Que Pira é Essa? 1ª edição

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MINISTÉRIO DA CULTURA APRESENTA

José Álvaro da Silva Carneiro Ilustrações Carla Irusta 1


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MINISTÉRIO DA CULTURA APRESENTA

José Álvaro da Silva Carneiro Depósito legal junto à Biblioteca Nacional, conforme Lei n° 10.994 de 14 de dezembro de 2004.

Ilustrações: Carla Irusta

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Bibliotecária responsável: Luzia Glinski Kintopp – CRB/9 - 1535 Curitiba - PR

Carneiro, José Álvaro da Silva C289 Que Pira É Essa? / José Álvaro da Silva Carneiro; ilustração e organização Carla Irusta; coordenação de Luciana Patrícia de Morais e Isadora Hofstaetter . — Curitiba : Edição do Autor, 2018. 60 p. : il. ; 28 cm.

ISBN 978-85-916972-3-6

1. Literatura infantojuvenil. 2. Índios da América do Sul Paraná - Cultura. I. Irusta, Carla. II. Morais, Luciana Patrícia de. III. Hofstaetter, Isadora. IV. Título. CDD: B869.8

1ª Edição

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IMPRESSO NO BRASIL

Curitiba, 2018 5


Apresentação

Nasci em Curitiba, no Paraná, e cresci rodeado por uma paisagem que ganhou nomes como Piraquara, Piraí, Açungui, Anhangava, Guaraqueçaba, Tibagi, Itupava, Peabiru, Iguaçu. Para onde quer que eu olhe, vejo a presença indígena nesses lugares, que apontam para uma história nem sempre contada...

Com o passar do tempo, as pessoas aqui e acolá passaram a usar essas palavras sem saber sua origem e significado. Isso nos afasta de nós mesmos, pois reconhecer a história dos povos indígenas e sua contribuição à língua que a gente fala é, também, aprender sobre a nossa história e a nossa identidade.

O nome de um lugar tem forte ligação com sua história. Rios, caminhos e montanhas ao meu redor contam sobre o passado do Estado do Paraná. Piraquara, por exemplo, significa “toca do peixe”, provavelmente porque nesse lugar tinham muitos peixes. Já Iguaçu é “água grande”, e quem já viu as cataratas desse rio entende o porquê.

Este livro, “Que Pira é Essa?”, é um chamamento. Remete ao distanciamento que nossa sociedade tem, hoje, de suas raízes e da consequente ausência de empatia para com as diferenças. Desconhecer a origem índigena de alguns costumes do nosso dia a dia, e de muitas das palavras que usamos com frequência é uma “piração” uma triste alienação.

Todas estas palavras indicam a presença de povos indígenas em minha região. Povos que viveram nessas terras ou passaram por aqui, há milhares de anos. E foi essa gente que ensinou aos colonizadores (que chegaram bem depois deles!) como é que se chamavam as coisas e os lugares. Foi assim aqui e em boa parte do nosso país. Foi desse jeito que a Língua Portuguesa falada no Brasil ganhou novos sons e ficou mais diversa.

Assim, chamamos as famílias para conhecer e valorizar as culturas indígenas presentes em nosso país. Conviver com elas é um privilégio que poucas sociedades têm. E é, sem dúvida, uma das chaves para podermos sonhar com um futuro mais diverso, acolhedor e humano.

JOSÉ ÁLVARO DA SILVA CARNEIRO

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Com o sol da manhã brilhando Inaiê se levanta em um só pé Na canoa vai remando E se deixa levar pela maré Entre a cidade e a cachoeira A menina encontra uma flor de sucupira Começa a desbravar a mata inteira E assim dá início a toda essa pira Piramboia, Piratininga, Piracema, Piracicaba Tem olhos de jabuticaba, a menina de Piraquara Chega na margem do rio, vê peixes pra dedéu Ela quer, na verdade, ver a sereia Iara Mas é um peixe que salta falando ao léu

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Que bela moça procura o canto Das sereias e outros seres Saiba que sob esse manto O que mais tem são saberes Aproveito sua atenção Para te contar estórias Dos indígenas dessa nação Que nada têm de simplórias Nessa nossa terra que há muito foi mapeada Temos muitas, muitas gentes Aconselho a ter o ouvido aberto para não perder o fio da meada Já que falamos muitas línguas diferentes

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Te pergunto se você sabe dessa pira De quem ensinou nosso jeito de chamar Muitas plantas, bichos e, também, o curupira Te pergunto se você sabe dessa pira De quem ensinou sobre as vontades do rio e do ar E que respeito à natureza não se tira Te pergunto se você sabe dessa pira De quem vê um homem velho a constelar Seguindo com a terra e o céu sempre em sua mira

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Payayá, Kanoé, Guató, Tukano, Gamela São alguns de nossos povos originários Pode até parecer história paralela Mas os caminhos em comum são vários Cara preta, Fulni-ô, Macuxi, Krahô-kanela Estes e outros há muito aqui estavam Quando os portugueses chegaram a caravela Nenhum bicho, planta ou terra faltavam

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Hoje o índio pode estar na metrópole ou na floresta Com arco, flecha e celular Ao redor da fogueira fazendo seresta Ou tendo um apê como lar Pois com bem mais de duzentas etnias Não dá pra generalizar Há o envolvimento de muitas cercanias O gosto vai do rap à música popular 16

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Vou te contar que aqui, bem pertinho, logo ali Numa aldeia nova que fica ao pé da serra Moram grupos Kaingangues junto dos Guaranis E lá eles compartilham a vida, a escola e a terra Aprendem suas línguas: Kaingang, Guarani e Português Fazem brincadeiras e, também, trabalhos sérios Pensando no futuro aprendem inglês Desvendam o passado, a natureza e seus mistérios Antes eles brigavam e agora estão unidos Suas crianças hoje crescem no mesmo chão Ao não se darem por vencidos Passaram a dividir o território e a tradição

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Essa pira toda é longa Devo confessar Que tenho muita história na manga Para a menina Inaiê contar Do perto, do longe, do igual e do diferente É preciso sempre lembrar Que cada povo tem sua semente E memórias para guardar

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Jå agora tenho que ir Começou a piracema Mas antes de me despedir Resgato nosso tema: Te pergunto se você sabe dessa pira De quem deu seu nome, de sua cidade Do mate, da pitanga e da Barra do Ararapira

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É TUDO INDÍGENA, MENINA!

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Sem dizer mais nada, o peixinho vai embora Inaiê na canoa segue sua jornada Pensa na loucura dessa conversa da hora E logo de cara, solta uma gargalhada! Com os olhos brilhando de curiosidade Inaiê vê que tem muito o que aprender Percebe que o mundo é uma grande comunidade Onde todos querem poder simplesmente ser

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Há quem diga que os portugueses descobriram o Brasil, mas, quando eles chegaram, aqui já tinha um monte de gente: mais ou menos mil povos indígenas diferentes, e o número de línguas faladas por eles era quase igual a esse! Pira, por exemplo, é uma palavra que alguns desses povos usavam e significa “peixe”, só que, pra nós, pira é também uma gíria para falar de coisas malucas. E assim este livro ganhou um nome! É que, além de pira, há muitas outras palavras e traços dessas culturas que fazem parte da nossa vida, e a gente nem se lembra ou, muitas vezes, nem imagina de onde vêm. Que coisa doida, né?

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Hoje em dia quem mora nas cidades grandes, asfaltadas, cheias de prédios e indústrias pode até pensar que a vida foi sempre assim. Mas tem rua que já foi rio; um dia o asfalto tomou o lugar da mata e cobriu as capoeiras nesses lugares. Se você vive onde já foi território tupi-guarani, pode ser que o seu bairro tenha sido uma taba, que depois, quando foi abandonada, virou tapera. E bem no lugar onde é a sua casa uma família pode ter construído como morada uma oca, muito tempo atrás. Assim como pira, capoeira, taba, tapera e oca, as culturas e povos indígenas têm muito a nos ensinar. Nas próximas páginas, vamos conhecer um pouco mais sobre a diversidade daqueles que estão aqui desde muito antes do Brasil se chamar Brasil. Vem com a gente?!

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E com tantos povos e línguas indígenas diferentes, nem sempre peixe é pira. Olha só: Em muitas línguas tupi-guarani, pira significa peixe. É por isso que o nome de tanto peixe por aqui começa desse jeito: piraputanga, pirarucu, piranha, piratinga, piraíba...e por aí vai! Diferentes línguas escrevem de um jeito parecido, com pronúncias distintas! Algumas línguas tupi-guarani, por exemplo, pronunciam pirá. Entre os Kaingangs, alguns grupos usam pirã, outros falam pirõ.

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Nossas “gentes” já eram muitas – ainda são Por que o índio mora no Brasil e não na Índia? Quando a esquadra de Cabral chegou por aqui, estava procurando pelas Índias Orientais, de olho nas especiarias. Por isso, as pessoas que eles encontraram foram chamadas de índios. Essa história já é bem conhecida. A palavra índio continuou sendo usada, passando por cima da imensa diversidade que caracteriza os povos indígenas no Brasil. Sempre de um jeito cheio de preconceitos e vazio de significados. Pouco se fala, ainda hoje, que esse índio não é um, são muitos. Esses povos resistem, e a palavra índio hoje é usada por eles como união, como marca de diferença com os não índios. É uma identidade multiétnica, pois abriga várias etnias! Índio é quem faz parte de um

Tukano, Gamela, Payayá, Kanoé e Guató. Nem tucano-ave, nem gamela-tigela. Esse Tukano e essa Gamela, assim como Payayá, Kanoé e Guató são os nomes de alguns dos mais de 240 povos indígenas que vivem hoje no Brasil. Todos eles nossa gente. Quase 900 mil pessoas que falam por volta de 150 línguas diferentes. Em 1500, quando os europeus chegaram aqui, um número muito maior de povos já vivia nessas terras. Na época, havia provavelmente mais de dois milhões de indígenas distribuídos em mais de mil povos diferentes pelo território que hoje é o Brasil. Entre as mais de mil línguas faladas por essas pessoas, algumas se pareciam entre si como o português se aproxima do espanhol. Outras eram tão diferentes como o português e o japonês.

grupo entre os que compõem os povos originários do Brasil, sendo também reconhecido por esse grupo como membro e vivendo – de forma transformada – o que seus antepassados viveram. Ao contrário do que muita gente pensa, não tem nada a ver com o tipo de roupa, com onde se mora, com assistir à TV ou com frequentar a universidade.

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O Brasil antes de ser Brasil O nome do nosso país revela muitos segredos em uma só palavra. Brasil é madeira com miolo cor de brasa. Esse miolo pode virar tinta e, por

O que é Tupi-Guarani?

causa disso, os europeus fizeram o pau-brasil cruzar o oceano e ganhar o mundo. Mas eles só souberam da madeira-brasa-cor porque alguém

Já disseram que é uma língua. Muita gente pensa que é um povo.

contou. Os antigos tupis a chamavam de “árvore

Mas o que é o tupi-guarani?

avermelhada”, “árvore rosada”: ybyrapytanga.

Tupi é uma grande família de línguas dos povos que moram na América do Sul. Essa família se divide em ramos – exatamente como os de uma árvore! Um deles é o maweti-guarani. Daí saem diversos sub-ramos, os galhos dessa mesma árvore; um deles é o tupi-guarani. E é aqui que está a novidade: esse sub-ramo traz muitas línguas, que, na verdade, são as folhas de tal árvore, faladas por povos que estão distribuídos por 13 estados do Brasil. Há folhas também no Uruguai, na Argentina, no Paraguai, na Bolívia, no Peru, na Colômbia, na Venezuela e na Guiana Francesa. 36

Essas seis letras de B.R.A.S.I.L falam também de sabedoria. Só quem conhece seu lugar e sabe o que a terra dá pode dizer a cor do que mora dentro da casca de uma árvore. Isso é conhecimento ancestral. Conhecimento de vários povos que viveram no território que hoje é o continente americano por milhares de anos antes dos europeus chegarem. Muito, muito antes de serem desenhadas fronteiras dividindo cidades, estados e países.

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Do Tupi ao Português Já se falou muito tupi pelo Brasil afora, sabia? Durante os primeiros séculos da colonização portuguesa, a região onde hoje fica o Estado de São Paulo foi um dos centros de propagação do tupi. As bandeiras, que eram as expedições que partiam de lá rumo à conquista do interior do Brasil, eram formadas principalmente pelos filhos de mulheres indígenas com europeus, conhecidos como “mamelucos”. A partir de 1600, a colonização chegou à Região Amazônica e, anos depois, uma língua descendente do antigo tupi se desenvolveu por ali. Só que, em 1757, entrou em vigor a primeira lei que determinava o português como língua oficial na colônia. Essa medida foi instituída por um ministro da Coroa Portuguesa que, mais tarde, ficou muito famoso: O Marquês de Pombal. Depois disso vieram outras medidas, como a obrigatoriedade do ensino de português nas escolas. Talvez, se não fosse o Marquês de Pombal, hoje estaríamos conversando e escrevendo em tupi!

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caju, de akaîu capim, de kapi’i capoeira, de kó-pûera, mato que cresce catinga, de katinga, ‘mau-cheiro’ cuia, de kuîaba, fruto da cuieira curumim, de kunumĩ ‘menino’ ‘guri’ jabuticaba, de îabotikaba mandioca, de mandi’oka maraká, de ‘chocalho, maraca ou maracá’ maracujá vem de murukuîa nhenhenhen, de anhe’eng, ‘eu falo’ oca vem de oka, ‘casa’ peteca, de aîpetek, ‘espalmar, golpear’ piracema, de pira-sema, ‘saída dos peixes’ pereba vem de mbereba~pereba, ‘ferida’ taba, aldeia tapera, de ‘ex-aldeia’, ruína piranha vem de pirãîa, ‘peixe dentado’ paçoca, de apasok socar, compactar pitanga, yba-pytanga, fruta avermelhada

Olha quantas palavras de origem tupi podemos encontrar só no Estado do Paraná:

O Tupi que a gente fala A distância em linha reta entre Manaus, no Estado do Amazonas, e Santarém, no Estado do Pará, é de 592 quilômetros. Até cinco mil anos atrás, era nessa região que viviam aqueles que originaram todos os grupos falantes das línguas do tronco tupi. Provavelmente por causa do aumento da população, eles começaram a migrar. Se espalharam e ocuparam boa parte do território que, após a chegada dos europeus, se tornou o Brasil. Esse encontro explica a porção de palavras de origem tupi na Língua Portuguesa que falamos. Como vimos, até o século XVIII, muito se falou Tupi por aqui. Existe todo um universo de palavras a serem descobertas. Mergulhando em seus significados e origens, é possível conhecer um pouco mais dessa parte de nossa história.

Paraná vem de paranã, ‘mar’ ou ‘água do mar’ Paranaguá, de paranã-ngûá, ‘enseada do mar’ Parnanguara vem de paranã-ygûara, ‘habitante do mar’ Iguaçu, de y gûasu, ‘rio/água grande’ Sapopema, sapó-pema ‘raiz achatada’ Jaguariaíva, îaguara-‘y-aíba ‘ruim rio das onças’ Itaperuçu, de ’y-tapera-usu ‘tapera grande do rio’ Guaraqueçaba, de guará-ker-saba ‘local de dormir dos guarás’ Curitiba, de kuri-tyba ‘ajuntamento de pinhão’

Há também uma versão contada por antepassados dos Kaingangues: quando passavam pela região onde hoje está a cidade, um dos membros morreu. Então o líder do grupo orientou que ele não fosse enterrado ali, mas apenas no destino final, Rio das Cobras. Ele teria dito: “levem ele ligeiro!”. (kur – ligeiro, ti – ele, vãn – carregar coisa comprida).

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Bicharada Você sabia que mais ou menos 80% das palavras que dão nome às nossas fauna e flora têm origem tupi? Foram os povos nativos que apresentaram aos europeus os bichos, plantas e tudo mais. E foi assim que a capivara, a suçuarana, a jiboia e o jabuti, junto com um tantão de outros animais, árvores e flores, entraram no dicionário do português que a gente fala.

Nossa língua emprestou palavras de outras línguas indígenas também, principalmente aquelas que foram “gerais” em alguma região da América Latina. Não são tantas quanto as palavras de origem tupi, mas usamos bastante! Cacau, por exemplo, tem origem maia. Cacique vem do taino, uma língua aruaque, assim como canoa, tabaco e goiaba. A palavra “puma” vem do quéchua, e pra eles quer dizer “onça”. Já chocolate, abacate e coiote são palavras de origem náuatle, a língua falada pelos astecas.

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Ser diferente é legal! Usamos o nosso idioma pra nos comunicar e nos fazer entender. Por meio da língua, traduzimos nossa cultura, nossa história e nossas tradições – conhecimentos transmitidos por quem veio antes de nós. Aprendendo nossa língua, aprendemos também, desde pequeninos, o jeito de ser da nossa sociedade. É por isso que quando uma língua deixa de existir, a humanidade perde um pedacinho seu. No Brasil, por exemplo, há muitos jeitos diferentes de ser e de viver, já reparou? Essas diferenças aparecem também na forma de falar de cada lugar. A gente contou aqui um pouquinho de como o português falado por nós incorporou muitas palavras de origem indígena, principalmente do tupi antigo, por causa da presença dos tupis no litoral, onde primeiro se estabeleceram os colonizadores. Isso faz parte da nossa história. Ao reconhecer e valorizar a pluralidade de povos e culturas presentes em nosso país, estaremos fortalecendo nossa própria identidade.

Salve a diferença!

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Glossário

Iara: famosa sereia dos rios e cachoeiras que encanta e amedronta com seu irresistível canto. Isso porquê, segundo a lenda de origem indígena, quem a

Barra do Ararapira: localizada em Guaraqueçaba, município do litoral norte

segue até o fundo dos rios nunca mais volta.

do Paraná, divisa com o Estado de São Paulo. Inaiê: nome próprio. Em tupi, Inaîé é o nome do gavião-carijó, também Cara Preta: há dois povos presentes no Brasil identificados com a

chamado de gavião-indaié ou inajé.

denominação Cara Preta - os Avá-Canoeiros e os Mundurukus. Itapira: município localizado no Estado de São Paulo. De acordo com o Catira: dança folclórica brasileira que tem o ritmo marcado pelas batidas

Dicionário Ilustrado tupi-guarani, o nome significa “ponta de pedra” ou

de pés e mãos dos dançarinos. Dizem que sua origem é uma mistura das

“pedra pontiaguda”. Segundo Navarro, é de “pedra levantada”, itá-bura.

influências indígena, africana e europeia. Jabuticaba: fruto da jabuticabeira. Do tupi îabotikaba. Curupira: personagem da cultura popular brasileira, de origem indígena. Quase todo mundo já ouviu dizer que ele tem os pés virados para trás e,

Kaingang: povo presente Brasil. 2. Língua falada pelos Kaingangues.

confundindo os caçadores e outros inimigos, protege as matas e florestas. Kanoé: povo presente no Brasil. Fulni-ô: povo presente no Brasil. Único povo do Nordeste brasileiro que mantém viva sua língua, yaathe.

Krahô-Kanela: povo presente no Brasil.

Gamela: povo presente no Brasil.

Makuxi: povo presente no Brasil.

Guarani: nome genérico para alguns povos que vivem ao sul da América

Payayá: povo presente no Brasil.

do Sul. No Brasil, são chamados assim os Kaiowás, Mbyas e Nhandevas. 2. Nome genérico das línguas que esses povos falam.

Piracema: movimento de migração dos peixes para a reprodução, que “sobem” o rio em direção contrária à correnteza. Do tupi pirasema: pirá –

Guató: povo presente no Brasil. 2. Língua falada pelos Guatós. Atualmente,

peixe + sema – sair.

apenas dois falantes dessa língua são conhecidos. Piracicaba: município localizado no Estado de São Paulo. Do tupi-guarani Homem Velho: nome de uma constelação do sistema astronômico indígena

“lugar onde peixe chega” ou “chegada dos peixes”, composto por pirá –

brasileiro (Tuja, em guarani); no lado leste, indica o início do verão e o início

peixe + syk – chegar + aba – lugar.

da estação chuvosa para o norte. É formada pelas constelações ocidentais Taurus e Orion.

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Piramboia: peixe da Bacia do Rio Amazonas. Do tupi pirá-mboîa: “peixe-cobra”. Piraquara: município localizado no Estado do Paraná. De acordo com várias fontes, significa “toca dos peixes”. Do tupi pirá – peixe + kûara – buraco, esconderijo. Esta cidade passou a ser notícia por abrigar o complexo penitenciário para onde os condenados pela operação da Polícia Federal “Lava Jato” foram enviados. Piratininga: nome indígena do lugar onde hoje se localiza a cidade de São Paulo, que se chamou, no começo do Brasil Colônia, São Paulo dos Campos de Piratininga. Significa “peixe seco”, do tupi pirá – peixe + tininha – seco. Pitanga: fruto da pitangueira. Seu nome vem do tupi antigo yba-pytanga, que significa fruta avermelhada. Sucupira: nome de algumas espécies de árvores que têm madeira de lei. Do tupi sebypyra. Tukano: os Ye’pã-masa vivem no Brasil e formam um povo que ficou mais conhecido como Tukano. 2. Língua falada por diversos povos no Estado do Amazonas. 3. Denominação de uma família linguística.

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Quem fez este livro

José Álvaro da Silva Carneiro

Carla Irusta nasceu em Curitiba, mas tem

é pai, avô, ativista e gestor. Autodidata,

um pé na Espanha, mais especificamente

desde cedo voltou-se para as questões

em Barcelona, e outro na Argentina,

ambientais, sociais e ligadas ao terceiro

sentindo-se em casa em cada um desses

setor. Por causa disso, teve participação

lugares. Carla gosta de – e sabe muito

importante na fundação de diversas

bem como – fazer livros! Faz livros para

entidades, como a SOS Mata Atlântica, por

crianças de zero a 100 anos com uma

exemplo. Também atuou como representante

graça que transforma qualquer assunto

dessas questões em entidades governamentais,

complicado em delicadeza. Seu jeito de

chegando a ser Superintendente do Instituto Brasileiro do

contar histórias é via desenhos. Estudou

Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA/PR.

sobre livros, sobre desenhos, sobre arte –

Como gestor, fez carreira profissional tendo como ápice uma diretoria

mas foi trabalhando com gentes que realmente

no Grupo Ultra, em São Paulo.

aprendeu e continua aprendendo. Diz ela: “sempre conto com a ajuda de generosas pessoas

Em 1999, passou a integrar o conselho do maior complexo hospitalar

que me dão boas ideias para cada projeto!”.

pediátrico do Brasil, o Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, e, desde então, relaciona-se de perto com as crianças e adolescentes que passam pela instituição, fazendo parte de suas vidas e sonhos. Hoje, é Diretor Corporativo do Complexo Pequeno Príncipe, o que impulsionou ainda mais o seu contato com a realidade hospitalar, sem deixar de lado o entendimento de que os aspectos lúdicos são essenciais para a construção de um mundo melhor.

Isadora Hofstaetter é curitibana “nascida e criada”, mas já passeou um bocadinho pelo mundo, sempre com olhos atentos às formas de ser e de viver de cada cultura. Colecionadora de livros infantis – tem um tantão! –, adora usar essa lente para observar as coisas do

José Álvaro fez mais do que acumular conhecimento sobre temas tão diversos e colecionar amigos de variadas origens e etnias. Ele também traduziu tudo isso em um novo ofício: escrever livros que tratam de questões urgentes, mas pouco observadas em nossa sociedade.

mundo e, na hora de traduzir o que vê, prefere usar as palavras escritas. Não à toa, hoje trabalha com projetos culturais que beneficiam crianças hospitalizadas – com um carinho especial, é claro, pelas publicações.

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Luciana Patricia de Morais é mineira de Belo Horizonte, mas

Florencio Rekayg Fernandes é indígena e pertence à etnia Kaingang, da marca tribal Kame (rá téj). Nasceu em 1976, na Terra Indígena de

vive em Curitiba há bastante

Rio das Cobras, no Paraná. É filho de Silvio Kaginh Fernandes

tempo. Desde pequenininha,

e de Judite Fygso Fernandes. Casou-se com Fabieli

gostava de contar e

Wollinger de Almeida Fernandes, indígena

ouvir histórias,

pertencente à etnia Xokleng, com quem tem

principalmente

três filhos. Florêncio, ao ser convocado pelas

aquelas contadas à

lideranças indígenas da terra onde nasceu,

beira de um fogão, com

viu a oportunidade de cursar o

as pessoas reunidas na

Magistério e, desde então, não

cozinha. Deve ser por isso

parou mais de estudar e de atuar

que decidiu virar pesquisadora e

como educador. Cursou Pedagogia,

contar histórias e memórias de outras

depois fez mestrado em Educação e

pessoas. E – que coincidência! – muitas

foi professor no curso de formação

dessas histórias passam pela comida e por

de docentes indígenas. Hoje em dia,

outros elementos que a ajudam a entender a

é doutorando em Antropologia na

cultura, identidade, memória e tradições das

Universidade Federal do Paraná.

diversas “gentes” que vivem nesse mundão.

Quando encontra tempo, dedica-se a projetos como esse, que buscam disseminar as culturas indígenas.

Gustavo Godoy é paulistano por acaso, mas é curitibano por criação. Quando cursava Ciências Sociais, interessou-se pelos indígenas ao observar os Kaingangues que vendiam artesanato nas ruas de Curitiba. Mas foi com os Mbyas que aprendeu o que é estudar a questão indígena. Com o guarani falado por esse povo, começou a aprender o que pode ser uma língua e encontrou reforço no estudo do antigo tupi. Com os Ka’apores aprendeu como é viver com os índios.

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Agradecemos <3 Para escrever esse livro, contamos com muita gente. Gente que embarcou conosco nessa vivência repleta de encantamento e gente que serviu de guia nesse universo ainda marcado pelo desconhecimento e preconceito. Agradecemos à Ana Paula Luz, Cintia Ribas, Cristiane Zoccoli, Claudio Teixeira e equipe do EDUC, Edívio Battistelli, Maria Helena Amorim, Sandra Ayres e toda a equipe da Coordenação Técnica Local da FUNAI em Curitiba, Elza Forte da Silva Carneiro, Ety Cristina Forte Carneiro, Genilda Maria Rodrigues, Geslline Braga, Grupo Cultural Towê Fulni-ô, Lia Marchi, Lucas Amorim, Luciana de Oliveira, Marcus Paiva, Mariana Carneiro, Sandra Corbari, Silvia Yokoyama, Otavio Bob Zucon, Renato Carneiro e equipe Museu Paranaense, Rose Tomasi, Towê Veríssimo e Ubirajara Zoccoli. Aos patrocinadores: Andali, Nipponflex, Ciapetro, Comtrafo, Agrícola Horizonte, Metisa, Nórdica Veículos, Tratornew, Tintas Vergínia, Aços Continente, Gemu, Grupo Pegoraro, Ravato. E, principalmente, a toda equipe de colaboradores, familiares e claro, às crianças e adolescentes do Hospital Pequeno Príncipe. Compartilhar esta obra com leitores e leitoras é realizar o sonho de contribuir para a urgência de conhecimento e envolvimento efetivo de nossa sociedade com as questões que afetam os povos indígenas no Brasil.

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O que lemos POVOS INDÍGENAS NO BRASIL: 2011-2016. São Paulo: Editores Gerais Beto Ricardo e Fany Ricardo, v. 1, 2017. AFONSO, Germano. Mitos e estações no céu Tupi-Guarani. In: Scientific American Brasil. Especial Etnoastronomia, n. 45, São Paulo, Editora Segmento, 2006. Disponível em: <http://www.mat.uc.pt/mpt2013/files/tupi_guarani_GA.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

LOPES, Reinaldo José. 1499: o Brasil antes de Cabral. Rio de Janeiro: HarperCollins, Brasil, 2017.

BACELAR, Laércio Nora. Gramática da língua kanoê: descrição gramatical de uma língua isolada e ameaçada de extinção, falada ao sul do Estado de Rondônia, Brasil. 2004. Tese. (Doutorado em Linguística) - Universidade Católica de Nijmegen, Holanda. 2004. Disponível em: <http://bandavisual.org/docs/kanoe/Laercio%20 Nora.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

NAVARRO, Eduardo de Almeida. Dicionário de tupi antigo: a língua indígena clássica do Brasil. São Paulo: Global, 2013.

BARBOSA, Pe. A. Lemos. Pequeno vocabulário tupi-português. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1951. BOUDIN, Max Henri. Dicionário de tupi moderno (dialeto tembé-ténêtéhar do Alto do Rio Gurupi) – Vol. I. São Paulo: Conselho Estadual de Artes e Ciências Humanas, 1978. CASTRO, Eduardo Viveiros de. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2002. Disponível em: <https://anedotadasantilhas.files.wordpress.com/2015/11/viveiros-de-castro-imanc3aancia-doinimigo.pdf>. Acesso em 06 de abril. 2018.

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Sites

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POVOS INDÍGENAS NO BRASIL. São Paulo: Instituto Socioambiental, v. 1, 2015.

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Coordenação Geral INSTITUIÇÃO BENEFICIADA

José Álvaro da Silva Carneiro Coordenação editorial Carla Irusta Texto José Álvaro da Silva Carneiro Isadora Hofstaetter

PATROCÍNIO

Luciana Patrícia de Morais Projeto gráfico e ilustrações Carla Irusta Pesquisa Luciana Patrícia de Morais Gustavo Godoy

REALIZAÇÃO

Florêncio Rekayg Fernandes Produção

MINISTÉRIO DA CULTURA

Isadora Hofstaetter

GOVERNO FEDERAL

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Este livro foi impresso no inverno de 2018 na grĂĄfica Midiograf em Curitiba. Foi composto na tipografia Graviola o papel do miolo ĂŠ o Alta Alvura 120 g. Tiragem de 3.000 exemplares.


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