A segunda edição do fanzine Foi à Feira
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a segunda edição do fanzine foi à feira
rayza mucunã paiva projeto de graduação em desenho industrial // comunicação visual // ufes // vitória // 2013
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Projeto de Graduação
universidade federal do espírito santo centro de artes departamento de desenho industrial
rayza mucunã paiva
a segunda edição do fanzine foi à feira
vitória 2013
rayza mucunã paiva
a segunda edição do fanzine foi à feira
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado em cumprimento às exigências da disciplina de Projeto de Graduação II para obtenção do título de Bacharel em Desenho Industrial - Programação Visual. Orientadora: Profa. Dra. Letícia Pedruzzi Fonseca
vitória 2013
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
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Find what you love and let it kill you. Let it drain you of your all. Let it cling onto you back and weigh you down into eventual nothingness. Let it kill you and devaur your remains. For all thigs will kill you, both slowly and fastly, but it's much better to be killed by a lover. Charles Bukowski
Agradecimentos
Gostaria de agradecer infinitamente à minha família, amigos e todos os colegas e professores que me ajudaram a entender e trilhar os caminhos tortuosos da graduação. Agradeço principalmente à Letícia Pedruzzi, que acreditou no projeto desde o início, e a todos os membros do coletivo Foi à Feira, passados, presentes e futuros. À Camila Lombarti Torres e Paulo Prot, que ajudaram a financiar a segunda edição do fanzine Foi à Feira. Este projeto é uma homenagem aos fanzineiros e feirantes de todo o mundo.
Resumo
Esta pesquisa busca investigar relações entre o processo de manufatura de fanzines e a prática de design gráfico, observando a construção de identidades gráficas híbridas fora dos padrões convencionais de criação. Partindo da segunda edição do Foi à Feira – fanzine produzido pelo coletivo cultural homônimo residente na Grande Vitória, foi possível compreender o planejamento e execução das diversas etapas do processo de produção do impresso. Inicialmente, é discutida a fundamentação teórica relacionada à produção gráfica de fanzines, para, em um segundo momento, analisar o Foi à Feira (tanto como fanzine quanto como coletivo). À guisa da conclusão, pode-se afirmar que a avolução e o desenvolvimento de um porjeto como o Foi à Feira promove novas possibilidades de criação no âmbito do design gráfico. Palavras-chave: fanzine, identidade, design gráfico.
Lista de figuras
Figura 1: capas de diversas publicações independentes e alternativas, 25. Figura 2: página de editorial do fanzine Punk (1985), 28. Figura 3: página de editorial do fanzine Bongolê Bongoró (2006), 28. Figura 4: página de editorial do fanzine Junkmail 4 (2000), 28. Figura 5: página simples de Meninas Viciadas (2000) e página dupla de editorial do Dalí 5 (sem data), 29. Figura 6: páginas espelhadas (sem numeração) do fanzine Quadrilha #1 (sem data), 29. Figura 7: capa do single God save the queen, lançado pela banda Sex Pistols em 1977, 30. Figura 8: Supermarket Images and Sticker, poster de Jamie Reid, 1984, 31. Figura 9: páginas simples dos fanzines Paranoia e Cala a Boca (2011) e Falamacia (2013) e página dupla de índice do Bongolê Bongoró (2006), 32. Figura 10: página do fanzine Atum (1994), capa do zine Tetas (Buenos Aires, 2008) e capa do zine Rocartê (2012), 33. Figura 11: alguns impressos alternativos da década de 1970, 35. Figura 12: capas dos fanzines Decadance (1988), Logotipo (sem data) e Hiper Espaço (1983), 36. Figura 13: páginas de Elementare Typographie (Tipografia Elementar), 1925, 40. Figura 14: Cartaz de exposição feito por Herbert Bayer, diretor da Bauhaus na época, 1926, 40. Figura 15: cartaz de exposição do grupo Grapus, 1982, 41. Figura 16: cartaz de divulgação do curso da Cranbrook Academy of Art, 1989, 42. Figura 17: Edward Fella, anúncio para uma palestra, 1995, 43. Figura 18: capas e páginas espelhadas de edições da revista Ray Gun durante o ano de 1997, 45. Figura 19: Exemplares das revistas Visionaire, 45. Figura 20: exemplos de grid com desconstrução linguística, 47. Figura 21: Exemplos de grid com utilização de cadavre exquis, 47. Figura 22: Capas da primeira e da segunda edição da revista Samba, 52. Figura 23: Página espelhada de sumário e página do editorial da segunda edição da revista Samba, 52. Figura 24: página dupla da revista Samba número 2, 52. Figura 25: Print screen da página da revista Samba online, 53. Figura 26: capa e página de sumário e expediente, Kowaski, 2010, 53. Figura 27: Página espelhada do miolo do zine Kowaski, 2010, 54.
Figura 28: página dupla de miolo da revista Beleléu, 54. Figura 29: capa e página de índice (3° capa) da revista Beleléu, 2009, 55. Figura 30: página dupla de texto e abertura da primeira parte, 55. Figura 31: capa e página dupla do editorial da revista Lama número 1, 56. Figura 32: página de sumário e página espelhada do miolo da revista Lama número 1, 56. Figura 33: capa e página espelhada do miolo do zine A Zica, 57. Figura 34: capas das revisas Prego número 1, 2, 3, 4 e 5, 58. Figura 35: página de rosto, de editorial e dupla do miolo da segunda edição da Prego, 58. Figura 36: página de rosto, de editorial e índice, e página dupla do miolo da terceira edição da Prego, 59. Figura 37: capa e folha de rosto / índice / página de créditos e página simples da sexta edição da revista Prego, 59. Figura 38: capa, página espelhada de rosto e página dupla do miolo da Vulgar Manual, 60. Figura 39: capa e página espelhada de rosto, página dupla do miolo e quarta capa da Quadro Negro Verde, 60. Figura 40: capas da primeira, segunda e terceira edições da Undergroung do Underground, 61. Figura 41: capas de várias edições da revista Strombolli, organizadas em sua biblioteca virtual, 61. Figura 42: foto dos membros do coletivo em 2010. 62. Figura 43: registros fotográficos de Tábuas de Carne realizadas entre 2010 e 2012, 64. Figura 44: exemplares do Foi à Feira #1, 65. Figura 45: Página dupla do editorial da primeira edição do Foi à Feira, 69. Figura 46: esboço da ideia 1, 73. Figura 47: esboço da ideia 2, 73. Figura 48: esboço da ideia 3, 74. Figura 49: cartaz virtual da chamada de trabalhos para o Foi à Feira #2, 75. Figura 50: cartaz da Tábua de Carne aberta do dia 25/10 e print screen da página para inscrição de trabalhos no site do Foi à Feira, 76. Figura 51: registros da Tábua de Carne em 25/08/2012, 76. Figura 52: oficina ministrada na 6° Semana de Design da Ufes em dezembro de 2012, 77. Figura 53: Tábua de Carne em 29/08/2012, 77. Figura 54: fotografias dos cavaletes devolvidos às ruas, 78. Figura 55: processo de pintura dos abrigos, 78. Figura 60: abrigos pintados e em uso: resultado final, 79. Figura 57: um dos cartazes virtuais de divulgação e registros do primeiro Coletivos Unidos (C.U.) no Espaço Criativo De Casa, 79. Figura 58: print screen da página de apresentação do projeto no site do Movimento HotSpot, 80. Figura 59: Imagens selecionadas para apresentação nos festivais, 80. Figura 60: Registro da Tábua de Carne realizada em 07/03/2013, no Centro de Artes da Ufes, 81. Figura 61: colagem de Sara Serna para colaboração no fanzine Foi à Feira 2, 83. Figura 62: ilustração Rasgo / Sobre o inalcançável, de Gabriel Loureiro para o Foi à Feira 2, 84.
Figura 63: metaphorically-cutting-until-bleeding-the-city, de Gabriela Canale para o Foi à Feira 2, 85. Figura 64: fotografia original de Alex Gouveia e resultado final com a montagem do fundo, 85. Figura 65: print screen do site da Feira Plana, onde estão listados todos os expositores, 86. Figura 66: registros da Feira Plana, 86. Figura 67: piloto do zine-card, frente e verso, 87. Figura 68: Figura 68: zines-cards finais, frente e verso, 87. Figura 69: gráficos com as porcentagens de métodos de impressão e tiragens, respectivamente, dos fanzines listados no 1° Anuário de Fanzines, Zines e Publicações Alternativas, 91. Figura 70: à esquerda, boneca com medidas demonstrando como as páginas se comportam. À direita, detalhe dos vários tipos de papeis testados, 92. Figura 71: detalhes do parafuso utilizado e da encadernação da boneca frente e verso, 93. Figura 72: colaboração de Natanael Souza, exemplo da manipulação de imagens, 94. Figura 73: leiaute final do poema Fala da fome, de Gabriel Ramos, 95. Figura 74: leiaute da página com o poema de Gabriel Ramos e a fotografia de Rayza Mucunã, e página impressa em papel colorido, 96. Figura 75: leiaute final nas páginas já impressas de Gabriela Canale, 96. Figura 76: teste realizado com carimbos e impressão e detalhe da textura das letras carimbadas, 97. Figura 77: à esquerda, leiaute do poema de Carol Ruas e página final impressa, 97. Figura 78: registros do processo de obtenção da imagem final, 98. Figura 79: leiaute final das três páginas do conto O famigerado Bolaoito, 99. Figura 80: leiaute final do texto de Fritz Noronha, 100. Figura 81: leiaute final do texto de Veriana Ribeiro, 100. Figura 82: as sete páginas do ensaio Doll House, 101. Figura 83: página da colaboração de Marianna Schimdt com o rasgo na margem inferior, 102. Figura 84: página com a ilustração de Isabela Bimbatto fechada e aberta, 102. Figura 85: Foi à Feira #2 finalizado, 104. Figura 86: Exemplo de utilização de papéis diferenciados, 106. Figura 87: teste de impressão da ilustração de Luis Filipe Porto em diferentes tipo de papel, 107. Figura 88: ajuste de cores na impressão, 110. Figura 89: exemplo de impressão defeituosa, 110. Figura 88: páginas com as fotografias dos pontos de ônibus, 111. Figura 91: à esquerda, página da boneca, sem ajuste. À direita, página reajustada com a margem adequada, 111. Figura 92: esquema com todas as páginas do miolo segunda edição em ordem (não inclui o editorial/capa), 113. Figura 93: imagem dos créditos alinhados, 115. Figura 94: página de créditos diagramada, 116. Figura 95: alguns registros das entrevistas, 118. Figura 96: projeto e resultado final da sobrecapa, 121.
Sumário
1. INTRODUÇÃO_____________________________________________________17
2.JUSTIFICATIVA____________________________________________________19 3. OBJETIVOS_______________________________________________________21 3.1. Objetivo Geral_________________________________________________21 3.2. Objetivos Específicos___________________________________________21 4. METODOLOGIA___________________________________________________23 5. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA_______________________________________25 5.1.Fanzine_______________________________________________________25 5.1.1. Características Gráficas_____________________________________28 5.1.2. Breve Levantamento Histórico da produção de fanzine_________ 34 5.2. Fanzine, Design Gráfico e Identidade_____________________________37 6. LEVANTAMENTO DE DADOS________________________________________49 6.1. Referências Atuais em Fanzine__________________________________49 6.1.1. Produção Nacional_________________________________________51 6.1.2. Produção Local____________________________________________58 6.2. Foi à Feira____________________________________________________62 6.2.1. O Coletivo________________________________________________62 6.2.2. O Fanzine_______________________________________________64 7. PLANEJAMENTO DA SEGUNDA EDIÇÃO______________________________67 7.1. Definição de parâmetros para o projeto gráfico____________________67 7.1.1. Por Que Fazer Impresso?____________________________________70 7.2. Geração de Alternativas_________________________________________72 7.3. Processo Produtivo_____________________________________________75 7.4. Estratégias Paralelas___________________________________________86 8. O PROJETO_______________________________________________________89 8.1. Como Imprimir_______________________________________________89 8.2. Como Apresentar_____________________________________________92 8.2.1 Formato e Encardenação____________________________________92 8.2.2 Leiaute e Diagramação______________________________________93 8.2.3. A Capa__________________________________________________103 8.2.4. Testes de impressão_______________________________________105 8.3. Como Organizar______________________________________________110 8.3.1. Indexação________________________________________________111 8.4. Testes_______________________________________________________115
9. CONCLUSÃO_____________________________________________________121 10. BIBLIOGRAFIA__________________________________________________125
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
1.
Introdução
O fanzine Foi à Feira é uma publicação independente, colaborativa e experimental que, através da combinação de diferentes gêneros de produção artística, busca construir reflexões críticas e manifestações estéticas sobre assuntos e aspirações que permeiam o universo de seus produtores e leitores. O projeto editorial tem como premissa que cada edição seja tematicamente pautada por um objeto diferente que guia, subjetivamente, os trabalhos publicados. Inserido em um circuito de mídia alternativa1, o fanzine busca disseminar local e nacionalmente a produção dos jovens artistas capixabas. A primeira edição do Foi à Feira foi lançada em 2010 e engloba produções diversas, feitas pelos membros do coletivo e por colaboradores de variadas áreas de produção. Com verba apertada e planejamento gráfico extremamente básico, o resultado final não atingiu todas as expectativas do coletivo. Embora as produções veiculadas fossem de alta qualidade estética, o impresso em si não se posiciona de maneira diferenciada, por não possuir uma identidade gráfica e visual marcante. Além disso, a falta de experiência neste tipo de projeto ocasionou a tomada de diversas decisões (de design e metodologia) que prejudicaram a produção e o produto final. A partir de tais constatações ficou clara a necessidade de desenvolver um novo projeto gráfico para a segunda edição, além de revisar a metodologia de produção, em vias de construir um produto superior, que supra as expectativas dos desenvolvedores e leitores no que diz respeito tanto ao conteúdo quanto à apresentação do fanzine. É neste contexto que se insere o presente estudo. A partir do interesse pela produção gráfica alternativa, decidiu-se investigar as relações existentes entre a produção de fanzines e a prática de design, com foco na construção de identidades gráficas híbridas e não-convencionais. Espera-se contribuir para a ainda incipiente bibliografia sobre publicações independentes e experimentais na perspectiva do design gráfico. Além disso, buscou-se registrar um recorte da cena atual brasileira e capixaba de zines, fanzines e publicações independentes.
1. Entende-se por mídia alternativa o conjunto de canais de comunicação que são alternativos à grande imprensa. Surgida em meados da década de 60, na América Latina assumiu um perfil de engajamento político, defendendo causas de minorias ignoradas pela comunicação em massa, principalmente devido ao nível de censura do Regime Militar (1964 à 1988). Com a disseminação da manufatura de impressos alternativos, criou-se também um circuito alternativo de distribuição e venda, geralmente abrangendo bares, teatros, universidades e outros, além das tradicionais livrarias e sebos. Tem se relacionado intimamente à movimentos artísticos que não se enquadram precisamente entre os meios de comunicação em massa (MAGALHÃES, 2003).
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Projeto de Graduação
Este projeto foi concebido no âmbito do design gráfico de forma a utilizá-lo como ferramenta para construção e desenvolvimento de uma identidade gráfica em um impresso experimental, tomando como objeto de estudo a segunda edição do fanzine Foi à Feira. Para tanto, compilou-se uma revisão bibliográfica que abrange os principais aspectos e conceitos dos dois universos contemplados: fanzines e identidade gráfica. As reflexões e análises traçadas a partir desta revisão forneceram a base teórica para o desenvolvimento do projeto gráfico em questão. Em seguida, realizou-se uma série de reuniões entre os membros do coletivo atual para se traçar uma análise crítica da primeira edição e de seu processo de produção. Tais reuniões pautaram as mudanças necessárias ao projeto gráfico e editorial no intuito de definir com clareza as diretrizes fundamentais para a segunda edição. A partir das etapas analíticas e do levantamento de dados, deu-se início ao projeto gráfico propriamente dito através da criação de alternativas e do desenvolvimento posterior do partido adotado. Relatou-se toda a experiência de criação e compilação das colaborações presentes no fanzine, além das ações do coletivo neste período de tempo. Finalmente, apresenta-se a segunda edição do Foi à Feira, produzida de acordo com o projeto desenvolvido. Para facilitar a compreensão do leitor, este projeto se divide em três etapas distintas e complementares. Primeiro se traça uma avaliação detalhada sobre a relação entre fanzines e design gráfico, inclusive com um levantamento das principais publicações neste âmbito. Posteriormente se analisa o passo a passo para a concepção do projeto e produção da segunda edição do Foi à Feira . Na terceira e última parte são discutidas algumas conclusões obtidas através deste estudo.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
2.
Justificativa
Este trabalho se justifica na medida em que visa construir pontes entre o planejamento e a produção de um impresso experimental e a prática, projetual e conceitual, de design gráfico. Partindo do pressuposto de que o universo da produção e veiculação de fanzines possui enriquecedoras afinidades para com a área de design gráfico, pretende contribuir com a tímida bibliografia existente que relaciona esses dois campos. Configura-se, ainda, como importante relato da produção de fanzines na Grande Vitória, por detalhar todas as etapas do processo de criação, planejamento e feitura de uma publicação alternativa e independente com foco no design e nas artes gráficas, o Foi à Feira, além de registrar outras iniciativas contemporâneas – locais e nacionais – de cunho semelhante. Ao buscar relações entre os processos de atribuição e construção de identidades gráficas em impressos tão peculiares como os fanzines, visa tornar-se referência para aqueles que possam se interessar por iniciativas de teor mais experimental e, de certa forma, autoral, dentro do design gráfico. O projeto surgiu a partir do interesse da autora pelo nicho da produção de impressos, tomando o design gráfico como grande área de conhecimento. Deste mesmo interesse veio a oportunidade, em 2010, de montar, junto a um grupo de amigos da Universidade Federal do Espírito Santo, o coletivo Foi à Feira e lançar a primeira edição do fanzine de mesmo nome. A iniciativa foi uma tentativa de abrir espaço na mídia alternativa para que produtores capixabas de design, literatura, ilustração e fotografia pudessem divulgar livremente trabalhos autorais. Por se tratar de um impresso experimental e alternativo, produzir o fanzine passou a ser uma oportunidade única de explorar possibilidades estéticas, acabamentos e ideias que não encontravam espaço na produção mercadológica e nas diversas vivências profissionais realizadas pela autora, incentivando pesquisas e experiências enriquecedoras.
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3.
Objetivos
3.1. Objetivo geral Investigar as relações entre fanzines e identidade gráfica através do planejamento e produção da segunda edição do fanzine Foi à Feira.
3.2. Objetivos específicos Como objetivos específicos esperados no decorrer do desenvolvimento deste projeto, tem-se: * Estudar a bibliografia existente sobre fanzines; * Discutir sobre como se dá a construção da identidade gráfica em impressos experimentais; * Ampliar a produção teórica sobre a relação entre fanzines e design gráfico; * Analisar criticamente a primeira edição do fanzine Foi à Feira para então propor uma série de transformações editoriais e gráficas, a serem aplicadas na segunda edição; * Projetar a segunda edição do fanzine Foi à Feira; * Apresentar o passo a passo do processo produtivo da segunda edição do anzine Foi à Feira; * Produzir um meio de comunicação alternativo.
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4.
Metodologia
Com a produção e lançamento da primeira edição do Foi à Feira, constatou-se algumas lacunas e problemáticas que influenciaram negativamente o impresso, deixando-o abaixo do esperado pelo coletivo, tanto em termos gráficos quanto editoriais. Assim, este projeto partiu do método hipotético-dedutivo, segundo Popper e conforme apresentado por Marconi e Lakatos (2002), onde a partir da observação de um problema advindo de expectativas ou experiências e conhecimentos prévios, gera-se conjecturas ou hipóteses sobre tal problema e posteriormente testa-se tais hipóteses no sentido de eliminar possíveis erros e alcançar a solução visada. Caso ainda sejam encontrados erros ou problemas na hipótese escolhida, reinicia-se o processo, até que a hipótese concebida seja, por dedução, aceita. Adaptando tal metodologia para o caso específico deste trabalho, a primeira edição foi analisada em busca de seus principais problemas (no que diz respeito ao projeto editorial e gráfico, em vias de desenvolver um impresso com uma identidade gráfica mais marcante e presente). Tais problemas definiram os objetivos do projeto. No desenvolvimento do mesmo, foram geradas algumas hipóteses para solucionar as problemáticas e atingir os objetivos. Tais hipóteses foram analisadas e observadas com o objetivo de eliminar possíveis problemas e definir a melhor opção para a conclusão do projeto. Tais decisões e análises foram feitas pela equipe do coletivo Foi à Feira (que edita o fanzine), da qual faço parte, o que configurou uma observação direta intensiva participante natural (marconi, lakatos, 2002), e é, também, um método de pesquisa e levantamento de dados. Assim, o desenvolvimento do projeto e das alternativas se deu individualmente, e os resultados foram apresentados para o restante da equipe para que se seguisse o andamento da produção. Ou seja: as decisões foram tomadas tanto individualmente quanto em grupo, e as deliberações fornecidas pelos membros do coletivo funcionaram como guias para as escolhas de design. O desenvolvimento do projeto também contou com o auxílio de uma pesquisa documental e bibliográfica. A primeira no sentido de analisar as produções locais de cunho semelhante, além da experiência própria no assunto e relatórios e anotações pessoais feitas durante a produção da primeira edição. Já a pesquisa bibliográfica pretendeu reunir e estudar o material já publicado sobre os assuntos abordados, fanzines e identidade gráfica, propiciando a base teórica para definir conceitos e explorar enfoques e abordagens diferentes, enriquecendo o trabalho e o produto final.
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Fundamentação teórica
Para embasamento teórico deste estudo compilou-se um conjunto de definições e conceitos fundamentais. Assim, esta revisão bibliográfica foi a base de muitas das decisões tomadas no decorrer da concepção do projeto gráfico e do processo produtivo do impresso, além de apresentar ao leitor o universo dos fanzines.
5.1 Fanzine
Figura 1: capas de diversas publicações independentes e alternativas nacionais. Fonte: acervo pessoal, 2013.
Cunhado a partir da contração das palavras fanatic e magazine, o termo fanzine foi concebido por Russ Chauvener em 1941, cerca de uma década após o nascimento desse tipo de impresso nos Estados Unidos. Como o termo indica, os primeiros fanzines eram revistas amadoras feitas por (um ou um grupo de) fãs de ficção científica. Tais impressos eram redigidos, produzidos e publicados pelos próprios autores de forma artesanal (MAGALHÃES, 2003).
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Embora no início o termo estivesse restrito ao universo underground da ficção científica americana, o mesmo foi rapidamente absorvido e passou a ser largamente utilizado para denominar impressos amadores, reproduzidos por xerox a partir de uma matriz composta artesanalmente, de forma geral (MAGALHÃES, 2003). Em busca de uma definição mais acurada do que é, ou seria, um fanzine, um aspecto parece ser consenso entre os estudiosos e analistas do assunto: trata-se de uma publicação independente, onde seus editores se encarregam de todo o processo de produção, desde a concepção da ideia até a coleta de informações, a diagramação, a composição, a ilustração, a montagem, a paginação, a divulgação, a distribuição e venda, tudo passa pelo domínio do editor. (...) O controle de todo o processo editorial, embora exija mais tempo e habilidade, dá ao editor maior liberdade de criação e execução da ideia (MAGALHÃES, 2003, p. 29).
Ainda assim, existem muitas divergências no que diz respeito às diferenças e fronteiras entre fanzines e revistas alternativas. Ambos fazem parte da imprensa alternativa (em oposição às grandes publicações comerciais), por possuírem produção e distribuição independentes, além de um tratamento estético e conteúdo diferenciados daqueles utilizados pela grande mídia. Segundo Henrique Magalhães1, a diferença essencial entre fanzine e revista alternativa não está nos aspectos de produção e distribuição, mas sim no conteúdo dos impressos: se o foco estiver na informação propriamente dita, em matérias, entrevistas, artigos e textos de forma geral, trata-se de um fanzine. Se o foco estiver na produção artístico-cultural inédita veiculada, trata-se de uma revista. Revistas também estariam mais diretamente relacionadas à divulgação de artistas iniciantes, que não possuem oportunidades de publicação em mídias de grande circulação (MAGALHÃES, 2003). Em contraponto, no livro Almanaque de Fanzines – o que são porque são como são2, são apresentados diversos exemplos de fanzines que veiculam produções inéditas em ilustração e poesia (ALBERNAZ; PELTIER, 1994). Já Edgar Guimarães3 é mais abrangente em sua definição: No entanto, o termo fanzine se disseminou de tal forma que hoje engloba todo tipo de publicação que tenha caráter amador, que seja feita sem intenção de lucro, pela simples paixão pelo assunto enfocado. 1. Editor do zine Top! Top!, disserta sobre o universo dos fanzines e publicações independentes em suas teses de mestrado e doutorado, ambas já publicadas como livros. Tem se dedicado a lançar livros e almanaques sobre o assunto através da Marca de Fantasia, editora independente que fundou em Pernambuco. 2 . Com formato semelhante ao de uma revista, este almanaque é um relato interessante da produção de fanzines na década de 1990. Além de definições de termos, entrevistas com fanzineiros e alguns pequenos estudos sobre fanzine, apresenta um catálogo de zines com resenhas, títulos e endereços de contato de mais de 350 fanzines da época, organizados em ordem alfabética. 3. Edgar Guimarães está envolvido com a produção de fanzines desde 1979, seus fanzines já ganharam prêmios e renderam palestras sobre o assunto em todo o Brasil. Lançou dois livros sobre o assunto pela editora Marca de Fantasia.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
Assim, são fanzines as publicações que trazem textos diversos, histórias em quadrinhos de editor e dos leitores, reprodução de HQs antigas, poesias, divulgação de bandas independentes, contos, colagens, experimentações gráficas, enfim, tudo que o editor julgar interessante (GUIMARÃES, 2000, p.11).
Segundo ele, a principal característica a ser observada para se classificar determinada iniciativa como fanzine é o caráter amador da publicação, no sentido de referir-se a exercer uma atividade pelo gosto da prática envolvida, sem o retorno esperado de uma atividade profissional (GUIMARÃES, 2000, p.12). O autor também coloca que fanzines são obrigatoriamente produtos culturais que veiculam conteúdo relacionado a esse tipo de produção, ou seja, boletins e informativos impressos que estão associados a ações comerciais ou ordens religiosas não podem ser considerados fanzine, por mais que possuam meios de produção similares (GUIMARÃES, 2000, p.13). Guimarães se preocupa em frisar o caráter autoral das publicações, seja através de textos ou imagens. Também afirma a importância desse tipo de iniciativa como contribuição cultural e meio de desenvolvimento de novos artistas e produtores culturais (GUIMARÃES, 2000). O conteúdo dos fanzines pode gravitar em torno das mais diversas temáticas, sendo tão inconstante quanto à ênfase entre aquilo que é dito com palavras ou com imagens. Os textos veiculados variam em teor, e podem ir de críticas recheadas de ironia e deboche a artigos sérios e discussões teóricas, filosóficas, literárias, entre outros. O importante, nesse caso, é o discurso e a originalidade do autor. Abrangendo também a característica gráfica dos textos, pode-se fazer um paralelo entre as páginas brancas e limpas dos livros e revistas e as páginas mal impressas, sujas e manuseadas dos zines: a tradução da ideia de dispersão e reprodução máxima, de compartilhamento de conhecimento bruto, sem a preocupação de rótulos ou outras formalidades (ALBERNAZ; PELTIER, 1994, p. 8-18). Por serem publicações independentes, os fanzines contam com pouco ou nenhum incentivo e apoio financeiro externo, existindo graças aos investimentos dos editores ou de venda de edições anteriores (GUIMARÃES, 2000; MAGALHÃES, 2003; ALBERNAZ; PELTIER, 1994). Além disso, fica claro que se trata de uma publicação extremamente conectada às vontades e ideias de seus realizadores, ou seja, um hobby. Isso posto, cabe frisar que tais impressos possuem tiragem variável, periodicidade esporádica, e modificam-se visualmente de acordo com os gostos e vontades dos editores. Abrangendo estas variáveis, Albernaz e Peltier (1994) listam os principais aspectos visuais que definem fanzine: O design dos fanzines se submete aos princípios de: economia, experimentação, flexibilidade e legibilidade. Estes são princípios presentes em qualquer outro tipo de publicação, mas são os pesos e a linguagem assumida para expressá-los que dão característica especial ao visual dos fanzines (ALBERNAZ; PELTIER, 1994, p. 4).
Ainda sobre as questões relacionadas ao custo dos fanzines, todos os autores consultados citam a relação estabelecida a partir dos correios entre os fanzineiros de diversos estados: é bastante comum enviarem-se, junto ao zine, “flyers” de outras publicações ou mesmo
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Projeto de Graduação
do próprio fanzine. Esses “anúncios móveis” são reenviados por quem os recebe e assim por diante, estabelecendo um tipo de “marketing colaborativo” (ALBERNAZ; PELTIRER, 1994), em oposição à publicidade competitiva do mercado editorial tradicional.
5.1.1. Características gráficas Adentrando um pouco mais nos aspectos visuais desse tipo de impresso, existem alguns consensos entre autores que possibilitam reunir um conjunto de características gráficas que dizem respeito aos fanzines de forma geral, ajudando a encorpar uma possível definição do termo. Editorial O editorial é a página de expressão máxima do editor do fanzine, onde, de fato, mostra-se a que veio. Essas páginas costumam conter um alto nível de experimentação, ainda que também contenham textos muitas vezes longos. Essa combinação tende a pender para um dos lados: ou se prioriza a legibilidade do texto ou as imagens utilizadas. Nesse caso, os princípios básicos de design são confrontados com a regra máxima de se fazer fanzine, que é, basicamente, questionar regras. Grita-se, xinga-se, fala-se pelos cotovelos, manda-se uma mensagem simplificada, caligrafada, espelhada ou sintetizada. Pode-se mesmo ilustrar o editorial com ilustrações tão contundentes ou mais que o texto. A experimentação gráfica é autorizada ao máximo, estendendo-se na organização do expediente (ALBERNAZ; PELTIER, 1994, p. 8).
Dessa equação nascem as experimentações presentes nos diversos fanzines que, embora únicas entre si, possuem alguns “estilos” em comum, que se repetem no miolo das publicações.
Figuras 2, 3 e 4: páginas de editorial dos fanzines Punk (1985), Junkmail 4 (2000) e Bongolê Bongoró (2006) respectivamente. Fonte: Acervo digital do site Zinescópio4.
4. Disponível em http://zinescopio.wordpress.com, acesso em março de 2013.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
Colagens A reestruturação e intervenção em imagens retiradas de outros impressos se caracterizou como uma linguagem própria desse tipo de publicação. Não existe uma preocupação em relação a agregar obras feitas por outrem, numa apropriação constante. Basicamente, qualquer tipo de conteúdo pode ser agregado e transformado dentro de um zine. Assim também a colagem, pela possibilidade de visualização da anarquia, é recurso recorrente dos zineiros. Contrariamente do que se poderia pensar, sua utilização não tem relação direta com a economia ou a falta de recursos dos editores, devendo-se muito mais à criação de uma imagem caótica, na tentativa de expressar a diversidade real (ALBERNAZ; PELTIER, 1994, p. 14).
Esse recurso é utilizado nas mais diversas formas, seja com imagens ou textos recortados e colocados desordenadamente sobre a página ou em criações minimalistas e mais poéticas onde se adicionam poucos elementos combinados ao texto manuscrito.
Figura 5: página simples de Meninas Viciadas (2000) e página dupla de editorial do Dalí 5 (sem data). Fonte: Acervo digital do site Zinescópio5.
Figura 6: páginas espelhadas (sem numeração) do fanzine Quadrilha #1 (sem data). Este zine é composto exclusivamente por colagens, e o único elemento verbal presente na publicação é o título, na folha de rosto. A impressão que se tem é que as páginas fazem parte de uma colagem única. Fonte: Fanzine Quadrilha #1, acervo pessoal. 5 . Disponível em http://zinescopio.wordpress.com, acesso em março de 2013.
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Aprofundando-se nessa questão, percebe-se que a colagem é uma forte herança do movimento Punk da década de 70, que adotou o fanzine como seu veículo porta-voz oficial (MAGALHÃES, 2003). Fazendo-se a ligação com a história do design gráfico, pode-se ver com clareza a relação entre os dois universos. As décadas de 60 e 70 presenciaram o surgimento de uma série de movimentos de fundo político/social que acabaram por influenciar de forma decisiva o design e a tipografia entre eles o movimento estudantil, o psicodelismo e o punk (FARIAS, 2001. p. 24).
O movimento Punk é considerado responsável por agregar ao design aquilo antes considerado feio, o “ruído gráfico”, a “sujeira” e o não-design (KOPP, 2002). Frequentemente relacionado ao Dadaísmo por também se utilizar de colagens e do caos tipográfico, Kopp cita a afirmação de Hollis: “o Dadaísmo fora contra a arte, o vsv era antidesign” (HOLLIS, 2001, apud KOPP, 2002, p. 77). O autor continua: O estilo Punk é o estilo das ruas londrinas, representa a cultura das drogas e da música pop, deseja chocar e é rebelde com todas as suas energias. O principal veículo de comunicação do Punk é o fanzine. Ali eram utilizadas letras e imagens recortadas de jornais, máquinas de escrever, letras feitas a mão. Tudo era colado sem haver muita preocupação com a ordem ou o acabamento (HOLLIS, 2001, HELLER 1988 apud KOPP, 2002, p. 77).
Dessa forma, ao se observar imagens de publicações e criações relevantes desse período - a partir da década de 70 (figuras 7 e 8), nota-se muita similaridade estética com os fanzines observados em outros livros. A relação é ainda mais óbvia ao se considerar, além do aspecto visual, o âmbito temático do movimento Punk, que envolve muitas áreas de grande interesse fanzineiro de forma geral: quadrinhos, música underground e outros “tipos de manifestação low-culture” (FARIAS, 2001, p. 27).
Figura 7: capa do single God save the queen, lançado pela banda Sex Pistols em 1977. Design assinado por Jamie Reid, um dos principais expoentes do movimento Punk no design gráfico. Fonte: FIELL; FIELL, 20026. 6. FIELL, Charlotte; FIELL, Peter. Graphic design for the 21st century. Londres: Taschen, 2003.
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Figura 8: Supermarket Images and Sticker, poster de Jamie Reid, 1984. Nesta obra percebe-se claramente o uso da colagem, a apropriação de imagens (fotografias de supermercados e anúncios) e a composição desordenada, que assume o ruído e a sujeira gráfica como parte do resultado final. Fonte: WALKER, 20127 .
Pode-se afirmar que tal estética, que originou o movimento Punk e psicodélico e foi agregada ao design pós-moderno, influenciou as décadas seguintes e tomou vida própria nos dias atuais (KOPP, 2002). As características mais marcantes dos fanzines, antes do advento do desktop publishing, eram o uso de recortes de letras ou palavras, caligrafias propositalmente grosseiras, textos batidos a máquina e corrigidos a mão, uso de fotos em alto contraste, granulação obtida através do processo repetido de fotocopiagem de um original e disposição não-ortogonal dos textos, configurando uma estética tipográfica onde todo tipo de ‘erro’ era bem-vindo ou até simulado. Com o tempo, alguns experts do Xerox passaram a descobrir e divulgar recursos bastante econômicos para se obter resultados surpreendentes, como as técnicas do xerox ‘mexido’ em uma cor, e posteriormente em 4 cores. Estas experimentações foram rapidamente incorporadas pelo design gráfico ‘oficial’, principalmente em títulos destinados ao público jovem, como as revistas inglesas I-D e The Face (FARIAS, 2001, p. 28-29).
Farias completa afirmando que, com o advento dos computadores, muitos dos fanzines que passaram a ser produzidos digitalmente perderam o caráter experimental relacionado à produção manual, enquanto a sua estética original fazia-se cada vez mais presente nas academias de design. Porém, ao ser desviado de sua expressão inicial e popularizada, esta estética sofreu um certo processo de banalização, já que a relação entre conteúdo e forma acabou se perdendo no meio do processo, reduzindo as imagens a estilos sem substância (FARIAS, 2001). 7. WALKER, John A. Left Shift: Radical Art in 1970s Britain. Londres: I.B.Tauris, 2002.
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Figura 9: páginas simples dos fanzines Paranoia e Cala a Boca (2011) e Falamacia (2013) e página dupla de índice do Bongolê Bongoró (2006), respectivamente. Fontes: Paranoia e Cala a Boca: acervo digital de fanzines do blog 365 Fanzines8. Falamacia: acervo pessoal. Bongolê Bongoró: acervo digital do site Zinescópio9.
Provavelmente também é oriunda desta herança punk o posicionamento político de discurso que tornou-se característico dos fanzines a partir de então. Refletindo sobre o assunto, pode-se afirmar que, por se caracterizar como uma iniciativa que pretende “burlar” – ou apenas questionar – o sistema vigente (de mídia, disseminação da informação, publicação de impressos etc), o fanzine foi, desde seu nascimento, uma mídia meio punk e meio anarquista. Para Rudnei Kopp (2002), os fanzines são uma expressão gráfica pós-moderna em essência, por não se adequar a nenhum tipo de rigidez gráfica relacionada ao que é considerado “bom design”, e utilizar elementos visuais rejeitados pelo que considerou-se chamar de estilo internacional. A geometria é utilizada de forma descontraída, ou seja, pouca ou completamente despreocupada com a clareza e legibilidade. (...) Tendência a fragmentar imagens e criar múltiplas camadas (...) Uso de espaçamentos tipográficos aleatórios e mistura de pesos e estilos de tipo dentro do mesmo parágrafo ou palavra. Opção por colagens, paródias (...) Inclusão do Ruído (sujeiras, imperfeições, rompimento com o acabamento ‘limpo’ etc) (KOPP, 2002, p. 73).
Tipografia manuscrita Como o fazer manual está imensamente associado à produção de fanzines, encontra-se com frequência o uso de caligrafia na composição dos textos e elementos visuais (figuras 11, 12 e 13). Segundo Albernaz e Peltier, essa é uma forma de deixar o zine ainda mais conectado aos seus criadores: A vontade de interferir na mensagem, a despreocupação em relação à aparente perfeição das publicações profissionais, a incorporação do desenho como expressão tão forte quanto à tipografia recuperam o status da letra manuscrita ou da 8. Disponível em http://365fanzines.blogspot.com.br, acesso em março de 2013. 9. Disponível em http://zinescopio.wordpress.com, acesso em março de 2013.
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caligrafia, perdido no mar de impessoalidade que hoje impera nas comunicações. Pois em um zine, sente-se a mão do editor, do poeta ou do desenhista (ALBERNAZ; PELTIER, 1994, p. 13).
Figura 10: página do fanzine Atum (1994), capa do zine Tetas (Buenos Aires, 2008) e capa do zine Rocartê (2012), respectivamente. Fonte: acervo digital do site Zinescópio10.
Uma discussão importante é abordada, ainda que superficialmente, por Albernaz e Peltier (1994) ao se contrapor o caráter caótico que parece ser um dos principais aspectos gráficos de fanzines a um possível planejamento visual que possa ser explorado. Nesse caso os autores colocam que mesmo indo contra a corrente, os zines que possuem maiores cuidados e acabamentos gráficos o fazem com o intuito de gerar uma “personalidade gráfica” do impresso, ou seja, partem do mesmo princípio das experimentações. Tal constatação já deixa dicas para um possível relacionamento entre projetos em design e fanzines. Fica claro que, mesmo há quase duas décadas, já existia uma preocupação com a aparência dos fanzines e o destaque que um impresso poderia ter, dentre os outros. Mesmo com a disseminação do termo e a proliferação dos impressos, existe pouca bibliografia disponível a respeito da teoria e da prática de se produzir fanzine. No Brasil, alguns autores11 10. Disponível em http://zinescopio.wordpress.com, acesso em março de 2013. 11. Henrique Magalhães foi pioneiro em publicações sobre fanzine, sua editora Marca de Fantasia lançou um outro autor importante, Edgard Guimarães, e continua produzindo novos volumes relacionados ao tema. Albernaz e Peltier dedicaram-se ao assunto no Almanaque dos Fanzines, que também tornou-se referência, mas não revisitaram o tema desde então. Atualmente pode-se perceber uma grande movimentação de fanzineiros em prol da documentação e disseminação do fanzine em papel nos tempos da internet. Tal movimentação se dá através da realização de eventos, documentários (como o Fanzineiros do século passado, de Márcio Sno, 2011 / 2012), blogs dedicados ao assunto (como o zinismo e o zinescópio, o primeiro um fanzine virtual e o segundo uma database de fanzines recentes e antigos para download, de onde saíram muitas das imagens utillizadas neste trabalho) e gibitecas e fanzinotecas que mantém acervos dedicados a fanzines. É de grande valia também o trabalho realizado pela Ugra Press na produção dos Anuários de Fanzines, zines e publicações alternativas (2010 / 2011), onde encontram-se documentados e resenhados grande parte dos fanzines produzidos atualmente, além de artigos relacionados ao tema. Na segunda edição do Anuário, por exemplo, vê-se que existem muitos pesquisadores estudando fanzine como ferramenta educacional em escolas e universidades.
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tem se dedicado a abordar o assunto e constituir obras de referência sobre o tema. Tais publicações buscam definir de forma mais embasada o que é fanzine e tratam, principalmente, sobre as iniciativas brasileiras nesse âmbito.
5.1.2 Breve levantamento histórico da produção de fanzine O fanzine surgiu nos Estados Unidos como forma alternativa para a publicação de impressos amadores sobre ficção científica, que não encontravam lugar na mídia especializada. O primeiro fanzine que se tem registro é o “The Comet, criado em maio de 1930 por Ray Palmer para o Science Correspondance Club” (MAGALHÃES, 2003, p. 57). Em um curto período de tempo a iniciativa se espalhou por outros lugares do globo (a começar pela Europa, especialmente na França), gerando uma onda desordenada de novas publicações, que passaram a abordar temas diversificados. Um dos temas que mais se mostrou frutífero para a produção de fanzines e ganhou destaque com o passar dos anos e dos países foi o universo das histórias em quadrinhos, algo que permanece até os dias atuais (GUIMARÃES, 2005). De forma mais generalista, ao analisar uma possível semente histórica para o nascimento dos fanzines, Loyd Dunn12 afirma que: O movimento de zines evidentemente cresceu a partir de tradições de small press que têm raízes em atividades tão distintas quanto a panfletagem política, os auto-publicados e os idiossincráticos trabalhos de aristas como William Blake, a publicação de fanzines de sci-fi e fantasia (começando algumas décadas antes), samizdat (do russo para ‘auto-publicado’), boletins Dada como Le Coeur à Barbe ou Merz bem como o estereotipado (apesar de não único) espírito americano de independência e auto-confiança. Assim como para o Dada e o Surrealismo, e até mesmo para a mais geek das turmas de fantasia e ficção científica, o movimento de zines era uma rejeição à conformidade e uma tentativa de por a imaginação no banco do motorista. A estética despretensiosa do xerox ecoou, e algumas vezes fez uso direto, das qualidades dos métodos de détournement defendidos pelo situacionismo, e muitas vezes pareceu perfeitamente adequada às aspirações de uma sub-cultura anti-glamour que se sentia imersa em uma cultura com uma fixação patológica por sua própria superfície lustrosa, sem se importar com sua substância freqüentemente medíocre e sem apelo (DUNN, 2007).
Trinta e cinco anos depois do The Comet, surgiu o “Ficção, órgão informativo do Intercâmbio Ciência-ficção Alex Raymond, lançado em outubro de 1965, por Edson Rontani em Piracicaba, São Paulo” (MAGALHÃES, 2003, p. 67). Da mesma forma que a maior parte dos próximos fanzines a serem lançados no Brasil, Ficção tratava unicamente sobre quadrinhos, e foi criado no intuito de contatar e corresponder-se com outros fãs do tema.
12. Ex-editor da PhotoStatic Magazine, revista fundada em 1983 que veiculava criações gráficas que exploravam a fotocópia como linguagem e expressão gráfica, junto a poemas, textos, ensaios, ficções, arte-correspondência etc. Dedicou muitas de suas páginas ao universo dos fanzines e é referência dentro desse tipo de iniciativa.
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O Ficção faz parte do que Magalhães classifica como primeira fase da imprensa alternativa no Brasil (que vai do início da década de 60 a meados da década de 70). Tal fase se caracteriza, principalmente, por um posicionamento menos questionador e mais relacionado ao consumo de histórias em quadrinhos nos moldes norte-americanos (MAGALHÃES, 2003, p. 71).
Figura 11: alguns impressos alternativos da década de 1970. Respectivamente, capas de O Pasquim, Lampião e Movimento, jornais alternativos e independentes de forte carga política. Fonte: MAGALHÃES (2003).
O progresso dos fanzines esteve intimamente relacionado com as tecnologias em desenvolvimento, e a disseminação da fotocópia foi provavelmente o maior marco nesse aspecto. Segundo Magalhães (2003), os primeiros fanzines editados em mimeógrafos à tinta e álcool, eram elaborados com instrumentos mecânicos simples, mas viabilizavam pequenas tiragens com baixo custo. O desenvolvimento das fotocopiadoras provocou uma revolução na produção dos fanzines, abrindo a possibilidade da execução de projetos gráficos mais bem-acabados, incluindo amplamente o uso de ilustrações (LISBOA, 2011, p. 18).
Tal revolução se deu a partir de meados da década de 70 e caracterizou a década de 80 como um período fértil para os fanzines, que ganharam mais páginas, mais edições, leiautes graficamente mais elaborados e aprimorados, tiragens maiores. Essa foi a fase de expansão, quando de fato cada leitor tornou-se editor em potencial (...). Em meados da década de 1980, três pólos de produção se destacavam; era surpreendente a quantidade de fanzines lançados na Bahia, em São Paulo e Rio Grande do Sul, com muitos alcançando um bom nível gráfico-textual... (MAGALHÃES, 2003, p. 73-74).
Esse período consolidou e definiu a prática de se produzir fanzines no Brasil, agregando a este universo criações autorais e trabalhos de crítica, e, enfim, transformando o fanzine em um veículo alternativo e articulado de informação (MAGALHÃES, 2003).
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Porém, na segunda metade dos anos 80, a crise econômica e os altos níveis de inflação prejudicaram seriamente a produção dos fanzineiros, por afetar diretamente dois pilares das edições: o custo da fotocópia e das transições postais. Concomitantemente, muitos editores passaram por uma “crise de identidade” já que, por não conseguir encontrar alternativas ao aumento dos preços, não viam possibilidade de crescimento ou mesmo continuidade de seus fanzines. Felizmente, esse período de crise originou um processo de auto análise e auto-crítica no universo da produção de fanzines que resultou numa nova expansão e revitalização da prática nos anos 1990 (MAGALHÃES, 2003).
Figura 12: capas dos fanzines Decadance (1988), Logotipo (sem data) e Hiper Espaço (1983), respectivamente. Fonte: MAGALHÃES, 2003.
Neste período surgiram algumas soluções de produção para sobreviver à crise econômica. Um exemplo que é importante para esta pesquisa é a formação de alguns coletivos de fanzines, onde fanzineiros reuniam-se em prol de um fanzine em comum – ainda que, em alguns dos casos, os zines individuais de cada editor continuassem sendo editados. Magalhães (2003) coloca como exemplos mais significativos o fanzine Singular-plural, de São Luís, o gaúcho Quadrante Sul, e o paraibano L e Q do Brasil. O autor enfatiza a iniciativa do coletivo Barata, em Santos, que foi o único dos exemplos que de fato funcionou coletivamente por um período considerável, tendo sido responsável pelo lançamento de muitos quadrinistas nacionais e se tornado referência nesse aspecto. Outro ponto colocado por Magalhães (2003) é a dificuldade encontrada pelos editores de trabalhar em grupo. Muitos achavam que isto causaria uma perda de identidade no fanzine, que deixaria de ser totalmente autoral. Guimarães também cita que, via de regra, quanto maior for a equipe envolvida na produção do fanzine, maiores são as chances de ocorrerem desavenças e desentendimentos teóricos e conceituais (GUIMARÃES, 2005).
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5.2. Fanzine, design gráfico e identidade Compreende-se que possa haver certa resistência em se afirmar que um impresso experimental, ou seja, que não atende às especificações de projetos mais tradicionais em design gráfico e editorial, pode ser fruto de um projeto de design. De fato, um fanzine é um impresso que, apesar de comportar-se basicamente como um veículo de comunicação, possui infinitas peculiaridades e autenticidades, principalmente no que se refere à sua apresentação visual. Além disso, fanzines são reconhecidos e caracterizados por possuírem um caráter amador e experimental, que, supostamente, dispensa maiores cuidados em seu planejamento e feitura. Analisando a questão por outro viés, Guimarães (2005), entre outros autores, afirma que o que caracteriza determinado impresso como fanzine, essencialmente, é a identidade que seu editor (ou seus editores) lhe imprime. Assim sendo, seria lógico afirmar que um fanzine produzido por designers seria fruto de um processo de design. Certamente não o mesmo processo projetual de revistas ou livros produzidos em larga escala e que abrangem estratégias de marketing e identidade corporativa, mas também um processo que utiliza o design como ferramenta de planejamento, construção e atribuição de identidades e significados alheios à natureza intrínseca do que se pretende produzir (DENIS, 1998). A abordagem proposta pelo fanzine tem relação direta com conceitos de cultura material e visual abordados por áreas das ciências sociais, como a sociologia e a antropologia. Tais conceitos também estão intimamente relacionados à área do design e do design gráfico, de forma geral. Rafael Cardoso Denis (1998) coloca que a cultura material de determinada sociedade é uma forma de compreender os artefatos que consumimos e produzimos. Sendo o design “um sítio privilegiado para a geração de artefatos” na sociedade industrial, ele "constitui, a grosso modo, a fonte mais importante da maior parte da cultura material de uma sociedade que, mais do que qualquer outra que já existiu, pauta a sua identidade cultural na abundância material que tem conseguido gerar" (DENIS, 1998, p. 22). A cultura material de determinada sociedade em determinada época é traçada através do estudo sistemático de sua produção material, ou seja, os objetos que são produzidos e consumidos pela população em questão. Dentro deste conceito, porém com um universo particular tão complexo quanto o que o envolve, tem-se a cultura visual. Combinando estudos culturais, história da arte e antropologia, este campo de conhecimento consiste no complexo conjunto de imagens que permeiam, ditam e acompanham a vivência contemporânea (GRUSZYNSKY, 2007, p.15). Ainda segundo Gruszynski (2007), a noção de que a pós-modernidade é profundamente marcada pelo predomínio da imagem é confirmada pela difusão massificada de tecnologias e práticas sociais em que a experiência humana é mediada através de telas. A inserção da imagem como fator determinante na sociedade atual se dá com tal intensidade que “a imagem não é apenas parte da vida cotidiana, mas é ela própria” (Mirzoeff apud Gruzynski, 2007, p. 9). Dessa forma, considera-se que a visualidade também possa se
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comportar como um espaço de interação social, gerando momentos de contestação, debate e transformação que evidenciam “o visual como um espaço onde sentidos são criados e contestados” (Gruzynski, 2007, p. 10). Ao ler um periódico, o leitor estará construindo os sentidos a partir de um conjunto de informações que provêm, de um lado, da informação visual que corresponde ao texto como representação gráfica da mensagem; de outro, de informações não-visuais, que atuam como um quadro de referências pessoais que abrangem o conhecimento linguístico, experiências pessoais, culturais, representações de mundo, etc. (Gruszynski, 2006, apud COLLI, 2011, p. 20).
Assumindo que o planejamento da comunicação gráfica é um campo de conhecimento específico que integra sociedades e suas culturas (COLLI, 2011) e, mais importante que isso, é uma prática que proporciona formas tangíveis a conceitos abstratos e complexos sobre comportamento e identidade (FORTY, 2007, p.12), fica clara a ligação entre este campo e os conceitos de cultura visual e material. Analisando mais a fundo o processo de criação de imagens, Adrian Forty (2007) coloca que “de todas as maneiras pelas quais o design pode influenciar nosso pensamento, a única reconhecida amplamente foi seu uso para expressar a identidade das organizações” (FORTY, 2007, p. 301). O autor frisa que o design é utilizado por organizações de diversas naturezas para transmitir ao público em geral quem são, o que fazem e qual a sua postura frente à sociedade. Ou seja, o design é uma ferramenta através da qual identidades são construídas, comunicadas e modificadas dentro das sociedades modernas. De fato, enquanto noção e objetivo a ser alcançado a identidade pode ser considerada uma constante no cotidiano de trabalho do designer gráfico. Tentando situar-se em relação a ela, entendê-la e destrinchá-la, o profissional vive seu processo de criação movendo-se no interior de uma verdadeira rede de identidades superpostas e interagentes. De tal forma que o nível de seu desemprenho depende, em grande parte, do grau de capacidade que demonstre de resolver questões que, no fundo, não passam de questões de identidade, nos vários planos em que elas se colocam a cada trabalho (ESCOREL, 1999, p. 45).
Ainda segundo Ana Luisa Escorel, o designer precisa processar dados de sua própria identidade, evitando receitas e caminhos já conhecidos, em vias de compreender o surgimento de processos associativos originais para cada novo trabalho (ESCOREL, 1999). Basicamente, a autora recomenda que cada novo trabalho exige um olhar crítico do projetista para definir até que ponto é interessante seguir processos tradicionais e estéticas consagradas e até que ponto deve-se ignorá-los ou transgredi-los (ESCOREL, 1999). É necessário também equalizar todas as questões de identidade presentes em cada projeto: a identidade de quem necessita do serviço, de quem o consumirá, de quem ele representa, de quem o projeta.
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Na realidade, para o design gráfico, a identidade visual de um produto é tão relevante quanto sua função, identidade aqui entendida como forma final, resultado de decisões de caráter tecnológico, estético e mercadológico, como conjunto de relações que exprimem apenas aquele sistema de informações, nenhum outro (ESCOREL, 1999, p. 46).
A identidade corporativa é o setor do design gráfico que abrange os projetos cujo principal objetivo e função é definir visual e graficamente o perfil de determinada empresa e/ ou seu produto. Nesta área “a solução de problemas obedece a uma série de procedimentos que constituem quase que um modelo de abordagem às questões gráficas, de maneira geral” (ESCOREL, 1999, p. 46). Percebe-se que tal constatação pode ser aplicada também a outras áreas do design gráfico, que também fazem uso da repetição de padrões já consagrados na tentativa de moldar e aplicar identidades gráficas aos mais diversos produtos (livros, revistas, cartazes etc). Gruszynski (2008) coloca que a partir da década de 1930 o design gráfico já era uma ferramenta utilizada para ordenar informações complexas e diferenciar marcas e produtos, associando os mesmos a um “estilo”. Segundo Kopp (2002), revistas e periódicos em geral não possuíam logos e aplicações fixas em capas e no miolo até aproximadamente a década de 1940, quando A mutabilidade do design passa a ser vista como antiga, ineficiente, instável, desordenada, irracional, ou seja, não apropriada ao mundo modernista dos racionalistas e funcionalistas. O Modernismo romântico e simbólico não estava de acordo com as linhas de montagem, com a indústria fordista e taylorista, não era útil ao progresso (KOPP, 2002, p. 107).
As vanguardas modernistas do design gráfico (Bauhaus, Estilo Internacional, Nova Tipografia), os acontecimentos históricos a partir da década de 40 (o fim da segunda guerra, a guerra fria, a evolução dos sistemas de produção em massa) e as transformações da sociedade urbana e industrial foram catalizadores de uma forte tendência racionalista e minimalista nas composições daquilo que era considerado “bom design” – design feito de acordo com as regras traçadas pela academia na época, com fortes influências de movimentos vanguardistas como o De Stjil e o Construtivismo. O design gráfico modernista (figuras 16 e 17) rejeitava qualquer tipo de inserção gráfica sem justificativa funcional e prezava acima de tudo pela legibilidade e clareza do conteúdo, cultiva a objetividade acima da subjetividade (BROCKMANN apud SAMARA, 2007, p. 18), rejeitando estilos anteriores e voltando-se para a definição de novos direcionamentos e códigos visuais relativos à prática de design gráfico. Escolas como a Bauhaus – que evidenciava a racionalidade, ordem e simplicidade - ou a chamada Escola Suíça – que estabeleceu o Estio Internacional, baseado em arranjos gráficos sustentados por um rígido sistema de diagrama (grid system) e formas minimalistas - identificam orientações que ainda hoje regem muitos praticantes do design (GRUSZYNSKI, 2008, p.12).
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Figura 13: páginas de Elementare Typographie (Tipografia Elementar), 1925. Folheto de Jan Tschichold responsável por explicar e disseminar os conceitos e aplicações básicos do design gráfico modernista. Fonte: MEGGS, 2009.
A difusão, tanto no universo acadêmico quanto profissional, de determinados métodos, normas e regras de processo em design para o desenvolvimento de projetos influencia diretamente nas decisões tomadas por profissionais e produtores, de modo geral, no que diz respeito aos trabalhos desenvolvidos (GRUSZYNSKI, 2008). Assim, a partir dos anos 1960, o uso de complexos e esmiuçados sistemas de grid no desenvolvimento de identidades visuais e sistemas de comunicação diversos era altamente difundido no mercado de design (SAMARA, 2007). Outras características estéticas do que se pode chamar de design modernista são a assimetria, o uso positivo do espaço em branco, ausência de ilustrações ou adornos de qualquer natureza, arranjo do layout em linhas oblíquas e verticais, adoção de papeis padronizados pelo sistema DIN, entre outros (figuras 16 e 17). Tais paradigmas buscavam não somente a criação de um novo design, mas explicitar também os conceitos supervalorizados de funcionalidade, necessidade e utilidade (KOPP, 2009). Porém, com o passar dos anos e a disseminação massiva, os ideais modernistas de design gráfico transformaram-se em padrões vazios, repetidos mecanicamente sem reflexão ou contestação.
Figura 14: Cartaz de exposição feito por Herbert Bayer, diretor da Bauhaus na época, 1926. Percebe-se claramente a ausência de ornamentos, a hierarquização clara dos conteúdos, a utilização de tipos sem serifa, entre outras características marcantes do design modernista. Fonte: MEGGS, 2009.
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Na segunda metade do século XX, transformações ainda maiores surgiram dentro da sociedade mundial. Mais do que nunca, as características que tangenciaram a modernidade solidificaram-se e agravaram-se, fornecendo a base para questionamentos e mudanças. Foi a partir de meados da década de 1960, com o surgimento de movimentos de cunho político e social (como o Punk e o Movimento Estudantil), que as primeiras contestações ao modus operandi padrão do bom design começaram a acontecer, definindo lentamente o que hoje é conhecido como design pós-moderno (FARIAS, 2001, p. 24). Assim como o uso de grids na prática moderna do design derivou do desenvolvimento da tecnologia, do pensamento estético e da industrialização, o uso de métodos alternativos, intuitivos de composição – dominantes na prática atual – surgiu destas mesmas influências (SAMARA, 2007, p.112).
Figura 15: cartaz de exposição do grupo Grapus, 1982. “Camadas sobrepostas de símbolos gráficos emocionalmente carregados se contradizem e desconcertam os espectadores” (MEGGS, 2009, p.574). Fonte: MEGGS, 2009.
Se o chamado design moderno consiste em movimentos e escolas que defendem e partem dos mesmos princípios e conceitos, o design pós-moderno caracteriza-se como “uma confluência casual de várias teorias e práticas de designers e escolas espalhadas pelo mundo, uma verdadeira distinção ao Estilo Internacional (baseado no dogma)” (KOPP, 2007, p.72). Ou seja, convencionou-se chamar de design pós-moderno os estilos e escolas que fogem da rigidez imposta pelo modernismo, desafiando padrões convencionais de leitura e composição ao adotar elementos decorativos, despreocupação com legibilidade, fragmentação de imagens, ausência (ou desconstrução) de grid, espaçamentos tipográficos aleatórios, uso de colagens e apropriação de imagens e referências artísticas.
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A marca registrada da pós-modernidade é o pluralismo, ou seja, a abertura para posturas novas e a tolerância ara posições divergentes. Na época pós-moderna, já não existe mais a pretensão de encontrar uma única forma concreta de fazer as coisas, uma única solução que resolva todos os problemas, uma única narrativa que amarre todas as pontas (CARDOSO, 2000, p.206).
Figura 16: cartaz de divulgação do curso da Cranbrook Academy of Art, 1989. A sobreposição de diversas camadas de cores, informações e imagens forma uma composição de caos controlado, sem grid ou hierarquia clara. Fonte: MEGGS, 2009.
O Psicodelismo, o Punk, o New Wave, a Cranbrook Academy (figura 19) e designers como Edward Fella (figura 20), Neville Brody, David Carson e o grupo Grapus (figura 18) foram os principais responsáveis por difundir a quebra com o modernismo e as novas tendências estéticas pós-modernistas. O intuito máximo destas iniciativas seria explorar novas possibilidades gráficas e visuais a partir de experimentações e desconstruções de tipografia e grid, em vias de transformar o leiaute em algo interativo, forçando o leitor a realizar interpretações e buscar a compreensão da peça gráfica. Dessa forma, questionava-se não só os princípios funcionalistas e estruturalistas, como também a própria razão de ser do design e da tipografia como linguagem expressiva e subjetiva, sujeita “aos sentimentos, à carga emotiva do designer/tipógrafo, e a suas escolhas e interpretações” (MIGLIARI, 2010, p. 27). Pós-modernismo é ainda o argumento para a diversidade na forma e no estilo, a celebração da individualidade em detrimento da linguagem universal do design – premissa do design funcionalista, a substituição da objetividade pela subjetividade, da simplicidade pela complexidade. Tudo isso subsidiado pela revolução dos computadores nos meios de comunicação, incluindo aí as produções gráficas, e em especial, o design de fontes digitais (HELLER & FILI, 1999, apud MIGLIARI, 2010, p. 80).
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Figura 17: Edward Fella, anúncio para uma palestra, 1995. Feito com letras manuais combinadas à tipografia e colagens. Mesmo com a ausência de um grid ou hierarquia clara, percebe-se uma lógica por trás da composição, de forma geral. Fonte: MEGGS, 2009.
Segundo Samara (2007), as movimentações pós-modernas no design gráfico foram responsáveis por descobrir um novo potencial visual, novas alternativas que desbancaram o uso do grid como o único sistema possível para a organização visual de uma peça gráfica, explicitando que o contexto de produção é um importante fator para a determinação do melhor sistema para um projeto. O autor cita a revista Ray Gun, de David Carson, como um exemplo em que observa-se como “a ferocidade dos leiautes e a constante destruição da conformidade a cada página definem visualmente um sistema identificável e inteligível, apesar da ausência de uma estrutura editorial coerente” (SAMARA, 2007, p. 119). Farias (2008) também cita a revista como um exemplo de consistência gráfica através da ausência de grid, da desconstrução de elementos gráficos e do aparente caos visual (figura 18). Outros designers da época e iniciativas não-convencionais de design – como Edward Fella (figura 17), Neville Brody, David Carson e a revista Emigre, que também funcionava sem projeto gráfico e abusava de experimentações (KOPP, 2009) – ajudaram a propagar e consolidar um “sistema para gerar coerência visual através de gerações intuitivas e espontâneas” (SAMARA, 2007, p. 119), violando ideais tradicionais (modernistas) de organização e apresentação em favor de uma estrutura que inclua outras linguagens visuais como o cinema, o vídeo e a internet. As abordagens organizacionais intuitivas e individualizadas passaram a estar em pé de igualdade com abordagens racionais baseadas em estruturas de grid. O instrumental do designer agora inclui vários métodos de transmitir ideias, e ele pode escolher a ferramenta mais adequada para um determinado projeto (SAMARA, 2007, p. 119).
Kopp (2009) define como cambiante o tipo de design que não pode ser definido como moderno ou pós-moderno, transitando entre movimentos e estilos, e existindo como algo mutante e flexível por natureza. Para exemplificar sua tese, o autor dedica uma seção do livro aos “Projetos Gráficos Cambiantes”, onde analisa as mudanças mais e menos comuns dentro de revistas de grande circulação. Segundo ele, alterações de edição para edição no que se refere à aplicações do logo na capa, tipografias das chamadas e formato são comuns
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e não caracterizam o impresso como cambiante. Para exemplificar de fato o que o caracterizaria, o autor disseca as revistas Ray Gun (Estados Unidos), Big (Estados Unidos), Matiz (México) e Sexta-Feira (Brasil). Tais impressos se diferenciam por apresentar um fluxo de combinações não-repetitivas, sem projetos gráficos solidificados, fazendo uso descabido de experimentações e processos diferenciados (fotografias de longa exposição, sem foco, tipografias sobrepostas sem espaçamento fixo, processos de xerox etc), e muitas vezes deixando de lado princípios considerados imprescindíveis como a legibilidade e a hierarquia de informações. O tratamento gráfico acompanha o público-alvo e o projeto editorial das revistas. A Ray Gun, por exemplo, trata de música e comportamento e é voltada a um público jovem, habituado à estética mutante, entreposta e recortada dos videoclipes (figura 18). A Matiz, voltada para designers gráficos, explora ao máximo a profusão, variedade e construção de imagens, e, assim como a Big, muda de equipe gráfica a cada número. A duas últimas e a Sexta-Feira exploram temas diferentes e específicos a cada edição, o que também acaba por justificar e caracterizar as mudanças constantes.
Figura 18: capas e páginas espelhadas de edições da revista Ray Gun durante o ano de 1997. Fonte: Site-portfolio do diretor criativo executivo Chris Ashworth13 13 . Disponível em http://www.chris-ashworth.com/ray-gun-publish/ray-gun-magazine-covers/, acesso em março de 2013.
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Se os exemplos apresentados por Kopp (2009) podem parecer datados, Leslie (2003) aborda o assunto de uma perspectiva mais contemporânea, dedicando um capítulo de seu livro ao que ele chama de “microzines”. Basicamente estas são revistas independentes de realizadores diversos que possuem propostas diferenciadas, artísticas, experimentais e inovadoras, e que se encaixam no conceito de “projeto gráfico cambiante” (KOPP, 2009). Não, não são fanzines, mas compartilham com estes o fato de que sua aparência está indiscutivelmente ligada à determinação e ao caráter independente de seus criadores. Segundo Jacovides (apud LESLIE, 2003), estas revistas se diferenciam pela capa, geralmente sem chamadas, pelo tratamento diferenciado da relação entre texto e imagem, a ausência de publicidade - as revistas sobrevivem de uma combinação entre as vendas (são produtos caros) e patrocínios - dificilmente possuem um número igual ao outro e algumas delas chegam a ultrapassar a barreira entre o que seria uma revista e um livro de arte. Mas seria um erro afirmar que as microzines estão a tentar definir uma nova linguagem de design para as revistas do mercado de massas. As microzines querem fazer as coisas nas suas próprias condições. [...] Está a surgir uma tendência nas microzines para questionar a própria natureza do que é uma revista, como funciona ou como poderia funcionar (JACOVIDES apud LESLIE, 2003, p. 17).
Dentre os exemplos mais interessantes estão a Visionaire (Estados Unidos), que muda totalmente a cada número e costuma trazer “acessórios” como caixas de luz e bolsas (figura 19); a Nest que “quebra todas as regras” (JACOVIDES apud LESLIE, 2003, p. 17) ao aplicar padronagens e cores aos espaços em branco das páginas; a Mined (Inglaterra) que não possui capa e é encadernada como livro de forma que suas páginas necessitam ser rasgadas pelo leitor para se ler o conteúdo; a Nice Magazine (Inglaterra) que é um pedaço retangular de MDF com impressão nas duas faces. É inútil perguntar onde nos levam estas experiências. Algumas serão assimiladas pelas tendências dominantes demonstrando que a revista está a atingir a maturidade. Está a avançar para além de sua função de veículo de disseminação de informação acerca do que existe fora dela – o jornalismo. Talvez a percepção mais estimulante para os criativos seja que os seus títulos podem aspirar a ser arte, não existindo por nenhuma outra razão para além da sua existência (JACOVIDES apud LESLIE, 2003, p. 17).
Figura 19: Exemplares das revistas Visionaire com os temas Fantasie (número 26), Woman (número 29), Love (número 38), Travel (número 41) e Black (número 7), respectivamente. Fonte: Acervo digital da revista Visionaire14. 14. Disponível em http://www.visionaireworld.com/issues, acesso em março de 2013.
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Ainda assim, como se dá o processo de construção de um periódico, empiricamente falando? Restringindo a discussão aos impressos mais interessantes para este trabalho, no caso livros e revistas (já que dificilmente se encontram estudos de caso ou mesmo menções bibliográficas a impressos mais experimentais como os fanzines sob a ótica do design), cujas características e o próprio funcionamento pode ser facilmente adaptável para a aplicação em fanzines. Começando pelo início, tem-se a estruturação do impresso em si, de acordo com algumas etapas que envolvem conceitos que podem ser úteis no desenvolvimento do projeto em questão. Segundo Ambrose e Harris (2009), o planejamento de um impresso tem início primeiramente na imposição de páginas, onde o designer pode planejar e estudar o comportamento físico do impresso, que tipos de papeis utilizará, como será a sua encadernação. A partir destas definições, e mantendo em mente que cada decisão tem suas particularidades (como que tipo de papel é mais adequado para determinado conteúdo etc) pode-se seguir para a confecção do leiaute a ser desenvolvido. O leiaute é basicamente a maneira como as imagens e o texto de determinado impresso se comportam (AMBROSE; HARRIS, 2009). É ele quem dá “a cara” de determinada publicação, interferindo diretamente na relação que o autor constrói com a peça gráfica. Leiautes podem fazer com que o leitor navegue facilmente entre grandes quantidades de informação ou fazer com que ele se perca dentre os conteúdos apresentados. Tudo depende essencialmente da identidade que se pretende emprestar ao produto final. O grid é o guia da organização dos elementos presentes em cada página do impresso. Segundo Samara (2007), o grid é uma forma de introduzir ordem ao leiaute, organizando as informações de maneira sistemática e facilitando o processo de diagramação. Além disso, o grid seria grande responsável pela manutenção de identidades em impressos que pertencem a uma série ou que remetem automaticamente a determinada marca ou produto. A definição do grid ou mesmo de se utilizar um vem diretamente do conteúdo, que merece, em primeira instância, uma profunda análise. Existem vários tipos de grid de acordo com as múltiplas naturezas de trabalhos (revistas, jornais, catálogos, folders etc), que determinam alguns modelos estruturais para que a construção do grid específico possa se dar de maneira mais simples. Como este trabalho se inclui no universo da criação sem amarras corporativas ou mercadológicas, tais padrões não são relevantes. Por outro lado, quando Samara passa a destrinchar a desconstrução do grid, o assunto torna-se bastante interessante. Às vezes, o conteúdo tem uma estrutura interna própria que nem sempre o grid consegue esclarecer; às vezes, o conteúdo deve ignorar totalmente a estrutura para criar tipos específicos de reações emotivas no público alvo; às vezes, o designer simplesmente quer um envolvimento intelectual mais complexo do público, como parte de seu contato com o objeto (SAMARA, 2007, p. 120).
O autor ainda coloca que a organização orgânica e, de certa forma, conscientemente caótica de impressos atuais é uma tentativa de criar impressões significativas capazes de concorrer com a avalanche de imagens e informação não-estática às quais o leitor contemporâneo se habituou (SAMARA, 2007).
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Dentre os diversos exemplos de possibilidades de desconstrução, os que mais interessam a este trabalho são a desconstrução linguística e a operação aleatória. A primeira refere-se à utilização de inserções verbais para quebrar a estrutura do grid. A segunda diz respeito a inclusão do acaso na construção do grid. Tal inclusão pode se dar de diversas formas, mas sempre de maneira “controlada”. Ou seja, o designer faz uso do acaso em certos aspectos, mantendo outros sob controle e assim “direcionando” o resultado, ainda que de forma indireta, e ainda assim obtendo combinações e relações visuais novas e orgânicas (SAMARA, 2007, p. 127). Há também a possibilidade de se projetar o impresso de forma que o autor, ao folheá-lo, possa traçar novas conclusões através da combinação aleatória das páginas. Chamada de cadavre exquis, é uma técnica apropriada do surrealismo que explora o acaso controlado (AMBROSE; HARRIS, 2009, p. 98).
Figura 20: exemplos de grid com desconstrução linguística. Fonte: SAMARA, 2007.
Figura 21: Exemplos de grid com utilização de cadavre exquis. Fonte: AMBROSE; HARRIS, 2009.
Outra questão a ser decidida é a encadernação do impresso. Ela se relaciona intimamente com a forma física do mesmo, ou seja, como ele se apresenta como objeto. Além disso, cada método de encadernação tem diferentes implicações no processo de diagramação e no projeto gráfico. É uma das características fundamentais do impresso, já que remete à própria essência do ato de design: dar forma à matéria (FLUSSER, 2007, p. 28). Observa-se que o formato e a encadernação, combinados, são o que indicam a natureza do impresso em questão. Não só de forma geral (livro, revista, mostruário, jornal) como também específica, a partir do momento em que conceitos mais ou menos óbvios ao leitor
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à primeira vista são abordados diretamente na apresentação do impresso. Estas escolhas, combinadas e interligadas ao leiaute, podem intensificar sensações e sentidos relativos ao caráter e ao conteúdo do material (AMBROSE; HARRIS, 2009, p.109), assim como “atribuir-lhes significados alheios à sua natureza intrínseca” (DENIS, 1998, p. 17). Pode-se concluir que as decisões de design relacionadas ao projeto de um impresso específico são diretamente responsáveis pelas cadeias de significações traçadas pelos usuários ao entrar em contato com o objeto em questão. A partir do momento que tais decisões e conceitos são mais ou menos absorvidos e explorados, o impresso particular torna-se mais diferenciado e pode se relacionar melhor com o público que o consome, tornando-se parte de um complexo sistema de construção de identidades. Não, a função do designer não é de atribuir ao objeto aquilo que ele já possui, aquilo que já faz parte (in haerere) da sua natureza, mas de enriquecê-lo, de fazer colar – aderir mesmo (ad haerere) – significados de outros níveis bem mais complexos do que aqueles básicos que dizem respeito apenas à sua identidade essencial. Conforme assinalei acima, esses significados podem ser de ordens diversas, desde questões de segurança e facilidade de uso, até noções de moda, prestígio ou sexualidade (DENIS, 1998, p.35).
Este papel de coautor assumido pelo designer pós-moderno perpetuou-se para a contemporaneidade de múltiplas formas. Generalizando, pode-se afirmar que o tratamento (de simples mediação ou coautoria) dado a determinado leiaute está essencialmente relacionado não só ao teor do conteúdo em si, como também ao público que vai consumi-lo: “se você não pode ler alguma coisa - não tem importância, ela provavelmente não foi escrita para você” (VIENNE apud GRUSZYNSKI, 2008, p. 91). O posicionamento mais “artístico” do designer gráfico pós-moderno ultrapassou a fronteira do underground para ser absorvido pela grande mídia comunicacional, e finalmente pela sociedade ocidental, de forma geral. Atualmente, vive-se um paradoxo entre a legibilidade e a inovação, por assim dizer. O design deve fazer a junção daquilo que pode ser lido e entendido pelo leitor, sem sufocar por completo as intenções do autor. Por outro lado, a simples repetição da estética modernista, sem nenhum aspecto de novidade ou inovação, é insuficiente no objetivo de produzir no leitor sensações, ou mesmo o interesse necessário para apreciar determinada peça gráfica.
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Levantamento de dados
6.1 Referências atuais em fanzine Atualmente a produção de fanzines e revistas alternativas tem ganhado visibilidade no Brasil. Algumas iniciativas de várias partes do país conseguiram atingir sucesso considerável. Além disso, a internet tem provido um campo fértil de divulgação e disseminação de vários fanzines e iniciativas de mesmo cunho. Através dela ocorre uma comunicação intensa entre os produtores de fanzine nacionais, o que permite uma vasta interação e circulação de impressos pelo país. A área dos quadrinhos continua sendo uma das de maior visibilidade no cenário nacional e internacional, existindo um número considerável de revistas e fanzines dedicados a fomentar e divulgar as HQs tupiniquins. É claro que os fanzines têm sofrido mudanças estéticas e de formato com o advento das novas tecnologias. Muitos migraram de vez para o digital, configurando aquilo que se veio a chamar de e-zines. Sobre essa nova etapa dos fanzines, Henrique Magalhães, em entrevista concedida ao portal Ugra Press15, afirma que: Nesse percurso ocorreram algumas experimentações com relação à transposição dos fanzines para a internet, com forte migração nos primeiros anos e certo recuo na atualidade, com a ascensão do blog. Há ainda muitas indefinições conceituais. Para alguns, os blogs, por seu caráter amador, confidencial e interpessoal, vieram tomar o papel do fanzine. Para outros, há o fanzine eletrônico, ou ezine, que se trata de uma revista dedicada a uma expressão artística. A definição de fanzine permite essas liberdades no uso de sua nomenclatura, mas o certo é que os fanzines impressos não deixaram de existir, melhoraram em qualidade gráfica e em seu apuro editorial, embora haja uma sensível retração em sua produção (MAGALHÃES, 2011).
O portal Ugra Press é um bom exemplo da revalorização dos fanzines no Brasil. Auto-denominados “uma empresa a serviço da Queda e do Nada”, se trata de um “projeto experimental interdisciplinar sem fins lucrativos focado na produção, pesquisa e fomento de cultura radical e alternativa” (UGRAPRESS, s.d.), de jovens que têm se dedicado a publicar 15. Entrevista publicada em 28/04/2011 no endereço http://ugrapress.wordpress.com/2011/04/28/henrique-magalhaes, acesso em outubro de 2011.
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e disseminar a prática de zines por aí. No manifesto que busca explicar a motivação do portal (que também é blog, selo e editora), encontram-se os mesmos conceitos de imprensa alternativa, faça você mesmo, mídia independente, entre outros, também vistos em muitas das publicações sobre fanzine abordadas por este estudo. Nas palavras da Ugra Press, Reconhecemos a movimentação alternativa como berço da maior parte da produção cultural relevante nas últimas décadas. Desde que a cultura passou a ser um bem de consumo, consolidou-se o discurso raso e as ideias simplórias como padrão. Consequentemente, as propostas divergentes passaram a ser alternativas. Eventualmente, elas adquiriram as mais diversas características e formas de expressão: da poesia beatnik de Jack Kerouac ao anarcopunk do Crass, do cinema de transgressão de Nick Zedd ao black metal misantropo do Burzum (UGRAPRESS, 2010)16.
Em fevereiro de 2011 a Ugra Press lançou seu 1° Anuário de fanzines, zines e publicações independentes, com uma compilação de mais de 120 resenhas de zines de todas as partes do país, da qual o Foi à Feira #1 fez parte. Em um artigo publicado neste mesmo anuário, Gazy Andraus17 concorda com Magalhães: “... os fanzines são criações independentes, libertárias, paratópicas, imagético-literárias, anárquicas, vivas, bidimensionais (e até tri- ou quadridimensionais), e que se refletem atualmente na forma de blogs (mescla de zines com diários) na internet” (ANDRAUS apud UTESCHER, 2001, p.36). O anuário fornece uma visão geral dos fanzines produzidos no Brasil, inclusive contendo dados estatísticos sobre as publicações recebidas. Nestas estatísticas percebe-se que a xerox ainda é o meio mais comum de produção de zines, quadrinhos são de fato a temática mais comum, e que a região sudeste é a maior fonte de zines, em comparação com as outras regiões brasileiras (UTESCHER, 2001). O segundo anuário foi lançado em 2011 e abrange também a América Latina e Portugal. Mesmo com a importância da internet, é consenso entre os autores que os zines impressos dificilmente deixarão de existir. Alex Vieira, fanzineiro capixaba de Vila Velha e produtor da Revista Prego (que é provavelmente o melhor exemplo de revista alternativa independente bem sucedida no Espírito Santo), afirma que As publicações artísticas na internet não excluem as publicações impressas. São mídias completamente diferentes e cada uma tem suas vantagens e desvantagens. Eu acredito que se eu tivesse feito a mesma publicação da Prego na internet, ela teria resultados completamente diferentes. Devido à publicação impressa, participei de diversos eventos e lançamentos pelo Brasil, pude conhecer como funciona o sistema de venda de quadrinhos nas maiores lojas de quadrinhos e obtive um “tato” maior com as pessoas envolvidas nesse tipo de arte. Sinceramente, sou viciado em internet e não me lembro da última vez que li uma revista virtual por inteiro, agora posso citar diversas revistas e impressos que li nestas últimas semanas (VIEIRA, 2011).
16. Disponível em http://ugrapress.wordpress.com/2010/02/18/manifesto-da-ugra, acesso em outubro de 2011. 17. Doutor e pesquisador do Observatório de Quadrinhos da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP).
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Ao discorrer sobre as novas produções em fanzine, MAGALHÃES (2004) salienta que a melhor forma de desenvolver fanzine é através da criação de pequenos grupos, associações ou cooperativas, pensando a edição como um trabalho planejado, estruturado em nível de pequenas editoras, que podem, inclusive, passar a editar outros projetos alternativos de publicações, como já ocorre com alguns desenvolvedores, como as Revistas Prego (ES) e Samba (DF), que tornaram-se pequenas editoras de trabalhos autorais fora do meio comercial.
6.1.1 Produção nacional Alguns exemplos significativos de publicações independentes brasileiras são brevemente descritos a seguir. Para ilustrá-los, optou-se por selecionar imagens das capas, páginas de sumário e/ou créditos e de editorial, além de exemplos interessantes do miolo. Tais páginas receberam atenção especial por serem os exemplos de maior “identidade gráfica” dentro dos fanzines e das revistas, por possuírem um aspecto mais textual e sistemático, que demostra de fato a visualidade adotada pelo impresso, já que seus conteúdos são altamente variáveis. Revista Samba (2008, Brasília – DF): sua segunda edição foi lançada em 2010, a terceira está em processo de financiamento coletivo. Publica quadrinhos independentes e experimentais de autores de todo o país. Apenas quatro de suas páginas não possuem conteúdo autoral, uma para o sumário, outra para o editorial (figura 23) e duas de anúncios de página inteira: um da própria revista e outro curiosamente da revista Prego. Sofreu uma grande mudança da primeira para a segunda edição (figura 22), passando de 64 para 132 páginas, do acabamento em grampo canoa para a encadernação de lombada quadrada. Quanto aos papéis utilizados, não houve mudanças e ambas edições possuem miolo em papel offset de cerca de 90g/m2 e capa em papel cartão supreme com laminação fosca. Em termos de projeto gráfico, percebe-se que não há definição fixa de margens. Cada quadrinho utiliza sua própria tipografia e a única página com texto diagramado é a do editorial, onde o texto encontra-se blocado em tipografia sem serifa (a mesma utilizada no expediente e no sumário). Essa tipografia também é utilizada para numeração, no canto inferior externo de cada página. Na primeira página de cada quadrinho, tem-se também o nome do artista no canto superior externo da página. Fica claro que a preocupação da revista é dar destaque máximo aos quadrinhos publicados, já que todas estas páginas “de apoio”, por assim dizer, são feitas de uma forma neutra, básica, sem muitas experimentações em termos de design. Formato: 18 x 26 cm. É comercializada pela internet diretamente no blog da revista (figura 25) e em outras lojas especializadas em quadrinhos independentes. Esse blog é o principal canal de comunicação da revista com o público, além das redes sociais (principalmente o facebook). Ele veicula conteúdos complementares à revista. O logotipo da revista varia em cada aplicação, com letterings diferentes. Na capa da segunda edição, vem em caixa alta e tipografia sem serifa.
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Figura 22: Capas da primeira e da segunda edição da revista Samba, respectivamente. Fonte: revistas Samba números 1 (2008) e 2 (2010), acervo pessoal.
Figura 23: Página espelhada de sumário e página do editorial da segunda edição. Fonte: revista Samba número 2 (2010) acervo pessoal.
Figura 24: página dupla da Revista Samba número 2. Fonte: revista Samba número 2 (2010), acervo pessoal.
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. Figura 25: Print screen da página da revista online. Fonte: Site da Revista Samba18.
Kowaski (2010, Brasília - DF): uma ramificação da Samba, esse fanzine publica histórias em quadrinhos politicamente incorretas e inapropriadas para menores de 18 anos. Também é feito em Brasília, possui 34 páginas. O sumário e expediente estão em uma mesma página, feita manualmente (figura 26). Não possui margens delimitadas (figura 27), a única característica de algum projeto gráfico é a numeração das páginas, feita da mesma forma que a Revista Samba. Também utiliza os mesmo papéis que esta última, encadernados em grampo canoa. Possui quadrinhos na segunda, terceira e quarta capa.
Figura 26: capa e página de sumário e expediente, Kowaski, 2010. Fonte: Kowaski número 1, 2010, acervo pessoal. 18. Disponível em http://revistasamba.blogspot.com.br/, acesso em março de 2013.
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Figura 27: Página espelhada do miolo do zine Kowaski, 2010. Fonte: Kowaski número 1, 2010, acervo pessoal.
Revista Beleléu (Rio de Janeiro - RJ): lançada em 2009, a revista aglutina quadrinhos e historietas de Daniel Lafayette, Eduardo Arruda, Elcerdo e Stêvz, com alguns convidados. Tem 82 páginas de 18 x 18 cm, e utiliza papel offset no miolo e cartão supreme na capa, com acabamento de lombada quadrada. A numeração das páginas é centralizada na margem inferior de capa página, em tipografia sem serifa semelhante à Helvetica (figura 30). O sumário encontra-se na terceira capa, com diagramação simples sobre uma fotografia que se comunica com outra vista na segunda capa (figura 32). A quarta capa tem uma história em quadrinhos. Não há identificação dos autores no miolo, apenas quando são convidados, onde vê-se, no canto superior externo da página, o nome de cada artista. Diferentemente das revistas supracitadas, a Beleléu possui algumas inserções de texto no decorrer de suas páginas, mais especificamente em dois casos: a revista é dividida em duas partes e nas transições tem-se como uma abertura de capítulo, com o nome da parte ocupando uma página inteira. Além disso, alguns pequenos contos de ficção também são veiculados, aparecendo diagramados da página e acompanhados de alguma pequena ilustração (figura 30). A tipografia utilizada nessas páginas não varia. Já nas histórias em quadrinhos percebe-se grande variação de títulos e estilos de diagramação, de acordo com cada história e cada autor (figura 28).
Figura 28: página dupla de miolo da revista Beleléu. Fonte: revista Beleléu, 2009, acervo pessoal.
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Figura 29: capa e página de índice (3° capa) da revista Beleléu, 2009. Fonte: revista Beleléu, 2009, acervo pessoal.
Figura 30: página dupla de texto e abertura da primeira parte. Fonte: revista Beleléu, 2009, acervo pessoal.
Revista Lama (Curitiba - PR): a primeira (e até então única) edição foi lançada em 2009, com 59 páginas de 24 x 18 cm encadernadas com grampo canoa. A revista é voltada para a literatura pulp19 brasileira, e publica contos de autores iniciantes, além de uma fotonovela muito bem produzida e finalizada. Os contos vem sempre acompanhados de ilustrações de diversos artistas e estúdios, principalmente de cidades do Paraná (figura 32). A Lama é, dos exemplos citados, aquele que mais se aproxima, visualmente, do modelo tradicional de revista. Possui créditos para o design e diagramação no expediente (figura 31), utiliza sistematicamente duas tipografias, uma serifada e uma sans, possui logotipo e marcador para fim de texto. A numeração vem no canto inferior externo de capa página, dentro de um box cinza, de forma que possa parecer em todas as páginas sobre todos os fundos, e acompanhada do logo da revista. 19. Segundo o editorial da própria revista, a literatura pulp surgiu nos Estados Unidos entre as décadas de 1920 e 1950 e é conhecida por suas ligações com a ficção científica e o terror. Embora seja considerada um tipo de literatura de baixa qualidade, possui muitos fãs fiéis o que lhe rendeu o status de “cult” nos dias atuais (LAMA, 2009).
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Por outro lado, não se percebe um projeto gráfico propriamente dito, as margens variam, assim como o corpo da tipografia, o que dá a entender que cada página é composta segundo uma lógica própria. A quarta capa possui uma propaganda de gráfica, provavelmente fruto de algum apoio para impressão, já que a tiragem é de 1000 exemplares.
Figura 31: capa e página dupla do editorial da revista Lama número 1. Fonte: revista Lama número 1, 2009, acervo pessoal.
Figura 32: página de sumário e página espelhada do miolo, respectivamente. Fonte: revista Lama número 1, 2009, acervo pessoal.
A Zica (Belo Horizonte - MG): produzido pelo coletivo Urubois, em formato A5, impresso em couché em preto e branco, é um fanzine colaborativo temático, o que o torna o mais próximo da proposta do Foi à Feira. Sua primeira edição, com o tema: morte, macumba e classe média foi lançada em setembro de 2010 e vendida a cinco reais. Uma característica intrigante sobre o fanzine é a ausência de editorial, possuindo apenas uma página de créditos onde são listados os colaboradores relacionados às respectivas páginas (embora as páginas não possuam numeração). O projeto gráfico é extremamente simples, e as imagens são apenas diagramadas nas páginas, sangradas ou com margem (figura 33). Ainda assim, o impresso possui uma identidade visível, principalmente devido ao fato de todas as artes
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serem em preto e branco e estarem claramente relacionadas pela mesma temática (embora a mesma não seja descrita no fanzine). A segunda edição está prevista para este ano, e a chamada de trabalhos foi aberta durante os meses de outubro e novembro (coincidentemente ao mesmo tempo da chamada para o Foi à Feira).
Figura 33: capa e página espelhada do miolo do zine A Zica, respectivamente. Fonte: A Zica número 1, 2010, acervo pessoal.
As revistas aqui descritas são os exemplos nacionais que mais se aproximam, ainda que não de forma específica, à proposta do Foi à Feira. Assim, estudar suas características estéticas e formais podem levar à conclusões valiosas durante o desenvolvimento do projeto gráfico. Além das revistas citadas, outros impressos nacionais independentes dignos de nota são: LTG (Lucas Gehre, 2009, Brasília - DF), Não fui eu (André Valente, 2011, Brasília - DF), Café Especial, Tarja Preta, entre outros. Percebe-se, numa primeira análise, que os impressos descritos impressionam mais pelas produções neles contidas e pelo cuidado com que são produzidos – em termos de acabamento, impressão e diagramação – do que por uma identidade gráfica concreta. Não existe exploração de formatos diferenciados (a maioria varia entre A4 e A5, com raras exceções), ou mesmo de projetos gráficos ousados, já que a maior parte das revistas apresenta apenas as produções diagramadas nas páginas – algumas inclusive sem nem mesmo numeração. Os créditos também se dão de forma semelhante, geralmente presentes em um índice onde se relacionam por página. A presença de um tema que permeia toda a edição é vista apenas no A Zica (embora a Revista Lama também possua uma temática forte, porém no seu caso isso se dá devido às produções explorarem o mesmo gênero literário). Fica claro também a forte presença dos quadrinhos. Outra característica comum é a grande visibilidade dada ao nome da revista nas capas, algumas, inclusive, com logotipos fixos. Esse nome é a maior fonte de identidade das revistas e fanzines que apresentam conteúdos de vários autores. O papel também é um dos aspectos gráficos mais emblemáticos para a diferenciação entre as revistas.
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6.1.2. Produção local Embora o Espírito Santo não se configure como um núcleo na produção de fanzines, pode-se listar algumas iniciativas de destaque, principalmente na Grande Vitória. Revista Prego (Vila Velha - ES): revista de “quadrinhos, arte punk e psicodelia” editada e produzida por Alex Vieira desde 2007, alcançou visibilidade nacional com suas seis edições. Publica quadrinhos de todo o Brasil, com ênfase na produção local. As obras não se restringem à noção tradicional de quadrinho, agregando linguagens e estéticas diferenciadas, com foco na colagem e na “arte xerox”.
Figura 34: capas das revisas Prego número 1, 2, 3, 4 e 5, respectivamente. Fonte: revistas Prego números 1 (2007), 2 (2008), 3 (2009), 4 (2010) e 5 (2012), acervo pessoal.
Durante sua trajetória manteve o formato A4. Até a quarta edição tinha o miolo impresso em papel jornal e a capa em couchè brilhante. Além disso, as quatro primeiras edições também mantinham o mesmo logotipo na capa, características que forneciam à revista uma identidade gráfica e visual forte e firme (figura 36).
Figura 35: página de rosto, de editorial e dupla do miolo da segunda edição. Fonte: revista Prego número 2, 2008, acervo pessoal.
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Figura 36: página de rosto, de editorial e índice, e página dupla do miolo da terceira edição. Fonte: revista Prego número 3, 2009, acervo pessoal.
Em 2012, na quinta edição, sofreu uma reforma e foi impressa em papel pólen 90 g/m2, com capa em papel couchè fosco, com número de páginas bastante superior às anteriores (o mesmo vinha crescendo a cada número, variando de 38 na primeira edição para as 116 da sexta). A partir desta edição, também percebe-se a presença de um novo nome nos créditos de diagramação e projeto gráfico. Tais funções, até então desempenhadas por Alex Vieira, passaram a ser realizadas por um designer gráfico, Werllen Castro. As mudanças nas páginas da revista, embora sutis, denunciam um novo olhar sobre o projeto já tradicional. Na quinta edição isto fica claro ao notar o cuidado com que as entrevistas e textos são diagramados, assim como a escolha consciente de tipografias e a clareza de créditos e índice. Na sexta edição mais um fator entra neste conjunto: a presença de legendas em inglês em todas as informações textuais.
Figura 37: capa e folha de rosto / índice / página de créditos e página simples da sexta edição da revista Prego, respectivamente. Na página simples percebe-se os créditos e número de página no cabeçalho e as legendas em inglês no rodapé. Fonte: revista Prego número 6, 2013, acervo pessoal.
Durante uma mesa-redonda na Semana de Design da Ufes de 201220, Vieira explicou que a mudança ocorreu principalmente com o objetivo de tornar a Prego um produto de maior 20. Semana de Design da Universidade Federal do Espírito Santo realizada em dezembro de 2012 e que contou com uma vasta programação de palestras e mesas redondas. Além de participar da mesa de publicações alternativas junto com a Revista Prego, o Foi à Feira também ministrou uma oficina.
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qualidade que possa concorrer com as revistas nacionais (como a Samba e a Beleléu, citadas anteriormente) que possuem acabamento primoroso e por tal são vendidas a um preço mais alto (após as mudanças a Prego passou a custar mais que o dobro do preço, indo de sete a vinte reais). Quando perguntado se a revista não perderia uma identidade já construída e se isso não poderia prejudicá-la, seu criador afirmou que a mudança é bem-vinda e que a intenção nunca foi manter um padrão por muito tempo. Ele não vê nenhum ônus para a revista com a mudança, pois sabe que o nome e o conteúdo da mesma já possuem uma certa visibilidade no mercado de quadrinhos independentes, ou seja, fãs fiéis. Ele acredita que a revista funcionará num esquema de pequenas coleções, que têm características gráficas e temáticas próprias. A primeira à quarta edição, por exemplo, compõem a coleção CMYK (devido às cores das capas). Já a quinta à sétima edição compõem a coleção rock’n roll, drogas e sexo (relativos aos temas de cada uma). Dr. Sexta-feira: o único que, segundo este estudo, pode ser considerado um fanzine de fato, é feito em xerox, encadernado com grampo canoa no formato A5 e distribuído gratuitamente. Traz textos autorais e reproduzidos, ilustrações e algumas experimentações gráficas. Vulgar Manual e Quadro Negro Verde: álbuns de quadrinhos de Guido Imbroisi, compilam histórias que não foram publicadas em outras revistas. Contém somente histórias em quadrinhos, sem sumário. A impressão foi feita em gráfica, em papel offset encadernados com grampo canoa e com capa em papel cartão supreme.
Figura 38: capa, página espelhada de rosto e página dupla do miolo da Vulgar Manual, respectivamente. Fonte: Vulgar Manual, 2010, acervo pessoal.
Figura 39: capa e página espelhada de rosto, página dupla do miolo e quarta capa da Quadro Negro Verde, respectivamente. Fonte: Quadro Negro Verde, 2011, acervo pessoal.
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Revista Underground do underground: revista online colaborativa (as edições são publicadas no issuu21 e a organização mantém uma página no facebook para divulgação), pulica trabalhos artísticos autorais do Espírito Santo e de São Paulo, além de entrevistas com bandas de hardcore e punk, ensaios fotográficos de shows, críticas de filmes, alguns quadrinhos e textos sobre assuntos diversos. Está na sua terceira edição.
Figura 40: capas da primeira, segunda e terceira edições, respectivamente. Fonte: biblioteca virtual da revista Underground do Underground22.
Revista Strombolli: outra revista online, também publica suas edições pelo issuu e mantém um blog. As edições possuem uma vasta seção de portfólio, tanto para artes plásticas quanto para fotografia, que abrange artistas nacionais e internacionais. Também publica pequenas reportagens colaborativas sobre assuntos diversos (filmes, bandas, acontecimentos).
Figura 41: capas de várias edições da revista Strombolli, organizadas em sua biblioteca virtual. Fonte: biblioteca virtual da revista Strombolli23.
21. O Issuu é uma plataforma online para compartilhamento de impressos e conteúdos semelhantes. A interface do site permite que o leitor folheie impressos virtuais ou faça o download do PDF em questão. Disponível em www.issuuu.com, acesso em abril de 2013. 22. Disponível em: http://issuu.com/undergrounddounderground, acesso em março de 2013. 23. Disponível em: www.issuu.com/revistastrombolli.com, acesso em março de 2013.
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Existem ainda outras revistas independentes que veiculam histórias e quadrinhos e são mais voltadas para o humor, que não foram descritas neste trabalho por estarem muito distantes da abordagem pretendida pelo Foi à Feira (a Revista Quase e a Revista Capitu por exemplo).
6.2. Foi à Feira 6.2.1 O coletivo
Figura 42: foto dos membros do coletivo em 2010. Fonte: acervo pessoal do Foi à Feira.
O coletivo Foi à Feira (figura 44) nasceu das aspirações inerentes a um grupo de estudantes da Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo) de produzir e publicar conteúdo autoral livre, fora das amarras do meio comercial e das mídias de grande porte. A ideia foi concebida a partir das chamadas Tábuas de Carne24, encontros semanais em que o grupo se punha, de maneira informal, a discutir assuntos ligados à produção cultural da Grande Vitória. Com a frequência desses encontros foi possível perceber o potencial criativo das pessoas quando reunidas, já que os encontros sempre resultavam na produção de desenhos, ilustrações, críticas, músicas, poemas (figura 43). Tal produção era divulgada, ao final de cada encontro, através da internet via flickr, blogs e outras redes. As Tábuas de Carne, somadas a uma série de discussões, levaram à conclusão de que há uma crescente produção cultural, artística e literária no Estado, que muitas vezes é deixada à margem pelos veículos tradicionais de comunicação por falta de espaço em suas grades de programação e / ou linhas editoriais. O Foi à Feira toma como exemplo O Gráfico Amador, uma pequena oficina experimental de artes gráficas fundada em Recife, Pernambuco, no ano de 1954. Formado por intelectuais criativos como Aloísio Magalhães, Gastão de Holanda, José Laurênio de Melo e Orlando da Costa Ferreira, o grupo se dedicava a projetar e realizar pequenas edições de textos literários, principalmente poesia, em tiragens artesanais e amadoras limitadas. Os projetos eram realizados coletivamente pelos membros d'O Gráfico, na oficina tipográfica que funcionava na sede do grupo, conhecida como Atelier 415 (LIMA, 1994). Os livros produzidos eram em maioria escritos pelos associados ao grupo, que chegaram a mais de 50 e se dividiam entre autores, leitores (que pagavam a mensalidade que garantia a produção, em troca de 24. Tábua de Carne é o nome dado aos encontros iniciais do coletivo Foi à Feira que aconteciam na residência de uma das integrantes do grupo. A origem do termo tem fundamento na produção de sketchbooks artesanais confeccionados com o auxilio de ferramentas improvisadas, uma delas a tábua de carne, instrumento de apoio utilizado na cozinha.
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receber as edições dos livros) e os chamados “mãos sujas”, que se envolviam na produção e impressão dos exemplares (cujos principais nomes são os supracitados Aloísio Magalhães, Gastão de Holanda, José Laurênio de Melo e Orlando da Costa Ferreira). Embora claramente inspirados pelo modernismo, os impressos d'O Gráfico Amador eram ricos em experimentações de técnicas e sintetizavam influências distintas de origens diversas de maneira eclética e inventiva (LIMA, 1994). O grupo encerrou suas atividades em 1961, num momento de grande instabilidade política no Brasil (embora o foco de suas atividades não fosse a resistência política). Lima (1994) coloca que: Ao longo de sua existência O Gráfico Amador tentou por mais de uma vez se tornar profissional. Quis a história, no entanto, que morresse amador. É somente a partir do desmembramento do grupo que seus membros vão, cada um por si, se tornando profissionais naquilo que começou como uma atividade diletante (LIMA, 1994, p. 44).
Da mesma forma que o “coletivo” pernambucano, o Foi à Feira se divide entre os produtores de conteúdo (seja ele literário ou visual) e os responsáveis pelo planejamento e editoração do fanzine homônimo, lançado em 2010 com uma coletânea de trabalhos feitos pelo coletivo e por colaboradores. Após a estreia da primeira edição do fanzine Foi à Feira, os encontros produtivos entre o coletivo passaram a ser menos frequentes, o que aumentou a inquietação em continuar a produção do impresso. A partir de 2012, houve uma reestruturação do grupo, o que inclui algumas trocas de funções e o remanejamento dos integrantes. O grupo inicial, para fins de registro, era formado por: Aline Manente, Camila Torres, Juliana Colli, Juliana Lisboa, Rayza Mucunã, Saulo Pratti, estudantes de Desenho Industrial; e Carol Ruas e Haroldo Lima, estudantes de Comunicação Social da Ufes. Atualmente o coletivo é formado por Rayza Mucunã, Marianna Schimdt, Ádamo Moscon, Juliana Colli, Haroldo Lima, Luís Filipe Porto e Carol Ruas. A articulação entre os membros se dá principalmente através da internet, e todos atualizam o site foiafeira.com em conjunto. Apesar da divisão horizontal de funções, devido ao trabalho em desenvolvimento a autora deste projeto tem atuado na coordenação do grupo.
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Figura 43 (na página anterior e acima): registros fotográficos de Tábuas de Carne realizadas entre 2010 e 2012. Fonte: acervo Foi à Feira25.
6.2.2. O fanzine A necessidade e o interesse em criar um meio para que as produções das Tábuas de Carne pudessem ser publicadas e veiculadas tornou-se palpável e o fanzine Foi à Feira começou a tomar forma. Em maio de 2010 o coletivo foi contemplado pelo Edital Rede Cultura Jovem, que viabilizou sua estrutura de produção e funcionamento. Em outubro de 2010 foi lançada a primeira edição do fanzine, com tiragem de 1000 exemplares. A publicação contou com a colaboração de 28 jovens envolvidos em diferentes formas de criação (ilustradores, escritores, fotógrafos, designers, músicos, entre outros), circulou por todo o estado e foi distribuída gratuitamente para escolas, gibitecas e bibliotecas Brasil afora. Seu alcance ultrapassou as fronteiras nacionais ao se estabelecer um contato com o circuito Fora do Eixo26, propiciando que o fanzine fosse vendido também em eventos culturais diversos em outros países da América Latina. O fanzine Foi à Feira é um veículo de comunicação alternativa com abordagem artística e cultural. Em cada edição se estabelece um objeto-tema diferente para que todo o conteúdo, tanto textual como imagético, possa ter uma ligação com a proposta. A edição-piloto, por exemplo, teve como tema o objeto fone de ouvido. O Foi à Feira se propõe a discutir o fe25. As imagens de Tábuas de Carne e membros do coletivo presentes neste trabalho foram em sua maioria retiradas do vasto acervo de fotografias do coletivo Foi à Feira, resultado de já alguns anos de acúmulo de registros diversos, feitos por fotógrafos diversos. Como não existe registro de data e autoria de grande parte das imagens, escolheu-se por creditar-se apenas como “acervo”. Boa parte destas imagens também está disponível no Flickr do coletivo, que pode ser acessado em: www.flickr.com/photos/foiafeira. 26. Circuito Fora do Eixo é uma rede de trabalhos relacionados à produção cultural, presente em 25 das 27 unidades federativas do Brasil, que intenciona o intercâmbio de tecnologias e produtos culturais na cena cultural independente e alternativa brasileira. Desde o ano passado o circuito passou a abranger também alguns países da América Latina, principalmente Argentina, Bolívia e Uruguai.
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tichismo dos objetos contemporâneos, tanto no âmbito de atribuir-lhes valores subjetivos quanto na tentativa de “apropriação de valores subjetivos representados pelo objeto (ou nele embutidos)” (DENIS, 1998, p. 25).
Figura 44: exemplares do Foi à Feira #1. Fonte: acervo Foi à Feira.
Além disso, o fanzine se comporta como um impresso pós-moderno que visa incentivar a participação do leitor como coautor de conteúdos e interpretações, estimulando múltiplas interpretações de um mesmo objeto (no caso não só do fanzine em si como também do objeto tema da edição), como coloca Mauro Pinheiro: Enquanto no período moderno o foco parecia concentrar-se na emissão das mensagens (na elaboração, no projeto), dando pouca atenção ao papel dos leitores como construtores de sentidos, no design pós-moderno sua importância como co-autores da mensagem não só é percebida como é intensamente trabalhada. Às intenções do autor original do discurso somavam-se as intenções do designer que projetava a forma, e a esse conjunto somava-se a plateia à qual se dirigia o trabalho (PINHEIRO, 2010, p.4).
Todo o desenvolvimento do fanzine foi discutido, planejado e executado em conjunto, inclusive seu projeto gráfico, a diagramação das páginas e a ordem dos conteúdos apresentados. Os colaboradores que participaram desta edição foram convidados, e não houve uma chamada pública para o envio de trabalhos, como havia sido idealizado no planejamento
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geral do fanzine. Tal decisão foi tomada principalmente devido a um certo temor por parte dos membros do coletivo de realizar a curadoria que seria necessária posteriormente. A partir do convite dos colaboradores, sua produção foi acompanhada pelos membros do coletivo em vias de manter o conteúdo dentro do “esperado”. Ainda assim, alguns trabalhos fugiram totalmente ao teor estético do fanzine, enfraquecendo uma possível identidade a partir da ligação entre os conteúdos. Outro aspecto que influenciou esta mesma questão negativamente foi a presença de conteúdos desvinculados ao tema: os leitores ficaram confusos com relação ao objeto tema, e esta intenção, que é um dos principais fatores de diferenciação do impresso, não ficou clara. Ocorre que apesar de existir um projeto por trás do fanzine, muitas decisões estéticas e projetuais foram prejudicadas devido à falta de uma metodologia de trabalho, além da determinante falta de experiência nesse tipo de processo27. No 1° Anuário de Fanzines, Zines e Publicações Alternativas, editado pela Ugra Press28, o Foi à Feira foi resenhado por Douglas Utescher, também responsável pela edição do Anuário de forma geral. A resenha, reproduzida por completo a seguir, ressalta o valor estético do fanzine: Por todo o país, pipocam ambiciosos coletivos de jovens artistas. Foi à Feira é um coletivo do Espírito Santo, terra que tem rendido gratas surpresas no design gráfico, nos quadrinhos e nas artes em geral. Contemplado por um edital, o grupo lançou esta pela publicação, sua primeira manifestação impressa. A revista toda apetece aos olhos. Inteira colorida, bem editada, com soluções gráficas interessantes. Os textos também são bem escritos e gostosos de ler. Sem dúvidas esse povo é talentoso. Peca apenas por querer abraçar o mundo, na minha opinião. Há uma tendência muito forte entre os novos artistas e editores (e artistas-editores) em querer falar de tudo um pouco, sem limitações. Parece nobre, na teoria, mas o produto final geralmente carece de aprofundamento. Mas isso não é culpa do Foi à Feira: é tão somente o reflexo de uma era de informações excessivas e fragmentadas (UTESCHER, 2011, p. 14).
Como se pode perceber ao ler o texto, Utescher (2011) parece ter chegado à mesma conclusão exposta neste texto: o fanzine peca ao não se focar em um tema, que possa fornecer uma unidade geral ao impresso. Como o autor coloca, outro ponto crucial em relação ao fanzine é a falta de aprofundamento, muito presente principalmente em algumas colaborações, menos interessantes que o restante do conjunto, por assim dizer. Estes são problemas de projeto editorial e curadoria que devem ser resolvidos para a segunda edição. Por outro lado, também é interessante reparar nas características que são colocadas como pontos positivos do fanzine: o fato de as páginas serem impressas a cores, a edição bem feita e “soluções gráficas interessantes”, o que pode se entender como uma diagramação eficiente e, ao mesmo tempo, criativa. Tais aspectos devem ser mantidos e aperfeiçoados nas edições futuras.
27. Tais aspectos serão melhor descritos no tópico 7.1. Definição de parâmetros para o projeto gráfico, na página 63. 28. Supracitados no tópico 6.1. Referências atuais em fanzine, na página 36.
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7.
Planejamento da segunda edição
Nesta etapa do projeto, buscou-se reunir os dados relevantes para o desenvolvimento do planejamento gráfico do fanzine, que influenciaram diretamente as decisões tomadas durante o processo produtivo. Além disso, estes parâmetros conduziram a formulação de alternativas para a formatação do impresso, especialmente em termos de formato e encadernação.
7.1. Definição de parâmetros para o projeto gráfico Com a segunda edição do fanzine pretende-se amadurecer o conteúdo e a linguagem do periódico, assim como afirmar a identidade do impresso através de uma reforma editorial e gráfica, que envolve um novo projeto gráfico (mudança de formato, leiaute, número de páginas etc). Tais mudanças buscam expandir a abrangência do fanzine, assim como a divulgação do mesmo, facilitando a viabilização de edições posteriores e valorizando o conteúdo veiculado.
Durante reuniões no decorrer do ano de 2012, os membros do coletivo puderam definir algumas diretrizes para o desenvolvimento da segunda edição: * Haverá, invariavelmente, uma versão impressa; * Fazer um produto mais elaborado, que se configure como um “objeto de desejo”; * Trazer produções que se preocupem em transmitir uma mensagem, onde haja uma preocupação com a relação entre o discurso da mensagem e a estética visual da peça; * Não ter conteúdos desvinculados do tema objeto; * Apresentar uma narrativa visual mais consistente; * Afirmar uma possível identidade do impresso; * Incluir, no próprio objeto físico do fanzine, alguma referência ao "objeto tema" da edição. Durante tais reuniões foi decidido o objeto/tema da segunda edição, que norteará todos os conteúdos veiculados: o canivete. Também foram indicados alguns colaboradores para a produção de conteúdos do fanzine, sempre abrangendo, da melhor forma possível, uma interdisciplinaridade de temáticas e abordagens.
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É importante frisar que, por se configurar como um impresso colaborativo, torna-se necessária a definição de diretrizes básicas de projeto mesmo antes que se possa ter todos os conteúdos a serem produzidos ou mesmo pautados, já que boa parte do conteúdo depende do projeto gráfico como diretriz para produção, pois depende da definição de questões visuais básicas como aproveitamento da página, proporção e formato. Embora a viabilização financeira da impressão dos exemplares ainda não esteja definida nesta etapa, é também de suma importância que o projeto considere o custo final da impressão, buscando alternativas para barateamento. A primeira edição do fanzine Foi à Feira foi impressa em Vitória no ano de 2010. Tem 19 x 14 cm (formato A5) utiliza papel offset 90gm2 no miolo e 120g/m2 na capa, ambos em policromia. Possui 40 páginas, somando-se as capas. A tiragem de mil exemplares provou-se altamente inadequada, já que a distribuição e escoamento das cópias demonstrou-se um processo demorado e oneroso. Embora o preço de cada exemplar diminua, o valor final é mais alto, fazendo necessária a utilização de um formato menor, por exemplo. A tiragem mostra-se totalmente exagerada para as necessidades do fanzine. Além disso, o formato pequeno e comum, a quantidade reduzida de páginas e a falta de maiores experimentações em relação à forma e à interação do objeto com o leitor não permitem um posicionamento de diferenciação estética do impresso, ou mesmo a formação de uma identidade através das páginas. Essa esquizofrenia também é altamente influenciada pelos conteúdos que divergem do objeto temático. Tais produções, embora enriqueçam o impresso, acabam por desviar o foco da temática abordada, o que causa certa confusão no leitor e prejudica a construção da identidade conceitual do fanzine. Outra consideração feita não só pelos membros do coletivo, mas também pelo público que consumiu a primeira edção, é que nem sempre a obra publicada possui um discurso conceitual forte, permanecendo meramente como uma produção estética. Isso é corroborado também no editorial, que contém uma imagem de página dupla e um pequeno texto de quatro parágrafos, onde explica-se, breve e poeticamente, o que levou à construção do fanzine e apresenta-se o objeto-tema, fone de ouvido. Percebe-se que apesar do ótimo texto não se encontra ali um discurso ou uma motivação objetiva e clara, o que é mais evidente ao se perceber a relação entre texto e imagem das páginas. Nesse caso, observa-se que é preciso melhorar tanto a curadoria dos colaboradores inscritos quanto elevar o nível de qualidade do que é produzido internamente pelos membros do coletivo (mesmo que de forma individual). A partir dos apontamentos feitos sobre a edição piloto, torna-se mais simples traçar os parâmetros para o desenvolvimento de um novo projeto, tirando o maior proveito possível das experiências prévias e sempre em vias de melhorar o produto final, sem cometer os mesmo erros.
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Figura 45: Página dupla do editorial da primeira edição. Fonte: Foi à Feira #1 (2010), acervo pessoal.
Primeiramente, é importante deixar claro que o projeto gráfico discutido aqui diz respeito exclusivametne à segunda edição do fanzine, e pode não se repetir em outras edições. O esperado é que cada edição possa modificar-se de acordo com o objeto tema e as condições de produção e impressão (altamente variáveis). A preocupação com a manutenção de uma identidade existe, mas acredita-se que esta venha a ser construída através de outras ferramentas, tais como a própria mutação de formato, a construção do conteúdo com base em um objeto, o teor dos conteúdos publicados, o próprio nome etc. Além disso, como foi dito anteriormente na Metodologia29, espera-se que a construção das futuras edições do fanzine siga um processo cíclico de diagnóstico e correção de falhas, tanto em relação ao produto final quanto ao processo produtivo, de forma a evoluir sempre. O Foi à Feira é um coletivo multidisciplinar da Universidade Federal do Espírito Santo. Os membros do coletivo, que produzem e editam o fanzine, são profissionais que lidam diariamente com a criação de impressos e outros meios de comunicação. GUIMARÃES (2005) afirma que o que caracteriza primordialmente fanzine é a personalidade que seu editor lhe imprime. Ou seja, o fanzine Foi à Feira deve refletir diretamente a personalidade de seus editores, e, assim sendo, deve configurar-se como um meio de comunicação ousado, contando com a presença indispensável do design gráfico. Por se tratar de um fanzine, um meio alternativo de publicação que não possui pontos de venda, intenção de gerar lucro, ou mesmo periodicidade fixa, não existem as mesmas preocupações de identidade gráfica e empresarial vistas em outros produtos comuns do mercado editorial. Disso veio a decisão tomada pelo coletivo, no início do projeto, de não construir uma identidade gráfica fixa para o fanzine ou mesmo para o coletivo, prevendo que essa identidade pudesse variar livremente de acordo com o canal de comunicação (seja o fanzine, redes sociais ou o site), com a edição do fanzine, com os colaboradores etc.
29. Disponível na página 21 deste Projeto de Graduação.
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Outra questão de ordem prática relacionada à produção do conteúdo é a necessidade de se definir o formato com antecedência, para que os colaboradores possam produzir suas respectivas artes. Assim, o projeto foi desenvolvido nessa ordem: primeiramente a definição do formato e posteriormente seus desdobramentos como fanzine.
7.1.1. Por que fazer impresso? Com as facilidades provindas da internet e levando em consideração tanto o custo da impressão quanto as dificuldades para distribuição e venda do fanzine, seria de fato mais simples fazer uma versão digital, saída que muitas outras revistas alternativas utilizam para que possam ser publicadas e lidas. Ainda assim, existe um anseio conjunto e coletivo para que exista uma edição impressa do Foi à Feira. É difícil embasar essa decisão em argumentos lógicos, mas é importante entender que não é da lógica que ela vem. A discussão sobre imprimir ou não também veio à tona no editorial do 2° Anuário de Fanzines, Zines e publicações alternativas: Com tudo isso [as novas possibilidades de comunicação promovidas pelas movas mídias e internet], o fanzine impresso deixou de ser necessário. Por que se dar ao trabalho de pesquisar, editar, diagramar, imprimir, dobrar, grampear, distribuir e – mais do que tudo – gastar dinheiro, se a informação pode ser disseminada com muito menos trabalho e sem custo algum? A resposta é simples e incrivelmente libertadora: porque sim, oras. Os fanzines finalmente chegaram ao ponto em que não precisam mais de desculpa alguma para existir. Se existem, é apenas pelo desejo e vontade de seus criadores (UTESCHER, p. 2, 2012).
Na revista Factsheet Five30 foram compiladas várias respostas para a mesma pergunta, que dá título ao impresso: Why Publish? ou, em português, Por que publicar? Quem responde são vários fanzineiros da época, de diversas regiões do mundo. As respostas são organizadas tematicamente em capítulos, o que fornece um panorama geral das principais motivações por trás dos fanzines: A rede / amigos, hábito, mudança social, descarga de opiniões, hobby / diversão, Informações e novas ideias, alimento para o ego, destino e auto-descoberta. As respostas são múltiplas e variáveis, algumas sérias, outras nem tanto. Uma coisa em comum é facilmente perceptível: não existe um motivo, uma razão, uma motivação sensata e concreta a não ser o querer e a sensação de “eu posso fazer isso”, provinda tanto da insatisfação com a grande mídia quanto da influência de fanzines alheios (GUNDERLOY, 1989). A publicação foi impressa em 1989, início do desktop publishing e da
30. Editado e fundado por Mike Gunderloy em 1982, o Factsheet Five era um tipo de catálogo de zines e edições alternativas de forma geral, contendo resenhas, endereços de contato e outras informações cerca destes impressos. Também veiculava artigos e ensaios sobre a cultura “faça você mesmo” e o universo das produções gráficas independentes. A última edição da revista foi lançada em 1998, já não mais sob a direção de Gunderloy (ZINE WIKI, 2011).
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prática digital tal como a conhecemos hoje31, e o principal meio de difusão de conteúdos e ideias era o impresso, enviado pelo correio. A partir disso verdadeiras comunidades postais se formaram, e os fanzines possuíam listas de assinantes, pagantes ou não (GUNDERLOY, 1989). Muitos fanzines nasceram e se mantiveram primordialmente do desejo de realizar esta troca e construir uma rede de contatos onde, diferente da prática editorial de grandes proporções, a informação ia e voltava, e havia um contato direto com leitores e outros produtores de fanzine. Muito embora o desenvolvimento da internet tenha modificado alguns desses conceitos largamente (a ponto de ficarem irreconhecíveis), muitos dos sentimentos e anseios dos produtores de fanzine do início dos anos 90 ainda sobrevivem, disseminados e fortalecidos por aqueles que continuaram a prática, agregando à mesma as facilidades do desktop publishing e da internet, sem deixar de lado as raízes desse tipo de prática e produto cultural (GUNDERLOY, 1989, 1988). No livro How to publish a fanzine32, também de Mike Gunderloy, o autor dedica um capítulo à mesma pergunta, por que publicar fanzine? Segundo o autor, existem três motivos principais: diversão, fama e dinheiro. A diversão vem de fazer contatos com pessoas diversas, a fama se restringe aos poucos que tenham acesso ao fanzine, e o dinheiro sai do bolso de quem publica para nunca mais voltar. O autor completa acrescentando o fator tempo: sim, fanzines irão tomar todo o seu tempo livre. Ou seja, brincadeiras à parte, o único motivo plausível para se adentrar o universo da “auto-publicação”33 é o simples desejo produtivo e o potencial prazer advindo da produção. Como é colocado no livro, fanzine é um hobby como qualquer outro, custa um certo dinheiro e demanda certo trabalho, mas a diversão compensa. Em entrevista para o 2° Anuário de Fanzines, Zines e publicações alternativas, Daniel Linhares, autor do zine Benzine, também responde: por que fazer fanzine? Porque é simples, direto e principalmente físico, a tendência hoje é migrar para a internet, mas o trabalho impresso tem outra dimensão e valor, tanto para o autor, como também para o leitor. (LINHARES apud UTESCHER, p.11, 2012)
Assim, a versão impressa vem de uma vontade coletiva de que se possa construir um “produto” físico, palpável e colecionável, que fuja da comum impessoalidade do meio digital para traçar uma abordagem mais próxima e pessoal com o leitor. Isso ocorre através do for31. Já existiam os chamados Personal Computers e softwares para composição de textos e páginas, de forma primitiva. Além disso, poderia-se compor as páginas manualmente, com textos manuscritos ou batidos à máquina de escrever, ou pagar para que a composição fosse feita profissionalmente e pequenas gráficas. Este processo culminava na produção de um original, que seria então xerocado, raros fanzines eram impressos em offset. (GUNDERLOY, 1988) 32. Livreto publicado em 1988 que contém um guia detalhado sobre a publicação de fanzines. Desde as motivações para começar, passando pelas temáticas possíveis até a produção em si, onde o autor apresenta um interessantíssimo panorama dos meios e métodos disponíveis na época para os pequenos produtores, explicando as tecnologias mais utilizadas e os processos necessários para utilizá-las. 33. Tradução livre de self-publishing, termo largamente utilizado em textos em inglês para referir-se à prática de fanzines, como se o autor fosse sua própria editora e impressora.
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mato, texturas, peso, enfim, características intimamente relacionadas ao ato de manusear um impresso, e que tornam essa experiência interessante e enriquecedora, bem diferente da relação que se tem através de uma tela, em uma leitura digital. Além disso, é de total interesse do coletivo divulgar e preservar a cultura histórica dos fanzines e dos veículos alternativos de comunicação, das trocas pelo correio, da distribuição independente, entre outros.
7.2. Geração de alternativas Formato Para a segunda edição do fanzine, uma das expectativas do coletivo Foi à Feira é produzir um impresso com mais identidade, mais “presença”. A intenção é que o produto final possa se comportar como um “objeto de desejo” por si só, tirando proveito do conhecimento gráfico a ser empregado no planejamento do impresso. A intenção maior é poder explorar o formato físico, com diferentes papéis e, principalmente, um formato interessante e que possa traçar uma relação interessante com o objeto-tema da edição. Tais anseios vêm, principalmente, da experiência com a primeira edição. O formato escolhido para o piloto da publicação, embora econômico e diretamente relacionado aos fanzines (que em sua maior parte são feitos em A5 por motivos práticos de produção e economia), mostrou-se ineficiente em de fato expor a riqueza do conteúdo produzido, além de fornecer poucas possibilidades de experimentação de leiaute. Além disso, o Foi à Feira possui a intenção de seguir o exemplo de outros coletivos que iniciaram a produção de fanzines e revistas alternativas e expandiram sua atuação para tornarem-se pequenas editoras, lançando projetos diferenciados e com outras temáticas. Para tal, é extremamente necessário que exista um grande cuidado gráfico com tudo aquilo que é produzido, em vias de demonstrar possibilidades interessantes para futuros lançamentos. Já que a definição do formato é essencial para o desenvolvimento dos conteúdos presentes no fanzine, buscou-se analisar algumas possibilidades concretas para a produção. Primeiramente, se o fanzine for impresso em gráfica (como dito anteriormente, ainda não há previsão de recursos para a impressão), deve obedecer aos formatos que proporcionam maior aproveitamento de papel, tanto por razões práticas quanto ecológicas. Por outro lado, se o fanzine for impresso de forma caseira34, o formato deve ser igual ou menor a uma folha A4, já que a impressora não permite a utilização de formatos maiores. Assim, de acordo com a tabela de aproveitamento de papel em formato 66x96 (o mais comum para impressão offset nas gráficas brasileiras), as possibilidades são: 16 x 33 cm, 17,5 34. Esta possibilidade existe palpavelmente pois o coletivo possui uma impressora a laser de alta qualidade, adquirida com os mesmos recursos que possibilitaram a impressão da primeira edição, advindos do edital de Núcleo de Criação do Programa Rede Cultura Jovem de 2010. Assim, os fundos necessários para produção viriam do papel e o do tonner para impressão.
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x 20,5 cm, 16,5 x 24 cm, 14,5 x 31,5, 19,2 x 22 cm, 15,5 x 21 cm, 14,5 x 20,5 cm, 15 x 17,5 cm, 13 x 22 cm e 12 x 22 cm. Encadernação e apresentação Projetar um impresso significa planejar todos os aspectos visuais e físicos do produto final, de forma a atingir os objetivos propostos. Para tal, é extremamente necessário que alguns conceitos básicos relativos ao design editorial sejam pensados e resolvidos. O arranjo do conteúdo, o leiaute, a relação entre forma e função, a encadernação e a indexação são aspectos de suma importância para este projeto, e que devem ser estudados e explorados com inteligência. Pensando na apresentação do fanzine como “produto cultural” e buscando uma diferenciação, algumas alternativas para a encadernação e a apresentação do produto final foram geradas, buscando abranger as possibilidades de impressão e produção. Manter uma relação conotativa com o objeto-tema e promover a maior interação possível entre leitor e impresso são os principais objetivos. Ideia 1. Fanzine-envelope: o fanzine viria dentro de um envelope lacrado, devidamente identificado, e que funcionaria como sobre-capa do impresso. Dentro do envelope viriam as páginas do fanzine, encadernadas ou não, existindo também a possibilidade de que outros objetos possam acompanhar o impresso de alguma forma (ferramentas para produção, ou objetos fora de contexto, para os quais sejam dadas novas conotações). Assim como o canivete, o fanzine seria um tipo de “kit” para diversas situações (imaginárias, provavelmente).
Figura 46: esboço da ideia 1.
Ideia 2. Fanzine-canivete: O fanzine teria um formato alongado, e suas páginas encadernadas por um círculo de metal no canto superior esquerdo, ou por uma tarracha. As páginas teriam furos que permitiriam tal encaixe, fornecendo ao impresso uma disposição semelhante a de um canivete, com as páginas abrindo-se em diagonal.
Figura 47: esboço da ideia 2.
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Ideia 3. Fanzine-mapa: o fanzine seria impresso em uma única folha de formato grande dobrada repetidamente de forma que cada página possa se configurar. Ainda assim, seu leiaute seria feito de forma que o leitor possa redobrar a grande folha da maneira que desejar, formando novos fanzines. Caso a produção seja caseira, a impressão teria de ser feita em gráficas rápidas, o que influenciará o custo final.
Figura 48: esboço da ideia 3.
Como colocado anteriormente, a definição do formato das páginas é extremamente necessária para dar continuidade ao projeto, já que esta é uma informação primordial para a elaboração das colaborações e abertura da chamada pública para trabalhos. Assim sendo, realizou-se uma reunião com os membros do coletivo para a apresentação das propostas acima e definição do formato. Na reunião discutiu-se os prós e contras de cada proposta, principalmente de acordo com o que cada um esperava da segunda edição, e também considerando-se a adequação dos conteúdos e as possibilidades de experimentação que cada formato e encadernação poderia oferecer. A partir de tal discussão, a proposta que mostrou-se mais adequada às expectativas foi a ideia 2, fanzine-canivete. Os membros do coletivo defenderam a imediata associação do impresso com o objeto como algo positivo, que possibilitaria uma comunicação direta com o público, e que é muito melhor explorada nesta ideia do que nas outras. Acredita-se que associar o fanzine à ideia de “kit de sobrevivência” ou “apocalipse” (como acontece na ideia 1) não contempla as colaborações que possam fazer outras infinitas interpretações do objeto em questão. Já a ideia 2, embora possa trazer opções interessantes de leiaute e manuseio, não faz uma relação direta com o objeto. A encadernação permite experiências com a ordem e o formato das páginas, e as artes podem estar na vertical ou na diagonal, ou seja, o impresso terá um manuseio dinâmico pelo leitor. Além disso, a encadernação também torna o processo de inserção de páginas de formatos variados dobradas, o que abre infinitas possibilidades. Como a abertura da chamada de trabalhos era urgente, para fornecer tempo hábil para a produção dos colaboradores, não foram feitos muitos testes- a não ser por uma pequena boneca de poucas páginas em branco- e a decisão foi tomada baseada na ideia e nas possibilidades enxergadas. A partir da definição da aparência geral do fanzine, veio a definição do formato das páginas. Para que a ideia funcione, as páginas devem ser compridas, para que o impresso final se assemelhe ao canivete. Como também não havia a definição de como o fanzine será impres-
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so, uma das necessidades deste formato é a adequação a impressão caseira ou em gráfica (como citado anteriormente). Dentro das possibilidades listadas, o formato escolhido foi o de 13 x 22 cm. Este foi o formato divulgado na chamada de trabalhos.
7.3. Processo produtivo O processo de produção da segunda edição do fanzine se deu diferentemente da edição anterior: em vez de colaboradores convidados, foi aberta uma chamada pública de trabalhos, onde qualquer pessoa interessada poderia se inscrever (com foco para as produções capixabas). Tal chamada foi aberta em 2 de outubro de 2012, e o prazo inicial foi colocado até o dia 31 do mesmo mês. Porém, devido ao pequeno volume de trabalhos recebidos neste período de tempo (que coincide com o final de período da Ufes, o que prejudica a produtividade de grande número de colaboradores), decidiu-se expandir o prazo até o dia 16 de novembro.
Figura 49: cartaz virtual da chamada de trabalhos para o Foi à Feira #2. Fonte: acervo Foi à Feira.
O site foiafeira.com foi um veículo essencial neste procedimento, já que através do mesmo tem-se um espaço para o “edital” de colaboração. Como parte do processo também foi utilizado um formulário digital onde cada colaborador fornece seus dados (nome, telefone, portfólio etc), assim como um pequeno texto explicando o conceito explorado na peça inscrita (figura 50). Tal ferramenta foi desenvolvida para despertar nos possíveis participantes do fanzine a necessidade de desenvolver peças com teor conceitual, e não apenas estético. Dentro dos procedimentos mutáveis da preparação de cada edição, o texto utilizado no site e o sistema de envio de propostas é uma opção que pode ser repetida em edições futuras.
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Figura 50: cartaz da Tábua de Carne aberta do dia 25/10 e print screen da página para inscrição de trabalhos no site do Foi à Feira, respectivamente. O questionário foi elaborado da forma mais simples possível, apenas para fins de organização. O objetivo era simplificar o processo ao máximo. Fontes: acervo e site do Foi à Feira35.
Durante o período de inscrições foram realizadas Tábuas de Carne públicas para produção e troca de ideias. A primeira Tábua foi realizada em 25 de outubro de 2012, no Cemuni 4, na Ufes (figuras 51). Embora o número de pessoas presentes tenha sido abaixo do esperado, muitas pessoas que não conheciam o projeto compareceram, preenchendo o principal objetivo da iniciativa: divulgar o fanzine e o método de produção coletiva.
Figura 51: registros da Tábua de Carne em 25/08/2012. Fonte: acervo Foi à Feira. 35. Disponível em www.foiafeira.com/chamada, acesso em março de 2013.
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Outra Tábua foi realizada durante a Semana de Design da Ufes (em dezembro de 2012), durante uma oficina de fanzine. Mais uma vez a quantidade de pessoas ficou abaixo do esperado (figura 52), o que pode indicar tanto um problema de divulgação quanto uma certa resistência das pessoas em se envolver com esse tipo de atividade. Outros encontros casuais aconteceram, mas o baixo número de pessoas sempre é uma constante.
Figura 52: oficina ministrada na 6° Semana de Design da Ufes em dezembro de 2012. Fonte: acervo Foi à Feira.
Uma experiência interessante aconteceu em uma Tábua de Carne organizada entre coletivos (no caso participaram, além do Foi à Feira, o coletivo Video Litteris e o Estúdio Cosmonauta) e convidados que rendeu um dos melhores resultados advindos de Tábuas de Carne. Esse encontro ocorreu em 26 de agosto de 2012 (figura 53), no Espaço Criativo De Casa (em Vitória), e contou com cerca de 10 cavaletes de campanha política: cada pessoa teve direito a uma face de um cavalete. De acordo com um conjunto prévio, desenvolveram-se as artes utilizando como base a fotografia do político em questão e o tema do canivete. Percebe-se que os resultados foram abundantes e que a criação ocorreu de forma coletiva, embora cada pessoa trabalhasse sozinha.
Figura 53: Tábua de Carne em 29/08/2012. Fonte: acervo Foi à Feira.
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Os cavaletes foram posicionados em diversos pontos da cidade e fotografados, e este registro entrará de fato no fanzine. A partir disso, constata-se que a metodologia de levar propostas de produção (e meios, claro) já previamente pensadas com pequenas brechas para adaptações de momento e decisões coletâneas garante um melhor funcionamento da dinâmica da Tábua, o que resulta em maiores resultados, em termos de produção. Este tipo de metodologia poderá ser explorado em edições futuras do Foi à Feira.
Figura 54: fotografias dos cavaletes devolvidos às ruas. Fonte: acervo Foi à Feira.
Outra iniciativa que funcionou muito bem foi a participação no projeto Pontos de Arte Vix. Contemplado pelo edital Rede Cultura Jovem de 2012, o projeto consiste em convidar artistas de rua, grafiteiros e produtores culturais de forma geral para pintar os abrigos nas paradas de ônibus da cidade de Vitória. O Foi à Feira foi convidado e pintou dois abrigos. Seguindo a mesma temática que o fanzine, a arte foi desenvolvida e executada coletivamente pelos membros do coletivo (figura 55), rendendo um resultado surpreendentemente interessante, que extrapola o universo restrito daqueles que tem acesso ao fanzine (figura 56).
Figura 55: processo de pintura dos abrigos. Fonte: acervo Foi à Feira.
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Figura 60: abrigos pintados e em uso: resultado final. Fonte: acervo Foi à Feira.
No início de 2013 (dia 25 de janeiro) ocorreu o primeiro “Coletivos Unidos” (C.U.), um encontro de coletivos da Grande Vitória promovido pelo Assédio Coletivo no Espaço Criativo De Casa. Nota-se a importância de participar de tais encontros e eventos que promovam interações e integrações entre os produtores culturais da cidade, já que o funcionamento de iniciativas independentes, tais como o Foi à Feira, dependem vastamente da rede de contatos que se pode construir dentro deste universo alternativo. Foi uma ótima oportunidade de divulgar o fanzine e tentar agregar mais colaboradores.
Figura 57: um dos cartazes virtuais de divulgação e registros do primeiro Coletivos Unidos (C.U.) no Espaço Criativo De Casa. Fonte: página do Assédio Coletivo no facebook36.
Durante este processo o Foi à Feira foi selecionado na primeira etapa do Movimento HotSpot, um prêmio de inovação e criatividade promovido pelo Ministério da Cultura, juntamente com a iniciativa privada. A seleção implica na participação em nove festivais multiculturais em realizados em diferentes capitais brasileiras, através de três painéis em A3 com imagens do projeto (as mesmas utilizadas no processo de seleção, vistas na figura 59). 36. Disponível em www.facebook.com/assediocoletivo, acesso em março de 2013.
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Figura 58: print screen da página de apresentação do projeto no site do Movimento HotSpot. Fonte: site do Movimento HotSpot .
Figura 59: Imagens selecionadas para apresentação nos festivais. Capa do fanzine, miolo do fanzine e montagem de registro de Tábuas de Carne diversas, respectivamente. Fonte: site do Movimento HotSpot37. 37. Disponível em http://movimentohotspot.com/projeto/fanzine-foi-a-feira-2/, acesso em março de 2013.
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A última Tábua de Carne coletiva e pública foi realizada na Ufes no dia 7 de março de 2013. Ela contou com poucas pessoas, mas com um volume de produção significativo. Por ter ocorrido no prédio do curso de artes plásticas e visuais no Centro de Artes da Ufes, alguns curiosos acabavam entrando na sala para perguntar o que estava acontecendo e deixavam alguma colaboração para o fanzine. Por mais que seja interessante realizar estes encontros, encontrar um local adequado tem sido uma dificuldade constante. Esta última Tábua, por exemplo, teve de ser encerrada mais cedo pois, mesmo com uma autorização prévia, a sala tinha que ser fechada por motivos que não ficaram muito claros no momento. A Ufes, que é o local ideal de realização, não tem sido muito acolhedora para com os encontros, quando estes ocorrem. É claro que isto envolve muitas outras questões, mas ainda assim é um obstáculo constante.
Figura 60: Registro da Tábua de Carne realizada em 07/03/2013, no Centro de Artes da Ufes. Fonte: acervo Foi à Feira.
Durante esta Tábua, foram planejadas as últimas ações do coletivo pré-lançamento da segunda edição. Também foi discutido de que forma acontecerá a curadoria dos trabalhos recebidos. Esta se dará no sentido de discutir e definir a melhor forma para a apresentação do conteúdo – o que diz respeito não só ao leitaute adotado em si, mas também à ordem dos conteúdos, descrição dos colaboradores, editorial, entre outros – e provavelmente acontecerá em sua maior parte pela internet, com uma reunião agendada para a finalização de conteúdos, de forma geral. Tais discussões compõem as mudanças editoriais a serem realizadas no fanzine, em conjunto às modificações gráficas. Somando-se todo o tempo de produção e elaboração deste projeto e da segunda edição, o Foi à Feira recebeu e pediu colaborações por aproximadamente seis meses, de 2 de outubro de 2012 a 18 de março de 2013 – devido a atrasos diversos e outras dificuldades encontradas. Considerando-se este período de tempo significativo, chega a ser frustrante perceber que o número de colaborações foi pequeno. Como dito anteriormente, nesta edição não convidamos todos os colaboradores, o que deixou o processo como um todo mais livre, aberto e orgânico. Por outro lado, como não há uma certa “obrigação” em produzir, acredita-se que os colaboradores possam ter ficado desmotivados, ou algo do tipo. Observa-se que deve haver um acompanhamento junto aos colaboradores para que a produção não “se perca” no meio do caminho. Sem essa presença constante, pelo menos durante o final do prazo de seleção,
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é difícil garantir que as pessoas terminem suas produções à tempo. Por ainda não ser um fanzine de grande visibilidade (guardadas as devidas proporções, claro), o alcance do Foi à Feira acaba se restringindo ao círculo de amizades dos membros do coletivo, o que basicamente significa que não podemos, ainda, contar com colaborações de muitas pessoas. É difícil traçar uma teoria sobre o baixo número de trabalhos, mas certamente esse comportamento é um reflexo claro da desvalorização desse tipo de mídia, mesmo quando inserida no meio universitário e cultural. A Grande Vitória, apesar de abrigar alguns produtores de mídia alternativa, não tem uma cultura de fanzine enraizada, como se vê em outras cidades do Brasil, principalmente no que diz respeito a fanzines plurais e experimentais que não tenham conexão com música (bandas de punk e hardcore, mais especificamente). No final de todo este processo, o Foi à Feira recebeu cerca de 26 colaborações, de diferentes naturezas. Em vias de organizar o conteúdo e poder visualizar o montante completo de produções, os colaboradores foram organizados em uma tabela, juntamente à quantidade de colaborações que enviaram e à natureza das mesmas. Nesta tabela também estão listados os projetos coletivos, como os cavaletes e os pontos de ônibus. Nome
Tipo
Quantidade
Ádamo Moscon
Ilustração
1
Antônio Sérgio Nogueira
Ilustração
1
Alex Gouvêa
Fotografia
3
Aurisa Paiva
Poesia
1
Carol Ruas
Poesia
1
Cavaletes
Fotografia
3
Doll House:
Fotografia
7
Filipe Mecenas
Ilustração
1
Fritz Noronha
Texto (conto)
2
Gabriel Ramos + Rayza Mucunã
Poesia + fotografia
1
Gabriel Ramos + Luis Filipe Porto
Poesia + ilustração
1
Gabriela Canale
fotografia
1
Gabriela Canale
poesia
1
Guido Imbroisi
Ilustração
1
Gustavo Rodrigues
Ilustração
1
Ilustração/
1
Marianna Schimdt,Ádamo Moscon, Kahren Agrizzi, Ricardo Capucho, Carol Ruas, Rayza Mucunã
Isabela Bimbatto
fotografia “entre” Isabela Bimbatto Isabela Bimbatto
Ilustração “rato”
1
Ilustração/
1
fotografia Isabela Bimbatto
Ilustração “morangos”
1
Jorge Loureiro
Ilustração
2
Juane Vaillant
Ilustração / lettering
2
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Juane Vaillant
Colagem “ivete”
1
Juliana Tinoco
Ilustração
1
Leonardo Amaral
Ilustração
1
Magno Calderón
Texto (conto)
1
Marianna Schmidt
Ilustração
3
Natan
Ilustração
1
Paulo Ramon
Colagem
1
Fotografia
3
Rayza Mucunã
Colagem
1
Rayza Mucunã
Fotografia/ lambe-lambe
1
Sara Serna
Colagem
1
Thiago Salles
Ilustração
1
Thiara Pagani
Ilustração
1
Veriana Ribeiro
Texto / carta
1
Pontos de ônibus Iago Amaral, João Oliveira, Ádamo Moscon, Rayza Mucunã
Tabela 1: ralação de colaboradores, tipo de colaboração e quantidade de páginas no fanzine.
Nem todos os colaboradores utilizaram o site como ferramenta de inscrição. Grande parte deles foi convidada pelos diversos membros do coletivo, inclusive três artistas de fora do estado, que foram convidados por e-mail por possuírem trabalhos notáveis e que se relacionam bem com o tema: Sara Serna, Jorge Loureiro e Gabriela Canale. Sara Serna (Colômbia) produz colagens, figurativas e abstratas, de um olhar lúdico e retrô, misturando texturas, formas e imagens com graciosidade. Ela mesma produz alguns fanzines pessoais, feitos completamente com colagens. Nos deparamos com seu trabalho pelo flickr e a convidamos por e-mail a colaborar, o que ela felizmente fez, explorando o tema do canivete (além disso, a própria técnica de colagem remete diretamente ao objeto-tema), como se pode ver na figura 61.
Figura 61: colagem de Sara Serna para colaboração no fanzine Foi à Feira 2. Fonte: acervo Foi à Feira.
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Jorge Loureiro (Porto Alegre) desenvolve um trabalho em ilustração, colagem e toy art. Por indicação da página do fanzine A Zica no facebook, nos deparamos com uma ilustração sua que trata, de maneira abstrata, de cortes e secções (como denuncia o título: Rasgo / Sobre o inalcançável). A partir disso entramos em contato para saber se ele não teria interesse em publicar a ilustração, o que ele felizmente aceitou (figura 62).
Figura 62: ilustração Rasgo / Sobre o inalcançável, de Gabriel Loureiro para o Foi à Feira 2. Fonte: acervo Foi à Feira.
Gabriela Canale, de São Paulo, faz parte do Multigraphias, um projeto artístico colaborativo que seleciona diferentes artistas para residências em diversas cidades do mundo, sobre as quais são realizadas as criações. O projeto já conta com mais de 60 artistas espalhados pelo mundo, que apresentam em conjunto suas produções periódicas na plataforma virtual do site Multigraphias em formato de blog / diário virtual, o que também remete um pouco ao papel de “fanzine virtual” assumido pelos blogs, conforme mencionado por MAGALHÃES (2005). A partir do interesse pelo projeto e do contato com Gabriela feito por um dos membros do coletivo, a artista teceu uma espécie poema-fotográfico relacionando os dois temas: o canivete e a metrópole. O resultado é uma perspectiva nova e inesperada sobre o objeto, que foge de sua simples imagem ou funções básicas e explora semanticamente sua própria existência dentro do universo maior das cidades (figura 63). Outro processo interessante que se deu já durante a diagramação foram algumas interações com as colaborações enviadas. Isso ocorreu em alguns casos, sempre com o consentimento dos autores. Alex Gouveia, por exemplo, enviou como colaboração uma série de fotografias de jovens jogando capoeira em golpes que remetem ao abrir do canivete (ou faca retrátil). As fotografias foram tiradas com maestria, porém os sujeitos foram retratados frente uma parede branca que, além de prejudicar o contraste das fotos – já que as roupas dos capoeiristas também são brancas, não acrescenta muito à composição, de forma geral. Como gostamos muito das fotos, propusemos ao fotógrafo que o fundo fosse refeito. Com seu aval, produzimos em conjunto (durante uma das Tábuas) texturas que pudessem ser aplicadas no fundo das fotografias, o que resultou em imagens totalmente diferentes (figura 64), e, o que é mais importante, colaborativas (ainda que à distância). Este processo colaborativo não-presencial, por assim dizer, foi incitado e praticado durante a produção de conteúdo
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Figura 63: metaphorically-cutting-until-bleeding-the-city, de Gabriela Canale para o Foi à Feira 2. A imagem é acompanhada pelo poema: “Me deram um canivete / E fui eu, armada com ele atravessar a cidade. / Não era mágico meu canivete, mas era útil. / Furei as rodovias. Fui eficiente na medida da precariedade. / Um canivete, em uma cidade, é de alguma utilidade”. Como a artista trabalha com o suporte digital, a adaptação para o impresso das páginas do fanzine será feita na diagramação, o que ainda dota o resultado final de certo teor colaborativo, entre a designer responsável pelas páginas e a autora da obra. Fonte: site Multigraphias38.
do fanzine, sempre que possível. Os casos mais comuns ocorrem com colaboradores que enviaram textos e poesias que receberam ilustrações feitas por outras pessoas, membros do coletivo ou não, que interferiram na apresentação do conteúdo inicial com o intuito de agregar e construir novos significados e interpretações, transformando o conjunto final no resultado de pelo menos três interações: a do escritor com o tema, do ilustrado com o texto e do diagramador com o conteúdo combinado. Este processo fornece ao fanzine camadas de significações que permitem agregar significados mais profundos às produções. Este processo também é descrito com mais detalhes no tópico 8.1.2 Leiaute e diagramação, na página 91.
Figura 64: fotografia original de Alex Gouveia e resultado final com a montagem do fundo. As texturas criadas têm clara inspiração tribal, e foram baseadas em padronagens utilizadas para combates e guerras em diversas tribos e culturas africanas e indígenas. Fonte: acervo Foi à Feira. 38. Disponível em http://multigraphias.wordpress.com/2013/04/05/as-cidades-e-as-ferramentas/, acesso em abril de 2013.
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7.4 Estratégias Paralelas No dia 10 de março de 2013 aconteceu no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo (SP) a primeira edição da Feira Plana, uma feira dedicada à editoras, produtores independentes e impressos alternativos, de forma geral. O número de participantes aumentou paulatinamente com a divulgação do evento, que reuniu cerca de 99 expositores (entre editoras, fanzines e selos pequenos, nacionais e internacionais, listados na figura 65) e mais de 3000 visitantes (figura 66). Esta é uma demonstração clara do interesse crescente em se produzir e consumir impressos experimentais e diferenciados.
Figura 65: print screen do site da Feira Plana, onde estão listados todos os expositores. Fonte: site da Feira Plana39.
Figura 66: registros da Feira Plana. Fonte: página da Feira Plana no Facebook40. 39. Disponível em www.feiraplana.org, acesso em março de 2013. 40. Disponível em www.facebook.com/feiraplana, acesso em março de 2013.
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A segunda edição do fanzine Foi à Feira
Como infelizmente nenhum membro do coletivo poderia comparecer pessoalmente à Feira, decidiu-se enviar dois exemplares da primeira edição para a zineteca (biblioteca de fanzines) que seria montada no evento. Enxergando nessa oportunidade um momento para divulgação e fortalecimento do fanzine, percebeu-se que, na edição piloto, não existe em nenhum momento, de forma clara, uma descrição da proposta do impresso. A solução para tal problema foi encartar nos exemplares um impresso separado que conteria estas informações. Aproveitando um painel em papel paraná que foi composto coletivamente durante a oficina ministrada em 2012 na S Design41, fizeram-se recortes de 10x15 cm que criaram vários cartões postais de composições aleatórias e recortadas. Então o texto explicativo foi escrito no verso deste cartão, à mão livre.
Figura 67: piloto do zine-card, frente e verso. Fonte: acervo Foi à Feira.
Percebendo que o resultado final foi bastante satisfatório, observou-se que a mesma ideia poderia ser adaptada para a produção de cartões que funcionam como flyers do fanzine, e que podem ser distribuídos tanto encartados dentro da primeira edição, numa tentativa de frisar a identidade e o caráter do impresso, quanto separadamente, em vias de disseminar os canais de comunicação do Foi à Feira, como o site e a página no facebook, que levam, invariavelmente, aos fanzines impressos. Para que tal produção seja viável, algumas adaptações devem ser feitas: o texto escrito a mão é impraticável, já que demandaria muito tempo de produção para uma quantidade maior de cartões. Assim, o texto foi composto, xerocado e então aplicado ao verso dos cartões. Para manter uma unidade com a imagem, buscou-se aplicar uma estética suja e manual à composição do texto.
Figura 68: zines-cards finais, frente e verso. Fonte: acervo Foi à Feira. 41. O processo de manufatura deste painel pode ser visto na figura 52, página 75.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
8.
O projeto
Finalmente chega-se ao momento os planejamentos feitos do papel e transformá-los na segunda edição do Foi à Feira. Neste estágio as principais decisões de projeto são tomadas, e o impresso finalmente toma forma, através da definição do método de impressão e do leiaute, além da diagramação das páginas.
8.1 Como imprimir Com o andamento do projeto, é chegado o momento em que a definição do método de impressão torna-se essencial para a continuidade da produção. Os fatores que mais influenciam tal decisão são, fatalmente: a verba disponível para impressão, a tiragem pretendida para o fanzine, a complexidade do projeto (em termos de dobras, facas especiais, entre outros). A verba disponível para impressão se resume em cerca de 500 reais, já que as tentativas de inscrição em editais fracassaram. Descartados os editais, restam poucas opções para a obtenção de fundos. Levando-se em consideração a desestruturação atual do coletivo, restam menos opções ainda (já que descartam-se, por exemplo, a realização de eventos ou outras ações para o público que possam acarretar a venda da primeira edição ou de outros produtos para levantar algum capital). Possivelmente, a única alternativa plausível seria fazer uma cota entre os membros do coletivo, de forma que cada um desse uma parte do capital necessário. Ainda assim, a contenção de custos torna-se indispensável e essencial, já que a disponibilidade de verbas é pequena. No que diz respeito à complexidade do projeto, esta também está sujeita à definição da forma de impressão, num caminho de vai e volta. Ainda assim, é claro que quanto maior for a liberdade de experimentações e inovações na edição, mais interessante o projeto se torna. Já a tiragem, é crucial que esta seja definida neste momento. Como dito anteriormente, a tiragem de mil exemplares da primeira edição mostrou-se inadequada, já que o processo de distribuição é lento e, de certa forma, complexo. Isso porque a venda é feita de mão em mão, assim como a divulgação, e acontece prioritariamente em eventos culturais, o que demanda uma mobilização do coletivo – para “montar a barraca” e vender. Tais eventos não ocorrem com frequência e têm periodicidade irregular.
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Existe a possibilidade de distribuir em sebos e bancas, onde a venda ocorreria por um processo indireto. A dificuldade desta opção, entretanto, está na negociação dos exemplares com estes estabelecimentos comerciais, já que poucos se dispõem a comprar um certo número de fanzines para revender. Se isso ocorresse, o fanzine seria vendido para os estabelecimentos a um preço mais barato que o estabelecido como normal, para que houvesse uma porcentagem do lucro destinada ao ponto de venda, o que significa que o valor revertido ao coletivo seria inferior ao de venda direta (realizada pelo coletivo). Apesar de este prejuízo ser pouco significativo, a problemática se encontra no fato que este tipo de negócio não é facilmente aceito pelo comércio, já que poucos comerciantes aceitariam o risco de comprar uma mercadoria alternativa cuja aceitação ele não conhece, ou seja, pagar por algo que não tem certeza que vai vender. A outra opção seria realizar uma venda consignada, onde a partir da venda dos fanzines o comerciante realizaria o pagamento ao coletivo. Porém, isso depende de um acompanhamento constante das vendas do estabelecimento, e só funciona caso se estabeleça uma confiança entre as duas partes. Tal relacionamento só ocorre em um caso, que é a loja Prego42 onde certamente a segunda edição poderá ser comercializada. Outra questão que deve ser considerada ao definir a tiragem é que cada colaborador deve receber uma cota de fanzines. Na primeira edição, devido à alta tiragem, cada colaborador recebeu cinco exemplares do fanzine, mas este número também pode ser reduzido (o que foi confirmado pelo feedback recebido de vários colaboradores, que assumiram não ser necessário receber tantos exemplares). Na primeira edição tal medida foi definida para compensar o fato de que os fazines seriam vendidos, mas os colaboradores fizeram as artes sem remuneração. Porém, com o passar do tempo e com a proximidade com outras publicações independentes colaborativas, percebeu-se que esta situação é comum e bem aceita pelos artistas. Em conversas informais com produtores de fanzines, pode-se chegar à conclusão que normalmente se recebe duas ou três cópias do impresso por colaboração. Assim, decidiu-se que cada colaborador receberá duas cópia do Foi à Feira 2. Analisando as tiragens de outros fanzines (figura 69), percebe-se que a maioria possui tiragens entre 51 e 100; e de 101 a 500 exemplares. Embora a amostra não seja tão específica como seria ideal, pode-se ter uma boa noção do que outros produtores conseguem produzir e distribuir. Deve-se, porém, analisar esta estatística em conjunto com outra, que a influencia diretamente: a forma de impressão. Ao ver o gráfico das principais formas de impressão, percebe-se que a maioria esmagadora dos fanzines - 42,8% - é feito através de xerox, que é um método muito mais barato do que a impressão colorida (como é o caso do Foi à Feira). Assim, assume-se que tiragens maiores tenham um custo significativamente menor. Outra variável envolvida é a quantidade de páginas do impresso, que torna cada edição mais cara ou mais barata, e consequentemente a tiragem total também.
42. Estabelecimento gerenciado por Alex Vieira, criador e realizador da Revista Prego, que comercializa impressos e outros produtos alternativos e independentes. A primeira edição do fanzine já é comercializada em consignação, o que ocorre principalmente devido à relação de amizade que vários membros do coletivo possuem com Alex.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
Figura 69: gráficos com as porcentagens de métodos de impressão e tiragens, respectivamente, dos fanzines listados no 1° Anuário de Fanzines, Zines e Publicações Alternativas. Fonte: UTESCHER; MÁRCIO, 2011.
Assim, considerando que o fanzine deve ter um número de páginas grande (já que isto foi colocado como prioridade e objetivo da segunda edição), numa média de 50 a 60 páginas, a produção de uma grande tiragem teria um preço alto. Ponderando todas estas variáveis, os membros do coletivo decidiram que 150 exemplares seria adequado. Considerando que são 19 colaboradores, e que cada um receberá dois fanzines, tem-se uma quantia de cerca de 50 fanzines que serão destinados especificamente aos mesmos e não serão vendidos. Com isso, a tiragem a ser distribuída é de apenas 100 fanzines. Embora o número possa parecer pequeno, esta tiragem permitirá que o fanzine seja um impresso mais restrito, sem a megalomania da primeira edição, e portanto de colecionador. Ponderando todas as questões envolvidas, decidiu-se que o fanzine será impresso de forma caseira, na impressora a laser que o coletivo possui. Assim, os gastos envolverão o preço do tonner – que pode imprimir entre 3000 e 8000 páginas, segundo o site de compras da marca da impressora43 e custa cerca de 100 reais (de acordo com o mesmo site) cada um – são necessários quatro, ciano, magenta, amarelo e preto. Também serão feitos gastos com o papel e a encadernação, que possuem preços módicos. Além disso, deve-se considerar que realizar a montagem e a impressão de forma artesanal demandará um gasto de energia, já que é um processo trabalhoso e demorado. Por outro lado, as vantagens da produção artesanal são altamente significantes. Pode-se, por exemplo, utilizar vários tipos de papel diferentes, de acordo coma natureza de cada colaboração, fazer variações nos formatos das páginas e até mesmo na forma de impressão 43 . Disponível em http://www.infofastshop.com/toners-compativeis/toner-brother.html, acesso em março de 2013
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– nada impede que algumas páginas sejam reproduzidas em xerox ou serigrafia, entre outros. Além disso, a montagem manual permite que algumas intervenções artesanais sejam feitas nas páginas, o que tornaria cada fanzine único. Todas estas questões agregam valor ao impresso final, ajudando-o a atingir os objetivos propostos (diferenciação, identidade gráfica e fetichismo – tornar o fanzine um objeto de desejo).
8.2. Como apresentar Uma vez que a tiragem e o método de impressão foram definidos, deu-se início ao planejamento visual do fanzine. Como colocado durante a revisão bibliográfica sobre fanzine, identidade e design gráfico, deu-se início ao projeto pela definição do formato, da encadernação e dos tipos de papéis a serem utilizados (AMBROSE; HARRIS, 2009). A metodologia de produção que se decidiu utilizar é extremamente artesanal, e envolve na maior parte das vezes vias de mão dupla entre os testes realizados e a manipulação do arquivo digital. Para que se possa compreender de forma clara as decisões de design tomadas neste ínterim, dividiu-se o processo em algumas etapas fundamentais de projeto, para que o mesmo possa ser descrito de maneira linear.
8.2.1 Formato e encadernação A partir das medidas divulgadas na chamada pública de trabalhos (13x22 cm), uma boneca foi confeccionada para que se pudesse analisar o comportamento do formato e da encadernação em conjunto. Vários tipos de papel foram utilizados, para que se pudesse observar o comportamento de cada um na proposta em questão, em vias de definir as possibilidades de impressão.
Figura 70: à esquerda, boneca com medidas demonstrando como as páginas se comportam. À direita, detalhe dos vários tipos de papeis testados.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
Uma vez que o método de impressão amador foi definido, a necessidade de que o formato siga o aproveitamento de páginas das gráficas deixa de existir. Assim, o coletivo decidiu aumentar o formato para 13x26 cm, considerando que desta forma o fanzine é mais harmônico, mais semelhante ao canivete e as páginas passam a ter uma área maior para explorar. A dificuldade está no fato de que algumas colaborações foram feitas no formato antigo, o que demandará uma adaptação. Como apenas cinco colaborações possuem este formato (a maioria dos colaboradores não respeitou o formato inicial), este ajuste pode facilmente ser realizado durante a diagramação44. A partir da construção da boneca também ficou clara a possibilidade de utilizar-se mais de um tipo de papel no impresso, adicionando aspectos de textura e variedade ao fanzine. O tipo de papel específico para cada página será decidido de acordo com o conteúdo em questão (este processo é descrito com mais detalhes nos próximos tópicos). A encadernação será feita através de um parafuso, que une todas as páginas pelo topo. O interessante desta encadernação e formato é que, além da analogia ao canivete, ele permite uma clara relação ao formato normalmente usado para mostruários em geral, que pode associar o fanzine a um catálogo da produção cultural da Grande Vitória. Além disso, o parafuso utilizado é facilmente retirado e recolocado, o que pode permitir que o usuário interaja com o fanzine, retirando, adicionando e modificando a ordem das páginas, como quem seleciona as ferramentas mais úteis ou importantes de um canivete, além de permitir outros usos para as páginas – como pequenos pôsteres ou postais, por exemplo. O leiaute das páginas, principalmente através da utilização de imagens em diferentes orientações (vertical e horizontal), também contribui para uma experiência mais dinâmica de manuseio do impresso, ao obrigar o leitor a girar a publicação durante a leitura.
Figura 71: detalhes do parafuso utilizado e da encadernação da boneca frente e verso, respectivamente. Nota-se um segundo furo na lateral direita do impresso: testes realizados para definir a melhor maneira de abrir as páginas do fanzine. O parafuso no centro foi a opção que funcionou melhor, de acordo com os testes.
8.2.2. Leiaute e diagramação Com as colaborações em mãos deu-se início à diagramação dos conteúdos do fanzine. Num primeiro momento as páginas foram preenchidas despojadamente. Como a maior parte das colaborações foi pensada para ocupar uma página inteira bastou que se sangrasse as 44. Outra consideração a ser feita é que a impressora a laser não possui a mesma qualidade de impressão que a offset, aceitando facilmente arquivos com até 250 dpi – segundo o manual de instruções da própria impressora.
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imagens nas folhas, com poucas adaptações decorrentes. Tendo visto que as ilustrações, colagens e fotografias são imensamente variadas e distintas uma das outras, concluiu-se que não haveria sentido em formular um layout que fosse repetido em todas as páginas, de forma que a diagramação também pudesse refletir a variedade de temas, técnicas e formatos das colaborações. Durante este processo algumas das colaborações receberam influências diretas minhas para que se adequassem melhor ao que eu imaginava para o projeto. Obviamente, toda e qualquer modificação feita foi aprovada pelo autor da colaboração em questão. A maior parte destas interferências diz respeito a retirar o fundo da ilustração, por exemplo, para que a impressão possa ocorrer melhor em um papel texturizado ou colorido, ou repetir a textura utilizada no fundo para que ocupe a página inteira.
Figura 72: colaboração de Natanael Souza, exemplo da manipulação de imagens. À direita o original, em formato A4, digitalizado sem nenhum tratamento. Em seguida, a composição final na página do fanzine e por último a página já impressa, respectivamente. Com o fundo totalmente branco e o contraste bem definido, a ilustração pode ser impressa em vários tipos de papel. Para o fanzine, decidiu-se pela impressão em papel pautado, brincando com a possibilidade de o desenho não parecer impresso e sim feito manualmente numa folha qualquer de caderno, num dia tedioso de aula.
Quanto às colaborações textuais, sua transposição para o leiaute final se deu de diferentes formas. Como foi colocado anteriormente, partiu-se do pressuposto que cada leiaute deveria transpor visualmente cada texto, conto ou poema, de forma que ficassem claras as diferenças e individualidades de cada um. Este processo de diagramação caso a caso mostrou-se muito interessante e enriquecedor, por possibilitar que diversas técnicas de composição fossem exploradas, a partir de referências distintas, e principalmente por permitir que os aspectos mais interessantes de cada texto fossem ressaltados, algo que seria infinitamente
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mais complexo ao se pensar em um leiaute e grid fixos. Dessa forma, cada texto diagramado recebeu uma atenção especial, seguiu uma linha de raciocínio diferente, e será descrito individualmente neste capítulo. Os dois poemas de Gabriel Ramos foram muito elogiados pelos membros do coletivo, de forma geral. Porém, não apresentavam uma conexão explícita com o canivete. Portanto, decidiu-se diagramá-los junto a ilustrações que pudessem fortalecer a relação dos textos com o objeto-tema. O primeiro poema, Fala da fome, foi ilustrado por Luis Filipe Porto, um dos membros do coletivo. O ilustrador não propôs nenhuma forma de associar o texto à imagem, portanto coube a mim realizar a diagramação das duas colaborações em conjunto na página. A intenção, de forma ampla, foi exaltar o caráter simples e sucinto do texto, através do grande espaço de respiro e da estética limpa, que também está presente na ilustração. Por outro lado, como o teor do poema está intimamente relacionado a um certo sentimento de angústia e ansiedade, o texto foi blocado em uma caixa apertada, com entrelinha e espaçamento reduzidos, de forma que se assemelhe a um fluxo ininterrupto de pensamento, desesperado, dito de um só fôlego, como se vê na figura 73.
Figura 73: leiaute final do poema Fala da fome, de Gabriel Ramos. O texto foi diagramado junto à ilustração de Luis Filipe Porto.
O segundo poema, Reza, foi aplicado sobre uma fotografia de intervenção urbana realizada pela autora, Rayza Mucunã, devido à semelhança temática entre as duas criações: a relação entre cortes, facas e fé. Justapor a poesia e a imagem é uma forma de implicar e sugerir semelhanças e relações entre os dois elementos (AMBROSE; HARRIS, 2009, p.148). Como já se utilizaria uma fotografia em close dos lambe-lambes produzidos, decidiu-se por inserir o texto numa fotografia que mostrasse o entorno da intervenção, com a presença de pessoas e da cidade. Decidiu-se compor o poema em uma tipografia de estêncil, de forma a traçar uma relação clara com a arte de rua. A fotografia foi reticulada em preto, para permitir a impressão em papel colorido de forma que a cor do papel funcione como a segunda cor da imagem impressa (figura 74).
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Figura 74: leiaute da página com o poema de Gabriel Ramos e a fotografia de Rayza Mucunã, e página impressa em papel colorido, respectivamente.
A colaboração de Gabriela Canale foi originalmente publicada no site do projeto Multigraphias, e foi necessário transpor este conteúdo para as páginas a serem impressas. Levando em consideração não só o caráter da colaboração, que trata do canivete como uma ferramenta de navegação na cidade, mas também o próprio aspecto de transposição do meio virtual para o meio impresso, decidiu-se por compor o texto em OCR, uma tipografia que remete à linguagem de programação em computação para a internet, e que é uma ferramenta neste sentido. Para que o texto e a imagem pudessem ser combinados com a menor quantidade de interferências possíveis em ambos, o texto foi diagramado ocupando apenas parte da página, para que metade da imagem apareça sob a folha do texto. Além disso, a página será impressa em papel vegetal, de forma que a imagem aparecerá discretamente entre as letras vazadas (figura 75).
Figura 75: leiaute final nas páginas já impressas de Gabriela Canale.
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Porém, nem todos os poemas recebidos seriam ilustrados ou teriam alguma representação visual já produzida. Nestes casos buscou-se desenvolver a diagramação e composição do texto de forma a suprir a necessidade de imagens. No caso da poesia de Carol Ruas, este processo se deu de uma forma bastante natural. O poema já foi entregue com um arranjo específico de palavras e símbolos que deveria ser respeitado. Pensando em ressaltar este aspecto, a diagramação foi feita de forma a frisar o posicionamento de cada palavra, e o texto foi composto em tipografia geométrica, sem serifa, numa folha A4. Também foram aplicados carimbos das letras que formam a palavra principal do texto (“CORTE”) de forma aleatória na página, antes da impressão (figura 76). O leiaute final tem clara inspiração nas vanguardas modernistas (principalmente o dadaísmo e futurismo) e na poesia concreta, de forma geral. Como o formato utilizado é maior que o do restante das páginas, o poema virá dobrado, de forma que quando fechado seja visível apenas parte da composição, promovendo uma interação do leitor com o impresso (figura 77).
Figura 76: teste realizado com carimbos e impressão e detalhe da textura das letras carimbadas, respectivamente. Decidiu-se por utilizar sempre a cor amarela nos carimbos, já que a mesma apresenta contraste com várias cores de papel colorido, além de permitir que o texto impresso continue visível tanto quando impresso antes quanto depois da aplicação dos carimbos.
Figura 77: à esquerda, leiaute do poema de Carol Ruas. As linhas pontilhadas indicam cortes – necessários para se realizarem as dobras na página para encadernação. À direita, página final impressa, com a aplicação de carimbos.
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Resta então o poema Canivete, de Aurisa Paiva. O texto narra o frio e desolado suicídio de um jovem anônimo, nas ruas da cidade. A inspiração para o leiaute veio da relação entre este teor do texto, de juventude em anonimato, e o movimento punk dos anos 70 – cujos lemas incluíam a famosa frase live fast, die young45. Buscou-se fazer a relação entre o punk e o surgimento dos fanzines, com a estética do faça-você-mesmo, quando textos eram batidos em máquinas de escrever, compostos manualmente nas páginas, e então xerocados. Assim, o texto foi composto em tipografia que simula a composição da máquina de escrever, impresso, recortado e colado por cima da imagem de fundo, já impressa. A imagem escolhida é uma textura de televisão fora do ar, fotografada e estourada, de forma que percebe-se apenas um ruído gráfico, uma textura suja que remete ao asfalto, a algo que não tem definição certa. A página montada foi xerocada e essa xerox foi escaneada para se obter a imagem do leiaute final. Espera-se que o leitor possa perceber as relações propostas através da apropriação estética e conceitual deste estilo característico (AMBROSE; HARRIS, 2009, p.95).
Figura 78: registros do processo de obtenção da imagem final. Composição do texto recortado no papel, colagem do texto, xerox da página composta e o scan tratado e pronto para impressão, respectivamente.
O processo de diagramação dos outros textos presentes no fanzine se deu de forma mais simplificada que as poesias. Primeiramente, como o número de colaborações textuais foi significantemente pequeno, decidiu-se utilizar estas páginas como intervalos na narrativa visual do fanzine. Então, buscou-se aplicar estilos simplificados de leiaute, para que estes intervalos funcionem como momentos de respiro entre tantas produções imagéticas. A começar pelo conto de Magno Calderón, que sofreu mais influência da deliberação supracitada. O famigerado Bolaoito é um texto lúdico, de teor divertido, que invoca um pouco a cultura do brasileiro esperto e cafajeste das décadas de 60 e 70. O leiaute foi desenvolvido a partir desta premissa, inspirado em capas de disco das décadas citadas, com o texto composto em Bodoni e um lettering de inspiração retrô. Manteve-se o fundo branco para que se 45. “Viva rápido, morra jovem”, em tradução livre. A frase é título de duas canções de bandas punks do início dos anos oitenta, e parece resumir o sentimento comum dos jovens da época.
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possa imprimir em papéis coloridos diversos. Decidiu-se por separar o texto em três partes, como capítulos de uma novela ou folhetim, para que ele faça as vezes e intervalo literário entre as páginas no fanzine.
Figura 79: leiaute final das três páginas do conto O famigerado Bolaoito.
O conto de Fritz Noronha é uma curta anedota sobre personagens insólitos que se relacionam com o canivete e com o ato de cortar, furar, permitir e negar, ver e esconder. Partindo dessas premissas, o texto foi diagramado de forma extremamente simples, sem imagens ou texturas, apenas o texto composto em Clarendon (no intuito de dar ao texto um aspecto nostálgico, clássico). Por cima do texto impresso, é aplicado um recorte de papel de cor diferente da página do texto. Ele encobre parcialmente a impressão, e atrapalha a leitura do texto completo. Assim, o leitor tem que rasgar ou cortar esta página superior para poder ler o texto por completo (ou pode ficar bisbilhotando por debaixo dessa cobertura). O papel inferior, onde é impresso o texto, é de gramatura alta (120g), para que possa suportar o rasgo do papel colado sem sofrer danos que prejudiquem sua integralidade como página do impresso. O papel superior (papel colorido, com a possibilidade de utilização de várias cores) é colado pelas bordas com uma quantidade mínima de cola especial, que não enruga o papel. Além da conexão semântica com o conteúdo do texto, esta configuração do texto também funciona como estratégia no intuito de proporcionar e incentivar a interação do leitor com o impresso de forma dinâmica, seguindo a relação entre a forma e a função do leiaute em vias de utilizar estes princípios para alcançar um grau de criatividade e inovação, conforme colocado por AMBROSE e HARRIS (2009, p. 87).
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Figura 80: leiaute final do texto de Fritz Noronha. A página sobreposta pode ser impressa em várias cores de papel.
O texto de Veriana Ribeiro se difere dos outros por configurar-se como uma carta, em primeira pessoa, direcionada a um personagem fictício. A interpretação do objeto proposta pela autora tem um aspecto íntimo e extremamente voltado às relações emocionais. Diante de um texto tão pessoal e emotivo, decidiu-se pela composição manual, sem imagens ou texturas de fundo. Apenas o texto, com rasuras e pequenos erros, como um bilhete de despedida deixado a um ex companheiro. A utilização direta da caligrafia é uma referência (e reverência) ao universo fanzineiro (principalmente pré desktop publishing), onde se pode sentir diretamente “a mão do editor”, sem maquiagens ou tratamento, onde a própria escrita é o elemento gráfico a ser explorado e a imagem é o próprio texto (ALBERNAZ; PELTIER, 1994). A composição será impressa em A4 e encadernada dobrada. O furo será feito no papel dobrado, e ele será encadernado com as duas faces presas ao parafuso. Ou seja, para que possa ler uma carta tão íntima e privada, o leitor terá que desencadernar o fanzine ou violar o lacre do papel.
Figura 81: leiaute final do texto de Veriana Ribeiro.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
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No ensaio Doll House houve a necessidade de compor o título e o subtítulo com a fotografia escolhida para abrir o ensaio. Estas fotografias receberam atenção e destaque especiais, pois além de este ser o único ensaio fotográfico propriamente dito presente no fanzine, é também uma criação coletiva, realizada em tábua de carne, e que é assinada por quase todos os membros do coletivo (razão pela qual escolheu-se por creditar o “Foi à Feira”, sem distinção de nomes a não ser daqueles que não fazem parte do coletivo de fato). Consequentemente, neste caso a maior parte das imagens foi sangrada nas páginas, que totalizam sete. A composição do título e do subtítulo se deram através da composição manual de um lettering caligráfico. A intenção foi fazer uma apropriação irônica da linguagem largamente utilizada em revistas femininas para editoriais de moda, que utilizam largamente o recurso de aplicação de tipografias em tamanhos grandes sobre a foto de abertura (geralmente escolhida por possuir um espaço determinado para esta aplicação, como também ocorre no fanzine).
Figura 82: as sete páginas do ensaio Doll House.
As inserções manuais, possibilitadas pela forma de produção artesanal e previstas no intuito de tornar cada exemplar único, foram pensadas de acordo com as colaborações e onde esse tipo de acabamento poderia ser aplicado. Não são muitos os casos, pois não se pode perder de vista a dinâmica de produção final do fanzine – que fica mais lenta e complicada cada vez que um novo acabamento é utilizado. Assim, decidiu-se por inserir elementos manuais em 5 casos: um texto manuscrito de 3 linhas que acompanha a montagem de Isabela Bimbatto, a página com a ilustração de Marianna Schimidt será rasgada manual e propositalmente, a página com a poesia de Carol Ruas terá aplicação de carimbos, e a página com o texto de Fritz Mendonça terá um papel colado por cima, deixando parte do texto invisível.
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Figura 83: página da colaboração de Marianna Schimdt com o rasgo na margem inferior. A ideia é que exista uma relação com os dizeres da ilustração: “ela quer um pedaço de mim, ela quer tudo” (tradução livre). Além disso é uma forma de surpreender o leitor.
Da mesma forma, as páginas que terão formatos diferenciados ou dobraduras foram surgindo de forma orgânica. Estas inserções de páginas diferentes são pensadas no intuito de que o fanzine incentive o leitor a interagir com o impresso, descobrindo o que está por trás das dobraduras, desencadernando as páginas, modificando a ordem das mesmas. A principal questão envolvida nessas decisões são as limitações da impressora caseira. Em termos de formato, por exemplo: a impressora só aceita folhas A4 (21 x 29,7 cm), Ofício (21,6 x 35,6) e Ofício 2 (21,6 x 31,5 cm). Qualquer impressão maior que estes formatos teria que ser feita separadamente em gráficas rápidas, por exemplo, o que não é desejável. Assim, as páginas que terão dobraduras serão: ilustração de Isabela Bimbatto, poesia de Carolina Ruas e carta de Veriana Ribeiro. Todos serão impressos em papel A4 e aparecerão dobrados no fanzine.
Figura 84: página com a ilustração de Isabela Bimbatto fechada e aberta, respectivamente.
A segunda edição do fanzine Foi à Feira
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8.2.3. A capa A capa é uma preocupação constante no decorrer de qualquer trabalho. Principalmente no caso do Foi à Feira, cujo conteúdo é extremamente diverso, em todos os aspectos, a deliberação da capa tornou-se um processo complexo. Na primeira edição, a capa foi feita em conjunto por alguns membros do coletivo durante o processo de fechamento do arquivo, que se deu com a presença de todos os membros. Nesta edição, o coletivo não participou de forma ativa deste processo, que ficou concentrado nas mãos desta autora. Dessa forma, tornou-se logisticamente impensável repetir este processo, devido à distância e desmobilização dos membros do Foi à Feira. Além disso, talvez não fosse de todo interessante que uma obra produzida pelos membros do coletivo fosse utilizada como apresentação para todo o conteúdo, da mesma forma que não seria interessante dar esta visibilidade diferente a qualquer colaborador que participou. Por outro lado, o formato e sua relação com o canivete também poderia ter sua compreensão prejudicada de acordo com o tipo de composição utilizada na capa. Assim, a solução encontrada foi abolir a capa. Tendo em mente o objetivo essencial deste projeto, que é firmar e construir uma identidade para a segunda edição do Foi à Feira, não se pode esquecer que o nome do fanzine é um dos elementos mais importantes, neste sentido (como foi visto na análise de impressos, durante o levantamento de dados ). A solução encontrada foi apresentar o texto editorial na primeira página do fanzine. Acima deste, uma faixa apresenta o nome e o número da edição. O leiaute da página de editorial é construído apenas com texto, de forma que ele seja o ponto focal de leitura e funcione, também, como textura visual que compõe com a página anterior de forma que esta se comporte como um box passível de movimento. Decidiu-se por não inserir o título “Editorial” acima do texto. O Foi à Feira não é uma revista, ou mesmo uma coletânea ou algo do tipo. A utilização deste termo remete diretamente a este tipo de publicação, e poderia causar uma certa confusão ao leitor: “afinal, de que se trata este impresso?”. Assim, o texto é apresentado ao leitor de forma direta, para que o mesmo possa tirar suas próprias conclusões. A redação do texto também foi guiada por este pressuposto, e buscou-se utilizar uma linguagem que funcione como ponte entre a abstração do objeto e uma apresentação formal da concepção do fanzine. Diferentemente do texto presente na primeira edição, que dizia mais respeito à experiência de produção do fanzine, neste buscou-se deixar mais clara a proposta do impresso, tanto desta edição quanto de forma mais geral, ao se traçar a relação entre o nome Foi à Feira e o conteúdo. O texto foi escrito inicialmente por esta autora e depois editado em conjunto pela internet, e aprovado pelo coletivo. Como acredita-se que ele faça parte das estratégias de definição e fortalecimento da identidade da edição, é reproduzido por completo a seguir:
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Projeto de Graduação
Esse foi à feira é sobre o canivete: um instrumento pérfuro-cortante multifacetado com várias utilidades. a ideia é reproduzir o canivete em diferentes representações, e tal como seu uso, vir a ser aplicado de várias maneiras. o formato dessa edição tem a mesma performance do objeto e, ao avançar da leitura, as páginas vão surgindo como ferramentas. O #FAF é uma tentativa de traduzir a feira em publicação. Tudo que tem lá tem cá: barraca, bacia, colorido, tempero, fruta, pastel. A feira é um lugar coletivo de interação com o mundo. Cada um vendendo seu peixe: foto, poesia, arte, ilustração, literatura e coisas sem nome (editorial do fanzine Foi à Feira 2).
O lettering presente na faixa que apresenta o nome do fanzine foi composto por esta autora. A intenção era compor algo orgânico, claramente manual, que fizesse referência aos módulos do fanzine e ao seu manuseio tridimensional.
Figura 85: Foi à Feira #2 finalizado.
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A segunda edição do fanzine Foi à Feira
8.2.4. Testes de impressão Concomitantemente à diagramação, foram surgindo as ideias para que tipo de papel seria utilizado em cada página, assim como “adicionais” de projeto: dobraduras, inserções manuais, cortes diferenciados. Estas decisões foram feitas deliberadamente de maneira intuitiva, pensando cada caso de cada vez, em alguns momentos em conjunto com o autor ou outros membros do coletivo e em outros individualmente. Foi incentivado que o autor participasse ao máximo desse procedimento, ainda que através da internet. Para tornar o processo mais claro e organizado, foi criada uma tabela com todos os dados listados. Nome
Tipo
Qtd Adicionais
Ádamo Moscon
Ilustração
1
Papel branco 120g
Antônio Sérgio Nogueira
Ilustração
1
Papel amarelado / creme / baixa gramatura
Alex Gouvêa
Fotografia
3
Papel branco 120g
Aurisa Paiva
Poesia
1
Papel branco 120g
Carol Ruas
Poesia
1
Papel colorido / amarelo / laranja / vermelho A4 Inserção de carimbos Página dobrada
Cavaletes
Fotografia
3
Papel branco 120g
Doll House: Marianna Schimdt,Ádamo Moscon, Kahren Agrizzi, Ricardo Capucho, Carol Fotografia Ruas, Rayza Mucunã
7
Papel couchè 120g
Filipe Mecenas
Ilustração
1
Papel couchè 120g
Fritz Noronha
Texto (conto)
2
Papel branco 180g Papel colorido colado
Gabriel Ramos + Rayza Mucunã
Poesia + foto1 grafia
Papel colorido vermelho / laranja
Gabriel Ramos + Luis Filipe Porto
Poesia + ilus1 tração
Papel creme mais escuro 90g
Gabriela Canale
fotografia
1
Papel branco 120g
Gabriela Canale
poesia
1
Papel vegetal 90g
Guido Imbroisi
Ilustração
1
Papel branco 120g
Gustavo Rodrigues
Ilustração
1
Papel couchè 120g
Isabela Bimbatto
Ilustração/ fotografia “entre”
1
Papel branco 120g Inserção de texto à mão
Isabela Bimbatto
Ilustração “rato”
1
Papel A4 branco 75g Página dobrada
Isabela Bimbatto
Ilustração/ fotografia
1
Papel couchè 120g
Isabela Bimbatto
Ilustração “morangos”
1
Papel amarelado / creme / baixa gramatura
Jorge Loureiro
Ilustração
2
Papel branco 120g
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Projeto de Graduação
Juane Vaillant
Ilustração / lettering
2
Papel cinza / jornal
Juane Vaillant
Colagem “ivete”
1
Papel amarelado / creme / baixa gramatura
Juliana Tinoco
Ilustração
1
Papel comum branco 120g
Leonardo Amaral
Ilustração
1
Papel amarelado / bege
Magno Calderón
Texto (conto)
1
Papel colorido
Marianna Schmidt
Ilustração
3
Papel comum branco 120g Página rasgada
Natan
Ilustração
1
Papel pautado de baixa gramatura
Paulo Ramon
Colagem
1
Papel cinza / jornal
Pontos de ônibus Iago Amaral, João Oliveira, Ádamo Moscon, Rayza Mucunã
Fotografia
3
Rayza Mucunã
Colagem
1
Papel cinza / jornal
Rayza Mucunã
Fotografia/ lambe-lambe
1
Papel colorido vermelho
Sara Serna
Colagem
1
Papel branco 180g
Papel comum branco 120g
Thiago Salles
Ilustração
1
Papel amarelado / creme / baixa gramatura
Thiara Pagani
Ilustração
1
Papel colorido amarelo
Veriana Ribeiro
Texto / carta
1
Papel branco 120g
Tabela 2: relação de colaboradores, quantidade de páginas e acabamentos especiais (grifados em amarelo) por colaboração.
Figura 86: Exemplo de utilização de papéis diferenciados. Na foto, papel couchè, canson, colorido laranja, cinza (jornal), colorido vermelho e amarelado, respectivamente.
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Acerca do tipo de papel de cada colaboração, um dos fatores determinantes para esta escolha foi o custo do papel em questão. Buscou-se aproveitar da melhor maneira a vontade de inserir no fanzine vários papeis diferenciados em conjunto com o orçamento apertado. Dessa forma, deu-se preferência para papeis de menor custo, e também para o aproveitamento de papéis que estavam guardados nas casas dos membros do coletivo, deixados ao esquecimento. Por exemplo, para algumas colaborações que envolvem experimentações fotográficas coloridas havia-se pensado em utilizar o papel fotográfico, que apresenta bons resultados para este tipo de imagem. Porém, como o mesmo possui um preço mais alto, foi substituído pelo papel couchè brilho de 120 g/m2, que apresenta resultado bastante semelhante e preço inferior.
Figura 87: teste de impressão da ilustração de Luis Filipe Porto em diferentes tipo de papel. Respectivamente, da esquerda para direita: papel azul reciclado, papel branco telado, papel branco 120 g, papel amarelado de baixa gramatura, papel mostarda.
Este tipo de substituição também ocorreu nos momentos em que se quis utilizar papel vegetal de alta gramatura, que possui um preço elevado. Neste caso a substituição se deu pelo papel vegetal de gramatura comum (70 g/m2), que também possui a característica de deixar entrever a página anterior e fornece resultados interessantes para impressão. A outra opção possível para esta impressão seria a utilização de transparência, porém esse tipo de suporte não pode ser impresso na impressora a laser, pois a temperatura interna da mesma faz com que a página seja completamente deformada durante a impressão. Ou seja, seria necessário imprimir estas páginas numa impressora jato de tinta, o que acarretaria na compra de cartuchos e aumentaria os custos de produção. Portanto, o uso de transparência foi descartado. A utilização de papéis diferentes também influencia na economia inteligente de recursos a partir do momento em que colaborações que faziam uso do recurso de simulação de papel – texturas ou cores de fundo, em alguns casos – podem ser impressas diretamente em papel diferenciado, o que significa que o fundo não será impresso e certa quantidade do tonner será melhor aproveitada. Ainda sobre o processo de impressão, uma outra dificuldade foi a configuração de cores da impressora, em conjunto com o arquivo no computador, para que a impressão seja o mais fiel possível à arte original. Este processo se deu através de repetidos testes e ajustes no arquivo original para corrigir e compensar os possíveis desvios da impressão.
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Figura 88: ajuste de cores na impressão. À esquerda, a fotografia original, e à direita os testes de impressão que deram errado.
É importante deixar claro que a impressão caseira difere significantemente da impressão profissional em gráfica. Além do fator determinante da máquina em questão, a qualidade reduzida da impressão é agravada pelo fato de o tonner utilizado ser recarregado, e não original – uma medida que viabilizou arcar com os custos da produção. Assim sendo, a qualidade das imagens impressas nas páginas do fanzine será visivelmente inferior, em termos técnicos, quando comparada à edição anterior – impressa na gráfica. Porém, levando-se em consideração o aspecto artesanal, independente e experimental da publicação, além de seu módico preço de venda, acredita-se que não haja prejuízos ao se aceitar e assumir o ruído gráfico causado pela impressão irregular, como, inclusive, uma escolha estética, que remete às características supracitadas e dotam o impresso de um caráter mais autêntico, como fanzine.
Figura 89: exemplo de impressão defeituosa.
Como os testes de impressão foram realizados paralelamente à diagramação do conteúdo, algumas adaptações foram possíveis, a partir das dificuldades encontradas, para evitar possíveis contratempos. Com relação aos problemas de impressão supracitados, por exemplo, percebeu-se que a impressão apresentava mais falhas e demonstrava a maior complexidade para ajustes, de forma geral – com relação a cor e contraste – quando se tratavam de fotografias nas páginas. Dessa forma, o conteúdo fotográfico produzido para o fanzine foi diagramado de forma a explorar as imagens de maneira inteligente. Isto pode ser visto com
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clareza nas páginas que apresentam as fotografias dos pontos de ônibus, que tomam apenas três páginas (haveria material fotográfico para mais), e apresentam de forma sucinta a ação, com duas fotografias de detalhe em cada página e uma terceira com a visão total dos dois abrigos. Nenhuma das páginas foi sangrada, e procurou-se diagramar as imagens de maneira dinâmica, explorando as possíveis ligações visuais entre as mesmas, de forma que as fotos fossem apresentadas como o registro de uma obra artística.
Figura 90: páginas com as fotografias dos pontos de ônibus: área de impressão utilizada de forma sintética e inteligente.
Outros ajustes de projeto importantes foram feitos com o auxílio de uma boneca preliminar, impressa durante o processo de diagramação. Além de ajustes mais simples de cor e contraste, os testes foram essenciais para determinar a margem das folhas, já que a encadernação em questão faz com que um pedaço da folha fique “escondido” atrás das outras. Assim, as ilustrações e colaborações com informações importantes ou que ficassem prejudicadas pela margem tiveram de ser acertadas.
Figura 91: à esquerda, página da boneca, sem ajuste. Nota-se que a parte superior da imagem fica cortada pelas outras páginas do fanzine, quando aberto. À direita, página reajustada com a margem adequada.
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8.3 Como organizar Com a finalização de todas as página, partiu-se para a organização do conteúdo e montagem do fanzine, de forma geral. Dentro desta premissa, uma questão importante a ser discutida é como se deu o processo de curadoria das colaborações. Como colocado anteriormente, parte das colaborações foram recebidas através de um processo de chamada de trabalhos, regida por um pequeno edital, que proporcionava que qualquer pessoa com interesse de participar pudesse submeter suas criações. Em um primeiro momento, acreditou-se que haveria um grande volume de inscrições, e que uma seleção seria necessária (já que a verba para impressão era limitada, e também em vias de atingir um nível interessante de qualidade do fanzine, de forma geral). A partir da constatação da baixa quantidade de trabalhos recebidos, métodos adicionais de elaboração de conteúdo foram traçados46, com o propósito de enriquecer o impresso e diversificar seu conteúdo. Os resultados práticos destas ações foram somados às artes e textos recebidos, acarretando em um material-base para o que seria o fanzine final. Segundo Nessia Leonzini (in OBRIST, 2010, p.10), curadoria pode ser entendida como o procedimento conceitual e empírico de agrupar obras artísticas em vias de atribuir relações críticas e estéticas, identificar vertentes e criar conexões, para despertar no espectador uma experiência de descoberta provocada pelo contato com a obra de arte. Ela também coloca que este processo parte de uma abordagem pessoal, e é tão subjetivo quanto todas as outras perspectivas em relação à arte. Neste sentido, pode-se afirmar que o material de base, “cru”, sofreu um processo de curadoria ao ser preparado para inserção nas páginas no fanzine de maneira inteligente. Tal procedimento se deu basicamente em duas etapas, uma relacionada às colaborações e outra relacionada ao conteúdo produzido pelo coletivo (advindo das ações supracitadas). O método de análise dos conteúdos enviados pelos colaboradores sucedeu-se através de reuniões com todos os membros do coletivo, nas quais se constatou que não faria sentido realizar uma seleção de conteúdos que excluísse colaborações. Tal decisão foi tomada com base em algumas observações: a baixa quantidade de trabalhos inscritos permite que o fanzine inclua as colaborações sem estourar um limite de páginas (ditado pelo custo da produção); a diversidade de técnicas e interpretações semânticas do objeto tema, que torna cada colaboração única e significativa; a proposta inclusiva do Foi à Feira, que pretende incentivar a criação cultural gráfica mesmo para aqueles que não estão habituados a este tipo de linguagem. Entretanto, percebeu-se que alguns dos trabalhos inscritos possuíam pontos vulneráveis de finalização, que prejudicavam a qualidade final da composição. Então, traçou-se um processo colaborativo entre os membros do coletivo (representados pela autora) e os artistas das obras, no sentido de agregar novas estéticas, texturas e formatos
46 . Refere-se às atividades descritas no tópico 7.3. Processo produtivo, na página 73, como as Tábuas de Carne, a ação com os cavaletes, a participação no projeto Pontes de Arte Vix e o convite direto de colaboradores de outros estados.
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que ressaltassem as qualidades já presentes nas criações47. Acredita-se que esta metodologia, que foi utilizada pela primeira vez nesta edição e é fruto das pesquisas deste trabalho, é o que caracteriza de fato a curadoria realizada no fanzine, e pode ser repetida e aperfeiçoada nas próximas edições. Já com relação ao conteúdo produzido pelo coletivo, a curadoria se deu no sentido de selecionar os registros adequados a cada projeto, de acordo com as concepções do mesmo. No caso dos cavaletes, todos os resultados finais foram registrados nos locais de “desova” (como se pode ver no tópico 7.3. Processo produtivo). Porém nem todos os registros entraram no impresso final. Das doze telas, selecionou-se apenas três para impressão. Esta seleção se deu a partir de critérios traçados pelo coletivo: arte que demonstra mais claramente a ligação com o objeto tema e registro de qualidade (nem todas as fotografias ficaram ideais). Isso também ocorreu com as fotografias dos pontos de ônibus e do ensaio Doll House (nestes dois casos a diagramação das imagens nas páginas também foi adicionada como critério).
8.3.1. Indexação
Figura 92: esquema com todas as páginas do miolo segunda edição em ordem (não inclui o editorial/capa). As páginas contornadas em vermelho possuem dobras. 47 . Este processo ocorreu à distância pela internet e presencialmente nas Tábuas de Carnes (através de conselhos e pitacos durante a produção), e tanto antes quanto durante a diagramação das páginas. É descrito com mais detalhes nos tópicos 7.3. Processo produtivo e 8.2.2. Leiaute e diagramação. A título de exemplo, pode-se citar a inserção das texturas no fundo das fotografias de Alex Gouveia.
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No que diz respeito à ordem das páginas (figura 92), os critérios de organização foram determinados institivamente, de maneira orgânica. Levando-se em consideração que o arranjo e a apresentação das imagens estão diretamente relacionados à maneira com a qual elas se comunicam com o leitor, intensificando a dramaticidade que as mesmas podem proporcionar a um projeto (AMBROSE; HARRIS, 2009, p. 100), buscou-se agrupar as colaborações que tivessem temáticas ou estéticas em comum, de forma a criar uma narrativa visual interessante ao decorrer de páginas do impresso. Embora intencione-se que o leitor faça modificações na ordem das páginas do fanzine, a primeira impressão dele ao ler pela primeira vez a publicação é de suma importância para sua compreensão e apreciação do impresso. Assim, as escolhas feitas neste processo são de suma importância. De forma geral, intencionou-se inserir os textos como pontuação entre a profusão de imagens, distribuindo-se entre as páginas do fanzine de forma que se pudesse compor intervalos mais ou menos regulares de temáticas. Da mesma forma se procedeu com relação às páginas com inserções manuais, embora as páginas com dobras tivessem de ser mantidas no meio da publicação para que permanecessem dobradas. Também intencionou-se agrupar as colaborações de mesma autoria, sempre que possível. O impresso começa pelas fotografias de Alex Gouveia, que relacionam golpes de capoeira ao abrir do canivete, e neste caso são utilizadas como metáfora para o leitor que abriu o fanzine, já que o formato do mesmo se relaciona ao do canivete. Em seguida tem-se a primeira parte do conto de Magno Calderón, cuja páginas foram inseridas no meio do miolo de maneira a pontuar o início, o meio e o fim da publicação. Adiante, a ilustração de Thiara Pagani, que dá início a uma série de colaborações que exploram a imagem do canivete de maneira gráfica mais experimental, com uso de grafismos e texturas. Então, o texto de Fritz Noronha, na página 10, pontua uma pausa literária, que dá prosseguimento à ilustrações que relacionam o canivete diretamente ao corpo humano. Depois da ilustração de Jorge Loureiro (páginas 13 e 14), que insere a temática do corte, tem-se a poesia de Carol Ruas (página 15), que relaciona o corte à escrita literária. A seguir, tem-se um conjunto de ilustrações que trabalham o conceito de corte de uma forma mais cartunesca e até inocente, e que remetem à linguagem das histórias em quadrinhos. A ilustração de Leonardo Amaral (página 20) encerra este ciclo e é seguida da colagem de Sara Serna, que também explora o estilo retrô. A partir da conexão feita entre canivete e mulher, tem-se o texto de Veriana Ribeiro (página 22), seguido da ilustração de Filipe Mecenas. Percebe-se que ambos tratam do mesmo assunto, numa interpretação “emocional” do corte (feita de forma mais séria no texto e mais irônica na ilustração). Dando prosseguimento à presença da imagem feminina, tem-se as ilustrações de Isabela Bimbato (páginas 24 a 27). Inicia-se então as colaborações que envolvem intervenções urbanas de forma geral, apresentadas pelo registro da pintura nos pontos de ônibus e corroborada textualmente através da poesia de Gabriela Canale (página 32), que faz a relação entre o canivete e a metrópole. A partir da página 39 estão as colaborações de estética mais suja e temática mais sombria, pontuadas textualmente pelo poema
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de Aurisa Paiva (página 40). Então tem-se as duas colaborações que interpretam o canivete de forma mais mística e mitológica (páginas 42 e 43). A ilustração de Thiago Salles (página 44) insere a relação entre canivete e comunicação, explorada também na poesia de Gabriel Ramos, cuja ilustração conecta esta temática e a mutilação, explorada significantemente no ensaio Doll House (páginas 46 a 52). Finalmente, última parte do conto O famigerado Bolaoito encerra o fanzine com um “fim”. Com a diagramação das páginas em andamento, surgiu a necessidade de determinar como seriam colocados os créditos relativos a cada produção. A busca por soluções se deu partindo do pressuposto que estes dados poderiam “ser incorporados ao design de fora que não depreciem o corpo principal do projeto” (ABROSE; HARRIS, 2009, p.114). Como a impressão amadora dificulta significativamente a impressão de frente e verso nas folhas, já que a impressão dos dois lados dificilmente casa perfeitamente neste tipo de impressora, e a resolução deste problema demandaria muito tempo, trabalho e provavelmente impressões desperdiçadas (as que sairão erradas), decidiu-se por manter o verso das páginas em branco. Dessa forma, decidiu-se inserir os créditos no verso das páginas, já que o mesmo não terá impressão. Como o problema da impressão ocorre da mesma forma, ainda que sejam impressos apenas os créditos, os nomes de cada colaborador e colaboração serão colados ao verso de suas respectivas páginas em papel adesivo. Dessa forma, pode-se diagramar os nomes dos colaboradores de forma que os mesmos fiquem visíveis ao se abrir o impresso em diagonal e olhando-se o verso das páginas.
Figura 93: imagem dos créditos alinhados. Ao se abrir o fanzine pelo verso, os créditos funcionam como um índice nominal de colaborações.
Como a intenção é incentivar que o leitor interaja com o impresso, as páginas não terão nenhum tipo de numeração, o que suprime a necessidade de uma página de sumário. Já a página de créditos, com a lista de todos os colaboradores e os contatos dos mesmos, ficará na folha de papel cartão que dá base ao fanzine (a terceira capa), de forma que ela se mantenha sempre presente no impresso (caso, por exemplo, o leitor retire qualquer das páginas
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por qualquer motivo, os nomes de todos os colaboradores estarão registrados nesta página). A impressora caseira não imprime neste papel, por causa de sua alta gramatura, então as informações serão impressas em outra folha e coladas na base. A diagramação desta página se dá de forma simplificada, para que a leitura possa ocorrer da forma mais clara possível.
Figura 94: página de créditos diagramada. Junto às informações, uma pequena ilustração de Luis Filipe Porto (membro do coletivo), que será inserida sem autoria, pois não se configura como colaboração, já que foi produzida especificamente para ilustrar esta página.
Decidiu-se por manter as mesmas tipografias utilizadas nos créditos da primeira edição (Delicious sans e Officina Serif), já que servem bem a este propósito e podem, inclusive, ser mantidas como padrão. Percebe-se que não há menções a datas, decisão que foi tomada conscientemente já que o fanzine não se configura como algo de fato relacionado a alguma periodicidade. Intenciona-se que o impresso funcione como algo, de certa forma, atemporal. Cada colaborador teve direito a inserir uma forma de contato ou divulgação de seu trabalho, no caso endereços de e-mail e sites portfolio. Este tipo de crédito é comum em fanzines colaborativos, e fazem bastante sentido dentro da intenção de divulgação dos novos artistas e produtores culturais. Espera-se que a partir de uma amostra dos trabalhos de cada colaborador possa-se estimular o interesse pela sua linha de produção e linguagem, incentivando possíveis contatos. Concorda-se com Leonzini (2010) ao se afirmar que A boa exposição é feita com inteligência e inventividade; com um ponto de vista. O público recebe um produto pronto, onde tudo esta em seu lugar, da iluminação ao prego na parede (quando há pregos). Para chegar à exposição montada, inúmeras e difíceis decisões foram tomadas, desde a escolha das obras (quando há obras) à posição e o conteúdo de uma simples etiqueta (a etiqueta pode gerar discussões acirradas entre curadores, artistas, museus e galerias!) (LEONZINI in OBIST, 2010, p.10).
Apesar da autora referir-se especificamente a exposições de arte, tais constatações podem facilmente ser aplicadas ao processo realizado neste projeto. Assim como ela, acredita-se
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que todos os aspectos da exposição (seja esta direta – através do contato presencial com os originais de arte - ou indireta – através de um impresso, por exemplo) de um conteúdo artístico específico devem ser pensados e projetados de maneira a enriquecer a experiência do usuário. Isso diz respeito tanto ao conteúdo das obras expostas quanto à sua organização, indexação e apresentação. A combinação favorável destes fatores resulta no aprimoramento máximo da percepção estética e conceitual advinda do contato com o impresso.
8.4 Testes Tendo em vista a utilização de estratégias diversas para a construção de um impresso diferenciado e alternativo, percebeu-se a necessidade de medir de alguma forma a interação dos leitores com o Foi à Feira, em vias de definir com maior clareza até que ponto os objetivos traçados foram, de fato, alcançados. Assim, produziu-se uma boneca da primeira edição, finalizada de acordo com o projeto apresentado. Esta boneca foi apresentada, durante entrevistas, a leitores que já conheciam a primeira edição do fanzine, e portanto, que representam uma parcela do público que o consome. Buscou-se entrevistar pessoas de diversas áreas do conhecimento e faixa-etária entre 15 e 30 anos (que imagina-se que componha o público-alvo principal do Foi à Feira), embora algumas pessoas já estivessem envolvidas na produção do fanzine como colaboradores, nenhuma delas já havia visto qualquer boneca ou estudos de formato e leiaute. Finalmente, formou-se um recorte de doze indivíduos, listados na tabela a seguir: Nome
Idade
Ocupação
Ádamo Moscon
23
Bacharel em letras inglês
Ana Mastrochirico
22
Graduanda em Design gráfico
Antônio Sérgio Nogueira
21
Graduando em Design gráfico
Catharina Mucunã
17
Estudante do ensino médio
Francisco Guilherme Siqueira
21
Graduando em Design gráfico
Iago Amaral
20
Graduando em Filosofia
Isabela Bimbatto
20
Graduanda em Artes Plásticas
João Oliveira
19
Graduando em Publicidade e Propaganda
Lucas Côrtes
25
Produtor musical
Maria Lina Soares
24
Consultora em moda
Marianna Schmidt
22
Graduanda em Design gráfico
Waldemar Teixeira
28
Produtor audiovisual / assistente de câmera / direção de fotografia
Tabela 3: nomes, idades e ocupações dos sujeitos entrevistados.
As entrevistas foram realizadas individualmente ou em duplas (figura 95). O impresso foi entregue aos sujeitos sem maiores apresentações formais, e as impressões de cada pessoa foram gravadas com um celular de forma a registrar suas observações tanto durante o
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manuseio quando após a leitura completa. Algumas perguntas também foram feitas pela entrevistadora em vias de obter respostas relacionadas a questões centrais do projeto, tais como “você acha que este é um impresso diferenciado?”, “o que você achou das inserções de elementos interativos e do uso de papéis diferentes?”, “quais diferenças ou semelhanças você percebeu com relação à primeira edição?”.
Figura 95: alguns registros das entrevistas.
A partir da observação do impresso sendo manuseado por diferentes pessoas, pode-se notar alguns pontos importantes. Primeiramente, não há um consenso sobre para onde girar as páginas do impresso. Alguns entrevistados giraram as páginas para a direita, outros para a esquerda. Num primeiro contato, alguns entrevistados ficaram um pouco confusos com o formato, sem saber como manuseá-lo devidamente, institivamente levantaram as folhas ao invés de girá-las para cima. Após mais tempo de contato, os mesmos perceberam que a forma mais prática de manusear o impresso seria dessa forma. Outro fator em comum foi a surpresa causada por certas inserções manuais no conteúdo das páginas, como as páginas com dobras e a página com a margem inferior rasgada. Os entrevistados demonstraram clara surpresa ao descobrir tais páginas, e relataram que de fato tais inserções contribuem de forma muito positiva para a experiência de leitura do fanzine. A maioria (nove entre doze) citou que o uso de páginas dobradas ou coladas torna
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o conteúdo mais interessante aos olhos do leitor, que fica intrigado sobre como acessar aquele conteúdo sem danificar a página, e transformam a experiência de ler o impresso em algo mais lúdico, com tom de desafio ou brincadeira. Em alguns momentos, os entrevistados pareciam em dúvida sobre se aquele seria o original da obra ou uma impressão. Principalmente na página impressa em papel pautado, que praticamente todos acreditaram ser de fato o desenho original. Qual não foi a surpresa ao ouvir um dos entrevistados (Iago Amaral) descrever tal página com as mesmas palavras utilizadas neste trabalho “parece um desenho das últimas folhas do caderno, que alguém fez numa aula tediosa”. Uma das perguntas feitas ao final da leitura dizia respeito à utilização de papeis diferenciados, se ela fica clara, se enriquece o conteúdo, se os papeis foram usados de maneira inteligente. Ao que a maioria dos entrevistados (8 de doze) afirmou que sim, mesmo embora em alguns casos a relação entre o tipo de papel e a arte não fosse tão óbvia, o tipo de papel parece influenciar positivamente as colaborações. Foi interessante reparar, inclusive, que alguns dos entrevistados (a porção que entende mais dos processos produtivos, provavelmente por cursar Design Gráfico) demonstraram grande interesse pelo tipo de papel de cada página, conferindo o verso das mesmas para saber até onde as cores eram impressas e qual a cor original do papel. Acredita-se que esta sensação de dúvida entre o que é impresso e o que é manual seja causada pela impressão falha da impressora a laser. Como fica muito claro que não é uma impressão com muita qualidade e definição, muitas vezes pode-se achar que tal coisa foi pintada com pincel ou feita a mão. A dúvida também é corroborada pela inserção de elementos que de fato não são impressos. Quando questionados sobre a qualidade da impressão, apenas Isabela Bimbato mencionou que de fato as fotografias são um pouco desvalorizadas pela impressão de baixa definição. Outros entrevistados (sete entre doze) acharam a qualidade da impressão suficiente, muitas vezes nem compreendendo o motivo da pergunta. E alguns (quatro entre doze) mencionaram que os defeitos e imperfeições da impressão na verdade são agregadas positivamente pelo conjunto de forma geral, contribuindo ao aspecto independente e alternativo do fanzine. Isso também acontece com relação ao acabamento manual (invariavelmente cheio de imperfeições), em opinião unânime se acredita que o acabamento manual é um dos diferenciais do impresso, e que as imperfeições corroboram esta identidade “underground”. Cem por cento dos entrevistados consideram o fanzine um impresso diferenciado, com um formato extremamente incomum. Waldemar Teixera mencionou que quando foi à Feira Plana não encontrou nenhum outro impresso que se assemelhasse ao Foi à Feira, tanto em termos de formato quanto de diversificação de conteúdo e inserção de elementos interativos nas páginas. A qualidade das colaborações também foi elogiada por todos os entrevistados, inclusive fazendo a comparação com a primeira edição. A opinião de que nesta edição o conteúdo é mais elaborado, mais interessante e mais bem explorado foi unânime. Muitos (9 entre os
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doze) comentaram que a disposição e o leiaute das páginas, associados ao formato, permitem que se veja sempre uma colaboração de cada vez, valoriza o conteúdo e torna o impresso em si diferenciado. A primeira edição, que possui uma diagramação mais tradicional, não passa esta mesma sensação e por isso não é tão interessante quanto a segunda. Todos os sujeitos compreenderam bem a proposta do impresso, principalmente por causa do texto de editorial. Eles também perceberam sem dificuldade que aquele texto sem título seria a apresentação ou o editorial do Foi à Feira. A adequação do impresso e do conteúdo à proposta apresentada neste texto se dá de maneira inteligente, segundo opinião unânime dos entrevistados. “A diversidade dos suportes e das obras faz a relação direta com a feira, basicamente é um conjunto de coisas muito diferentes, mas que conversam entre si” disse João Oliveira, opinião compartilhada em todas as outras entrevistas. Lucas Côrtes comentou que a edição se assemelha a um tumblr, sendo cada colaboração um post diferente, com interações diferentes. Essa comparação se dá de forma interessante, pois o tumblr é uma rede social de compartilhamento de imagens e referências, largamente utilizada para divulgação de trabalhos artísticos de forma geral. Como o conteúdo é pautado apenas por um tema, a impressão que o entrevistado teve é que o fanzine seria como uma compilação de trabalhos que compartilham este tema de variadas formas. Antônio Sérgio Nogueira mencionou que o fanzine se comporta como um registro e um catálogo artístico da produção autoral em diversas áreas. Quando perguntados sobre a ordem das páginas, se perceberam alguma narrativa, as respostas foram divididas. A maioria de fato não conseguiu perceber nenhuma ordem aparente na organização das páginas (sete entre doze). Alguns mencionaram que, apesar de não reparar em algum critério de organização, conseguiram perceber institivamente que o fanzine possui um início, meio e fim (três entre doze). E alguns (cinco entre doze) perceberam que as temáticas das colaborações possuíam uma certa lógica organizacional, embora não conseguissem definir formalmente esta lógica. Uma das perguntas mais interessantes foi em relação ao tratamento do conteúdo. Quando perguntados se imaginavam que alguém tratou, diagramou e de fato planejou aqueles conteúdos (principalmente ou textos), ou se imaginavam que todas as colaborações chegaram prontas e que alguém simplesmente imprimiu e encadernou, a maioria dos entrevistados escolhiam o segundo caso como verdadeiro. Ou seja, pode-se concluir que o trabalho de design realizado foi incorporado às colaborações e ao impresso de forma tão sutil e adequada que o mesmo se tornou invisível. Os estilos e leiautes compostos para cada colaboração conseguiram trabalhar o conteúdo de maneira tão integrada que de fato parecem ter sido feitos pelo mesmo autor. Essa característica foi unanimemente ressaltada como positiva, pois agrega à obra e não “passa por cima” do estilo do autor, valorizando os aspectos mais interessantes e mantendo o estilo original. Outra questão importante é o manuseio do impresso. Embora a forma de passar as páginas seja perceptível após um tempo de interação, alguns dos entrevistados (cinco entre doze)
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mencionaram o caráter frágil da estrutura do fanzine, propondo formas de armazená-lo sem danificar as páginas, como o uso de uma luva ou capa em papel mais resistente. De fato, esta preocupação mostrou-se adequada, principalmente ao observar que durante este período de testes algumas páginas foram amassadas e mesmo saíram da encadernação. Isso atenta para alguns procedimentos: o furo nas páginas deve ser feito com uma distância segura da borda, de forma a prevenir o rasgo. Pelos estudos feitos, a medida a ser seguida é de 1 cm da borda de página superior. Na manufatura da boneca utilizada para os testes essa medida sofreu variações em algumas páginas, provavelmente devido aos furos terem sido feitos com uma medição irregular. Para prevenir tais erros, o furo será marcado diretamente nas páginas-mestre do arquivo no InDesign, de forma que estejam posicionados no mesmo local em todas as páginas. Com relação ao suporte, decidiu-se por incluir no projeto uma sobrecapa de papel kraft (ou cartão, que possui gramatura semelhante e cores variadas) que possa proteger as páginas e auxiliar o manuseio do impresso. Dessa forma, ao se passar as páginas elas ficarão armazenadas neste dispositivo. As marcas de dobras e cortes serão impressas para que as capas possuam sempre as mesmas medidas. Como a sobrecapa é algo auxiliar, decidiu-se não aplicar impressão na mesma, deixando o foco para a página de editorial e o título do fanzine, que passa a ser encadernado antes da sobrecapa.
Figura 96: projeto e resultado final da sobrecapa. Nesse caso em papel cartão preto
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9.
Conclusão
Este projeto de graduação nasceu a partir do interesse da autora por fanzines – impressos experimentais, autorais e independentes produzidos e distribuídos de forma amadora. Enxergando a experiência de produção de fanzines como uma incrível possibilidade de explorar conceitos e experimentar estéticas, este trabalho buscou construir pontes – conceituais e empíricas – entre a produção de zines e a prática de design gráfico, a metodologia de projeto, conforme ensinada na academia. Para tal, tomou-se como estudo de caso e ponto de partida o fanzine Foi à Feira, e as mudanças editoriais e gráficas previstas para sua segunda edição. Porém, não se trata do planejamento de um projeto gráfico tradicional, como os de livros e revistas comuns. Este projeto diz respeito apenas à segunda edição do fanzine, e poderá ser completamente modificado nas edições posteriores. Dessa forma, buscou-se desenvolver um impresso inventivo, de produção e impressão artesanais, e que se comporta de forma totalmente diferente da sua primeira edição e de outros periódicos corriqueiros. O Foi à Feira passa a ser, portanto, uma plataforma livre para experimentação e laboratório de projetos diversos, um veículo de comunicação alternativo de posicionamento gráfico diferenciado. Retomando o exemplo d'O Gráfico Amador, citado anteriormente nesta pesquisa, concorda-se com Escorel (1999) ao se afirmar que Pois bem, não por acaso, entre os “mãos sujas” parece ter se desenvolvido uma consciência aguda das riquíssimas relações existentes entre a produção artística e a seriação industrial. Se bem que as tiragens dos impressos produzidos pelo O Gráfico Amador fossem pequenas e o processo de reprodução utilizado, basicamente o tipográfico, fosse operado de forma artesanal, esse momento da juven-
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tude parece ter introduzido no horizonte dos quatro cavalheiros a chave apara a compreensão do sentido profundo das formas de manifestação artística no mundo de hoje (ESCOREL, 1999, p. 107).
A autora se refere diretamente aos “mãos sujas”, ou seja, aqueles que lidavam diretamente com a produção e impressão dos exemplares editados. Fica claro que a experiência de projetar fora das amarras do meio comercial e lidar diretamente com conteúdo artístico autoral é uma forma enriquecedora de expandir horizontes e perceber de forma mais profunda o processo de criação e planejamento de impressos. Tomando certa liberdade de interpretação, pode-se comparar com facilidade as atividades realizadas pelo O Gráfico Amador com a manufatura de fanzines por coletivos em tempos modernos. Guardadas as devidas proporções, os membros d'O Gráfico parecem ser pioneiros brasileiros de uma tendência que, nos dias de hoje e com as novas tecnologias de produção e comunicação, tem crescido cada vez mais. A retomada da produção de fanzines, zines e impressos alternativos é sensível e parece multiplicar-se ao redor do mundo. Atendo-se ao Brasil, pode-se perceber que novas iniciativas surgem com frequência na tentativa de disseminar e produzir impressos alternativos diferenciados, assim como valorizar a cultura da edição de fanzines. Como exemplos claros, pode-se citar a profusão recente de iniciativas que funcionam como editoras independentes, organizam eventos voltados para fanzines e fanzineiros, e comercializam as edições uma das outras (seja em lojas virtuais ou físicas), como a Ugra Press, a Samba, a Prego, a Contra, a Beleléu, A Bolha, a Meli-Melo Press, entre outras (pra não citar as de fora do país). Fora os envolvidos com a produção de impressos, tem-se aqueles dedicados ao armazenamento e à disseminação digital de fanzines, como o Zinescópio e o 365 Fanzines, que tiram proveito das novas interações com a internet e as redes sociais da melhor forma possível a favor do compartilhamento de um conteúdo muitas vezes restrito (e esgotado). O sucesso da Feira Plana também corrobora notoriamente este argumento48. Portanto, concorda-se com Magalhães (2005): A história dos fanzines, não só no Brasil, tem sido vertiginosa em transformações, adaptações a crises e experimentações. De pequenos boletins mal impressos chegamos, em poucos anos, ao refinamento do álbum, passando pelas revistas que em nada devem às publicações comerciais. Isto é uma demonstração inquestionável do amadurecimento de uma geração formada pelo empenho empreendedor, que cresceu inventando formas e meios para expor sua criação (MAGALHÃES, 2005, p. 62).
É interessante notar que estas editoras muitas vezes exploram soluções criativas para a manufatura de impressos diferenciados a preços acessíveis. A exemplo de publicações estran48. Como dito nas páginas 84 e 85 deste trabalho, a Feira Plana contou com cerca de 99 expositores – produtores de impressos alternativos - e mais de 3.000 visitantes.
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geiras (como as citadas Visionaire e Nice), estas novas editoras independentes apostam em propostas artísticas pouco convencionais, conteúdos semi exclusivos voltados diretamente a um novo nicho de mercado, que anseia por consumir impressos que denotam nitidamente projetos gráficos e editoriais ousados, que fogem ao lugar-comum e bebem diretamente na fonte dos impressos alternativos, sejam eles amadores ou não. Isto posto, pode-se afirmar que este projeto seja de grande utilidade para o curso de Desenho Industrial, já que descreve em detalhes todo o processo de criação e produção de um impresso experimental, independente e alternativo voltado para as artes gráficas e o design, de forma geral. Espera-se que, através do acesso à revisão bibliográfica realizada e ao relatório de editoração presentes neste trabalho, possa-se incentivar o leitor a participar do universo da produção gráfica independente e desenvolver novas habilidades, abrindo caminhos para a criação experimental livre, e propondo novas possibilidades de atuação (profissional ou não). Além disso, acredita-se que este projeto possa contribuir para a ainda embrionária bibliografia que relaciona fanzines49 e design gráfico, já que inclui uma descrição gráfica das principais iniciativas contemporâneas neste sentido, especialmente as advindas de terras capixabas. Este tipo de registro é fundamental para possíveis desdobramentos futuros de pesquisas neste âmbito, já que se tratam de impressos efêmeros e de periodicidade indefinida, e, embora já existam iniciativas no sentido de registrar seu teor e conteúdo50, nenhuma parece se atentar detalhadamente às características gráficas e visuais dos mesmos. Enfim, a segunda edição do Foi à Feira se apresenta como um meio de comunicação alternativo diferenciado e experimental, que reforça visualmente e de forma empírica o diferencial proporcionado pelo conhecimento do processo projetual de design na gestação de impressos, mesmo quando amadores e independentes. Espera-se que o fanzine possa incentivar tal prática em seus leitores, além de disseminar a produção cultural dos jovens e emergentes artistas capixabas.
49. Entenda-se impressos alternativos, experimentais e independentes em geral. 50. As mais significativas delas são os Anuários de zines, fanzines e publicações independentes da Ugra Press (UTESCHER, 2010, 2012), mas também existem blogs e sites diversos dedicados ao assunto.
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