Manejo florestal comunitário - cacau nativo do Purus

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MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO CACAU NATIVO DO PURUS Ecio Rodrigues (org.)


Chocolate é um daqueles poucos produtos que gozam de unanimidade: todos gostam. Para fazer chocolate são necessárias as sementes de cacau. Ao longo dos anos, desde que o chocolate entrou na vida das pessoas, o cacau vem sendo plantado em vários países. Escolhem-se sempre, para plantar, as árvores de cacau que apresentem duas características principais: muitas sementes e resistência a doenças. Assim o cacau nativo, selvagem e original, oriundo da floresta amazônica, foi perdendo sabor e ganhando produtividade. Essa é a diferença do cacau do Rio Purus produzido por uma cooperativa de produtores - a Cooperar. As árvores não foram plantadas, ocorrem de maneira natural na floresta, desde que a floresta existe. Um sabor especial que despertou o interesse dos mercados europeus, em especial o alemão, que fechou contrato de compra das safras anualmente colhidas pelos produtores da Cooperar. Fazer com essa produção de cacau nativo se efetivasse com o emprego de alta tecnologia foi o objetivo de uma equipe de pesquisadores, a maioria engenheiros florestais, que ajustou o extrativismo do cacau à tecnologia do manejo florestal comunitário. Algo inovador e um tanto inusitado, mas que foi feito. Uma história como essa precisava ser registrada em livro. Escrever livros não é fácil, exige demais de quem se aventura, mas tudo fica bem mais prazeroso quando se trata de uma história vivida e monitorada nos últimos três anos. Este é o livro do cacau da cidade de Boca do Acre, interior do Amazonas, na mata ciliar do Rio Purus.


MANEJO FLORESTAL COMUNITĂ RIO CACAU NATIVO DO PURUS Ecio Rodrigues Alexandre Lins Jairo Lima Pedro Cristo Luciana Pereira Jaime Sass Raul Torrico Edmilson Cruz Nei Gomes


Sumรกrio


PARA ENTENDER O LIVRO

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SUMÁRIO EXECUTIVO

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PARTE I

O PROJETO APOIADO PELO CNPq

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Manejo do cacau nativo do Purus Importância da cooperativa agroextrativista do Mapiá e Médio Purus – Cooperar Levantamentos subsidiários ao plano de manejo Operacionalização do projeto Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo da várzea do Purus Os tempos do cacau nativo do Purus Três hipóteses para explicar a dispersão do cacau nativo do Purus Subsídios para o plano de manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus

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PARTE II

38 61 69 72 81 87

PLANO DE MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO

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Síntese do Plano de Manejo Protocolos de Manejo Diretrizes de Manejo Protocolos de Manejo Florestal Manejo das espécies associadas Decisões de Manejo relacionadas às espécies associadas Critérios de manejo florestal para as espécies associadas ao povoamento nativo de cacau

114 123 125 129 145 151

PARTE III  PROGRAMA DE EXTENSÃO FLORESTAL Manejo florestal comunitário como solução tecnológica para ampliar a produtividade do cacau nativo do purus Experiências acreanas de manejo florestal comunitário Multidisciplinaridade do programa de extensão florestal Cronograma do programa de extensão florestal

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161 165 170 179 182

ANEXO 1

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ANEXO 2

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BIBLIOGRAFIA

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Para entender o livro


Quando, em algum lugar da imensa floresta tropical amazônica, uma experiência consegue reunir pesquisadores, instituições e pequenos produtores, para manejar algum produto oriundo da consagrada diversidade biológica existente no ecossistema florestal, com objetivo de gerar renda e, contra todas as previsões, consegue ser bem-sucedida, no mínimo, merece ser registrada. Afinal, muito embora a região seja rica em experiências envolvendo recursos florestais e seu manejo por alguma comunidade, nem sempre é possível fazer com que a produção tenha a perenidade necessária, para resistir aos variados entraves que surgem no cotidiano da atividade florestal, na Amazônia. Exigências não faltam e todas, com pouquíssimas exceções, travam o manejo florestal praticado por comunidades amazônicas. São problemas relacionados às exigências normativas, quase sempre exageradas e sempre ineficazes, às exigências de mercado, quase sempre insuperáveis pelas comunidades, exigências ambientais, sempre inalcançáveis e incompreensíveis para a realidade comunitária e, por fim, exigências trabalhistas impraticáveis. Na maioria das vezes, o que ocorre é o extremo paradoxo, em que existe um farto ecossistema florestal, com várias oportunidades de negócios, um mercado que demanda pelos produtos e uma massa trabalhadora que sabe, por tradição, manejar a floresta para ofertar os produtos que viram negócios e, por incrível que pareça, nada acontece. Com um ingrediente a mais: não há, também na maioria das vezes e apesar de alguns desavisados e poucos afetos à realidade amazônica teimarem em discordar, problemas tecnológicos insuperáveis ou de comprometida solução.

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Para entender melhor, existe tecnologia compatível com a realidade das comunidades, em especial no que se refere à quantidade de trabalho disponível e à capacidade de investimentos, para explorar os recursos da biodiversidade amazônica de acordo com os ideais de sustentabilidade atualmente preconizados. Todavia, se é como afirmado acima, a pergunta que surge é óbvia. Por que as comunidades florestais amazônicas apresentam os piores índices de desenvolvimento humano, vivem em situação permanente e antiga de exclusão e não conseguem superar os fatores limitantes de uma produção florestal manejada? Pelo contrário, as comunidades de manejadores florestais costumam adentrar no nebuloso e sem volta universo da pecuária extensiva, para criação de boi, praticando uma atividade para a qual não estão preparadas e que requer uma escala, ou tamanho, sobretudo de terra desmatada, da qual, no geral, não poderão dispor, nem hoje e muito menos no futuro próximo. O paradoxo se mantém. O produtor amazônida não consegue entrar ou se manter na atividade florestal, por razões difíceis de serem diagnosticadas, mas que não envolvem a existência de recurso florestal, de trabalho, de investimento ou de tecnologia. É impedido por forças alheias ao tripé da produção preconizado pela economia. Uma mistura inusitada de preconceito, tanto para com o manejador florestal quanto para com o uso da biodiversidade; e de ausência de bom senso, o que não garante a manutenção das espécies, vegetais ou da fauna, e não possibilita seu uso econômico que, por sua vez, poderia trazer alguma esperança para a conservação da floresta. Viabilizar o Manejo Florestal Comunitário para a exploração do potencial econômico da biodiversidade é o melhor caminho e a ciência, sobretudo aquela praticada na própria Amazônia, já comprovou isso. Uma única certeza: a culpa pelo bloqueio da produção florestal comunitária não está na floresta e, sim, no que acontece fora dela. É nesse contexto que se insere este livro.

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Para entender o livro


ESTRUTURA E TEMAS ABORDADOS A elaboração deste livro atende às exigências de contratação de projetos de pesquisas aprovados nos editais de demanda induzida, publicados pelo CNPq e que são objeto de Termo de Concessão firmado com o coordenador do projeto e responsável pelo ordenamento de despesas utilizando conta-corrente vinculada, sempre por meio da assinatura de cheques, selecionando propostas de aquisição de bens e realização de serviços de toda natureza. Indo além, esse documento originou e ao mesmo tempo incorporou partes de outros dois documentos: Relatório final de projeto enviado ao CNPq e o Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, entregue à Cooperar, em 2010. O primeiro documento foi elaborado com o objetivo de registrar no CNPq a profícua experiência realizada em Boca do Acre para promover a produção de cacau nativo, que envolveu um leque amplo de parcerias institucionais e que possibilitou a produção de extensa bibliografia sobre o cacau nativo, que, antes do projeto, não passava de um ilustre desconhecido. Já o segundo, um documento técnico de planejamento operacional de o todo processo produtivo do cacau nativo, foi destinado a auxiliar a cooperativa dos manejadores de cacau nativo, a Cooperar, no gerenciamento operacional da produção, de maneira a alcançar o objetivo principal do projeto, que foi ampliar de nove para 40 toneladas a oferta de sementes de cacau pelos manejadores do Purus. Sendo assim, o livro foi dividido em quatro partes distintas, no entanto intrinsecamente relacionadas. 1. 2. 3. 4.

Sumário executivo O projeto apoiado pelo CNPq Plano de manejo florestal comunitário do cacau nativo do purus Extensão florestal para fazer valer os seis protocolos de manejo

A primeira parte apresenta, de maneira ampla e ao mesmo tempo sucinta, as ações desencadeadas pelo projeto e o significado de cada uma. Também apresenta a equipe envolvida na realização das pesquisas e a conclusão do plano de manejo. Para aqueles que estejam mais apressados, a leitura do sumário fornece uma compreensão importante do que foi realizado em Boca do Acre.

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A segunda parte apresenta o projeto apoiado pelo CNPq, o que foi previsto e o que foi possível concluir, bem como a conjugação de esforços representada pelos projetos executados em paralelo, como o que é apoiado pela Cooperação Técnica Alemã – GIZ, voltado ao suporte operacional das safras e aos aportes financeiros oriundos de órgãos federais, em especial o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Ministério do Meio Ambiente. Os resultados acadêmicos obtidos com investimentos diretos do projeto, e que sem os quais não teriam sido possíveis, são discutidos de maneira pormenorizada e, ao mesmo tempo, objetiva, na tentativa de satisfazer a demanda por informação para os que pretendem dominar a realidade do cotidiano no Purus e despertar o interesse para a leitura de cada trabalho de pesquisa em separado. Optou-se por apresentar, para cada estudo realizado, os tópicos relacionados aos objetivos do estudo, os procedimentos metodológicos adotados e, por fim, os principais resultados alcançados acompanhados de discussões acerca da aplicabilidade de cada resultado no dia a dia dos manejadores do cacau nativo associados à Cooperar. Dessa forma, cada um dos quatro estudos principais para subsidiar a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário, quais sejam: Inventário Florestal do cacau nativo; Mapeamento da dispersão do cacau ao longo da mata ciliar do Purus; Socioeconomia dos manejadores de cacau; e Logística do processo produtivo são apresentados e a relação de dependência entre eles estabelecida. Ao leitor será simples compreender que o resultado de cada estudo foi complementado com a execução de outro e que, no conjunto, todas as informações eram essenciais para o manejo do cacau. Em nenhum momento a equipe do projeto deixou-se levar pela costumeira sede acadêmica por obtenção de informação para uso sabe-se lá quando. Pelo contrário, cada centavo investido trouxe retorno, em conhecimento da realidade, para o próprio manejador do cacau. A terceira parte, por sua vez, mostra de que maneira as informações e a experiência obtida com o projeto se transformaram em medida de planejamento e gerenciamento do processo produtivo do cacau nativo. Isto é, como o mapeamento da dispersão do cacau, apenas para citar um exemplo, contribuiu para que a Cooperar definisse sua área de atuação ao longo do Purus, sem que precisasse arcar com os elevados custos associados à prospecção do cacau nativo.

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Para entender o livro


Planejar a produção de cacau, por si só, é tarefa complexa diante da igualmente complexa realidade vivenciada nos rios amazônicos e, em especial, no Purus, rio onde se observa um dos maiores fluxos fluviais, de cargas e pessoas, correntes na navegação de cabotagem da Amazônia. Desafio maior é planejar a ampliação expressiva, quase quadruplicar, de uma produção que terá que ser elevada do patamar tecnológico do extrativismo ao do manejo florestal comunitário. Sendo assim, todas as tarefas de planejamento foram organizadas em um Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, cuja elaboração levou a equipe de pesquisadores a conceber um conjunto de procedimentos técnicos denominados de Protocolos de Manejo, uma vez que devem ser colocados em prática de forma sequenciada durante a realização de cada safra anual. Dado que os beneficiários do projeto são os associados da Cooperar e que o objetivo principal do edital do CNPq não era a pesquisa, mas sim, a extensão florestal, denominada de inovadora, a quarta e última parte do livro discute a aplicação de um Programa de Extensão Florestal voltado para a assimilação, por parte dos manejadores do cacau, do conjunto de Protocolos de Manejo. Ocorre que é na unidade produtiva localizada na mata ciliar do Purus, onde as famílias conhecidas, de maneira um tanto pejorativa, como ribeirinhos praticam o manejo do cacau nativo, em que serão executados os Protocolos de Manejo. Ou seja, somente uma pequena porção do Plano de Manejo, em especial a que trata da logística do processo de aquisição e de beneficiamento primário da semente de cacau (fermentação, secagem, ensacagem e embarque) ocorrerá sob a gerência da Cooperar, no mais, todas as atividades que irão quadruplicar a produtividade do cacau nativo do Purus dependem da anuência do produtor e manejador do cacau. Mais que anuência, o manejador terá que passar pelos quatro estágios previstos em Programa de Extensão: de sensibilização para a importância de se inovar no processo produtivo do cacau nativo (estágio I); de conscientização acerca da relação entre o aumento de produtividade e a manutenção das características ecológicas do povoamento do cacau nativo (estágio II); de convencimento sobre os benefícios que podem ser auferidos com a elevação da dinâmica econômica por meio da produção de cacau (estágio III); e, por último, de adoção dos Protocolos de Manejo como meios principais de inovação tecnológica da produção de cacau nativo com elevada produtividade (estágio IV). Manejo florestal comunitário

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No entanto, há ainda um perigoso agravo para o manejo comunitário do cacau nativo do Purus relacionado à legislação ambiental vigente, discutido no decorrer do livro, em todas as suas quatro partes. Tendo em vista que o povoamento de cacau está localizado em área de mata ciliar, considerada na legislação como Área de Preservação Permanente, conhecidas por APP, que englobam, além da margem dos rios, nascentes e olhos d´água, os topos de morros e rampa com inclinação elevada, sua exploração, mesmo que manejada, será questionada. Em tese e de acordo com uma interpretação não tão grave da legislação, o manejo do cacau nativo em mata ciliar não teria nenhum tipo de entrave legal. Todavia, sendo a APP considerada um ícone para o ambientalismo nacional mais ortodoxo, qualquer tipo de exploração não é encarada com boa vontade. Como dizem os próprios manejadores: poder até que pode, mas tem que brigar com o Ibama. A todos que se aventurarem na leitura deste livro aguarda-os uma agradável surpresa. Não durante a leitura, mas, sobretudo, quando chegarem ao final, perceberão que se sucedeu uma série de discussões paralelas e sempre muito polêmicas em cada etapa da execução do projeto e na preparação do Plano de Manejo. Vá se acostumando: quando se trata de Amazônia é assim, não existe questão pequena, tudo tem a ver com o destino do ecossistema florestal e a manutenção da vida.

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Sumário executivo A inclusão do cacau nativo na cesta de produtos ofertados pelos extrativistas que vivem às margens do Rio Purus, em especial no município de Boca do Acre, no Amazonas, adquiriu importância especial, na medida em que contribuiu para criar trabalho e renda na região, para a melhoria das condições sociais de pequenos produtores em estágio elevado de isolamento e, não menos importante, para promover o uso sustentável da diversidade biológica existente no ecossistema florestal da Amazônia, o que é apontado como a principal saída para a manutenção da floresta. Para ajudar os associados da Cooperar, cooperativa de extrativistas do cacau, a ampliar sua produtividade, tendo em vista que os produtores conseguiam ofertar nove toneladas de sementes fermentadas e secas de cacau, enquanto a empresa compradora alemã Hachez tinha demanda para 40 toneladas, os pesquisadores da Universidade Federal do Acre – Ufac propuseram-se a elaborar um documento de gerenciamento da produção, denominado de Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, principal objetivo do projeto de pesquisa. Ocorre que a empresa compradora do cacau investiu na produção de um chocolate para um mercado especial, que tinha preferência pelo chocolate oriundo de um cacau primitivo, selvagem e original; o sabor natural do cacau como era consumido nos primórdios da invenção do chocolate. Para tanto, o cacau teria que ser mantido em condições selvagens, ou seja, não poderia ser cultivado em plantios homogêneos, pois acredita-se que dessa maneira amplia-se a produtividade, com os sucessivos melhoramentos, mas, perde-se o sabor.

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Para atender ao desafio de quadruplicar a produção sem lançar mão da domesticação, os Engenheiros Florestais da Ufac associaram-se em um amplo leque de parcerias, para a concepção de protocolos de manejo florestal comunitário para produzir mais, sem perder o sabor nativo do cacau. Para subsidiar a elaboração do plano de manejo, a equipe de pesquisadores e extensionistas envolvidos no projeto realizaram um amplo processo de levantamento estruturado em seis estudos principais, conforme seguem.

i. Mapeamento da dispersão do cacau nativo com imagem de satélite Concluído em dezembro de 2009, foi objeto de monografia aprovada pela Banca Examinadora do curso de Engenharia Florestal da Ufac, de autoria da bolsista ITI A, Kamilla Andrade. Tanto a metodologia de interpretação das imagens de satélite de média resolução quanto a confecção dos mapas temáticos contaram com apoio expressivo da parceria firmada com a Universidade de Viçosa, sobretudo com a imprescindível orientação do doutorando Pedro Christo. O principal resultado do estudo foi o mapeamento da dispersão dos povoamentos nativos de cacau, ao longo da margem do Rio Purus, no trecho entre a foz do Rio Iaco, no Acre, até o município de Lábrea, no Amazonas, área de atuação da Cooperar. O mapeamento permitiu à Cooperar planejar sua logística de compra de cacau sem os custos elevados da prospecção. Ou seja, a partir do estudo tornou-se possível saber onde há cacau, por meio de mapas, sem o ônus dos longos deslocamentos pelo Purus. As imagens de satélite de média resolução corroboraram as três hipóteses formuladas pelo projeto, de características físicas que devem coexistir para possibilitar a ocorrência de povoamento nativo de cacau no Purus:

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1.

Cota 100: O cacau ocorre somente na cota altimétrica de 100 metros, sendo que na margem do Purus há variações entre 90 a 120 metros.

2.

Interflúvio do Purus: O cacau ocorre em áreas de interflúvio do rio, isto é, que são anualmente encharcadas no período de cheias, que vai de dezembro a maio. Não são as áreas de alagação, que costumam acontecer em períodos cíclicos de dez anos, mas as de cheia anual, ou interflúvio.

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3.

Alelopatia com palmeiras: O cacau ocorre onde não há incidência de algum tipo de palmeira. Se tem paxiúba, patauá, buriti, abacaba ou outra palmeira, não haverá cacau. Tanto em floresta densa quanto em floresta aberta, as duas tipologias florestais predominantes na região, pode ocorrer cacau, desde que não haja associação com palmeira.

ii. Inventário Florestal da área de ocorrência do cacau nativo Concluído em novembro de 2009, foi objeto de monografia aprovada pela Banca Examinadora do curso de Engenharia Florestal da Ufac, de autoria do bolsista Hudson Franklin Pessoa Veras. O Inventário Florestal do cacau inovou em metodologia ao se basear na realização de amostragem sistemática estratificada, com amostras em conglomerados, de dois estágios, distribuídos a uma distância fixa de 40 km de leito do rio de cada margem. O complexo processamento das medições realizadas em campo foi possível graças à essencial parceria da Embrapa do Acre, sob a orientação do pesquisador Luís Cláudio. A partir do mapeamento da dispersão do cacau, foi estipulada a intensidade amostral necessária, tendo em vista que o inventário teve como objetivos calcular a densidade dos povoamentos de cacau nativo e definir as seis espécies a ele associadas, em especial para sombreamento. O resultado principal do estudo foi a determinação de que existem, na área delimitada pela ocorrência de cacau, o equivalente a 7,84 pés de cacau por hectare. É uma densidade considerada baixa, o que permite conceber protocolos de manejo para triplicar a quantidade de indivíduos e, consequentemente, a produção por área, objetivo maior do projeto. Outra diretriz para estabelecimento de protocolos de manejo diz respeito às espécies associadas ao cacau. Parece que o sombreamento realizado por essas árvores é importante para o crescimento das mudas de cacau, mas, todavia, reduzem sua produtividade quando o indivíduo de cacau adquire maturidade. O manejo dessas espécies em paralelo com o do cacau também deverá ampliar a produtividade do povoamento. A melhor notícia é que as seis espécies associadas descritas pelo Inventário Florestal: Cecropia sp. (embaúba), Eschweilera odorata (matá-matá), Hevea brasiliensis (seringueira), Fícus sp. (gameleira), Aspidosperma sp. (amareliManejo florestal comunitário

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nho), Pouteria sp. (abiurana ou maparajuba) e Calycophyllum spruceanum (mulateiro) possuem técnicas de manejo florestal já desenvolvidas e relativamente simples. O mulateiro, por exemplo, apresenta elevada demanda de mercado para confecção de forros e assoalhos.

iii. Logística de produção da semente do cacau Estudo concluído em maio de 2010 e objeto de artigo técnico elaborado em parceria com o Departamento de Engenharia Civil da Universidade do Estado de São Paulo – Unesp, campus de Ilha Solteira, em especial sob a orientação do pesquisador Jairo Salim Pinheiro de Lima. Tendo em vista que a logística na Amazônia é o principal componente de custos dos empreendimentos, o estudo buscou, em um primeiro momento, dimensionar as tarefas e o tempo despendido em cada fase do processo produtivo, da coleta do fruto no pé de cacau no interior do ecossistema florestal até a chegada das sementes fermentadas e secas no porto de Frankfurt, na Alemanha. Em um segundo momento, o trabalho ofereceu alternativas para otimização de cada fase do processo produtivo, sem embargo do elevado grau de eficiência já alcançado pelos experientes gestores da Cooperar, depois de quatro anos ininterruptos de safras de cacau. A conclusão importante do estudo é que o principal fator limitante à melhoria das condições de logística diz respeito ao período de ocorrência da safra do cacau, de janeiro a junho de cada ano. Ocorre que se trata de um período no qual o clima da região e, por conseguinte, a vazão do rio encontram-se em transição entre inverno (com chuva) e verão (sem chuva), cheias e seca, respectivamente, para clima e vazão do rio. Ou seja, não se pode contar com as facilidades surgidas com as cheias, como a melhor e mais rápida navegação e menor distância entre a margem e o eixo do rio, da mesma maneira que também não se pode contar com as condições mais apropriadas para deslocamento em terra quando o piso está seco. Pelo contrário. Tem-se o pior dos mundos, a safra do cacau ocorre quando o rio está na vazante, mas ainda pela metade do nível, a umidade é alta, não chove tanto, mas também não para de chover, e a distância do rio ao barranco da margem não é a maior, mas

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também não é pequena e, o pior, não está firme o suficiente para aguentar a caminhada. Conclusão, todo o embarque e desembarque do cacau é feito com lama no joelho. Outra conclusão fundamental para o planejamento e a aplicação dos protocolos de manejo é que todo o processo produtivo é realizado sob uma cronologia bem inflexível, são os denominados tempos do cacau. Uma vez colhido em cinco dias, precisa ser quebrado para a retirada da semente. Uma vez retirada a semente, no mesmo dia, precisa ser colocada para fermentar. Depois de sete dias de fermentação, a semente vai para a estufa de secagem, onde permanecerá, sendo constantemente revirada, por 40 dias, quando estará pronta para ser ensacada e embarcada na balsa. Essa rigidez no processo de beneficiamento exige disciplina e deixa pouca margem para a introdução de alterações. Mesmo assim, o estudo de logística apresentou sugestões de otimização, que envolve sinalização das unidades produtivas na beira do rio quando tem cacau, sugestões para transporte no batelão de sementes e não de frutos, fermentação a bordo e melhoria do fluxo de secagem/reviragem.

iv. Socioeconomia da população extrativista envolvida na produção de cacau

Concluído em maio de 2010, o levantamento socioeconômico foi objeto de monografia aprovada pela Banca Examinadora do curso de Engenharia Florestal, do bolsista Israell Ricardo de Melo. Utilizando a metodologia de entrevistas diretas com emprego de formulário previamente elaborado, mais de 800 produtores responderam aos entrevistadores, formados por uma equipe multidisciplinar. Uma expressiva quantidade de informações faz parte de um banco de dados em socioeconomia, que servirá para consulta de outros graduandos do curso. Afinal, o formulário contém mais de 200 questões, com seis páginas e muitos detalhes. O estudo traça um perfil do extrativista do cacau e do cotidiano no qual ele está inserido. Distingue a importância na geração de renda das atividades agropecuárias e florestais.

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Com um barco de médio porte, a equipe deslocou-se por toda a área abrangida pelo projeto, realizando as entrevistas nas duas margens do rio, com uma duração aproximada de 60 dias de campo. Uma das conclusões mais importantes do estudo diz respeito ao registro de uma tendência perigosa à agropecuarização das unidades produtivas dos ribeirinhos, o que coloca em risco a mata ciliar. Por outro lado, os produtos florestais extraídos e coletados resumem-se em: castanha, borracha e cacau, o que pode ser significativamente ampliado. Em termos de participação na composição da renda familiar, o cacau é o produto que melhor remunera o dia de trabalho do extrativista, chegando a pagar uma diária de, no mínimo, R$50,00 no período da safra.

v. Genética da população de cacau nativo do Purus Ainda em fase de conclusão, o estudo de genética de populações não estava previsto no documento de projeto aprovado pelo CNPq. A demanda pelo estudo surgiu à medida que o projeto se consolidava. Logo na primeira expedição do projeto, a equipe de pesquisadores notou que a grande maioria dos povoamentos de cacau se reproduzia por meio da estaquia. Denominados de chupões, o galhos do cacau são lançados e enraízam com facilidade, formando novos indivíduos que, por sua vez, lançam novos galhos. A agressividade dos chupões inibe a germinação por sementes. Não é o caso do produtor realizar a coleta de frutos em excesso, o que não deixaria semente para a regeneração natural, pelo contrário, o produtor não consegue coletar mais que 70% dos frutos. Ocorre é que as sementes germinam, mas, no entanto, não se transformam em indivíduos adultos por falta de espaço, sempre ocupado pelos chupões. Ao discutir sobre a importância da regeneração sexuada obtida via sementes para a melhoria das condições genéticas dos povoamentos, inclusive no que se refere à produtividade, a equipe envolvida no projeto considerou importante saber o grau de endogamia existente no povoamento de cacau. A conclusão quase óbvia é que a reprodução via chupões está reduzindo a base genética dos povoamentos, com poucos indivíduos se reproduzindo, em detrimento da variabilidade genética oriunda das sementes.

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Relacionar a redução da variabilidade genética com indicadores de produtividade será uma das conclusões mais importantes desse estudo. Caso sejam confirmados, os protocolos de manejo deverão reforçar a importância da reprodução por sementes.

vi. Protocolos de manejo florestal comunitário do cacau nativo Concluído em 2010, o teste dos protocolos de manejo concebidos para ampliar a produtividade do cacau nativo foi objeto de monografia da pesquisadora júnior Kaline Rossi do Nascimento, apresentada para obtenção do título de Engenheira Florestal. Um total de seis protocolos de manejo foi concebido, tendo em vista a definição de três estratégias principais: a) estimular a reprodução sexuada, por semente; b) estimular a dominância do Cacau de Touceira, por semente; e c) definir a Unidade Ótima de Produção Anual. A primeira estratégia compreende um bloco de quatro protocolos de manejo: a) poda – Eliminação de 100% das gemas de chupão já lançadas ao solo; b) abate – Eliminação de 50% dos chupões já enraizados por touceira; c) seleção e marcação de touceiras matrizes – Tendo como critério de seleção a produtividade da touceira; e d) semeadura sob dossel emergente – Distribuição das sementes coletadas das matrizes em toda a unidade produtiva. Já a segunda estratégia inclui apenas um protocolo de manejo: a) desbaste – Eliminação de 100% do cacau solteiro com cortes realizados a 20 centímetros de altura do solo. Importante: observar a ocorrência de rebrotas. E, por fim, a terceira estratégia também inclui um protocolo de manejo: a) pousio produtivo – Identificar seis áreas de manejo segmentadas e com tamanho semelhante. Esse sexto protocolo de manejo é o que encontra maior resistência por parte do produtor, devido à obrigatoriedade de que parte da área permaneça ociosa por algum tempo. Também se definiu um período de três anos para a aplicação dos protocolos de manejo, momento no qual a produtividade do povoamento deverá apresentar curva ascendente com a duplicação da produção nesse período.

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No decorrer do projeto, de forma paralela, mas relacionada, surgiu a demanda para testar alguns óleos florestais destinados à diversificação da produção da Cooperar. Um conjunto de seis espécies florestais com potencial para produção de óleos foi testado na Unidade de Tecnologia de Alimentos da Ufac. Uma sexta e última monografia, também concluída em 2010, analisou a adaptabilidade de algumas matrizes de cacau trazidas do Purus às condições do Parque Zoobotânico da Ufac. Foram produzidas 800 mudas de cacau e plantadas sob duas condições de sombreamento diferenciadas e em áreas distantes do leito do rio. A conclusão não é favorável à indicação de plantios no interior do bosque; as mudas não vingaram e levariam até 25 anos para iniciar a produção de cacau. Todos esses estudos são subsidiários à elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, documento que tem duas finalidades importantes: servir de referência para a Cooperar gerenciar toda a produção e chegar às 40 toneladas de cacau nativo demandadas; e possibilitar o licenciamento ambiental de toda a cadeia produtiva do cacau nativo do Purus. Além dos estudos e do trabalho permanente do grupo de pesquisas, o projeto também possibilitou a realização de um acompanhamento e assessoramento aos dirigentes e associados da Cooperar, em três safras consecutivas, por três extensionistas bolsistas que atuaram durante os 30 meses de duração do projeto, com as seguintes prioridades:

Apoio aos produtores na organização da produção Envolveu o contato do extensionista com os produtores, em todos os momentos, antes e depois das safras. O trabalho do extensionista consistiu em preparar, em conjunto com os produtores, um cronograma de atividades necessárias à produção de cacau. Com uma permanência média de três dias em cada unidade produtiva, o extensionista estava em constante visita, o que permitia acompanhar a evolução do cronograma definido.

Apoio logístico para as safras Com a responsabilidade pelo patrimônio adquirido pelo projeto, o extensionista ocupava-se em operacionalizar o apoio da voadeira e do motor de popa nas safras de cacau. Além disso, o extensionista também funcionava como elo entre a equipe | 20 |

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de pesquisadores e as comunidades, fazendo essa ligação, sobretudo em momentos-chave da execução do projeto, como durante a realização dos levantamentos e contribuindo na adaptação das várias palestras realizadas na área pelos estudiosos.

Articulação institucional para a operacionalização do projeto como um todo e das quatro expedições O projeto foi executado em quatro expedições, nas quais se contou com a participação da equipe de pesquisadores em todas as áreas de estudos previstos. As expedições foram organizadas pelos extensionistas. Tendo em vista que o projeto reúne um leque amplo de parcerias e uma quantidade expressiva de produtores, o trabalho do extensionista consistiu em fazer elo de ligação entre as instituições e dessas com os produtores, organizando seminários e encontros entre ambos.

INSTITUIÇÃO RESPONSÁVEL Universidade Federal do Acre – Ufac

PARCERIAS A seguir, é apresentada uma breve descrição do papel das instituições na execução do Projeto de Manejo Florestal comunitário do cacau nativo do Purus. Instituição  Universidade Federal do Acre – Ufac Especialização  Engenharia Florestal Esclarecimentos  A Ufac coordenou o projeto e disponibilizou profissionais da área de engenharia florestal com doutorado e que compõem o quadro de professores. Também selecionou dois engenheiros florestais participantes do Programa de Residência Florestal para intercâmbio com a Universidade de Freiburg. Por fim, também selecionou seis estudantes de graduação em Engenharia Florestal para atuarem como bolsistas.

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Instituição  Cooperativa Agroextrativista do Mapiá e Médio Purus – Cooperar Especialização  Extrativismo, beneficiamento e comercialização do cacau Esclarecimentos  Na condição de articuladora e beneficiária do projeto, a Cooperar, com o envolvimento direto dos seus associados, participou de todas as etapas de execução do projeto. Instituição  Universidade de Freiburg Especialização  Engenharia Florestal Esclarecimentos  Selecionou três alunos de mestrado em Engenharia Florestal para participarem do intercâmbio com os residentes da Ufac e, ao final, produzirem três dissertações de mestrado sobre o cacau nativo. Instituição  Regenwald-Institut e.V. Especialização  Estudos de Botânica Esclarecimentos  Disponibilizou um pesquisador com experiência em cacau nativo e um dos mentores da presente proposta. Instituição  Universidade Estadual Paulista – Unesp Especialização  Engenharia de Transportes Esclarecimentos  Por meio do envolvimento do Departamento de Engenharia Civil, a Unesp produziu estudos relacionados ao escoamento da produção de cacau e à melhoria da logística para o manejo comunitário do cacau. Instituição  Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas – Idam Especialização  Programa de Extensão Florestal Esclarecimentos  Todas as inovações tecnológicas surgidas no projeto deverão ser objetos de programas de extensão florestal, que contarão com o envolvimento direto dos extensionistas estaduais. Instituição  Agência de Cooperação Técnica Alemã – GTZ Especialização  Assistência Técnica Esclarecimentos  Articulação institucional e apoio para a contrapartida necessária e não conseguida dos demais parceiros.

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Instituição  Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira – Ceplac Especialização  Pesquisa e extensão Esclarecimentos  Transmissão de conhecimentos pela experiência adquirida nas atividades desenvolvidas nas várzeas amazônicas, ao longo dos últimos anos, em pesquisa e extensão na produção de cacau. Instituição  Bremer Hachez Chocolade GmbH & CoKG, Bremen, Alemanha Especialização  Produção de Chocolate Esclarecimentos  Empresa alemã responsável pela aquisição da produção manejada de cacau nativo da Cooperar, com a qual mantém acordo de fornecimento de longo prazo.

OBJETIVOS DO PROJETO GERAL Promover a melhoria das condições de vida dos agricultores familiares do médio Rio Purus, por meio de extensão tecnológica inovadora para o manejo florestal de uso múltiplo, com foco no cacaueiro nativo da Amazônia.

ESPECÍFICOS 1. Avaliar o potencial produtivo e a dispersão do cacaueiro nativo e espécies associadas, na área de atuação da Cooperar, de modo a subsidiar o planejamento de produção de cacau da Cooperativa, bem como orientar ações de extensão do projeto. 3. Disseminar o manejo florestal de uso múltiplo, com foco no cacaueiro nativo, para agricultores familiares do médio Rio Purus, por meio de extensão tecnológica inovadora. 4. Avaliar a sustentabilidade econômica, social e ambiental do manejo florestal comunitário do cacau nativo. 5. Disseminar, em instituições de ensino superior, pesquisa, assistência técnica e extensão da Amazônia, os conhecimen tos gerados pelo projeto. Manejo florestal comunitário

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PRODUTOS ORIUNDOS DO PROJETO Para se ter uma ideia da dimensão e abrangência assumidas pelo projeto, bem como de sua importância para a realidade vivenciada no município de Boca do Acre, segue uma síntese do que foi obtido de maneira direta ou indireta pelo projeto. Produto:  Bolsistas de Iniciação contratados | Quantidade: 8 Todos os bolsistas de iniciação tecnológica são oriundos do curso de Engenharia Florestal da Ufac e se comprometeram com a elaboração de um documento para ser publicado. A maioria optou por utilizar os dados pesquisados na elaboração da monografia exigida para a graduação. Outros três optaram pela elaboração de artigos. Produto:  Bolsistas de Extensão contratados | Quantidade: 5 Os extensionistas tiveram papel fundamental no projeto. Primeiro, por estarem de forma permanente em contato com os produtores, ou seja, dois deles residem em Boca do Acre, próximo às comunidades. Segundo, pelo apoio a todas as safras de cacau ocorridas durante a execução do projeto, em especial na operação da voadeira por ele adquirida. O terceiro extensionista cuidou da interface institucional do projeto, o que foi igualmente imprescindível, tendo em vista o amplo leque de parceria formado na sua operacionalização. Produto: Produtores envolvidos | Quantidade: 800 Diretamente, um total expressivo de 800 famílias de produtores, o que significa, de acordo com dados do projeto, 4.000 pessoas, tiveram participação direta no projeto, tanto nos estudos, em especial de socioeconomia, quanto nas ações de extensão durante as safras apoiadas pelo projeto. Produto:  Expedições realizadas | Quantidade: 4 A decisão de estruturar o planejamento da execução do projeto em quatro expedições demonstrou ter sido acertada. Além de possibilitar facilidade no entendimento e na cobertura pela mídia sobre as ações do projeto, a reunião dos pesquisadores e dos bolsistas demonstrou ser bastante profícua. A totalidade das conclusões relacionadas a cada estudo a ser realizado e sobre os protocolos de manejo foram originadas durante essas reuniões. As expedições também ti| 24 |

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veram o mérito de ampliar o intercâmbio dos pesquisadores com os associados da Cooperar envolvidos diretamente no projeto, afinal todos ficavam hospedados nas unidades de produção dos manejadores de cacau nativo. Produto:  Monografias publicadas | Quantidade: 6 O mapeamento por satélite com imagens de média resolução dos povoamentos de cacau nativo, um trabalho por sinal inédito, foi tema de monografia de Kamila Andrade. O cálculo da abundância e densidade de cacau resultado do Inventário Florestal foi tema da monografia de Hudson Veras. E, por último, a realidade do cotidiano dos manejadores de cacau foi tema de monografia de Israell Melo. Outras três monografias trataram do tema da genética de populações e sobre os testes dos protocolos de manejo (Kaline Rossi). Produto:  Dissertações publicadas | Quantidade:  2 Por meio da parceria com a Universidade de Freiburg, na Alemanha, o projeto recepcionou dois estudantes (Johan Bjorn e Benjamin Beck), que elaboraram dissertação de mestrado acerca da estrutura dos povoamentos de cacau, com foco na intensidade amostral ótima para Inventário Florestal e estratégias de reprodução do cacau (uma comparação entre a reprodução sexuada, por sementes, e assexuada, pelos chupões), respectivamente. Produto:  Artigos elaborados | Quantidade: 3 Outro aluno, também da Alemanha, foi recepcionado pelo projeto e está em fase de conclusão de seu artigo sobre a importância do cacau para a fauna local (uma avaliação dos animais dispersores de semente de cacau). Outros dois artigos encontram-se em fase de conclusão por bolsistas acreanos, tratando do Inventário Florestal e do estudo de logística. Produto:  Folder impresso | Quantidade: 1 Para auxiliar no processo de extensão florestal, o projeto elaborou e imprimiu um folder, que que teve o duplo objetivo de informar sobre o projeto como um todo e introduzir o assunto dos protocolos de manejo a serem discutidos e adotados pelos manejadores de cacau para ampliar a produtividade por indivíduo, por povoamento e por área.

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Produto:  Banner | Quantidade: 1 Também na condição de material de apoio para a extensão florestal, no entanto, voltado a um público diferenciado, com mais formação acadêmica, foi elaborado um banner sobre o projeto, com enfoque nos seus objetivos e na importância do Plano de Manejo. Nos seminários sobre o projeto e em outros eventos como as Semanas Florestais e Expo Ufac, o banner foi apresentado. Produto:  Reunião em Brasília | Quantidade: 1 A partir de convite formulado pela Secretaria de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA, o coordenador do projeto participou de reunião de intercâmbio, em Brasília, na sede do MDA, onde pôde estreitar relacionamento com os outros 80 projetos apoiados no âmbito do edital 036/2007. Produto:  Artigos em site | Quantidade: 4 Outros artigos, também de opinião e assinados pelo coordenador do projeto, foram publicados em dois sites ativos: Agência de Notícias Kaxiana (www. kaxi.com.br) e da Associação Andiroba (www.andiroba.org.br). O objetivo, com essas publicações, foi chegar a um público regional, uma quantidade maior de leitores localizados em outros estados amazônicos. Produto:  Replicação da experiência | Quantidade: 2 No mínimo, dois frutos o projeto de maneira direta ou indireta proporcionou. O governo estadual, por meio da Secretaria de Meio Ambiente, iniciou prospecção da ocorrência de cacau nativo ao longo da bacia do Rio Acre, no trecho entre o município de Brasileia e Assis Brasil. Já a empresa alemã compradora do cacau iniciou procedimento comercial semelhante ao de Boca do Acre com os manejadores de cacau localizados no Rio Envira, no sul do Amazonas. Produto:  Seminários realizados | Quantidade: 2 Dois seminários foram realizados. O primeiro, no campus da Ufac, com a participação da equipe técnica, da cooperação alemã – GTZ e de dirigentes da Cooperar, discutiu e decidiu acerca dos protocolos de manejo, ficando pendente de decisão o sexto protocolo, referente à manutenção de área para pousio, que foi considerado difícil de ser assimilado pelos manejadores do cacau. O segundo

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seminário foi realizado em Boca do Acre, com a participação das instituições parceiras, produtores e dirigentes da Cooperar. A equipe do projeto formada pelo coordenador, bolsistas e um aluno alemão pôde observar a recepção favorável obtida pelo projeto e pelos resultados apresentados, em especial o mapeamento por satélite, que mostra onde estão os povoamentos de cacau, e o inventário, que esclarece quantos pés de cacau existem. Produto:  Reuniões técnicas realizadas | Quantidade: 4 Quatro reuniões técnicas com a participação dos pesquisadores, bolsistas, GTZ e membros da Cooperar aconteceram, com o intuito de tomar decisão acerca, sobretudo, dos procedimentos metodológicos para os estudos subsidiários ao plano de manejo. Também foi a partir das reuniões que se incluíram a necessidade da avaliação química dos óleos de sementes florestais, para tentar diversificar a produção dos ribeirinhos e atendendo a uma demanda da Cooperar, e o teste das matrizes de cacau, no Parque Zoobotânico da Ufac, para acompanhar o desempenho do cacau nativo fora de sua área endêmica. Produto:  Artigos em jornal impresso | Quantidade: 8 Em parceria com o Jornal A Tribuna, de circulação local em todo o Acre e com site ativo, o projeto elaborou e publicou seis artigos de opinião, assinados pelo coordenador, e que tinham o objetivo de divulgar as ações realizadas com o apoio do CNPq e convencer os leitores acerca da importância de se incluir o manejo do cacau nativo na cesta de produtos oriundos da biodiversidade e passíveis de serem ofertados segundo a tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo. Produto:  Safras apoiadas | Quantidade: 3 A primeira safra de 2008 já contou com a participação dos extensionistas e dos pesquisadores que, paralelamente, promoveram a primeira expedição do projeto. Com uma produção de nove mil toneladas de sementes, a safra manteve a média anual considerada baixa pela Cooperar e pelos compradores. A segunda safra teve apoio mais expressivo, em especial pelos extensionistas, que puderam contar com a voadeira adquirida pelo projeto. O resultado mantevese na casa das nove mil toneladas, ainda baixa. Já em 2010, o projeto pôde se apoiar com os extensionistas e novas informações sobre a ocorrência do cacau

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e logística. Uma safra recorde superior a 15 mil toneladas ainda está sendo contabilizada com o relatório sendo entregue em setembro próximo. Todavia, esse aumento se deve à ampliação dos produtores envolvidos, ou seja, a introdução de novas áreas de cacau nativo ao processo produtivo e não por aumento de produtividade das mesmas áreas, o que seria ideal e é o objetivo principal do projeto. Produto:  Inscrição da experiência em prêmios | Quantidade: 3 Na tentativa de buscar apoio para a continuidade do projeto, em especial no que se refere à ampliação dos testes dos protocolos de manejo, a preparação e a produção de material de extensão florestal e a realização de um programa de extensão para todos os manejadores de cacau nativo do Purus, a equipe preparou material para inscrição em prêmios nacionais, como: Desenvolvimento Regional, instituído pelo Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio; Empreendedores Sociais, instituído pelo Banco Santander; e Empreendedorismo consciente, instituído pelo Basa. Produto:  Participação em programa de TV com exibição nacional | Quantidade:  1 O Globo Universidade, que foi ao ar no dia 10 de julho de 2010, tratou do tema do manejo florestal de uso múltiplo e a experiência do cacau ganhou um quadro de destaque. Com a apresentação do projeto de pesquisa da bolsista Kaline Rossi, por ela mesma e pelo seu orientador, professor Nei Braga, foi possível demonstrar como os protocolos de manejo poderiam ampliar a produtividade do cacau. A exibição do programa acarretou um número elevado de comentários, contatos e muitas, mas muitas sugestões, fornecendo uma ideia clara sobre a importância dessa iniciativa. Produto: Palestras na UFAC | Quantidade: 14 Todos os pesquisadores envolvidos no projeto, sem exceção, apresentaram seus trabalhos em duas palestras para acadêmicos da Ufac. A primeira, para discutir a metodologia adotada; e a segunda, para apresentar os resultados obtidos. Representantes das instituições parceiras, como: Universidade de Freiburg, GTZ, Cooperar, empresa Hachez e as outras universidades brasileiras: Unesp e Universidade Federal de Viçosa também apresentaram as atividades a serem realizadas por meio de sua participação no projeto.

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Produto:  Entrevistas concedidas | Quantidade:  3 A mídia local se interessou pelo projeto desde a realização da primeira expedição, o que mobilizou um bom número de gente nova a chegar a Boca do Acre. As entrevistas concedidas pelo coordenador e pela equipe como um todo, em jornais locais, tiveram o objetivo de divulgar as ações do projeto, o apoio do CNPq e a importância do cacau para o extrativismo. Produto:  Livro sobre o projeto | Quantidade: 1 Para finalizar, um livro sobre a experiência do projeto encontra-se em fase final de elaboração pelo coordenador do projeto; e os recursos para sua publicação ainda precisam ser captados dos parceiros envolvidos no projeto.

EQUIPE DO PROJETO Segue a listagem dos membros da equipe envolvida na execução do projeto de manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus, de acordo com a seguinte legenda:

Pesquisador | Instituição | Formação/atuação profissional | Atividade •  Ecio Rodrigues | Ufac | Engenheiro Florestal, Dr. | Coordenador •  Alexandre Carvalho Lins | Cooperar | Economista | Gerenciamento da produção de cacau •  Rainer Putz | Regenwald-Institut e.V. | Engenheiro Florestal, Dr. | Estudo da dispersão do cacau •  Jairo Pinheiro de Lima | Unesp | Engenheiro Civil, Dr. | Estudo da logística de escoamento da produção •  Pedro Christo | Doutorando na UFV | Engenheiro Florestal, Me. | Mapeamento de imagem de satélite •  Nei Sebastião Braga Gomes | Ufac | Engenheiro Florestal, Dr. | Fitopatologia e silvicultura do cacau •  Edmilson Santos Cruz | Ufac | Engenheiro Florestal, Dr. | Inventário Florestal

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•  Kamilla Andrade | Ufac | Bolsista ITI A| Mapeamento de imagens de satélite •  Hudson Veras | Ufac | Bolsista ITI A | Inventário Florestal •  Israell Melo | Ufac | Bolsista ITI A | Socioeconomia •  Tarso Halk | Ufac | Bolsista ITI A | Estudo de logística da produção •  Kaline Rossi | Ufac | Bolsista ITI A | Manejo florestal •  Luciana Pereira | Associação Andiroba | Engenheira Florestal | Elaboração do Plano de Manejo Florestal •  Ronaldo Araújo da Silva | Cooperar | Extensionista | Programa de Extensão •  José Gonçalves Oliveira | Cooperar | Extensionista | Programa de Extensão •  Domingos Ramos de Assis | Ufac | Extensionista | Programa de Extensão •  Mágna Cunha | GTZ | Engenheira Florestal | Assistência técnica ao projeto •  Mario Francisco Caldas Ono | GTZ | Técnico | Programa de Extensão •  Maria E. Arruda Feitoza Baía | GTZ | Técnico | Programa de Extensão •  Admilson Mota de Brito | Ceplac | Pesquisador | Manejo florestal do cacau nativo •  Gláucio César Vieira da Silva | Ceplac | Pesquisador | Manejo florestal do cacau nativo

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Parte 1 O projeto apoiado pelo CNPq

PARTE 1


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O projeto apoiado pelo CNPq


Com o objetivo principal de ampliar a presença de extensionistas para auxiliarem os pequenos produtores rurais, em especial aqueles denominados de agricultores familiares, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, por meio da Secretaria de Agricultura Familiar, recorreu ao CNPq para que as atividades de extensão fossem realizadas associadas a algum tipo de inovação tecnológica ou no jeito de produzir ou produzindo algo novo. O resultado foi o lançamento do edital 036, ainda no primeiro semestre de 2007, para a seleção pública de projetos voltados ao tema da extensão tecnológica inovadora. A recepção ao edital foi surpreendente para todos os envolvidos. Das mais de 500 propostas apresentadas, cerca de 80 foram selecionadas para apoio financeiro. O eficiente sistema do CNPq, que envolve: elaboração e publicação de edital de indução da demanda e recepção das propostas de projetos no sistema on line; julgamento por comitê de especialistas por área do conhecimento; contratação por Termo de Concessão individual firmado com o pesquisador; sistema on line de prestação de contas; e assim por diante, demonstrou configurar-se em importante mecanismo para a execução de políticas públicas de outras instâncias de governo, nem sempre diretamente afetas à pesquisa. Na condição de solução rápida, transparente e com custos reduzidos de operacionalização, o sistema de apoio a projetos de pesquisas e extensão do CNPq permitiu um ganho adicional incomparável: contratar um número elevado de extensionistas para atuarem com os produtores, por meio da concessão de bolsas de extensão, do tipo EXP 3.

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Com a concessão da bolsa aos extensionistas que não tinham remuneração permanente, haja vista que a condição para recebimento da bolsa é não ter vínculo empregatício com órgão público ou privado, abriu-se uma janela importante para a solução de um gargalo histórico para a extensão universal, pública, gratuita e, talvez o mais importante, associada à inovação tecnológica: a existência de extensionistas próximo aos produtores. Sem as tradicionais amarras para a contratação de serviços de pessoa física por órgãos públicos, sem os constantes e muitas vezes questionáveis contratos e convênios (ou o Termo de Parceria, para o caso de Oscip, que o Estado não consegue levar adiante) da relação pública-privada com as organizações não governamentais, sem o fantasma da continuidade que ainda assombra órgãos públicos, uma vez que o trabalho de extensão teria duração igual à vigência do projeto, o edital do CNPq conseguiu arregimentar um grande número de extensionistas. Apesar de estar longe de ser considerada uma unanimidade, a vinculação das ações de extensão à inovação tecnológica parece ter demonstrado ser eficiente. Afinal, a presença do extensionista junto ao produtor, sem prejuízo do papel de motivador do empreendedorismo e da constante busca da autonomia ampla da pequena produção familiar, papel esse que é desempenhado pelo extensionista, a existência de inovação tecnológica a ser compartilhada com o produtor constitui-se em condição superior para a realização da própria extensão. O estreito vínculo entre extensão e inovação foi algo que o CNPq parece ter percebido com clareza ao se lançar no bem-sucedido desafio, representado pelo Edital 036, da extensão tecnológica inovadora.

MANEJO DO CACAU NATIVO DO PURUS Com ocorrência ao longo da mata ciliar do Purus, o manejo florestal do povoamento de cacau nativo representava, antes da execução do projeto, uma lacuna bibliográfica sem precedentes. Para se ter uma ideia, a produção histórica de cacau nativo, que remonta aos primórdios da ocupação do Purus, ainda na época áurea da produção gomífera ocorrida nos idos do final do século dezenove, apesar de resistir a todos os

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ciclos econômicos e permanecer na atualidade, não teve a atenção devida dos órgãos responsáveis pela compilação de estatísticas de produção. Em suma, não há dados de produção do cacau. É como se nunca houvesse sido produzido. Se não há informações elementares sobre produção, tampouco há análises acerca da importância dessa produção para a dinâmica econômica local e, pior ainda, para técnicas de exploração ou de manejo florestal da espécie. Por outro lado, a quase total lacuna de informações oriundas de pesquisas sobre o manejo do cacau nativo é inversamente proporcional ao do cacau de cultivo. Capitaneado, quase que exclusivamente pela Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira – Ceplac, vários estudos retratam todas as etapas para a domesticação do cacau, da seleção das matrizes, passando pela produção de mudas e indo até o surgimento da, sempre inevitável, praga que causa a doença comumente chamada de vassoura-de-bruxa. No pior dos mundos é que, em raras oportunidades, os resultados das pesquisas com o cacau domesticado pode ajudar no manejo do nativo. Afora as atividades tradicionais, como a realização de poda higiênica para a limpeza do cacaueiro, as demandas por tratos culturais no cacau domesticado se distanciam das do nativo. Todavia, em que pesem algumas dificuldades para a concepção de novas metodologias para os levantamentos, a ausência de estudos sobre o cacau nativo, ao invés de desanimar, funcionou como incentivo para a equipe de pesquisadores envolvida no projeto. O resultado, como será demonstrado a seguir, superou todas as expectativas, permitindo a formação de um banco de informações para deixar futuros pesquisadores do cacau nativo repletos de perguntas a serem respondidas.

EXTRATIVISMO DO CACAU NO PURUS O cacaueiro (Theobroma cacao L.) da Amazônia foi uma das primeiras espécies florestais a adquirirem elevado valor de mercado. Primeiro, ao compor o conjunto de espécies denominadas de “Drogas do Sertão” e, posteriormente, de maneira isolada, com taxas de exploração e de exportação bem mais significativas. Seguindo o histórico do ciclo econômico, no qual os produtos extrativos estão submetidos, o cacaueiro nativo da Amazônia foi domesticado para a produção em cultivos e levado para a região sul da Bahia, zona de escape do fungo

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causador da vassoura-de-bruxa, Crinipellis perniciosa (Stahel) Singer, sobretudo na região de Ilhéus, na qual ganhou grande notoriedade. O ciclo econômico dos produtos explorados segundo o modo extrativista, tem se repetido em vários estudos, com enfoque em um variado leque de espécies florestais. Como salientou Caio Prado Júnior, a Amazônia estava fadada a manter-se na coleta e ver suas riquezas sendo levadas, uma a uma, para outras regiões. A domesticação não teria futuro na própria região e a história comprovou o quanto esse raciocínio é acertado. Ocorre que o extrativismo encontra barreiras, no que os economistas chamam de inelasticidade de oferta. Em um dado momento do ciclo produtivo, quando o produto de origem extrativa já alcançou níveis de demandas extraordinários, sua oferta não pode ser ampliada em curto prazo, devido ao limite imposto pela dispersão da espécie no inteiror do ecossistema florestal. Mesmo considerando a grande quantidade de recursos florestais, devido à imensidão da Amazônia, o elevado custo de exploração de áreas longínquas praticamente inviabiliza economicamente a ampliação da oferta do produto em curto prazo, mesmo que haja aumento significativo no preço. O alto custo de exploração dos recursos florestais, principalmente os mais longínquos, está relacionado a diversas limitações estruturais da região amazônica: transporte, energia, comunicação, dificuldades de determinar precisamente as áreas de ocorrência de produtos florestais, quantidade e qualidade da mão de obra. O plantio em larga escala de espécies nativas da Amazônia não é uma solução viável para a região, tendo em vista a ocorrência de pragas e doenças endêmicas que chegam a dizimar as plantações. Por outro lado, o cultivo de produtos nativos da Amazônia em larga escala em outras regiões do País e do mundo é menos suscetível à infestação por pragas ou doenças que, geralmente, não estão presentes fora do ambiente de origem da espécie. Assim, tendo em vista que a Amazônia é pouco competitiva em relação a outras regiões do País e do mundo quando se trata da exploração de recursos florestais domesticáveis, muitos estudiosos previram que a amazônia continuaria na coleta, adquirindo importância econômica relativa em curtos espaços de tempo e perdendo suas riquezas para outras regiões do País e do mundo. Depois do cacau, outro exemplo semelhante chocou os brasileiros e até hoje impregna o imaginário de técnicos e cientistas envolvidos com a produção florestal na região: o saque da borracha pelos ingleses. | 38 |

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A seringueira foi, provavelmente, a espécie florestal de maior amplitude econômica da Amazônia. Com um ciclo produtivo longo, de mais de 20 anos, essa espécie florestal gerou riquezas nunca vistas para a região. Por um lapso estratégico, o governo brasileiro permitiu a transferência de sementes e mudas para o Jardim Botânico de Kew em Londres, e o resto da história todos conhecem. Inicialmente, os britânicos, em 1911, impuseram um primeiro choque na produção de borracha amazônica. Mais recentemente, desde 1992, os paulistas são recordistas nacionais na produção cultivada de borracha, deixando a Amazônia sem condições de competir. Mas, o cacau e a borracha não são os únicos exemplos da derrocada econômica dos ciclos florestais na Amazônia. A sequência inexorável da descobertademanda-inelasticidade-domesticação-cultivo repete-se cada vez com maior rapidez. Exemplos atuais, como o da pupunha (palmito e fruta), do cupuaçu, da graviola, da pimenta-longa e, por último, do camu-camu, reforçam a tese de que a Amazônia está fadada ao fracasso econômico. No entanto, modificações importantes em tecnologia e na postura e atitude do mercado parecem reverter essa tese. Sem entrar na discussão da inegável, e cada vez mais reconhecida, importância do ecossistema florestal amazônico para a regulação do clima no planeta e a mitigação dos efeitos danosos do desequilíbrio climático, novas perspectivas de mercado cercam os produtos oriundos da floresta. No âmbito do desenvolvimento tecnológico, no decorrer da década de 1990, sobretudo em instituições localizadas na própria Amazônia, foi concebido o que se convencionou chamar de MANEJO FLORESTAL DE USO MÚLTIPLO. Trata-se de um conjunto de procedimentos técnicos que permite elevar tecnologicamente o modo extrativista de produção, no sentido de ampliar a cesta de produtos florestais sob manejo e, assim, proporcionar a redução do custo de cada produto individualmente, já que os custos de exploração da parcela florestal passam a ser rateados entre vários produtos. Além disso, o manejo também proporciona aumento significativo de produção e produtividade de cada espécie manejada, assegurando, ao mesmo tempo, o equilíbrio ambiental. Já com relação à postura e atitude de mercado, no decorrer da década de 1990, a sociedade viu surgir algo inusitado e até então desconsiderado por diversos pesquisadores: os denominados mercado solidário e ecomercado, formados por consumidores que se preocupam e exigem a certificação de origem do produto

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florestal, de maneira a comprovar que sua produção não deixa rastros de destruições ambientais e sociais. Indo além, no caso específico do cacau nativo da várzea dos rios amazônicos, há ainda um ingrediente mais significativo: a volta ao sabor primitivo do chocolate, já que o cacau é originário da região Amazônica. Interessante que essa valorização do manejo florestal das espécies em seu habitat de ocorrência natural ocorra em detrimento da domesticação e dos cultivos. Mais interessante ainda é que essa valorização do manejo florestal surja exatamente com a primeira espécie florestal a ser submetida à tese da inelasticidade da oferta. O cacaueiro nativo das várzeas dos rios amazônicos inaugurou o ciclo da domesticação e agora, irá inaugurar um novo ciclo de valorização do ecossistema florestal na Amazônia, contribuindo para ampliar sua competitividade frente aos usos alternativos do solo como, por exemplo, o da agropecuária.

IMPORTÂNCIA DA COOPERATIVA AGROEXTRATIVISTA DO MAPIÁ E MÉDIO PURUS – COOPERAR A Cooperar foi fundada por um grupo de 21 extrativistas da região do médio Rio Purus, com o objetivo de auxiliar na execução de um projeto concebido e aprovado pela Associação de Moradores da Vila Céu do Mapiá, para ser financiado com recursos a fundo perdido oriundos do Ministério do Meio Ambiente – MMA. A missão da cooperar está vinculada à definição, promoção e implantação de alternativas produtivas adequadas aos ideais de sustentabilidade atualmente preconizados. A ideia principal é que seja possível a geração de trabalho e renda para os extrativistas da região, sobretudo para aqueles associados à Cooperar, compartilhada com a manutenção do ecossistema florestal. Desde a sua criação, em 2003, a Cooperar tem, por meio de um intenso processo de articulação institucional e da elaboração e aprovação de projetos de financiamento, conseguido adquirir bens de primeira necessidade, para atender às necessidades de seus associados, com a redução expressiva do custo desses produtos para cerca de 80 famílias da região do Purus. Ao lado da produção, a Cooperar tem investido na oferta e comercialização de frutas desidratadas, como: banana, tucumã, abacaxi e castanha; sementes | 40 |

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secas de cacau nativo; e óleos vegetais de espécies florestais, como: castanhado-brasil e andiroba. A comercialização desses produtos tem contribuído para a melhoria da renda de um total de 115 famílias de extrativistas. No período compreendido de 2007 a 2010, a Cooperar, por meio de parceria com o Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas – Idam e financiamento do MMA, via Fundo Nacional do Meio Ambiente – FNMA, ofereceu assistência técnica e extensão florestal para 120 famílias e 240 produtores familiares residentes nos municípios de Boca do Acre e Pauini. O projeto previu a elaboração, em conjunto com os beneficiários, do diagnóstico das propriedades e áreas de uso comum e o planejamento de atividades produtivas baseadas no manejo florestal a serem incluídas nas propostas para a obtenção de crédito rural. Os produtores, de posse dos recursos do crédito, implantaram manejo florestal e sistemas agroflorestais, com assistência técnica continuada. Realizaram visitas de intercâmbio na região para a troca de conhecimentos e experiências e aumento da integração social. À Cooperar coube a responsabilidade pelo beneficiamento e a comercialização da produção nas propriedades beneficiárias da assistência técnica e do crédito produtivo.

PRODUÇÃO DE CACAU NATIVO PELOS ASSOCIADOS DA COOPERAR, DE 2006 A 2008 De acordo com o relatório de acompanhamento da produção de cacau elaborado pela Cooperar, sob a coordenação do economista Alexandre Carvalho Lins (cujos textos transcritos abaixo foram originalmente divulgados em março de 2009), o comportamento das três safras de cacau nativo, durante a série histórica analisada, apresenta incremento significativo para a renda dos extrativistas envolvidos na produção. Em 2006, a Cooperar comprou frutos de cacau colhidos entre as comunidades Capana e Volta da França, Figura 1. Em 2007, o trecho de operação foi ampliado até a comunidade São José do Catipari. Já em 2008, o trecho de operação foi de Santo Onofre a Boca do Mamoriá. A partir de 2007, a Cooperar também passou a comprar cacau do Rio Acre. Estima-se que o trecho de operação da Cooperar, em 2008, foi, aproximadamente, três vezes maior do que o trecho operado em 2006. Manejo florestal comunitário

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Sena Madureira Santo Onofre

Boca do Acre Santo Elias * Volta da França Canacuri *

Trechos de Operação

Rio Purus

Capana

2006 2007 2008

Pauini São José do Catipari

Boca do Mamoriá * Localidades com Centrais de Beneficiamento de Cacau

Figura 1: Área coberta pela Cooperar para a compra de cacau, 2006 a 2008

Em 2006, a Cooperar comprou frutos de cacau de 25 comunidades, conforme a Tabela 1. Em 2007, mesmo com a ampliação do trecho de operação, apenas 21 comunidades colheram cacau, em função da pequena safra. Já em 2008, 65 comunidades colheram cacau, correspondendo a 46% do total de comunidades existentes no trecho de operação naquele ano.

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O projeto apoiado pelo CNPq


Tabela 1: Comunidades atendidas pela Cooperar por trecho, 2006 a 2008 Total de comunidades*

N° de comunidades colhendo cacau

% do total de comunidades*

2006

2007

2008

2006

2007

2008

Purus de cima

34

9

1

22

26%

3%

65%

Boca do Acre/ Santo Elias

20

7

3

10

35%

15%

50%

Santo Elias/ Canacuri

27

9

9

11

33%

33%

41%

Canacuri/ Boca do Mamoriá

35

0

7

11

0%

20%

31%

Rio Acre

25

0

1

11

0%

4%

44%

Total

141

25

21

65

18%

15%

46%

* Em 2008

Trecho

A quantidade de produtores que entregaram cacau à Cooperar aumentou de 141, em 2006, para 207, em 2008, mesmo depois da acentuada redução em 2007, quando apenas 47 produtores entregaram cacau, Tabela 2. Apesar desse comportamento, a média de produtores que entregaram cacau, por comunidade, diminuiu de seis, em 2006, para três, em 2008. Fato justificado, provavelmente, pela pequena safra de 2008, quando comparada à de 2006, acarretando desinteresse dos produtores. Adicione-se ainda o constrangimento de que, em 2006, a Cooperar promoveu a venda de mercadorias e estivas abaixo do preço de mercado para os produtores que manejaram cacau, o que não ocorreu em 2007 ou 2008. É claro que o abastecimento de mercadorias funciona como importante motivação para despertar o interesse dos manejadores. Cabe destacar, ainda, que o número de produtores que colhem cacau é sempre superior ao número de produtores que comercializam, pois muitos contam com a ajuda de familiares para a colheita.

Manejo florestal comunitário

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Tabela 2: Produtores que comercializaram cacau com a Cooperar, 2006 a 2008 Média de produtores por comunidade

Total de produtores

Trecho

2006

2007

2008

2006

2007

2008

Purus de cima

30

1

58

3

1

3

Boca do Acre/ Santo Elias

43

9

38

6

3

4

Santo Elias/ Canacuri

68

24

52

8

3

5

Canacuri/Boca do Mamoriá

0

12

48

0

2

4

Rio Acre

0

1

11

0

1

1

141

47

207

6

2

3

Total

A safra de 2006 foi considerada excepcional em praticamente todo o Purus, enquanto a safra de 2007 foi a pior ocorrida nos últimos 20 anos. Naquele ano, estima-se que, na maioria das comunidades, cerca de 80% dos pés de cacau, por razões inerentes ao nicho ecológico da espécie, não frutificaram. Já em 2008, a frutificação aumentou, quando comparada com 2007, mas ainda continuou inferior a 2006, sendo considerada fraca pelos manejadores. Esse comportamento ecológico da espécie explica, em parte, a quantidade de frutos colhidos. Um total de 343.023 frutos foi colhido, em 2006; e apenas 62.731 frutos, em 2007, mesmo com a ampliação significativa de trecho de operação da Cooperar, Tabela 3. Em 2008, com a nova ampliação da área de atuação chegando a ser três vezes maior do que a de 2006, a colheita alcançou 374.883 frutos (apenas 9% a mais que em 2006). A média de frutos colhidos por comunidade diminuiu de 13.721, em 2006, para 2.987, em 2007, e aumentando para 5.767, em 2008.

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O projeto apoiado pelo CNPq


Tabela 3: Quantidade de cacau colhido por Trecho de Operação, 2006 a 2008 Quantidade de frutos

Trecho

Média de frutos por comunidade

2006

2007

2008

2006

2007

2008

Purus de cima

92.645

400

127.596

10.294

400

5.800

Boca do Acre/ Santo Elias

104.143

8.700

95.118

14.878

2.900

9.512

Santo Elias/ Canacuri

146.235

32.864

66.886

16.248

3.652

6.081

Canacuri/ Boca do Mamoriá

0

20.467

76.791

0

2.924

6.081

Rio Acre

0

300

8.492

0

300

772

343.023

62.731

374.883

13.721

2.987

5.767

Total

Diretamente relacionada à quantidade de frutos colhidos, a renda gerada pela colheita de cacau apresentou comportamento semelhante, mesmo com aumento significativo do preço pago pela Cooperar pelo cento de frutos de cacau. Enquanto, em 2006, o cento de frutos de cacau era comprado por R$ 4,00, em 2007 e 2008, foi adquirido por R$ 6,00 (preços pagos na propriedade). A elevação do preço fez parte da estratégia adotada pela Cooperar para estimular a colheita. Para o cacau entregue nas usinas de beneficiamento primário, a Cooperar, em 2008, pagou R$ 8,00 pelo cento, o que também contribuiu para o aumento de renda dos produtores. A renda total com o manejo do cacau aumentou de R$ 13.299,12, em 2006, para R$23.093,70, em 2008, sendo de apenas R$ 3.324,30, em 2007, Tabela 4. A renda média gerada para cada manejador, no período da safra (equivalente a 2,5 meses), passou de R$ 97,35, em 2006, para R$ 70,73, em 2007, chegando a R$ 111,56, em 2008. Cabe destacar que a renda média é fortemente influenciada para baixo, devido à existência de vários produtores que fizeram apenas uma ou duas colheitas de cacau. Trata-se de valor expressivo para a realidade da região. A renda obtida com o cacau alcança importância significativa, uma vez que a renda financeira per capita nas comunidades do Purus é de R$ 23,65 por mês e a renda familiar é de R$ 120,82 por mês, de acordo com indicadores socioeconômicos da Cooperar para o ano de 2004. Manejo florestal comunitário

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Tabela 4: Renda da colheita de cacau por trecho de operação, 2006 a 2008 Trecho

Renda total por trecho

Renda média por produtor

2006

2007

2008

2006

2007

2008

Purus de cima

3.721,30

16,00

8.163,00

124,04

16,00

140,74

Boca do Acre/ Santo Elias

4.156,82

522,00

6.109,50

96,67

58,00

160,78

Santo Elias/ Canacuri

5.421,00

1.704,30

3.940,70

86,00

71,01

75,78

Canacuri/Boca do Mamoriá

0

1.070,00

4.332,00

0

89,17

90,25

Rio Acre

0

12,00

548,50

0

12,00

49,86

13.299,12

3.324,30

23.093,70

97,35

70,73

111,56

Total

FIDELIDADE COMERCIAL COM A PRODUÇÃO DE CHOCOLATE COM A MARCA DOS ALEMÃES O acordo comercial firmado entre a Cooperar e a empresa de chocolates finos alemã Hachez, com interveniência da agência de cooperção técnica alemã, conhecida pela sigla em alemão GIZ, foi, ao mesmo tempo, o que promoveu a dinâmica econômica local e permitiu transformar o cacau nativo em importante componente da cesta de produtos florestais passíveis de serem produzidos com as inovações tecnológicas originadas do manejo florestal de uso múltiplo. O contrato estabelece, uma vez que ainda vige, uma relação comercial extremamente favorável aos manejadores de cacau, uma vez que prevê o custeio de toda a logística de produção, incluindo os investimentos em barcos, canoas e estrutura de beneficiamento primário, que assumem proporções elevadas dadas as condições locais. Para se ter uma ideia mais precisa do significado financeiro desse indispensável aporte na logística da produção, a Tabela 5 apresenta os valores gastos para a safra de 2008.

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O projeto apoiado pelo CNPq


Tabela 5: Investimentos por finalidade para a safra de 2008 Finalidade do gasto

Valor (R$)

%

2.759,70

2,80

0,00

0,00

Equipamentos

2.548,90

2,60

Frutos de cacau

23.566,30

24,30

Transporte (suprimento)

38.446,65

39,70

Beneficiamento

17.803,40

18,40

Comercialização

8.00,00

8,30

Custos administrativos

3.714,40

3,80

Total

96.839,35

100,00

Pesquisa (ressarcimento dos gastos da pesquisa do Bjorn) Estrutura

Note-se que o item de dispêndio denominado frutos de cacau refere-se aos valores antecipados para a compra da safra e equivalentes a 24% dos gastos, enquanto o transporte, leia-se logística, representa 39%; ou seja, o valor pago pelo cacau ao produtor representa um quarto do preço pago pelo cacau, pela empresa. Há que se considerar, também, que a única garantia de que a empresa receberá as sementes de cacau, secas e sem a presença de fungos, e ainda na qualidade requerida, é a asinatura de um dirigente da Cooperar no contrato. Não há seguro de safra ou qualquer outra forma de ressarcimento para a empresa, caso ocorra algum imprevisto ou sinistro com a balsa que navega com toda a carga de sementes de Boca do Acre até o porto de Belém, por exemplo. A responsabildade dos dirigentes da Cooperar em honrar os compromissos com a empresa é fator crucial para a manutenção do contrato durante as safras, desde 2006. A única represália que a empresa pode fazer, caso alguém descumpra o acordado, é não adiquirir a safra do ano seguinte e ir prospectar cacau nativo em outras paragens do Purus. Em que pesem as possíveis críticas à exigência de fidelidade imposta pela empresa à Cooperar e a consequente dependência da comercialização do cacau às decisões da Hachez, o acordo comercial tem sido cumprido por ambas

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as partes e, ao que tudo indica, satisfeito as expectativas de todos os envolvidos, o que é mais importante. Por último, outro ponto complexo do acordo comercial trata da definição do preço pago pelo cento de frutos ao manejador do cacau. A primeira dúvida seria sobre quem recai a responsabilidade para tomar essa decisão ou de quem é o papel para a definição do preço. Da Cooperar, porém, com o aval da empresa. Ocorre que o grau de liberdade da Cooperar para a taxação do preço é bem reduzido e oscila entre um valor que seja atrativo para o produtor, que o motive a colher o cacau, uma vez que ele não praticava essa atividade antes, e os custos relacionados à introdução de uma nova colocação, um novo manejador, ao processo produtivo de cacau. Como esse custo de inclusão de um novo produtor envolve os elevados investimentos em logística, adicionados aqueles vinculados à propspecção, para saber se tem ou não cacau na comunidade, o preço fixado pela Cooperar é amarrado ao custo de oportunidade do produtor para ocupar sua força de trabalho. Os indicadores de socioeconomia produzidos pelos estudos apoiados pelo projeto dão conta de que o manejo do cacau, durante sua safra, remunera melhor o produtor pelo dia trabalhado do que qualquer outra atividade produtiva, inclusive a criação de gado.

ASSESSORIA TÉCNICA DO INSTITUTO ALEMÃO DE FLORESTA TROPICAL, DA UNIVERSIDADE DE FREIBURG E DA GIZ No entanto, é óbvio que a Hachez, para decidir envolver-se em uma empreitada de alto risco como essa, que se baseava no adiantamento de recursos financeiros, procurou proteger-se por meio do envolvimento de uma série de instituições, também alemãs, é claro. Mas, não foi a empresa que descobriu o potencial do cacau nativo, e sim o Instituto Alemão de Floresta Tropical, em alemão, Regenwald-Institut e.V., que atuava na região com a realização de estudos de botânica, com a presença frequente de um biológo. O potencial do cacau surgiu a partir de discussões do biólogo com a Cooperar. A partir daí, a Hachez foi instada a entrar no negócio do cacau nativo, sob o argumento de que se tratava de um cacau especial, diferenciado do cultivado,

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O projeto apoiado pelo CNPq


que forneceria ao chocolate produzido a partir dele o aroma e o sabor especiais presentes no produto quando foi inventado. Outro risco assumido pela empresa foi o teste desse novo nicho de mercado composto por consumidores que concordariam em pagar um preço superior para provar um chocolate selvagem, primitivo, original e nativo da Amazônia. Esse mercado existiria de fato ou se tratava de especulação de apaixonados pela região? Qual o tamanho do diferencial de preço que os consumidores se disporiam a aferir para valorizar esse novo produto? Essas perguntas foram respondidas de maneira favorável aos interesses da empresa e da Cooperar, mas significavam, no início, riscos graves ao empreendimento. A agência de cooperação alemã GIZ também foi acionada para funcionar tanto como elo de ligação entre a empresa e a Cooperar, sobretudo para internalização dos recursos aportados pela empresa para adiantamento do custeio da safra, quanto como fornecedora de assistência técnica voltada para garantir a qualidade na semente de cacau beneficiada pela Cooperar. Restava ainda esclarecer uma preocupação permanente de todos os envolvidos: a produção de sementes de cacau nativo não poderia, em nenhuma hipótese, acarretar algum tipo de impacto ambiental que colocasse em risco a espécie, o povoamento de cacau ou a própria manutenção da floresta. A demanda por estudos relacionados à ciência florestal surgiu de imediato. Com a responsabilidade de oferecer respostas ao manejo florestal comunitário do cacau praticado pelos associados da Cooperar, os engenheiros florestais da Universidade de Freiburg envolveram-se no esforço para a execução do projeto, chamando a atenção para a ampla e completa lacuna de conhecimento acadêmico sobre os dois temas: do cacau nativo e de seu manejo florestal comunitário.

ENVOLVIMENTO DA ENGENHARIA FLORESTAL DA UFAC Além de Freiburg, era clara a importância do envolvimento de uma universidade amazônica para o estudo do manejo do cacau nativo. Por uma questão exclusiva de localização geográfica, a Universidade Federal do Acre – Ufac, por ser a unidade acadêmica mais perto das áreas manejadas pelos produtores, viu-se diante do desafio de atender a essa demanda originada na sociedade.

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Os engenheiros florestais, vinculados ao curso de graduação em Engenharia Florestal da Ufac, interessaram-se pelo desafio, por duas razões profissionais claras. Primeiro, diante da oportunidade única, e indispensável, de poder estabelecer uma parceria com a engenharia florestal mais tradicional do mundo, representada pela Universidade de Freiburg. Os dividendos dessa relação para a Ufac seriam incalculáveis. Segundo, devido às características do próprio desafio. Além da originalidade do tema do manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus, o projeto era pioneiro para a Ufac em vários sentidos. Primeiro, pela localização da área de manejo florestal entre Boca do Acre e Pauini, localidades com acesso facilitado por Rio Branco e muito difícil por Manaus, mas que, todavia, não eram prioridade para a realização de pesquisas pela Ufac. Também, pelo envolvimento direto dos produtores por meio da sua organização de representação, a Cooperar, entidade criada pelos moradores da Vila Céu do Mapiá, comunidade reconhecida pela sua espiritualidade baseada no culto do Santo Daime, seita que tem sua maior referência na existência e manutenção do ecossistema florestal na Amazônia. Ainda, e mais atraente, pela promoção e o fortalecimento da tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo, referência principal para o curso de Engenharia Florestal da Ufac, uma vez que o objetivo final do projeto resumia-se à preparação de um documento de gerenciamento da produção de cacau nativo, o Plano de Manejo Florestal Comunitário. O fator ainda mais atraente era que, depois das respostas promissoras do nicho de mercado para a empresa de chocolate, a demanda por sementes de cacau subiu das usuais nove para 40 toneladas por safra. Uma elevação sensível de produtividade que deveria ser alcançada sem apelar para a domesticação do cacau em cultivos homogêneos ou mesmo consorciados em sistemas agroflorestais, uma vez que alteram o sabor do chocolate. A produtividade dos povoamentos de cacau deveria ser quaduplicada com a adoção de protocolos de manejo florestal, para manter o cacau nativo, selvagem, ecológico, primitivo, natural ... Isto é, mesmo reconhecendo os limites para a produtividade do ecossistema florestal nativo, que nunca chegará às elevadas quantidades produzidas pela domesticação e, por isso, destinadas ao consumo em larga escala, ou de massa, como dizem os economistas, os engenheiros florestais deveriam concen-

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O projeto apoiado pelo CNPq


trar-se em promover ao máximo a produtividade dos povoamentos nativos de cacau do Purus. No entanto, uma linha muito tênue e, por conseguinte, perigosa separa uma abundância ou, para ser mais claro, uma quantidade de pés de cacau por hectare, para auferir o máximo de produtividade de um povoamento de cacau nativo, da abundância dos cultivos domesticados. E, como os estudos demonstraram, a resposta está assentada no imprescindível manejo florestal das seis espécies associadas ao cacau nativo, não para sombreá-lo (como se pensava incialmente), mas sim para criar o microclima no qual o cacau nativo floresce e do qual a espécie é tão exigente. Mas, infelizmente e sem que haja uma razão plausível, o manejo florestal das seis espécies associadas, que deve ocorrer ao mesmo tempo que são aplicados os protocolos de manejo para o cacau nativo, de forma paralela, para que os efeitos sejam exponenciais, ainda encontra muita, mas muita, resistência dos órgãos ambientais. Esse é um desafio para a ciência florestal amazônida que, ao que tudo indica, será cada vez mais recorrente, urgente, contemporâneo e futuro.

CONVÊNIO ENTRE A UFAC E A UNIVERSIDADE DE FREIBURG A profícua parceria entre a Universidade Freiburg e a engenharia florestal da Ufac foi selada e oficializada por meio de convênio de cooperação técnica com amplas perspectivas. Para a concentração de esforços relacionados à produção acadêmica sobre o manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus, os alemães comprometeram-se em bancar a elaboração de três dissertações de mestrado, nos seguintes temas:

•  Inventário Florestal Tema concluído e defendido em Freiburg com cópias para distribuição aos interessados, em alemão e inglês (resumo em português), discutiu a intensidade amostral, ou melhor, a área ótima a ser amostrada em povoamentos de cacau nativo para se obter confiança estatística com o menor custo amostral

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possível. A conclusão principal é que uma amostragem de 10 hectares de povoamento de cacau nativo é representativo de toda a população do Purus.

•  Propagação do cacau Dissertação concluída e defendida em Freiburg, apresenta um ensaio sobre as potencialidades da propagação por chupão (vegetativa e assexuada), em comparação com a reprodução por sementes (sexuada), segundo o critério da eficiência para cosolidar o povoamento do cacau nativo. A conclusão principal é que a propagação por chupão, assexuada, se sobrepõe à reprodução por semente e pode ser a responsável pela manutenção do sabor diferenciado do cacau nativo.

•  Dispersores do cacau nativo Tema concluído e apresentado em Freiburg, trata-se de um ensaio sobre a relação do cacau nativo com a fauna de dispersores das sementes, no interior da floresta, com análise sobre as espécies de fauna associadas ao cacau e sobre a área de dispersão do povoamento nativo propiciada pelos animais. A conclusão principal é que não há relação significativa do cacau com a fauna cinegética. Sendo que apenas o papagaio e uma espécie de macaco foram fotografados com frutos de cacau, o meio mais significativo para a dispersão da semente nas margens do Purus é o próprio Purus, o que explica a segunda hipótese para a ocorrência do cacau nativo, a do interflúvio, comprovada no projeto. À engenharia florestal da Ufac, por sua vez, como se verá logo a seguir, coube a elaboração de seis estudos acadêmicos, na forma de monografia, todos concluídos por bolsistas do projeto e já defendidos no curso de Engenharia Florestal, e que são melhor detalhados abaixo. A continuidade da parceria estará submetida à capacidade dos pesquisadores envolvidos em conseguir estabelecer áreas comuns de interesse, que, provavelmente, estarão ligadas ao ainda inexplorado campo do manejo florestal comunitário da biodiversidade presente no ecossistema florestal da Amazônia.

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O projeto apoiado pelo CNPq


CONCEPÇÃO DO PROJETO DE EXTENSÃO E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA PARA O CACAU NATIVO A relação direta existente entre extensão e inovação nem sempre é percebida, tanto pelos extensionistas quanto pelos adeptos da inovação tecnológica. É fácil comprender as razões de cada um, uma vez que inovação está relacionada à realização de pesquisas; e extensão, ao cotidiano do produtor. Enquanto a pesquisa costuma não ter pressa, a extensão precisa de respostas mais imediatas, ou seja, é muito arrojada. Nesse ponto, o manejo comunitário do cacau nativo do Purus demonstrou ser uma instigante superfície de contato entre inovação e extensão. Ao tratar de algo concreto, que está acontecendo nesse momento, como a ampliação da oferta de sementes de cacau fermentadas e secas, o que significaria um aumento considerável da renda dos associados da Cooperar, os extensionistas depararam-se com uma série de gargalos, cuja superação dependia de um processo de inovação. Na relação invertida, quando a realidade provoca a demanda pela inovação, e não o contrário, quando a inovação de laboratório precisa passar pela complexa realidade do cotidiano das pessoas, parece que a inter-relação entre extensão e inovação é mais perceptível a todos os participantes. Foi esse entendimento que permitiu a formação de um arranjo institucional único e difícil de ocorrer na realidade institucional amazônica, no qual organizações com missões variadas, nacionais e internacionais, amazônidas e de outras regiões conseguiram encontrar uma motivação para contribuir para encontrar uma resposta para as muitas perguntas feitas pelos manejadores de cacau, associados à Cooperar. Dessa maneira, um conjunto – formado por três entidades de ensino superior, sendo uma alemã (Universidade de Freiburg); e duas brasileiras, uma localizada na Amazônia (Ufac) e outra na região sudeste (Unesp) – une-se ao esforço da agência de cooperação técnica alemã (GIZ), de um instituto não governamental de pesquisas, também alemão (Regenwald-Institut e. V.), de uma instituição estadual, amazonense, de extensão rural (Idam) e do órgão nacional de pesquisa e extensão da cultura cacaueira no Brasil (Ceplac), a fim de apoiarem o esforço dos extrativistas de cacau nativo do médio Rio Purus, reunidos em uma cooperativa, a Cooperar, no intuito de oferecer soluções tecnológicas para o manejo florestal do cacau nativo de várzea, exportado para uma empresa

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alemã (Hachez), que também está envolvida no projeto, assegurando a compra antecipada do cacau nativo, colhido e beneficiado no interior do ecossistema florestal da Amazônia. Tendo como região prioritária as várzeas do médio Rio Purus, em especial os municípios amazonenses de Boca do Acre e Pauini, o projeto estruturou-se na realização de levantamentos destinados à subsidiar as propostas de inovação tecnológica e na consequente adoção dessas inovações pelos manejadores de cacau nativo, a serem convencidos sobre suas vantagens por meio da extensão florestal. É possível que o sucesso experimentado pelo projeto esteja, sobretudo, na clareza de propósitos presente na sua concepção inicial, qual seja: aumentar a produção de cacau nativo, por meio da tecnologia do manejo florestal comunitário, para melhorar a renda e a vida dos manejadores. Afinal, o projeto apoiado pelo CNPq foi concebido porque os produtores associados à Cooperar precisam dessas soluções tecnológicas para honrar os contratos de fornecimento já firmados com a empresa compradora. Às universidades, ao instituto de pesquisas, ao órgão estadual de extensão florestal e ao órgão federal de pesquisas e extensão da cultura cacaueira foi depositada a responsabilidade de, por meio das ações do projeto, criar, testar e fazer com que essas soluções tecnológicas sejam assimiladas pelos agricultores familiares.

SOBRE O EDITAL 36/2007 DO CNPQ E O PAPEL DA SECRETARIA DE AGRICULTURA FAMILIAR DO MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO A publicação do edital 36, em 2007, pelo CNPq foi uma agradável surpresa para os que vinham discutindo as lacunas de informação e os gargalos produtivos relacionados ao cacau nativo do Purus. Os recursos oriundos da Secretaria de Agricultura Familiar, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, deveriam ser investidos para colocar mais extensionistas atuando com o pequeno produtor. O interesse dos financiadores era, claro, ampliar, de forma rápida, a oferta de serviços de extensão, por meio da contratação de extensionistas vinculados a projetos com duração definidas: que iniciassem e terminassem.

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O projeto apoiado pelo CNPq


A ideia era tornar o serviço de extensão, público e gratuito, mais dinâmico com a entrada permanente de novos técnicos, com novas ideias, motivações e entusiasmados para estimular os produtores. Não importava aos financiadores se os temas tratados nos projetos tinham preocupação, por exemplo, com a qualidade ambiental da propriedade ou da produção. Ou, ainda, se eram voltados à conservação de recursos hídricos no meio rural ou se queriam aumentar a produção orgânica com a aplicação de técnicas de agroecologia e assim por diante. Importava contratar mais extensionistas e colocá-los ao lado do pequeno produtor. Uma primeira tentativa havia sido realizada dois anos antes em acordo firmado com o Fundo Nacional de Meio Ambiente – FNMA, importante mecanismo de financiamento, a fundo perdido, de projetos afetos à execução da Política Nacional de Meio Ambiente. Tendo como pano de fundo a gestão de recursos hídricos nas propriedades, o FNMA publicou edital de demanda induzida para seleção e contratação de projetos por pequenas prefeituras e organizações não governamentais, que, por sua vez, deveriam contratar os extensonistas e colocá-los ao lado do produtor, como era de interesse dos financiadores. Como o FNMA, desde 2003, passa por uma crise de identidade sem precedentes, da qual levará ainda muito tempo para se recuperar (crise oriunda da compreensão equivocada dos dirigentes de que o Fundo era balcão de projetos e não mecanismo de execução da política ambiental), o processo de seleção e contratação dos projetos, demorado e complexo, não agradou aos financiadores. Recorrer ao CNPq foi a segunda opção para ampliar o extensionismo do País. Apesar de empregar o mesmo expediente para a indução da demanda por projetos inseridos em uma temática previamente definida, como os editais, o sistema da pesquisa e inovação demonstrou ser bem mais eficiente que o da esfera ambiental. O FNMA demonstraria ser bem mais burocrático, mais caro e menos eficaz que o CNPq. Para firmar o acordo com o CNPq, os financiadores tiveram, é claro, que se submeter a algumas regras da tradição operacional da pesquisa. Projetos propostos e gerenciados somente por pesquisadores com grau de doutorado foi uma delas, e, talvez, a que deixou os financiadores mais apreensivos, uma vez que extensionistas não costumam ser titulados nesse nível.

Manejo florestal comunitário

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Outra preocupação dos financiadores, igualmente pertinente, era que os recursos a serem investidos nos projetos tivessem maior parcela destinada à pesquisa do que à extensão, o que comprometeria seu objetivo principal de aumentar o número de extensionistas ao lado do produtor. Já no CNPq, por seu turno, a preocupação resumia-se na possibilidade de se usar o sistema eficiente de sua plataforma Carlos Chagas, para a recepção e a seleção de projetos para outros fins que não a realização de pesquisas. Ocorre que o sistema de oferta de um leque extenso e diversificado de bolsas destina-se a tornar a realização de estudos e pesquisas, com recursos públicos, mais flexível do ponto de vista burocrático, o que é imprescindível para a pesquisa, e mais rápido para atender à demanda da sociedade. Nunca para resolver problema de contratação ou carência de funcionários de qualquer tipo. Receios à parte, a vinculação entre a realização da extensão e a inovação tecnológica, expressa no edital, com a oferta de bolsas de extensão, tipo EXP 1, e de iniciação tecnológica, tipo ITI A, demonstrou solucionar a maioria das preocupações de ambas as partes. No entanto, os resultados positivos obtidos com a experiência proporcionada pelo Edital 36, de 2007, não estão, obviamente, restritos a alguma parte específica do procedimento adotaod pelo CNPq, mas, no sistema como um todo. Desde a elaboração livre da proposta a partir de sugestão de roteiro, cadastro on line com arquivo anexado sem envio de qualquer documentação por correio ao CNPq, com o provimento de bolsas a partir de indicação do responsável pelo projeto e pagamento direto em conta do bolsista pelo sistema, e, por fim, o mais importante, com o gerenciamento dos recursos do projeto em conta-corrente vinculada e por meio de cheques assinados pelo pesquisador-coordenador do projeto, a plataforma Carlos Chagas desenvolvida pelo CNPq é de extrema valia. Há que se ressaltar também a promoção da livre concorrência observada na quantidade de propostas recebidas, da impessoalidade e transparência presentes no processo de análise e seleção dos projetos pelas câmaras de pesquisas e, ainda, o monitoramento e a prestação de contas, também on line, para a finalização das obrigações contratadas pelo pesquisador com doutorado e responsável pela execução do projeto.

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Ampliar o uso do sistema da plataforma Carlos Chagas, desenvolvido pelo CNPq, para outras esferas responsáveis pela execução de ações de Estado, parece ser um caminho para associar o amplo e crucial processo de inovação tecnológica e de realização e valorização de pesquisas para a operacionalização das políticas públicas coerentes com a demanda da sociedade.

INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS PROPOSTAS NO PROJETO Parece existir uma lacuna intransponível para os procedimentos e as inovações tecnológicas destinados a viabilizar a produção comercial de produtos florestais em ambiente natural. O manejo florestal, mesmo aquele destinado à produção de madeira, um produto de elevada importância comercial e que foi objeto de vários estudos nos últimos 50 anos, ainda encontra sérios gargalos a serem superados. Com relação ao cacau nativo não é diferente, pois o nível de investimento realizado no estudo da domesticação e dos cultivos é assustadoramente superior ao investimento na análise de suas relações, nicho ecológico, no interior do ecossistema florestal. Na medida em que ocorre uma mudança de atitude e de postura dos agentes econômicos inseridos no mercado do chocolate, fazendo com que voltem sua atenção para o cacau nativo de várzea, a lacuna em geração de pesquisas e tecnologias surge como um empecilho perigoso. A Amazônia possui o recurso florestal, no caso o cacau, com ampla ocorrência na várzea dos rios, em especial no Purus; possui uma população com habilidade para manejá-lo e, no entanto, não possui tecnologia de manejo florestal comunitário apropriada para manter níveis de produção permanentes e, assim, honrar contratos comerciais de fornecimento em uma escala aceita pelos contratantes. Algumas dessas lacunas tecnológicas, essa experiência contribuiu para sanar. O cacau poderá ser introduzido no sistema tecnológico do manejo florestal de uso múltiplo, uma tecnologia concebida e formulada especificamente para o ecossistema florestal da Amazônia, no decorrer da década de 1990, sobretudo no Acre. Para isso e de maneira concreta, o projeto trouxe inovações tecnológicas cruciais em quatro áreas do conhecimento, nas quais se assenta a ciência florestal na Amazônia, da seguinte forma:

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1.  Em sensoriamento remoto aplicado à floresta amazônica, ao conceber metodologia para mapear a dispersão do cacau nativo, com emprego de imagens de satélite de média resolução. Nos últimos anos, a tecnologia dos sistemas de sensoriamento remoto tem evoluído de maneira rápida. Se, na década de 1980, o uso da interpretação visual de imagens de satélite restringia-se a um pequeno grupo de centros de excelência localizados em universidades do centro e do sul do País, atualmente em todos os Estados da região amazônica existem unidades estruturadas de sensoriamento e geoprocessamento, podendo até ocorrer a existência de dois ou mais centros de processamento, como os que existem atualmente no Acre, por exemplo. A Engenharia Florestal, por sua vez, lançou mão das técnicas de mapeamento temático de povoamentos florestais, em especial para a realização de Inventários Florestais, há mais de 20 anos. Primeiro, com imagens de radar; depois, com fotografia aérea; e, por fim, com as, atualmente corriqueiras, imagens do satélite Landsat, os engenheiros florestais aprimoraram muito suas técnicas de quantificação de povoamentos florestais com a ferramenta de interpretação das imagens. Atualmente, o emprego de imagens de satélite, antes em preto e branco e agora coloridas, ou em falsa cor, segundo os técnicos da área, transformou-se em condição técnica para planejamento e locação de parcelas amostrais dos Inventários Florestais. Diversificaram-se os satélites, o que ampliou a precisão da área fotografada; ampliaram-se os usos, e estes chegaram às florestas nativas e, principalmente, ao complexo e heterogêneo ecossistema florestal da Amazônia. Nesse contexto, o esforço de inovação tecnológica vem sendo direcionado no sentido de possibilitar a realização dos cálculos biométricos de povoamentos florestais, somente pelas imagens de satélite, sem a necessidade de realização de extensos levantamentos amostrais, com medições de muitas árvores, o que encarece e dificulta sobremaneira a adoção do manejo florestal em larga escala. Sendo assim, o desenvolvimento de inovações tecnológicas para mapeamento por imagem de satélite da dispersão do cacaueiro nativo nas várzeas do Purus, como realizado neste projeto, significou um passo im-

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portante na prospecção florestal, de baixo custo, realizada por meio do sensoriamento remoto.

2.  Em biometria, ao conceber metodologia para Inventário Florestal com enfoque em uma única espécie nativa e nas espécies a ela associadas. As técnicas de amostragem para a realização de Inventário Florestal na Amazônia evoluíram, na década de 1980. Com os ensaios amostrais realizados na ZF2 pelo Instituto de Pesquisas da Amazônia – Inpa, e na Floresta Nacional do Tapajós pelo Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Úmido – Cpatu, da Embrapa do Pará, chegou-se a um consenso técnico acerca da forma das amostras, em conglomerados, e da intensidade amostral ideal para o ecossistema florestal na Amazônia, com a obtenção de informações seguras do ponto de vista estatístico. No entanto, o esforço para o desenvolvimento nas técnicas de Inventário Florestal foi direcionado, de maneira acertada, para oferecer soluções à indústria madeireira, cuja importância social e econômica na região justificou tal investimento. Todavia, conceber metodologia de amostragem e análise estatística para o Inventário Florestal, diferente do cálculo de volume de madeira de várias espécies com diâmetro superior ao requerido pela indústria, ainda é um desafio. A inovação tecnológica em Inventário Florestal trazida pelo projeto foi voltada para a concepção de metodologia apropriada de Inventário Florestal com foco em uma única espécie, no caso o cacaueiro, na produção de frutos, e não de madeira, e, por último, na identificação e quantificação das espécies que favorecem o microclima e fornecem sombreamento ao cacaueiro. Uma inovação tecnológica imprescindível para aprimoramento do manejo florestal de uso múltiplo.

3. Em manejo florestal, ao conceber protocolos de manejo florestal para ampliar a produtividade de uma espécie florestal, para a produção de frutos e com ocorrência na várzea dos rios amazônicos.

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Não há dúvidas acerca da viabilidade técnica do manejo florestal, na Amazônia, para a produção de madeira. No entanto, o manejo florestal para a produção de cascas, flores, frutos, resinas, látex, pigmentos, sementes, óleos e fitoterápicos, somente para citar alguns exemplos do potencial da biodiversidade, ainda carecem de definições cruciais. No caso específico do cacau, as instituições voltadas à promoção de sua produção, sobretudo a Ceplac, optaram por resolver os gargalos tecnológicos existentes na realização de cultivos, em especial aqueles relacionados com a ocorrência da praga vassoura-de-bruxa. Foi uma opção institucional acertada para a realidade produtiva existente na época do ciclo econômico do cacau e que se repetiu com o ciclo da borracha e assim por diante. A inovação tecnológica na área de manejo florestal, obtida nessa experiência, diz respeito ao desenvolvimento de procedimentos técnicos que possibilitam o manejo florestal comunitário do cacau nativo em seu local de ocorrência, ou seja, na própria várzea dos rios amazônicos. O escopo tecnológico foi bem definido, ou seja, os protocolos de manejo foram concebidos somente para o cacau nativo e aquele povoamento que ocorre na várzea, excluindo o de terra firme e, o mais importante, os cultivados. A definição clara do passo a passo que o produtor deverá assumir para o manejo comunitário do cacau foi a contribuição em inovação tecnológica, na área de manejo florestal, resultado do projeto.

4. Em logística, ao diagnosticar os detalhes da complexidade que envolve a produção de cacau no Purus e propor soluções para sua otimização. As sementes de cacau, para chegar ao porto alemão de Frankfurt com a qualidade requerida pelo comprador e depois de um processamento primário que envolve fermentação e secagem, passam por, no mínimo, três transbordos. Cada transbordo significa mudança no sistema de transporte e, o pior, subir e descer os barrancos do Purus. O primeiro transbordo ocorre quando os frutos coletados pelos manejadores são levados da colocação do produtor para o batelão, operação que envolve a descida do barranco da margem e deslocamento médio de 300 metros, em terreno lamacento, pois o

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rio está em vazante, até o batelão, sendo que toda a operação é realizada pelo próprio produtor com a carga de frutos nas costas. Os frutos subirão o barranco da mesma forma, novamente, ao chegar aos locais onde estão as usinas de fermentação e secagem natural das sementes. Caso a localização seja Boca do Acre, depois da secagem ocorrerá um transbordo para embarque na balsa que vai até o último transbordo no porto de Belém, no Pará; no entanto, caso estejam em alguma usina intermediária, as sementes, depois de ensacadas, ainda deverão ser levadas para o porto de Boca do Acre para armazenamento e espera da balsa para Belém. Isto é, um transbordo a mais deverá acontecer. Ocorre que o sistema de compra dos frutos pela Cooperar, por meio dos batelões que transportam os frutos até as usinas e depois as sementes secas até Boca do Acre, apresenta custos elevados e leva dias para se consumar. Por outro lado, essa logística foi aprovada durante as consecutivas safras, desde 2006. Alterar sua funcionalidade com propostas para a otimização do tempo e a ergonometria envolvida foi o que propôs o projeto. Melhorar a logística para produzir o extenso leque de opções presentes na diversidade biológica do ecossistema florestal da Amazônia, como se verá mais adiante, configura-se em um dos desafios mais emergenciais e ao mesmo tempo mais complexos, para a viabilidade do manejo florestal de uso múltiplo na região.

O PRINCIPAL DESAFIO DE CHEGAR A 40 TONELADAS DE PRODUÇÃO DE SEMENTES DE CACAU COM A QUALIDADE REQUERIDA É possível que a decisão mais importante assumida pela equipe de pesquisadores e bolsistas envolvidos na execução do projeto tenha sido a de amarrar ou fixar com clareza um objetivo a ser alcançado, para que todas as ações planejadas na sua execução não perdessem o foco. O “nosso negócio”, como gostam de afirmar os administradores, era fazer com que a quantidade de sementes de cacau nativo produzida pelos associados da Cooperar fosse ampliada, por meio do manejo dos povoamentos de cacau que ocorrem naturalmente na floresta. A ideia principal era obter mais sementes sem cultivar e com introdução mínima de novas áreas de manejo, ou novos associados

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para a Cooperar, tendo em vista a consequente ampliação dos custos de logística. Produzir mais, no mesmo trecho de rio e com os mesmos manejadores. A fixação de um número ou uma meta a ser perseguida, no caso 40 toneladas de sementes, além de didático e exemplar, demonstrou ser oportuno para determinar o tamanho do desafio e estimular a equipe a usar sua criatividade. As 40 toneladas surgiram como uma expectativa aventada pela empresa compradora, que, na realidade, compraria uma produção maior do que essa. Todavia, para a superação da média de nove toneladas anuais, conseguidas nas três safras anteriores, a meta de 40 toneladas, por ser ao mesmo tempo possível e desafiadora, incentivou os produtores e os outros envolvidos a tentar alcançá-la. A partir daí, depois de tomadas as decisões mais importantes para enquadramento do projeto no alcance das 40 toneladas de produção de sementes, desde os estudos considerados fundamentais para subsidiar a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus até a concepção dos protocolos de manejo, procurou-se tanto identificar gargalos de produtividade quanto usar a criatividade para superá-los. Para se ter uma ideia de como a fixação de uma meta clara para o projeto contribuiu para a motivação dos envolvidos e para encontrar as inovações tecnológicas requeridas, com relação a encontrar os gargalos, logo na primeira expedição a equipe conjecturou que o principal entrave à renovação do povoamento e à melhoria da produtividade poderia estar na agressividade da reprodução assexuada do cacau, com o lançamento dos chupões. Com o desenrolar dos estudos e de maneira paulatina, essa primeira e importante constatação foi cada vez mais sendo comprovada e corroborada pelo processamento e análise dos dados primários coletados nos levantamentos, o que contribuiu para afirmar algumas principais diretrizes de manejo a serem assumidas para o cacau nativo. Isto é, sem embargo de outras orientações relacionadas à melhoria do processo produtivo do cacau nativo, os protocolos de manejo, que, por sua vez, se configuram na essência do Plano de Manejo Florestal Comunitário, assumidos no projeto, deveriam compreender a execução de um mínimo de tratos silviculturais distribuídos em três diretrizes de manejo consideradas prioritárias e melhor detalhadas na segunda parte deste livro, quais sejam:

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Diretriz I de Manejo: •  Privilegiar o alargamento da base genética do povoamento do cacau nativo Por meio da promoção da reprodução sexuada por sementes e inibição da reprodução assexuada por chupões.

Diretriz II de Manejo: •  Promover a formação de povoamentos de cacau nativo a partir do cacau de touceira Por meio da promoção do cacau de touceira e inibição, com abate, de todo cacau solteiro presente no povoamento de cacau nativo.

Diretriz III de Manejo: •  Condicionar a ocorrência das seis espécies associadas ao nicho ecológico do povoamento do cacau nativo Por meio do estabelecimento de estratégias de manejo para as seis espécies associadas ao cacau nativo de maneira a promover a entrada de luz e aumento da produtividade total do povoamento.

LEVANTAMENTOS SUBSIDIÁRIOS AO PLANO DE MANEJO Durante a elaboração do projeto submetido ao CNPq, que teve a participação direta e fundamental de professores da Ufac, da representação da GIZ no Acre e de dirigentes da Cooperar, a demanda pela definição de protocolos de manejo para o cacau nativo e pela consequente elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário, além de evidente, deveria aparecer em todos os possíveis processos de inovação tecnológica e de extensão, que surgiriam na concepção do projeto. De antemão, acertou-se que a realização de três estudos básicos seriam imprescindíveis: a) Mapeamento da dispersão dos povoamentos de cacau nativo por meio de imagens de satélite Landsat de média resolução; b) Inventário florestal do cacau nativo e das espécies a ele associadas; e c) Socioeconomia do cotidiano dos ribeirirnhos vinculados à produção de cacau nativo.

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Com a realização da primeira expedição, outros quatro estudos demonstraram ser necessários ou por demanda gerencial da Cooperar ou devido às demandas técnicas para a definição dos protocolos de manejo; são estes: a) Logística do processo produtivo das sementes de cacau; b) Estudo de genética de populações do cacau nativo; c) Levantamento de solos no interior do povoamento de cacau; e d) Composição química da semente de cacau com prioridade para a detecção da taxa de cádmio. Devido aos custos inerentes à realização de estudos de pedologia e de química, os relacionados aos solos e ao teor de cádmio teriam que ser objeto de projetos específicos posteriores, o que deverá ser realizado no futuro. Todavia, depois da segunda expedição, surgiu a demanda por outros dois estudos, ambos realizados, quais sejam: a) Teste de matrizes de cacau nativo, previamente selecionadas, em ambiente de terra firme; e b) Análise de conteúdo nutricional de cinco óleos florestais que poderiam compor o portfólio de produtos vendidos pela Cooperar. Concluindo os estudos, depois da terceira expedição restou a demanda pelo teste dos protocolos de manejo com cinco produtores considerados de excelência pela gerência da Cooperar. Como será fácil observar no detalhamento de cada estudo, mais adiante, todos eles contribuíram para que a equipe envolvida pudesse tomar as decisões mais importantes para o alcance das 40 toneladas de produção de sementes de cacau. Desde os estudos considerados fundamentais para subsidiar a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus até a concepção dos protocolos de manejo, procurou-se tanto identificar gargalos de produtividade quanto usar a criatividade para superá-los.

PRODUÇÃO ACADÊMICA ASSOCIADA AO PROJETO Muito embora realizar os levantamentos e elaborar seus relatórios conclusivos atendessem a dois objetivos particulares, que eram: a) Ajudar a Cooperar a gerenciar a produção de cacau, trazendo melhoria em sua eficiência, razão para a realização do projeto; e b) Subsidiar a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo, principal documento de gerenciamento da produção, não contribuía para internalizar o tema do cacau nativo no universo acadêmico.

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Na condição de segunda prioridade, porém não menos importante, a experiência, única, diga-se, obtida com a execução do projeto e de cada um dos levantamentos, deveria impregnar a academia, para que o tema do manejo florestal do cacau nativo ganhasse a importância que lhe deveria ser dada, mas não era. Para que a dimensão econômica que a produção de cacau representa ao elevado contingente de famílias de ribeirinhos localizadas em toda a mata ciliar do extenso trecho percorrido pelo Purus se transformasse em prioridade de pesquisa e pudesse ser incluída nas revisões anuais do Plano Estadual de Ciência e Tecnologia, na Agenda de Convergência em C & T e demais instrumentos de planejamento para pesquisa, o primeiro e significativo passo seria a transformação de relatórios de pesquisas em produtos acadêmicos, algo nem sempre simples de se conseguir. No geral, todos os estudos previstos e executados no âmbito do projeto deveriam ser transformados em monografias de conclusão do curso de Engenharia Florestal vinculado à Ufac, em dissertações de mestrado da pósgraduação da Universidade de Freiburg, na Alemanha, artigos na forma de papers a serem publicados em periódicos especializados ou ainda, em artigos de jornais de circulação diária. A Tabela 6 apresenta de maneira consolidada o resultado auferido pelo projeto.

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Monografia1

Dissertação 2

Artigo Científico

Artigo de jornais

Mapeamento por satélite Landsat

1

2

Inventário Florestal

1

2

Socioeconomia dos manejadores

2

2

Intensidade amostral – Inventário

1

Reprodução de cacau

1

Fauna dispersora do cacau

1

Estudo de logística da produção

1

2

Genética de populações

1

2

Teste de matrizes, em terra firme

1

2

Teste de protocolos de manejo

1

2

Estudos concluídos

1Engenharia Florestal da Ufac; 2Universidade de Freiburg

Tabela 6: Produtos acadêmicos oriundos dos levantamentos realizados no Projeto de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus

Como se pode observar, o único estudo que ainda não se constituiu em objeto de produto acadêmico foi o de química dos óleos florestais, tendo em vista a dificuldade encontrada pelos alunos para trabalhos na área de química, sobretudo os da Engenharia Florestal. A motivação para atuar com o tema do cacau nativo, por outro lado, é crescente. Atualmente, encontram-se em execução dois projetos de iniciação científica, chamados na academia de Pibic, e uma monografia, que tratam da industrialização do cacau e da socioeconomia de um novo trecho dos manejadores, respectivamente. É o tema do cacau nativo se transformando em demanda da academia, fruto indubitável da realização da experiência do Purus.

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ACORDOS INSTITUCIONAIS NECESSÁRIOS À OPERACIONALIZAÇÃO DO PROJETO A execução do projeto, que já foi demonstrada anteriormente, exigiu uma concentração institucional que reuniu um amplo e diversificado conjunto. As características institucionais e o papel das principais envolvidas, bem como sua motivação para participar do projeto, são apresentadas a seguir.

Unesp A Universidade Estadual de São Paulo – Unesp, por meio do campus de Ilha Solteira e do Departamento de Engenharia Civil, envolveu-se desde a concepção do projeto, motivada, em especial, pelo estudo do complexo sistema de transporte fluvial usado no processo de produção das sementes de cacau até sua chegada ao destino, o porto de Frankfurt, na Alemanha. O curso de Engenharia Civil de Ilha Solteira foi o primeiro a ser criado na Unesp, concomitantemente com a formação dessa Universidade, em 1976. O Departamento de Engenharia Civil também abrigou o primeiro Programa de PósGraduação “strictu sensu” em Engenharia Civil – PPGEC da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Este programa, em nível de mestrado, teve início no ano de 1999. O Departamento é constituído por um conjunto de prédios e instalações, perfazendo 2.600 m2 de área edificada. Os principais laboratórios, devidamente equipados, atendem às atividades de docência, pesquisa e extensão. São estes: • • • • • • • • • •

Laboratório de Construção Civil Laboratório de Estruturas Laboratório de Geotecnia Laboratório de Topografia Laboratório de Estradas Laboratório de Hidráulica Laboratório de Hidrologia e Hidrometria Laboratório de Saneamento Oficina de Apoio Laboratório de Instrumentação

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O curso de graduação em Engenharia Civil distingue-se por sua criteriosa formação teórica e prática. Uma formação generalista que abrange as diversas áreas da engenharia civil, visando à flexibilidade e à capacidade de adaptação no exercício da profissão. Sendo assim, o currículo possui disciplinas obrigatórias, distribuídas em cinco principais áreas do conhecimento: Estruturas, Geotecnia, Hidráulica e Saneamento, Estradas e Transportes e Construção Civil. As pesquisas são desenvolvidas por meio de financiamento das agências de fomento. Nesse contexto, destacam-se vários projetos em parcerias com instituições públicas e privadas localizadas na região norte, como no Acre, Amazonas e Pará. As principais linhas de pesquisas são: • • • • • • • • • • • • • •

Análise experimental de estruturas Análise numérica de estruturas Desenvolvimento de sistemas construtivos Hidráulica fundamental e aplicada Recursos hídricos Fundações Instrumentação Infraestrutura de transportes Mapeamento geotécnico Mecânica dos solos e geossintéticos Planejamento de transportes Saneamento básico Topografia, fotogrametria e geodésia Segurança de obras de infraestrutura

O estudo de logística para a produção de sementes de cacau nativo realizado pela engenharia civil da Unesp enfocou três objetivos principais: a) diagnóstico do sistema atual de transporte, da floresta até o embarque para exportação; b) desenvolvimento de alternativas para fermentação e secagem; e c) propostas de otimização da logística atual. Para tanto, a parceria envolveu a liberação de um professor com doutorado na área de transporte, que participou das expedições e elaborou o relatório final do estudo, cujo resumo é apresentado a seguir.

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HACHEZ Desde a fundação da fábrica pelo belga Joseph Emile Hachez, em 1890, as receitas originais de chocolate ainda são usadas na produção. A maioria dos produtos, até hoje, é produzida de forma artesanal e manual, sendo que a produção automática é empregada somente para alguns itens de produção. Os 425 funcionários da empresa, incluindo mestres com grande experiência, e 25 aprendizes são motivados com a produção, um fato raro em grandes corporações. A empresa considera que existem duas principais razões para essa motivação. A primeira é que a Hachez produz, exclusivamente, na cidade do Bremen, ao norte da Alemanha, mesmo local de sua fundação, onde todo o processo para torrar o cacau, até a embalagem do produto final, é realizado. A segunda é que se trata de uma empresa gerenciada há 15 anos pelos proprietários: Hasso G. Nauck (possui 60% das ações da empresa) e Wolf Kropp-Büttner (possui 40% das ações). Os chocolates da Hachez são comercializados somente nas Chocolaterias consideradas de alto nível e não em supermercados comuns. A empresa procura manter contato direto com cada revendedor, no intuito de garantir a qualidade do chocolate. O cacau usado pela empresa é, em sua maioria, adquirido no Equador, Venezuela, Brasil, Colômbia e Ghana e outras regiões com plantações de cacau nobre.

GIZ A Cooperação Técnica Alemã, da sigla em alemão GTZ, é uma empresa pública de direito privado, com atuação em todo o mundo, em especial nos países classificados como em desenvolvimento. Foi criada, em 1974, com o objetivo de gerenciar um elevado número de projetos de cooperação técnica em execução mundo afora. Trabalha contribuindo para o desenvolvimento sustentável por meio da cooperação internacional para melhorar as condições de vida da população. Presta serviços para os seguintes órgãos alemães: Ministério Federal da Cooperação Econômica e do Desenvolvimento, Ministério do Meio

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Ambiente, Proteção à Natureza e Segurança de Reatores Nucleares; e para outros clientes internacionais. No Brasil, trabalha em três temas prioritários: Proteção e Gestão Sustentável das Florestas Tropicais, Desenvolvimento Regional Integrado e Fontes Renováveis de Energia e Eficiência Energética. Participou do projeto de manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus, por meio do escritório de representação em Rio Branco, que teve papel fundamental no apoio técnico para a idealização, a elaboração e a execução do projeto, com envolvimento direto em todas as suas fases. Articulou e organizou o Seminário de Critérios e Indicadores de sustentabilidade para a produção de cacau nativo do Purus. Vem apoiando a Cooperar desde o início do acordo comercial com a Hachez. Como participante da primeira expedição do projeto, auxiliou na formulação dos estudos e de suas metodologias. Também elaborou e publicou material de divulgação sobre a experiência fornecida pelo projeto.

Instituto Alemão de Floresta Tropical O Regenwald-Institut é uma organização da sociedade civil que foi fundada, em 1997, para criar e implementar projetos interdisciplinares em parcerias com outras instituições voltadas à conservação e à manutenção das florestas tropicais. Foi o principal idealizador do projeto para a produção de cacau nativo do Purus e responsável pela articulação do acordo comercial entre a Cooperar e Hachez. Atualmente, monitora o acordo e mantém a comunicação entre os dois parceiros. O Instituto também planeja, organiza e implementa estudos ecológicos para garantir o uso sustentável de recursos naturais. No caso do cacau, o estudo é realizado por meio de parceria com a Universidade de Freiburg, na Alemanha, e a engenharia florestal da Ufac. A ideia principal dos estudos é sanar a lacuna existente na literatura sobre o cacau nativo e seu papel ecológico, nas várzeas da Amazônia.

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OPERACIONALIZAÇÃO DO PROJETO MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO DO CACAU NATIVO DA VÁRZEA DO PURUS Uma vez aprovado o projeto, sua operacionalização teve início com uma série de pequenas reuniões, em especial entre os professores da Ufac, a gerência da Cooperar e o escritório local da GIZ, mesmo antes da efetiva liberação de recursos pelo CNPq. O primeiro passo, antes do planejamento operacional do projeto, foi dado com o envolvimento da equipe de pesquisadores no Seminário de Indicadores de Sustentabilidade para a produção de cacau nativo e de outros produtos oriundos do modo de produção da agricultura familiar, realizado em Rio Branco, em janeiro de 2008. A participação foi considerada importante, para que os pesquisadores tivessem um primeiro contato com extensionistas experientes na produção de cacau e para que houvesse um consenso, no grupo, sobre o que cada pesquisador, a seu modo, já havia percebido: que sustentabilidade e manejo florestal comunitário consistiam em temas correlatos. Ou melhor, que somente com a aplicação de técnicas de manejo florestal comunitário se poderia garantir a sustentabilidade da produção de cacau nativo. Depois do o seminário, os coordenadores concentraram-se na formação da equipe do projeto. Havia chegado o momento da seleção e da inclusão, no sistema da Plataforma Carlos Chagas, gerenciada pelo CNPq, dos bolsistas de extensão florestal e de iniciação tecnológica. Um acordo prévio entre a Cooperar e a Ufac distribuiu as três bolsas previstas para extensionistas, de maneira a manter dois profissionais em tempo integral em Boca do Acre, no apoio às safras de cacau. Um terceiro extensionista ocupou-se da articulação institucional do projeto, permanecendo no escritório em Rio Branco, organizando as expedições. Os bolsistas de Iniciação foram selecionados dentre os alunos do curso de Engenharia Florestal da Ufac que estivessem no sétimo período em diante, com divulgação ampla na instituição, por meio do modelo de cartaz apresentado a seguir. Com o intuito de se obter o máximo possível de monografias sobre o cacau, tanto para preencher a lacuna de conhecimento existente quanto para trazer para o interior da academia a opção de pesquisa com o cacau nativo, os coordenadores

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estabeleceram a duração máxima de 12 meses, para os bolsistas com boa avaliação; e período inferior, para os que tivessem avaliação prejudicada. Como explícito no cartaz, fazia parte do compromisso do bolsista com o projeto a elaboração de documento de monografia, pré-requisito para conclusão do curso, na área de conhecimento de sua pesquisa no projeto. Dessa maneira, o primeiro grupo, de três bolsistas, renovados em janeiro do ano seguinte, deteve-se no estudo de logística, metodologia de inventário florestal e mapeamento por satélite.

Figura 2: Modelo de cartaz de seleção de bolsistas para o projeto de manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus, usado em 2009

Já o segundo grupo de bolsistas foi orientado para os estudos de socioeconomia, testes dos protocolos de manejo e finalização do inventário florestal. Ao final, ainda surgiu a possibilidade de se realizar outro estudo com um sétimo bolsista, desta feita com duração de 10 meses, no campo de genética de populações. Completada a equipe, era o momento de se realizar uma ampla reunião de planejamento operacional do projeto, como detalhado abaixo.

PLANEJAMENTO OPERACIONAL Todo o planejamento para a execução do projeto foi estruturado tendo como referência a realização de expedições e não no cronograma de cada levantamento em separado, o que costuma ser mais comum. Duas razões principais levaram a equipe a tomar essa decisão arriscada e inovadora. A primeira estava relacionada ao conjunto de atividades paralelas que

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a maioria dos envolvidos no projeto tinha que assumir em suas instituições de ensino. Tanto os pesquisadores quanto os alunos bolsistas precisavam organizar-se em função do período letivo, com poucos espaços livres durante as aulas. Por outro lado, os extensionistas podiam atuar com exclusividade nas ações do projeto. Conciliar o planejamento das expedições para ocorrer fora do período letivo demonstrou ser de extrema valia para se chegar aos objetivos propostos. Já a segunda razão buscou melhor eficiência na operacionalidade do projeto. Isto é, com a reunião de toda a equipe em expedições, os custos operacionais foram reduzidos sobremaneira, em especial, os custos fixos. Afinal, para colocar um pesquisador em uma unidade de produção nas margens do Purus, como na localidade denominada Santo Elias, que concentrou vários estudos, gasta-se o mesmo orçamento empregado para colocar cinco pesquisadores, equivalente a uma lotação da voadeira, que consumiria em torno de R$ 1.200,00 em combustíveis para chegar lá com um ou cinco pesquisadores. Um total de quatro expedições foi suficiente para executar o projeto e realizar todos os estudos, com a complementação de uma ou outra viagem isolada para obter algum tipo de informação adicional. Cada expedição era precedida de reuniões de planejamento com a equipe, elaboração de documentação de orientação do planejamento e levantamento do orçamento necessário. A partir da primeira expedição e tendo em vista que o ordenamento de despesas via cheque direto ao fornecedor era o ideal, passou a ser elaborado um plano de aplicação dos recursos para orientar a aplicação financeira. Mas, a organização do projeto, de acordo com as quatro expedições, também trouxe ganhos inesperados. Além de conciliar a agenda dos pesquisadores e de reduzir os custos de deslocamentos, a realização das expedições contribuiu para o estabelecimento de um efeito de sinergia fundamental para superar os diversos tipos de entraves que a realidade do Purus trouxe para as costumeiras amarras metodológicas dos levantamentos. A possibilidade de outros pesquisadores presenciarem e ajudarem a discutir as soluções, para que cada estudo desse a resposta esperada foi, talvez, uma das melhores surpresas trazidas pelas expedições. A isso se denominou de efeito sinérgico de equipe.

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PRIMEIRA EXPEDIÇÃO Um desafio surpreendente e gratificante envolveu a realização da primeira expedição ao Purus. Ao associar o reconhecimento da realidade com as decisões para o detalhamento dos estudos a serem realizados, a expedição trouxe para a equipe a experiência que faltava para a grande maioria. Durante 40 dias, a equipe foi bombardeada por uma avalanche de informações, fazendo com que os pesquisadores adquirissem, de forma rápida, a experiência requerida para a empreitada, em especial para o domínio da realidade produtiva na qual a safra do cacau se realizava, uma realidade, diga-se, inusitada; e para estabeleecer as três hipóteses para a ocorrência de povoamentos de cacau, o que embasaria a realização dos demais levantamentos. Para se ter uma ideia da importância dessa primeira expedição, no Anexo 1 é apresentada uma síntese do seu relatório.

OS TEMPOS DO CACAU NATIVO DO PURUS Talvez esteja nas características produtivas do cacau nativo do Purus a melhor explicação para que o produto não obtivesse do extrativista, dos extensionistas, dos técnicos e de autoridades públicas a atenção que lhe deveria ser dada. Ocorre que o cacau é uma espécie que exige disciplina produtiva para chegar ao mercado consumidor. Da coleta do fruto no pé de cacau em seu povoamento no interior da floresta até a semente seca embalada para exportação, no porto de Belém, o processo produtivo é regido por espaços de tempo que fornecem pouca flexibilidade, como se verá a seguir. Um fato complicador que interfere sobremaneira nas características restritivas para a produção de cacau nativo no Purus refere-se às condições climáticas na qual a safra de cacau se realiza, no período de janeiro a junho. Trata-se da pior época e do pior local: vazante e beira do rio.

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Figura 3: Área de influência do projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq – 2008

Acontece que, nesse período, a condição de isolamento das comunidades na Amazônia chega ao seu limite. O solo não está seco o suficiente para o escoamento terrestre da produção, ao mesmo tempo que também não há água suficiente para uma boa navegação. Pior ainda, a cada dia o rio vaza mais um pouco, o que significa adicionar alguns metros ao trecho de transbordo do cacau, realizado sobre um terreno com lama até a cintura e sob o ataque constante de piuns. A associação de disciplina rígida com condições adversas ao processo produtivo exige que a atividade tenha mais atratividade, para compensar os desânimos diários aos quais se submete o produtor.

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DA COLETA À QUEBRA PARA FERMENTAÇÃO Uma vez coletado no pé do cacau, atividade que requer destreza do coletor, vez que o fruto deve ser colhido na árvore, evitando que caia ao solo, o cacau passa pelo primeiro carregamento, cujo transporte vai do povoamento no interior da floresta até a casa do manejador, onde encontra-se o porto. Além de, durante todo o trajeto, o produtor trafegar por igapós e muita lama, o único jeito de carregar o fruto colhido é nas costas, com auxílio de um paineiro confeccionado de palha, mas suficientemente resistente para o carregamento. Em média, o produtor, durante a safra e nos dias em que se dedicará à colheita do cacau nativo, faz 20 viagens, conseguindo coletar em torno de 1.000 frutos por dia. A aritmética para decifrar os dias que se planejam para colheita, transporte e espera do batelão da Cooperar que irá comprar sua produção, está intrinsecamente vinculada ao tempo que o cacau pode esperar para ser levado à fermentação depois da colheita: cinco dias.

Figura 4: Cacau nativo no interior de povoamento no Purus pronto para ser coletado na safra. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq – 2008

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DA FERMENTAÇÃO À SECAGEM Uma vez quebrada a semente de cacau, bem como sua polpa, ambas devem ser levadas à fermentação. Caso o processo de fermentação ocorra no próprio batelão, para cumprir o prazo de cinco dias, as sementes são depositadas em caixas de PVC de 500 litros e transportadas até o leito do rio, onde estará atracado o batelão. O processo de fermentação é demorado e trabalhoso. Normalmente, a fermentação acontece na usina de beneficiamento, que inclui fermentação e secagem em fluxo contínuo de processamento, o que é mais indicado. Mas, a fermentação também pode ocorrer no próprio batelão, em situações em que o tempo depois da coleta pode expirar. A fermentação dura, no máximo, sete dias e é realizada em caixas confeccionadas em madeira, sobretudo com mulateiro, uma das seis espécies associadas aos povoamentos do cacau nativo.

Figura 5: Transporte de frutos para fermentação, em Boca do Acre. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq – 2008

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Depois de acondicionadas nas caixas, as sementes e sua polpa são cobertas com folhas de palmeiras, para evitar moscas e para contribuir para aumentar a temperatura da fermentação. Em intervalos periódicos de tempo, ou diariamente, as sementes precisam ser reviradas, para aumentar a oxigenação e acelerar a fermentação, que é aeróbica. Revirar a caixa de mulateiro cheia de sementes de cacau não é uma tarefa simples, o que torna a fermentação uma das fases mais complexas do processamento da semente de cacau, e, o mais importante, que mais influencia na qualidade final do produto. Uma boa fermentação fornece as duas principais características para a classificação das sementes de cacau: sabor e aroma. A temperatura da fermentação é acompanhada durante os sere dias de fermentação. Uma queda brusca nessa temperatura significa que as bactérias aeróbicas terminaram seu trabalho e o prazo de fermentação está encerrado.

Figura 6: Caixas de fermentação de sementes de cacau. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq – 2008

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Realizar a fermentação em fluxo contínuo, com a colocação das caixas de fermentação em sequência, para que a oxigenação ocorra de uma caixa para outra, até a sétima caixa que finalizaria a fermentação passando à secagem, o que seria o ideal, ainda não foi conseguido, pois o processo de fermentação não ocorre de maneira linear em cada lote de sementes. O estudo de logística analisa a otimização do processo de fermentação. Onde deve se processar a fermentação? No próprio batelão, o que reduziria a ociosidade do tempo de navegação entre a unidade de coleta do produtor até a estufa de secagem; na própria unidade de produção, o que agregaria valor da produção para o próprio produtor, o que é considerado interessante por todos; ou junto à estufa de secagem, como ocorre atualmente? A Cooperar, com a experiência de três safras, optou pela fermentação junto às estufas, e uma ou outra excessão, no próprio batelão, quando os frutos correm o risco de estragar depois dos cinco dias de coleta. Já o estudo de logística, como se verá adiante, considera que as três possibilidades devem ocorrer, desde que planejadas para isso. O problema estaria na decisão tomada à revelia e não na alternativa adotada. Isto é, a fermentação ocorrerá no batelão, desde que este seja especificamente preparado para tal, não transporte frutos nem pessoas e compre a produção em locais distantes, no mínimo, mais de cinco dias de navegação, da estufa mais próxima e previamente definidos. Da mesma forma que a fermentação não poderia ocorrer de maneira generalizada em todas as unidades de produção, agregando valor para o manejador de cacau nativo, o que, novamente, todos almejam e acham ótimo, por três motivos intrinsecamente relacionados: 1. A maioria dos produtores possui uma rotina pesada de trabalho diário, na qual não há tempo que sobra, a não ser quando dispõe de reserva de trabalho, ou se preferir, de mão de obra feminina, infantil ou adolescente, como aferiu o levantamento de socioeconomia. Incluir novas atividades na cheia agenda de trabalho do produtor requer avaliar o custo de oportunidade dessa nova atividade, uma vez que alguma outra que lhe fornece algum rendimento poderá ser abandonada, o que remete ao segundo motivo.

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2. A agregação de valor à produção de sementes de cacau fermentada não é, no momento, diretamente proporcional ao trabalho despendido na fermentação. Mesmo com a Cooperar fornecendo todas as caixas de fermentação e os aeradores, mesmo não havendo custos associados aos investimentos na fermentação para o produtor, mesmo estando a Cooperar sensível a, até, sobrevalorizar o trabalho do produtor, ainda assim o custo de oportunidade limitaria o abandono de outra atividade. Ou seja, vale somente para o caso de existir trabalho ocioso na unidade de produção, um trabalho, é claro, menos qualificado que aquele realizado pelo próprio produtor, o que remete ao terceiro motivo. 3. Sendo a fermentação uma etapa-chave no processo de produção de semente de cacau com a qualidade requerida pela empresa compradora, a fim de produzir um chocolate com mercado diferenciado, o trabalho de fermentação exige destreza, limpeza e, o mais grave, muita disciplina. Usar o termomêtro para controlar a temperatura da massa de fermentação de forma permanente, para que o tempo não ultrapasse o limite dos sete dias, e aerar a massa de fermentação, são tarefas de rotina, mas que devem ser executadas com atenção redobrada. Como todo o processo de beneficiamento da semente de cacau não é industrializado, com as operações realizadas de maneira artesanal, com certo grau de rusticidade e em ambiente pouco propício ao beneficiamento, não se pode correr mais riscos que os existentes, para não comprometer a, elogiada, diga-se, qualidade do produto vendido pela Cooperar. No entanto, sempre de maneira intencional e planejada, o produtor que atender aos critérios que minimizem os riscos de comprometimento da qualidade tenha interesse em fermentar e queira receber mais pelo beneficiamento do cacau, poderá realizar a fermentação na sua própria unidade de produção. Enfim, o estudo de logística é enfático ao afirmar que seria interessante para a Cooperar atuar com a fermentação na usina, na propriedade e no batelão, frisa-se: com planejamento, uma vez que a opção mais adotada poderia variar em cada safra. Se, atualmente, 90% da fermentação é realizada nas usinas de secagem e nenhum produtor comercializa sua produção fermentada, essa participação relativa pode ser alterada na safra seguinte. | 80 |

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A melhor alternativa de fermentação, aquela que é, ao mesmo tempo, melhor para a Cooperar, para a qualidade do chocolate e, o mais importante, para o produtor, é a que ocorrer na maioria dos casos, no decorrer de sucessivas safras.

DA SECAGEM AO ENSACAMENTO Com a conclusão da fermentação, as sementes são levadas à secagem que, para durar o máximo de 40 dias, é realizada em estufas, especialmente construídas de maneira a garantir um fluxo contínuo de secagem. As estufas são, em sua maioria, de formato acentuadamente retangular, com largura estreita, de uns cinco metros, e muito compridas, com mais de 20 metros. São fechadas na lateral e cobertas com plástico transparente para, ao mesmo tempo, permitir entrada de luz solar e impedir a entrada de chuva. O ambiente no interiror da estufa é muito aquecido, o que torna o trabalho com as sementes exaustivo. O fluxo contínuo de secagem ocorre da seguinte forma: 1. Cada lote de sementes é espalhado em uma camada, não devendo ficar nenhuma semente encoberta por outras sementes. 2. Depois de um período previamente estabelecido, de dez dias por exemplo, um novo lote entrará na estufa, no lugar de um lote que chegou ao final dos 40 dias de secagem. 3. O espaço ocupado pelo lote seco será ocupado pelo anterior e, assim, sucessivamente, até que o espaço do primeiro lote esteja liberado para o novo. O ciclo se repete sempre com intervalo máximo de 40 dias. A secagem exige a presença, quase constante, de um operador dentro da estufa. Sua função principal será a reviragem das sementes em cada lote e a movimentação dos lotes até o final da estufa. A estufa é construída em madeira, com preferência pela espécie mulateiro, sobre barrotes, o mais afastada do solo possível, em torno de dois metros. Normalmente, a área sob o piso da estufa é usada para acondicionar as caixas de fermentação.

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O acesso à estufa para levar um novo lote de semente fermentada e pronta para secagem é realizado por escada, uma tarefa agravada pelo peso da caixa de madeira maciça.

Figura 7: Estufa de secagem de sementes de cacau. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq-Ufac – 2008

DO ENSACAMENTO AO EMBARQUE Uma vez seca, depois de um máximo de 40 dias na estufa, a semente está pronta para ser ensacada e embarcada. Toda a produção é colocada em sacos de lona ou de juta, no padrão requerido para exportação. Completada a carga, toda a safra é carregada em balsa, que levará não menos que 60 dias, época de vazante, para chegar ao porto de Belém, onde será embarcada em navios da marinha mercante até o porto final, na Alemanha. As operações aduaneiras para embarque do cacau exigem esforço administrativo elevado da Cooperar. Além de Boca do Acre, onde são realizadas as operações de embarque e fretamento da balsa, não possuir estrutura pública apropriada, a burocrcia, sobretudo a fiscal, é excessiva e um tanto insensata.

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Por enquanto, produtos florestais, como é, por exemplo, o caso do cacau e da castanha-do-brasil, que possuem histórico de exportação, têm sido embarcados com atendimento às exigências aduaneiras. As regras relacionadas à produção e à exportação de sementes florestais, mesmo sem poder germinativo, elaboradas e instituídas no âmbito do Ministério da Agricultura, não são cobradas e espera-se que isso continue assim, para embarque do cacau ou da castanha. No entanto, o que ninguém deseja, mas, segundo a Lei de Murphy (se algo pode dar errado, dará errado da pior maneira, no pior momento e de modo a causar o maior estrago possível), um dia acontecerá, é que as regras atuais para licenciamento ambiental da produção de sementes florestais passem a incluir o cacau. Ocorre que, enquanto as regras aduaneiras possuem algo de insensato, as ambientais, ao contrário, parecem não possuir algo de sensato. Além de não diferenciarem as sementes vivas das mortas, a exigência principal recai sobre a necessidade de elaboração de um Plano de Manejo Florestal para Produtos Não Madeireiros com custos proibitivos para qualquer organização de origem comunitária.

DO EMBARQUE AO CHOCOLATE DA HACHEZ O chocolate oriundo do cacau nativo produzido no Purus, na safra de 2010, será consumido pelos alemães e em outros países somente a partir de 2011. O fato é que, além dos 60 dias para chegar a Belém, os navios com o cacau do Purus demoram não menos que 20 dias para chegar à Alemanha. O tempo do cacau no interior da floresta é de quase seis meses para colocar as sementes secas em Belém. No transporte oceânico, o cacau levará mais um mês. Mas, uma vez na indústria, o chocolate estará pronto para venda em uma semana.

TRÊS HIPÓTESES PARA EXPLICAR A DISPERSÃO DO CACAU NATIVO DO PURUS O cacau é uma espécie exigente, em termos de relacionamento com outras espécies florestais e de microclima. As seis espécies associadas ao cacau e as características da vazão do Purus favorecem a existência do microclima no qual o povoamento de cacau poderá se estabelecer ou não. Manejo florestal comunitário

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Identificar essas características foi o segundo resultado mais importante da primeira expedição e que serviu de referência para a definição da metodologia a ser aplicada em todos os levantamentos subsidiários para a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo, objetivo principal do projeto. Os pesquisadores, por meio da observação direta em vários povoamentos de cacau cobrindo uma extensa área localizada ao redor da comunidade chamada de Santo Elias, às margens do Purus e próximo à foz do Igarapé Mapiá, conseguiram captar algumas interferências naturais que funcionavam como condição para a ocorrência ou não de povoamentos de cacau nativo. Essas interferências foram agrupadas, no que se convencionou chamar de três hipóteses que orientam a dispersão do cacau, que somente quando ocorrem de maneira simultânea o microclima para o cacau será perfeito.

HIPÓTESE DA COTA 100 A cota altimétrica nas margens do Purus e no trecho compreendido pelo projeto, que vai de Boca do Acre até a cidade de Lábrea, varia de 90 a 110 metros, de acordo com as medições realizadas pela equipe envolvida na primeira expedição. Povoamentos de cacau apresentam maior densidade, ocorrendo com maior fartura de indivíduos e, consequentemente, maior produção na cota 100. Parece existir preferência da espécie por essa cota altimétrica, uma vez que a quantidade para essa cota de 7,8 pés de cacau por hectare vai reduzindo até a não ocorrência, tanto nas cotas superiores quanto nas inferiores. Não se trata do cacau existir e deixar de existir ao se alterar a cota para mais ou para menos de 100, mas sim, de uma redução paulatina da densidade sempre que se altera a cota. No entanto, a densidade ótima, como aferido pelo Inventário Florestal de quase oito indivíduos por hectare é a que apresenta uma produção que remunera adequadamente o trabalho do produtor.

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HIPÓTESE DO INTERFLÚVIO DO PURUS Além de apresentar maior densidade de indivíduos na cota altimétrica 100 (primeira hipótese), o povoamento de cacau exige um microclima com elevadas taxas de umidade e de umidade relativa. Áreas molhadas, não encharcadas, como ocorrem nas alagações, mas permanentemente com umidade elevada, favorecem a ocorrência do povoamento de cacau. Essas áreas, que anualmente são banhadas pelo Purus, são denominadas de interflúvio, e encontram-se na porção intermediária entre a margem do rio e a terra firme. Isto é, na classificação legal de mata ciliar, parece que uma grande parte dessas áreas, de interflúvio, estariam fora. Mais que a manutenção de uma taxa de umidade que ajuda o microclima para o povoamento do cacau, há que se conjecturar também que os interflúvios são áreas enriquecidas com os nutrientes carreados pelo rio todo o ano. São solos de boa fertilidade, o que contribui para justificar a preferência dos povoamentos de cacau.

HIPÓTESE DA TIPOLOGIA FLORESTAL Há indícios concretos de que em povoamentos densos de cacau, naquela quantidade de 7,8 indivíduos por hectare, a tipologia florestal, que pode ser de floresta densa ou aberta, não apresenta associação com palmeiras, quer sejam dominadas ou dominantes. Nas palavras dos produtores, mateiros e moradores em geral: onde tem cacau, não dá palmeira. As razões para esse tipo de alelopatia não foram objeto dos estudos, mas a comprovação de que onde o povoamento do cacau é denso não existe palmeira, sim. O mapeamento temático por imagem de satélite de média resolução comprovou que, sempre que ocorrerem as três hipóteses de maneira simultânea, haverá povoamento de cacau na densidade aferida pelo Inventário Florestal. Isso significa dizer que poderão ser encontrados indivíduos de cacau com baixa densidade e tendendo à não ocorrência, em cotas diferentes, em áreas que não são interflúvios e onde haja palmeira; no entanto, significa dizer também que, sempre que as três hipóteses ocorrerem de forma simultânea, haverá um povoamento denso de cacau.

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SEGUNDA EXPEDIÇÃO A segunda expedição priorizou a realização conjunta da parte campo dos três levantamentos prioritários: Inventário Florestal, Socioeconomia e Mapeamento da dispersão por satélite. Com a metodologia definida a partir da primeira expedição, os responsáveis pelos levantamentos, em especial os bolsistas de inciação tecnológica, em conjunto com os extensionistas, lançaram-se na árdua e complexa tarefa, dadas as condições adversas do terreno no Purus, de coletar dados primários. Com apoio de um batelão, a equipe percorreu todo o trecho do projeto, da foz do Rio Iaco, em Sena Madureira, até Pauíni, no Amazonas, fazendo as medições das árvores encontradas nas parcelas do inventário, entrevistando as famílias e georreferenciando a dispersão do cacau. A opção pelo aluguel do batelão, que funcionou como eficiente meio de transporte e de hospedagem para a equipe, demonstrou ter sido acertada, em especial no que se refere à redução de custos e ao aumento do rendimento do trabalho. Reuniões com toda a equipe eram constantemente realizadas, para checagem e aferição da metodologia e discussão dos muitos obstáculos que surgiam no decorrer dos levantamentos.

TERCEIRA EXPEDIÇÃO Com o mapeamento temático da dispersão do cacau e o estudo de logística concluídos, a terceira expedição foi a primeira a ser realizada com a equipe, podendo assumir e apresentar alguns resultados para discutir com a Cooperar. Como se pode notar, a expedição concluiu o Inventário Florestal e o Levantamento Socioeconomico, bem como instalou as unidades experimentais para teste dos protocolos de manejo. A seleção dos cinco produtores considerados especiais pela Cooperar, onde deveriam ser instalados os testes dos protocolos de manejo, apresentou certo grau de dificuldade, tendo em vista que os critérios relacionados à maior produtividade precisavam ser contrabalançados com os de dedicação e atenção para cuidar da área demarcada pelo experimento.

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Figura 8: Reunião para discussão de obstáculos na etapa de campo dos levantamentos. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq – 2008

A expedição, também de posse de dados preliminares do Inventário Florestal, iniciou a identificação e a análise da importância das seis espécies associadas ao cacau para sombreamento e para propiciar o microclima requerido, como se pode notar na figura acima.

QUARTA EXPEDIÇÃO Finalmente, a quarta e última expedição dedicou-se à complementação dos testes dos protocolos de manejo e à coleta do material para o estudo de genética de populações incluído no rol de estudos a partir da execução do projeto. Durante a expedição, também foi possível realizar reuniões com a Cooperar, no intuito de apresentar alguns resultados já disponíveis pelo projeto.

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Figura 9: Reprodução e espécies associadas ao cacau. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq – 2009

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SUBSÍDIOS PARA O PLANO DE MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO DO CACAU NATIVO DO PURUS Todos os levantamentos realizados para subsidiar a elaboração do Plano de Manejo Florestal comunitário do cacau nativo do Purus demonstraram ser de especial relevância. Decidir por sua execução, ainda durante a primeira expedição, exigiu longas avaliações, mas, como se poderá analisar a seguir, não houve qualquer tipo de excessos acadêmicos, ou seja, as informações produzidas, sem exceção, ajudaram a tomada de decisão para o manejo. Para melhor compreensão da importância de cada estudo e para não estender o livro em demasia, optou-se pela apresentação de uma versão resumida dos quatro estudos principais, contendo: apresentação, objetivos e resultados principais.

ESTUDO DE LOGÍSTICA Por meio de visita e observação direta do sistema de transporte empregado nas atividades de produção de sementes de cacau silvestre para a fabricação de chocolate, o estudo objetivou encontrar alternativas tecnológicas para agregar valor a essa cadeia produtiva. A rotina inclui a extração e a coleta dos frutos, o manejo das sementes e a exportação. E para cumprir essas atividades são realizados transportes terrestres em ambiente de floresta, transporte fluvial, transbordos, estocagem dos frutos e armazenamento das sementes desidratadas. Os frutos recolhidos na floresta seguem em embarcações até uma das três unidades de processamento administradas pela Cooperar. Essas unidades estão às margens do Rio Purus: em Boca do Acre, na comunidade Santo Elias e em Pauini. Nesses locais, os frutos são partidos, as sementes frescas são desidratadas, embaladas e exportadas. Muitos desafios, contudo, comprometem a eficiência e a eficácia do sistema produtivo. Melhorar e aumentar o volume de produção sugere interferir nas tarefas de coletar e transportar, armazenar e estocar frutos e sementes, nas instalações e infraestrutura e nas operações de transbordo das cargas.

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Outros fatores, como o clima, o regime fluvial dos rios, a qualidade da comunicação entre os agentes, o aproveitamento de recursos e de insumos locais, a oferta de energia e a manutenção dos equipamentos disponíveis, podem também influenciar. O ciclo das chuvas, por exemplo, interfere na dinâmica da coleta dos frutos, na preparação das sementes e na logística dos transportes.

Figura 10: Encontro das águas: Rio Acre e Purus, em Boca do Acre, Amazonas. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq, 2007

Objetivos Diagnosticar toda a logística envolvida no processo de produção do cacau nativo em suas três etapas: coleta, beneficiamento e transporte, constituiu o primeiro objetivo do estudo. A partir do diagnóstico, o estudo propõe melhorias para superar entraves de eficiência ao processo produtivo.

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Principais resultados Operações de Transbordo No primeiro transbordo, os frutos são contados, ensacados e carregados até as embarcações. A quantidade de frutos registrados é a unidade de referência para a remuneração dos produtores. Mas, a exploração cacaueira pode ser individual ou coletiva. E essa dinâmica de trabalho influi no protocolo e no tempo de parada da embarcação, uma vez que os registros e o pagamento são feitos com base no número de frutos de cada fornecedor. Na produção individual, as pilhas ficam separadas. Maiores deslocamentos e possibilidade de erros nas aferições e no cadastro dos dados são transtornos frequentes. Unificar toda a produção e estocá-la em um único local, por outro lado, simplifica a operação e reduz o tempo de parada e de viagem. Instalações apropriadas e protegidas, com capacidade suficiente, fácil acesso e boas condições de carga e descarga também são argumentos em favor da unificação dos estoques. Depois de contados e ensacados, os frutos são transferidos para as embarcações. A tripulação e os próprios produtores movimentam as cargas pelos barrancos. As distâncias (vertical e horizontal) até o ponto de embarque variam de poucos metros até algumas centenas de metros. Há rampas suaves e barrancos íngremes e instáveis. Cada ponto de embarque e desembarque ao longo dos rios Purus e Acre apresenta peculiaridades que tornam as tarefas de transbordo típicas. Algumas dificuldades são recorrentes, outras, porém, são pontuais. E todas elas dependem bastante das condições climáticas e do ciclo hidrológico dos rios. Durante as cheias (inverno), por exemplo, as águas dos rios e igarapés “sobem”, reduzindo as distâncias e os desníveis de transbordo. Muitos cursos d’água também se tornam navegáveis e facilitam acessos às colocações distantes das margens dos rios. No verão, por outro lado, o leito dos rios diminui, aumentando as distâncias e as dificuldades. Os desbarrancamentos, as areias moles e a lama tornam as calhas dos rios instáveis e irregulares. O complemento do transbordo acontece quando a produção é despejada no interior do batelão. No final do processo, a prancha é recolhida e é feita a desatracação. Então, o barco manobra para se afastar da margem e prosseguir viagem. Depois, os dados coletados anteriormente são repassados para um caderno de instruções e registros.

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Os pontos de embarque do cacau estão dispersos no curso dos rios. E em todos eles faltam instalações e equipamentos para facilitar as operações de aproximação das embarcações e de transbordo das cargas. O tempo de carregamento pode ser extenso ante as dificuldades de mobilidade, sobretudo pela presença de solos moles, instáveis e escorregadios. O volume de produção e as condições locais substanciam os argumentos que podem justificar investimentos em melhorias. Em todo caso, aumentar o volume da produção requer intervenções, sabendo-se que melhorar os serviços de embarque reduz o tempo de viagem, o consumo de energia e os custos operacionais. Além disso, aumenta a capacidade de tráfego, permite operar maiores volumes de cargas com mais agilidade e menos risco de acidentes. Há vários modelos de equipamentos e instalações com potencial de aplicação para facilitar a movimentação das cargas em condição tão adversas como aquelas presentes na Amazônia. A edificação de rampas, escadas, escorregadores de cargas e gôndolas transportadoras são algumas delas. Outras ações e procedimentos podem ser adotados e/ou ajustados isoladamente ou combinados, para facilitar as operações de transbordo, inclusive aproveitando experiências regionais e matrizes locais de energia. Algumas sugestões para ganho de eficiência: 1. padronizar as planilhas e uniformizar o cadastro das informações e dados; 2. adotar unidade de massa como registro e remuneração da produção; 3. construir unidades apropriadas de estocagem às margens dos rios. É importante observar que o tempo de vida útil do fruto extraído na floresta até o início do processamento (quando o cacau é quebrado) é de cinco dias. Depois desse prazo, as sementes perdem qualidade e são descartadas. Dessa forma, a sintonia entre o momento da colheita, a passagem da embarcação e o tempo de viagem até o local de beneficiamento é a garantia de manutenção da estabilidade na cadeia produtiva cacaueira.

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Proposta Para Instalações Portuárias A administração e o uso dos equipamentos e instalações portuárias podem ser de caráter comunitário ou cooperativo. O tamanho e a forma das instalações dependem do volume e da qualidade das cargas gerados, da capacidade de processamento, do tipo e da capacidade operacional dos veículos e do tempo de viagem. Combinar estruturas fixas e móveis é recomendável para os locais onde o nível das águas varia bastante, como nos rios Purus e Acre. As estruturas fixas incluem as escadas, as rampas e os suportes de atracação das embarcações. As estruturas móveis são os flutuantes, as plataformas de embarque e desembarque, as defensas (dispositivos para evitar choques da embarcação na estrutura) e os aparelhos de ancoragem. As descrições e as recomendações das instalações portuárias são apresentadas a seguir.

Figura 11: Perspectivas das instalações portuárias. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq-Ufac, 2010

Armazém Edificação com tamanho e forma adequados à produção, apoiada sobre estacas e com o assoalho suspenso, para evitar a ação direta da umidade do solo e de pequenos animais. Paredes divisórias internas podem ser construídas para abrigar diferentes tipos de produtos.

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Evitar locais sujeitos às alagações e desbarrancamentos e perto de árvores frutíferas ou de grande porte. Utilizar madeira dura e resistente (maçaranduba, itaúba, cumaru). Instalar teias na junção entre a cobertura e as paredes, para inibir a ação de aves, morcegos e outros animais.

Figura 12: Vista em planta do porto. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq-Ufac, 2010

A pequena oferta de energia, a carência de recursos humanos e tecnológicos e a dependência de agentes externos são fatores que colaboram para inibir projetos e instalações de auxílio à movimentação das cargas e, por analogia, o aumento da produção cacaueira. Dispositivos especiais adaptados e ajustados ao ambiente regional e o aproveitamento de matrizes energéticas locais (biomassa, correnteza dos rios, ventos e solar) são alternativas capazes de viabilizar tais empreendimentos.

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MAPEAMENTO TEMÁTICO DA DISPERSÃO DO CACAU NATIVO

Apresentação Para a verificação das regiões de ocorrência de cacau, foram realizadas duas etapas de interpretação de imagens de satélite, envolvendo as seguintes técnicas: trabalho em laboratório com digitalização das áreas de ocorrência de cacau de forma visual, utilizando imagens Landsat/TM5 bandas 3, 4 e 5 e relacionandoas com aspectos perceptíveis na imagem de acordo com padrões identificados, como: textura, padrão de cor e rugosidade da imagem. Posteriormente, trabalho de campo para reconhecimento de padrões e coleta de amostra das classes de cobertura do solo; em seguida, o trabalho de laboratório para processamento de dados e classificação supervisionada detalhados a seguir. Para separar os diferentes padrões das tipologias florestais nas imagens, foi utilizada a interpretação visual, em que foram sobrepostas as tipologias identificadas no Radambrasil (1976) sobre as imagens de satélite adquiridas para delimitação dos polígonos, como pode ser observado na Figura 13.

Figura 13 – Imagem do satélite LANDSAT, 2007, com as áreas de cacau digitalizadas após interpretação visual. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus, CNPq, 2009.

Os trabalhos de campo ocorreram seguindo um roteiro preestabelecido, durante a alocação das parcelas do Inventário Florestal. As incursões ocorreram em três etapas, entre os meses de março/abril, maio/junho e janeiro/fevereiro, totalizando 45 dias.

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A área do projeto foi delimitada com geração de um buffer de 3 km de cada margem do Rio Purus, devido às condições de coleta do cacau nativo na região não ultrapassarem essa distância.

Figura 14: Área do Projeto realizada, buffer de 3 km de cada margem do rio. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq, 2009

A partir de levantamentos de campo, foram coletadas amostras utilizadas no treinamento do classificador, as quais foram coletadas da seguinte forma: por pixel e por regiões. As amostras por regiões foram coletadas e digitalizadas em forma de polígonos sobre as feições de interesse na imagem, cada amostra de treinamento e representada por pixels com reflexão característica.

Objetivos Considerando a importância do mapeamento da cobertura vegetal, na Amazônia, o objetivo geral deste trabalho foi avaliar a classificação supervisionada por redes neurais e máxima verossimilhança das classes de cobertura e uso do solo da região de várzea do Médio Purus, para identificar regiões de ocorrência do cacaueiro nativo a partir dos dados obtidos pelo sensor TM do satélite Landsat 5 e de dados do meio físico, com vistas a subsidiar o plano de manejo florestal comunitário.

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Principais resultados Foram obtidas quatorze classificações supervisionadas que utilizaram um conjunto de dados e treinamento para os classificadores de máxima verossimilhança e redes neurais artificiais. O melhor desempenho de classificação para ambas as metodologias foi obtido com o uso da composição das bandas, cujo espectro seguiu a seguinte ordem: infravermelho de ondas curtas (MIR), com comprimento de onda 1,55 – 1,75; infravermelho próximo (NIR), com comprimento de onda 0,76 – 0,90; e o vermelho visível (VIS), com comprimento de onda 0,63 -0,69. Na classificação por Maxver, buscou-se testar valores entre 0 e 1, adotando um valor para controlar o parâmetro da classificação Probability Threshold. Entretanto, o classificador obteve melhores resultados com os parâmetros-padrões (default) do sistema computacional para a análise das imagens, que não adota valores para controle do desvio-padrão da amostragem selecionando a opção none. Para a classificação por redes neurais artificiais, os melhores resultados obtidos seguiram a contribuição do peso interno com nível de ativação de 0,9 para o ponto Training Threshold Contribution, e de 0,2 para a taxa de treinamento Training Rate, incorrendo em um processamento mais demorado, porém, com menor risco nas oscilações dos resultados. Depois do treinamento, foi realizada a classificação dos pixels e a geração da matriz de confusão. As avaliações das classificações foram feitas por meio de comparação entre as estatísticas geradas resultantes da matriz de confusão de cada algoritmo classificador. O conjunto de variáveis das amostras classificadas pelo algoritmo maxver obteve maior exatidão global na classificação quando comparado a redes neurais. O algoritmo maxver apresentou os melhores resultados de exatidão global para o mapeamento e menos confusão entre classes, mostrando ser o método mais satisfatório para a representação do mapa de cobertura e uso dos solos nas regiões de ocorrência do cacau nativo na várzea do Purus. Foram concluídas todas as etapas do processo de classificação para todas as imagens, utilizando a classificação que obtiveram melhores respostas em relação ao mapeamento. Depois da classificação, realizou-se a filtragem da imagem; no entanto, o resultado da filtragem não condizia com a realidade, mascarando algumas feições, visto que a metodologia visa à união com os

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pixels mais próximos. Logo essa alternativa utilizada pós-classificação foi rejeitada para o referido estudo. A Figura 14 representa o mapa de uso e a cobertura produzidos pela classificação da imagem 1 por maxver; percebe-se que o conflito esquematizado nos quadros é visualmente imperceptível.

Figura 15: Mapa de uso e cobertura produzidos pela classificação da imagem 1 por maxver; os detalhes 1 e 2 mostram pontos coletados em áreas de ocorrência de cacau; o 3 mostra detalhe de região de floresta; o detalhe 4 mostra os diferentes tipos de amostras. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq, 2009

INVENTÁRIO FLORESTAL

Apresentação Com emprego de amostragem sistemática e unidades amostrais do tipo conglomerado, a metodologia do inventário considerou que cada conglomerado (unidade primária) é formado por três unidades secundárias de 20 x 200 m (4.000 m2), equidistantes de 800 m entre si, de forma que a primeira unidade secundária se localizará a 200 m da cota máxima do Purus.

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A cada 40 km ao longo do Rio Purus, foram alocados dois conglomerados, sendo um na margem direita e outro na margem esquerda, em toda a área de abrangência do projeto, totalizando 26 conglomerados. Também foram levantadas as espécies associadas ao cacaueiro, com medição do diâmetro e altura. Foi estabelecida, no centro de cada unidade secundária, uma faixa de 20 m x 1 m, para a contagem da regeneração natural de cacaueiro.

Figura 16: Distância entre as parcelas sobre a área de estudo. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus – CNPq-Ufac, 2009

Objetivos Caracterizar a distribuição geográfica do cacau na várzea do médio Rio Purus por meio da obtenção de dados biométricos foi o principal objetivo deste estudo. Com a determinação dos índices de abundância, frequência e dominância foi possível quantificar os povoamentos de cacau nativo. Como objetivo paralelelo, todavia igualmente importante, o estudo também determinou as seis espécies de maior abundância que se associam ao cacau tanto para sombreamento quanto para formação do microclima.

Principais resultados Foram inventariados 573 indivíduos distribuídos em 24 famílias e 69 espécies botânicas; a diversidade de Shannon-Weaver (H’) e a equabilidade de Pielou (J) foram 3,503 e 0,824, respectivamente.

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As famílias que apresentaram maior riqueza de indivíduos foram Moraceae, com 44 (7,68%); Sapotaceae, com 48 (8,38%); Sterculiaceae, com 73 (12,74%); Lecythidaceae, com 63 (10,99%); e Clusiaceae, com 60 (10,47%). Juntas totalizaram 50,26% do total de indivíduos amostrados. As famílias Moraceae, Mimosaceae, Euphorbiaceae, Caesalpiniaceae, Arecaceae e Fabaceae foram as que apresentaram mais espécies, cinco no total, cada uma. Os resultados encontrados diferiram do trabalho realizado por Lima Filho (1981); na bacia do Rio Urucu, onde encontra-se com o Purus desaguando no Solimões, as famílias com maior riqueza foram Lecythidaceae, Sapotaceae, Chrysobalanaceae, Myristicaceae e Moraceae, onde, juntas, representaram 54,66% de todos os indivíduos amostrados. As espécies com maior densidade relativa foram Theobroma cacau (12,04%), Eschweilera odorata (10,65%), Pouteria sp. (6,46%) e Inga sp. (4,01%), Calycophyllum spruceanum (3,66%), Hevea brasiliensis (3,14%), Cecropia sp. (2,97%), Ficus sp. (2,27%), que equivalem a 45,2% dos indivíduos levantados. Sendo as espécies com o maior número de indivíduos Theobroma cacau, com 69; e Eschweilera odorata, com 61. Os resultados encontrados por Lima Filho (1981), corresponderam a 42,66% da amostra, concentrou-se em 30 indivíduos. Com maior frequência relativa apresentadas na área destacaram as espécies Pouteria sp. (5,78%), Eschweilera odorata (4,89%), Theobroma cacau (4,00%), Calycophyllum spruceanum (4,00%), Pseudolmedia laevis (3,11%). Em relação à dominância relativa, as principais espécies foram Ficus sp. (12,93%), Calycophyllum spruceanum (6,70%), Pseudolmedia laevis (5,83%), Hura crepitans (5,38%), Manikara surinamensis (4,23%), Cecropia sp. (4,10%), Inga sp. (4,00%). São espécies que, no geral, não apresentaram grande distribuição, mas os poucos indivíduos amostrados correspondem a um grande incremento volumétrico, com média de 140 cm de diâmetro. As 30 espécies com maior dominância representaram 50,46% (LIMA FILHO, 1981). As espécies que merecem ser destacadas com maior valor de importância são Eschweilera odorata (20,90%), Pouteria sp. (19,97%), Theobroma cacau (18,02%), Ficus sp. (17,87) e Calycophyllum spruceanum (14,37%). As espécies que demonstraram maior área basal e dominância absoluta, como se pode observar, foram Ficus sp., Pouteria sp., Calycophyllum spruceanum, Pseudomeldia laevis, Hura crepitans e Eschweilera odorata. Ocorreu associação, em que

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as espécies que apresentaram maior área basal foram, consequentemente, as que apresentaram maior dominância absoluta, pois são espécies com alto incremento volumétrico, embora alguns tenham apresentado baixa abundância. Algumas espécies, no entanto, como o Theobroma cacau, apresentaram baixo volume devido à grande quantidade de indivíduos amostrados, o que resultou em uma dominância significativa. O índice de valor de cobertura com a densidade relativa das espécies, indivíduos com alto volume, resulta em uma área maior de cobertura; o mesmo pode ocorrer para espécies que não apresentam alto volume, mas compensam com grande abundância. É o caso do Theobroma cacau, que apresentou densidade de 12,04% de indivíduos e o valor de cobertura 14,02%; já com Ficus sp., que possui densidade baixa, equivalente a 2,27%, em contrapartida seu valor de cobertura foi de 15,20%, pois os indivíduos amostrados apresentaram média de 254 cm de diâmetro mensurado à altura do peito. O Theobroma cacau, de acordo com 22 unidades amostrais utilizadas no processamento dos dados, representando 8,8 ha amostrados, apresentou distribuição espacial correspondente a 7,84 indivíduos/ha. Logo, a cada hectare de floresta, espera-se encontrar o equivalente a oito indivíduos de cacau, aproximadamente. No entanto, Bjorn (2009) realizou um inventário, amostrando somente as áreas dos povoamentos de cacau; na mesma região da várzea do Rio Purus, a área analisada foi de 24 ha e a densidade obtida foi de 60 indivíduos por hectare.

LEVANTAMENTO SOCIOECONÔMICO

Apresentação As entrevistas em 100% da população residente foram realizadas com emprego de formulário elaborado com base nas experiências já realizadas em levantamentos semelhantes, no Acre, como na Floresta Estadual do Antimary e Reserva Extrativista do São Luis do Remanso, com seis páginas e mais de 200 questões. O formulário foi bem abrangente e conseguiu captar toda a realidade social e econômica que envolve os produtores de cacau nativo do Purus. O formulário priorizou a coleta de informações distribuídas em três blocos distintos, da seguinte forma:

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Aspectos Sociais 1. Identificação do responsável pela casa, situação legal, área de domínio da família, número de moradores. 2. Dados sobre o responsável: origem, documentos possuídos, situação conjugal. 3. Dados sobre a família: escolaridade, estrutura, atividades dos membros. 4. Condições de saúde: tipo de atendimento recebido, tratamento utilizado.

Aspectos Econômicos 1. Área utilizada para pasto de domínio exclusivo e/ou coletivo e para roçado (floresta derrubada para agricultura) de domínio exclusivo e/ou coletivo; área plantada na praia ou barranco. 2. Principais produtos e produção gerados ao longo do ano, fruteiras existentes. Culturas normalmente plantadas na praia. 3. Local de venda da produção. 4. Quantidades de animais criados. 5. Caça de animais.

Aspectos Relacionados à Produção de Cacau 1. 2. 3. 4.

A pretensão de continuar colhendo. O porquê de não coletar frutos. Interesse em fazer um plantio de cacau na sua área. Existência de algum produto que rende mais pelo dia de trabalho do que o cacau.

Objetivos O levantamento socioeconômico entrevistou todas as famílias residentes na margem do Purus, no intuito de obter dados sociais e econômicos daquela realidade. Os principais objetivos foram produzir indicadores sociais e econômicos sobre a população de ribeirinhos que praticam, ou poderão praticar no futuro, o manejo florestal comunitário do cacau nativo, com vistas a determinar a importância dessa atividade no rol de alternativas produtivas que se apresentam aos produtores, como fonte de geração de trabalho e renda.

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Principais resultados Foram entrevistadas 362 famílias, distribuídas em 19 comunidades. As entrevistas foram realizadas, preferencialmente, com o chefe de família, o que ocorreu na quase totalidade dos casos. Foi contabilizado um total de 1.777 moradores, sendo 57 % do sexo masculino e 43% do sexo feminino. O número médio de integrantes por família é de cinco pessoas. Esses dados, quando comparados com a realidade florestal no Acre, onde a proporção por gênero é de 50% para cada sexo e as famílias são de quase seis pessoas, demonstram um diferencial importante na estrutura demográfica da região. Dentre os entrevistados, a grande maioria é do município de Boca do Acre, em que 86,7% deles nasceram no Amazonas e 11,9%, no Acre, e os demais habitantes (1,4%) são oriundos de outros estados. Os entrevistados têm idade mínima de 18 anos e máxima de 87, com média de 42 anos. O sexo masculino predomina como responsável pela casa, perfazendo um percentual de 86,7%, e 13,3% para o sexo feminino. A grande maioria dos entrevistados é “ajuntada” (62,2%), ou seja, vive com suas parceiras, porém, não possui uma relação oficializada; os demais distribuemse entre casados (25,7%), viúvos (4,7%), solteiros (6,1%) e separados (1,4%). Com relação ao nível educacional, verifica-se que 43,6% dos entrevistados são analfabetos, 33,4% possuem o ensino fundamental incompleto, 16,6% sabem ler e escrever, 1,7% com ensino fundamental completo, 1,4% com ensino médio incompleto, 1,9% com ensino médio completo e 1,4%, com superior completo. Levando em consideração os entrevistado e sua família, a população que predomina na Bacia do Médio Rio Purus está na faixa etária 0 a 12 anos (35,3%). O segundo maior percentual está na faixa etária de 31 a 59 anos (24,4%). E se forem consideradas as faixas etárias de 13 a 20 anos e a de 21 a 30 anos, obtémse um percentual de 68,6%, caracterizando essa região uma população jovem. Já o tempo de moradia nas comunidades variou de alguns meses a 76 anos. O percentual de famílias morando por um período maior que 10 anos é de 62,3%, retratando a estabilidade dessas famílias quanto à permanência em suas comunidades. Dentre os entrevistados, 60,4% disseram já ter morado em outra comunidade perto, antes de morar na atual; e 66,3% nunca moraram em cidade.

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A organização comunitária é um ponto fundamental na constituição dessas comunidades. Entretanto, apenas 16,57% dos entrevistados fazem parte de alguma associação local. Desse total, 45% dizem que os homens participam mais das reuniões; já 38,3% dizem que são as mulheres; e o restante 16,7% afirmam que existe participação igual de ambos. A área sob domínio da família variou de um mínimo de 0,15 a 800 hectares, com média de 77 por família. A soma de todas as áreas das 362 famílias representou aproximadamente 28.000 hectares. Dessas, o uso representativo das áreas utilizadas para terreno da casa, pasto e roçado de domínio das famílias variou de 0,25 a 250 com média de 17 hectares por família. A soma de todas as áreas das 362 famílias representou, aproximadamente, 6.000 hectares desmatados. A maioria das famílias, 87,7%, pratica a agricultura de corte (derrubada) e queima nos roçados e desse total 69,1% têm roçado de uso exclusivo com tamanho entre 1 e 2 hectares e 7,4% têm roçados menores que um hectare. Em relação ao pasto de uso exclusivo, a maioria das famílias, 50%, tem tamanho menor que 10 hectares e 18,4% delas têm pastos maiores que 30 hectares. Quanto ao costume de se plantar em praias alagáveis do leito do rio, 66,8% afirmaram realizar essa atividade, sendo que o tamanho da área utilizada variou de 0,6 a 6 hectares. As crianças a partir de cinco anos já desenvolvem alguma atividade. Por exemplo, buscando água numa pequena vasilha ou auxiliando os maiores nos serviços da roça. As rendas advindas das profissões de serrador, carpinteiro, marceneiro, artesão de canoa, barqueiro (frete), professor e agente de saúde variaram de um mínimo de cem a um máximo de 4.000 reais; menos de 1% respondeu ter algum membro da família realizando essas atividades. Porém, a renda como diarista/ emprego variou de 60 a 2.600 reais, sendo que 19,4% pessoas afirmaram ter algum familiar que desempenha esta atividade. Já a renda referente a algum programa do governo, 41,4% deles responderam que recebem algum auxílio, sendo o Bolsa-Família o único na região, apesar de ter a Resex Arapixi, que corta uma parte do Rio Purus, e moradores poderiam ganhar o Bolsa-Floresta lançado pelo governo do Amazonas para famílias que moram em áreas de unidades de conservação; sendo assim, a renda variou de

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R$ 20,00 a R$ 190,00 sendo que 24,9% possuem renda menor que R$ 100,00 e 39,7% com renda maior que R$ 120,00. A castanha-do-brasil é o segundo produto extrativista em importância, com uma média de 164 latas por família (1 lata = 20 litros = 13 kg). Sua coleta é realizada, aproximadamente, de dezembro a fevereiro. Há uma grande diferença na disponibilidade de caça e de pesca nas comunidades. A Tabela 8 discrimina os animais caçados, de acordo com as entrevistas, em que 47% dos entrevistados afirmaram que costumam caçar algum desses animais. Tabela 7 - Socioeconomia dos manejadores de cacau. Espécies que as famílias costumam caçar. Projeto de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, CNPq-Ufac, 2010. Espécies caçadas

No de famílias

Frequência

Tatu

137

80,6%

Veado

103

60,6%

Porco do mato/Queixada

144

84,7%

Anta

36

9,9%

Capivara

48

28,2%

Paca

150

88,8%

Jabuti

55

32,5%

Jacu

85

50,0%

Nambu

95

55,9%

Macaco

38

22,4%

Cutia

55

32,5%

Jacamim

13

7,6%

Jacaré

2

1,2%

Onça

2

1,2%

Papagaio

1

0,6%

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O extrativismo de cacau é a maneira que os ribeirinhos têm para conseguir dinheiro, já que a maioria deles se dedica apenas à agricultura de subsistência e à criação de animais domésticos, cujas transações são realizadas por intermédio do escambo. Os ribeirinhos de Boca do Acre trabalham com o cacau durante três meses (março a maio). Dos entrevistados, 13,8% extraem cacau para vender, ou seja, 86,2% não extraem. Dos entrevistados, 96,0% pretendem continuar extraindo cacau, demonstrando o interesse por parte destes em obter uma renda a mais com essa atividade, sendo fator decisivo para a manutenção, o incentivo e o fortalecimento da atividade, criando assim, subsídios para a implementação de políticas públicas que visem a melhorar o preço e a qualidade do produto. A extração do cacau é feita somente com os frutos maduros, pois, com o amadurecimento dá-se uma contração na polpa e as sementes ficam quase livres, presas apenas ao cordão central; desse modo, ao receber pancadas manuais, o fruto emite um som característico. No entanto, se forem extraídos frutos verdes quando misturados com maduros e passados, obtém-se, como consequência, um produto de fermentação desigual, de mau aspecto e de cotação baixa no mercado. Os extrativistas das comunidades realizam a extração do seguinte modo: em todos os pés, 55,1% dos entrevistados; em quase todos os pés, 34,7%; e na maior parte dos pés, 10,2%; e ao relacionar esses dados com o número de frutos que sobram nos pés, verificou-se que 26,5% deixam muitos frutos, 61,3% deixam poucos frutos e 12,2% não deixam frutos, sendo que os que deixam pouco ou muitos frutos fazem isso porque não conseguem extrair os frutos por estes estarem no alto dos pés. Das 50 famílias que afirmaram extrair cacau, 81,6% dos entrevistados estão dispostos a aprender e a implantar protocolos de manejo para que o cacaueiro produza mais. De acordo com os entrevistados que afirmaram extraírem cacau, 81,6% acreditam que o cacau é um produto que rende mais pelo dia trabalhado, devido à facilidade e ao tempo gasto na atividade. Pois, enquanto se leva o dia todo para encher uma lata de castanha ou fazer o roçado, com o cacau em um dia de trabalho consegue-se retirar até 1.000 frutos e obtém-se uma renda mais “rápida”, ou seja, sobra tempo para outras atividades; além do mais, no cacau toda a família pode participar. | 106 |

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Parte 2 Plano de Manejo Florestal Comunitรกrio



O documento original e oficial de Plano de Manejo entregue à Cooperar, que poderá ser usado para licenciamento ambiental da atividade, é composto por dois volumes separados, de maneira a facilitar a análise e a compreensão, tanto por parte dos dirigentes da Cooperar quanto pelos analistas ambientais, da seguinte forma: Volume I: Plano de Manejo Volume II: Estudos subsidiários Para efeito deste livro, procurou-se incluir as porções do primeiro volume, na tentativa de divulgar as ideias do Plano de Manejo e para servir de instrumento de replicação das ações pioneiras desencadeadas pelo projeto. Afinal, é no primeiro volume que são apresentados e discutidos os coeficientes técnicos do Plano de Manejo e todos os seis Protocolos de Manejo, que são a principal referência para o próprio plano. Todas as decisões relacionadas a este puderam ser assumidas a partir da elaboração de uma série de estudos, denominados subsidiários, cujas sínteses são apresentadas no segundo volume. Sendo assim, esta segunda parte do livro está organizada em dois capítulos distintos e complementares, da seguinte maneira:

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I. Síntese do Plano de Manejo Apresenta todo o conteúdo do Plano, sem detalhamento dos itens. Sua leitura possibilitará a compreensão das decisões de manejo assumidas pelos responsáveis técnicos e sua operacionalização, fornecendo uma visão de conjunto importante aos que se interessarem pelo tema.

II. Protocolos de Manejo Este capítulo discute a tecnologia do Manejo Florestal Comunitário, tendo por referência as experiências em andamento no Acre. Apresenta e analisa também cada protocolo de manejo e seu cronograma de aplicação. Por fim, discute o manejo das espécies associadas ao cacau. Além da demanda técnica por um instrumento de gerenciamento da produção de cacau nativo, fartamente discutida em todo este documento, a idealização e a elaboração do Plano de Manejo também se justificaram dos pontos de vista: social, econômico e ecológico, como demonstrados abaixo.

JUSTIFICATIVA SOCIAL Na área de atuação do projeto, estima-se que habitam cerca de 800 famílias de agricultores familiares, que basicamente exercem atividades de subsistência, possuem baixo nível de organização social e recebem pouco auxílio de políticas públicas, vivendo praticamente isoladas. Dessas 800 famílias, cerca de 300 já iniciaram o extrativismo do cacau nativo e estão em processo de filiação à Cooperar. Além da região de influência da cooperativa, os ribeirinhos da Amazônia, em zonas de ocorrência do cacau, são estimados em mais de 500 mil pessoas. Desde o início da atividade extrativa do cacau, na região do médio Purus, em 2006, diversas melhorias sociais têm sido levadas à comunidades da região, em função da organização social dos produtores e da articulação de diversas parcerias institucionais pela Cooperar. Como exemplo, algumas comunidades já foram beneficiadas com a implantação de estrutura para fermentação, secagem e armazenamento de amêndoas, e muitas comunidades serão beneficiadas com a implantação de geradores de energia, com a regularização fundiária, com a oferta e melhoria dos serviços de educação e saúde, medidas que vêm sendo ar-

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ticuladas pela Cooperar com apoio da agência de cooperação alemã – Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit –, atual GIZ, da sigla em alemão. Cabe destacar que, além de evitar o êxodo rural, por se constituir em excelente fonte de renda para os ribeirinhos, a atividade produtiva do cacau inclui o envolvimento de mulheres e adolescentes, uma disponibilidade de trabalho que geralmente não participa das outras atividades produtivas realizadas no interior da floresta. O Plano de Manejo também terá relevante impacto social, na medida em que ajudará a consolidar a Cooperar, que possui histórico de diversas iniciativas relevantes para o desenvolvimento sustentável da região do médio Purus, conforme já descrito. A Cooperar foi fundada por um grupo de 20 extrativistas da região do médio Rio Purus, em 2003. Sua finalidade básica é promover atividades produtivas sustentáveis, que conciliem a geração de trabalho e renda com a conservação da floresta, bem como viabilizar o consumo de bens de primeira necessidade para a população ribeirinha da região do médio Rio Purus, nos municípios de Boca do Acre e Pauini no Amazonas. Desde sua fundação, a cooperativa tem promovido a compra coletiva de bens de primeira necessidade, reduzindo o custo desses produtos para cerca de 80 famílias da região do médio Purus. No ano de sua criação, a Cooperar também implantou, em Boca do Acre, uma fábrica para a desidratação de frutas, a partir da doação de fornos de secagem pela organização Engenheiros Sem Fronteiras, da Espanha, e da construção de prédio doado pelo Instituto de Desenvolvimento Ambiental Raimundo Irineu Serra – IDA. Em 2004 e 2005, a Cooperar comercializou esses produtos para pequenas lojas do Rio de Janeiro e São Paulo e, em 2006, iniciou a distribuição da banana--passa e da farinha de banana em supermercados de Rio Branco e na rede de supermercados Pão de Açúcar de São Paulo. Apesar de só estar desidratando a banana e a castanha, a Cooperar já desenvolveu testes de produção para a desidratação de outras frutas, como abacaxi, mamão e tucumã. Em 2006, a Cooperar também iniciou a implantação de uma usina de óleos vegetais em Boca do Acre, com apoio do Subprograma de Projetos Demonstrativos – PDA, no âmbito do PPG7, gerido pelo Ministério do Meio Ambiente. Em 2007, foram realizados testes de produção de óleos de andiroba, castanha,

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tucumã e patauá. A usina tem capacidade para produzir cerca de 20 toneladas de óleos por ano; atualmente, opera na fase de teste. A implantação da usina baseia-se em plano de negócios elaborado pelo IDA com apoio do Fundo Nacional do Meio Ambiente – FNMA.

JUSTIFICATIVA ECONÔMICA Em 2005, a Cooperar iniciou os contatos com uma empresa alemã de chocolates finos, a Hachez, e, mediante projeto apresentado à empresa, firmou acordo para iniciar a exportação do cacau nativo, sendo que todos os recursos necessários para investimento e capital de giro seriam adiantados pela Hachez e, posteriormente, restituídos pela Cooperar, mediante abatimento no lucro da exportação do cacau. Em 2006, no âmbito desse acordo, a Cooperar beneficiou e exportou para a Alemanha cerca de nove toneladas de cacau nativo, beneficiando diretamente 20 comunidades ribeirinhas e 115 extrativistas. A qualidade do cacau foi aprovada pela Hachez, que encomendou 30 toneladas de cacau nativo para 2007. Para isso, a Hachez financiou a implantação da estrutura de beneficiamento de cacau da Cooperar, que inclui três unidades com capacidade para cerca de 20 toneladas de cacau por ano cada, sendo uma unidade em Boca do Acre, uma na comunidade Santo Elias e uma na comunidade Canacuri (ambas as comunidades no município de Pauini – AM). Em 2007, a safra do cacau foi a pior dos últimos 20 anos, na região do médio Purus, o que inviabilizou o beneficiamento da quantidade demandada pela Hachez. Como a maior parte dos cacaueiros nativos praticamente não deu frutos naquele ano, a Cooperar só conseguiu produzir cerca de duas toneladas de cacau. Por outro lado, estendeu seu raio de ação para cerca de 60 comunidades ribeirinhas e, aproximadamente, 200 extrativistas, que estão em processo de associação à Cooperativa. Também em 2007, a Cooperar, com apoio da Hachez, da GIZ e de diversas instituições brasileiras, iniciou um projeto para a certificação orgânica do cacau nativo do médio Purus, manejo dos cacaueiros nativos e apoio ao processo de regularização fundiária na região. Para 2008, a Cooperar firmou com a Hachez o compromisso de beneficiar 38 toneladas de cacau nativo, que já estaria certificado pelo Instituto de Mercado Ecológico – IMO. O produto foi vendido por

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R$ 6,50 o kg (FOB Manaus), o que representou quase o dobro do preço do cacau convencional. Ou seja, do ponto de vista mercadológico, o projeto está amparado num acordo comercial de longo prazo e de alto valor agregado. Já do ponto de vista do desenvolvimento econômico local, o extrativismo do cacau nativo tem se mostrado a atividade econômica mais vigorosa, no que diz respeito à geração de renda para os produtores familiares do médio Purus. De acordo com levantamento socioeconômico realizado em 2005 pela Cooperar em cinco comunidades do médio Purus (projeto MMA-PDA), a renda familiar monetária nas comunidades é, em média, de apenas R$ 120,00 por mês. Por outro lado, apenas a coleta do cacau nativo chega a proporcionar ao extrativista uma diária de até R$ 50,00, ganho que pode ser obtido ao longo de 2,5 meses por ano (período de safra do cacau).

JUSTIFICATIVA ECOLÓGICA Há vários anos, o município de Boca do Acre detém o maior rebanho bovino de corte do Estado do Amazonas, totalizando cerca de 292 mil cabeças de gado, em 2005, segundo o Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas – Idam, o que tem provocado significativa perda da cobertura florestal na região, na proporção de 1 hectare desmatado por cabeça de gado (totalizando cerca de 290 mil hectares de pastos ativos, sem contar os abandonados, que podem chegar a 30% do total). O crescimento da bovinocultura em Boca do Acre é da ordem de 10% ao ano. Em Pauini, a bovinocultura é menos expressiva, com cerca de sete mil cabeças e sete mil hectares de pastos; entretanto, também crescendo à taxa de aproximadamente 10% a.a. Na região abrangida por esse plano de manejo, as principais atividades econômica das famílias são a pesca e a agricultura de subsistência, praticadas nas praias do Purus em roçados que têm gerado desmatamento médio de 0,5 hectare por família, no modelo da agricultura de corte e queima. Como os rendimentos da pesca e da agricultura são insuficientes para tirar as famílias da condição de pobreza, muitos produtores familiares da região têm adotado a pecuária como meio de melhorar a situação econômica, mas essa atividade também não tem possibilitado retorno financeiro capaz de promover

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a superação da pobreza, já que a lucratividade do negócio é estabelecida a partir de um rebanho de cerca de 100 cabeças, segundo estimativas do Idam. Entre as atividades desenvolvidas pelos agricultores familiares da região abrangida pelo plano, a principal ameaça ambiental, em termos da proporção do desmatamento, tem sido a pecuária extensiva. No levantamento socioeconômico da Cooperar, realizado em 2005, foi constatado que cerca de 14% das famílias ribeirinhas do médio Purus já estão criando gado, e que o desmatamento médio proporcionado por essa atividade é de, aproximadamente, 10 hectares por família, ou seja, 20 vezes maior do que no caso da agricultura de corte e queima. Esses dados foram corroborados pelo projeto CNPq-Ufac de 2010. A manutenção do estoque florestal, tanto com relação aos povoamentos do cacaueiro nativo quanto para outras espécies florestais importantes para a cultura e economia dos extrativistas do médio Purus, só será assegurada caso a atividade extrativista seja economicamente mais atrativa do que as alternativas produtivas, consideradas insustentáveis, sobretudo a pecuária. Com secas extremas nunca observadas e, de outra banda, com alagações igualmente atípicas, o Purus em desequilíbrio é o resultado do processo de antropização e desmatamento realizado na área de influência do plano. Os produtores sabem disso e, mais ainda, que a atividade do manejo florestal comunitário do cacau e de outras espécies se configura em alternativa imprescindível para frear esse processo de ocupação que destrói o ecossistema florestal. A Cooperar, por sua vez, vem buscando articular parcerias com várias entidades, como a Ufac e demais instituições envolvidas nesse plano, com o objetivo de tornar as atividades produtivas realizadas pelos agricultores familiares compatíveis com a conservação do ecossistema florestal.

SÍNTESE DO PLANO DE MANEJO Desde sua idealização, o Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus apresentou um diferencial importante: sua demanda partiu de fora do ambiente acadêmico. Com um desafio concreto a ser superado, os extrativistas da Cooperar, cooperativa que desenvolve trabalho de organização da produção extrativista, no

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médio Purus, procuraram a Ufac, em especial o curso de Engenharia Florestal, para que, juntos, pudessem elevar a sua produção de sementes secas de cacau das, anualmente repetidas, 9 toneladas para 40 toneladas. Evidente que a usual opção seria sugerir a domesticação do cacau nativo em cultivos, com uma espécie ou, para ser mais moderno, consorciado com outras espécies agrícolas ou florestais, o que ampliaria, de forma rápida (em dois anos, por exemplo) a produção, além dos benefícios de localizá-la em um determinado ponto do rio, o que reduziria os custos associados à logística. Uma ideia, em princípio simples e eficiente, que poderia ser realizada mesmo sem a ajuda dos pesquisadores da universidade, mas que encontrou três barreiras cruciais e perigosas: a social, a ecológica e a econômica. Ocorre que a domesticação possibilitaria atender à demanda pelas 40 toneladas com um plantio localizado, para minimizar custos operacionais, o mais próximo de Boca do Acre, município de embarque das sementes de cacau destinadas à exportação. A tendência seria envolver alguns poucos produtores, que poderiam, inclusive, passar de pequenos produtores familiares para médios, no decorrer dos ciclos de comercialização do cacau. No entanto, a concentração da produção em algumas propriedades selecionadas pela sua proximidade à área de embarque, excluiria da atividade um contingente elevado de produtores, que, apesar de possuírem em sua unidade de produção o cacau nativo, não participariam do processo produtivo, agravando as precárias condições sociais existentes. Por outro lado a domesticação, além de ganhos nos custos de logística advindos da localização dos plantios, proporcionaria ganhos econômicos relacionados à elevação da produtividade por hectare e por pé de cacaueiro. A tendência seria ampliar o esforço nas técnicas de melhoramento genético, buscando obter clones de pés de cacau, cujas variedades possibilitassem produzir quantidades cada vez maiores de frutos por pé e, talvez o melhor, frutos de cacau cada vez mais polpudos, com o dobro do volume médio de sementes por fruto. No entanto, o melhoramento vegetal associado à domesticação colocaria o cacau cultivado no Purus para competir no mercado de massa do cacau, que fabrica um chocolate considerado de sabor inferior, como ocorre em cultivos realizados em outras regiões do país e do mundo. Um mercado para o qual a

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competitividade da Amazônia é reduzida por características climáticas, de infraestrutura, de trabalho e de capital. Sem condições de competir com arranjos produtivos locais para o cacau, como o existente, por exemplo, em Ilhéus, na Bahia, o cacau domesticado do Purus seria levado ao atendimento de um mercado local e próximo, que pratica preços inferiores, o que agravaria as precárias condições de viabilidade econômica da atividade. Finalmente, a domesticação traria de volta o fantasma da vassoura-de-bruxa, doença fatal que não poupa os cultivos de cacau. A tendência seria de alastramento da doença, tendo em vista que seu controle é complicado, em especial, por exigir investimentos proibitivos. Ou seja, além da convivência nem sempre salutar entre os clones dos cultivos resultantes do melhoramento genético destinado à ampliação de produtividade e os povoamentos nativos, a domesticação também exigiria o emprego de agroquímicos pesados no controle da vassoura-de-bruxa, o que, por sua vez, agravaria as precárias características ecológicas associadas à atividade. Assumindo como premissa básica que a região perde expressiva competitividade, sobretudo a médio e longo prazo, com a participação no mercado de massa do chocolate de sabor inferior, a negação da domesticação, em cultivos de qualquer tipo, como alternativa para ampliação da produção de sementes de cacau para 40 toneladas, levou a equipe de pesquisadores à opção pela tecnologia de manejo florestal do cacau existente no próprio ecossistema florestal das margens do Purus. A consolidação da tecnologia do Manejo Florestal Comunitário ocorrida nos últimos 20 anos, na Amazônia, foi o que inspirou o esforço criativo dos responsáveis pela elaboração do Plano de Manejo, transformando-o em um grande desafio para a engenharia florestal amazônica. Ocorre que o manejo do cacau nativo envolve, por sua capilaridade ao longo da margem do Purus, um enorme contingente de pequenos produtores familiares, reduzindo o agravamento das questões sociais. Nos povoamentos de cacau nativo, a vassoura-de-bruxa não entra, pois existem os inimigos naturais do causador da doença, que impedem sua proliferação, o que ameniza as características ecológicas da atividade. Por fim, e talvez o mais decisivo, é que a empresa compradora não abre mão do sabor selvagem do cacau nativo, questão central de seu marketing voltado

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para atender a um mercado reduzido, exigente e que paga mais caro pelo chocolate com sabor primitivo. O Plano de Manejo propiciou como principal resultado a constatação de que a inovação tecnológica oriunda da aplicação do Manejo Florestal Comunitário, por meio de um amplo programa de extensão florestal, como previsto na terceira parte desse livro, pôde quadruplicar a produção de cacau nativo, atendendo à demanda do mercado, exigindo, contudo, o estabelecimento de protocolos de manejo passíveis de serem executados em cada safra de cacau nativo. Esse Plano de Manejo Florestal Comunitário foi resultado da conclusão de seis estudos pioneiros, que subsidiaram sua elaboração, atendendo à demanda dos associados da Cooperar por respostas para o gerenciamento da produção de cacau nativo, sendo que quatro deles, considerados mais importantes, são apresentados na primeira parte do livro. Para um documento de gerenciamento, reconhece-se que o Plano de Manejo, infelizmente, ficou um pouco mais extenso que o previsto, o que foi inevitável diante da obrigação de se descrever a dimensão do trabalho realizado, para se chegar à definição dos protocolos de manejo, que são a referência principal do plano. A variedade de conhecimentos necessários para o diagnóstico da situação atual e propor soluções para o cacau nativo, tanto com relação à elaboração dos estudos subsidiários quanto à preparação do plano de manejo, respectivamente, contou com uma equipe de várias formações como a apresentada no início desse livro. Tendo em vista a considerada extensa área geográfica destinada à produção de cacau nativo do Purus, na qual a Cooperar atua nas safras de cacau, um grupo de quatro profissionais, sendo três engenheiros florestais e um engenheiro civil, todos com larga experiência no tema, se disponibilizaram para assumir a elaboração e a responsabilidade técnica do Plano de Manejo na Cooperar, nos órgãos de licenciamento ambiental e nos de atuação profissional. Os responsáveis técnicos estão identificados logo a seguir. Finalmente, o Plano de Manejo apresenta também um curioso e frutífero leque de parcerias institucionais, que envolveu, além da Ufac, a Unesp, a Universidade de Viçosa, a Universidade de Freiburg, a Agência de Cooperação Alemã – GIZ, a Associação Andiroba, a empresa de chocolates finos Hachez e, acima de tudo, os manejadores de cacau nativo associados à Cooperar, principal razão para investimento no plano.

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COEFICIENTES TÉCNICOS DO PLANO DE MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO DO CACAU NATIVO DO PURUS Tipo de empreendimento:  Manejo Florestal Comunitário da biodiversidade presente no ecossistema florestal da Amazônia, no caso, o Cacau Nativo nas margens do Rio Purus. Detentor do Plano:  Cooperativa Agroextrativista do Mapiá e Médio Purus – Cooperar. Responsáveis pela elaboração do Plano Ecio Rodrigues, Engenheiro Florestal, PhD, professor da Universidade Federal do Acre, Ufac. Luciana Rodrigues Pereira, Engenheira Florestal, pesquisadora da Associação Andiroba. Jairo Salim Pinheiro de Lima, Engenheiro Civil, PhD, professor da Unesp. Responsável Técnico pelo Plano:  Luciana Rodrigues Pereira, Engenheira Florestal, pesquisadora da Associação Andiroba. Registro Profissional: 19023 CDAC, CREA-Acre Tecnologia de manejo empregada:  Manejo Florestal Comunitário, MFC, tendo o cacau como espécie florestal principal para o objetivo de manejo e outras seis espécies florestais associadas e manejadas de forma complementar ao manejo da espécie principal. Área total de Manejo:  Faixa de 3 quilômetros de cada margem do Rio Purus, no trecho compreendido entre a foz do Rio Iaco até o município de Lábrea, conforme mapa abaixo, incluindo uma área total aproximada de 400.000 hectares, sob influência indireta do manejo.

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Figura 17: Trecho do Purus sob manejo de cacau com faixa de 3 km de cada margem e identificação em amarelo dos povoamentos manejados

Espécie florestal manejada:  Cacau nativo, Theobroma cacao L., Sterculiaceae Produto florestal obtido:  Sementes de cacau, fermentadas e secas, para exportação e produção de chocolate de alta qualidade. Objetivo do manejo florestal:  Levar a produção total de cacau nativo para 40 toneladas anuais, na área de manejo onde atua a Cooperar, para atender à demanda de mercado previamente acordada entre a Cooperar e a empresa alemã de chocolates finos Hachez. Manejadores florestais envolvidos no Plano:  Em torno de 300 pequenos produtores familiares, associados à Cooperar que, voluntariamente, coletam cacau e participam do sistema de aquisição anual da safra operado pela Cooperar. Área manejada por manejador florestal:  Cada produtor familiar trabalhará em uma área aproximada de 23 hectares, ocupada pelo povoamento de cacau nativo existente na sua unidade produtiva, em cada margem do Purus. Alguns poucos produtores poderão atuar em duas áreas de manejo, uma em cada margem do Purus, cada um com 60 hectares.

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Produção estimada (frutos/safra/ano) por manejador florestal:  Espera-se que cada manejador colete e comercialize com a Cooperar entre 3.000 e 6.000 frutos de cacau, em uma ampliação paulatina à medida que os protocolos de manejo comecem a apresentar os resultados esperados para cada situação. Esse intervalo de produção foi estabelecido com base na média da força de trabalho despendida pelo manejador na produção do cacau. Descrição dos seis protocolos de manejo: Protocolo I: PODA – Eliminação de 100% das gemas de Chupão já lançadas ao solo. Protocolo II: ABATE – Eliminação de 50% dos Chupões já enraizados por touceira. Protocolo III: SELEÇÃO E MARCAÇÃO DE TOUCEIRAS MATRIZES – Tendo como critério de seleção a produtividade da touceira, deverão ser selecionadas as 10 mais produtivas de cada produtor. Protocolo IV: SEMEADURA SOB DOSSEL EMERGENTE – Distribuição das sementes coletadas das matrizes em toda a unidade produtiva. Protocolo V: DESBASTE – Eliminação de 100% do cacau solteiro com cortes realizados a 20 centímetros de altura do solo. Importante: observar ocorrência de rebrotas. Protocolo VI: POUSIO PRODUTIVO – Identificar seis áreas de manejo segmentadas e com tamanho semelhante. Cronograma de introdução dos protocolos de manejo:  A introdução de cada protocolo de manejo no processo produtivo ocorrerá no início de cada safra anual. O período da safra, no qual o manejador se volta para o trabalho com o cacau,

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parece oportuno para aplicação conjunta do protocolo de manejo. Ocorre que, além de otimizar o trabalho, uma vez que o produtor estará atuando no interior do povoamento de cacau, alguns protocolos, como o V, por exemplo, facilitam a colheita do cacau no ato de sua aplicação. Responsabilidades sobre a operacionalização do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus:  A execução do Plano de Manejo, de acordo com o cronograma de aplicação dos protocolos de manejo apresentado mais adiante, estará sob a responsabilidade da Cooperar, dos manejadores florestais e dos responsáveis técnicos, da seguinte forma: a.  Cabe à Cooperar Organizar o processo produtivo, envolvendo a responsabilidade pela aplicação de cada protocolo de manejo, de acordo com as orientações previstas no Plano de Manejo e com acompanhamento dos responsáveis técnicos. Ou seja, é da Cooperar a responsabilidade pela execução do plano de manejo, no que diz respeito à introdução de cada protocolo e o monitoramento dos resultados observados. Para isso deverá promover a sensibilização e a qualificação dos manejadores na aplicação das técnicas preconizadas no plano e introduzir mecanismos que relacionem a execução dos protocolos com a aquisição da safra, inclusive com o pagamento de preços diferenciados para o manejador que aplica o protocolo de manejo. b.  Cabe aos manejadores Executar as ações, paralelas à safra, relacionadas à aplicação dos protocolos de manejo de acordo com as orientações da Cooperar. Apresentar sugestões de melhoria da operacionalização dos protocolos. c.  Cabe ao responsável técnico Orientar a Cooperar e diretamente os manejadores florestais na operacionalização dos protocolos de manejo, além de monitorar o efeito dos protocolos na produção total de cacau obtida em cada safra. A responsabilidade pela condução do Plano cobrirá todo o período compreendido até a sua primeira revisão técnica.

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Validade e revisão do Plano de Manejo:  O Plano de Manejo tem duração prevista para cinco anos, ou seja, até 2015, momento no qual deverá passar por uma revisão técnica, que, necessariamente, compreenderá uma avaliação detalhada dos efeitos dos protocolos na produção total dos povoamentos de cacau nativo. Uma segunda revisão está prevista para ocorrer depois de um espaço de tempo maior, dez anos, em 2020, quando será elaborada uma segunda versão do Plano, o que exigirá estudos detalhados como os que foram realizados para elaboração dessa primeira versão. Manejo das espécies associadas ao cacau:  Um total de seis espécies foi mapeado no Inventário Florestal, sendo essas associadas ao povoamento do cacau nativo. Mais que sombrear o cacau, como se acreditava ser sua principal função, as espécies associadas contribuem para formação do microclima requerido pelo povoamento de cacau. Todas as seis espécies devem ser manejadas no sentido de favorecer a ampliação da produtividade do povoamento de cacau. No grupo das seis espécies associadas ocorrem 4 (mata-mata, cedro, mulateiro e abiurana) que são interessantes para o mercado madeireiro, o que as torna um potencial para o manejo e a redução de densidade para favorecer o cacau nativo. Manejo florestal do Mulateiro – Calycophyllum Spruceanum:  Das seis espécies associadas ao cacau, o mulateiro merece destaque. Pressionada pelo setor madeireiro, sobretudo por suas características dendrológicas e elevada ocorrência, nas várzeas dos rios amazônicos, a espécie possui demanda urgente pelo Plano de Manejo. Todavia, o manejo do mulateiro deve priorizar a ampliação da produtividade do cacau nativo. Diretrizes de Manejo:  Todo Plano de Manejo está estruturado de forma a atender a três diretrizes principais de manejo, quais sejam: Diretriz I de Manejo: Privilegiar o alargamento da base genética do povoamento do cacau nativo. Diretriz II de Manejo: Promover a formação de povoamentos de cacau nativo a partir do cacau de touceira.

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Diretriz III de Manejo: Condicionar a ocorrência das seis espécies associadas ao nicho ecológico do povoamento do cacau nativo. Extensão florestal para assimilação do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo do Purus:  No intuito de promover a assimilação, por parte dos manejadores florestais, dos protocolos de manejo prescritos no Plano, um Programa de Extensão Florestal é apresentado, com previsão para se desenrolar por um período de 30 meses e custos estimados em R$ 150.000,00, recursos que deverão ser captados de instituições de fomento afetas ao tema e negociados com as instituições envolvidas na execução do Plano.

PROTOCOLOS DE MANEJO A definição dos seis protocolos de manejo, detalhados a seguir, tomou por referência um conjunto de informações geradas nas pesquisas realizadas nos povoamentos de cacau nativo do Purus. Denominar de protocolos de manejo e não de tratos silviculturais, o que, para alguns, seria o mais acertado do ponto de vista técnico, teve duas razões principais. Primeiro, para facilitar a compreensão por um público mais amplo que, no geral, não está familiarizado com as terminologias da Engenharia Florestal, mas que, por outro lado, conhece a expressão protocolo, quer seja devido à burocracia pública, extensa, diga-se, quer seja devido à exposição prolongada às ações de saúde pública. Segundo, para fornecer uma ideia de rotina e de permanência ao longo do tempo, tendo em vista que se trata de um rol de procedimentos a ser executado a cada safra, no período anterior, durante e depois da colheita dos frutos. Mesmo que no primeiro ano a aplicação do protocolo exija esforço mais elevado que nos demais, o protocolo deverá ser reaplicado periodicamente, de dois em dois anos, por exemplo, para sempre. Pode ser melhorado, alterado um pouco, mas, por se tratar de um protocolo, é permanente. É possível que esteja aí a principal inadequação dos termos “tratos silviculturais”. Ocorre que, além de o cacau nativo não ter sido objeto de atenção dos pesquisadores no que se refere à melhoria de sua performance produtiva, o

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que exigiria os tratos silviculturais, os povoamentos nativos requerem uma intervenção periódica e permanente, a médio e longo prazo, cujos resultados são, igualmente, obtidos depois de algum tempo de maturação. Por outro lado, geralmente, os tratos silviculturais costumam ser aplicados com certo nível de emergência para resultados de curto prazo. Dos seis protocolos, somente o último, como se verá a seguir, estabelece rotação nas áreas de manejo, impondo porções de povoamento sob pousio, isto é, que serão mantidas ociosas durante o período de safra. Esse sexto protocolo, muito embora encontre certa dificuldade para aceitação por parte do produtor, é fundamental para o sucesso das diretrizes de manejo previamente assumidas. Finalmente, cabe esclarecer ainda que nenhuma das seis espécies associadas foi incluída nos protocolos de manejo, uma vez que os resultados de cada protocolo, isoladamente, independem do manejo a ser realizado nas espécies associadas. No entanto, como o manejo das espécies associadas influencia direta e fortemente o objetivo principal a ser alcançado com a aplicação do conjunto de protocolos de manejo, sendo: ampliar a produtividade dos povoamentos nativos de cacau para chegar à meta de 40 toneladas de sementes de cacau por safra, o manejo florestal aplicado à cada espécie associada, separadamente ou em conjunto, é discutido depois da apresentação dos protocolos para o cacau. A primeira decisão tomada pela equipe envolvida na elaboração deste Plano de Manejo foi lançar mão da tecnologia denominada Manejo Florestal Comunitário – MFC, o que significou aceitar todo o conjunto de procedimento relacionado a essa tecnologia, um diferencial tecnológico que levou o Plano de Manejo para um rumo diferente das comuns prescrições relacionadas aos planos empresariais e individuais. Nesse caso, as características dos produtores e sua associação à Cooperar pesaram para a adoção do MFC como referencial tecnológico. Uma tecnologia que, felizmente, encontra-se concebida e que surgiu a partir, em especial, de experiências realizadas no Acre, algumas delas sumariamente apresentadas na terceira parte deste livro, em que se discute o Programa de Extensão Florestal.

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DIRETRIZES DE MANEJO Com a conclusão das quatro expedições realizadas pelo projeto apoiado pelo CNPq e depois de processados e analisados todos os dados coletados em campo pelos quatro estudos considerados prioritários (Logística da produção, Inventário Florestal, Mapeamento por satélite e Socioeconomia), a equipe de pesquisadores pôde debater acerca do caminho a ser adotado pelo Plano de Manejo para chegar ao seu objetivo principal: produzir 40 toneladas de sementes de cacau para exportação. Optou-se, de forma conjunta, por discutir as principais estratégias a serem adotadas pelo Plano, para orientar sua elaboração, o que ficou a cargo dos pesquisadores que iriam requerer ao CREA a Anotação de Responsabilidade Técnica – ART. Um conjunto de três Diretrizes de Manejo apresentado abaixo foi elaborado pelos pesquisadores e orientou toda a estrutura prevista para o Plano.

1. Privilegiar o alargamento da base genética do povoamento do cacau nativo Na condição de principal e mais importante Diretriz de Manejo, na qual as Diretrizes 1 e 2 se assentam, a Diretriz 1 pressupõe o favorecimento da reprodução sexuada por sementes e a consequente inibição da formação de novos exemplares do mesmo indíviduo por meio do lançamento de chupões, principal instrumento da reprodução assexuada. A ideia principal é que, com os novos indivíduos surgidos a partir do cruzamento ocorrido intrapovoamento, seja possível direcionar ou provocar o processo de seleção natural em prol de indivíduos que apresentem duas caracterísiticas genéticas prioritárias: maior quantidade de frutos produzidos e, o que é fundamental para as espécies florestais nativas da Amazônia, constância e estabilidade na quantidade de frutos por safra. Ou seja, produzir o máximo possível e manter essa produção no decorrer das safras, evitando a natural flutuação da frutificação que faz com que ocorram safras em que a produtividade individual caia a índices inferiores a 50% da média observada em séries históricas.

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Nas palavras dos manejadores “ninguém sabe por que, mas tem ano que não dá cacau”. Em um segundo momento, estima-se que, depois da aplicação da Diretriz I de Manejo em três safras consecutivas, será possível realizar análise comparativa entre os povoamentos (interpovoamentos) distribuídos de maneira descontínua ao longo da mata ciliar do Purus, a fim de selecionar indivíduos melhor adaptados, segundo as duas características genéticas desejáveis, cujas sementes poderão ser lançadas nos povoamentos, sobretudo naqueles de maior interesse para a logística de produção.

2. Promover a formação de povoamentos de cacau nativo a partir do cacau de touceira Os indíviduos de cacau nativo apresentam duas estratégias de estabelecimento que, ao que tudo indica, dependem do local exato onde a semente cai e se enraíza. De acordo com a primeira estratégia, o indivíduo se estabelece formando touceiras com uma média de cinco caules por indivíduo, com altura média de 8 metros, sendo que todos os caules florescem e frutificam nas safras. Já com relação à segunda estratégia, o indivíduo se estabelece por meio do enraizamento e crescimento de somente um caule, chamado de solteiro, com altura média de 12 metros, que floresce e frutifica em cada safra. Ocorre que o cacau de touceira, além de facilitar a colheita, devido a sua altura inferior, produz até cinco vezes mais que o solteiro. A própria espécie parece priorizar a primeira estratégia, uma vez que a ocorrência natural de cacau solteiro é bastante inferior à das touceiras, não chegando a representar 20% dos indivíduos do povoamento. Isso siginifica afirmar que a Diretriz II de Manejo irá potencializar e acelerar a estratégia de estabelecimento assumida pelo próprio povoamento de cacau nativo. Com a aplicação da Diretriz II de Manejo em três safras consecutivas, esperase que a ocorrência de cacau solteiro não chegue a 5%, em média, de todos os povoamentos, e que o cacau solteiro seja completamente eliminado nos povoamentos considerados de maior interesse para a logística de produção.

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3. Condicionar a ocorrência das seis espécies associadas ao nicho ecológico do povoamento do cacau nativo Um dos mais importantes resultados do Inventário Florestal do cacau nativo foi a identificação de quais das seis espécies apresentam relação ecológica com os povoamentos de cacau nativo. O Inventário Florestal também permitiu o cálculo da quantidade média de árvores de cada espécie existente no povoamento de cacau. A conclusão é que o manejo florestal comunitário de cada uma dessas espécies é condição essencial para o manejo florestal comunitário do cacau nativo. Explicando melhor, a ampliação da produtividade do cacau nativo depende do manejo das seis espécies florestais a ele associadas. Dois pontos precisam ser devidamente discutidos e esclarecidos, para que a Diretriz III de Manejo alcance os resultados pretendidos. O primeiro e mais urgente diz respeito à interpretação corriqueira das normas que envolvem o manejo de espécies florestais em mata ciliar de rios e outros fluxos de água. No geral e de forma equivocada, a maioria dos que atuam em órgãos de licenciamento ambiental costuma rejeitar a hipótese de que é possível o manejo florestal destinado à produção de madeira, o que exige, evidentemente, o abate de árvores, em área de mata ciliar, desde que, o que é novamente evidente, seja realizado a partir de documento de plano de manejo avaliado e aprovado nos órgãos de licenciamento ambiental. Como nesse caso a redução da quantidade de árvores das espécies florestais associadas ao povoamento de cacau nativo configura-se em atividade preconizada nas diretrizes do plano de manejo do cacau nativo, manejar essas espécies significa, na verdade, operacionalizar o manejo do cacau nativo com base em elevados e precisos coeficientes técnicos, não trazendo qualquer tipo de prejuízo aos objetivos para os quais a mata ciliar foi instituída pela legislação. O segundo ponto é que acreditava-se existir uma relação simbiótica entre o povoamento de cacau e as espécies a ele associadas, uma vez que o cacau, por não ser uma espécie heliófita tolerante ao sombreamento, beneficia-se da ocorrência das espécies florestais, ao mesmo tempo que as espécies se beneficiam com o povoamento de cacau, o que impede o estabelecimento de outras

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espécies heliófitas que irão, por sua vez, competir pela limitada luz do sol. Mas, não é bem assim. Ocorre que os testes dos protocolos de manejo demonstraram que o fator crucial nessa relação simbiótica para o povoamento de cacau nativo é a manutenção do microclima propício para a espécie, o que nem sempre está estreitamente relacionado à existência de sombreamento. Esse fato foi corroborado por estudos realizados pela Ceplac em cultivos de cacau domesticado. Isto é, o cacau tolera o sombreamento, mas o que favorece o seu estabelecimento é o microclima – em especial as condições de umidade relativa e de temperatura – criado pelas espécies florestais associadas. No entanto, a produtividade do cacau é ampliada de maneira considerável e quase na proporção direta da exposição a uma determinada quantidade de luz. A diferença de produtividade é facilmente observada quando se amplia a quantidade de luz que penetra no povoamento. Por outro lado, a exposição demasiada do indivíduo a uma quantidade de luz pode interferir no microclima requerido pela espécie, o que, em decorrência, prejudica seu desenvolvimento e, claro, sua produtividade. Encontrar o ponto ótimo de abertura de dossel, que ao mesmo tempo permita entrada de luz que amplie a produtividade ao máximo sem comprometer o microclima, é condição elementar ao sucesso do manejo do cacau e das espécies a ele associadas. Curioso é o fato de que a intensidade de exploração de cada uma das espécies associadas dependerá da curva de intensidade ótima de luz no povoamento de cacau, ou seja, é o manejo florestal comunitário do cacau que vai imprimir as regras para o manejo florestal das espécies associadas e não, como é normal, as características de abundância, dominância e do índice de valor de importância da própria espécie. A constatação de que são os indicadores do manejo do cacau nativo que vão determinar a quantidade de árvores das espécies florestais associadas que deverão ser exploradas em cada localidade vem corroborar a afirmação, feita acima, de que o manejo dessas espécies deve ser entendido como uma atividade paralela ao manejo do cacau, o que possibilita outro tipo de interpretação das regras de manejo para mata ciliar. Afinal, se a produtividade aumenta com mais luz e o microclima fica prejudicado com exagero de luz, a densidade ótima das espécies associadas será |130|

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alcançada por um número de árvores que irá variar dependendo da biomassa presente na formação da copa de cada espécie. A relação Microclima versus Sombreamento não pode ser quebrada, mas pode ser alterada para beneficiar a produtividade, até certo ponto. Como ficou claro aos pesquisadores, o cacau não gosta de sombra, mas tolera, gosta de luz, mas não tolera um microclima quente e seco. Enfim, a intensidade de exploração observada no fundamental e necessário manejo florestal das seis espécies associadas aos povoamentos de cacau nativo vai depender do nicho ecológico do cacau nativo e das características genéticas consideradas prioritárias: produtividade e constância. Reduzir o sombreamento sem afetar microclima do povoamento de cacau, por meio do manejo das seis espécies associadas, para ampliar produtividade do cacau, parece ser a chave para o sucesso da Diretriz III de Manejo. Finalmente, com a definição das diretrizes de manejo que estabeleceram um rumo a seguir e os resultados dos estudos subsidiários, tornou-se possível a concepção de um conjunto de seis protocolos de manejo. Esse conjunto deve ser aplicado segundo um cronograma próprio, mas que, no todo, permitirá ampliar a produção total para 40 toneladas, por meio da ampliação da produtividade por pé de cacau e por povoamento nativo.

PROTOCOLOS DE MANEJO FLORESTAL Cada um, dos seis protocolos citados no Plano de Manejo Florestal, é detalhado a seguir.

I. PODAR GEMAS DE CHUPÕES Objetivo  Restringir a reprodução assexuada do cacau por meio dos chupões. Existe ocorrência elevada de chupão, com índice superior a 90% da taxa de reprodução. O chupão reduz a base genética do povoamento. Com a reprodução por semente, será possível promover a variabilidade e encontrar indivíduos mais produtivos. Descrição  Com uso do terçado, o manejador de cacau realizará cortes da gema dos chupões, no sentido longitudinal do galho, de forma a cortar a gema sem cau-

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sar aberturas profundas no galho, o que facilitaria a entrada de fungos e outros patógenos. A PODA deve ocorrer durante a safra e no exato momento da colheita dos frutos de cacau, isto é, será PODADO o pé de cacau que está sendo colhido, da mesma maneira que estará excluída da PODA a árvore de cacau que, por dificuldade de acesso ou qualquer outra razão, não tenha sido colhida. O único insumo requerido pela PODA é o terçado e os custos para sua realização são reduzidos. Abrangência  Toda área média de 23 hectares ocupada pelo povoamento nativo de cacau deverá ser PODADA, exceto aquela que estiver em pousio, conforme determinação do sexto protocolo. Resultado esperado  Eliminação de 100% das gemas de chupão proeminentes ou já lançadas ao solo, mas que ainda não entraram em contato com a terra e não enraizaram. Taxa zero de ampliação da reprodução por chupões já no primeiro ano de aplicação do protocolo. Manutenção da quantidade de pés de cacau em idade produtiva e que são colhidos e manejados em cada safra, com nenhum tipo de impacto negativo sobre a quantidade produzida de frutos em relação à safra do ano anterior. Grau de dificuldade  Baixa, com pequena exigência de esforço de trabalho, em especial por correr simultaneamente com a coleta do cacau no mesmo pé de cacau que estará sendo PODADO. Operacionalização  Tendo em vista que os chupões precisam de tempo para que as gemas se lancem em direção ao solo, a PODA será realizada a cada dois anos, ano sim, ano não, da seguinte forma: • safra de 2011: PODA de todas as gemas existentes em pé de cacau que está sendo colhido; • safra de 2012: PODA não realizada; • safra de 2013: PODA de todas as gemas existentes em pé de cacau que está sendo colhido; • safra de 2014: PODA não realizada; e • safra de 2015: PODA de todas as gemas existentes em pé de cacau que está sendo colhido. |132|

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Esquema do Primeiro Protocolo – podar gemas de chupões

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II. ABATER CHUPÕES JÁ ENRAIZADOS Objetivo  Reduzir a participação relativa dos chupões na taxa de reprodução do povoamento de cacau nativo, por touceira, minimizando sua importância na composição genética do povoamento de cacau, ao mesmo tempo que favorece a reprodução sexuada por sementes e diversifica a base genética do povoamento. Descrição  No período da safra, com uso do terçado, o manejador de cacau cortará, em cada touceira de cacau que estará sendo colhida, metade dos chupões, os mais novos ou que sejam recém-germinados, naquela touceira. Será ABATIDO somente o chupão de germinação mais recente, que ainda não produziu frutos ou encontra-se em fase inicial de produção. O corte deve ser realizado o mais rente ao solo possível, com cuidado para se evitar a proliferação de patógenos no povoamento. Toda a matéria orgânica ABATIDA oriunda do corte dos chupões deve permanecer no povoamento amontoada no local do corte. Serão ABATIDAS somente as touceiras que estão sendo colhidas; aquelas que, por algum motivo, como acesso, por exemplo, não estiverem sendo colhidas não serão, por oportuno, ABATIDAS. O único insumo requerido para ABATE é o terçado e os custos relacionados ao trabalho do manejador são reduzidos, muito embora sejam superiores ao do primeiro protocolo. Abrangência  Toda área média de 23 hectares ocupada pelo povoamento nativo de cacau deverá ser ABATIDA, exceto aquela que estiver em pousio, onde o manejador não fará atividades em seu interior, conforme determinação do sexto protocolo. Resultado esperado • Eliminação de 50% dos chupões que se encontram em processo produtivo ou que entrariam em produção em breve, por touceira. • Ampliação em 20% de luminosidade no interior do povoamento de cacau nativo, com a abertura de dossel causada pelo ABATE das copas de cacau originadas dos chupões. • Elevação da taxa de germinação de sementes de cacau em igual proporção à taxa de ampliação da luminosidade.

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Esquema do Segundo Protocolo – abater chupões já enraizados

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• Elevação da quantidade de indivíduos de cacau surgidos a partir da reprodução sexuada por sementes. • Redução da quantidade de pés de cacau a serem colhidos no segundo ano depois da aplicação do protocolo, em níveis que não deverão trazer impacto negativo sobre a quantidade produzida de frutos em relação à safra do ano anterior. Grau de dificuldade  Média, com alguma exigência de esforço de trabalho, em especial por ocorrer simultaneamente com a coleta do cacau na mesma touceira que estará sendo ABATIDA. Operacionalização A fim de não comprometer a produtividade do povoamento e, por conseguinte, trazer impacto sobre a safra, a partir do terceiro ano de iniciado o manejo, o ABATE ocorrerá em 50% dos chupões presentes em cada touceira a cada três anos, ano sim, dois anos não, com início na safra seguinte à aplicação do primeiro protocolo, da seguinte forma: • safra de 2011: ABATE não realizado; • safra de 2012: ABATE de 50% dos chupões por touceira colhida; • safra de 2013: ABATE não realizado; • safra de 2014: ABATE não realizado; e • safra de 2015: ABATE de 50% dos chupões por touceira colhida.

III. MARCAR TOUCEIRAS MATRIZES Objetivo  Identificar, selecionar e marcar um total de dez touceiras matrizes de cacau, as mais produtivas, em cada povoamento nativo de cada manejador, para serem usadas como provedoras de sementes. Descrição  Depois da safra, o manejador de cacau deverá selecionar a touceira de cacau que produziu maior quantidade de frutos durante aquela safra. O segundo critério de seleção será a touceira que apresentar menos chupões, caso a produção de frutos não se mostre suficiente para o manejador escolher as 10 touceiras principais.

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Uma vez selecionada a touceira, esta será marcada pelo manejador com fita de identificação fornecida pela Cooperar, para que, posteriormente, um membro da equipe de extensão florestal faça seu georreferenciamento. Na safra seguinte, os frutos dessas matrizes serão coletados pelos extensionistas, para dispersão de sementes entre povoamentos nativos, como prescrito no quarto protocolo, para melhoria das características genéticas dos povoamentos como um todo.

Figura 18: Manejadores selecionados para o quarto protocolo de manejo.

Os frutos oriundos das cem matrizes selecionadas devem ser misturados, ficando sua posterior distribuição nas áreas realizada ao acaso, para evitar tendências de prevalência de uma ou outra matriz em determinada área. O insumo requerido para MARCAR touceiras é uma fita especial que deverá ser fornecida pela Cooperar e os custos para sua realização são reduzidos, limitando-se ao trabalho de seleção realizado pelo produtor. Abrangência  Unidades produtivas de dez manejadores florestais previamente selecionados, sendo que cinco já foram selecionados para o trecho do Purus a partir de Boca do Acre, que inclui as colocações: Boa Hora, Santo Elias, Salpico, Prainha e

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Curitiba, como se pode observar no mapa abaixo; faltando selecionar outros cinco manejadores para o trecho que vai da foz do Rio Iaco até Boca do Acre. Essas dez unidades, bem como as cem matrizes, serão georreferenciadas para registro e fornecimento permanente de sementes para povoamentos nativos de cacau. Resultado esperado  Um total de cem touceiras matrizes de cacau selecionadas, georreferenciadas e marcadas para a produção de sementes de alto valor genético, segundo os critérios de produtividade e de lançamento de chupões. Coleta dos frutos de cacau nas matrizes selecionadas pela equipe de extensionistas da Cooperar, realizada em toda a safra na qual ocorra a aplicação de algum protocolo voltado à redução dos chupões, a partir do segundo ano de aplicação do protocolo de manejo. Grau de dificuldade  Elevada, requerendo treinamento do manejador para compreensão e aplicação dos critérios de seleção das matrizes, bem como com relação às atividades de marcação das matrizes e sua posterior manutenção. O programa de extensão florestal voltado para a aplicação dos protocolos de manejo irá priorizar a qualificação do manejador do cacau. Operacionalização  Depois do término da primeira safra na qual o Plano de Manejo esteja em operação, será possível ao produtor aplicar os critérios de seleção para a escolha das touceiras matrizes. A partir daí, a coleta ocorrerá simultaneamente à aplicação de algum protocolo direcionado à redução dos chupões, da seguinte forma: • safra de 2011: MARCAR touceiras matrizes; • safra de 2012: COLETAR sementes nas matrizes selecionadas; • safra de 2013: COLETAR sementes nas matrizes selecionadas; • safra de 2014: NÃO APLICAR O PROTOCOLO; e • safra de 2015: COLETAR sementes nas matrizes selecionadas.

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Esquema do Terceiro Protocolo – marcar touceiras matrizes

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IV. SEMEAR CACAU Objetivo  Promover a formação de povoamento de cacau nativo com predominância de indivíduos oriundos de sementes de matrizes de alta qualidade, no que se refere à produtividade de frutos de cacau. Com a prevalência de indivíduos de elevada produtividade, será possível ampliar a produção do povoamento como um todo. Descrição  Nos momentos finais da safra, quando a estrutura de logística ainda está funcionando, mas a quantidade de frutos são bem inferiores ao momento de pico, as sementes de cacau colhidas das matrizes serão entregues ao manejador pela Cooperar. Em sua derradeira passagem pelo povoamento nativo, o manejador realizará as semeaduras, enterrando as sementes entre dois e cinco centímetros na terra, exatamente nos locais onde ele realizou o Segundo Protocolo de Manejo. A luminosidade ampliada com a remoção das copas dos chupões já enraizados será providencial para firmamento das mudas originadas nas semeaduras. Um total de três sementes de cacau deverá ser depositado por cova. O insumo requerido para SEMEAR é o espeque, para abertura das covas de semeadura, e os custos para sua realização são relativos ao trabalho do manejador e costumam ser elevados para sua realidade. Abrangência  Em todas as touceiras nas quais se aplicou o Segundo Protocolo de Manejo, de maneira a cobrir toda a área média de 23 hectares ocupada pelo povoamento nativo de cacau que deverá ser SEMEADA. Resultado esperado • Ampliação de 20% na quantidade de indivíduos de cacau reproduzidos por sementes de matrizes selecionadas e de alta produtividade. • Promoção da produção total do povoamento em 20% depois do terceiro ano de aplicação do protocolo. • Melhoria das características genéticas das populações de cacau nativo. Grau de dificuldade  Elevada, exigindo empenho e atenção do manejador na escolha do local a SEMEAR e cuidados no acondicionamento e transporte das sementes das matrizes.

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Esquema do Quarto Protocolo – semear cacau

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Operacionalização  Com a seleção das matrizes realizadas no primeiro ano da safra sob manejo, será possível a aplicação do Quarto Protocolo já no segundo ano, da seguinte forma: • safra de 2011: NÃO APLICAR O PROTOCOLO; • safra de 2012: SEMEAR matrizes; • safra de 2013: SEMEAR matrizes; • safra de 2014: NÃO APLICAR O PROTOCOLO; e • safra de 2015: SEMEAR matrizes.

V. DESBASTAR CACAU SOLTEIRO Objetivo  Eliminar todo cacau solteiro existente no povoamento de cacau nativo, tendo em vista sua pequena produtividade quando comparada à das touceiras, bem como as dificuldades ergonométricas para sua colheita pelo manejador. Descrição  Durante a safra, no exato momento em que o manejador irá fazer a colheita do cacau solteiro, este será DESBASTADO, o que facilitará sobremaneira sua colheita a ser realizada com os frutos no solo. Um corte com terçado à altura aproximada de 20 centímetros do solo, no caule do cacau solteiro, será suficiente para seu DESBASTE. Atenção especial deverá ser dada pelo produtor na realização do corte, uma vez que, quanto menos fraturas ocorrerem menor a chance de invasão de organismos patógenos. Além disso, o potencial de rebrota do cacau solteiro em vários galhos, como em uma touceira, será ampliado por meio de um corte inclinado, contínuo e, o mais importante, a 20 centímetros do solo. A biomassa oriunda no DESBASTE deve ser amontoada próximo ao local do corte, mas nunca sobre o toco do cacau solteiro, que deve estar desobstruído para facilitar possíveis rebrotas. O insumo requerido para DESBASTAR o cacau solteiro é o terçado, por ser mais barato que o emprego da motosserra, que seria ideal para a qualidade do corte. Os custos são relativos ao trabalho do manejador e são baixos, considerando as facilidades acarretadas para coleta dos frutos. Abrangência  Em toda área média de 23 hectares nas quais existam cacau solteiro, deverá ocorrer DESBASTE.

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Esquema do Quinto Protocolo – desbastar cacau solteiro

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Resultado esperado • Ampliação de abertura de luminosidade para a consolidação do favorecimento de touceiras. • Ampliação da produção com a eliminação da baixa produtividade do cacau solteiro, considerando a quantidade de frutos por indivíduo. • Facilitação da coleta por meio da prioridade na formação de touceiras baixas e bem ramificadas, com alta biomassa. Grau de dificuldade  Elevada, exigindo esforço do manejador para DESBASTE do cacau solteiro. Operacionalização  Tendo em vista a média ocorrência de indivíduos de cacau do tipo solteiro, a aplicação do Quinto Protocolo no primeiro deverá ser suficiente, com uma reaplicação posterior, da seguinte forma: • safra de 2011: DESBASTAR todo cacau solteiro; • safra de 2012: NÃO APLICAR O PROTOCOLO; • safra de 2013: NÃO APLICAR O PROTOCOLO; • safra de 2014: NÃO APLICAR O PROTOCOLO; e • safra de 2015: DESBASTAR todo cacau solteiro.

VI. POUSIO PRODUTIVO Objetivo  Promover as características ecológicas do povoamento por meio da permanência de porção equivalente a 10% ou, em média, 2,3 hectares da área total do povoamento nativo em sistema de rodízio de POUSIO. Descrição  Com assessoramento dos extensionistas florestais da Cooperar, uma área média de 2,3 hectares será identificada e sinalizada no interior do povoamento de cacau nativo. No primeiro ano de execução do plano, logo depois do encerramento da safra, os manejadores, juntamente com a Cooperar, realizarão o inventário das árvores das seis espécies associadas presentes no povoamento, com a marcação dos indivíduos de mulateiro que deverão ser explorados no ano seguinte. As |144|

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prescrições de manejo das espécies associadas são apresentadas em separado, logo a seguir. Depois de elaborado o mapeamento das árvores de mulateiro a serem exploradas, com seu georreferenciamento e localização, o órgão de controle ambiental deverá licenciar o abate. A porção de área na qual o mulateiro foi explorado permanecerá sob POUSIO durante os dois anos seguintes, sendo a partir daí reincorporada ao processo produtivo do cacau. No período de POUSIO, o manejador guardará para que não haja qualquer tipo de processo produtivo na área, bem como circulação de pessoas. Também não ocorrerá aplicação de nenhum outro Protocolo de Manejo. Simultaneamente à exploração, uma nova porção de 2,3 hectares estará sendo inventariada para exploração no ano seguinte, de maneira que o produtor sempre terá um ganho adicional com a exploração das espécies associadas para compensar o POUSIO da área de cacau. Essa nova área a entrar em POUSIO não deverá ser contínua à que está em processo de exploração naquele momento, sendo ideal uma localização no outro extremo do povoamento de cacau nativo. Os insumos requeridos para determinação do POUSIO envolvem o trabalho do manejador e a assistência técnica, que deverá ser provida pela Cooperar, com seus custos cobertos pela exploração das espécies associadas. Abrangência   Inicialmente, as 10 colocações selecionadas no Terceiro Protocolo de Manejo serão as mesmas nas quais se realizarão o POUSIO e a exploração das espécies associadas. Paulatinamente e segundo planejamento discutido entre a Cooperar e os manejadores envolvidos, novas áreas serão incorporadas ao manejo das espécies associadas. Resultado esperado • Melhoria das características ecológicas do povoamento de cacau nativo como um todo, mediante atração de fauna silvestre para a área de POUSIO. • Ampliação da produtividade do cacau nativo decorrente do aumento de almofadas florais na floração e consequente frutificação. • Delimitação de áreas de pousio anual para atração de fauna, de polinizadores e regeneração natural, a fim de promover a produtividade natural do povoamento. Manejo florestal comunitário

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Esquema do Sexto Protocolo – pousio produtivo

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• Promoção da dispersão do cacau nativo por meio da atração de uma variada fauna silvestre para o interior do povoamento. Grau de dificuldade  Elevada, exigindo esforço do manejador e da Cooperar, havendo compensação com ganhos financeiros advindos da exploração do mulateiro e das outras espécies associadas. Operacionalização   Tendo em vista a aplicação inicial do POUSIO em unidades produtivas selecionadas, para posterior e paulatina ampliação entre os manejadores, o SEXTO PROTOCOLO irá requerer um planejamento rigoroso, da seguinte forma: • safra de 2011: Identificação e mapeamento das áreas de POUSIO, nas propriedades selecionadas; • safra de 2012: Inventário e marcação das árvores de mulateiro a serem exploradas; • safra de 2013: Exploração das árvores de mulateiro, em cada uma das 10 propriedades, • safra de 2014: POUSIO; e • safra de 2015: POUSIO.

MANEJO DAS ESPÉCIES ASSOCIADAS Um conjunto de seis espécies arbóreas foi mapeado pelo Inventário Florestal, considerando estas as mais importantes para o sombreamento do cacau e a consequente manutenção do microclima requerido pela espécie. É importante esclarecer que a lista das seis espécies consideradas de maior importância foi composta a partir da análise das variáveis: frequência (que detecta quantas árvores da espécie ocorrem em cada hectare do povoamento nativo de cacau); densidade (que mede a área ocupada pela espécie em cada hectare de cacau nativo, fornecendo ao mesmo tempo uma ideia clara do diâmetro, ou da grossura, como dizem os manejadores, do caule que as árvores daquela espécie possuem), e dominância (que mede o quanto do volume de biomassa

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existente em um hectare é representado pelas árvores daquela espécie, também permitindo uma ideia clara da altura que as árvores daquela espécie alcançam). Essas varáveis, em conjunto, formam o indicador denominado Índice de Valor de Importância, ou IVI, que mede a relação entre elas, as variáveis, o que permite classificar cada espécie existente no povoamento nativo do cacau, de acordo com sua importância para o povoamento. Para se ter uma ideia das principais características das seis espécies associadas ao povoamento nativo de cacau, a sessão Características das espécies associadas ao cacau nativo do Purus, a seguir, apresenta a descrição botânica, a fenologia, aocorrência e os usos de cada uma. É fácil notar que as espécies mulateiro, matá-matá e a abiurana são, respectivamente, muito, médio e pouco demandadas pelo mercado de madeiras. Ao mesmo tempo que as outras três espécies, embaúba, fícus e ingá, praticamente, por ora, não são buscadas para atendimento ao mercado de madeiras. As decisões de manejo florestal para as espécies associadas consideraram as informações a seguir, o que permitiu a definição de quatro critérios de manejo que, depois de aplicados, contribuíram para o cálculo das intensidades de exploração para cada espécie, bem como em que momento seu manejo deveria ser executado. Os quesitos diretamente vinculados ao sombreamento do cacau e a manutenção do micloclima exigido pelo cacau pesaram fortemente nas decisões de manejo. Como se verá, a fonologia, por exemplo, de todas as seis espécies, diferem do cacau na época de floração e de frutificação. Ou seja, no momento em que o cacau lança as almofadas de flores, as outras espécies já completaram seu ciclo reprodutivo, isto é, o cacau frutifica praticamente sozinho. Essa é uma informação crucial para confirmar a importância do Sexto Protocolo de Manejo, tanto no que se refere à manutenção da área do povoamento nativo de cacau sob POUSIO quanto para a exploração de alguma espécie associada, uma vez que não haverá comprometimento da oferta de alimentação, sementes e flores para a fauna ali existente. Com relação à ocorrência, todas as espécies são comuns em mata ciliar da hidrografia amazônica. Já com relação aos usos, é importante notar que todas as espécies possuem elevado potencial para uma variedade de empregos, muito embora o mercado, atualmente, valorize apenas o mulateiro. Essa informação |148|

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contribuiu para a decisão de iniciar o manejo das espécies associadas pelo mulateiro e deixar as outras, em especial a matá-matá e a abiurana, para um segundo ciclo de manejo das espécies associadas.

CARACTERÍSTICAS DAS ESPÉCIES ASSOCIADAS AO CACAU NATIVO DO PURUS Espécie | Eschweilera odorata, ou Matá-matá Descrição botânica  Altura de 15-35 m, com copa globosa e densa. Tronco ereto e cilíndrico, frequentemente com sapopemas de 50-90 cm de diâmetro, casca pouco fissurada, descamando em placas irregulares, de cor amarelo-esbranquiçada no corte. Folhas simples, alternas, cartáceas, glabras, com 9-16 pares de nervuras laterais, com margens inteiras, de 10-25 cm de comprimento por 5-12 cm de largura, sobre pecíolo de 5-14 cm de comprimento. Inflorescências peniculadas terminais e axilares, com flores perfumadas de cor branca ou amarelada. Fruto pixídio lenhoso deiscente, com 2-6 sementes, contendo 1-5 sementes. Fenologia  Floresce principalmente durante os meses de agosto a dezembro e os frutos amadurecem de março a junho. Ocorrência  Região Amazônica, tanto em florestas de terra firme quanto naquelas periodicamente inundadas. Também nas Guianas, Venezuela e Colômbia. Usos  A maioria é indicada para a construção civil, como caibros e vigas, para postes, cabos de ferramentas, tacos para assoalhos e marcenaria em geral. As sementes são oleaginosas e avidamente procuradas por animais selvagens. A árvore pode ser aproveitada para reflorestamentos e arborização rural. Espécie | Pouteria venosa (Mart.) Beehi, ou Abiurana Descrição botânica  Planta lactescente de 12-24 m de altura, dotada de copa arredondada e densa. Tronco ereto e cilíndrico, de 30-60 cm de diâmetro, com casca rugosa e partida, com descamamento em placas compridas. Folhas simples, alternas espiraladas, concentrada na extremidade dos ramos, cartáceas, glabras, com 8-14 pares de nervuras secundárias, de 7-21 cm de comprimento por 2,5-8,0 cm de largura, sobre pecíolo canaliculado de 0,5-3,0 cm. Inflores-

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cências em fascículos com 1-6 flores bissexuais. Fruto baga globosa apiculada, de 4-8 cm de diâmetro, com polpa carnosa e amilácea, com 1-3 sementes. Fenologia  Floresce em épocas variadas do ano, dependendo da região. Na costa sudeste, predomina nos meses janeiro-fevereiro e os frutos amadurecem de agosto a setembro. Ocorrência  Região Amazônica e costa sudeste do País (BA até SC), nas matas pluviais Amazônica e Atlântica. Também na Venezuela e Guianas. Usos  A madeira é indicada para a construção civil, como caibros, vigas e esteios; para obras externas, como moirões, dormentes e cruzetas. Os frutos são comestíveis e também muito procurados por aves e roedores. Espécie | Inga cylindrica (Vell.) Mart., ou Ingá Descrição botânica  Altura de 8-18 m, dotada de copa globosa pequena. Tronco ereto e cilíndrico, com casca fina e rugosa. Folhas alternas, compostas pinadas, com eixo comum (pecíolo + raque) pubérulo ou glabro de 7-14 cm de comprimento. Folíolos opostos quase sésseis, em número de 3-5 pares, inflorescências em espigas congestas, solitárias ou agrupadas nas axilas foliares. Fruto-legume indeiscente, ereto, glabro, achatado, inicialmente, e depois tornando-se bastante engrossado em volta das sementes envoltas por arilo branco e muito adocicado. Fenologia  Floresce durante os meses janeiro-fevereiro. Os frutos amadurecem em agosto-setembro. Ocorrência  Região Amazônica. Goiás e na costa leste do País, desde o sul da Bahia até o Rio de Janeiro, na mata ciliar. Também na Bolívia e no Peru. Usos  A madeira é empregada apenas localmente para uso interno em construção civil e para lenha e carvão. Os frutos são comestíveis e muito procurados por pássaros, principalmente periquitos e papagaios. Espécie | Calycophyllum spruceanum, ou Mulateiro Descrição botânica  Altura de 20-30 m, com tronco retilíneo ramificado somente na ponta, de 30-40 cm de diâmetro. Folhas simples, glabras, de 9-17 cm de comprimento por 6-7 cm de largura. Fenologia  Floresce durante os meses de junho-julho. A maturação dos frutos ocorre nos meses de outubro-novembro. Ocorrência  Região Amazônica, na mata de várzea periodicamente inundada, nas margens dos rios. |150|

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Usos  A madeira é empregada para marcenaria, confecção de esquadrias, cabos de ferramentas e artigos torneados. A árvore possui tronco liso muito decorativo. Pode ser empregada com sucesso no paisagismo, principalmente para formação de aleias e alamedas. Indicada também para plantios mistos em áreas ciliares degradadas. Espécie | Cecropia sciadophylla Mart., ou Embaúba Descrição botânica  Planta dioica, de 5-7 m de altura, dotada de copa mais ou menos corimbiforme. Tronco ereto e cilíndrico, fistuloso e com formigas no seu interior, de 15-25 cm de diâmetro, com casca lisa marcada pelas cicatrizes das antigas estípulas e pecíolos. Folhas alternas, simples, peltadas, tri ou pentalobadas, de 20-34 cm de diâmetro, longo-pecíoladas, coriáceas, discolores, ásperas e glabras na face superior e esparso-pubescentes na inferior, com a parte inferior das folhas novas e a espata terminal de cor vermelha ou púrpura. Infrutescência cilíndrica resultante da fusão dos frutos, de polpa carnosa e adocicada quando madura, de 10-15 cm de comprimento. Fenologia  Floresce durante um longo período do ano, predominando nos meses de fevereiro-maio. Os frutos amadurecem em dezembro-janeiro. Ocorrência  Região Amazônica, na mata pluvial de terra firme, entretanto, pode também ser encontrada no Triângulo Mineiro e sul de Goiás, onde talvez tenha sido introduzida. Também na América Central. Usos  A madeira é empregada localmente para a confecção de gamelas e recipientes e pouco comercialmente para caixotaria, miolo de portas e painéis e para a confecção de placas de partículas e contraplacados. Os frutos são procurados por pássaros. Espécie | Ficus catappifolia Kunth & Bouché, ou Ficus Descrição botânica  Altura de 8-16 m, dotada de copa globosa ampla e densa. Tronco curto e profundamente sulcado, de 50-90 cm de diâmetro, com casca rugosa grisácia. Folhas simples, alternas, inteiras, coriáceas, levemente discolores, glabras em ambas as faces, de 15-38 cm de comprimento por 5-15 cm de largura, sobre pecíolo glabro de 10-25 cm de comprimento, com a nervura principal de cor mais clara e saliente na face inferir, com 10-13 pares de nervuras secundárias bem visíveis. Fruto sincônio (figo) elipsoide, de 1-2 cm de

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diâmetro, pubérulos e de cor avermelhada quando maduros, reunidos em aglomerados axilares. Fenologia  Floresce durante os meses de agosto-setembro. Os frutos amadurecem de setembro a outubro. Ocorrência  Região Amazônica, principalmente no Amazonas, Pará e no Pantanal Mato-grossense, em matas de terrenos inundáveis. Usos  A madeira é empregada apenas e em menor grau para caixotaria e como matéria-prima para a confecção de chapas de partículas. Os frutos são avidamente consumidos por pássaros, sendo, por isso, importante para o ecossistema. Sua copa densa fornece elevado sombreamento.

CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DA ESPÉCIE DE REFERÊNCIA, CACAU NATIVO DO PURUS Espécie | Theobroma cacao, ou Cacau Descrição botânica Altura entre 4-6 m , com tronco de 20-30 cm de diâmetro. Folhas simples, pendentes com 15-25 cm de comprimento e pecíolo de 1-3 cm. De madeira clara e de cor branca. Fenologia  Floresce duas vezes ao ano, porém, com maior intensidade nos meses de dezembro-abril. A maturação dos frutos também ocorre duas vezes ao ano, principalmente no período de abril-setembro. Ocorrência  Toda a região Amazônica, em área de mata ciliar ou alagada periodicamente. Usos  Madeira utilizada apenas localmente para lenha e carvão. Os frutos são comestíveis, tanto in natura quanto industrializados. In natura, sua polpa é utilizada para o preparo de refrescos e licores. Seu principal valor está nas sementes, transformadas industrialmente no chocolate e consumido em todo o mundo. O Brasil é o maior produtor mundial de cacau, que é exportado na forma de sementes secas.

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DECISÕES DE MANEJO RELACIONADAS ÀS ESPÉCIES ASSOCIADAS Para determinar a intensidade e a cronologia de exploração das seis espécies associadas, além dos quesitos relacionados no anteriormente, também foi necessário definir os critérios de manejo, que, por sua vez, dependiam dos indicadores florestais de cada espécie em comparação com os da espécie de referência: o cacau nativo. Nos quadros 1 e 2, a seguir, estão agrupados os seguintes indicadores:

I. Densidade Relativa Mede o percentual entre a área total ocupada por todas as árvores daquela espécie, existentes em 1 hectare de povoamento de cacau nativo, fornecendo, assim, uma dimensão do diâmetro das árvores daquela espécie. Uma elevada densidade relativa significa que aquela espécie possui elevada frequência ou árvores com tronco de diâmetros igualmente elevados, em comparação com as demais.

II. Frequência Relativa Mede o percentual entre a quantidade de árvores daquela espécie existente em 1 hectare de povoamento nativo de cacau, em relação à quantidade total de árvores ali existentes.

III. Dominância Relativa Mede o percentual entre o volume de biomassa de todas as árvores daquela espécie existente em 1 hectare de povoamento nativo, em relação ao volume total de biomassa ali existente. Fornece também uma dimensão da altura das árvores daquela espécie.

IV. Índice de Valor de Importância – IVI Proporciona medir a relação existente entre as variáveis anteriores (densidade, frequência e dominância), agrupando-as para fornecer uma referência da importância daquela espécie em relação a 100% de importância para todas as espécies somadas.

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Para permitir a tomada de decisões de manejo relacionadas a cada uma das espécies associadas, seus indicadores florestais foram comparados, em um primeiro momento, entre si, quando foi possível aferir o potencial produtivo, econômico e ecológico de cada uma, classificando aquelas que poderiam, segundo a realidade tecnológica e a de mercado atuais, entrar imediatamente em exploração e as que, por outro lado, deveriam aguardar ou outros ciclos de corte ou rotações, no futuro. Posteriormente, em um segundo momento, os mesmos indicadores florestais também foram calculados para a espécie de referência, no caso o cacau nativo, a fim de fornecer parâmetros comparativos entre as espécies associadas e o cacau nativo, cuja ampliação da produtividade para 40 toneladas é o principal objetivo do Plano de Manejo. Ou seja, as decisões relacionadas ao manejo de cada uma das espécies associadas e apresentadas adiante consideraram a performance da própria espécie, sua relação de importância com as outras cinco espécies associadas e, por fim, sua proximidade com os indicadores calculados para o cacau (conforme Quadros 1 e 2). Como se verá, algumas decisões de manejo privilegiaram e tiveram que reconhecer a elevada importância que a percepção dos agentes econômicos e atores sociais assumem na realidade local, em especial com relação às espécies madeireiras, como, por exemplo, no caso do mulateiro; e outras decisões puderam dar maior valor à importância da espécie para atração da fauna, como no caso do fícus. No entanto, todas as decisões de manejo, sem exceção, favorecem a produtividade do cacau nativo.

Quadro 1: Principais indicadores florestais para as espécies associadas ao cacau nativo Espécie Abiurana

Densidade Relativa (%)

Frequência Relativa (%)

Dominância Relativa (%)

IVI (%)

6,46

5,78

7,90

19,97

Mata-matá

10,65

4,89

5,70

20,90

Mulateiro

3,66

4,00

6,70

14,37

Ficus

2,27

2,77

12,93

17,87

Ingá

4,01

2,77

4,00

11,00

Embaúba

2,97

1,78

4,10

10,00

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Quadro 2: Principais indicadores florestais para o cacau nativo Espécie

Densidade Relativa (%)

Cacau

12,04

Frequência Relativa (%)

Dominância Relativa (%) 4,00

IVI (%)

2,00

18,02

CRITÉRIOS DE MANEJO FLORESTAL PARA AS ESPÉCIES ASSOCIADAS AO POVOAMENTO NATIVO DE CACAU A partir das análises das informações, a equipe envolvida na elaboração do Plano de Manejo conseguiu definir os seguintes critérios para a definição do manejo florestal a ser praticado para as espécies arbóreas associadas.

Critério I  Taxa de Frequência Relativa Descrição  Nenhuma espécie pode ter maior Frequência Relativa do que o cacau. Detalhamento  Significa afirmar que, uma vez que a quantidade de pés de cacau por hectare representa 4% do total de árvores existentes no interior do povoamento de cacau nativo, essa participação relativa deve ser considerada limite para a ocorrência de todas as espécies arbóreas. Em uma linguagem menos técnica, nenhuma espécie poderá apresentar mais árvores do que o cacau, no interior do povoamento. Onde houver cacau, este terá que ser, necessariamente, a maioria. Ao limitar a quantidade das árvores de uma mesma espécie em 4% do total, a abiurana e a matá-matá teriam que ser exploradas para reduzir sua quantidade por hectare à mesma quantidade de pés de cacau.

Critério II  Taxa de Dominância Relativa Descrição  Todas as espécies devem ter mais que o triplo da Dominância Relativa do cacau ou mais que o dobro da altura. Detalhamento  Tendo em vista que o cacau representa 2% do volume de biomassa presente no volume total de biomassa do povoamento nativo e que essa dominância está relacionada diretamente ao porte alcançado pela espécie, o Manejo florestal comunitário

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que, por sua vez, determina a intensidade de sombreamento e as características do microclima requeridas pelo cacau; quanto maior a dominância das espécies arbóreas sobre o cacau melhor para sua produtividade. Ocorre que, uma vez limitada a Frequência Relativa em 4% para todas as espécies, de acordo com o critério anterior, espera-se que a ampliação da dominância priorize a permanência de árvores com maior porte possível, entendendo porte pela associação da variável altura com densidade. Em uma linguagem menos técnica, árvores que são somente um pouco mais altas que o cacau, nas quais a galhada da copa está bem próximo à copa do cacau, devem ser, todas, exploradas. Abafar mais que sombrear as espécies com dominância próximo à do cacau, não contribui para um microclima propício, além de reduzir a produtividade do cacau, que depende de mais luz. Ao estabelecer o limite mínimo de dominância de cada espécie ao triplo do cacau, as árvores conhecidas como ingá e embaúba, presentes no povoamento, devem ser todas exploradas.

Critério III  Similaridade de IVI Descrição  Todas as espécies devem pertencer à mesma classe de IVI que o cacau. Detalhamento  Uma vez que o IVI relaciona a frequência com a densidade e a dominância, e considerando também que os dois primeiros critérios estabeleceram os limites máximo e mínimo para frequência e dominância, respectivamente, a exigência para que todas as espécies pertençam à mesma classe de IVI do cacau diz respeito à garantia das características ecológicas do povoamento e à consequente ampliação da produtividade do cacau nativo. É simples compreender que se as espécies não poderão apresentar mais árvores que a quantidade existente de cacau, primeiro critério, da mesma forma que não deverão ter altura próxima às do cacau, segundo critério, ao mesmo tempo que seus índices de valor de importância, terceiro critério, são similares, a prioridade é manter árvores que sombreiam, sem excesso, e não acarretam excesso de umidade no microclima requerido pelo cacau. Em uma linguagem menos técnica, o ideal para associação ao cacau em seu povoamento nativo é que as árvores sejam finas, bem altas, poucas e com as copas densas.

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Ao amarrar a ocorrência das espécies à classe de IVI do cacau, depois de os critérios anteriores estabelecerem limites para frequência e dominância, elevaram-se à condição de espécies preferenciais, para sombreamento e manutenção do microclima no povoamento de cacau, as árvores de fícus, que, por isso, não podem ser exploradas e, logo, devem ser todas mantidas.

Critério IV  IVI mínimo Descrição  Nenhuma espécie deve pertencer à classe imediatamente inferior à classe de IVI do cacau. Detalhamento  As espécies que pertencem à classe de IVI imediatamente abaixo à do cacau, desde que aprovadas nos dois primeiros critérios, possuem, no conjunto, características que inibem a produtividade do cacau, tanto no que se refere à quantidade de luz quanto ao microclima. Ocorre que nessa classe de IVI as espécies não possuem altura suficiente que lhes permita o afastamento esperado das copas do cacau, ao mesmo tempo que possuem copa e fuste fartos em biomassa. Não há, como algum leigo poderá apreender, uma sequencia natural que faz com que uma espécie passe de uma classe para outra de IVI. As espécies, quando adultas, não alteram sua classe de IVI e por isso esse indicador é crucial. Em uma linguagem menos técnica, tratam-se de árvores com altura média, muito grossas no caule, com copa cheia de galhos e folhas, e que, por isso, atrapalham a sombra feita pelas árvores mais altas, o que é ideal para a produção de frutos do povoamento de cacau. Ao impedir a existência de árvores dentro do povoamento de cacau que pertençam à classe imediatamente inferior ao do IVI do cacau, os indivíduos de mulateiro deverão ser todos explorados. E, considerando o interesse do mercado pelo mulateiro, iniciar o manejo florestal por essa espécie, como previsto no SEXTO PROTOCOLO de manejo do cacau, atende às diretrizes de manejo aqui preconizadas. A definição de cada critério trouxe implicações diretas para o manejo florestal de cada uma das espécies associadas, uma vez que os quatro critérios somados devem melhorar as características ecológicas do povoamento nativo de cacau,

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tornando o microclima propício a sua consolidação, com fortalecimento de cada indivíduo de cacau isoladamente e da população como um todo. Espera-se, por meio da aplicação dos critérios de manejo para as espécies associadas e, claro, dos seis protocolos de manejo para o cacau, a formação de um povoamento de cacau nativo com mais vigor genético, com maior quantidade de indivíduos por hectare, com menos competição entre o cacau e outras espécies, com indivíduos aptos a produzirem mais frutos e, assim, alcançar as 40 toneladas de sementes secas a serem produzidas por safra de cacau. No quadro abaixo, são explicitadas todas as implicações que cada critério, isoladamente, acarretou para as decisões de manejo florestal de cada uma das seis espécies arbóreas associadas ao cacau nativo. É importante compreender que as intervenções com relação à quantidade de árvores de cada espécie dizem respeito a sua distribuição no interior do povoamento de cacau nativo, isto é, não se trata do manejo florestal da espécie para a mata ciliar do Purus, mas, única, exclusivamente, com relação às árvores que existem no interior do povoamento de cacau. Quadro 3: Implicações para os critérios do MFC do cacau nativo nas decisões de manejo florestal de cada espécie arbórea associada ao povoamento Espécies arbóreas associadas Matá-matá Abiurana

Critérios Taxa de Frequência Relativa Redução de 30% das árvores Redução de 50% das árvores

Taxa de Dominância Relativa

IVI Mínimo

Não se aplica

Não se aplica Não se aplica

Não se aplica

Não se aplica Não se aplica

Redução de 100% das árvores Redução de 100% das árvores

Ingá

Não se aplica

Embaúba

Não se aplica

Ficus

Não se aplica

Não se aplica

Mulateiro

Não se aplica

Não se aplica

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Similaridade de IVI

Não se aplica Não se aplica

Não se aplica Não se aplica Manutenção de 100% das Não se aplica árvores Exploração Não se aplica de 100% das árvores

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Tendo em vista que as operações de manejo florestal relacionadas à intensidade de exploração de cada espécie arbórea associada ocorrerão segundo o que estabelece o SEXTO PROTOCOLO do MFC do cacau nativo, nas porções do povoamento nativo de cacau a serem submetidas ao POUSIO produtivo de cacau, o quadro abaixo apresenta a cronologia de aplicação das ações de manejo florestal, assumindo que a execução do plano terá início no ano de 2011. Quadro 4: Cronologia de aplicação das atividades de manejo florestal para cada espécie arbórea associada nas áreas sob pousio e de acordo com o sexto protocolo de manejo florestal comunitário para o povoamento do cacau nativo no Purus Espécies arbóreas associadas

Ações de manejo florestal nas áreas do SEXTO PROTOCOLO 2011 Pousio NO1

2012 Pousio NO1

2013 Pousio NO2

2014 Pousio NO2

Matá-matá

Abiurana

2015 Pousio NO3

Ingá Embaúba Fícus Mulateiro Legenda Georreferenciamento e plaqueteamento das árvores Exploração de 100% das árvores

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O procedimento se repetirá até que seja concluída uma rotação ou ciclo de corte das espécies associadas existentes em 10 áreas de POUSIO, o que levará um prazo de 20 anos, uma vez que cada POUSIO tem duração de 2 anos. Dessa maneira, no primeiro ano, a área destinada à aplicação do SEXTO PROTOCOLO e ao consequente POUSIO será demarcada no campo e as árvores das seis espécies arbóreas associadas serão inventariadas e plaqueteadas. No entanto, essas atividades serão realizadas logo depois da conclusão da safra de cacau nativo, com a participação do manejador e suporte técnico da Cooperar. Note-se que as espécies matá-matá e abiurana, que possuem potencial de mercado, muito embora na atualidade não sejam ainda demandadas, serão inventariadas e marcadas para participar do processo produtivo somente no segundo ciclo de corte, quando não haverá árvores de mulateiro para serem exploradas. Significa que, para evitar prejuízos do manejador, que terá que abrir mão de uma boa extensão de área de coleta equivalente a 10% de seu povoamento, cada área de POUSIO estará excluída do processo produtivo do cacau nativo somente por um ano, no caso, o segundo ano. Sendo o primeiro ano em cada área de POUSIO destinado ao Inventário Florestal e marcação das árvores; o segundo ano de aplicação das técnicas de manejo florestal para espécies associadas é o momento no qual ocorrerá o abate de todas as árvores de mulateiro (espécie que poderá ser comercializada a preços que compensam a ociosidade da área de colheita de cacau e pode custear todas as ações de MFC do cacau), todas de Ingá (espécie que poderá ser usada em construções na própria unidade produtiva do manejador) e todas as embaúbas (espécie que pode ser deixada como matéria orgânica no próprio povoamento de cacau nativo). O procedimento se repete até que seja realizado na décima área, equivalente a 2,3 hectares, destinada ao SEXTO PROTOCOLO. Ao concluir o décimo POUSIO, as atividades de manejo florestal serão realizadas novamente, em um novo segundo ciclo de corte que terá início na primeira área submetida ao POUSIO, no início do plano de manejo. Depois da primeira revisão do plano, prevista para 2015, será possível determinar a conveniência em se manter a cronologia adotada. Nesse momento também será avaliada a existência ou não de demanda comercial, para que as outras espécies arbóreas, matá-matá e abiurana, entrem no processo de exploração durante o segundo ciclo de corte. |160|

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Um cronograma completo para as atividades relacionadas aos protocolos de manejo do cacau e àquelas necessárias à execução do manejo florestal das espécies associadas é apresentado a seguir, na terceira e última parte deste livro, em que é apresentado o Programa de Extensão Florestal requerido para fazer com que o manejador florestal adote e assuma o Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo, como melhor opção produtiva para sua colocação.

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Parte 3 Programa de Extens達o Florestal



Devido à complexidade do plano, seria incorreto supor que o manejador do cacau poderia entender as propostas aqui contidas e, o principal, encampar a execução no seu cotidiano produtivo. O objetivo principal do programa de extensão florestal será traduzir a rica, e necessária, diga-se, linguagem técnica empregada em sua elaboração para o universo do conhecimento e da realidade popular. Pretende-se, com o emprego de técnicas de extensão florestal, que o manejador se envolva diretamente, como vem acontecendo desde o início do projeto, na concepção do programa de extensão, na elaboração do material de apoio didático, na realização dos treinamentos e, por fim, na multiplicação das ações do plano para todas as áreas de manejo do cacau do Purus. A experiência tem demonstrado que o manejador, sempre que é instado a se envolver, responde com rapidez e de maneira satisfatória. Na realização da série de estudos, cujas sínteses compõem a primeira parte deste livro, os manejadores participaram tanto das discussões acerca da definição das metodologias de levantamentos quanto da medição e coleta dos dados no campo. Seu conhecimento empírico sobre a realidade florestal local, seu domínio sobre as condições de logística nas duas principais condições climáticas anuais, seca e chuva, o conhecimento pessoal travado com os outros manejadores e, enfim, a dedicação pura para que tudo dê certo, mesmo sob condições precárias de ergonometria em suas atividades, tornam o envolvimento do produtor condição especial para o sucesso do plano de manejo. Por outro lado e não menos importante, é no trabalho do manejador que circunscreve o aspecto-chave do plano. Sem ele não haveria produção e a de-

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manda por seu planejamento, como será para ele também que toda qualificação será dirigida. Para executar as atividades previstas no plano e se beneficiar de seus retornos, que se espera surgirem no curto prazo, o manejador terá que ser, em conjunto com a Cooperar, mais que um executor, um entusiasta do plano da manejo. Um período de três anos está previsto para ser colocado em prática um conjunto de ações de extensão florestal. Nesse período, no qual o plano de manejo estará sendo executado com os cinco manejadores considerados prioritários e já selecionados durante a elaboração do plano, a extensão irá propiciar a identificação dos novos manejadores a serem, paulatinamente, envolvidos nas ações de manejo. Ao final dos três anos de execução do Programa de Extensão, espera-se que 80% dos manejadores florestais estejam familiarizados com as técnicas de manejo florestal para o cacau nativo e em processo de sua aplicação em seu povoamento. Um conjunto de material de apoio deverá ser elaborado para atender aos requisitos da qualificação. Para cada dos seis PROTOCOLOS DE MANEJO, será necessário elaborar um Kit de apoio didático – composto por cartilha, folder, banner e cartaz – a ser usado no treinamento de cada PROTOCOLO DE MANEJO. A população de manejadores que irá participar do Programa de Extensão, sobretudo dos seis treinamentos, um para cada PROTOCOLO DE MANEJO, soma as atuais 300 famílias de pequenos produtores familiares sócios da Cooperar. A ampliação desse coletivo dependerá da capacidade da Cooperar em captar recursos para a extensão florestal do cacau. A primeira decisão importante para o Programa de Extensão foi o enquadramento das propostas do Plano de Manejo no universo tecnológico atualmente presente na Amazônia, o que levou a equipe à análise da tecnologia do Manejo Florestal Comunitário, como discutido a seguir.

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MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO COMO SOLUÇÃO TECNOLÓGICA PARA AMPLIAR A PRODUTIVIDADE DO CACAU NATIVO DO PURUS A opção pela adoção da tecnologia do MFC como referência para ampliar a produção de sementes de cacau para 40 toneladas por ano, objetivo principal do plano, sustenta-se nos resultados observados em experiências realizadas, em especial no Acre, nos últimos 20 anos, onde se aplicou a tecnologia para oferta de produtos florestais variados, como: madeira, fauna silvestre, copaíba e sementes florestais. O primeiro ponto importante é conseguir caracterizar o MFC como uma tecnologia e não como medidor para a escala na qual a produção de determinado bem ou serviço florestal será praticada. Acontece que é comum identificar o MFC como sendo de pouca intensidade de exploração o que, por sinal, atrai um número elevado de técnicos e ativistas que atuam na área ambiental e que cometem o equívoco de associar produção comunitária com pouca produção, o que, novo equívoco, significaria pouco impacto na floresta. Algo que realmente pode ocorrer, mas que não é uma condição. Produção florestal realizada sob pequena escala não significa necessariamente ausência de impacto ou menor impacto na floresta, da mesma maneira que uma produção em larga escala também não significa muito impacto. Existem técnicas de manejo florestal para a pequena e para a grande escala e o emprego dessas técnicas é que irá distinguir o tamanho do estrago ocorrido na floresta. Da mesma forma os técnicos e ativistas, que atuam na área social, cometem o igual equívoco de associar produção comunitária com benefícios gerados para a coletividade, em prol do bem comum, o que resultaria em maior preocupação com a manutenção da floresta, considerada o patrimônio coletivo mais importante para quem vive no seu interior. Algo que pode acontecer, mas que não é condição. A tragédia dos comuns foi exemplarmente detalhada por Garret Hardin, ainda no final do século dezoito, deixando claro que a existência de regras de manejo florestal rígidas e que devem ser seguidas por todos, inclusive com imposição de punições, é que pode garantir a manutenção do recurso objeto de exploração, quer esse manejo seja realizado por um indivíduo, empresa ou comunidade.

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Sem embargo do altruísmo que as comunidades possam ter, a produção comunitária precisa e deve ser pautada pelo lucro. Pode até ser que a busca pelo ganho, para que as despesas sejam menos possível que as receitas, ocorra com menor agressividade do que quando buscado pela empresa, mas isso não é o melhor para ninguém. Ao contrário, a lista de empreendimentos geridos de forma coletiva criados com recursos públicos e voltados à produção de borracha, somente para citar um exemplo, aumenta a cada dia. Gestão coletiva de empreendimentos florestais, quando consegue se consolidar, é uma raridade, o normal é quebrar. E uma das principais razões das quebradeiras em série é, claro, a dificuldade para obter lucros. Quando muito conseguem pagar as despesas, mas, distribuir dividendos aos associados, algo de fundamental significado, não ocorre. Mas, deixando de lado os preconceitos comuns em ativistas sociais e ambientais, tratar o Manejo Florestal Comunitário como tecnologia requereu uma definição clara de suas principais características técnicas. Sendo assim será considerado Manejo Florestal Comunitário quando:

I. Empregar mão de obra familiar Os trabalhadores nas atividades de manejo florestal comunitário devem ser oriundos da pequena propriedade, em especial da força de trabalho familiar presente na propriedade que está sendo manejada, o que não impede a contratação, por parte dos detentores do plano, de profissionais externos com certo grau de especialização, como: mateiros, marcadores de parcelas, anotadores, responsáveis por romaneios e assim por diante. Para o MFC do cacau nativo, todo trabalho necessário à consecução da colheita em cada safra – bem como aqueles direcionados à aplicação dos protocolos de manejo, exceto as assessorias de técnicos especializados – será realizado pela comunidade de produtores familiares envolvida na oferta de cacau.

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II. Área manejada estiver sob domínio coletivo Pequenas áreas individuais, num conjunto, com média de 100 hectares cada uma, distribuídas de forma contínua ou descontínua em uma superfície maior que esteja sob domínio de uma coletividade, quer esteja legalizada ou não como projeto de assentamento para reforma agrária ou como Unidade de Conservação vinculada à política de meio ambiente, compõem as áreas onde o MFC poderá ser aplicado. Reservas Extrativistas, por exemplo, são áreas prioritárias para instalação do MFC, o que não significa que uma grande propriedade individual ou empresarial não possa fazer uso da tecnologia do MFC para produção de madeira, por exemplo. Para o MFC do cacau nativo, cada um dos 1.800 manejadores trabalha em uma área média de 23 hectares de povoamento nativo de cacau, implicando em uma área total efetiva de manejo por safra de 43.263,39 hectares.

III. Assumir Intensidade de Exploração adequada ao ecossistema A definição da quantidade de produtos florestais que será retirada da floresta sob a tecnologia do MFC depende da conjugação de dois fatores: disponibilidade de mão de obra e capacidade de regeneração da espécie manejada. Tendo em vista que a força de trabalho é fator limitante na pequena propriedade, na maioria das vezes, os manejadores trabalham em uma escala inferior àquela operada por indivíduos e empresas, mas isso não é um pré-requisito. Cada espécie e o povoamento nativo possuem capacidade de regeneração específica, o que define quanto se pode extrair sem comprometer o futuro, ou seja, a quantidade retirada em uma safra tem que ser a mesma a ser retirada na safra seguinte e assim para sempre, o que comprovará o sucesso ou não do manejo florestal. Para o MFC do cacau nativo, todos os frutos produzidos deverão ser coletados, muito embora a possibilidade de coletar todo o cacau produzido seja remota, com estimativas de que há uma perda, que varia de 10% a 20%, de frutos que permanecem na floresta para alimentação da fauna e para regeneração natural por sementes. No entanto, será mantida porção de área do povoamento sob pousio anual, na safra, para resguardar a capacidade de regeneração do povoamento, de acordo com o Protocolo 6. Manejo florestal comunitário

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IV. Apresentar Ciclo de Corte diferenciado Mantendo estreita relação com a intensidade de exploração, o ciclo de corte, representado pelo lapso de tempo entre a exploração de uma área e o retorno para a segunda exploração naquela mesma área, deve assegurar, de forma rígida e rigorosa, a capacidade de regeneração do povoamento da espécie na floresta sob manejo. Independente de qual produto florestal esteja sendo manejado, o ciclo de corte, comumente medido em anos, deve ser calculado para se encontrar o ponto ótimo entre máximo ganho econômico e máxima resiliência da floresta. Para o MFC do cacau nativo, tendo em vista que não ocorre o abate do indivíduo manejado, somente a coleta dos frutos, o ciclo de corte será definido de acordo com a aplicação do Protocolo 6.

V. Possuir momentos de gestão comunitária Diversos fracassos na gestão comunitária de empreendimentos industriais, sobretudo relacionados com borracha e castanha-do-brasil, sugerem que a sonhada verticalização da produção não pode ser encarada como uma regra para a produção florestal comunitária. Por outro lado, enquanto a industrialização encontra algum tipo de resistência, o mesmo não acontece com o manejo florestal realizado no interior do ecossistema florestal, que no caso do MFC deve necessariamente assumir momentos individuais, que reconheça o mérito de cada produtor, e momentos coletivos de gestão do processo produtivo. Para o MFC do cacau nativo, o momento individual de produção ocorre na colocação do manejador florestal, da colheita até a venda dos frutos no batelão. A partir daí, todo o processo produtivo possui gestão coletiva por meio da atuação da Cooperar.

VI. Envolver mais de uma propriedade A quantidade de colocações, ou outro tipo de unidade produtiva, a ser inserida no plano de manejo, independentemente de se localizar de maneira contínua ou descontínua, muito embora a continuidade das áreas contribui para a redução dos custos associados à realização de Inventários |170|

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Florestais, deve justificar a existência de alguma organização de representação vinculada ao setor produtivo, como associações ou cooperativas. Sindicatos de Trabalhadores Rurais, no geral, possuem vínculo político superior, o que costuma atrapalhar sua atuação com processos produtivos. Para o MFC do cacau nativo, esse plano de manejo inclui todas as propriedades localizadas na margem do Purus, no trecho entre a foz do Rio Iaco, no Acre, até o município de Pauini, no Amazonas, o que representa uma área total sob manejo de 43.263,39 hectares.

VII. Detentor do Plano por entidade de representação Definir um detentor, ou responsável legal, pelo plano de manejo, uma vez que quase sempre ocorrerão momentos individuais e coletivos no processo de produção, não é tarefa fácil e depende da existência de uma forte relação de confiança entre os associados. Responsabilizar-se pela execução do plano de manejo perante os órgãos de controle ambiental deve ser tarefa da entidade de representação produtiva à qual os manejadores estão, obrigatoriamente, associados. Para o MFC do cacau nativo, a Cooperar assume a responsabilidade pela execução do plano de manejo como um todo, estando cada manejador responsável pela aplicação dos protocolos de manejo no seu povoamento de cacau nativo.

VIII. Enquadrar-se na definição legal do Programa Nacional de MFC Nos últimos 15 anos, os envolvidos com MFC conseguiram articular uma série de eventos que culminou com a edição de dois Decretos presidenciais importantes para a consolidação dessa tecnologia. O Decreto 6.040, de 2007, instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, que tem no manejo dos ecossistemas nativos sua principal referência. Já o Decreto 6.874, de 2009, instituiu o Programa Federal de Manejo Florestal Comunitário e Familiar – PMCF, que, entre outras orientações, definiu, em seu artigo segundo, MFC como: “... execução de planos de manejo realizada pelos agricultores familiares,

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assentados da reforma agrária e pelos povos e comunidades tradicionais para obtenção de benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema. Parágrafo único. As atividades previstas no plano de manejo realizadas por terceiros não descaracterizam o manejo florestal comunitário e familiar, desde que o referido plano continue sob a responsabilidade dos agricultores familiares, assentados e dos povos e comunidades tradicionais”. Para o MFC do cacau nativo, todas as diretrizes de manejo, bem como os protocolos de manejo, tiveram sua concepção respeitando os dois referidos diplomas normativos. Essas oito características que podem ocorrer de maneira simultânea ou não, apesar de não esgotarem todo detalhamento relacionado à tecnologia do MFC, fornecem um arcabouço teórico importante para a classificação dessa tecnologia e sua diferenciação frente, em especial, ao manejo florestal empresarial e ao manejo florestal de uso múltiplo. O relato das principais experiências acreanas de MFC, apresentado abaixo, tem como objetivo contribuir para esclarecer ainda mais o diferencial tecnológico representado pelo MFC.

EXPERIÊNCIAS ACREANAS DE MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO FLORESTA ESTADUAL DO ANTIMARY Criada em 1988, a Floresta Estadual do Antimary – FEA foi a área de floresta escolhida para a execução do Projeto de Manejo Florestal Sustentável financiado pela Organização Internacional de Madeira Tropical – ITTO, da sigla em inglês, em um montante aproximado de três milhões de dólares. O projeto aprovado pela ITTO foi considerado um dos melhores executados no mundo e possui um organograma operacional bastante inovador, com a instalação de um Conselho Consultivo (formado por entidades da sociedade civil) e um Comitê de Direção (formado pelos interessados e beneficiários diretos do projeto). |172|

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Com uma área total de 76.832 ha, composta pelo seringal Limoeiro e por parte dos seringais Arapixi, Pacatuba e Mapinguari, o manejo florestal da FEA é realizado por meio de administração de contratos de licitação, firmados com empresas privadas, embasados na Lei 8.666, de 1993. Como os contratos de exploração foram firmados antes da aprovação da Lei de Concessões, alguns arranjos legais foram usados para contornar as limitações relativas à não permissão de contratos por área e sim por produtos, e às restrições ao uso do parâmetro “melhor técnica” na seleção da proposta. Por isso, o Estado teve que assumir a elaboração do Plano de Manejo Florestal, dos Inventários Florestais a 100% e dos Planos Operacionais Anuais. Assim, o estoque de produto a ser licitado é definido para concorrência pública, na forma de leilão. E para induzir a participação de empresas que praticam o manejo florestal incluiu-se no edital uma fase de pré-qualificação com a comprovação de critérios técnicos (com apresentação de planta industrial compatível com a quantidade e a qualidade da madeira a ser explorada) e trabalhistas. À Secretaria Estadual de Florestas – SEF cabe o monitoramento das empresas concessionárias, no intuito de garantir o cumprimento dos critérios de manejo previstos no plano e as orientações emanadas da empresa certificadora. O Plano de Manejo da Floresta Estadual do Antimary foi elaborado em 1995, durante a primeira fase do projeto apoiado pela ITTO. Por se tratar de um plano para Unidade de Conservação, apresenta diretrizes de uso e gestão da área. O plano foi atualizado, para o caso da exploração de madeira, com a elaboração do Plano Operativo Anual. O sistema de manejo florestal utilizado para a madeira é policíclico, com base em inventários a 100% e uso de técnicas de exploração de impacto reduzido. O sistema é composto por três grandes fluxos de atividades: planejamento, extração, controle e monitoramento, sendo que parte das atividades é atribuição do poder público e parte delas, a responsabilidade de execução, é das empresas que vencem a licitação. Atualmente o trabalho realizado na FEA, coordenado pela SEF e pela Fundação de Tecnologia do Estado do Acre – Funtac, representa parte estratégica da atual política florestal do Acre, funcionando como laboratório para concepção de instrumentos normativos, econômicos e administrativos para a política. A meta principal é a certificação de 1.500.000 hectares de florestas no Acre.

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O manejo florestal praticado no Antimary foi, por meio do Programa SmartWood, recomendado para certificação do Forest Stewardship Council – FSC, incluindo a Cadeia de Custódia. Para manter a certificação, a FEA passará por auditorias anuais, com base no que estabelecem os princípios e critérios do FSC. Na condição de uma das primeiras experiências de manejo florestal comunitário e empresarial realizadas na Amazônia, o Antimary ostenta o título de ser uma das áreas de florestas mais estudadas da região. Para o caso do Acre, trata-se de uma inigualável referência para disseminação das tecnologias de manejo florestal, reconhecidas internacionalmente e por todos institutos de pesquisas localizados na Amazônia.

PORTO DIAS O Projeto de Assentamento Extrativista Porto Dias – PAE Porto Dias, está localizado em Acrelândia, no Acre, sendo gerido pelo Incra. Pelas normas estabelecidas na reforma agrária, no PAE são reconhecidos os direitos de uso dos recursos florestais pelas populações de seringueiros, tendo como finalidade principal o emprego de práticas de manejo florestal. No caso do Porto Dias, a área teve origem na desapropriação da Gleba Extrema, constituída pelos seringais Perpétuo Socorro e Boa Esperança, por meio do Decreto 95.577/87, de 23 de dezembro de 1987, com um total de 22.345 hectares. Residem na área, atualmente, 88 famílias associadas a três diferentes associações com atuação regionalizada, que têm como principal atividade econômica a agricultura e o extrativismo. Tal qual nas Reservas Extrativistas, no PAE as terras permanecem em nome do Incra, que concretiza a regularização fundiária de forma coletiva por meio da assinatura do Contrato de Concessão de Direito Real de Uso com cada Associação, baseado na aprovação do Plano de Utilização, ocorrida em 1º de novembro de 1997. A organização detentora e responsável pelo Manejo Florestal Comunitário – MFC é a Associação Seringueira Porto Dias, que iniciou suas primeiras discussões no ano de 1995, tendo como seu mais importante apoio, na concepção e efetivação do projeto, o Centro de Trabalhadores da Amazônia – CTA.

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Em 1998, foi concluído o Plano de Manejo e, em 2000, iniciou-se a atividade de extração de madeira, com a comercialização, já em 2001, de 900 m3 de toras manejadas. Na safra de 2002, por sua vez, foram explorados 650 m3 de madeira manejada pela comunidade. A associação possui, atualmente, um total de 22 famílias associadas, das quais 13 estão participando como manejadores florestais. Cada família pratica o manejo madeireiro numa área de 10 hectares, anualmente, perfazendo um total de 130 hectares explorados por ano, com um ciclo de produção total de 30 anos, ou seja, são cortadas uma média anual de duas árvores por hectare. Assim, o volume anual máximo de extração madeireira estimado pelo Plano de Manejo do PAE Porto Dias foi de 1.300 m3, ou seja, uma média de 10 m3 por hectare. É explorado um total de 125 espécies com valor comercial, sendo que o volume total máximo permitido por propriedade é de 100 m3. A renda advinda do MFC, estimada em quase 2 salários mínimos por mês, representa 52% da renda total dos manejadores, seguida de 22% de outros produtos florestais e 12% da agricultura. O projeto de manejo do PAE Porto Dias foi certificado pelo FSC, em 2002, sendo submetido, anualmente, à auditoria de conformação com os princípios e critérios de sustentabilidade adotados pelo FSC. No entanto, a experiência do Porto Dias revelou, em 2006, um dado preocupante, que é o crescimento da participação da renda com criações (principalmente bovinos), indicando que os ganhos advindos do MFC podem estar sendo investidos na pecuária que o MFC pretendia substituir. O CTA, sediado em Rio Branco, com alguns financiamentos externos conseguiu captar em torno de US$ 500.000,00 para a elaboração do Plano de Manejo e assessoria ao projeto desde seu início. O Porto Dias produz madeira em tora, madeira serrada, pequenos objetos em madeira e óleo de copaíba, todos certificados pelo FSC. Foi a primeira área sob MFC a obter certificação para copaíba da Amazônia. A comercialização de sua produção é realizada por meio da Cooperfloresta, uma cooperativa de produtores florestais que concentra a comercialização de vários projetos de MFC no Acre.

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PAD PEIXOTO Criado pelo Incra, em 1977, o assentamento foi concebido com o objetivo de conter o êxodo rural surgido a partir do declínio do extrativismo de borracha durante a década de 60. Com uma área total de 317.588 hectares, o projeto de assentamento é um dos principais produtores de grãos, carne bovina, suína e aves, que representam a principal fonte de renda das 4.220 famílias ali residentes. Além da agropecuária, a exploração de madeira era elevada, acarretando um rápido empobrecimento do potencial de espécies florestais mais valorizadas no mercado. Essa exploração de madeira, contraditoriamente, funciona como um dos principais aportes financeiros para a ampliação da pecuária, que deveria substituir. A pecuária bovina, que no início do assentamento ocupava apenas 3,7% da área das propriedades, cresceu para, aproximadamente, 70% em 2000. A Embrapa iniciou, em 1996, um projeto de pesquisa que reuniu 11 famílias de produtores, distribuídas em dois ramais do PAD Peixoto, no intuito de promover a incorporação dos recursos madeireiros ainda existentes nas áreas de Reserva Legal, equivalentes a 80% da área da propriedade, onde a única forma de geração de renda é a produção florestal. A proposta de exploração florestal é baseada na tecnologia do MFC, com emprego de um ciclo de corte para madeira, de 30 anos, com pequena intensidade de corte, equivalente à retirada de duas árvores por hectare e por ano. As árvores que deverão ser exploradas são selecionadas a partir de um conjunto de critérios econômicos e ecológicos. A ideia principal do projeto é gerar renda na Reserva Legal, antes ociosa, por meio da produção florestal. O principal desafio foi adequar os procedimentos do MFC para pequenas áreas rurais em uma comunidade com nenhuma tradição na produção de madeira. Os inventários realizados pela instituição apresentaram um razoável volume de corte e excelente estoque para recompor a população florestal depois da exploração. O projeto ainda não contempla atividades de aproveitamento dos demais produtos de uso direto, como castanha, copaíba e açaí, tidos pelo mercado como os produtos extrativistas de maior importância, depois da madeira. O PAD Peixoto é citado atualmente como uma das principais referências de experiências de MFC na Amazônia, sendo a única relacionada ao aproveitamento econômico das áreas de Reserva Legal e realizada em assentamentos da reforma agrária. |176|

Programa de extensão florestal


Graças à realização do projeto no PAD Peixoto, não existem dúvidas quanto à viabilidade técnica, econômica e social da tecnologia de MFC para produção de madeira, afinal, o projeto já concluiu seu primeiro ciclo de corte e ao voltar à primeira área explorada, há 8 anos, os manejadores florestais encontraram a quantidade de madeira esperada e de acordo com o previsto no Plano de Manejo.

PAE CACHOEIRA Denominado, oficialmente, pelo Incra, de Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes, o PAE Cachoeira foi criado pela Portaria nº 158 do Ministério da Agricultura, em 1989, tendo como beneficiários diretos 68 colocações e famílias de seringueiros. Está localizado em Xapuri, no Acre, possuindo uma área de 24.098,00 hectares. O projeto, como no caso dos demais PAEs, surgiu com a finalidade de respeitar a forma de exploração e posse da terra, cabendo aos colocados manterem a atividade extrativista, em especial de borracha e castanha. Cada colocação tem, em média, 300 hectares. O detentor do plano de MFC é a Associação de Moradores e Produtores do PAE Chico Mendes, que foi fundada em 1995 com o objetivo de organizar a comunidade para defender seus interesses e atrair a atenção de outros atores para suas demandas. Já no momento de sua fundação, iniciaram-se as discussões entre o CTA, que já possuía vasta experiência na execução do projeto do Porto Dias, e a comunidade, sobre as possibilidades de se implantar um projeto de manejo comunitário no local. As articulações seriam concluídas em 2000, quando foi possível viabilizar o Plano de Manejo com recursos da Suframa e, assim, pôr em prática o MFC. Desde então, os resultados econômicos, sociais e ecológicos para a comunidade têm sido significativos, tanto que, com apenas dois anos de implantação, o projeto recebeu, em fevereiro de 2002, a certificação do FSC, ostentando o título de primeira experiência de MFC certificada, na Amazônia. Existem, atualmente, nove famílias participando do plano de manejo, envolvendo uma área total de 900 hectares, sendo que cada participante maneja uma área de 100 hectares divididos em 10 hectares por ano, ou seja, anualmente são explorados 90 hectares de floresta, em um ciclo de corte previsto para ser concluído em 10 anos. Manejo florestal comunitário

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O Contrato de Concessão de Direito Real de Uso foi firmado entre o Incra e as Associações, em abril de 1998, e tem validade de dez anos, podendo ser prorrogado se for verificado o cumprimento do Plano de Utilização, documento que disciplina a implantação de atividades produtivas. O Plano de manejo considerou 100% das árvores de valor comercial, sendo estas marcadas e mapeadas para exploração na safra seguinte. No Inventário Florestal foram identificadas a área de menor volume, com exploração de 2,9 m3 por hectare, e a de maior volume, que chega a 15,1 m3 por hectare. São manejadas 26 espécies diferentes de árvores, sendo a árvore comercial de maior incidência o Breu-Vermelho (Protium altosonii). Os manejadores estão divididos em grupos de três, de acordo com a proximidade de suas colocações, e a extração da madeira ocorre em função dos contratos de comercialização, porém, obedecendo ao potencial de cada área, onde cada pedido de compra é executado pelo grupo que melhor se enquadre no perfil da solicitação. A produção de madeira, no geral, não atrapalha as atividades do extrativismo tradicional de borracha e castanha, que ainda possuem importância signficativa na geração de renda das colocações. Em 2001, na média, a madeira foi comercializada por R$ 129,18/m3 e o custo do manejo florestal foi estimado em 60% desse valor. A renda líquida obtida por manejador florestal foi de R$ 2.656,00, ou seja, uma renda 89,71% superior ao total da renda oriunda dos outros produtos florestais, enquanto a renda líquida total do plano de manejo foi 189,71% superior à renda média dos extrativistas que não participaram do manejo florestal.

RESERVA EXTRATIVISTA CAZUMBÁ Criada por Decreto presidencial, em 2002, a cultura de organização comunitária é bastante disseminada entre os membros da associação de produtores que reivindicou sua criação. Com aproximados 752 mil hectares, a área da reserva possui uma característica única de incluir em seu interior uma Terra Indígena com área inferior a 5 mil hectares. Ocorre que a Funai, à época da criação da Resex, cometeu o equívoco irreparável de considerar que a demarcação da Resex não resolveria o problema da pequena comunidade indígena ali residente. Para

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não comprometer a criação da Resex do Cazumbá, a coordenação técnica do CNPT, em Brasília, decidiu excluir a Terra Indígena da área da Resex. No Cazumbá, ocorre uma experiência única de MFC voltado à fauna silvestre, com a produção de capivaras, Hydrochoerus hydrochaeris, que conta com 56 animais; de jabutis, Geochelone denticulata, com cem cabeças e de queixadas, Tayassu pecari, com a captura das primeiras matrizes, manejados em regime semiextensivo, com parte de sua dieta obtida no interior da floresta e parte disponibilizada pelos manejadores. Atualmente, vivem em torno de 230 famílias na área. O acesso principal é por via fluvial, sobretudo o Rio Caeté, que liga a Resex à cidade de Sena Madureira. Na época seca, um ramal em péssimo estado de conservação, com 36 km de extensão, permite o acesso à Resex. A Associação Cazumbá possui elevados níveis de organização comunitária, onde inclusive os professores que chegam à comunidade, para uma permanência temporária, são inseridos nos trabalhos comunitários. As regras para licenciamento do MFC de fauna silvestre, monitoradas pelo Ibama, não são fáceis de cumprir. A comunidade tem se empenhado, mas o manejo de animais silvestres em sistemas extensivos, o que seria ideal, são autorizados somente quando os animais fazem parte de uma população isolada geograficamente de outras populações, uma vez que uma interpretação errada da Lei de Proteção à Fauna Silvestre considera que podem ser comercializados somente animais nascidos em cativeiro. O MFC praticado no Cazumbá assume como diretriz que o uso sustentável da fauna silvestre, em especial na Amazônia, requer tanto a concepção de tecnologias para a criação comercial em cativeiro, no caso manejo intensivo, quanto a promoção do manejo extensivo, com a criação dos animais no interior da floresta, o que é mais lucrativo para o manejador e mais adequado aos ideais de sustentabilidade. A experiência do Cazumbá é pioneira na Amazônia. No início de 2004, seis membros da comunidade, com apoio do Ministério do Meio Ambiente, visitaram criadores de animais silvestres em outros, visando à ampliação do manejo para espécies em risco de extinção, como paca, Agouti paca, e veado, Mazama americana. Com relação aos jabutis, a expectativa é que os filhotes possam ser vendidos como animais de estimação, PET, a R$ 200,00 cada um. Com o objetivo

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de investir no mercado de PET, o Ibama também licenciou a criação extensiva de papagaios e araras-canindé. Os filhotes de arara e papagaio serão vendidos como animais de estimação, com possibilidade de exportação para o mercado europeu, onde o produto é muito valorizado, chegando a preços superiores a mil dólares. Os resultados sociais e econômicos obtidos são satisfatórios; no Cazumbá, todas as crianças estão na escola e a população como um todo ou está alfabetizada ou em fase de alfabetização.

PAE SÃO LUIS DO REMANSO Com uma área de 43.412 hectares, abrangendo os municípios de Capixaba e Rio Branco, o acesso ao São Luis do Remanso pode ser feito pela rodovia BR-317, no sentido do município de Capixaba, ou pelo Rio Acre, que corta a área, depois de seis horas de voadeira. Faz limites com a Alcoolbrás, projeto destinado ao plantio de cana-de-açúcar para produção de álcool, e com os Seringais Vila Nova, São Gabriel e Santa Severina, pertencentes à Reserva Extrativista Chico Mendes. Na condição de um dos primeiros PAEs criados na Amazônia, o movimento dos seringueiros costuma afirmar que o São Luis do Remanso não foi criado: foi conquistado. Acontece que a área, de acordo com o planejamento do Incra e a predileção de sua equipe técnica, deveria ser destinada para a instalação de um projeto de colonização tradicional, com a introdução de mais de 300 famílias assentadas e oriundas de outras regiões. O argumento principal do Incra era a localização geográfica estratégica do São Luis do Remanso, uma vez que possui acesso fluvial e rodoviário, além de estar totalmente cercado por grandes propriedades rurais, todas destinadas à pecuária, o que reforçaria a existência de pequenos proprietários ligados à agricultura de arroz, feijão, milho e macaxeira. Todavia, foi justamente a localização estratégica que reforçou a tese da criação do PAE, no sentido de conseguir manter uma porção de área coberta por florestas em uma região completamente desmatada pela pecuária. Venceu o bom senso e o PAE foi criado. Existem no PAE 188 colocações, sendo que o número de famílias residentes supera essa quantidade. Na época de sua criação, 137 famílias viviam na área, número que deve ter sido bem ampliado. Infelizmente, não se dispõe do número exato de indivíduos que vivem na área. |180|

Programa de extensão florestal


Como todo PAE, no São Luis também não existe titulação individual da terra, uma vez que a regularização fundiária se dá de forma coletiva, com assinatura do Contrato de Direito Real de Uso, entre o Incra e a Associação dos Moradores. Atuam na área três associações: Boa Fé (17 associados), Agroextrativistas do Remanso de Capixaba (81 associados) e Nova Vida (35 associados). Um total de 55 produtores não participa das associações. Segundo dados da Secretaria Municipal de educação de Capixaba, existem nove escolas em funcionamento e distribuídas segundo as áreas de influência das três associações. O projeto de MFC realizado no São Luis do Remanso teve início em 1999, com recursos oriundos do Banco Interamericano. Em 2004, essa experiência foi a primeira a obter a certificação, pelo FSC, para o manejo florestal de uso múltiplo, incluindo, além da madeira, jarina e copaíba. Os serviços técnicos relacionados ao MFC são executados pelo CTA. Apenas 20 famílias de produtores participam do grupo de manejadores florestais. Toda a produção é comercializada de forma coletiva por meio da Coopfloresta, uma cooperativa que centraliza a venda de vários outros projetos de MFC executados no Acre.

MULTIDISCIPLINARIDADE DO PROGRAMA DE EXTENSÃO FLORESTAL A extensão florestal para introdução de inovações tecnológicas aos produtores associados à Cooperar, para produção de cacau nativo de várzea do Purus, como descrito no plano de manejo, possui características de multidisciplinaridade que envolvem grosso modo, e no mínimo, três principais campos do conhecimento:

SOCIOECONOMIA DE POPULAÇÕES TRADICIONAIS DA AMAZÔNIA Existe uma carência generalizada acerca de indicadores de socioeconomia de populações tradicionais, na Amazônia. As iniciativas para a produção de diagnósticos acerca das características sociais e econômicas dessas comunidades

Manejo florestal comunitário

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são esparsas e nem sempre adequadas à tomada de decisões para programas de extensão florestal nessas comunidades. No caso dos seringueiros, ribeirinhos ou não, uma descrição detalhada, e impressionante, foi realizada por Euclides da Cunha, em 1902, ou seja, no início do século XX, momento de maior esplendor do ciclo econômico da borracha. Seus apontamentos estão publicados na sua célebre obra “À Margem da História”, publicada postumamente em 1908, em que descreve a “anomalia capitalista na qual está submetido o seringueiro: a de trabalhar para escravizar-se”. Mais tarde, já na década de 1950, de maneira igualmente brilhante, apesar de pouco conhecida, Arthur Cezar Ferreira Reis, em 1952, publicou sua importante obra “O Seringal e o Seringueiro”, na qual traça de forma didática e detalhada os indicadores microeconômicos que envolvem a atividade extrativa da borracha em seus vários níveis: do seringueiro, do seringalista e das casas de aviamento. Na redescoberta do extrativismo e sua alçada à condição de modelo adequado de ocupação da Amazônia, ocorrida no final da década de 1980, e com a criação das primeiras áreas de Reservas Extrativistas, alguns novos levantamentos socioeconômicos foram realizados. Por sinal, a realização dos estudos socioeconômicos foi introduzida como condição para a criação dessas Unidades de Conservação, nas quais existam habitantes no seu interior ou no seu entorno, configurando-se em exigência legal. Indo além dos estudos antropológicos típicos, elaborados com certo grau de deslumbramento frente ao ambiente selvagem e bucólico no qual essas comunidades vivem e, por outro lado, das meras descrições de dados de cadastros imobiliário realizados pelos órgãos de regularização fundiária, a socioeconomia tem um importante papel: oferecer subsídios à elaboração dos programas de manejo florestal e, mais importante ainda, dos programas de extensão florestal, que farão com que as comunidades assimilem as inovações tecnológicas sugeridas no plano de manejo.

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Programa de extensão florestal


ECOLOGIA DE POPULAÇÕES DE ESPÉCIES DE ORIGEM FLORESTAL NA AMAZÔNIA Análises isoladas sobre espécies florestais existentes no interior do ecossistema amazônico são pouco realizadas e, o que é pior, como diriam os extrativistas, de pouca serventia. A elaboração do plano de manejo exigiu o envolvimento de pesquisadores da área de ecologia de populações florestais, tendo em vista que o cacaueiro mantém uma relação íntima com algumas espécies preferidas para seu sombreamento e microclima. Além disso, os mecanismos de dispersão do cacaueiro ao longo das várzeas deverão ser diagnosticados para melhor compreensão de sua ocorrência. O plano de manejo também manteve, a título de unidade de referência, uma parcela destinada ao estudo da autoecologia do cacau na Área de Pesquisa pertencente à Ufac denominada de “Floresta Humaitá”, localizada em Porto Acre, município próximo à Boca do Acre e inserido na área de influência do plano de manejo. Os técnicos da área de ecologia de populações vegetais e da autoecologia serão fundamentais para subsidiar o estabelecimento dos princípios ecológicos do manejo florestal comunitário do cacau nativo de várzea.

MANEJO FLORESTAL NA AMAZÔNIA O manejo florestal comunitário do cacau é o objetivo-fim do plano. Por isso, entre os profissionais da área de Engenharia Florestal estarão incluídos, de maneira interdisciplinar, técnicos que atuam nos campos da Dendrometria, Dendrologia, Economia Florestal e Manejo Florestal. As informações do Inventário Florestal, sobre a abundância e a densidade do cacaueiro e das espécies associadas, bem como da produção de cacau e de seu valor, subsidiaram as decisões acerca da intensidade de exploração e demais coeficientes fundamentais ao estabelecimento das rotinas de manejo florestal comunitário. Finalmente, o Programa de Extensão proposto aqui procurou associar conhecimentos de socioeconomia, de ecologia de populações e de manejo florestal, no intuito de transformar a informação em processo contínuo de comunicação com o manejador florestal do cacau nativo.

Manejo florestal comunitário

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CRONOGRAMA DO PROGRAMA DE EXTENSÃO FLORESTAL Para a elaboração do cronograma de extensão florestal, foi preciso considerar a cronologia para a aplicação de cada um dos seis PROTOCOLOS DE MANEJO, conforme apresentada no quadro abaixo. Quadro 5: Cronologia para a aplicação dos protocolos de manjeo para o cacau nativo do Purus 2011

Protocolos I. Podar chupões II. Abater chupões já enraizados III. Marcar touceiras matrizes IV. Semear cacau V. Desbastar cacau solteiro

2012

2013

– –

– –

2014

2015

– –

VI. Pousio produtivo

O Programa de Extensão está estruturado em três ações principais: a) seleção de manejadores para a ampliação da execução do plano de manejo; b) elaboração de material didático de apoio (kit de extensão: cartilha, folder, banner, cartaz); e, c) qualificação do manejador. Essas ações serão realizadas de maneira simultânea e o cronograma da extensão deverá se adequar tanto às demandas do plano de manejo florestal quanto às atividades inerentes ao período de safra, no qual todos se voltam para a produção. Há que se considerar ainda que as três ações de extensão terão que ser executadas para cada um dos seis PROTOCOLOS DE MANEJO, o que significa que a ampliação da extensão para além dos cinco primeiros produtores já selecionados |184|

Programa de extensão florestal


dependerá da realização prévia da extensão florestal para aquele determinado PROTOCOLO DE MANEJO. Significa ainda que, no primeiro ano de execução do plano de manejo, a execução do primeiro, terceiro, quinto e sexto PROTOCOLOS DE MANEJO se restringirá aos cinco manejadores já selecionados e descritos para seleção de matrizes, de acordo com o QUARTO PROTOCOLO DE MANEJO, quais sejam: Santo Elias, Curitiba, Boa Hora, Prainha, Salpico. Com duração de três anos, o Programa de Extensão será concluído no final de 2013, quando todos os PROTOCOLOS DE MANEJO estarão sendo executados em, no mínimo, 50% das propriedades dos manejadores de cacau nativo. Finalmente, antes de apresentar o cronograma de extensão, cabe ainda esclarecer que o Programa de Extensão requererá a presença permanente, em Boca do Acre e com os manejadores, de uma equipe mínima, formada por dois técnicos, sendo um engenheiro florestal e outro, extensionista, com experiência. Durante os três anos de execução do Programa de Extensão, essa equipe mínima estará sempre em contato com os manejadores. Para a elaboração do material de apoio e a realização dos treinamentos para cada um dos seis PROTOCOLOS DE MANEJO, outra equipe de profissionais, contratados por empreitada para a realização de serviços específicos, deverá ser formada com a participação de profissionais com variada formação técnica. Trabalhos relativos à prestação continuada de assistência técnica, especialmente no período de pico de demanda na safra, deverá ser oferecida por parte da Cooperar, inclusive por meio da articulação de órgãos estaduais e oficiais de assistência técnica. É de fundamental importância, para sucesso do Programa de Extensão Florestal, que a equipe de extensão tenha dedicação exclusiva e não se confunda com as de assistência técnica, a ser prestada de forma permanente e tratando de todos os temas relacionados à unidade produtiva dos manejadores, como criação de animais, produção agrícola e comercialização. Para melhor compreensão do conjunto do Programa de Extensão, no quadro a seguir são apresentadas todas as atividades referentes à execução do plano de manejo, incluindo as exigidas para a aplicação dos PROTOCOLOS DE MANEJO para o cacau nativo e àquelas relacionadas ao manejo florestal das espécies associadas, bem como as incluídas no Programa de Extensão.

Manejo florestal comunitário

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É importante esclarecer que, independente do trabalho previsto e que esteja sendo executado naquele momento, garantir as atividades relacionadas à safra do cacau nativo é, e sempre será, a maior prioridade para todos os envolvidos no objetivo de alcançar as 40 toneladas de sementes fermentadas e secas de cacau nativo no Purus. Quadro 6: Cronograma do programa de extensão florestal para a aplicação dos protocolos de manejo para o cacau nativo do Purus Protocolos de manejo

Cronograma do Programa de Extensão Florestal 2011

2012

2013

I. Podar chupões

Selecionar e treinar produtores

Preparar material de apoio

II. Abater chupões já enraizados

Preparar material de apoio

Treinar produtores

III. Marcar touceiras matrizes

Selecionar e treinar produtores

IV. Semear cacau

Selecionar produtores

V. Desbastar cacau solteiro

Selecionar e treinar produtores

Preparar material de apoio conjunto

Selecionar e treinar produtores Treinar produtores Treinar produtores

VI. Pousio produtivo

Preparar material de apoio

Selecionar e treinar produtores

Manejo florestal espécies associadas

Preparar material de apoio

Selecionar e treinar produtores

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Programa de extensão florestal


Manejo florestal comunitário

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Preparar material

Manejo florestal – espécies associadas

Selecionar e treinar

Selecionar e treinar

V. Desbastar cacau solteiro –

Preparar material

Selecionar produtores

IV. Semear cacau

VI. Pousio produtivo

Treinar produtores

Preparar material

Selecionar e treinar

Preparar material

Selecionar e treinar

Treinar produtores

Selecionar e treinar

III. Marcar touceiras matrizes

Treinar produtores

Preparar material

II. Abater chupões já enraizados

Preparar material

2013

Selecionar e treinar

2012

I. Podar chupões

2011

2014

2015

2016

2017

2018

Atividades por ano até segunda versão do Plano de Manejo do cacau nativo

Revisão do Plano de MFC do cacau nativo do Purus

PROTOCOLOS DE MANEJO/ Programa de extensão 2019

2020

Quadro 7: Cronograma ilustrativo das atividades de MFC do cacau nativo, das espécies associadas e do programa de extensão florestal

Segunda versão do Plano de MFC do cacau nativo do Purus


Anexo 1

Síntese do relatório da primeira expedição, ocorrida em maio de 2008.


MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO DO CACAU NATIVO NA VÁRZEA DO PURUS CNPq Edital 36/2007 | SÍNTESE DA PRIMEIRA EXPEDIÇÃO AO PURUS

MISSÃO DO PROJETO Elevar a produção anual do cacau nativo da várzea do purus para 40 toneladas de sementes secas, com emprego de inovações tecnológicas inseridas na tecnologia do manejo florestal comunitário.

1. EQUIPE ENVOLVIDA Professores do Curso de Engenharia Florestal da Ufac: •  Ecio Rodrigues – Coordenador do Projeto CNPq •  Edmilson Santos Cruz – Inventário florestal •  Nei Braga Gomes – Doenças do cacau, fitopatologia Professor da Unesp: •  Jairo Salim Pinheiro de Lima – Estudo de logística Doutorando da Universidade de Viçosa: •  Pedro Christo – Mapeamento por satélite Gerência da Cooperar: •  Alexandre Lins – Aquisição da safra Extensionistas: •  Domingos Ramos de Assis •  Ronaldo Braga •  José Gonçalves Bolsistas de Iniciação Tecnológica: •  Tarso Halk •  Kamilla Andrade •  João Coutinho

Manejo florestal comunitário

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Representante da GTZ: •  Magna Cunha

2. OBJETIVOS DA EXPEDIÇÃO 1. Realizar reuniões de nivelamento de informações sobre o estágio operacional do projeto. 2. Fazer visita de reconhecimento em porções da área de abrangência do projeto. 3. Manter contatos preliminares com os produtores extrativistas envolvidos com a produção de cacau nativo na várzea do Purus e vinculados à Cooperar. 4. Conhecer a estrutura de produção envolvendo: colheita, transporte, fermentação, armazenamento e embarque do cacau. 5. Manter contatos com a gerência da Cooperar e discutir seu envolvimento na operacionalização do projeto. 6. Visitar a comunidade residente na sede da Floresta Nacional do Mapiá. 7. Realizar reuniões de apresentação do projeto com as lideranças da Flona do Mapiá. 8. Discutir proposta para atuação da Engenharia Florestal da Ufac na Flona do Mapiá. 9. Definir hipóteses para a amarração da área de ocorrência do cacau nativo na várzea do Purus a ser posteriormente inventariada. 10. Estabelecer metodologia inicial para a elaboração de trabalhos de monografia em Logística (Tarso Halk), Sensoriamento remoto (Kamilla) e Inventário Florestal (João). 11. Planejar a execução do projeto em 2008. 12. Estabelecer responsabilidades e competências na execução do projeto.

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Anexo 1


3. CONTEXTUALIZAÇÃO DA EXPEDIÇÃO O cacau é um dos produtos de valor comercial mais antigos da Amazônia. Na condição de um dos mais importantes componentes da cesta de produtos florestais denominada de “drogas do sertão”, o cacau ocupa lugar de destaque nas estatísticas amazônicas de produção. O que intriga na história comercial do cacau é a ausência de ciclos, como o que ocorreu com a borracha, por exemplo. Ao contrário, trata-se de uma produção permanente e, praticamente, ininterrupta por quase duzentos anos. Um desempenho que impressiona e que fornece ao cacau importância econômica considerável. A novidade na produção de cacau amazônico é que, depois de tentativas um tanto frustradas de cultivos (devido à ocorrência da praga vassoura-de-bruxa), os plantios de cacau na Amazônia vêm sendo, ao longo dos últimos 20 anos, abandonados. Evidente que reforçam a intenção do abandono dos plantios por parte dos produtores a elevada oferta internacional e o baixo preço operado pelo mercado. Todavia, um nicho de mercado surge com a valorização do cacau nativo. Empresas que detêm marcas tradicionais de chocolates europeus se voltam em busca do sabor característico e exótico do cacau selvagem. Aquele cacau que ocorre na várzea dos rios amazônicos, como o Rio Purus. Foi a percepção desse novo e promissor mercado que levou os extrativistas residentes na Floresta Nacional do Mapiá a fecharem acordos comerciais com uma renomada empresa da Alemanha para fornecimento de um cacau especial, que originaria um chocolate de alta qualidade. Indo além, a Cooperar, cooperativa que reúne os extrativistas do cacau do Purus, preocupada em tornar essa produção extrativista sustentável e permanente, procurou os profissionais da Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre – Ufac para estudar essa produção e conceber um Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus. Uma primeira expedição será realizada no período de 16 a 24 de maio próximo, quando os engenheiros florestais estarão no município de Boca do Acre, no Amazonas, para conhecer o Rio Purus e o Manejo Comunitário praticado pela Cooperar.

Manejo florestal comunitário

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A expedição faz parte das atividades inseridas no projeto Manejo Florestal Comunitário na Várzea do Rio Purus, recentemente aprovado no âmbito do Edital 036 do CNPq, fruto de uma ampla parceria firmada entre representantes da academia, de institutos de pesquisas, de empresas de extensão florestal e a Cooperar; além do importante envolvimento da Universidade de Freiburg, da Alemanha. A equipe do projeto cumprirá extensa agenda, que envolve uma rodada de reuniões com a Cooperar para discussão dos objetivos do projeto, visita às áreas de extração de cacau, conhecimento do sistema de escoamento da produção e diagnóstico das doenças do cacaueiro. O objetivo principal da equipe é contribuir para que a elevada produção de cacau oriunda da várzea do Purus, realizada pelos extrativistas, possa ser organizada com a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário, o que dará a requerida sustentabilidade a essa produção. O compromisso firmado entre a equipe do projeto e a Cooperar, que justificou o apoio do CNPq, envolve a realização de um intenso processo de inovação tecnológica direcionado à melhoria do processo produtivo atualmente praticado. O desafio maior do projeto é demonstrar que, com a tecnologia do manejo florestal, é possível produzir o cacau sem a necessidade de plantios – um desafio complexo e que irá exigir da equipe muita criatividade.

4. DESAFIOS PARA O MANEJO FLORESTAL DO CACAU NATIVO DO PURUS São vários os desafios. Todavia, o dilema maior é requerido pela própria empresa alemã que compra o cacau nativo do Purus. Para eles, o sabor do cacau que ocorre naturalmente na várzea do Rio Purus possui características únicas e incomparáveis, quando é transformado em chocolate. Entenda-se, por sabor único, um diferencial de mercado que faz com que o produto chocolate consiga melhores preços de venda e, o mais importante, traga identidade para a empresa. Ou seja, o cacau produzido na várzea do Purus possui um gosto que, para quem aprecia chocolate, e são muitos na Alemanha e na Europa em geral, compensa pagar mais por ele. A empresa que adquire esse cacau não faz falsa modéstia com o

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Anexo 1


produto. É a única a vender um chocolate genuíno, nativo, natural, do jeito que a floresta amazônica oferece. Somente quem prova poderá saber a diferença do sabor autêntico e milenar desse cacau. Um mercado que amplia a cada ano. Afinal, quem não gostaria de experimentar um chocolate que é consumido há milênios e que vem de uma região ícone no mundo: a Amazônia? Para se ter uma ideia, o contrato inicial da empresa com a cooperativa dos produtores do Purus demonstrou que a demanda pelo cacau era bem superior à oferta oriunda do manejo florestal comunitário. Algo, sem dúvida, inusitado no mercado que envolve produtos de origem extrativista da Amazônia. Na maioria das vezes, tem-se uma diversidade enorme de produtos que, geralmente, não possuem mercados consolidados. Ocorre que, nesse momento, tal qual o que ocorreu com a borracha no início do século passado, o mercado quer mais desse cacau. E tal qual o que ocorreu com o próprio cacau, com a borracha, com o cupuaçu, com a pupunha, com a pimenta-longa e assim por diante, a tendência seria recorrer aos cultivos comerciais para ampliar a oferta do produto. A história econômica da Amazônia comprova que, sempre que uma espécie florestal ganha dinamismo econômico, a resposta agronômica é rápida. Domesticação, plantio, colheita e, assim, o ciclo produtivo atende à expectativa do mercado. Um processo intenso de mecanização da produção será o inexorável passo seguinte. Esse procedimento tem justificado a entrada no mercado de vários produtos da floresta amazônica. E tem, igualmente, justificado o afastamento da Amazônia de vários mercados abertos por suas espécies florestais. A borracha ainda é o melhor exemplo dessa triste constatação. Uma vez dominado o sistema de cultivo e o Estado de São Paulo vem dominando o mercado desde 1993. No entanto, a história econômica da Amazônia também tem demonstrado que o que pode salvar a espécie florestal e o seu consequente manejo em ambiente natural é a existência de algumas características importantes para o mercado e que se perdem com ao serem cultivadas. No caso do cacau, a empresa compradora é taxativa. Cacau cultivado não é nativo e, por isso, não interessa. E aí volta-se ao maior dilema do início deste artigo:

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Como fazer para triplicar, ou mais, a produtividade de um cacau nativo, sem recorrer aos plantios? A ciência florestal amazônica precisa dar uma resposta contundente. Um passo importante vem sendo dado com uma parceria entre a Ufac e a Universidade Freiburg e um leque variado de outras instituições. Com um projeto apoiado pelo CNPq, está sendo possível reunir um número expressivo de especialistas para se debruçarem sobre o tema. Tudo indica que, em breve, algumas soluções surgirão. Respostas que ajudarão a solucionar os desafios do cacau e, o melhor, do Manejo Florestal Comunitário da Amazônia.

5. CONCLUSÕES DA PRIMEIRA EXPEDIÇÃO Algumas conclusões importantes direcionadas para subsidiar a elaboração do Plano de Manejo do Cacau Nativo e também para a orientação operacional do projeto foram obtidas com essa primeira expedição e podem ser sintetizadas nos seis pontos que estão relacionados abaixo. 1. A melhoria das condições de logística na qual a safra do cacau ocorre pode trazer ganhos de produtividade importantes para se alcançar a meta de 40 toneladas anuais. 2. O cacau possui mecanismos de dispersão na várzea do Rio Purus que estão submetidos a três hipóteses preliminares: I. DA COTA 100 Entre as altitudes de 95 a 105 metros, com prevalência na faixa dos 100 metros, há ocorrência de maior densidade de cacau. II. DO INTERFLÚVIO Em áreas onde predominam a cota 100, primeira hipótese, a densidade de indivíduos de cacau será maior ou menor, havendo, inclusive, a possibilidade de não ocorrência, dependendo do nível de alagação, anual ou não, periódica realizada pelo Purus. |194|

Anexo 1


III. DA TIPOLOGIA FLORESTAL Em áreas de cota 100, primeira hipótese, com elevada influência do interflúvio do Purus, segunda hipótese, o cacau não ocorrerá se a tipologia florestal for de Floresta Aberta com Palmeiras Dominantes ou Dominadas (nas palavras do mateiro Cunha “onde tem palmeira não tem cacau”). 3. O mapeamento temático da área de ocorrência do cacau deverá considerar a área efetiva a ser manejada pelos extrativistas. Uma família de extrativista não colhe cacau em um raio médio de três quilômetros de distância do Rio Purus. Ou seja, deverá ser considerada como área de manejo, portanto a ser inventariada, uma faixa paralela ao traçado da margem do Purus equivalente a três quilômetros de profundidade em direção à terra firme. 4. Os prazos para colheita, quebra, fermentação e secagem do cacau devem ser considerados na elaboração do Plano de Manejo da seguinte forma: • uma vez colhido, deve ser quebrado em cinco dias; • uma vez quebrado, deve ser fermentado em sete dias, ou quando a temperatura baixar abruptamente; e • uma vez fermentado, deve ser secado em estufa por até 40 dias. 5. Não há evidências de que a queda de produção observada no período 2006/2007 tenha algum tipo de amparo nas regras de mercado estabelecidas para aquisição da produção. Tudo indica que nos comportamentos intrínsecos ao cacau, sobretudo aqueles relacionados ao seu nicho ecológico, estejam as causas dessa variação perigosa de produção. Uma avaliação mais apurada de estatísticas de produção e de produtividade por indivíduo deverá trazer mais revelações. 6. A Cooperar, na condição de responsável pelo gerenciamento da produção de cacau, encontra-se em fase de diversificação da produção e agregação de valor a produtos extrativistas com perspectivas para entrada no mercado de castanha e de óleos florestais em geral.

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7. O número prévio de identificação de seis espécies florestais associadas ao cacau parece atender à expectativa para elaboração do Inventário Florestal do Cacau e das espécies a ele associadas. Um tratamento especial deverá ser dado ao mulateiro (SPP), notadamente de elevada ocorrência na área.

6. PENDÊNCIAS PARA A CONTINUIDADE DO PROJETO Para a orientação da equipe envolvida no projeto, os próximos dez passos de sua operacionalização envolvem o seguinte:

10 Passos do cacau nativo para 2008 1. Realização de levantamento de solos, com apoio da Universidade de Viçosa, a fim de auxiliar os relatórios de conclusão do Inventário Florestal. 2. Análise na Unidade de Tecnologia de Alimentos – Utal da Ufac dos óleos de espécies florestais com perspectivas de inclusão na cesta de produtos florestais gerenciados pela Cooperar. 3. Análise da semente seca do cacau, pronta para embarque, para a descrição de conteúdo mineral de cadmo e presença de atrativos para formiga. 4. Finalização e divulgação do relatório da expedição, contendo: arquivo fotográfico, análise crítica e diário de bordo. 5. Conclusão do balanço financeiro parcial do projeto. 6. Conclusão dos mapas de ocorrência e de área de manejo. 7. Planejamento do Inventário Florestal na área de ocorrência. 8. Conclusão do relatório de logística.

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Anexo 1


9. Realização de pesquisa bibliográfica para o Plano de Manejo, nos seguintes temas: a. Desbaste e rebrota no cacau nativo solteiro. b. Regeneração por sementes e mudas em cacaueiro nativo. c. Regeneração por chupão ou mergulhão, em cacau nativo de touceira. d. Sistemas de classificação e seleção de indivíduos de cacaueiro de touceira para reprodução. 10. Criação de domínio para divulgação do projeto na internet, segundo orientação da Cooperar e para garantia da marca de comercialização de seus produtos.

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Anexo 2

Artigos de extens達o publicados*

* www.ufac.br www.andiroba.org.br www.jornalatribuna.com.br


ENGENHARIA FLORESTAL E O MANEJO COMUNITÁRIO DO CACAU Publicado em maio de 2008

O cacau é um dos produtos de valor comercial mais antigos da Amazônia. Na condição de um dos mais importantes componentes da cesta de produtos florestais denominada de “drogas do sertão”, o cacau ocupa lugar de destaque nas estatísticas amazônicas de produção. O que intriga na história comercial do cacau é a ausência de ciclos, como o que ocorreu com a borracha, por exemplo. Ao contrário, trata-se de uma produção permanente e, praticamente, ininterrupta por quase duzentos anos. Um desempenho que impressiona e que fornece ao cacau importância econômica considerável. A novidade na produção de cacau amazônico é que depois de tentativas um tanto frustradas de cultivos (devido à ocorrência da doença vassoura-de-bruxa), os plantios de cacau na Amazônia vêm sendo, ao longo dos últimos 20 anos, abandonados. Evidente que reforçam a intenção do abandono dos plantios, por parte dos produtores, a elevada oferta internacional e o baixo preço operado pelo mercado. Todavia, um nicho de mercado surge com a valorização do cacau nativo. Empresas que detêm marcas tradicionais de chocolates europeus se voltam em busca do sabor característico e exótico do cacau selvagem. Aquele cacau que ocorre na várzea dos rios amazônicos, como o Rio Purus. Foi a percepção desse novo e promissor mercado que levou os extrativistas residentes na Floresta Nacional do Mapiá a fecharem acordos comerciais com uma renomada empresa da Alemanha para fornecimento de um cacau especial, que irá originar um chocolate de alta qualidade. Indo além, a Cooperar, cooperativa que reúne os extrativistas do cacau do Purus, preocupada em tornar essa produção extrativista sustentável e permanente, procurou os profissionais da Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre – Ufac para estudar essa produção e conceber um Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus. Uma primeira expedição será realizada no período de 16 a 24 de maio próximo, quando os engenheiros florestais estarão no município de Boca do Acre, no Manejo florestal comunitário

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Amazonas, para conhecer o rio Purus e o Manejo Comunitário praticado pela Cooperar. A expedição faz parte das atividades inseridas no projeto Manejo Florestal Comunitário na Várzea do Rio Purus, recentemente aprovado no âmbito do Edital 036 do CNPq, fruto de uma ampla parceria firmada entre representantes da academia, de institutos de pesquisas, de empresas de extensão florestal e a Cooperar. Além do importante envolvimento da Universidade de Freiburg, da Alemanha. A equipe do projeto cumprirá extensa agenda, que envolve uma rodada de reuniões com a Cooperar para discussão dos objetivos do projeto, visita às áreas de extração de cacau, conhecimento do sistema de escoamento da produção e diagnóstico das doenças do cacaueiro. O objetivo principal da equipe é contribuir para que a elevada produção de cacau oriunda da várzea do Purus, realizada pelos extrativistas, possa ser organizada com a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário, o que dará a requerida sustentabilidade a essa produção. O compromisso firmado entre a equipe do projeto e a Cooperar, que justificou o apoio do CNPq, envolve a realização de um intenso processo de inovação tecnológica direcionado à melhoria do processo produtivo atualmente praticado. O desafio maior do projeto é demonstrar que, com a tecnologia do manejo florestal, é possível produzir o cacau sem a necessidade de plantios. Um desafio complexo e que irá exigir da equipe muita criatividade.

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Anexo 2


DESAFIOS PARA O MANEJO FLORESTAL DO CACAU NATIVO DO PURUS Publicado em junho de 2008

São vários os desafios. Todavia o dilema maior é requerido pela própria empresa alemã que compra o cacau nativo do Purus. Para eles, o sabor do cacau que ocorre naturalmente na várzea do Rio Purus possui características únicas e incomparáveis, quando é transformado em chocolate. Entenda-se por sabor único, um diferencial de mercado que faz com que o produto chocolate consiga melhores preços de venda e, o mais importante, traga identidade para a empresa. Ou seja, o cacau produzido na várzea do Purus possui um gosto que, para quem aprecia chocolate, e são muitos na Alemanha e na Europa, compensa pagar mais por ele. A empresa que adquire esse cacau não faz falsa modéstia com o produto. É a única a vender um chocolate genuíno, nativo, natural, do jeito que a floresta amazônica oferece. Somente quem prova poderá saber a diferença do sabor autêntico e milenar desse cacau. Um mercado que se amplia a cada ano. Afinal, quem não gostaria de experimentar um chocolate que é consumido há milênios e que vem de uma região ícone no mundo: a Amazônia? Para se ter uma ideia, o contrato inicial da empresa com a cooperativa dos produtores do Purus demonstrou que a demanda pelo cacau era bem superior à oferta oriunda do manejo florestal comunitário. Algo, sem dúvida, inusitado no mercado que envolve produtos de origem extrativista da Amazônia. Na maioria das vezes tem-se uma diversidade enorme de produtos que, geralmente, não possuem mercados consolidados. Ocorre que, nesse momento, tal qual o que ocorreu com a borracha no início do século passado, o mercado quer mais desse cacau. E tal qual o que ocorreu com o próprio cacau, com a borracha, com o cupuaçu, com a pupunha, com a pimenta-longa e assim por diante, a tendência seria recorrer aos cultivos comerciais para ampliar a oferta do produto. A história econômica da Amazônia comprova que, sempre que uma espécie florestal ganha dinamismo econômico, a resposta agronômica é rápida. Manejo florestal comunitário

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Domesticação, plantio, colheita e, assim, o ciclo produtivo atende à expectativa do mercado. Um processo intenso de mecanização da produção será o inexorável passo seguinte. Esse procedimento tem justificado a entrada no mercado de vários produtos da floresta amazônica. E tem, igualmente, justificado o afastamento da Amazônia de vários mercados abertos por suas espécies florestais. A borracha ainda é o melhor exemplo dessa triste constatação. Uma vez dominado o sistema de cultivo e o Estado de São Paulo vem dominando o mercado desde 1993. No entanto, a história econômica da Amazônia também tem demonstrado que o que pode salvar a espécie florestal e o seu consequente manejo em ambiente natural é a existência de algumas características importantes para o mercado e que se perdem com ao serem cultivadas. No caso do cacau, a empresa compradora é taxativa. Cacau cultivado não é nativo e por isso não interessa. E aí volta-se ao maior dilema do início deste artigo: Como fazer para triplicar, ou mais, a produtividade de um cacau nativo, sem recorrer aos plantios? A ciência florestal amazônica precisa dar uma resposta contundente. Um passo importante vem sendo dado com uma parceria entre a Ufac e a Universidade Freiburg e um leque variado de outras instituições. Com um projeto apoiado pelo CNPq, está sendo possível reunir um número expressivo de especialistas para se debruçarem sobre o tema. Tudo indica que, em breve, algumas soluções surgirão. Respostas que ajudarão a solucionar os desafios do cacau e, o melhor, do Manejo Florestal Comunitário da Amazônia.

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Anexo 2


MANEJO FLORESTAL MELHORA PRODUÇÃO DE CACAU DO PURUS Publicado em março de 2009

Com apoio do CNPq e da Secretaria de Agricultura Familiar, a Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre – Ufac vem executando uma série de pesquisas para conceber e introduzir inovações tecnológicas na produção extrativa de cacau nativo do Rio Purus, no Amazonas. O projeto de pesquisa tem como objetivo primordial a elaboração, depois de três anos de levantamentos, do Plano de Manejo Florestal do cacau nativo que servirá de referência técnica para que os produtores extrativistas melhorem a produtividade e a qualidade do cacau. Ocorre que toda a produção é exportada para a Alemanha, onde a indústria de chocolates Hachez transforma as sementes de cacau do Purus em um chocolate considerado genuíno pelo seu sabor primitivo ou, como eles dizem, selvagem. É o sabor dos primeiros chocolates produzidos no mundo, pois o cacau é o mesmo de 500 anos atrás. O sucesso do chocolate é evidente. A empresa compra antecipadamente as nove toneladas de sementes de cacau produzidas anualmente pela Cooperar, a cooperativa dos extrativistas do cacau. Todavia, o mercado consumidor do chocolate está estimado em 40 toneladas por ano. Como passar de nove para 40 toneladas de sementes de cacau sem recorrer aos cultivos (quer sejam em monocultivos ou em sistemas agroflorestais) é o maior desafio com que se deparam os engenheiros florestais da Ufac. Acontece que os cultivos de cacau, após anos seguidos de plantios e replantios sucessivos deixaram o cacau sem “sustância”, como dizem os produtores. A tecnologia do Manejo Florestal terá, diante desse grande desafio, que provar sua capacidade de ampliar a produtividade sem acarretar perda ou alterações perigosas de sabor. A empresa que produz o chocolate depende do diferencial de mercado trazido pelo cacau nativo. No momento, quatro estudos fundamentais estão sendo concluídos. O primeiro trata da logística envolvida na produção extrativa de cacau, trazendo inovações de projetos de embarcações e layout de beneficiamento das sementes. Manejo florestal comunitário

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O segundo estudo trata do mapeamento da dispersão dos cacaueiros. Responde a perguntas de quais as condições físicas e biológicas para que a espécie ocorra ou não em determinada área. Três hipóteses estão sendo testadas: da cota 100, do interflúvio do Purus e da floresta sem palmeira. Isto é, o cacau ocorrerá na cota cem, onde haja alagação anual do Purus e, por fim, onde não exista tipologia florestal, densa ou aberta, com palmeiras. Já o terceiro estudo trata da realidade social e econômica na qual aquela população extrativista está inserida. Mostrará um diagnóstico, claro e objetivo, da renda existente nas pequenas propriedades e, o melhor, da participação relativa do cacau na composição dessa renda. Finalmente, o Inventário Florestal quantificará exatamente os pés de cacaueiros nativos, distinguindo as touceiras dos solteiros e, o que é primordial, a estrutura e dinâmica daquele povoamento florestal, sobretudo no que se refere a sua composição por idade. Indo além, o Inventário também irá definir quais as seis espécies florestais que se associam ao cacau para sombreá-lo. Será a primeira vez que um conjunto de inovações tecnológicas estará direcionado para a melhoria da produtividade do cacau e, consequentemente, para elevar o IDH dos produtores extrativistas do cacau nativo do Purus.

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Anexo 2


DOMESTICAÇÃO NÃO, MANEJO NA FLORESTA É A SOLUÇÃO Publicado em fevereiro de 2010

Todas as vezes que uma espécie, vegetal ou animal, presente no ecossistema florestal amazônico adquiriu importância elevada de mercado, os pesquisadores e técnicos que atuavam com a espécie tentaram e, na maioria das vezes conseguiram, sua adaptação em cultivos comerciais, por meio de um processo de domesticação que geralmente exige investimentos públicos elevados. O argumento principal é de que a extração, sobretudo sob o modo extrativista de produção, ou coleta do produto no interior da floresta, apresenta custos elevados, tem baixa produtividade e encontra limitações de oferta. Isto é, a floresta, certamente devido à existência de um equilíbrio complexo entre a diversidade biológica existente, apresenta um número de árvores por hectare difícil de ser alterado, independente do crescimento da demanda comercial pelo produto extrativo. No jargão econômico, trata-se de inelasticidade de oferta. O que significa uma rigidez na quantidade total possível de ser extraída da floresta, alterada somente com a incorporação de novas áreas de florestas ao ciclo produtivo. Não foi outra a razão para que, no auge do ciclo de produção de borracha, nos idos de 1890, a busca pela abertura de novos seringais era frenética. O resultado foi sua domesticação na Malásia, cuja transferência de mudas de seringueira, realizada sob acordos comerciais vigentes à época, até hoje suscita arraigados sentimentos nacionalistas contra um saque que não existiu. O exemplo da borracha é importante para análise, devido ao pioneirismo e à dimensão da tragédia econômica que a domesticação causou à Amazônia. O problema reside na domesticação e não na Malásia ou na Inglaterra. O Brasil também conseguiu, com exímia eficiência, domesticar a seringueira e sua completa adaptação à região Sudeste. O resultado é que desde 1992 São Paulo é recordista nacional na produção de borracha cultivada. Produz mais borracha que toda a Amazônia. Outros exemplos também são sintomáticos, apesar de nenhum outro produto florestal ter se aproximado em importância da borracha. Manejo florestal comunitário

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A domesticação levou da Amazônia o cacau, o cupuaçu, a pupunha e, mais recentemente, a pimenta-longa. Todas, sem exceção, essas espécies foram descobertas no interior da floresta, domesticadas com recursos e esforços dos próprios amazônidas e atualmente, são produzidas fora da região. Ocorre que, por um conjunto variado de razões, que vai da dificuldade de se estabelecer na região uma agropecuária com níveis adequados de tecnologia, passando pela falta de tradição do produtor e chegando até às limitações ecológicas relacionadas à ocorrência de pragas que não existem em outras regiões, a domesticação não vinga na Amazônia e, no curto prazo, prejudica a dinâmica econômica local. A resposta então estaria em uma alteração profunda no jeito de se encarar o processo produtivo relacionado à biodiversidade da Amazônia. Uma alteração que se deveria acatar, sem reclamar, como um dogma, que a oferta de produtos florestais amazônicos podem se realizar somente por meio da tecnologia do Manejo Florestal de Uso Múltiplo, cujos níveis de produtividade, nunca, mas nunca, se compararão com os dos cultivos domesticados. Aceito esse dogma da produção florestal, o esforço técnico e científico deveria se voltar à melhoria diária das técnicas de manejo, com o desenvolvimento de inovações em logística, extração, beneficiamento e assim por diante. Com o fantasma da domesticação estirpado, a criatividade dos amazônidas encontraria solução para a melhoria do Manejo Florestal de Uso Múltiplo.

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Anexo 2


INVENTÁRIO FLORESTAL DO CACAU NATIVO DO PURUS É TEMA DE MONOGRAFIA Publicado em maio de 2010

Projeto de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, apoiado pelo CNPq desde 2007, com recursos financeiros da Secretaria de Agricultura Familiar, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, publicou seu primeiro documento acadêmico, uma monografia elaborada por Hudson Veras, intitulada: INVENTÁRIO FLORESTAL DIAGNÓSTICO DO CACAU NATIVO E ESPÉCIES ASSOCIADAS NA VÁRZEA DO MÉDIO RIO PURUS – AMAZONAS, apresentada como requisito final para graduação em Engenharia Florestal na Universidade Federal do Acre. O projeto possui uma rede de instituições envolvidas na sua execução e que acreditam na possibilidade de o manejo florestal comunitário do cacau nativo do Purus se configurar em importante componente no uso múltiplo da biodiversidade existente na região. Instituições como a Agência de Cooperação Técnica Alemã – GTZ, Universidade Estadual Paulista – Unesp, Universidade Federal de Viçosa e a Universidade de Freiburg, na Alemanha, se uniram à Cooperativa dos produtores, Cooperar, e a empresa que compra todo o cacau para a produção de chocolate de altíssima qualidade, Hachez, para encontrar uma saída para um grande e genuíno desafio: aumentar a oferta de sementes de cacau por meio do manejo florestal comunitário. O problema que originou o desafio é que a empresa tinha uma demanda para 40 toneladas de sementes de cacau nativo e a Cooperar consegue ofertar, no máximo, nove toneladas. Como passar de nove para 40 toneladas sem apelar para os cultivos, ou seja, intervindo no povoamento do cacau em ambiente nativo ou florestal. A primeira informação importante para subsidiar estratégias de manejo dizia respeito à definição dos padrões de ocorrência do cacau. A equipe de Engenheiros Florestais precisava saber onde encontraria, na extensa área coberta pela margem do Rio Purus, povoamentos de cacau. Três hipóteses foram testadas e comprovadas.

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Existirão povoamentos agregados de cacau sempre que ocorrerem, simultaneamente, as três hipóteses: a cota altimétrica for de 100 metros, a área estiver sujeita aos interflúvios do Purus (que é atingida pelas cheias anuais) e estiverem associados à tipologia florestal de Floresta Densa ou Aberta, desde que sem palmeiras. Com o cruzamento dessas três condições para a existência de povoamentos de cacau, foi possível definir a área de ocorrência e a segunda pergunta importante poderia ser respondida: na área de ocorrência existem quantos pés de cacau? Pergunta respondida pelo Inventário Florestal. A equipe envolvida na pesquisa, a partir de agora, pode planejar suas ações sabendo que existem 7,84 indivíduos de cacau em cada hectare de mata ciliar, no Purus. E mais, que sete espécies arbóreas se associam ao cacau para sombreá-lo, quais sejam: Cecropia sp. (embaúba), Eschweilera odorata (matá-matá), Hevea brasiliensis (seringueira), Fícus sp. (gameleira), Aspidosperma sp. (amarelinho), Pouteria sp. (abiurana ou maparajuba), Calycophyllum spruceanum (mulateiro). Os próximos trabalhos acadêmicos irão discutir a metodologia do Inventário Florestal, o mapeamento de povoamentos florestais por imagens de satélite e de radar, o estudo de genética de populações do cacau, a logística de produção do cacau e, por fim, o teste dos oito protocolos de manejo já concebidos. Novas monografias serão apresentadas até o final de 2010. Além dos estudos realizados na Ufac, o projeto prevê também a realização de três trabalhos com alunos ligados à Universidade Freiburg, na Alemanha, relacionados à quantificação dos cacaueiros, à germinação por sementes e estaquia e à propagação das sementes de cacau na floresta. O projeto, ao final, entregará à Cooperar um Plano de Manejo Comunitário do Cacau Nativo do Purus, para ofertar, com gerenciamento, 40 toneladas de cacau.

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Anexo 2


ENGENHEIROS FLORESTAIS USAM SATÉLITE PARA MAPEAR CACAU NATIVO DO RIO PURUS Publicado em junho de 2010

Pesquisa desenvolvida por Kamilla Andrade de Oliveira estabeleceu os padrões de ocorrência para o cacau nativo do Purus. Isto é, com a conclusão dos estudos de mapeamento temático com uso de imagens de satélite de média resolução, tornou-se possível saber onde estão os povoamentos nativos de todo cacau existente nas margens do Rio Purus. A monografia, denominada de CLASSIFICAÇÃO DE IMAGENS LANDSAT 5 PARA MAPEAMENTO DO CACAUEIRO NATIVO (Theobroma cacao L.), DO RIO PURUS – AMAZONAS, foi elaborada como requisito para a conclusão do Curso de Engenharia Florestal da Ufac e está incluída no Projeto de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo do Purus, apoiado pelo CNPq, com recursos oriundos da Secretaria de Agricultura Familiar, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. O projeto é fruto de uma ampla parceria que envolve a Universidade Estadual de São Paulo – Unesp, responsável pelos estudos de logística para o escoamento do cacau, a Universidade Federal de Viçosa, responsável pelo mapeamento por satélite do cacau e a Universidade Federal do Acre, responsável pela elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do Cacau Nativo, que é o objetivo principal do Projeto. Os beneficiários diretos das ações do Projeto são os associados da Cooperativa dos Extrativistas do Purus e Mapiá, a Cooperar. Também fornecem apoio fundamental ao projeto a Agência de Cooperação Alemã – GTZ, e a empresa de chocolates Hachez, que adquire toda a produção da Cooperar. O mapeamento dos povoamentos por imagem de satélite era um passo fundamental para as ações de planejamento da produção de cacau pelos extrativistas. A partir de agora, com a localização dos povoamentos será possível estabelecer procedimentos para melhorar a logística de produção e determinar a quantidade de famílias de extrativistas que poderão, efetivamente, se juntar à safra anual do cacau.

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Trata-se da segunda monografia concluída pelo projeto (a primeira quantificou o povoamento de cacau por meio de Inventário Florestal) que ainda irá apresentar estudos socioeconômicos sobre os manejadores de cacau, de genética dos cacaueiros, de logística de transporte, de protocolos de manejo e, ao final, o Plano de Manejo Florestal Comunitário. Com a imprescindível orientação do professor Pedro Christo, da Universidade Federal de Viçosa, a pesquisa comparou tecnologias de interpretação de imagens de satélite, com o objetivo de trazer a maior precisão possível entre o que é visto na imagem e o que existe na realidade. Considerada pela Banca Examinadora de elevado nível técnico, a monografia conclui que as ferramentas de sensoriamento remoto podem ser utilizadas para mapear povoamentos florestais, com percentual de acertos superior a 95%, o que é considerado ideal pela Engenharia Florestal. E mais, os custos associados à realização de Inventário Florestal e de elaboração do Plano de Manejo são reduzidos de forma significativa, com o emprego das imagens de satélite. Parabéns para Kamilla, agora também engenheira florestal, que conseguiu algo inusitado: Destrinchar os pormenores da alta tecnologia dos satélites, ao mesmo tempo que entendia o cotidiano das populações tradicionais do Purus.

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ESTUDO SOCIOECONOMICO REVELA: CACAU NATIVO É MELHOR OPÇÃO NO PURUS Publicado em outubro de 2010

Com apoio do CNPq, por meio de recursos oriundos da Secretaria de Agricultura Familiar, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, uma equipe de pesquisadores vem, desde 2007, pesquisando o extrativismo do cacau nativo localizado nas margens do Rio Purus. O projeto é fruto de um consórcio formado pela Universidade de Viçosa, que se responsabilizou pelo mapeamento da dispersão do cacau nativo ao longo da margem do Rio Purus, no trecho entre a foz do Iaco, em Sena Madureira, no Acre, e a cidade de Lábrea no Amazonas, com emprego de imagem de satélite de média resolução. Esse estudo, já publicado em monografia, permitiu saber onde e em quais condições o cacau nativo aparecia. Já a Unesp se envolveu no estudo da logística necessária para fazer com que o cacau fosse extraído e colocado no mercado. Todos os passos necessários ao processamento primário da semente e seu transporte até o destino final foram minuciosamente detalhados para sua otimização. O projeto conta ainda com apoio fundamental da Agência de Cooperação Alemã – GTZ e da Universidade de Freiburg, que concluiu estudos de Inventário Florestal, reprodução do cacau e sobre a fauna silvestre que consome o cacau. Com três anos de duração e orçado em R$ 200.00,00, o projeto se encerra com a elaboração do Plano de Manejo Florestal Comunitário do cacau nativo, que permitirá aos produtores associados à Cooperativa dos Extrativistas do Purus e Mapiá – Cooperar ampliar sua produção de sementes de cacau nativo, para atender a uma demanda cada vez maior. Ocorre que a necessidade de se elaborar o plano de manejo surgiu a partir de um acordo comercial firmado entre a Cooperar e a empresa alemã Hachez, produtora de um chocolate de alta qualidade. A empresa resolveu investir na oferta de um chocolate obtido de um cacau primitivo e selvagem, com o sabor diferenciado do cacau nativo da Amazônia. O produto fez sucesso no mercado alemão e a demanda inicial de nove toneladas teve que ser ampliada para 40 toneladas de sementes de cacau. Manejo florestal comunitário

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Como ampliar a produtividade sem apelar para a domesticação e o cultivo, afinal, o cacau teria que ser selvagem, foi o desafio trazido pela Cooperar para a Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre – Ufac, que se incumbiu pela concepção dos protocolos de manejo necessários à ampliação da produção em ambiente florestal. O que foi possível com a conclusão do estudo de socioeconomia dos extrativistas envolvidos na produção de cacau nativo do Purus, objeto de monografia do Engenheiro Florestal Israell Ricardo Melo, graduado na Ufac, que mostrou a realidade do cotidiano daquela comunidade e, o mais importante, permitiu conceber inovações tecnológicas adequadas a essa realidade. O denso estudo socioeconomico, que teve por base de dados a realização de mais de 800 entrevistas com os ribeirinhos do Purus, também revelou a importância da produção de cacau nativo para dinâmica econômica local. Com a extração do cacau e o processamento das sementes, o extrativista pode conseguir, durante a safra, o equivalente a R$ 50,00 por dia de produção. É a atividade que melhor remunera o trabalho daqueles produtores. Além dessa importância econômica, como afirma Israell, o manejo comunitário do cacau nativo é a atividade produtiva mais adequada ao ecossistema florestal do Purus e aos ideais de sustentabilidade atualmente preconizados para a Amazônia. Somente isso devia bastar para receber atenção de políticas públicas.

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Anexo 2


Manejo florestal comunitรกrio

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Bibliografia


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Manejo florestal comunitário

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Esta publicação foi possível graças ao empenho da Associação Andiroba www.andiroba.org.br Equipe técnica e co-autores Domingos Ramos de Assis Kamila Andrade Hudson Veras Israell Melo Kaline Rossi Andressa Gmak Capa Rayza Mucunã Projeto Gráfico e diagramação Rayza Mucunã e Marianna Schmidt Ilustrações Leonardo Trombetta Amaral Fotografias Acervo do projeto Este livro foi composto nas tipografias Scala Sans e ChaparralPro. Seus 400 exemplares foram impressos em papel off-set 90g/m2 pela Gráfica Lisboa, em Vitória - ES.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Manejo Florestal Comunitário: Cacau Nativo do Purus. Rodrigues, Ecio; Lins, A.; Lima, J.; Cristo, P.; Pereira, L.R.; Torrico, R.V. Associação Andiroba. Rio Branco: Editora do autor. 2011. 200p; 23cm. ISBN – 978-85-907253-6-7 1. Amazônia 2. Ecossistema Florestal 3. Rio Purus 4. Cacau Nativo 5. Boca do Acre.


AUTORES Ecio Rodrigues é Doutor em Desenvolvimento Sus­ tentável, com graduação em Engenharia Florestal; atualmente, é professor de Política Florestal na Ufac.

Alexandre Lins é economista formado pela UnB; atu­ almente, exerce o cargo de Presidente da Cooperar.

Jairo Lima é Doutor em Sistemas de Transportes, com graduação em Engenharia Civil; atualmente, é professor na Unesp.

Pedro Cristo é Doutor em Ciências Florestais, com graduação em Engenharia Florestal; atualmente, é assessor da Cooperar.

Luciana Pereira é engenheira florestal, com experi­ ência em Inventário Florestal na Amazônia; atual­ mente, é consultora da Associação Andiroba.

Jaime Sass é o administrador da Cooperar, responsá­ vel pelo gerenciamento da aquisição e comerciali­ zação das safras de cacau.

Raul Torrico é Mestre em Desenvolvimento Regio­ nal, com experiência em Ordenamento Territorial; atualmente, é consultor da Associação Andiroba.

Edmilson Cruz é Doutor em Inventário Florestal, com graduação em Engenharia Florestal; atu­ almente, é professor de Dendrometria na Ufac.

Nei Gomes é Doutor em Silvicultura, com gradua­ ção em Engenharia Florestal; atualmente, é pro­ fessor de Silvicultura na Ufac.


Relato da experiência levada a cabo mediante o projeto Manejo Florestal Comu nitário do Cacau Nativo do Purus financiado pelo CNPq com recursos da Secretaria de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário -, em cujo âmbito foram realizados estudos pioneiros sobre o cacau nativo localizado na mata ciliar dos rios da Amazônia. As pesquisas desenvolvidas culminaram na elaboração de um Plano de Manejo Florestal Comunitário. Trata-se, não há dúvida, de uma experiência precursora e ousada. Este livro foi elaborado com base no relatório final do projeto enviado ao CNPq, nos termos do Edital MCT/CNPq/ MDA/SAF/MDS/SESAN 36/2007 - Agricultura Familiar - Processo CNPq 551817/07-0.


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