
— Ela deveria levar a serio. Este edifıcio estaria muito melhor sem gente como voce.
— Com voce estando aqui? Ate parece.
— Fala serio. Voce e o incomodo aqui, nao eu.
Eu levanto uma sobrancelha para ela. — Diz a menina que dedura constantemente os vizinhos. Ate meus alunos sabem que dedurar nao e legal.
— Eu nao deduro, mas agora que voce mencionou, me sinto pessima por aquelas pobres crianças desorientadas que tem que sofrer durante o ano letivo com você como professor.
— Para que voce saiba, sou um excelente professor.
Ela bufa. — Assim como voce e um excelente dançarino.
— Sabe, estou começando a achar que o motivo pelo qual voce veio aqui foi para mostrar essa sua toalha minuscula. Alguem tem uma agenda sexual comigo?
— O que? Nao! Voce esta seriamente louco! Completamente maluco pra caralho.
— Acontece que acho que estou perfeitamente sao. Seus olhos fecham para fendas ameaçadoras enquanto ela da um passo em minha direçao. Eu icaria apavorado se ela nao fosse 20 centımetros mais baixa do que eu... e me excitasse tanto. — Abaixe. A. Musica.
Eu invadi seu espaço de volta. — Nao.
— Abaixe isso, Dean.
— Me obrigue.
— Ok.
Ela e rapida; Eu vou dou esse merito a ela.
River passa por mim como se eu nao fosse um obstaculo, correndo para o meu apartamento.
— Cade?
— Filha da... — Eu a sigo.
— Onde esta a sua caixa – FOGO! Incendio! Incendio! Incendio!
— O que? — Eu mal paro de rebater ela quando o cheiro me atinge. — Merda! Incendio!
Pego a mangueira de spray conectada a pia e aponto para o fogo.
— Nao! Nao! Agua –
Eu jogo.
E tudo vai para o inferno em um minuto.
As chamas lambem o fogao, a toalha que esta se desintegrando em nada e sobem pela parede. Parece que acontece em menos de dois segundos.
— Seu idiota! — River me puxa para voltar. — Agua e gordura nao combinam bem juntos!
— Por que voce nao me disse isso antes?
— Eu tentei! Por que voce nao sabe disso?
— Pare de discutir e ligue para o 911.
Ela sai correndo do apartamento e eu vou para o sofa, puxando um cobertor pelas minhas costas, jogando-o sobre o fogo.
Parece funcionar... por um momento.
Em seguida, as chamas explodiram atraves do material. Precisamos sair daqui imediatamente.
— Precisamos ir agora! — River grita quando ela volta correndo, ecoando meus pensamentos. Ela me puxa, tentando me puxar para fora do apartamento. — Vamos! Mova-se!
— Espere! Eu preciso pegar Leo.
— Oh meu Deus! SE APRESSE!
Eu me movo como um raio, tirando Leo de seu terrario e de volta para sua cabana em movimento. — Desculpe por voce estar de volta aqui, amigo. Estou apenas tentando salvar a sua vida.
Voce vai parar de falar com sua tartaruga e tirar ela daı? Eu realmente nao quero morrer aqui com você.
— Por que voce ainda esta aqui? — Eu atiro de volta para ela. — Esta preocupada com a minha segurança?
— Porque sou uma boa pessoa.
— Duvido disso. — Eu fecho a tampa. — Feito. Vamos. — Eu estendo minha mao para ela, e ela zomba disso.
— Por favor. Estou não segurando a sua mao, Dean.
Eu a ignoro e agarro a sua mao de qualquer maneira, puxando-a do apartamento e longe do fogo ainda crescente.
— Espere!
Paramos e River estende a mao para o alarme de incendio, puxando-o para baixo.
Ela sorri para mim. — Sempre quis fazer isso.
Ela pressiona seu aperto em mim, e eu ja posso ouvir as sirenes do lado de fora enquanto tento ignorar a maneira como gosto da sensaçao da sua mao na minha.
— A boa notıcia e que quem jogou o cobertor nas chamas ajudou a conter o fogo e ele nao se espalhou pelo apartamento.
Soltei um suspiro pesado. Visto que eu sou sua vizinha de porta e seria a mais provavel de sofrer danos, estou aliviada com as palavras do bombeiro.
— Ha! — Dean aponta para mim como se ele fosse o homem mais inteligente do mundo, sentindo-se ainda mais orgulhoso de si mesmo por ajudar a conter o fogo que começou.
— Mas quem jogou agua na gordura nao era muito inteligente e poderia ter queimado o predio inteiro.
Eu nem me incomodo em tentar esconder o meu sorriso enquanto Dean se encolhe, cheio de vergonha.
Bom. Idiota.
Quem nao sabe que a unica coisa que voce de initivamente não pode fazer e jogar agua em uma panela com gordura?
E pensar que ele esta ensinando nossos jovens...
Porem, se eu estou sendo cem por cento justa... Eu nao sabia disso ate que eu também joguei agua em uma panela com gordura e quase queimei minha propria casa.
Suponho que Dean e eu agora tenhamos algo em comum.
Tecnicamente, duas coisas: incendios por causa de gordura e torta.
Mas nao estou dando a ele a satisfaçao de jamais admitir meu erro em voz alta.
Dean olha para o bombeiro. — Quais sao as mas notıcias?
— Voce queimou seu apartamento.
— Estou completamente ciente. — Seus dentes rangem, mandıbula apertada de frustraçao. — Eu quis dizer–
— Isso e uma tartaruga? — o bombeiro interrompe, apontando para Leo, que esta sentado entre nos em sua cabana na parte de tras da ambulancia. — Havia algum outro animal de estimaçao dentro do apartamento?
— So o Leo aqui.
— Voce chamou sua tartaruga de Leo? — O homem bufa. — Que original.
— Obrigada! — Eu jogo minhas maos para cima. — Foi o que eu disse!
— Na verdade, o nome dele e Tolstoy.
— Uh-huh. Tenho certeza de que era isso que voce pretendia e nao acabou de inventar isso depois de nomear sua tartaruga com o nome da Tartaruga Ninja e as pessoas zombaram de voce por isso.
— Eu nao tenho que responder a voce, especialmente quando esta vestida como uma batata cozida. — Os olhos de Dean descem pelo meu corpo.
Eu nao tenho os mesmos arrepios que tive quando ele passou aquele olhar sobre o meu corpo coberto por uma toalha antes. Os cabelos do meu braço nao vao icar em pe, e todo o meu corpo nao vai formigar com algo que eu nao sinto ha muito tempo.
Nao. Agora, estou morti icada.
Eu pareço ridıcula.
Como a idiota que sou, tao envolvida em minha raiva de Dean, corri ate a porta ao lado para gritar com ele em nada alem da minha toalha.
Quando percebi, era tarde demais para voltar atras. Ele estava abrindo a porta, e eu nao sou de desistir de um desa io – nao importa o quao ridiculamente vestida eu esteja.
Entao aconteceu o incendio, e a ultima coisa em minha mente foi vestir uma roupa. So queria sair do predio em chamas porque a ultima pessoa que quero morrer ao lado e ele.
Agora estou parada na parte de tras da ambulancia, enrolada em um cobertor parecido com um traje espacial, parecendo uma idiota, enquanto nossos vizinhos nos encaram por estragar o dia deles.
Fico feliz que Caroline esteja no trabalho e nao esteja por perto para testemunhar isso – embora eu tenha certeza de que Cooper, que esta tentando ao maximo conter um sorriso malicioso, contara o desastre em detalhes completos.
Eu aceno e ele inclina a cabeça para o lado.
Você está bem? ele murmura, como o cavalheiro que ele e.
Eu atiro para ele um polegar para cima e ele sorri, aceitando minha resposta.
Como posso sentir seus olhos em mim, eu olho para Dean, que esta olhando para mim com um olhar que nao consigo decifrar.
— O que?
Me ignorando, ele se volta para o bombeiro.
— Qual e o dano?
— Seu apartamento esta queimado. — O bombeiro ri quando o rosto de Dean se contorce de frustraçao. — Eu so estou brincando com voce, garoto. As vezes voce tem que encontrar uma maneira de rir em um trabalho tao difıcil como este.
Ele nao responde, apenas encara o primeiro a responder com olhos desinteressados.
O cara pigarreia. — Bem, como eu disse, o fogo foi semi-contido, muitos dos danos sao para a cozinha. No entanto, por causa do conceito aberto do apartamento, meus homens relataram que parte da sala de estar tambem foi dani icada.
— E o terrario do Leo?
— A casa do seu aspirante a Tartaruga Ninja esta intacta.
Dean solta um suspiro aliviado, um que tenho certeza que ele esta segurando desde que fugimos do predio. Nao consigo imaginar que a casa do Leo seja barata e, como minha mae era professora, estou mais do que ciente de como ele ganha pouco.
— Eu estou feliz em ouvir isso. Estou feliz que Leo esta bem. Lucy faz todo mundo pular, aparecendo do nada, como ela sempre faz.
— Aw, merda. Lucy, eu estou tão arrependido. Eu nao... eu nao estava pensando. River veio invadindo meu apartamento para me encher com mais uma reclamaçao sobre o barulho, quando tenho certeza de que ela estava apenas sozinha e precisava de companhia, mas estava com medo de perguntar. Eu–
— Seu bundao! — Eu grito com ele, tentando nao bater na cabeça dele.
Ele apenas sorri para mim, e eu me encolho.
Tenho certeza de que aparecer de toalha nao ajudou em nada, mas nao era isso que eu estava fazendo ali.
Dean arruinou mais um dia meu – primeiro roubando minha torta, depois me deixando toda irritada e estressada quando ja estou estressada. Em seguida, ele teve que estragar meu banho. A única coisa que eu tinha a meu favor hoje, ele estragou tudo.
Tudo isso e culpa dele, e me recuso a assumir qualquer parte da culpa por isso.
Nao. Nao vai acontecer.
Sempre.
Lucy da um tapinha no ombro de Dean. — Nao se preocupe, querido. Estou feliz que todos estejam bem, o dano foi contido e o apartamento abaixo de voce estava vazio. Vamos deixar o seguro cuidar de tudo. — Os cantos de seus labios se inclinam para baixo. — Lamento por voce ter que encontrar um novo lugar.
— O apartamento nao esta habitavel?
— Esta. No entanto, como sındica, não posso permitir que voce ique la, para a sua segurança. Tenho certeza que voce entende.
O rosto de Dean cai, toda a cor desaparecendo em um lash.
Seus ombros caem quando a realidade de tudo começa a se estabelecer.
— Eu vou segurar o apartamento para voce assim que as coisas voltarem ao bom estado — Lucy diz a ele.
— Oh inferno. Puta que pariu. Onde vou morar? Jamais voltaria para a casa dos meus pais, e a casa do meu melhor amigo e muito pequena para nos dois e Leo. — Seus olhos se arregalam de medo. Leo! Ah, merda, merda, merda. Eu poderia ir para um hotel, mas... oh, inferno. Merda. Estou completamente ferrado. Eu–
— Dean — Lucy diz com aquela voz suave dela enquanto ele engole o ar. — Nos vamos arrumar isso. Apenas respire. E relaxe...
— Relaxar? Eu nao consigo relaxar, Lucy! Eu quase queimei todo o seu predio!
— Oh, querido… — Ela o encara apenas a alguns metros de distancia, falando baixinho, tentando fazer com que ele se acalme.
O bombeiro assovia. — Estou neste negocio ha tempo su iciente para saber que o seguro pode ser lento como o diabo. Pode ser alguns meses difıceis para ele.
Meses? Dean poderia estar fora do seu lugar por tanto tempo? E o Leo tambem?
Merda. Isso me faz sentir mal por Leo.
E
acho que Dean tambem. Mas apenas por padrao.
— Droga. Vamos dar uma pausa para ele. — O cavalheiro balança a cabeça e se vira para mim, apontando o polegar para sua tripulaçao. — Vou enviar um dos meus homens para terminar de tomar as suas declaraçoes. Basta me avisar se precisar de mais alguma coisa.
— Obrigada — murmuro, atirando-lhe um sorriso rapido, em seguida, desviando meu olhar de volta para a cena na minha frente.
E difıcil tirar meus olhos de Dean.
Ele se eleva sobre Lucy, com a cabeça entre as maos enquanto ela fala com ele em voz baixa.
Ele esta mais chateado do que eu ja o vi antes – e isso inclui a vez que seu time de futebol perdeu o grande jogo... ou seja la o que foi que ele chorou por uma semana.
Tenho certeza de que tudo que esta por vir nos proximos meses esta passando por sua cabeça em um loop, incluindo a escola de verao, que ele esta programado para começar a lecionar em algumas semanas.
Uma sensaçao incomoda começa na base da minha espinha e desliza pelo meu pescoço.
Besteira.
Talvez eu esteja me sentindo mal por ele, e nao apenas porque ele e o dono de Leo.
Eu gosto do pequeno Leo, nao que eu va admitir, e nao quero que Dean tenha que desistir dele so para ter um lugar para icar. Isso nao e justo para nenhum deles.
Eu tenho um quarto vago...
Nao! Isso e ridıculo.
Nao posso deixar que Dean ique comigo. Nao ha absolutamente nada de bom que possa resultar disso. Vamos nos matar.
Nao ha como sobrevivermos.
Mas Leo...
— Ele pode icar comigo!
Eles giram a cabeça na minha direçao, e coloco minha mao sobre a boca enquanto minhas palavras sao registradas em meus proprios ouvidos.
O que diabos eu acabei de dizer?
Dean levanta aquela sobrancelha que ele sempre levanta, inclinando a cabeça para o lado. Eu odeio essa sobrancelha. — O que e que foi isso?
— Voce pode icar comigo.
Não! Pare de falar, River!
— O que?
Eu gemo, puxando meu traje espacial mais apertado em torno de mim, de repente me sinto mais exposta do que quando tudo que eu tinha cobrindo meu corpo era a menor toalha do mundo.
— Nao me faça dizer isso de novo, seu idiota.
— Nao, eu nao acho que entendi voce. Eu–
— A menos que sua cabeça esteja cheia de tanta fumaça quanto seu apartamento — Lucy fala, fazendo-o se encolher — voce a ouviu perfeitamente bem, querido.
Ela se move em minha direçao, batendo palmas com um sorriso nos labios que eu decididamente nao gosto. — É uma ideia maravilhosa, River.
— Voce nao pode estar falando serio. — Dean chega ao lado dela. — Nao tem como voce estar falando serio.
— Eu estou.
Puta merda.
Eu estou falando serio.
Estou disposta a deixar Dean icar comigo.
E apenas um mes ou dois, certo? Tenho certeza de que posso evitar mata-lo por tanto tempo.
— Voce esta me zoando? Ashton? Ashton Kutcher? Voce pode sair agora!
Eu franzo meus labios. — Sim, porque eu trouxe Ashton Kutcher aqui para ferrar com voce e nao para ferrar com ele eu mesma. Em seus sonhos, idiota.
— Isso estaria em seus sonhos.
Eu bufo e Lucy ri.
— Oh sim. — Ela aperta os labios, tentando conter um sorriso. Isso vai funcionar perfeitamente.
— Eu quero um contrato. — Eu aponto para ele. — Como um bom. Um legıtimo. Algo que vai impedir essa ameaça de me libertar pelo resto de seus dias.
— Ha tantas coisas erradas com essa a irmaçao. A primeira e que voce realmente acha que eu sou a ameaça.
— Voce e aquele que toca musica muito alto! Isso e exatamente o que colocou voce nessa bagunça!
— Nao, o que me colocou nessa bagunça foi voce andando ate o meu apartamento parecendo sexy em nada alem de uma maldita toalha.
— Voce acabou de me chamar de sexy?
— Voce estava usando uma toalha, River. Uma toalha! Eu sou um homem – eu acharia que ate Lucy icaria sexy em uma toalha! — Dean estremece. — Quero dizer, sem ofensa, Lucy. E que... voce tem a idade da minha avo...
— Nenhuma ofensa tomada. — Ela acena com a mao. — Mas, so para voce saber, eu ico muito sexy em uma toalha.
Ela balança as sobrancelhas e os olhos de Dean crescem para o dobro do tamanho normal.
— E-eu… — Ele se debate, tentando encontrar as palavras certas para dizer. — Eu... umm...
Lucy ignora Dean sendo... bem, Dean.
— Voce pode ter seu contrato, River. Vou começar a trabalhar nisso esta noite e acertar tudo amanha de manha. O que precisa acontecer agora e que todos voltem para seus apartamentos e continuem com o dia. Voces dois precisam descansar. Voce teve um longo dia e uma boa noite de descanso e totalmente necessaria. — Ela sorri maliciosamente. — Pode ser a ultima chance de algumas pessoas para isso.
Eu gemo.
— Por que eu odeio absolutamente o jeito que isso soa?
— Porque, querida, provavelmente estou certa. Agora, deixe-me embrulhar tudo com esses bombeiros legais e estaremos todos de volta
para dentro antes que percebamos. Volto logo.
Lucy sai correndo, deixando eu e Dean sozinhos.
Acho que devo me acostumar, porque aparentemente ele vai morar comigo agora.
Por que eu disse que ele poderia icar comigo? Por que eu nao conseguia manter minha boca fechada? Maldito Leo por me fazer sentir mal.
Eu olho para a tartaruga, que nao parece tao feliz por estar de volta em sua cabana.
— Nao de a ele olhos malignos. Ele nao fez nada para voce.
— Porque ele e uma tartaruga, nao uma pessoa.
— Ele tem muita personalidade, o que e mais do que posso dizer de voce. — Ele zomba de mim.
— Eu sou cheia de personalidade – e uma personalidade brilhante. Eu sou um raio de sol do caralho.
— Oh, eu duvido muito disso.
— E assim que voce esta escolhendo falar comigo? A pessoa que e gentil o su iciente para permitir que voce more no apartamento dela quando voce tem um historico de incendio criminoso?
Dean move sua mandıbula para frente e para tras. Ele quer dizer algo sarcastico, mas ele morde a lıngua.
Homem inteligente.
Os bombeiros liberam todos os outros de volta para seus apartamentos. A maioria de nossos vizinhos nos da sorrisos tristes enquanto se arrastam de volta para dentro, mas alguns deles mandam olhares furiosos em nossa direçao.
— Foi tudo culpa dele. — Eu aponto para Dean. — Direcione a sua furia para esse cara.
Dean bate no meu dedo. — Pare com isso. Ja falamos sobre isso: voce me distraiu com...
— Minha toalha – sim, eu ouvi. Voce sabe, voce continua trazendo isso a tona. E quase como se voce tivesse uma pequena queda por mim ou algo assim.
Ele zomba. — Eu ja te disse, eu acharia qualquer um atraente em uma toalha.
— Isso e tudo o que voce precisa dizer a si mesmo para ajuda-lo a dormir no quarto de frente para o meu a noite. Falando nisso... — Eu me levanto da ambulancia, de frente para ele. — Essa coisa toda de voce se mudar e completamente temporaria.
— Eu tambem entendi assim.
— E so ate que seu lugar seja consertado ou voce encontre outro lugar.
Ele estreita os olhos. — Sim, entendi.
— E havera regras.
Ele exala. — Eu imaginei.
— Bom. Eu so quero ser clara.
— Voce esta sendo.
Eu me viro e começo a voltar para o predio – entao algo me atinge.
Dean disse que eu sou sexy.
Uma linha precisa ser desenhada o mais rapido possıvel.
Eu volto para ele, e ele me olha com olhos curiosos.
— Sim, River? — A sobrancelha sobe.
— Voce nao pode tentar dormir comigo.
Ele deixa cair o queixo, surpreso com o que eu disse.
Entao, ele cai na gargalhada.
E nao qualquer tipo de risada. Nao. E do tipo barulhento, o tipo que atrai todos os olhares em um raio de trinta metros.
Isso e exatamente o que esta acontecendo – todo mundo esta olhando para nos enquanto ele se dobra.
— Serio? — Eu fecho a cara, esperando por ele se recompor.
Quando ele inalmente acaba, para respirar, ele esta enxugando os olhos como se estivesse limpando as lagrimas.
— Oh, cara. Obrigado por isso. Eu precisava de uma boa risada. Tem sido um longo dia. — Dean sai da ambulancia, agarrando a cabana de Leo. Ele vem em minha direçao com con iança. — Nao se preocupe, River, nao terei problemas em resistir a voce.
— Nem mesmo com — eu deixo cair o traje espacial — isso?
Os olhos de Dean escurecem no momento em que o cobertor atinge o chao, sua mandıbula apertando com força enquanto suas narinas dilatam.
Ele tenta, eu dou isso a ele.
Mas ele nao pode lutar contra isso.
Lentamente, seus olhos descem pelo meu corpo e, assim como antes, posso sentir seu olhar me acariciando.
Exceto que desta vez, e melhor.
E quase como se eu nao estivesse vestindo nada.
Como se ele pudesse ver tudo de mim.
Ate as partes que eu escondo.
Lamento ter jogado o cobertor de lado por apenas um momento.
Entao o poder passa por mim e, pela primeira vez, durante o joguinho de vai e vem que jogamos no ano passado, sou eu quem esta no controle.
Dean e sempre aquele que da a ultima palavra. Ele e sempre aquele que vai embora, me deixando nervosa e irritada.
Hoje nao.
Nao, eu nao vou dar a ele a satisfaçao
Eu levanto meu queixo, nao recuando. — Parece que pode nao ser o caso, Dean.
Eu me giro no meu calcanhar, deixando-o parado ali olhando para mim.
E eu sei que ele esta encarando.
Porque seu olhar e tao quente quanto o incendio que ele começou.
Estou morando com River ha cinco minutos e ja quero me mudar.
Nao apenas porque ela e a reencarnaçao de Lucifer, da qual tenho noventa e nove por cento de certeza, especialmente depois daquela façanha que ela fez la fora.
Ou porque sou seu inimigo jurado por algum motivo desconhecido para mim.
Nao e nenhuma dessas coisas. E o maldito gato.
Aquele que esta sentado no sofa, rosnando para mim nos ultimos minutos. O mesmo que escapou do apartamento de River pelo menos dez vezes no ano passado e encontrou o caminho para dentro do meu, tentando chegar ate Leo.
Quando tento pega-lo e leva-lo para casa, ele ica agressivo como se eu fosse o unico invadindo seu espaço.
— Morris, seja legal. — River coloca uma das minhas malas perto do sofa, estendendo a mao e coçando entre as orelhas. — Assim que ele te conhecer, vai se acalmar. — Ela faz uma pausa, lançando um olhar na minha direçao. — Bem, talvez nao. A inal, e você.
— Isso e maneira de tratar um convidado? — Eu coloco a minha outra mala ao lado da primeira.
O bombeiro estava certo sobre os danos do incendio: a maior parte foi contida na cozinha, apenas uma pequena mancha na sala de estar foi queimada.
O maior dano foi o causado pela fumaça. E evidente em todo o apartamento. Eu nao sou um grande fa de manter as portas fechadas –me faz sentir todo fechado – entao isso se espalhou rapido e para longe.
Tenho certeza de que vou ter que lavar todas as roupas que joguei nas malas pelo menos duas vezes, apenas para tirar o fedor.
Um incendio. Um maldito incendio de gordura.
Eu poderia ter queimado o predio inteiro hoje.
Eu poderia ter me machucado. Ou Leo. River.
Porra, eu sou um idiota.
Eu olho em volta da minha nova sala de estar. Alem de algumas mudanças de cor, como pisos e armarios diferentes, e o mesmo apartamento que eu – tinha – acabado de queimar.
Deve ser um ajuste relativamente facil. Isso e bom, porque eu poderia usar algo facil, considerando que acabei de colocar fogo no meu apartamento e tudo.
Merda. Nao posso acreditar que River, de todas as pessoas, me acolheu.
A casa da minha irma estava uma bagunça, considerando que ela ainda mora em Assholetown.
A casa de Nolan e muito pequena e incompleta. O cara deveria se mudar para um bairro melhor.
E nao ha nenhuma maneira no inferno de eu estar indo para meus pais com isso. Meu pai comeria esse acidente como se fosse bacon, e meu velho adora bacon.
Um hotel teria sido minha unica outra opçao, e teria sido caro. Quando River ofereceu seu lugar, quase disse nao. Eu desembolsaria esse dinheiro apenas para ofender sua bondade. Mas entao o pensamento de pegar minha vida e mudar para um lugar completamente desconhecido por um numero inde inido de semanas, quando tenho tantas coisas para fazer...
E, bem, aqui estou.
Puta que pariu. Eu passo a mao pelo meu cabelo, puxando as pontas com força demais. Mas, merda, quero dizer, quao burro eu sou por me deixar entrar nessa bagunça? Com a minha sorte, isso vai levar meses para consertar. Isso vai atrapalhar completamente a programaçao de Leo, minha programaçao. Foi–
— Ei. — A voz de River interrompe meu panico. — Tudo vai icar bem. Lucy estava certa – ninguem se machucou, e isso e o mais importante. Apartamentos e coisas sao substituıveis. Pessoas e animais de estimaçao nao sao. Apenas se concentre nisso e o resto se encaixara.
Suas palavras sao suaves. Calmante ate, como se ela pudesse ler a ansiedade luindo em minha mente. E o tom mais doce que ela ja usou comigo.
— Uh, obrigado. — Eu levanto a mao, apertando minha nuca. E estranho receber a gentileza de River.
No entanto... e reconfortante.
— De nada. Ela limpa a garganta e aponta para o painel encostado na parede. — Pode colocar Leo aqui se funcionar para voce. Voce vai icar no meu escritorio e nao ha lugar para um tanque la. Vou entrar e reorganiza-lo amanha para que haja espaço para mais do que apenas um colchao de ar. Voce vai ter que dormir no sofa esta noite.
— Eu nao me importo com o sofa. Algumas noites eu desmaio no meu de qualquer maneira. Estou muito grato por ter um lugar para icar.
E e verdade. Mesmo que seja com River.
Ela balança a cabeça e começa a puxar bugigangas do painel, movendo-as para a estante que ocupa a outra parede. — Nao tenho muita comida aqui e estava planejando uma torta para o jantar, entao vamos precisar ir ao mercado tambem.
— Eu posso pagar por isso. Pode ser parte do meu aluguel por icar aqui. O que, de novo, eu agradeço.
Outro aceno curto. — E eu vou precisar passar na loja de ferramentas algum dia para pegar uma chave para voce. Maya tem a minha unica reserva.
Ela se move rapidamente de novo, como se nao quisesse que eu reconhecesse a sua gentileza.
Eu simplesmente nao entendo o porque.
— Qual e o seu ponto?
Ela para seus movimentos, olhando para mim atraves do cabelo ruivo bagunçado que mal consegue icar no grampo em que ela o prendeu. — Desculpe-me?
— Eu disse, qual e o seu ponto? Por que voce esta me deixando icar aqui e entao agindo assim quando eu continuo tentando te agradecer?
Suas sobrancelhas sobem uma fraçao. — E isso que voce esta fazendo?
— Sim.
— Nao parece ser assim.
— Nao e?
Outra migalha.
Eu aperto minha mandıbula. — Obrigado, River. Obrigado por me permitir icar aqui. Nao tenho certeza de como vou te retribuir.
Uma mao no quadril, ela bate o dedo no queixo. — Puxa, eu me pergunto como voce poderia me retribuir. Alem do aluguel, porque eu realmente espero isso. — Ela estala os dedos. — Ja sei! Que tal voce parar de roubar minha torta.
Eu estreito meus olhos. — Nao.
— Parece que alguem vai icar sem-teto, entao.
— Voce realmente acha que estou acreditando que o motivo pelo qual voce esta me permitindo icar aqui e para que eu pare de “roubar” sua torta?
— O fato de que voce acabou de colocar roubo entre aspas...— Ela balança a cabeça, sua raiva e palpavel. — Pare de questionar os meus motivos.
— Entao voce esta admitindo que tem motivos?
— O que? Nao.
— Entao o que e isso?
Ela rosna, jogando a cabeça para tras em frustraçao. — Por que esta analisando tanto? Voce nao pode simplesmente ser grato?
— Isso e o que eu estava tentando fazer, e voce estava sendo indiferente.
— Porque voce esta agindo estranho. — Ela passa por mim e vai ate a estante, colocando outra estatueta nela. Nossa, quantas dessas coisas ela tem?
— Estranho como?
— Eu nao sei... legal.
— Eu sempre sou legal com voce. Eu compro uma torta para voce.
Ela bate a estatua no chao, passando por mim novamente, pegando mais duas e levando-as de volta para a prateleira. — Voce me compra torta porque se sente culpado por pegar a minha. Isso nao e ser legal – isso e estar cobrindo a sua propria bunda.
Ela me pegou...
— Ok, entao pode haver alguma verdade nisso. Mas ainda assim. Eu considero voce uma amiga, River. — Ela bufa. — Talvez nao uma
amiga, mas pelo menos uma conhecida.
Depois de colocar os dois ultimos colecionaveis na prateleira onde ela os quer, ela se vira para mim.
Sua boca carnuda e desenhada em uma linha ina. Mesmo que ela pareça seria, nao posso fazer com que meus olhos nao vagueiam.
Ja sequei bastante a River no passado.
Eu seria um tolo se nao reconhecesse o quao atraente ela e.
Mas depois de ve-la naquela toalha, e como se eu nao pudesse tirar meus olhos dela.
Ela jogou fora seu pedaço de quase nada e trocou por um par de leggings azul-marinho e uma camisa grande. Seu cabelo esta a mesma bagunça de antes, e ela ainda nao esta usando nada de maquiagem. Ela passou a tarde tentando apagar um incendio que eu coloquei e ainda assim... ela parece incrıvel.
Ela da dois passos em minha direçao e eu arrasto meus olhos de seu corpo para seu olhar castanho.
— Voce e um pe no saco. Alto e desagradavel. O pior vizinho do mundo. — Abro a boca, mas ela aponta para mim. — Voce acabou de tentar queimar o predio inteiro, entao nem tente desmentir isso. — Eu concordo. — Nos estabelecemos que eu te odeio. Nao somos amigos. Somos vizinhos e, agora, companheiros de quarto. E isso aí. Nada mais. Portanto, nao ique pensando que vou me apaixonar pelos seus encantos e acabaremos sendo amigos em breve. Voce faz o seu trabalho, eu faço o meu.
Eu quero discutir. Principalmente para argumentar. Mas ela esta certa. A maneira mais facil de convivermos sem bater de cabeça a cada cinco minutos e nos limitarmos aos nossos respectivos cantos.
— Entendeu?
Eu aceno para ela. — Entendido.
— Bom. — Ela se vira e se dirige para a porta da frente. Calça os sapatos. — Vamos a loja.
— Achei que voce tivesse dito que deverıamos fazer nossas proprias coisas.
Ela range os dentes, nao gostando do meu comentario espertinho. — Toda essa emoçao do dia me deixou com fome. — Ela abre a porta. E voce arruinou minha torta, entao voce me deve o jantar. Vamos.
Meu estomago ronca com a mençao de comida, e eu percebo que estou morrendo de fome porque nunca cheguei a comer aquele maldito sanduıche.
Pego a cabana de Leo. — Pelo menos me deixe escolher o lugar.
Ela me lança um olhar. — E fofo que voce pense que e assim que funciona.
— Alguem ja te disse que voce e meio baixa para ser tao atrevida?
— Cale a boca e me alimente antes que eu ique com fome.
— Isso e voce normalmente? Cara, vai ser muito bom morar aqui, entao.
Ela resmunga algo que nao consigo entender, mas seja o que for, nao soa tao mal-humorado quanto eu esperava.
Tenho a sensaçao de que River nao vai odiar me ter como colega de quarto tanto quanto ela pensa que vai.
— Voce se importa se pararmos na loja de animais por um minuto? Preciso pegar algumas coisas para o terrario de Leo.
Uma das vantagens do predio em que moramos e a localizaçao. E um local privilegiado no coraçao da cidade. Quase tudo o que e importante esta a uma curta caminhada e, se nao estiver, voce pode andar de bicicleta. Se voce estiver se sentindo alegre, voce pode dirigir.
Depois de (naturalmente) parar no The Gravy Train para jantar – ica apenas no im do quarteirao – optamos por ir a pe ate a loja, ja que nao estavamos fazendo compras pesadas no mercado... ou foi o que pensei.
Estou carregando tres bolsas – uma em cada ombro e uma na minha mao - e River tem uma.
Ela comprou nada menos que tres litros de sorvete, sem mencionar pelo menos quatro tipos diferentes de biscoitos de queijo.
Estou começando a achar que ela nao passa muito tempo em casa e tambem nao come la com frequencia, o que faria sentido porque a mulher esta sempre trabalhando. E um milagre ela encontrar tempo para reclamar de mim quando mal ica em casa.
— Voce acabou de perguntar se estava tudo bem em entrar na loja de animais? Onde posso brincar com os animais?
— Vou tomar isso como um sim.
— Grande sim. So nao diga a Morris que iquei animada com isso.
— Ele nao vai sentir o cheiro em voce?
— Sim, mas direi a ele que a culpa e sua.
— E ele vai... acreditar nisso?
— Sim. — Ela encolhe os ombros. — Ele e tao ingenuo quanto Sam.
Eu rio... e so me preocupo com sua sanidade. — Sam e um bom garoto.
— Ele e o melhor garoto. Como sempre.
— Voce e tendenciosa.
— Eu posso ser tendenciosa. Ele fez parte da minha vida por quase metade dela. — Ela inclina a cabeça. — O que? Seus olhos se arregalaram.
— Nao e nada. Eu simplesmente nunca considerei a idade de Sam em relaçao a idade de Maya. Presumo que tenhamos a mesma idade, entao...
— Voce acabou de descobrir que Maya teve uma gravidez na adolescencia. — Ela acena com a cabeça. — Ela tem essa aparencia.
— Eu nao quis dizer nada com isso. De verdade.
— Estranhamente, eu acredito nisso — ela murmura, levantando a sacola reutilizavel – aquela que ela me fez comprar porque era bonita e eu devia a ela – mais alto.
— Voce precisa de ajuda com sua sacola?
Ela me ignora. — Tenho vinte e oito anos. Isso e quao velho voce e?
— Sim. Desde o mes passado.
— O que? Eu nao sabia que era seu aniversario no mes passado!
— Como voce icaria? Nao somos amigos, nem conhecidos. Apenas vizinhos, lembra?
Suas sobrancelhas se juntam, nao gostando de como eu jogo suas palavras de volta em sua cara. — Que seja. Nao e nada pessoal. Eu so gosto de aniversarios.
— Vou arquivar essa informaçao na minha pasta Coisas que agora sei sobre minha vizinha que me odeia para futuras nao interaçoes.
Eu recebo uma carranca por isso.
Eu paro em frente as portas da loja de animais de estimaçao e viro para River. — Olha, tem um monte de coisas fofas aqui.
— Como... hamsters? E coelhos? E porquinhos-da-ındia? — Ela engasga. —Oh meu Deus, onde os porquinhos-da-ındia ainda vivem na selva? Eu literalmente nunca pensei nisso ate agora. Onde vivem os hamsters? O que é mesmo um hamster?
Ela esta falando a mil por hora e ja me arrependo de perguntar se podemos parar, mas preciso de coisas para o terrario de Leo. Espero que River nao se importe que eu use o seu banheiro esta noite para esfregar seu tanque e limpa-lo para que eu possa começar a substituir as coisas.
— Temos coisas congeladas — eu a lembro. — Como aquele litro de sorvete que voce roubou das minhas maos.
Ela levanta um ombro. — Deveria ter colocado na sua bolsa mais rapido.
Ela tem sorte de ser apenas meu terceiro sabor favorito; do contrario, teria feito uma cena.
— Mas eu entendo. Nao vou perder muito tempo brincando com todas as criaturinhas adoraveis.
— Por que eu nao acredito em voce?
— Porque provavelmente estou mentindo. — Ela passa por mim como uma brisa, abrindo a porta. Ela olha para tras por cima do ombro, mechas soltas de seu cabelo vermelho voando com a brisa. — Vamos. Nao quero que meu sorvete derreta. —
Em que diabos eu me meti?
A cena do crime e iminente.
Dean esta morando no meu apartamento ha dois dias, e estou perto de chutar sua bunda para o olho da rua. Ou simplesmente pulando para mata-lo.
Fecho a geladeira com força e me viro para ele, olhando feio.
Ele coloca o garfo ao lado do prato de cafe da manha quase vazio e esfrega os olhos cansados. — E agora?
— Voce sabe o que.
Ele passa os dedos pelo cabelo escuro. — Olha, eu dormi como uma merda na noite passada, entao se voce pudesse falar a acusaçao que voce tem desta vez, eu agradeceria.
— E eu apreciaria se voce parasse de usar todo o meu creme. Nao e a primeira coisa minha que ele usa.
Quando acordei ontem, ele estava cavando meus ovos. Claro, eles sao apenas ovos, mas tınhamos acabado de ir ao supermercado na noite anterior e discutido sobre como o sistema de compras funcionaria.
Levamos dez minutos praticamente gritando um com o outro no corredor de batatas fritas, mas concordamos que ele compraria seus proprios mantimentos – e apenas os seus – e dividirıamos a geladeira por igual.
Aparentemente, a sua versao de igualdade e a minha eram duas coisas diferentes.
Mesmo com a loja fechada as segundas-feiras, fugi para a butique para evita-lo.
Acontece que ele comer meus ovos foi apenas a primeira de muitas ofensas que viriam.
Como deixar as suas meias suadas e fedorentas dentro de seus sapatos depois da academia. Tive que acender duas velas so para tirar o fedor da sala de estar.
Depois, ha sua briga constante com Morris, que Dean claramente odeia. (Tudo bem. O sentimento e mutuo.)
E a maior reclamaçao de todas: nao posso simplesmente entrar pela porta e tirar o sutia.
Minhas costas estao começando a doer e esses meninos maus precisam ser livres. Ele esta estragando minha capacidade de voltar para casa e relaxar a noite.
Bem, para ser justo, ele sempre fez isso.
Mas isso e pior.
— Eu nao usei o seu creme, River.
Eu aceno em direçao a sua caneca, que contem cafe que esta longe de ser preto puro. — Entao o que esta em sua xıcara?
— Cafe. — Cafe e...
— Brilho do sol.
— Dean.
— E leite.
Eu fungo. — Voce espera que eu acredite nisso quando meu creme esta obviamente vazio?
— Eu nao sou a unica pessoa neste apartamento. Voce parou para pensar que você poderia ter usado o resto do seu creme?
— Nao. Eu saberia.
— Se fosse esse o caso, voce se lembraria de quando estavamos no supermercado dois dias atras e voce icou na frente do creme por cinco minutos escolhendo um e depois colocando-o de volta porque voce ainda tinha bastante em casa.
Ele diz isso com tanta con iança que quase acredito nele.
— Voce quase me pegou, mas me lembro perfeitamente de coloca-lo na minha cesta.
— Entao voce o tirou quando descemos o corredor de sorvete porque se icasse sem creme, simplesmente pararia no Gravy Train. Ele suspira novamente. — Con ie em mim, eu nao roubei a sua merda.
— Eu nao acredito em voce.
Ele se levanta da cadeira e pega seu prato, levando-o para a pia. — Isso e muito ruim, porque e a verdade.
Eu cruzo meus braços, encostado no balcao, olhando para ele.
Ele enrola as mangas de sua camisa de uma maneira que faz seus antebraços estourarem, especialmente quando ele pega a esponja. Ele esfrega levemente o prato, depois o coloca na maquina de lavar antes de passar para os outros pratos na pia.
— Voce nao precisa fazer isso. Essa e a minha bagunça – eu posso limpar.
Ele me ignora e continua a pre-lavar todos os pratos como se a maquina de lavar louça nao tivesse sido inventada para fazer exatamente esse trabalho.
Que seja. Se ele quiser lavar tudo duas vezes, ele pode perder o seu tempo.
Seu labio inferior esta en iado entre os dentes enquanto ele se concentra no que esta fazendo.
O cheiro de algo que de initivamente não e sabao chega sobre mim.
E o Dean. Canela e cedro.
O aroma vem daquele chiclete maldito que ele esta sempre mascando, e o cheiro amadeirado deve ser de sua colonia.
Eu me pego querendo me inclinar para ele, para me familiarizar melhor com a fragrancia, porque eu nunca senti uma combinaçao tao atraente antes.
Ele faz um barulho, e eu percebo que estou apenas parada aqui olhando e cheirando-o como uma idiota.
O que diabos estou fazendo? Por que ainda estou de pé aqui? Vá embora, River...
Exceto que por algum motivo, eu nao vou.
— Entao, ha algum plano para o dia? — Eu pergunto.
— Estou indo para a escola hoje para começar a preparar a minha sala para as aulas da proxima semana. Estava na minha agenda antes do incendio.
— Voce ensina ingles, certo?
— Sim.
— Sam disse que era sua aula favorita no ano passado. Surpreendente, porque aquele garoto odeia ler.
Um sorriso se forma nos labios de Dean. — Eu gosto de ouvir isso. Sam e um bom aluno. Ele sempre fazia perguntas tao... interessantes sobre as tarefas de leitura. Muitas vezes, aproximou-se deles de um angulo inesperado. Me surpreendeu, algo que e cada vez mais difıcil de fazer quanto mais eu ensino.
— Voce tem ensinado ha muito tempo?
— Cerca de quatro anos agora. Trabalhei na empresa do meu pai desde o segundo grau por um tempo, mas nao era o que eu queria fazer. Desisti, me candidatei na escola e tenho ensinado desde entao.
— Voce gosta disso?
— Eu amo isso. Nao me entenda mal, tem seus dias ruins, mas todo trabalho tem. — Ele encolhe os ombros. — Nao consigo me imaginar fazendo outra coisa.
Eu posso entender isso. E como eu me sinto sobre a Making Waves.
— Por que voce dormiu como uma merda na noite passada?
Outro suspiro enquanto ele olha para mim. — Por que voce esta fazendo tantas perguntas?
— Porque sou mais curiosa de manha. — Eu dou a ele um sorriso sarcastico.
Ele tem razao. Eu estou fazendo um monte de perguntas, e nao sei porque. Estou me sentindo incomumente tagarela – mas talvez eu seja sempre tagarela e simplesmente nao sei disso porque nunca ha mais ninguem aqui.
Eu deveria parar enquanto estou na frente. Nao quero icar confortavel tendo alguem aqui para conversar. Mais do que isso, nao quero que Dean ique muito confortavel aqui.
Ele inalmente me responde. — Eu nunca caı em um sono profundo de verdade.
— Eu nao te mantive acordado, certo?
Sobrancelhas grossas sobem, um sorriso provocador em seus labios. — Voce quer dizer a primeira, segunda ou terceira vez que voce entrou no escritorio?
Eu entrei as onze da noite, apenas quinze minutos depois que Dean se retirou para dormir, e acendi a luz.
Eu nem pensei sobre ele estar la. Foi completamente por habito.
Ele pulou do colchao de ar vestindo apenas uma cueca boxer cinza que não deixou nada para a imaginaçao.
Desviei meus olhos o mais rapido que pude, mas nao antes de dar uma olhada no que ele tinha a oferecer.
Houve um momento em que questionei por que o odiava novamente.
Entao, ele falou.
— Puta que pariu. Achei que você fosse um gremlin. Então eu dei uma boa olhada em você.
— E?
— Gremlins são muito mais fofos.
Eu mostrei o dedo do meio para ele, agarrei o caderno que estava procurando e saı sem apagar a luz.
Eu podia ouvi-lo xingando enquanto eu corria de volta para o meu quarto.
As outras vezes que eu entrei la nao foram nem por maldade. Eu realmente precisava de coisas. Foi apenas um bonus que interrompeu seu sono.
Mas ve-lo esta manha... A culpa pesa em meu estomago, especialmente porque eu posso perceber como ele esta se sentindo cansado.
Ha varios anos eu sofro de insonia. Para ser honesta, eu posso dizer que comecei a desenvolver na epoca em que comecei meu negocio. E o estresse diario de saber que tudo isso pode desmoronar a qualquer segundo, sabendo que ha dois outros funcionarios trabalhando no meu negocio.
Esses pensamentos literalmente me mantem acordada a noite.
E ridıculo com a loja indo tao bem quanto esta, mas tambem e valido porque, ei, esta indo bem. Na minha experiencia, isso signi ica que tudo vai desabar a qualquer momento.
Foi por insistencia de Maya que inalmente consultei meu medico sobre isso no ano passado. Embora geralmente eu nao seja do tipo que toma remedios, eu sabia que, se eu quisesse ter sucesso, precisava dormir mais de tres horas por noite, sem interrupções.
Eu odeio falar disso, odeio ser dependente disso – ou de qualquer coisa, por falar nisso. Entao, faço tudo o que posso para evitar.
Yoga, meditaçao, reduçao do tempo de tela, qualquer coisa alem de desistir do meu trabalho para ajudar a reduzir o estresse.
Na maioria dos dias funciona. Nao estou tomando meus remedios com tanta frequencia agora.
Dean ainda esta olhando para mim com expectativa, entao eu apenas dou de ombros. — Nao estou acostumada a ter alguem la entao eu preciso veri icar algumas coisas.
Ele levanta a maldita sobrancelha de novo, sem acreditar, embora seja verdade.
Eu lutei ontem a noite sabendo que ele estava no outro quarto, mas so porque honestamente nao estou acostumada a ter outra pessoa no meu apartamento.
Nao tem nada a ver com o fato de que esse alguem e Dean.
Ele nao e ninguem para mim. Apenas meu vizinho do inferno.
— Vou trazer meu laptop de trabalho para casa esta noite, para nao incomoda-lo novamente.
— Obrigado. — Ele começa a esfregar outro prato. — Voce sempre trabalha ate tarde da noite?
Eu encolho os ombros. — As vezes. Normalmente quando nao consigo dormir ou se uma nova ideia me ocorre.
— A sua boutique esta tao ocupada?
Suas palavras me deixaram nervoso.
Eu nao gosto deles. Eles sao condescendentes. Como se meu sustento nao importasse tanto quanto seu precioso sono.
Como se minha loja fosse uma piada para ele.
Eu me empurro para fora do balcao, saindo apressada da cozinha e pelo corredor em direçao ao meu quarto para terminar de me preparar para o trabalho.
Talvez se eu me distrair, eu nao o mate.
Nao mata-lo provavelmente seria o melhor.
Eu acho.
Deslizando para o banquinho na minha penteadeira, eu começo a ajeitar meu cabelo no lugar. Eu puxo para cima em um coque perfeito, mas nao gosto do visual. Muito serio.
Tento fazer um bagunçado, e e muito... bem, bagunçado.
Eu puxo a faixa de cabelo, odiando tudo que tento.
Minha roupa chama minha atençao no espelho, e eu odeio isso tambem.
Não. Pare. Você está apenas deixando Dean chegar até você. Vocêama essa roupa. É a sua favorita. É ele. Isso é tudo.
Eu fecho meus olhos e respiro fundo para me acalmar.
Se Dean vai morar aqui, preciso adicionar mais ioga a minha rotina para me impedir de explodir.
Eu nao posso continuar deixando ele me atingir. Ele nao vale a pena a frustraçao.
Ele nao importa.
— River.
Eu abro meus olhos, surpresa ao encontrar Dean parado na minha porta. Ele esta encostado no batente, os braços cruzados. Essa maldita camisa esta esticada contra seu peito.
Por que ica tão bem nele?
— Tenho a sensaçao de que voce interpretou as minhas palavras de forma errada.
— Eu iz?
Ele concorda. — Sim. Eu nao quis dizer nada como isso. Eu so quis dizer... bem, nao tenho certeza. Acho que simplesmente nao percebi que sua pequena boutique... consumia tanto o seu tempo.
Eu bufo, me levantando.
Se eu nao for embora agora, vou seriamente mata-lo.
Ele levanta o braço, me impedindo de passar.
— Deixe-me passar.
— Eu tambem nao quis dizer nada com isso.
Eu olho para ele.
— Entao o que voce quer dizer, Dean?
— Nao sei. Nao tenho certeza do que estou tentando dizer e, francamente, estou preocupado que, nao importa o que eu diga, isso va te ofender.
— Voce provavelmente esta certo.
— Posso escrever isso?
— Dean.
— Tudo bem. Deixe-me começar de novo, entao? — Ele limpa a garganta. — E triste ver voce icar acordada ate tarde trabalhando no seu negocio, mas nao quero dizer isso de uma maneira ruim. Quero dizer como... gostaria que voce fosse capaz de descansar mais, para nao ter que sacri icar o seu sono... ou interromper o meu.
Eu sabia que haveria motivos egoıstas para suas palavras. Abro a boca, mas ele me vence.
— Mas eu tambem entendo nao querer entregar seu bebe para outra pessoa. Por outro lado, e uma grande conquista que sua loja esteja indo tao bem. Voce deveria estar orgulhosa Eu estou.
Esta na ponta da minha lıngua dizer a ele para me morder e forçar minha passagem. Eu nao preciso de sua validaçao.
Provavelmente e triste que meu primeiro instinto seja nao acreditar nele.
Tambem e provavel que seja infantil da minha parte.
Mas, ei, Dean traz esse meu lado a tona.
Eu aceno um agradecimento, porque no fundo eu acho que ha alguma sinceridade em suas palavras alem de ele querer dormir sem interrupçoes, e entao tento ir embora.
Ele nao me deixa.
Eu cerro meus dentes.
— O que?
— Estamos bem?
Eu rolo meus ombros para tras e olho para ele.
Nao ha como ele perder a minha respiraçao.
Seus vibrantes olhos verdes claros quase me derrubam.
Ele parece genuinamente preocupado por ter me ofendido.
Ele nunca me olhou assim antes, e isso quer dizer algo porque ele me ofendeu varias vezes ao longo dos meses em que era meu vizinho.
Desta vez, parece diferente.
Como se ele se importasse.
Sobre mim.
Para mim. Minha respiraçao começa a icar mais forte e, se ele percebe, nao da nenhuma indicaçao.
— River, estamos bem?
Meus olhos vao para sua boca... para seus labios perfeitamente esculpidos...
Aposto que eles se sentem assim. Suave.
Eu me pergunto se ele beija a maneira como se comporta. Com con iança.
Eu quero ser beijada com con iança novamente.
Bastaria eu icar na ponta dos pes e testar minhas teorias... Não! Pare de deixá-lo afetar você. Ele ainda é Dean.
— Voce esta me bajulando porque estou lhe fornecendo moradia?
— Voce vai jogar isso continuamente na minha cara?
— Sim.
Ele suspira e eu cedi.
Ele tem razao. Eu ico falando isso, mas nao quero que ele esqueça que e um convidado aqui e, a qualquer momento, posso tirar isso dele.
Sou eu quem esta por cima desta vez.
Acho que poderia recuar um pouco... — Nao.
— Bom. — Ele acena com a cabeça uma vez. — Nao, eu nao estou dizendo isso apenas para te bajular. Eu quis dizer isso.
— Bem, obrigada. Eu acho.
Seus labios se erguem nos cantos. — De nada. Eu acho.
Eu rolo meus olhos. — Posso ir agora? Eu preciso começar a trabalhar.
Lentamente, ele deixa cair o braço, permitindo-me inalmente passar.
Eu faço, dando a ele um amplo espaço.
Eu preciso de espaço. Aparentemente, estar perto dele me faz perceber coisas ridıculas como o quao bem ele cheira. Ou pior... como eu nao o afastaria se ele tentasse me beijar.
— Ei, River?
Eu olho por cima do ombro.
— Eu gosto do seu cabelo solto. Eu nao respondo.
Em vez disso, continuo pelo apartamento, prendendo minhas longas ondas em um rabo de cavalo e torcendo meu elastico de cabelo em torno delas.
Dean ri enquanto faço meu caminho para fora da porta.
— Saude! Um brinde ao Dia Internacional sem Crianças!
— Isso existe?
— Sim, embora tecnicamente demore mais um mes. — Nolan, meu melhor amigo, bebe sua cerveja de volta.
— Por que estamos comemorando hoje, entao?
— Porque nao ter crianças e a maneira de ser, e eu precisava de uma desculpa para beber um pouco de cerveja com meu melhor amigo.
— Eu vou beber a isso. — Eu tilinto minha garrafa na dele.
— Ja bebi por menos.
Eu ri. — Verdade.
Ele limpa a boca com as costas da mao.
— Tudo bem, entao deixe-me ver se eu entendi: voce esta morando com sua vizinha.
— Sim.
— Que e quente como o inferno.
— Ela e... ok.
— Besteira. Eu ja vi – ela e gostosa.
— Ah, voce a viu, mas ja falou com ela por tempo su iciente? De initivamente corta os pontos quentes.
— Quente e quente. — Ele revira os olhos. — Mas o que voce esta realmente tentando fazer e sentar aqui e me dizer que morar com sua vizinha sexy vai ser a morte para voce porque ela o irrita?
— Sim.
Ele balança a cabeça. — Se houver alguma coisa, isso vai matar sua vida sexual. — Ele ri para si mesmo. — Brincadeira ... ja esta morta.
— Foda-se, Nolan. — Eu dou o dedo do meio para ele e levanto minha garrafa de cerveja aos labios, tomando um gole.
Eu odeio que ele nao esteja errado.
Minha vida sexual é uma piada. Nao me lembro da ultima vez que tive um encontro que terminou comigo entre duas coxas quentes, em
vez de em casa com o meu pau na mao direita.
Ja faz muito tempo. Muito tempo, se voce me perguntar.
A ultima garota com quem eu saı passou a noite inteira olhando para o telefone dela, e entao teve a audacia de icar ofendida quando sugeri que eu a levasse para casa em vez de voltar para minha casa.
Eu poderia te-la levado ao meu apartamento e provavelmente apreciado uma ou duas rodadas no lençol? Nao ha duvidas sobre isso.
Mas, merda, eu gosto de pelo menos um pouco de conversa decente antes.
Nao estou com pressa de me apaixonar nem nada, e nao estou dizendo que sou um cara heroico que nunca levou uma garota para casa so para fazer sexo; Estou somente entediado com a cena do namoro. Nao houve uma unica garota com quem eu tenha pensado duas vezes desde... merda, eu nem sei quanto tempo.
Nolan ri. — Ora, ora, Sr. Evans, isso nao e muito educado da sua parte.
— Por favor. Eu coloquei minha garrafa de volta na minha frente, envolvendo meus dedos em torno dela, pegando o rotulo azul e vermelho. — Todo mundo tem essas versoes prontas dos professores em suas cabeças, mas nos somos tao fodidos quanto o resto deles. Simplesmente somos os melhores em esconder isso.
— Isso mesmo. Nao quero assustar os pequenos. Pequenos idiotas.
Eu ri. — Um dia desses, cara, voce vai levar uma surra e acabar com cerca de dez desses merdinhas correndo por aı.
Ele zomba. — Por favor. Eu sei bem que nao devo me envolver nisso. Sao dezoito anos de responsabilidade. — Ele torce os labios, enojado com a ideia. — Nao, obrigado.
— Certo, Sr. Fobia de Compromisso. Eu esqueci.
— Pelo menos eu sei o que faço e o que nao quero.
Ai. — Eu nao acho que isso seja motivo de orgulho quando voce esta sempre correndo depois da fase de lua de mel.
— Isso e o que eu chamo de autopreservaçao.
— Isso se chama ser um covarde.
Ele nao reconhece isso, apenas inclina a cerveja para tras e a termina.
Porque ele sabe que estou certo.
Conheço Nolan desde os cinco anos. Nos nos conhecemos no ponto de onibus da mesma escola de merda e nos unimos por nenhum de nos ter uma daquelas lancheiras do Power Ranger que eram a ultima moda. Tudo o que tınhamos eram sacos de papel pardo que estouravam pelas emendas com guloseimas nutritivas.
A cada dia nos encontravamos e eu trocava o meu sanduıche de peru e queijo pelo seu de manteiga de amendoim com geleia. Ele odiava a manteiga de amendoim, mas era tudo que seu pai podia pagar.
Para Nolan nunca importou que minha famılia ganhou na loteria e nos saımos daquela merda.
Ele ainda era Nolan e eu ainda era Dean. Isso foi su iciente.
Somos proximos desde que nos conhecemos. E justo dizer que conheço Nolan bem, melhor do que ninguem.
E como eu sei que ele e um corredor e nao tem compromisso, o que tem tudo a ver com sua mae fugindo da sua famılia quando ele tinha cinco anos. Ele tem sido uma bola de amargura de descontentamento desde entao. Em qualquer relacionamento que ele ja teve, ele sempre sai antes de poder ser deixado.
Estou falando serio sobre ele conhecer uma garota que vai bater em sua bunda. Isso vai acontecer e mal posso esperar para estar la para testemunhar.
— Entao, o que essa garota esta fazendo agora? Alem de ser um anjo absoluto por deixar sua bunda idiota morar la depois que voce quase incendiou o predio.
Eu aperto minha mandıbula com a lembrança, ainda chateado comigo mesmo – daı o motivo de sentar no bar para happy hour, algo que raramente faço.
Como se ele pudesse ler minha mente e soubesse que eu precisava desabafar, Nolan me ligou e perguntou se eu queria uma cerveja. Eu agarrei a oportunidade rapidamente.
— Ela me acusa de roubar ou usar suas coisas todos os dias que estive morando la.
— Voce so esta la ha cinco dias.
— Eu sei. — Eu rio, mas nao ha humor nisso, porque nao acho nada disso engraçado. E exaustivo. — No primeiro dia, ela icou brava porque eu comi seus ovos ou algo assim. A segunda, ela estava chateada porque eu aparentemente usei todo o seu creme.
— Voce fez?
— Sim. — Ele ri. — No terceiro e no quarto dia ela icou brava porque eu disse que ela nao devia deixar a louça se amontoar na pia. Ela nao falou comigo desde entao.
— Se voce a odeia tanto, parece a situaçao ideal, entao.
— Oh, seria otimo, exatamente o que eu quero – exceto que ela ainda nao me deu a chave do apartamento.
Apesar de eu perguntar a ela todos os dias, ela ainda nao me deu a chave. Isso signi ica que se eu quiser sair do apartamento, tenho que esperar ela chegar em casa para que eu possa voltar. E por isso que eu estava animado para tomar uma cerveja com Nolan. Eu tinha que estar na escola hoje para ajudar a contar o equipamento de futebol, e nao havia nenhuma maneira de chegar tarde o su iciente para esperar River voltar para casa.
Pensei em roubar as chaves dela e fazer uma copia eu mesmo, mas ela as mantem em seu quarto e me pareceu errado entrar la para pega-las.
Eu respeito alguns de seus limites.
— Como voce ainda nao tem a chave?
Eu encolho os ombros. — Nenhuma maldita pista, cara. Acredito que isso da a ela algum tipo de autoridade sobre a minha cabeça que ela tenha a palavra inal quando eu entro e saio.
— Considerando tudo o que voce me disse sobre todas as suas brigas com ela, isso nao me surpreenderia. Ainda nao consigo acreditar que nao a conheci mais do que de vista.
— Voce deveria vir uma noite, na proxima semana, para um jogo de beisebol. Voce pode conhece-la.
— Duas coisas. — Ele levanta um dedo. — Um, beisebol e chato pra caralho, e voce sabe que eu odeio isso. — Outro dedo sobe. — Dois, estou dentro, mas quero deixar registrado que nao acho que seja uma boa pratica convidar estranhos para um lugar em que voce esta dormindo temporariamente.
—Um — rebato — beisebol é entediante, mas pizza e cerveja nao, e esportes sao uma desculpa para isso. Dois, preciso de uma testemunha. Tenho a sensaçao de que ela ou seu gato vao me matar.
— Eu nunca atrapalharia um bom assassinato, especialmente quando o idiota merece.
— Entao, voce esta dentro?
— Assistir a sua companheira de quarto-barra-inimiga matar voce? — Ele sorri. — Foda-se, sim. — Nolan empurra sua garrafa vazia, balançando a cabeça quando o barman faz um gesto em direçao a ela, perguntando se ele quer outra.
— Por favor. Nao estou preocupado com River. — Eu zombo, terminando minha cerveja.
— Pelo que ouvi, voce deveria estar.
— Eu posso lidar com ela.
— Ela parece mal-humorada. E divertido.
— Ela e... uma coisa.
Nolan inclina a cabeça. — Voce disse isso de um jeito engraçado.
Eu levanto minhas sobrancelhas. — O que? Eu nao disse.
Ele me olha, curioso. Entao, um sorriso lento se forma em seus labios. — Oh, foda-se. Por que voce nao me contou?
— Contei o que? — Pego a garrafa de cerveja vazia, precisando de algo para me distrair, desconfortavel sob seu escrutınio. Ele esta olhando para mim diretamente e por muito tempo.
— Que voce tem uma queda por essa garota.
Eu solto uma risada, pedindo ao barman para outra bebida; Vou precisar de uma se tiver que sentar aqui e ouvir as merdas de Nolan. Por favor. Eu nao tenho nada por ela, seja la o que diabos isso quer dizer.
— Isso signi ica que ela mantem seu pau e suas outras partes funcionando. — Ele se inclina e sussurra: — Voce sabe, como sentimentos e essas merdas.
— Tanto faz, cara. — Eu pego a cerveja que o barman silenciosamente desliza em minha direçao e tomo um longo gole. Limpo minha boca com as costas da mao. — River e quente? Sim ela e. Eu nao sou cego. Ela e o tipo de garota que eu normalmente escolheria, mas nao e uma coisa. A atraçao e puramente fısica.
— Entao voce nao se importa se eu convida-la para sair?
— Voce nem mesmo a conhece.
Ele sorri, e eu sei que ele percebeu que minha resposta nao foi um nao direto de cara. Ele deve ter sido. Nos dois sabemos disso.
— Nunca me impediu antes. Nao conheço muitas das garotas com quem saio.
Verdade. Nolan nao e exatamente o tipo de pessoa que quer conhecer voce.
E tanto faz. Eu nao julgo. Nao e como se eu nunca tivesse comido uma buceta e depois fosse embora antes de icar estranho. Você quer tomar café da manhã?
O pensamento dele fazendo isso com River... faz meu estomago parecer estranho. Errado.
— Se voce nao tem nada por ela, entao ela esta no jogo, certo?
— Nao.
A palavra sai dos meus labios por impulso, mas isso nao a torna menos verdadeira.
Na verdade, isso torna tudo muito mais honesto.
Nao quero namorar River, mas tambem nao quero que Nolan saia com ela.
E nao consigo descobrir porque.
Ele ri e se levanta do banquinho. — Foi o que eu pensei.
— Onde voce esta indo? O que voce quer dizer com isso que voce pensou?
— Estou saindo. — Ele en ia a mao no bolso de tras, puxando a carteira e acenando para o barman. — Eu estive acordado desde o nascer do sol. Nem todos nos tiramos o verao de folga.
— A conta? — Essa palavra e a segunda vez que eu ouço o barman falar desde que entrei aqui, e e a minha parte favorita neste bar. Ninguem faz perguntas ou tenta fazer uma terapia. Voce pode pegar uma bebida e icar sozinho.
Nolan acena com a cabeça, entregando seu cartao, e o cara sai para cuidar de sua conta.
— O que voce quis dizer com isso e o que voce pensou? — Eu pergunto novamente quando estamos sozinhos.
— Vamos la, cara. Embora eu nao tenha certeza de porque e sempre a escolha certa quando se fala sobre nıvel de inteligencia, nao e ciencia de foguetes. Voce gosta dela, e nao apenas isicamente.
— Nao, eu nao.
— Voce gosta — o barman diz, deslizando o recibo de Nolan pelo balcao antes de se virar e sair novamente.
— O que...— Eu olho para suas costas recuando, entao balanço minha cabeça. — Ele esta errado.
— Ele nao esta errado. — Ele assina o recibo e o desliza de volta para o balcao. — E eu tambem nao. Voce gosta dela. Simplesmente nao vai admitir para si mesmo por algum motivo. Talvez seja porque esta hospedado la agora e nao quer causar problemas, o que e inteligente, mas voce nao pode me dizer que nao pensou em River antes.
— Eu–
— Nao apenas quando voce esta batendo uma com seu pau. Tenho certeza que voce faz muito isso, seu cachorro sujo.
Culpado da acusaçao.
Levou cada grama de força de vontade que eu tinha para nao envolver minha mao em volta do meu pau na primeira noite em que estive la. Cada vez que fechei meus olhos, tudo que eu podia ver era ela naquela porra de toalha minuscula, curvada para que eu pudesse ver tudo o que ela tem a oferecer. A unica coisa que me impediu foi saber que River estava deitada na cama do outro lado do corredor e me ouviria.
— Quero dizer, em um tipo de relacionamento.
Ele esta errado.
Nao penso em um relacionamento quando se trata de River.
Ela me detesta, e nunca poderıamos ser nada mais.
Aposto que o sexo seria explosivo...
Nolan suspira, tirando algum dinheiro de sua carteira e jogandoo no balcao. Ele desliza o cartao de credito de volta. — Olha, cara, eu tenho ouvido voce lamentar sobre o estado da sua vida amorosa desde que as coisas deram uma merda com a sua ex e voce voltou para a cena do namoro, falando sobre como nenhuma mulher desa iou voce, fez voce se sentir animado para mais do que apenas atividades no quarto –embora porque voce esta procurando por essa merda esteja alem da minha compreensao. Ei, o que quer que te faça feliz. — Ele balança a cabeça. — De qualquer forma, tudo o que estou dizendo e que River desa ia voce, e nao ha como negar. Se ainda nao esta pensando em um relacionamento com ela, algo que eu duvido muito, talvez voce devesse.
Ele tem razao. O maior obstaculo na minha vida amorosa é nao me sentir desa iado ou a vontade com ninguem. E tudo a mesma merda,
encontro diferente. A mesma variaçao nada excitante de jantar, ilme, cama. Enxague e repita, porra.
Nao e mais divertido. Nao ha perseguiçao. Sem emoçao.
Entao, eu acho que posso entender o ponto de Nolan sobre River.
Ela e divertida e me desa ia – principalmente para nao cometer um crime, mas mesmo assim e um desa io.
Mas ainda... ela e River.
Ele da um tapinha no meu ombro, me dando um pequeno sorriso. — Eu te ligo mais tarde, cara.
Eu aceno, e ele sai.
Fico sentado aqui pensando em todas as maneiras pelas quais River pode ser a certa para mim... talvez em mais maneiras do que apenas no quarto.
— Ei, Maya, e River. Sua chefe e melhor amiga. — Acrescento essa parte apenas para que ela nao me odeie por incomoda-la novamente. — Mandei uma mensagem sobre isso, mas estou ligando tambem, porque, bem, voce me conhece – sou neurotica e obsessiva. O encontro com a fotografa foi adiado para amanha porque ela tem que levar o ilho ao medico. Sao dez agora, nao nove. Eu–
Minhas palavras morrem quando a porta do quarto e aberta e Dean atravessa o corredor.
Ele esta encharcado de suor.
Cada centımetro de sua camisa de treino azul claro esta grudada nele como uma segunda pele.
Eu sei que Dean faz exercıcios, nao apenas porque ele esta morando aqui ha cinco dias e sempre sai de casa no mesmo horario todas as noites para ir a academia, mas porque e obvio mesmo atraves daquelas camisas de botao e camisetas de banda que ele sempre usa.
O que eu nao esperava ser capaz de contar seu abdomen – todas as seis coisas de dar agua na boca.
Ele puxa os fones de ouvido sem io das orelhas, os musculos de seus braços saltam com a açao. Ele ainda esta respirando com di iculdade, como se tivesse corrido todo o caminho da academia ate aqui. Para ser honesta, eu nao colocaria isso no passado. Ele parece o tipo exibicionista.
Um par de shorts de ginastica esta baixo em seus quadris e–Uau. sim. Esse é de initivamente o contorno do seu pau.
Ele limpa a garganta, e eu levanto meus olhos para os dele e para longe deste presente que ele me deu sem saber.
Suas sobrancelhas escuras estao levantadas, um sorriso brincalhao estampado em sua boca.
Pega. — Gosta do que ve, River?
Suas palavras sao provocantes, divertidas. Mas seus olhos? A maneira como eles estao queimando com intensidade?
Eles dizem algo totalmente diferente.
Eu injo que ele nao esta me olhando como se desejasse que nao houvesse tanta distancia entre nos e puxo o telefone da minha orelha, esmagando o botao vermelho na tela. Faço uma nota mental para explicar a mensagem de voz para Maya mais tarde e viro o nariz para Dean, forçando minha atençao de volta para o computador na minha frente como se eu nao estivesse apenas tivesse babado nele antes.
— Eu ja vi melhores — eu digo tao friamente quanto posso.
Eu ouço a vacilaçao em minha propria voz.
Eu gosto do que vejo.
Gosto do que vejo muito mais do que deveria.
— Claro que sim. Em um daqueles encontros quentes que voce teve?
Eu seguro meu suspiro. As vezes eu esqueço que ele teve um lugar na primeira ila para meus varios contratempos de namoro. Morando na casa ao lado, tenho certeza de que ele viu todas as vezes que voltei para casa sozinha e todas as manhas que me arrastei para fora da cama parecendo uma bagunça quente, tentando pegar meu coraçao/ego ferido.
Ele ri secamente.
— Por favor, me diga que nao foi aquele cara vestindo a camisa havaiana. Isso vai doer.
Ah, sim. O cara da camisa havaiana.
O primeiro encontro que fomos foi na pista de boliche. Eu descartei sua roupa porque eu pensei que ele estava sendo peculiar. Ele contou algumas piadas e a noite nao foi um desastre completo, entao eu disse sim para um segundo encontro. Isso foi quando eu estava entrando na cena do namoro novamente e ainda estava otimista.
Eu era tao tola.
Eu o deixei me buscar para o segundo encontro, e imagine minha surpresa quando abri minha porta e vi que ele estava vestindo outra camisa havaiana.
Agora, eu amo roupas. Eu adoro moda e ser capaz de usar uma roupa para me expressar, mas ha algumas coisas em que estabeleço o limite.
As camisas havaianas sao uma delas.
Claro, porque isso foi apenas minha sorte, Dean teve que sair do elevador quando estavamos entrando. Ele tinha muito a dizer na manha seguinte no restaurante.
Essa foi a ultima vez que deixei um cara me buscar no meu apartamento; Eu nao precisava do comentario de Dean sobre minha vida amorosa. Eu tinha visto muitas mulheres entrando e saindo de sua casa no ano passado e nunca iz comentarios nao solicitados sobre suas escolhas.
— Para falar a verdade, era – e ele tinha uma vantagem sobre voce tambem. Havia um pacote de oito escondido sob aquelas camisas impressionantes.
Seus olhos brilham.
— Tudo que acabei de ouvir foi que voce contou meu abdomen.
Eu com certeza iz.
— Foi um tiro no escuro.
— Tiro no escuro, minha bunda — ele murmura, movendo-se em direçao a sua pilha de coisas.
Ele se agacha e começa a remexer, procurando uma muda de roupa.
— O que voce esta fazendo aqui?
— Trabalhando.
— Estou feliz que veio aqui quando eu estava fora e nao dormindo, como voce fez a semana toda. Temos uma evoluçao.
Eu estremeço.
— Ops. Eu vou trazer meu...
— Laptop de trabalho para casa – sim, eu ja ouvi isso antes.
— Sinto muito, voce esta sendo mal-humorado comigo?
Ele pausa seus movimentos e entao suspira.
— Talvez um pouco. Nao e sua culpa. — Ele se levanta, virandose para mim. — Bem, e... mas nao completamente. — Outro suspiro, seus ombros caindo na expiraçao. — Foi apenas uma longa semana.
Ele parece exausto. Atropelado. Como se ele estivesse correndo com a sua ultima perna.
— Prometo trazer meu laptop para casa.
— Tenho certeza que voce vai.
— Vou enviar uma mensagem de texto para Maya e garantir que ela me lembre.
Ele grunhe e se senta na beirada do colchao de ar.
Nao consigo imaginar que isso ajude no departamento de dormir. Dean e muito grande para dormir naquela coisa, e eu sei que nao e confortavel.
Tentamos resgatar sua cama de seu apartamento, mas para nos cheirava muito forte a fumaça. Nao tınhamos certeza se era apenas o cheiro queimado em nossas narinas ou se estava torrada, nao estavamos arriscando.
— No que voce esta trabalhando tao tarde? A loja fechou horas atras.
Eu clico no meu e-mail uma ultima vez, certi icando-me de que nao perdi nada. — Fotografo.
— Voce tem um fotografo?
Eu concordo. — Vendemos itens online, começamos no inıcio do ano. Ainda somos apenas nos tres gerenciando a loja e agora as vendas online, entao e muito trabalho extra para mante-la funcionando com e iciencia, mas ajudara a manter os negocios estaveis durante a temporada de turismo.
Muito trabalho e muito estresse adicionado. E por isso que corro aqui a noite para veri icar as coisas. Por que estou sempre entrando cedo e por que sou sempre a ultima a sair. Somos uma loja pequena, mas nossa loja online esta crescendo a cada dia e a internet e exigente demais.
— Caroline e Maya sabem que voce vai icar acordada ate tarde assumir o peso desse trabalho?
Ha algo em sua voz que quase soa como preocupaçao. Sua preocupaçao e doce – algo que nunca pensei que diria ao me referir a Dean – mas nao e necessaria.
No inal do dia, Making Waves e minha, e como nao estou no ponto de contratar confortavelmente mais funcionarios ou pagar os que ja tenho, e justo que caia sobre meus ombros.
— Sim.
— E o que elas tem a dizer sobre isso?
— Nao muito.
— Entao, elas so pensam que voce e boa em operar uma maquina bem lubri icada na o icina e nao se mata a noite?
— Nao. Elas sabem que as vezes trabalho em casa.
— Elas sabem com que frequencia?
Eu suspiro. — Que diferença faz para voce o tempo que passo trabalhando?
— Porque isso te desgasta e te deixa sobrecarregada e voce começa a agir de maneira extremamente agressiva.
Eu levanto minhas sobrancelhas.
— Voce acabou de me chamar de cuzona?
— Agressiva, mas sim.
Meus labios se contraem, divertidos.
— Bem, entao.
Ele nao parece estar arrependido, e gosto que ele nao pareça arrependido. Que ele se atem as suas armas. Que nao tem medo de me criticar quando estou sendo uma pirralha, o que provavelmente e frequente.
— So estou falando como eu te vejo. — Ele ergue os ombros. Eu te conheço ha um ano e, nesse tempo, voce esta icando cada vez mais irritada. Talvez seja hora de ferias.
Eu estreito meus olhos para ele. — Ja parou para pensar que o motivo pode ser voce?
— Nao. Eu sou um anjo do caralho.
— Se quis dizer no sentido de que Lucifer ja foi um anjo, voce tem esse direito.
Ele bufa, mergulhando de volta em sua bolsa de pertences. Hilario vindo de voce, Pequena Senhorita Ligue Para a Sındica, porque minha musica esta muito alta em vez de apenas, eu nao sei, bater na minha porta como um vizinho normal faria.
— O que? Eu nunca chamei Lucy para voce.
Ele me olha por cima do ombro, seus olhos em fendas estreitas. — Por favor. Nao tente agir como uma inocente agora.
— Estou falando serio, Dean. Nunca chamei Lucy para voce. Eu queria muito, mas nunca consegui fazer isso. Alem de bater na sua parede, aquela tarde do incendio foi a primeira vez que agi com base na sua antipatia.
Ele me encara, as sobrancelhas grossas erguidas.
Elas lentamente caem de volta quando a percepçao de que nao estou mentindo o atinge.
Ele pensa que sou tao mesquinha? Que eu o delataria a nossa sındica do predio por sua musica estar muito alta?
Tive vontade de reclamar com Lucy sobre sua musica e seu comportamento geralmente insuportavel? Claro que sim. Todo santo dia.
Mas nao fui eu.
— Entao quem foi?
— Nao tenho certeza, mas eu adoraria conhece-los e apertar sua mao. Seu gosto musical e uma droga.
— Voce nao pode dizer isso se nao gosta de musica. — Balançando a cabeça, ele se levanta novamente, estica os braços para tras sobre a cabeça e tira a camisa com um movimento rapido.
Meu queixo cai tao facilmente quanto suas roupas escorregam.
Ele esta parado a menos de tres metros de mim sem camisa e, oh, meu Jesus amado.
Se eu pensei que seu corpo era impressionante quando estava coberto, eu estava errada. As costas de Dean nao sao nada alem de musculos tensos, as linhas de inidas e sexy.
Desde quando eu acho costas sexy?
Como se ele soubesse que estar sem camisa esta me prejudicando, ele ri. — Eu posso sentir voce olhando, River.
Desculpe, você tem um espelho? Claro que estou olhando!
Eu engulo em seco e me dou uma boa sacudida, voltando minha atençao para o meu computador.
Não olhe, não olhe, não olhe.
— Estranho, porque eu de initivamente nao estava olhando. Outra risada. — Apenas admita que voce me acha tentador.
Eu torço meu nariz e me levanto, pegando meu caderno. — A unica coisa que voce me tenta a fazer e cometer assassinato. EuEle se vira e, pela segunda vez esta noite, ele me deixa sem palavras.
Normalmente nao sou do tipo que saliva por causa de um homem com o peito esculpido, mas... bom Deus .
Ainda posso ver as gotas de suor escorrendo pelos contornos de seu abdomen bem de inido, os musculos saltando enquanto meus olhos percorrem seu corpo como se ele pudesse sentir meu olhar o acariciando.
Claramente, ja faz muito tempo desde que vi um cara sem camisa porque minhas partes femininas estao formigando como nunca antes. Porra, ate meus mamilos estao duros, pelo amor de Deus!
— Sinto muito, voce estava dizendo algo, River?
Como se estivessem ligados a sua voz, eles apertam ainda mais, e eu agarro meu caderno como se fosse minha tabua de salvaçao, cobrindo as evidencias. Grande erro, porque o atrito aparentemente e exatamente o que eu preciso, e quase soltei um gemido.
Puta merda, estou sem fazer sexo, icando excitada com a porra de um caderno. Não tem nada a ver com um Dean sem camisa, é claro.
Ele se aproxima, e eu nao recuo, segurando minha posiçao.
Eu empurro meus ombros para tras. — So que eu te odeio.
— Serio? — Ele da mais um passo. E outro. Ele esta tao perto que posso sentir o cheiro de canela em seu chiclete.
Cada centımetro do meu corpo esta tenso porque tudo que consigo pensar e em como ele esta muito perto, mas muito longe ao mesmo tempo.
Ele da um ultimo passo, entao inclina a cabeça em direçao a minha. Ele nao esta me tocando, mas se eu nao estivesse prendendo a respiraçao, meu caderno estaria batendo em seu peito.
— Me odeia tanto que voce esta escondendo seus mamilos duros atras de um caderno?
O sopro da respiraçao me deixa em um gemido alto, e eu fujo da sala, com cuidado para nao roçar nele.
— Algo errado, colega de quarto? — ele grita, diversao clara em sua voz. — Surgiu alguma coisa sobre a qual voce gostaria de conversar?
— Deixe meus mamilos fora disso!
Sua risada ecoa pelo apartamento quando bato a porta do meu quarto. Idiota.
EU NAO CONSIGO DORMIR.
Passei a ultima hora me virando e me virando, e e inteiramente culpa de Dean.
Nao demorou muito para ele entrar no chuveiro depois que corri para o meu quarto. O tempo todo em que ele esteve la, tudo que eu conseguia pensar era como ele estava completamente nu com nada alem de alguns metros de drywall entre nos.
Como a agua deve estar boa correndo por suas costas... seu abdomen.
Seu penis.
Eu deveria ter icado mais envergonhada do que quando ele me pegou olhando para seu pau. Deveria ter icado vermelho como uma beterraba.
Mas seus olhos...
Por um rapido momento, pela menor fração de segundo, considerei diminuir a distancia como seus olhos estavam implorando que eu izesse.
Mas eu nao iz.
Agora estou escondida em segurança no meu quarto, onde nao serei tentada a fazer algo tolo como beijar Dean Evans.
E ele esta em seu quarto, onde tenho certeza que esta tao satisfeito consigo mesmo por me deixar toda excitada e deixar meus mamilos duros.
Eles ainda estao.
Inferno, meu corpo inteiro esta acordado porque toda vez que fecho meus olhos, vejo Dean sem camisa. Ou o contorno de seu pau.
Eca. Eu realmente preciso transar. Isso esta icando ridıculo se eu estiver deitada aqui pensando em Dean, entre todas as pessoas.
Talvez um encontro rapido com o meu brinquedo favorito ajude a aliviar...
Eu chego na minha mesa de cabeceira e pego meu vibrador. Ligo. De ino ele para a con iguraçao mais baixa (e mais silenciosa), deslizo minha calcinha para o lado.
Eu estou tão carente. Tao tensa que quase explodi antes mesmo de fazer contato com meu centro.
Eu abro minhas pernas e inclino meus quadris para cima, guiando o brinquedo sobre meu clıtoris, que esta pulsando de necessidade.
Meus olhos se fecham e tudo que vejo e um par familiar de olhos verdes.
Eu abro meus olhos de novo, puxando o brinquedo do meu corpo, por que diabos?
Uma coisa e se masturbar, outra e pensar em Dean enquanto faço isso.
O que os olhos não veem...
Eu fecho meus olhos, trago meu brinquedo de volta ao meu clitoris... e Deus me ajude, eu penso em Dean.
Seus olhos verdes. Esse sorriso perfeito. Seu cabelo preto meianoite, a sombra de sua barba de cinco horas, a leve covinha em seu queixo.
Eu evoco a imagem dele de apenas uma hora atras, parado sem camisa na minha frente. Eu o imagino caminhando em minha direçao, seu corpo duro e tenso pressionando contra o meu enquanto ele segura meu rosto. Seu polegar acaricia suavemente minha bochecha enquanto ele se inclina para me beijar e ...
E eu gozo. Forte.
Eu busco por ar, descendo do alto, meu coraçao disparando perigosamente rapido.
— Pegue isso, Dean. — Tiro o brinquedo debaixo dos cobertores. — Eu nao preciso de voce de verdade.
— Voce disse algo?
— PORRA! — Eu grito.
E meu vibrador voa pelo quarto enquanto meus braços se agitam. Thump.
Ele bate ruidosamente contra a parede... e deixa uma sensaçao agradavel. Eu fui pega me masturbando e entrei em pânico e joguei meu vibrador abrindo um buraco do tamanho de um cômodo na parede.
— Mae…
— Uh, esta tudo bem aı? — Dean chama pela porta.
— OH MEU DEUS! VA EMBORA!
— Nossa, tudo bem — ele diz. — Eu ouvi conversas e pensei que voce disse meu nome. Desculpe.
Seus passos ecoam pelo corredor enquanto eu ico la, prendendo a respiraçao, completamente morti icada. Eu coloco minha mao sobre meu peito, tentando acalmar minha respiraçao. Se eu achava que minha frequencia cardıaca aumentou durante meu orgasmo ...
O que diabos aconteceu?
Depois de alguns minutos tentando relaxar, eu me coloco em uma posiçao sentada, penteando meu cabelo para tras. Eu estalo meus labios, minha boca seca.
Eu me arrasto para fora da cama e pego meu pobre vibrador.
— Desculpe por isso, amigo — eu sussurro, colocando-o de volta na minha mesa de cabeceira.
Eu silenciosamente abro a porta do meu quarto. Antes de entrar no corredor, espio pelo batente da porta e a minha esquerda.
A porta de Dean esta fechada e sua luz esta apagada.
Bom.
Eu me esgueiro pelo corredor e entro na cozinha. O mais silenciosamente que posso, pego um copo d'agua e bebo. Eu encho outro e coloco minhas costas contra o balcao, tentando me fazer relaxar.
Estou ainda mais tensa agora do que antes do meu orgasmo estrelar.
Claro que Dean iria estragar meu brilho. Esse e apenas o seu estilo, apenas a coisa que ele conseguiria fazer, cuzao.
Com o canto do olho, vejo meu tapete de yoga enrolado e encostado no sofa.
Sim! E exatamente disso que preciso. A yoga sempre me ajuda a me acalmar.
Volto na ponta dos pes para o meu quarto, pego meu telefone e fones de ouvido e, em seguida, volto para a sala de estar.
Eu desenrolo meu tapete e coloco tudo no lugar antes de abrir meu aplicativo de yoga favorito.
Antes de apertar o play, ico imovel, ouvindo atentamente para ver se acordei Dean com todos os meus movimentos.
Nada. Ele deve estar dormindo.
Eu tomo algumas respiraçoes suaves e aperto o play na minha rotina inicial.
Nao demora muito ate que eu esteja perdida nos movimentos, completamente focada no tom calmante do meu instrutor favorito.
Quando o vıdeo termina, eu continuo com minhas poses de resfriamento, determinada a tirar o resto do nervosismo que sinto.
Uma coceira na espinha me tira do transe.
Eu nao estou sozinha.
Dean esta me observando.
Seu olhar ardente e para mim. Nao preciso estar olhando para saber que o olhar dele e o mesmo que vi antes em seu quarto.
Ele esta gostando da vista.
E estou gostando da maneira como seus olhos estao me acariciando, seguindo cada movimento que faço enquanto me curvo, colocando minhas maos espalmadas contra o chao.
Mesmo com meus fones de ouvido, posso ouvir a ingestao aguda de Dean, minha bunda totalmente a mostra.
Estou vestindo nada alem de um par de shorts pretos e uma camisola rosa claro, meu traje padrao para dormir.
Eu me estico ao maximo, entao me curvo novamente, desta vez andando minhas maos e empurrando minha bunda ainda mais para cima.
— Foda-se — ele murmura, o desejo em sua voz grossa.
Eu nem consigo rir.
Eu tambem sinto a tensao inexplorada na sala.
Estou começando a suar, e nao e com o meu exercıcio.
As chamas de seu olhar lambem minha pele, e eu percebo agora que gozar pensando nele foi um erro.
Nao me sinto relaxada. Estou tudo menos relaxada.
Inalar, exalar.
Eu respiro fundo tres vezes, estico-me novamente sem a intençao de deixar Dean louco e, em seguida, me levanto.
Eu nao lhe dou atençao enquanto rolo meu tapete de yoga de volta para cima e o coloco longe.
Puxando um fone de ouvido da minha orelha, me viro em direçao ao meu publico.
Ele nao desvia o olhar. Nao se encolhe sob minha atençao.
Ele esta me olhando descaradamente, um copo d'agua nas maos, o luar da janela aberta e o terrario lançando luz su iciente para que eu o veja sentado na ilha na cozinha escura.
Nao consigo ver seus olhos, mas ainda posso senti-los.
Me sentindo corajosa, eu sigo em direçao a ele, nao parando ate que estou quase entre suas pernas abertas.
Eu deslizo o copo de suas maos e tomo um longo e forte gole, esvaziando-o antes de coloca-lo no balcao.
Ele apenas observa, sem dizer uma palavra enquanto estou la.
Tudo o que podemos ouvir e nossa respiraçao irregular.
Eu nao sei quantos minutos se passaram, mas meus mamilos estao de volta em posiçao de sentido e minha boceta esta novamente sentido como se eu nao lhe desse atençao a dias.
Estou começando a icar desconfortavel sob seu olhar profundo, e nao e algo sinistro. Esta mais para estou prestes a fazer algo na qual vou me arrepender.
— Gosta do que esta vendo? — Eu tento parecer esperta, preciso recuperar a aparencia de equilibrada, o que diabos estamos fazendo?
Nao podemos jogar jogos como este.
Eu nao posso estar me masturbando porque Dean me deixou toda quente e incomodada.
Ele nao pode olhar para mim como se quisesse me deixar nua.
— Sim — ele responde.
Sem nenhuma preocupaçao no mundo, ele ajusta seu pau obviamente duro dentro daquele moletom cinza que estou começando a odiar.
— Sim?
Uma sobrancelha desa iadora sobe.
— Bem, isso e muito ruim.
Embora eu queira correr, eu me afasto dele lentamente, vagando pelo corredor o mais indiferente que posso.
— Puta que pariu — ele resmunga enquanto fecho minha porta.
Puta que pariu, esta certo.
— O que diabos voce esta olhando?
A penugem de pelo branco perfura seu olhar azul brilhante e cheio de odio em mim do outro lado do sofa onde estive plantado o dia todo.
Morris nao gosta nem um pouco de mim. Ele deixou isso claro ontem a noite quando me levantei para usar o banheiro e ele me deu um tapa enquanto eu caminhava pelo corredor. Agora estou exibindo dois cortes no pe esquerdo que sei que doerao mais tarde, quando calçar os sapatos para a minha visita noturna a academia.
Com um miado irritado, o idiota se levanta e sai andando pelo corredor, me deixando curtir sem ser observado.
Eu olho para Leo e juro que ele revira os olhos para Morris.
— Igualmente, cara. Igualmente. — Estendo a mao, correndo meu dedo ao longo do vidro de seu terrario.
Ele parece tao cansado quanto eu.
Nao e sempre que eu levo dias apenas para relaxar. Nao sou um homem muito ocupado, mas sempre encontro algo para fazer para preencher meu tempo, como matricular-me em uma escola de verao ou meu trabalho voluntario no abrigo de animais local onde eu comprei Leo. Ficar parado nao e a minha praia.
Mas hoje, eu precisava disso.
Foi uma longa semana e estive constantemente ocupado lidando com seguros, Lucy – que eu juro que e um anjo – e as consequencias de quase incendiar minha propria casa.
Merda, estive tao ocupado que esqueci de contar aos meus pais sobre o incendio e recebi um belo telefonema da minha mae esta manha que consistia em muitos xingamentos e promessas de que trouxe você a este mundo, Dean Evans, e eu posso te tirar.
Posso agradecer a boca grande de Holland por isso.
Depois de acordar desse jeito horrıvel, decidi que um dia sem fazer nada parecia perfeitamente aceitavel. Especialmente porque eu nao dormi merda nenhuma na noite passada.
Nao conseguia parar de pensar em River... ou em como ela parecia curvada. Como ela parecia praticamente parada entre minhas
p p p p pernas com os mamilos duros como pedras.
Eu tive que lutar pra caralho para nao estender a mao e toca-la. Assim como eu tive que lutar muito hoje para me convencer a nao acariciar meu pau com a imagem da sua bunda no ar.
Eu deveria ter vergonha de mim mesmo por evocar isso tantas vezes, mas eu recuso. Nao quando ela parecia tao boa quanto estava. Pare de pensar nisso, Dean. É uma má ideia ir para lá.
Eu foco minha atençao de volta no violao em minhas maos, puxando as cordas. Nao sou o melhor guitarrista que existe e nao toco com frequencia, mas e uma boa distraçao quando estou tentando relaxar.
As chaves escorregam pela fechadura da porta da frente e Morris corre de volta para a sala de estar, empoleirando-se perto da porta no momento em que River a abre.
— Oi, Baby. — Ela murmura como se ele nao fosse o demonio disfarçado, trocando a bolsa em suas maos por ele, levantando o gato e abraçando-o. Eu posso ouvir seu ronronar todo o caminho desde o sofa enquanto ela coça sob suas orelhas, salpicando-o de beijos.
Como se ela pudesse sentir meu olhar, ela vira os olhos para mim.
— Oh. Oi.
Sua voz pode ser monotona, mas ha algo diferente na maneira como ela esta olhando para mim. Nao consigo de inir o que estou vendo.
— Como foi seu dia? — Eu pergunto.
Ela franze o rosto. — Voce nao pode?
— Eu nao posso o que? Ser civilizado?
— Ser domestico. E estranho.
— Certo. — Eu concordo. — Foi mal. Vou pular as gentilezas da proxima vez e apenas rasgar a bunda assim que voce passar pela porta. Seus olhos se arregalam. — Voce andou peidando no meu sofa?
Eu nem mesmo digni ico isso com uma resposta.
Em vez disso, eu me levanto do meu lugar de conforto e coloco meu violao de lado. Pego meu copo de agua e vou ate a cozinha para coloca-lo na pia.
Ela suspira. — Desculpa. Provavelmente nao foi uma resposta apropriada.
Agora sou eu que estou com os olhos arregalados quando me viro para ela. — Voce acabou de... se desculpar? Para mim ?
Ela quer revirar os olhos. Esta tudo em seu rosto. De alguma forma, ela se refreou, dando um suspiro mal reprimido enquanto colocava Morris no chao. Ele mia para ela, entao se afasta, indo para sua cama ao lado da mesa de TV.
River tira os sapatos e entra no apartamento. — Nao ique muito animado. Tambem pedi desculpas ao vaso de plantas que encontrei no corredor. Voce nao e especial. — Ela desliza para o banquinho no balcao. — Pode prestar atençao.
Eu aperto minhas sobrancelhas juntas. — Huh?
Ela acena com a cabeça em direçao ao copo que esta sob a torneira de agua da geladeira no momento em que começa a transbordar para a minha mao.
— Merda! — Eu o puxo para longe, e e uma coisa tola de se fazer. Agua espirra por toda parte.
Dou um passo, e minha coisa menos favorita no mundo acontece: eu piso na agua... com minhas meias.
— Filho da puta!
River ri.
De verdade, ri.
Eu viro minha cabeça em sua direçao. Nunca ouvi um som assim sair dela antes.
Se ela esta rindo quando estou por perto, e para mim, e isso pode ser classi icado mais como um bufo sarcastico do que qualquer outra coisa.
— Voce parecia Dean.
— Eu sou Dean.
Desta vez, ela revira os olhos. — Nao você Dean. Winchester. O que eu realmente gosto.
— Sabe, eu e aquele Dean temos muito em comum. E estranho voce nao gostar de mim tambem.
— Sinto muito, voce viu Jensen Ackles sem camisa?
— Voce me viu sem camisa?
Ela franze os labios. — Voce sabe que sim.
— E?
Ela engole em seco, a açao visıvel ate mesmo daqui, e se contorce em seu assento.
Ela limpa a garganta e acena com a mao, tentando parecer nao afetada.
— Nao estou impressionada.
— Nao foi isso que seus mamilos disseram. — Eu levanto minha perna, puxando minha meia molhada do meu pe, entao removo a outra. Eu as enrolo e coloco no bolso.
Se eu estivesse na minha casa, jogaria no chao.
Tenho a sensaçao de que nao iria cair muito bem com River.
— Tem uma reserva.
— Em um quarto com todas as janelas fechadas?
— Sim — ela diz. Entao ela aponta para a cozinha. — Segunda gaveta, ao lado do fogao.
— O que?
Ela bufa. — Toalhas de mao. Segunda gaveta, ao lado do fogao. Voce vai precisar deles para limpar sua bagunça. Eu nao tenho toalhas de papel.
— Voce se esqueceu de comprar alguns?
— Nao. Eu simplesmente nao os uso em casa. Reutilizar, reduzir, reciclar e tudo mais. Tento fazer a minha parte onde posso, e as toalhas de papel parecem inuteis quando ha guardanapos de pano lavaveis e toalhas perfeitamente boas que podem ser usados.
— Isso e... surpreendente.
— O que e?
— Voce sendo totalmente hipster e outras coisas.
— Se ser totalmente hipster signi ica dar a mınima para o meio ambiente, entao sim, acho que sou uma “hipster”. — Ela usa aspas no ar em torno da palavra. — Voce precisa de ajuda?
— Voce vai continuar falando assim a noite toda?
— Assim como?
— So estou jogando fora essas perguntas aleatorias como se eu soubesse sobre o que diabos voce esta falando.
— Estou me referindo a sua bagunça. Voce precisa de ajuda para limpar isso? Voce esta demorando muito.
Eu balanço minha cabeça, indo em direçao a gaveta que ela apontou, e limpo minha bagunça.
River se levanta de seu banquinho, indo para a cozinha, passando por mim e tendo a audacia de me olhar de lado como se eu fosse o unico em seu caminho.
Terminada a limpeza, ico em pe, jogando a toalha no balcao ao meu lado. Eu inclino minhas costas contra o granito e cruzo os braços sobre o peito, observando enquanto ela corre ao redor, espiando em todos os armarios e embaralhando as coisas antes de fecha-los.
— Voce esta com fome ou algo assim? Precisa de um lanche? Voce parece extremamente mal-humorada hoje.
— Sim, realmente. — Ela puxa a porta da geladeira/freezer e leva cinco segundos ate que ela a feche com raiva tambem. — Eu estou morrendo de fome, e nao ha nada para comer neste apartamento.
— Nao acabamos de fazer compras no mercado?
— Sim, mas nada parece bom.
A verdade e que tambem estou morrendo de fome e, agora que estamos falando de comida, meu estomago esta começando a roncar. Fiz a mesma rotina tres vezes hoje antes de decidir comer algumas colheres de manteiga de amendoim direto do pote que estava claramente marcado com... bem, nao era meu nome.
Mas nao estou dizendo isso a ela.
— Vamos sair.
Ela enruga o nariz.
— Tipo... juntos? Em publico? — Eu a encaro com um olhar estreito.
— Sim.
— Onde as pessoas podem nos ver?
— River… — Eu aperto a ponta do meu nariz entre o polegar e o indicador.
— Tudo bem, tudo bem — ela cede. — Podemos ir para o Gravy Train. As pessoas ja nos conhecem la, entao nao vai ser estranho se formos vistos juntos.
— Voce esta agindo como se eu fosse uma especie de leproso.
— Voce disse isso, nao eu.
Eu me afasto do balcao, passando por ela. — Vou me vestir.
— Quer dizer que voce nao vai usar uma roupa que induz ao orgasmo por aı?
Eu giro de volta. — Voce sabe o que? Sim, acho que vou. Quer dizer, voce vai para a lanchonete parecendo uma merda no chao o tempo todo. Por que nao posso?
Ela mexe a mandıbula para frente e para tras com a minha mentira.
River pode nem sempre estar bem vestida, mas ela certamente nunca parece uma merda, mesmo quando esta tentando.
— Que seja. — Ela passa por mim como uma brisa, caminhando ate a porta da frente. — So nao ique muito perto de mim.
— Oh, eu estou perto - muito perto. Posso ate segurar sua mao para que todos saibam que estamos juntos.
— Por favor. Ela desliza os sapatos de volta enquanto eu caminho em sua direçao, pegando minha carteira e o telefone da mesa de centro e os en io no bolso. — Como se eles acreditassem nisso. Nos nos odiamos. Todo mundo sabe disso.
— Bom ponto. Voce nao e muito sutil quanto ao seu desgosto por mim.
— Voce pode me culpar? — ela joga de volta, agarrando sua bolsa enquanto eu abro a porta da frente e aceno para ela passar. Voce primeiro. Eu tenho a chave.
— Que eu ainda preciso de uma copia — eu a lembro enquanto me dirijo para o corredor. Eu perguntei a ela todas as manhas e noites desde que me mudei e ela ainda nao me deu uma copia.
— Entao voce disse cerca de dez vezes. Esta na minha lista de tarefas.
— Onde? No inal da lista?
Seu sorriso me diz que estou certo.
Antes que ela feche totalmente a porta, coloco a mao no bolso, pego a bola de meias molhadas e jogo no apartamento.
— Dean!
— O que? — Eu digo inocentemente. — Vou pega-las quando voltarmos. Eu nao iria para o Gravy Train com as meias molhadas no bolso.
— Mas voce vai levar sua tartaruga para la?
— Ela e minha tartaruga de apoio emocional!
— Claro que ela e. — Ela vira a fechadura e eu a sigo em direçao ao elevador, amando a forma como sua bunda ica com o jeans colado ao corpo que ela esta usando. — E Michael B. Jordan me pediu em casamento hoje.
— Aquele pobre coitado.
Ela bate na minha barriga. Espero que Morris roube suas meias e as esconda onde voce nunca as encontrara.
— E espero que Michael B. Jordan tenha proposto – seria bom alguem inalmente tirar voce de minhas maos.
— Isso implica que voce tem algum tipo de controle sobre mim, e posso garantir que nao poderia estar mais longe da verdade.
— Nao poderia? — Eu sorrio enquanto esperamos pelo elevador. — Voce parece muito obcecada por mim.
— Sonhe.
O elevador chega e as portas se abrem para mostrar outro residente do predio en iado la dentro, parado no canto do fundo.
Nao me lembro do nome da mulher – algo com um T – mas ela sorri calorosamente para nos quando entramos no elevador e paramos em frente a ela.
A viagem e silenciosa enquanto descemos dez andares.
Quando o elevador chega ao saguao, ela sorri para nos brilhantemente enquanto sai do elevador. — Eu sempre soube que voces dois iriam icar juntos eventualmente.
— Que porra e essa… — eu sussurro, uma vez que ela esta fora do alcance da voz.
— Pela primeira vez, concordo com voce — diz River. Ela torce o nariz enquanto saımos do elevador. — As pessoas pensam que
estamos... namorando? — Ela estremece, empurrando as portas principais do predio. — Ai credo.
Eu me arrepio com a reaçao dela.
Ela me odeia, eu entendo, mas insinuar para mim que namorar comigo seria nojento por alguma razao.
— Ai.
— Nao aja como se isso machucasse seus sentimentos. Voce sabe que nos namorando seria horrıvel.
— E.
— Sinto muito, voce esta insinuando que se namorassemos não seria um desastre?
— Pode ser bom. Especialmente por sua reputaçao.
Ela gargalha. — Por favor. Qualquer coisa, seria exatamente o oposto.
— O que foi que voce me disse antes? — Eu coço meu queixo. Ah, isso mesmo – tudo o que voce precisa dizer a si mesma para ajudala a dormir no quarto em frente ao meu a noite.
Ela levanta os olhos para o ceu.
— Cuidado — digo a ela. — Se continuar revirando os olhos assim, eles vao icar presos desse jeito.
Ela faz de novo, com um talento extra dessa vez.
Eu rio, agarrando a porta do The Gravy Train e abrindo para ela. Ela nao se esquiva enquanto meus dedos roçam em suas costas para guia-la para o restaurante.
Entramos na ila e ha pelo menos cinco pessoas a nossa frente. River nao esta feliz com isso.
— Eu juro, se alguem pegar o ultimo pedaço de torta de cereja, eu vou enlouquecer. — Ela esta la com os braços cruzados sobre o peito, batendo o pe contra o velho e gasto ladrilho xadrez preto e branco. Ela parece irritada, e e adoravel como esta icando incomodada. — Como o pior tipo de raiva que uma pessoa pode sentir. Virando mesas e tudo mais.
— Voce leva sua torta a serio quando esta com fome.
— Eu levo minha torta a serio o tempo todo. — Ela me olha de lado enquanto damos um passo a frente. — Algo que voce deve se
lembrar da proxima vez que quiser tentar rouba-la.
— E roubar se for dado a mim?
— Considerando que voce engana uma criança pobre e ingenua para “dar” a voce, sim – isso e roubo.
Eu ri. — Cara, aquele garoto e ingenuo. Maya deveria trabalhar nisso.
Um sorriso orgulhoso curva os labios de River. — Ela e uma boa mae.
— Ela e. — Eu concordo. — Eu vejo muitos pais entrando em minha sala de aula que nao sao. Me faz perceber que, mesmo quando eu pensava que estava mal quando era criança, poderia ter sido pior.
— De onde voce e originalmente?
— Nao muito longe. Cerca de uma hora e meia ao sul.
— Por que se mudou para ca?
Eu me viro para ela, surpresa. — Sinto muito, voce esta tentando me conhecer ou algo assim?
— Na verdade, estou apenas tentando me distrair da fome que esta rasgando o meu estomago para nao pular essa ila ridıcula e começar a roubar guloseimas direto do balcao.
— Ha tres pessoas na nossa frente agora. A ila nao é ridıcula. Ela encolhe os ombros e subimos novamente.
— Agora duas.
Ela rosna e eu rio.
Ficando na ponta dos pes, ela balança de um lado para o outro, tentando ver o que esta acontecendo a sua frente, sua paciencia se esgotando enquanto o casal de idosos no balcao – que tenho quase certeza de que estava por perto quando os dinossauros estavam – se moviam lentamente.
Suas pernas parecem longas dentro de seus jeans skinny, e eu sei que e uma ilusao de otica porque ela mal chega aos meus ombros em um dia bom.
A camisa de mostarda e bolinhas pretas que ela esta usando sobe com seus movimentos, me dando uma olhada em sua pele.
E agora tudo em que consigo pensar e na noite passada.
Como ela parecia boa ao luar fazendo a porra da pose que estava fazendo. Ela poderia estar la embaixo inventando uma merda completa e eu nao saberia. Eu a teria observado a noite toda se pudesse.
O resto da ila a nossa frente desaparece e avançamos para o caixa.
A mulher atras do balcao pisca duas vezes, claramente surpresa em nos ver.
— River. Dean. Voces estao aqui... juntos? — Ela expressa isso como uma pergunta, seus olhos curiosos disparando entre nos.
— Sim. — Eu sorrio para ela. — So estou pegando um pouco de jantar, Darlene.
— Juntos?
Tento esconder minha risada, mas e difıcil, especialmente quando posso sentir o aborrecimento vindo de River em ondas.
— Sim. Juntos. Posso tomar um cafe e uma fatia de cereja primeiro, depois um Don’t Go Bacon My Heart.
— Sinto muito, River, mas voce acabou de perder a ultima de cereja. Seus olhos castanhos se enchem de furia.
Opa.
— O que?
A palavra e cortada e ate Darlene da um passo para tras.
— I-Infelizmente, querida. Vendemos tudo ha poucos minutos.
— Mas e sabado a noite! Eu sempre como torta de cereja nas noites de sabado. Todos estao tao empolgados com o dia da noz-peca que faz a de cereja desaparecer do radar. — Os olhos de River caem em fendas. — Foi aquele homem dinossauro, nao foi?
Darlene nao responde, mas o gole grosso ja diz o su iciente.
— Eu sabia! — River explode. — E isso. Eu vou atras dele. Ela da dois passos antes de envolver meu braço em volta de sua cintura, segurando-a no lugar.
— O que voce vai fazer? Vai roubar uma fatia de torta de um velho?
— Sim! — Ela se contorce em minhas maos, tentando se libertar para fazer exatamente isso.
A parte mais triste e: eu acredito nela. Ela esta desesperada neste momento.
— Voce nao pode roubar torta dos clientes, River, especialmente os antigos. Esse homem esta facilmente na casa dos noventa. Pelo que voce sabe, este pode ser o ultimo pedaço de torta de sua vida.
— Pode ser minha tambem! Ela tenta correr de novo e eu a aperto com mais força.
Grande erro.
O atrito que ela esta causando esta fazendo meu pau solitario chorar com a pouca atençao que esta recebendo. Se ela nao parar, sera obvio que estou gostando muito de te-la esfregando contra mim.
Conhecendo River, duvido que deixaria esse constrangimento sair ileso.
Eu coloco meus labios em seu ouvido. — Lembra o que seu pequeno show de yoga fez comigo ontem a noite? Eu nem toquei em voce, e ja fez aquilo comigo. Voce quer se contorcer contra mim agora?
Como eu sabia que faria, funciona e ela para de lutar contra mim.
Eu relaxo meu controle sobre ela, mas nao a solto totalmente, nao con io nem um pouco nela.
Suas bochechas estao vermelhas quando ela se endireita, alisando sua camisa. — Voce pode me deixar ir agora, Dean.
Eu nao posso.
— Posso con iar em voce? — Eu digo, meus labios um pouco perto de sua orelha.
— Sim.
— Voce promete nao perseguir um pobre e indefeso homem velho e se comportar?
Ela grunhe. — Sim.
— Ok. — Lentamente, eu a solto e dou um passo para tras, deixando escapar um suspiro de alıvio porque eu realmente poderia usar o espaço.
Se ela percebeu alguma coisa se esfregando contra ela, guardou para si mesma, sem dizer nada enquanto ajeitava suas roupas e se
arrumava.
— Agora, va pegar uma mesa enquanto eu termino de fazer o pedido.
— Tudo bem, mas so porque se eu for, voce tera que pagar pelo meu jantar.
Ela sai na direçao de onde o velho foi e eu agarro seu pulso, puxando-a de volta para mim.
Eu balanço minha cabeça enquanto ela olha para mim inocentemente.
— O outro lado — digo a ela.
Ela faz beicinho e nao gosta, mas faz o que eu digo a ela, cambaleando para encontrar um lugar para nos do outro lado da lanchonete.
Quando ela esta fora do alcance da voz, volto minha atençao para a caixa registradora.
— Desculpe por isso, Darlene.
Ela esta exibindo um sorriso torto, balançando a cabeça para mim.
— O que? — Eu pergunto.
— Oh garoto. Voce tem uma situaçao ruim por ela.
Eu puxo minhas sobrancelhas juntas e decido ignorar seu comentario absurdo. — Vou tomar um cafe e um Couldn’t If I Fried.
Ela da uma risadinha. — Claro que e isso que voce quer.
—O que?
— Faz sentido, considerando que River pediu o...
— Don't Go Bacon My Heart eu termino. — Ok, entendi, mas voce esta lendo muito sobre isso. Eu sempre peço o Couldn’t If I Fried.
— E ela sempre pede bacon.
Ela pede?
Tanto faz. E daı se sempre pedirmos refeiçoes com nomes ridiculamente fofos que parecem que combinam? Nao signi ica absolutamente nada.
— Ouça, se eu der dez a mais, voce pode dizer aquele cara que pediu a torta de cereja que ela caiu no chao e colocar na minha mesa?
Aquele sorriso bobo que nao deixou seu rosto cresce. — Para River? Ou para voce?
— Darlene…
Ela ri. — Me de vinte e voce consegue um acordo, querido.
Eu pago nossas refeiçoes – mais o suborno extra – e vou ate a mesa que River pegou.
Ela esta sentada la, furiosa, atirando adagas contra o velho na lanchonete, praticamente olhando para um buraco em suas costas.
— Deixe-o em paz, River.
— Ele roubou minha torta, Dean, e voce sempre rouba minha torta. As pessoas estao sempre roubando minha maldita torta e isso nao e nada legal.
— Voce poderia tentar chegar aqui mais cedo, sabe. Entao talvez tenha a chance de conseguir sua torta preciosa.
— Voce diz isso como se eu fosse o unico de nos que gosta de torta. — Ela engasga, os olhos arregalados. — Puta merda. Juro que se voce so esta comprando a torta porque sabe que gosto e voce nem mesmo a ama de verdade e adora como se fosse feita para ser amada e adorada, vou matar voce. Nao, primeiro vou expulsa-lo do meu apartamento e depois mata-lo.
— Bem, isso e duplamente terrıvel da sua parte.
— E verdade.
Ela pega o garfo da mesa, segurando-o na minha direçao de uma maneira que ela acha ser ameaçadora, mas tenho certeza de que ser ameaçada por uma criança mal-humorada e faminta e assim.
— Relaxa, turbo — eu digo, arrancando o garfo dela. — Eu realmente amo e adoro a torta da maneira que deve ser amada e adorada.
Ela solta um suspiro aliviado, sentando-se de volta na cabine. — Bom. Porque eu odiaria ter que matar voce.
— Desenvolvendo um fraco por mim, hein?
— Nao. So nao quero sujar meus sapatos com sangue. Eles sao meus favoritos.
Eu ri. — Justo.
— Aqui estao aqueles cafes. — Darlene coloca uma xıcara na frente de cada um de nos. — E eu encontrei isso para voce, River.
Ela pisca para ela enquanto desliza sobre um prato com um unico pedaço de torta de cereja e sai correndo.
Todo o rosto de River se ilumina, e algo em meu peito muda. Eu nao sei o que exatamente. Tudo o que sei e que foram os melhores vinte dolares que gastei durante toda a semana.
Ela se move mais rapido do que eu ja vi, pegando o garfo de volta e apunhalando a torta, empurrando um pedaço muito maior do que ela pode segurar na boca.
Ela geme, e la se vai meu pau saltando querendo atençao novamente.
Eu me mexo na cadeira, tentando ajustar meu pau dolorido sem tornar o que estou fazendo muito obvio.
Acho que nunca a tinha visto tao feliz antes, e isso inclui a vez em que ela pensou ter visto Hugh Jackman passando pela lanchonete.
Ela ate sorri para mim.
E eu me pego sorrindo de volta.
— Esta e a melhor coisa que me aconteceu durante toda a semana.
— O que? Jantar comigo?
Seu sorriso diminui, mas nao desaparece. — Se jantar com voce signi ica torta gratis, entao sim. Embora eu me pergunte como Darlene conseguiu arranjar isso...
Suas palavras morrem enquanto ela inclina a cabeça, me estudando.
— O que? — Eu me inquieto sob sua inspeçao.
— Voce teve algo a ver com isso?
— O que? Nao. — Mas minha voz soa muito alta ate mesmo para meus proprios ouvidos. Eu limpo minha garganta. — Claro que nao.
— Esta desenvolvendo um ponto fraco por mim, Dean? — Ela pergunta com um sorriso malicioso, jogando minhas palavras de volta.
Pode ser.
Eu rolo meus olhos. — Cale a boca e coma sua torta, River.
Ela faz, e nao para de sorrir para mim o tempo todo. Essa sensaçao estranha no meu peito perdura.
— Voce sabia que esta sem ovos?
Eu estreito meus olhos para Dean enquanto ele entra na sala de estar, empurrando uma garfada de comida em sua boca. — Por que voce esta contando meus ovos?
Um sorriso de merda se estende por sua boca, e estou irritada com o quao bom ele parece, embora tenha um pedaço de ovo grudado no labio. — Porque eu nao quero que voce morra de fome. Lembro de duas noites atras, quando voce tentou mutilar um velho por roubar sua torta, e gostaria de evitar uma repetiçao.
Ok, entao talvez eu tenha sido um pouco temperamental na outra noite.
Mas a culpa foi inteiramente de Dean.
Ele foi o unico que me deixou tao excitada que eu nao poderia não cuidar de mim, o que naturalmente levou a desordem e um treino de im de noite.
Os olhos de Dean vagando sobre mim durante a minha sessao de yoga improvisada me deixaram mais acordada do que nunca, e eu nao adormeci ate quase o nascer do sol. Quando eu inalmente saı da cama na manha seguinte e vi o buraco que meu brinquedo deixou na parede, eu sabia que nao poderia enfrentar Dean.
Eu corri para a Making Waves mesmo sendo meu dia de folga, pulando o cafe da manha para nao ter que arriscar um encontro indesejado com meu colega de quarto. Meu dia inteiro icou desequilibrado depois disso.
Como eu disse, totalmente culpa dele.
— Duvido muito que voce esteja preocupado com meus habitos alimentares. — Levo meu cafe aos labios e assopro o lıquido quente.
Nao e preciso ser um genio para saber que ele andou roubando meus ovos e quase todas as outras comidas na geladeira e na despensa com o meu rotulo. E como se as regras que desenhamos cuidadosamente nao signi icassem absolutamente nada para ele.
Ele sorri para mim enquanto se joga na outra extremidade do sofa. E o mesmo sorriso que ele tem me dado desde que se mudou, como se ele soubesse que te-lo aqui esta me matando.
E isso e.
Mentalmente... isicamente.
Estou tensa. Mais cansada do que o normal, com certeza. Te-lo por perto esta me estressando. O relaxamento e coisa do passado. E nao me re iro apenas ao tipo “relaxar sem as calças” ou “deixar meus peitos voarem livremente” – esse e um nıvel totalmente diferente de lazer.
Quero dizer, apenas sentar no meu proprio sofa e assistir algo de baixa qualidade na televisao. Ou entrar na minha propria cozinha e comer meio litro de sorvete sem sentir que seu julgamento vai me afetar. Simplesmente existindo no meu proprio espaço e nao me sentindo no limite ou como um hospede no meu proprio apartamento. Nem me fale sobre a maneira como ele regularmente anda por este lugar como esta agora, vestido com aquele moletom cinza caindo e uma camiseta branca lisa como se ele fosse um deus do sexo.
Eu odeio cada momento disso.
Especialmente a noite, quando eu deito na cama pensando sobre o fato de que Dean Fodido Evans esta deitado do outro lado do corredor... e como pode ser bom cruzar a soleira de seu quarto e se enrolar na cama ao lado dele. Para deixa-lo me tocar com as maos do jeito que fazia com os olhos.
Para beija-lo.
— Obrigada pelo inventario — digo a ele. — Vou marcar isso da proxima vez que izermos nossas compras de supermercado... e voce vai notar o plano cuidadosamente elaborado que traçamos.
Dou a ele um breve sorriso, deixando-o saber que nao vou aceitar mais suas merdas, incluindo ele roubando minha comida.
Ele ri.
Ele tem a porra da audacia de rir.
— Voce quer dizer escrever nossos nomes em nossa porcaria como se estivessemos no jardim de infancia ou algo assim? Vamos, River. Nao e grande coisa se usarmos as coisas um do outro. Eu sei que voce usa algumas das minhas coisas.
— Eu nao uso nada seu.
Ele levanta as sobrancelhas e eu trabalho hora extra para nao deixar meus ombros caırem.
Merda. Ele sabe.
Para ser justo, e culpa dele eu usar as coisas dele. Ele cheira tão bem. Tao bem que quero me banhar em seu perfume...
Entao eu me banho.
Posso ter começado a usar seu sabonete lıquido no chuveiro.
Mas posso realmente ser culpada? Esse cheiro de cedro luindo sobre mim... droga. Quase nao me sinto tao solteira e solitaria quando o uso.
Triste, mas verıdico.
— Eu nao — eu repito, mantendo minha compostura.
Ele me olha como se nao acreditasse em mim, mas desiste de qualquer maneira.
— Entao — ele começa, empurrando sua comida e misturando-a. — O que esta em sua agenda hoje?
Felizmente, com Dean morando aqui, tenho me distraıdo com o trabalho. Fiz questao de sair cedo todos os dias e icar ate tarde todas as noites apenas para evitar tempo extra com ele.
Grosseiro? Sim.
Necessario para nao cometer assassinato? Tambem sim.
Tenho certeza de que poderia invocar algo e me esgueirar para a loja, mas preciso de um dia de folga.
Eu amo a Making Waves – e o meu bebe – mas ate eu preciso respirar de vez em quando, e esta semana tem sido muito difıcil. Eu poderia fazer uma pausa.
Alem disso, tenho a sensaçao de que depois de aparecer na loja ontem quando eu nao deveria estar la, se Caroline e Maya descobrissem que eu iz isso de novo... bem, vamos apenas dizer que enfrentar a ira delas nao esta na minha lista de coisas: Eu quero fazer em breve.
— Pela primeira vez em muito tempo, absolutamente nada. Voce vai trabalhar?
Ele balança a cabeça. — A escola de verao nao começa ate a proxima semana.
— Alguma coisa para cuidar do apartamento?
— Impasse com o seguro.
— Voce vai estar em casa hoje, entao?
Ele concorda. — Sim.
— Oh.
Ele da uma mordida no que quer que seja meu que esta comendo, mastiga e engole. Voce quer que eu saia da sua frente depois do cafe da manha para que voce possa ter o lugar so para voce?
E la vai ele, me fazendo gostar dele um pouco mais de novo.
Seria mais facil minha vida se eu nao o tivesse por perto o tempo todo e pudesse realmente relaxar na minha propria casa? Sim.
Mas vou expulsa-lo pelo dia em que ele ja estiver passando por toda a merda que esta passando? Nao.
Ele pode ser a pessoa mais desagradavel do mundo, mas nao sou cruel.
Ele estica as pernas, colocando os pes na mesa de centro. Estendo a mao e bato neles, mas ele me desconsidera, deixando-os onde estao.
Morris, que esta se escondendo debaixo da mesa, estica a pata e da um tapa nele, me apoiando.
— Filho da… Dean puxa seus pes para baixo, pegando a dica nao tao sutil.
Ele olha furiosamente para Morris enquanto ele sobe no meu colo, se enrolando em uma bola e ronronando.
— Por que voce perguntaria isso?
— So porque eu mesmo tive uma festa da preguiça outro dia. Aposto que voce tambem poderia ter uma.
— Voce esta dizendo que estou tensa?
— Considerando que voce estava fazendo yoga a meia-noite no outro dia, sim. — Ele olha para mim com um sorriso tımido. A menos que voce nao estivesse acordada porque estava estressada e fosse algo totalmente diferente.
Nao tımida. Sinistro.
Por uma fraçao de segundo, esqueci que Dean e o diabo disfarçado.
— Nao me sinto bem em icar parada — digo a ele. — É por isso que eu estava fazendo yoga. — Mentira parcial. — Nao tinha nada a ver com mais nada.
— Eu tambem nao sou bom em icar quieto. E por isso que me inscrevo na escola de verao todos os anos e passo tantas horas no abrigo.
— Abrigo?
Ele aponta o polegar por cima do ombro. — Onde consegui esse idiota.
Leo, que esta descansando em uma cama de pedras, levanta a cabeça, e eu juro que ele faz contato visual direto comigo como se soubesse que estamos falando sobre ele.
— Voce nao estava brincando sobre ele ser sua tartaruga de apoio emocional?
— Eu sou seu treinador de suporte emocional. E nao. Por que eu mentiria sobre isso?
— Porque e estranho.
— Por que ele e uma tartaruga?
— Sim. — Tomo outro gole cuidadoso do meu cafe. — Nao seria tao estranho se fosse tipo, eu nao sei, um gato ou algo assim.
— Nah. — Dean balança a cabeça. — Eu odeio gatos.
— Ei! — Eu aponto para meu colo. — Morris pode ouvir voce!
— Eu disse o que disse, Morris.
Miau.
— Tenho certeza de que isso signi ica que o sentimento é mútuo na linguagem dos gatos.
Ele ri. — Voce provavelmente esta certa.
— O que fez voce ter uma tartaruga de apoio emocional? — Dean abre a boca para me corrigir e eu rolo meus olhos. — Voce sabe o que eu quero dizer.
— Eu gostaria de ter uma boa historia, mas estava passando pelo abrigo pouco depois de me mudar para ca e vi uma placa que dizia São necessários voluntários. Eu nao conhecia ninguem na cidade ainda e tinha tempo antes das aulas começarem, entao imaginei por que nao? Eu nao tinha nada melhor para fazer. — Seu tom e casual, mas a maneira como ele olha para Leo com um sorriso nos labios conta uma historia diferente. — Cerca de uma semana depois de me tornar voluntario, esse carinha foi trazido. Ele foi capturado e cuidado por alguns anos antes de ser acidentalmente atropelado por um daqueles grandes carros Power Wheels. Sua casca estava muito quebrada e a famılia nao queria conserta-la, entao o entregaram ao abrigo. Felizmente, ele foi capaz de ser remendado de volta, mas pode levar muito tempo para uma concha cicatrizar. Eu me senti pessimo por ele.
p p p p
Ele e uma tartaruga, sabe? Nao um gato fofo ou cachorrinho gordinho. Ninguem ia dar a ele uma hora do dia. Entao, eu o levei para casa. Ele esta comigo desde entao.
Ele coloca a mao no terrario e Leo vai ate o vidro, batendo a cabeça contra a palma da mao de Dean como se tivessem feito um milhao de vezes antes.
Meu coraçao derrete.
Ele afasta a mao, colocando sua atençao de volta no prato. — De qualquer forma, nao consigo ir com tanta frequencia durante o ano letivo porque estou muito ocupado, mas tento dedicar pelo menos dois dias da semana ao abrigo durante o verao.
Ele pode falar como se so tivesse entrado no abrigo porque estava entediado, mas esta claro que tem um ponto fraco em seu coraçao por coisas quebradas.
Ele olha para mim, mastigando o resto de sua comida. — O que? — ele pergunta, engolindo. — Por que voce esta olhando assim para mim?
— Nada. — Eu balancei minha cabeça. — Nao e nada.
So que nao e. Estou começando a achar que Dean pode nao ser tao ruim quanto eu pensava.
Ainda e irritante? Sim.
Mas talvez haja mais nele do que eu pensava... e isso pode ser perigoso.
— Voce nunca me respondeu — diz ele.
— O que voce perguntou?
— Voce quer que eu me afaste do apartamento hoje?
— Nao.
— Legal. Quer fazer algo divertido comigo, entao? Algo para ajudar a desabafar e talvez ajuda-la a relaxar?
— Claro.
Espere o que?
Por que digo isso? E por que eu quero dizer isso?
— Voce esta brincando.
Eu ico olhando para o predio vermelho em estilo de um galpao que eu ja passei muitas vezes, mas nunca entrei.
— Nao.
— Isso e o que voce tinha em mente?
— Sim. — Ele abre a porta. — Vamos.
— Voce esta falando serio?
— Morte.
— Nao estamos um pouco velhos para isso?
— Estamos muito velhos para nos divertir? Nao. Agora, vamos.
— Por que diabos nao?
Com um encolher de ombros, eu passei por ele no que e apropriadamente chamado de The Skate Barn, um rinque de patinaçao.
A primeira coisa que noto e o cheiro – velho. Nao e totalmente desagradavel, mas cheira a antiquado, com certeza. O segundo e a decoraçao. Ha velhos posters de shows, folhetos e ingressos grampeados nas paredes. Esta desordenado, mas de uma forma artıstica.
Para minha surpresa, o lugar nao esta completamente morto. Ha cerca de dez pessoas no chao voando ao redor do ringue, e alguns retardatarios no meio se movendo mais devagar. Ha uma musica suave tocando nos alto-falantes e algumas crianças correndo loucamente na pequena sala de jogos.
— Este lugar e…
— Impressionante! — Dean bate palmas. — Oh cara. Eu nao estive em um destes em muito tempo. Eu vi na minha viagem no ano passado, eu morei aqui, mas nao tive a chance de dar uma olhada ainda.
— Eu tambem nunca estive. Acho que nem mesmo piso em um desses desde que tinha cinco anos.
— Serio? Tınhamos um na minha cidade natal. Ao longo do ensino medio, estava sempre lotado nas sextas-feiras a noite. O lugar mais quente para ir, com certeza.
— Acho que voce e um otimo patinador, entao?
Ele encolhe os ombros. — Eu me viro. Voce?
Vai ser muito constrangedor e não estou ansiosa por isso. — Eu vou me virar tambem.
— Bom. Vamos pegar alguns patins.
Dean coloca a mao na parte inferior das minhas costas, e minha pele zumbe exatamente como fez na outra noite, quando ele fez o mesmo movimento.
E bobagem. Nao e como se eu nunca tivesse feito isso comigo antes.
Mas o toque de Dean... e diferente.
Firme, mas gentil. Como se ele estivesse me tocando porque quer me manter segura e perto e porque ele nao consegue se conter.
Eu gosto disso.
Dean pede patins em nossos tamanhos, entao vamos ate um banco vazio e trocamos nossos sapatos pelo estilo de quatro rodas.
Ele termina primeiro, enquanto eu luto.
— Preciso de ajuda? — Ele pergunta, se elevando acima de mim com as maos nos quadris.
Eu olho feio para ele, tirando meu cabelo do rosto. — Eu nao sou uma criança. Posso amarrar meus proprios patins.
— Tem certeza? Porque nesse ritmo, icaremos aqui o dia todo.
— Voce pode sair sem mim.
Ele me lança um olhar que diz que acredita no contrario.
Em seguida, cai de joelhos, e eu ico parada enquanto ele enrola a mao em volta da minha panturrilha.
Se eu pensei que ter a mao dele nas minhas costas estava fazendo minha pele vibrar antes, eu estava errada.
Isso? E de outro nıvel.
Nao e como se esta fosse a primeira vez que Dean me tocou. Ele me colocou contra ele na lanchonete apenas duas noites atras, mas eu estava muito focada em comida para prestar atençao em como era estar em seus braços.
Se a sensaçao de ter a mao dele na minha perna e alguma indicaçao, perdi um grande momento.
Lentamente, como se ele pudesse sentir a diferença tambem, ele arrasta a mao pela minha panturrilha, levantando minha perna ate que meu patins esteja encostado em sua coxa gigante. Seus dedos se movem rapidamente enquanto ele endireita meus cadarços.
— Voce deve amarrar o cabelo para que nao voe na sua cara la fora.
— Eu pensei que voce gostava do meu cabelo solto?
Ele olha para mim com a sobrancelha levantada. — Desde quando voce se preocupa com o que eu gosto?
Eu nao respondo a ele.
Em vez disso, faço o que ele me diz, enrolando meu cabelo comprido em um coque e prendendo-o desordenadamente no topo da minha cabeça.
Ele coloca meus pes agora amarrados de volta no chao, entao pula nos dele com facilidade, como se tivesse nascido usando um par de patins ou algo assim.
Ele estende a mao para mim. — Esta pronta?
—Como sempre estarei.
Eu o deixei me puxar para cima. Eu realmente nao ando de patins ha muito tempo, provavelmente desde que eu tinha cerca de oito anos. Dessa vez, Maya e eu decidimos que seria divertido tentar escalar o pinheiro perto de nossa casa... entao começamos a cair e assustar nossos pais e a nos mesmos. Jogamos nossos patins na lixeira na manha seguinte.
— Vamos. — Ele começa a nos levar para o chao. — Eu sei que voce disse que ja faz muito tempo que voce nao usa isso, entao, quando chegarmos la, posso ajudar a te orientar se voce precisar. Eu vou–
Ele para e eu corro direto para ele.
Aqueles comediantes que caem exageradamente com os braços agitando-se e os pes balançando para frente e para tras como se nao pudessem encontrar traçao ate que batessem no chao?
Sim, sou eu agora.
Minhas pernas voam debaixo de mim e eu caio direto na minha bunda.
Dean tomba junto comigo.
— Merda! — ele grita enquanto desce.
O ar e expulso dos meus pulmoes quando ele cai em cima de mim, todos os dez bilhoes de quilos de musculos pressionando contra mim.
Ele se levanta, empurrando-se de cima de mim ate que esta pairando como se estivesse prestes a fazer uma lexao ou algo assim. — Merda! Porra! Merda! Voce esta bem?
Eu gemo e ele olha para baixo com olhos preocupados.
— Voce esta bem?
— Sim?
E uma pergunta porque, francamente, tudo doi.
Ele se inclina tao perto que posso ver pelo menos tres tons diferentes de verde em seus olhos.
— Por favor, me diga que voce nao bateu com a cabeça.
— Eu nao bati. — Ele exala, aliviado. — Mas tenho quase certeza de que meu coccix e inexistente neste momento.
Ele ri, fechando os olhos e encostando a testa na minha. — Eu posso trabalhar com uma bunda quebrada, mas nao uma concussao.
Eu paro de respirar novamente.
Eu paro de me mover.
Tenho quase certeza de que o tempo tambem para, porque nao sei dizer quanto tempo passa enquanto icamos deitados aqui, Dean em cima de mim e eu tentando nao respirar, como se eu fosse um cadaver em um programa de TV e a camera e ampliada no meu rosto.
Ele afunda mais. Eu juro que posso sentir seus labios contra os meus.
E eu juro que quero sentir mais.
— River?
— Sim?
Ele engole. Uma vez. Novamente.
— Eu... uh... eu–
— Bem, esta e uma reviravolta interessante.
Inclinamos rapidamente nossas cabeças em direçao a voz que vem de cima.
— Ei, Lucy — Dean fala casualmente.
Nossa sındica do predio esta de pe sobre nos, seus labios pintados de roxo brilhante se estendendo de orelha a orelha, as maos nos quadris.
Dean sai de cima de mim, sentando ao meu lado, puxando os joelhos para cima. Eu me levanto para sentar, meu coccix doendo seriamente com os movimentos.
— Como voce esta?
Lucy aperta os labios com a tentativa ridıcula de Dean de agir como se ela nao tivesse apenas nos pegado quase nos beijando.
Deus. Porra. Merda.
Dean Evans quase me beijou!
E quase o deixei.
— O que voces crianças estao fazendo aqui? — ela pergunta.
— Patinaçao.
— No chao? Horizontalmente?
O rosto de Dean ica tao vermelho quanto meu cabelo.
Lucy ri. — Estou apenas brincando, mas estou feliz em ver que inalmente aconteceu. Sempre soube que voces dois iriam icar juntos.
O que há com as pessoas dizendo isso?
Franzindo minha sobrancelha, eu olho para Dean, e ele parece estar tao confuso quanto eu.
Ele limpa a garganta. — O que voce esta fazendo aqui?
— Estou apenas começando a praticar.
— Praticar?
Lucy acena com a cabeça. — Roller derby.
Suas sobrancelhas apontam para a linha do cabelo. — Você joga roller derby?
—Costumava jogar. Eu era muito boa. Sem lei e como me chamavam, porque eu era pessima em seguir as regras. — Ela encolhe os ombros. — Agora eu apito. Eu posso estourar as bolas.
Tenho certeza que o apelido de Lawless tambem teve muito a ver com o fato de que ela se assemelha a Xena com seus longos cabelos negros e franja romba.
— Isso ainda e muito foda, especialmente para… — Suas palavras morrem, os olhos se arregalando quando ele percebe o que estava prestes a dizer e como esta completamente impotente para se convencer do contrario.
Eu posso estar gostando de ve-lo se contorcer sob a observaçao de Lucy um pouco demais.
— Alguem da minha idade? — ela fornece para ele, inclinando a cabeça. — Quantos anos voce acha que eu tenho, Dean?
Ele engole ruidosamente. — Eu so quis dizer... uh... eu quis dizer...
Ela ri. — Eu so estou brincando. Sei que nao sou um brotinho. Nao signi ica que nao posso me divertir, certo?
Ela pisca, e eu me pergunto se ela de alguma forma ouviu nossa conversa anterior do lado de fora, porque soa quase exatamente como o que Dean me disse.
— Certo — ele concorda calmamente.
Ja vi Dean ser muitas coisas antes, mas nunca envergonhado como esta agora, olhando diretamente para seu colo e sem fazer contato visual com a nossa sındica.
Lucy me da outra piscadela e faz um gesto em direçao ao rinque. — Vejo voces crianças la dentro, certo?
Ela patina como se tivesse nascido sobre rodas, mas nenhum de nos faz mençao de segui-la.
— Ela vai totalmente aumentar meu aluguel depois desse comentario — diz Dean, olhando para ela.
— Nah, Lucy e muito legal. Prova: voce ainda esta morando no predio quando esta sendo claramente denunciado de forma consistente. Isso me lembra... por que acha que sou eu quem esta denunciando voce?
— Porque voce mora na casa ao lado e provavelmente eu a aborreço mais.
— Isso e provavelmente cem por cento correto, mas, infelizmente, nao sou eu.
— Por que nao?
Eu espreito para ele, e ele esta me observando com olhos intensos. — Nao tenho certeza.
Eu queria denunciar Dean nos ultimos meses, mas sempre que pego meu laptop para fazer login no sistema e registrar uma reclamaçao, nunca envio o formulario. Escrevi pelo menos dez no ano passado. Todos eles acabam no lixo.
Nao sei o que me impede.
— E esse ponto fraco que voce esta desenvolvendo por mim?
Ponto fraco? Por ele? Ele sonharia. De jeito nenhum eu tenho algo que se pareça com um fraquinho por ele. Ele e o homem mais detestavel do planeta. Se os alienıgenas invadissem a Terra e tivessemos que enviar um sacrifıcio com eles para salvar a humanidade, eu escoltaria pessoalmente Dean ate a nave deles.
Então por que você não o denunciou? E a melhor pergunta... por que ia deixar ele te beijar?
— Con ie em mim, nao ha ponto fraco.
— Certo. — Ele ri, balançando a cabeça. Ele se levanta com facilidade e estende a mao na minha direçao. — Vamos. Vamos ver o quanto somos pessimos nisso.
— Voce so pode estar brincando comigo...
Eu rosno, batendo minha cabeça contra a porta e segurando a maçaneta ate que os nos dos dedos estejam brancos.
Trancado para fora novamente.
Eu gostaria de ter parado na loja de ferragens com ela a reboque a forçado a me fazer uma chave no dia em que fomos para o rinque de patinaçao, mas a unica coisa que estava passando pela minha mente e que quase a beijei.
Quase beijei River e se Lucy nao tivesse nos interrompido, eu o teria feito.
Inferno, mesmo quase uma semana depois, eu provavelmente ainda estaria beijando ela.
Longamente. Com força. De todas as maneiras que pensei quando nao conseguia dormir a noite e nao queria puxar o meu pau com ela no quarto do outro lado do corredor.
Agora, eu nao quero beija-la. Estou muito irritado com ela.
Eu bato na porta. — Droga, River! Me deixe entrar!
Uma mulher mais velha do outro lado do corredor sai de seu apartamento, com o rosto contraıdo em desaprovaçao. Ela ja me deu olhares semelhantes antes, e agora que sei que nao e River, aposto que é ela quem está reclamando de mim com Lucy.
Eu dou a ela um sorriso tenso.
— E uma coisa de jogo sexual.
Ela engasga, segurando o peito e correndo mais rapido pelo corredor em um esforço para se afastar de mim.
Nao sinto pena de assusta-la. Estou muito frustrado.
Preciso da chave deste apartamento, e isso muda... agora.
Eu bati na porta mais uma vez. — River! Abra, caramba!
—Uau.
Eu me viro, assustado com o som.
River esta parada cerca de tres portas abaixo, em frente ao elevador. Ela esta encostada na parede, com os braços cruzados, me olhando com uma sobrancelha levantada.
— Dizendo as velhas que estamos jogando jogos sexuais e me xingando. E eu pensei que voce era um cavalheiro, Dean.
Eu zombo. — Voce nao tem essa noçao. — Ela encolhe os ombros. — Agora, abra a porta.
— Voce nao esta tecnicamente errado. — Ela se afasta da parede, caminhando em minha direçao com o passo mais lento do mundo –provavelmente porque ela caiu pelo menos dez vezes enquanto patinava. Com o mesmo passo de caracol, ela puxa as chaves do bolso e desliza a correta na fechadura, torcendo duas vezes e empurrando a porta aberta, gesticulando para eu ir primeiro.
— Eu posso ser um idiota as vezes, mas as mulheres sempre vao primeiro.
Ela resmunga algo que nao consigo entender e passa por mim. Eu a sigo para dentro.
— Qual e teu problema? — Ela joga a bolsa na mesa ao lado da porta, em seguida, tira os sapatos.
Eu mal segurei meu suspiro. Ela esta parada no meio da entrada comigo praticamente pressionado contra a porta, exigindo respostas como se eu fosse o idiota nesta situaçao.
— Voce esta brincando ne? — Seus labios franzidos me dizem que ela nao esta, e desta vez eu deixo meu suspiro sair. — Eu nao tenho a chave, River. Ainda. Ja faz um tempo que estou aqui e nao tenho como ir e vir quando quiser.
— Eu estive ocupada. Eu nao tive tempo de chegar a loja e conseguir sua propria copia.
— Por duas semanas?
— Por duas semanas? — Ela zomba de mim como se tivesse doze anos. — Sim. Caso voce nao tenha percebido, eu tenho um negocio.
— Oh, acredite em mim – as repetidas noites interrompidas de sono me fazem perceber o quao ocupada voce esta.
Embora ela tenha prometido trazer seu laptop do trabalho para casa, ela sempre “esquece”. Nesse ponto, tenho certeza de que ela esta começando a me deixar infeliz.
Ela nao parece nem um pouco arrependida, e eu sei que nao vou chegar a lugar nenhum com isso.
— Voce pode, por favor, me dar uma chave? Eu realmente nao acho que isso seja pedir muito.
—Eu–
— Se nao for por mim —eu a cortei, — entao pelo menos faça isso por Leo. Ele precisa de cuidado e atençao.
Seu olhar vagueia em direçao ao terrario montado no painel e a criatura adoravel descansando dentro.
Com uma bufada, ela revira os olhos na minha direçao. — Vou fazer disso uma prioridade – irei logo de manha. Por que voce vai e vem no domingo, a inal?
— Eu estava no abrigo antes, entao me encontrei com um amigo. Eu tenho uma vida, voce sabe.
— Voce tem amigos?
— Por que isso e surpreendente?
— Porque nao consigo imaginar alguem sendo amigo de voce por vontade propria.
Eu empurro a porta, fechando a distancia entre nos. Tenho muitos amigos, River.
— Soa exatamente como algo que uma pessoa sem amigos diria. Eu nao icaria surpreso se voce deixasse o apartamento todos os dias para sentar no parque sozinho, apenas para fazer parecer que sua vida nao e triste.
— Isso e muito rico vindo de voce. Se esqueceu, ja somos vizinhos ha um ano. Eu vi voce voltar para casa sozinha muitas noites ao longo dos meses.
Ela ergue o nariz. — Eu tenho padroes.
— Ou talvez seja porque voce nao consegue um cara para te levar para casa.
Ela inala uma respiraçao a iada, minhas palavras doendo. Seu peito arfa, e ela esta perto o su iciente para que eu possa sentir seus seios como fantasmas contra o meu corpo. Eu seria um maldito mentiroso se dissesse que meu pau nao saltou com o quase contato.
Merda. Mesmo quando ela esta nos meus ultimos nervos, como agora, eu quero beija-la.
O que diabos há de errado comigo?
E tudo o que consigo pensar.
Esta na minha cabeça a primeira coisa pela manha quando ela esta na cozinha fazendo seu cafe e assobiando a mesma melodia irritante de sempre. Quando ela olha para mim por acordar e existir. Quando ela chega em casa do trabalho parecendo estressada e cansada. A noite, quando estou deitado naquele colchao de ar de merda, rezando para dormir.
Eu penso sobre tudo isso. A. Porra. Do. Tempo. Todo.
Esta me matando lentamente. Esta semana inteira foi uma tortura.
A pior parte? Nao parece que tenha afetado River de forma alguma.
Eu preciso saber se isso aconteceu. Seus labios se curvaram em um rosnado. — Bundao.
— Ai. Estou tão magoado com o seu insulto superinteligente.
— Pau no cu.
— Sim, eu tenho os dois, baby.
Ela olha incisivamente para minha virilha. — Poderia ter me enganado.
Eu cerro meus dentes. — Isso foi frio, mas acho que nao deveria ter esperado nada menos da propria Rainha do Gelo.
— Eu so sou fria com voce.
— Diz a garota que obviamente passa mais tempo enroscada em seu sofa sozinha do que com os amigos.
— Voce esta insinuando que eu nao tenho nenhum amigo porque eu sou fria?
— Voce insinuou que eu nao tinha primeiro.
— Porque eu conheço voce!
— E eu conheço você.
Ela funga com altivez, girando para longe de mim e colocando distancia entre nos.
Soltei um suspiro de alıvio silencioso, esperando que ela nao ouvisse.
— Eu tenho muitos amigos, muito obrigada. — Ela se move para a cozinha, alcançando o armario ao lado da geladeira e puxando um copo. — Eu apenas pre iro passar minhas noites sozinha.
— Voce com certeza tinha essa desculpa bloqueada e carregada, nao e? So estou dizendo que deveria sair mais. Comece um hobby. Sua agenda social, sem duvida, nao esta cheia.
Eu acertei um nervo. Posso ver em sua mandıbula, o modo como tiques.
— Eu tenho hobbies.
— Como?
— Evitar voce.
— Boa sorte com isso, ja que estamos morando juntos agora.
— E com esse lembrete, eu preciso de uma porra de uma bebida.
— Ela geme, murmurando algo, mas a unica palavra que consigo entender claramente e arrependimento.
Ela se curva, entrando no armario embaixo da torradeira. Uma garrafa de uısque cai pesadamente no balcao e ela abre a tampa, derramando dois dedos de bebida em seu copo.
Sem hesitar, ela joga o alcool de volta, em seguida, despeja um pouco.
— Eu–
Ela ergue o dedo e bebe a segunda bebida.
— Ah. — Ela estala os labios. — Muito melhor. Talvez agora eu possa lidar com voce. Agora, com o que quer me insultar em seguida?
— Voce esta bebendo seu uısque errado. E feito para ser saboreado, nao engolido como uma dose barata.
Com um rolar de olhos, ela serve outra bebida... e vira de novo.
Seu olhar cai para a garrafa e ela encolhe os ombros. — Voce quer saber? Foda-se. — Ela pega a garrafa e o copo, caminhando pelo corredor. — Eu estou tomando banho. Se eu me afogar, vou assombrar sua bunda!
A porta do banheiro bate e nao consigo deixar de rir.
Nolan estava certo.
River me desa ia como ninguem jamais fez... especialmente a minha sanidade.
Provavelmente e por isso que me encontro indo em sua direçao como um manıaco.
Ela nao reage quando empurro a porta, quase como se ela esperasse que eu a seguisse. Seu uısque esta no balcao, e ela esta curvada sobre a banheira em nada alem de sua camiseta e calcinha, mexendo com a agua.
Sua bunda esta para cima e traz de volta todas as memorias de sua sessao de yoga, que eu conjurei muitas vezes para ser considerada saudavel.
Estar perto dela o tempo todo... esta icando na minha cabeça. Fazendo-me notar coisas sobre ela. Forçando-me a ve-la quando ela nao esta tao exausta o tempo todo.
Isso esta me fazendo gostar dela. Fazendo-me querer estar perto dela, e nao apenas irrita-la.
— Isso sao tartarugas na sua bunda?
— Sim.
Eu estreito meus olhos. — Eu pensei que voce odiava tartarugas.
— Por que voce assumiria isso?
— Porque voce odeia Leo e sempre tira sarro dele.
— Correçao. — Ela estende a mao e fecha a torneira. — Eu te odeio e tiro sarro de voce. Agora pode sair? Voce esta estragando meu banho.
Quando ela se vira, nao perco tempo prendendo-a contra a pia, prendendo-a.
Seu corpo pressiona com força contra o meu, e tudo dentro do meu cerebro entra em curto-circuito quando sinto seus seios.
Ela e macia e se encaixa contra mim como se fosse onde ela deveria estar.
— O-o que voce esta fazendo, Dean? — Sua lıngua aparece, traçando seus labios carnudos que parecem tao, tão bons.
Eu me inclino em direçao a ela, querendo prova-los. Precisando prova-los.
— O que eu estou fazendo?
Merda. O que estou fazendo?
Por que tenho esse desejo ridıculo de toca-la? Para provar ela?
E River! Isso nao faz sentido.
E, no entanto, aqui estou... olhando para seus labios, que muitas vezes vomitam palavras de odio.
Mas nada disso importa neste momento.
Eu preciso beijar ela.
— Eu vou te beijar. — Sua respiraçao acelera e eu olho em seus olhos. — Posso beijar voce?
Sua cabeça se move quase imperceptivelmente.
Entao, eu beijo River White, porra.
E ela me beija de volta. Com força.
Seus braços vao ao redor do meu pescoço, seus dedos batendo no meu cabelo ja bagunçado. Eu a apalpo como um viciado em drogas que tem medo de nunca mais receber outro golpe, passando minhas maos para cima e para baixo em seus lados, sobre sua bunda. Tudo sobre ela. Com muito medo de nao conseguir toca-la novamente.
Meu pau ica incrivelmente duro, e nao ha nenhuma maneira que nao o sinta pressionando contra ela. Eu me arrisco e me jogo nela. Ela engasga.
Eu faço de novo. Outro suspiro.
Sem aviso, ela se afasta e nos dois estamos ofegantes como se tivessemos acabado de terminar uma maratona para a qual estavamos mal preparados.
— O que... o que... eu... nos ...
Entao nossas bocas se fundem novamente.
Nao sei quem alcança quem primeiro. Nao sei qual braço vai ao redor de quem primeiro. Nao sei como vou ingir que nao sei como sao os labios dela.
Estou completamente fodido.
Eu desacelero minha boca, transformando o nosso beijo frenetico em algo mais calmo ate que nossos labios nao estao mais se movendo. Eu fecho meus olhos, descansando minha testa contra a dela.
— Eu... foda-se — murmuro.
Ela ri. — Eu concordo.
Abrindo meus olhos, eu me afasto, olhando para ela. — O que e que foi isso?
— Nao sei. Voce e quem me abordou.
— Foi voce quem nao me afastou.
— Foi voce quem gostou... embora eu ache que tambem gostei.
— Ela engole. — Por que?
Eu sorrio. — Voce me viu sem camisa?
Ela nao ri. Seus olhos castanhos queimam em mim.
Eu posso praticamente ver seus pensamentos passando por sua cabeça. Eles sao os mesmos que estao atacando os meus.
Por que eu a beijei? O que isso signi ica? O que fazemos agora?
Nao sei. Nao sei. E eu nao sei, porra.
Tudo que sei e que quero fazer de novo.
— Por que voce fez isso, Dean?
— Porque eu nao poderia deixar de fazer isso.
— Nao pode signi icar nada. Eu te odeio.
— Nao quero que signi ique nada, porque eu tambem te odeio. Entao, estamos nos beijando novamente.