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Descobrindo a Costa

Ahistória do território hoje chamado de costa do descobriMento começa muito antes do nascimento da colônia que viria a se tornar país. Mata fechada, abundância e diversidade da fauna e fl ora, povos originários vivendo em estreita e respeitosa relação com o ambiente, princípios, práticas e espiritualidade de comunhão com a natureza, estes eram os aspectos compartilhado pelas nações que aqui existiam. Uma visão mercantil, com práticas de exploração devastadoras, foi a forma de colonização iniciada na região. Uma colônia que surge suprimindo nações preexistentes e extraindo suas riquezas naturais, para o enriquecimento da metrópole e de poucos colonizadores, agraciados pela coroa. Passados mais de cinco séculos, políticas compensatórias são necessárias e urgentes para a mitigação da desigualdade decorrente deste modelo.

a Vista do alto do monte pascoal explicita o contraste entre o desmatamento promoVido pelo agronegócio e a conserVação das matas originais promoVida pelos poVos originários.

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O Monte Pascoal, foi o primeiro ponto da costa brasileira avistado, antes do desembarque dos portugueses, em 1500. Hoje o parquE NaCioNal Do moNtE pasCoal é guardado pelos Pataxó da Aldeia Pé do Monte, que guiam visitantes até o seu cume, em meio a mata preservada, mas ameaçada pelo desmatamento ilegal.

A associação que representa a aldeia é uma dos participantes do projeto Desenvolvimento Territorial Solidário, trabalho desenvolvido pela Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte, e executado pelo Instituto Mãe Terra, que procura colaborar para a instauração da justiça, desenvolvimento sustentável e reconhecimento dos povos e comunidades tradicionais, visando a restauração da terra e melhoria da qualidade de vida do seu povo, em busca do “Bem Viver”, baseado em princípios herdados dos povos originários. Para tanto, os esforços das políticas governamentais, na presente gestão, abrangem os oito municípios do território, cada um com sua história e importância.

o centro histórico de porto seguro preserVa construções do período colonial

Porto seGuro o epicentro da colonização, passou ao longo dos séculos por transformações político-administrativas, sociais, culturais e econômicas, transformando-se, com a conclusão da rodovia BR-101, em 1972, em um importante centro turístico. Além da Associação Pataxó Aldeia Pé do Monte (APAPEM), mais quatro empreendimentos participam do projeto, contando com mais uma aldeia Pataxó, uma cooperativa de artesanato da periferia da cidade, um coletivo de mulheres rurais agroecológicas e um núcleo de uma rede de certifi cação orgânica.

santa cruZ cabrália disputa com os municípios de Porto Seguro e Prado, a primazia de ter sido o local de chegada dos portugueses ao Brasil em 1500 e onde foram realizadas a 1ª e a 2ª Missas no Brasil, ambas celebradas por Frei Henrique de Coimbra, capelão da armada de Pedro Álvares Cabral.

Em 1536, Pero do Campo Tourinho fundou uma povoação denominada Vera Cruz, que foi arrasada pelos Aimorés em 1564. Em decorrência do ataque, os habitantes constituíram uma nova povoação conhecida por Santa Cruz, a qual, na década de 1580, foi transferida para um platô na foz do Rio João de Tiba, o atual Centro Histórico, com melhores condições de defesa contra os frequentes ataques indígenas.

encontro do mar com o rio joão de tiba, Visto a partir do centro histórico de santa cruz cabrália

A Vila de santa cruz é criada em 1833, sendo agregada ao município de Porto Seguro em 1931. Em 1933, passa a chamar-se Santa Cruz Cabrália, para tornar-se novamente autônoma, como cidade, em 1938. Na década de 1970, com a conclusão da BR-101 e a construção da estrada oriunda de Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália passa atrair também grande fl uxo de turistas. Algumas aldeias e indígenas se benefi ciam deste progresso, mas a maioria permanece numa difícil situação socioeconômica e ainda lutam pela demarcação de boa parte de suas terras ameaçadas. Uma das aldeias contempladas pelo projeto encontra-se distante dos centros comerciais e enfrenta difi culdade com relação à geração de renda. Uma realidade que não mudará sem a ampliação de políticas de proteção e promoção de direitos dos povos tradicionais. Também faz parte do projeto uma associação de produtores rurais do município.

belMonte, durante muito tempo, foi importante porta de entrada para Minas Gerais, através do rio Jequitinhonha, única via navegável até Salto da Divisa. Localizada entre este importante rio e o oceano Atlântico, o local fl oresceu devido ao cultivo do cacau, no fi nal do século XIX, tornando-se cidade em 1891, com o nome Belmonte do Jequitinhonha.

Antes da praga da vassoura-de-bruxa impactar drasticamente esta cultura, o cacau representava 80% da economia do município (hoje, corresponde a apenas 17%). Por outro lado, as produções dos segmentos de pecuária e pesca têm signifi cância na renda do município. Na foz do Jequitinhonha, ainda existem manguezais com a vegetação típica local e uma fauna riquíssima. O projeto Desenvolvimento Territorial Solidário benefi cia um coletivo predominantemente de mulheres agricultoras da região, um coletivo de pequenos agricultores do distrito de Petrolândia e um coletivo exclusivamente de mulheres marisqueiras e pescadoras. As últimas avançaram nas duas últimas décadas em direção a sua autonomia e valorização do ofício, conquistaram a unidade de benefi ciamento e os equipamentos para viabilizar seu trabalho.

o jequitinhonha deságua no mar em belmonte, mudando a coloração da água e dando à cidade seu epíteto “cidade do mar moreno”.

O grande desafi o é realizar a comercialização a preço justo, em um comércio dominado por atravessadores. A luta pela independência econômica é acompanhada pela luta por todos os direitos ainda não conquistados e pelo fortalecimento da identidade local, ligada às tradições de pesca e coleta de mariscos do mangue.

itaPebi, termo tupi que signifi ca “água da pedra achatada” (itá = “pedra”, peb = “achatado” e ‘y = “água”), dá nome ao próximo município. A cidade teve sua origem de moradores do povoado de Cachoeirinha, localizado nas proximidades do rio, deslocados por sucessivos acontecimentos naturais. Sua população era composta de agricultores, pescadores, artesãos e pequenos comerciantes que utilizavam canoas para chegar aos centros comerciais. Elevado a distrito em 1938, do município de Belmonte, torna-se município em 1958, abarcando Itagimirim.

Devido às enchentes recorrentes do Rio Jequitinhonha, surge um novo núcleo de povoamento mais afastado das margens, a Cidade Nova ou Cidade Alta que se tornou sede em decorrência da concentração da população. A dinâmica socioeconômica de Itapebi é baseada na silvicultura, com o plantio de eucalipto e agropecuária, ambas atividades de grande impacto na Mata Atlântica.

O esforço do projeto é no apoio a um coletivo de mulheres costureiras, um coletivo de agricultura Reza a lenda que dois foragidos da justiça se estabeleceram em uma clareira ocasionada pela extração de madeira e fi zeram um barracão para fi ns comerciais de gêneros alimentícios, utensílios e ferramentas para os exploradores. Este local tornou-se ponto de pouso para tropeiros que faziam comércio entre Minas Gerais e o extremo sul da Bahia, mas teve um rápido declínio devido ao decrescimento da exploração madeireira. familiar diversifi cada, mas que promove o resgate do cacau e um coletivo de produção de Tilápia, formada por pescadores transformados em piscicultores, impactados pelo assoreamento do Rio Jequitinhonha.

Dois municípios constituíram-se a partir da exploração da madeira advinda da exuberante Mata Atlântica da região: Itagimirim e Itabela. O início da

cidade baixa de itapebi, às margens do jequitinhonha, o assoreamento do rio é uma ameaça às populações das cidades que se encontram abaixo da represa.

povoação de Itagimirim data da década de 1930. Apenas com a chegada de um motor de luz a diesel, em 1954, o povoado passa benefi ciar arroz. Emancipado em 1962, o município tem uma economia que se distribui entre construção civil, serviços e comércio; Agropecuária, Extração Vegetal, Caça e Pesca e Administração. Os dois empreendimentos apoiados pelo projeto no município têm a mandioca e derivados como produto principal.

itabela, também surge com a chegada de madeireiros, por volta de 1949. Em meados da década de 1960, milhares de imigrantes ligados à exploração madeireira ocupam a microrregião, protagonizando a chamada “febre do jacarandá”.

As fontes principais de renda da cidade, que se emancipou em 1989, são o cultivo do café e do mamão, seguidos pelo cacau, coco-da-baía, banana e maracujá, bem como a pecuária e o comércio. Neste município o projeto apoia um coletivo de apicultores, cuja produção de mel, a partir da florada do café, é bastante apreciada.

a cultura da mandioca e o processamento da farinha são atiVidades importantes do município de itagimirim e seu distrito de união baiana.

GuaratinGa originou-se dentro de uma propriedade da Sra. Maria da Conceição que deixou em testamento sua fazenda para a fundação de um arraial.

Com terras boas para o cultivo, desencadeou-se relativo crescimento a partir dos cultivos de subsistência de mandioca, milho, feijão e outros cereais e da criação de gado. A produção excedente, para fins comerciais, era levada para Porto Seguro, a 118 km de distância, através de tropas, em picadas. O arraial prosperou, elevando-se a distrito subordinado a Porto Seguro, quando então passou a ser denominado Guaratinga, que na língua Tupy significa Garça Branca. Em 1961, passa à categoria de município.

Guaratinga é um município que tem grandes potenciais turísticos inexplorados, como outros pontos do

território, mas seu diferencial encontra-se no relevo montanhoso, com pequenos riachos e cachoeiras que compõem uma paisagem surpreendente. Neste município, o apoio do projeto volta-se a uma cooperativa de temperos e um coletivo de apicultores, cujo volume e qualidade da produção de mel é referência na região.

a pedra do oratório demonstra a beleza do releVo e o potencial turístico do município de guaratinga.

eunáPolis surgiu pela permanência dos chamados garimpeiros, profi ssionais que construíam estradas usando pás picaretas e galeotas, na região inicialmente conhecida como km 64, que era a distância de Porto Seguro ao entroncamento da futura BA-2, atual BR-101. A cidade iniciou-se com a construção de choupanas para abrigar os que esperavam a chegada das empreiteiras que iriam dar continuidade à construção da estrada principal.

O vilarejo cresceu bastante, chegando a ser conhecido pelo topônimo de Eunápolis, como o “Maior Povoado do Mundo”. Hoje a cidade concentra o comércio e rede de serviços mais diversifi cados da região, mantendo uma área rural produtiva. Em Eunápolis, o projeto apoia um empreendimento urbano baseado em reciclagem e um coletivo rural, formado por mulheres assentadas, que possuem a mandioca como matéria prima para produtos diversifi cados. Por todo território Costa do Descobrimento, a exploração, a extração e destruição permanecem sendo a forma de ocupação, mas a luta por sua preservação e desenvolvimento também se tornou marca de sua história. Hoje, a biodiversidade e a riqueza cultural têm sido valorizadas pelo seu grande potencial, que colabora para o desenvolvimento socioambiental sustentável da região. É com esse objetivo, de se desenvolver sustentavelmente, sem impactar negativamente os recursos naturais e sem explorar os trabalhadores participantes, que atuam os vinte empreendimentos participantes do projeto.

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