EST A FA
J u l20 23 N# 0 1
Esse editorial tem mais como sentido servir de meia culpa, já havia escrito o pequeno texto que justifica essa publicação, porém ainda não sabia se isso se tornaria uma troca de ideias ou um zine. O objetivo do mesmo, era contribuir de alguma forma com a oficina hardcore que será realizada em julho de 2023 na Casa Punk, devido a mudanças de data, gripe, e principalmente procrastinação, deixei para fazer a diagramação na semana do evento, momentos antes de escrever esse texto conversei com a Rafa para que ela prepare algum artigo, pois com certeza ela tem coisas mais relevantes para dizer do que eu. Só me resta aguardar e editar o que tenho disponível no momento. Caso você se sinta motivado para saber os pensamentos jogados nessas páginas, verá que o rumo que tomei e compartilhei nesse editorial é um péssimo exemplo para o que eu considero viver o hardcore dentro de uma estrutura punk rs. Devido as desculpas despejadas anteriormente, achei que Estafa era um nome digno “ou indigno” para intitular esse material.
E di t o ri a lpo r :G u a i a n a i s
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T e x t o :G u a i a n a i s Um comportamento em comum que observo entre a galera mais velha, ou nos entusiastas que mantém um pé na sociedade, é a ideia de que a tosquice é a forma natural do punk, e não a consequência do excesso de entusiasmo de um indivíduo, combinado com a falta de recursos. É evidente que a baixa qualidade de áudio, desenhos em nanquim ou artes feitas de colagem de recortes deixaram sua marca ao longo das décadas, e isso não conta como empecilho para ouvir sons gravados por um grupo de moleques na década de 80 nos dias de hoje, Shitlickers e Anti-Cimex continuam sendo influentes como nunca no meio hardcore. Tais características criaram uma linguagem visual e sonora que ajudam a definir a estética da cultura punk, e é comum que as produções atuais continuem bebendo dessa fonte. Porém essa paridade entre punk e tosco repetida como mantra por alguns, parece acabar servindo como muletas para não se dar o trabalho de tentar aprender algo novo, não se dedicar para melhorar aquilo que já sabe, ou criticar quem está se esforçando. Já me deparei diversas vezes com situações onde bandas bem trabalhadas, discos com capas bem feitas,
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gigs bem organizadas ou até mesmo simetria nos rebites da jaqueta de um punk foram questionadas por que o natural do punk é a tosqueira. Em certo ponto, parece que foi estabelecido um limite de esforço válido dentro das produções, onde quem tentar ultrapassar vai ser visto com estranheza por que não é o esperado do punk. O que eu interpreto como DIY não é uma forma de fazer algo nas coxas e empurrar aquilo que eu gostaria de fazer com a barriga, e sim fazer o melhor que está dentro do alcance no momento em específico. Se você tem um celular pra gravar sua banda e uma caneta e papel para fazer a capa, ótimo! Fazer o registro é a parte mais importante do processo, e com uma boa ideia pode sair um material excelente. Porém, se você tem recursos materiais ou intelectuais para fazer algo mais trabalhado, por que não? É um tipo de mentalidade que é necessário para se levar no cotidiano, eu tendo uma trena e com o objetivo de colocar uma prateleira, faz todo sentido utilizá-la. Acredito que a vivência punk é pautada em se livrar das amarras da sociedade e buscar autogestão, visar o melhor e fazer o possível para me aprimorar utilizando o que tenho disponível, obviamente não vou saber ou querer aprender tudo, 03
mas naquilo que me disponho, e que tenho o objetivo de compartilhar, vale a pena me dar o trabalho. Esse texto não tem como objetivo de apontar o dedo ou cobrar ninguém, é um assunto que já surgiu em conversas aleatórias e não pude explicar o que eu penso de forma mais elaborada por mudanças de rumos, e ficou entalado na minha cabeça. No final cada um vive seu punk, e essa é a forma que faz mais sentido pra mim.
Guai anai s,SãoPaul o2023
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T e x t o :R a f a Há um tempo eu pensava em escrever sobre como a cultura de consumo nos leva à inação, e, foi fazendo vários fragmentos escritos para a minha própria auto-compreensão que pude tomar uma reflexão maior sobre algumas “falhas” levam o indivíduo à inércia e como a inação conduz o punk à ausência de sentido subjetivo. Não utilizarei nenhum desses fragmentos aqui, mas os cito porque eles me conduziram a pensar na “quebra da inação” como forma necessária para refletir sobre a própria existência do punk, e como em sua essência, o punk é necessário para romper a inércia, comodismo, irreflexão, consumismo e estagnação. É primordial que o indivíduo que se identifica com a cultura punk faça a quebra diária com essas características da in(ação). Antes de tudo, explicar que a definição do termo in(ação) é “o estado em que não se age; ausência de ação; ociosidade; inércia”. Essas características se opõem ao ser punk, principalmente quando falamos de estagnação e o conformismo! O conformismo traz consigo mesmo, o traço da sua limitação: o comodismo, a credulidade no que é dito sem ir à fundo aos fatos, o semi-conhecimento, a falta de pesquisa, o sempre mesmo, a não-inovação a aversão em ir além do mediano e ainda na sua própria não-superação enquanto indivíduo. 05
A estagnação que muitos indivíduos punks encontram alicerces numa interpretação vulgar do “No future” para justificar a sua inércia, apenas reforça mais uma rendição, com a muleta de uma interpretação vaga sobre aquilo que ainda não entendeu no punk. Quem não se aperfeiçoa em seus pensamentos e nem busca evoluir na sua existência, já se rendeu à característica do perfeito encaixe na sociedade: a não-contestação e o não-pensar. O caráter contestador é essencial para manter-se ativo enquanto indivíduo punk! Raf aeGuai amai s,SãoPaul o2022
O agir é e sempre será característica imanente do punk enquanto filosofia de vida. É agir por si, agir coletivamente para construção do que é o seu ideal e do que você faz no punk. Contudo, a reprodução massiva de tudo que é consumível por uma grande parcela da garotada, acaba levando à estaticidade do “sempre comum” e à reprodução de conteúdos, não dando margens para novos pensamentos e ideias que poderiam somar com novas percepções de mundo e de universo punk. Tenho em teoria, que muitos punks jovens irão conhecer o punk não através do conhecimento sobre a cultura, e sim, no que a cultura de consumo fornecerá de rebeldia vaga, vulgar e tosca para tornar o punk consumível. O que considero hoje que pode ser considerado o “punk consumível” é o punk a-culturalizado, expropriado da cultura punk ou que perdeu seu significado enquanto punk, mas se utiliza da terminologia “punk” 06
enquanto identidade subjetiva, sem de fato o viver propriamente. Sendo assim, muitos indivíduos se reconhecem ou se reconheceram no punk enquanto indivíduo e não perduraram. Isso ocorre pela falta de significado no punk que vivem, na não-identificação do punk enquanto cultura, tornando-o mais um subterfúgio de lazer que a cultura de massas traz como consumo. A irreflexão sobre o punk enquanto cultura, a inércia e a comodidade no não-pensar, o entorpecimento em consumir o punk e não o viver, afasta o indivíduo punk para longe de si e da sua essência. Raf a,SãoPaul o2023
Quando concordamos com o mediano, quando tragamos o “mais ou menos” como aceitável, nos tornamos parte da cultura de massas. O mediano e a ausência de pensamento é muito bem aceito por ser totalmente consumível, e isso, só cabe à sociedade devendo ser negada em toda ação.
O esclarecimento, a reflexão lúcida e contínua, o ato de pensar e agir, o aperfeiçoamento e a superação de-si para-si e/ou para a coletividade é o movimento necessário para fazer o punk acontecer, acontecer, de forma simples, consciente e autogestionária. Enxergar o punk como ação e identidade cultural e não como o consumo de entretenimento é fundamental para que o indivíduo punk possa entender a sua essência.
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“Não há outro lugar para o punk que não seja no próprio punk” Quebrar os valores de uma civilização tosca banhada em moralidade, religião, ídolos, consumo e atrofia da reflexão é a ação direta para o coletivo e o subjetivo.
Raf a,SãoPaul o2023
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Rafa; Ao Gaianais, pela edição, arte, conteúdo e estímulo, à Márcia por impulsionar sempre a produtividade e de conteúdos em torna da cultura Punk, à Casa Punk pelas propostas de criação, à 99 Rawpunk, ao Diógenes, ao Lacan, a Salomè, a Xantipa, a Helena, ao Emílio, à Simone, a Theodora, à Bolinha, a Branca, a Veia, ao Biscoito, ao Nero, à Purum, a Preta, o Tetho, a Puni-puni, Puninho, Rutinha e a Liara! Ao Baiano também. Guaianais; Agradeço a Rafa pela colaboração na idealização e criação do conteúdo para essa publicação, aos 99 Rawpunk e Casa Punk pela oportunidade de participar da oficina hardcore, aos punks que se mantém hardcore e deixo um agradecimento especial para o Saenchai pelo uh ue semi novo.
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Estafa, Julho 2023 Idealização Guaianais e Rafa Artes, Capa e diagramação: Guaianais Desenhos pag. 09, 10 e Contracapa: Rafa Texto Vivência Hardcore na Cultura Punk por Guaianais Texto O Refletir e o Agir - Subjetividade Punk por Rafa
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