Revista RG News vol 3 n°1 2017

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Revista

RG NEWS V.3

N.1

2017

Sociedade Brasileira de Recursos GenĂŠticos


Revista RG News 3 (1) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Revista Recursos Genéticos News - RG News Brasília, DF V3 (1) 2017 – 136p. Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos Foto Capa: Paulo Sérgio da Costa Moura - 1° colocado II Concurso de Fotos da Biodiversidade realizado durante o IV Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos.

A eventual citação de produtos e marcas comerciais, não expressa, necessariamente, recomendações de seu uso pela SBRG. É permitida a reprodução parcial, desde que citada a fonte.

"Toda a forma de vida é uma manifestação de Deus e está sob os nossos cuidados. Proteja o que é seu - sua fauna sua flora. As plantas e os animais embelezam a terra. São úteis ao homem e representam a riqueza da Pátria. Nunca se deve mutilar, destruir ou deixar que destruam estes bens. Vamos amar nossos animais domésticos. Vamos dar aos selvagens a paz que eles têm direito. Permitamos que enfeitem nossas florestas. Vamos amar os pássaros puros e belos, cantando nas ramagens, voando alegres no espaço ilimitado, como verdadeiros símbolos de liberdade!" São Francisco de Assis (1212) ...sobre a extinção de espécies...

Editada pela SBRG


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Revista RG News Publicação eletrônica oficial da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos COMISSÃO EDITORIAL DA REVISTA Editor Chefe: Renato Ferraz de Arruda Veiga Editor Chefe-substituto Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira Editor Técnico Científico - Área Animal: Afrânio Gonçalves Gazolla Editor Técnico Científico - Área Micro-organismos: Maíra Halfen Teixeira Liberal Editor Técnico Científico - Área Vegetal: Manoel Abílio de Queiróz

DIRETORIA DA SBRG Presidente - Alexandre Floriani Ramos Vice-Presidente - Rosa Lia Barbieri Diretor Financeiro - Marcos Aparecido Gimenes Vice-Diretor Financeiro- Juliano Gomes Pádua Secretário Executivo - José dos Santos Neto Diretor Técnico e de Divulgação - Renato Ferraz de Arruda Veiga Vice-Diretor Técnico e de Divulgação - Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira Diretor de Curadorias e Redes Regionais - Manoel Abílio de Queiróz Vice-Diretor de Curadorias e Redes Regionais - Semíramis Rabelo Ramalho Ramos Diretora de Eventos - Ana Cecília Ribeiro de Castro Vice-Diretora de Eventos - Fernanda Vidigal Duarte Souza


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Revista RG News v.3, no. 1., 2017 APRESENTAÇÃO A RG News é uma revista oficial da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos. Iniciou com seu primeiro número sendo publicado no segundo semestre de 2015. Com periodicidade semestral, encontra-se neste quarto número, o primeiro do ano de 2017. Trata-se de uma revista eletrônica que objetiva divulgar textos sobre recursos genéticos. Abrange desde artigos científicos de pesquisa como de trabalhos de extensão, além de possibilitar a divulgação de eventos, contos, homenagens, etc., em recursos genéticos, quer seja animal, micro-organismo ou vegetal. Seu público original é o de associados da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, mas também publica textos de colegas de outras Sociedades Científicas do país e exterior. A língua oficial é o Português, mas também são aceitos textos em inglês e espanhol. Tem a pretensão de alcançar os especialistas que atuam tanto in situ como ex situ, nas Redes e/ou Curadorias, de Bancos Ativos de Germoplasma e de Coleções Científicas (Herbários, Museus, etc.). Os autores são os únicos responsáveis pelo conteúdo dos seus textos, não sendo necessariamente a mesma visão ou opinião da Revista e nem da Sociedade. Os revisores convidados efetivam sugestões apenas com o intuito de uniformização, que também podem ou não ser aceitas pelos autores. Estamos esperando o seu revistargnews@recursosgeneticos.org.

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basta

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Aproveitem para se instruir, se atualizar e se divertir com os textos de nossa revista, abraços a todos!

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CONTEÚDO I – A PALAVRA DO PRESIDENTE ...................................................................................... 6 a) Conclusão de um ciclo................................................................................. 6 Marcos Aparecido Gimenes ........................................................................................... 6 b) Assumindo a missão ..................................................................................................... 8 Alexandre Floriani Ramos ............................................................................................. 8 II - ARTIGOS DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA ......................................................................... 9 1. Conservação genética dos gigantes da Mata Atlântica: o exemplo do Jequitibá-rosa (Cariniana legalis (Mart.) Kuntze), na Estação Experimental de Luiz Antônio – SP .............. 9 2. A Introdução de Germoplasma de Soja no Piauí .......................................................... 16 3. Espécies Invasoras Exóticas Danosas ........................................................................... 23 4. Borboletário: Preservação e Conservação de Recursos Genéticos .................................. 27 5. Marcadores Moleculares em Recursos Genéticos Vegetais ............................................ 35 6. Óbices no Processo de Intercâmbio Agrícola ................................................................ 39 7. Recursos Genéticos de Frutíferas Tropicais: Parte 1 ...................................................... 45 8. Recursos Genéticos de Frutas Tropicais: Parte 2 ........................................................... 55 9. A Sexta e a Sétima Ondas do Desenvolvimento Humano ............................................. 65 10. Biotechnological interventions in preserving environment through bioremediation .................... 70 11. Conservação ex situ de germoplasma de espinheira-santa ............................................. 79 III - ENTREVISTADOS DA VEZ ............................................................................................... 86 a) Área Micro-organismos .............................................................................................. 86 Maria Aparecida Vasconcelos Paiva e Brito .................................................................. 86 b) Área Animal ............................................................................................................... 94 Sandra Aparecida Santos ............................................................................................. 94 c) Área Vegetal ............................................................................................................. 100 Ignácio José de Godoy ............................................................................................... 100 IV - EXPRESSE A SUA OPINIÃO .............................................................................................103 1. Por que acreditamos que a Rede Brasileira de Jardins Botânicos pode se integrar com a Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos? .................................................................. 103 2) A Necessária Utilização de Estratégia e Tática contra Pragas Quarentenárias A2 no Brasil ..................................................................................................................................... 113 3) Campanha da Fraternidade 2017: Vamos Salvar os Biomas Brasileiros ....................... 117 V - EVENTOS .............................................................................................................................119 Aconteceu..................................................................................................................... 119 IV Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos – IV CBRG ........................................ 119 Acontecerá ................................................................................................................... 123 III Simpósio da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste ............................. 123 4


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VI – MEMÓRIA DOS RECURSOS GENÉTICOS .....................................................................125 a) Memória Internacional ............................................................................................. 125 Erna Bennett (1925-2012) ........................................................................................... 125 b) Memória Nacional.................................................................................................... 127 Ahmés Pinto Viégas (1905 – 1986) ............................................................................. 127 VI – HOMENAGENS PÓSTUMAS ............................................................................................129 Fernando Irajá Félix de Carvalho ............................................................................... 129 Antonio Fernando Caetano Tombolato ..................................................................... 130 VIII – INSTITUIÇÃO HOMENAGEADA .................................................................................132 Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” ...................................................... 132 IX – APOIO ................................................................................................................................134 X – NORMAS DA REVISTA .....................................................................................................135

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I – A PALAVRA DO PRESIDENTE a) Conclusão de um ciclo Marcos Aparecido Gimenes Ex Presidente da SBRG

Graduado em Ciências Biológicas (1990). Me (1993) e Dr (1997) em Ciências Biológicas (Genética) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Botucatu. Pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia e Professor e Orientador do curso de Pós-graduação em Ciências Biológicas da UNESP-Botucatu. Atuando principalmente em caracterização de recursos genéticos. Presidente da SBRG por dois mandatos (2013 a 2014 e 2015 a 2016) e atual diretor Financeiro.

Prezados sócios e amigos da SBRG, Após ter tido o prazer de trabalhar por duas gestões seguidas na qualidade de presidente, entrego o cargo para ao colega Alexandre Floriani desejando a ele e à nova diretoria toda sorte do mundo! Entre as muitas realizações da diretoria anterior, destaco a criação da Revista RG News, que aproveito a oportunidade para passá-la a nossa nova diretoria! A RG News tem permitido que as experiências dos grandes nomes em recursos genéticos do Brasil sejam registradas e disponibilizadas para a comunidade! A nova gestão terá a honra de ser a responsável pela comemoração do 10º Aniversário da SBRG, que acontecerá durante o V Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos, a ser realizado na cidade de Fortaleza/CE em novembro de 2018. O 10º aniversário da SBRG é um fato extremamente relevante, que demonstra a efetiva consolidação de nossa sociedade e marca o início de uma nova etapa de sua “juventude”, que será com certeza cheia de autoconhecimento e de novas experiências, o que considero extremamente necessários para o seu amadurecimento. Tenho certeza que a SBRG continuará prosperando dia a dia e ficando cada vez mais forte! Lembro que já vencemos alguns desafios, mas ainda temos outros muito importantes que só poderemos vencer juntos, isto é, atuando como sociedade, como, por exemplo: Criação de comitês assessores e de linhas para financiamento de projetos específicos para recursos genéticos;

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Destinação de verbas para conservação in situ e conservação ex situ em bancos de germoplasma por órgãos federais, estaduais e municipais; Implementação de um Programa Nacional de Recursos Genéticos; Criação de Redes Regionais de Recursos Genéticos nas regiões Centro-Oeste, Norte e Sudeste e apoio às Redes já existentes. Aproveito para agradecer a minha querida amiga e orientadora Dra. Catalina Romero Lopes, por ter me mostrado a beleza e a importância dos recursos genéticos. Obrigado a todos pelo apoio recebido! Vamos em frente! Abraços, Marcos Gimenes.

Nova diretoria eleita para mandato 2016-2018 Da direita para esquerda: José dos Santos Neto (IAPAR) - Secretário Executivo; Dr. Manoel Abílio de Queiroz (UNEB) - Diretor de Curadorias e Regionais; Dr. Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira (USC) – Vice-Diretor Científico e de Divulgação; Dr. Alexandre Floriani Ramos (EMBRAPA) – Presidente; Dra. Rosa Lia Barbieri (EMBRAPA) - Vice-Presidente; Dr. Marcos Ap. Gimenes (EMBRAPA) - Diretor Financeiro; Dr. Renato Ferraz de A. Veiga (FUNDAG) - Diretor Científico e de Divulgação; Dra. Fernanda Vidigal Duarte Souza (EMBRAPA) - Vice-Diretora de Eventos; Dra. Semíramis Rabelo R. Ramos (EMBRAPA) - Vice-Diretora de Curadorias e Regionais; Dra. Ana Cecilia R. de Castro (EMBRAPA) - Diretora de Eventos

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b) Assumindo a missão Alexandre Floriani Ramos Presidente da SBRG Graduado em Medicina Veterinária pela UF de Santa Maria (2000), especialização em Produção Animal (2002) pela UE de Santa Catarina, Me em Medicina Veterinária (2004) e Dr. em Ciência Animal pela UF de Minas Gerais (2006). Atualmente é Pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Editor Chefe Adjunto da Revista Brasileira de Reprodução Animal e Curador do Banco Brasileiro de Germoplasma Animal. Tem experiência na área de Medicina Veterinária, com ênfase em Biotecnologia da Reprodução voltada a Conservação de Recursos Genéticos Animais. Ex Diretor Financeiro da SBRG.

Em janeiro deste ano a nova diretoria deu início ao seu trabalho frente à SBRG e não medirá esforços para conduzi-la com dedicação, respeito e seriedade, uma vez que a missão da SBRG é promover o desenvolvimento, a difusão de conhecimento e contribuir para a formação e atualização dos profissionais que atuam na área de Recursos Genéticos animais, vegetais e de microrganismos. O compromisso dessa gestão é dar continuidade ao trabalho já desenvolvido, sendo assim, já demos início a ações para viabilizar o próximo Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos que ocorrerá em novembro de 2018, e estamos apoiando a realização do III Simpósio da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste que ocorrerá no mês de outubro desse ano. A nova diretoria também tem como objetivo aumentar o número de sócios atuantes, para assim buscarmos meios para ampliar a participação da SBRG nas discussões sobre o tema Recursos Genéticos, pois como sabemos a união faz a força! Convidamos todos nossos associados e apoiadores a atuarem junto conosco nessa missão e vamos em frente objetivando transformar nossos sonhos em realidade. Devo lembra que contamos sempre com a participação ativa de cada associado, para promover a SBRG e nossa especialidade, ampliando seu reconhecimento e valorização. Para tanto, dispomos dos canais de divulgação como a Revista RGNews, o site da SBRG e nossas páginas do Facebook. Esses espaços podem ser utilizados para a divulgação de informações, opinião, artigos técnicos, fotos e vídeos relacionados ao tema Recursos Genéticos. A participação do associado nesse processo é fundamental e bastante simples, basta enviar um e-mail para sbrg@recursosgeneticos.org. Contem comigo e com os demais membros de nossa nova diretoria, seguimos juntos!

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II - ARTIGOS DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA 1. Conservação genética dos gigantes da Mata Atlântica: o exemplo do Jequitibá-rosa (Cariniana legalis (Mart.) Kuntze), na Estação Experimental de Luiz Antônio – SP

Miguel Luiz Menezes Freitas Eng. Agr. (UniTau-1992), Me. em Sistemas de Produção (FEIS/Unesp Jaboticabal - 1999) e Dr. em Genética e Melhoramento de Plantas (FCAV/Unesp Jaboticabal - 2003). É PqC VI do Instituto Florestal de São Paulo desde 2004, Diretor Geral entre 2012 e 2015.

Tamires Gonçalves Bióloga e Mestre em Ecologia e Tecnologia Ambiental pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG). Pós-graduanda do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor/Unicamp).

Resumo As árvores de grande porte possuem funções chave para a manutenção da biodiversidade em paisagens fragmentadas, contudo estas tornam-se cada vez mais raras com o processo de fracionamento e perda de habitats. Nesse contexto, estudos e ações que visem a conservação das gigantes das florestas são de extrema importância. O Instituto Florestal do Estado de São Paulo (IF) vem, desde a sua fundação, desenvolvendo pesquisas visando contribuir para a preservação e conservação da biodiversidade do estado. A implantação de bancos ativos de germoplasma (BAG) é uma das missões que o IF vem desempenhando ao longo dos anos, possuindo atualmente cerca de 75 espécies cuja variabilidade genética vem sendo mantida nos BAG. A espécie Cariniana legalis (Mart.) Kuntze, da família Lecythidaceae, popularmente conhecida como Jequitibá-rosa, é uma das gigantes endêmicas da Floresta Atlântica que o Instituto vem ajudando a preservar in situ e conservar ex situ. A espécie pode atingir 60 m de altura, 4 m de diâmetro e viver até 500 anos. Contudo, devido à extensiva destruição da Floresta Atlântica, o 9


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Jequitibá-rosa é uma das espécies em vias de extinção, o que evidencia a importância do BAG implantando na Estação Experimental (EE) de Luiz Antônio. A existência deste e de outros BAG sob a gestão do IF fomenta oportunidades de se plantar florestais nativas, contribuindo sobremaneira para a conservação da biodiversidade.

Histórico do Instituto Florestal do Estado de SP: missão pautada na conservação A fragmentação de habitats é um processo que vem ocorrendo em muitas florestas ao redor mundo em função das atividades humanas. Nesse processo, a estrutura, a distribuição e a funcionalidade dos ecossistemas são totalmente alteradas, levando à perda de biodiversidade. Tal problema tem se mostrado particularmente crítico nas regiões tropicais, que possuem uma elevada diversidade de espécies arbóreas, muitas das quais possuem baixa densidade populacional (LAURANCE et al., 2000). As grandes árvores desempenham importantes funções nos ecossistemas florestais, sendo consideradas elementos chave (keystone) para a manutenção da biodiversidade em paisagens fragmentadas. Isso porque essas árvores, com suas grandes copas, fornecem abrigo, alimentos e outros recursos para várias espécies, sendo cruciais para a sobrevivência das florestas (MANNING, FISCHER&LINDENMAYER, 2006). Dessa forma, estudos e ações que visem a conservação e a preservação destas espécies são de extrema importância. Neste sentido, o IF tem trabalhado em diversas ações que visam a proteção das florestas. Criado em 1896 e inicialmente conhecido como Serviço Florestal do Estado de São Paulo, o IF esteve à frente da criação de Hortos, Estações Experimentais, Viveiros Florestais, Florestas, Parques e Reservas Estaduais, culminando na gestão em pesquisa e preservação de aproximadamente 3,5% da área total do Estado de São Paulo. No que diz respeito à conservação genética, o IF teve como primeira representante dessa missão a engenheira agrônoma Dr.ª Yone Pásztor (foto) que, na década de 1960, foi responsável pelos primeiros trabalhos de conservação genética e pelas coletas iniciais de sementes no atual Parque Estadual Alberto Loefgren (“Horto Florestal”), que hoje abriga a sede do Instituto. No final da década de 1970 foi formalizado o Programa de Conservação Genética e Melhoramento Florestal (CGMF), composto pelos subprogramas Essências Nativas e Essências Exóticas. O Programa teve como prioridades o estabelecimento de áreas de atuação e implantação de pomares de sementes, bancos clonais, testes de progênies, áreas de produção de sementes, testes de procedências, instalação de populações base de conservação e melhoramento genético das espécies de interesse atual ou potencial, entre outras atividades científicas inerentes à preservação e conservação genética e melhoramento genético florestal.

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A partir de 1987, os objetivos do Programa passaram a dar atenção à obtenção de sementes melhoradas em curto prazo, em atendimento à demanda interna, evitando importação de material exótico e garantindo a exploração da variabilidade genética do material já existente, além de garantir a conquista de ganhos genéticos que propiciassem aumento contínuo de produtividade. A obtenção de sementes melhoradas, visando usos específicos, permitiu o desenvolvimento de estudos de origens e/ou procedências adaptadas às regiões de cultivo do Estado de São Paulo (edafoclimáticas), estudos de parâmetros genéticos, além da conservação do material genético de qualidade superior nos BAG. Desde então, com o intuito de se produzir sementes para possíveis restaurações florestais e/ou melhoramento genético florestal, as já citadas 75 espécies arbóreas foram sendo conservadas e avaliadas em 252 talhões (variando entre 1 a 6 ha e milhares de acessos) de pesquisa nas Unidades Experimentais. No que tange à conservação ex situ de espécies nativas, 24 ensaios com espécies consideradas prioritárias para a conservação foram instalados de forma homogênea (talhões puros) em áreas geridas pelo IF. Tais ensaios são extremamente relevantes para a conservação das espécies nativas, uma vez que o número de indivíduos e populações naturais tem declinado ao longo dos anos, o que resulta no estreitamento da base genética dessas populações, colocando-as sob o risco de extinção. Dessa forma, a criação de BAG dessas espécies se justifica à medida que estes auxiliam a reverter o quadro de vulnerabilidade à extinção em que se encontram, além de complementar a preservação in situ realizada em Unidades de Conservação da Natureza. Estes BAG - IF contribuem sobremaneira para o cumprimento da missão na qual a Instituição está alicerçada. Atualmente o IF conta com a colaboração de laboratórios de Silvicultura e Melhoramento Florestal da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Ilha Solteira, Laboratório de Sementes Florestais da Unesp-Jaboticabal e Laboratório de Fitopatologia e Melhoramento Florestal da Unesp-Botucatu, do Laboratório de Biologia Reprodutiva e Genética de Espécies Arbóreas da Universidade de São Paulo (Usp) de Piracicaba, do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética da Universidade de Campinas (Unicamp) e do Laboratório de Sementes e Mudas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) de Sorocaba.

Conservando um Jequitibá-rosa

gigante

da

floresta:

BAG-

A espécie C. legalis (foto, BAG IF) está entre uma das escolhidas como prioritárias para a conservação no Programa (CGMF). É conhecida como uma das árvores gigantes da Floresta Atlântica, pelas suas dimensões e durabilidade. Endêmica da Mata Atlântica, ela habita seu estrato superior, ocorrendo no 11


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subtipo Floresta Ombrófila Densa, formação Baixo-Montana e Floresta Estacional Semidecidual (LORENZI, 2002). Distribui-se naturalmente pelos Estados do Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, e Santa Catarina, entre as altitudes de 30 a 1.000 m, onde ocorre em pequenos grupos nas baixadas e encostas úmidas (CARVALHO, 2003). O Jequitibá-rosa apresenta características de espécie secundária tardia no estágio sucessional, não habitando pastagens e outras áreas abertas, sendo essencialmente uma espécie de ocorrência florestal. Ela é perenifólia, semicaducifólia, com flores hermafroditas, polinizada por abelhas e dispersada por anemocoria. Sua madeira é leve e muito utilizada para tabuados em geral, carpintaria civil, confecção de saltos de sapatos, de brinquedos, lápis, tonéis, mobiliário em geral, produção de celulose, entre outros (CARVALHO, 2003; LORENZI, 2002). De acordo com a International Union for Conservation of Nature (IUCN), uma das principais ameaças à espécie é a perda de habitat, que tem levado a declínios populacionais, restando apenas um reduzido número de exemplares em ocorrência natural, o que coloca a espécie em estado vulnerável à extinção (IUCN, 1996). Apesar de sua enorme importância ecológica e de sua grande utilidade, pouco tem sido feito para salvar a espécie da extinção, sendo que não existem programas específicos de preservação in situ e de melhoramento genético de jequitibárosa (SEBBENN et al., 2000). A preservação in situ tem sido realizada em estações ecológicas e reservas públicas, enquanto que a conservação ex situ tem sido feita através de BAGs implantados no Estado de São Paulo pelo IF. O BAG-Jequitibá-rosa da Estação Experimental de Luiz Antônio foi estabelecido em 9 de novembro 1986 sob a gestão o IF. Implantado na forma de teste de procedência e progênies, este banco tem como missão realizar a conservação ex situ de algumas populações desse gigante da floresta. É composto por 50 matrizes e formado por três populações: Ibicatu, Santa Genebra, e Vassununga. Diversas pesquisas estão sendo conduzidas ao longo desses anos no BAG-Jequitibá-rosa da EE de Luiz Antônio, como por exemplo as avaliações da distribuição da variabilidade genética entre e dentro das procedências e progênies, estudos do comportamento silvicultural da espécie no local de experimentação, quantificação do potencial evolutivo da população a partir de caracteres quantitativos, avaliação e seleção de genótipos para compor um pomar de sementes por mudas. Além disso, o manejo florestal em alguns ensaios possibilita estudos de anatomia e qualidade da madeira, avaliação de rebrotas e avaliação da produção de sementes. O BAG-Jequitibá-rosa possui extrema relevância no contexto atual na qual a espécie se encontra – isto é, praticamente dizimada no estado de São Paulo. As pesquisas conduzidas no banco se justificam diante do fato de que para a efetivação de qualquer programa de conservação e melhoramento genético de uma espécie, é fundamental que se tenha conhecimento acerca dos níveis e da distribuição da variabilidade genética entre e dentro de suas populações (SEBBENN et al., 2000). Além disso, a importância do BAG se traduz no fato de que a partir do material genético ali conservado é possível recuperar áreas degradadas, reflorestar Reservas Legais (RLs) e Áreas de Preservação Permanente (APPs), contribuindo tanto para a preservação da 12


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biodiversidade em ecossistemas florestais, quanto para a conservação do próprio jequitibá-rosa. Outro uso potencial desse banco é a produção comercial de madeira, a partir da seleção de materiais genéticos superiores para esse fim, haja vista o potencial de crescimento da espécie e da qualidade de madeira que foram observados, ao longo dos anos, em estudos realizados a partir de caracteres silviculturais.

Conhecimentos gerados no BAG-Jequitibá-rosa da EE de Luiz Antônio

As avaliações dos ensaios implantados no BAG têm produzido importantes informações genéticas a respeito da espécie. Além disso, o banco já conta com a seleção de matrizes superiores, sendo possível fornecer sementes geneticamente melhoradas para pesquisadores, silvicultores e empresas interessadas na implantação de programas de conservação, melhoramento genético e reflorestamento. Segundo dados coletados em 2005 do Ensaio de Procedências e Progênies de jequitibárosa, com 1.500 árvores de 26 anos de idade, a média de altura dessas árvores foi de 16,1 m e o diâmetro médio foi de 15,3 cm. As maiores árvores foram registradas com 26,5 m de altura e 28 cm de diâmetro a altura do peito (DAP). Em 2009, ao atingir os 30 anos, foi realizado o manejo florestal, com o intuito de diminuir a endogamia da população, uma vez que a distribuição das procedências e progênies estava muito adensada e algumas mortes já estavam ocorrendo. A partir desse desbaste observou-se a ocorrência de rebrotas de cepas, informação inédita, uma vez que não existem talhões de plantio de jequitibá-rosa na forma de pesquisa ou comercial, fora do IF. A partir destes dados gerados na EE de Luiz Antônio (foto - cede), esforços foram sendo somados visando a avaliação de crescimento dessas rebrotas e outros caracteres que não haviam sido antes estudados, a fim de se contribuir para a geração de conhecimento inédito sobre a espécie e seu potencial para a silvicultura comercial. Essas rebrotas chegaram a altura de 1,5 m após 6 meses do corte, o que pode ser um indicativo de uso em plantio comercial, sendo o jequitibá-rosa uma possível substituta, em alguns casos, de espécies de gêneros exóticos em produções comerciais, como Eucalyptus e Pinus. Com o intuito de aprimorar a conservação das espécies, ensaios consorciados com diferentes espécies vêm sendo implantados. Estes ensaios permitem aumentar o número de acessos e de espécies conservadas em uma mesma área, além da avaliação dessas ao uso múltiplo 13


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de espécies em um mesmo ambiente. A região tropical fortalece essa possibilidade de interação entre espécies de diferentes grupos sucessionais e diferentes estruturas fitofisiológicas.

Conclusões Devido ao avançado estado de degradação e fragmentação que se encontram as florestas naturais do estado de São Paulo, ações que promovam a conservação desses ecossistemas são necessárias. Esta mobilização deve ser cada vez mais presente na elaboração de políticas públicas voltadas à manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, uma vez que essas áreas abrigam riquezas imensuráveis em termos econômicos e ecológicos, que estão sendo perdidas em face desse contexto. A redução das populações naturais dos gigantes da Mata Atlântica tem acarretado a perda de genes adaptados a ambientes específicos de colonização dessas espécies. Além disso, a redução contínua no tamanho de muitas populações submete as espécies a perdas de variabilidade, por deriva genética, sujeitando-as ao risco de extinção, uma vez que tais perdas acometem o potencial evolutivo das espécies (SEBBENN et al., 2000). Dessa forma, a conservação genética é uma das principais estratégias do IF para conter a perda de valiosas populações naturais de espécies arbóreas nativas. Manter populações em BAGs vem sendo uma das missões dessa Instituição desde o final da década de 1970, quando foram implantadas dezenas de experimentos na forma de testes de procedências e progênies em diversas unidades do Instituto Florestal. Atualmente o IF conta com acessos de jequitibá-rosa e de outras importantes espécies nativas, prontos para serem melhorados geneticamente para a produção comercial ou para o uso em reflorestamento, caso ocorra algum evento indesejável que comprometa as áreas naturais desta espécie. O fornecimento de sementes com alta variabilidade genética, capazes de atuar na recuperação de ambientes degradados, se traduz em política pública que fomenta oportunidades de se replantar florestas com espécies nativas, consequentemente conservando os recursos hídricos e demais atributos ecológicos de suma importância à preservação da biodiversidade. Os estudos conduzidos nestes BAG têm subsidiado atividades do “São Paulo Amigos da Amazônia” (identificação de madeira pela sua anatomia) – apesar do seu nome também apoiam espécies de Mata Atlântica - fomentando a Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo. A partir destes bancos é possível extrair amostras das plantas sem causar danos à floresta natural, sendo exemplo de pesquisa científica, como é o caso da conservação genética, com seus resultados destinados a políticas públicas na área ambiental.

Referências bibliográficas CARVALHO, P. E. R. Espécies arbóreas brasileiras. Brasília: Embrapa Informações Tecnológica; Colombo: Embrapa Floresta, 2003. 739 p.

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INTERNATIONAL UNION FOR CONSERVATION OF NATURE (IUCN). Americas Regional Workshop (Conservation & Sustainable Management of Trees, Costa Rica, November 1996). 1998. Cariniana legalis. The IUCN Red List of Threatened Species 1998. LAURANCE,W.F.; DELAMONICA, P., LAURANCE, S.G.; VASCONCELOS, H.L.; LOVEJOY, T.E. Rainforest fragmentation kills big trees. Nature, v. 404, p. 836-836, 2000. LORENZI, H. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. 4. ed. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 2002. MANNING, A. D.; FISCHER, J.; LINDENMAYER, D. B. Scattered trees are keystone structures – Implications for conservation. Biologica l Conservation, v. 132, n. 3, p. 311–321. 2006. SEBBENN, A.M.; SIQUEIRA, A.C.F.M.; GARRIDO, L.M.G.; ANGERAMI, E.M. Variabilidade genética e interação genótipo x locais em Jaquitibá-Rosa - Cariniana legalis (Mart.) O. Ktze. Revista do Instituto Florestal, v.12, n.1, p. 13-23, 2000.

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2. A Introdução de Germoplasma de Soja no Piauí

Gilson Jesus de Azevedo Campelo Eng. Agr. pela Escola de Agronomia da Universidade Federal Rural de Pernambuco (1967). Me. em Fitotecnia pela Escola de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1975). Pesquisador da Embrapa Meio-Norte (1976 a 2004) onde desempenhou também a função de Chefe Adjunto Técnico. Atua principalmente com arroz de sequeiro, soja e sistema de produção sustentável nos Cerrados do Meio-Norte do Brasil. Foi agraciado pela UEPAE/Teresina pelo lançamento da cultivar de Soja Tropical e pelas prefeituras de Uruçuí, Bom Jesus e Miguel Alves no Piauí, bem como pelo CREA/PI.

Marcos Lopes Teixeira Neto Eng. Agr. (1979) e Me. (2002) pela U.F. de Goiás. Especialização em Pesquisa de Sistema de Produção Sustentável nas Savanas/Cerrados e Agente de Inovação e Difusão Tecnológica. Atuou na EMATER-PI por 15 anos e desde 1994 na Embrapa Meio-Norte. Supervisor e Chefe Substituto de Transferência de Tecnologias. Atua principalmente com Transferência de Tecnologia para o Setor Agropecuário do MeioNorte, Validação e Difusão de Tecnologias Promissoras para Recuperação e Manejo dos Solos de Cerrados do Meio-Norte, agricultura familiar, e Transferência de Tecnologia para Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) nos Cerrados Nordestinos. Atualmente é Representante da Câmara Setorial do Agronegócio nos Cerrados do Piauí, do Comitê Estadual do Plano ABC Piauí e Coord. Regional da Rede Fomento para Transf. de Tecnol. em ILPF na Região MATOPIBA.

Apresentação A soja (Glycine max (L.) Merr.) é uma planta oleaginosa, da família Fabaceae, utilizada tanto para a alimentação humana como animal. Seu centro de origem situa-se na região central da China (em amarelo no mapa). Provavelmente essa região foi o centro de origem da soja e a região da Manchúria (em marrom claro no mapa), o secundário de diversidade genética (HYMOWITZ, 1970). Domesticada, portanto, em latitudes compreendidas entre 35 e 45° N, foi disseminada posteriormente para a Europa, América do Norte e América do Sul. No Brasil, foi introduzida na Bahia em 1882 e depois, na região Sul do país, onde apresentou melhor adaptação, face às condições bioclimáticas mais semelhantes aquelas das 16


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regiões tradicionais de cultivo (VERNETTI, 1983). A cultura comercial dessa leguminosa só começou a ter expressão econômica no início da década de 1940, no Rio Grande do Sul. Os programas de melhoramento de soja, na região sul do Brasil, basearam-se, inicialmente, na introdução de genótipos desenvolvidos no sul dos EUA, conservados no Banco Ativo de Germoplasma (BAG-Soja) e, posteriormente, incluídos no desenvolvimento de cultivares elite. Nas regiões de expansão e região potencial, compreendendo parte do Norte e Nordeste do Brasil, os programas de melhoramento buscaram o desenvolvimento de genótipos com características de período juvenil longo que resolviam as limitações do porte e da produtividade dos tipos que não apresentavam essa característica (PALUDZYSZYN et al., 1993). Essas características são função do crescimento da soja no período vegetativo, o qual é encurtado consideravelmente em latitudes menores, onde a amplitude entre o dia mais curto e o dia mais longo do ano é menor como ocorre em baixas latitudes (SPEHAR et al., 1993). Existem mais de uma centena de BAG espalhados pelo mundo, mas os principais BAG são mantidos na China, USA, Coréia do Sul, Japão, Alemanha, Índia e Indonésia. O BAG de origem do germoplasma citado, dos EUA (USDA, ARS - Agriculture Research Service, Urbana, Illinois), mantém cerca de 21.000 acessos, de G. max e cerca de 18 espécies correlatas, sendo o segundo do mundo, pois o primeiro fica em Pequim, na China (PIPOLO et al. 2007). No Brasil, o BAG-Soja conta com aproximadamente 5.000 acessos, mantidos na Embrapa Soja, em Londrina-PR, o qual abastece os programas de pesquisa em melhoramento genético do país.

A Soja no Piauí O programa de pesquisa com a soja no estado do Piauí iniciou-se em 1972, na então Estação Experimental “Apolônio Sales” do Ministério de Agricultura, com o apoio da Secretaria de Agricultura do Estado do Piauí, da Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro S/A (SANBRA), da Associação Nordestina de Crédito e Assistência Rural do Piauí (ANCAR-Piauí), atualmente Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Piauí (EMATER-Piauí). Com a criação da Unidade de Execução de Pesquisa de Âmbito Estadual (UEPAE-Teresina), da Embrapa, este programa teve continuidade a partir de 1978/79, com a parceria da Embrapa Soja e com o apoio do Banco do Nordeste do Brasil (CAMPELO & CARVALHO, 1981). Inicialmente introduziram-se na UEPAE de Teresina cerca de 200 (duzentas) linhagens provenientes da Embrapa Cerrados (na época CPAC), onde foram testadas e avaliadas em uma latitude de 5°S pelo pesquisador Gilson Jesus de Azevedo Campelo e sua equipe, com o apoio do Embrapa Soja (na época CNPSoja) e a 17


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participação do pesquisador Irineu Alcides Bays (falecido em 1983 num acidente aéreo quando desenvolvia atividades na região dos cerrados do Maranhão). Destacou-se, entre outras, a progênie uniforme (F6) Lo 75-2280, que posteriormente recebeu a denominação de cultivar Tropical (Figura 1: Detalhe de plantas da linhagem Lo 75-2280 em ensaio na área experimental da Embrapa Meio-Norte em Teresina – PI e que deu origem a cultivar de soja Tropical. 1979). É uma cultivar resistente à pústula bacteriana, com hábito de crescimento determinado, flores roxas, pubescência marrom, sementes amarelas e hilo preto. O número de dias, da semeadura à floração e à maturação é de 50 a 100 dias, respectivamente, tendo porte de 90 cm e altura de inserção das primeiras vagens de 24 cm, o que permitiu melhor eficiência na colheita mecânica. Não foi observado acamamento de plantas, nem deiscência de vagens. Sua produtividade atingiu 2300 kg/ha no município de Teresina e 2100 kg/ha, no município de Água Branca. A partir de 1980, com o lançamento da cultivar Tropical, para regiões de baixas latitudes, criou-se uma demanda natural e permanente por cultivares de soja cada vez mais adaptadas e produtivas para cultivo na região. Em 1982 foi recomenda a cultivar Timbira e em 1983, a BR 10 (Teresina) e BR 11 (Carajás). Em 1987 foram recomendadas a BR-27 (Cariri) e BR-28 (Seridó); em 1988 a BR-32 (Nova Tropical); em 1989 a BR/EMGOPA 312 (Potiguar) e BR 35 (Rio Balsas); em 1991 a Embrapa 9 (Bays); em 1994 foram recomendadas a Embrapa 30 (Vale do rio Doce), Embrapa 31 (Mina), Embrapa 33 (Cariri RC) e a Embrapa 34 (Teresina RC); em 1996 a Embrapa 63 (Mirador); em 1997 a MA/BR 64 (Parnaíba) e a MA/BR 65 (Sambaíba); e em 1998 a MA/BR-164 (Pati) e MA/BR-165 (Seridó RCH). Em 1999 foram recomendadas BRS Babaçu, BRS Boa Vista, BRS Juçara, BRS Tracajá e em 2002 a BRS Candeia. Inicialmente a base genética utilizada nos cruzamentos para segregação de tipos com período juvenil longo foram os genótipos PI 240664, PI 159925, Santa Maria e, a partir dos anos 80, Paranagoiana e PR 77-10001 (MIYASAKA et al., 1970); HARTWIG et al., 1979). Paludzyszin Filho et al. (1993) ressaltaram que as primeiras cultivares de soja desenvolvidas para as regiões norte e nordeste do Brasil (Tropical e Timbira) apresentavam como fonte de período juvenil longo o genótipo PI 240664. Posteriormente, a linhagem IAC 73-2736, que é uma mutação de florescimento tardio da cultivar Hardee, foi muito utilizada, originando cultivares de soja, como BR-10 (Teresina), BR-11 (Carajás), BR-28 (Seridó) e Embrapa 9 (Bays).

Soja em um Novo Sistema de Produção O processo contínuo de recomendação de cultivares para as regiões de médias e baixas latitudes permitiu que extensas áreas da região tropical dos cerrados fossem incorporadas ao processo produtivo agrícola, inclusive viabilizando a exploração econômica de outras espécies de culturas agrícolas e de animais, o que possibilitou a diversificação no sistema de produção dessa região, tendo a soja como a cultura principal no sistema. Dessa forma, foi importante o surgimento do sistema plantio direto, do sistema de integração lavoura-pecuária (ILP) e do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) 18


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que vieram alterar o sistema de cultivo até então de monocultura da soja, para uma estratégia de produção assentada num plano de rotação de culturas e de manejo adequado do solo. Esses sistemas vêm contribuindo sobremaneira para o aumento da produtividade tanto da soja com das outras culturas na rotação como milho (Zea mays L.), feijão-caupi (Vigna unguiculata (L.) Walp.), sorgo rangífero (Sorgum bicolor (L.) Moench), milheto (Pennisetum glaucum (L.R.Br.) e, das forrageiras que passaram fazer parte do sistema, tendo viabilizado a exploração pecuária nessa região. Esse sistema se baseia na consorciação, sucessão e na rotação de culturas e de área e objetiva produzir na mesma área de cultivo grãos, fibras, carne, leite e ao incluir floresta produzir também produtos madeireiros seja para móveis, celulose ou carvão vegetal, que já está consolidado como alternativa para o desenvolvimento mais sustentável do agronegócio (Figura 2).

Figura 2: Tecnologias de ILPF [consórcio milho+capim, bois em terminação a pasto, soja em semeadura direta na palhada de pastagem após pastejo, eucalipto e milho+capim e bois (2006)].

Preconiza-se converter ¼ da área cultivada em monocultivo para a rotação com milho + capim e engorda de bois e/ou ovinos na entressafra e o cultivo de soja passa a ser feito nos outros ¾ da área mas em semeadura direta na palhada do capim após retirada do gado, seguido de “safrinha” com outras culturas de grãos. Assim, o produtor continua produzindo soja como a cultura principal e inclui o milho e o capim para formar pastagem no período das chuvas e que será utilizada para engordar bovinos e ovinos na entressafra com suplementação alimentar a base de ração usando resíduos de culturas da própria fazenda como casquinha da soja e quirera de milho. A importância do sistema observa-se pelos dados obtidos (Tabela 1) em uma das fazendas de referência em sistemas integrados de produção, onde a soja teve incremento de produtividade em oito safras, passando de 47 sacas/ha (média da fazenda) para 59,7 sacas/ha e ainda safrinha 19


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de milho+capim, sorgo granífero, feijão-caupi e milheto pós-colheita da soja, e o milho com produtividade média de 153 sacas/ha e ainda o boi com ganho de peso de 9,8 arrobas/ha de carne bovina (TEIXEIRA NETO et al., 2015). Tabela 1. Rendimento agrícola e pecuário em sistema de ILP na Fazenda Santa Luzia em São Raimundo Mangabeiras, MA. 2004 a 2013.

Ano

Área

Milho

Soja

(ha)

(sacas/ha)

(sacas/ha)

2004/05

43

137

-

-

2005/06

146

143

57,1

-

2006/07

440

145

58,5

8,5

2007/08

800

155

63,0

9,3

2008/09

990

156

60,8

7,3

2009/10

1.065

156

58,1

10,1

2010/11

1.077

160

58,3

9,2

2011/012

1.057

156

59,0

12,8

2012/13

1.050

168

63,0

11,1

-

153

59,7

9,8

Média

Bois @/ha

Impacto da Soja na Economia do Piauí Em 1982 foram plantadas as primeiras lavouras comerciais de soja com 30 ha em Uruçuí e 60 ha em Ribeiro Gonçalves. Na safra 1984/85 foram produzidas cerca de 162 toneladas em 90 ha. Em 2015 a produção atingiu 1,8 milhões de toneladas de soja em uma área de 666 mil hectares que a preço de R$ 1.330,00 a tonelada equivale a um valor total de R$ 2,39 bilhões/ano, com impactos importantes na economia da região dos cerrados piauienses e sendo o principal produto da pauta de exportações do Piauí, conforme mostra a Figura 3 (IBGE, 1998 a 2015).

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PRODUÇÃO DE SOJA PELO AGRONEGOCIO NOS CERRADOS DO PIAUI - SÉRIE HISTÓRICA (FONTE : IBGE, 2015) 2.000.000 1.800.000 1.600.000 1.400.000 1.200.000 1.000.000 800.000 600.000 400.000 200.000 0

Area

Produção

Figura 3. Evolução da área e produção de soja no Piauí. IBGE. GCEA-PI. LSPA, 2015.

A soja vem contribuindo também para outros impactos importantes na região dos cerrados piauienses como a instalação de agroindústrias de produção de óleo e farelo de soja, agroindústria algodoeira, agroindústria de ração e a instalação da produção de frango de corte em grande escala na região. Com esse progresso observa-se melhoria na educação regional onde o ensino superior conta hoje com a Universidade Federal do Piauí/Campus de Bom Jesus, a Universidade Estadual do Piauí e o Instituto Federal do Piauí em Uruçuí. Outro impacto de relevância por força dessa produção é a geração de emprego onde estudos do IBGE/FGV (1995/96) revelam que cada hectare explorado nos cerrados brasileiros gera 0,013 emprego direto e 0,026 indireto, sendo assim os 666.000 hectares cultivados com soja no Piauí na safra 2014/15 proporcionaram cerca de 8.658 empregos diretos e 17.316 indiretos na área de produção da região. Ainda se tem os empregos provocados pelo forte incremento do comercio e serviço na região em função da produção de soja.

Perspectivas de Produção Se considerarmos que a produção de 1,8 milhões de toneladas nos 666 mil hectares de soja (média de 2,7 t/ha/ano) em monocultivo na safra 2014/15 no Piauí (IBGE. GCEA-PI. LSPA, 2015) forem convertidos em sistema ILPF, ou seja, essa mesma área ser convertida ¼ para milho + capim e engorda de bois a pasto (166 mil hectares) e ¾ em produção de soja (500 mil hectares), esses mesmos 666 mil hectares produziriam cerca de 3,34 milhões de t/ha/ano, baseado nos rendimentos da soja (59,7 kg/ha ou 3,58 t/ha), milho (153 kg/ha ou 9,18 t/ha) e carne bovina (9,8 @/ha ou 0,14 t/ha) (Tabela 1). Significa um incremento de 85% a mais na produção na mesma área de cultivo, quase que dobrando a oferta de alimentos nas próximas décadas, sem a 21


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necessidade de abertura de novas áreas, reduzindo o desmatamento, além de praticar uma agricultura de baixa emissão de carbono e de outros gases de efeito estufa (GEE), com preservação dos recursos genéticos e o meio ambiente e mantendo o solo produtivo para futuras gerações (TEIXEIRA NETO, 2015).

Referências bibliográficas CAMPELO, G. J. de A.; CARVALHO, J. H. de. Introdução e evolução da soja no Estado do Piauí. In: MIYASAKA, S.; MEDINA, J. C. A soja no Brasil. Campinas: ITAL., 1981. pp. 52-55. HARTWIG, E.E. & R.A.S. KIIHL. 1979. Identification and utilization of a delayed flowering character in soybean for short-day conditions. Field Crops Research. 2:145-151. HYMOWITZ, T. On the domestication of the soybean. Economic Botany. v. 23, pp. 408-21, 1970. IBGE. GCEA-PI. LSPA - Levantamento sistemático da produção agrícola: Produção de grãos. Teresina, 2015. IBGE/FGV. Censo Agropecuário: 1995/96. Rio de Janeiro, 1995. MIYASAKA, S.; G. GUIMARAES; R.A.S. KIIHL; L.A.C. LOVADINE & J.D. DEMATTE. 970. Variedades de soja indiferentes ao fotoperiodismo e tolerantes a baixas temperaturas. Bragantia. 29:169-174. PALUDZYSZYN FILHO, E.; KIIHL, R. S. A.; ALMEIDA, L. A. Desenvolvimento de cultivares de soja na região Norte e Nordeste do Brasil. In: SIMPÓSIO SOBRE A CULTURA DA SOJA NOS CERRADOS, 1992. Uberaba. Anais. Piracicaba: POTAFOS, 1993. pp. 255-265. PIPOLO, A. E.; ARIAS, C.A.A.; SOUZA CARNEIRO, G.E.; TOLEDO, J.F.F. http://www.cnpso.embrapa.br/ download/cirtec/circtec52.pdf. Obtido em: 20/09/2016.

2007.

In:

SPEHAR, C. R.; MONTEIRO, P. M. F. de O.; ZUFFO, N. L. Melhoramento genético de soja na região CentroOeste. In: SIMPÓSIO SOBRE A CULTURA DA SOJA NOS CERRADOS, 1992. Uberaba. Anais…Piracicaba: POTAFOS, 1993. pp. 229-253. TEIXEIRA NETO, M. L.; ARAUJO NETO, R. B.; AZEVEDO, D. M. P.; FROTA, M. N. L. Income from agricultural and livestock activities in integrated crop-livestock systems on Cerrados of Maranhão. In: WORLD CONGRESS ON INTEGRATED CROP-LIVESTOCK-FOREST SYSTEMS; INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON INTEGRATED CROP-LIVESTOCK SYSTEMS, 3., 2015, Brasília, DF. Towards sustainable intensification: proceedings. Brasília, DF: Embrapa, 2015. TEIXEIRA NETO, M. L.: Sistema ILPF no Matopiba. Revista Opiniões. Ano 12, nº 40, Div. F, jun-ago, 2015. pp. 48-49. VERNETTI, F. de J. Origem da espécie, introdução e disseminação no Brasil. In: FUNDAÇÃO CARGILL. Soja: planta, clima, pragas, moléstias e invasoras. Campinas, 1983. pp. 3-123.

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3. Espécies Invasoras Exóticas Danosas

Afonso Celso Candeira Valois Eng. Agr., Me., Dr., e Pós-Doc em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Introdução A agricultura brasileira possui diversos condicionantes biológicos, considerando as pragas de uma maneira geral com destaque para insetos, fungos, bactérias, vírus, nematoides e plantas daninhas, além das espécies invasoras exóticas (EIE), às quais agregamos no título o termo “danosas”, muito embora invasor já denotar certo prejuízo, para dar ênfase ao prejuízo agrícola, ao meio ambiente e/ou, à pecuária. No referente às EIE, esses invasores bióticos são organismos vivos (plantas, animais e microrganismos) que são transportados intencionalmente, ou não, para áreas onde não ocorrem naturalmente. A prevenção da entrada no País de EIE (chamadas também de “Pragas Quarentenárias”, quer sejam classificadas em A1 ou A2) que possam causar sérios danos à agricultura, pecuária e florestas, principalmente dois pontos devem ser considerados, isto é, retardar ao máximo a entrada do patógeno e se preparar proativamente com consistentes programas de melhoramento genético preventivo e curativo para o controle, no caso de a praga vir a se estabelecer no País. Um bom exemplo de retardamento é quanto ao caso do mal-das-folhas da seringueira, séria doença causada pelo fungo Microcyclus ulei (Henn.) Arx, atualmente bastante monitorada para não penetrar na Ásia e África, onde os seringais são formados por clones altamente suscetíveis ao citado patógeno. Para o caso do melhoramento genético preventivo, um bom exemplo foi o que ocorreu com a ferrugem do café (Hemileia vastatrix Berk. & Broome), pois quando a doença penetrou no Brasil, o Instituto Agronômico de São Paulo (IAC) já possuía cultivares resistentes, melhoradas previamente em Portugal pelo saudoso Dr. Alcides Carvalho. Outro bom exemplo, bem atual, é quanto à sigatoka negra da bananeira causada pelo fungo Mycosphaerella musicola, Leach forma perfeita ou sexuada/Pseudocercospora musae (Zimm) Deighton - forma imperfeita ou assexuada, visto que antes de a doença entrar no Brasil, a Embrapa introduziu germoplasma como fonte de resistência, desenvolvendo pelo menos 10 cultivares que estão à disposição dos bananicultores nacionais. Planos de Controle Dentro de uma visão estratégica didática para o estabelecimento de planos de controle, as EIE podem ser classificadas de três maneiras:

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a) aquelas que já estão no Brasil há mais tempo, como o bicudo do algodoeiro - Anthonomus grandis (Boh.) (Figura 1) e a mosca branca Bemisia spp.; b) aquelas que entraram mais recentemente, como a mosca da carambola Bactrocera carambolae (Drew & Hancock) (Figura 2), a ferrugem da soja - Phakopsora pachyrhizi Sydow, o ácaro do arroz - Steneotarsonemus spinki Smiley e a helicoverpa da soja – Helicoverpa armigera Hübner; c) aquelas que poderão entrar no País se não houver os cuidados necessários, como a monília do cacaueiro - Moniliophthora roreri (Cif.) H.C. Evans, Stalpers, Samson & Benny, a murcha bacteriana da bananeira - Xanthomonas campestres pathovar musacearum (Xcm) e o besouro asiático - Anoplophora glabripennis Motschulsky (Figura 3), séria praga de espécies florestais.

Articulação Internacional No âmbito do fortalecimento da articulação internacional, o Brasil se ressente de uma melhor articulação com países vizinhos, tendo em vista reduzir perigos, riscos e danos na agricultura, na pecuária e no meio ambiente pela mitigação ou mesmo exclusão da entrada de EIE de fungos, bactérias, vírus, insetos, plantas, nematoides e animais indesejáveis. Por exemplo, pode ser citada a doença sigatoka negra da bananeira (Mycosphaerella fijiensis Morelet) que entrou pela Venezuela ou pela Colômbia, a mosca-das-frutas, B. carambolae (Diptera, Tephretidae), vulgarmente conhecida como mosca-da-carambola, mas que também ataca cerca de 100 outras fruteiras, que entrou pela Guiana Francesa e encontra-se instalada no Amapá, a mosca-negra dos citros, Aleurocanthus woglumi Ashby (Hemiptera, Aleyrodidae) que talvez tenha entrado pela Colômbia ou por outros países vizinhos nos quais há relatos da presença da praga, além de outros exemplos já ocorridos no Brasil, como o bicudo do algodoeiro, A. grandis (Coleoptera, Curculionidae), e a mosca-branca (Hemiptera, Aleyrodidae). Atualmente, a cacauicultura brasileira está muito ameaçada caso seja efetivada a entrada da monília, doença causada pelo fungo M. roreri, mal muito mais devastador do que a vassourade-bruxa; a monília já se encontra no Peru, em região fronteiriça ao estado do Acre. Existe ainda receio da entrada do besouro asiático, terrível praga de espécies florestais. Como suporte a essa articulação internacional é marcante a presença do Programa Global de Espécies Invasoras (GISP), em ações ambientais ao redor do mundo. Como parte de sua ação, o GISP em articulação com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ministério das Relações Exteriores (MRE) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), efetuaram uma reunião em Brasília-DF, na Sede da Embrapa, no período de 17 a 19/10/2001, que versou sobre o tema de EIE. Essa reunião 24


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contou com a participação de especialistas representando a Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela.

Do evento citado acima foi emanada a seguinte declaração: a) as espécies invasoras, que incluem pragas, doenças e plantas daninhas, além de causarem enormes prejuízos econômicos, principalmente à agricultura, constituem uma das principais ameaças à biodiversidade e aos ecossistemas naturais, além dos riscos à saúde humana; b) a crescente globalização da economia e costumes, com o incremento do transporte, do comércio e do turismo internacional, competições esportivas como copa do mundo de futebol e olimpíadas, mudanças climáticas causadas pelo efeito estufa e mudanças no uso da terra, tendem a ampliar as oportunidades de introdução e expansão de espécies exóticas invasoras danosas na região; c) a América do Sul abriga metade das florestas tropicais e mais de um terço de toda a biodiversidade do mundo, imenso e valioso patrimônio natural em grande parte compartilhado por 13 países, muitos deles megadiversos, sendo a diversidade biológica a base da sustentabilidade dos serviços ambientais, dos recursos florestais e pesqueiros, da agricultura e da nova indústria da biotecnologia. Cerca de 50% do Produto Interno do Brasil, por exemplo, vêm do uso direto da biodiversidade e seus recursos genéticos; d) os prejuízos causados por EIE à produção agrícola na América do Sul excedem a muitos bilhões de dólares ao ano. A título de exemplo, na Argentina a mosca das frutas custou US$ 10 milhões de dólares ao ano com programas de controle, mais 15-20% da produção em perdas anuais diretas, equivalentes a US$ 90 milhões de dólares por ano, e impactos econômicos e sociais indiretos incalculáveis com a redução da produção e perda de mercados de exportação; e) na condição de integrantes de um mesmo continente, separados apenas por fronteiras políticas, os países sul-americanos compartilham o mesmo destino no caso de introdução de EIE. É essencial, portanto, a promoção de maior cooperação entre os países na região na prevenção e controle de um inimigo comum; f) apesar dos avanços recentes na prevenção e controle de EIE que ameaçam a agricultura, constata-se a necessidade de maior atenção para a prevenção e controle dos impactos de EIE sobre os ecossistemas naturais e sobre a rica biodiversidade da região; g) se reconhece a importância de implementar plenamente na região a decisão V/8 da 5ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, que estabeleceu diretrizes para a prevenção e controle de EIE que ameaçam ecossistemas, habitats ou espécies; h) há necessidade de se promover maior intercâmbio de informação, começando pela elaboração de diagnósticos nacionais sobre as limitações, pesquisa, capacitação técnica, fortalecimento institucional, conscientização pública, coordenação de ações e harmonização de legislações; 25


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i) sem prejuízo de outros temas identificados nos diagnósticos nacionais, merece atenção urgente a questão da introdução de EIE nas diferentes bacias hidrográficas da região e ecossistemas transfronteiriços; j) também existe a necessidade de se promover maior coordenação e cooperação entre os setores agrícolas, florestais, pesqueiros e ambientais nacionais no tratamento desta questão, incluindo a criação de comissões nacionais sobre EIE, e envolver outros setores relacionados ao tema como saúde, turismo, transporte e comércio; k) é essencial, portanto, a promoção de maior cooperação entre os países na região na prevenção e controle de um inimigo comum, incluindo a elaboração de uma estratégia regional sul-americana para EIE, bem como, cooperar com os demais países das Américas e com o esforço global para solucionar um dilema comum para ser liderado pela FAO, CDB e GISP; l) constata-se, entretanto, que falta a conscientização pública sobre a importância desse tema, o que facilita a introdução acidental ou intencional de EIE; m) a efetiva prevenção e controle de espécies invasoras exóticas danosas na América do Sul necessitarão de apoio financeiro e técnico adequados.

Conclusões Vemos assim que todos os pontos aqui expostos são de grande relevância para mitigar e evitar a ação danosa das espécies invasoras exóticas na agricultura brasileira, em consonância com um esforço e articulação regionais. Além disso, deve-se atentar principalmente para a lembrança de que o Brasil possui cerca de 17 mil quilômetros de fronteira com os países limítrofes, sendo 11,3 mil quilômetros somente na Amazônia. Nesse sentido é premente a colocação em prática de um consistente programa de segurança biológica, com ênfase na vigilância sanitária e fitossanitária, poderia ser até mesmo com o apoio do Comitê de Sanidade Vegetal do Cone Sul – COSAVE. Infelizmente, recentemente o País foi surpreendido pelo enfraquecimento das suas ações nas fronteiras devido à falta de visão estratégica e compromisso de dirigentes mal informados, onde é esperado que o atual Governo Federal em articulação com os governos estaduais exerça rapidamente um consistente esforço de realinhamento desse importante processo. “O agronegócio brasileiro é merecedor desses esforços e ações nas fronteiras devido à sua forte influência econômica, social, ambiental e política que exerce para o benefício do Brasil! ”

Referências bibliográficas VALOIS, A. C. C. Benefícios e estratégias de utilização sustentável da Amazônia. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, 2003. 75 p.

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4. Borboletário: Preservação e Conservação de Recursos Genéticos Juvenal Damasceno Amaral Filho Graduando em Biologia na Faculdade Frassinetti do Recife, estagiário do Jardim Botânico de Recife - PE, responsável pela implantação do Borboletário. Tem experiência na área de Biologia Geral, atuando principalmente nos seguintes temas: borboletário, manejo de borboletas (Lepidópteros), taxidermia e sistemática, reprodução e introdução de espécies silvestres. No trato de animais silvestres e seu manejo atuou na reprodução das aves Guará (Eudocimus ruber L.) e Beija-flor (Anthracothorax nigricollis Vieillot).

Introdução A história das borboletas e mariposas é muito antiga, pois, achados arqueológicos de borboletas remetem sua existência há 40 milhões de anos, enquanto as mariposas são ainda bem mais antigas, cerca de 140 milhões de anos, tendo voado entre os dinossauros (APRILE, 2006). Existem muitas perguntas a serem respondidas neste tema, o que já demonstra a grande relevância do texto aqui apresentado. Por exemplo: O que é um borboletário? Qual sua relevância para a preservação e conservação de recursos genéticos e para o meioambiente? Qual sua importância para um Jardim Botânico e para área de Recursos Genéticos? Qual o ciclo de vida da borboleta? Afinal são insetos maléficos ou benéficos? A seguir tentamos responder tais questões que também nos afligem, já que meu trabalho atual é o de implantar um borboletário, a partir do zero, dentro do espaço do Jardim Botânico de Recife, o qual espero que sirva de exemplo positivo aos demais Jardins Botânicos, que ainda não o possuem, ligados à Rede Brasileira de Jardins Botânicos (RBJB).

O que é um Borboletário? É um local de criadouro de espécies da Classe Insecta (borboletas e mariposas), com fins educacionais. Tal criadouro é um ambiente construído para imitar o ambiente de reprodução das borboletas, em confinamento, permitindo a sua criação e ao mesmo tempo disponibilizando espaço para a recepção do público visitante (Foto – JB Mangal das Garças, Belém – PA, desde 2005, o maior do Brasil). 27


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Quais as diferenças e semelhanças entre borboletas e mariposas? As semelhanças são muitas entre estes animais, já que são insetos da mesma ordem, possuindo o corpo dividido em cabeça com antenas, tórax e abdome, e seis patas. As diferenças mais marcantes começam com o hábito de cada uma, pois as borboletas são preferencialmente diurnas e deixam as asas fechadas quando em repouso, enquanto as mariposas são preferencialmente noturnas e mantém suas asas abertas quando em repouso. Embora ambas possuam antenas, seu formato também é um descritor diferencial, pois as borboletas possuem antenas longas finas e clavadas, isto é, com uma clava na extremidade, enquanto as mariposas ou possuem antenas curtas e filiformes, em forma de fio, ou grossas e plumosas, em forma de pena. As asas também são um diferencial, pois a mariposa possui apenas duas asas, enquanto a borboleta possui dois pares de asas. Pode-se referir às cores intensas para a borboleta como regra e cores pálidas para a mariposa, mas esta esporadicamente também pode apresentar espécies com cores mais intensas. O ciclo de vida varia conforme a espécie, mas é bem diferente entre elas, já que a mariposa vive cerca de 24 horas, enquanto a borboleta em torno de duas a quatro semanas. No tocante à planta mamadeira (hospedeira), esta apresenta também algumas características diferenciais no tocante ao inseto visitante, pois normalmente a borboleta poliniza plantas com flores avermelhadas ou alaranjadas, enquanto para a mariposa poliniza vegetais com flores esbranquiçadas ou pálidas, mas as corolas nos dois casos são longas, adaptadas para a polinização.

Qual sua relevância para a conservação e preservação de recursos genéticos, e para o meioambiente? É importante lembrar que o conhecimento adquirido, com a criação de borboletas, em muito tem contribuído para a redução do risco de extinção de suas espécies raras, assim como auxiliado na polinização das plantas e, consequentemente, ajudado também na preservação da variabilidade genética das plantas, além de fazer parte da cadeia alimentar de outras espécies animais sendo, portanto, essenciais ao equilíbrio do meio ambiente. Vivemos em um crescimento populacional exponencial que requer uma demanda maior por alimento e água, sendo um grande desafio para nossa sociedade viver em equilíbrio como o meio ambiente. Atualmente 57 espécies de borboletas são consideradas em risco de extinção no Brasil.

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Entretanto, uma vez preservado, o meio ambiente pode se tornar um mercado lucrativo para a sociedade, pois, “para assegurar um bom padrão de vida para as futuras gerações, é preciso que de algum modo seja preservado um estoque de natureza” (RIBEMBOIM, 1997). Concordo que preservar é a melhor forma de manter alta qualidade de vida, desde que tal seja vivenciada com atitudes micro que somadas se transformem em atitudes macro, viabilizando este conceito. Conservar e preservar são atitudes que perdem sentido quando não se define o seu benefício para a natureza e o seu uso pelo ser humano. Acredito que, entender essas ações humanas em conjunto com o conhecimento do funcionamento do ecossistema, seja o caminho para o início da manutenção de biomas, como é o caso de se entender como funciona a cadeia trófica e suas relações fauna-flora. Imagino um trem desgovernado em direção ao consumo de todo recurso natural do planeta, que seja uma figura representativa do que vem ocorrendo no mundo atual. Falta aqui um freio para este trem que seria o uso do conhecimento através da educação ambiental, e assim construir trilhos que nos levem a despertar para a mudança em preservação e conservação da natureza. Parte do referido anteriormente cabe muito bem no caso dos insetos. No presente texto tratamos da ordem Lepidoptera, que é composta pelas borboletas e mariposas, sendo considerada a segunda maior ordem dos insetos. Também estão entre os melhores grupos para efetivação de estudos de monitoramento ambiental (DEVRIES et al., 1997; FREITAS et al., 2003) pela sua riqueza em espécies e importância trófica, exercendo papel fundamental dentro de Unidades de Conservação (UC) e similares dentre outros fragmentos como praças públicas e até jardins. O Borboletário nos transporta para um mundo lindo e que suas psiques têm o poder de transformar sentimentos, mexer com nosso humor e nos deixar leves para entender a relação de contemplação do homem e a natureza. Como ferramenta na preservação sabemos que temos vários meios de passar esse conceito à sociedade, através da família, das escolas, das faculdades, e no nosso caso através do Borboletário. Ainda temos logicamente os livros, filmes, e revistas que também podem ser utilizados nestes locais. O próprio público visitante é um multiplicador de conhecimentos, a partir do momento em que a Educação Ambiental lhe possibilita entrar em contato com uma metodologia de sensibilização que demonstra a relevante relação entre animal e flora (BERTI FILHO & CERIGNONI, 2010), e ainda o insere no verdadeiro entendimento da preservação in situ e da conservação ex situ.

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Os principais Borboletários do Brasil são: Águias da Serra – São Paulo – SP, Mata Santa Genebra – Campinas – SP, Diadema – São Paulo – SP, Flores que voam – Campos de Jordão – SP, Osasco – SP, Asas Mágicas – Porto Seguro – BA, Mangal das Garças – Belém – PA, Sesc Pantanal – Poconé – MT.

Qual sua importância para os Jardins Botânicos (JB) e para área de Recursos Genéticos? No caso dos jardins botânicos, assim como para quem trabalha na área de recursos genéticos, por se dedicarem à coleta, cultivo, preservação, conservação e uso, entre outras atividades, o viveiro (Foto: JB de BH) é uma ferramenta útil para a aplicação da Educação Ambiental com a sociedade. No caso dos Jardins Botânicos, além da necessidade de exporem uma ampla diversidade de plantas, identificadas taxonomicamente (família, gênero e espécie) e com os dados de passaporte [origem (país onde é nativa) e vegetação onde ocorre (mata atlântica, caatinga, prados, pampas, etc.)], procedência (de onde veio), essenciais para o uso como germoplasma e como material educativo, um borboletário é um excelente local para se aplicar a Educação Ambiental, promovendo mudanças comportamentais, inserindo o amor à natureza, justificando a sua existência e necessidade de conservar, enfim, promovendo ciência e cultura. A construção de infraestruturas para manutenção de Bancos Ativos de Germoplasma (BAG) visando à conservação de material genético ex situ, podendo ser para uso imediato, a médio ou longo prazo, no caso dos JB em especial para germoplasma representativo da sua região, privilegiando as espécies em risco de extinção, vem ganhando força no Brasil. Há uma busca pela inserção do pensamento de sustentabilidade, lembrando que “o jardim botânico e feito de plantas e pessoas”, como diz Toledo (2016). Compreendemos que se deva também incluir borboletários com infraestrutura essencial nos JB.

Qual o ciclo de vida das borboletas? Os lepidópteros são insetos holometábolos (desenvolvimento completo), apresentando as fases de ovo, larva (que em Lepidoptera é denominada lagarta), pupa ou crisálida e adulto. Quando a borboleta se encontra na fase adulta, logo após a sua copula, segue em busca de sua planta mamadeira para o deposito dos seus ovos, levando em média cinco dias para a eclosão das lagartas; esta, por sua vez, ao nascer se alimentam da casca do ovo eclodido e seguem em busca de alimento para sua sobrevivência. 30


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Para fins comparativos, as mariposas na sua fase de lagarta podem vir a se alimentar de várias espécies de plantas, e ao emergir as lagartas passam por vários instares (idades), até chegarem à fase de pupa (crisálida) e, com o passar desse período de metamorfose, chega a sua fase alada (adulta). A seguir descrevemos as fases:

Ovo Após a observação do local de postura na planta-hospedeira é efetivada a coleta do ovo, logo pela manhã, dentro do espaço do borboletário. Em seguida, o responsável pelo recolhimento os leva para o criatório, onde são contados e seus dados anotados em uma ficha de coleta (exemplo ao lado). Os dados obtidos são os seguintes: data, quantidade, qualidade (fazendo uma minuciosa inspeção, em especial para micro-vespas predadoras), e nome do responsavél pela coleta. Assim começa o primeiro passo de controle para criação, cujo método comumento é utilizado na criação massal de insetos, em local climatizado, com controle de luminosidde e umidade.

Larva (Lagarta) Após os cinco dias de espera da eclosão, as larvas (lagartas) são colocadas em recipientes plásticos (potes) ou gaiolas. Dependedo da espécie de borboleta seu manejo é distinto segundo a sua ecologia (o processo de criação segue as condições ideais para a obtenção de uma boa produtividade, se considerando a quantidade e qualidade) inclusive a transferencia para uma planta-hospedeira (mamadeira) preferencial. Portanto, se torna necessária uma equipe técnica de excelência para dar continuidade ao processo de criação diário, tanto na higienização das gaiolas ou potes, quanto da troca de alimentos, como no preenchimento da ficha de controle, o que significa o trabalho, em média 15 dias, até a fase de retirada das pupas.

Pupa (Crisálida) Após o trabalho com ovos e larvas vem a retirada das pupas das gaiolas. Para que seja feito o processo da citada retirada, é necessária uma seleção, já que dentro dos viveiros observa-se que algumas larvas se alimentam mais que outras, como consequência o empupamento (que em média pode

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durar de um a três dias) pode vir a ocorrer em dias distintos, possibilitando o indesejável comportamento de canibalismo das pupas, pelas próprias primeiras lagartas a surgirem. Assim, o técnico faz a coleta durante o dia, e dentro da organização do criatório, sendo executado segundo as espécies mantidas pelo Borboletário, dependurando as pupas em palitos de bambu e colocando-as num armário, permanecendo assim pelo período aproximado de 10 dias, seguindo com o acompanhamento, limpeza, e burrifamento d água para manutenção da umidade adequada, e retirada de possíveis pupas doentes até a fase de emergência do adulto e, finalmente levando-as para o Borboletário de visitação, para o fechamento de um ciclo e início do seguinte.

Soltura dos Adultos Ao final do ciclo de criação é efetivada a soltura dos adultos no viveiro de exposição do Borboletário. A equipe técnica segue um rigoroso protocolo de controle de atividades, tanto nos cuidados com ovos, larvas e pupas, nos primeiros instares, como nesta fase de soltura, onde o inseto tem preferência pelas folhas mais novas e menos rígidas, já que as lagartas jovens necessitam raspar as folhas, hábito alterado nos últimos instares quando as trocas pelas folhas mais velhas. O trabalho de assepsia segue com as plantas que devem ser limpas, evitando assim as doenças e parasitas que podem agir em diferentes fases da borboleta. Assim, aqui atinge a esperada fase de exposição, onde ocorre o espetáculo de beleza e cores indescritíveis que entra no imaginário do visitante provocando todos os seus sentidos. Neste momento é a hora de se utilizar da Educação Ambiental, transmitindo todos os conhecimentos aqui listados ao público leigo, além dos de Recursos Genéticos e Meio Ambiente. Como cita Primack et al. (2001) “A sociedade tem a responsabilidade de proteger a terra”, o que concordando plenamente já que na nossa área somos os responsáveis pelo desenvolvimento de projetos científicos que executam justamente este conceito de proteção.

Afinal são insetos maléficos ou benéficos? Os insetos têm um papel vital para a manutenção da natureza. Neste presente caso está o benefício que proporciona à polinização das plantas e sua inserção na cadeia trófica no meio ambiente, o que pode inseri-lo como um inseto benéfico quer seja a borboleta ou mariposa.

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Por outro lado, não há como não citar que o maior ou menor benefício também depende da fase de sua metamorfose (Foto: http://www.eusoucurioso.com/ metamorfose-saiba-o-quee/). A fase de lagarta é considerada um dos vilões da agricultura e jardins. Algumas espécies, quando em grande número de indivíduos, se tornam uma praga que prejudica os agricultores, nosso alicerce da economia. Deve-se enfatizar que as mariposas e também borboletas possuem espécies consideradas venenosas. No caso das mariposas é muito comum serem atraídas pela luz artificial à noite, e ao se debaterem liberam substâncias que causam problemas dermatológicos, portanto, ao tocar um destes insetos devemos lavar bem as mãos. Não devemos nos esquecer também que na fase de lagartas, o veneno de algumas espécies pode causar queimaduras e até ser letal ao ser humano. “Porém, fiquem tranquilos, as espécies que mantemos nos Borboletários, no viveiro de visitação, não são prejudiciais às nossas crianças”. Conclusões Há que se entender que não se pode vandalizar as espécies de borboletas e mariposas a ponto de que algumas espécies sejam dizimadas em nome da produtividade agrícola, ou do risco potencial aos seres humanos. Devemos sim compreender a importância dos recursos genéticos da lepitofauna, para poder defendê-los em prol do equilíbrio do meio ambiente. Para isto lutamos pela implantação do maior número de criadouros no Brasil. Indubitavelmente, o surgimento da borboleta traz para o ser humano prazeres inconfessos que valem a pena serem sentidos. Venha nos visitar no Borboletário!

Referências bibliográficas APRILE, M. 2006. Borboletas e mariposas: Características e diferenças entre as duas. In: http://educacao. uol.com.br/disciplinas/biologia/borboletas-e-mariposas-caracteristicas-e-diferencas-entre-as-duas.htm. Obtido em: 20 de setembro de 2016. BERTI FILHO, E. & CERIGNONI, J.A. 2010. BORBOLETAS/ In: http://borboletasbr.blogspot.com.br/ 2011/05/borboletario-belempa.html. Obtido em 20/09/2016. BERTI FILHO, E. & CERIGNONI, J.A.. Borboletas. In: http://borboletasbr.blogspot.com.br/ 2011_07_01_ archive.html. Obtido em: 20 de setembro de 2016.

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EDU AMBIENTAL. Borboletário. In: http://blogdoeduambiental.blogspot.com.br/2012/11/borboletario. html. Obtido em: 20 de setembro de 2016. ESC ON. Metamorfose. setembro de 2016.

In: http://www.eusoucurioso.com/metamorfose-saiba-o-que-e/. Obtido em: 20 de

MORAES, D. 2016 Criação de Lepidópteros, Borboletário Jose Marcio Ayres. PRIMACK, R.B. & RODRIGUES E. BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO, LONDRINA, 2001, 328p. RIBEMBOIM, J. (org.). Mudando os padrões de produção e consumo. Brasília: MMA/Ibama,1997. p. 11123. SILVA, J.M., DA CUNHA, S.K., ELY E SILVA, E.J., GARCIA, F.R.M. 2012. Borboletas Frugívoras (Lepidoptera: Nymplhalidae) No Horto Botânico Irmão Teodoro Luís/ Capão do Leão/ Rio Grande do Sul. 2012. In: https://periodicos.ufsc.br/index.php/biotemas/article/view/2175-7925.2013v26n1p87. Obtido em 20/09/2016. TOLEDO, J.N. 2016. Palestra apresentada na reunião anual da Rede Brasileira de Jardins Botânicos. Jardim Botânico de Recife. VILAS BOAS, G.A. et al. 2014. Eficiência de Métodos de Coleta de Lepidoptera e Constatação de Alternância de Dominância entre as Espécies ao Longo do Tempo na Mata do Ifsulminas/ Campus Muzambinho.

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5. Marcadores Moleculares em Recursos Genéticos Vegetais Afonso Celso Candeira Valois Engenheiro Agrônomo, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa, ExProfessor Associado da UnB, Ex-Professor Contratado da UEA/CEST, ExSecretário Municipal de Meio Ambiente de Tefé (AM).

Contextualização Marcadores moleculares são ferramentas essenciais para a caracterização de indivíduos, que também inclui os organismos geneticamente modificados. Os cromossomos contêm as unidades de informação que são transferidas de uma geração para outra, sendo que o DNA foi identificado como a molécula que contém a informação genética. Cada cromossomo contém uma longa e única molécula de DNA, além de proteínas que atuam na formação estrutural dessa molécula. As tecnologias disponíveis de análise molecular da variabilidade do DNA permitem determinar pontos de referência nos cromossomos, tecnicamente denominados de “marcadores moleculares”. É definido como marcador molecular todo ou qualquer fenótipo molecular oriundo da expressão de um gene, como no caso das isoenzimas (múltiplas formas moleculares de uma mesma enzima presentes em uma espécie) ou segmentos específicos de DNA, que correspondem a regiões expressadas no genoma. Um marcador molecular pode ainda ser definido como qualquer fenótipo molecular derivado de um polimorfismo específico na sequência de DNA, conhecido ou anônimo, que pode corresponder ou não a um gene expresso. Quando se verifica o comportamento de acordo com as leis básicas da herança mendeliana, se define um marcador molecular como “marcador genético”, que se comprova, por exemplo, mediante o estudo do comportamento do marcador em uma população segregante. Diversas técnicas de biologia molecular estão disponíveis para a detecção da variabilidade genética no nível da sequência de DNA, ou seja, para a detecção do polimorfismo genético. Essas técnicas permitem a obtenção de um número virtualmente ilimitado de marcadores moleculares cobrindo todo o genoma do organismo. Tais marcadores podem ser utilizados para as mais diversas aplicações, tanto no estudo de genética como na prática do melhoramento de plantas, dentre outros. O desenvolvimento tecnológico na área de marcadores moleculares tem sido espetacular e extremamente rápido. 35


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Os principais marcadores moleculares até então conhecidos são os seguintes : Marcadores isoenzimáticos, polimorfismo de comprimento de fragmentos de restrição (RFLP) e sequências simples repetitivas ou marcadores microssatélites (SSR). Além disso, estão disponíveis técnicas utilizadas na identificação de marcadores ou em estudos de expressão gênica, como: DNA polimórfico amplificado ao acaso (RAPD), polimorfismo de comprimento de fragmentos amplificados (AFLP), polimorfismo de nucleotídeos únicos ou Single Nucleotide Polymorphisms (SNP) e sítios identificados em sequências ou Sequence Tagged Sites (STS). A tecnologia do DNA recombinante e o desenvolvimento da amplificação de segmentos de DNA via PCR abriram o caminho para a troca do paradigma genético básico da inferência no genótipo a partir do fenótipo, onde o monge agostiniano Gregor Johann Mendel (Figura 1) foi o pioneiro, em 1865, para a análise genética direta da variação na sequência de DNA. Essa troca de enfoque foi denominada de transição da genética “mendeliana” para a genética “genômica”. Até ao meado dos anos 1960, os marcadores utilizados em estudos de genética e melhoramento eram aqueles controlados por genes associados a caracteres morfológicos, em geral fenótipos de fácil identificação visual como nanismo, deficiência clorótica, morfologia foliar, coloração de folíolos e pétalas, cujos marcadores contribuíram de maneira significativa para o desenvolvimento teórico das análises de ligação para a construção das primeiras versões de mapas genéticos. Entretanto, o pequeno número de marcadores morfológicos distintos em uma mesma linhagem reduz a probabilidade do encontro de associações significativas entre esses marcadores e caracteres de importância econômica, o que limita o emprego em programas de melhoramento genético. Nesse plano, o grande avanço se iniciou com o descobrimento e utilização dos marcadores moleculares. Assim, o número de marcadores genéticos disponíveis foi ampliado em boa ordem de magnitude e a ampliação da técnica se estendeu praticamente a todas as espécies de plantas. Com o domínio das técnicas modernas de biologia molecular surgiram diversos métodos de detecção de polimorfismo genético diretamente no nível do DNA. Inicialmente, a utilização de enzimas de restrição permitiu a análise de RFLP. Mais adiante, o desenvolvimento do processo de amplificação em cadeia utilizando uma DNApolimerase (PCR) conduziu à descrição de outras classes de marcadores moleculares. Essas metodologias aliadas às técnicas de clonagem e sequenciamento de DNA têm possibilitado obter e acumular grande número de informações sobre a estrutura do genoma eucariótico. O uso intensivo dessa nova tecnologia contribuiu para o desenvolvimento do estudo das diversas classes de sequências repetitivas de DNA chamadas mini e microssatélites, outras ricas fontes de polimorfismo genético.

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Diversas tecnologias para a detecção de marcadores moleculares têm sido desenvolvidas nos últimos anos, particularmente após a descoberta da PCR no final dos anos 80, com destaque para o RFLP e SSR. Marcadores RAPD têm contribuído significativamente para o rápido desenvolvimento de mapas genômicos, análise de variabilidade e “fingerprinting” ou impressão digital de DNA (Figura 2), além de assegurar a propriedade intelectual, bem como, outras vantagens. Marcadores RAPD dispensaram a necessidade do desenvolvimento de sondas específicas empregando reagentes universais “de bancada” e forneceram uma entrada rápida e tecnicamente simples à análise de segregação, ligação genética, construção de mapas e “fingerprinting” de indivíduos. A principal limitação dos marcadores RAPD é o baixo conteúdo informativo por loco, uma vez que esses marcadores tipicamente exibem uma herança dominante e tecnicamente detectam apenas um alelo por loco, sendo que todos os outros alelos são agrupados em uma única classe caracterizada pela ausência de amplificação de banda. Os marcadores microssatélites são aqueles atualmente disponíveis que possuem o maior conteúdo informativo. O que distingue os microssatélites é a sua natureza multialélica, herança codominante, abundância e ampla distribuição no genoma e a possibilidade de detectar variações de sequência por meio de um ensaio simples de PCR, tal como RAPD e AFLP. Adicionalmente, marcadores SSR em geral são altamente transferíveis de genoma para genoma dentro de uma espécie e frequentemente entre espécies geneticamente relacionadas. Nos últimos anos, o desenvolvimento de marcadores, baseados em SSR, tem se tornado cada vez mais acessível, principalmente devido a estratégias inovadoras de enriquecimento de bibliotecas genômicas e a tecnologias rápidas de sequenciamento automático baseadas em fluorescência. Em teoria, o uso de genes como marcadores ao invés de marcadores anônimos de DNA (tais como RAPD, AFLP ou SSR) pareceria ser a melhor escolha, uma vez que isto facilitaria o estabelecimento de relações entre genes candidatos e QTL (loco controlador de característica quantitativa) específicos mapeados em sua vizinhança, isto é, o uso da abordagem do “gene candidato”. Na prática, as sequências de cDNA são muito mais conservadas e, portanto, a detecção de polimorfismo de sequência e variação alélica de indivíduos se torna uma tarefa relativamente árdua com a tecnologia atual. Tem sido possível identificar SNP a partir do sequenciamento de cDNA e análise de clusters por meio da bioinformática, também extremamente importante na identificação de marcadores moleculares. Na construção de mapas de ligação em Eucalyptus spp., por exemplo, já foram utilizados QTL na identificação de regiões genômicas que têm efeitos significativos na expressão de caracteres economicamente importantes como: a) características juvenis (altura de plântulas, 37


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área foliar e tolerância da muda a geadas; b) habilidade de propagação vegetativa (enraizamento adventício, brotamento de toco e multiplicação de plântulas in vitro); c) idade da rotação (crescimento volumétrico, densidade básica da madeira, espessura da casca e forma do caule). A detecção e expressão de QTL que controlam características quantitativas, tais como altura da planta ou produtividade em patrimônios genéticos (backgrounds) distintos parece ser uma abordagem importante para espécies anuais e deve ser ainda melhor para espécies perenes geneticamente heterogêneas. A seleção assistida por marcadores (SAM) em plantas é essencialmente um sinônimo de retrocruzamento assistido por marcadores. A aplicação mais direta dessa tecnologia está se tornando comum em programas de melhoramento genético de plantas anuais em todo o mundo. Marcadores moleculares fortemente ligados a alelos favoráveis a serem introduzidos a partir de um genitor silvestre para uma linhagem comercial ou de uma linhagem para outra são usados para monitorar a herança em gerações de retrocruzamento. Ao mesmo tempo, a seleção é realizada para marcadores do genitor recorrente com o objetivo de recuperar o mais rápido possível, a maior proporção do genoma recorrente. Tecnologias de análise genômica com marcadores moleculares estão em constante e rápida evolução, sendo a caracterização da variação da sequência de DNA entre indivíduos, em grande número de amostras e com ampla cobertura genômica, um dos grandes desafios. Diversas tecnologias que dispensam o uso de eletroforese baseando-se na hibridação de DNA em lâminas de algumas dezenas de milímetros quadrados contendo moléculas de DNA muito específicas imobilizadas em arranjos sistemáticos, os chamados microarrays ou DNA chips estão se tornando disponíveis, principalmente para serem usados em análise genética de seres humanos e organismos modelos. A tecnologia de microarrays está acelerando enormemente a análise de expressão gênica de milhares de genes “em paralelo” (simultaneamente), sendo esperado que venha a revolucionar os procedimentos de genotipagem individual, geração de perfis de expressão e mapeamento de ligação em organismos vivos. O DNA chips permite ainda a exploração de uma das classes mais abundantes de polimorfismos de DNA em genomas de eucariotos, isto é, os SNP (Single Nucleotide Polymorphisms) ou polimorfismo de nucleotídeos únicos, atualmente bastante utilizados em programas de seleção assistida por marcadores moleculares (SAM). Em seres humanos a disponibilidade de grande número de marcadores STS, ou seja, sítios identificados (etiquetados) por sequências levará ao desenvolvimento de um grande número de marcadores bi alélicos baseados em SNP. Referências bibliográficas VALOIS, A. C. C. Biodiversidade, biotecnologia e organismos transgênicos. Brasília, DF: Embrapa, 2016. 217 p. (Texto para Discussão/Embrapa. Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento; 46).

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6. Óbices no Processo de Intercâmbio Agrícola Afonso Celso Candeira Valois Eng. Agr., Me., Dr., e Pós-Doc em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Introdução Cada vez mais, o processo de intercâmbio (importação e exportação) de produtos agrícolas, dentre estes os recursos genéticos, enfrenta óbices pronunciados, principalmente diante da globalização da economia, disputas comerciais por novos mercados e exigências de medidas excessivas não tarifárias, dentre outros. Em artigos divulgados anteriormente nesta revista, o autor teve a oportunidade de fazer referência ao agroterrorismo ou agrossabotagem, e aos riscos da introdução de pragas A2, que é quando um terceiro país interfere nas transações comerciais entre dois outros países. Na condição de um país emergente com amplas condições vantajosas de entrar nessa competição internacional de maneira ética, legal, transparente e surpreendente, como não podia deixar de ser, o Brasil já passou por acontecimentos inusitados quanto aos negócios agrícolas e agropecuários, sendo capaz de galhardamente suplantar esses óbices considerando o seu preparo técnico-científico, executar a geração, adaptação e extrapolação de técnicas e tecnologias apropriadas, possuir infraestrutura e apoio logístico adequados, ter capacidade de se harmonizar e transferir confiança aos parceiros consumidores e muitas das vezes ser premonitório quanto ao atendimento às exigências dos mercados consumidores, dentre outras vantagens comparativas. No presente artigo são destacados fatos históricos exemplares que atestam a necessidade de o Brasil ficar sempre alerta a esses fatos ligados ao agronegócio, saindo do amadorismo e ingenuidade, entrando definitivamente no profissionalismo. Caso da soja (Glicine max Merrill) Um exemplo marcante foi o que aconteceu para o caso da soja. É sabido que os Estados Unidos são grandes importadores de produtos fabricados na China, como calçados e outros manufaturados. Por seu lado, a China é um grande importador da soja produzida no Brasil. Os Estados Unidos também são grandes produtores de soja, competindo com o nosso país no mercado internacional. Na ânsia de colocar dificuldades e suplantar as exportações da famosa leguminosa do Brasil para a China, os Estados Unidos exigiram dos chineses que reduzissem as importações do Brasil e dessem preferência para eles, pois do contrário reduziriam as importações dos produtos chineses. Isso infelizmente ocorreu, pois os orientais passaram a exigir um padrão de grãos tratados para evitar condicionantes biológicos, nas exportações brasileiras de soja.

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De forma premonitória este autor verificou tal fato, relatado acima, in loco, em evento técnico que organizou conjuntamente com a Universidade de Maryland (EUA), quando foi levada a efeito uma reunião com professores e produtores americanos de soja, no sentido de intercambiar germoplasma de soja. Os produtores não acharam adequado esse tipo de intercâmbio, pois comentaram que o Brasil era um grande competidor dos Estados Unidos no mercado internacional da soja, o que restringiria esta ação. Por que esta intenção de aproveitar a larga variabilidade genética de soja disponível nos Estados Unidos? A soja, G. max seria de origem da própria China, utilizada há 3.000 anos A.C. (ou Japão, ou Indonésia, ainda há dúvidas sobre sua origem!), sendo a introdução no novo mundo que se tem notícia foi feita primeiramente nas Américas em 1765 ainda como forragem e, nos Estados Unidos, em 1879, provavelmente pela cidade de Albany (Nova Iorque), onde hoje é um cemitério, e desde então veio se aclimatando, diversificando e sendo melhorada geneticamente naquele país. Para fazer justiça, historicamente o precioso grão foi introduzido no Brasil em 1882, sendo os primeiros estudos realizados na Escola de Agronomia da Bahia – Cruz das Almas, pelo eminente Professor Gustavo Dutra. Depois, em 1892 foi introduzida e pesquisada em Campinas (SP), no Instituto Agronômico de Campinas (IAC), pelo seu Diretor Dr. Frans Josef Wilhelm Daffert (imagem de sua medalha). Em 1906 o Polonês Eng. Agr. Czesław Mariusz Odrowaz Bieżanko (foto), do Instituto Agronômico do Sul, introduziu com sucesso a cultura no Rio Grande do Sul. Após a negativa advinda da reunião organizada em Maryland, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (antigo CENARGEN), sob a direção do autor, conseguiu introduzir 1.400 acessos de soja junto ao USDA para o enriquecimento do respectivo banco ativo de germoplasma (BAG-Soja), como bom exemplo de sucesso da cooperação técnica internacional, perseverança, persistência e determinação em benefício do Brasil. O objetivo estratégico com a gestão tática e operacional era 40


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incrementar o germoplasma disponível no citado BAG da Embrapa, considerando se tratar de uma espécie autógama, onde perdura a variação genética livre, menor combinação gênica em relação à variação genética potencial das alógamas, como base para a criação de novas cultivares (Na foto ao lado aparece o Dr. José Nelson, responsável pelo intercambio de germoplasma, a Dra. Clara O. Goedert, responsável pela coordenação dos bancos ativos de germoplasma e o autor, em lançamento do livro de memórias do Cenargen, em 2014). Lembra-se que o Brasil deu um grande salto quantitativo e qualitativo na produção de soja, saindo de um milhão de toneladas anuais para 96,4 milhões de toneladas em 2015, tendo como um dos principais fulcros, a implantação e desenvolvimento da Embrapa Soja em 1975, Centro de PD&I localizado em Londrina (PR), além do próprio SNPA coordenado pela Embrapa. Ainda como parte lastimável dessa competição indevida, entre os países, este autor teve que assumir destemidamente consequências injustas após uma entrevista concedida ao Jornal “Valor Econômico”, em 2005, de título “Governo brasileiro se arma contra o agroterrorismo” sobre o aparecimento, tudo indica intencional, da ferrugem da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi Sydow que apareceu em plantios de Mato Grosso em 2001, na distância de cerca de 200 km de um foco que existia no Paraguai. Isso infelizmente causou perdas severas superiores a dois bilhões de dólares na safra brasileira de soja em 2003, além do gasto elevado ao redor de 500 milhões de dólares na aquisição de fungicidas recomendados. Também sobre esse assunto, o autor também concedeu outra entrevista à Revista Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento, Edição n. 33- julho/dezembro de 2004, p. 4-7. Este foi um dos pesados ônus ao qual o Brasil foi submetido, advindo da perversidade do agroterrorismo ou agrossabotagem. Mas, a Embrapa mais uma vez mostrou o seu poder institucional dinâmico ao formular e desenvolver cultivares e sistemas de produção de soja adequados para mitigar ou mesmo debelar esse mal! Caso do algodão (Gossypium hirsutum L.) Os Incas, no Peru, e outras civilizações antigas, já utilizavam o algodão em 4.500 a.C. No Brasil, os índios já o cultivavam, na sua forma nativa, o algodão arbóreo, quando do nosso descobrimento. A produção de algodão comercial no Brasil se iniciou no Maranhão, quando a Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará, criada em 1756, ali se implantou, tendo exportado, já em 1760, sua primeira carga para a Europa. A pesquisa científica com a cultura, somente tomou impulso a partir da década de 1920, no IAC, e posteriormente com a criação do Centro Nacional de Pesquisa do Algodão, da Embrapa, em 1975. Inserido nesse tema da tentativa de causar prejuízos de fito econômico, social e ambiental ao agronegócio brasileiro, encontra-se o rumoroso caso que a Embrapa enfrentou com extremo nacionalismo, responsabilidade, integridade institucional, resposta imediata e fervoroso dinamismo ético. A referência é sobre o desastre que ocorreu com o aparecimento no Brasil do tenaz bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis Bohemen), inseto Curculionídeo, cuja fêmea é capaz de originar uma progênie em torno de 500 novos indivíduos. Primeiramente, o bicudo foi detectado em plantação de algodão próxima ao Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), 41


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daí se difundindo perigosamente para outros nichos, inclusive pelos algodoais perenes do Nordeste, o que se transformou em uma tremenda calamidade para o setor. Na época, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), de São Paulo, suspeitou que tenha vindo junto a um carregamento transportando fibras de algodão, por trem, vindo de outro país vizinho. Este acontecimento, entretanto, também foi atribuído, não devido à disputa comercial entre países, mas pela usurpadora vontade de empresas estrangeiras em comercializar inseticidas apropriados ao controle da citada praga, no Brasil. Este autor tem dito, em palestras relacionadas, que o bicudo é tão terrível que no Alabama (Estados Unidos) existe uma praça onde se encontra um monumento devotado ao bicudo do algodoeiro, pois a população fez essa alusão inusitada e está feliz porque a praga dizimou a fonte da sua principal economia, isto é, os algodoais, mudou de atividade e ficou rica. Mas, na Embrapa, através da sua Diretoria Executiva para o Norte e Nordeste, em 1983/84, enfrentou esse óbice com extrema capacidade, dinamismo e compromisso, tendo promovido reuniões entre especialistas, contratado consultores competentes, formado equipes, desenvolvido planos, programas e projetos estratégicos, emitidos diversos comunicados técnicos e outras publicações orientadoras, promovido o desenvolvimento de cultivares de algodão precoce resistentes e formulado métodos de plantio e outros sistemas de produção etc., sendo que atualmente existe uma convivência com essa praga de forma prática, inteligente e viável pelos produtores de algodão. Faz-se essa menção principalmente para chamar atenção sobre o risco de ataques à Biossegurança Nacional, que acontece em ato criminoso, proposital ou não, praticado por outro país ou indivíduos internos (tendo, por exemplo, o caso da vassoura-de-bruxa no cacau do Brasil), vizinho ou não, por atos oficiais ou não, de cunho político ou financeiro, com destruição, às vezes, somente semelhantes a uma guerra. Caso da exportação de laranjas (Citrus L.) São originárias principalmente das regiões subtropicais e tropicais do sul e sudeste da Ásia, incluindo-se a Austrália e África. No Brasil foram trazidas pelos portugueses, no século XVI. No sentido de nuanças quanto ao processo de intercâmbio de produtos agrícolas, outra experiência inusitada que o autor experimentou, no exercício da vida profissional, aconteceu na Malásia. Em uma das quatro vezes que o mesmo esteve naquele país em missão oficial, ao se apresentar à Embaixada do Brasil, como sempre fazia toda vez que ia ao país, um simpático casal de cearenses que trabalhava na Embaixada em função comercial (na época, as embaixadas brasileiras não dispunham de adidos agrícolas), convidou o autor para participar de uma reunião marcada para acontecer no Ministério da Agricultura no dia seguinte. Qual o motivo desse evento? Era afastar óbices para a Malásia importar laranjas do Brasil. Mas, por que isso, se geralmente aquele país amigo fazia essas importações da Austrália, bem mais próxima? O motivo foi a prisão de um traficante australiano, surpreendido comercializando entorpecentes na Malásia. Neste caso, os países orientais costumam trucidar os traficantes, pois a tolerância é zero! Isso aconteceu, causando um grande estremecimento diplomático entre os dois países. Então, para o caso da importação de laranja, uma das alternativas para a Malásia era tentar a 42


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importação das laranjas produzidas no Brasil. A visão presente era praticar a importação a partir dos laranjais implantados na região de Campinas (SP). Só que outra grande preocupação que existia entre os malásios (e não malaios como erroneamente é falado no Brasil- eles não gostam!) era o receio de introduzir a doença denominada “mal-das-folhas da seringueira”, causada pelo fungo Microcyclus ulei (P. Henn.)V. Arx., que felizmente não ocorre naquele país. Como é sabido, a seringueira (Hevea brasiliensis Müll. Arg) foi introduzida no Oriente por volta de 1886, tendo como origem cerca de 70 mil sementes coletadas oficialmente na região de Boim, localizada no Baixo Amazonas, no Estado do Pará, onde a citada doença é endêmica. Primeiramente, as sementes foram plantadas no Jardim Botânico de Kew - Inglaterra, e de lá em torno de 1919 “seedlings” (plântulas germinadas de sementes) foram enviadas para o Ceilão, hoje Sri Lanka. Daí, 22 plantas foram introduzidas na Malásia, via Cingapura, originando toda a riqueza do setor de borracha natural daquele país. Tudo isso para enfatizar aos leitores que os seringais que correspondem a um dos sustentáculos do formidável agronegócio malásio (os outros estão representados por óleo de dendê, madeira e frutas) são altamente suscetíveis ao mal-das-folhas, daí o grande temor dos técnicos do Ministério da Agricultura malásio. Por ocasião da reunião acima citada, o autor e o nobre casal da Embaixada sentaram-se a uma comprida mesa em conjunto com 23 especialistas locais, entre eles um excelente pesquisador fitopatologista malásio, conhecido do autor, que já havia trabalhado na CEPLAC/CEPEC, no sul da Bahia, com doenças da seringueira, especificamente com o maldas-folhas, através de acordo de cooperação técnica e financeira do RRIM (Instituto de Pesquisa de Seringueira da Malásia) com a Embrapa e a CEPLAC, sob o comando do autor a partir da Chefia-Geral da Embrapa Seringueira e Dendê, atual Embrapa Amazônia Ocidental, Centro localizado em Manaus (AM). Para avançar no entendimento dos leitores, deve-se ainda acrescentar que a seringueira apresenta diversas formas de resistência da planta ao mal-das-folhas, como a vertical, horizontal e por hipersensibilidade, bem como diversas formas de explorar essas resistências, sendo uma delas usar áreas de escape à doença, isto é, em condições climáticas que apresentem um período seco bem definido, dificultando a multiplicação do patógeno, levando em conta os estádios suscetíveis dos novos folíolos ao ataque do M. ulei. No Estado de São Paulo existem duas regiões bem distintas em termos climáticos, isto é, o Litoral e o Planalto. No Litoral, devido às constantes chuvas, alta umidade e elevada temperatura, o mal-das-folhas ocorre. Porém no Planalto, com baixa umidade, ocorrência de baixas temperaturas e um período seco bem definido, constitui um excelente exemplo de área de escape da Hevea à doença e denominada pelo autor de resistência genético-ecológica, com a 43


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exploração da resistência de campo ou mesmo horizontal (poligênica) para esse caso. É justamente isso que ocorre na região de Campinas (SP), isto é, não existe o M. ulei. Esta informação acima foi o argumento técnico-científico do autor para assegurar aos malásios que não havia o risco, perigo ou dano de importar laranjas da região de Campinas, com o receio da contaminação com o temido patógeno da seringueira, logicamente que resguardando os critérios de tratamento prévio para inocuidade dos frutos, o que é usual. Outra preocupação dos técnicos da Malásia era a possibilidade da introdução de patógenos do dendezeiro (Elaeis guineensis Jacq.), outro sustentáculo da economia local, como nematoides etc., o que foi afastada, pois a região de Campinas não se aplica ecologicamente à dendeicultura. Afastados todos os óbices, finalmente houve o acordo do Ministério da Agricultura em aprovar a importação das laranjas brasileiras, o que significou uma transação comercial de cerca de oito milhões de dólares naquele ano! Com todos ficando felizes, o evento foi encerrado. Ou quase, pois quando o autor retornou ao Brasil, na sala da Chefia-Geral da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, o autor atendeu a uma ligação telefônica que partiu de um dos responsáveis pela exportação das laranjas para a Malásia, indagando quanto ao valor financeiro que seria cobrado pelo serviço realizado. O autor respondeu ao mesmo que apenas tinha cumprido uma obrigação funcional e que na Embrapa não se costumava proceder dessa nefasta maneira de cobrar por serviços dessa natureza, e o convidou para vir à Brasília para conhecer a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia para tomar um cafezinho, mas, nunca mais voltou a manter contato. Aquele interlocutor parece ter aprendido a lição de honestidade e amor à pátria!

Conclusões Diante desses aspectos enfocados, no Brasil devemos ficar atentos para afastar todos os males que afetem o agronegócio que, aliás, está incomodando os competidores no âmbito internacional, deixando de lado a ingenuidade e o amadorismo, elegendo o profissionalismo e a competência premonitória e desconfiada. Referências bibliográficas VALOIS, A. C. C. Segurança biológica: agricultura, pecuária e florestas saudáveis e livres de doenças e pragas. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, n. 33, p. 4-7, 2004. VALOIS, A. C. C.; OLIVEIRA, M. R. V. Segurança biológica para o agronegócio. Agrociência. Montevideo, Uruguay, v. 9, n. 1/2, p. 203-211, 2005.

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7. Recursos Genéticos de Frutíferas Tropicais: Parte 1 Afonso Celso Candeira Valois Eng. Agr., Me., Dr., e Pós-Doc em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Introdução Os recursos genéticos de frutíferas tropicais são extremamente ricos no Brasil, quer seja em frutíferas exóticas introduzidas num passado longínquo ou recente, quer em nativas de nosso território sendo, portanto, de valor inestimável para nossa agricultura. De maneira geral, a fruticultura tropical se apresenta como um dos grandes sustentáculos do agronegócio familiar e empresarial no mundo, seja para o cultivo atual ou potencial, dando margem para a agregação de valores e instalação de agroindústrias em bases sustentáveis, originando a geração de empregos, trabalhos, renda, serviços, impostos oficiais e outras oportunidades de cunho social, econômico e ambiental. Logicamente que é nos países tropicais que se encontram os seus centros de origem ou mesmo de dispersão, com grande diversidade genética, possibilitando sua ampla utilização tanto em condições de extrativismo in situ como em agricultura ex situ pelas comunidades locais e regionais. Mesmo já existindo um grande número de frutíferas tropicais domesticadas para a alimentação humana, muitas espécies ainda estão por atingir esse patamar via melhoramento genético, ao mesmo tempo que é enorme o número de genótipos potenciais que ainda não consta da lista de utilização racional ou mesmo que continua com baixo nível de consumo e uso. O processo de coleta de germoplasma, preservação in situ e conservação ex situ, caracterização, avaliação, informação, documentação e utilização em programas de melhoramento genético e áreas afins, abre um grande leque para a exploração racional de recursos genéticos de frutíferas tropicais, principalmente devido ao grande número de espécies aguardando a oportunidade de ser devidamente domesticado para o seu uso sustentável. A segurança alimentar e os alimentos biofortificados, livres de perigos físicos, químicos, biológicos e ambientais é atualmente um dos maiores desafios do mundo, tendo em vista assegurar os direitos humanos por uma alimentação adequada, sem influir na busca de outras necessidades básicas considerando-se que a fome, a pobreza e a miséria absoluta ainda persistem no seio da sociedade. A fruticultura tropical, com a sua larga plasticidade fenotípica, estabilidade genética, valor nutricional, conhecimento tradicional atrelado, conhecimentos científicos disponíveis, aceitação palatável dos seus variados produtos, e diversidade de espécies, é uma ferramenta essencial da comunidade agrícola para suprir esta carência mundial. Considerando o grande número de espécies frutícolas tropicais de uso em larga escala, incluiu-se no presente trabalho, além das espécies já tradicionais, espécies de pouco e médio 45


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usos pelas populações e cientistas, inclusive para implementar a percepção pública de sua relevância, como ponto fundamental adicional de evitar a erosão genética pelo uso irracional extrativista e, até mesmo, a extinção desses genótipos, pela falta de informação e inexistência de melhoramento genético. Diante da excelente oportunidade de agregação de valores oferecida pela fruticultura tropical, o Brasil se apresenta como um país de enorme valor real e potencial para a exploração sustentável desse rentável agronegócio, fulcro para a geração de trabalho, emprego, serviço, renda e impostos oficiais como valores éticos, levando em conta a grande diversidade ecológica dos seus diversos biomas e ecossistemas. Descrição Sucinta das Espécies Apresenta-se a seguir uma descrição sintética das espécies cuidadosamente selecionadas, na intenção de oferecer aos leitores informação capaz de conduzir ao seu uso sustentável, mesmo que em base de sucinta com descrição: botânica (família, nome científico, nome comum), centros de origem, grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos, características fitotécnicas, oportunidades de comercialização, composição físico-química e valor nutritivo, além de figuras ilustrativas.

1. Abacaxi Descrição: Família: Bromeliaceae; Nome científico: Ananas comosus (L.) Merril.; Nomes comuns: Abacaxi, Ananás, Piña (Espanhol), Pineapple (Inglês); Centro de origem: O abacaxizeiro é originário do continente americano e nordeste do Brasil. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: A planta possui uma larga adaptabilidade em regiões da Bacia Amazônica e terras baixas da América do Sul. Adapta-se muito bem em temperaturas não inferiores a 20ºC, em condições de chuvas entre 600 e 1.500mm, sendo obtida uma boa produção sob precipitação ao redor de 1.000mm anuais, em solos de textura média a argilosa, bem drenados. Características fitotécnicas: O abacaxizeiro é extensivamente cultivado em quase todos os países tropicais pela excelência do sabor dos frutos que produz. Botanicamente, a denominação abacaxi corresponde à variedade cultivada, enquanto que ananás se refere à variedade típica, geralmente de sabor inferior ao do abacaxi. O fruto é múltiplo, resultante de uma inflorescência na qual as inúmeras flores, compactamente unidas, soldam-se com sépalas, pétalas e ovários durante o processo de maturação, originando uma infrutescência. No Maranhão foi selecionada a cultivar Turiaçu, de tamanho e forma apropriados e excelente sabor, enquanto que no município de Tarauacá (Acre) talvez ocorra o abacaxi ou ananás de maior tamanho conhecido, podendo pesar mais de 15kg. Oportunidades de comercialização: Trata-se de uma das frutas tropicais com maior poder de mercado, podendo ser consumida ao natural ou em forma de sucos, doces, compotas e de outras maneiras, sendo muito rica em vitamina C. Pode ser encontrada nas feiras praticamente durante todo o ano, porém o clímax da produção verifica-se entre agosto e outubro, chegando até dezembro. 46


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2. Abiu Descrição: Família: Sapotaceae; Nome científico: Pouteria caimito (Ruiz & Pav.) Radlk; Nomes comuns: Abiu (Português), Egg fruit, Abiu (Inglês), Caimito, Caimo, Cauje (Espanhol), Abiu (Francês); Centro de origem: Brasil. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: É cultivado em pomares domésticos de diversas regiões do Brasil. É uma planta que vegeta bem na terra-firme, em solos sílico-argilosos, férteis, profundos e de boa permeabilidade. Desenvolve-se, também, em solos de várzea alta, bem drenados. Características fitotécnicas: Árvore de porte pequeno a médio, de 3 a 10m de altura. Os frutos podem ser globosos, elipsoides, alongados, pontudos, grandes ou pequenos, variando de 10-14 cm de comprimento e 4-8 cm de diâmetro. O peso médio é de 150 a 200g. A casca de 2 a 5mm de espessura, apresenta cor amarela, quando maduro. A polpa, de cor branca a creme ou amarelada, translúcida, adocicada e um pouco mucilaginosa, contém de 1 a 5 sementes oblongaovoides lisas e negras, com cerca de 3,5cm, não aderente a polpa. Floresce várias vezes ao ano, principalmente de setembro a janeiro e frutifica de fevereiro a maio, na Amazônia Central. Propagação por sementes, que são recalcitrantes. A germinação ocorre em 15 a 45 dias e, entre 3 a 5 meses, as mudas tem tamanho adequado para plantio O plantio pode ser feito em triângulo equilátero, com 8 metros de lado. O crescimento juvenil é rápido, até um metro por ano. Inicia a produção, normalmente, no segundo ou terceiro ano após o plantio. A árvore, quando em plena produção, pode chegar a 500 frutos por planta. A polpa do fruto é consumida na forma in natura. Oportunidades de comercialização: Importante para agricultura familiar, especialmente para plantio em consórcio com outras frutíferas. Comercialização do fruto no mercado local, em feiras. 3. Abricó Descrição: Família: Clusiaceae (Gutiferae); Nome científico: Mammea americana L.; Nomes comuns: Abricó-do-Pará, Mamey ou Mamey de S. Domingo; Centro de origem: Originário das Índias Ocidentais. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Clima tropical de baixa a média altitude. Adapta-se a vários tipos de solo. Temperatura ideal acima de 16º C. Características fitotécnicas: A árvore cresce em média de 20 m de altura, formando uma copa mais ou menos alongada. O fruto tem forma depressora-globosa, de tamanho variável, podendo alcançar 17cm de diâmetro e peso médio de 2 kg; casca rugosa, coriáceo-flexível, de cor pardo-alaranjada, mesocarpo (parte comestível) de polpa compacta, pouco fibroso, de cor abóbora; sementes de 1- 4 por fruto, ovaladas, plano-convexas e envolvidas pelo endocarpo. A polpa é consumida geralmente em maceração com açúcar, ou em salada de frutas, podendo ainda servir para o preparo de licor. A planta propaga-se facilmente por sementes, as quais germinam com 12-18 dias, podendo a planta florescer a partir dos 8 anos.

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Oportunidades de comercialização: Cultivado na Amazônia e no Nordeste do Brasil, na maioria dos casos em indivíduos isolados em pequenos pomares domésticos. Geralmente os frutos aparecem nas feiras durante o ano, mas a maior produção é de junho a dezembro. 4. Açaí Descrição: Família: Palmaceae; Nome científico: Euterpe oleracea Mart.; Nomes comuns: Açaí, Açaí-do-Pará, Açaí do Baixo Amazonas, Juçara (Maranhão); Centro de origem: O gênero Euterpe congrega cerca de 28 espécies, que estão distribuídas desde as Antilhas e América Central até às regiões florestais amazônicas do Peru. No Brasil três são as espécies mais importantes: E. oleracea, que ocorre principalmente em toda extensão do estuário amazônico, do Maranhão ao Amapá e no Pará, acompanhando o vale do Baixo Amazonas, estendendo-se às Guianas, Venezuela e Trinidad; E. precatoria Mart., nas regiões central e ocidental da Amazônia, indo até aos contrafortes dos Andes; E. edulis Mart., abundante nas florestas Atlântica e do centro-sul do País, atualmente encontra-se seriamente ameaçada pela exploração desordenada do palmito. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: É uma planta tipicamente tropical encontrada em estado silvestre e fazendo parte da vegetação florística das matas de terra firme, várzea e igapó, sendo seus frutos grandemente procurados para a produção do tradicional “vinho do açaí”, rico em antocianina (antioxidante), ferro, cálcio e fósforo, utilizado na alimentação humana e fabricação de sucos, picolés, sorvetes e iogurtes. Características fitotécnicas: Uma das características da espécie é o crescimento em touceiras (reboladas), resultante das brotações. O número de pés e brotações por touceira varia em função das condições ambientais, podendo chegar a 25 em uma touceira, incluindo as brotações. O estipe é delgado, às vezes ligeiramente curvo, atingindo em média 15-20m de altura, sustentando no ápice um capitel de folhas pinadas com os segmentos pêndulos, o que lhe confere um porte delicado e elegante. Por esta razão geralmente é encontrado em praças e jardins particulares, como planta ornamental. O número de cachos por pé varia em torno de oito, sendo mais comum de 3-4, porém em ambos os casos sempre em diferentes estádios de desenvolvimento, desde inflorescência encerrada na espata até aos cachos com frutos maduros. O fruto é uma baga arredondada de cor atroviolácea quando madura, de 12-15 mm de diâmetro. A frutificação pode ocorrer durante o ano inteiro, sendo a estação menos chuvosa o período de maior abundância e também de frutos que fornecem o vinho de melhor sabor. A colheita dos cachos é uma tarefa árdua, arriscada e aventureira, realizada por pessoas habilitadas em escalar os açaizeiros. Quando lá no alto passam de um para pé para outro, colhendo assim, todos os cachos maduros da touceira. Oportunidades de comercialização: O açaizeiro é uma espécie de grande importância socioeconômica devido ao seu enorme potencial de aproveitamento integral de matéria-prima. O principal produto é o “vinho” extraído da polpa dos frutos, enquanto que as sementes são utilizadas para artesanato, adubo orgânico e produção de mudas para plantio. A planta fornece ainda um ótimo palmito, enquanto que suas folhas são muito utilizadas para a cobertura de casas e o estipe pode ser usado na indústria de celulose e papel. Em face da característica altamente perecível do “vinho”, a Embrapa Amazônia Oriental (Belém-Pará) desenvolveu uma tecnologia para a obtenção do açaí desidratado (em pó), que em linhas gerais compreende as seguintes etapas: recepção dos frutos, lavagem, maceração dos frutos, despolpamento, 48


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centrifugação, secagem em equipamento “spray dryer”, envasamento, embalagem e estocagem, todas com extremo cuidado no uso de boas práticas de fabricação (BPF), para a obtenção do produto livre de perigos físicos, químicos e biológicos. Outro método bastante utilizado pelas indústrias alimentícias é submeter o suco concentrado à temperatura de –40ºC, preservando assim grande parte das suas características. Para o caso da tecnologia e processos de obtenção da polpa os principais passos são os seguintes: recepção dos frutos, lavagem, maceração, despolpamento e envasamento. No sentido de assegurar a alta produção e produtividade de açaizais de cultivo a Embrapa Amazônia Oriental desenvolveu a cultivar BRS PARÁ, cuja planta é precoce (começa a frutificar aos três anos de idade), a primeira frutificação ocorre à altura de 1,12m do nível do solo (facilidade de colheita e maior eficiência operacional), mais produtiva em relação à média dos outros açaizeiros nativos (estimativa de 10t/ha/ano após oito anos do plantio) e maior rendimento de polpa (entre 15% e 25%, garantindo maior quantidade de vinho por fruto), com boa adaptação regional (plasticidade fenotípica). A grande visão de futuro é a introdução do açaí em pó na merenda escolar em municípios maranhenses. Características físico-químicas do açaí: A parte comestível representa 17% do fruto e a semente (caroço) 83%. A composição química varia de acordo com as características físicas do açaí. Essa composição para cada 100 gramas de polpa é a seguinte: umidade 59,73%; protídeos 2,52%; lipídios 7%; glicídios 25,52%; cinza 1,23%; cálcio 0,167%; fósforo 0,051% e ferro 0,004%. Para o vinho é a seguinte: umidade 87%; protídeos 2,37%; lipídios 5,96%; cinza 0,47%; cálcio 0,05%; fósforo 0,033% e ferro 0,0009%. A análise química do pó de açaí mostra os seguintes resultados a cada 100 gramas: voláteis a 105ºC 7,45%; resíduo mineral fixo 4,50%; extrato etéreo 45,00%; proteína bruta 9,4%; fibra bruta 3,20%; cálcio 0,72%; fósforo 0,30%; potássio 0,89% e magnésio 0,29%. O valor energético de 100 gramas de açaí é de 80 calorias. O material corante existente no fruto, responsável pela coloração roxa que lhe é própria, pertence ao grupo das antocianinas. 5. Araçá-boi Descrição: Família: Myrtaceae; Nome científico: Eugenia stipitata McVaugh; Nomes comuns: Araçá-Boi (Brasil), Arazá, Arazça -Buey (Peru); Centro de origem: Espécie originária da Amazônia peruana, encontrada em estado nativo em muitas partes da região, principalmente, na Bacia do Rio Ucayali e distribuída na Amazônia Ocidental; Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Solos bem drenados, férteis, precipitação 2.800mm, temperatura anual 26º C, altitude até 650m. Características fitotécnicas: Planta de 3 a 15m de altura e ramificação densa. O fruto é uma baga globosa-depressa que pode atingir 12cm de diâmetro transversal e 10cm no longitudinal, peso de 50 a 750g, cor verde claro a amarelo quando maduro e casca aveludada ao tato. A polpa é sucosa, brancacenta, pouco fibrosa e ácida. As sementes são oblongas com até 2,5cm de comprimento. A propagação é por sementes, que apresentam poder germinativo alto (80 a 100%), quando recém-extraídas do fruto. A germinação pode levar 2 a 4 meses para começar e, 6 a 8 meses, para completar. O plantio no campo pode ser no espaçamento 3 x 3m ou 4 x 4m. A primeira frutificação ocorre entre o segundo e o terceiro ano, com produção de 3 a 5 t. de frutos por hectare. É um fruto ácido, o que limita seu consumo “in natura”. A polpa é usada no preparo de sucos, sorvetes, doces, cremes e geleias.

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Oportunidades de comercialização: Importante para agroindústria, pois diversificação de produtos, além de produzir o ano todo quando bem manejado.

apresenta

6. Araticum Descrição: Família: Anonaceae; Nome científico: Anonna montana Macf; Nomes comuns: Araticum-Açu, Mountain Soursop (Inglês), Guanabana Cimarrona (Cuba), Falsa Graviola; Centros de origem: Espécie largamente distribuída pela América Tropical, comum em capoeiras, culturas abandonadas e em alguns pomares domésticos, crescendo em média cerca de 15 m de altura. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Desenvolve bem em floresta tropical secundária. Precipitação média anual de 2.400mm e temperatura de 26º C. Características fitotécnicas: Planta de 10 a 15m de altura. O fruto é um sincarpo oviforme ou arredondado, com cerca de 26 cm de comprimento e 15cm de diâmetro, polpa brancacenta, mucilaginosa, de cheiro ativo. Produção 35kg de fruto por planta. Propagação por semente. Oportunidades de comercialização: Os frutos ficam maduros no período de julho a dezembro. Usada na agroindústria para suco, sorvete e doces. 7. Ata Descrição: Família: Anonaceae; Nome científico: Annona squamosa L.; Nomes comuns: Fruta-do-Conde, Pinha; Centros de origem: originária das Antilhas e cultivada em todos os países tropicais. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Desenvolve bem em clima tropical, precipitação acima de 1.200mm, bem distribuída e altitudes inferiores a 1.200m. Solos profundos e bem drenados. Características fitotécnicas: Planta de pequeno porte, de 4 a 5 m de altura. O fruto com carpelos achatados, onde cada um corresponde à formação de uma semente, envolta a uma polpa brancasucosa, doce, de sabor extremamente delicioso, geralmente consumido in natura. Oportunidades de comercialização: No Pará encontra-se cultivada em alguns municípios, como também em outros estados da Amazônia. No Nordeste brasileiro a ata encontra o seu habitat ideal, sendo também largamente cultivada e produzida comercialmente em São Paulo no período de janeiro a maio. 8. Bacaba Descrição: Família: Arecaceae; Nome científico: Oenocarpus bacaba Mart.; Nomes comuns: Bacaba Açu, Bacaba Verdadeira (Brasil), Ungurauy (Peru), Camon (Guiana Francesa), Manoco, Milpesos, Punáma (Colômbia); Centros de origem: É uma palmeira comum na

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Amazônia Central, podendo ser seu centro de origem. Também se encontra no oeste e sudeste da Amazônia, na Bacia do Orinoco e nas Guianas. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Bem adaptada em altas temperaturas, solos pobres e argilosos da Amazônia. Precipitação entre 1.500mm e 3.000mm, bem distribuído. Características fitotécnicas: Palmeira inerme, monoica, tronco solitário, liso, reto, com até 20m de altura e 30cm de diâmetro, marcado por anéis correspondentes às cicatrizes foliares. O cacho mede em torno de 1,5m, com frutos arredondados de aproximadamente 1 a 2cm de diâmetro e peso de 1,5 a 4g. A casca é de cor roxo-escura quase preta; epicarpo delgado e liso; mesocarpo de 1 a 1,5mm de espessura, brancacento e oleoso; endocarpo fibroso e delgado. A propagação é por sementes, que germinam após quatro meses, apresentando crescimento lento. A frutificação inicia após seis anos de idade, quando a planta está com 3 a 4m de altura. Os cachos pesam normalmente 2 a 8kg, podendo ocorrer de 19 a 35kg. Os frutos representam cerca de 70% do peso total do cacho. As plantas silvestres produzem de 1 a 3 cachos/árvore/ano, com rendimento total em torno de 20kg de frutos. A floração ocorre entre junho e agosto, sendo comum floração fora de temporada. O fruto amadurece entre 6 a 8 meses mais tarde. A polpa do fruto é utilizada no preparo de suco, que é uma bebida de cor creme-leitosa, de sabor agradável, embora com elevado teor de óleo. Oportunidades de comercialização: Os frutos podem ser encontrados em feiras no período compreendido entre outubro e maio do ano posterior, justamente quando rareia a presença do açaí, compensando assim a falta deste. As amêndoas e os restos de macerado da polpa são utilizados na alimentação de suínos e aves. As folhas são usadas pela população interiorana como cobertura de moradias, enquanto o tronco serve como esteios, vigas e cabo de ferramentas. 9. Bacuri Descrição: Família: Gutiferae; Nome científico: Platonia insignis Mart.; Nome comum: Bacuri; Centro de origem: Muito comum em estado silvestre na região amazônica, o bacurizeiro estende-se ao Maranhão, Goiás, Mato Grosso, indo até ao Paraguai. Seu principal centro de dispersão é o estado do Pará, ocorrendo em quase todos os municípios, sempre em áreas mais ou menos descampadas ou de vegetação baixa. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: O bacurizeiro apresenta uma boa plasticidade fenotípica e estabilidade genética, permitindo a sua adaptação em diferentes nichos, desde áreas de florestas até à condição de áreas de cerrados. Na Ilha do Marajó e região do Salgado, ambas localizadas no estado do Pará, estão as maiores concentrações de bacurizeiros, onde a planta se prolifera com extrema facilidade, tanto de sementes abandonadas como de brotações de raízes. Por possuir uma madeira de alta qualidade, as ocorrências naturais de bacurizeiros têm sido drasticamente reduzidas por ação de bioburla (fraude à vigilância e ao não cumprimento das leis ambientais), por parte de madeireiras. Características fitotécnicas: O bacurizeiro atinge em média 25m de altura, tendo um tronco reto, com casca enegrecida nos indivíduos adultos. Copa em forma de cone invertido, crescimento dos ramos em posição mais ou menos constante, ou seja, entre 50-60º com o tronco. Folhas opostas, elípticas, verde-brilhosas na face superior, subcoriáceas. Flores grandes, cerca 51


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de 7cm de comprimento, solitárias, de cor rósea, com cinco pétalas. Fruto, uma baga volumosa, ovoide ou subglobosa, tamanho variável de até 13 cm, peso de até cerca de 900g; contém geralmente de 1-4 raro 5 sementes oblongo-angulosas, em média de 5-6 cm de comprimento, envolvidas por uma polpa branca, macia, de cheiro e sabor agradáveis que lhe conferem a condição de uma das frutas mais preferidas da Amazônia Legal. Nos óvulos não fecundados apenas se desenvolve a polpa que no fruto maduro recebe a designação popular de “filho”, geralmente a parte mais preferida em face da maior quantidade de polpa; casca rígida, com espessura de 1-2 cm, de cor citrina, contendo uma resina vermelho-amarelada, característica da família, que deve ser preterida por ocasião do consumo do fruto. Oportunidades de comercialização: O fruto do bacurizeiro é um dos mais preferidos entre os produtos das frutíferas tropicais, daí a excelente oportunidade de comercialização. É empregado principalmente na fabricação de sorvetes, doces e compotas, além de ser bastante degustado in natura. A planta floresce regularmente entre junho e julho, sendo que a queda dos frutos tem início em dezembro, prolongando-se até maio do ano seguinte, situando-se o clímax da safra entre os meses de fevereiro e março. 10. Banana Descrição: Família: Musaceae; Nome científico: Musa paradisiaca L.; Nome comum: Banana; Centro de origem: Sudeste asiático Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: A banana é uma das frutas mais conhecidas e cultivadas em todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo. De acordo com a literatura, o início da cultura da bananeira vem de épocas remotíssimas, talvez datando de 4.000 anos atrás. Características fitotécnicas: As variedades de bananas comestíveis, sem sementes, são tradicionalmente agrupadas em três espécies pertencentes ao gênero Musa: Musa paradisiaca L., Musa sapientum L., e Musa cavendishii L. Originaram-se de duas espécies silvestres (Musa acuminata Colla e Musa balbisiana Colla) largamente distribuídas na Ásia, Índia e Sri Lanka, península e arquipélago malásio, Ilhas Filipinas, Nova Guiné e algumas ilhas do Pacífico. Uma das principais características do gênero Musa é encontrada na parte vegetativa. O verdadeiro caule é um rizoma subterrâneo; a parte aérea constitui-se quase que exclusivamente das folhas, cujas bainhas, robustas e superpostas, formam um pseudocaule, que pode alcançar 4-5m de altura. O centro desse “tronco”, a partir do rizoma, é percorrido por um tecido que representa o pedúnculo da inflorescência. A flor consta de um perianto de seis sépalas, cinco das quais são soldadas e uma livre, cinco estames férteis e um involuído, ovário ínfero, trilocular. Fruto do tipo baga, partenocárpico, isto é, desenvolvido sem fecundação. O fato de a bananeira ter perdido sua capacidade de reprodução sexuada (por sementes) e ser multiplicada exclusivamente por processo vegetativo, é tido como indício de um cultivo secular, desde os tempos primordiais de origem da humanidade. Atualmente são conhecidas inúmeras cultivares de banana, inclusive que oferecem resistência genética a condicionantes biológicos da bananicultura sustentável. Oportunidades de comercialização: A banana é considerada um dos principais alimentos da humanidade, especialmente por ser rica em potássio, um nutriente da maior importância para o funcionamento adequado do coração, além de se constituir na principal fonte de carboidratos dos povos que habitam muitas partes dos trópicos úmidos. É uma boa fonte de vitamina C e B6, podendo ser consumida de inúmeras maneiras, desde o natural até chips, farinha, purê, fritas, 52


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doces, vitaminadas, compotas, tortas e outras formas. Essas vantagens comparativas e competitivas remetem para a franca disponibilidade de mercados para a comercialização desse nutricional produto da bananeira. 11. Biriba Descrição: Família: Anonácea; Nome científico: Rollin ia mucosa (Jacque.) Bial.; Nomes comuns: Biriba, Bereba, Biriba de Pernambuco, Fruta da Condessa, Jaca de Pobre (Brasil), Anona (Peru); Centro de origem: Supõe-se ser originário do extremo ocidental da bacia Amazônica. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Está distribuído até o nordeste brasileiro, nas Antilhas e outras partes do Caribe. Características fitotécnicas: É uma árvore de porte médio, em geral de 6-10 m de altura, com os ramos muitas vezes flageliformes e nodulosos na região da cicatriz foliar. O fruto é um sincarpo ovoide ou globoso, formado pelos ovários que se tornam carnosos e se soldam na maturação, casca amarelada, munida de saliências escamiformes e carnosas; polpa abundante, sucosa, de sabor adocicado e agradável, sementes numerosas, pardooliváceas. O peso do fruto pode chegar ao redor de 1350 g, nas dimensões de 14 cm de comprimento por 16 cm de diâmetro na parte mais larga. A polpa é consumida ao natural. A propagação é por sementes, com germinação entre 20 a 30 dias e 60 a 80% de poder germinativo. Também pode ser multiplicado por enxertia. No campo, o crescimento inicial é vigoroso, com incremento anual de 1,5m. Árvores com cinco anos de idade podem produzir entre 25 a 60 frutos e acima de 15 anos podem produzir mais de 150 frutos/ano. Oportunidades de comercialização: Trata-se de uma fruta bastante consumida no estado do Pará e Amazonas, presente em pomares domésticos. A rigor, pode aparecer nas feiras durante todo o ano, sendo mais abundante no período que vai de janeiro a junho. A madeira é empregada na confecção de pranchas e caixas. 12. Buriti Descrição: Família: Arecaceae; Nome científico: Mauritia flexuosa L.; Nomes comuns: Buriti, Miriti, Buriti do Brejo, Moriche (Venezuela), Palmier Bâche (Guiana), Aguaje, Achual (Peru); Centro de origem: Origem amazônica, distribuída por toda a América Equatorial, habitando os terrenos baixos alagáveis (igapós), margens de rios e igarapés, formando os característicos buritizais ou miritizais. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Habita os solos baixos e alagáveis e as margens dos rios e igarapés. Pode ocorrer em áreas mais secas, com altitude acima de 50m. Características fitotécnicas: Palmeira com tronco reto de 20 a 35m de altura, 30 a 60cm de diâmetro, com leve engrossamento na região média, sustentando no ápice um capitel de folhas grandes, flabeladas, com a extremidade dos segmentos pendentes. Planta dioica, frutos ovoides, de 4 a 7cm de comprimento, 3 a 5cm de diâmetro, revestidos de escamas de coloração castanhoavermelhada. A polpa de coloração amarelo-alaranjada, pouca espessura, tem sabor agridoce e 53


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consistência amelace e oleosa, envolvendo endocarpo esponjoso. Contém uma semente globosa, muito dura com endosperma homogêneo e córneo. Propagada por sementes, que perdem o poder germinativo em poucas semanas, entretanto alcançam 100% de germinação com sementes recém-colhidas. A germinação ocorre aos 75 dias. O número de inflorescências ou de cachos com frutos varia de 5 a 8 por planta. Oportunidades de comercialização: As folhas são usadas na fabricação de cordas e cobertura de casas, o tronco na confecção de canoas e as raízes na medicina popular. A planta serve ainda para ornamentação. A polpa é consumida na forma de doces, sorvetes, suco ou “vinho de buriti”. Conclusões Nesta primeira etapa concluímos a apresentação das frutas de nomes vulgares de A até B, de uma série de 40 frutíferas por mim elencadas, como de grande valor agrícola para o Brasil. Nos textos seguintes continuaremos nossa listagem na Revista RG News.

Referências bibliográficas CALZAVARA, B. B. G; MÜLLER, C. H. & KAHWAGE, O. N.C. 1984. Fruticultura tropical: O cupuaçuzeirocultivo, beneficiamento e utilização do fruto. Belém, EMBRAPA-CPATU. 101 p. (EMBRAPA-CPATU, Documentos, 32). CAVALCANTE, P. B. 1976. Frutas comestíveis da Amazônia. 3ª edição. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém (Pará). 174 p. KERR, L; CLEMENT, R; CLEMENT, C & KERR, W.E. 1997. Cozinhando com a pupunha. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-Inpa, Manaus-Amazonas. 95p. LIMA, V.P.M.S. (Organizador). 1988. A cultura do cajueiro no nordeste do Brasil. Fortaleza, Banco do Nordeste do Brasil. Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste. 486 p. (Estudos Econômicos e Sociais, 35). MIRANDA, C. & COSTA, C. (Organizadores). 2005. Gestão Social do Território: Experiências no Estado do Maranhão. Brasília: IICA. 178p. (Desenvolvimento Rural Sustentável; v. 3). MMA/SUFRAMA/SEBRAE/GTA. 1998. Opções de investimento na Amazônia Legal: açaí. Brasília. 51p. MOURA, E. G. (Coordenador). 2004. Agroambientes de transição entre o trópico úmido e o semi-árido do Brasil: atributos, alterações, uso na produção familiar. Estação Produções Ltda, São Luís: UEMA. 312p. SCHULTZ, Q. & VALOIS, A. C.C. 1974. Estudos sobre o mecanismo de floração e frutificação do guaranazeiro. Manaus, IPEAAOc. p. 35-38 (IPEAAOc, Boletim Técnico, 4). SMITH, N. J. H.; WILLIAMS, J.T.; PLUCKNETT, D. L. & TALBOT, J. P. 1992. Tropical forests and their crops. Cornell University Press, Ithaca and London. 568 p. SOUSA, N. R. & SOUZA, A. G. C. 2001. Recursos fitogenéticos na Amazônia Ocidental: conservação, pesquisa e utilização. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental. 205 p. VALOIS, A. C. C. 1994. Genetics resources of palms. Acta Horticulturae, 360: 113-120. VALOIS, A. C. C. 2006. Fruticultura Tropical Atual e Potencial: espécies autóctones e exóticas de interesse econômico, social e ambiental. Vida Rural. Edição Especial, Ano 1, São Luís. 8 p. (ilustrado). VALOIS, A.C.C. 2003. Benefícios e estratégias de utilização sustentável da Amazônia. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica. 75p. VALOIS, A.C.C. 2006. Fruticultura Tropical Atual e Potencial: espécies autóctones e exóticas de interesse econômico, social e ambiental. Vida Rural. Edição Especial, Ano 1, São Luís. 8p. (ilustrado).

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8. Recursos Genéticos de Frutas Tropicais: Parte 2 Afonso Celso Candeira Valois Eng. Agr., Me., Dr., e Pós-Doc em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Introdução Em nosso primeiro texto nesta revista apresentamos 12 frutíferas tropicais de grande interesse para o Brasil. Prosseguimos agora com as Frutíferas de C até E. Como somos o país da maior megabiodiversidade do mundo, era de se esperar que fossemos grande consumidores de espécies nativas do Brasil, mas isto não é a realidade. Cardim (2011) citou que na relação das 20 frutíferas mais consumidas no Brasil, o resultado mostrou que a minoria é composta por espécies nativas, sendo elas: abacate, abacaxi, banana, caqui, coco-da-baía, figo, goiaba, laranja, limão, mamão, manga, maracujá, marmelo, maçã, melancia, melão, pera, pêssego, tangerina, e uva. Pode-se dizer que destas frutíferas apenas quatro podem ter origem em nosso país, três com certeza: abacaxi, goiaba e maracujá, ficando a dúvida para o coco-da-baía, se de fato é originário do Brasil, há controvérsias, mas a história é insofismável! Vejam a seguir mais informações sobre essa palmeira de expressão econômica, social e ambiental: O coqueiro (Cocos nucifera L.), família Arecaceae, apresenta-se como uma excelente alternativa para o sucesso do agronegócio familiar e empresarial. Originário do sudeste da Ásia, principalmente das ilhas entre os oceanos Índico e Pacífico, o coqueiro foi levado para o leste da África e após a descoberta do Cabo da Boa Esperança, a planta foi introduzida no oeste da África, daí seguindo para as Américas e demais regiões tropicais do planeta. Dono de uma larga variabilidade genética, o coqueiro é possuidor de duas variedades bem distintas, isto é, a variedade gigante e a variedade anã. O coqueiro gigante foi introduzido no Brasil em 1553 trazido pelos navios negreiros, proveniente da Ilha de Cabo Verde. A variedade anã foi introduzida em nosso país nas seguintes épocas: anão-verde em 1925 e 1939 oriundo de Java e norte da Malásia, respectivamente; anão-amarelo e anão-vermelho em 1938 e 1939, respectivamente, também originários do norte da Malásia. O nome comum de coco-da-baía (de mar) e não Bahia (Estado) conforme às vezes propalado erroneamente, prende-se ao fato de frutos especialmente da variedade gigante ao serem atirados ao mar por tripulantes dos navios chegavam às praias especialmente do nordeste brasileiro, onde germinavam e formavam exuberantes plantas que encantavam a paisagem praiana. As demais são exóticas, e 13 delas podem ser consideradas como plantas tropicais, como o abacate, abacaxi, banana, coco-da-baía, goiaba, laranja, limão, mamão, manga, maracujá, melancia, melão, e tangerina. Tal fato demonstra que mesmo as frutas tropicais sendo a maioria dentre as frutíferas consumidas no país, há uma extrema dependência de germoplasma exótico para o trabalho de melhoramento genético, na maioria das espécies citadas, justificando a existência de bancos ativos de germoplasma, sediados no Brasil, para que possa haver o abastecimento rápido de genes necessários às pesquisas de melhoramento genético. Além disso,

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podemos concluir que há um enorme campo de trabalho com as nossas frutas nativas, desde a domesticação até ao lançamento de uma cultivar elite. Desta forma, mesmo que haja questionamentos quanto à listagem acima, aqui continuamos com nossa pequena contribuição ao tema das frutíferas tropicais. Descrição Sucinta das Espécies Neste segundo texto continuo a apresentar uma descrição sintética das espécies por mim selecionadas, na intenção de oferecer aos leitores e demais usuários um nível de conhecimento capaz de conduzir ao uso sustentável, com base na descrição botânica (família, nome científico, nome comum), centros de origem, grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos, características fitotécnicas, oportunidades de comercialização, composição físico-química e valor nutritivo, além de figuras ilustrativas, mantendo a mesma numeração sequencial a seguir: 13. Cajarana Descrição: Família: Anacardiaceae; Nome científico: Spondias dulcis Forst.; Nomes comuns: Taperebá do Sertão, Cajá-Manga, “Otaheite Apple” (Inglês); Centros de origem: Originária das Ilhas da Sociedade e de Fiji. Largamente distribuída nos trópicos. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Espécie largamente distribuída nos trópicos. Características fitotécnicas: A planta tem porte mediano, copa descontínua, ramos alongados com tufos de folhas nas extremidades. O fruto é elipsoide ou subarredondado, variando de 6-8 cm de comprimento e 5-6 cm de diâmetro, podendo pesar cerca de 375 g, casca amarelo-ouro ou pardacento, polpa agridoce e endocarpo revestido de acúleos irregulares. Oportunidades de comercialização: No Brasil é comum seu cultivo em pomares domésticos, principalmente na região Nordeste. Frutos maduros regularmente no período de dezembro a julho do ano seguinte. Comercialização em feiras livres. 14. Caju Descrição: Família: Anacardiaceae; Nome científico: Anacardium occidentale L.; Nomes comuns: Caju, Cajueiro (Brasil), Marañon (Equador), Merey (Venezuela), Kachui (Filipinas), Kazuwa (Zaire), Cashew ( Inglês); Centro de origem: a bibliografia cita que a origem brasileira do cajueiro é aceita por quase todos os autores modernos que se dedicaram ao seu estudo. Também parece inquestionável que dentro do território pátrio, o cajueiro tem como centro de origem e de dispersão o litoral nordestino, embora haja ainda a convicção de que o centro de origem seja os lavrados do estado de Roraima, com grande dispersão no município de Normandia. Em alguns países de língua espanhola, como já foi assinalado, é conhecido com o nome de “Marañon”, em clara alusão ao importante estado do Maranhão, de onde provavelmente o cajueiro foi introduzido nesses países. É notável a ocorrência natural de cajueiros na região dos Lençóis Maranhenses.

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Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: presente em vasta área do litoral brasileiro à época do descobrimento e reconhecido o seu enorme valor alimentício pelos colonizadores, o cajueiro foi disseminado por quase todos os rincões do País. Do Brasil o cajueiro foi levado pelos portugueses para a Índia em meados do século XVI, iniciando, assim, a sua trajetória pelo mundo. Nas Filipinas essa planta foi introduzida por volta de 1.600, no início da dominação espanhola, bem como a sua disseminação para a Indochina e outros países do sudeste asiático, além de um grande número de ilhas do Pacífico, foi consequência direta dos primeiros domínios coloniais, nos séculos XVI e XVII. Também, o cajueiro foi levado para a África na segunda metade do século XVI, espalhando-se em pouco tempo nas costas leste e oeste desse Continente. Depois, o cajueiro atingiu o norte da Austrália, ilhas Fiji, Havaí e sul da Flórida. De maneira geral, a ocorrência dessa planta está compreendida entre as latitudes de 30º norte e 30º sul, vegetando em estado natural ou sob cultivo em grande número de países, em muitos dos quais com perfeita adaptação. Um dos mais espetaculares exemplos de adaptação de uma planta ao meio ambiente é proporcionado pelo cajueiro do Pirangi do Norte, no estado do Rio Grande do Norte, cuja árvore ocupa uma superfície de 9.000 m², conforme levantamento efetuado pelo autor deste texto (in loco) em outubro de 2016! Características fitotécnicas: Das 22 espécies do gênero Anacardium apenas quatro não ocorrem naturalmente no Brasil. Para o caso da A. occidentale (cajueiro), a descrição sucinta encontra-se a seguir. É planta nativa dos campos e dunas da costa norte do Brasil, atingindo 20 metros de altura, sendo proporcional o diâmetro da copa. Nas terras secas e arenosas do sertão a árvore é baixa, tronco tortuoso e copa irregular, chegando mesmo a rastejar, conforme o fenótipo da planta do Pirangi acima citada. As folhas são alternas, pecioladas, simples, ovaladas e verdeamareladas e roxo-avermelhadas quando novas. Flores pequenas, curto-pediceladas, pálidas, avermelhadas ou purpurinas, dispostas em amplas panículas terminais, pedunculadas, ramificadas, bracteadas na parte inferior. O fruto, a castanha, é um aquênio reniforme cujo peso pode variar de 3 a 32 gramas, o que permite a seguinte classificação: castanha miúda (até 4g.), castanha pequena (até 8g), castanha média (até 12g), castanha grande (até 16g) e castanha gigante (peso superior a 17g). O tegumento da castanha é liso, coriáceo, cinzento ou verdeacinzentado; o mesocarpo é espesso, alveolado, cheio de um líquido viscoso, vermelho, acre, cáustico e inflamável, comumente chamado de LCC (líquido da casca da castanha), de grande valor comercial. A parte comestível da castanha tem formato rinóide, composta por dois cotilédones brancos, carnosos, oleosos, revestidos por uma película pergaminácea. A castanha prende-se a um pedúnculo hipertrofiado, carnoso, suculento, o caju propriamente dito, muito embora o conjunto hipocarpo-castanho também seja chamado de caju. O pedúnculo hipertrofiado (hipocarpo, pseudofruto) apresenta a seguinte variação: tamanho (3 a 20cm de comprimento por 3 a 12cm de largura); peso (média de 15 a 200g, podendo chegar a 650g); formato (conformações piriforme, cilíndrica, musóide, pomóide, cardióide, tronco-cônico, fusiforme, alongado e ficóide são as mais comuns, todas com tipos pequenos, médios e grandes); cor (varia de amarelo-canário, laranja até vermelho vinho, com rajas de outras cores, principalmente esverdeada.). Geralmente a floração em zonas do Maranhão pode ocorrer no período de julho a dezembro e a frutificação de setembro a janeiro. Os cajueiros do tipo “anão precoce” florescem e frutificam um mês antes do “comum”, mas com duração superior, podendo ser encontrados frutos no mês de fevereiro. No referente à ocorrência de chuvas, a faixa de 800 a 1.500mm anuais, distribuídos no período de 5 a 7 meses, tem sido vista como a mais adequada nos países produtores. Em regiões muito úmidas a doença fúngica denominada antracnose pode ser um fator limitante do cultivo racional! A temperatura média do ar ideal é de 27ºC para permitir o normal desenvolvimento, floração e frutificação, suportando temperaturas em torno de 35ºC, sendo a planta sensível a temperaturas inferiores a 22ºC. 57


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Quanto à exigência de solos tem sido visto o cajueiro vegetando muito bem em solos das classes Podzólico, Latossolo, Regossolo e Areia Quartzosa, tanto distróficos como eutróficos. Oportunidades de comercialização: A exploração nativa e de cultivo racional do cajueiro encontram no mercado nacional e internacional uma ampla e rendosa oportunidade de comercialização dos produtos obtidos. De maneira geral, esses produtos são em forma de LCC, ACC (amêndoa da castanha do caju), como o próprio suco industrializado, rico em vitamina C. Além disso, do pedúnculo são obtidos deliciosos doces caseiros, licores, suco de caju com polpa em suspensão, cajuína (suco límpido de caju), néctar, caju em calda, caju ameixa, doce em massa, geleia, caju cristalizado, farinha, vinho, vinagre, aguardente, xarope e outros variados produtos de larga aceitação para consumo e comercialização, sendo ainda utilizado na alimentação animal. Da castanha podem ainda ser obtidos: creme de amêndoa para alimentação humana, similar à pasta de amendoim; cascas para uso como combustível de caldeiras e película (testa) das amêndoas para a composição de rações para animais ou mesmo como fonte de tanino para utilização em curtumes. Em face da larga distribuição do cajueiro pelo mundo afora, é grande a competição internacional, o que requer os requintes na aplicação das boas práticas agrícolas (BPA) incluindo os sete princípios do Sistema APPCC (análise de perigos e pontos críticos de controle), boas práticas de fabricação (BPF), procedimento padrão de higiene operacional (PPHO) e produção integrada de frutas (PIF) para a obtenção de produtos em quantidade e qualidade, livres de perigos físicos, químicos e biológicos, do campo à mesa! No Maranhão, na região do município de Barreirinhas anualmente são obtidas enormes produções de castanha de exuberantes cajueiros nativos, mas que infelizmente são exportados para outros estados na condição de produto bruto, desprezando totalmente o pseudofruto, perdendo uma excelente oportunidade de agregar valores para as comunidades locais pela geração de renda, trabalho, emprego, serviços e outras oportunidades, pela inexistência de agroindústrias, certificadoras e outros meios de valorização da importante produção autóctone. Composição química e valor nutritivo do suco de caju: sólidos solúveis 10,5%; açúcares em glicose (g/100g) 9,1; prótides Nx6,25 (g/100g) 0,383; acidez em ácido málico (g/100g) 0,327; tanino (g/100g) 0,404; cálcio (mg/100g) 2,5; ferro (mg/100g) 3,4; fósforo (mg/100g) 2,2; vitamina C (mg/100g) 181,9 podendo chegar a 229; valor nutritivo (kcal) 34,3; pH 3,6. 15. Camu-camu Descrição: Família: Mirtaceae; Nome científico: Myrciaria dubia (HBK) McVaugh; Nomes comuns: Camu-camu, Caçari, Araçá d’Água (Brasil), Guayabo (Colômbia), Guayabato (Venezuela); Centros de origem: A origem mais provável é a Amazônia Ocidental. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Encontra-se amplamente distribuída na Bacia Amazônica, principalmente nas margens dos rios e lagos (várzea e igapó), no Peru, Colômbia, Brasil e Venezuela. Características fitotécnicas: Árvore de 8 a 10m de altura. Em seu habitat natural pode permanecer com o tronco submerso por 4 a 5 meses. O fruto é uma baga globosa, com 10 a 32mm de diâmetro, casca fina, brilhosa, de coloração vermelha ou rósea e, roxo escuro, no estádio final de maturação. A polpa é ácida, sucosa, levemente rósea. O número de sementes por fruto varia de 1 a 4, com média de três. A propagação normalmente é por sementes, que são recalcitrantes. A germinação ocorre entre 14 e 21 dias. As enxertias tipo garfagem com fenda lateral e garfagem lateral simples, possibilitam bons índices de pegamento. Para plantio no 58


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campo pode ser utilizado o espaçamento de 4m x 4m, o crescimento inicial é lento. A planta inicia sua produção após três anos de seu estabelecimento no campo. A frutificação ocorre entre novembro e fevereiro. Em plantios bem estabelecidos, com espaçamento de 4m x 4m, pode-se esperar uma produção de 10 toneladas de frutos por hectare/ano. A colheita é feita manualmente, 2 a 3 vezes por semana. A polpa é apreciada na forma de suco, refresco, sorvete, picolé, geleia, doce, licor, ou para conferir sabor, a tortas e sobremesas. Os frutos são populares em Iquitos (Peru) e Tefé (estado do Amazonas). Oportunidades de comercialização: A grande importância do camu-camu como alimento devese ao seu elevado teor de vitamina C (ácido ascórbico- 2.880 mg/100 gramas de polpa), bastante superior à maioria das plantas cultivadas: a quantidade de ácido ascórbico do camu-camu é 1,5 vez maior que a da acerola (1.790 mg/100 g); 13 vezes maior que a do caju (219,7 mg/100 g) e 65 vezes maior que a do limão (44,2 mg/100 g). No Peru, o processo de transformação da produção de camu-camu já atingiu um bom nível de comercialização, sendo os frutos exportados para o Japão no estado liofilizado. No Brasil, as pesquisas prosseguem quanto ao processo de domesticação da planta, seleção de genótipos para o incremento do teor de vitamina C já com resultados animadores, emprego da biologia molecular para o melhor uso desse alimento funcional pela sociedade, bem como em bares, lanchonetes e mercados da Amazônia já podem ser encontrados sucos, sorvetes e picolés produzidos com a utilização da polpa dos frutos. 16. Cubiu Descrição: Família: Solanaceae; Nome científico: Solanum topiro Humb. & Bonpl.; Nomes comuns: Cocona (países andinos), Maná; Centros de origem: Espécie com origem no Alto Orinoco, domesticada pelos Ameríndios e está distribuída por toda a Amazônia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Arbusto, a planta é comum nas condições de várzea alta do estado do Amazonas, como também ocorre em outros países amazônicos. Características fitotécnicas: Fruteira arbustiva, ereta, ramificada, com 1 a 2m de altura, semiperene, ciclo de um a três anos, possui toda parte aérea coberta por uma pilosidade densa. O fruto é uma drupa que varia em formato, cor e tamanho. Pode ser redondo, achatado, quinado ou alongado, ter cor amarelo ou marrom-avermelhado, quando maduro. Polpa amarela de 1 a 3mm de espessura, contém de 500 a 2.000 sementes glabras, ovaladas e achatadas. O peso do fruto fica em torno de 30 a 400g, enquanto que 1.000 sementes pesam em torno de 1,2g. A propagação é feita por sementes em canteiros e o plantio, no espaçamento de 1,0 x 1,0m ou 1,30 x 1,30m. A produção varia de 20 a 140 frutos/planta. É rico em ferro e vitamina B 5. Devido apresentar uma condição especial de ser resistente à murcha bacteriana das solanáceas, o cubiu tem sido estudado em trabalhos de seleção de porta-enxertos do tomateiro ou mesmo em pesquisas de fusão de protoplastos para a obtenção de cíbridos (produto do cruzamento, no nível citoplasmático, de dois genitores geneticamente distintos) resistentes à referida bactéria patogênica (VALOIS, 2016). Oportunidades de comercialização: Na medicina popular é usado para reduzir os níveis elevados de colesterol, ácido úrico e glicose no sangue. Pode ser consumido in natura ou como suco, doce, geleia, salada, compota, batida e em cozidos de peixe e frango.

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17. Cupuaçu Descrição: Família: Sterculiaceae; Nome científico: Theobroma grandiflorum (Willd. Ex Sprend.) Schum.; Nomes comuns: Cupuaçu, Cupu (Maranhão), Copoazú (Países Andinos); Centro de origem: A espécie T. grandiflorum ocorre espontaneamente nas matas de terra firme e várzea alta, na parte sul e leste do Pará, abrangendo o nordeste do Maranhão. Está distribuída por toda a Bacia Amazônica. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Planta tipicamente da região neotropical, distribuída em floresta tropical úmida, no hemisfério ocidental, entre as latitudes 18º norte e 15º sul. O cupuaçuzeiro se desenvolve em temperaturas relativamente elevadas, com média anual de 21,6 a 27,5ºC, umidade relativa média anual de 77 a 88% e quantidade de chuva média anual na faixa de 1900 a 3100mm. Possui uma excelente adaptação no município de Anajatuba, na baixada maranhense, como também o seu cultivo possui ampla possibilidade de êxito na região da Pré-Amazônia do Maranhão. Características fitotécnicas: O cupuaçuzeiro é uma árvore que atinge 7m de diâmetro da copa, 4 a 10m de altura principalmente nos indivíduos silvestres na mata alta. A raiz é pivotante e nos primeiros 30cm de profundidade no solo concentra grande quantidade de raízes laterais ou secundárias. Os ramos ortotrópicos crescem verticalmente, enquanto que os ramos plagiotrópicos se desenvolvem lateralmente. O crescimento em altura do tronco não é contínuo. A muda cresce verticalmente de 60cm a 1,0m, quando o crescimento é interrompido, surgindo três ramos plagiotrópicos, dando origem ao conjunto denominado tricotomia. Então, o ramo ortotrópico volta a crescer e novas tricotomias são formadas, originando o crescimento da planta em altura. As folhas são inteiras, de coloração rósea e coberta de pelos quando jovens e verde quando maduras. As flores, de coloração branca ou vermelha com tonalidade clara a escura, são as maiores do gênero Theobroma e crescem normalmente nos ramos. O fruto é uma baga, com formatos variáveis, extremidades obtusas ou arredondadas, diâmetro de 9 a 15cm, comprimento de 10 a 14cm, peso variando de 0,3 a 4,0kg, com média de 1,5kg. O percentual do peso do fruto contém de 24 a 50% de polpa, 10 a 29% de sementes, 39 a 50% de casca e 2 a 4% de placenta. A casca é rígida, coloração castanho-escura, espessura variando de 0,6 a 1,0cm, recoberta de pelos que se soltam facilmente com o manuseio. A polpa mucilaginosa é abundante, ácida, coloração amarela, creme ou branca, odor ativo e sabor bastante agradável. As sementes, envoltas pela polpa, dispostas em cinco fileiras, apresentam formatos ovoides ou ovoide-elipsoides, com 2 a 3 cm de comprimento, de 4-7g. O número de sementes por fruto normalmente varia de 15 a 50. Vale destacar que ocorrem naturalmente cupuaçuzeiros que produzem frutos sem caroço (semente), já tendo sido constado pelo autor deste texto um desses frutos com a quantidade de 4,1kg de polpa. Oportunidades de comercialização: A comercialização dos frutos in natura é feita diretamente do produtor para o consumidor, intermediários e feirantes. A comercialização da polpa ocorre diretamente com a agroindústria ou com o consumidor. Com a polpa preparam-se sorvetes, vinhos, licores, compotas, iogurte, geleia, sucos, balas, tortas, biscoitos, doces em pasta, pudim, salame e outros. A composição em calorias, nutrientes e minerais por 100 gramas de polpa é a seguinte: calorias 72g; umidade 81,3g; proteínas 1,7g; lipídios 1,6g; glicídios 14,7g; fibras 0,5g; cinzas 0,7g; cálcio 23mg; fósforo 26mg e ferro 2,6mg. As sementes possuem cafeína e teobromina que é um alcaloide com propriedades estimulantes, além de ser utilizada para a produção de cupulate, manteiga, cosméticos, fármacos, mudas para plantio e outros fins. Enquanto isso, a casca pode ser utilizada para a produção de adubo orgânico e artesanato. No mercado externo a distribuição ainda é restrita, estando os produtos sendo testados pelos 60


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consumidores. A capacidade de inserção dos produtos de cupuaçu em outros mercados depende da aceitação pelos consumidores finais, segurança do alimento, livre dos perigos físicos, químicos e biológicos, divulgação, distribuição bem acondicionada e preços praticados em relação aos produtos similares. Para isso é recomendável a consistente adoção de boas práticas agrícolas (BPA) incluindo os sete princípios do Sistema APPCC (análise de perigos e pontos críticos de controle), boas práticas de fabricação (BPF), procedimento padrão de higiene operacional (PPHO) e produção integrada de frutas (PIF), para a segurança da qualidade dos alimentos do campo à mesa. O fruto quando maduro desprende-se da árvore, deixando o seu pedúnculo, podendo durar em condições de aproveitamento no prazo ao redor de 10 dias. A época de frutificação é no primeiro semestre do ano, sendo o clímax da safra entre fevereiro e abril. Em janeiro de 2006 o Convênio da Embrapa com o Governo do estado do Maranhão e outras instituições, coordenado pelo autor deste texto, introduziu em diversos nichos do Estado quatro clones de cupuaçu (Belém, Manacapurú, Codajás e Coari) resistentes à doença vassourade-bruxa, causada pelo fungo Crinipellis perniciosa (Stahel), cujos genótipos foram selecionados pela Embrapa Amazônia Oriental. 18. Durian Descrição: Família: Bombacaceae; Nome científico: Durio zibethinus Murray; Nomes Comuns: Durião, Durian; Centro de Origem: Malásia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: É uma planta de clima tropical úmido, com temperatura mínima acima de 16º C. Precipitação pluviométrica bem distribuída, solos profundos, férteis e bem drenados. Características fitotécnicas: Planta com altura até 30m e diâmetro de copa superior a 10m. Folhas simples, elípticas e oblongas, com 12 cm de comprimento e 4cm de largura, verde na parte superior e avermelhada inferior. As flores surgem em racemos ramificados nos ramos maduros. Possui alto grau de incompatibilidade, uma vez que as anteras se abrem durante a noite, quando os estigmas não estão receptivos. A polinização feita por morcegos. O fruto pesa de 2 a 5kg, é ovoide, amarelo quando maduro, coberto por espinhos duros e piramidais e desprende-se da árvore quando maduro. A polpa amarela, de forte aroma, normalmente é consumida in natura, na forma de sorvete e geleia. Produz de 10 a 15 sementes. A semente é rica em óleo e carboidratos sendo consumida tostada. A propagação é por sementes ou por enxertia. A produção inicia aos sete anos, quando pé franco e aos quatro anos quando enxertados, podendo chegar a 200 a 500 kg/planta. As principais cultivares utilizadas na Tailândia são: Mon Thong, Chanee, Kaan-Yaw e Kradum. Oportunidades de comercialização: É cultivado na Tailândia e Malásia. Seus frutos são exportados para o Japão e outros países asiáticos e também para o Canadá. No Brasil, as sementes originadas da Malásia foram introduzidas no Sul da Bahia, onde estão em início de cultivo. No ano 2001 o durianzeiro foi introduzido no Amazonas. 19. Fruta-pão Descrição: Família: Moraceae; Nome científico: Artocarpus altilis (Park.) Fosberg; Nomes comuns: Fruta de Pan (Espanhol), Breadfruit (sem sementes), Breadnut (com sementes) (Inglês); Centro de origem: Originária das ilhas de Java e Sumatra, é cultivada em todas as ilhas do

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arquipélago asiático e regiões tropicais do Planeta. Entrou no Brasil no começo do século 19 pelo estado do Pará, através de Caiena, sendo em seguida introduzido no Maranhão. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Desenvolve bem em clima quente e úmido, com temperatura entre 20º C e 32º C, precipitação média anual acima de 1500mm, bem distribuída. Solos profundos e férteis. Características fitotécnicas: Tem crescimento relativamente rápido, atingido a altura de 25-30 metros, copa mais ou menos frondosa, com uma folhagem verde-escura, contendo um leite branco, viscoso, em todas as suas partes. O fruto, bem vistoso, é um sincarpo globoso, submuricado, de 12-15cm de diâmetro, pesando até 4kg, podendo conter ou não sementes, daí a existência de duas variedades: apyrena (sem sementes), vulgarmente conhecida pelo nome de “fruta-pão-de-massa”; seminífera (com caroços), denominada de “fruta-pão-de-caroço”. Os frutos sem sementes são consumidos assados, cozidos, fritos ou torrados. Nos frutos com sementes, estas são consumidas após fervidas ou torradas. Geralmente a árvore inicia a floração em junho, tendo um período de frutificação bastante longo. Oportunidades de comercialização: Importante para agricultura familiar, pois tem sabor e a consistência do pão fresco de trigo, sendo bastante apreciados por ocasião do café da manhã. 20. Graviola Descrição: Família: Anonaceae; Nome científico: Annona muricata L.; Nomes comuns: Jacama (Maranhão), Guanábana, Zapote de Viejas (Espanhol), Zuurzak (Suriname), Soursop (Inglês); Centro de origem: América Central, Antilhas. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Desenvolve bem em clima tropical e subtropical, precipitação acima de 1.200mm, bem distribuída e altitudes inferiores a 1.200m. Solos profundos e bem drenados. Características fitotécnicas: A árvore possui porte que varia de pequeno a mediano (4-8 m de altura). O fruto é um sincarpo ovoide, com casca de cor verde escuro quando verde e verde claro quando maduro. Polpa branca, sucosa, agridoce, de cheiro e sabor muito agradáveis; sementes numerosas, cerca de 1,7 cm de comprimento, de cor castanho. O peso de um fruto varia de entre 750- 5.000 g. A graviola é bastante apreciada em forma de sorvete, creme, doce e suco. A propagação é por semente e por enxertia. A germinação ocorre 25 a 35 dias após o semeio. Inicia a produção de 24 a 28 meses após o plantio, e pode atingir de 10 a 18t/ha aos seis anos de idade. Existem seleções como Morada, Blanca, FAO I, FAOII, B e Lisa. Oportunidades de comercialização: Fruta muito procurada para agroindústria, com oferta praticamente durante todo o ano. A seleção Morada é a mais plantada por ter maior produção e frutos grandes. 21. Guaraná Descrição: Família: Sapindaceae; Nome científico: Paullinia cupana var. sorbilis Duke; Nome comum: Guaraná; Centro de origem: a planta é encontrada em estado nativo na região 62


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compreendida entre os rios Amazonas, Maués, Paraná dos Ramos e no rio Negro, no estado do Amazonas e na bacia superior do rio Orenoco, na Venezuela. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: O guaranazeiro vem sendo cultivado em áreas de clima quente e úmido, com abundância de chuvas, com a menor intensidade coincidindo com a época da floração e frutificação (julho-outubro). A temperatura média anual gira em torno de 22 a 29ºC, sendo a mínima tolerável de 12ºC. Total de chuvas igual ou superior a 1400mm anuais e umidade relativa do ar em torno de 80%. Os solos devem ser de boa textura, profundos, bem drenados, com propriedades físicas e químicas recomendáveis. A planta tem encontrado boas condições de cultivo racional em nichos apropriados dos estados amazônicos e sul da Bahia, com destaque para o município amazonense de Maués, de onde, provavelmente, originou-se todo o material plantado no Brasil. A espécie Paullinia cupana tem duas variedades: a P. cupana - assim denominada na Venezuela e Colômbia, encontrada em quantidade muito reduzida nas bacias fluviais do Alto Orenoco e Alto Rio Negro, com o cultivo restrito ao seu habitat natural; e a P. sorbilis- também conhecida como guaraná, guaraná de Maués ou do Baixo Amazonas- cultivada em larga escala na região de Maués, seu uso foi largamente difundido em outras regiões de clima e solo favoráveis do Pará, Acre, Mato Grosso, Bahia e outros estados. Teve domesticação indígena pelas tribos Maués e Andirás, no Baixo Amazonas (Paullinia cupana var. sorbilis), e pelos Barés, no Alto Rio Negro (Paullinia cupana var. cupana). Características fitotécnicas: O guaraná Paullinia cupana var. sorbilis Ducke é um arbusto subereto, escandente ou cipó lenhoso. Em cultura racional forma moitas que podem ser apoiadas em suporte (tutor) ou pode crescer sem esse arrimo até 2-3m de altura. Possui ramos sulcados longitudinalmente devido ao crescimento atípico do lenho, tendo regular quantidade de látex branco. Gavinhas formadas na axila das folhas, geralmente bifurcadas do meio para a extremidade. Folhas compostas, pinadas, com o âmbito variando de 25-50cm; folíolos em número de cinco, coriáceos, largo-elípticos, levemente assimétricos exceto o terminal, os dois inferiores ovalados. Inflorescência axilar ou no lugar de um dos ramos da gavinha ou, ainda, entre os dois ramos, tipo cacho com 6-15cm de comprimento, sendo composta de flores masculinas e femininas (pseudo-hermafroditas). O fruto é uma cápsula septicida, estipitada, cerca de 2-2,5cm de diâmetro, de cor vermelho-alaranjado quando maduro, ocasião em que se abre parcialmente, deixando aparecer a semente (uma ou duas, raro três), negro-brilhosa ou levemente esverdeada, com a metade inferior recoberta por um espesso arilo branco, tendo muita semelhança com um olho humano. Um cacho de frutos chega a 25cm de comprimento e pode conter 50 frutos. A floração do guaranazeiro tem início no segundo semestre do ano, geralmente em julho, prolongando-se até outubro ou novembro, e os frutos maduros aparecem até janeiro ou fevereiro. Deste modo é comum encontrar-se plantas com flores e frutos maduros (bom exemplo do fenômeno do hidroperiodismo). Quando reproduzido por semente (sexuada), o guaranazeiro começa a produzir frutos após o terceiro ano do plantio, embora esse período possa ser reduzido para cerca de 14 meses quando a reprodução for vegetativa (assexuada), favorecendo assim a clonagem de bons genótipos. Oportunidades de comercialização: O produto apresenta grande potencial para os mercados interno e externo e vem sendo comercializado sob as formas de refrigerantes, bastão, pó e xarope. Estudos mostram que vem sendo crescente a participação relativa do produto, no mercado, nas formas de refrigerante e guaraná em pó, enquanto tem decrescido sensivelmente o consumo de bastão. A diversificação dos subprodutos do guaraná tem refletido na expansão da demanda por pó e extrato líquido. Isso se deve ao crescente interesse por parte de laboratórios, 63


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farmácias e lojas de produtos naturais na utilização de bases púricas (cafeína, teobromina e teofilina) do guaraná para a fabricação de produtos energizantes. O guaranazeiro na sua condição de uma “planta incontestavelmente miraculosa” tem excelentes propriedades testadas cientificamente de ser diurético, antitérmico, analgésico, antigripal e afrodisíaco. A quantidade de cafeína contida no fruto do guaraná é cerca de três vezes superior à existente na semente do café. Conclusões Nesta continuidade de nosso trabalho finalizamos as frutíferas selecionadas por mim, de C a G, prosseguindo no próximo volume da revista RG News com mais frutíferas tropicais para o conhecimento dos nobres leitores, e para concluir o número total de 40 frutíferas tropicais, planejado por mim para quatro artigos no total.

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9. A Sexta e a Sétima Ondas do Desenvolvimento Humano Afonso Celso Candeira Valois Eng. Agr., Me., Dr., e Pós-Doc em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Contextualização Tenho escrito em alguns dos meus artigos que o universo é conduzido e transformado por "ondas de desenvolvimento", me reportando a cinco tipos de ondas bem caracterizadas no mundo contemporâneo, hoje amplio esta visão. A noção de desenvolvimento está atrelada a um contínuo de evolução, em que nós caminharíamos ao longo de todo o ciclo vital. Essa evolução, nem sempre linear, se dá em diversos campos da existência, tais como afetivo, cognitivo, social e motor (RABELLO & PASSOS, 2016). Logicamente que cada autor considera o desenvolvimento segundo a sua própria visão da evolução da humanidade, onde no presente caso chamamos de onda os acontecimentos marcantes, sem datas marcadas de início e fim, que se remontam, mas que podem ser facilmente detectados na história contemporânea. A primeira onda marcante foi nitidamente a agricultura, estimada com cerca de 11 mil anos de existência, ultrapassando a fase nômade onde uma pessoa caçava e buscava os seus alimentos em cerca de 2.500 hectares, alimentando-se do extrativismo. Mesmo a agricultura prosseguiu com suas próprias fases, como a da agricultura tradicional ou original caracterizada pelo cultivo “no toco”, quando o ser humano praticamente iniciou a sua longa caminhada no esplêndido processo de domesticação das plantas para utilização racional. Seguiu com a agricultura convencional com a aplicação de neo tecnologia apropriada, com mecanização, inclusão de fertilização e defensivos agrícolas, agricultura de precisão, revolução verde, integração lavoura-pecuária-floresta, sistema ABC, sistemas agroflorestais, etc.. Hoje se considera a da agricultura não convencional atualmente em franca expansão, inclusive se apoiando no fenomenal uso da biotecnologia, culminando com a criação e utilização de plantas geneticamente modificadas, além de ações de controle biológico de pragas da agricultura, dentre outras. Daqui em diante as ondas meio que se mesclam no tempo, se considerando a segunda onda, a da revolução industrial, onde a máquina assume um papel muito relevante na substituição e complementação da mão de obra e na produção em massa. A terceira onda pode ser considerada a da informação e do conhecimento, onde a mesma passa a ter grande relevância na produção de riquezas, com a fase da matemática e da física, quase conjuntamente com a fase da química, proporcionando talvez o maior “breakthrough” da ciência até então, que foi a decifração das duas fitas semi conservativas do DNA, em 1953.

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Não demorou muito para que o mundo conhecesse a quarta onda com a fase da informática, cada vez mais surpreendente. Aí surgiu a quinta onda, a da biotecnologia, sabidamente de extrema relevância técnica, científica e inovação, onde o ser humano teve a inteligência necessária para juntar esta onda com a informática, moldando assim a bioinformática, capaz de determinar o tri dimensionamento de uma proteína, além de inúmeras outras aplicações de sublime valor funcional para a humanidade. Diante de todas essas maravilhas capazes de sustentar a existência humana em grau progressivo e exponencial, faltava outro acontecimento de realce capaz de se transformar na mais moderna e bela onda do desenvolvimento humano. Em vista dessa lacuna tive a oportunidade de escrever em alguns artigos, aplicáveis exemplos de “convergências” de esforços e ações de conhecimento, técnica, tecnologia apropriada e know how, como a própria biologia da conservação de recursos genéticos (VALOIS et al., 2010; VALOIS, 2016a). Por isso e outros avanços essenciais à humanidade é que o Brasil não pode prescindir das tecnologias mais avançadas em todos os ramos de aplicação, visto que elas são as ferramentas mais eficientes e eficazes no jogo das forças globalizadas, como sinais vitais de soberania, independência e integridade nacional com dignidade, lealdade, ética, lisura e esperança. Isso tem a ver com a soberania do território brasileiro, com a soberania alimentar (conhecida também como "segurança alimentar e segurança dos alimentos"), com segurança biológica, biossegurança e biossoberania, com precaução para promoção do desenvolvimento sustentável voltado para o crescimento da autonomia da nação (VALOIS, 2016 b). Recentemente teve-se conhecimento de um artigo muito bem delineado sobre a “conectividade geográfica” que pode se transformar na tão esperada “sexta onda” do desenvolvimento humano, a qual será capaz de redesenhar a geografia global, o novo e verdadeiro destino cintilante da humanidade! Esta ideia chegou a mim durante o preparo de meu artigo publicado em 2016, no Procitropicos (www.procitropicos.org.br), através de um texto de autoria do Dr. Maurício Antônio Lopes, atual Presidente da Embrapa, que circulou no Jornal “Correio Braziliense”, em 13/11/2016, e na própria página do Procitropicos em 14/11/2016, sendo que logo pressenti que estava diante da “sexta onda” que tanto procurava, daí a minha proposição neste singelo artigo na Revista RG News. No artigo citado do Dr. Maurício (foto), o autor fez referência ao fulcro dessa auspiciosa informação, pois tal tese foi primeiramente defendida pelo jovem e celebrado estrategista Khanna, do Centro de Globalização da Universidade Nacional de Cingapura, em seu livro “Conectografia: mapeando o futuro da civilização global”, em 2016. De acordo com o memorável artigo, a lógica de que muitas nações são prisioneiras de sua posição geográfica e assim nunca terão acesso aos mercados e às novas 66


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tecnologias de que precisam para florescer na economia global, agora é substituída pela ideia de que “a conectividade – e não a geografia – é o destino das nações”. A obra de Khanna (foto) apresenta a conectividade como a grande força revolucionária do século 21 e como a melhor maneira de aproveitar ao máximo qualquer geografia, promovendo ligações e sinergias, como fazem, por exemplo, Cingapura e Dubai. De acordo com Khanna, a conectividade, viabilizada por tecnologias e infraestrutura de transporte e comunicações e por relações de comércio, é agora parte determinante da amarração global com a geografia. Para unir cada vez mais seus povos, culturas e mercados, países e empresas investem somas astronômicas interligando as maiores cidades globais umas às outras. “Isso gera consequências profundas para a geopolítica, a economia, a demografia, o meio ambiente e a identidade social”, diz o autor, corroborado pelo Dr. Maurício Lopes. O autor do artigo enfatiza ainda que os números que sustentam a tese de Khanna são sólidos. Segundo ele, a rede de infraestrutura que interliga o mundo está em grande expansão e já conta com 64 milhões de quilômetros de rodovias, quatro milhões de quilômetros de vias férreas, dois milhões de quilômetros de grandes dutos, além de um milhão de quilômetros de cabos de internet, sem falar na intrincada rede de vias aéreas, marítimas e fluviais que cortam o mundo em todas as direções. As fronteiras internacionais, definidoras da geografia convencional, somam menos de 500 mil quilômetros. Para o Dr. Maurício Lopes, esses números indicam que a conectividade é, cada vez mais, uma parte determinante da ligação das pessoas com a geografia e isso terá grande impacto no futuro da humanidade. A civilização de redes globais que está emergindo promete dinamizar as cadeias de fornecimento, reduzir a desigualdade, e até mesmo superar rivalidades geográficas, incluindo desestímulos a guerras e conflitos, que quase sempre destroem a infraestrutura, o que é péssimo negócio para todos. Outra dimensão importante da conectografia é o emergente padrão de poder global, impactado por uma nova ordem de empreendedorismo e negócios. Empresas jovens como Apple, Amazon, Alphabet, Uber, Airbnb e Facebook se beneficiam da infraestrutura globalizada para prover serviços inovadores, respondendo com grande eficiência às necessidades de uma população cada vez mais urbanizada, dependente de tecnologia e influenciada pelo dinamismo que a conectividade global cria. Atualmente existem menos pessoas no campo para alimentar cada vez mais pessoas vivendo nas grandes cidades (VALOIS, 2016 b). A rápida emergência dessas empresas indica claramente que a capacidade de integrar mercados, se aliar aos melhores parceiros e unir pessoas é que irá moldar a força econômica no futuro. Por mais que essas ideias possam ser contestadas, diante de conflitos de domínio territorial e de migrações ora presentes, é importante que tal visão seja analisada na perspectiva da trajetória que a humanidade deverá trilhar em prazos mais longos. Liderar com conectividade poderá distinguir países, organizações e negócios, tendo em vista os benefícios óbvios da criação 67


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de ambientes de troca de informações e de criação conjunta na era da informação e do conhecimento em que o ser humano vive, complementa o Dr. Maurício. Que inspiração a conectografia poderá oferecer ao Brasil, gigante na geografia e na economia, pergunta o autor? Além da diversidade étnica de mais de 206 milhões de habitantes, o Brasil é feito de múltiplos recortes: quinto país mais extenso do planeta, possui um terço das florestas tropicais nativas contínuas do mundo, 20% das águas doces líquidas de rios do hemisfério, 19% dos solos agricultáveis disponíveis na terra, sete biomas principais, algo em torno de 20% da biodiversidade de plantas, animais e microrganismos existentes no globo terrestre, cinco regiões, 26 estados, um distrito federal, dezenas de metrópoles e 5.570 municípios que se espalham pela imensidão de 8.514.876 km2, ainda considerando cerca de 18 mil quilômetros de fronteiras com outros países, sendo 11,3 mil km só na Amazônia, conforme tenho enfatizado em alguns dos meus artigos. O poder de uma conectividade aprimorada no Brasil irá favorecer, inclusive, a proteção das cabeceiras dos rios que não nascem no país e dos autóctones, além dos cuidados especiais com a diversidade biológica transfronteiriça e adequação da vigilância na fronteira por mitigar ou mesmo evitar (o desejado) a entrada de condicionantes biológicos na agricultura brasileira e na saúde humana, tráfico de entorpecentes e das perigosas armas bélicas, cujos esforços e ações atualmente estão bastante enfraquecidos. No Brasil, a primazia da “conectividade geográfica” em elevada dimensão, com pontos focais bem aparelhados, é uma bela estratégia e gestão tática e operacional de segurança nacional (VALOIS, 2016 c). Para o Dr. Maurício, a conectografia é um conceito que poderá marcar o futuro de países grandes, complexos e plurais como o Brasil, utilizando o conceito de Inteligência Territorial Estratégica para organizar e interpretar as abundantes informações sobre os quadros natural, agrário, agrícola, socioeconômico e de infraestrutura do país, e alimentar o planejamento integrado e a conectividade para melhor aproveitamento das funcionalidades da privilegiada geografia brasileira. Se bem aplicado, o conceito de Inteligência Territorial Estratégica tem o potencial de ajudar o Brasil a criar boas práticas para crescer mais ordenado e harmônico e se inserir, de forma mais competitiva, nas grandes redes de interação, comércio e cooperação que o futuro da “conectografia” promete.

Conclusões Diante dessa brilhante iniciativa do Dr. Maurício Lopes de oferecer o citado artigo, com os singelos adendos deste autor foi vislumbrante para eu finalmente encontrar de forma graciosa, batizar e propor à sociedade, a “sexta onda do desenvolvimento humano” representada pela “conectividade geográfica”, com a sua pragmática articulação transfronteiriça, considerando ainda que enquanto mais um breakthrough não aparece, a “convergência de tecnologias apropriadas” continua representando desta vez, provavelmente, a “sétima onda do desenvolvimento da humanidade”

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10. Biotechnological interventions in preserving environment through bioremediation Marines Marli Gniech Karasawa PhD Genetics and Plant Breeding (USP)/Post doc Haploid Technology – Gametic embryogenesis at Palermo University (UNIPA-IT). Previous: Federal University of Alfenas (UNIFAL-MG), State University of São Paulo (USP/ESALQ-SP), Federal University of Lavras (UFLA-MG). Academic Degree: Federal University of Pelotas(UFPEL-RS).

Mohan Chakravarthi Postdoctoral Fellow, Dept. of Genetics and Evolution, Federal University of São Carlos, São Paulo. Previous: PhD Biotechnology (Bharathiar University, India).

Introduction Environment is an essential component for survival of life. Preserving the environment is imperative to ensure the survival of future generations. However, the list of chemical pollutants released into the environment by human activities is rapidly increasing. The pollutants include petroleum hydrocarbons, polycyclic aromatic hydrocarbons, polychlorinated biphenyls, phthalate esters, nitroaromatic compounds, dyes, radionuclides, industrial solvents, pesticides and metals. Biotechnology harnesses cellular and biomolecular processes to develop technologies and products that help improve our lives and the health of our planet. With the advent of biotechnology coupled with the use of plants and microorganisms, the concentration of toxicity in the air, water and environment can be reduced to a greater extent and coined by the term ‘bioremediation’. Bioremediation is described as the process where plants and other organisms are used to clean the soil and the water, seeking to remove the pollutants from environment. Using biotechnology, the hazardous wastes can be degraded or removed from the environment using beneficial microbes and plants that have the ability to accumulate and or degrade such wastes. Using genetic engineering, microorganisms and plants that have the ability to degrade hazardous wastes have been employed successfully and are described in this article. The role of environmental biotechnology needs a special mention as in the recent decades it has played a significant role by integrating plants and microbes to address the issues related to environmental management and sustainable development. 70


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Common pollutants in environment Among the pollutants the major wastes arise from the agricultural and industrial applications. Agricultural wastes include agrochemical residues (thiamethoxam), animal and vegetal wastes from farms, slaughterhouses and poultry houses as well as harvest waste, fertilizer remnants and the pesticides that enter into soil, water and air. Industrial wastes comprise the major pollutants which include metallic wastes, mineral wastes, wood wastes, paper and cardboard wastes and combustion wastes. The major biodegradable pollutants are following:Hydrocarbons are organic compounds whose structures consist of hydrogen and carbon. They are linear linked, branched or cyclic molecules and are observed as aromatic or aliphatic hydrocarbons. The first one has benzene (C6H6) in its structure, while the aliphatic one is seen in three forms: alkanes, alkenes and alkynes. Polycyclic aromatic hydrocarbons (PAHs): are important pollutants class of hydrophobic organic contaminants (HOCs) widely found in air, soil and sediments. The major source of PAH pollution is industrial production. They have been studied with increasing interest for more than twenty years because of more findings about their toxicity, environmental persistence and prevalence (OKERE & SEMPLE, 2012). PAHs can absorb to organic-rich soils and sediments, accumulate in fish and other aquatic organisms, and may be transferred to humans through seafood consumption. The biodegradation of PAHs can be considered on one hand to be part of the normal processes of the carbon cycle, and on the other as the removal of man-made pollutants from the environment. The use of microorganisms for bioremediation of PAHcontaminated environments seems to be an attractive technology for restoration of polluted sites. Polychlorinated biphenyls (PCBs) are mixtures of synthetic organic chemicals. Due to their non-flammability, chemical stability, high boiling point and electrical insulating properties, PCBs were used in hundreds of industrial and commercial applications including electrical, heat transfer, and hydraulic equipment- as plasticizers in paints, plastics, and rubber products; in pigments, dyes, carbonless copy paper and many other industrial applications. Consequently, PCBs are toxic compounds that could act as endocrine disrupters and cause cancer. Therefore, environmental pollution with PCBs is of increasing concern (SEEGER et al., 2010). Pesticides are substances intended for preventing, destroying, repelling or mitigating any pest. Those that are rapidly degraded are called nonpersistent while those which resist degradation are termed persistent. The most common type of degradation is carried out in the soil by microorganisms, especially fungi and bacteria that use pesticides as food source. Dyes are widely used in the textile, rubber product, paper, printing, color photography, pharmaceuticals, cosmetics and many other industries. Azo dyes, which are aromatic compounds with one or more (–N=N–) groups, are the most important and largest class of synthetic dyes used in commercial applications. These dyes are poorly biodegradable because of their structures and treatment of wastewater containing dyes usually involves physical and /or chemical methods such as adsorption, coagulation-flocculation, oxidation, filtration and electrochemical methods (VERMA & MADAMWAR, 2003). The success of a biological 71


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process for color removal from a given effluent depends in part on the utilization of microorganisms that effectively decolorize synthetic dyes of different chemical structures. Radionuclides are atoms with unstable nuclei, characterized by excess energy available to be imparted either to a newly created radiation particle within the nucleus or via internal conversion. During this process, the radionuclide is said to undergo radioactive decay, resulting in the emission of gamma ray(s) and/or subatomic particles such as alpha or beta particles (LLOYD & LOVLEY, 2001). Heavy metals cannot be destroyed, but must either be converted to a stable form or removed. Bioremediation of metals is achieved through biotransformation. Mechanisms by which microorganisms act on heavy metals include biosorption (metal sorption to cell surface by physicochemical mechanisms), bioleaching (heavy metal mobilization through the excretion of organic acids or methylation reactions), biomineralization (heavy metal immobilization through the formation of insoluble sulfides or polymeric complexes), intracellular accumulation, and enzyme-catalyzed transformation (redox reactions). Role of microorganisms in bioremediation Several microorganisms can be used in degrading the toxicity in the environment. Recently, Wood et al., (2016) reviewed the uses of several bacteria involved in bioremediation of toxic chemicals. Some of them include Microbacterium spp. (Nickel), Bacillus subtilis (Copper) and Pseudomonas fluorescens (Cadmium) to name a few. Bacillus, Corynebacterium, Staphylococcus, Streptococcus, Shigella, Alcaligenes, Acinetobacter, Escherichia, Klebsiella and Enterobacter, are hydrocarbon degrading bacteria. Bacterial strains that are able to degrade aromatic hydrocarbons have been isolated from soil and characterized. These are usually gram negative bacteria most of them belonging to the genus Pseudomonas. The biodegradative pathways have also been reported in bacteria from the genera Mycobacterium, Corynebacterium, Aeromonas, Rhodococcus and Bacillus (MROZIK et al., 2003). Although many bacteria can metabolize organic pollutants, a single bacterium does not possess the enzymatic capability to degrade all or even most of the organic compounds in a polluted soil. Mixed microbial communities have higher biodegradative potential since genetic information of more than one bacterium is necessary to degrade the complex mixtures of organic compounds present in contaminated sites (FRITSCHE & HOFRICHTER, 2005). Both, anaerobic and aerobic bacteria are capable of biotransforming PCBs. Higher chlorinated PCBs are subjected to reductive dehalogenation by anaerobic microorganisms. Lower chlorinated biphenyls are oxidized by aerobic bacteria (SEEGER et al., 2001). Research on aerobic bacteria isolated so far has mainly focused on gram-negative strains belonging to the genera Pseudomonas, Burkholderia, Ralstonia, Achromobacter, Sphingomonas and Comamonas. However, several reports about PCB-degrading activity and characterization of the genes that are involved in PCB degradation indicated PCB-degrading potential of some Gram-positive strains as well (genera Rhodococcus, Janibacter, Bacillus, Paenibacillus and Microbacterium) (PETRIC et al., 2007). Successful removal of pesticides by the addition of bacteria had been reported earlier for many compounds, including atrazine (STRUTHERS et al., 1998). Recent report has shown that 72


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chlorpyrifos could be degraded by Providencia stuartii isolated from agricultural soil (SUREKHA RANI et al., 2008) and isolates Bacillus, Staphylococcus and Stenotrophomonas from soil can degrade dichlorodiphenyltrichloroethane (DDT) (KANADE et al., 2012). Moreover, bacterial strains are being harnessed for degrading the oil spills (Alcanivorax borkumensis), for removing hazardous wastes from water and to degrade plastics (Ideonella sakaiensis 201-F6). Biotechnological applications using engineered bacterial strains are rapidly increasing in the recent years with several examples. Bacterial species are assisted in the process of degradation by fungi (e.g., Aspergillus sp.), protozoa, and representatives of Archaea. Recently, Perpetuo et al. (2011) reviewed in detail about the advantages of genetic engineering of bacteria for bioremediation. They also highlighted the current situation pertaining to biosorbents, their mechanisms, pros and cons. In addition, the achievements and current status of biosorption technology, which exploits natural biodiversity and molecular tools, in order to engineer microorganisms, were discussed in detail. Bioremediation can be classified into two different types - in situ bioremediation which involves treating the contaminants at the site (Ex. oil spills) and ex situ bioremediation which involves the removal of the contaminated material to be treated in a different place (Ex. composting). The various steps involved in bioremediation are described in Figure 1.

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Biotechnology and phytoremediation With urbanization and population explosion, the increased human activities in the industrial and agricultural sectors have made a severe impact on the environment (REDONDOGOMÈZ et al., 2011) by the deposition of non-degradable wastes, which form a natural part of the biogeochemical cycle (BARBOSA et al., 2015). The wastes constitute accumulation of heavy metals (arsenic, copper, lead, chromium, iron, manganese, zinc, etc.), petrochemical residues, sewage from industrial activities, hospital and residential activities, pesticides and fertilizers from agricultural use, explosives and ammunition from military use (LANGSTON, 2016) and other environmental pollutants (such as: benzene, chloroform, vinyl chloride, and carbon tetrachloride). To solve this problem it is not only necessary to remove the contaminants, but also to reuse and recycle these toxic products, transforming them from waste to wealth in a ecofriendly way. Conventional strategies of phytoremediation have been focused in the prospection of indicative species that are able to fix, accumulate and/or degrade different types of toxic waste from the environment. Excess toxic elements in the environment reduce plant growth and overall development by negatively affecting the biomass production (BARBOSA et al., 2015). In addition, another major problem is the low ability of fixation and immobilization of toxic elements. In this sense, some initiatives have been done by testing the effect of growth regulators in reducing environmental stress and increase the fixation of toxic components having been verified that the brassinosteroids had a positive effect by increasing the photosynthetic capacity and biomass production in crop species (VÁZQUEZ et al., 2013; COLL et al., 2015). Other studies have used biotechnological techniques to produce genetically modified plants with high capacity to extract toxic elements from soil and water to perform phytoremediation of contaminated environments. This latter approach has been known as environmental biotechnology which includes the integration of natural sciences and genetic engineering in order to achieve plants that are able to degrade environmental contaminants (NANEKAR & JUWARKAR, 2015). This technique has become promising in the remediation of contaminated soils, but its success depends on the ability of the selected species to produce high amount of biomass, and extract and accumulate the toxic compound present in the soil (REDONDO-GOMÈZ et al., 2011). According to Pilon-Smits (2005) phytoremediation is based on the use of plants and microbes associated in order to remove contaminants from the environment. There are different ways to start the cleaning processes (Figure 2): 1. Phytodegradation - refers to uptake, metabolism and degradation of the contaminant in the body of the plant; 2. Phytoextraction - is considered the best way to remove pollutants from the soil which implies in the uptake and accumulation of the contaminant in harvestable parts of the plant tissue; 3. Phytovolatilization - comprehends the uptake of the contaminant by the plant and later release in volatile degraded product; 74


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4. Phytostabilization or phytoimmobilization - means the use of plants to control in situ contaminants by changing the chemical, physical or biological conditions of the soil; 5. Phytostimulation - refers to the process where chemical substances released by the roots of plants mimic pollutants that enhance microorganisms’ activities in the rhizosphere. These chemical compounds may serve as energy sources to the microorganisms; 6. Rhyzofiltration - the process where plant roots remove contaminants by absorption, precipitation and concentration of pollutants. Environmental biotechnology techniques have improved the fixing and storage capacity of several species. Examples of transgenic plants include Populus tremula L. x Populus alba L. with increased capacity of the cytochrome P450 E1 being able to absorb trichloroethylene, vinyl chloride, carbon tetrachloride, chloroform and benzene from air and hydroponic solutions (DOTY et al., 2008); Agrostis stolonífera L. and Panicum virgatum L. with two bacterial genes being able to absorb and utilize nitramide (popular as RDX - a toxic component from explosives) in the plant metabolism, where the best lineages could neutralize all toxic products from the soil in less than two weeks (LANGSTON, 2016); Nicotiana glauca Graham transformed with the phytochelatin gene TAPCS1 showing higher capacity in accumulating zinc, boron, cadmium, nickel and lead. The tolerance to heavy metals was also found in Arabidopsis Heynh., Nicotiana tabacum L., and Brassica juncea (L.) Czern. with the over-expression of genes that induce the phytochelatin formation (ISAA, 2006). Other examples of transgenic plants developed to extract toxic products from environment can be obtained from ISAA (www.isaa.org.kc).

Figure 2. Different methods of phytoremediation (Adapted from Pilon-Smits, 2005 and Sharma & Juwakar, 2015) 75


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Phytoremediation: Merits and demerits Though phytoremediation is more advantageous, there exist few limitations too. It is rather a slow process and the contaminated material must be in proximity to the plant. Recently, Sharma & Juwarkar (2015) reviewed various advantages and limitations of phytoremediation which are briefly described below: Merits • • • • • • • • • • • •

Bound environmental disturbance and cost effective; Well studied in large contaminated area; Exploit the competence of the environment restore itself; Plants might be used as indicators of contaminated and phytoremediated area; Help stop the dissemination of the contamination, keeping them within or near the roots; Some plants that growing in wetland are able to transfer oxygen to the rhizosphere region allowing aerobic degradation of the contaminants by microorganisms; Improve the soil structure and quality; Increase soil porosity and water absorption that will accelerate nutrient cycling and increase the organic carbon in the soil; Prevent soil erosion; Avoid secondary wastes in the water and the air; Powerful in reducing CO2; Help to improve the floral diversity by the green belt formation.

Demerits • • • • •

Is not so fast as the other ex situ methods to remove contaminants from the soil; Need a long time to clean up the environment; No indication in human or environmental conditions where contamination needs to be immediately removed; Contamination fixed on the soil or organic matter is not available to be degraded by plants; Environmental conditions should be within the plant’s proximity.

Phytoremediation is thus a really useful process which when coupled with biotechnological tools is certainly a boon to environment. As far as limitations are concerned, the approach is under research and constant steps are being taken up by the research community to improvise the methods and reduce the limitations. One of the best examples is the development of transgenic Arabidopsis thaliana carrying the enzyme mercuric reductase from bacteria and is widely used in the biodegradation of mercury in soil. Conclusions To summarize, biotechnology is undoubtedly a wonderful approach for environmental cleaning. However, there are some challenges and risks which would be overcome in the near 76


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future. According to ISAA, although the use of biotechnology in developing transgenic plants aids in environmental cleaning, several challenges still remain to be overcome and are mentioned below • • •

A better understanding of the molecular mechanisms involved in degradation of the pollutants, and discovery of suitable genes for phytoremediation; Phytoremediation is only available for restricted number of pollutants and several contaminated patches exist with different pollutants and need to be resolved; The environmental biotechnology approaches are still in infancy. Field testing for phytoremediation is limited due to problems related to biosafety and gene escape.

Acknowledgements The first author is grateful to Palermo University, Italy and to São Paulo University for their support and help in learning various biotechnology techniques. The authors also thank Dr. Manoel Abílio de Queiróz and to Dr. Renato Ferraz de Arruda Veiga for their insightful suggestions and for granting the opportunity to publish this article.

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11. Conservação ex situ de germoplasma de espinheira-santa

Tângela Denise Perleberg Bióloga, Mestre em Sistemas de Produção Agrícola Familiar pela Universidade Federal de Pelotas. Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-riograndense, atuando no Campus Pelotas - Visconde da Graça. Tem experiência na área de Botânica, com ênfase em Recursos Genéticos, Biologia Reprodutiva, Taxonomia Vegetal e Ensino de Botânica.

Rosa Lia Barbieri Bióloga, Doutora em Genética e Biologia Molecular. Pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Clima Temperado. Integra o corpo docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Agronomia da Universidade Federal de Pelotas, na área de concentração Fitomelhoramento. Faz parte da diretoria da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, e é presidente da Rede de Recursos Genéticos da Região Sul do Brasil. Tem experiência nas áreas de Agronomia, Genética Vegetal e Botânica, com ênfase em Recursos Genéticos Vegetais e Agrobiodiversidade.

Márcio Paim Mariot Engenheiro Agrônomo, Doutor em Agronomia, Professor do Instituto Federal Sulrio-grandense, Campus Pelotas-Visconde da Graça. Chefe do Departamento de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação. Tem experiência na área de Agronomia, Genética Vegetal e Botânica, com ênfase em Plantas Medicinais, Recursos Genéticos Vegetais, Melhoramento Genético e Etnobotânica.

Introdução A espinheira-santa (Maytenus ilicifolia Mart.) é uma planta medicinal nativa da região sul do Brasil, que pertence à família Celastraceae (Figura 1). Essa espécie pode ser arbustiva ou arbórea, com altura variando de 40 cm até 12 m (MARIOT, 2005; CARVALHO, 2006). Dependendo da região onde ocorre é conhecida por diferentes nomes populares, além de espinheira-santa: cancorosa, cancerosa, erva-cancerosa (MARIOT, 2005). As folhas apresentam grande variação no tamanho e podem ter de um a vários espinhos na margem. A infusão destas é usada para desordens estomacais (NASCIMENTO et al., 2005) 79


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apresentando ação comprovada contra gastrite e úlceras gástricas (CARLINI, 1988; JORGE et al., 2004). Além disso, existem várias indicações populares para a espécie, como antiulcerogênica, anti-inflamatória e analgésica (JESUS; CUNHA, 2012; SIEGEL et al., 2016; STOLZ et al., 2014). A espinheira-santa faz parte da lista nacional de plantas de interesse para o Sistema Único de Saúde (Renisus) do Ministério da Saúde.

Figura 1. A. Planta de espinheira-santa (M. ilicifolia). B. Detalhe da folha, evidenciando os espinhos da margem. Fotos: Tângela Denise Perleberg.

O Banco Ativo de Germoplasma (BAG) de Espinheira-Santa A Embrapa Clima Temperado, em parceria com o Instituto Federal Sul-rio-grandense, mantém um BAG de Espinheira-Santa (Figura 2). Os acessos desse Banco pertencem às espécies Maytenus aquifolia Mart. (oito acessos) e M. ilicifolia (129 acessos). Originários de diferentes regiões do Rio Grande do Sul são conservados a campo desde 2002 em duas áreas distintas no município de Pelotas (MARIOT, 2005). Na Estação Experimental Cascata da Embrapa Clima Temperado estão 471 plantas, dos acessos 01 a 115. O local fica a 25 km do centro de Pelotas e pertence à região fisiográfica da Serra do Sudeste, com altitude de 160m. No Campus Pelotas - Visconde da Graça do Instituto Federal Sul-rio-grandense são mantidas 183 plantas, dos acessos 116 a 137. Esta área fica a 8,5 km do centro de Pelotas, e situa-se na Planície Costeira do município, com 7m acima do nível do mar. Os acessos do BAG foram caracterizados com descritores morfológicos e marcadores microssatélites (MARIOT; BARBIERI, 2010; MARIOT et al., 2008; RIBEIRO et al., 2010). Também foram avaliados caracteres fisiológicos relacionados à qualidade das sementes (MARIOT et al., 2005).

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Desde 2015 vem sendo realizado um estudo para conhecer os polinizadores e os dispersores de M. ilicifolia no BAG Espinheira-Santa. Na época de floração foi feita a observação dos visitantes florais. Os visitantes foram classificados em polinizadores ou pilhadores de néctar de acordo com o comportamento apresentado ao realizar a visitação das flores. Os polinizadores visitaram ambos os morfotipos florais frequentemente, encostando alguma parte do seu corpo nos órgãos reprodutivos da flor, possibilitando, assim, a transferência de pólen entre as plantas. As aves visitantes foram registradas no período em que a espinheira-santa estava com frutos maduros, sendo consideradas dispersoras aquelas que consumiram diásporos, ou seja, o arilo com as sementes. Foram realizados registros fotográficos dos polinizadores e dispersores.

Figura 2. Banco Ativo de Germoplasma de Espinheira-Santa da Embrapa Clima Temperado/Instituto Federal Sul-rio-grandense. Foto: Tângela Denise Perleberg.

Os polinizadores da espinheira-santa No BAG Espinheira-Santa o período reprodutivo inicia em junho, com a emissão dos botões florais, e se estende até janeiro, com a produção de frutos maduros. A floração acontece a partir de julho e se estende até novembro, com maior intensidade em agosto e setembro. A formação de frutos maduros ocorre de novembro a janeiro. A espinheira-santa apresenta dois morfotipos florais que ocorrem em plantas distintas. Ambas são muito semelhantes, com flores pequenas, de coloração verde-amarelada e sem perfume. No entanto, diferem quanto à funcionalidade (Figura 3). As flores funcionalmente masculinas produzem grande quantidade de pólen e as flores funcionalmente femininas originam frutos. Por este motivo, é uma espécie considerada funcionalmente dioica. E, portanto, o pólen das flores funcionalmente masculinas precisa ser transportado até o estigma das flores funcionalmente femininas para que o ocorra a fecundação e formação de frutos.

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Figura 3. Morfotipos florais de M. ilicifolia (Celastraceae). A. Flores funcionalmente femininas. B. Flores funcionalmente masculinas. Fotos: Paulo Lanzetta.

As moscas e as vespas foram os principais polinizadores da espinheira-santa (Figura 4). Estes insetos visitam as flores em busca de néctar. Ao vasculharem o disco nectarífero, encostam com partes do seu corpo nas anteras ou estigma das flores, propiciando, desta forma, o fluxo gênico entre os acessos do BAG. A mosca varejeira (Lucilia eximia Wiedemann), e a vespamexicana-do-mel (Brachygastra mellifica Say), são os polinizadores mais frequentes (Figuras 4A e 4F). A família Syrphidae foi a mais expressiva em diversidade de espécies de polinizadores (Figuras 4D e 4E). Essa família é considerada a mais importante entre os dípteros polinizadores, sendo constituída por moscas especializadas em se alimentar de pólen e néctar, dependendo, na sua fase adulta, quase exclusivamente de flores para sua alimentação, sendo por isso chamadas moscas-das-flores (WILLMER, 2011). As moscas saprófagas e necrófagas, pertencentes às famílias Anthomyiidae, Calliphoridae, Muscidae e Sarcophagidae, também foram considerados polinizadores da espinheira-santa (Figuras 4A, 4B e 4C). Estas moscas realizam visitas rápidas em várias flores de uma planta e após se deslocam para as plantas vizinhas, fazendo a transferência de pólen. Entre as vespas também foram frequentes, Polistes canadensis L., uma espécie do gênero Mischocyttarus e uma espécie pertencente à família Thiphidae (Figuras 4G e 4H). Esta última chamou a atenção não somente pela frequência das visitas, mas por fazê-las sempre em cópula. Essa espécie apresenta dimorfismo sexual acentuado, sendo que os machos são alados e as fêmeas todas ápteras. Neste sentido, os machos coletam néctar e ao se deslocarem sobre as flores “carregam” a fêmea, que também coleta pólen, e nesse processo fica inteiramente repleta de pólen em seu corpo. 82


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Figura 4. Polinizadores de Maytenus ilicifolia (Celastraceae). Moscas: A. Lucilia eximia. B. Espécie da família Sarcophagidae. C. Espécie da família Anthomyiidae. D e E. Espécies da família Syrphidae. Vespas: F. Brachygastra mellifica. G. Polistes canadensis. H. Espécie da família Tiphiidae. Fotos: Tângela Denise Perleberg.

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Os dispersores de sementes de espinheira-santa Quando os frutos estão maduros a coloração varia desde alaranjado, passando por vermelho até marrom, com diversas tonalidades destas cores. Neste momento a cápsula do fruto se abre e expõe o arilo branco e suculento, levemente adocicado (Figura 5A). A coloração do fruto contrasta com a coloração do arilo, chamando a atenção das aves, que são as dispersoras das sementes da espinheira-santa. As aves pousam nos ramos da planta e se alimentam somente do arilo com as sementes (diásporo). Para coletar os arilos as aves utilizam diversas táticas de coleta. A maioria somente pousa no galho e apanha os diásporos mais próximos, sem estender o corpo. No entanto, algumas aves estendem o corpo para baixo, para cima ou para o lado, na tentativa de alcançar os diásporos mais distantes. Outras realizam investidas através de voos curtos. O sanhaço-cinzento (Tangara sayaca L.), o guaracava (Elaenia sp.) e o sanhaço-papa-laranja (Pipraeidea bonariensis Gmelin) visitam as plantas de espinheira-santa com bastante frequência (Figuras 5B, 5C e 5D). Demonstram agilidade ao se locomover entre os ramos na procura de frutos abertos, e então retiram somente os arilos com as sementes e os engolem, utilizando diferentes táticas de coleta. O bem-te-vi (Pitangus sulphuratus L.), o suiriri (Tyrannus melancholicus Vieillot), o sabiá-poca (Turdus amaurochalinus Cabanis), o sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris Vieillot), e o peitica (Empidonomus varius Vieillot) realizam visitas esporádicas à espinheira-santa.

Figura 5. A. Frutos maduros de espinheira-santa (Maytenus ilicifolia), Celastraceae; B-D. Aves dispersoras de espinheira-santa. B. Sanhaço-cinzento (Tangara sayaca). C. Guaracava (Elaenia sp.). D. Sanhaço-papa-laranja (Pipraeidea bonariensis). Fotos: Tângela Denise Perleberg.

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Conclusões A espinheira-santa (Maytenus ilicifolia) é uma espécie generalista quanto ao processo de polinização e dispersão. A polinização dessa espécie é realizada por insetos (polinização entomófila) e a dispersão das sementes é feita por aves (dispersão ornitocórica). A espinheira-santa tem grande diversidade genética e já existem dados científicos suficientes para que esse BAG seja uma referência nacional.

Referências Bibliográficas CARLINI, E. A. 1988. Estudo da ação antiúlcera gástrica de plantas brasileiras: Maytenus ilicifolia (Espinheirasanta) e outras. Brasília: CEME/AFIP. 87 p. CARVALHO, P. E. R. 2006. Espécies arbóreas brasileiras. v. 2. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica. Colombo: Embrapa Florestas. 627 p. JESUS, W. M. M.; CUNHA, T. N. 2012. Estudo das propriedades farmacológicas da espinheira-santa (Maytenus ilicifolia Mart. ex Reissek) e de duas espécies adulterantes. Revista Saúde e Desenvolvimento, 1: 20-46. JORGE, R. M.; LEITE, J. P. V.; OLIVEIRA, A. B.; TAGLIATI, C. A. 2004. Evaluations of antinociceptive, antiinflammatory and antiulcerogenic activities of Maytenus ilicifolia. Journal of Ethnopharmacology, 94: 93-100. MARIOT, M. P. Recursos genéticos de espinheira-santa (Maytenus ilicifolia e Maytenus aquifolium) no Rio Grande do Sul. Pelotas, 2005. 131 f. Tese (Doutorado em Ciências) – Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel, Universidade Federal de Pelotas. MARIOT, M. P.; BARBIERI, R. L. 2010. Divergência genética entre acessos de espinheira-santa (Maytenus ilicifolia Mart. ex Reissek e M. aquifolium Mart.) com base em caracteres morfológicos e fisiológicos. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, 12: 243-249. MARIOT, M. P.; BARBIERI, R. L.; SINIGAGLIA, C.; RIBEIRO, M. V. 2008. Variabilidade em matrizes de acessos de espinheira-santa. Ciência Rural, 38: 351-357. MARIOT, M. P.; BARBIERI, R. S.; SINIGAGLIA, C.; BENTO, L. H.; RIBEIRO, M. V. 2005. Presença do arilo na produção de mudas de Maytenus ilicifolia. Ciência Rural, 35: 468-470. NASCIMENTO, V. T.; LACERDA, E. U.; MELO, J. G.; LIMA, C. S. A.; AMORIM, E. L. C.; ALBUQUERQUE, U. P. 2005. Controle de qualidade de produtos à base de plantas medicinais comercializados na cidade do Recife-PE: erva-doce (Pimpinella anisum L.), quebra-pedra (Phyllanthus spp.), espinheira-santa (Maytenus ilicifolia Mart.) e camomila (Matricaria recutita L.). Revista Brasileira de Plantas Medicinais, 7: 56-64. RIBEIRO, M. V.; BIANCHI, V. J.; RODRIGUES, I. C. S.; MARIOT, M. P.; BARBIERI, R. L.; PETERS, J. A.; BRAGA, E. J. B. 2010. Diversidade genética entre acessos de espinheira-santa (Maytenus ilicifolia Mart. ex Reis.) coletados no estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, 12: 443-451. SIEGEL, P.; GASPI, F. O.; SALERNO, V.; LIMA, C. S. P.; STEPHAN, C.; BARROS, N. F. 2016. Medicinal herbs for cancer patients undergoing chemotherapy in a Brazilian hospital – An exploratory study. European Journal of Integrative Medicine, 8: 478-483. STOLZ, E. D.; MÜLLER, L. G.; TROJAN-RODRIGUES, M.; BAUMHARDT, E.; RITTER, M. R.; RATES, S. M. K. 2014. Survey of plants popularly used for pain relief in Rio Grande do Sul, southern Brazil. Revista Brasileira Farmacognosia, 24: 185-196. WILLMER, P. 2011. Pollination and floral ecology. Princeton: Princeton University Press. 778 p.

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III - ENTREVISTADOS DA VEZ a) Área Micro-organismos Maria Aparecida Vasconcelos Paiva e Brito

Por Maíra Halfen Teixeira Liberal

Graduada em Farmácia e Bioquímica pela Universidade Federal de Ouro Preto (1973), Me. em Microbiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1979), PhD pela Universidade de Bristol-UK (1989) em Microbiologia e Imunologia Veterinária, Pós-Doutorado no Eastern Regional Research Center, do ARS nos EUA (2006) e Prof. de Virologia (Universidade Santa Úrsula, RJ, 1978), de Bioquímica (Fundação Educacional do Alto Uruguai Catarinense, 1980) e Microbiologia (Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora, 2004). Desde 1979 é pesquisadora da Embrapa, e a partir de 1993 na Embrapa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG. Tem experiência na área de Microbiologia, com ênfase em Microbiologia Veterinária. Temas em que atua: doenças infecciosas de animais, mastite bovina, com ênfase no diagnóstico microbiológico e caracterização microbiológica e molecular dos patógenos da mastite, e segurança alimentar e patógenos veiculado pelos alimentos e qualidade do leite.

1. Historicamente, desde a sua fundação em 1973, a Embrapa investe na formação de Coleções Microbianas. Como vem sendo feita a organização dos Projetos de Pesquisa em Recursos Genéticos Microbianos na Embrapa nos últimos anos? R. - A conservação de recursos genéticos microbianos na Embrapa ocorreu naturalmente a partir das pesquisas realizadas nas áreas de microbiologia, fitopatologia, virologia e outras correlatas. Diversos grupos de microrganismos com potencial de aplicação, ou para estudos mais detalhados relacionados a resistência a produtos químicos, virulência, mecanismos de ação, tratamento de resíduos, capacidade antagônica para controle biológico, síntese de moléculas foram isolados e preservados em Coleções. O Sistema de Curadorias de Germoplasma da Embrapa foi formalizado em 1993, e desde o seu estabelecimento, incluiu as coleções de microrganismos. A partir de 2003, as ações com recursos genéticos passaram a operar sob o modelo de organização em rede, com a Rede Nacional de Recursos Genéticos (RENARGEN) no período de 2003 a 2008. Na RENARGEN os recursos genéticos microbianos foram incluídos em um projeto componente, contendo aproximadamente 15 coleções de diferentes Unidades da Embrapa. Essa organização permitiu maior interação entre as coleções microbianas, principalmente nos aspectos metodológicos comuns e quanto às atividades de coleta, isolamento, identificação, caracterização e 86


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preservação. Este modelo foi aprimorado com o estabelecimento da Rede de Recursos Genéticos Microbianos (2008-2015), dentro da Plataforma de Recursos Genéticos, dedicada somente às coleções de microrganismos. A Rede Microbiana permitiu maior integração das coleções de microrganismos, viabilizando-as em ações conjuntas. Atualmente, as Coleções continuam estruturadas em Rede, e fazem parte da Vertente Microbiana, do Portfólio Gestão Estratégica de Recursos Genéticos para Alimentação, a Agricultura e a Bioindústria (REGEN). Estruturalmente, a Vertente Microbiana é composta por Projetos Componentes, que visam as atividades de conservação dos recursos genéticos microbianos, a gestão da rede e projetos que tratam da documentação, intercâmbio, quarentena e implantação de requisitos de qualidade nas coleções. A Vertente Microbiana permitirá não só a continuação dos trabalhos de coleta, identificação e preservação dos materiais, mas também a valoração do material genético nelas existente, assim como a organização do banco de dados comum a todas as coleções.

2. Como são organizadas as Coleções de Microrganismos na Embrapa? R. - A organização em Rede permitiu muitos avanços para os recursos genéticos microbianos na Embrapa. Foi criado um Comitê Gestor, e foram realizadas reuniões técnicas que fortaleceram a organização e estruturação das coleções. Foram propostos novos modelos de organização com fusões de coleções que apresentavam escopos semelhantes. Foi verificada a necessidade de implantação de processos gerenciais e operacionais para alcançar níveis de excelência, satisfazer normas nacionais e internacionais, atender às regulações de biorrisco e acessibilidade, e garantir a harmonização dos procedimentos e processos. Para isso foi desenvolvido o Modelo Corporativo de Gestão para as Coleções de Microrganismos da Embrapa no âmbito do projeto GESTCOL (2012 a 2015), liderado pela Pesquisadora do CENARGEN, Dra. Clarissa Silva Pires de Castro (foto). O Modelo, já elaborado, possibilitará a estruturação e organização das coleções de acordo com sua categoria: Centro de Recursos Biológicos (CRB), Coleção Institucional e Coleção de Trabalho, segundo critérios padronizados.

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A Embrapa desenvolveu o sistema Alelo (acima), para gerir as informações relacionadas a recursos genéticos. O AleloMicro, a parte dedicada aos microrganismos, foi estruturado em módulos e disponibilizado em 2013. Atualmente cerca de 60% de toda informação básica sobre as linhagens de microrganismos das coleções da Embrapa, já está inserida no AleloMicro. Este sistema conta com um banco de dados centralizado e com parte das informações disponibilizadas para acesso externo via Internet. A alimentação e manutenção das bases de dados são feitas de forma descentralizada pelos curadores de cada coleção.

3. As Coleções são classificadas em Coleções de Trabalho, Coleções Institucionais e Centros de Recursos Biológicos (CRBs). A complexidade aumenta da Coleção de Trabalho até os CRBs? R. - Sim, a complexidade aumenta de acordo com a categoria da Coleção. Os Centros de Recursos Biológicos (CRB) devem atender aos elevados padrões de qualidade e especialização exigidos pela comunidade internacional, para a distribuição de material e informações biológicas. Os CRBs da Embrapa atendem aos requisitos das Normas NIT-DICLA 061, ABNT ISO/IEC 17025, ABNT ISO GUIA 34 e Versão Brasileira do Documento Diretrizes da OCDE de Boas Práticas para Centros de Recursos Biológicos. É composto por Coleções de Microrganismos de Unidades da Embrapa, formalmente reconhecidas pelo INMETRO, por meio da acreditação de suas atividades de ensaio e de produção de materiais de referência segundo as Normas citadas. No Brasil, está sendo estruturada uma Rede de CRBs de modo a abranger os quatro principais segmentos estratégicos para o desenvolvimento da biotecnologia: Saúde, Agronegócio, Ambiente e Indústria, sendo a Embrapa a instituição âncora responsável pelo CRB Agronegócio. 88


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As Coleções Institucionais e as Coleções de Trabalho atendem a requisitos corporativos de qualidade estabelecidos a partir das Normas ABNT NBR ISO/IEC 17025 e Versão Brasileira do Documento Diretrizes da OCDE de Boas Práticas para Centros de Recursos Biológicos. Os requisitos são diferenciados, de acordo com a categoria da Coleção. As Coleções Institucionais representam aquelas que não prestam serviços, mas que podem atuar como fiel depositária e exercem atividades realizadas a intercâmbio, preservação, identificação e caracterização dos microrganismos isolados, utilizando técnicas e processos que certificam a qualidade do material biológico e que estejam de acordo com as leis, regulamentos e políticas nacionais. As Coleções de Trabalho estão necessariamente vinculadas a projetos específicos, e aos CRB ou às Coleções Institucionais, possuem pesquisadores responsáveis, podendo executar atividades práticas de coleta de amostras, isolamento, identificação, caracterização, prospecção, armazenamento e documentação do acervo. Atualmente existem 16 Coleções de Microrganismos da Embrapa, distribuídas por todo o Território Nacional. Elas preservam microrganismos de funcionalidades diversas, incluindo espécies relacionadas ao controle biológico de pragas, à fixação biológica de nitrogênio e fertilidade do solo, à agroindústria e a agentes patogênicos de animais e de plantas, entre outras. O acervo das coleções microbianas constitui um recurso valioso para detectar potencialidades de uso em processos agroindustriais, pesquisa, ensino e programas de melhoramento genético.

4. Como está sendo implantado o Modelo de Gestão para as Coleções Microbianas da Embrapa? R. - O Modelo foi elaborado com base nos diagnósticos realizados em 17 coleções microbianas, em benchmarking realizado em coleções nacionais e internacionais de referência e no mapeamento dos processos de gestão de uma coleção microbiana. Contempla sistemas de qualidade baseados em normas internacionais (NIT-DICLA 061, ABNT ISO/IEC 17025, ABNT ISO GUIA 34 e Versão Brasileira do Documento Diretrizes da OCDE de Boas Práticas para Centros de Recursos Biológicos) e outros que tratam aspectos peculiares às coleções de microrganismos, por exemplo, legislações aplicáveis a recursos genéticos microbianos, sustentabilidade, critérios para armazenamento de material biológico, documentos, registros, biorrisco, entre outros.

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O Modelo está sendo implantado nos CRBs, Coleções Institucionais e Coleções de Trabalho, pelo projeto “Implementação e monitoramento de sistemas da qualidade na vertente microrganismos - QUALIMICRO”, considerando as particularidades e estágio de cada categoria de coleção. A implementação dos requisitos do Modelo permitirá que as coleções de microrganismos da Embrapa tenham processos harmonizados e estejam estruturadas de acordo com as exigências nacionais e internacionais, incluindo os aspectos de qualidade e legislação e de forma a garantir excelência em suas atividades e serviços. 5. Na estrutura organizacional da Vertente Microbiana do Portfolio REGEN, o projeto “Coleções Institucionais de Microrganismos” está sob a sua liderança. Detalhe-nos a composição dos acervos dessas Coleções e as Instituições parceiras. R. - As Coleções Institucionais da Embrapa são em número de cinco, e estão localizadas nas Unidades: Arroz e Feijão, Gado de Leite, Milho e Sorgo, Suínos e Aves e Uva e Vinho. Algumas iniciaram as atividades de coleta, identificação e preservação dos microrganismos a partir do estabelecimento dessas Unidades, como por exemplo, a Coleção de Microrganismos de Interesse da Suinocultura e Avicultura da Embrapa Suínos e Aves (1977) e a Coleção de Microrganismos Multifuncionais e Fitopatogênicos da Embrapa Arroz e Feijão (1981), enquanto outras começaram no início da década de 1990. São incluídas também no projeto, cinco Coleções de Trabalho associadas às Coleções Institucionais. Estas estão localizadas nas Unidades da Embrapa: Agroindústria de Alimentos, Agroindústria Tropical, Caprinos e Ovinos, Florestas e Quarentena. Considerando todas as coleções envolvidas no projeto, estão preservadas aproximadamente 26.000 linhagens, que incluem bactérias, fungos, leveduras, algas microscópicas e vírus. Estes microrganismos são de importância para o controle de doenças tanto de plantas como de animais, resistência ou biodegradação de produtos químicos, capacidade antagônica para controle biológico, síntese de moléculas ou enzimas de aplicação industrial. As próprias linhagens com propriedades fermentativas desejáveis podem ser usadas para aplicação em processos industriais. Tem-se assim uma rica diversidade microbiana, que constitui recurso genético relevante para bioprospecção de genomas e/ou produtos de interesse biotecnológico. As atividades previstas no projeto tratam do enriquecimento das coleções, pela introdução de novas linhagens, a identificação taxonômica, a preservação em pelo menos dois métodos e a documentação no sistema de informação AleloMicro. A documentação permitirá a disponibilização de um conjunto de informações e a visibilidade desse importante patrimônio. O acervo genético conservado e caracterizado constituirá uma fonte excepcional de germoplasma microbiano para utilização em diversas áreas do conhecimento. O enriquecimento da variabilidade genética microbiana disponível poderá contribuir com o desenvolvimento de produtos e tecnologias, que representarão ganhos de produtividade e qualidade tecnológica na agroindústria, produzindo significativo impacto sobre a sustentabilidade e a competitividade do agronegócio no Brasil. 90


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6. As atividades de diagnóstico e de pesquisa epidemiológica de Recursos Genéticos Microbianos de origem animal estão diretamente relacionadas com Defesa Sanitária Animal, Medicina Veterinária Preventiva, Saúde Pública e Segurança dos Alimentos. Sabemos que a manutenção de Coleções de Microrganismos de interesse para Animais de Produção é essencial para o desenvolvimento da Pecuária Nacional. Dentro desse novo modelo da Embrapa, essas Coleções estão contempladas? R. - Há três Coleções de Microrganismos que abrigam especificamente, linhagens de interesse de animais de produção na Embrapa. Estas são a Coleção de Microrganismos de Interesse da Agricultura e Pecuária da Embrapa Gado de Leite, a Coleção de Microrganismos Patogênicos a Caprinos e Ovinos, da Embrapa Caprinos e Ovinos e a Coleção de Microrganismos de Interesse da Suinocultura e Avicultura da Embrapa Suínos e Aves. Essas Coleções fazem parte do projeto Coleções Institucionais da Vertente Microbiana. Na Vertente Microbiana há ainda a colaboração da Coleção de Microrganismos Patogênicos para Animais de Produção, da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro / PESAGRO-RIO. Essa é uma coleção com grande número de linhagens preservadas e relacionadas a diferentes espécies animais, incluindo bovinos, suínos, equinos, caprinos, aves, e rãs, entre outras. Os microrganismos preservados incluem patógenos dos animais, contaminantes dos produtos de origem animal e os de importância para a segurança dos produtos de origem animal. Os primeiros incluem microrganismos infecciosos que prejudicam a produção e causam prejuízos econômicos aos produtores. Os microrganismos importantes do ponto de vista da segurança alimentar podem ou não causar doenças nos animais, mas quando presentes nos produtos de origem animal causam doenças no homem, como por exemplo, Escherichia coli produtora de enterotoxinas, Listeria monocytogenes, Campylobacter jejuni, Salmonella spp., e Staphylococcus aureus, que têm causado surtos com grande morbidade e mortalidade em diversos países. Além do acervo preservado, as Coleções dispõem das informações sobre origem, dados do isolamento, informações clínicas e dos surtos ou dos problemas causados, permitindo seu uso em estudos epidemiológicos, desenvolvimento de métodos de diagnóstico e no controle de doenças ou problemas relacionados a contaminação. Podem contribuir para o desenvolvimento ou avaliação de vacinas, emprego e/ou avaliação de proteínas antimicrobianas como alternativas de controle de infecções, controle da resistência ou estudos de disseminação de determinantes de resistência a antimicrobianos entre patógenos animais. Desse modo, as Coleções de interesse para animais de produção são de suma relevância não só para a Defesa Sanitária Animal como também para a Saúde Pública.

7. Existe uma estratégia institucional para financiamento de Projetos que contemplem a manutenção e a modernização de Coleções de Microrganismos de interesse para Animais de Produção?

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R. - A programação de pesquisa da Embrapa está organizada com base em temas estratégicos, representada pelos Portfólios e Arranjos. Como mencionado anteriormente, os projetos que tratam de recursos genéticos estão abrigados no Portfólio REGEN. A aprovação dos projetos se dá por meio de inscrição em Chamadas, e seguem trâmites de avaliação por pares e Comitês especializados. Considerando a relevância dos recursos genéticos como acervos estratégicos para o desenvolvimento agropecuário, as propostas em desenvolvimento estão focadas em ações exclusivas de coleta, introdução, caracterização, conservação e documentação. Pelo fato dessas ações requererem atenção contínua ao longo do tempo, os projetos das Vertentes Animal, Vegetal e Microrganismos, estão organizados em um modelo não competitivo. Na Vertente Microbiana, as atividades de todas as Coleções de microrganismos compreendem a coleta, isolamento, identificação e preservação dos microrganismos e a organização da informação, garantindo o germoplasma para estudos de aplicações no agronegócio e outros setores produtivos relacionados. No momento não há uma estratégia institucional de financiamento dedicada exclusivamente às Coleções de interesse para animais de produção, porque o modelo adotado se aplica igualmente a todas as Coleções. No Portfólio REGEN projetos que visam a prospecção e caracterização das linhagens com finalidade de aplicação, participam do modelo competitivo e aguardam a abertura periódica das Chamadas.

8. Qual é a sua expectativa futura para as atividades relacionadas à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação para os Recursos Genéticos Microbianos? R. - A expectativa futura para as atividades relacionadas aos recursos genéticos microbianos é enorme, pois microrganismos são organismos versáteis, e constituem fontes para prospecção de genes e funções, que podem ter aplicação de interesse direto para o setor agropecuário e a agroindústria e diversas outras áreas. Novas técnicas estão sendo empregadas para identificar microrganismos não cultiváveis, importantes em diversos ecossistemas, revelando microrganismos até pouco tempo desconhecidos, ou cuja presença, nesses locais era desconhecida. Atualmente, as tecnologias de sequenciamento de DNA em grande escala fornecem um grande número de 92


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dados a custos acessíveis à maioria dos laboratórios de pesquisa. Aplicando-se ferramentas de bioinformática, são gerados conhecimentos significativos sobre o tamanho dos genomas e funções metabólicas de uma grande variedade de microrganismos. Métodos novos estão sendo usados para desvendar a diversidade genética e funcional do genoma microbiano, incluindo comunidades complexas do ambiente, que podem conter milhares de espécies. Estratégias para expressão heteróloga de genes e abordagens para a triagem eficiente de grandes bibliotecas genômicas, certamente trarão muitos benefícios para a análise genômica funcional. O processo de fermentação industrial capaz de obter biomassa ou metabólitos microbianos como produtos finais, abre possibilidades diversas de aplicação, incluindo a alimentação humana e animal. Os processos de biotransformação ou bioconversão, em que o próprio microrganismo ou suas enzimas são usados para modificar um dado composto e produzir um composto estruturalmente relacionado, pode gerar maior diversidade de produtos e aplicações, nas diversas áreas da agricultura e pecuária. Muitos destes produtos ou conhecimentos gerados são direcionados pela própria evolução do setor agroindustrial e de produção de alimentos. Por exemplo, a agricultura e a silvicultura, no atual panorama da globalização e crescimento do agronegócio, têm inserido no âmbito nacional, novos conceitos e demandas. A segurança biológica na agricultura é assegurada por meio de métodos precisos de detecção e identificação de fitopatógenos, bem como de conhecimentos da sua biodiversidade. Na saúde animal, as informações obtidas sobre a diversidade microbiana dentro da mesma espécie, a disseminação de determinados microrganismos entre regiões ou rebanhos, a presença de fatores de virulência e o potencial patogênico fornecerão informações importantes para o controle de doenças, desenvolvimento de métodos de diagnóstico e de vacinas. E a grande diversidade dos microrganismos preservados nas coleções, representa uma riqueza de oportunidades para melhorar os sistemas agrícolas, contribuir para a indústria de alimentos, produção de energia, gestão de resíduos na agricultura e aplicação industrial.

Maria Aparecida, esta entrevista é uma pequena homenagem que a SBRG presta a você como agradecimento pelo seu magnífico trabalho desenvolvido com recursos genéticos de micro-organismos, nosso muito obrigado! Maíra.

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b) Área Animal Sandra Aparecida Santos Por Afrânio Gazolla

Formada em Zootecnia pela UNESP (1984), Me. em Agronomia pela USP

(1989) e Dr. em Zootecnia pela UNESP (2001), PhD, Universidade de Cranfield, UK (2011). Pesquisadora, nível III da Embrapa Pantanal. Foi coordenadora da Rede Pecuária do Centro de Pesquisa do Pantanal (CPP) e de vários projetos da Embrapa Pantanal, entre os quais, os projetos “Avaliação e conservação do cavalo Pantaneiro no Pantanal mato-grossense” e "Desenvolvimento de sistema de suporte a decisão para a produção animal sustentável do Pantanal". Tem experiência em: Manejo, monitoramento e conservação de pastagens nativas, atuando principalmente nos seguintes temas: raças localmente adaptadas, pastagem nativa, recursos genéticos animais, bovinocultura de corte, herbívoros silvestres, sistemas de produção animal e monitoramento/manejo sustentável das pastagens. No ano de 2009, recebeu o prêmio de melhor curadora da Rede Animal da Embrapa. Em 2013 recebeu o diploma de honra ao mérito da Assembleia Legislativa do Estado de MS por sua contribuição à pesquisa nacional durante as comemorações dos 40 anos da Embrapa e também no mesmo ano o prêmio Top MS Cavaleiro 2013, modalidade pesquisa. Em 2016 recebeu homenagem da Assembleia Legislativa de MS como Zootecnista de destaque de MS durante comemoração dos 50 anos da Zootecnia.

1. Sandra, para iniciar a entrevista gostaria de saber quando se iniciaram os trabalhos de conservação com o Cavalo Pantaneiro, e qual foi o grau de evolução deste trabalho daquela época para aos dias atuais?

Figura 1. Prof. Luiz Rodrigues Fontes

R: O início do trabalho de conservação com o cavalo Pantaneiro ocorreu em 1958 quando um grupo de técnicos, fomentados pelo Ministério da Agricultura, vieram para a região do Pantanal avaliar os cavalos existentes e constataram a frequente miscigenação do cavalo Pantaneiro com outras raças. Este grupo de técnicos era coordenado pelo professor Luiz Rodrigues Fontes (Figura 1), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas foi somente em 1970 que o Prof. Fontes criou uma Comissão técnica para a formação do primeiro núcleo de preservação do cavalo Pantaneiro formado por 100 animais (98 fêmeas e 8 machos), provenientes de várias fazendas do norte do Pantanal, culminando em 1972, com a criação da 94


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Associação Brasileira de Criadores do Cavalo Pantaneiro (ABCCP), na cidade de Poconé, MT. A partir de uma demanda dos criadores da ABCCP para a equipe da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, decidiu-se fundar o Núcleo de Criação do Cavalo Pantaneiro na Embrapa Pantanal em julho de 1988, na Fazenda Nhumirim, localizada no Pantanal sul-matogrossense na sub-região da Nhecolândia, município de Corumbá, MS. Esta fundação do núcleo teve o esforço conjunto dos técnicos da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (em especial, do Dr. Arthur da Silva Mariante – Figura 2), dos pesquisadores da Pantanal; da ABCCP e da Secretaria da Agricultura de Mato Grosso do Sul. Naquela época recebemos três garanhões com idade média de três anos, quatro éguas com idade de quatro anos e dois meses, e 24 potrancas com idade média de dois anos, provenientes de diferentes propriedades para se obter Figura 2. representatividade, em variabilidade genética, da raça. Dr. Arthur da Silva Mariante Na ocasião, embora não estivesse trabalhando com cavalos Pantaneiros e nem com a criação do núcleo, a chefia optou por me convidar para coordenar os estudos com a raça. O rebanho inicial foi a base para um longo trabalho de caracterização, conservação e seleção. Na seleção do rebanho procurou-se manter a diversidade e animais com conformação mais equilibrada dentro dos critérios do padrão racial, que proporcionasse uma melhor performance funcional. Atualmente, temos um rebanho que apresenta variabilidade e diversidade genética assim como alta qualidade racial e adaptado às condições do Pantanal.

2. Para você, como foi a formação e evolução da raça? Discorra sobre isto em termos históricos e abordando os elementos do processo: Cavalo, homem pantaneiro, ambiente, Associação de Criadores e Embrapa. R: Os cavalos Pantaneiros, assim como as demais raças localmente adaptadas do Brasil, são descendentes dos animais trazidos pelos primeiros colonizadores, especialmente as raças Ibéricas. No Pantanal, estes cavalos encontraram extensas áreas de campos nativos, o que propiciou a sua multiplicação e adaptação a este ambiente com pouca interferência antrópica, até a implantação de fazendas na região. A formação da raça pode ser resumida em cinco fases principais: a) Início da colonização do Brasil até final do século 18, com o surgimento das primeiras fazendas do Pantanal; b) Final do século 18 até as décadas de 1930 e 1940, período no qual se estabeleceu a pecuária de corte na região e também surgiram os primeiros surtos do Mal de Cadeiras (transmitida por um protozoário - Trypanosoma evansi); c) Décadas de 1930 e 1940 até o início da década de 1970, período que apareceu a Anemia Infecciosa Equina (AIE) (provocada por um RNA vírus do gênero Lentivirus, da família

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Retrovírus) na região e juntamente com cruzamentos indiscriminados com outras raças de cavalos provocou uma diminuição drástica no seu efetivo populacional; d) Início da década de 1970 até o final do século 20, período de resgate e reconhecimento do valor da raça, com a criação da ABCCP e os núcleos de criação na Embrapa Pantanal, UFMS e UFMT; e) Época atual, onde observamos interesse crescente pela raça por seu uso em várias atividades, não apenas no campo (na lida com o gado, e meio de transporte), mas também em provas esportivas e no lazer.

3. Como o cavalo Pantaneiro participa da vida das fazendas? R: Cerca de 90% da região do Pantanal é constituído por grandes fazendas privadas (média de 10.000 ha), sendo que muitas destas fazendas ficam isoladas, em especial durante as grandes enchentes. Nestas situações o cavalo é de primordial importância como meio de transporte local, possibilitando a interação dos pantaneiros com fazendas vizinhas. Este isolamento também propiciou uma maior interação do homem pantaneiro com o cavalo e a natureza, tornando-os quase inseparáveis. Além desta importância social, o cavalo tem grande relevância econômica, pois, não há pecuária de corte nas áreas inundáveis do Pantanal sem o uso dos cavalos. O cavalo é utilizado na lida diária, especialmente na vistoria das invernadas para a cura dos bezerros e manejo geral do gado, assim como em comitivas que transportam o gado de um local para outro. Figura 3. O Cavalo Pantaneiro

4. Pode outro cavalo substituir sua função no ambiente Pantaneiro? R: Como relatado na questão anterior, o cavalo é imprescindível para a atividade da pecuária de corte nas áreas inundáveis, pois nenhuma outra raça suporta longos períodos dentro da água devido à enorme possibilidade de podridão da ranilha. Grande parte das raças exóticas, que foram introduzidas no passado, não sobreviveram, restando apenas os animais mestiços. O cavalo Pantaneiro, por sua vez, possui cascos resistentes à umidade e esta característica de adaptação é fundamental para os animais criados na região pantaneira. Além da resistência do casco à umidade, o cavalo Pantaneiro apresenta outras características de adaptação como tolerância ao calor, fertilidade, hábito alimentar, tolerância às doenças e parasitas, entre outras. Porém, em áreas mais secas, é possível sim, pois, outras raças e até mesmo motos vem substituindo o cavalo.

5. A conservação do Cavalo Pantaneiro sofre alguma ameaça atualmente? 96


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R: Sim, a principal ameaça é o aumento da endogamia por meio da utilização de garanhões famosos e de destaque. Na análise da estrutura da população registrada na ABCCP, desde sua criação em 1972 até 2009, observou-se um aumente crescente da endogamia na raça. Outra ameaça é a intensificação dos sistemas de produção, muitos dos quais estão localizados fora da planície pantaneira, o que pode acarretar na perda das características adaptativas herdadas pela seleção natural.

6. Qual a importância do Núcleo de Conservação da Embrapa para a raça? R: Diante das prováveis ameaças sobre a conservação da diversidade dentro da raça Pantaneira, manter um núcleo de conservação no seu ambiente natural é de extrema importância, mas para isto é necessário que o núcleo privilegie a manutenção da variabilidade genética da raça. A manutenção do núcleo nas condições ambientes do Pantanal viabiliza a evolução continua da raça no seu ambiente natural, como também da continuidade às pesquisas das caraterísticas adaptativas, de preferência associadas com marcadores moleculares. Além do mais, a Embrapa comercializa regularmente os produtos do núcleo para os criadores interessados, contribuindo assim com os pecuaristas no uso e consequente preservação da raça.

7. Discorra sobre as principais pesquisas realizadas pela Embrapa com o Cavalo Pantaneiro. R: Desde a formação do Núcleo de Criação do Cavalo Pantaneiro na Embrapa Pantanal, vários projetos de pesquisas foram desenvolvidos, o que possibilitou a realização de parcerias com Universidades, com unidades da Embrapa e com a ABCCP, contribuindo para a construção de uma equipe multidisciplinar. Até a criação do núcleo havia poucos estudos sobre a raça, e com a elaboração de projetos multidisciplinares, diversos estudos foram realizados, especialmente sobre a origem e caracterização da raça (origem, genética, fenotípica, sanitária, nutricional, reprodutiva, sanitária, entre outros). Estes projetos tiveram longa duração e após o seu término, os estudos ficaram concentrados apenas nos projetos da Rede Animal de Recursos Genéticos que tem por objetivo manter os núcleos de conservação de raças localmente adaptadas da Embrapa.

8. Existem trabalhos de identificação, sazonalidade e bromatologia das principais forrageiras nativas da sua dieta? R: Sim, estes foram os primeiros estudos a serem desenvolvidos com a raça. Entre as espécies forrageiras nativas consumidas pelos equinos, destacam-se as ocorrentes nas fitofisionomias presentes nas cotas mais baixas do mesorelevo, ou seja, naquelas áreas que apresentam certa 97


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umidade no solo durante o ano todo (borda de baias, rios, vazantes, corixos, etc.), que são as preferidas pelos equinos para pastejo. Nestas áreas há dominância de gramíneas de via fotossintética C3 que são de melhor qualidade, mas muitas ficam dentro da água como é o caso do Grameiro (Leersia hexandra Sw.) e o Capim Arroz (Luziola subintegra Swallen). O comportamento de pastejo foi estudado ao longo do ano em regiões do Pantanal com diferentes origens de inundação (origem fluvial e pluvial). Devido ao hábito de pastejo rente ao solo, o cavalo prefere as gramíneas nativas de porte baixo. Algumas das espécies forrageiras preferidas pelos equinos estão sendo conservadas e caracterizadas no Banco Ativo de Germoplasma de Forrageiras Nativas, plano de ação da Rede Vegetal da Embrapa, que possibilitará num futuro próximo seleção e melhoramento destas espécies. Todos estes resultados podem ser encontrados no livro publicado sobre a raça: “Cavalo Pantaneiro: rústico por natureza”.

9. Na mídia tem sido relatado o grande número de cavalos que participam das Feiras Agropecuárias nos Estados de MT e MS, o que nem as Associações conseguem viabilizar frequentemente em um mesmo evento. Diante do fato podemos considerar que o Cavalo Pantaneiro caminha para ocupar outras regiões além dos domínios do Pantanal? R: A ABCCP efetua quatro julgamentos oficiais por ano, sendo o último na cidade de Corumbá, MS, durante Feira Agropecuária do Pantanal (FEAPAN). Na FEAPAN de 2017, em Corumbá, foram apresentados cerca de 100 cavalos Pantaneiros. Observa-se um interesse crescente por produtores da região, assim como também vem crescendo o interesse da sua criação em outros locais do Brasil e de países fronteiriços, como a Bolívia. O potencial de expansão da raça é imenso, o que requer um programa de seleção, conservação e fiscalização da raça para que ela não perca suas características essenciais e únicas.

10. Sei que há um novo livro sobre o Cavalo Pantaneiro, como surgiu a ideia de um livro e tão completo sobre a raça? R: A ideia do livro surgiu da necessidade de se resgatar e reunir num único documento, e em linguagem acessível, as informações inéditas até então somente encontradas em publicações dispersas. O livro seria uma forma de tornar as pesquisas mais próximas dos criadores, assim como descrever a experiência deles no processo de conservação da raça. A elaboração do livro envolveu uma interação intensa entre criadores e pesquisadores. O livro é como um banco de informações sobre o cavalo Pantaneiro, onde é possível encontrar ilustrações e informações sobre o histórico, pioneiros a raça, normas da ABCCP, padrão racial, genealogia, etc., assim como as principais pesquisas realizadas nos últimos 27 anos pela Embrapa Pantanal em conjunto com outras Instituições e criadores, focando as principais características da raça como adaptação ao ambiente, funcionalidade no serviço e nos esportes. 98


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No livro também são relatadas as estratégias de manejo e conservação da raça Pantaneira. Este livro consiste na base atual de conhecimentos sobre a raça para quaisquer estudos atuais e futuros. É um livro muito interessante para criadores e estudantes da área animal pois abrange vários aspectos como nutrição, reprodução, genética, sanidade, etc. Enfim, é um livro que busca mostrar a importância dessa raça como uma raça única para uma região também única no mundo.

11. Estamos curiosos para saber, quais os próximos passos para a pesquisa com a raça Pantaneira? R: Apesar do avanço das pesquisas científicas com o cavalo Pantaneiro, ainda há muito a ser feito, porém gostaria de destacar três linhas de pesquisas importantes: a) Intensificar os estudos nas características de adaptação como resistência dos cascos à umidade e avaliação morfofuncional; b) Desenvolver de um programa de conservação e melhoramento da raça que seria coordenado pela ABCCP com a participação de equipe multidisciplinar de pesquisadores e demais atores do processo. Para implantar quaisquer programas de melhoramento, um dos pré-requisitos é a existência de um banco de dados de longo prazo. Com relação ao cavalo Pantaneiro, a ABCCP mantém um banco de dados com informações da genealogia, pelagem e de 15 características morfométricas, das quais podem ser gerados diversos índices de morfofuncionais. A partir deste banco deverá ser criado um sistema de gerenciamento de dados, visando implantar um sistema que oriente os acasalamentos da raça levando em consideração as características morfofuncionais e a manutenção da diversidade dentro da raça, ou seja, produção de progênies com o mínimo de consanguinidade. Com esta iniciativa, os estudos complementares necessários para o desenvolvimento do programa de melhoramento serão direcionados, contribuindo para a construção participativa de um programa que leve em consideração as principais características da raça; c) Incrementar o agronegócio do cavalo Pantaneiro, tema essencial para a valorização e comercialização da raça para que esta se conserve para sempre.

Muito obrigado Sandra pela sua pronta atenção ao nos atender, parabéns pelo seu trabalho que nos enche de orgulho. Sua contribuição ao país pode muito bem ser verificada em sua entrevista, a qual lhe agradecemos de coração! Afrânio. 99


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c) Área Vegetal Ignácio José de Godoy Por Renato F.A. Veiga

Eng. Agr. pela UNESP – Botucatu-SP-Brasil (1972), PhD. Universidade da Florida - Gainesville, FL, EUA (1981). É e Pesquisador Científico VI do Instituto Agronômico de Campinas – IAC, desde 1975, nas linhas de melhoramento genético (sendo responsável pelo lançamento de 15 cultivares) e tecnologia de produção de amendoim (Arachis hypogaea L.). Com 69 artigos científicos publicados, 1 livro, 13 capítulos de livro, 59 artigos e 100 resumos publicados em congressos, e 17 outras publicações. Com 9 orientações de mestrado, 3 de doutorado, 2 de pós-doutorado. Mantém estreita interação com o setor produtivo, atuando também na difusão de conhecimentos sobre esta cultura. Também desenvolve trabalhos ligados à exploração da diversidade genética de germoplasma e colabora em projetos que envolvem o desenvolvimento e uso de marcadores moleculares na seleção para caracteres de importância agronômica. Dentre os cargos administrativos que ocupou, no IAC, destacam-se os de Diretor da Divisão de Plantas Industriais, Chefe da Seção de Oleaginosas, Chefe da Seção de Genética, e o de Diretor do Centro de Plantas Graníferas. Recebeu homenagens como:2013 - pelos serviços prestados em prol do amendoim no Brasil, Camap e Sindcato Rural de Tupã, SP. 2010 - Prêmio IAC - Pesquisador do Ano, Instituto Agronômico de Campinas. 2008 - Contribuições relevantes para o desenvolvimento tecnológico do amendoim, UNESP/Jaboticabal. 1990 - Prêmio Summa Phytopathologica pela co-autoria do trabalho - Variação nos sintomas e resistência do amendoim a Phoma arachidicola, Grupo Paulista de Fitopatologia. 1980 - Gamma Sigma Delta Honor Society, University of Florida (USA).

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1. Ignácio, quando iniciei meus trabalhos de caracterização morfológica com o BAG Amendoim do IAC, em 1980, pela Seção de Botânica Econômica, você atuava pela Seção de Oleaginosas, e se encontrava nos EUA fazendo seu doutorado. Em que esta experiência lhe foi útil para sua vida profissional? R: Um doutorado no exterior é uma oportunidade muito valiosa. Dá um upgrade nos conhecimentos científicos, amplia os horizontes profissionais, estabelece interações com pessoas de outros países, além de aprimorar a proficiência em uma língua estrangeira. Foi muito gratificante passar por essa experiência. 2. Você e sua equipe fizeram um trabalho muito bom com a caracterização agronômica do BAG Amendoim, no início de sua carreira, isto ainda hoje lhe traz resultados positivos para o seu trabalho? R: Os resultados são de grande valia até hoje, principalmente o banco de dados de resistência a doenças. 3. Sempre te perturbei com relação a efetivar o melhoramento com germoplasma alternativo do BAG, em especial com as sementes variegadas que julgava muito importante para consumo in natura pelo pequeno agricultor. Sei que você chegou a tentar uma linha secundária de melhoramento com germoplasma deste tipo, isto não deu resultado? R: As sementes de cor variegada hoje não têm valor para o mercado de amendoim; mas muitos desses acessos trazem outras características agronômicas de interesse, principalmente a resistência a doenças foliares. 4. Há uns 15 anos atrás você chegou a ficar desanimado e me confessou que pensava em parar com o melhoramento do amendoim e seguir para outra cultura. Os anos se passaram, suas cultivares chegaram ao mercado e com isto houve uma virada no mercado e o amendoim voltou a ser relevante para o estado de São Paulo. Para a sorte do Brasil você continuou, valeu a pena a luta? R: Houve sim um certo desânimo naquela época porque o mercado de amendoim, como produto para óleo, era insipiente e não havia demanda pelo setor produtivo. Felizmente persistimos no trabalho de melhoramento e, com o desenvolvimento e modernização da cadeia de produção de amendoim no Brasil, tanto para o mercado brasileiro como o de exportação, os produtos do nosso trabalho (cultivares) fazem parte do potencial tecnológico que o amendoim exibe atualmente. 5. Neste tempo em que trabalhou com o melhoramento genético do amendoim, qual a relevância que você pode citar do BAG-Amendoim para o seu trabalho até hoje? R: Diversos acessos do BAG têm sido utilizados no programa de melhoramento, daí, portanto a relevância de manter uma coleção de germoplasma junto ao programa.

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6. Em determinada época você participou de expedições científicas de coleta de germoplasma pelo estado de São Paulo, inclusive tendo me convidado em algumas oportunidades. Em que esta atividade pôde ser útil profissionalmente para você? R: As expedições ao longo das regiões produtoras de amendoim em São Paulo auxiliaram no maior conhecimento da diversidade ainda existente na época (década de 1980); alguns acessos foram coletados e incorporados à coleção. 7. Estive com você em duas oportunidades na Argentina, conhecendo o trabalho lá realizado com o amendoim, tais viagens incrementaram o seu trabalho? R: As viagens à Argentina foram muito úteis para conhecer a região de amendoim daquele país, traçar paralelos com a realidade em SP, além de propiciar integração com pesquisadores daquele país. 8. Você também esteve no ICRISAT, na Índia, onde se encontra o principal BAG Amendoim, em quantidade de acessos, no mundo. Mesmo uma viagem curta como esta pode ser útil para um melhorista genético de plantas? R: A viagem ao ICRISAT foi de grande valia. Além do estabelecimento de contato com pesquisadores da Índia e de outros países, tivemos a oportunidade de trazer para o Brasil diversos acessos do germoplasma indiano, enriquecendo em muito a coleção do IAC. 9. Se tivesse que começar de novo um trabalho de melhoramento genético, qual cultura escolheria, e por que? R: Escolheria o amendoim mesmo. Primeiro porque obviamente os muitos anos de trabalho com esta espécie acabam por criar uma satisfação pessoal e, além disso, porque vislumbramos para o futuro novos e interessantes desafios no melhoramento desta cultura. 10. Ao longo da minha vida profissional vi você trabalhando com colegas das mais diversas áreas do IAC, e de outras instituições. Qual a relevância que você considera no trabalho integrado em melhoramento genético? R: É muito importante a integração do melhoramento com outras áreas de conhecimento, tais como a Fitopatologia, Entomologia e Fitotecnia. O melhoramento genético utiliza muito os conhecimentos dessas áreas. Ignácio aproveito-me desta oportuna entrevista para lhe agradecer por tudo que fez por mim, muito aprendi com você no meu trabalho cotidiano de caracterização morfológica aplicada ao amendoim, quer seja no meu dia a dia no IAC, quer em nossas viagens internacionais e expedições científicas de coleta de germoplasma. Lembro-me com carinho de toda nossa trajetória, desde a época em que eu ainda era solteiro e nos reuníamos para cantarolar modas de viola. Obrigado por sua amizade e paciência na transmissão de conhecimentos que ainda me são muito úteis! Renato

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IV - EXPRESSE A SUA OPINIÃO 1. Por que acreditamos que a Rede Brasileira de Jardins Botânicos pode se integrar com a Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos? Renato Ferraz de Arruda Veiga & Renato Steck

Eng. Agr. FAZMACG (1979), Me. e Dr. pela UNESP-Botucatu. Pq C VI (aposentado) pelo Instituto Agronômico de Campinas. Diretor Técnico e de Divulgação da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos (SBRG),

Eng. Agr. (1997) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pós-graduação “Gerente de Cidades” (FAAP). Diretor do Jardim Botânico de Jundiaí (JBJ) e VicePresidente da Rede Brasileira de Jardins Botânicos (RBJB).

Contextualização Considerando-se que a integração entre grupos científicos seja essencial para que haja novas ideias permeando seus indivíduos, evitando assim uma “consanguinidade”, bem como permitindo teoricamente uma melhor distribuição nacional dos recursos advindos de instituições financiadoras quando não há duplicação de projetos semelhantes, acredita-se ser essencial discutir a questão de integração de Redes e Sociedades diversas no país, como é o presente caso da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos e da Rede Brasileira de Jardins Botânicos. Os escassos recursos dos sócios também não permitem que os cientistas se associem a diversas sociedades e redes, e a integração permitiria tal associação sem prejuízos financeiros às partes envolvidas. Desta forma pretende-se apresentar neste artigo principalmente o trabalho desenvolvido pela Rede Brasileira de Jardins Botânicos (RBJB), pouco conhecido pelos colegas da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos (SBRG), que por suas semelhanças com o da SBRG já permite a sonhada integração.

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Os Jardins Botânicos no mundo Segundo o Botanic Gardens Conservation International BGCI (2016), ao qual parte de nossos jardins botânicos é filiada, a Rede Internacional de Jardins Botânicos possui aproximadamente 3.362 jardins botânicos e afins, sendo que destes, 500 são membros do BGCI em 115 países espalhados pelo mundo, de onde são pesquisadas, preservadas in situ e conservadas em câmaras frias, in vitro e in vivo ex situ cerca de 100.000 espécies de plantas. Apoia projetos de 100 JB, além de registrá-los na Agenda Internacional de Conservação (Ex: certificado do IAC ao lado). A estratégia mundial para a conservação das espécies vegetais (GSPC) foi aprovada na Conferência das Partes (COP) para o Convênio sobre a Diversidade Biológica (CDB), em 2002, segundo o BGCI, 2016 (2) seguindo cinco objetivos: 1) compreender, documentar e reconhecer adequadamente a diversidade das espécies; 2) conservar urgente e eficazmente a diversidade das espécies; 3) Utilizar de maneira sustentável e equitativa a diversidade das espécies; 4) promover a educação e a conscientização sobre a diversidade das espécies, seu rol de meios de vida sustentável e sua importância para a toda vida na terra; 5) desenvolver as capacidades e o compromisso público necessários para aplicar a estratégia. Os Jardins Botânicos no Brasil Em primeiro lugar temos que entender o que são os Jardins Botânicos brasileiros, para que vejam que há sentido e que há necessidade de aprofundarmos uma integração da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos (SBRG) com a Rede Brasileira de Jardins Botânicos (RBJB). Os jardins botânicos são instituições com excepcional relevância quanto à conservação ex situ devido a sua capacidade de cultivo e armazenamento de sementes de espécies da flora nacional, em especial aquelas vulneráveis e em risco de extinção, disponibilizando-as para a pesquisa científica e o acesso do público em geral através da educação ambiental. No Brasil, os Jardins Botânicos (JB) são instituições oficialmente registradas no Sistema Nacional de Registro de Jardins Botânicos (SNRJB), do Ministério do Meio Ambiente (MMA), cujas principais atribuições são de preservação in situ e conservação ex situ, educação ambiental e pesquisa (meio ambiente, botânica, agricultura, biologia, etc.), além do apoio vital à preservação de ecossistemas naturais, quer sejam de responsabilidade de municípios, empresas, estado, e até mesmo particulares. Conceitualmente, apenas uma pequena parte da sua área total é aberta à visitação e lazer da sociedade, objetivando transferir conhecimentos de educação ambiental e das ciências biológicas, onde pode efetivar a visitação com a necessária segurança individual. A maior área dos JB comumente destina-se às pesquisas científicas, em especial com 104


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meio ambiente, biodiversidade e agricultura, à preservação da flora e fauna nativa, e às edificações laboratoriais, sendo abertas à visitação somente aos cientistas, ou eventualmente numa visitação monitorada à pequenos grupos de professores e estudantes. Na área tradicionalmente destinada às visitas, a maior parte das plantas é identificada taxonomicamente e com dados de passaporte, sendo plantadas visualmente na forma de jardins que atraiam a atenção dos visitantes, e aguce a sua curiosidade pela provocação dos seus sentidos (audição, olfato, paladar, tato, e visão), proporcionando memorizar novos conhecimentos e atitudes preservacionistas, através de placas informativas, de eventos organizados pelos especialistas, ou de monitoramento da visitação. Estas ações podem também ser desenvolvidas nas áreas nativas preservadas pelos JB, onde são disponibilizadas trilhas com determinadas características, também através de algumas plantas identificadas como: plantas alimentícias, aromáticas, medicinais, etc., ou pelo seu gênero, espécie, ou segundo temas como os ciclos econômicos, etc. Assim, a missão de um Jardim Botânico é tradicionalmente a de pesquisar, preservar e ensinar alunos e demais visitantes, visando o enriquecimento, a preservação in situ, a conservação ex situ, a sanidade, a identificação, a caracterização, etc., e o uso dos recursos genéticos vegetais nativos e exóticos. Suas metas são normalmente seguidas pelo Manual Técnico Darwin para Jardins Botânicos (LEADLAY & GREENE, 1999), principalmente as determinadas pelo Plano de Ação para os Jardins Botânicos Brasileiros (PEREIRA, T.S., COSTA, M.L.M.N. & JACKSON, P. W., 2004), integradas à Rede Brasileira de Jardins Botânicos e ao Botanic Gardens Conservation International (BGCI).

A Rede Brasileira de Jardins Botânicos Fundada em 23 de janeiro de 1991 na cidade de Goiânia, Estado de Goiás, portanto ainda jovem nos seus 26 anos de existência, a Rede Brasileira de Jardins Botânicos atualmente congrega um número respeitável de 65 jardins botânicos/similares associados, dos 89 detectados no país. Estes JB têm assim o respaldo internacional e nacional para a oficialização dos JB no Brasil, e desta forma participar de projetos conjuntos, como o tradicional “O Jardim Botânico vai à Escola”, que até já virou livro. Tem por objetivos fomentar e facilitar a criação e implantação de Jardins Botânicos, sendo a entidade que representa os JB no Brasil junto ao Sistema Nacional de Registro de Jardins Botânicos (SNRJB), do CONAMA, que legislam sobre o tema, como a seguir:

Objetivos de um Jardim Botânico segundo a Resolução CONAMA 339, de 25 de setembro de 2003: Em seu Art. 2, a CONAMA considera que os objetivos dos jardins botânicos no Brasil são os seguintes:

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I - promover a pesquisa, a conservação, a preservação, a educação ambiental e o lazer compatível com a finalidade de difundir o valor multicultural das plantas e sua utilização sustentável; II proteger, inclusive por meio de tecnologia apropriada de cultivos, espécies silvestres, ou raras, ou ameaçadas de extinção, especialmente no âmbito local e regional, bem como resguardar espécies econômica e ecologicamente importantes para a restauração ou reabilitação de ecossistemas; III - manter bancos de germoplasma ex situ e reservas genéticas in situ; IV realizar, de forma sistemática e organizada, registros e documentação de plantas, referentes ao acervo vegetal, visando plena utilização para conservação e preservação da natureza, para pesquisa científica e educação; V - promover intercâmbio científico, técnico e cultural com entidades e órgãos nacionais e estrangeiros; e VI - estimular e promover a capacitação de recursos humanos.

Na verdade, não há uma receita única para definir os objetivos gerais de um jardim botânico, estes devem ser acordados internamente conforme a característica e necessidade de cada instituição, e devem estar em consonância com a missão e as metas que os jardins pretendem alcançar. No entanto, há que se enquadrar nas normas existentes no país, se quiser participar de uma organização nacional.

Exigência para oficialização dos JB, segundo a CONAMA 339: Segundo o Art. 6, os Jardins Botânicos são classificados em categorias A, B e C. onde necessitam se enquadrar nos seguintes itens:

1. Categoria "A": I - possuir quadro técnico - científico compatível com suas atividades; II - dispor de serviços de vigilância e jardinagem, próprios ou terceirizados; III - manter área de produção de mudas, preferencialmente de espécies nativas da flora local; IV - dispor de apoio administrativo e logístico compatível com as atividades a serem desenvolvidas; V - desenvolver programas de pesquisa visando à conservação e à preservação das espécies; VI - possuir coleções especiais representativas da flora nativa, em estruturas adequadas; VII - desenvolver programas na área de educação ambiental; VIII - possuir infraestrutura básica para atendimento de visitantes; IX dispor de herbário próprio ou associado a outras instituições; X - possuir sistema de registro informatizado para seu acervo; 106


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XI - possuir biblioteca própria especializada; XII - manter programa de publicação técnico-científica, subordinado à comissão de publicações e/ou comitê editorial, com publicação seriada; XIII - manter banco de germoplasma e publicação regular do Index Seminum; XIV - promover treinamento técnico do seu corpo funcional; XV - oferecer cursos técnicos ao público externo; e XVI oferecer apoio técnico, científico e institucional, em cooperação com as unidades de conservação, previstas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza-SNUC, instituído pela Lei n o 9.985, de 18 de julho de 2000. Tabela 1. Os JB classificados como A, são os seguintes: No. 1 2 3 4 5

Nome do Jardim Botânico JB de São Paulo Instituto de Pesquisas JB do Rio de Janeiro JB da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre JB de Brasília JB de Recife

Estado SP RJ RS DF PB

2. Categoria "B": I - possuir quadro técnico - científico compatível com suas atividades; II - dispor de serviços de vigilância e jardinagem, próprios ou terceirizados; III - manter área de produção de mudas, preferencialmente de espécies nativas da flora local; IV - dispor de apoio administrativo e logístico compatível com as atividades a serem desenvolvidas; V - desenvolver programas de pesquisa visando à conservação das espécies; VI - possuir coleções especiais representativas da flora nativa, em estruturas adequadas; VII - desenvolver programas na área de educação ambiental; VIII - possuir infraestrutura básica para atendimento de visitantes; IX - ter herbário próprio ou associado com outra instituição; X - possuir sistema de registro para o seu acervo; XI - possuir biblioteca própria especializada; XII - divulgar suas atividades por meio de Informativos; XIII - manter programas de coleta e armazenamento de sementes próprio ou associado; e XIV oferecer apoio técnico, científico e institucional, em cooperação com as unidades de conservação, previstas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza-SNUC, instituído pela Lei n o 9.985, de 18 de julho de 2000. 107


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Tabela 2. Os JB classificados como B, são os seguintes: No. 1 2 3 4 5 6

Nome do Jardim Botânico JB do Instituto Agronômico de Campinas JB da Fundação Zoobotânica de Belo Horizonte JB do Inhotim JB Amália Hermano Teixeira, Goiânia JB de Jundiaí JB de Bauru

Estado SP MG MG GO SP SP

Exemplo de uma Fixa de avalição, no caso do IAC, de 2002.

3. Categoria "C": I - possuir quadro técnico-científico compatível com suas atividades; II - dispor de serviços de vigilância e jardinagem, próprios ou terceirizados; III - manter área de produção de mudas, preferencialmente de espécies nativas da flora local; IV - dispor de apoio administrativo e logístico compatível com as atividades a serem desenvolvidas; V - desenvolver programas de pesquisa visando à conservação das espécies; VI - possuir coleções especiais representativas da flora nativa, em estruturas adequadas; VII - desenvolver programas na área de educação ambiental; VIII - possuir infraestrutura básica para atendimento de visitantes; IX - ter herbário próprio ou associado com outra instituição; X - possuir sistema de registro para o seu acervo; e XI - oferecer apoio técnico, científico e institucional, em cooperação com as unidades de conservação, previstas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza-SNUC, instituído pela Lei n o 9.985, de 18 de julho de 2000. 108


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Art. 9 o A Comissão Nacional de Jardins Botânicos-CNJB, instituída nos termos da Resolução n o 266, de 3 de agosto de 2000, tem por finalidade prestar apoio à Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, no acompanhamento e análise dos assuntos relativos a jardins botânicos. Art. 10. Compete à CNBJ: I - deliberar sobre os pedidos de criação e enquadramento de jardins botânicos; II - monitorar e avaliar a atuação dos jardins botânicos; e III - elaborar seu regimento interno. Tabela 3. Os JB classificados como C, são os seguintes: No. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Nome do Jardim Botânico Fundação JB de Poços de Caldas JB Municipal Francisca Maria Garfunkel Rischbieter, Curitiba Instituto Mata Atlântica - Melo Leitão Museu de História Natural JB da UFMG JB Plantarum, Nova Odessa JB da UFRJ JB de Salvador JB Municipal de Santos- Chico Mendes JB Municipal de São José Museu Paraense Emilio Goeld e Parque Zoobotânico

Estado MG PR ES MG SP RJ BA SP SC PA

Ainda temos os Jardins Botânicos que tem que cumprir com alguns itens, por prazo determinado, e que por ainda não estarem plenamente capacitados para serem incluídos como C, são colocados com C Provisório. Se atenderem às reivindicações serão incorporados como C definitivo, são eles: Tabela 4. Os JB classificados como C-Provisório, são os seguintes: No. 1 2 3 4

Nome do Jardim Botânico Bosque Rodrigues Alves JB da Amazônia, Belém JB da Universidade Federal de Santa Maria JB do Instituto de Biociências da UNESP-Botucatu JB de Rio Verde - IF

Estado PA RS SP GO

Independentemente do motivo que os levam alguns JB a não terem interesse em se cadastrar junto ao SNRJB, ou não se encontram ainda em condições de cumprir com as exigências mínimas de credenciamento, ainda temos um grande número de JB nestas condições no Brasil, tais como: Tabela 5. JB ainda sem enquadramento no SNRJB. No. 1 2 3

Nome do Jardim Botânico JB de Lajeado Horto Botânico do Museu Nacional da UFRJ JB Museu da Amazônia, Manaus

Estado RS RJ AM 109


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4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49

JB de Pipa JB de Sorocaba JB da UCS, Caxias do Sul Parque Botânico do Ceará JB de Niterói JB de Franca JB Beijamin Maranhão, João Pessoa JB Municipal de Paulínia JB de São Leopoldo, Parque Imperatriz JB de Florianópolis Parque Ambiental de Ananindeua Parque Ambiental de Paragominas JB da UNIVILLE, Joinville JB do Faxinal do Céu, Pinhão Parque Zoobotânico Orquidário Municipal de Santos JB do Mato Grosso, Cuiabá JB de Londrina JB Chapada dos Veadeiros, Cavalcante JB de Campina Grande Sitio Radini – Pomar de Sementes e Frutas da Amazônia, Abaetetuba Mangal das Garças, Belém Jardim Etnobotânico Kalunga, Teresina de Goiás JB de Manaus - SEMMAS Horto Botânico de Albras JB do Sergipe, São Cristovão Sitio Burle Marx - IPHAN JB da UNISINOS Arboreto Marcel Bauer, Aracajú JB de Itatiba JB de Caldas JB de São José do Rio Pardo JB de Timbó JB de Cubatão JB do Piauí JB de Diadema JB de Guarapuava JB da Flora UFPI, Terezina JB de Limeira JB Brasil Kirim, Itu Horto Botânico de Ouro Preto Horto Botânico Del Rey, Olinda JB de Paraty JB de Natal JB de Bonito JB de Vila Velha JB de Americana

RN SP RS CE RJ SP PB SP RS SC PA PA SC PR SP MT PR GO PB PA PA GO AM PA SE RJ RS SE SP MG SP SC SP PI SP PR PI SP SP MG PE RJ RN MS ES SP 110


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50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60

JB da UFJF Orquidário de Guarulhos JB de Porto Seguro J. Etnobotânico da Bahia, Nilo Peçanha Parque Maceió Instituto Orquis Parque Zoobotânico Cachoeira do Sul JB de Aracajú Parque Botânico Vale, São Luís JB de São Luís, Parque das Dunas Parque Zoobotânico de Macapá

MG SP BA BA AL PE RS SE MA MA AP

Feita esta introdução sobre os Jardins Botânicos, mostrando quantos e quais são, suas atividades e excelências, vamos ao título do artigo onde especificamos a relevância de integrálos à Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, o que é facilmente justificável pelas atividades dos JB e dos Institutos, Empresas, Universidades que trabalham com curadorias de recursos genéticos, serem praticamente as mesmas na preservação in situ e na conservação ex situ, o que somente viria a enaltecer a área de recursos genéticos do Brasil perante o mundo. Então o que poderíamos realizar juntos, Rede Brasileira de Jardins Botânicos e Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos? A seguir tentaremos responder esta questão!

O Sistema Nacional de Curadorias e a Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos O SNC foi criado em 2011, durante o I Workshop de Curadores de Germoplasma do Brasil, realizado no Instituto Agronômico, tendo um dos autores deste artigo, o Dr. Renato Ferraz de Arruda Veiga como o seu primeiro Coordenador Nacional. Tem por objetivo principal aglutinar as curadorias de todo o país, de forma a poder auxiliá-las na sua organização e manutenção das coleções. Logicamente que aqui cabe muito bem as curadorias dos Jardins Botânicos do país, desde que a Rede Brasileira de Jardins Botânicos crie o seu sistema de curadorias de germoplasma. Por outro lado, a Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, preocupada com o tema, já incorporou uma nova diretoria que tratará dos temas de Redes de Recursos Genéticos e de Curadorias de Germoplasma. Assim, seria conveniente que a Rede Brasileira de Jardins Botânicos se credenciasse junto a esta Sociedade.

Quais ações poderiam ser desenvolvidas integradamente entre RBJB & SBRG? São muitas as ações possíveis, mas sugere-se, a princípio, estudar algumas ações regionais onde existam universidades, instituições de pesquisa, e empresas, ligadas a biologia, botânica, genética e agricultura, para integrar projetos com os jardins botânicos, tais como: a) integração na gestão de recursos genéticos e coleções biológicas; 111


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b) estruturar, publicar e manter atualizado um website sobre recursos genéticos e educação ambiental, entre outros temas relevantes; c) estruturar programas de gestão de recursos genéticos e coleções biológicas na intranet; d) montar equipes e desenvolver pesquisas de pre-breeding nas diversas culturas pesquisadas; e) implantar a áreas e atividades de Educação Ambiental; f) concretizar atividades de qualidade de sementes e mudas; g) apoiar a efetivação de quarentenas; definir equipes de preservação e inventaria espécies nativas, em risco de extinção, a serem conservadas; h) desenvolver metodologias de conservação de sementes, in vitro, preservação em nitrogênio líquido, e conservação e preservação in vivo; i) inventariar etnovariedades e cultivares em desuso no país; j) caracterizar as novas cultivares e incorporá-las aos herbários; recuperar áreas degradadas; k) outras...

Conclusões Os alicerces de um Jardim Botânico concentram-se em seus recursos genéticos, na pesquisa científica, e no ensino das ciências biológicas e agrícola, e isto é o que nos identifica e justifica plenamente uma integração nacional entre a Rede Brasileira de Jardins Botânicos e a Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, o que inexiste neste momento no Brasil. Lembrando que este texto não teve a intenção de esgotar o assunto integração, e sim atiçar os colegas para que viabilizem tal ação o quanto antes, afinal são 31 Jardins Botânicos trabalhando com a preservação e conservação de recursos genéticos, nos mais variados ecossistemas do Brasil, com os quais poderemos nos integrar.

Referências bibliográficas BGCI. 2016. Botanic Garden Conservation International. In: https://www.bgci.org/. Obtido em: 30/08/2016. BGCI. 2016 (2). The global strategy for plant conservation. In: https://www.bgci.org/files/Plants2020/ GSPCbrochure/gspc_english.pdf. Obtido em: 30/08/2016. CONAMA. 2016. RESOLUÇÃO No. 339, DE 25 DE SETEMBRO DE 2003. Conselho Nacional do Meio Ambiente, Brasilia – DF. Obtido em: 30/08/2016. In: http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res03/ res33903.xml. LEADLAY, E & GREENE, J. 1999. Manual técnico Darwin para jardins botânicos. Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro/Rede Brasileira de Jardins Botânicos, Rio de Janeiro. 154p. PEREIRA, T.S., COSTA, M.L.M.N. & JACKSON, P. W., 2004. Plano de Aça dos Jardins Botânicos Brasileiros. Botanic Gardens Conservation, International. Rede Brasileira de Jardins Botânicos. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro : BGCI : Rede Brasileira de Jardins Botânicos : Jardim Botânico do Rio de Janeiro, 2004. 44 p.

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2) A Necessária Utilização de Estratégia e Tática contra Pragas Quarentenárias A2 no Brasil Afonso Celso Candeira Valois Engenheiro Agrônomo, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Contextualização Algumas atividades em Recursos Genéticos Vegetais são essencialmente básicas para a agricultura, tanto pelo seu enorme benefício na disponibilização de genes para novas cultivares (e até mesmo novas culturas para o país), como também pelo potencial risco fitossanitário, em especial a coleta, o intercâmbio (introdução e remessa) e a quarentena. Considerando a imensidão do território brasileiro com seus 850 milhões de hectares e, devido a isto, as inúmeras dificuldades de controle fitossanitário fronteiriço, são claras as chances da entrada de novas pragas exóticas na agricultura do país, as chamadas Pragas Quarentenárias A2. No entanto, a questão de controle estratégico e tático das pragas pode ser considerada de três maneiras, onde devem ser levados em conta: a) o controle interno daquelas pragas que já se estabeleceram no país há longo tempo; b) o controle interno daquelas pragas que já se estabeleceram no país, mas só recentemente detectadas (as chamadas Pragas Quarentenárias A1), e; c) uma ação anterior à entrada da praga quarentenária, aqui pensando no caso das A2, efetivando a mitigação ou proibição desses condicionantes biológicos que podem vir a penetrar na agricultura brasileira. A enorme responsabilidade de se implementar no Brasil um consistente esquema de segurança biológica é evidente. Esse esforço exigiria barreiras quarentenárias bem equipadas e estabelecidas em pontos estratégicos do país, a serem implementadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), principalmente no momento em que o agronegócio vem assumindo cada vez mais, papel preponderante no pagamento das dívidas do país através das exportações (aqui seria necessária a “reinvenção” da chamada quarentena de exportação), além do consumo interno (etapa posterior à quarentena interna).

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Para os mais céticos, no entanto, de nada adiantaria a aplicação de planos, programas e projetos para coibir a entrada de novos patógenos na agricultura brasileira, pois mais cedo ou mais tarde aqui entrariam. Apesar dessa posição descrente, com a qual não concordamos, pois para o agricultor um ano agrícola negativo já lhe seria extremamente danoso, imagine isto para o país, assim, é incontestável que as medidas premonitórias urgentes sejam programadas pelo governo brasileiro, e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) já vem desenvolvendo projetos com este objetivo no exterior. Exemplo internacional eficiente nessa direção ocorre na Malásia, onde é buscado a todo custo evitar a entrada do fungo Microcyclus ulei nos seringais altamente suscetíveis daquele país. As medidas tomadas são diversas, como o rígido controle de voos domésticos e de passageiros, especialmente provenientes da América do Sul, além de outras medidas de vigilância ostensiva. Para mitigar ou evitar a ação de patógenos, a agricultura brasileira ainda carece de consistentes medidas antecipatórias eficientes. Ainda assim existem exemplos brasileiros históricos que podem ser citados, de programas de melhoramento genético preventivo com o uso inteligente de recursos fitogenéticos, tais como:

Surge a Ferrugem do café no Brasil O primeiro caso emblemático é o da ferrugem do café (Coffea spp.), causada pelo fungo Hemileia vastatrix, onde a equipe do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), sob a coordenação do pesquisador científico, Dr. Alcides Carvalho (foto - já homenageado nesta revista), desenvolveu pesquisas em outro país (Portugal), como medida premonitória, proativa, antecipadora, com experimento implantado em 1953, na expectativa de que o patógeno um dia poderia penetrar no Brasil. Assim, quando finalmente o fungo chegou aos cafezais brasileiros (em 1970) foi “tenazmente recepcionado” por cultivares resistentes ou mesmo tolerantes ao referido patógeno (vantagem comparativa de uma cultivar em relação a outras quanto ao desempenho de um caráter sob as mesmas condições ambientais), sendo prontamente disponibilizadas à agricultura brasileira.

Surge a Sigatoka-Negra da bananeira no Brasil O segundo caso que se destaca aos nobres leitores é sobre o melhoramento preventivo da sigatoka-negra da bananeira, causada pelo fungo Mycosphaerella fijiensis, onde o papel da Embrapa foi preponderante. Nesse sentido, vale a pena um pequeno registro. Quando o autor deste singelo artigo estava na assessoria da Diretoria Executiva da Embrapa, por volta de 1983, trabalhava junto ao Diretor-Executivo, Dr. Raymundo Fonsêca Souza. O referido Diretor, pessoa de excelente índole, tinha como hábito reunir com este autor e com outro assessor, o Dr. Zelson Tenório, já falecido. Isso ocorria toda segunda-feira a partir 114


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das 09h00min horas. Analisavam-se os fatos da semana anterior e planejavam-se as atividades da entrante. Em uma dessas manhãs, o Dr. Raymundo recebeu o saudoso Dr. Dalmo Catauli Giacometti (foto), na época Chefe-Geral da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (então denominado Cenargen). O Dr. Dalmo carregava consigo uma revista trazendo na capa, a figura colorida de uma bananeira severamente atacada pela sigatoka-negra. Após nos mostrar a referida revista técnica, o Dr. Giacometti defendeu que, se nada fosse feito, esse terrível patógeno chegaria ao Vale do Ribeira (São Paulo) e dizimaria a bananicultura brasileira. Diante da ameaça ainda aparente, o Dr. Raymundo, utilizando-se da notável flexibilidade institucional da Embrapa à época, tomou providências imediatas. Foram mantidos contatos com instituições estrangeiras e internacionais detentoras de germoplasma resistente à nefasta doença, formou-se uma equipe com colegas do Cenargen e da Embrapa Mandioca e Fruticultura (Cruz das Almas-BA), sendo a missão realizada com inteiro sucesso. Os genótipos resistentes foram introduzidos, passando pelo Quarentenário do Cenargen, e depois plantados naquele Centro baiano para confirmação de testes de campo no país, além de outros fins. O início desse notável programa de melhoramento genético preventivo contou ainda com a participação de colegas da Embrapa Amazônia Ocidental (Manaus-AM) e Embrapa Acre (Rio Branco-AC). Desta forma, quando a sigatoka-negra chegou ao Brasil foi “plenamente acolhida e rechaçada” por genótipos geneticamente resistentes. Nesse período, a Revista Veja publicou uma reportagem onde se lia que “o brasileiro deixaria de comer bananas”. Mas, felizmente, os recursos fitogenéticos, o melhoramento genético preventivo e a força institucional da Embrapa não permitiram que isso viesse a ocorrer. Este autor recorda-se ainda que, quando adolescente, em São Luís (MA), ouvia, toda manhã, um vendedor ambulante de frutas tocando o sino do carrinho anunciando que tinha “banana maçã macia”. Pois bem, a sigatoka-amarela dizimou a banana maçã no Maranhão, enquanto a sigatoka-negra fez esse "serviço" nas demais terras de cultivo do produto no Brasil, pois ainda não ocorria nesse Estado nordestino. Certa vez, em Maracay (Venezuela), este autor participou de eventos técnicos, incluindo a visita a um banco de germoplasma com genótipos resistentes à sigatoka-negra, inclusive do grupo FHIA, daqueles introduzidos com sucesso no Brasil (FHIA 1 e FHIA 18). No mercado municipal de Tefé (AM), o autor encontrou bananas FHIA, inclusive tendo o sabor semelhante ao da banana maçã, tendo se lembrado daquele astucioso vendedor de São Luís. Em Tefé, as pessoas comentavam que voltaram a comer banana maçã! Quando o autor coordenava o Convênio da Embrapa com o Governo do Maranhão e outras instituições da sociedade civil organizada para a realização de PD&I, confirmou que a sigatoka-negra ainda não tinha penetrado naquele Estado. Diante desse fato auspicioso, o autor 115


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se motivou, fortaleceu medidas preventivas e manteve contatos institucionais com a Embrapa Amazônia Ocidental e com o Governo do Estado do Amazonas, detentores de genótipos de elevado valor fenotípico quanto ao citado caráter, tendo introduzido dez variedades resistentes e plantado em vários locais do Maranhão, como medida preventiva, proativa ou antecipadora, de caráter premonitório. A foto inicial deste artigo mostra o autor deste texto junto a uma bananeira resistente à sigatoka-negra, com um cacho muito bem formado, em comunidade agrícola do município de Barreirinhas (MA).

Conclusões Os exemplos deste texto servem para enfatizar a enorme importância do enriquecimento, manejo adequado e uso sustentável dos recursos genéticos para o Brasil!

Referências bibliográficas VALOIS, A. C. C. Segurança biológica na agricultura, pecuária e florestas. IICA/PROCITROPICOS: BrasíliaDF, 2016. 66 p.

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3) Campanha da Fraternidade 2017: Vamos Salvar os Biomas Brasileiros Dr. José Antônio Jorge Nascido em Serra Negra – SP, graduado em Agronomia pela Utah State University, USA (1958), Me. na Office de la Recherche Scientifique et Technique Outre Mer (ORSTOM) e Universidade de Paris – Paris (1976), Dr. pela ESALQ/USP (1981), PhD. pela Universidade da Flórida – USA (1988), tendo trabalhado no Instituto Agronômico de Campinas, na área de solos e fitotecnia, até se aposentar, e Gerente da Fábrica de Rações Purina do Brasil Alimentos LTDA. Sendo também graduado em Advocacia pela Faculdade Fundação de Ponta Grossa - PR., e ainda graduado em Ciências Religiosas, pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (1996), Mestre em Teologia, autor do Dicionário Informativo Bíblico, Teológico e Litúrgico e do livro “Escuta Cristã”, com 4.000 verbetes e o Livro “Escuta Cristã”, para acolhimento de pessoas que sofrem. Atualmente é Diácono da Arquidiocese de Campinas.

A Campanha da Fraternidade nada mais é que uma campanha anual da Igreja Católica brasileira, coordenada pelos bispos da CNBB, sempre realizada do início da Quarta Feira de Cinzas persistindo até a Páscoa, objetivando incrementar a solidariedade cristã para problemas brasileiros emergentes, e indicando possíveis caminhos. O tema da CF 2017 foi “Fraternidade: Biomas brasileiros e defesa da vida” e o lema “Cultivar e guardar a criação” (Gênesis 2,15). O objetivo geral da Campanha deste ano foi cuidar da criação dos biomas brasileiros, dons de Deus, e promover relações fraternas com a vida e a cultura dos povos à luz do Evangelho. Bioma (“bio”= vida e “omas”= “sistema”), diz respeito ao conjunto dos seres vivos de uma área. Os portugueses ficaram maravilhados ao chegar ao Brasil em 1500 pelo volume de águas que depararam, classificadas por Pero Vaz de Caminha como “infinitas” possibilitando a produção de tudo o que for plantado: “em se plantando tudo dá”. Impressionou igualmente aos colonizadores a presença de homens e mulheres todos nus, sem malícia e muito acolhedores. Também ficaram extasiados com a exuberância da Mata Atlântica. São seis os Biomas brasileiros: Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal. O Brasil abriga 15% de toda biodiversidade do mundo. A floresta amazônica no Brasil abrange mais de quatro milhões de quilômetros quadrados. Nesta área gigantesca, em sua megadiversidade, crescem cerca de 2.500 espécies de árvores e 30 mil espécies de plantas. A Amazônia com 24 milhões de pessoas tem uma importância incalculável para o ciclo das águas e do carbono não só no Brasil, mas para todo o planeta. A Caatinga (“Kaa”= “mata” e “tinga” = “branca”), adaptada aos solos secos do semiárido, ocupa 117


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11% do território brasileiro, sendo que 40.000 hectares já se degradaram em deserto. Este Bioma abriga 178 espécies de mamíferos, 591 espécies de aves e 241 classes de peixes. A Mata Atlântica se entendia por 17 estados e hoje este bioma ocupa apenas 8,5% de sua formação original. Há forte presença dos Biomas Cerrado e Mata Atlântica na região metropolitana de Campinas - SP, onde atuo. Dos sete bilhões de habitantes no planeta, o Brasil reparte a Casa Comum com 206 milhões de pessoas. A Sagrada Escritura não usa o neologismo “Bioma”, mas fala muito forte da Criação. A Palavra (“dabar”) de Deus gera acontecimento. Em Gênesis 2 tudo era deserto e Deus intervém e coloca o homem e a mulher num jardim. A Criação foi perfeita, mas o ser humano pela ganância e desatino se comportou como um tirano contra a Natureza, devastando-a, gerando desequilíbrios econômicos e sociais.

Finalizando, como diz a oração da Campanha, reconhecendo que somos hóspedes da Terra: “Deus, nosso Pai (...) criastes o universo com sabedoria e o entregastes em nossas frágeis mãos para que dele cuidemos com carinho e amor. Ajudai-nos a ser responsáveis e zelosos pela Casa Comum”. Amém.

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V - EVENTOS Aconteceu IV Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos – IV CBRG O IV CBRG aconteceu no período de 08 a 11 de novembro de 2016, no Centro de Convenções Expo Unimed no município de Curitiba-PR, sendo promovido pela Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos e realizado pelo Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) e teve como tema central “Recursos genéticos no Brasil: a base para o desenvolvimento sustentável”. O evento abordou temas específicos para cada área: animal, microrganismo e vegetal. Desse modo, foram organizadas mesas redondas e painéis simultâneos direcionados separadamente para as três áreas, bem como palestras transversais que abordaram temas gerais para que todos pudessem participar. Participaram do IV CBRG 480 congressistas e foram recebidos um total de 572 trabalhos científicos com os resultados de pesquisas dos participantes inscritos e aprovados para apresentação, sendo 537 na forma de pôster e 35 apresentações orais.

Concomitante ao IV CBRG ocorreram:

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a) O IV Workshop de Curadores do Brasil que contou com a participação de 110 profissionais e teve como objetivo debater pontos específicos relacionados à curadoria dos bancos de germoplasma; aproximar os curadores de bancos de germoplasma, núcleos de conservação e coleções biológicas de diversas instituições do Brasil e discutir as ações que podem ser desenvolvidas para a conservação e o manejo de recursos genéticos.

b) O II Concurso de Fotos e Vídeos da Biodiversidade, visando contribuir com a divulgação e a popularização do tema recursos genéticos. As fotos enviadas foram selecionadas por uma comissão e a votação ocorreu durante o evento, todos os participantes do congresso puderam votar na foto que mais gostaram.

Abaixo segue as fotos dos 5 primeiros colocados.

Concurso Fotos - IV CBRG - 1° Lugar - Foto: Paulo

Sérgio da Costa Moura 120


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Concurso Fotos - IV CBRG 2° Lugar - Foto: Nathalia Hack Moreira Concurso Fotos - IV CBRG 2° Lugar - Foto: Fernanda Vidigal D. Souza

Concurso Fotos - IV CBRG 3° Lugar - Foto: Kleibe de Moraes Silva

Concurso Fotos - IV CBRG 3° Lugar - Foto: Juliana Varkachi

Portes

Concurso Fotos - IV CBRG 4° Lugar - Foto: Amanda Pacheco Cardoso Moura

Concurso Fotos - IV CBRG 5° Lugar – Foto: Catarina Côrrea Puttkammer

Os primeiros colocados na categoria vídeos foram: 1° lugar - Clandio Medeiros da Silva 2° lugar - Paulo Sérgio da Costa Moura 3° lugar - Ana Cecília Ribeiro Castro Os vídeos estão disponíveis em nossa página na internet www.recursosgeneticos.org 121


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c) A I Feira Nacional de Guardiões da Agrobiodivesidade na qual participaram aproximadamente 200 pessoas, entre agricultores, indígenas, populações tradicionais, pesquisadores, estudantes de graduação e pós-graduação, técnicos, chefes de cozinha, consumidores e pessoas que se dedicam a conservar a agrobiodiversidade. A feira contou com o apoio da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pela Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia e pelo Centro Paranaense de Referência em Agroecologia (CPRA). Além da exposição, troca e comercialização de sementes, a feira teve mostra de plantas raras e nativas, abelhas sem ferrão, artesanatos e alimentação orgânica. Os visitantes da feira também tiveram a oportunidade de assistir a palestra "A experiência dos Guardiões e Feiras de Sementes em Terras Indígenas no Brasil", com a pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Dra. Terezinha Dias, e também participaram das Rodas de Prosa, momento em que é feito o intercâmbio de experiências entre os guardiões e reuniões de articulação. Foi realizada ainda uma visita de campo a trabalhos de resgate da raça suína Moura na fazenda da UFPR. Estiveram presentes na feira trocando sementes e conhecimentos as seguintes associações: AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia União da Vitória (PR); a Casa da Semente de Mandirituba (PR); a Associação Brasileira de Amparo à Infância (ABAI); a Associação de Agricultura Orgânica do Paraná (AOPA); a Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESOAR); o Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (CAPA); o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra de Lapa (PR); a Associação dos Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná (ACOPA); a Associação dos Meliponicultores de Mandirituba (Amamel); o Povo Indígena Guarani de Cornélio Procópio (PR) e chefes de cozinha.

Mais informações, assim como o e-book dos anais do IV CBRG, estão disponíveis em nossa página: www.recursosgeneticos.org e na página do evento www.cbrg2016.com.br 122


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Acontecerá III Simpósio da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste Semíramis Rabelo Ramalho Ramos Engenheira Agrônoma pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB-1990), Mestrado em Genética e Melhoramento de Plantas pela Universidade Federal de Viçosa (UFV1995) e Doutorado em Melhoramento Genético de Plantas pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF-2003), Campos, Rio de Janeiro, RJ. Atualmente é Pesquisadora A da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, EMBRAPA, Unidade Embrapa Tabuleiros Costeiros, Aracaju - Sergipe. Especialização em Recursos Genéticos Vegetais com os temas: Manejo de Bancos de Germoplasma, Melhoramento Vegetal, Melhoramento Participativo, Cucurbitáceas, e Cocos nucifera. Atualmente é Curadora do Banco Internacional de Coco para a América Latina e Caribe (ICG), o qual se encontra vinculado à Rede Internacional de Coco (COGENT). É também Vice-Presidente da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste (RGVNE) e Vice-Diretora de Redes Regionais e Curadorias da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos (SBRG)

A Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste (RGV-NE), com o apoio da SBRG, promove a terceira edição do seu Simpósio, que será realizado na cidade de Aracaju no período de 08 a 11 de outubro de 2017, apresentando como tema “Agrobiodiversidade: valor, conservação e uso”. O tema do Simpósio tem importância cientifica e tecnológica e está alinhado à conservação e o uso sustentável da agrobiodiversidade, a necessidade de valorização da importância nutricional das espécies nativas e exóticas, espécies subutilizadas ou negligenciadas, com vistas à possibilidade de maior inclusão e inovação em programas que possam contribuir para melhorar a segurança alimentar e a nutrição humana. Na programação do III Simpósio da RGV-NE, serão abordados temas como conservação da biodiversidade agrícola e estratégias para conservação e desenvolvimento local sustentável; estratégias de inovação para acesso aos recursos genéticos na alimentação considerando, inclusive as plantas subutilizadas e os novos costumes alimentares. Além disso, serão discutidos procedimentos de avaliação e uso do germoplasma frente ao desafio das mudanças climáticas, assim como de acessar e descobrir novos usos para as plantas. 123


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O evento também promoverá o “Recursos Genéticos no Parque”, que será realizado no Parque da Sementeira e terá o objetivo de popularizar o tema junto à sociedade. Também haverá uma visita técnica a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) do Caju e aos bancos de germoplasma situados no campo experimental da Embrapa Tabuleiros Costeiros, em Itaporanga d’Ajuda, no estuário do Rio Vaza-Barris. Com essas ações, o evento garantirá um espaço de discussão entre pesquisadores e cidadãos de forma a promover o avanço da ciência, em especial no contexto dos desafios do desenvolvimento sustentável. Maiores informações estão disponíveis no site do evento: www.rgvne.org/3simposio/ Sócios da SBRG tem descontos nas inscrições! Venha prestigiar nosso evento!

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VI – MEMÓRIA DOS RECURSOS GENÉTICOS a) Memória Internacional

Erna Bennett (1925-2012) Nasceu em Derry - Irlanda, em 1925, tendo crescido em Belfast, vindo a falecer em 2012, depois de morar em diversos países, por exemplo: logo nos seus primeiros anos de pós-graduação lecionou na Inglaterra, Grécia, Escócia e Roma. Considerada a rainha dos curadores e dos guardiães da biodiversidade. Reconhecida geneticista, com especialização em citogenética, sendo uma das pioneiras na pesquisa em conservação ex situ da biodiversidade vegetal, defendendo que a elas deve ser permitido que ocorra a evolução natural. Também foi uma das primeiras cientistas a levantar a bandeira contra a erosão da biodiversidade mundial, enquanto servidora da Organização das Nações Unidas, além de ter cunhado, na década de sessenta, o termo Recursos Genéticos - para expressar a ideia de que os próprios genes são um recurso, onde sementes camponesas tradicionais são um recurso genético muito valoroso pela variabilidade genética apresentada, recurso este perdido quando foram sendo substituídos por sementes de cultivares elite modernas que apresentam reduzida base genética. Escreveu o livro “Introdução de Plantas e Conservação Genética: aspectos gene-ecológicos de um problema mundial urgente”, em 1964, onde defendeu a necessidade de se conservar e proteger os recursos genéticos, sendo traduzido em várias línguas. Ainda nos anos 1960 trabalhou na Estação de Melhoramento de Plantas da Escócia, onde estudou microevolução e as origens da diversidade genética, com foco em culturas forrageiras e de cereais. Seu trabalho incluiu um grande número de expedições científicas de coleta de germoplasma ao redor do mundo. Trabalhou na FAO/ONU com a conservação dos recursos genéticos vegetais, de 1967 a 1982, onde dirigiu a Unidade de Recursos Genéticos e Ecologia de Plantas Cultivadas nos anos 60 e 70. Em 1970, com o famoso cientista Otto Frankel escreveu o livro clássico "Recursos Genéticos nas Plantas". Bennett também foi um dos membros do conselho fundador da RAFI. Recebeu da ONU a 125


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medalha Meyer, como reconhecimento pela sua contribuição científica, em 1971. (Foto abaixo). Também tinha um grande interesse por traduções e poesia.

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b) Memória Nacional Ahmés Pinto Viégas (1905 – 1986) Por Margarida Fumiko Ito & Christina Dudienas

PqCs Drs. do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Fitossanidade, Instituto Agronômico de Campinas (IAC).

Formou-se como Engo. Agro. pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP), em 1932 e PhD em Filosofia pela Universidade de Cornell, EUA, em 1938. Quando se fala de Recursos Genéticos de Micro-organismos, o nome do Dr. Ahmés Pinto Viégas aparece como expoente coletor, conservador e taxonomista. Este cientista nasceu em Piracicaba - SP, aos 30 de janeiro de 1905. Iniciou sua diversificada vida profissional no Instituto Agronômico (IAC), em 1933, primeiramente na Seção de Genética (1933 - 37), depois na Seção de Fitopatologia (1937 - 40), a seguir foi Chefe da Seção de Botânica (1940 - 45) e retornou como Chefe na Seção de Fitopatologia (1945 - 61), onde permaneceu até sua aposentadoria. Micologista, reconhecido mundialmente, criou e organizou o Herbário IAC-M, reconhecido internacionalmente, onde descreveu taxonomicamente o número impressionante de 250 novas espécies de fungos, e deixou catalogados 8.277 exemplares. Publicou mais de cem artigos científicos, com destaque para a série “Alguns fungos do Brasil”, onde se encontram informações como, por exemplo: II - Ascomicetos; IV – Uredinales, XV - Cercosporae, etc., que descrevem algumas das mais importantes espécies de fungo para a agricultura. Ressalta-se, também, o Dicionário Alemão / Português de Micologia e Fitopatologia. Ainda mais relevante foi, e continua sendo, a obra “Índice de Fungos da América do Sul”, em 1961, para a qual foram dedicados 30 anos de pesquisas. Lembrando que sua obra contém o mais completo índice de fungos do Brasil, até a atualidade! Os exemplares coletados, conservados e identificados, oriundos de diversas regiões brasileiras, encontram-se perfeitamente acondicionados, em envelopes, vidros, caixas, mantendo as características de cada fungo (como a histórica “Pedra de Anchieta”, hoje santificado, publicada em Bragantia). Todas as amostras de fungos catalogadas, as fichas com 127


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suas respectivas descrições e seus relatórios estão sob os cuidados do Centro de Fitossanidade do IAC. Em 1941, criou a Revista Bragantia, que continua em sua plenitude, publicada pelo Instituto Agronômico (IAC), além de ser reconhecido como membro honorário da Associación Latinoamericana de Micología (http://almic.org/). Ahmés Pinto Viégas aposentou-se em 05 de agosto de 1962 e faleceu em 25 de março de 1986, na sua cidade natal.

Margarida e Christina elaboraram este texto, pelo qual somos gratos, já que o homenageado ainda é um grande exemplo a ser seguido, por todos nós da área de recursos genéticos.

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VI – HOMENAGENS PÓSTUMAS Fernando Irajá Félix de Carvalho Por Antonio Wilson Penteado Ferreira Filho

Fernando foi Eng. Agr. (1962) e Me. (1970), pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1962), e Dr. pela University of California (1974).

Atualmente era Professor Associado - I, da Universidade Federal de Pelotas. Em Recursos Genéticos atuou com ênfase em Genética e Melhoramento Vegetal, principalmente com aveia e trigo, minha área de atuação antes da aposentadoria no IAC. Aposentou-se em 1995 como Professor Titular da UFRGS, porém, continuou formando pessoas pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), como Professor Associado I. Participou diretamente do lançamento de 20 cultivares elite de aveia, tento também atuado com o trigo, entre outras culturas. Foi dos poucos brasileiros que receberam bolsa de estudos da Rockfeller Foundation e atuando também na Sociedade Latino-Americana de Genética, além de CAPES, CNPq, e PRODETAB, e ainda consultor do Banco Mundial para projetos agropecuários. Seus orientados colaboram com grandes instituições de pesquisa como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (FEPAGRO), Instituto Rio-grandense do Arroz, Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Universidades Federais do Rio Grande do Sul, de Pelotas, de Santa Maria, de Santa Catarina, e Estaduais de Santa Catarina e de Ponta Grossa, e, ainda, espalhados por países da América do Sul como na Argentina, Bolívia, Chile, e Paraguai. Tive o grande privilégio, na década de 1980, de ter sido seu orientado. Com certeza foi um grande entusiasta do ensino e da pesquisa científica brasileira, cuja dedicação e entusiasmo eram contagiantes. Seus ensinamentos foram de grande valia para a minha carreira de pesquisador científico no IAC. Que Deus dê forças e conforto à Valesca, filhos e netos. Amigo Fernando descanse em paz! Nossa SBRG sente-se honrada em poder homenageá-lo, por seu imenso trabalho em recursos fitogenéticos, assim como agradecemos ao Wilson pelo texto elaborado! 129


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Antonio Fernando Caetano Tombolato Por Dra. Gláucia Moraes Dias

Eng. Agr. pela ESALQ/USP (1977), Me. (1981). e Dr. (1984) pela Universidade de Bordeaux – França, Pós Doc. na Itália (Instituto Sperimentale Per La Floricultura) e China. Atuou em Introdução de Plantas, Conservação, e Embriologia, Fisiologia, Fitotecnia, Micro propagação e Melhoramento Genético, com Frutíferas de Clima Temperado (Ameixa, Caqui, Figo, Macadâmia, Maçã, Marmelo, Nectarina, Pera, Pêssego, Pecã, Pistache, etc.) e Floricultura (Amendoim silvestre, Amarilis, Alstroeméria, Antúrio, Açucena, Bromélias, Cravos, Crisântemos, Hemerocales e Gladíolo, Gloxínia, Heliconia, Rosas, Samambaia, Orquídea, Violeta africana, Zantedeschia, etc.), no Instituto Agronômico de Campinas, por toda sua vida profissional, tendo nos últimos tempos se dedicando mais ao Bambu. .

O Dr. Fernando Tombolato era um ser iluminado, sempre irradiando alegria e conhecimento. Poliglota (falava seis línguas) foi o mais bem-sucedido melhorista de flores e plantas ornamentais que o Brasil já teve. A primeira cultivar de flor lançada comercialmente no Brasil teve sua participação. Também tinha o dom para lecionar, desde alunos da pós-graduação até os jardineiros, sempre com o mesmo respeito e dedicação. Participou de bancas de tese e comissões julgadoras e orientou inumemos estagiários desde iniciação até o doutorado. Foi o Editor Chefe da Revista Brasileira de Horticultura Ornamental e fez parte do corpo editorial da Acta Horticulturae, e entre outras revistas foi revisor da Plant Cell Culture & Micropropagation. Autor de 135 trabalhos científicos, 16 capítulos de livros, 14 textos em Jornais e Revistas e autor de quatro livros, 17 trabalhos completos, 27 produtos tecnológicos, cinco patentes, participou e presidiu eventos, no Brasil e exterior, dentre eles, em 2010 o Primeiro Simpósio Internacional de Recursos Genéticos de Bambu e Palmeiras. Foi Diretor do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento - Jardim Botânico - IAC, a partir de dezembro de 2011, e Presidente da Comissão de Coordenação do Sistema de Curadoria de Coleções do IAC, de julho de 2009 a agosto de 2012. Foi o Curador do BAG de Bambu do IAC, bem como do BAG de Herbáceas Ornamentais da APTA, além de ter sido também um dos presidentes destes sistemas de curadoria. Sua carreira lhe proporcionou muitos prêmios como: 2012 - Curador do Ano, Instituto Agronômico - IAC. 2010 - ISHS Medal, International Society for Horticultural Science. 2009 - VIII World Bamboo Congress Thailand 2009, World Bamboo Organization. 2006 - Amigo do Mercaflor, Mercaflor. 2003 - Organização do V International Symposium on New Floricultural Crops, The International Society for Horticultural Science. 2001 – Homenageado com Nova espécie botânica descrita Alstroemeria tombolatoi M.C., Embrapa - CNPM. Segundo João Luís Carchedi Roxo, do MAPA, escrevendo sobre a morte de Fernando, entre outras coisas, cita: ...e sem medo 130


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de cometer injustiça, com outros pesquisadores, foi o melhor desenvolvedor de variedades novas na área de floricultura no Brasil... Foi ótimo trabalhar profissionalmente ao lado dele e uma honra imensurável ser sua amiga. O Brasil perdeu um grande Cientista que deixa uma lacuna impossível de ser preenchida e seu legado cientifico e humano será lembrado para sempre.

Na qualidade de editor desta Revista aproveito aqui também para homenagear o meu amigo e grande cientista, o nosso “Parinam”. Obrigado por tudo que fez pelos recursos genéticos de plantas ornamentais no Brasil, e agradecimentos à Gláucia pelo texto! Renato F. A. Veiga

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VIII – INSTITUIÇÃO HOMENAGEADA Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”

Em três de junho de 1901, em terras doadas por Luiz Vicente de Souza Queiroz, Piracicaba ganhou seu maior presente, uma escola de ensino agrícola, a Escola Agrícola Prática São João da Montanha. Posteriormente, em 1931, passou a fazer parte da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, integrando a Universidade de São Paulo (USP), com a denominação de Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, em homenagem ao seu idealizador. Localizada em Piracicaba, a 160 km de São Paulo, a ESALQ está instalada em um dos mais belos campi universitários do País, com jardins, parques e prédios históricos, tombados como Patrimônio Público Estadual, e moderna infraestrutura para atividades acadêmicas e científicas, unindo tradição com inovação. Está situada em uma área de 3.825,4 hectares, denominada Campus "Luiz de Queiroz", correspondente a 48,85% da área total da USP e que compreende as quatro estações experimentais - Anhembi, Anhumas, Itatinga e Fazenda Areão (Piracicaba, SP) onde se encontra a ESALQTec - Incubadora Tecnológica. Considerada um centro de excelência, oferece sete cursos de graduação e 15 programas de pósgraduação (PPG) (sendo um internacional), além de duas interunidades e um interinstitucional, que se utilizam de seus 12 departamentos. Desde sua fundação, já formou mais de 14 mil profissionais em nível de graduação e mais de oito mil pós-graduandos (leia mais). No seu dia a dia circulam cerca de 2.000 estudantes de graduação e 1.000 pós-graduandos, além de pós-doutores, jovens pesquisadores e participantes de cursos de pós-graduação lato sensu. A revista Dinheiro Rural divulgou, em sua edição 141, de outubro de 2016, uma lista com as 100 personalidades mais influentes do agronegócio, dentre estes são citados 11 egressos da ESALQ, são eles: - Antonio Roque Dechen (engenheiro agrônomo formado em 1973), Carlos Alberto Paulino da Costa (engenheiro

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agrônomo formado em 1960), Fernando Penteado Cardoso (engenheiro agrônomo formado em 1936), Francisco Beduschi Neto (engenheiro agrônomo formado em 1996), José Graziano da Silva (engenheiro agrônomo formado em 1972), Luiz Carlos Corrêa Carvalho (engenheiro agrônomo formado em 1973), Luiz Gustavo Nussio (engenheiro agrônomo formado em 1987), Maria Priscila Rondino Vansetti (engenheira agrônoma formada em 1980), Mauricio Palma Nogueira (engenheiro agrônomo formado em 1997), Roberto Rodrigues (engenheiro agrônomo formado em 1965), e Rodrigo Peixoto dos Santos (engenheiro agrônomo formado em 1995). Pode-se dizer sem medo de errar que não existe história agrícola brasileira sem a ESALQ, pois ela foi o embrião da nossa agricultura ao formar seus cérebros mais históricos, quer seja ocupando cargos administrativos em governos e instituições, lecionando ou aplicando a pesquisa científica e a extensão agrícola, e porque não dizer da implementação da área de Recursos Genéticos no país. São tantos que seria impossível nominá-los aqui, sem cometer o erro do esquecimento de pessoas relevantes e, portanto, não o faremos!

Nossa singela homenagem e agradecimentos, da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, a todos professores e demais funcionários que ajudaram a formar no passado e àqueles que continuam a construir no presente, mentes férteis para a área de Recursos Genéticos em todas suas atividades, especialmente através do seu ensino teórico e prático em agricultura, floresta e pecuária, aliado à proteção ao meio ambiente.

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IX – APOIO

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X – NORMAS DA REVISTA

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Fale conosco Revista RG News E-mail: revistargnews@recursosgeneticos.org

Sociedade Brasileira de Recursos GenĂŠticos - SBRG E-mail: sbrg@recursosgeneticos.org Acesse nosso site: www.recursosgeneticos.org

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