Que Pira é Essa? - 2ª edição

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Depósito legal junto à Biblioteca Nacional, conforme Lei n° 10.994 de 14 de dezembro de 2004.

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Bibliotecária responsável: Luzia Glinski Kintopp – CRB/9 - 1535 Curitiba - PR

C289

Carneiro, José Álvaro da Silva Que Pira É Essa? / José Álvaro da Silva Carneiro; ilustração e organização Carla Irusta; coordenação de Luciana Patrícia de Morais e Isadora Hofstaetter . — Curitiba : Edição do Autor, 2022. 60 p. : il. ; 28 cm.

ISBN 978-85-916972-3-6

1ª reimpressão

1. Literatura infantojuvenil brasileira. 2. Índios da América do Sul - Paraná - Cultura. I. Irusta, Carla. II. Morais, Luciana Patrícia de. III. Hofstaetter, Isadora. IV. Título.

CDD: B869.8

IMPRESSO NO BRASIL / PRINTED IN BRAZIL

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José Álvaro da Silva Carneiro Ilustrações: Carla Irusta
1º Reimpressão Ministério do Turismo apresenta: Curitiba, 2022

Apresentação

Nasci em Curitiba, no Paraná, e cresci rodeado por uma paisagem que ganhou nomes como Piraquara, Piraí, Açungui, Anhangava, Guaraqueçaba, Tibagi, Itupava, Peabiru, Iguaçu. Para onde quer que eu olhe, vejo a presença indígena nesses lugares, que apontam para uma história nem sempre contada.

O nome de um lugar tem forte ligação com sua história. Rios, caminhos e montanhas ao meu redor contam sobre o passado do Estado do Paraná. Piraquara, por exemplo, significa “toca do peixe”, provavelmente porque nesse lugar havia muitos peixes. Já Iguaçu é “água grande”, e quem já viu as cataratas desse rio entende o porquê.

Todas essas palavras indicam a presença de povos indígenas em minha região. Povos que viveram nessas terras ou passaram por aqui, há milhares de anos. E foi essa gente que ensinou aos colonizadores (que chegaram bem depois deles!) como é que se chamavam as coisas e os lugares. Foi assim aqui e em boa parte do nosso país. Foi desse jeito que a Língua Portuguesa falada no Brasil ganhou novos sons e ficou mais diversa.

Com o passar do tempo, as pessoas aqui e acolá passaram a usar essas palavras sem saber sua origem e significado. Isso nos afasta de nós mesmos, pois reconhecer a história dos povos indígenas e sua contribuição à língua que a gente fala é, também, aprender sobre a nossa história e a nossa identidade.

Este livro, “Que Pira é Essa?”, é um chamamento. Remete ao distanciamento que nossa sociedade tem, hoje, de suas raízes e da consequente ausência de empatia para com as diferenças. Desconhecer a origem índigena de alguns costumes do nosso dia a dia, e de muitas das palavras que usamos com frequência, é uma “piração”, uma triste alienação.

Assim, chamamos as famílias para conhecer e valorizar as culturas indígenas presentes em nosso país. Conviver com elas é um privilégio que poucas sociedades têm. E é, sem dúvida, uma das chaves para podermos sonhar com um futuro mais diverso, acolhedor e humano.

José Álvaro da Silva Carneiro

Com o sol da manhã brilhando Inaiê se levanta em um só pé Na canoa vai remando E se deixa levar pela maré

Entre a cidade e a cachoeira

A menina encontra uma flor de sucupira Começa a desbravar a mata inteira E assim dá início a toda essa pira

Piramboia, Piratininga, Piracema, Piracicaba

Tem olhos de jabuticaba, a menina de Piraquara Chega na margem do rio, vê peixes pra dedéu Ela quer, na verdade, ver a sereia Iara Mas é um peixe que salta falando ao léu

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Que bela moça procura o canto Das sereias e outros seres Saiba que sob esse manto O que mais tem são saberes

Aproveito sua atenção Para te contar estórias Dos indígenas dessa nação Que nada têm de simplórias

Nessa nossa terra que há muito foi mapeada Temos muitas, muitas gentes Aconselho a ter o ouvido aberto para não perder o fio da meada Já que falamos muitas línguas diferentes

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Te pergunto se você sabe dessa pira De quem ensinou nosso jeito de chamar Muitas plantas, bichos e, também, o curupira

Te pergunto se você sabe dessa pira De quem ensinou sobre as vontades do rio e do ar E que respeito à natureza não se tira

Te pergunto se você sabe dessa pira De quem vê um homem velho a constelar Seguindo com a terra e o céu sempre em sua mira

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Payayá, Kanoé, Guató, Tukano, Gamela São alguns de nossos povos originários Pode até parecer história paralela Mas os caminhos em comum são vários

Cara preta, Fulni-ô, Macuxi, Krahô-kanela Estes e outros há muito aqui estavam Quando os portugueses chegaram na caravela Nenhum bicho, planta ou terra faltavam

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Hoje o índio pode estar na metrópole ou na floresta Com arco, flecha e celular Ao redor da fogueira fazendo seresta Ou tendo um apê como lar Pois, com bem mais de duzentas etnias, Não dá pra generalizar Há o envolvimento de muitas cercanias O gosto vai do rap à música popular

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Vou te contar que aqui, bem pertinho, logo ali Numa aldeia nova que fica ao pé da serra Moram grupos Kaingangs junto dos Guaranis E lá eles compartilham a vida, a escola e a terra

Aprendem suas línguas: Kaingang, Guarani e Português Fazem brincadeiras e, também, trabalhos sérios Pensando no futuro, aprendem inglês Desvendam o passado, a natureza e seus mistérios

Antes eles brigavam e agora estão unidos Suas crianças hoje crescem no mesmo chão Ao não se darem por vencidos, Passaram a dividir o território e a tradição

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Essa pira toda é longa Devo confessar

Que tenho muita história na manga Para a menina Inaiê contar

Do perto, do longe, do igual e do diferente É preciso sempre lembrar

Que cada povo tem sua semente E memórias para guardar

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Já agora tenho que ir Começou a piracema Mas antes de me despedir Resgato nosso tema

Te pergunto se você sabe dessa pira De quem deu seu nome, de sua cidade Do mate, da pitanga e da Barra do Ararapira

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É tudo indígena, menina! 24
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Sem dizer mais nada, o peixinho vai embora Inaiê na canoa segue sua jornada Pensa na loucura dessa conversa da hora E logo de cara, solta uma gargalhada!

Com os olhos brilhando de curiosidade Inaiê vê que tem muito o que aprender Percebe que o mundo é uma grande comunidade Onde todos querem poder simplesmente ser

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Mas afinal,

Há quem diga que os portugueses descobriram o Brasil, mas, quando eles chegaram, aqui já tinha um monte de gente: mais ou menos mil povos indígenas diferentes, e o número de línguas faladas por eles era quase igual a esse!

Pira, por exemplo, é uma palavra que alguns desses povos usavam e significa “peixe”, só que, para nós, pira é também uma gíria para falar de coisas malucas. E assim este livro ganhou um nome! É que, além de pira, há muitas outras palavras e traços dessas culturas que fazem parte da nossa vida, e a gente nem se lembra ou, muitas vezes, nem imagina de onde vêm. Que coisa doida, né?

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Hoje em dia, quem mora nas cidades grandes, asfaltadas, cheias de prédios e indústrias pode até pensar que a vida foi sempre assim. Mas tem rua que já foi rio; um dia, o asfalto tomou o lugar da mata e cobriu as capoeiras nesses lugares. Se você vive onde já foi território tupi-guarani, pode ser que o seu bairro tenha sido uma taba, que depois, quando foi abandonada, virou tapera. E bem no lugar onde é a sua casa, uma família pode ter construído como morada uma oca, muito tempo atrás. Assim como pira, capoeira, taba, tapera e oca, as culturas e povos indígenas têm muito a nos ensinar. Nas próximas páginas, vamos conhecer um pouco mais sobre a diversidade daqueles que estão aqui desde muito antes de o Brasil se chamar Brasil. Vem com a gente?

Em muitas línguas tupi-guarani, pira significa peixe. É por isso que o nome de tanto peixe por aqui começa desse jeito: piraputanga, pirarucu, piranha, piratinga, piraíba...e por aí vai!

Diferentes línguas escrevem de um jeito parecido, com pronúncias distintas! Algumas línguas tupi-guarani, por exemplo, pronunciam pirá. Entre os Kaingangs, alguns grupos usam pirã, outros falam pirõ.

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E com tantos povos e línguas indígenas diferentes, nem sempre peixe Wé pira. Olha só:

Quando a esquadra de Cabral chegou por aqui, estava procurando pelas Índias Orientais, de olho nas especiarias. Por isso, as pessoas que eles encontraram foram chamadas de índios. Essa história já é bem conhecida.

A palavra índio continuou sendo usada, passando por cima da imensa diversidade que caracteriza os povos indígenas no Brasil. Sempre de um jeito cheio de preconceitos e vazio de significados. Pouco se fala, ainda hoje, que esse índio não é um, são muitos. Esses povos resistem, e a palavra índio hoje é usada por eles como união, como marca de diferença com os não índios. É uma identidade multiétnica, pois abriga várias etnias! Índio é quem faz parte de um grupo daqueles que compõem os povos originários do Brasil, sendo também reconhecido por esse grupo como membro e vivendo – de forma transformada – o que seus antepassados viveram. Ao contrário do que muita gente pensa, não tem nada a ver com o tipo de roupa, com onde se mora, com assistir à TV ou com frequentar a universidade.

Nossas “gentes” já

– ainda são

eram muitas

Tukano, Gamela, Payayá, Kanoé e Guató. Nem tucano-ave, nem gamelatigela. Esse Tukano e essa Gamela, assim como Payayá, Kanoé e Guató são os nomes de alguns dos mais de 240 povos indígenas que vivem hoje no Brasil. Todos eles nossa gente. Quase 900 mil pessoas que falam por volta de 150 línguas diferentes.

Em 1500, quando os europeus chegaram aqui, um número muito maior de povos já vivia nessas terras. Na época, havia provavelmente mais de dois milhões de indígenas distribuídos em mais de mil povos diferentes pelo território onde hoje é o Brasil. Entre as mais de mil línguas faladas por essas pessoas, algumas se pareciam entre si, assim como o português se aproxima do espanhol. Outras eram tão diferentes como o português e o japonês.

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Por que o índio mora no Brasil e não na Índia?
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O que é Tupi-Guarani?

Já disseram que é uma língua. Muita gente pensa que é um povo. Mas o que é o tupi-guarani?

Tupi é uma grande família de línguas dos povos que moram na América do Sul. Essa família se divide em ramos – exatamente como os de uma árvore! Um deles é o maweti-guarani. Daí saem diversos sub-ramos, os galhos dessa mesma árvore; um deles é o tupi-guarani. E é aqui que está a novidade: esse sub-ramo traz muitas línguas, que, na verdade, são as folhas de tal árvore, faladas por povos que estão distribuídos por 13 estados do Brasil.

Há folhas também no Uruguai, na Argentina, no Paraguai, na Bolívia, no Peru, na Colômbia, na Venezuela e na Guiana Francesa.

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O Brasil antes de ser Brasil

O nome do nosso país revela muitos segredos em uma só palavra. Brasil é madeira com miolo cor de brasa. Esse miolo pode virar tinta e, por causa disso, os europeus fizeram o pau-brasil cruzar o oceano e ganhar o mundo. Mas eles só souberam da madeira-brasa-cor porque alguém contou. Os antigos tupis a chamavam de “árvore avermelhada”, “árvore rosada”: ybyrapytanga.

Essas seis letras de B.R.A.S.I.L falam também de sabedoria. Só quem conhece seu lugar e sabe o que a terra dá pode dizer a cor do que mora dentro da casca de uma árvore. Isso é conhecimento ancestral. Conhecimento de vários povos que viveram no território que hoje é o continente americano por milhares de anos, antes de os europeus chegarem. Muito, muito antes de serem desenhadas fronteiras dividindo cidades, estados e países.

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Do Tupi ao Português

Já se falou muito tupi pelo Brasil afora, sabia? Durante os primeiros séculos da colonização portuguesa, a região onde hoje fica o Estado de São Paulo foi um dos centros de propagação do tupi. As bandeiras, que eram as expedições que partiam de lá rumo à conquista do interior do Brasil, eram formadas principalmente pelos filhos de mulheres indígenas com europeus, conhecidos como “mamelucos”. A partir de 1600, a colonização chegou à Região Amazônica e, anos depois, uma língua descendente do antigo tupi se desenvolveu por ali. Só que, em 1757, entrou em vigor a primeira lei que determinava o português como língua oficial na colônia. Essa medida foi instituída por um ministro da Coroa Portuguesa que, mais tarde, ficou muito famoso: o Marquês de Pombal. Depois disso vieram outras medidas, como a obrigatoriedade do ensino de português nas escolas. Talvez, se não fosse o Marquês de Pombal, hoje estaríamos conversando e escrevendo em tupi!

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O Tupi que a gente fala

A distância em linha reta entre Manaus, no Estado do Amazonas, e Santarém, no Estado do Pará, é de 592 quilômetros. Até cinco mil anos atrás, era nessa região que viviam aqueles que originaram todos os grupos falantes das línguas do tronco tupi.

Provavelmente por causa do aumento da população, eles começaram a migrar. Espalharam-se e ocuparam boa parte do território que, após a chegada dos europeus, tornouse o Brasil. Esse encontro explica a porção de palavras de origem tupi na Língua Portuguesa que falamos. Como vimos, até o século XVIII, muito se falou Tupi por aqui. Existe todo um universo de palavras a serem descobertas. Mergulhando em seus significados e origens, é possível conhecer um pouco mais dessa parte de nossa história.

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caju, de akaîu capim, de kapi’i capoeira, de kó-pûera, mato que cresce catinga, de katinga, ‘mau cheiro’ cuia, de kuîaba, fruto da cuieira curumim, de kunumĩ  ‘menino’ ‘guri’ jabuticaba, de îabotikaba mandioca, de mandi’oka maraká, de ‘chocalho, maraca ou maracá’ maracujá vem de murukuîa nhe-nhe-nhen, de anhe’eng, ‘eu falo’ oca vem de oka, ‘casa’ peteca, de aîpetek, ‘espalmar, golpear’ piracema, de pira-sema, ‘saída dos peixes’ pereba vem de mbereba~pereba, ‘ferida’ taba, aldeia tapera, de ‘ex-aldeia’, ruína piranha vem de pirãîa, ‘peixe dentado’ paçoca, de apasok socar, compactar pitanga, yba-pytanga, fruta avermelhada

Olha quantas palavras de origem tupi podemos encontrar só no Estado do Paraná: Curitiba, de kuri-tyba, ‘ajuntamento de pinhão’ Há também uma versão contada por antepassados dos Kaingangs: quando passavam pela região onde hoje está a cidade, um dos membros morreu. Então o líder do grupo orientou que ele não fosse enterrado ali, mas apenas no destino final, Rio das Cobras. Ele teria dito: “levem ele ligeiro!”. (kur – ligeiro, ti – ele, vãn –carregar coisa comprida).

Paraná vem de paranã, ‘mar’ ou ‘água do mar’ Paranaguá, de paranã-ngûá, ‘enseada do mar’ Parnanguara vem de paranã-ygûara, ‘habitante do mar’ Iguaçu, de y gûasu, ‘rio/água grande’ Sapopema, sapó-pema, ‘raiz achatada’ Jaguariaíva, îaguara-‘y-aíba, ‘ruim rio das onças’ Itaperuçu, de ’y-tapera-usu, ‘tapera grande do rio’ Guaraqueçaba, de guará-ker-saba, ‘local de dormir dos guarás’

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Bicharada

Você sabia que mais ou menos 80% das palavras que dão nome às nossas fauna e flora têm origem tupi? Foram os povos nativos que apresentaram aos europeus os bichos, plantas e tudo mais. E foi assim que a capivara, a suçuarana, a jiboia e o jabuti, junto com um tantão de outros animais, árvores e flores, entraram no dicionário do português que a gente fala.

Nossa língua emprestou palavras de outras línguas indígenas também, principalmente aquelas que foram “gerais” em alguma região da América Latina. Não são tantas quanto as palavras de origem tupi, mas usamos bastante! “Cacau”, por exemplo, tem origem maia. “Cacique” vem do taino, uma língua aruaque, assim como “canoa”, “tabaco” e “goiaba”. A palavra “puma” vem do quéchua, e para eles quer dizer “onça”. Já “chocolate”, “abacate” e “coiote” são palavras de origem náuatle, a língua falada pelos astecas.

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Ser diferente é legal!

Usamos o nosso idioma para nos comunicarmos e nos fazermos entender. Por meio da língua, traduzimos nossa cultura, nossa história e nossas tradições – conhecimentos transmitidos por quem veio antes de nós. Aprendendo nossa língua, aprendemos também, desde pequeninos, o jeito de ser da nossa sociedade. É por isso que, quando uma língua deixa de existir, a humanidade perde um pedacinho seu.

No Brasil, por exemplo, há muitos jeitos diferentes de ser e de viver, já reparou? Essas diferenças aparecem também na forma de falar de cada lugar. A gente contou aqui um pouquinho de como o português falado por nós incorporou muitas palavras de origem indígena, principalmente do tupi antigo, por causa da presença dos tupis no litoral, onde primeiro se estabeleceram os colonizadores. Isso faz parte da nossa história. Ao reconhecer e valorizar a pluralidade de povos e culturas presentes em nosso país, fortalecemos nossa própria identidade.

Salve a diferença!

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Barra do Ararapira: localizada em Guaraqueçaba, município do litoral norte do Paraná, divisa com o Estado de São Paulo.

Cara Preta: há dois povos presentes no Brasil identificados com a denominação Cara Preta - os Avá-Canoeiros e os Mundurukus.

Catira: dança folclórica brasileira que tem o ritmo marcado pelas batidas de pés e mãos dos dançarinos. Dizem que sua origem é uma mistura das influências indígena, africana e europeia.

Curupira: personagem da cultura popular brasileira, de origem indígena. Quase todo mundo já ouviu dizer que ele tem os pés virados para trás e, confundindo os caçadores e outros inimigos, protege as matas e florestas.

Fulni-ô: povo presente no Brasil. Único povo do Nordeste brasileiro que mantém viva sua língua, yaathe.

Gamela: povo presente no Brasil.

Guarani: nome genérico para alguns povos que vivem ao sul da América do Sul. No Brasil, são chamados assim os Kaiowás, Mbyas e Nhandevas. 2. Nome genérico das línguas que esses povos falam.

Guató: povo presente no Brasil. 2. Língua falada pelos Guatós. Atualmente, apenas dois falantes dessa língua são conhecidos.

Homem Velho: nome de uma constelação do sistema astronômico indígena brasileiro (Tuja, em guarani); no lado leste, indica o início do verão e o início da estação chuvosa para o norte. É formada pelas constelações ocidentais Taurus e Orion.

Iara: famosa sereia dos rios e cachoeiras que encanta e amedronta com seu irresistível canto. Isso porquê, segundo a lenda de origem indígena, quem a segue até o fundo dos rios nunca mais volta.

Inaiê: nome próprio. Em tupi, Inaîé é o nome do gavião-carijó, também chamado de gavião-indaié ou inajé.

Itapira: município localizado no Estado de São Paulo. De acordo com o Dicionário Ilustrado tupi-guarani, o nome significa “ponta de pedra” ou “pedra pontiaguda”. Segundo Eduardo de Almeira Navarro, filólogo e lexicógrafo brasileiro, é de “pedra levantada”, itá-bura.

Glossário
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Jabuticaba: fruto da jabuticabeira. Do tupi îabotikaba.

Kaingang: povo presente Brasil. 2. Língua falada pelos Kaingangs.

Kanoé: povo presente no Brasil.

Krahô-Kanela: povo presente no Brasil.

Makuxi: povo presente no Brasil.

Payayá: povo presente no Brasil.

Piracema: movimento de migração dos peixes para a reprodução, que “sobem” o rio em direção contrária à correnteza. Do tupi pirasema: pirá – peixe + sema – sair.

Piracicaba: município localizado no Estado de São Paulo. Do tupiguarani “lugar onde peixe chega” ou “chegada dos peixes”, composto por pirá – peixe + syk – chegar + aba – lugar.

Piramboia: peixe da Bacia do Rio Amazonas. Do tupi pirá-mboîa: “peixe-cobra”.

Piraquara: município localizado no Estado do Paraná. De acordo com várias fontes, significa “toca dos peixes”. Do tupi pirá – peixe + kûara – buraco, esconderijo. Esta cidade passou a ser notícia por abrigar o complexo penitenciário para onde os condenados pela operação da Polícia Federal “Lava Jato” foram enviados.

Piratininga: nome indígena do lugar onde hoje se localiza a cidade de São Paulo, que se chamou, no começo do Brasil Colônia, São Paulo dos Campos de Piratininga. Significa “peixe seco”, do tupi pirá – peixe + tininha – seco.

Pitanga: fruto da pitangueira. Seu nome vem do tupi antigo ybapytanga, que significa fruta avermelhada.

Sucupira: nome de algumas espécies de árvores que têm madeira de lei. Do tupi sebypyra.

Tukano: os Ye’pã-masa vivem no Brasil e formam um povo que ficou mais conhecido como Tukano. 2. Língua falada por diversos povos no Estado do Amazonas. 3. Denominação de uma família linguística.

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Quem fez este livro

José Álvaro da Silva Carneiro é pai, avô, ativista e gestor. Autodidata, desde cedo voltou-se para as questões ambientais, sociais e ligadas ao terceiro setor. Por causa disso, teve participação importante na fundação de diversas entidades, como a SOS Mata Atlântica, por exemplo. Também atuou como representante dessas questões em entidades governamentais, chegando a ser Superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA/PR. Como gestor, fez carreira profissional tendo como ápice uma diretoria no Grupo Ultra, em São Paulo.

Em 1999, passou a integrar o conselho do maior complexo hospitalar pediátrico do Brasil, o Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, e, desde então, relacionase de perto com as crianças e adolescentes que passam pela instituição, fazendo parte de suas vidas e sonhos. Hoje, é Diretor Corporativo do Complexo Pequeno Príncipe, o que impulsionou ainda mais o seu contato com a realidade hospitalar, sem deixar de lado o entendimento de que os aspectos lúdicos são essenciais para a construção de um mundo melhor.

José Álvaro fez mais do que acumular conhecimento sobre temas tão diversos e colecionar amigos de variadas origens e etnias. Ele também traduziu tudo isso em um novo ofício: escrever livros que tratam de questões urgentes, mas pouco observadas em nossa sociedade.

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Carla Irusta nasceu em Curitiba, mas tem um pé na Espanha, mais especificamente em Barcelona, e outro na Argentina, sentindo-se em casa em cada um desses lugares. Carla gosta de – e sabe muito bem como – fazer livros! Faz livros para crianças de zero a 100 anos com uma graça que transforma qualquer assunto complicado em delicadeza. Seu jeito de contar histórias é via desenhos. Estudou sobre livros, sobre desenhos, sobre arte – mas foi trabalhando com gentes que realmente aprendeu e continua aprendendo. Diz ela: “sempre conto com a ajuda de generosas pessoas que me dão boas ideias para cada projeto!”.

Isadora Hofstaetter é curitibana “nascida e criada”, mas já passeou um bocadinho pelo mundo, sempre com olhos atentos às formas de ser e de viver de cada cultura. Colecionadora de livros infantis – tem um tantão! –, adora usar essa lente para observar as coisas do mundo e, na hora de traduzir o que vê, prefere usar as palavras escritas. Não à toa, hoje trabalha com projetos culturais que beneficiam crianças hospitalizadas – com um carinho especial, é claro, pelas publicações.

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Luciana Patricia de Morais é mineira de Belo Horizonte, mas vive em Curitiba há bastante tempo. Desde pequenininha, gostava de contar e ouvir histórias, principalmente aquelas contadas à beira de um fogão, com as pessoas reunidas na cozinha. Deve ser por isso que decidiu virar pesquisadora e contar histórias e memórias de outras pessoas. E – que coincidência! – muitas dessas histórias passam pela comida e por outros elementos que ajudam a entender a cultura, identidade, memória e tradições das diversas “gentes” que vivem nesse mundão.

Gustavo Godoy é paulistano por acaso, mas é curitibano por criação. Quando cursava Ciências Sociais, interessou-se pelos indígenas ao observar os Kaingangs que vendiam artesanato nas ruas de Curitiba. Mas foi com os Mbyas que aprendeu o que é estudar a questão indígena. Com o guarani falado por esse povo, começou a aprender o que pode ser uma língua e encontrou reforço no estudo do antigo tupi. Com os Ka’apores aprendeu como é viver com os índios.

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Florencio Rekayg Fernandes é indígena e pertence à etnia Kaingang, da marca tribal Kame (rá téj). Nasceu em 1976, na Terra Indígena de Rio das Cobras, no Paraná. É filho de Silvio Kaginh Fernandes e de Judite Fygso Fernandes. Casou-se com Fabieli Wollinger de Almeida Fernandes, indígena pertencente à etnia Xokleng, com quem tem três filhos. Florêncio, ao ser convocado pelas lideranças indígenas da terra onde nasceu, viu a oportunidade de cursar o Magistério e, desde então, não parou mais de estudar e de atuar como educador. Cursou Pedagogia, depois fez mestrado em Educação e foi professor no curso de formação de docentes indígenas. Hoje em dia, é doutorando em Antropologia na Universidade Federal do Paraná. Quando encontra tempo, dedica-se a projetos como esse, que buscam disseminar as culturas indígenas.

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Agradecemos <3

Para escrever este livro, contamos com muita gente. Gente que embarcou conosco nessa vivência repleta de encantamento e gente que serviu de guia nesse universo ainda marcado pelo desconhecimento e preconceito.

Agradecemos à Ana Paula Luz, Cintia Ribas, Cristiane Zoccoli, Claudio Teixeira e equipe do EDUC, Edívio Battistelli, Maria Helena Amorim, Sandra Ayres e toda a equipe da Coordenação Técnica Local da FUNAI em Curitiba, Elza Forte da Silva Carneiro, Ety Cristina Forte Carneiro, Genilda Maria Rodrigues, Geslline Braga, Grupo Cultural Towê Fulni-ô, Lia Marchi, Lucas Amorim, Luciana de Oliveira, Marcus Paiva, Mariana Carneiro, Sandra Corbari, Silvia Yokoyama, Otavio Bob Zucon, Renato Carneiro e equipe Museu Paranaense, Rose Tomasi, Towê Veríssimo e Ubirajara Zoccoli.

Aos patrocinadores da primeira e segunda edição e, principalmente, a toda a equipe de colaboradores, familiares e, claro, às crianças e adolescentes do Hospital Pequeno Príncipe.

Compartilhar esta obra com leitores e leitoras é realizar o sonho de contribuir para a urgência de conhecimento e envolvimento efetivo de nossa sociedade com as questões que afetam os povos indígenas no Brasil.

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O que lemos

AFONSO, Germano. Mitos e estações no céu Tupi-Guarani. In: Scientific American Brasil. Especial Etnoastronomia, n. 45, São Paulo, Editora Segmento, 2006. Disponível em: <http://www.mat.uc.pt/mpt2013/files/tupi_guarani_GA.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

BACELAR, Laércio Nora. Gramática da língua kanoê: descrição gramatical de uma língua isolada e ameaçada de extinção, falada ao sul do Estado de Rondônia, Brasil. 2004. Tese. (Doutorado em Linguística) - Universidade Católica de Nijmegen, Holanda. 2004. Disponível em: <http://bandavisual.org/docs/kanoe/ Laercio%20Nora.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

BARBOSA, Pe. A. Lemos. Pequeno vocabulário tupi-português. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1951.

BOUDIN, Max Henri. Dicionário de tupi moderno (dialeto tembé-ténêtéhar do Alto do Rio Gurupi) – Vol. I. São Paulo: Conselho Estadual de Artes e Ciências Humanas, 1978.

CASTRO, Eduardo Viveiros de. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2002. Disponível em: <https://anedotadasantilhas.files.wordpress.com/2015/11/viveirosde-castro-imanc3aancia-doinimigo.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

COELHO, Maria do Carmo Pereira. As narrações da cultura indígena da Amazônia: lendas e histórias. 2003. Tese. (Doutorado em Linguística Aplicada) - Universidade Católica de São Paulo. 2003.

CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário histórico das palavras portuguesas de origem tupi. Companhia Melhoramentos; Brasília: Universidade de Brasília, 1998.

GODOY, Gustavo. Dos modos de beber e cozinhar cauim: ritos e narrativas dos ka’apores. 2015. 165 p. Dissertação. (Mestrado em Antropologia Social)Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015.

GRUPIONI, Luís Donisete Benzi (Org.). Índios no Brasil. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto, 1994.

SILVA, Aracy Lopes (Orgs.). A temática indígena na escola – novos subsídios para professores de 1º e 2º graus. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto, MARI – Grupo de Educação Indígena/USP-UNESCO, 1995.

Povos indígenas no Brasil. São Paulo: Instituto Socioambiental, v. 1, 2015.

Povos indígenas no Brasil: 2011-2016. São Paulo: Editores Gerais Beto Ricardo e Fany Ricardo, v. 1, 2017.

LOPES, Reinaldo José. 1499: o Brasil antes de Cabral. Rio de Janeiro: HarperCollins, Brasil, 2017.

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MELATTI, Júlio Cezar. Índios do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2007.

NAVARRO, Eduardo de Almeida. Dicionário de tupi antigo: a língua indígena clássica do Brasil. São Paulo: Global, 2013.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Departamento da Diversidade. Kanhgág jykre. Curitiba: SEED – PR, 2011.

PIVETTA, Marcos. Ocupações do “Brasil” primordial. In: Revista Pesquisa FAPESP, ed. 264, vev.2018. Disponível em: <http://revistapesquisa.fapesp.br/2018/02/15/ ocupacao-do-brasilprimordial/?cat=humanidades>. Acesso em 06 de abril. 2018.

SANTOS, Solon Natalício dos. Conquista e resistência dos Payayá no Sertão das Jacobinas: Tapuias, Tupi, colonos e missionários (1651-1706). 2011. 217 p. Dissertação. (Mestrado em História Social) – Universidade Federal da Bahia, 2011. Disponível em: <https://ppgh.ufba.br/sites/ppgh.ufba.br/files/2011._santos_ solon_natalicio_araujo_dos._conquista_e_resistencia_dos_payaya_no_sertao_das_ jacobinas_tapuias_tupi_colonos_e_missionarios1651-1706.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

SOUZA, Sheila (org.) Eg jykre sinvi: nossas belas histórias. 1. Ed. Curitiba: Gráfica e Editora Caiuás, 2014.

FRANZIN, Adriana. Palavras indígenas nomeiam a maior parte das plantas e animais do Brasil. In: Portal EBC. Conteúdo criado em 29/10/2015. Disponível em: <https://memoria.ebc.com.br/infantil/voce-sabia/2015/10/palavras-indigenasnomeiam-maior-parte-das-plantas-e-animais-do-brasil>. Acesso em 10 de agosto 2022.

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56 6.2. MARCAS DA LEI DE INCENTIVO À
INSTITUIÇÃO BENEFICIADA PATROCÍNIO REALIZAÇÃO SECRETARIA ESPECIAL DA CULTURA MINISTÉRIO DO TURISMO

Coordenação geral

José Álvaro da Silva Carneiro

Coordenação editorial

Carla Irusta

Texto

José Álvaro da Silva Carneiro

Isadora Hofstaetter

Luciana Patrícia de Morais

Projeto gráfico e ilustrações

Carla Irusta

Pesquisa

Luciana Patrícia de Morais

Gustavo Godoy

Florêncio Rekayg Fernandes

Produção

Elisa Cordeiro

Francielli da Rosa

Isadora Hofstaetter

Luciana Patrícia de Morais

Shana Lima Tania Campos

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Este livro foi impresso na primavera de 2022 em Curitiba. Composto na tipografia Graviola, o papel do miolo é o Alta Alvura 120 g. Tiragem de 2.000 exemplares.

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