Revista RG News Vol 3 N°3 2017

Page 1


Revista RG News 2 (1) 2016 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos Revista RG News V2 (3) 2016 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Revista RG News Publicação eletrônica oficial da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos COMISSÃO EDITORIAL DA REVISTA Editor Chefe Renato Ferraz de Arruda Veiga Editor Chefe-substituto Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira Editor Técnico Científico - Área Animal Afrânio Gonçalves Gazolla Editor Técnico Científico - Área Micro-organismos Maíra Halfen Teixeira Liberal Editor Técnico Científico - Área Vegetal Manoel Abílio de Queiróz

DIRETORIA DA SBRG Presidente - Alexandre Floriani Ramos Vice-Presidente - Rosa Lia Barbieri Diretor Financeiro - Marcos Aparecido Gimenes Vice-Diretor Financeiro- Juliano Gomes Pádua Secretário Executivo - José dos Santos Neto Diretor Técnico e de Divulgação - Renato Ferraz de Arruda Veiga Vice-Diretor Técnico e de Divulgação - Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira Diretor de Curadorias e Redes Regionais - Manoel Abílio de Queiróz Vice-Diretor de Curadorias e Redes Regionais - Semíramis Rabelo Ramalho Ramos Diretora de Eventos - Ana Cecília Ribeiro de Castro Vice-Diretora de Eventos - Fernanda Vidigal Duarte Souza


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Revista Recursos Genéticos News - RG News Brasília, DF V.3 (3) 145 p., 2017 ISSN 2526-8074 Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos Foto Capa: Rosa Lia Barbieri - BAG de Cucurbitáceas

A eventual citação de produtos e marcas comerciais, não expressa, necessariamente, recomendações de seu uso pela SBRG. É permitida a reprodução parcial, desde que citada a fonte.

“Quem hoje em dia, percorre o nosso território imenso, há poucos séculos densamente coberto de magníficas florestas e campos férteis, sulcado aqui e ali por castos cursos de água e semeado de miríades de borbulhantes nascentes, verá que disto tudo, que constituía outrora o paraíso dos naturalistas e o notável característico de nossa paisagem, pouca coisa resta… Os homens, havidos de imediatos lucros, sem dedicar ao porvir qualquer sombra de preocupação, semeiam à sua volta uma devastação tão sistemática quanto impiedosa”. Mário Levy, 1952, Revista Chácaras e Quintais

Editada pela SBRG


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Revista RG News v.3, no. 3., 2017 APRESENTAÇÃO A RG News é uma revista oficial da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos. Iniciou com seu primeiro número sendo publicado no segundo semestre de 2015. Com periodicidade semestral, encontra-se neste terceiro número, o terceiro do ano de 2017. Trata-se de uma revista eletrônica que objetiva divulgar textos sobre recursos genéticos. Abrange desde artigos científicos de pesquisa como de trabalhos de extensão, além de possibilitar a divulgação de eventos, contos, homenagens, etc., em recursos genéticos, quer seja animal, micro-organismo ou vegetal. Seu público original é o de associados da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, mas também publica textos de colegas de outras Sociedades Científicas do país e exterior. A língua oficial é o Português, mas também são aceitos textos em inglês e espanhol. Tem a pretensão de alcançar os especialistas que atuam tanto in situ como ex situ, nas Redes e/ou Curadorias, de Bancos Ativos de Germoplasma e de Coleções Científicas (Herbários, Museus, etc.). Os autores são os únicos responsáveis pelo conteúdo dos seus textos, não sendo necessariamente a mesma visão ou opinião da Revista e nem da Sociedade. Os revisores convidados efetivam sugestões apenas com o intuito de uniformização, que também podem ou não ser aceitas pelos autores. Estamos esperando o seu revistargnews@recursosgeneticos.org.

texto,

basta

enviá-lo

para

o

e-mail:

Aproveitem para se instruir, se atualizar e se divertir com os textos de nossa revista. Abraços a todos!

2


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

CONTEÚDO I – A Palavra do Presidente ...................................................................................... 5 II - Artigos de divulgação científica ........................................................................ 7 1. Controle de Fungos na Produção e Manejo da Castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa Humb. & Bonpl.) na Comunidade da Agrovila, Tefé-AM-Brasil...................... 7 2. Preservação de Recursos Genéticos e Genética Evolutiva ..................................... 18 3. Convergência de Tecnologias na Biologia da Conservação/Preservação de Recursos Genéticos.............................................................................................................. 23 4. A Resistência das Plantas aos Insetos e os Recursos Genéticos ............................ 28 5. Retrospectiva Histórica sobre Pesquisa e Desenvolvimento da Seringueira no Brasil ...................................................................................................................................... 32 6. Recursos Genéticos de Frutas Tropicais: Parte 3 ..................................................... 37 7. Recursos Genéticos de Frutas Tropicais: Parte 4 .................................................... 44 8. Variabilidade genética de abóboras da região metropolitana de Manaus, Amazonas ............................................................................................................................... 53 9. O uso do BAG-Feijão do Instituto Agronômico (IAC) no melhoramento genético .................................................................................................................................................. 64 10. Importância dos maracujás (Passiflora L. spp.) e seu uso comercial ................. 72 11. Feijão Carioca: Meio século de sucesso no campo e de revolução na mesa dos brasileiros .............................................................................................................................. 82 12. Gestão e Caracterização do BAG-Passiflora spp. através do Portal Alelo RG da Embrapa ................................................................................................................................. 92 13. Conservação de espécies ameaçadas da flora brasileira no Jardim Botânico Plantarum ............................................................................................................................ 105

III - Expresse a sua opinião ................................................................................... 110 1. O Mistério do Albinismo ............................................................................................... 110 2. Percepção dos riscos, perigos e danos na agricultura, pecuária e floresta ....... 114

IV - Contos ................................................................................................................ 117 1. Meu Primeiro Computador .......................................................................................... 117

V – Entrevistados da vez ........................................................................................ 120 Osmar Cavassan ................................................................................................................. 120 Alexandre Magno Sebbenn .............................................................................................. 122

VI – Eventos .............................................................................................................. 125 1. Aconteceu ........................................................................................................................ 125 a) Inauguração: Embrapa inaugura Centro de Recursos Biológicos Johanna Döbereiner ................. 125 b) SIRGEALC agora é SIRGEAC ....................................................................................................... 128 c) III Simpósio da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste ............................................. 129

2. Acontecerá ....................................................................................................................... 130

3


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

a) V Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos – V CBRG ........................................................... 130

VII – Memória dos Recursos Genéticos ................................................................ 131 Memória Internacional ..................................................................................................... 131 CARL VON LINEU (1707-1778) ......................................................................................................... 131

Memória Nacional .............................................................................................................. 133 ÁLVARO SANTOS COSTA (1912 - 1998) .......................................................................................... 133

VIII – Instituição Homenageada .......................................................................... 136 Instituto Agronômico do Paraná .................................................................................... 136

VIII – Homenagens Póstumas ................................................................................ 137 Hipólito Assunção Antonio Mascarenhas (1930 – 2017) ................................................ 137 Shiro Miyasaka (1924 – 2017) ........................................................................................... 139 Jaison Pereira de Oliveira (1965 – 2017)........................................................................ 141

IX – Apoio ................................................................................................................. 143 X – Normas da Revista .......................................................................................... 144

4


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

I – A Palavra do Presidente Dando continuidade e construindo novos tempos para a Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos!

Alexandre Floriani Ramos - Presidente da SBRG Graduado em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Santa Maria (2000), especialização em Produção Animal (2002) pela Universidade do Estado de Santa Catarina, mestrado em Medicina Veterinária (2004) e doutorado em Ciência Animal pela Universidade Federal de Minas Gerais (2006). Atualmente é pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia onde é curador do Banco Brasileiro de Germoplasma Animal. Tem experiência na área de Medicina Veterinária, com ênfase em Biotecnologia da Reprodução voltada a Conservação de Recursos Genéticos Animais, atuando principalmente nos seguintes temas: conservação de recursos genéticos, caracterização produtiva e reprodutiva de raças localmente adaptadas, transferência de embriões, dinâmica folicular e congelamento de sêmen.

É com enorme satisfação que completo meu primeiro ano à frente da Presidência da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos e sem dúvida posso afirmar que foi um ano muito produtivo. Isso se deve principalmente ao compromisso assumido por toda diretoria, afinal administrar uma sociedade científica é sempre um grande desafio. Das atividades realizadas ao longo desse ano destaco a realização do III Simpósio da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste ocorrido de 08 a 11 de outubro na cidade de Aracaju, organizado pela Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste, e que mais uma vez contou com total apoio da SBRG para sua execução, tornando o evento um grande sucesso. Os anais do Simpósio foram publicados aqui na revista RG News em uma edição especial. Aqui abro um parenteses para ressaltar outra conquista desse ano relacionada a RG News, depois de uma série de ajustes em nosso site, necessários para nos adequar as exigências do Centro Brasileiro do ISSN (CBISSN), conseguimos obter o registro do ISSN de nossa revista eletrônica. Participamos também de eventos e reuniões realizadas pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, da qual a SBRG faz parte, onde debatemos junto aos gestores públicos sobre o cenário de dificuldades que a ciência brasileira vem enfrentando. Além disso, não poderia deixar de citar os preparativos para a realização do V Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos que estão a todo vapor! Ao longo desse ano, juntamente com a comissão responsável pela realização dessa quinta edição do CBRG, presidida pela Dra. Ana Cecília Ribeiro de Castro, uma série de encontros foram realizados seja para definir questões da logística do evento, assim como para captar recursos junto a possíveis patrocinadores e apoiadores. 5


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

O V CBRG acontecerá de 06 a 09 de novemvro de 2018 na cidade de Fortaleza-CE e traz como tema: “Valor, inovação e uso: o futuro dos recursos genéticos”. Temos certeza que o V CBRG será mais um grande evento e para nós membros da SBRG será ainda mais especial, pois iremos comemorar 10 anos de nossa sociedade, por isso reserve a data em sua agenda, por que você não pode deixar de participar! Em nome de toda a diretoria queremos agradecer a todos que ajudaram e participaram deste crescimento. Aproveitamos também para chamar todos a participarem ainda mais, com suas opiniões, sugestões e críticas. As Sociedades são formadas por seus sócios e, para representá-los bem, precisamos conhecê-los, sendo assim, não deixem de entrar em contato conosco!

6


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

II - Artigos de divulgação científica 1. Controle de Fungos na Produção e Manejo da Castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa Humb. & Bonpl.) na Comunidade da Agrovila, Tefé-AMBrasil.

Maria de Nazaré dos Santos Bióloga formada na UEA/CEST.

Afonso Celso Candeira Valois Professor, Orientador na UEA/CEST.

INTRODUÇÃO A Castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa Humb. & Bonpl) - família Lecythidaceae, é rica em selênio, ômega-3, metionina e lisina, além de controlar o mau colesterol- LDL. Estados produtores: Acre, Amapá, Amazonas, Pará e Rondônia. Existem condições inadequadas da comercialização, armazenamento e manejo. Há o perigo da contaminação da castanha por fungos como o Aspergillus flavus Link, que produz a aflatoxina B1, causadora de câncer no fígado, sendo aceito pela OMS o nível de até 4 ppb de aflatoxinas no produto. A principal finalidade desta pesquisa foi identificar a presença de aflatoxinas nas castanhas produzidas na Comunidade da Agrovila, em Tefé (AM), e mostrar as alternativas de controle desse terrível mal. Contextualização A castanha-do-brasil, como é conhecida mundialmente, ocorre nos estados do Acre, Amazônia, Maranhão, Mato Grosso, Pará e Rondônia, recebendo também outros nomes vulgares como castanha-do-pará, tocari, tururi e, apesar do seu nome mais popular, também é encontrada naturalmente na Colômbia, Bolívia, Guianas, Perú, Surinami e Venezuela, sendo considerada a “rainha da floresta amazônica” pela exuberância e esplendor fenotípico com que se destaca, dominando a bela paisagem, pois pode chegar a 60m de altura e cerca de 4m de DAP (diâmetro do caule à altura do peito).

7


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

No município de Tefé (AM), considerado pelos seus nobres moradores como a “terra da castanha”, e em outros locais da hileia onde essa planta nativa está adaptada, geralmente é explorada de forma extrativa, se constituindo em um dos fulcros multifuncionais de agregação de valores para o benefício social, econômico, ambiental, ético, histórico e cultural da sociedade. A amêndoa contida no ouriço da castanheira é considerada um alimento Figura 1. funcional, rico em proteínas, lipídios e vitaminas, bem como em selênio, um Jovem da Comunidade da Agrovila Tefé – AM, 2011. importante antioxidante (evita o envelhecimento precoce das células). Produz o azeite extravirgem de excelente qualidade, antidepressivo, superior ao famoso azeite de oliva, pois tem capacidade para reduzir os níveis do colesterol ruim (LDL), além de possuir alguns ácidos graxos com potencial para combater o câncer, bem como os ácidos “ômega-3” que fazem muito bem à saúde. Dentre os produtos alimentícios de maior uso destacam-se as amêndoas descascadas utilizadas em snacks, cobertura de sorvetes, produção de doces, bolos, biscoitos e bombons, farinhas de elevado teor protéico, além de óleos para uso na culinária, sendo de grande potencial para utilização na merenda escolar e complemento/suplemento alimentar. Por tudo isso é que sua exploração racional é considerada um excelente agronegócio de consumo interno e de exportação sustentável, especialmente para países da América do Norte, Europa e Ásia. Mas, toda essa riqueza natural oriunda da frondosa floresta amazônica poderá ficar seriamente comprometida caso ocorram as micotoxinas (toxinas produzidas por fungos) do grupo das aflatoxinas (B1, B2, G1, G2) mais comuns na castanha-do-brasil, que são metabólitos altamente tóxicos. Essas toxinas, além de comprometerem órgãos vitais atacam o sistema imunológico, causam disfunção do sistema nervoso e sabe-se que podem provocar hemorragias internas nos rins, proliferação dos canais biliares, cirrose, encefalopatia com degeneração gordurosa do cérebro e diminuição da resistência a doenças. A aflatoxina B1, por exemplo, é considerada uma das mais potentes substâncias carcinogênicas conhecidas, existindo fortes evidências de que causa câncer hepático em seres humanos. Logicamente que o efeito das aflatoxinas está na dependência da dose e da frequência com que as mesmas são ingeridas (o que pode ser crônico ou letal), além da idade das pessoas (as mais jovens são mais suscetíveis), do estado nutricional e até mesmo do sexo. O efeito crônico é o resultado da ingestão de doses pequenas (não letais) e que provoca distúrbios e alterações em órgãos de seres humanos e de animais. Vale ressaltar que o risco potencial de desenvolvimento do câncer hepático no fígado não significa que a ingestão das aflatoxinas fatalmente causará o câncer, mas há o risco. Em países da África e Ásia onde infelizmente são consumidos regularmente alimentos contaminados com este fungo, principalente devido ao mau armazenamento, a incidência de câncer do fígado é em torno de 13 casos por 100 mil habitantes, por ano. Além da castanha, as aflatoxinas também contaminam o amendoim, cacau, milho e 8


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

outros importantes produtos. O limite crítico para a aceitação de alimentos contaminados por aflatoxinas é de até 4 ppb. (partes por bilhão). Os fungos responsáveis pela produção dessas toxinas são do gênero Aspergillus, principalmente o A. flavus, que é um microrganismo filamentoso onde o solo é o seu reservatório natural, embora pesquisas estejam sendo realizadas para determinar ou não a presença desse patógeno contaminando o ouriço ainda na árvore. Independente da intensidade da contaminação das amêndoas, o armazenamento e transporte são considerados etapas críticas. Para o caso da armazenagem, dependendo de como for conduzida haverá maior ou menor possibilidade de haver o desenvolvimento do fungo e consequente produção das citadas toxinas. Por esta razão, fatores como umidade e temperatura deverão ser rigorosamente controlados para inibir a produção das aflatoxinas nessa etapa. Variações na temperatura e nos teores de umidade relativa nos armazéns poderão possibilitar a reidratação das amêndoas e o desenvolvimento dos fungos contaminantes. Teores de umidade acima de 16% e temperaturas entre 27-30°C favorecem a produção dos citados patógenos. A castanha está com a presença do fungo quando se encontra com aparência de cor branca, verde ou amarela e nesses casos não poderá ser vendida e nem usada na alimentação. A coloração escura do interior da amêndoa também indica a presença do patógeno e deve ser imediatamente evitada para consumo. Objetivo Verificar e avaliar como está ocorrendo o manejo, transporte e outros tratos da castanhado-brasil na Comunidade da Agrovila localizada no município de Tefé (AM), para que esse rico produto possa ser levado ao consumidor livre dos perigos biológicos advindos da contaminação por aflatoxinas. Material e Métodos a) Material Área do Estudo: Comunidade da Agrovila (Tefé-AM) De acordo com o IDAM (Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas), a Comunidade da Agrovila se localiza aproximadamente a 12 km do centro da cidade de Tefé, estando constituída por 96 famílias na época da pesquisa, tendo o Senhor Wilson Ramos como Presidente. b) Métodos A pesquisa foi realizada durante o segundo semestre de 2011. A aplicação de questionários foi realizada com as pessoas residentes no referido local, contendo perguntas relacionadas ao manejo e transporte das castanhas. A Figura 2 mostra o comportamento das pessoas quanto à limpeza das áreas das castanheiras por ocasião da fase da colheita do produto. Todos os ouriços encontrados embaixo das árvores são coletados diariamente na época da produção. A Figura mostra que a maioria das pessoas limpa as áreas para a coleta dos ouriços, sendo desprezível o número daquelas que não praticam essa tarefa. 9


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figura 2- Comportamento dos castanheiros quanto à limpeza das áreas ao redor das plantas. Tefé-AM, 2011.

Resultados Os resultados obtidos a partir da análise dos questionários demonstram que das 35 pessoas entrevistadas (sendo 21 do sexo masculino e 14 do sexo feminino), todas as pessoas trabalhavam no manejo das castanhas voltado para atividades familiares.

A Figura 3 mostra que as árvores das castanhas são limpas próximo à colheita do produto. Todos os ouriços encontrados sob as árvores são recolhidos para o processamento das práticas adequadas.

Figura 4 mostra o produto sendo transportado em paneiros protegidos por folhas ou plástico, sendo esse processo considerado uma boa prática.

10


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figura 5: Gráfico referente à proteção dos paneiros no momento do transporte da castanha.

Após a coleta, os ouriços são quebrados. Ao quebrar os ouriços, deve-se evitar danificar as castanhas, e aquelas atingidas são retiradas do meio das castanhas inteiras; ocorre a lavagem das castanhas tanto para o consumo próprio quanto para a comercialização. Na lavagem, as castanhas que boiarem nos tanques são retiradas e excluídas do lote. Quanto à conservação do produto, a realização da prática acontece nas próprias casas dos castanheiros, onde também ocorre a secagem do produto após a lavagem. Esses ambientes são limpos diariamente. (Figura 6)

Para a comercialização das castanhas, as mesmas são acondicionadas em sacos de aniagem. Quanto ao transporte do produto para os pontos de comercialização, para este caso da Comunidade da Agrovila, são usados apenas ônibus, sendo que o produto ensacado segue descoberto durante o trajeto. (Figura 7)

De acordo com os entrevistados, no referente à cor da castanha consumida e comercializada (Figuras 8) foi observado que entre os mesmos havia concordância de que: a) A castanha que apresentar cor amarela ou escura na amêndoa indica contaminação; 11


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

b) Consumo e comercialização de castanhas só daquelas que apresentarem amêndoas brancas.

Figura 9: Gráfico referente ao conhecimento dos entrevistados quanto à contaminação pelas aflatoxinas nas castanhas.

DISCUSSÃO Durante a pesquisa, notou-se que a atividade extrativista nas áreas de castanhais não se apresenta como sendo apenas uma etapa no desenvolvimento da comunidade, mas como uma valorização histórica da cultura e estado de pobreza. Esta avaliação concorda com Homma (1996), o qual reconhece que o extrativismo é uma atividade que ainda é importante para as populações amazônicas.

12


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Lira (1976) sugere que a susceptibilidade da castanha frente à contaminação fúngica seja mais uma questão do manejo inadequado no campo e não do transporte e armazenamento deficientes. Há inúmeras publicações referentes a esse tema, pois há muitos cientistas como: Nilsson (1974), e Yndestad & Underdal, (1975), preocupados no sentido de que a estrutura externa do produto deve limitar a penetração de fungos como o Aspergillus flavus, (Figura 10) e consequente produção das micotoxinas.

Figura 10: Fungo Aspergillus flavus

A Figura 11 revela dados utilizados pela Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuáriaEmbrapa, referentes à exportação e devolução por outros países da castanha-do-brasil exportada através do Estado do Pará – 2001, ocasionadas pela ocorrência de aflatoxinas nas castanhas no limite acima do estipulado pela OMS.

7% EXPORTADAS DEVOLVIDAS

93% Figura 11: Gráfico relacionado à castanha-do-brasil (exportação/devolução, Estado do Pará – 2001)

Com vistas à segurança e qualidade da castanha- do-brasil, a Embrapa já realizou inúmeros trabalhos e eventos referentes aos métodos para evitar a contaminação das castanhas oriundas da Amazônia, com destaque para um evento muito importante efetuado em Laranjal do Jarí (AP) em 2005, conforme as Figuras 12, 13, 14, a seguir:

Figura 12: Evento da Embrapa realizado em Laranjal do Jarí- AP, 2005. Chegada dos produtores ao local do evento. 13


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figuras 13: Evento da Embrapa realizado em Laranjal do Jarí- AP, 2005. Explanação sobre as boas práticas, efetuada por pesquisadores.

No Estado do Amazonas, em um estudo realizado por Cunha (2007) na Comunidade do Jutica (Tefé-AM), referente às práticas de controle da contaminação por aflatoxinas, foi verificado que as práticas realizadas naquela Comunidade conferem maiores riscos à contaminação do produto por fungos produtores de aflatoxinas. Recomendações Técnicas e Evidências Para a produção de castanha-do-brasil prioriza-se a aplicação das “boas práticas agrícolas-BPA” de précolheita, colheita e pós-colheita dos ouriços seguindo os princípios do Sistema APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle), sendo fundamental para a produção da castanha livre de perigos biológicos, químicos, físicos e ambientais na produção do “alimento seguro da floresta à mesa”. De maneira geral, as seguintes BPA são recomendadas para proteger a castanha do ataque dos fungos (bolores) e consequentemente evitar a produção de aflatoxinas: 1- Efetuar a limpeza em volta das árvores (Figura 15) componentes das “estradas” que serão utilizadas no processo de coleta dos ouriços. 2- Evitar a coleta integral de todos os ouriços existentes no local para permitir que novas castanheiras surjam no futuro. Nas condições normais, sem a ação criminosa da derrubada da árvore para a comercialização da madeira (de excelente qualidade) ou prática do fogo, a vida de uma planta

14


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

da castanha varia entre 800 e 1200 anos, mas mesmo assim deve haver a preocupação com a sustentabilidade do castanhal. 3- Coletar os ouriços em menor espaço de tempo possível, escolhendo aqueles mais novos. Não coletar ouriços mais velhos, ou seja, de safras anteriores. Os fungos geralmente estão no chão da floresta, daí a recomendação para coletar os ouriços o quanto antes para evitar o contato direto com o solo por muito tempo. Essa medida também evita a exposição do fruto a ação de outros microrganismos, animais silvestres e insetos, além de fatores abióticos como elevada umidade e temperatura que levam à perda gradativa da qualidade dos ouriços. 4- A coleta pode ser semanal, mas se não for possível, os ouriços podem ser apenas juntados semanalmente e colocados em jiraus, que podem ser construídos com materiais rústicos. O ouriço deve ficar com o umbigo (opérculo) voltado para baixo sobre o jirau, para evitar a entrada de água e possível contaminação causada por fungos e outros microrganismos. No ato da coleta deve haver o máximo de atenção devido ao perigo eminente de o ouriço poder cair sobre o coletor, causando-lhe sérios danos físicos! 5lama.

Quebrar os ouriços logo após a coleta, de preferência em local protegido da chuva e da

6-

Não amontoar os ouriços sob as árvores por longo tempo.

7-

Quebrar os ouriços, evitando danificar as castanhas.

8-

Separar as castanhas danificadas (cortadas) das castanhas inteiras.

9- Realizar a catação dos umbigos, castanhas podres, atacadas por cupins e outras impurezas, separando das castanhas boas. 10- Após a coleta e quebra dos ouriços, as castanhas devem ser bem lavadas antes da condução para o paiol, que deve ser coberto, conter frestas de 1,5 cm nas paredes e piso para favorecer a ventilação, possuir assoalho com 1 metro distante do solo e ter proteção contra animais domésticos e silvestres, aves e roedores. De preferência, a lavagem deve ser em água corrente e limpa, como também pode ser efetuada dentro de tanques, desde que a água esteja bem limpa. No processo de lavagem devem ser retiradas as castanhas que boiarem, por não serem boas para consumo. A destinação das cascas dos ouriços deve ser feita para local distante dos pontos de coleta, podendo ser enterradas ou mesmo utilizadas na confecção de artesanatos, uso como combustível e outros fins. 11- Após a lavagem, as castanhas deverão ser secadas no interior do paiol, onde ficarão armazenadas até serem levadas para o galpão de armazenamento. Esses ambientes devem ser mantidos bem limpos e secos, sem conter outros objetos, mas apenas as castanhas. As boas condições do paiol e do galpão são a garantia de que as castanhas estão sendo bem tratadas. 12- Limpar o paiol e galpão a cada comercialização. Evitar molhar as castanhas e guardálas em ambientes escuros antes de cada comercialização com o intuito da obtenção de maior volume e peso, pois o fungo poderá surgir e contaminar todo o produto. 15


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

13- Armazenar as castanhas boas e secas, a granel ou ensacadas. Evitar acondicioná-las em caixas de isopor ou em outros recipientes que favoreçam o acúmulo de água, umidade e temperatura. 14- Proteger os paneiros com folhas ou plásticos quando do transporte das castanhas selecionadas no trajeto da floresta para o paiol. 15- Transportar as castanhas boas a granel ou ensacadas para a comercialização, em veículos adequados (barco, caminhão e outros meios). Os recipientes deverão estar protegidos com lona de plástico a fim de evitar que as castanhas fiquem molhadas quando transportadas em porões ou fundo de embarcações, ou mesmo em carrocerias de caminhões. Antes do processo de comercialização propriamente dito, caso necessário, poderá ser efetuada uma segunda lavagem e secagem das castanhas. A correta aplicação dessas recomendações técnicas seguramente fará com que as castanhas produzidas fiquem protegidas do terrível mal: as aflatoxinas! É muito grande o impacto positivo na comercialização de produtos da castanha com o devido controle dos níveis de aflatoxinas. Assim, por exemplo, na região do município de Brasiléia (AC), a lata da castanha passou de 2 para 26 reais. Em Manicoré (AM), se tem notícia de que para o coletor que produzia uma média de 10 hectolitros, o ganho anual passou de 125 para 650 reais. Outro bom exemplo do enorme interesse pelos produtos alimentícios oriundos da castanha, o Professor-Orientador do presente artigo teve a oportunidade de viajar pela Amazônia com componentes de uma missão da União Europeia integrada por representantes da Irlanda, Alemanha, Inglaterra e Suécia que visitou os municípios amazonenses de Tefé e Manaus, além de Belém (PA), com a finalidade de realizar estudos e levantamentos sobre a cadeia produtiva da castanha e determinar os pontos críticos de controle de ocorrência das aflatoxinas. Os resultados das análises efetuadas possibilitaram a constatação de que é perfeitamente possível comercializar castanhas livres ou mesmo com baixíssimos níveis das citadas toxinas com o uso das boas práticas agrícolas e sistema APPCC. Em outras oportunidades, seguidamente países notadamente europeus rejeitaram partidas de castanha exportadas pelo Brasil devido aos altíssimos níveis de aflatoxinas, o que causou sérios prejuízos para os coletores, empresas, municípios, estados e país. No sentido da criação de conhecimento e experiência, isto é, competência científica e tecnológica no controle da ocorrência das malfadadas aflatoxinas em castanha, instituições de ensino, pesquisa, extensão, fomento e agências de desenvolvimento e de fontes de financiamento vêm despendendo diversos esforços e ações no sentido de debelar esse terrível condicionante biológico da castanha-do-brasil!!! Conclusões Nas pequenas produções e baixas rendas dos castanheiros da Comunidade da Agrovila (Tefé-AM), o manejo e transporte da castanha-do-brasil são realizados respeitando, em parte, o 16


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

processo das “boas práticas agrícolas-BPA”. No entanto, em alguns casos observou-se que muitas das pessoas entrevistadas tinham conhecimentos do processo correto, porém não o praticavam. No consumo do produto, observou-se que são ingeridas castanhas contaminadas, mesmo sendo em pequena quantidade. Nesse sentido, torna-se evidente a enorme necessidade da elaboração e aplicação na Comunidade, de orientações técnicas que permitam a produção da castanha-do-brasil (Figura 16), livre de condicionantes biológicos nocivos à saúde humana, especialmente da aflatoxina B1. Referências CUNHA, A.P.M. Melhorias das práticas tradicionais de manejo da castanha-do-brasil no controle de contaminação por aflatoxinas na Comunidade do Jutica–Tefé-AM. Monografia apresentada ao Centro de Estudos Superiores de Tefé - CEST-UEA, 2007. 47 p. HOMMA, A. K. O. Extrativismo Vegetal na Amazônia: Limites e Oportunidades. Brasília: EMBRAPA – SP. 1993. 202 p. LIRA, M. B. A castanha da Bertholletia excelsa e a aflatoxicose. In: Congresso de Toxicologia Tropical. 1., Manaus. Anais. 1976. p. 153-155. NILSSON, G. Aflatoxin in nuts. Vor Joda, 26: 1974. p. 56-62. YNDESTAD, M.; UNDERDAL, B. Aflatoxin in goods on the Norvegian markets. Noad. Veterinaermed., 27: 1975. p. 48-58. VALOIS, A.C.C. Aflatoxinas – Um perigo que pode estar na castanha-do-brasil. www.procitropicos.org.br. Publicado em 22/02/2010.

17


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

2. Preservação de Recursos Genéticos e Genética Evolutiva Afonso Celso Candeira Valois Engenheiro Agrônomo, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Genética e Melhoramento de Plantas. Foi Vice-Diretor do IPEAAOc-DNPEA, Chefe Adjunto Técnico e Chefe Geral da Embrapa Seringueira e Dendê, Chefe Adjunto Técnico e Chefe Geral da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Diretor Executivo da Embrapa em Exercício, Pesquisador Aposentado da Embrapa, Professor Associado da UnB, Professor Contratado da UEA/CEST, Secretário Municipal de Meio Ambiente de Tefé (AM).

Contextualização A Genética Evolutiva que se constitui em uma síntese entre a genética e a ecologia de populações vem contribuindo para o desenvolvimento de princípios que têm grande aplicação na preservação e uso de recursos genéticos, especialmente em condições naturais. Deixando claro aqui que neste trabalho o termo “preservação” é utilizado para os recursos genéticos in situ, enquanto “conservação” é empregado para os recursos genéticos ex situ.

Figura 1. BAG Arroz, Filipinas.

Embora se conheça a necessidade do estabelecimento de bancos ativos de germoplasma (BAGs) através da coleção de sementes, indivíduos adultos ou cultura de tecidos, a implantação de reservas genéticas precisa ser considerada como parte de uma estratégia global de preservação (Figura 1). Esta necessidade é premente tendo em vista a velocidade com que os habitats vêm sendo perdidos, fragmentados ou transformados pelas diversas atividades humanas.

As consequências disto são a redução drástica da variabilidade genética ou mesmo extinção de espécies, a subdivisão de habitats, a formação de novos ambientes, o aumento das condições de estresse, a mistura de conjuntos gênicos antes isolados, a intensificação da hibridação introgressiva (cruzamento interespecífico repetido ou mesmo contínuo, ocasionando infiltração de genes de uma espécie para outra, em decorrência de falhas do mecanismo de isolamento reprodutivo, podendo ainda ocorrer segregação transgressiva, isto é, aparecimento de gerações segregantes com fenótipos diferentes dos progenitores com relação a um ou mais caracteres) e mesmo, a origem de novos taxa. Todas essas mudanças no ecossistema envolvem processos evolutivos. Dentro deste contexto, a Genética Evolutiva oferece o instrumental necessário para os estudos desses processos a curto e longo prazo, e a possibilidade de se prever as consequências genéticas e ecológicas dessas alterações tanto no nível de populações como de comunidades. Consequentemente, a Genética Evolutiva vem oferecendo embasamento teórico para a discussão de tópicos como a manutenção da variabilidade dentro e entre populações, sobrevivência e extinção, estabilidade da densidade populacional e diversidade dentro de comunidades, entre outras. Esta discussão é fundamental tendo em vista que o objetivo básico 18


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

da preservação in situ é a manutenção da variabilidade genética suficiente para possibilitar a evolução contínua em ecossistemas que vêm sendo modificados no espaço e no tempo. A preservação de germoplasma envolve tanto comunidades inteiras como populações de espécies silvestres, bem como, os complexos de espécies “cultivadas-invasoras-silvestres” comuns em muitos centros de origem. Como é sabido, as espécies vegetais podem apresentar distribuição geográfica ampla ou ocorrer de forma endêmica em uma área restrita e, dentro da sua amplitude de distribuição podem ocorrer de forma esparsa ou concentrada, formando colônias. Além disso, as populações podem apresentar variações periódicas ou estacionais de densidade. As primeiras consequências das alterações causadas pelo ser humano nos ecossistemas ocorrem normalmente sobre os padrões de distribuição geográfica e de abundância, podendo levar tanto à extinção (caso de espécies endêmicas) como a descontinuidade na distribuição geográfica, criando várias “ilhas ou demes” de tamanho e densidade variáveis, alterando o padrão de variação genética. O processo de quebra da distribuição contínua de espécies em “ilhas” ocorreu em áreas extensas no passado devido a mudanças ambientais ou mesmo atividades antrópicas extrativistas, pastoris e agrícolas que vêm ocorrendo aceleradamente no presente (Figura 2.). Um exemplo bem marcante Figura 2. "Ilhas" de vegetação. quanto à ocorrência dessas “ilhas” na Amazônia é aquele que ocorre nos lavrados de Roraima, onde maciços florestais estão em meio à vegetação de cerrados. Pelo lado oposto, no Acre foram abertas clareiras em meio à floresta para o estabelecimento artificial da seringueira (Hevea spp.), visando ao enriquecimento! Essas alterações drásticas dos padrões de distribuição têm implicações na estrutura demográfica (flutuação e redução da densidade) e na estrutura genética (manutenção da variabilidade e sobrevivência) e se constituem em ameaças centrais tanto para a preservação in situ (estratégias de manejo) como a conservação ex situ (estratégias de amostragem). O desenvolvimento dos aspectos teóricos relacionados à diversidade de espécies em “ilhas” recebeu grande impulso a partir da “teoria de biografia de ilhas” em 1967. Segundo esta teoria, a diversidade de espécies aumenta proporcionalmente ao tamanho da “ilha” a das taxas de imigração, porém a composição de equilíbrio depende das relações entre as taxas de colonização e extinção, da diversidade ambiental e dos resultados da evolução dos nichos. Por outro lado, as taxas de colonização dependem das taxas relativas de nascimento e morte (tabelas vitais), da capacidade de dispersão e das alterações evolutivas nesses parâmetros, considerando que o efeito de dispersão entre “ilhas” é função do tamanho e distância entre as mesmas. Essa teoria tem implicações nas estratégias de amostragem do material genético dentro 19


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

e entre “ilhas” e no manejo de reservas genéticas que podem ser formadas por uma grande área, porém com inúmeros habitats ou “ilhas” internas, ou serem constituídas por diversas pequenas áreas isoladas dentro de uma região. A variação genética dentro de uma espécie subdividida em “ilhas” foi extensivamente pesquisada, principalmente em relação às características de mudanças evolutivas. Assim foi mostrado que o balanço dos vários fatores evolutivos (mutação, migração, recombinação, seleção natural e deriva genética) é quem determina o padrão de variação, e não um único fator isolado. Por exemplo, na ausência da seleção natural, a deriva genética tende a produzir grande diferenciação genética, enquanto a migração entre populações tende a diminuir o efeito da deriva. Deve-se chamar a atenção para o fato de que a variação genética pode oferecer um importante instrumento para pesquisas ecológicas, principalmente para monitorar as estratégias de manejo a serem empregadas na preservação de espécies em reservas naturais. Nesse sentido, estudos experimentais envolvendo polimorfismo genético são essenciais na determinação do tamanho efetivo da população, da condição da estabilidade demográfica, da quantidade da variabilidade genética para a evolução contínua, das ameaças resultantes do isolamento reprodutivo e da endogamia depressiva. Esse polimorfismo pode ser expresso no nível morfológico (marcadores genéticos fenotípicos), marcadores moleculares ou mesmo com o uso da técnica do DNA recombinante. Dentro da necessidade da reconstrução de nichos alterados pela implantação de áreas de preservação de recursos genéticos in situ, aparece a restauração ecológica na qualidade de uma nova estratégia de se estabelecer reservas genéticas em áreas degradadas. Neste caso, a Genética Evolutiva tem a oferecer princípios que permitem entender as ameaças relacionadas à adaptabilidade, persistência das populações, padrões espaciais de distribuição e abundância, além da dinâmica de sucessão, essenciais na restauração ecológica para a preservação in situ. Portanto, a Genética Evolutiva que nestes últimos anos vem buscando uma síntese entre a genética e a ecologia de populações, tem a oferecer aos pesquisadores envolvidos na preservação de recursos genéticos e outros interessados, um conjunto de princípios fundamentais no equacionamento de estratégias que visam fundamentalmente, a manutenção ou estabelecimento de condições que permitam a continuidade dos processos evolutivos. A possibilidade dessa continuidade e da evolução de novas estratégias adaptativas aos ambientes que vêm sendo alterados rápida e profundamente através de ações antrópicas é condição essencial não só para a sobrevivência das plantas, animais e microrganismos, como também do próprio ser humano. Isso não é diferente no Estado do Amazonas, por exemplo, antes tido como uma Unidade da Federação Brasileira que bem cuidava das suas florestas naturais, se for observado o grande antropismo que vem ocorrendo em muitas das suas regiões, especialmente no sul do Estado, onde os recursos genéticos madeireiros vêm sendo explorados de maneira ilegal. Neste e em outros contextos é também importante considerar aspectos da Genética Ecológica em articulação com a Preservação de Recursos Genéticos e com a Genética Evolutiva. 20


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Em Genética Ecológica podem ser considerados os seguintes temas: distribuição espacial e abundância, fixação de nitrogênio e micorrizas, dormência de sementes, tolerância de genótipos à seca, populações estrategistas r e K, fixação de carbono fotossintético e análise de proteínas, dentre outros. Para o caso da distribuição espacial e abundância, pode-se citar plantas como leguminosas forrageiras de hábito de crescimento rasteiro que têm distribuição aleatória, fixa (colonial) e uniforme. A distribuição aleatória é quando a presença de um indivíduo em um ponto não influi na chance de aparecimento de outro indivíduo da mesma população nas adjacências. Já na forma colonial, a ocorrência de um indivíduo em um ponto aumenta a probabilidade de ser encontrado outro membro da mesma população naquele ponto. Na distribuição uniforme, a presença de um componente de uma população em um determinado ponto diminui a chance de ocorrência de outro componente da mesma população em um ponto adjacente. As distribuições aleatória e colonial são influenciadas pela forma de reprodução da planta, isto é, se de autofecundação geralmente a distribuição é colonial (agregada), enquanto que se a forma de reprodução sexuada for cruzada, a tendência é para a distribuição aleatória. Para o caso da distribuição colonial, trata-se de uma forma mais comum de ocorrência de espécies, sendo os agregados originados de fatores como: a) tendência dos descendentes se arranjarem em volta dos pais, como resultado da dispersão de sementes próximo à planta-mãe ou mesmo da reprodução vegetativa; b) dispersão uniforme ou aleatória, porém em agrupamento de habitats favoráveis à colonização pelas espécies. A distribuição espacial de espécies em um nicho pode ser gerada pela heterogeneidade do habitat. Para o conhecimento das densidades existem determinações absolutas e relativas. A medida absoluta pode ser feita por contagem direta ou por amostragem, e neste último caso existem vários métodos, onde se destaca o método do quadrado (mais para planta) e o método da captura, marcação e recaptura (mais para animais). O método do quadrado pode ser aplicado tanto pelo processo de isomonas como pelo processo do “transect”, não havendo diferença significativa entre os dois. O processo de isomonas é feito a partir do estabelecimento de uma área que pode ser de 10m x 10m dividida em pequenos quadrados de 0,5m x 0,5m, totalizando 400 quadrados. No processo do “transect” são alocados quadrados de 0,5m x 0,5m, a cada cinco metros, ao longo de linhas que partem de um mesmo ponto em quatro direções. Conclusões De acordo com o acúmulo de conhecimento pragmático explicitado neste artigo, a aplicação de métodos utilizados na Genética Evolutiva aliada à Genética Ecológica, também oferecem bons subsídios para o sucesso da preservação de recursos fitogenéticos nos nichos de ocorrência e para utilização racional em programas de melhoramento genético e ciências afins.

21


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Referências MARTINS, P. S. Preservação e Genética Evolutiva. In: ARAUJO, S. M. C.; OSUMA, J. A. (Ed.). Anais do Primeiro Encontro sobre Recursos Genéticos. FCVA: Jaboticabal (SP), 1988, p: 62- 66.

22


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

3. Convergência de Tecnologias na Biologia da Conservação/Preservação de Recursos Genéticos Afonso Celso Candeira Valois

Contextualização No Brasil é premente a constância de propósitos de pesquisa sobre a convergência de tecnologia na biologia da preservação de recursos genéticos na condição in situ e de conservação ex situ, através dos esforços e ações de centros e institutos de pesquisa, universidades e outras instituições. Trata-se de uma moderna disciplina que procura sistematizar e harmonizar a convergência e complementaridade dos conhecimentos, tecnologias apropriadas e das inovações disponíveis na busca do melhor entendimento e aplicação das alternativas plausíveis da seleção, manutenção e utilização dos genótipos de plantas, animais e microrganismos, além da adequação da estrutura física e apoio logístico. Para isso, antes da execução da pesquisa pretendida, torna-se necessário aprofundar a revisão bibliográfica no sentido de aprimorar os estudos e levantamentos sobre a existência de tecnologias convergentes, sobre o tema em questão, que estejam à disposição e que sejam compatíveis à esse novo enfoque temático. Dentro de um pragmatismo cabal, no processo do desenvolvimento de uma ciência como a biologia da conservação/preservação de recursos genéticos pode ser visto que existem momentos em que há uma fragmentação que facilita a compreensão dos fenômenos mais intrínsecos de um determinado enfoque, além de outros, onde ocorre um agrupamento ou uma convergência, com a atuação de tecnologias complementares apropriadas. Essa alternância é fundamental para o alcance dos avanços pretendidos, onde, por exemplo, pode ser citada a biologia da conservação/preservação, que por seu turno passou por um período de fragmentação e divisão em várias disciplinas, com aperfeiçoamento dos conhecimentos, mas que atualmente necessita dessa convergência para tornar o processo mais atrativo e aplicável, dentro da visão holística de um aceitável enfoque sistêmico. Assim, de forma concentrada são apresentados os seguintes temas que complementados por outros podem ser úteis a esse propósito do melhor entendimento e da busca da convergência da tecnologia em benefício da biologia da conservação/preservação: a) Tamanho ideal das unidades de conservação (Figura 1); tamanho efetivo mínimo viável da população para tornar os procedimentos mais pragmáticos; amplitude da convergência harmônica entre plantas, animais e microrganismos em interação com o ambiente em que vivem; inventário, domesticação e enriquecimento dos recursos genéticos; valoração e valorização da biodiversidade e da agrobiodiversidade; processos dinâmicos de conservação/preservação de germoplasma; aplicação dos fundamentos da coleção nuclear; complexo gênico; fisiologia do desenvolvimento e sistemas reprodutivos de genótipos; sanidade vegetal e animal; homeostase genética e do desenvolvimento; efeitos pleiotrópicos; efeitos

23


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

endogâmicos com ênfase àqueles depressivos; efeitos de perigos e danos naturais e antrópicos que atuam para a vulnerabilidade da biodiversidade, incluindo os seus recursos genéticos; b) Citogenética; botânica e taxonomia; conceito tipológico versus conceito genético na caracterização de germoplasma, genética qualitativa; genética quantitativa; genética de populações; genética evolutiva, demes, clines e ecótipos; genética ecológica; genética estatística; genética de microrganismos; genética genômica, proteômica, metabolômica, epigenômica e transcriptômica; genética sintética; etnobotânica; Figura 1. Unidades de Conservação, em etnobiologia; ecologia e evolução levando em vermelho. consideração as forças evolucionárias da mutação, migração, recombinação, oscilação genética e seleção (natural, estabilizadora, direcional e disruptiva); seleção artificial versus seleção natural; conceito evolutivo versus conceito do equilíbrio de ligação, diversidade funcional de ecossistemas; populações simpátricas, populações alopátricas e isolamento reprodutivo; efeitos alelopáticos; efeitos heteróticos; c) Erosão genética e perigo de extinção de espécies considerando os seguintes critérios com o objetivo de estabelecer prioridades para a conservação/preservação e resgate da diversidade e variabilidade genética: com risco, vulnerável, raro, sem perigo, indeterminado, desconhecido e fora de perigo; d) Biologia molecular, mapeamento e análise genômica; funcionalidade dos genomas; sequenciamento de DNA; bioinformática e modelagem molecular; regulação e expressão gênica; bioquímica do metabolismo; estresses bióticos e abióticos na presença das atuais ameaças de mudanças climáticas; bioprospecção e engenharia de genes e proteínas; marcadores moleculares; tipificação de genótipos; e) Biologia celular; cultivo in vitro e estabilidade genética dos acessos conservados; mutação e efeitos epigenéticos; regeneração e transformação; micropropagação e diferenciação celular; efeitos da dicogamia, partenocarpia, apomixia e xênia; fisiologia de sementes ortodoxas, intermediárias e recalcitrantes; criopreservação; conservação e armazenamento de sementes. A união desses e de outros procedimentos com a aplicação da convergência de tecnologias é de fundamental importância para o constante aperfeiçoamento requerido para o pleno sucesso da biologia da conservação/preservação de recursos genéticos. Dentro dessa auspiciosa convergência de tecnologias, encontra-se um enorme desafio para os melhoristas de plantas que é estabelecer um ideótipo levando em consideração os diferentes genótipos existentes no âmbito de uma dada espécie vegetal.

24


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Aplicação para o milho (Zea mays L.) Para o pleno desenvolvimento desse modelo pode ser considerado o milho (Zea mays L.), por ser uma das espécies mais estudadas no Reino Planta e, que por ser alógama favorece uma larga variabilidade genética entre os descendentes e exploração da herança, como fundamentos das leis da genética. Nesse sentido inovador, a ideia básica é tentar a obtenção de um ideótipo de planta que possa congregar o máximo de características genéticas convergidas para um só conjunto de indivíduos meios- irmãos, advindo das várias pesquisas divergentes executadas em diferentes genótipos, considerando os caracteres de interesse, com o uso da ferramenta da seleção artificial funcional. É relevante considerar a herdabilidade do caráter no sentido restrito para explorar a variância genética aditiva, bem como, a própria resposta correlacionada, capacidade geral e específica de combinação, pré-melhoramento, índice de seleção, estimativa de parâmetros genéticos sem o emprego de progênies e valoração genética, dentre outros. Dentro desse propósito desafiador, estima-se que para isso primeiramente haveria uma revisão bibliográfica circunstanciada sobre as pesquisas já desenvolvidas, tomando-se como base cada parte do corpo da planta, isto é, raiz, caule (colmo), folha, flor e fruto (espiga). Logicamente que esse minucioso levantamento abrangeria os caracteres qualitativos e quantitativos. Para o início de uma discussão no sentido holístico, nesse levantamento seriam incluídos os seguintes parâmetros: a) Raiz- amplitude e ritmo de desenvolvimento da cabeleira radicular, área de ocupação no solo, profundidade, emissão de adventícias para fortalecer a tolerância ao acamamento, além de outros; b) Colmo- circunferência a cinco cm do solo, distância entre os nós, altura da planta, inserção de raízes adventícias etc.; c) Folhas- número, tamanho médio, intensidade da clorofila, área foliar, ângulo de inserção no colmo, disposição ao longo do colmo, resistência e tolerância ao desfolhamento natural, capacidade de externar deficiência mineral, resistência a fatores bióticos e tolerância a impedimentos abióticos etc.; d) Flor Floração masculina- tamanho do pendão, número de estames, grau de dispersão do grão de pólen, estimativa da quantidade de grãos de pólen, dispersão e alcance de grãos de pólen, presença de espiguetas etc.; Floração feminina- tamanho da inflorescência, tamanho do estilo-estigma, distribuição ao longo do colmo, altura da primeira inflorescência etc.; e) Fruto Frutificação feminina- altura da primeira espiga, número de espigas por planta (prolificidade), distribuição das espigas no colmo, formação das espigas, qualidade do grão, tipo de grãos, coloração de grãos, presença de milho opaco, existência de lisina, triptofano e aleurona 25


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

múltipla nos grãos, número de grãos por espiga, maturação uniforme dos grãos, poder germinativo dos grãos e valor cultural, métodos de conservação e armazenamento das sementes, etc. De posse de todas as informação disponíveis, o próximo passo seria recolher os genótipos tomados como superiores por apresentar um ou mais caracteres desejados e colocá-los em um composto sintético para a subsequente seleção de genótipos superiores, seguindo os passos relacionados, com destaque para a produção de grãos: a- Escolha de populações contrastantes adaptadas à região, com características genéticas de interesse; b- Possuidoras de caracteres agronômicos de relevância; c- Tivessem bom nível de heterose; d- Apresentassem média alta para os caracteres envolvidos; e- Possibilitassem boa proporção da variância genética aditiva; f- Alcançassem excelente homogeneidade quanto à qualidade dos grãos e de outras características de importância agronômica, com distingüibilidade, homogeneidade, estabilidade e novidade (DHE-N); g- Atingissem o equilíbrio de Hardy-Weinberg na primeira geração de síntese (na ausência da mutação, migração, seleção e oscilação genética); h- Obtivessem bom grau de homogeneidade fenotípica após n gerações de intercruzamento ao acaso; Nesse composto sintetizado a partir de n populações progenitoras, a média é a seguinte: co= p + (n-1/n) x h, onde: p- média do caráter em todas as n populações; h- heterose média de todos os 0,5 n (n-1) cruzamentos possíveis entre elas. Pode-se notar que em compostos maiores é retida uma porção considerável (n-1/n) da heterose média de cada população cruzada. Para este caso do milho, o ideótipo ideal é aquele onde as plantas são baixas, pendão pequeno, plantas prolíficas, precocidade, colmos vigorosos, boa inserção das espigas, baixa altura da inserção da primeira espiga, boa formação das espigas, boa qualidade e quantidade de grãos, bom tipo de grãos, maturação uniforme dos grãos, presença de lisina, triptofano e aleurona múltipla nos grãos, boa formação de raízes, presença de raízes adventícias, tolerância ao acamamento, boa qualidade do grão, resistência a pragas e doenças, tolerância à seca e ao frio, tolerância à irrigação natural e artificial, boa capacidade geral e específica de combinação, bom vigor heterótico, baixa exigência nutricional e homeostase do desenvolvimento adequada, dentre outros caracteres de interesse.

26


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Considerando um exemplo pragmático, deve-se acrescentar que o autor deste artigo obteve grande sucesso ao sintetizar o “Composto Manaus” em condições ecológicas de Manaus (AM), ao intercruzar ao acaso seis cultivares de milho utilizando métodos acima explicitados! Aplicação para outras espécies Pode-se ainda fazer um bom exercício pela integração ao estudo holístico de casos utilizando outras espécies de importância, tendo como destaques, neste exemplo, a seringueira (Hevea brasiliensis Müll. Arg.) e o dendê africano (Elaeis guineenses Jacq.). Levando em conta a seringueira, entre outros caracteres desejáveis é da mais alta valia que os clones sejam altamente produtivos em borracha seca, precoces quanto ao início da produção de borracha, apresentem baixo índice de obstrução dos vasos laticíferos para produção do látex, boa renovação da casca, boa qualidade da borracha, boa regeneração do látex, tenham os folíolos voltados para cima com o fito da maior eficiência fotossintética, arquitetura de copa voltada para cima para melhor absorção dos raios solares, boa qualidade da madeira, resistentes a doenças como o mal das folhas, antracnose, cancro do painel e podridão da raiz, resistentes a pragas como o mandarová, mosca de renda e mosca branca, tolerantes à seca e ao frio, apresentem boa homeostase do desenvolvimento e boa capacidade combinatória, entre outras características. Para o dendê sua precocidade, alta produção e boa qualidade do óleo, resistência a pragas, tolerância ao amarelecimento fatal, tolerância a áreas alagadas, boa capacidade geral e específica de combinação com o dendê amazônico (Elaeis oleífera Cortés) para a obtenção de híbridos interespecíficos principalmente para qualidade do óleo, resistência e tolerância ambiental, boa capacidade de combinação entre os tipos dura e pisífera para obtenção de tenera, bom vigor heterótico, tolerância à seca, boa resposta à irrigação, boa homeostase do desenvolvimento e outras características recomendadas são desejáveis. Para o caso das outras espécies, especialmente de interesse do agronegócio, outros objetivos e metas podem ser perseguidos, de modo que o melhorista de plantas possa alcançar os desejos buscados em seus planos, programas e projetos.

Conclusões Diante do exposto neste breve artigo pode ser observado que é bastante ampla a oportunidade oferecida pela biologia da conservação/preservação, considerando a divergência e convergência do conhecimento, técnica, tecnologia apropriada e know-how disponível, visando ao uso sustentável dos recursos genéticos apropriados. Referências VALOIS, A. C. C.; GOEDERT, C. O.; VALLS, J. F. M.; FERREIRA, M. A. J. F.; WETZEL, M. M. V. S. Recursos fitogenéticos en Brasil. In: Recursos fitogenéticos en los trópicos suramericanos. PRICITROPICOS, IICA: Brasília, DF, 2010, p: 77- 121.

27


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

4. A Resistência das Plantas aos Insetos e os Recursos Genéticos Afonso Celso Candeira Valois Engenheiro Agrônomo, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa, Ex-Professor Associado da UnB, Ex-Professor Contratado da UEA/CEST, Ex-Secretário Municipal de Meio Ambiente de Tefé (AM).

Introdução De maneira geral é muito grande o número de insetos que ataca as culturas agrícolas, causando danos que influem negativamente no sucesso destes empreendimentos. Os catálogos de insetos já divulgados no Brasil mostram essa amplitude de condicionantes biológicos, sendo que a tendência é aumentar na medida em que a agricultura for ampliada, possibilitando uma seleção direcional para o aparecimento de novos patógenos, perda da resistência por parte dos hospedeiros, além da possibilidade da convivência dos insetos-praga com a planta diante dos vários processos de controle conhecidos. Uma das maneiras de controlar uma determinada praga é através da resistência genética da planta-alvo, aliado a fatores ambientais, visto que um determinado inseto pode ser capaz de identificar e escolher os seus hospedeiros. As fontes dessa resistência são buscadas nos recursos genéticos existentes na natureza ou conservadas em bancos ativos de germoplasma (BAGs). Nesse sentido, uma planta é considerada resistente quando a sua constituição genotípica é menos danificada que outra em igualdade de condições. Aqui ainda aparece o termo tolerância, entendido como a condição em que o rendimento de um genótipo é menos influenciado em relação a outro no mesmo ambiente. Nesse sistema de interação hospedeiro x inseto-praga ainda aparecem os fenômenos da não preferência do inseto por oviposição e alimentação na determinada planta, da antibiose (efeito adverso produzido pelo hospedeiro sobre a biologia do inseto) e a própria tolerância representada pela capacidade da planta em se regenerar ou suportar infestações. O conhecimento dos fatores genéticos que regulam a herança da resistência de plantas ao inseto é mais importante na prática do que um conhecimento da causa da resistência, pois permite adequar e planejar um esquema de seleção de genótipos em programas de melhoramento genético. Muitas das vezes a resistência da planta a pragas é monogênica, o que facilita a seleção e cruzamentos entre genótipos para a exploração do caráter, por ser menos influenciado pelo meio ambiente. Considerando a complexidade dessa tripla interação planta hospedeira x inseto-praga x ambiente, neste artigo são apresentados tópicos especiais de maneira holística, que induzem à exploração dos recursos genéticos de plantas para explorar as nuanças da resistência a pragas da agricultura.

28


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Importante lembrar que o conceito de “inseto praga” é empregado para aqueles insetos que causam prejuízo à agricultura, uma vez que há insetos que convivem com as culturas sem causar danos, e que também há insetos considerados benéficos. 1- Graus da resistência: a) b) c) d) e) f) g) h) i) j) k)

Imunidade; alta resistência; resistência moderada; resistência vertical; resistência horizontal; não preferência; suscetibilidade; alta suscetibilidade; escape; evasão (“avoidance”); resistência induzida.

2- Resistência/Suscetibilidade: a) b) c) d)

Adaptação e reprodução: preferência de oviposição; Substâncias secundárias: glicosídeos, taninos, saponinas, alcaloides e óleos essenciais; Estímulos exótico (alcaloides) e nutritivo; Causas físicas- insetos de hábito diurno- luz e radiação refletida (cor); coloração verdecomprimento de ondas que o ser humano não consegue detectar, mas que provocam respostas dos insetos; insetos de hábito noturno- ex.: as mariposas do Gênero Erinnyis respondem muito bem aos comprimentos de ondas de luz e possuem sensores que detectam a radiação infravermelha (exemplo: processo de ataque da lagarta mandarová Erinnyis ello L.- à mandioca e à seringueira em noites de lua cheia). e) Causas químicas- substâncias que afetam o comportamento do inseto (atuam no metabolismo- ausência ou desequilíbrio de enzimas inibidoras da digestão e fitormônios). f) Causas morfológicas- tipo de epiderme, dimensão e disposição das estruturas (exemplo: ataque da lagarta mandarová à seringueira - Hevea brasiliensis Müll. Arg.).

3- Tipos de resistência da planta: a) 1. 2. 3. 4.

Não preferência: Por oviposição e alimentação. Atraente/repelente; Incitante/supressor (alimentação); Estimulante/deterrente (continuar ou não a alimentação); Cairomônios/alomônios (os primeiros atraem os insetos e os outros afugentam (fato observado em Nim- Azadirachta indica A.Juss.);

29


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

5. Atuação de feromônios- substâncias aliciadoras de estímulos positivos ou negativos (Vale ressaltar que tanto os cairomônios, os alomônios como os feromônios são genericamente denominados semioquímicos (sinais químicos), que são substâncias envolvidas na comunicação entre seres vivos, especialmente em insetos); 6. Comportamento do inseto (influência de cores, preferência por certos alimentos, hábito sugador). b) Antibiose: Efeito adverso sobre a biologia do inseto. - Ação adversa da planta hospedeira sobre a biologia do inseto (principais causas- toxinas, inibidores de crescimento ou de reprodução e impropriedade nutricional da dieta); c) Tolerância: Regeneração ou capacidade de suportar infestação; resistência genética vertical, horizontal, completa e por imunidade. - Quando uma planta sofre menor dano do que a outra para um determinado caráter, sob as mesmas condições ambientais. 4- Soluções no manejo integrado de pragas (MIP): a) uso de estações quarentenárias e barreiras fitossanitárias – a primeira para pragas que ainda não entraram no país, e a segunda para pragas que já entraram no país; b) controle biológico- manipulação genética e uso de patógenos; c) manipulação ambiental- escape ao patógeno (solução genético-ecológica) e “avoidance” (não permite o contato do hospedeiro com o patógeno); d) socioeconomia- considera parâmetros sociais e econômicos; e) resistência de plantas- uso de cultivares, organismos transgênicos, híbridos e clones; f) tolerância de plantas- compara genótipos quanto à menor influência dos patógenos nos rendimentos; g) controle cultural- uso de culturas múltiplas, e de cultivares multilinhas, emprego de práticas agronômicas (“sanitation”); h) controle químico- atuação de toxinas naturais e artificiais, defensivos sintéticos seletivos; i) controle genético-horticultural - uso de enxertia de copa e de base; j) qualidade do produto (monitoramento) - uso de boas práticas agrícolas (BPA), aplicação do sistema APPCC (análise de perigos e pontos críticos de controle), uso da produção integrada (PI), análise de risco de pragas (ARP). 5- Fatores que influenciam a resistência: a) idade da planta: a resistência da planta varia conforme o estádio de desenvolvimento; b) parte atacada da planta: determinadas estruturas, em estádios diferentes, quando atacadas tem respostas diferentes de resistência; c) fisiologia da planta: pode haver um desiquilíbrio fisiológico da planta, afetando assim a sua resistência ao ataque; 30


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

d) enxertia (parte aérea e raiz): A enxertia pode ser um fator favorável ou desfavorável de resistência, dependendo da resistência ou suscetibilidade do cavalo ou cavaleiro; e) características do inseto: (idade, raças fisiológicas, pré-condicionamento do adulto, tamanho da população, controle biológico); f) condições ambientais: (umidade, temperatura, topografia, luminosidade, disponibilidade de nutrientes, época e densidade de plantio, efeito das plantas adjacentes e cultivos precedentes, além de outras). Conclusões A estratégia e tática operacional do controle dos prejuízos causados por insetos-praga, ao setor do agronegócio, carecem de conhecimento, técnica e tecnologia apropriada, acrescidos da necessidade do uso da acurácia para lidar com a sutileza da tripla interação planta x inseto x ambiente para a mitigação ou mesmo acabar com o risco, perigo e dano que possam advir. A adequação de uma consistente análise de risco em conjunto com o comportamento da praga, conhecimento básico da resistência genética da planta, uso de recursos genéticos apropriados e programas de melhoramento genético são fundamentais para a obtenção de sucesso no agronegócio brasileiro.

Referências CARVALHO, R. P. L. Pragas do milho. In: Melhoramento e produção do milho no Brasil. Fundação Cargill: Piracicaba (SP), 1980, p: 505- 570.

31


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

5. Retrospectiva Histórica sobre Pesquisa e Desenvolvimento da Seringueira no Brasil Afonso Celso Candeira Valois

Figura 1. Dr. Valois inspecionando experimento de Seringueira.

Contextualização Recentemente, em 15/04/2016, foi publicado um interessante artigo liberado pela Agência FAPESP de título “Estudo possibilita Conhecer e Preservar Diversidade Genética da Seringueira (Hevea brasiliensis Müll. Arg.)”, ao qual oferecemos, com o propósito de singela contribuição, nossos comentários que se seguem, sem qualquer intenção de rebatimento. Tal estudo está muito interessante e é justamente por isto mesmo que desejo complementálo. Quem vos escreve é o pesquisador, ex-dirigente de centros de pesquisa da Embrapa, que introduziu pioneiramente um lote de 3 ha de seringueiras na Embrapa Cerrados por volta de 1977, através de feliz articulação com o Centro Nacional de Pesquisa de Seringueira, Unidade da Embrapa, localizada em Manaus (AM), então chefiado tecnicamente por este autor, composto por clones já utilizados em programas de melhoramento genético, como o IAN 717, IAN 873, Fx 3810, Fx 3899, Fx 3925, P 9, P 10, etc.. Posteriormente esse excelente Centro ampliou os trabalhos com a Hevea Aubl., inclusive sendo vítima do nefasto acontecimento da queimada intencional que envolveu uma formidável área experimental da seringueira brilhantemente conduzida pelo pesquisador Dr. Ailton Victor Pereira (Figura 2), muito bem citado no estudo em epígrafe, além da incompreensível ação lastimável do Governo do Distrito Federal, que talvez por falta de infância técnico-científica na época, ajudou a exterminar de vez com essa aplicada área de pesquisas e estudos da Embrapa, que também abrangia outros importantes produtos.

Figura 2. Ailton Victor Pereira

Ainda efetivou-se outra, excelente introdução, a partir da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen), quando se trouxe para o Brasil 70 clones advindos da Malásia (importante lembrar que fiz previamente estudos e levantamentos in loco), sendo que parte deste recurso genético está plantada no planalto paulista, em estação experimental do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) localizada em Votuporanga-SP (são suscetíveis ao fungo Microcyclus ulei (Henn.) Arx), se constituindo na grande visão estratégica de sustentação da 32


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

heveicultura nacional em áreas de escape ao terrível patógeno, e cujo Banco Ativo de Germoplasma (BAG) se mantém sob a tutela do competente pesquisador Dr. Paulo de Souza Gonçalves (Figura 3), que grande contribuição vem proporcionando para o sucesso da cultura no estado de São Paulo. Também na coleção de 100 plantas citada no estudo em referência, espero que não tenham esquecido o principio básico da "coleção nuclear", tamanho efetivo da população e que outras espécies do gênero Hevea Figura 3. Paulo de Souza também são importantes como fontes de resistência. Isso indica que o Gonçalves relevante estudo necessita de profunda revisão diante desses fatos e de outros importantes acontecimentos técnico-científicos. Mas, o que é premente é de se acabar de vez no Brasil com a falácia de que a saída das 70 mil sementes de seringueiras para a Inglaterra, que chegou ao Jardim Botânico de Kew em 14 de junho de 1876, foi biopirataria, pois a remessa foi autorizada oficialmente pelo governo brasileiro (não importando aqui se foi através de corrupção ou não). Nesse sentido, para desfazer a histórica controvérsia, lembro que o “Planters’ Bulletin”, número 14, de setembro de 1954, publicação do Instituto de Pesquisas da Borracha da Malásia, no Editorial: A borracha do Ocidente ao Oriente, afirma: “a remessa de Wickham para Kew se deveu à boa vontade e cooperação do Governo Brasileiro”. Mas, em sã consciência talvez tenha sido providencial, considerando os estragos feitos pelo Microcyclus ulei, a partir de Fordlândia e Belterra. Com certeza, a formidável indústria de pneumáticos no âmbito nacional Figura 4. Henry Wickham e internacional, por exemplo, não teria como fundamento, a salvadora H. brasiliensis. Ainda para ser considerado, acrescento que devido às nefastas ocorrências do impressionante condicionante biológico em Fordlândia e Belterra, que é capaz de trucidar a seringueira, ambas no Estado do Pará, próximas à região de Boim, no Baixo Amazonas, onde as 70 mil sementes foram coletadas por Henry Wickham (Figura 4) em 1876 (injustamente declarado biopirata, neste caso) levadas para o Jardim de Kew, deve-se ainda comentar que a seringueira foi a planta que passou oficialmente pelos primeiros esforços de sistematização de PD&I na Amazônia. Teve como fulcro encontrar soluções alternativas para debelar o ataque do M. ulei que infortunadamente ocorreu naquelas plantações de Fordlândia (1928) e Belterra (1932) em esforços de plantio da Hevea patrocinados por Henry Ford (Figura 5), quando os seringais foram adensados, diferente do que acontecia nos seringais nativos. A plantação de Belterra foi transferida para o Ministério da Agricultura, que fundou o ERT (Estabelecimento Rural do Tapajós) em 1937, onde foram realizados os primeiros cruzamentos intra e interespecíficos com ênfase na Hevea brasiliensis, H. benthamiana Müll. Arg., H. pauciflora Müll. Arg., H.

Figura 5. Henry Ford

33


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

spruceana Müll. Arg., H. guianensis Aubl., e outras. Estes fatos que não podem ser olvidados no estudo patrocinado pela FAPESP e outras instituições, para fazer justiça, pois se referiram basicamente, à busca do aumento da variabilidade genética da Hevea visando à obtenção de clones produtivos e resistentes a impedimentos de ordem biótica, principalmente provocados pelo mal-das-folhas da seringueira. Ainda fazendo referência à história, após o ERT, o Ministério da Agricultura, em 1939, criou em Belém (PA), o primeiro instituto de pesquisa agropecuária no norte do Brasil, isto é, o famoso Instituto Agronômico do Norte (IAN), hoje Embrapa Amazônia Oriental, que teve como um dos seus principais sustentáculos, a pesquisa com seringueira, em articulação com o ERT. Assim, mais de 1.000 clones foram sintetizados (documentos disponíveis com belos estudos sobre paternais e procedências), abrindo o leque do melhoramento genético da seringueira no Brasil. Após isso, com a criação pela Embrapa, do Centro Nacional de Pesquisa da Seringueira, em Manaus (AM), em 3 de março de 1975, a Hevea teve redirecionado os seus destinos técnico-científicos e inovação, de forma bastante positiva e abrangente, à regiões propícias do Brasil, com excelentes articulações nacionais e internacionais, sendo este o primeiro grande exemplo na Embrapa daquilo que modestamente eu criei, coordenei e chamei de “Modelo Concentrado Circular Regional Integrado”. Em 1983, publicou-se pela PAB (Revista Pesquisa Agropecuária Brasileira, 18 (9): 1015-1020, set. 1983), periódico da Embrapa, um trabalho inédito de título “Expressão de Caracteres em Seringueira e Obtenção de Clones Produtivos e Resistentes ao Mal-das-folhas”, onde fiz destaque ao estabelecimento de seringais em áreas de escape ao M. ulei, com o título de “Solução Genético-ecológica”, que na realidade é uma forma de explorar a resistência horizontal ao patógeno, pois em seringueira muito se explorou a resistência vertical, suscetível de ser quebrada pelo aparecimento de novas raças de M. ulei pela ação da seleção direcional e seleção estabilizadora. Apesar do sucesso da enxertia de copa da H. brasiliensis com H. pauciflora e outras espécies, pesquisas básicas galhardamente efetuadas em Manaus (AM), há de se convir que as áreas de escape são a grande alternativa para a perenização da heveicultura nacional em bases econômicas, sociais e ambientais, daí a importância do planalto paulista e de outras regiões do país que promovam o escape das plantas ao patógeno, inclusive por se situarem mais próximas dos parques agroindustriais de transformação da borracha. Tenho dito que a seringueira é uma das plantas mais didáticas que existem, pois o M. ulei obrigou esse vegetal a mostrar e “nos ensinar” os mais diversos sistemas de resistência ao ataque de patógenos, especialmente ao M. ulei, inclusive a tolerância à seca como exterioriza o próprio IAN 873 em áreas de escape, um clone intraespecífico de H. brasiliensis com boa “homeostase do desenvolvimento”. Esse fato inclusive obriga ao melhorista a pensar e agir convenientemente, pois geralmente quando um clone é altamente produtivo em látex é também altamente suscetível ao M. ulei, sendo a recíproca verdadeira (a biologia molecular é uma poderosa ferramenta que pode auxiliar na definição desse enigma para a busca das soluções alternativas). Assim, em relação ao mal-das-folhas, a seringueira pode apresentar diversas formas de resistência como: imunidade, completa, parcial, vertical, horizontal, por hipersensibilidade etc. 34


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Na Malásia e em outros países orientais e africanos, o M. ulei não ocorre, apesar de o ambiente e o hospedeiro serem favoráveis, daí a estratégia tática e operacional para que o terrível condicionante biológico não penetre nas suas áreas produtoras de borracha. Assim, nesses locais, o melhoramento genético tem ênfase na produção de borracha, precocidade, qualidade do látex, etc., embora existam alguns patógenos, mas de virulência e agressividade muito inferiores às do M. ulei. Devido a isso tenho enorme confiança no benefício dos clones elites que introduzi da Malásia, não só per se, mas no uso em outros programas de melhoramento genético da seringueira para áreas de escape (nesse aplicável conjunto de genótipos está incluído o clone PM 10, que vi na Malásia com idade de sangria normal aos 4,5 anos, quando o normal é a exploração ao redor de 7,0 anos após o plantio). Como citei anteriormente, no estado de São Paulo, o experiente pesquisador Dr. Paulo de Souza Gonçalves (pesquisador da Embrapa, que trabalha sediado no IAC), também muito bem lembrado no estudo, já os utiliza em seus consistentes programas de melhoramento genético, com maestria. Lembro aqui da enorme recaída da produção de borracha no Brasil no início dos anos de 1.900, que tinha como base os seringais nativos, especialmente do estado do Acre. Isso mostra que a grande alternativa brasileira nessa busca incessante pela autossuficiência em borracha natural é o pleno desenvolvimento da heveicultura nas áreas de escape ao patógeno. No entanto, isso jamais justifica a intensa devastação da Amazônia que atualmente voltou a ocorrer, por absoluta falta de compromisso, visão estratégica e gestão tática e operacional do governo federal (fase do Partido dos Trabalhadores), que simplesmente desmantelou o sistema de vigilância o consistente controle do desflorestamento e das queimadas, além da segurança biológica na grande região, onde se encontram os seringais nativos. Esses genótipos eram e são fundamentais para o constante abastecimento genotípico dos programas de melhoramento genético da seringueira. Para os nobres leitores terem uma ideia, no Jaru (Rondônia), encontrouse duas plantas de seringueira (H. brasiliensis) que produziam respectivamente, nove e dez litros de látex por sangria (denominação regional e nacional para os cortes cirúrgicos das plantas para a obtenção do látex)), sendo que as mesmas foram clonadas com as siglas RO 45 e RO 46, estando no BAG do IAC. Atualmente essas matrizes naturais já não mais existem in situ no Jaru (ainda bem que foram clonadas e estabelecidas em BAG, inclusive no planalto paulista - gostaria que fizessem parte do conjunto das 100 plantas citadas no estudo em epígrafe), como também inúmeros outros preciosos genótipos foram perdidos (como resultado de atitude irresponsável de caráter institucional e privado foi desperdiçado um formidável acervo de banco genético natural de seringueiras). Devo ainda acrescentar como interessante um fato histórico, com visão estratégica, quando certa vez reuni uma equipe de coletores da Embrapa, em Manaus-AM, formada por destemidos servidores, e a enviei para o seringal nativo de Rondônia, no Jaru, com o objetivo específico de coletar hastes ortotrópicas das matrizes que deram origem aos clones RO 45 e RO 46, pois já estava bem claro de que logo seriam exterminadas pelo antropismo perverso! Logicamente que outras memoráveis expedições de coleta de germoplasma de seringueira foram efetuadas na 35


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Amazônia, com inteiro sucesso, com destaque para aquelas levadas a efeito por pesquisadores brasileiros e aquelas outras que tiveram a presença de especialistas ligados ao Conselho Internacional de Pesquisa e Desenvolvimento da Borracha (IRRDB- sigla inglesa) e posteriormente do Instituto de Pesquisas da Borracha da Malásia (RRIM- sigla em inglês), que em conjunto com competentes pesquisadores brasileiros efetuaram essas muito proveitosas atividades de coleta de germoplasma de seringueira. Levando em conta que o estudo em epígrafe partiu da excelente Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), deve-se ainda comentar que hercúleos trabalhos de pesquisa com seringueira foram e estão sendo efetuados em São Paulo, como já citado anteriormente. Primeiramente, clones de seringueira foram introduzidos em dois distintos nichos ecológicos: Litoral (ambiente favorável ao M. ulei), utilizando clones amazônicos, como o IAN 717 e IAN 873; Planalto (áreas de escape ao patógeno), utilizando clones orientais, como o Tjir 1, PB 86, PB 186 e GT 1, que apresentaram melhores desempenhos fitotécnicos. Nesse sentido, competentes instituições contribuíram, como a Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo e suas filiadas IAC e Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), bem como, a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”(ESALQ-USP), mais adiante. Certa vez tive a oportunidade de visitar a seringueira vovó (H. brasiliensis), plantada em Gavião Peixoto, na região de Araraquara (SP), que deu origem a diversas progênies de interesse da heveicultura nacional os dados históricos mostram que em 1998 essa planta estava com cerca de 80 anos de idade. Conclusões Considerando todos esses singelos comentários oriundos da minha experiência no tema, os estudos proporcionados pela FAPESP são muito válidos, necessitando de alguns ajustes técnicocientíficos e históricos, pois adicionalmente exploram de maneira plausível, o esquema de seleção da seringueira na base molecular, o que não tem sido muito comum no melhoramento genético desta Euphorbiaceae. Este histórico possibilitou que me expressasse com meus pontos de vista de maneira ética, legal, transparente, respeitosa, e complementar, com texto inédito, em alguns aspectos, no caminho cintilante do conhecimento e experiência. Estudos com este gênero não devem se restringir apenas ao âmbito da preservação (não usar), pois a conservação (usando) é primordial ao conhecimento das plantas, e o estudo dos genótipos estocados nos BAG, e consequentemente essenciais aos programas de melhoramento genético de Hevea, inclusive em áreas afins de PD&I! Posto isto, estou à disposição para receber manifestações quanto ao texto aqui exposto!

Referências BAHIA, D. B.; PINHEIRO, E.; GOMES, A. R. S.; VALOIS, A. C. C.; GONÇALVES, P. S.; MELO, J. R. V.; PEREIRA, J. P. Clones de seringueira (Hevea spp.), origem e ancestralidade. Centro de Pesquisas do Cacau: Rodovia Ilhéus-Itabuna, km 22, Bahia, 1985. 428 p. GONÇALVES, P. S.; BENESI, J. F. C. (Ed.). I Ciclo de palestras sobre a heveicultura paulista. Anais...: Barretos, SP, 1998. 247 p.

36


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

6. Recursos Genéticos de Frutas Tropicais: Parte 3 Afonso Celso Candeira Valois

Introdução Neste texto continuamos nossa apresentação das frutíferas tropicais que temos no Brasil à nossa disposição, prontas para incluir no nosso cardápio agrícola (Figura 1). Nossos primeiros brasileiros, os indígenas já conheciam a fruticultura através do babaçu, cajá, caju, goiaba, jabuticaba, pequi, entre outras nativas. Já o material melhorado chegou Figura 1. Frutas do Brasil, por Albert principalmente trazidos pelos nossos colonizadores e imigrantes Eckhout 1.600-1.666. alemães, holandeses, italianos, japoneses e portugueses. Sem contar, é claro, a grande contribuição das escolas de agronomia de Cruz das Almas, de Pelotas, mas principalmente a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiróz” – Piracicaba/SP, entre outras, e de Instituições de Pesquisa tradicionais como o Instituto Agronômico de Campinas, entre outros, e mais atualmente da Embrapa. A importância da fruticultura em geral para o Brasil é incontestável já que somos o terceiro produtor mundial, somente sobrepujados pela China e Índia, merecendo, portanto, esta nossa atenção com este texto. No volume anterior apresentamos dois textos que contemplam as frutíferas tropicais, de A até G, por mim selecionadas para o leitor. Agora finalizamos com as frutas de letra J em diante. Descrição Sucinta das Espécies Neste terceiro e último texto continuo a apresentação das espécies por mim selecionadas, na intenção de oferecer aos leitores e demais usuários um nível de conhecimento sucinto mas capaz de conduzir ao uso sustentável, com base na descrição botânica (família, nome científico, nome comum), centros de origem, grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos, características fitotécnicas, oportunidades de comercialização, composição físico-química e valor nutritivo, além de figuras ilustrativas, mantendo a mesma numeração sequencial a seguir: 22. Jaca Descrição: Família: Moraceae; Nome científico: Artocarpus heterophyllus Lam.; Nomes comuns: Jaca (Brasil), Jackfruit (Inglês); Centro de origem: Originária da Índia é exclusivamente cultivada nos países tropicais. Foi introduzida no Brasil através do estado da Bahia, sendo de fácil disseminação em face da facilidade de germinação das sementes. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Clima quente e úmido a semiárido com irrigação. Solos bem drenados, profundos e férteis. 37


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Características fitotécnicas: Árvore de altura que chega a mais de 20 metros de altura, copa densa, folhagem verde-escura, brilhosa, dando ótimo sombreamento. Fruto múltiplo ou sincarpo, originando-se de uma inflorescência formada pelos ovários e demais partes das flores que se desenvolvem em torno de um receptáculo alongado. A parte externa do sincarpo apresenta numerosos “picos”, de coloração verde-amarelada, quando madura. Os volumosos sincarpos, que podem pesar mais de 15 kg, são formados no tronco ou nos galhos mais grossos da árvore. As partes comestíveis são as paredes do ovário, que se desenvolveram, constituindo os “bagos”, de cor branco-amarelada, sabor doce e cheiro característico. Esses “bagos” podem ter consistência dura ou mole, daí a distinção de duas formas de jacas: “jaca dura” e “jaca mole”; nesta, o tipo “manteiga” é tradicionalmente apreciado pelo sabor mais doce e delicado dos “bagos”. As sementes são bastante apreciadas na alimentação após serem cozidas. Os frutos alcançam maturação entre 180 a 200 dias. A propagação é por semente ou vegetativa. Oportunidades de comercialização: Importante para agroindústria, na confecção de doces cristalizados, compotas quando maduro e na forma de salada, em sopas e em conservas quando os frutos estão imaturos. 23. Jenipapo Descrição: Família: Rubiaceae; Nome científico: Genipa americana L.; Nomes comuns: Jenipapo (Brasil), Genipap (Inglês), Génipa (Francês), Bigrande (Bolívia), Jagua (Colômbia), Maluco (México), Caruto, Kaguá (Venezuela), Huito (Peru). Centro de origem: Espécie pré-colombiana com origem no norte da América do Sul, largamente encontrada na América Central, Antilhas e México. Na Amazônia brasileira, a planta é espontânea ou cultivada, cresce preferencialmente nas várzeas dos rios de águas claras. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Planta de clima tropical e subtropical, precipitação entre 1.500mm a 4.500mm anuais. Temperatura média anual entre 22º C a 30º C. Solos bem drenados, férteis e profundos. Características fitotécnicas: A casca da árvore e os frutos verdes produzem uma substância muito usada pelos indígenas para tingir o corpo, de cor azul-escuro e que, em contato com o ar, aos poucos vai se tornando preta, fixando-se na pele e resistindo à água por vários dias. A árvore atinge cerca de 15 m de altura, cuja madeira, branca, de grão fino, presta-se muito bem para trabalhos de escultura e tornearia. O fruto é uma baga globosa ou ovoide, às vezes assimétricas, de 10-12 cm de comprimento e 7-9 cm de diâmetro, pesando entre 200-400 g. Apresenta um pericarpo amarelo-pardo, esponjoso, cerca de 1,5 cm de espessura, de cheiro característico, muito forte, polpa doce-acidulada envolvendo numerosas sementes achatadas. A propagação é por sementes, que geralmente mantém a viabilidade em torno de 90 dias e germinam com 25 a 30 dias após o semeio. O crescimento inicial é lento, sendo o transplantio feito com um ano, quando a muda alcança 20 a 40 cm de altura, no espaçamento de 10 x 15m. Plantio em áreas inundáveis, logo após o início da vazante. Em terra firme plantio no início do período chuvoso. Floresce na Amazônia, entre maio e setembro e, frutifica entre setembro a abril. O fruto maduro é coletado no chão. A produção inicia-se com 8 a 10 anos e árvores com 15 a 20 anos têm produzido de 400 a 600 frutos. O pericarpo e a polpa suculenta são comestíveis ao natural, com açúcar, em forma de salada; posto de infusão em garrafas e deixado por vários dias ao sol e

38


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

sereno, o vinho assim obtido e tomado em jejum se constitui em excelente tônico. Também é tradicional e muito apreciado o licor de jenipapo. Oportunidades de comercialização: A madeira é branco-marfim, fácil de trabalhar e apropriada para confecção de utensílios domésticos e construção naval. Do fruto verde extrai-se um líquido amarelado que altera sua tonalidade para azul escuro, servindo como pintura nos rituais indígenas. O fruto está pronto para consumo, quando o pericarpo se apresenta amolecido. A polpa é bastante usada no preparo de licor, refresco, vinhos, xarope e doces cristalizados. Os frutos são encontrados em feiras no período de setembro a março, e em menor quantidade no espaço de abril a agosto. 24. Mangostão Descrição: Família: Clusiaceae; Nome científico: Garcinia mangostana L.; Nomes comuns: Mangostão, Mangostán, Mangosteen; Centro de origem: Indonésia e Sudeste da Ásia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Requer clima quente e úmido, temperatura entre 18º C e 32º C, precipitação acima de 1.200mm. Solos argilo-arenosos, profundos, férteis e bem drenados. Características fitotécnicas: A propagação é por sementes, que são apomíticas, o que garante a transferência das características da planta mãe. A germinação ocorre entre 10 a 70 dias. As mudas estão aptas ao plantio após um período de 24 meses em viveiro. O espaçamento usado é 8m x 8m, em triângulo equilátero. A produção inicia no oitavo ano após o plantio, com floração no mês de outubro e colheita em fevereiro, nas condições do Amazonas. Na Tailândia a produção é em média de 6 a 8 t/ha. O fruto é arredondado, com cinco a oito centímetros de diâmetro, de cor violeta escuro quando maduro, com casca grossa, dura, que exsuda um látex amarelo quando cortado. A polpa é doce, sabor agradável, formada por arilos brancos, que podem envolver uma ou mais sementes. O consumo do fruto é in natura. Não possui cultivares definidas. Oportunidades de comercialização: Cultivada em países asiáticos, como Malásia, Indonésia, Tailândia, Ceilão, Filipinas, Índia, Sri Lanka e Austrália. No Brasil, é cultivado no Pará, Bahia e São Paulo. A Tailândia exporta para os Estados Unidos e outros países da América. 25. Mapati Descrição: Família: Moraceae; Nome científico: Pourouma cecropiifolia Mart.; Nomes comuns: Uva da Amazônia, Umbaúba de Cheiro, Tararanga Preta, Mapati; Centro de origem: Nativa da Amazônia Ocidental encontra-se distribuída nos Estados do Amazonas e Acre e nas fronteiras com o Peru e Colômbia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Solos férteis, com boa drenagem e profundos. Adaptação compreende regiões com baixa radiação, com menos de 1.200h por ano, como no Estado de Putumayo na Colômbia até radiações acima de 2.000h por ano, como na Amazônia Brasileira. A temperatura ideal é de 20º C a 28º C. Precipitação fluvial anual de 1.500mm a 4.000mm. 39


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Características fitotécnicas: Planta com três a 15m de altura, dioica, com fruto ovoide ou esférica com dois a quatro centímetros de diâmetro e cerca de 20 a 30 frutos/cacho, semelhante aos de uva. Epicarpo coriáceo, levemente áspero, violáceo quando maduro. Polpa suculenta, gelatinosa, levemente adocicada, envolvendo uma semente oval e dura. As mudas são formadas por sementes, que germinam entre 10 a 30 dias após a semeadura. Árvore fácil de ser cultivada e de crescimento rápido, atinge 2,5m no primeiro ano de crescimento. O início da produção normalmente ocorre entre o segundo e terceiro ano, após estabelecimento no campo, com produção em torno de 13 a 45kg/planta. Numa densidade de 156 plantas/ha, considerando 50% de plantas femininas, a produção estimada é de 3,5t/ha. Os frutos são consumidos in natura ou usados para produção de vinho e geleia. Oportunidades de comercialização: É uma espécie de rápido desenvolvimento e pioneira para formação ou recuperação de áreas alteradas. Plantada em pomares domésticos para fins ornamentais e produção. Na Amazônia colombiana, o mapati está classificado entre as 11 espécies arbórea que apresenta o “Índice de Valor de Importância” superior a sete numa escala até 20. Fruteira muito parecida com a imbaúba (Cecropia spp.), é muito cultivada pelos índios e pelos caboclos na parte ocidental do estado do Amazonas, e sobretudo na vizinhança das fronteiras do Peru e Colômbia, sendo bastante abundante nos arredores de Iquitos. 26. Maracujá Descrição: Família: Passifloraceae; Nome científico: Passiflora edulis Sims; Nomes comuns: Maracujá, Flor da Paixão, Parchita (Venezuela), Passionfruit (Inglês); Centro de origem: Provavelmente o Brasil. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: No Brasil, vários estados plantam o maracujazeiro, com destaque para a Bahia, Sergipe, Minas Gerais, Pernambuco, Alagoas, Rio Grande do Norte e Pará, que são os maiores produtores nacionais. Possui uma boa adaptação em praticamente todos os países tropicais, com destaque para a Austrália, onde tem um grande valor socioeconômico. A temperatura média ideal para o cultivo racional do maracujazeiro situa-se em torno dos 25ºC, com uma precipitação de cerca de 1.400mm anuais, bem distribuídos, sendo prejudicial o ritmo de chuvas mais intenso no período de floração da planta. Os solos mais indicados são os areno-argilosos, além de outras unidades pedogenéticas, desde que bem drenadas e profundas. Em locais sujeitos a ventos fortes devem ser implantados quebra-ventos para não prejudicar a cultura, enquanto que a geada e ventos frios são fatores limitantes da exploração sustentável do maracujazeiro. Características fitotécnicas: Planta trepadeira, folhas alternas, inteiras nos indivíduos jovens e trilobadas nos adultos, bordos serrilhados e duas glândulas no ápice do pecíolo. Flor solitária, hermafrodita, cerca de 6cm de diâmetro, com 3 brácteas foliares na base; 5 sépalas espessas, verdes por fora e brancas internamente; 5 pétalas, menores que as sépalas, delicadas e brancas; 5 estames com os filetes planos; anteras oblongas, de 10-12mm; ovário súpero, unilocular. Fruto, uma baga geralmente esférica, com a casca amarela quando maduro, podendo ocorrer a cor roxo-avermelhada, até 9cm de diâmetro e peso de 60-190g; sementes numerosas, planas, ondulado-rugosas, envolvidas por um arilo sucoso, amarelado, de sabor ácido e forte aroma. As flores geralmente se abrem nas primeiras horas da tarde, nos meses de época seca, exalando um agradável perfume atrativo dos insetos polinizadores, notadamente os mangangás (Bombus) e marimbondos (Polistes). 40


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Oportunidades de comercialização: Os frutos do maracujazeiro são de fácil comercialização, inclusive pelas suas propriedades medicinais. A polpa sucosa do maracujá apresenta inúmeras maneiras de aproveitamento, sendo mais comum em forma de suco, sorvete, licor, “batidas” com aguardente, mousse, pudins, bolos e outras maneiras, todas tradicionalmente apreciadas, inclusive sendo a casca utilizada para o tratamento de pessoas diabéticas. Praticamente todo o ano os frutos são encontrados nas feiras e supermercados, sendo mais escasso entre os meses de maio e agosto. 27. Murici Descrição: Família: Malpighiaceae; Nome científico: Byrsonima crassifolia (L.) Rich.; Nomes comuns: Murici-do-Campo, Muruci, Cimarron (Cuba), Chaparro (Venezuela), Wild Cherry (Inglês); Centro de origem: Espécie encontrada em estado silvestre em quase toda a Amazônia e em parte do Nordeste, nas áreas campestres, dunas, capoeiras baixas, no litoral, e não raro cultivada. A dispersão atinge os estados de Mato Grosso e Minas gerais, além das Guianas, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Peru e alguns países da América Central, possuindo cinco cultivares, sendo a B. crassifolia var. typica Nied., a mais comum. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Precipitação anual acima de 2.000mm, não tolera solos alagados, temperatura média anual acima de 20º C e altitude abaixo de 100m. Características fitotécnicas: O muricizeiro é um arbusto ou pequena árvore tortuosa, crescendo cerca de 5m de altura. O fruto é drupa globosa-depressa, de 1,5-2cm de diâmetro, epicarpo delgado, de cor amarela, mesocarpo (parte comestível), quando no fruto bem maduro, é constituído de uma massa amarela e mole, com cerca de 5 mm de espessura, de cheiro e sabor característicos, muito ativos. O endocarpo (caroço do fruto) é arredondado ou ovalado, lenhoso, de superfície reticulado-rugosa, geralmente contendo uma semente viável. Os frutos são bastante apreciados para o consumo ao natural. A época de frutificação geralmente compreende o período de dezembro a abril do ano seguinte, quando aparecem nas feiras em quantidade apreciável e disputada pelos consumidores. Oportunidades de comercialização: Importante cultura para agroindústria familiar, pois tem uma ampla possibilidade de produtos industriais populares como sucos, doces, licores, sorvetes e outros. No Pará, o murici é cultivado em escala agroindustrial. 28. Oiti Descrição: Família: Crisobalanacea (Rosacea); Nome científico: Licania tomentosa (Benth.) Fritsch; Nome comum: Frutacabeluda, goiti, guailí, guití, manga-da-praia, milho-cozido, oiti, oitizeiro, oiti-da-praia, oiti-cagão, oiti-mirim, oiticica, uiti. Centro de Origem: Mata Atlântica do Brasil. Características: Floresce geralmente no período do inverno, frutificando no verão. Embora consideremos aqui uma frutífera tropical, também pode ser cultivada em climas equatorial e oceânico. O sabor do seu fruto lembra o da manga, daí o nome vulgar manga-da-praia, mas que pode ter efeito laxativo, daí ter que ser consumido maduro, com pousio após a colheita de aproximadamente 5 dias. 41


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Oportunidades de comercialização: A espécie foi introduzida na Amazônia advinda do Nordeste e cultivada, principalmente para sombreamento de ruas e praças, tendo crescimento meio lento. Vale destacar que frondosas árvores de oiti se destacam na arborização urbana, como exemplo no sombreamento das ruas ao largo da Praça da Biblioteca, em São Luís (MA), mas também encontrada em Campo Grande, no Rio de Janeiro, Minas Gerais, e em São Paulo. Mais conhecida por suas características paisagísticas com raízes pivotantes e pouco agressivas, uso da madeira como moirões em fazendas, e alimento da fauna que pelo valor alimentício humano, embora muito nutritiva. 29. Patauá Descrição: Família: Arecaceae; Nome científico: Jessenia bataua (Mart.) Burret; Nomes comuns: Patauá (Brasil); Cuperi, Obango, Come, Aricaguá, Batauá (Colômbia); Chapil (Equador); Sacumana; Ungurauy; (Peru); Komboe (Suriname); Jagua (Trinidad); Palma Seje (Venezuela). Centro de origem: Origem amazônica, distribuída por toda bacia Amazônica, na parte ocidental da Colômbia; no Equador; na bacia do Orenoco, Trinidad e nas Guianas Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Em regiões com alta umidade, temperatura média de 25º C, altitude abaixo de 1.000m, tolera sombra quando jovem e adapta em solos pobres e arenosos. Não desenvolve em áreas alagadas, provavelmente porque sua germinação é lenta e não chega a se estabelecer. Características fitotécnicas: O Patauá é uma planta oleaginosa. Palmeira individual, inerme e monoica. O estipe é reto, de 25m de altura e 30cm de diâmetro, liso, com anéis de cicatrizes foliares. Os frutos representam cerca de 45 a 70% do peso total do cacho, são oblongos ou elipsoides de 3 a 4cm por 1,5 a 2,5cm, peso em média 8 a 9g; epicarpo liso, de cor entre púrpuro escuro e preto na maturação; mesocarpo carnoso, oleaginoso, de aproximadamente 0,5 a 1,5mm de espessura e cor entre o branco e púrpuro. Propagado por sementes, que germinam em 30 dias, mas o crescimento inicial é lento. A idade para transplantio varia de 18 a 24 meses, quando atinge 30cm de altura. Floresce entre dezembro e julho, da emergência da inflorescência a produção de frutos maduros, transcorre cerca de 1 ano. A frutificação inicia aos 8 anos de idade, quando a planta atinge 5 a 8m de altura, o fruto leva de 6 a 8 meses para amadurecer. A palmeira adulta, normalmente, produz 2 cachos de 15 a 20kg por ano. Oportunidades de comercialização: Apesar de não ser explorada economicamente, seu óleo tem propriedades para substituir o azeite de oliva na culinária. A polpa fornece o suco de patauá, preparado e consumido especialmente pela população do interior do estado do Amazonas. 30. Pitomba Descrição: Família: Sapindaceae; Nome científico: Talisia esculenta (St. Hil.) Radlk; Nomes comuns: Pitomba (Brasil); Carayà-Yola (Paraguai); Centro de origem: Originária da parte Ocidental da Amazônia se encontra distribuída desde o Amazonas até ao Rio de Janeiro, Paraguai e Bolívia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Não tolera solos encharcados. Adapta-se em uma grande amplitude climática, desde climas tropicais a subtropicais.

42


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Características fitotécnicas: A pitombeira é uma árvore mediana, de 10-15 m, frondosa, folhas alternas, compostas de 6, 8 e 10 folíolos. O fruto é uma baga subglobosa, mono ou disperma, de 3cm por 2,5cm, casca subcoriácea, amarela-esverdeada, semente oblonga, recoberta por um arilo carnoso, branco, de sabor agridoce, agradável. Tem em torno de 25 a 30% de polpa comestível. Contém 33 a 37mg de ácido ascórbico. Crescem em cachos de 10 a 25 unidades. Estima-se que uma planta adulta em boas condições produza 100 cachos. Propagação é por sementes. Oportunidades de comercialização: Encontrada em feiras especialmente na Amazônia e Nordeste, além do Paraguai e Bolívia. Importante fruteira para agricultura familiar. A árvore pode ser usada para arborização. Conclusões São muitas as frutíferas tropicais que podemos listar, mas neste pudemos colocar apenas sete frutas escolhidas cuidadosamente para o leitor. Ficamos assim de concluir nossa promessa de publicar um número de 40 frutas até ao texto final, não deixem de lê-lo a seguir.

Referências CALZAVARA, B. B. G; MÜLLER, C. H. & KAHWAGE, O. N.C. 1984. Fruticultura tropical: O cupuaçuzeirocultivo, beneficiamento e utilização do fruto. Belém, EMBRAPA-CPATU. 101 p. (EMBRAPA-CPATU, Documentos, 32). CAVALCANTE, P. B. 1976. Frutas comestíveis da Amazônia. 3ª edição. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém (Pará). 174 p. KERR, L; CLEMENT, R; CLEMENT, C & KERR, W.E. 1997. Cozinhando com a pupunha. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-Inpa, Manaus-Amazonas. 95p. LIMA, V.P.M.S. (Organizador). 1988. A cultura do cajueiro no nordeste do Brasil. Fortaleza, Banco do Nordeste do Brasil. Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste. 486 p. (Estudos Econômicos e Sociais, 35). MIRANDA, C. & COSTA, C. (Organizadores). 2005. Gestão Social do Território: Experiências no Estado do Maranhão. Brasília: IICA. 178p. (Desenvolvimento Rural Sustentável; v. 3). MMA/SUFRAMA/SEBRAE/GTA. 1998. Opções de investimento na Amazônia Legal: açaí. Brasília. 51p. MOURA, E. G. (Coordenador). 2004. Agroambientes de transição entre o trópico úmido e o semi-árido do Brasil: atributos, alterações, uso na produção familiar. Estação Produções Ltda., São Luís: UEMA. 312p. SCHULTZ, Q. & VALOIS, A. C.C. 1974. Estudos sobre o mecanismo de floração e frutificação do guaranazeiro. Manaus, IPEAAOc. p. 35-38 (IPEAAOc, Boletim Técnico, 4). SMITH, N. J. H.; WILLIAMS, J.T.; PLUCKNETT, D. L. & TALBOT, J. P. 1992. Tropical forests and their crops. Cornell University Press, Ithaca and London. 568 p. SOUSA, N. R. & SOUZA, A. G. C. 2001. Recursos fitogenéticos na Amazônia Ocidental: conservação, pesquisa e utilização. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental. 205 p. VALOIS, A. C. C. 1994. Genetics resources of palms. Acta Horticulturae, 360: 113-120. VALOIS, A. C. C. 2006. Fruticultura Tropical Atual e Potencial: espécies autóctones e exóticas de interesse econômico, social e ambiental. Vida Rural. Edição Especial, Ano 1, São Luís. 8 p. (ilustrado). VALOIS, A.C.C. 2003. Benefícios e estratégias de utilização sustentável da Amazônia. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica. 75p. VALOIS, A. C. C. 2006. Fruticultura Tropical Atual e Potencial: espécies autóctones e exóticas de interesse econômico, social e ambiental. Vida Rural. Edição Especial, Ano 1, São Luís. 8 p. (ilustrado).

43


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

7. Recursos Genéticos de Frutas Tropicais: Parte 4 Afonso Celso Candeira Valois

Introdução Isto é o Brasil onde “em se plantando tudo dá”, e desta forma as frutíferas podem ser encontradas em todas as regiões do país, logicamente que as de clima temperado se concentram mais ao Sul, enquanto que as tropicas mais ao Norte. O que nos interessa, para fins deste texto, é que encontramos comumente, nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, frutas tropicais como: abacaxi, banana, coco, cacau, caju, mamão, melão e o maracujá, enquanto nas regiões Sudeste e Sul vamos encontrar mais os citros e goiaba. (NUNES, 2008). Nosso mercado interno é um grande consumidor, cerca de 95% da produção total, mas a exportação vem crescendo, especialmente para a Europa. Logicamente esta atividade tem grande relevância social, pois gera milhões de empregos e trabalhos diretos e indiretos. Com clima diversificado, em alguns estados, é possível cultivar e produzir frutos o ano inteiro (DECICINO, 2007). Vamos então prosseguir nesta tarefa de listar nossas frutíferas, muitas delas pouco conhecidas, mas que possuem grande potencial, como a seguir: 31. Pupunha Descrição: Família: Palmaceae; Nome científico: Bactris gasipaes Kunth; Nomes comuns: Cachipay, Chonta, Chontaduro, Macanilla e Pejibaye (Américas Central e do Sul), Pupunha (Brasil), Peach Palm (Inglês); Centro de origem: A pupunheira encontra-se distribuída na grande maioria das regiões dos trópicos úmidos americanos. No entanto, a sua origem continua no campo das especulações, supondo-se que a sua pátria de origem estaria no Peru, Bolívia ou mesmo em certas áreas do Panamá, Colômbia e Equador. Mas, provavelmente, o sudoeste da Amazônia seja o seu centro de origem. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Na época da conquista das Américas, a pupunheira era distribuída do Sudeste de Honduras (16ºN) ao centro Sul da Bolívia (18ºS) e do Sudoeste da Costa Rica (84º W) ao Leste da Amazônia Brasileira (46º N), sempre com ocorrência em áreas com altitudes inferiores a 1.200m, pluviosidade acima de 1.500 mm e solos de textura média a argilosa, bem drenados. Ocorre na costa atlântica das Américas Central e do Sul até São Luís (Maranhão) e também ao longo da costa do Pacífico, do sul da Costa Rica até ao norte do Peru. Características fitotécnicas: A pupunheira é a única palmeira domesticada nos trópicos americanos, tendo a primazia de só ser encontrada em estado de cultivo ex situ. Seu processo de domesticação teve por base o interesse dos primeiros povos americanos pelo uso da sua madeira para a fabricação de instrumentos de pesca, caça e guerra devido a sua flexibilidade e dureza. Hoje em dia também se privilegia seus frutos pela riqueza em óleo e fonte de energia semelhantes ao milho e mandioca, além de seu saboroso palmito. Assim, para o seu melhoramento genético torna-se imperioso considerar a pupunheira também como uma fruteira tropical para a produção 44


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

de frutos e palmito. O fruto tipo drupa possui variação na forma, no tamanho, e cor, inclusive na constituição do pericarpo, com frequente aborto das sementes. Quando maduros podem ter casca vermelha, amarela e outras cores intermediárias, ou mesmo totalmente verdes; quanto à forma são ovoides, cônico-globosos ou arredondados, tendo geralmente a base aplainada; mesocarpo (parte comestível) geralmente tem a cor amarelo-alaranjado, espesso, carnosoamiláceo, com um teor de gordura mais acentuado em algumas cultivares e quase ausente em outras. A planta é monoica com flores femininas e masculinas no mesmo espádice, com o número de inflorescência por pé variando em torno de 10. A ideal para o melhoramento é aquela sem espinhos, pois comumente apresenta espinhos ao longo de toda a planta e, esporadicamente com poucos, o que deve ser em consequência da base genética original, isto é, do cruzamento natural interespecífico entre a Guilielma microcarpa Huber e Guilielma insignis Mart. A partir de um único pé, a pupunheira forma uma touceira de vários perfilhos que, quando adultos, é comum encontrar-se de 3-5 indivíduos frutificando simultaneamente. O tronco (estipe) é cilíndrico, com cerca de 20m de altura, possuindo internós revestidos de espinhos finos e penetrantes, exceto nas cultivares inermes (sem espinhos). A propagação da pupunheira pode ser feita tanto por sementes como por brotos basais, sendo que o primeiro favorece a segregação mendeliana (não reproduz as características desejadas da planta matriz), enquanto que o segundo (propagação vegetativa ou assexuada) garante as qualidades da planta mãe, além de reduzir o tempo para o início da frutificação. Mesmo em nichos da Amazônia ou mesmo em áreas do Centro-Oeste e Sudeste do Brasil onde a planta é cultivada é comum o aparecimento de frutos sem caroço (sementes), principalmente pela carência de insetos polinizadores e grau de grão de pólen estéril, aparecendo o fenômeno da partenocarpia, o que torna o produto ainda mais atrativo ao consumo. Oportunidades de comercialização: Os frutos da pupunha possuem um excelente poder de mercado, pois são bastante procurados para consumo após cozidos, sendo muito apreciados pelas classes populares. A pupunheira além de possuir amido, óleo e proteínas, ostenta uma boa composição de vitaminas, especialmente a vitamina A, da qual grande parte da população é carente. O fruto é um alimento de alta qualidade, e diante da larga variabilidade genética que apresenta é possível selecionar genótipos superiores que possuam boa concentração de vitamina A, cujos frutos têm polpas mais alaranjadas, chegando até a quase avermelhada. Também é possível selecionar pupunhas com bons valores fenotípicos para a produção de óleo. Detentores de um sabor inigualável, os frutos podem ser degustados no café-da-manhã (cozidos, em forma de omelete, pãozinho, farinha, fatias fritas, geleia, casquinhos, bolinhos, croquetes), bebidas (vitaminada, suco, cerveja), saladas verdes e sopas, entradas (tomate recheado com pupunha, arroz com pupunha, massa para pizza de pupunha, farofa, maionese, macarronada com pupunha), em misturas com carnes, aves, peixes e ovos, além de pirão, bolos, biscoitos, mousse de pupunha, massa doce de pupunha e outras delícias. Após colhidos e em condições normais de acondicionamento podem durar cerca de 10 dias sem haver a deterioração. O aparecimento nas feiras inicia-se quase regularmente no mês de novembro, prolongando-se até junho do ano seguinte, sendo o clímax da safra entre os meses de março e maio. A pupunheira fornece ainda um excelente palmito, já encontrado comumente nos mercados, podendo ser explorada para tal a partir dos 3-4 anos de idade. Composição química dos frutos: a composição nutritiva média dos frutos é a seguinte (100 gramas): água- 53,2g; proteína- 3,3g; gordura- 6,0g; carboidratos (amido e açúcares) - 34,9g; fibra- 2,0g; calorias- 273g. Composição química do palmito: a composição química do palmito em estado natural é a seguinte: umidade- 88,4%; proteína- 2,32%; matéria graxa- 2,16%; cinzas- 1,21%; fibras- 1,05%; ácido cianídrico- 3,73 (mg/100g) e vitamina C- 3,2 (mg/100g), enquanto que a composição 45


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

mineral em mg/100g é: fósforo- 94,0; ferro- 4,3; cálcio- 114,0; magnésio- 80,0; sódio- 1,33; potássio- 337,6; cobre- 0,159; zinco- 0,79; magnésio- 0,48. 32. Puruí Grande Descrição: Família: Rubiaceae; Nome científico: Borojoa sorbilis (Huber) Cuatrec.; Nome comum: Apuruí. Borojó; Centro de origem: Encontrado no sudoeste do estado do Amazonas, em alguns locais do médio Purus, Solimões, Juruá, Javari e Madeira, em matas não inundadas, em estado silvestre. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Ocorre em solos bem drenados, pobres em nutrientes. Temperatura média de 26º C. Precipitação média anual de 2.000mm a 2.800mm. Características fitotécnicas: Pequena árvore de 4-6 m, com folhas amplas, opostas, cruzadas, adensadas no ápice dos ramos, medindo de 25-50 cm de comprimento e 15-26 cm de largura. Fruto globoso, de 8-10 cm de diâmetro, com pericarpo consistente, polpa semelhante a do tamarindo (Tamarindus indica L.), servindo para o preparo de refrescos ou doces; sementes numerosas, de forma mais ou menos triangular, cerca de 2 cm de comprimento; frutos maduros em março. Oportunidades de comercialização: Devido seu sabor agradável é cultivado em pomares caseiros e comercializados em mercados locais. 33. Rambutan Descrição: Família: Sapindaceae; Nome científico: Nephelium lappaceum L.; Nomes comuns: Rambutã, Rambutão, Rambutan, e Rambuteira; Centro de origem: Malásia, muito encontrada no Sudeste Asiático e Tailândia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Planta tipicamente tropical, cultivada em locais somente com temperatura acima de 15º C. Solos profundos, bem drenados e ricos em matéria orgânica. Características fitotécnicas: Os cultivares comerciais produzem predominantemente flores hermafroditas. A propagação é por semente, enxertia e alporquia. O plantio pode ser feito no espaçamento de 6m x 4m. Quando plantada por semente, a frutificação ocorre aos cinco anos e vegetativamente após dois anos de idade. O fruto é consumido in natura. Oportunidades de comercialização: Com grande mercado e cultivos em diversos países da Ásia e inclusive na Austrália. No Brasil, foi introduzido na Bahia, Pará e Amazonas, e a comercialização dos frutos é feita comumente em feiras nestas regiões. 34. Sapota Descrição: Família: Bombacaceae; Nome científico: Quararibea cordata (Hum. & Bonpl.)Visch.; Nomes comuns: Sapota-do-Solimões, Sapota-do-Peru (Brasil), Sapote (Inglês), Zapote, ChupaChupa (Colômbia), Mame Colorado (Venezuela); Centro de origem: Provavelmente, originária da

46


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

bacia do médio e do alto Solimões. Distribuída desde o município de Tefé no Amazonas até o Peru oriental, Colômbia e Equador. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Planta tropical, temperatura ideal acima de 18º C. Exige solos férteis, profundos e bem drenados. Características fitotécnicas: No estado in situ, em mata virgem, a árvore cresce até 40m, porém quando cultivada ex situ atinge cerca de 10-15 m. O período de floração da planta está compreendido entre agosto e novembro com os frutos maduros de fevereiro a maio do ano seguinte, produzindo de 700 a 1.000 frutos por planta/ano. O fruto é uma baga ovalada de 10-13 cm de comprimento, peso entre 300 - 1.100g, casca verde-castanho, coriácea e espessa, sendo que geralmente se desenvolvem duas a três sementes que são envolvidas por uma polpa amarelo alaranjada, de sabor açucarado, agradável. A polpa é consumida in natura, em forma de suco e em saladas. Sua propagação é efetivada por sementes. Oportunidades de comercialização: É consumida na parte ocidental do estado do Amazonas, a partir do município de Tefé, no rio Solimões, bem como na Colômbia e Peru, além de Cruzeiro do Sul, no estado do Acre. Comumente seus frutos são encontrados nas feiras das seguintes cidades do estado do Amazonas: Tefé, Tocantins, Santo Antônio do Iça, São Paulo de Olivença, Tabatinga, Benjamim Constant e Atalaia do Norte. O cultivo está expandindo em toda a América, devido ao sabor de seus frutos, quantidade de fibras e suas características favoráveis de transporte. Mesmo assim, não há plantio comercial estabelecido. Aparece em pomares familiares mesclada com outras fruteiras. 35. Sapoti Descrição: Família: Sapotaceae; Nome científico: Manilkara zapota L.; Nomes comuns: Sapoti (Brasil), Chicozapote, Níspero (Espanhol), Sapodilla (Inglês); Centros de origem: Originário do México e América Central. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Planta de clima tropical, temperatura de 14º C a 34º C, altitude até 1000m. Exige solos bem drenados e profundos. Características fitotécnicas: Árvore cuja altura chega a 20m, de ramificação ampla, tronco robusto e baixo em relação à altura da copa. O fruto é uma baga arredondada ou ligeiramente ovalada, casca recoberta por um indumento pulverulento, fuscoferrugíneo, polpa suculenta e doce, de sabor e odor agradáveis, contendo de 1- 4 sementes achatadas, negro-brilhosas, de 2 - 2,5 cm, peso do fruto de 150 - 300 g. O fruto é rico em cálcio (28mg por 100g), ferro (2mg/100g) e fósforo (27mg/100g). Na Flórida - USA são citadas as cultivares Prolific, Brown sugar, Modello e Russel. Na Índia existem cerca de 20 cultivares. No Brasil tem a cultivar “Chocolate” (BAG: IPA-180), com produção média de 110kg/planta (1030frutos/planta). A planta produz um látex branco que é aproveitado na indústria de goma de mascar. Os frutos geralmente são consumidos in natura ou em forma de sorvete, sendo encontrados em feiras durante o ano inteiro. Em plantas adultas a produção pode chegar a 1.000 frutos. Oportunidades de comercialização: O seu cultivo é principalmente para extração de látex para elaboração da goma de mascar, e seus principais produtores são Honduras, Guatemala e 47


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

México. No México existe plantio de 4.000ha, os quais representam as maiores plantações comerciais dessa fruta no mundo. Existem também numerosos pomares caseiros que mantêm abastecido de frutas os mercados locais, praticamente o ano todo. No Brasil, a região Nordeste é a principal produtora. 36. Tamarindo Descrição: Família: Cesalpinaceae; Nome científico: Tamarindus indica L.; Nomes comuns: Tamarind (Inglês), Tâmara da Índia, e Tamarindo; Centros de origem: O gênero contém apenas uma espécie, cuja origem exata é discutida, se da África Tropical ou da Ásia Meridional. A árvore encontrase cultivada em todas as regiões tropicais Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: A espécie encontra-se cultivada em todas as regiões tropicais e subtropicais. Solos bem drenados, profundos e férteis. Características fitotécnicas: A planta alcança até 20m de altura. O fruto é uma vagem indeiscente, de cor castanha, com uma polpa acidulada, contendo 12% de ácido tartárico e 30% de açúcar, muito empregada na fabricação de compotas, sorvetes, licor e refrescos e, na medicina, como laxante. A propagação é por semente, alporquia e garfagem. Embora domesticada, ainda não tem cultivares definidas. Oportunidades de comercialização: Aparece nas feiras no período de julho a dezembro. Com potencial para uso na agroindústria familiar. 37. Tanjaroa Descrição: Família: Rutaceae; Nome científico: Citrus reticulata Blanco; Nomes comuns: Tanja, Tangerina, Tangerina-deRosário, Tanjaroa; Centro de origem: As tangerinas se originaram, provavelmente, do Nordeste da Índia ou no Sudeste da China. As plantas cítricas foram introduzidas no Brasil pelas primeiras expedições de colonizadores, provavelmente na Bahia. Ela se destaca dentre os citros existentes no Maranhão, considerada uma importante fruta naturalizada nesse Estado, especialmente no município de Rosário. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: De maneira geral, a Tanjaroa apresenta bom comportamento produtivo em condições tropicais. A faixa de temperatura média adequada varia de 22 a 30ºC, com o ideal ao redor de 25ºC. Na região de Rosário onde a média anual é de 27ºC, e as chuvas são concentradas no período de janeiro a junho, com total anual médio de 1.500 mm, encontra ali condições adequadas de propagação. As maiores populações naturais da Tanjaroa ocorrem na região de Rosário e na Baixada Ocidental maranhense, embora se encontre espalhada por todo o Estado através da propagação por sementes. Esse tipo de propagação conduz a uma grande variabilidade genética, proporcionando alta variação morfológica nos descendentes, o que conduz ao fenômeno da poliembrionia, o que permite a seleção e fixação de genótipos superiores e melhor adaptados aos diferentes nichos. Características fitotécnicas: As plantas são de porte alto, atingindo cerca de 7 metros (típicas de pés-francos), com fortes características juvenis (presença de espinhos nos ramos e grande 48


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

vigor). O porte elevado dificulta a colheita e os tratos culturais. No município de Bacabeiras (MA) foram identificados genótipos com mais de 50 anos, o que demonstra a sua grande longevidade, e com produção variando muito, de 400 a 3.500 frutos, por planta. As principais características físicas e químicas dos frutos possuem os seguintes valores médios: diâmetro longitudinal e transversal de 5,8cm, com índice de conformação de 1,0 (formato esférico), espessura da casca de 3,1mm, teor de suco de 34,1%, número de sementes em torno de 15 por fruto e número de segmentos (gomos) entre 9 e 10. A coloração da casca é predominantemente verde com laivos amarelados, enquanto que a cor da polpa varia entre o amarelo claro ao laranja forte. O teor de sólidos solúveis totais se situa em torno de 10 brix, com acidez de 1,24%. O sistema agroflorestal adotado permite ao produtor conservar plantas de alto valor genético, econômico, social, ambiental e ético, evitando o risco da erosão genética ou extinção de germoplasma superior. Cultivada em larga escala na região de Rosário, Anajatuba, Presidente Juscelino, Axixá, Bacabeiras e em outros municípios maranhenses, por agricultores de produção familiar. O fruto possui boa qualidade alimentar e nutricional, por seu alto teor em vitamina C, açúcares, sais minerais e fibras. A fenologia das plantas está perfeitamente sincronizada com o período chuvoso. O florescimento é intenso e ocorre com as primeiras chuvas de dezembro e principalmente de janeiro, enquanto o período de desenvolvimento e maturação dos frutos se completa entre junho e julho. Oportunidades de comercialização: A Tanjaroa é muito popular no mercado maranhense, principalmente em São Luís, de forma que a produção, quase sempre oriunda de quintais domésticos, a qual não atende à demanda dos consumidores. O fruto é consumido in natura e na forma de suco, considerando ainda a possibilidade de obtenção da polpa e produção de suco concentrado. Quando maduro, muitas vezes o fruto apresenta a casca ainda de coloração verde, o que se traduz em uma excelente característica diferencial vantajosa em relação a outras cultivares de tangerina, em face do seu alto poder de vida útil de prateleira (armazenamento). A colheita dos frutos se concentra nos meses de junho, julho e agosto, podendo chegar até setembro. 38. Taperebá Descrição: Família: Anacardiaceae; Nome científico: Spondias mombin L.; Nomes comuns: Taperebá (Amazônia), Cajá (Nordeste), Cajazinho (Maranhão), Cajá-Mirim (Sul do Brasil), Hogplug (Inglês); Centro de origem: Provavelmente originário da Amazônia, está distribuído no Norte e Nordeste do Brasil. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Cosmopolita tropical. Precipitação pluvial de 1.500mm a 3.200mm, temperatura entre 25º C e 30º C e umidade relativa entre 70 e 90%. Características fitotécnicas: Árvore com altura ao redor de 25 m, tronco revestido de casca espessa e fendida. O fruto é uma drupa de 3-4 cm de comprimento, casca fina, lisa, de coloração amarelo alaranjada, polpa escassa, sucosa, doce-acidulada, de sabor e odor apreciáveis, endocarpo espesso e varia em formato de globoso a piriforme, pequenas ou grandes. A propagação é por sementes ou por estacas. Oportunidades de comercialização: A árvore fornece madeira branca e elástica, usada na fabricação de caixas. O fruto é usado na fabricação de sucos, sorvetes, geleias e compotas.

49


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Comercializado principalmente nas agroindústrias produtoras de polpa. O fruto aparece nas feiras durante todo o ano, sendo em maior quantidade na estação chuvosa. 39. Tucum Descrição: Família: Arecaceae; Nome científico: Astrocaryum aculeatum G. F. W. Meyer; Nomes comuns: Tucumã, Tucumã-Açu (Brasil), Star Nut Palm (Inglês), Tackoeman, Waran (Suriname), Chambira (Colômbia), Kuru (Guiana), Hericungo (Peru), Tucum (Maranhão); Centro de origem: Provavelmente originado do Amazonas e se encontra distribuído até às Guianas, Peru e Colômbia. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Tolera solos pobres, e períodos de seca por poucos meses em área que recebe acima de 1.600mm de chuvas por ano. Características fitotécnicas: Das espécies de tucumã é a mais comum. Palmeira solitária, monoica, estipe de 10 a 15m de altura, provido de espinhos pretos, dispostos em anéis que se adensam na metade superior do estipe. Os frutos são globosos ou ovoides, de 5 a 6cm de diâmetro, peso de 70 a 75g e coloração verdeamarelada. Polpa amarelo alaranjada, firme, de 7 a 8mm de espessura; endocarpo negro, contendo no interior uma amêndoa (endosperma). Propagado por sementes. Existe também a espécie Astrocaryum vulgare Mart. conhecida como Tucumã-do-Pará, que cresce em touceiras com média de 4 estipes, podendo chegar até a 18. A espécie, praticamente, tem o mesmo uso do tucumã amazonense, entretanto o fruto é de pior qualidade por ser mais fibroso para o consumo in natura. Oportunidades de comercialização: São fontes especiais de provitamina A, com grande superioridade em relação a outras espécies como abacate, buriti e cenoura. Também, o seu valor em vitamina B1 (tiamina) é bem pronunciado, bem como o seu teor em vitamina C (ácido ascórbico), rivalizando com os frutos cítricos, além de ter grande o valor energético da polpa comestível. Muito utilizado na agroindústria e em cafés regionais, na fabricação de sanduíches. 40. Uxi Descrição: Família: Humiriaceae; Nome Científico: Endopleura uchi (Huber) Cuatrecasas; Nomes comuns: Uxi, Uxipucu (Amazônia); Centro de origem: Espécie originária da Amazônia brasileira, encontrada em estado silvestre da mata primária de terra firme, dispersa por todo Pará e Amazonas. Grau de adaptação aos diversos nichos ecológicos: Ocorre em solos bem drenados de terra firme, clima quente e úmido e de baixa altitude. Características fitotécnicas: Árvore com altura de 25 a 30m, tronco reto, cilíndrico, com até 1m de diâmetro, casca com 2cm de espessura e copa ampla. O fruto é uma drupa oblongaelipsoide, de 5 a 7cm de comprimento, 4cm de diâmetro e peso entre 50 a 70g; exocarpo liso, verde amarelado ou pardo escuro quando maduro; mesocarpo comestível, de 5mm de espessura, carnoso, farináceo e oleoso; endocarpo lenhoso, duro com sulcos profundo no sentido 50


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

longitudinal, contendo tecido fibroso dando à superfície do caroço aparência lisa. Somente com a remoção ou decomposição da estrutura fibrosa pode-se observar os sulcos e as arestas do endocarpo, no interior do qual, encontram-se 1 a 2 sementes alongadas com 2 a 3 cm de comprimento e 0,7cm de largura. A propagação é por sementes, com germinação entre 9 e 10 meses. As árvores frutificam a partir de 15 anos de idade. Oportunidades de comercialização: É uma fruta silvestre da Amazônia, onde é bastante apreciado pelas classes populares como complemento da alimentação, sendo também empregado na agroindústria na produção de sorvetes, licores e doces em pasta. A época de frutificação vai de dezembro a maio do ano seguinte. Raramente cultivada, provavelmente por ser árvore de crescimento lento, que só frutifica após os 15 anos de idade. Conclusões Este texto fecha a série de quatro na pesquisa que elaboramos, o que foi um prazer muito grande para disponibilizá-la aos leitores da Revista RG News, revelando dados resumidos de 40 frutíferas tropicais que consideramos prontas para uso no Brasil, na esperança de que espero que lhes sejam úteis e tragam mais frutos à agricultura brasileira. Logicamente poderiam ser mais espécies, mas creio que a quantidade escolhida já dá uma boa ideia do potencial pouco explorado da fruticultura. Ainda para efeito de singela contribuição para elevar conhecimento dos nossos prezados fruticultores, encerra-se esta série oportunizada pela citada Revista, com destaques adicionais que podem ser usados quando se deseja capacitar produtores rurais levando em conta os vários níveis de aprendizagem. Assim existem aqueles agricultores que ainda não utilizam as boas práticas agrícolas (BPA) recomendadas, mas que precisam adotá-las, inclusive pela inclusão dos sete princípios do sistema APPCC (análise de perigos e pontos críticos de controle), BPF (Boas Práticas de Fabricação), PPHO (procedimento padrão de higiene operacional), AR (análise de riscos) e PI (produção integrada), tudo isso como prioridade para a adequação de uma visão sistêmica de integração com o ideótipo da planta requerido para o agronegócio comercial ou mesmo familiar pretendido. Considerando uma produção integrada de frutas (PIF) como exemplo, dentro de uma visão holística, o seguinte ideótipo de cultivares pode ser considerado: produção e produtividade adequadas; maturação uniforme de grãos; resistência a patógenos (horizontal de preferência) de pré-colheita e pós-colheita e com genes fortes de resistência vertical; tolerância a fatores abióticos; baixa exigência a nutrientes e corretivos de solos; uniformidade de altura para facilitar o processo de colheita e tratos culturais; tolerância ao acamamento; resistência ao desgrano para evitar perdas no processo de colheita; tolerância a choques físicos de transporte; longevidade de prateleira (armazenamento); palatabilidade desejada; apresentem eficiência, eficácia e efetividade no processo de colheita; valor cultural adequado das sementes; qualidade e quantidade de polpa; qualidade nutricional elevada; atendimento à legislação de sementes e mudas (certificação); tolerância aos tratamentos de sanificação e de empacotamento; longevidade adequada do cultivo; características recomendadas para a transformação da produção; formato e coloração de sementes e frutos desejados; características adequadas de folhosas e tubérculos; possuidora de homeostase do desenvolvimento. 51


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Referências CALZAVARA, B. B. G; MÜLLER, C. H. & KAHWAGE, O. N.C. 1984. Fruticultura tropical: O cupuaçuzeirocultivo, beneficiamento e utilização do fruto. Belém, EMBRAPA-CPATU. 101 p. (EMBRAPA-CPATU, Documentos, 32). CAVALCANTE, P. B. 1976. Frutas comestíveis da Amazônia. 3ª edição. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém (Pará). 174 p. DECICINO, R., 2007. Fruticultura no Brasil: Importância econômica para o país. In: http://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/fruticultura-no-brasil-importancia-economica-para-o-pais. Obtido em: 28/09/2016. KERR, L; CLEMENT, R; CLEMENT, C & KERR, W.E. 1997. Cozinhando com a pupunha. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-Inpa, Manaus-Amazonas. 95p. LIMA, V.P.M.S. (Organizador). 1988. A cultura do cajueiro no nordeste do Brasil. Fortaleza, Banco do Nordeste do Brasil. Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste. 486 p. (Estudos Econômicos e Sociais, 35). MIRANDA, C. & COSTA, C. (Organizadores). 2005. Gestão Social do Território: Experiências no Estado do Maranhão. Brasília: IICA. 178p. (Desenvolvimento Rural Sustentável; v. 3). NUNES, José Luís da Silva, 2008. In: http://www.agrolink.com.br/noticias/com-nova-sede--arysta-querexpandir-negocios-na-america-latina_81113.html. Obtida em 28/09/2016. MMA/SUFRAMA/SEBRAE/GTA. 1998. Opções de investimento na Amazônia Legal: açaí. Brasília. 51p. MOURA, E. G. (Coordenador). 2004. Agroambientes de transição entre o trópico úmido e o semi-árido do Brasil: atributos, alterações, uso na produção familiar. Estação Produções Ltda., São Luís: UEMA. 312p. SCHULTZ, Q. & VALOIS, A. C.C. 1974. Estudos sobre o mecanismo de floração e frutificação do guaranazeiro. Manaus, IPEAAOc. p. 35-38 (IPEAAOc, Boletim Técnico, 4). SMITH, N. J. H.; WILLIAMS, J.T.; PLUCKNETT, D. L. & TALBOT, J. P. 1992. Tropical forests and their crops. Cornell University Press, Ithaca and London. 568 p. SOUSA, N. R. & SOUZA, A. G. C. 2001. Recursos fitogenéticos na Amazônia Ocidental: conservação, pesquisa e utilização. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental. 205 p. VALOIS, A. C. C. 1994. Genetics resources of palms. Acta Horticulturae, 360: 113-120. VALOIS, A.C.C. 2003. Benefícios e estratégias de utilização sustentável da Amazônia. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica. 75p. VALOIS, A. C. C. 2006. Fruticultura Tropical Atual e Potencial: espécies autóctones e exóticas de interesse econômico, social e ambiental. Vida Rural. Edição Especial, Ano 1, São Luís. 8 p. (ilustrado).

52


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

8. Variabilidade genética de abóboras da região metropolitana de Manaus, Amazonas Pedro Chaves da Silva Graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Amazonas (2009) com pósgraduação em Gestão e Políticas Públicas (2015). Técnico em Zootecnia formado pela Escola Agrotécnica Federal de Manaus (2002). Possui o título de Mestre em Agricultura no Trópico Úmido pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (2016). Tem experiência na área de Agronomia, atuando principalmente nos seguintes temas: Agricultura familiar, melhoramento genético de hortaliças, assistência técnica e extensão rural, olericultura, fruticultura, culturas industriais, manejo e tratos culturais no cultivo de guaranazeiros, produção em ecossistema de várzea, administração e economia rural, crédito rural e engenharia rural. Conselheiro na Câmara Especializada de Agronomia do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Amazonas (CREA AM). E-mail: pedrochaves.am@gmail.com

Danilo Fernandes da Silva Filho Tecnólogo Modalidade Indústria da Madeira pelo Instituto de Tecnologia da Amazônia (1983), graduado Eng. Florestal pelo Instituto de Tecnologia da Amazônia (1991), possui os títulos de Mestre em Agronomia (Melhoramento Genético Vegetal) pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1994) e de Doutor em Ciências Biológicas (Botânica econômica) pelo convênio mantido entre o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA e a Universidade Federal do Amazonas - UFAM (2002). É pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, credenciado nos Programas de Pós-Graduação em Agricultura no Trópico Úmido do INPA e em ciências do ambiente e sustentabilidade na Amazônia da UFAM, em Manaus. Suas linhas de pesquisas incluem: conservação de recursos genéticos vegetais; melhoramento genético e de sistemas de cultivos para hortaliças convencionais e não convencionais, medicinais, condimentares e ornamentais; agricultura familiar rural e urbana. E-mail: danilo@inpa.gov.br

César Augusto Ticona Benavente Bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade Nacional de San Agustín, Peru (2000), possui os títulos de Mestre em Melhoramento Genético de Plantas pela Universidade Nacional Agrária La Molina, Peru (2002) e de Doutor em Genética e Melhoramento de Plantas, pela Universidade Federal de Lavras-UFLA, Brasil (2010). Atualmente é Pesquisador Associado do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia desenvolvendo projetos visando o melhoramento de jacatupé (Pachyrhizus spp.), cubiu (cocona) e tomate. Tem experiencia em melhoramento (batata-inglesa e Capsicum spp.) e estatística. E-mail: cesar.benavente@gmail.com

53


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Resumo O objetivo deste trabalho foi avaliar a diversidade genética de 13 populações de abóboras com massa média de fruto entre 1,5-3,0 kg, as quais são cultivadas na região metropolitana de Manaus-AM. Para tanto, foram utilizados 15 descritores fenológicos e agronômicos. Os experimentos foram conduzidos em dois ambientes de terra firme de Manaus, um em Argissolo Vermelho-Amarelo e outro em Latossolo Amarelo. Os resultados mostraram que nove POPs são abóbora de leite (Cucurbita moschata Duchesne) e quatro caboclas (C. maxima Duchesne). Foram detectadas diferenças significativas (p<0,05) em ambos locais apenas para nove características do fruto tais como: produtividade (3,4-21,7 t ha-1), massa (0,5-4,1 kg), espessura da polpa (1,6-3,3 cm), massa da placenta (27-192 g), número de sementes (352,5-796,5), comprimento (7,6-25,3 cm), diâmetro (10,6-20,6 cm), largura (7,8-14,3 cm) e altura da cavidade interna (5,2-16,4 cm). No Argissolo as POPs 1 PCS de Iranduba (13,17 t ha-1) e 7 SIL de Silves (11,69 t ha-1), foram as que tiveram maior produtividade. No latossolo, as POPs 1 PCS de Iranduba (21,72 t ha-1) e 3 PF de Presidente Figueiredo (19,22 t ha-1) foram as mais produtivas. Estes resultados indicam que há diversidade genética para características de fruto, e em consequência se poderiam fazer seleções para melhoramento ou como novas cultivares. Palavras chave: Cucurbita spp., abóboras crioulas, recursos genéticos vegetais, avaliação de acessos. Abstract GENETIC VARIABILITY OF PUMPKINS FROM THE METROPOLITAN REGION OF MANAUS, AMAZONAS STATE Pumpkins are vegetables and are among the main plant genetic resources of economic interest in the Amazon region. The objective of this work was to evaluate the genetic diversity of populations of pumpkins cultivated in the metropolitan region of Manaus, using phenological and agronomic descriptors. Thirteen populations of pumpkins were evaluated in experiments conducted at INPA (Experimental Vegetable Stations) and Experimental Farm of the Federal University of Amazonas - UFAM (Fazenda UFAM), municipality of Manaus, AM. Of the 13 populations evaluated, nine were identified as milk squash (Cucurbita moschata Duchesne) and four populations such as cabocla squash (C. maxima Duchesne). Significant contrasts were detected at a 5% probability level by the Tukey test. In the area of EEH INPA, the populations (POPs) of Iranduba (13.17 t ha-1) and Silves (11.69 t ha-1) were the ones that had higher productivity. At the Fazenda da UFAM, the POPs of Iranduba (21.72 t ha-1) and Presidente Figueiredo (19.22 t ha-1) were the most productive ones. The phenotypic variability detected in the populations allows the selection of several accessions, which can be immediately used in breeding programs for pumpkins in the state of Amazonas. Key words: Cucurbita spp., landraces, plant genetic resources, accession evaluation. 1. Introdução As abóboras (abóbora-amarela, jerimu ou jerimum) pertencem à família Cucurbitaceae, ao gênero Cucurbita L. e são hortaliças que apresentam ampla variabiliade genética e são bastante cultivadas por agricultores familiares nas área de várzea e terra firme do Estado do Amazonas, principalmente em comunidades ribeirinhas locais, e estão entre as principais espécies de interesse econômico na região (IDAM, 2016). No entanto, devido a diversidade fenotípica 54


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

encontrada nos cultivos, durante a seleção dos frutos para comercialização, muitos são deixados nas propriedades rurais, feiras e centros de comercialização por não atenderem às características (aparência, formato, massa, sabor e tamanho) exigidas pelos consumidores que visam maior praticidade e qualidade dos frutos. A grande variabilidade genética de abóboras é de suma importância para alimentação humana tanto pela versatilidade de uso na culinária (SILVA, 2012), quanto pelas propriedades medicinais e na sua composição nutricional, destacando-se os carotenóides (precursores de vitaminas A), a presença de vitamina C e sais minerais, são fatores que contribuíram para seu uso na alimentação (ASSIS et al., 2007). No Brasil, a produção de abóboras de acordo com o Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2006), registrou a produção de cerca de 384.912 t de abóboras, numa área colhida de 84.478 hectares, distribuída entre 127.738 estabelecimentos agropecuários brasileiros. No Amazonas, de acordo com o Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal do Estado do Amazonas - IDAM, a estimativa da produção de jerimum foi de 36.445 toneladas em 2.796 hectares de área plantada por 9.407 beneficiários no ano de 2015 (IDAM, 2016). Em muitas regiões brasileiras um grande número de variedades de abóboras vêm sendo mantidas em propriedades rurais de agricultores familiares. Na Bacia Amazônica também é encontrada uma grande diversidade de abóboras, as quais parecem se concentrar ao redor das cidades maiores e no caso do Amazonas estas estariam na região metropolitana de Manaus. Apesar do Brasil não parecer ser um centro de origem das abóboras (KATES et al., 2017) é um centro de diversidade, especialmente na região nordeste. Entretanto diversos tamanhos e formatos de C. moschata e C. maxima têm sido observados em feiras de Manaus. Ao mesmo tempo, a abobora produto de cruzamento interespecífico entre C. moschata e C. maxima produzindo o híbrido‘Tetsukatuto’, chamada de ‘Cabotiá’, é muito mais apreciada por seu tamanho e sabor, já sendo plantada neste município apesar do custo elevado das sementes. Portanto, estudos sobre a variabilidade genética de abóboras de massa em torno de 2 kg são necessárias para desenvolver variedades com características semelhantes a Tetsukabuto. Assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a diversidade genética de populações de abóboras com esta característica e que ao mesmo tempo sejam cultivadas na região metropolitana de Manaus. Para tanto foram utilizados descritores morfológicos e agronômicos. 2. Material e Métodos Foram avaliadas 13 populações de abóboras cultivadas na região metropolitana de Manaus (Figura 1), mantidas na coleção de trabalho do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia INPA, em Manaus. Dois experimentos foram conduzidos, simultaneamente, nas Estações Experimentais de Hortaliças do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA, situadas na coordenada geográfica de 59º 48' 70,01'' S e 60º 01' 25,13” O, a 72 metros de altitude, localizada no km 14 da rodovia estadual AM 010, em solo Argissolo Vermelho-Amarelo, e na Fazenda Experimental 55


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, na coordenada geográfica 02º 37' 17,1'' S e 60º 03' 29,1” O, localizada no km 38 da rodovia federal BR 174, em Latossolo Amarelo, município de Manaus, Estado do Amazonas.

Figura 1 - Origem das populações de abóboras avaliadas: 1. Iranduba, 2. Manacapuru, 3. Presidente Figueiredo, 4. Rio Preto da Eva, 5. Manaquiri, 6. Itapiranga, 7. Silves, 8. Itacoatiara, 9. São Sebastião do Uatumã, 10. Urucará, 11. Careiro, 12. Autazes e 13. Manaus.

O preparo das áreas experimentais foi mecanizado, com uso de tratores agrícolas na aração e gradagem do solo. As covas abertas, manualmente, com enxadas, em dimensões de 0,30 m de largura e 0,30 m de profundidade em um espaçamento de 2,5 m entre as plantas e 2,5 m entre as fileiras. As mudas foram transplantadas para o local definitivo, 20 dias após a semeadura, com 10 cm de altura e três folhas definitivas. Aos dez dias após o transplantio foi feito o desbaste, deixando-se apenas uma planta por cova. Durante a condução do experimento foi realizado o manejo agrícola recomendado para cultivo de abóboras na região (FILGUEIRA 2008). Durante o desenvolvimento do experimento foram realizadas três adubações, sendo uma de fundação (2,0 kg de adubo orgânico curtido, 20 g de sulfato de amônio, 100 g de superfosfato triplo, 30 g de cloreto de potássio e 20 g de FTE BR 12 (micronutrientes) e duas de cobertura (20 g de sulfato de amônio e 30 g de cloreto de potássio), aos 15 e 30 dias após o transplantio. Foi adotado o delineamento experimental de blocos casualizados com 13 tratamentos (as populações de abóbora) com três repetições e com parcelas de cinco plantas no espaçamento 3 x 3m.

56


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

As análises de variância (ANOVA) sobre dos caracteres quantitativos nas 13 populações foram processadas no programa GENES, desenvolvido por Cruz (2013), de acordo com a metodologia indicada por Falconer (1987). As análises de variância dos caracteres quantitativos nas populações de abóboras foram processadas através de um critério de agrupamento de médias, para avaliar as diferenças existentes entre os tratamentos (13 populações) usando o modelo matemático preconizado por Falconer (1987). O efeito dos genótipos foram considerados fixos, e os de ambientes, aleatórios. As estimativas dos parâmetros genéticos e fenotípicos, como o componente quadrático genotípico (variância genética), componente quadrático G x A, variância residual (Ve), coeficiente de determinação genotípico (%), coeficiente de variação genético (%) e Relação CVg / CVe foram efetuadas pelo programa GENES (Cruz 2013). 3. Resultados e Discussão As 13 populações (POPs) de abóboras avaliadas atingiram o seu ciclo vegetativo completo. Dentre elas, nove foram identificadas como abóbora de leite (C. moschata) e quatro populações como abóbora cabocla (C. maxima). A fase de floração das plantas na EEH INPA aconteceu aos 32 dias após o transplantio entre as mais precoces e aos 43 dias entre as mais tardias. A frutificação ocorreu após a antese floral aos 43 dias em plantas mais precoces e 54 dias nas mais tardias. A maturação dos frutos concentrou-se em um intervalo compreendido entre 82 e 93 dias, após o transplantio. Na área da Fazenda UFAM a fase de floração das plantas aconteceu aos 23 dias após o transplantio entre as mais precoces e aos 31 dias entre as mais tardias. A frutificação ocorreu após a antese floral aos 34 dias em plantas mais precoces e 45 dias nas mais tardias. A maturação dos frutos concentrou-se em um intervalo compreendido entre 71 e 84 dias, após o transplantio. Entre as POPs foram encontradas diferentes formas de frutos: piriformes, globulares, bojudos, alongados, esféricos, achatados, cordiforme, cilíndrico, discóide e oval. A maior predominância foi de frutos piriformes e cordiforme (Figuras 2 e 3).

Figura 2 – Variabilidade fenotípica dos frutos de abóbora. Detalhe do formato e coloração na EEH INPA. Foto: Pedro Chaves, 2016.

Figura 3 – Variabilidade fenotípica dos frutos de abóbora. Detalhe do formato e coloração na Fazenda da UFAM. Foto: Pedro Chaves, 2016.

57


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figura 4 – Coloração da polpa do fruto. Polpa laranja. POP 1 PCS Iranduba. Foto: Pedro Chaves, 2016.

Figura 5 – Coloração da polpa do fruto. Polpa amarela. POP 13 MAO Manaus. Foto: Pedro Chaves, 2016.

Com relação à polpa dos frutos, duas tonalidades de coloração foram encontradas: laranja (77%) e amarela (23%) (Figuras 4 e 5). A coloração laranjada é uma característica importante a ser considerada na seleção em C. moschata e C. maxima, visando tanto ao consumo doméstico quanto ao uso de produtos industrializados. A coloração da polpa, além de ser um indicador de qualidade comercial do fruto, esta característica é positivamente correlacionada com o teor de betacaroteno existente na polpa das abóboras. Estes carotenóides que são compostos poliênicos, lipossolúveis responsáveis pelas cores atraentes, características de muitos alimentos, que se estendem desde a cor amarela ao roxo (RODRIGUEZ-AMAYA & AMAYA-FARFAN 1992). Essa variação indica que essas POPs podem ser uma mistura de progênies meias-irmãs e progênies endogâmicas provenientes de cruzamentos abertos, portanto, podem ser aproveitadas imediatamente em programas de melhoramento, utilizando a sua base genética, com metodologia de seleção recorrente para plantas alógamas (ALLARD, 1966). Na área da Estação Experimental de Hortaliças do INPA, a produtividade de frutos variou entre 3,36 a 13,17 t ha-1. As POPs oriundas dos municípios de 1 PCS Iranduba (13,17 t ha-1) e 7 SIL Silves (11,69 t ha-1), foram as que tiveram maior produtividade (Tabela 1). Na Fazenda Experimental UFAM a produtividade média das POPs variou entre 2,88 a 21,72 t ha-1. As POPs de Iranduba (21,72 t ha-1) e Presidente Figueiredo (19,22 t ha-1) foram as que tiveram maior produtividade (Tabela 2). Estes resultados se enquadram nos padrões recomendados por Ramos et al. (1997), porque a tendência comercial é para frutos com massa média de 2,0 kg. Alguns pesquisadores admitem que os frutos pequenos são preferidos, porque além da facilidade de acondicionamento e transporte, podem ser armazenados em condições naturais pelo consumidor, podendo cada fruto ser preparado numa única refeição (BLANK et al., 2013). Os coeficientes de variação (CV%) estimados para todos os caracteres avaliados variaram de baixos a altos. Os mais altos foram observados nas características massa da placenta do fruto (37,66%) e massa fresca de sementes por fruto (29,03%), respectivamente) no experimento conduzido na EEH/INPA (Tabela 1). Nos caracteres massa da placenta do fruto (53,48%) e 58


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

produtividade (39,22%), no experimento conduzido na Fazenda Experimental da UFAM (Tabela 2). As estimativas dos coeficientes de herdabilidade apresentam as mesmas tendências observadas para os coeficientes de variação genética e suas magnitudes expressam a variabilidade genética exibida pela POPs. As estimativas de herdabilidade foram superiores a 80% para os caracteres massa do fruto (91,79%), espessura da polpa (89,07%), massa da placenta (84,63%), comprimento do fruto (92,70%), diâmetro do fruto (94,53%), altura da cavidade interna do fruto (91,23%), largura da cavidade interna do fruto (92,46%) e produtividade (89,35%) e inferiores a 80% para os caracteres comprimento da folha (59,03%), largura da folha (63,13%), comprimento do pedúnculo da folha (30%), espessura da casca (68,17%), massa fresca de sementes por fruto (53,08%), número de sementes por fruto (79,62%), número de frutos por parcela (72,92%) e número de frutos por planta (72,92%) (Tabela 3). De acordo com Falconer (1987), quando os valores da herdabilidade (h2) são superiores a 80%, podem ser obtidos ganhos de seleção satisfatórios. Tal situação foi observada para os caracteres: massa do fruto, espessura da polpa, massa da placenta, comprimento do fruto, diâmetro do fruto, altura da cavidade interna do fruto, largura da cavidade interna do fruto e produtividade, indicando que genótipos superiores para estes caracteres, podem ser obtidos pelo emprego de seleções simples.

59


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Médias seguidas pelas mesmas letras nas colunas não difere entre pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. CFo = Comprimento da folha, LFo = Largura da folha, PFo = Comprimento do pedúnculo da folha, Mfrut = Massa do fruto, ECasc = Espessura da casca, EPolp = Espessura da polpa, MPlac = Massa da placenta, MFSem = Massa fresca de sementes por fruto, NSemF = Número de sementes por fruto, CFrut = Comprimento do fruto, DFrut = Diâmetro do fruto, ACiFr = Altura da cavidade interna do fruto, LCiFr = Largura da cavidade interna do fruto, NFPar = Número de frutos por parcela, NFPlan = Número de frutos por planta, Prod = Produtividade (t ha-1), CV (%) = Coeficiente de variação, DMS = Diferença mínima significativa. EHH/ INPA.

60


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Médias seguidas pelas mesmas letras nas colunas não difere entre pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. CFo = Comprimento da folha, LFo = Largura da folha, PFo = Comprimento do pedúnculo da folha, Mfrut = Massa do fruto, ECasc = Espessura da casca, EPolp = Espessura da polpa, MPlac = Massa da placenta, MFSem = Massa fresca de sementes por fruto, NSemF = Número de sementes por fruto, CFrut = Comprimento do fruto, DFrut = Diâmetro do fruto, ACiFr = Altura da cavidade interna do fruto, LCiFr = Largura da cavidade interna do fruto, NFPar = Número de frutos por parcela, NFPlan = Número de frutos por planta, Prod = Produtividade (t ha-1), CV (%) = Coeficiente de variação, DMS = Diferença mínima significativa. Fazenda Experimental UFAM.

61


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

(*) Médias seguidas pelas mesmas letras nas colunas não difere entre pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.

CpFo = Comprimento da folha, LFo = Largura da Folha, PFo = Comprimento do Pendúnculo da Folha, Mfrut = Massa do fruto, ECasc = Espessura da Casca, EPolp = Espessura da Polpa, MPlac = Massa da Placenta, MFSem = Massa fresca de sementes por fruto, NSemF = Número de Sementes por fruto, CFrut = Comprimento do Fruto, DFrut = Diâmetro do fruto, ACiFr = Altura da cavidade interna do fruto, LCiFr = Largura da cavidade interna do fruto, NFPar = Número de Frutos por Parcela, NFPlan = Número de Frutos por Planta, Prod = Produtividade (t ha-1). EEH INPA e Fazenda UFAM

62


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

4. Considerações finais Das 13 POPs de abóboras avaliadas, nove populações foram identificadas como C. moschata e quatro como C. maxima. As observações fenológicas detectaram maior precocidade em relação à floração, frutificação e maturação dos frutos no experimento em área de latossolo amarelo conduzido na Fazenda Experimental da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). As populações oriundas de Iranduba, Silves e Presidente Figueiredo foram as que tiveram maior produtividade (t ha-1). Quanto ao caráter massa dos frutos e espessura da polpa, as POPs oriundas de Iranduba, Presidente Figueiredo, Rio Preto da Eva, Silves e Manaus obtiveram os maiores resultados entre as 13 POPs avaliadas nas duas áreas experimentais. A variabilidade fenotípica detectada nas populações permite a seleção de vários materiais genéticos, que podem ser imediatamente utilizados em programas de melhoramento genético de abóboras no Estado do Amazonas. Esta pesquisa permitiu identificar que entre as populações de abóboras cultivadas nos municípios da região metropolitana de Manaus, as POPs oriundas de Iranduba, Presidente Figueiredo, Rio Preto da Eva, Silves e Manaus são materiais genéticos com potencial produtivo promissor tanto para o cultivo em curto e médio prazo pelos agricultores familiares da região. 5. Referências ALLARD, R. W. 1966. Population structure and performance in crop plants. Ciência e Cultura, São Paulo, v. 19, p. 145 - 150. ASSIS, J. G. A.; RAMOS NETO, D. C.; DRUZIAN, J. I.; SOUZA, C. O.; ARAGÃO, A. C.; QUEIROZ, M. A. 2007. Identificação de acessos de abóbora (Cucurbita moschata) com altos teores de carotenoides. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Olericultura, Porto Seguro: Horticultura Brasileira, v. 25, n.1. BLANK, A. F; SILVA, T. B; MATOS, M. L; CARVALHO FILHO, J. L. S; SILVA-MANN, R. 2013. Parâmetros genotípicos, fenotípicos e ambientais para caracteres morfológicos e agronômicos em abóbora. Horticultura Brasileira v. 31, p. 106-111. CRUZ, C.D. 2013. GENES. A software package for analysis in experimental statistics and quantitative genetics. Acta Scientiarum. Agronomy, v.35, p.271-276. FALCONER, D.S. 1987. Introduction to quantitative genetic. 2 ed. London: Longman, 340 p. FILGUEIRA, F. A. R. 2008. Novo manual de olericultura: Agrotecnologia moderna na produção e comercialização de hortaliças. 3 ed. Viçosa: UFV, 421 p. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2015. Produção Agrícola Municipal. Disponível em https://sidra.ibge.gov.br/Tabela/3411#notas-tabela. Acesso em 17/12/2016. IDAM. 2016. Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas. Relatório Trimestral de Acompanhamento. Jerimum. IDAM/SEPROR. jul/set., 1p. RAMOS, S.R.R.; SILVA, M.A.S. DA; QUEIRÓZ, M.A.DE; OLIVEIRA, C.A. DE V.; SOUZA, F.F. 1997. Perfil do consumo de Cucurbita sp. no polo Petrolina e Juazeiro. In: Congresso Brasileiro de Olericultura. Manaus. Horticultura Brasileira, Brasília, v.15, Resumo 229. Suplemento. RODRIGUEZ-AMAYA, D. B; AMAYA-FARFÁN, J. 1992. Estado actual de los métodos analíticos para determinar provitamina A. Archivos Latinoamericanos de Nutricion, v. 42, n. 2, p. 180 - 191. SILVA, M. F. G. 2012. Atributos de qualidade de abóbora (Cucurbita moschata cv. Leite) obtida por diferentes métodos de cocção. Dissertação de Mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Universidade Federal do Ceará – UFC, 83p.

63


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

9. O uso do BAG-Feijão do Instituto Agronômico (IAC) no melhoramento genético Sérgio Augusto Morais Carbonell Eng. Agr. pela Universidade Federal de Santa Maria (1987), Me. em Genética e Biologia Molecular pela Universidade Estadual de Londrina (1991) e Dr. em Agronomia (Genética e Melhoramento de Plantas) pela ESALQ - Universidade de São Paulo (1995). Atualmente é PqCVI e Diretor Geral do IAC e líder de Pesquisa em Melhoramento do Feijoeiro nesta Instituição. Professor do Curso em Agricultura Tropical e Subtropical, Área de concentração em Genética, Melhoramento Vegetal e Biotecnologia do IAC. Assessor 'ad doc' da FAPESP, CNPq, CAPES e FAPEMIG em projetos de pesquisa, membro do Comitê Editorial da CBAB. Assessor técnico externo do MP-1 Pesquisa Estratégica da EMBRAPA para o Brasil. Possui 15 cultivares de feijoeiro registradas no MAPA-RNC (oito protegidas no MAPA/SNPC).

Alisson Fernando Chiorato Eng. Agr. pelo Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal - SP (2002), Me. em Agricultura Tropical e Subtropical pelo IAC (2004) e Dr. em Genética e Melhoramento de Plantas pela ESALQ/USP (2008). Atualmente é PqC-VI do IAC, com ênfase em Melhoramento Genético de Feijoeiro e Professor do curso de Pós-Graduação em Agricultura Tropical e Subtropical da PGIAC nas Disciplinas de Bases do Melhoramento Genético de Plantas e Genética Quantitativa. Atua também como responsável técnico pela produção de sementes genéticas produzidas pelo IAC. É assessor ad hoc da FAPESP e CNPq em projetos de pesquisa. Possui 11 cultivares de feijoeiro registradas no MAPA-RNC onde destas, oito foram protegidas no MAPA/SNPC.

Contextualização O melhoramento genético do feijoeiro envolve inúmeros processos, desde o prémelhoramento até chegar à possível recomendação de uma nova cultivar, até o pósmelhoramento. Todos eles devem ser considerados de igual importância, desde a escolha dos genitores até a seleção dos genótipos nos ensaios de competição. Para que uma cultivar de feijoeiro seja recomendada ao comércio, esta deve atender às características de produtividade, resistência ou tolerância a fatores bióticos e abióticos, além das relacionadas às características de qualidades tecnológicas como tempo de cozimento, qualidades nutricionais e o tipo de caldo para feijões de tegumento preto. No mercado do Brasil, predominam os feijões com tegumento carioca e preto tipicamente de origem mesoamericana. Cultivares com características de origem andina, caracterizados pelo maior tamanho da semente, são conhecidos como feijões especiais ou gourmet, e apresentam pouca participação no mercado (<8%). Essas limitações dificultam o trabalho do melhorista, pois muitas vezes reduzem o número de genitores para cruzamentos prejudicando a obtenção de cultivares mais produtivas, principalmente quando busca-se ampliar a variabilidade e a introdução de genes presentes em genótipos de outros países (CARBONELL et al. 1999).

64


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

O progresso no melhoramento para alta produtividade em feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.) tem sido bastante modesto, por volta de 1,21% ao ano (ELIAS et al. 1999, CHIORATO et al. 2010). A utilização de genitores divergentes em cruzamentos é uma opção vantajosa, pois promove combinações gênicas favoráveis, mediante efeitos de aditividade, pleiotropia e epistasia, condicionando à presença de caracteres favoráveis. Desta forma, a postulação de critérios racionais e eficientes para a identificação de genitores não aparentados, visando a síntese de linhagens que permita ao melhorista atingir seus objetivos, torna-se uma questão aberta no melhoramento de plantas. Dias et al. (2004) explicam que existem duas possibilidades para atingir estes objetivos. A primeira é testar os tipos parentais quanto à capacidade combinatória, onde neste caso, os sistemas de cruzamentos dialélicos são conduzidos para avaliar a capacidade geral e específica de combinação. A segunda possibilidade, que se enquadra melhor no melhoramento de feijoeiro, baseia-se na premissa de que genótipos parentais altamente divergentes e com alta performance média podem gerar linhagens superiores, ou seja, a seleção de genitores pela performance per se evita que grande número de cruzamentos sejam realizados. Neste sentido, a caracterização e a avaliação dos acessos de Bancos Ativos de Germoplasma (BAG), atualmente chamada de pré-melhoramento, permite o conhecimento da variabilidade existente, identificando genitores divergentes e facilitando o trabalho do melhorista na elaboração dos blocos de cruzamento. Essa caracterização fornece informações complementares para o melhorista, obtendo-se múltiplos resultados no seu material experimental. O programa de melhoramento genético do IAC tem realizado avaliações qualitativas e quantitativas dos acessos do BAG-Feijão no campo (Figura 1) e no laboratório, visando a caracterização e a conservação do seu banco de genes em câmara de armazenamento (Figura 2). Estas avaliações rotineiras mantém a identificação do acesso e a sua variabilidade (Figura 3). No preparo e manuseio simultâneo de vários descritores, as técnicas multivariadas a exemplo das análises de agrupamento, análise de componentes principais e variáveis canônicas são opções favoráveis na otimização para seleção de acessos de um BAG e na predição de combinações heteróticas, onde centenas de cruzamentos indesejáveis podem ser evitados. No melhoramento para ampliação da base genética/produtividade ou para outras características de interesse, estudos de pré-melhoramento são essenciais para o sucesso do ganho genético, permitindo redução dos esforços de trabalho e economia da atividade.

Figura 1. Avaliação de acessos do BAG-Feijão IAC. Espírito Santo do Pinhal, 2005.

65


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figura 2. Câmara fria de armazenamento de acessos do BAG-Feijão IAC. Campinas, 2017.

Figura 3. Variabilidade em sementes do BAG-Feijão IAC. Campinas, 2017.

Em cultivos que utilizam alta tecnologia de produção, são obtidas produtividades médias superiores a 4.000 kg/ha. Nestes casos, o melhoramento convencional que utiliza genótipos geralmente adaptados às nossas condições (Mesoamérica) podem não ser suficiente para aumentar este patamar de produtividade. Deste modo, no Brasil são utilizados em programas de melhoramento fontes com base genética ampla, como por exemplo as várias raças locais de feijoeiro (SINGH, 1992; SINGH et al., 1991). Estas fontes de variabilidade são consideradas, em sua maioria, genótipos exóticos não adaptados às condições do Brasil, pertencentes a outro centro de origem (Andina) ou outro ‘pool’ gênico. O conhecimento e avaliação destes genótipos são de grande importância para a quebra de patamares de produtividade, além da identificação de novas fontes de resistência à doenças que possam ser utilizadas nos programas de melhoramento genético em andamento no Brasil. As realizações através do uso No IAC, cruzamentos inter-raciais envolvendo as seis raças de feijoeiro dão preferência às combinações de genótipos das raças Mesoamericanas como Jalisco, Durango e Mesoamericano, pois genótipos das raças Andina como Peruana, Chilena e Nova Granada, geralmente produzem descendência pouco produtiva e não combinam com tipos mesoamericanos em cruzamentos simples (SINGH, 1992). Estes cruzamentos são importantes, pois além de promoverem a introdução de novos genes para resistência a doenças, porte de planta, tipo de grão, precocidade, tolerância à seca e altas temperaturas, em uma população local tipicamente Mesoamericana, permitirá possíveis ganhos de produtividade (Tabela 1). No entanto, devido às diferenças entre raças, estes ganhos são obtidos mais facilmente quando efetuados através de cruzamentos múltiplos com cultivares locais (SINGH, 1992, SINGH & URREA, 1994; SINGH & URREA, 1995). Deste modo, cruzamentos múltiplos foram realizados envolvendo cultivares IAC com genótipos das raças Jalisco (Puebla 152, Flor de Mayo, Garbancillo Zarco), Durango (Pinto 114), Mesoamericano (Aporé, Preto Dom Feliciano, Baetão, Oito e Nove), Peruano (ICA Viboral, Bolon Bayo), Nova 66


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Granada (Jalo EEP558, Canário 101, G2333, Antioquia 8) e Chileno (Sangretoro, Tortolás), bem como outros genótipos a serem introduzidos pelo programa. Estes cruzamentos produzem progênies que são caracterizadas morfologicamente e que futuramente são importantes nos processos de produção de sementes e nas orientações de manejo de novas cultivares disponibilizadas aos agricultores (Figura 4). Tabela 1. Características de planta, vagens e sementes de feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.) utilizadas para classificação nos respectivos centros de origem [SINGH et al. (1989) e SINGH et al. (1991)]. Origem

Raça

Hábito

Vagens e sementes

Outras características

Mesoamérica

I

Vagens com 8-10 cm com 6-8 sementes

Precoces - 70 a 80 dias

Mesoamérica

II

Vagens com 8-10 cm com 6-8 sementes

Plantas com 60-80 cm altura

Mesoamérica

III

Vagens concentradas na parte basal da planta

Apresenta guias curtas

Mesoamérica

IV

Apresenta sementes pequenas

Plantas altas com até 2,0 metros

Durango

III

Vagens achatadas com 5-8cm e sementes elípticas ou romboides

Plantas prostradas

Jalisco

IV

Sementes redondas e ovais

Plantas com até 3,0 metros de altura

Nova granada

I

Sementes reniformes, cilíndricas e muitas vezes retangulares

Folhas grandes

Nova granada

II e III

Sementes longas, reniformes ou cilíndricas

Sensíveis ao fotoperíodo

Nova granada

III

Sementes redondas ou ovais

Folhas longas e pequenas

Chilena

IV

Sementes grandes, semelhantes ao ‘pool gênico’ 7, 8 e 9

Plantas com até 3,0 metros

Peruana

I

Peruana

III e IV

Meso- americana

Andina

Vagens com 8-10 cm, sementes Plantas altamente medianas sensíveis ao fotoperíodo Vagens achatadas e longas, sementes medianas

Semelhante ao ‘pool’ 11

67


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

2

1

Ovalada Cordata Grande

1

2

3

1

Pequeno

b

a 2

Triangular

3

C

d

1

2

3

Figura 4. Características morfológicas da planta de feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.): a. Vagem: perfil: 1. recurvado, 2. reto e 3. arqueado; b. Flor: formato da bractéola: 1. ovalada cordata grande (mesoamericano) e 2. triangular pequena (andino); c. Hábito de crescimento: 1. determinado, 2. indeterminado arbustivo e 3. indeterminado prostrado; d. Flor: cor da asa: 1. branca, 2. rósea e 3. violeta.

Outra importante participação do uso do germoplasma de feijoeiro está relacionada ao mercado consumidor, para grãos de feijão diferentes do grupo carioca e preto. No Brasil, há uma crescente demanda pela procura de tipos diferentes aos grãos carioca e preto, visando um maior valor agregado ao produto e também para um segmento de exportação. Empresas empacotadoras buscam por um produto diferenciado em qualidade e tipo de grão, colocando nas prateleiras dos supermercados produtos com embalagens de 500 gramas para um segmento da população de maior poder aquisitivo. Estes tipos preferidos ou ofertados por estas Empresas 68


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

são os Rosinha, Bolinha, Rajado, Cramberry e Branco, onde muitas vezes, são importados de outros países do Mercosul, Canadá ou EUA, pois não há um fluxo de produção de qualidade no Brasil para atender a demanda anual. Aidar et al. (1999) discutem o incremento das pesquisas em melhoramento genético com a utilização de genótipos classificados como graúdos (Brancos grandes, Manteigão, Kidney, etc.), muitos destes com alto valor agregado, que quando submetidos à alta tecnologia de produção, proporcionam alto rendimento e qualidade de produto, suprindo o mercado interno e competindo no mercado externo brasileiro. Em função das exigências de mercado para outros tipos de grãos, diferentes do tipo Carioca e Preto, os programas de melhoramento, a exemplo do IAC, estão voltados para a avaliação do germoplasma existente, realizando-se cruzamentos para obtenção de resistência a doenças, maior produtividade, precocidade, porte e altura de planta. O uso de germoplasma exótico, mantido no BAG, é essencial para a introdução de características de interesse agronômico em cultivares locais. Após a publicação da Portaria 298 SDR/MAA de 14/10/1998, estabelecendo as normas de avaliação do Valor de Cultivo e Uso (VCU) para registro de novas cultivares de feijoeiro, as pesquisas têm sido intensificadas enfatizando a influência ambiental x diferenças entre cultivares sobre os caracteres de qualidade tecnológica e novas metodologias e discussões têm acontecido. Perina et al. (2014) relatam que a qualidade tecnológica do feijão é determinada basicamente pelo comportamento frente ao cozimento, etapa comum a todos os processos de industrialização ou para consumo doméstico. Reportam ainda que o cozimento dos grãos de feijão depende da capacidade de absorção de água e das características do tegumento do grão e que a qualidade tecnológica depende das condições de colheita (característica genética), das condições de armazenamento e das técnicas de processamento. Esta característica tem sido buscada junto ao BAG-Feijão nos programas de melhoramento, demonstrando que há efeitos ambientais, genéticos e interação entre estes efeitos na caracterização dos genótipos quanto à qualidade tecnológica dos grãos. Considerações finais No melhoramento para resistência a fungos da parte aérea ou de solo, é importantíssimo o conhecimento da variabilidade genética do patógeno. Assim, na literatura há artigos reportando várias raças fisiológicas de patógenos causadores de doenças no feijoeiro (RIBEIRO et al., 2017; HENRIQUE et al., 2015; SOUZA FILHO et al., 2015). Rava et al.(1994) salientam que devido à capacidade de variação patogênica do fungo, torna-se imperativo manter atualizado o seu conhecimento para, mediante a exploração da variabilidade existente no feijoeiro comum, lograr o desenvolvimento de novas cultivares resistentes. Da mesma forma ou mais importante que o conhecimento da variabilidade patogênica é o conhecimento do controle genético e a identificação de fontes (germoplasma) de resistência à doença estudada. Assim, o melhoramento genético do feijoeiro com o conhecimento do patógeno e da genética da planta, aliado às metodologias eficientes de avaliação e seleção, obtém 69


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

cultivares resistentes às principais doenças do feijoeiro. Técnicas em biologia molecular tem auxiliado os programas de melhoramento de feijoeiro principalmente na identificação da variabilidade patogênica e identificação de genes de resistência (PERSEGUINI et al., 2016; OBLESSUC et al., 2015). Em 2017, o Programa de Melhoramento Genético do IAC, conta com 2.200 acessos no BAG-Feijão para uso em cruzamentos biparentais e múltiplos, visando incorporar características agronômicas, de mercado e de consumo de interesse, sempre aliado à sustentabilidade e melhoria do produto final. Anualmente são realizados dezenas de cruzamentos visando à ampliação da base genética das cultivares em uso no Brasil, bem como cruzamentos dirigidos para a solução de problemas específicos. Isto só é possível com o uso do germoplasma existente neste BAG e, assim, é essencial que seja caracterizado e conservado adequadamente.

Referências AIDAR, H.; DÍAZ, J.L.C.; THUNG, M. Comportamento de linhagens de feijões graúdos, pertencentes a classes do mercado internacional, na região centro-oeste. Anais. VI Reunião Nacional de Pesquisa de Feijão. 14 a 18/10/1996. Salvador, BA, Volume 1: Resumos expandidos. P 325-327. 1999. CARBONELL, S.M.; ITO, M.F.; POMPEU, A.S.; FRANCISCO, F.; RAVAGNANI, S.; ALMEIDA, A.L.L. Raças fisiológicas de Colletotrichum lindemuthianum e reação de cultivares e linhagens de feijoeiro no Estado de São Paulo. Fitopatologia Brasileira, v.24, n.1, p.60-65, 1999. CHIORATO, A.F.; CARBONELL, S.A.M.; VENCOVSKY, R.; FONSECA JUNIOR, N.S.; PINHEIRO, J.B. Genetic gain in the breeding program of common beans at IAC from 1989 to 2007. Crop Breeding and Applied Biotechnology (Impresso), v. 10, p. 329-336, 2010. DIAS, L.A.S.; PICOLI, EAT P.Y., ROCHA, R.B. and ALFENAS, A.C. (2004). A priori choice of hybrid parents in plants. Genetics and Molecular Research 3: 356-368. ELIAS, H.T., HEMP, S.; FLESCH, R.D.. Ganho genético na produtividade das cultivares de feijão recomendadas para Santa Catarina – 1979/1999. Anais. VI Reunião Nacional de Pesquisa de Feijão. 21 a 26/11/1999. Salvador, BA, Volume 1: Resumos expandidos. P 373-375. 1999. HENRIQUE, F.H.; CARBONELL, S.A.M.; ITO, M.F.; GONÇALVES, J.G.R.; SASSERON, G.R.; CHIORATO, A.F. Classification of physiological races of Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli in common bean. Bragantia (São Paulo, SP. Eletrônico), v. 74, p. 84-92, 2015. OBLESSUC, P.R.; MATIOLLI, C.C.; CHIORATO, A.F; CAMARGO, L.E.A; BENCHIMOL, L.L.; MELOTTO, M.. Common bean reaction to angular leaf spot comprises transcriptional modulation of genes in the ALS10.1 QTL. Frontiers in Plant Science, v. 6, p. x-x, 2015. PERINA, E.F. ; CARVALHO, C.R.L.; CHIORATO, A.F.; LOPES, R.L.T.; GONÇALVES, J.G.R.; CARBONELL, S.A.M.. Technological quality of common bean grains obtained in different growing seasons. Bragantia, v. 73, p. 14-22, 2014. PERSEGUINI, J.M.K.C.; OBLESSUC, P.R.; ROSA, J.R.B.F.; GOMES, K.A.; CHIORATO, A.F.; CARBONELL, S.A.M. ; GARCIA, A.A.F.; VIANELLO, R.P.; BENCHIMOL-REIS, L.L.. GenomeWide Association Studies of Anthracnose and Angular Leaf Spot Resistance in Common Bean (Phaseolus vulgaris L.). Plos One, v. 11, p. e0150506, 2016. RAVA, C.A.; PURCHIO, A.F. & SARTORATO, A. Caracterização de patótipos de Colletotrichum lindemuthianum que ocorrem em algumas regiões produtoras de feijoeiro comum. Fitopatologia Brasileira 19(2):167-172, 1994. RIBEIRO, T.; AZEVEDO, C.V.G.; ESTEVES, J.A.F.; CARBONELL, S.A.M.; ITO, M.F.; CHIORATO, A.F.. Reaction of common bean lines to Xanthomonas axonopodis pv. phaseoli and Curtobacterium flaccumfaciens pv. flaccumfaciens. Crop Breeding and Applied Biotechnology (Online), v. 17, p. 40-46, 2017.

70


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

SCHOLZ, M.B.S.; FONSECA JÚNIOR, N.S. Efeito de ambientes, dos genótipos e da interação genótipos x ambientes na qualidade tecnológica de feijão do grupo cores no Estado do Paraná. Anais. VI Reunião Nacional de Pesquisa de Feijão. 21 a 26/11/1999. Salvador, BA, Volume 1: Resumos expandidos. P 339-342. 1999a. SINGH, S.P. Patterns of variation in cultivated common bean (Phaseolus vulgaris, FABACEAE). Economic Botany, v. 43, n.1, p. 33-57, 1989. SINGH, S.P.; GEPTS, P.; DEBOUCK, D. Races of common bean (Phaseolus vulgaris, FABACEAE). Economic Botany, v. 45, n. 3, p. 379-96, 1991. SINGH, S.P. Commom bean improvement in the tropics. Plant Breeding Reviews 10. ISBN#1-57347-7. 1992. SINGH, S.P. & URREA, C.A. Generations of intra- and interacial populations of the commom bean. Revista Brasileira de Genética 17(3):299-303. 1994. SINGH, S.P. & URREA, C.A. Inter- and intraracial hybridization and selection for seed yield in early generation of commom bean, Phaseolus vulgaris L.. Euphytica 81:131-137. 1995. SINGH, S.P.; ROCA, W.M.; DEBOUCK, D. Ampliación de la Base Genética de los Cultivares de Frijol: Hibridación Interespecífica en Phaseolus Espécie. ANAIS. Taller de Mejoramiento de Frijol para el siglo XXI: Bases para una estrategia para América Latina. Ed.: Shree P. Singh y Oswaldo Voysest. 23/10/96 - 01/11/96. Cali, Colombia. p. 9-20. 1996.

71


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

10. Importância dos maracujás (Passiflora L. spp.) e seu uso comercial Jamile da Silva Oliveira Eng. Agr. (2011), Me. em Recursos Genéticos Vegetais (2014). Desde 2007 a 2011 atuou como voluntária de pesquisa, nas seguintes áreas: cerrado, produção de mudas, utilização de substratos alternativos, fisiologia de sementes e plantas, ecofisiologia, alelopatia, spring, solos e conservação de espécies nativas do bioma Cerrado. Desde 2012 trabalha com recursos genéticos e melhoramento vegetal. Universidade de Brasília (jamile.oliveira54 @gmail.com).

Fábio Gelape Faleiro Eng. Agr. (1995), Me. em Genética e Melhoramento (1997) e Dr. em Genética e Melhoramento (2000), pela Universidade Federal de Viçosa e Pós-Doc em Genética e Biotecnologia (2011) pela University of Florida. Trabalhou no Centro de Pesquisas do Cacau (2000-2002) utilizando marcadores moleculares como ferramenta auxiliar no programa de melhoramento visando resistência à vassoura-de-bruxa. Atualmente é pesquisador da Embrapa Cerrados e atua como professor credenciado no curso de pós-graduação em agronomia da Universidade de Brasília e colaborador na Universidade Católica de Brasília, Universidade Federal do Norte Fluminense, Universidade Federal de Lavras e Universidade Federal de Goiás. Atua em genética e melhoramento, genética molecular e quantitativa, com maracujá, manga, leguminosas e gramíneas forrageiras e espécies nativas do Cerrado.

Nilton Tadeu Vilela Junqueira Eng. Agr. pela Universidade Federal de Lavras (1979), Me. em Fitopatologia pela Universidade Federal de Viçosa (1981) e Dr. em Fitopatologia pela Universidade Federal de Viçosa (1984). Realizou cursos de especialização em Bioquímica da resistência de plantas a doenças pela Technischen Universitaet Braunschweig, Botaniches Institut, Alemanha (1987), Taxonomia e Utilização de Fungos Entomopatogênicos pelo Forestry And Forest Products Research Institut, Tsukuba Japão (1992) e em Manejo Ecológico de Doenças de Frutíferas pela Japan Fruit Tree Research Station, Tsukuba (1992). Atualmente é pesquisador da Embrapa Cerrados, Planaltina - DF, onde coordena e realiza pesquisas com frutíferas tropicais para alimentação e produção de agroenergia, atuando também como professor colaborador no Programa de Pós-Graduação de Agronomia da Universidade de Brasília. Atua em Fitopatologia (Manejo de doenças e melhoramento visando resistência a doenças), principalmente em: Pesquisas e sistema de produção para cultivos de maracujá, manga, anonáceas, pequi e macaúba.

Introdução Os maracujás são popularmente conhecidos como os frutos das espécies do gênero Passiflora L.. Estas espécies são cultivadas e utilizadas há muito tempo na alimentação, mas possuem outras funcionalidades importantes, como a medicinal e a ornamental. O maracujazeiro pertence a família Passifloraceae. Dentro dessa família, o gênero mais representativo é o Passiflora, com diversas espécies potencialmente úteis. Muitas passifloras têm importância econômica e podem ser exploradas comercialmente, desde que, se tenha acesso a cultivares geneticamente melhoradas, para potencializar a lucratividade. Nos últimos anos, cultivares de diferentes espécies e híbridos interespecíficos do maracujá têm sido desenvolvidas pelos programas de melhoramento genético e disponibilizadas para a sociedade por meio de uma logística de produção de sementes e mudas envolvendo parcerias público-privadas. O maracujá é originário das Américas Tropical e Subtropical, com cerca de 500 espécies, e o Brasil é um dos principais centros de diversidade do gênero Passiflora, com aproximadamente 72


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

150 espécies nativas. Acessos de grande importância têm sido obtidos, caracterizados e utilizados de forma prática no programa de melhoramento genético do maracujazeiro azedo e maracujazeiro doce, como porta-enxertos e também como plantas ornamentais, funcionais e medicinais. Uma grande diversidade de espécies do gênero é encontrada em todos os Biomas brasileiros, com destaque para o Cerrado e a Amazônia. Esta diversidade é a fonte de variabilidade genética dos programas de melhoramento genético de diferentes espécies do gênero Passiflora. A partir desta variabilidade genética, importantes produtos tecnológicos foram desenvolvidos ou estão em desenvolvimento (FALEIRO et al., 2008; FALEIRO et al., 2012; FALEIRO et al., 2014). Trabalhos de conservação e caracterização de acessos silvestres de passiflora devem ser realizados para valoração e o maior conhecimento desta rica biodiversidade brasileira. Esses trabalhos de caracterização ajudam a subsidiar a incorporação de muitos acessos em programas de melhoramento do maracujazeiro azedo e doce visando à ampliação da base genética e também na diversificação de sistemas de produção envolvendo Passifloras ornamentais, funcionais e medicinais. A utilização prática dos recursos genéticos vegetais conservados em bancos de germoplasma é um dos principais desafios e demandas para as ações de pesquisa e desenvolvimento. Neste artigo, é apresentada uma síntese da importância de diferentes espécies do gênero Passiflora, considerando o seu uso comercial e os processos de domesticação e melhoramento genético que levaram ao desenvolvimento de novas cultivares. Os produtos tecnológicos ou cultivares do programa de melhoramento genético dos maracujás realizado na Embrapa e seus parceiros são enfatizados nesse relato. Família Passifloraceae Juss. A família Passifloraceae Juss., ordem Marpighiales, constitui grupo monofilético bem sustentado por análises moleculares (MUSCHNER et al., 2003; JUDD et al., 2009; TOKUOKA, 2012), que está taxonomicamente estruturada em 17 gêneros e duas tribos, Paropsieae e Passiflorieae. No Novo Mundo, a família é representada por quatro gêneros (Passiflora L., Mitostemma Mast., Dilkea Mast., Ancistrothyrsus Harms) sendo o primeiro o mais representativo com aproximadamente 500 espécies (BERNACCI et al., 2013). Há um certo desencontro nas informações específicas e genéricas, já que Killip (1938) e Sacco (1980) consideram que a família Passifloraceae era composta por 12 gêneros, porém, Vanderplank (1996) relatou que a família era formada por 630 espécies e 18 gêneros, enquanto Bernacci et al., (2013), citam 530 espécies e 19 gêneros. A América do Sul é o centro de origem de mais de 95% das espécies da família Passifloraceae, sendo o Brasil um dos principais centros de diversidade com três gêneros relatados, Passiflora, Dilkea e Mitostemma (BERNACCI et al., 2013). As espécies pertencentes à família Passifloraceae são conhecidas como maracujazeiros e também como flor-da-paixão, um nome popular que tem origem na correlação da morfologia 73


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

da flor com os símbolos da Paixão de Cristo. Acredita-se que existam mais de 580 espécies dessa família, a maioria da América Tropical e com ampla distribuição no Brasil, especialmente na região Centro-Norte (SOUZA; MELETTI, 1997; FALEIRO et al., 2012). A maioria das espécies de maracujá tem origem americana, envolvendo principalmente o Brasil, Colômbia, Peru, Equador, Bolívia e Paraguai, embora existam espécies nativas em outros países das Américas, além da Ásia e Oceania (China e Austrália, por exemplo). Estima-se que o Brasil seja berço de aproximadamente 150 espécies diferentes de maracujás, podendo-se afirmar que o maracujá faz parte de uma biodiversidade essencialmente brasileira (FALEIRO; JUNQUEIRA, 2009; FALEIRO et al., 2012). As Passifloráceas têm seu uso comercial definido principalmente pelos seus frutos para consumo in natura e para fabricação de bebidas, farinhas, doces e sucos. No entanto, apresentam também potencial para uso como planta ornamental devido à beleza e diversidade das folhagens e das flores dos maracujazeiros de muitas espécies (PEIXOTO, 2005; FALEIRO et al., 2012). De acordo com Abreu et al. (2009), já foram registrados mais de 400 híbridos ornamentais a nível mundial. Também são utilizadas na indústria de fitoterápicos, na exploração da diversidade genética em relação ao desempenho quanto à resistência, tolerância ou suscetibilidade às pragas, doenças e nematóides (VASCONCELLOS et al., 2005). Souza & Lorenzi (2008) descrevem a família Passifloraceae como sendo composta por plantas trepadeiras herbáceas ou lenhosas, com gavinhas originadas de modificações das inflorescências; possuindo folhas alternas espiraladas, simples ou raramente compostas, frequentemente lobadas, em geral com nectários extraflorais no pecíolo ou lâmina, com ou sem estípula, margem inteira ou serreada. As plantas da família Passifloraceae possuem inflorescência cimosa ou racemosa, em geral reduzida a uma única flor geralmente bissexuada, actinomorfas, com androginóforo bastante desenvolvido, diclamídeas ou raramente monoclamídeas, períginas; cálice geralmente dialissépalo, prefloração imbricada, frequentemente petalóide; corola geralmente dialipétala, prefloração imbricada; corona disposta no ápice do hipanto, formada por um ou mais ciclos de apêndices; estames geralmente livres entre si, anteras rimosas; disco nectarífero às vezes presente ao redor do ovário ou do androginóforo; ovário súpero carpelar, unilocular, placentação parietal, pluriovulado, estiletes em geral livres entre si. Possuindo fruto baga ou cápsula (SOUZA & LORENZI, 2008). Importância econômica das passifloras O cultivo das passifloras tem grande importância econômica e social na geração de empregos no campo, no setor de venda de insumos, na agroindústria e nas cidades, além de ser importante opção de geração de renda para micros, pequenos, médios e grandes produtores. Diferentes espécies de maracujá são opções para os fruticultores, por gerar renda semanal ao longo de todo o ano, com diferentes opções de mercado e de agregação de valor ao produto. No Brasil, a espécie com maior expressão comercial é a Passiflora edulis Sims, conhecida como

74


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

maracujazeiro azedo, a qual ocupa mais de 90% dos pomares brasileiros de maracujá, com produção anual que já chegou a quase um milhão de toneladas. Além da espécie P. edulis, no Brasil outras espécies são cultivadas como a P. alata Curtis (maracujá-doce, maracujá-açu, maracujá-mamão), P. setacea D.C. (maracujá do sono, maracujá do cerrado, maracujá pérola, maracujá sururuca, maracujá de cobra) e P. cincinnata Mast. (maracujá do mato, maracujá da caatinga) que também atingem escala comercial como frutífera, além de outras espécies como P. nitida Kunth (maracujá suspiro, maracujá do cerrado), P. quadrangularis L. (maracujá gigante, badea, maracujá de quilo) e P. maliformis L. (cholupa, granadilla de piedra) que são cultivadas localmente ou em escala doméstica (BERNACCI et al., 2005). Outra cadeia produtiva que está sendo fortalecida no Brasil é a utilização de híbridos interespecíficos para fins ornamentais, o que já é tradicional em alguns países da Europa. Além do Brasil, as passifloras são cultivadas em outros países, com destaque para a Colômbia, onde há o cultivo comercial de seis diferentes espécies de maracujá, sendo que a espécie P. ligularis A. Juss. (granadilla) é a mais tradicional. As outras espécies cultivadas comercialmente na Colômbia são a P. edulis Sims., P. edulis f. edulis Sims. (gulupa, maracujároxo), P. maliformis L., P. tripartita (Juss.) Poir. (curuba, tumbo) e P. quadrangularis L.. A Figura 1 ilustra as principais espécies do gênero Passiflora cultivadas comercialmente.

a

b

c

d

e

f

g

h

i

j

k

l

Figura 1. Principais espécies comerciais do gênero Passiflora: P. edulis Sims. (a); P. alata Curtis (b); P. setacea D.C. (c); P. ligularis A. Juss. (d); P. nitida Kunth (e); P. cincinnata Mast. (f); P. tripartita (Juss.) Poir. (g); P. maliformis L. (h); P. edulis f. edulis Sims. (i); P. quadrangularis L. (j); Híbrido ornamental P. setacea X P. coccinea cv. BRS Estrela do Cerrado (k); Híbrido ornamental P. edulis X P. incarnata cv. BRS Céu do Cerrado (l). Fotos: Nilton Junqueira, Fábio Faleiro e Ana Maria Costa, Embrapa Cerrados.

75


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

As espécies do gênero Passiflora, além de serem utilizadas como alimento, servem como remédios e algumas têm grande potencial ornamental. Considerando o aspecto medicinal, folhas, flores, raízes e frutos extraídos de espécies silvestres e comerciais de passifloras são utilizados para combater diferentes enfermidades, tais como, verminoses, tumores gástricos e estresse, fazendo parte do conhecimento tradicional associado à cultura de diferentes povos (COSTA & TUPINAMBÁ, 2005). Os principais estudos disponíveis se referem aos fitoconstituintes de P. edulis e P. incarnata (PATEL et al., 2011). Pesquisas mais recentes têm apontado também, as espécies P. sidifolia, P. bahiensis, P. coccinea, P. vitifolia e P. incarnata como ricas em flavonoides que têm ação ansiolítica, sedativa e analgésica (SAKALEM et al., 2012). No que se refere ao uso ornamental, as passifloras despertam interesse pela beleza exótica de suas flores com formato e colorido peculiares, o que viabiliza sua utilização na linha do agronegócio de plantas ornamentais. Já foram obtidos e registrados mais de 685 híbridos para uso ornamental, com intuito de gerar flores com formas e cores diversificadas para todos os gostos e ambientes (VANDERPLANK et al., 2003; PEIXOTO, 2005; FALEIRO et al., 2007; JUNQUEIRA et al., 2008; ABREU et al., 2009; SANTOS et al., 2012). Em 2007, a equipe de melhoramento genético de maracujazeiro da Embrapa Cerrados e parceiros lançou três híbridos ornamentais de maracujá, o BRS Estrela do Cerrado, o BRS Rubiflora e o BRS Roseflora (EMBRAPA, 2017a) (Figura 2). O híbrido BRS Estrela do Cerrado foi obtido a partir do cruzamento entre as espécies silvestres P. coccinea Aubl., de flores vermelhas, e P. setacea DC., de flores brancas. Após a obtenção das progênies, selecionaram-se as plantas produtoras de flores maiores, com cores mais atrativas e mais tolerantes às doenças nas condições do Planalto Central. Os híbridos BRS Rubiflora e BRS Roseflora foram obtidos a partir do retrocruzamento do BRS Estrela do Cerrado com acessos selecionados de P. coccinea e P. setacea, respectivamente. Mais recentemente, foram registradas e protegidas no MAPA, novas cultivares com propósito ornamental, a BRS Rosea Púrpura, um híbrido triplo envolvendo as espécies P. incarnata X (P. quadrifaria X P. setacea) e a ‘BRS Céu do Cerrado’ um híbrido entre as espécies P. incarnata X P. edulis (EMBRAPA, 2017b) (Figura 2). A partir da variabilidade genética conservada no BAG “Flor da Paixão”, a Embrapa Cerrados e parceiros lançaram em 2008, os primeiros híbridos de maracujazeiro azedo BRS Gigante Amarelo (BRS GA1), BRS Sol do Cerrado (BRS SC1) e BRS Ouro Vermelho (BRS OV1) (EMBRAPA, 2017c). Em 2012 foi feito o lançamento do BRS Rubi do Cerrado (BRS RC) (EMBRAPA, 2017d). Com relação aos maracujazeiros silvestres, em 2013, foi lançada a cultivar de P. setacea BRS Pérola do Cerrado (BRS PC) (EMBRAPA, 2017e), uma cultivar com quádrupla aptidão, sendo utilizada para o consumo in natura, processamento industrial, ornamental e funcional-medicinal e em 2016, o lançamento da cultivar de P. cincinnata BRS Sertão Forte (EMBRAPA, 2017f), uma cultivar originada a partir de acessos coletados nos Biomas Semiárido e Cerrado, com alta tolerância ao estresse hídrico, alta produtividade e tamanho de frutos (Figura 2). Completando o portfólio de cultivares lançadas pela Embrapa a partir da variabilidade genética conservada no BAG “Flor da Paixão”, em 2017 foi lançada a cultivar de maracujazeiro doce, P. alata ‘BRS Mel do Cerrado’ (BRS MC) (EMBRAPA, 2017g), 76


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

a qual apresenta pelo menos 3 aptidões para consumo in natura, ornamental e funcionalmedicinal (Figura 2).

maracujazeiro azedo

maracujazeiro ornamental

maracujazeiro silvestre

maracujazeiro doce

Figura 2. Cultivares de maracujazeiro lançadas pela Embrapa Cerrados e parceiros: maracujazeiro azedo, P. edulis: BRS Gigante Amarelo (BRS GA1), BRS Sol do Cerrado (BRS SC1), BRS Ouro Vermelho (BRS OV1) e BRS Rubi do Cerrado (BRS RC); maracujazeiro ornamental: BRS Estrela do Cerrado (P. coccinea X P. setacea F1), BRS Rubiflora (P. coccinea X P. setacea RC1), BRS Roseflora (P. setacea X P. coccinea RC1), BRS Céu do Cerrado (P. edulis X P. incarnata RC1) e BRS Rosea Púrpura (P. incarnata X (P. quadrifaria X P. setacea); maracujazeiro silvestre: P. setacea BRS Pérola do Cerrado (BRS PC) e P. cincinnata BRS Sertão Forte (BRS SF) e maracujazeiro doce: P. alata BRS Mel do Cerrado (BRS MC).

Dentre as espécies trabalhadas no programa de melhoramento da Embrapa e parceiros, a P. edulis é a que mais se destaca economicamente. O Brasil é, atualmente, o maior produtor mundial, com uma área de 57.183 hectares e produção de 823.284 toneladas (ABF, 2016). A fruta é comercializada no mercado in natura ou de frutas frescas e no mercado para processamento agroindustrial. Estima-se que 60% do maracujá azedo produzido no Brasil destina-se ao mercado de frutas frescas e 40% para a agroindústria (MELETTI, 2011). No Brasil, consome-se praticamente toda produção de maracujá, sendo que uma pequena parte é exportada na forma de suco concentrado. Apesar da grande produção, há relatos de importação de frutos produzidos em países vizinhos para abastecimento de indústrias de suco. O maracujá é produzido em todas as regiões brasileiras, havendo uma complementaridade da oferta dos frutos em todos os meses do ano. Ocorre uma flutuação do preço do maracujá pago ao produtor em função da maior e menor oferta. De um modo geral, o preço do maracujá é menor nas épocas mais frias do ano, devido a uma menor demanda dos consumidores. A cultura do maracujá tem um mercado promissor, e com o consumo de frutos in natura cada vez mais crescente, em decorrência principalmente, da maior demanda por alimentos com maior qualidade funcional e nutracêutica. 77


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Acredita-se que atualmente, o mercado consumidor brasileiro possua capacidade para absorver todo o maracujá produzido aqui no Brasil para o mercado in natura e anseia por frutos especiais, com características diferenciadas e com maior qualidade. A oferta de cultivares de espécies silvestres de maracujá é um campo promissor para ações de pesquisa e desenvolvimento envolvendo os programas de conservação, caracterização e uso de recursos genéticos e os programas de melhoramento dessas diferentes espécies. A espécie P. alata (maracujá doce) é uma frutífera que apresenta grande potencial de comercialização destinado principalmente, para o mercado in natura, tanto interno como também para exportação, devido às suas boas características de tamanho, coloração externa, com polpa de aroma adocicado e de refinado sabor. É comum a sua comercialização em feiras e também em grandes redes de varejo, com a particularidade de ter elevada cotação no mercado de frutas frescas em virtude da pequena oferta e alta demanda devido à qualidade dessa fruta. Essa espécie aparece em terceiro lugar entre as espécies mais cultivadas no mundo, ficando atrás apenas do maracujazeiro azedo e do roxo (IBGE, 2011). Apesar dessa grande importância econômica, a primeira cultivar registrada e protegida no Brasil de maracujazeiro doce BRS Mel do Cerrado só ocorreu em 2017. Além das espécies trabalhadas no melhoramento genético com cultivares registradas no MAPA, existem várias outras com potencial comercial. Segundo Pires et al. (2012), Passiflora morifolia, P. suberosa sbsp. litoralis e P. palmeri var. sublanceolata são espécies silvestres com potencial ornamental, que ocorrem no Brasil. Vieira & Carneiro (2004), relacionam mais de 50 espécies de Passiflora que são cultivadas ou apresentam potencial comercial, destacando a origem e as formas de utilização, além do status de cultivo de cada uma delas. Faleiro, Junqueira & Costa (2015) e Faleiro et al. (2013) relatam o potencial agronômico na produção de frutos das espécies P. alata, P. setacea e P. cincinnata que já possuem cultivares registradas e das espécies P. nitida, P. tenuifila, P. quadrangularis e P. maliformis que estão sendo trabalhadas no melhoramento genético para o mercado de frutas frescas, na produção de matéria-prima para doces e sorvetes e também substâncias bioativas com propriedades medicinais. Dentro da família Passifloraceae, especialmente dentro do gênero Passiflora, existe uma diversidade genética para os programas de melhoramento, visando à seleção e desenvolvimento de cultivares para atender os anseios da sociedade, e sanar as necessidades dos produtores, especialmente, quanto a produtividade e resistência às principais doenças que afetam o maracujazeiro. Essas cultivares podem diversificar os sistemas de produção e oferecer novas opções para os fruticultores. Araújo et al. (2014a) avaliaram a produtividade de seis acessos de P. cincinnata do Banco Ativo de Germoplasma da Embrapa Semiárido, em áreas com histórico de ocorrência de fusariose. Os autores observaram diferenças significativas para as variáveis ligadas a produtividade. Araújo et al. (2014b) avaliaram a sobrevivência de dez genótipos de P. cincinnata

78


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

em áreas com histórico de ocorrência de fusariose. Alguns acessos de P. cincinnata apresentaram 95% de sobrevivência. A tecnologia de mudas enxertadas está entre as mais promissoras para o manejo da morte prematura de plantas e das doenças causadas por Fusarium no maracujazeiro (CAVACHIOLI et al., 2011; MACHADO et al., 2015). Alguns resultados obtidos pela Embrapa e parceiros estão sendo validados em condições de produção comercial. Destaque para o trabalho coordenado pela Pesagro-Rio em parceria com a Embrapa sobre o uso de uma seleção de P. alata como portaenxerto em plantios comerciais no Rio de Janeiro. Resultados igualmente animadores também foram obtidos com o uso de plantas selecionadas de P. alata e P. nitida como porta-enxerto de plantas elites de maracujazeiro azedo em plantios comerciais no Mato Grosso com histórico de ocorrência de fusariose. Esta experiência de sucesso é da Cooperativa Agropecuária Mista Terranova Ltda. (COOPERNOVA), em parceria com a Embrapa (ARAÚJO et al., 2012; SEMPREBOM et al., 2012). Destaque também deve ser dado a uma seleção de P. foetida obtida pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), em parceria com a Embrapa, a qual também está sendo validada com sucesso em pomares comerciais (SILVA, 2016). Considerações Finais As passifloras possuem grande importância econômica, ligada à utilização alimentícia, medicinal e ornamental, a qual pode ser potencializada por meio de uma maior utilização dessa rica biodiversidade essencialmente brasileira. A diversidade genética das passifloras deve ser caracterizada e inserida nos programas de melhoramento genético do maracujazeiro azedo e doce, visando ao aumento da base genética com genes de interesse. Além disso, as passifloras podem ser utilizadas para diversificar os sistemas de produção com o desenvolvimento e disponibilidade de cultivares de diferentes espécies e híbridos interespecíficos. Referências ABF, ANÚARIO BRASILEIRO DE FRUTICULTURA, Michelle Treichel ... [et al.]. Santa Cruz do Sul: Editora Gazeta Santa Cruz, 2016. 88 p.: il. ABREU, P. P.; SOUZA, M. M.; SANTOS, E. A.; PIRES, M. V.; PIRES, M. M.; ALMEIDA, A. F. Passion flower hybrids and their use in the ornamental plant market: perspectives for sustainable development with emphasis on Brazil. Euphytica, v. 166, n. 3, p. 307-315, 2009. ARAUJO, C. A. T.; FALEIRO, F. G.; SEMPREBOM, M. S.; KRAUSE, W. Sobrevivência de plantas enxertadas de maracujazeiro em área com histórico de doenças causadas por Fusarium spp. no Mato Grosso. In: Congresso Brasileiro de Fruticultura, 22, 2012, Bento Gonçalves. Anais... Bento Gonçalves: SBF, 2012. 4p. ARAÚJO, F. P.; MELO, N. F.; MACHADO, C. F.; FALEIRO, F. G.; FREIRE, A. J. C. S.; SILVA, T. D. F. Produtividade de maracujazeiro (Passiflora cincinnata Mast.) em área com histórico de ocorrência de fusariose. In: III Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos. Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos: Santos, SP. Resumos... n. 570, 2014a. Unidade CD. ARAÚJO, F. P.; MELO, N. F.; GAVA, C. A. T.; FALEIRO, F. G.; FREIRE, A. J. C. S.; BATISTA, D. C. Avaliação da sobrevivência de genótipos de maracujazeiro em área com histórico de ocorrência de fusariose. In: III Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos. Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos: Santos, SP. Resumos... n. 569, 2014b. Unidade CD. BERNACCI, L. C.; CERVI, A. C.; MILWARD-DE-AZEVEDO, M. A.; NUNES, T. S.; IMIG, D. C.; MEZZONATO, A. C. (2013) Passifloraceae In: Lista de Espécies da Flora do Brasil. Jardim Botânico do Rio

79


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

de Janeiro, 2013. Disponível em: <http://floradobrasil.jbrj.gov.br/ jabot/floradobrasil/FB128567>. Acessado em: 12 de maio de 2014. BERNACCI, L. C.; SOARES-SCOTT, M. D.; JUNQUEIRA, N. T. V.; PASSOS, I. R. S.; MELETTI, L. M. M. Passiflora edulis Sims: The correct taxonomic way to cite the yellow pasion fruit (and of others colors). Revista Brasileira de Fruticultura, v. 30, n. 2, p. 566-576, 2008. BERNACCI, L. C. (Coord.) Passifloraceae. In: WANDERLEY, M. G. L.; SHEPHEERD, G. J.; GIULIETTI, A. M.; MELHEM, T. S. (Ed.) Flora fanerogâmica do Estado de São Paulo. São Paulo: RiMa/FAPESP, v.3, p. 247-274, 2003. CAVICHIOLI, J. C.; CORRÊA, L. S.; GARCIA, M. J. M.; FISCHER, I. H. Desenvolvimento, produtividade e sobrevivência de maracujazeiro-amarelo enxertado e cultivado em área com histórico de morte prematura de plantas. Revista Brasileira de Fruticultura, v. 33, p. 567-574, 2011. COSTA, A. M.; TUPINAMBÁ, D. D. O maracujá e suas propriedades medicinais – estado da arte. In: FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; BRAGA, M. F. (ed.) Maracujá: germoplasma e melhoramento genético. Planaltina: Embrapa Cerrados, p.475-508, 2005. EMBRAPA. Memória do Lançamento dos Híbridos de Maracujazeiro Ornamental. Disponível em:< http://www.cpac.embrapa.br/lancamentoornamental/>. Acesso em: 27 nov. 2017a. EMBRAPA. Maracujazeiros ornamentais com coloração de flores rosadas e azuladas. Disponível em:< http://www.cpac.embrapa.br/lancamentoornamental2016/>. Acesso em: 27 nov. 2017b. EMBRAPA. Memória do Lançamento dos Híbridos de Maracujazeiro Azedo. Disponível em:< http://www.cpac.embrapa.br/lancamentoazedo/>. Acesso em: 27 nov. 2017c. EMBRAPA. Lançamento do híbrido de maracujazeiro azedo - BRS Rubi do Cerrado. Disponível em:< http://www.cpac.embrapa.br/lancamentobrsrubidocerrado/>. Acesso em: 27 nov. 2017d. EMBRAPA. Lançamento da cultivar de maracujazeiro silvestre BRS Pérola do Cerrado. Disponível em:<<http://www.cpac.embrapa.br/lancamentoperola/>. Acesso em: 27 nov. 2017e. EMBRAPA. Lançamento Oficial da Cultivar de Maracujazeiro Silvestre BRS Sertão Forte (BRS SF). Disponível em: <http://www.cpac.embrapa.br/lancamentosertaoforte/>. Acesso em: 20 jan. 2017f. EMBRAPA. Lançamento da cultivar de maracujazeiro doce BRS Mel do Cerrado. Disponível em:<<http://www.cpac.embrapa.br/lancamentodoce/>. Acesso em: 27 nov. 2017g. FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; BRAGA, M. F. Germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro – Desafios da pesquisa. In: FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; BRAGA, M. F. (Eds.) Maracujá: germoplasma e melhoramento genético. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2005. p. 187-210. FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; BRAGA, M. F.; PEIXOTO, J.R. Caracterização de germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro assistidos por marcadores moleculares: resultados de pesquisa 20052008. Planaltina: Embrapa Cerrados, 2008. 59 p. (Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento, No 207). FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; JESUS, O. N.; COSTA, A. M. Avances y perspectivas del fitomejoramiento de las pasifloráceas en Brasil. Congreso Latinoamericano de Passifloras 2. Anais...Neiva: Corporación Cepass Colombia, 2013. FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; JUNQUEIRA, K. P.; BRAGA, M. F.; BORGES, R. S.; PEIXOTO, J. R.; ANDRADE, G. A.; SANTOS, E. C.; SILVA, D. G. P. BRS Estrela do Cerrado: Híbrido de Passiflora para uso como planta ornamental. Revista Brasileira de Horticultura Ornamental, v. 13, p. 334, 2007. FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; BRAGA, M.F.; COSTA, A.M. Conservação e caracterização de espécies silvestres de maracujazeiro (Passiflora spp.) e utilização potencial no melhoramento genético, como porta-enxertos, alimentos funcionais, plantas ornamentais e medicinais - resultados de pesquisa. Planaltina: Embrapa Cerrados, 2012. (Documentos, No 312). 34p. FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; COSTA, A.M. Ações de pesquisa e desenvolvimento para o uso diversificado de espécies comerciais e silvestres de maracujá (Passiflora spp.). Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2015. (Documentos, No 329). 26p. FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; OLIVEIRA, E.J.; MACHADO, C.F.; PEIXOTO, J.R.; COSTA, A.M.; GUIMARÃES, T.G.; JUNQUEIRA, K.P. Caracterização de germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro assistidos por marcadores moleculares - fase II: resultados de pesquisa 2008-2012. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2014. (Documentos, No 324). 102p. IBGE. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Consulta em: 20/08/2011.

80


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

JUDD, W. S.; CAMPBELL, C. S.; KELLOGG, E. A.; SETEVENS, P. F.; DONOGHUE, M. J. Sistemática vegetal: um enfoque filogenético. 3ª Ed. Porto Alegre, RS: Artmed. 612P. 2009. JUNQUEIRA, K. P.; FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; BELLON, G.; RAMOS, J. D.; BRAGA, M. F.; SOUZA, L. S. Confirmação de híbridos interespecíficos artificiais no gênero Passiflora por meio de marcadores RAPD. Revista Brasileira de Fruticultura, v. 30, n. 1, p. 191-196, 2008. KILLIP, E. P. The American species of Passifloraceae. Field Museum of Natural History, Botanical Séries, v.19, p.1-613, 1938. MACHADO, C. F.; FALEIRO, F. G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; JESUS, O. N.; ARAÚJO, F. P.; GIRARDI, E. A. A enxertia do maracujazeiro: técnica auxiliar no manejo fitossanitário de doenças do solo. Cruz das Almas, BA: Embrapa Mandioca e Fruticultura, 2015. (Circular Técnica, No116). 15p. MELETTI, L. M. M. Avanços na cultura do maracujá no Brasil. Revista Brasileira Fruticultura, v. 33, nº spe. 1, p. 83-091, 2011. MUSCHNER, V. C.; LORENZ, A. P.; CERVI, A. C.; BONATTO, S. L.; SOUZA-CHIES, T. T.; SALZANO, F. M.; FREITAS, L. B. A first molecular phylogenetic analysis of Passiflora (Passifloraceae). American Journal of Botany, v. 90, n. 8, p. 1229-1238, 2003. PATEL, S. S.; MISHRA, H. S. K.; SINGHAI, A. K. Recent updates on the genus Passiflora: A review. Research in Phytochemistry and Pharmacology, v. 1, n. 1, p. 1-16, 2011. PEIXOTO, M. Problemas e perspectivas do maracujá ornamental. In: FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N. T. V.; BRAGA, M. F. (Eds.) Maracujá: germoplasma e melhoramento genético. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, p. 457-463, 2005. PIRES, M. V.; ALMEIDA, A. A. F.; FIGUEIREDO, A. L.; GOMES, F. P.; SOUZA, M. M. Germination and seedling growth of ornamental species of Passiflora under artificial shade. Acta Scientiarum Agronomy, v. 34, n. 1, p. 67-75, 2012. SACCO, J. C. Passifloráceas. Itajaí: Herbário Barbosa Rodriguez, (Flora Ilustrada Catarinense), 130P. 1980. SAKALEM, M.; NEGRI, G.; TABACH, R. Chemical composition of hydroethanolic extracts from five species of the Passiflora genus. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 22, n. 6, p. 1219–1232, 2012. SANTOS, E. A. Quantificação da Diversidade Genética entre Genitores e Híbridos de Maracujazeiro por meio da Estratégia Ward-Mlm. Anais... CD-Rom dos Anais do XXII Congresso Brasileiro de Fruticultura, Bento Gonçalves – RS, 2012. SEMPREBOM, M. S.; FALEIRO, F. G.; ARAUJO, C. A. T.; PRADO, L. L. do.; HADDAD, F.; JUNQUEIRA, N. T. V. Tecnologia de mudas enxertadas de maracujazeiro azedo para controle de doenças causadas por Fusarium spp. no Mato Grosso - a experiência da Coopernova. In: Congresso Brasileiro de Fruticultura, 22., 2012, Bento Gonçalves. Anais... Bento Gonçalves: SBF, 2012. 4p. SILVA, R. M. Enxertia de cultivares de maracujazeiro azedo sobre Passiflora foetida L.: Desempenho agronômico das cultivares, caracterização morfoagronômica, variabilidade genética do porta enxerto e resistência a fusariose. 2016. 112 f. Tese (Doutorado em Agronomia) – Universidade Federal Rural do Semiárido, Mossoró, PE, 2016. SOUZA, J. S. I.; MELETTI, L. M. M. Maracujá: espécies, cultivares, cultivo. Piracicaba: FEALQ, 1997. 179p. SOUZA, V. C.; LORENZI, H. Botânica Sistemática: guia ilustrado para identificação das famílias de fanerógamas nativas e exóticas no Brasil, baseado em APG II. 2º Ed. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 640P. 2008. TOKUOKA, T. Molecular phylogenetic analysis of Passifloraceae sensu lato (Malpighiales) based on plastid and nuclear DNA sequences. Journal of Plant Research, v. 125, n. 4, p. 489-497, 2012. VANDERPLANK, J. Passion flowers. Massachusetts: MIT Press, 224P. 1996. VANDERPLANK, J.; BLANCO, E. G.; FEUILLET, C.; FRANK, A.; KING, L.; KUGLER, E.; LAURENS, C.; MACDOUGAL, J.; SKIMINA, T. The International Passiflora Register 2003. Passiflora Society International, v. 1, p. 1-36, 2003. VIEIRA, M. L. C.; CARNEIRO, M. C. Passiflora spp. Passionfruit. In: LITZ, R. (Ed). Biotechnology of fruit and nut crops. Oxford: CABI, p. 436-453, 2004.

81


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

11. Feijão Carioca: Meio século de sucesso no campo e de revolução na mesa dos brasileiros Elaine Bahia Wutke Eng. Agr. (1982), Me. (1987) e Dr. (1998) na área de concentração de Agronomia pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ-USP) . É Pesquisadora Científica VI, efetiva, do Instituto Agronômico (IAC), em Campinas, SP. Tem experiência na área de fitotecnia de adubos verdes, feijão e outras leguminosas alimentícias, com ênfase em sistemas de produção sustentáveis, manejo da cultura e do solo e manutenção de germoplasma. Publicou 51 artigos científicos; 151 trabalhos em anais de eventos, 54 capítulos de livros; cinco produtos tecnológicos e outros 67 itens de produção técnica, interagindo com 360 colaboradores. Proferiu 48 palestras; participou de 73 eventos no Brasil; coordena dois projetos no IAC e recebeu um prêmio e / ou homenagem. É Curadora do Banco de Germoplasma de Leguminosas Diversas do IAC; relatora de revistas científicas nacionais e assessora ad-hoc de instituições de fomento à pesquisa.

Luiz D’Artagnan de Almeida

Eng. Agr. Escola Nacional de Agronomia da Universidade Rural do Brasil(1966). Ingressou no Instituto Agronômico de Campinas em 1967, na Seção de Leguminosas. Dr. em Agronomia, pela ESALQ, 1973. Foi chefe da Seção de Leguminosas de 1975 a 1982. Entre 1983 e 1988 foi Diretor da Divisão de Plantas Alimentícias Básicas. Foi Assistente Técnico de Direção no IAC até 1991, e Assistente Técnico de Direção da Coordenadoria de Pesquisa Agropecuária da Secretaria de Agricultura e Abastecimento. Entre os anos de 1993 e 1997, exerceu a Presidência da Fundação IAC, hoje Fundação de Apoio à Pesquisa Agrícola. A partir de 1997 foi Assistente Técnico de Direção junto a Diretoria Geral do IAC, sendo ainda Diretor Geral Substituto do IAC, até sua aposentadoria em 2002.

RESUMO ‘Carioca’ é a mais bem sucedida cultivar na história brasileira do feijão (Phaseolus vulgaris L.). Neste trabalho foram compiladas informações obtidas em documentos, como atas de Comissões Técnicas de Feijão, artigos científicos e de divulgação técnico-científica e em relatos de pessoas que estiveram diretamente relacionadas a essa cv., desde seu surgimento até sua utilização em experimentos, em cultivos para produção de sementes, em sua distribuição, divulgação e adoção pelos agricultores e utilização como material parental para cruzamentos no Brasil e em outros países. Foi ressaltada a importância desse germoplasma na modernização da cultura do feijão para a agricultura paulista e nacional, já que a ‘Carioca’ sobrevive por 50 anos no mercado e foi inserida nos mais distintos sistemas de produção devido ao seu excepcional desempenho agronômico, qualidade culinária e palatabilidade. Palavras-chave: Phaseolus vulgaris L.; cultivar de feijão; leguminosa alimentícia, pesquisa agronômica; proteína vegetal. ABSTRACT ‘Carioca’, is the most successful cultivar in common bean (Phaseolus vulgaris L.) history in Brazil. This paper presents some information compiled from official documents, such as technical committee minutes, articles for scientific dissemination, and reports of many persons directly related to this cv. since its discovering and during its utilizations at experiments, official seed production, distribution, disclosure and adoption by farmers, and as parenting material for crosses in Brazil and other countries. It was emphasized the importance of this cultivar for the modernization of common bean crop in São Paulo and national agriculture because ‘Carioca’ 82


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

has survived over 50 years of its existence and was inserted into agricultural production systems due to its agronomic performance, cooking quality and palatability. Key words: Phaseolus vulgaris L.; common bean cultivar; food leguminous crop; agronomic research; vegetable protein INTRODUÇÃO A cultivar Carioca representa o maior sucesso na história nacional da cultura do feijão, por predominar na produção brasileira dessa importante leguminosa alimentícia por cerca de cinco décadas. Seu nome, inclusive, tornou-se denominação de um tipo comercial de grão – o tipo Carioca. Até os dias de hoje, muitas das novas cultivares disponíveis no mercado não conseguiram substituí-la totalmente e nem têm a posição de destaque que esta cv. usufruiu. Sua história se inicia pelos idos do ano de 1963, em Ibirarema, SP, onde o Eng. Agr. Waldimir Coronado Antunes (Figura 1) era então o chefe da Casa de Agricultura, subordinada à Coordenadoria de Assistência Técnica Integral da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (CATI). Em sua Fazenda Bom Retiro, nesse mesmo município, o Sr. Waldimir havia semeado um campo de feijão da cultivar Chumbinho, cujo grão tem a casca com a coloração típica marromescura. Passado um tempo, ele e um tio constataram algumas plantas Figura 1. Waldimir Coronado cujos grãos possuíam textura listrada, “manchados de preto e Antunes. marrom” nessa mesma lavoura. Devido à sua tendência pessoal para as coisas do campo e curiosidade profissional, fez uma experiência prática, semeando uma área só com esse material. Percebendo que essas “novas” plantas eram mais robustas, cresciam com muita facilidade, eram menos suscetíveis às doenças e mais produtivas, fez seleção massal, acreditando se tratar de uma mutação genética natural. A esposa do Sr. Waldimir cozinhou os grãos, resultando num feijão de caldo considerado consistente e aroma muito atrativo, sendo aprovado por quem experimentava. Foram então doadas sementes para alguns agricultores da região que reagiram muito bem ao novo material. Decidiram batizá-la com o nome ‘Carioca’ depois que um dos empregados do Sr. Waldimir percebeu a semelhança entre a aparência dos grãos e a dos porcos criados na fazenda, conhecidos por tal nome porque possuíam manchas escuras na pele sobre fundo de cor clara. É que, naquela época e naquela região, denominavam de carioca, por associação, tudo ou todos que tivessem a aparência pintada e rajada (PINHEIRO, 2000; SARDENBERG, 2013). Aliás, por muito tempo o nome Carioca foi atribuído à famosa calçada de Copacabana, no Rio de Janeiro, devido à falta de informação oficial, o que só aconteceu em 2000, em relato do Sr. Waldimir, em Informativo comemorativo dos 33 anos da CATI (PINHEIRO, 2000). Já em 1966, o Sr. Waldimir selecionou e entregou um saco de 30 quilos desse germoplasma ao Eng. Agr. Jacob Tosello, diretor da DIRA de Presidente Prudente, subordinada a Casa de

83


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figura 2. Busto em homenagem ao Dr. André Tosello.

Agricultura de Ibirarema que as enviou para seu irmão, o Dr. André Tosello (Figura 2), que trabalhava no Instituto Agronômico – IAC, em Campinas, SP. As sementes, por sua vez, foram então recebidas no IAC, em 01o de agosto desse mesmo ano, pelo Eng. Agr. Shiro Miyasaka (Figura 3), pesquisador e chefe da então Seção de Leguminosas. Essa amostra de feijão foi oficialmente catalogada na coleção de plantas do IAC como acesso Carioca, recebendo o número institucional de introdução I-38700.

O Dr. Miyasaka se empenhou decisivamente para a adequada avaliação desse material, designando para tal o Dr. Luiz D’Artagnan de Almeida (Figura 4), responsável Figura 3. Dr. Shiro Miyasaka. direto pelas avaliações regionais preliminares, pela multiplicação dessa cultivar e para seu futuro lançamento, embora as sementes, pela sua coloração, não tivessem ainda a preferência dos consumidores paulistas.

D’Artagnan, Shiro e Hermógenes Freitas Leitão Filho (Figura 5), pesquisadores do IAC, apresentaram um trabalho preliminar descritivo das características botânicas, agronômicas e 5. Dr. Hermógenes culinárias do feijão ‘Carioca’, já então Figura Freitas Leitão Filho. considerado uma nova cultivar para o Figura 4. Dr. Luiz D’artagnan de Almeida, avaliando feijão em casa de vegetação, no Estado de São Paulo, no 3º Encontro de Técnicos em Agricultura, IAC, anos 1960. realizado de 21 a 23 de agosto de 1968, em Serra Negra, SP (a) (Figura 6). Nessa primeira apresentação pública do ‘Carioca’ os pesquisadores divulgaram os animadores resultados que comprovavam a produtividade superior, a resistência às doenças prevalentes na época e as qualidades culinárias desse feijão após as avaliações preliminares.

Figura 6. Engenheiro-agrônomo Luiz D’Artagnan de Almeida apresentando o primeiro relato sobre o feijão ‘Carioca’, no 3º Encontro de Técnicos em Agricultura, em agosto de 1968, em Serra Negra, SP.

Conforme relatado em ata de reunião da Comissão Técnica de Leguminosas da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo (SAA), realizada em 03 de outubro de 1968, no prédio da então Seção de Leguminosas do IAC, um dos tópicos discutidos foi o plano de multiplicação de sementes de feijão, concluindo-se pela “inclusão da cultivar Carioca, levantando a premissa de sua não aceitação;...”. Nessa mesma reunião, o pesquisador Miyasaka, que era presidente 84


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

da referida Comissão, destacou: “a alta produção que a nova ‘Carioca’ apresentou em ensaios” e o pesquisador D’Artagnan “realçou as boas características dessa cv.” (COMISSÃO..., 1968). Cabe ressaltar que, mesmo entre alguns membros dessa Comissão Técnica de Leguminosas, havia alguma restrição e receio quanto à inclusão desse novo material para multiplicação pelo Departamento de Sementes e Mudas da CATI, devido à possível não aceitação pelos agricultores e consumidores. Isso porque, naquela época, era bastante difícil a introdução e oferta de cultivares com sementes cujo tegumento fosse de coloração “pintada” ou “rajada”, como no caso do ‘Carioca’. O Eng. Agr. Alaor Menegário (Figura 7), então extensionista rural da CATI e presente a essa reunião, embora um pouco receoso, sugeriu uma campanha de esclarecimento junto ao lavrador e ao Figura 7. Eng.Agr. Alaor Menegário, da consumidor, o que foi acatado pelos demais, conforme constado CATI, foto de 2009 (in memoriam - 2013). na referida ata (COMISSÃO..., 1968). Em 1969 a cultivar Carioca foi oficialmente lançada, sob a responsabilidade direta do pesquisador científico Dr. D’Artagnan, sendo incluída no projeto de produção de sementes básicas da CATI. Foram entregues cinco sacas desse feijão para multiplicação ao Departamento de Sementes e Mudas da CATI. Ao final desse ano foram distribuídas amostras de sementes, sobretudo para os agricultores da região Sudoeste do Estado de SP, na qual se concentravam 60% da produção estadual de grãos de feijão naquela época, juntamente com um folheto informativo das características da nova cultivar (AGÊNCIA..., 2000). Nesse folheto, de quatro páginas e de autoria de D’Artagnan e de Lígia Pereira, nutricionista da CATI, foram também relacionadas as qualidades culinárias da cv., algumas instruções sobre o seu preparo propriamente dito, e receitas de Figura 8. Folder sobre salada e de dobradinha, destinadas, àquela época, às donas de casa (Figura 8). o feijão 'Carioca'. Como apoio a essa campanha de divulgação pelo Dr. D’Artagnan e outros agrônomos do IAC proferiram muitas palestras para agricultores e técnicos, em reuniões nas Casas de Agricultura da CATI, particularmente naquelas de municípios da região Sudoeste do Estado. Alguns reconheceram prontamente a importância dessa nova cultivar e se tornaram incansáveis divulgadores do “Carioca’. No município de Taquarituba, na referida região, o engenheiro-agrônomo José Norival Augusti (Figura 9), da CATI, colaborou destacadamente para a difusão dessa cultivar, distribuindo Figura 9. Eng. Agr. José Norival Augusti, CATI. amostras de sementes e realizando as primeiras vendas de sementes para a região. Ele curiosamente relatou que, em conversas com o agricultor, incentivava para que aquele interessado na aquisição de 20 sacos de feijão ‘Bico-de-Ouro’ acabasse adquirindo pelo menos um do ‘Carioca’ (AGÊNCIA..., 2000). De acordo com Norival, os grãos dessa nova cultivar foram inicialmente recebidos com certa desconfiança pelos agricultores por serem considerados “manchadinhos”, já que os grãos 85


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

de feijão consumidos naquela época eram de uma só cor. Nos anos seguintes, entretanto, os agricultores começaram a ficar entusiasmados com a “nova” cultivar, devido às suas qualidades agronômicas (produtividade, resistência à acidez do solo) e culinárias, determinadas em diversas avaliações (AUGUSTI, 1992). Nessa ocasião foi também iniciada a investida junto ao mercado consumidor e durante anos, até 1976, foram distribuídas amostras de 0,5 kg de sementes e o folheto anteriormente mencionado, com algumas receitas culinárias (AGÊNCIA..., 2000). Cabe destacar que a qualidade culinária dos grãos do ‘Carioca’ foi informalmente avaliada e aprovada com distinção em preparos caseiros realizados pela Sra. Maximiliana Haddad de Almeida, mãe de D’Artagnan, e por funcionárias da então Seção de Leguminosas do IAC, além dos testes culinários laboratoriais oficiais. Nestes últimos, os grãos da cv. Carioca foram classificados como tenros e de cozimento rápido (1 hora e 35 minutos), sendo determinada a seguinte composição química em 100 gramas de sementes: 21% de proteína; 58% de carboidratos; 4,4% de fibras e 280mg de fósforo, 136 mg de cálcio e 11 mg de ferro (ALMEIDA et al., 1971). Em determinado momento de dúvidas acerca da viabilidade comercial do ‘Carioca’, D’Artagnan recebeu importantes incentivos e apoios de sua esposa, a Sra. Florans, e de sua mãe que, provavelmente, foi a primeira brasileira do ambiente externo do IAC a cozinhar o ‘Carioca’ em sua casa. Ela, inclusive, foi proprietária de um restaurante em Monte-Mor, por 24 anos, onde utilizava o ‘Carioca’ na feijoada ao invés de feijão de grão preto (AGÊNCIA..., 2000). Em meados de 1970, D’Artagnan escreveu uma matéria de alcance nacional sobre a cultivar Carioca no Suplemento Agrícola do jornal “O Estado de São Paulo” (ALMEIDA, 1970). Em 1971 foi publicada uma Nota Científica em Bragantia, revista científica do IAC (Figura 10), intitulada “Características do feijão Carioca, um novo cultivar”, de autoria dos pesquisadores D’Artagnan, Hermógenes e Shiro, do IAC (ALMEIDA et al. 1971). Nela foram relacionados os resultados constatados em 22 experimentos regionais de competição de cultivares de feijoeiro, desenvolvidos desde a safra da seca de 1967 até 1969, em todo o Estado de São Paulo. Foi evidenciada a destacada produtividade em grãos da ‘Carioca’ em 15 deles, com média estadual ao redor de 1.670 Figura 10. Nota Científica em Bragantia, 1971. kg/ha, comparativamente aos 1.280 kg/ha das cultivares Bico de Ouro e Rosinha G-2, que, naquela época, eram as mais cultivadas neste Estado, cujo tegumento de grãos era de coloração uniforme (Figura 10). Cabe informar que, naquela época, cerca de 30 pessoas trabalhavam na então Seção de Leguminosas do IAC, o que muito favoreceu o adequado desenvolvimento dos necessários estudos.

Figura 11. Anais do I Simpósio Brasileiro de Feijão, Campinas - 1971.

Ainda em 1971, por ocasião do I Simpósio Brasileiro de Feijão, realizado de 22 a 29 de agosto de 1971, em Campinas, SP (Figura 11), D’Artagnan e Shiro fizeram uma apresentação oral, intitulada “Cultivar, melhoramento e genética do feijoeiro”, relacionada aos estudos 86


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

desenvolvidos no Estado de São Paulo, e distribuíram amostras de sementes de feijão ‘Carioca’ para técnicos de todo o país, presentes ao referido evento. De 1970 a 1975 foi confirmado o desempenho inicial dessa nova cultivar, tanto na produção de sementes genéticas e básicas quanto na sequência de experimentos desenvolvidos nas principais regiões produtoras e nas duas safras tradicionais (águas e seca) de cultivo dessa leguminosa no estado de São Paulo. Cabe aqui ressaltar mais uma vez o empenho e a determinação de Shiro e D’Artagnan, em assumirem oficialmente a responsabilidade inicial naquela Comissão Técnica de Leguminosas, que incluiu essa nova cultivar na relação das que seriam multiplicadas. Posteriormente, esses pesquisadores do IAC e também Alaor Menegário e José Norival Augusti, da CATI, em profícuo trabalho de integração do serviço público da Secretaria de Agricultura, tiveram papel relevante no trabalho de divulgação dessa cultivar pelo Estado, distribuindo saquinhos de sementes para avaliação própria entre os agricultores, muitos deles ainda incrédulos, devido ao hábito alimentar da população paulista, exigente em cultivares com sementes de coloração única no tegumento. Essa divulgação do ‘Carioca’ foi também possível por conta das centenas de experimentos, dos campos de demonstração e de outras atividades de difusão e de transferência de tecnologia, das quais resultaram o conhecimento e a adoção dessa nova cultivar pelos produtores paulistas e também de outros estados brasileiros. Já em 1976, a cv. Carioca era a mais cultivada e comercializada no estado de São Paulo, além de ser a mais consumida e aceita pelo mercado, estando presente na relação de materiais recomendados para produção oficial de sementes no estado (COORDENADORIA..., 1976). Após cinco anos de seu lançamento, o feijão ‘Carioca’ foi praticamente adotado como o preferido, sobretudo pelos consumidores paulistas, desbancando cultivares até então comumente utilizadas, como Bico-de-Ouro, Chumbinho, Manteiga, Mulatinho, Rosinha e Roxinho (FERNANDES, 1999). Em 1977 o IAC distribuiu gratuitamente um folheto sobre a cultura do feijão, em que se recomendavam para “plantio” as cultivares Carioca, Aroana, Rosinha G-2, Piratã-1, Goiano Precoce e Moruna, como sendo de “boa capacidade produtiva e de aceitação no mercado consumidor” (Figura 12) (ALMEIDA, 1977). A partir de 1980, a cultivar Carioca ou ‘Carioquinha’, como foi Figura 12. Boletim sobre a carinhosamente apelidada, passou a ser cultivada na maioria dos Estados cultura do feijão, 1977. brasileiros, assim como outras cultivares que dela se originaram, tendo esta cv. como parental, em diversos programas de melhoramento em desenvolvimento no país e inclusive no Centro Internacional de Agricultura Tropical, em Cali, Colômbia (CIAT). É importante ressaltar que o CIAT é uma renomada instituição internacional de pesquisa direcionada aos estudos de aplicação da ciência para a erradicação da fome e da pobreza nos

87


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

países em desenvolvimento, a qual tem o apoio do Consultative Group on International Agricultural Research (CIGIAR). A revolução gerada a partir do Carioca teve interessante e direta relação com a modernização da cultura do feijão, como a que se constatou a partir de 1980, com o lançamento do Programa de Feijão Irrigado do Estado de São Paulo (Pró-Feijão) da SAA do estado de São Paulo, particularmente no município de Guaíra, e imediatamente expandido para as regiões Norte e Oeste do estado. Com isso foi favorecido o cultivo de uma terceira safra de feijão em um mesmo ano (safra de inverno com irrigação), além das tradicionais safras “das águas” e “da seca”, sendo ‘Carioca’ a cultivar mais cultivada nas três safras. A adoção dessa terceira safra em outros estados foi natural e pequenas áreas foram transformadas em extensas lavouras de feijão, em processo de modernização tecnológica e aperfeiçoamento produtivo, seguido de desenvolvimento na aplicação de insumos, manejo, armazenamento e mecanização, com consequente suporte para a auto regulação do setor (BULISANI, 2008; GONÇALVES, 2017). Em interessante artigo científico da área econômica, relatou-se o cultivo de ‘Carioca’ em 48% da área avaliada nos estados de Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais e Rio de Janeiro, inclusive, como cultivar referencial no estudo (JANSSEN et al., 1992). Com a introdução do ‘Carioca’ nos anos 1970, a produtividade das lavouras paulistas passou a ter um crescimento contínuo, sendo constatado rendimento médio da ordem de 1.077 kg/hectare, considerando-se as safras “das águas” e “da seca”, no período de 1995 a 1998; esse valor é muito superior à média de 492 kg/hectare, determinada nas mesmas safras, mas no período 1970 a 1974 (IEA, citado em Agência..., 2000). Em inúmeros experimentos desenvolvidos no período 1994-1996, destinados à avaliação e recomendação oficial de cultivares para o estado de São Paulo, realizados em três safras (águas, seca e inverno, com irrigação) e em diferentes localidades de regiões produtoras dessa leguminosa, a cv. Carioca sempre foi utilizada como testemunha-padrão, sendo com ela obtidos relevantes resultados de produtividade (WUTKE et al., 1998). Em 1999, quando a ‘Carioca’ completou 30 anos do seu lançamento, D’Artagnan deu uma entrevista para o Jornal Gazeta Mercantil, destacando a importância desse genótipo que foi um marco na história da feijoicultura nacional. Naquela época, o Brasil era o segundo maior produtor mundial dessa leguminosa e cerca de 80% da produção e consumos de grãos eram provenientes dessa cultivar e também de outras originadas a partir dela (Fernandes, 1999). Em 19 de abril de 2000, durante as comemorações oficiais do 30º aniversário do lançamento desta cv., realizadas no XVI Dia de Campo de Feijão, em Capão Bonito, SP, D’Artagnan, Shiro Miyasaka e Eduardo Antonio Bulisani, do IAC, e Alaor Menegário e José Norival Augusti, da CATI, foram meritoriamente homenageados pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (AGÊNCIA..., 2000). Os inúmeros reflexos da adoção do feijão tipo Carioca e sua importância na alimentação da população brasileira foram detalhadamente divulgados em 2000, em comemoração aos 30 anos dessa destacada cultivar, em folheto informativo de autoria de D’Artagnan, então 88


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

apelidado de “o pai do Carioquinha” (Figura 13) (ALMEIDA, 2000); em edição especial de publicação da SAA-SP, de maio/junho (Figura 14) (Agência..., 2000) e em matéria do Suplemento Agrícola do Jornal ‘O Estado de São Paulo’ (TOMAZELA, 2000).

Figura 13. O Feijão Carioca: reflexos de sua adoção.

Ainda em 2000, em edição especial de novembro do Informativo CATI, comemorativa dos 33 anos dessa instituição pública de assistência técnica, foi divulgada a matéria “Feijão Carioca: o segredo de um sucesso”, em que foi relatada a saga inicial da descoberta dessa importante cultivar de feijão (Figura 15) (PINHEIRO, 2000).

Figura 14. Informativo da APTA.

Também naquele mesmo ano, foram publicadas informações sobre os impactos da geração de tecnologia pela pesquisa paulista com a cultivar Carioca na Revista Agricultura, do Instituto de Economia Agrícola - IEA (VICENTE et al., 2000). Nesse texto, referente a uma palestra apresentada no 16º Dia de Campo de Feijão, realizado de 18 a 19 de abril de 2000, evento tradicionalmente realizado em Capão Bonito, SP, os autores afirmam que: “o lançamento do Feijão Carioca Figura 15. Informativo CATI em 1969 constituiu um divisor de águas na evolução dessa lavoura. 33 anos, 2000. Esse fato promoveu uma reversão da tendência declinante da produtividade da terra, ao mesmo tempo em que formou o alicerce da modernização dessa atividade. Com isso, contrariando a perspectiva de que teria havido prioridade absoluta para produtos de exportação, a pesquisa pública paulista sustentou o desenvolvimento de uma cadeia de produção tipicamente de mercado interno”. Em capítulo intitulado “Las Grandes Cultivars Internacionales Del Sieglo Veinte”, de livro sobre o melhoramento genético do feijão, publicado também no ano de 2000, pelo CIAT, em Cali, Colômbia, o autor afirmou que, de toda a relação de cultivares cultivadas por toda a América Latina no período 1930-1999, ‘Carioca’ foi considerada umas das cinco de destaque, por seu valor excepcional, o que possibilitou ultrapassar as fronteiras brasileiras, onde se originou, e ser mantido nas preferências dos agricultores por muitos anos (VOYSEST, 2000). Em meados de 2007, em reportagem sobre a ‘Carioca’, veiculada no programa televisivo Globo Rural, pesquisadores do CIAT, na Colômbia, reconheceram a importância dessa cultivar, enfatizando sua eficaz inclusão nos programas de melhoramento desenvolvidos naquele Centro. Em 21 de outubro de 2008, na abertura do IX Congresso Nacional de Pesquisa de Feijão, realizado em Campinas, SP, o PqC. VI Eduardo Antonio Bulisani, do IAC, proferiu uma palestra intitulada “Feijão Carioca - uma história de sucesso”. Na ocasião, evidenciou a “importância do Carioca tanto na vertente empresarial da feijoicultura brasileira quanto para a agricultura de subsistência e dos pequenos produtores, que teriam se beneficiado das vantagens intrínsecas da cultivar e daquelas extrínsecas relacionadas à generalizada modernização dos mais variados sistemas produtivos”. Bulisani ainda ressaltou que, “passados dez a quinze anos 89


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

de seu lançamento e difusão, a notação técnica ‘cultivar Carioca’ já não mais poderia ser propriamente aplicada, pois os inúmeros programas brasileiros de melhoramento genético vegetal, usando a cultivar Carioca como um dos parentais, disponibilizaram aos produtores e ao mercado consumidor algumas dezenas de novas cultivares com grãos do tipo Carioca, que foram substituindo o genoma inicial, cada qual com peculiaridades próprias, especialmente de produtividade, resistência a pragas e moléstias, e arquitetura de planta mais adequada à colheita mecanizada, porém mantendo os grãos a forma, a cor e qualidade culinárias do material original...”. Também mencionou que, ao longo das últimas cinco décadas, foram gerados mais de 60 novas cultivares do “tipo Carioca” em muitos dos programas de melhoramento pelo Brasil, mas que a maioria deles acabou não “vingando” ao longo do tempo (BULISANI, 2008). Em 2008 foi também divulgada uma reportagem discorrendo sobre a inserção do feijão ‘Carioca’, desenvolvido pelo IAC, em programa mundial da Organização das Nações Unidas – ONU no combate à fome, por meio da distribuição de sementes de cultivares resistentes e muito produtivas pelos principais bolsões de pobreza, como no continente africano, e por localidades atingidas por catástrofes (VERZIGNASSE, 2008). A importância dessa cultivar foi igualmente ressaltada em publicações posteriores (TOLEDO, 2013; WUTKE & MASCARENHAS, 2010; WUTKE et al., 2010; GONÇALVES, 2017). Nos últimos dez anos, apesar da área cultivada com a ‘Carioca’ ter sido reduzida de 159 mil hectares para pelo menos 100 mil hectares no estado de São Paulo, possivelmente devido ao aumento de áreas cultivadas com cana-de-açúcar e soja, a produtividade foi aumentada de 28 para as atuais 36 sacas por hectare, no mesmo período, para atendimento do consumo interno (GONÇALVES, 2017). Até hoje, os grãos de feijão do tipo Carioca agradam mais o paladar dos brasileiros (cerca de 85% do mercado) por causa da casca fina, do caldo de espessura média e do cozimento mais fácil, de 20 minutos, em média, na panela de pressão (TOLEDO, 2013). Atualmente, ‘Carioca’ está presente na sua 13ª geração, tendo sido utilizado em cruzamentos que originaram mais de 42 cultivares lançadas, cujos grãos têm coloração mais destacada, formato mais homogêneo, mais proteína e mais tempo de permanência com a casca (tegumento) clara, devido à resistência à incidência de luz durante o armazenamento “na prateleira”. Como um dos desafios atuais, relaciona-se a tentativa de aumento do consumo de feijão tipo Carioca pelo mercado externo, já que tanto a produção quanto o consumo nacional são basicamente direcionados para o mercado interno; recentemente o IAC enviou material desse tipo para a Ucrânia (GONÇALVES, 2017). Considerações finais Dessa maneira, diante do que foi anteriormente explanado, esta é, definitivamente, uma história ímpar de meio século de sucesso invejável e de feliz sobrevivência de uma cultivar de feijão que, com certeza, fez revolução na alimentação dos brasileiros! 90


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Bibliografia AGÊNCIA PAULISTA DE TECNOLOGIA DOS AGRONEGÓCIOS. A Revolução do Carioquinha. Informação APTA, Campinas, ano 1, n.1, p.3-5, maio-junho 2000. (Edição Especial) ALMEIDA, L.D’A. de. Cultura do feijão. Campinas: Instituto Agronômico, 1977. 6p. (Série Instruções Sumárias, 5) ALMEIDA, L.D’A de. O feijão Carioca: reflexos de sua adoção. Campinas: Instituto Agronômico, 2000. 6p. (Folder) ALMEIDA, L. D’A. de; LEITÃO FILHO, H.F.; MIYASAKA, S. Características do feijão Carioca, um novo cultivar. Bragantia, Campinas, v.30, n.1, p.XXXIII-XXXVIII, 1971. (Nota, 7) AUGUSTI, J. N. Cultura do feijão em Taquarituba. GRIL Gráfica: Taquarituba, 1992. 47p. BULISANI, E.A. Feijão Carioca - uma história de sucesso. Campinas: Instituto Agronômico, 2008. p.1630-1632. (Documentos IAC, 85. CD-ROM) COORDENADORIA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA INTEGRAL - CATI/SAA/SP. Estamos apresentando o FEIJÃO CARIOCA: Prove-o. Campinas: CATI, s.d. 4p. (Folheto ilustrado) CATI/SAA. Descrição de cultivars de feijão: Phaseolus vulgaris L. CAS-Programa de Sementes e Mudas/Projeto de Produção de Sementes Básicas. Campinas: CATI, 1976. p.1. COMISSÃO TÉCNICA DE LEGUMINOSAS DA SECRETARIA DE AGRICULTURA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Ata... 1968. Seção de Leguminosas, Instituto Agronômico-IAC: Campinas, SP, 3 de outubro de 1968. 5p. (Ata de Reunião de Comissão Técnica) FERNANDES, A. C. Feijão Carioca faz 30 anos. Jornal Gazeta Mercantil, São Paulo, ano I, n.114, p. B-20, 12 Maio1999. (Suplemento Finanças & Mercados: Agribusiness) GONÇALVES, N. ‘Carioca’, amado na mesa da região. JCNET, Bauru, 25 junho 2017. Disponível em: <https://www.jcnet.com.br/Regional/2017/06/carioca-amado-na-mesa-da-regiao.html#prettyPhoto>. Acesso em 20 JUL 2017. JANSSEN, W.; TEIXEIRA, S.M.; THUNG, M. Adoção de cultivares melhoradas de feijão em estados selecionados no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v.30, n.4, p.321-338, 1992. PINHEIRO, C. Feijão Carioca: o segredo de um sucesso. Campinas: CATI, 2000. p.2. (Edição especial, CATI Informativo 33 anos) SARDENBERG, W. Grão Maravilha. Francella Cafeteria, Rio de Janeiro, 3 set 2013. Disponível em: <http://francellacafeteria.blogspot.com.br/2013/09/feijao-tropeiro.html>. Acesso em 16 Maio 2017. TOLEDO, G. Força Carioca. São Paulo: Folha de São Paulo, 12 junho 2013;. p. F4 Comida. TOMAZELA, J. M. Feijão Carioca faz 30 anos e ganha mais resistência. São Paulo: Suplemento Agrícola do Jornal O Estado de São Paulo, 2000. p.10-11. VERZIGNASSE, R. Feijão desenvolvido no IAC faz parte de projeto mundial para combater a fome. AGEMCAMP. 2008. Disponível em: <http://www.agemcamp.sp.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=181%3Afeijaodesenvolvido-no-iac-faz-parte-de-projeto-mundial-para-combater-a-fome&catid=6%3Armcnoticias&lang=pt>. Acesso em 12 ABR 2012. VOYSEST, O. V. Las Grandes Cultivars Internacionales Del sieglo veinte. In: VOYSEST, O. V. (Ed.). Mejoramiento Genético Del Frijol (Phaseolus vulgaris L.): Legado de Cultivars de America Latina 19301999. Cali: Centro Internacional de Agricultura Tropical -CIAT. 2000. p.134-136. (Publicación CIAT, nº 321) WUTKE, E. B.; MASCARENHAS, H. A. A. Feijão carioca: quase meio século de sucesso. Revista Cultivar, Pelotas, Julho 2010. Disponível em: http://www.grupocultivar.com.br/noticias/artigo-feijao-carioca-quasemeio-seculo-de-sucesso. Acesso em 02 AGO 2010. WUTKE, E. B.; MASCARENHAS, H. A. A.; THUNG, D. T. History of Carioca, the most popular landrace cultivar of the modern times on the American continents. Bean Improvement Cooperative – BIC, Prosser, v.55, n.55, p.257-258, 2010. WUTKE, E.B.; PINZAN, N. R.; SANNAZZARO, A.M.; OLIVEIRA, S.H.F. (Coord.). Feijão: sistema de avaliação e recomendação de cultivars para o Estado de São Paulo – 1994/1996. Campinas: CATI, 1998. 18p. (CATI. Documento técnico, 109)

91


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

12. Gestão e Caracterização do BAG-Passiflora spp. através do Portal Alelo RG da Embrapa Jamile da Silva Oliveira Eng. Agr. (2011), Me. em Recursos Genéticos Vegetais (2014). De 2007 a 2011 atuou como voluntária de pesquisa, nas seguintes áreas: cerrado, produção de mudas, utilização de substratos alternativos, fisiologia de sementes e plantas, ecofisiologia, alelopatia, spring, solos e conservação de espécies nativas do bioma Cerrado. Desde 2012 trabalha com recursos genéticos e melhoramento vegetal. Universidade de Brasília (UNB) (jamile.oliveira54 @gmail.com).

Fábio Gelape Faleiro Eng. Agr. (1995), Me. em Genética e Melhoramento (1997) e Dr. em Genética e Melhoramento (2000), pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Pós-Doc em Genética e Biotecnologia (2011) pela University of Florida. Trabalhou no Centro de Pesquisas do Cacau (2000-2002). É pesquisador da Embrapa Cerrados e atua como Prof. credenciado no curso de pós-graduação em agronomia da UNB e colaborador na Universidade Católica de Brasília (UCB), Universidade Federal do Norte Fluminense, Universidade Federal de Lavras e Universidade Federal de Goiás. Atua em genética e melhoramento, genética molecular e quantitativa.

Nilton Tadeu Vilela Junqueira Eng. Agr., Me. e Dr. em Fitopatologia pela Universidade Federal de Viçosa (1979), (1981) e (1984). Especialização em Bioquímica da resistência de plantas à doenças pela Technischen Universitaet Braunschweig, Botaniches Institut, Alemanha (1987), Taxonomia e Utilização de Fungos Entomopatogênicos pelo Forestry And Forest Products Research Institut, Tsukuba Japão (1992) e em Manejo Ecológico de Doenças de Frutíferas pela Japan Fruit Tree Research Station, Tsukuba (1992). É pesquisador da Embrapa Cerrados, e é Prof. colaborador no Programa de Pós-Graduação de Agronomia da UNB.

Renato Sales dos Santos Graduado em Sistemas de Informação, Faculdade Alvorada, Brasília - DF (2003). Atua no Departamento de Pesquisas de Difusão Tecnológica da Embrapa – Brasília – DF.

Gilberto de Oliveira Hiragi Graduado em Processamento de Dados pela UCB (1995), graduação em Ciências da Computação pela UNB (1997), graduação em Graduação de Professores pela UCB(1999), mestrado em Ciências da Informação pela UNB(2006) e mestrado em Ciência da Computação pela UNB (2007). É analista de sistemas da Embrapa. Tem experiência na área de Ciência da Computação, com ênfase em Banco de Dados.

Ivo Roberto Sias Costa Possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal de Pelotas (1973) e mestrado em Fitotecnia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1986). Atualmente é pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Recursos Genéticos Vegetais, atuando principalmente nos seguintes temas: curadoria de germoplasma de raízes e tubérculos, conservação ex situ, on farm, segurança alimentar no povo indígena craô, documentação e informatização de recursos genéticos.

92


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Introdução O Banco Ativo de Germoplasma (BAG) de Passiflora spp. “Flor da Paixão”1 (Passifloraceae) foi criado devido à grande preocupação dos pesquisadores e melhoristas com o avanço das fronteiras agrícolas no Centro-Norte do Brasil (principal centro de distribuição geográfica do maracujá). Este banco subsidia importantes trabalhos de caracterização de acessos silvestres para valoração do germoplasma e o maior conhecimento da rica biodiversidade brasileira. Estes trabalhos de caracterização subsidiaram a incorporação de muitos acessos em programas de melhoramento do maracujazeiro azedo ou doce visando à ampliação da base genética e também à diversificação de sistemas de produção envolvendo passifloras ornamentais, funcionais e medicinais. O “Portal Alelo Recursos Genéticos”, um programa criado pela Embrapa, e seu conjunto de sistemas, ferramentas e recursos voltados à gestão de dados e informações de recursos genéticos, é fruto do encontro e do empenho de pesquisadores e profissionais da tecnologia da informação, e conta com o apoio de parceiros internos e externos, que desde 2010 tem dedicado grande esforço ao seu desenvolvimento. A equipe de pesquisadores da Embrapa Cerrados e seus parceiros que trabalham diretamente com o programa de caracterização e uso de germoplasma e melhoramento genético de Passiflora spp. tem trabalhado há mais de 20 anos em atividades que integram recursos genéticos e melhoramento genético vegetal. Uma dessas atividades envolveu o trabalho de caracterização e integração do BAG “Flor da Paixão” ao Portal Alelo RG, visando a um melhor gerenciamento das informações do banco, assim como, disponibilizar tais informações ao público em geral. Neste artigo, objetivou-se relatar o processo de caracterização e integração do BAG “Flor da Paixão” no Portal Alelo RG. Informações gerais sobre o BAG-Passifloras, no Sistema Alelo e a importância da conservação e caracterização dos recursos genéticos são apresentadas. No processo de caracterização e integração do BAG no Portal Alelo RG, são mostradas as diferentes funcionalidades do Portal Alelo RG para consultas do público externo e sua utilidade como uma ferramenta para o gerenciamento de bancos de germoplasma. O Banco Ativo de Germoplasma de Passiflora spp. “Flor da Paixão” Na década de 1990, a Embrapa Cerrados e parceiros iniciaram um programa de pesquisas com espécies silvestres e comerciais de maracujazeiro (Passiflora spp.). O bioma Cerrado é um dos principais centros de diversidade do gênero Passiflora L. e acessos de grande importância têm sido obtidos, caracterizados e utilizados de forma prática no programa de melhoramento genético do maracujazeiro azedo e maracujazeiro doce, como porta-enxertos e também como plantas ornamentais, funcionais e medicinais. Diante do grande potencial dos maracujás e dos desafios da pesquisa relacionados ao germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro foi iniciado, em 2005, a primeira fase

Flor da Paixão – que é o mesmo significado de “Passiflora”, em referência à crença na antiguidade de que a flor do maracujá se tratava da natureza imitando os principais instrumentos da Paixão de Cristo: coroa, açoites, cravos, chagas, etc. 1

93


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

do projeto “Caracterização de germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro assistidos por marcadores moleculares”. A conservação de plantas vivas de diferentes acessos e espécies de plantas semiperenes é muito desafiadora, com eventuais perdas de acessos por diferentes causas (FALEIRO & JUNQUEIRA, 2011). Por esse motivo, este BAG tem uma natureza dinâmica quanto ao número de acessos das espécies conservadas. Estima-se que já passaram por processos de caracterização no BAG “Flor da Paixão” mais de 400 acessos de mais de 100 espécies distintas do gênero Passiflora. Assim, considerando-se as perdas, atualmente este banco ativo de germoplasma abriga aproximadamente 200 acessos de 80 espécies e ainda assim é uma das maiores coleções de maracujás do mundo (Figura 1).

Figura 1. Imagens do Banco Ativo de Germoplasma de Passiflora spp. “Flor da Paixão”, Brasília – DF., Embrapa Cerrados, 2017.

Os acessos e espécies conservados no BAG “Flor da Paixão” são as fontes de variabilidade genética do programa de melhoramento genético de diferentes espécies do gênero Passiflora coordenado pela Embrapa Cerrados. A partir desta variabilidade genética, importantes produtos tecnológicos foram desenvolvidos ou estão em vias de desenvolvimento (FALEIRO et al., 2012; FALEIRO et al., 2014; FALEIRO et al., 2017). A utilização de acessos de espécies silvestres de maracujá de forma prática no melhoramento genético do maracujazeiro azedo e também no desenvolvimento de cultivares de maracujazeiro doce, silvestre e ornamental, respectivamente, têm sido fruto das pesquisas realizadas na Embrapa Cerrados e seus parceiros (FALEIRO et al., 2015). Tais pesquisas ganharam destaque no relatório mundial da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura Mundial sobre Recursos Genéticos (FAO, 2010), onde as ações de pesquisa e desenvolvimento realizadas no BAG “Flor da Paixão” foram relatadas de forma especial. Este BAG têm sido de grande importância para a conservação do germoplasma de Passifloras, contribuindo para a redução da erosão genética, principalmente a causada pelo avanço das fronteiras agrícolas do Centro-Norte do Brasil que é o local de maior diversidade genética do gênero Passiflora no Brasil. Em 2011 foi credenciado como “Fiel Depositário” de amostra de componente do patrimônio genético por meio da deliberação do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético 041/2011/SECEX/CGEN publicado no D.O.U. nº 29, de 10.02.2011, Seção 3, página 112, Processo N° 02000.001723/2010-31. 94


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Tal banco é a base para importantes trabalhos de caracterização de acessos silvestres, para valoração e o maior conhecimento desta rica biodiversidade brasileira. Estes trabalhos de caracterização subsidiaram a incorporação de muitos acessos em programas de melhoramento do maracujazeiro azedo ou doce visando à ampliação da base genética e também na diversificação de sistemas de produção envolvendo Passifloras ornamentais, funcionais e medicinais. Esta utilização prática dos recursos genéticos conservados em bancos de germoplasma é um dos principais desafios e demandas para as ações de pesquisa e desenvolvimento. Portal Alelo Recursos Genéticos A partir de 2010, com a reformulação da Plataforma Nacional de Recursos Genéticos, cujas ações estratégicas foram voltadas à conservação e gestão de recursos genéticos, foi aprovado o projeto intitulado “Documentação e Informatização de Recursos Genéticos, no âmbito do Macro programa 1 (Sistema Embrapa de Gestão)”, permitindo o desenvolvimento do Portal Alelo RG, com tecnologia para Web, de código aberto (open source). O sistema possui recursos de segurança e funcionalidade desde o manejo das informações até a sua disponibilização para a sociedade, favorecendo o intercâmbio de germoplasma de animais, micro-organismos e plantas (Figura 2) (EMBRAPA, 2017).

Figura 2. Página inicial do Portal Alelo Recursos Genéticos.

O portal Alelo RG e seu conjunto de sistemas, ferramentas e recursos voltados à gestão de dados e informações de Recursos Genéticos, é fruto do encontro e do empenho de pesquisadores e profissionais da tecnologia da informação, e conta com o apoio de parceiros internos e externos, desde 2010. O objetivo geral deste portal é disponibilizar dados e informações sobre as atividades de pesquisa desenvolvidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária 95


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

(Embrapa), e seus parceiros, relacionadas a Recursos Genéticos animais, microbianos e vegetais, promovendo o intercâmbio e uso de germoplasma. Na página inicial do Portal Alelo RG, o usuário tem a possibilidade de acessar diferentes informações sobre recursos genéticos conservados e caracterizados na Embrapa. Para acessar o sistema e incorporar informações, pesquisadores e curadores de bancos de germoplasma, tornase necessário efetivar um cadastro prévio, que é referendado pelos gerenciadores do portal. Entretanto, usuários externos também podem acessar várias informações de forma livre, ou seja, sem a necessidade de cadastro prévio. Este acesso é feito na mesma página inicial, na opção Consultas (animal, microrganismo e vegetal). Curadores das coleções cadastradas e inseridas no Portal Alelo RG podem inserir informações sobre os acessos conservados para visualização livre do público, como é o caso das informações do Banco Ativo de Germoplasma de Passiflora spp. “Flor da Paixão”. Dessa forma, qualquer usuário externo poderá visualizar tais informações, que são úteis especialmente, no caso de pesquisadores e estudantes que necessitam consultar informações a respeito de recursos genéticos conservados nos bancos de germoplasma, em geral. Além dos dados de passaporte, podem ser disponibilizadas no Portal Alelo RG, informações da caracterização dos acessos, foto documentação do material e outras informações. O portal Alelo RG apresenta uma opção para facilitar o intercâmbio de recursos genéticos, na qual o usuário externo poderá por meio das características disponíveis, dos acessos das coleções cadastradas, solicitar o acesso para o curador, fazendo o preenchimento do formulário de intercâmbio eletrônico. Na página inicial do Portal (https://www.embrapa.br/alelo), tem o link BAGs-Coleções, no qual o usuário é direcionado para a lista de Bancos Ativos de Germoplasma cadastrados no sistema. A partir dessa lista, é possível fazer uma busca de seu interesse, e assim ir afunilando a pesquisa até chegar no acesso que tem características de seu interesse. Inclusive, este acesso, caso tenha germoplasma disponível, pode ser solicitado ao curador para a realização de ações de pesquisa. As informações de caracterização dos acessos disponíveis também podem ser utilizadas para fins de comparação. O portal Alelo RG tem como público principal, curadores de bancos ativos de germoplasma, melhoristas genéticos, fitotecnistas, indigenistas, pesquisadores e estudantes, especialmente os que atuam com atividades ligadas aos recursos genéticos (coleta, introdução, exportação, quarentena, caracterização, conservação, educação, informatização, documentação e uso) em especial o pré-melhoramento, melhoramento e pós-melhoramento genético. Porém, é objetivo dos gerenciadores do sistema a utilização do portal pela sociedade de forma geral, o mais rápido possível. Tendo em vista as funcionalidades do Portal Alelo RG e a natureza institucional e corporativa do sistema, a equipe de pesquisadores da Embrapa Cerrados e parceiros, que pesquisam diretamente com o programa de melhoramento genético de Passiflora spp., trabalharam nos últimos anos para integrar o Banco Ativo de Germoplasma de Passiflora spp. ‘Flor da Paixão’ ao Portal Alelo RG, visando o adequado gerenciamento das informações do banco, assim como, disponibilizar as informações obtidas pelo programa de conservação e caracterização de germoplasma ao público em geral. 96


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Caracterização de acessos de Passiflora spp. do Banco Ativo de Germoplasma “Flor da Paixão” e inserção no Portal Alelo RG As atividades de conservação e caracterização de recursos genéticos de maracujazeiro são fundamentais para subsidiar o uso de novos acessos em programas de melhoramento genético, como porta-enxertos em sistemas de produção de mudas, bem como para diversificar os sistemas produtivos com novos alimentos funcionais para consumo in natura (maracujá-doce) e para uso como plantas ornamentais e medicinais (FALEIRO & JUNQUEIRA, 2011). Tais atividades devem ser consideradas prioritárias para que os recursos genéticos possam ser efetivamente utilizados. Com relação ao melhoramento genético, o uso de espécies silvestres têm mostrado grande potencial, principalmente como fontes de genes de resistência a doenças (FALEIRO & JUNQUEIRA, 2009; FALEIRO et al., 2015). O uso de espécies silvestres de maracujá para o consumo in natura e como plantas ornamentais e medicinais tem um grande potencial, entretanto para explorar tamanho potencial, os trabalhos de prospecção, coleta, conservação e caracterização são estratégicos e fundamentais (FALEIRO et al., 2015). Em vista do exposto acima, foram caracterizados 170 acessos de Passiflora spp., os quais estão conservados no BAG “Flor da Paixão”. Os acessos foram caracterizados utilizando 56 dos 81 descritores ilustrados para Passiflora spp. Ainda não foram aplicados os 16 descritores de fruto e os nove descritores de resistência a doenças. Para aplicação dos descritores de frutos serão necessários experimentos fora do ambiente protegido com diferentes acessos para realização da polinização cruzada necessária para a frutificação das espécies auto incompatíveis. Para a avaliação da resistência a doenças, bioensaios de inoculação artificial serão necessários. Após o trabalho de caracterização morfoagronômica dos acessos conservados, os dados de caracterização foram documentados no Portal Alelo RG. Primeiramente foi feito o cadastro dos 170 acessos de Passiflora spp., e para cada um desses acessos, foram inseridos os 56 descritores morfoagronômicos obtidos. Enfatizamos novamente que o usuário externo pode ter acesso a todas as informações acessando o link 'Consultas - Vegetal' para abrir a página de buscas. Nesta página, o usuário pode digitar o que quer consultar, por exemplo, 'passiflora' (Figura 3).

Figura 3. Página inicial do Portal Alelo RG, da Embrapa, e Página das consultas. Resultado da pesquisa com a palavra-chave 'passiflora', com as espécies do gênero Passiflora e respectivo número de acessos cadastrados.

97


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Ao fazer a busca com a palavra-chave 'passiflora', vão aparecer todos os acessos do gênero cadastrados no Portal Alelo RG (Figura 4). O usuário pode clicar no nome da espécie que apresente interesse, como por exemplo, Passiflora alata Curtis, para ter acesso ao número de acessos cadastrados (Figura 4).

Figura 4. Interface gerada ao clicar no nome da espécie Passiflora alata Curtis. Acessos de Passiflora alata Curtis do BAG ‘Flor da Paixão’ cadastrados na plataforma Alelo e disponíveis para pesquisa pública.

Ao clicar no número da coluna 'quantidade de acessos', aparecerão os 12 acessos existentes de P. alata cadastrados no Portal Alelo RG. Nesta consulta, vão aparecer algumas informações únicas de cada acesso, como o número BRA (número universal daquele acesso), o código local (vem sempre precedido da sigla CPAC), que indica que os acessos têm procedência da Embrapa Cerrados. O usuário pode clicar no link detalhes, especificamente na lupa, à direita de cada acesso. Dessa forma, o usuário pode verificar detalhes de cada acesso contido no BAG ‘Flor da Paixão’(Figura 5). Estes detalhes incluem a foto documentação e todos os dados de caracterização, caso tenham sido cadastrados e disponibilizados para o usuário externo.

Figura 5. Detalhamento do acesso de Passiflora alata Curtis (CPAC MJ-02-16), cadastrado no Portal Alelo RG. CPAC MJ-0203 Passiflora alata Curtis, 1788.

Foto documentação dos acessos de Passiflora spp. no Portal Alelo RG A princípio, a foto documentação foi realizada com intuito de manter um arquivo fotográfico digital dos acessos, para utilização em caso de dúvidas sobre a morfologia, coloração e formato das flores e folhas, entre outras características das espécies conservadas. No Portal Alelo RG, no BAG “Flor da Paixão” estão disponíveis fotos de todos os acessos conservados. 98


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Na Figura 5, está um exemplo da foto documentação do acesso CPAC MJ-02-16 da espécie P. alata. A inclusão das fotos dos acessos possibilita que usuários com os mais diversos interesses, possam comparar acessos da mesma espécie ou espécies distintas, ou simplesmente, tirarem outras dúvidas sobre a morfologia das estruturas. Este trabalho de foto documentação e sua disponibilização no portal está sendo realizado continuamente, com a inserção de imagens dos acessos contendo ramos, folhas, flores e frutos. Na Plataforma Alelo todos os 170 acessos de Passiflora spp. caracterizados até o momento possuem imagens disponíveis, para que os usuários possam utilizar. O Portal Alelo RG como uma ferramenta para o gerenciamento do Banco Ativo de Germoplasma de Passiflora spp. ‘Flor da Paixão’ A manutenção e o gerenciamento de Bancos Ativos de Germoplasma não são consideradas tarefas fáceis, especialmente, de espécies com sementes recalcitrantes, alógamas, semiperenes e com hábitos de crescimento indeterminado, como é o caso de muitas espécies do gênero em questão. Nestes casos, a manutenção deve ser feita por meio de plantas vivas que requerem podas frequentes, o que aumenta o custo da manutenção e a vulnerabilidade a doenças. Algumas espécies apresentam um crescimento rápido, porém, as podas podem interferir nos processos de florescimento e frutificação, o que dificulta ou inviabiliza o processo de caracterização. A grande variabilidade genética das espécies do gênero Passiflora também dificulta o processo de manutenção dos BAGs, pois, existem diferenças quanto à velocidade de crescimento, vigor, além de exigências diferenciadas de nutrição e disponibilidade hídrica. As atividades relacionadas à caracterização dos acessos mantidos nos BAG devem ser consideradas prioritárias para que os recursos genéticos possam ser efetivamente utilizados (FALEIRO & JUNQUEIRA, 2011). As informações obtidas nos processos de caracterização dos BAG, na maioria das vezes, estão armazenadas em planilhas de computadores particulares ou das instituições, ou ainda em planilhas impressas, o que de certa forma, torna a informação indisponível e/ou mais vulnerável. Era o que acontecia com o BAG “Flor da Paixão”, onde os acessos foram caracterizados, porém, as informações eram armazenadas nos computadores da Embrapa Cerrados e em planilhas impressas. Tendo em vista a necessidade de sistematizar e tornar pública essas informações, os dados de caracterização e demais informações do BAG 'Flor da Paixão' foram incluídas no Portal Alelo RG, tornando mais fácil o gerenciamento do banco. No portal podem ser inseridas as informações da origem e data de coleta e/ou da inserção no BAG de cada acesso, local exato onde o acesso se encontra conservado dentro da coleção, número de registro local (código local), caracterização completa do acesso, podendo-se incluir os dados de caracterização molecular e foto documentação. Com a possibilidade de sistematização e disponibilização da informação, essas podem ser utilizadas mais facilmente e de forma mais efetiva. Dessa forma, facilita o trabalho de gerenciamento das coleções por parte do curador, o qual pode compartilhar as informações com diferentes níveis de segurança e para diferentes clientes. 99


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Para disponibilizar as informações é necessário que as mesmas estejam sistematizadas, para possibilitar um maior entendimento por parte de quem irá utilizar a informação. Com a disponibilização das informações publicamente, aumenta-se as chances de pesquisadores das mais diversas áreas terem o acesso às informações e utilizarem os acessos em programas de melhoramento genético visando ao desenvolvimento de novas cultivares. Com a sistematização da informação, pode haver uma melhoria no fluxo de informação entre os bancos de germoplasma mantidos por diferentes instituições. Acesso aos descritores utilizados na caracterização de passifloras No Portal Alelo RG, existe uma funcionalidade, chamada observação (Figura 6). Dentro desta página, no link “Grupo de descritores” o usuário tem acesso aos descritores utilizados para caracterização de diferentes espécies de plantas, incluindo os descritores para espécies do gênero Passiflora (JESUS et al., 2016), descritores para processos de proteção de Passiflora edulis Sims (JESUS et al., 2015a) e descritores para processos de proteção de Passiflora spp. (incluem todas as espécies e híbridos interespecíficos do gênero Passiflora, com exceção da espécie P. edulis que possui descritores específicos) (JESUS et al., 2015b). Ao clicar em cada grupo de descritores, o usuário é direcionado para a lista de descritores de cada grupo (Figura 7).

Figura 6. Funcionalidade 'Observação' do Portal Alelo RG. Disponível em http://alelobag.cenargen.embrapa.br /AleloConsultas/Observacao/index.do. Página para seleção do grupo de descritores de Passiflora cadastrados no Portal Alelo RG: 1. Descritores para espécies do gênero Passiflora; 2. Descritores para processos de proteção de Passiflora edulis Sims; 3. Descritores para processos de proteção de Passiflora spp.

Figura 7. Página contendo a lista dos descritores de maracujás inseridos na Plataforma Alelo. Informações gerais sobre o descritor selecionado, no exemplo, o descritor CRA (Coloração do Ramo).

100


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Ao clicar no link “Detalhes” de cada descritor, o usuário vai ter acesso a várias informações sobre esse descritor: 1. Informações gerais sobre o descritor: grupo, divisão, categoria, número de observações ou acessos caracterizados e as classes fenotípicas (codificações) do descritor (Figura 7); 2. Ilustrações de cada classe fenotípica (codificações) do descritor (Figura 8); 3. Estatística descritiva do número de observações do descritor quanto à distribuição de frequência dos acessos caracterizados em cada uma das classes fenotípicas do descritor (Figura 8); 4. Caracterização de cada acesso, quanto à classe fenotípica do descritor (Figura 9).

Figura 8. Imagem ilustrando as quatro categorias do descritor CRA (Coloração do Ramo) para Passiflora spp.. Estatística descritiva do número de observações do descritor CRA (Coloração do Ramo), quanto à distribuição de frequência dos acessos caracterizados em cada uma das classes fenotípicas do descritor. Neste caso, são 170 acessos caracterizados, mantidos no BAG ‘Flor da Paixão’ e cadastrados no Portal Alelo RG.

A análise da estatística descritiva do número de observação do descritor CRA (Coloração do Ramo) (Figura 8), permite observar que 43,2% dos 170 acessos de Passiflora spp. mantidos no BAG ‘Flor da Paixão’ e cadastrados na Plataforma Alelo que foram caracterizados usando os descritores ilustrados para Passiflora spp., apresentam coloração de ramo (CRA) verdearroxeada, 40,6% verde-clara, 9,7% roxo-avermelhada e 6,5% verde-escura.

Figura 9. Classe fenotípica do descritor CRA (Coloração do Ramo) de cada acesso caracterizado e cadastrado no Portal Alelo RG. Acesso selecionado pelo BRA 00060430-6, detalhamento do acesso.

101


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Obtenção das informações de caracterização de cada acesso dentro do Portal Alelo RG. A caracterização de cada acesso também é fornecida dentro do Portal Alelo RG (Figura 9). Por exemplo, para maiores informações de cada acesso que foi caracterizado utilizando o descritor CRA, o usuário deve selecionar o acesso, clicando sobre o código BRA, sendo então direcionado para a página do acesso selecionado (Figura 9). Nesta página, o usuário terá todas as informações como: 1. Nome científico, forma de obtenção, local de coleta, código local, entrada no banco de germoplasma e procedência (Figura 9); 2. Foto documentação do acesso (Figura 10); 3. Classe fenotípica de cada descritor utilizado na caracterização do acesso (Figura 10).

Figura 10. Imagem do acesso BRA 00060430-6. Caracterização do acesso BRA 00060430-6, utilizando 56 descritores ilustrados para Passiflora spp.

Geração do QR code para cada acesso do Banco Ativo de Germoplasma O QR code é um código de barras bidimensional feito a partir de uma forma de pixels pretos e brancos, que permite a codificação de várias centenas de caracteres. O conteúdo armazenado no código pode então ser descodificado e exibido utilizando um Smartphone ou Tablet. “QR” significa Quick Response (Resposta rápida) e refere-se à digitalização excepcionalmente rápida. Devido à enorme popularidade dos Smartphones, os códigos QR são agora utilizados principalmente para fins de Marketing móvel. Os meios de comunicação impressos, como folhetos, cartazes, catálogos ou cartões de visita podem ser adicionados ao conteúdo digital, como páginas web, vídeos, PDFs, galerias de imagens ou dados de contato. A variabilidade de diferentes aplicações é praticamente ilimitada. A partir da inserção das informações de todos os descritores e foto documentação dos acessos na Plataforma Alelo, a mesma possibilita a geração do QR code para cada acesso. A impressão do QR code de cada acesso é feita a partir do Portal Alelo RG. A Figura 11, mostra um exemplo de resposta rápida gerada para o acesso CPAC MJ-M-07. A impressão pode ser feita em papel especial resistente à água e sol, de modo que estes códigos podem ser fixados no local onde cada acesso está conservado no BAG. 102


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Figura 11. QR code gerado para o acesso CPAC MJ-M-07.

Na impressão do QR code aparece o número BRA de cada acesso e o código local, que também identifica o acesso. A leitura deste gera mais informações sobre aquele acesso como o nome científico, além de um link onde o usuário poderá acessar imagens do acesso, sua caracterização morfoagronômica completa e todas as publicações que se encontram disponíveis no Portal Alelo RG. A leitura do QR code pode ser feita por meio de aplicativos utilizando qualquer aparelho móvel. A abertura do link com toda caracterização do acesso pode também ser feita pelo mesmo aparelho, se o mesmo estiver conectado à internet. Considerações Finais A etapa de caracterização dos acessos conservados em BAG pode ser uma etapa muito trabalhosa, mas de fundamental importância para subsidiar o uso prático dos acessos. Por meio desta caracterização, pode-se inserir efetivamente esses acessos nos programas de melhoramento genético visando ao desenvolvimento de novas cultivares. Nesse sentido, nos últimos anos efetivaram-se esforços para caracterizar os acessos do BAG “Flor da Paixão” e inserir as informações obtidas no Portal Alelo RG. Este portal é uma ferramenta moderna e muito útil no gerenciamento e sistematização das informações obtidas nos processos de manejo e pesquisa dos acessos, apresentando diferentes funcionalidades para consultas de diferentes usuários na internet.

Referências EMBRAPA. Embrapa Cerrados. Memória da inauguração do banco de germoplasma "Flor da Paixão". Planaltina, DF. Disponível em: http://www.cpac.embrapa.br/inauguracaobag/. Acesso em 04 de julho de 2017. EMBRAPA. Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia. <http://alelo.cenargen.embrapa.br/>. Acesso em 04 de julho de 2017.

Alelo.

Disponível

em:

FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V. Recursos genéticos: conservação, caracterização e uso. In: FALEIRO, F.G.; ANDRADE, S.R.M.; REIS JÚNIOR, F.B. Biotecnologia: estado da arte e aplicações na agropecuária. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2011. p. 513-551. FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; BRAGA, M.F.; COSTA, A.M. Conservação e caracterização de espécies silvestres de maracujazeiro (Passiflora spp.) e utilização potencial no melhoramento genético, como portaenxertos, alimentos funcionais, plantas ornamentais e medicinais - resultados de pesquisa. Planaltina: Embrapa Cerrados, 2012. (Documentos, No 312). 34p. FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; COSTA, A.M. Ações de pesquisa e desenvolvimento para o uso diversificado de espécies comerciais e silvestres de maracujá (Passiflora spp.). Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2015. (Documentos, No 329). 26p. FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; JESUS, O.N.; MACHADO, C.F.; FERREIRA, M.E.; JUNQUEIRA, K.P.; SCARANARI, C.; WRUCK, D.S.M.; HADDAD, F.; GUIMARÃES, T.G.; BRAGA, M.F.

103


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Caracterização de germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro assistidos por marcadores moleculares – fase III: resultados de pesquisa 2012-2016. (Documentos, No XXX). 2017. XXXp. (no prelo). FALEIRO, F.G.; JUNQUEIRA, N.T.V.; OLIVEIRA, E.J.; MACHADO, C.F.; PEIXOTO, J.R.; COSTA, A.M.; GUIMARÃES, T.G.; JUNQUEIRA, K.P. Caracterização de germoplasma e melhoramento genético do maracujazeiro assistidos por marcadores moleculares - fase II: resultados de pesquisa 2008-2012. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2014. (Documentos, No 324). 102p. FAO 2010. The second report on the state of the world’s plant genetic resources for food and agriculture. Rome. Disponível em: http://www.fao.org/docrep/013/i1500e/i1500e.pdf. Acessado em 04 de julho de 2017. JESUS, O.N.; OLIVEIRA, E.J.; FALEIRO, F.G.; SOARES, T.L.; GIRARDI, E.A. (Eds.) Descritores morfoagronômicos ilustrados para Passiflora spp. Brasília, DF: Embrapa. 2016. 122p. JESUS, O.N.; OLIVEIRA, E.J.; SOARES, T.L.; FALEIRO, F.G. (Eds.) Aplicação de descritores morfoagronômicos utilizados em ensaios de DHE de cultivares de maracujazeiro-azedo (Passiflora edulis Sims): Manual Prático. Brasília, DF: Embrapa. 2015a. 33p. JESUS, O.N.; OLIVEIRA, E.J.; SOARES, T.L.; FALEIRO, F.G. (Eds.) Aplicação de descritores morfoagronômicos utilizados em ensaios de DHE de cultivares de maracujazeiro-doce, ornamental, medicinal, incluindo espécies silvestres e híbridos interespecíficos (Passiflora spp.): Manual Prático. Brasília, DF: Embrapa. 2015b. 45p.

104


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

13. Conservação de espécies ameaçadas da flora brasileira no Jardim Botânico Plantarum José André Verneck Monteiro Pedagogo pela Fundação Universidade do Tocantins (2011), Me. em desenvolvimento sustentável pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ (2015). Atualmente trabalha no Horto Escola Jardim Vital. E-mail: jardimvital@hotmail.com

André Felippe Nunes-Freitas Biólogo formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ (1997), com Me. na Universidade Federal do Rio de Janeiro (2000), e Dr. em Ciências Biológicas pela UERJ (2004) em Ecologia. Atualmente é Professor na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Florestas. Áreas de atuação: Ecologia do epifitismo, Ecologia de Bromeliaceae, Dinâmica de comunidades vegetais, Biologia reprodutiva de espécies vegetais. E-mail:afnfreitas@gmail.com

Resumo Jardins Botânicos são instituições que desenvolvem pesquisa, conservação e educação. Há mais de setecentos jardins botânicos (JB), localizados em 118 países (dos quais 36 no Brasil). Este artigo aborda a conservação de plantas brasileiras ameaçadas de extinção em um jardim botânico não governamental, localizado em Nova Odessa (SP), o Jardim Botânico Plantarum (JBP). A pesquisa traz uma análise comparativa da lista de espécies de plantas nativas do Brasil conservadas na instituição (2.653 spp.) com as 2.113 espécies da “Lista oficial nacional de espécies ameaçadas da flora”, (2014). No JBP são preservados 156 espécimes ameaçados (5,6 % do acervo de espécies nativas), totalizando 30 famílias botânicas. O bioma predominante de espécies ameaçadas é a Mata Atlântica (120 ocorrências). As cinco famílias botânicas sob ameaça, melhor representadas no acervo de espécies nativas do JBP são: Cactaceae (20spp.), Gesneraiceae (20spp.), Amaryllidaceae (19spp.), Arecaceae (18spp.) e Begoniaceae (14spp.). Introdução O Brasil possui mais de 46 mil espécies de plantas nativas, sendo o país com maior diversidade vegetal em todo o mundo (FAPESP, 2016). Destas, mais de 2.100 espécies elencam a Lista Oficial Nacional de Espécies Ameaçadas de Flora (BRASIL, 2014). As principais ameaças à flora brasileira são decorrentes de atividades humanas (MONTEIRO, 2015).

Figura 1. Entrada do Jardim Botânico Plantarum, em Nova Odessa.

Jardins Botânicos são instituições que possuem coleções documentadas de plantas vivas para fins de pesquisa científica, conservação, exibição e educação. Existem mais de 700 JB, em 118 países, dos quais mais de 500 localizam-se na Europa Ocidental, outros 350 na 105


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

América do Norte e aproximadamente 200 no leste e sudeste da Ásia, a maioria na China (BGCI, 2017).

Figura 2. Vista parcial interna do JB Plantarum.

No Brasil há 36 Jardins Botânicos, listados por Costa (2014), e dentre estes está o Jardim Botânico Plantarum (JBP) que é uma associação sem fins lucrativos, fundada em 2007, dedicada à educação, pesquisa e conservação da flora brasileira, com sede de 10 hectares implantada no perímetro urbano do município de Nova Odessa, Região Metropolitana de Campinas/SP (JBP, 2014), Figuras 1 e 2.

O JBP é muito ativo, e somente no triênio 20112014, mais de 23 mil pessoas foram atendidas no seu Programa de Educação Ambiental (MONTEIRO, 2015). A meta 14 da “Estratégia nacional para conservação ex situ de espécies ameaçadas da flora brasileira”, segundo Costa & Bajgielman (2016), orienta que os JB e outras instituições de conservação que priorizem dentre seu acervo vivo às espécies ameaçadas, enquanto a meta nove propõe que as coleções de espécies ameaçadas subsidiem a pesquisa, divulgação e a educação ambiental. Material e Métodos Em junho/2017 o acervo do JBP continha exemplares de 4000 espécies vegetais. Para o presente trabalho foi realizada uma análise comparativa da lista de espécies de plantas nativas do Brasil conservadas no JBP (2.653 spp.) com as 2113 espécies da Lista Oficial Nacional de Espécies Ameaçadas da Flora (BRASIL, 2014). Resultados e Discussão No acervo do JBP são conservados exemplares de 156 espécies nativas do Brasil classificadas como ameaçadas (BRASIL, 2014), nas categorias CR, EN e VU. O maior número de espécies se enquadra na categoria EN (N=90) (Gráfico 1).

NÚMERO DE ESPÉCIES (N)

100

90

80 60

48

40 20

18

0

EN VU CR CATEGORIA DE AMEAÇA

Gráfico 1. Número de espécies nativas do acervo do Jardim Botânico Plantarum por categoria de ameaça, segundo Brasil (2014). EN = Em perigo; VU = Vulnerável; CR = Criticamente em perigo.

106


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Em termos percentuais a categoria melhor representada é VU (8,6%), conforme demonstrado na Tabela 1. Tabela 1. Número de espécies conservadas no Jardim Botânico Plantarum em comparação com as espécies classificadas como ameaçadas (BRASIL, 2014).

Categorias de ameaça CR EN VU

Espécies conservadas no JBP

Espécies classificadas pela Portaria 443

% de espécies conservadas no JBP

18

468

3,8

90

1146

7,8

48

499

8,6

FAMÍLIAS BOTÂNICAS

As 156 espécies nativas do Brasil classificadas como ameaçadas (BRASIL, 2014), conservadas no JBP, pertencem a 30 famílias botânicas. Dentre estas, as cinco famílias botânicas melhor representadas no acervo de espécies nativas ameaçadas do JBP são Cactaceae (N= 20 spp.), Gesneriaceae (N= 20 spp.), Amaryllidaceae (N= 19 spp.), Arecaceae (N= 18 spp) e Begoniaceae (N= 14 spp.). (Gráfico 2).

GESNERIACEAE

20

CACTACEAE

20

AMARYLLIDACEAE

19

ARECACEAE

18

BEGONIACEAE

14 0

5 10 15 20 25 NÚMERO DE ESPÉCIES (N)

Gráfico 2. Número de espécies nativas sob ameaça, conservadas no Jardim Botânico Plantarum, agrupadas por família botânica.

Em termos percentuais a família botânica melhor representada é Arecaceae (100%), conforme monstrado na Tabela 2. Tabela 2. Porcentual do número de espécies ameaçadas por família botânica em comparação com o número de espécies ameaçadas (BRASIL, 2014).

Famílias botânicas CACTACEAE GESNERIACEAE AMARYLLIDACEAE ARECACEAE BEGONIACEAE

Espécies conservadas no JBP 20 20 19 18 14

Espécies sob ameaça 76 29 29 18 36

% de espécies conservadas no JBP 26,3 68,9 65,5 100 38,8

107


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

O bioma predominante de espécies ameaçadas conservadas no JBP é a Mata Atlântica (120) ocorrências. Contudo, há espécies que ocorrem simultaneamente em mais de um Bioma (Gráfico 3).

NÚMERO DE ESPÉCIES (N)

140 120

120

100 80 60 36

40

18

20

10

6

0 Mata Atlântica

Cerrado

Caatinga

Amazônia

Pampa

1 Pantanal

BIOMAS Gráfico 3. Número de espécies de cada bioma brasileiro dentre as espécies ameaçadas conservadas no acervo do Jardim Botânico Plantarum.

Considerações finais O Jardim Botânico Plantarum prioriza a gestão de seu acervo vivo com ênfase nas espécies da flora brasileira, as quais constituem o eixo estruturante do programa de educação ambiental da instituição. Busca evitar a extinção precoce de espécies vegetais que representa imensurável perda genética. As ações voltadas à educação ambiental na conservação de plantas ameaçadas de extinção realizadas pelos JB são de fundamental importância para o avanço do estado de conhecimento sobre os recursos genéticos vegetais. A avaliação periódica de eficácia dos programas voltados à conservação de espécies ameaçadas é um exercício rotineiro da instituição, incentivado desde 2012 pela Rede Brasileira de Jardins Botânicos. Os esforços empreendidos pelos JB brasileiros em sua autoavaliação e disponibilização dos dados em rede são imprescindíveis para se medir o alcance dos objetivos da “estratégia nacional para conservação ex situ de espécies ameaçadas da flora brasileira”. Referências

BGCI - Botanic Gardens Conservation International. 2017. Disponível em <https://www.bgci.org> Acesso em : 15 out 2017. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Portaria nº 443 de 17 dez 2014. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 dez. 2014. Seção 1, p. 110-121.

108


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

COSTA, M.L.M.N., BAJGIELMAN, T. (Orgs.), 2016. Estratégia Nacional para a conservação ex stu de espécies ameaçadas da flora brasileira. Centro Nacional de Conservação da Flora — CNCFlora : Jardim Botânico do Rio de Janeiro : Andrea Jakobsson, Rio de Janeiro. 24 p. Disponível em <http://bit.ly/2xNRpVT> . Acesso em : 18 out 2017. COSTA, M.L.M.N. Conservação de espécies ameaçadas de extinção nos jardins botânicos brasileiros. Tese de Doutorado. Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro / Escola Nacional de Botânica Tropical. Rio de Janeiro. 2014. Disponível em <http://bit.ly/1EQBmYc>. Acesso em : 15 abr 2015. FAPESP. Pesquisa. A maior diversidade de plantas do mundo. Edição 241. Março/2016. Disponível em <http://revistapesquisa.fapesp.br/2016/03/21/a-maior-diversidade-de-plantas-do-mundo/>. Acesso em : 17 out 2017. JBP. Jardim Botânico Plantarum. 2014. Apresentação geral. Disponível em <http://www.plantarum.org.br>. Acesso em : 07 jun 2014. MONTEIRO, José André Verneck. Conservação ex situ de espécies ameaçadas da flora brasileira: a contribuição do Jardim Botânico Plantarum. 2015. 162p. Dissertação (Mestrado em Práticas em Desenvolvimento Sustentável). Instituto de Florestas, Departamento de Ciências Ambientais, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, RJ, 2015. Disponível em <https://www.researchgate.net/publication/282571082_Conservacao_ex_situ_de_especies_ameacadas_da_flor a_brasileira_a_contribuicao_do_Jardim_Botanico_Plantarum>. Acesso em : 18 out 2017.

109


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

III - Expresse a sua opinião 1. O Mistério do Albinismo

Afonso Celso Candeira Valois Engenheiro Agrônomo, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Genética e Melhoramento de Plantas, Pesquisador Aposentado da Embrapa.

Introdução Considerando que esta revista trata de recursos genéticos em geral, achei relevante tocar neste assunto do albinismo em seres humanos. Tal foi motivado pela programação do “Domingo Show”, de 11/09/2016, da Rede Record de Televisão, onde foi mostrada uma excelente reportagem envolvendo um casal de negros, cuja história se passou na África do Sul e no Brasil. Desse matrimônio, primeiramente nasceu uma linda menina negra, atualmente com 13 anos e que sonha em ser modelo e, após dois anos, nasceram mais duas belas irmãs gêmeas, entretanto albinas. Diante desse fato inusitado, o marido achou surreal, por serem ambos negros, como poderiam ter duas filhas brancas, louras, de olhos verdes e pestanas claras? Essa desconfiança de adultério foi tão grande no seio da família que cerca de quatro anos após o nascimento das gêmeas, os dois resolveram se separar, ficando a mãe e suas três filhas totalmente desamparadas, o que deu margem à reportagem acima referida. As quatro mulheres foram muito bem recebidas no programa, com muitos presentes, visitaram lojas e pessoas de realce, bem como, tiveram uma visão estratégica e gestão operacional de melhoria substancial da qualidade de vida. Porém, no que se refere ao albinismo propriamente dito, o apresentador somente fez referências à falta de melanina na pele das meninas albinas e à lacuna de conhecimento do marido sobre o fenômeno que o levou à tamanha estupidez, mas deixou de fazer menção ao fundamento genético causador do aparecimento do albinismo! A reportagem da TV Record não informou se os pais das jovens eram parentes próximos, mas a julgar pelas condições em que os mesmos se relacionavam na África, namoro e subsequente casamento e vinda para o Brasil, avento a possibilidade de que sejam mesmo parentes. Em vista do exposto resolvi novamente escrever sobre este assunto tão relevante socialmente, que retrata a depressão endogâmica causada pela homozigose excessiva de genes recessivos que redunda em defeitos genéticos, que no caso do albinismo geralmente tem como causa o acasalamento entre parentes próximos, como primos. Como já havia publicado anteriormente sobre este tema, reavivo aqui a questão esse fenômeno do albinismo em humanos, sendo que retomo exemplos ocorridos no Estado do 110


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Amazonas e no Estado do Maranhão, já que no Punã existia a mesma desconfiança entre casais, o que pode ser desfeita após as minhas singelas explicações técnicas. Espero que os nobres leitores interessados entendam o desvendamento desse “mistério”, tendo uma boa leitura, e fico no aguardo de comentários! A Endogamia Depressiva Geralmente as pessoas à medida que vão ficando com “DNA” (Data Natalícia Avançada, desculpe-nos pelo gracejo), como eu, viram contadoras de histórias com o fito de transferir conhecimento e experiência (competência) aos devotados leitores interessados. Revejo aqui alguns textos meus anteriores com o objetivo principal de é apresentar exemplos pertinentes, envolvendo um bom acontecimento de caso envolvendo a religião, ocorrido na Amazônia, mas que pode ser extrapolado para outras regiões do país. Mas, antes de entrar no tema propriamente dito devo esclarecer sobre o motivo do uso do termo Endogamia Depressiva. Como todos sabem, a endogamia ou consanguinidade ocorre quando vários locos ao longo da maravilhosa fita do DNA (agora sim, Ácido Desoxirribonucleico) estão em homozigose, permitindo assim que, além dos genes dominantes, muitos outros genes sejam recessivos nessa condição homozigótica. Quando isso acontece, como exemplo, em plantas alógamas (de cruzamento), os genótipos oriundos de autofecundações gradativamente vão tendo divergências genéticas que são aproveitadas em programas de melhoramento genético até a um determinado número de autofecundações (por exemplo, até vinte), a partir do qual os genes vão ficando em excessiva homozigose, aparecendo aí os genes recessivos deletérios, promovendo a redução de vigor e alterações genéticas indesejáveis. Em plantas, a homozigose proveitosa vem sendo explorada na obtenção do vigor do híbrido, como os exemplos do primeiro milho híbrido no Brasil, de Carlos Arnaldo Krug (Instituto Agronômico de Campinas - SP, 1939 – Figura 1), trabalhando com milho, além de outros memoráveis resultados como os do saudoso Professor Dr. Ernesto Paterniani (Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, de Piracicaba - SP, falecido recentemente em 2009, e que aqui se faz Figura 1. Carlos Arnaldo Krug uma justa homenagem póstuma, Figura 2.) e de outros excelentes profissionais brasileiros, na criação do milho híbrido e de outras espécies, pelo uso de linhagens adequadas oriundas das autofecundações. Essa variabilidade genética também pode ser explorada em híbridos de cultivares em cruzamentos controlados ou permitindo a troca de genes ao acaso em metodologia de criação de compostos sintéticos. Nestes últimos, a referência vai para aquele que consegui em Manaus (AM), no tempo em que trabalhava no IPEAAOc, um dos 11 institutos do ExDNPEA que deu origem à Embrapa Amazônia Ocidental, quando Figura 2. Ernesto Paterniani usei seis cultivares de milho apropriadas e formei o Composto Manaus, 111


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

com excelentes características genotípicas e fenotípicas para a produção de grãos e tolerância ambiental. E para o caso onde há excesso de genes recessivos deletérios, quais são as consequências? Para o caso de plantas alógamas, isso acontece, no caso, quando há exagerado número de autofecundações, deixando os genótipos com pouco vigor, alterações genéticas indesejáveis na penetrância e expressividade de genes etc. Para efeito didático, chama-se endogamia para o caso de plantas e consanguinidade quando a referência for para animais racionais ou irracionais. No referente aos seres humanos, deixa-se de aprofundar nos exemplos por motivos ligados à bioética! Mas, onde se quer chegar, tendo a religião como principal ponto de referência? É o que se apresenta nas linhas subsequentes. Voltamos assim ao caso Punã (distrito do município de Uarini- Amazonas) para fazer justiça a um sucesso religioso. Quando professor na Universidade do Estado do Amazonas Centro de Estudos Superiores de Tefé (UEA/CEST), após a aposentadoria na Embrapa, fui àquele distrito em duas oportunidades para participar de oficinas técnicas e apresentar palestras naquele lindo rincão do Médio Solimões. Na primeira vez verifiquei um razoável número de pessoas com deficiência física, como aliás ocorre em comunidades encravadas no seio da imensa floresta amazônica. Essas deficiências são principalmente de origens genéticas, devido ao fenômeno da consanguinidade motivada pelo acasalamento entre parentes próximos, como primos. Na formação das comunidades geralmente vai um casal para um determinado local previamente escolhido, que depois convida irmãos e outros parentes próximos, e assim por diante, e com isso a comunidade vai sendo formada e aumentada, tendo como base a mesma base genética, ocorrendo assim o isolamento geográfico e mecanismo de isolamento reprodutivo pela manutenção do pequeno tamanho da população (efeito fundador) por várias gerações. Foi isso que ocorreu no Punã, inclusive com a presença marcante de pessoas albinas. Interessante que após explicarmos o motivo pelo qual isso acontecia no Punã tal provocou alívio a vários casais daquela comunidade, pois antes não podiam imaginar como duas pessoas de cor escura poderiam gerar filhos de pele branca, cabelos loiros e olhos claros. Diante daquele mistério indagavam entre si: Será que houve adultério? Após detectar in loco tal fato, decidi mitigar ou mesmo evitar esse mal de forma premonitória. Ao verificar que na comunidade existia uma única Igreja (Protestante), cujo Pastor, pessoa muito bem quista na localidade, promovia reuniões e cultos aos domingos, procurei esse senhor que, aliás, aceitou nossa proposta e teve boa participação naqueles eventos, nos quais ele explicava o porquê daquelas alterações genéticas propalando o fato repetidamente em todos seus cultos e demais eventos religiosos, para que se evitasse o acasalamento entre pessoas parentes próximos ou que pelo menos tivessem ciência disto. Isso foi feito com maestria, obtendo sucesso! Em outra localidade, em Tefé, no bairro do Abial, o mesmo fato foi observado! Na região dos Lençóis Maranhenses, desta feita, o fato envolvia uma comunidade inteira de albinos, problema agravado pelo aparecimento de câncer de pele, forçando as pessoas a se 112


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

deslocarem no período da noite. Olhando-se o semblante dos moradores daquela comunidade facilmente depreende-se que em sua essência, originalmente, era uma pequena população negra, talvez oriunda de escravos fugidos, portanto de base genética estreita devido ao tamanho da população que ali se estabeleceu. Cheguei a sugerir a colegas da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) a fazerem estudos genéticos sobre essa comunidade, o que foi feito com pleno sucesso e posteriormente publicado. Também aproveitei esse exemplo do Punã para difundi-lo nos cursos de genética que ministrava na UEA/CEST, solicitando aos alunos para replicarem o mesmo nos municípios vizinhos (cerca de seis) de onde eram provenientes! Considerações finais Este breve relato nos remete para um grande significado: É possível o uso da religião para o benefício do sucesso reprodutivo! Fica também a orientação para que, no Brasil, seja motivo de grande atenção o processo de formação de novas comunidades, para que se evite o efeito depressivo da consanguinidade pelo acasalamento entre parentes próximos. Além disso, fica a sugestão no sentido de que outras instituições públicas e privadas também participem desse vital processo de conscientização da população de maneira premonitória! Referências ALLARD, R. W. Principles of Plant Breeding. John Willey & Sons, New York, 1960. 485 p.

113


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

2. Percepção dos riscos, perigos e danos na agricultura, pecuária e floresta Afonso Celso Candeira Valois

Introdução Recentemente, o Brasil se viu diante de tremendo óbice à exportação de produtos da pecuária, especialmente da carne bovina, devido a falta de acurácia de profissionais quanto à sanidade dos produtos e atenção às leis internacionais do comércio de exportação. Essa verdadeira síndrome avassaladora, embora passageira, causou enormes perdas econômicas e de credibilidade, sendo denominada de "carne fraca", o que demandou o dispêndio de esforços hercúleos e ações curativas e premonitórias por parte do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no sentido de realinhar o processo, o que de certa forma vem sendo amenizado. Devido a esse enorme susto é que disponibilizo os comentários a seguir, no sentido de alertar as pessoas envolvidas e a comunidade em geral sobre as nuanças que consubstanciam tamanha preocupação. Controle dos riscos, perigos e danos Na década de 90, as palavras “globalização da economia mundial” dominaram os mais diferentes setores da sociedade. Contudo, durante esse período observou-se que os fatores econômicos per se, como tarifas, taxas, subsídios, quotas de importação, entre vários outros, não seriam capazes de proteger esse mercado. A proteção teria que ser mais desenvolvida e ser extensiva à biodiversidade e aos recursos genéticos animais e vegetais, bem como ao ser humano, pragas, resíduos, toxinas e outros contaminantes que podem estar associados a plantas e alimentos in natura, processados e industrializados. Tornou-se evidente para os diferentes segmentos da sociedade que havia uma necessidade premente do estabelecimento de regras que apresentassem outras soluções aos impedimentos relacionados a pragas e doenças. Esses, por sua vez, estavam se tornando cada vez mais complexos, difíceis de serem tratados e de ocorrência nunca antes vista, pela facilidade de locomoção de bens, produtos e pessoas. Em março de 1991 foi realizada uma Conferência Conjunta entre a FAO e a Organização Mundial da Saúde (OMS) para padronização dos alimentos e, desse encontro, foram emanadas recomendações de avaliações baseadas em sólidos princípios científicos e a promoção para conhecimento desses princípios foi estabelecida para que padrões, códigos de prática ou orientações relacionadas à proteção da saúde humana se tornassem transparentes e acessíveis a todos. Por sua vez, em 1995, com a efetivação do Acordo das Aplicações de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (Acordo SPS), os países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) reafirmaram seus direitos para adotar e reforçar as medidas necessárias para proteger a vida e a saúde dos seres humanos, bem como das plantas e animais domesticados e silvestres, incluindo testes, diagnoses, isolamentos, controle ou erradicação de doenças e pragas. 114


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Outros acordos elaborados são também considerados relevantes no processo de adoção de medidas protetoras aos países membros. O Acordo SPS pode, direta ou indiretamente, afetar o comércio internacional e não deve ser usado como restrição mascarada a esse comércio. Os Membros têm o direito de promover e adotar as medidas acordadas como forma de proteger sua soberania, desde que baseadas em sólidos princípios científicos. Ele ainda estimula que os Membros adotem medidas sanitárias e fitossanitárias internas mais relevantes, baseadas em padrões, recomendações e diretrizes internacionais, como forma de se protegerem de ações restritivas durante negociações comerciais. Medidas nacionais devem ser de conformidade com a “identificação e avaliação do risco” e apresentarem abordagens consistentes com o “manejo do risco”, ambos descritos no Acordo SPS. Este define avaliação do risco como: “a avaliação da possibilidade de entrada, estabelecimento ou propagação de praga ou doença dentro do território de um Membro importador de acordo com as medidas sanitárias ou fitossanitárias que podem ser aplicadas, e o potencial biológico e consequências econômicas associadas; ou a avaliação dos efeitos adversos potenciais para a saúde humana ou animal, advindos da presença de aditivos, contaminantes, toxinas ou organismos causadores de doenças nos alimentos, bebidas ou rações”. Para o Codex Alimentarius o termo “risco” pode ser definido como uma função da probabilidade de um efeito adverso e a gravidade desse efeito resultante de um ou mais perigos presentes nos alimentos. O risco é geralmente expresso como uma proporção e é uma das chances que uma pessoa tem de ser afetado pelo perigo em questão, dado que uma avaliação apropriada do perigo possa ter sido feita. Na avaliação do risco, Membros do Acordo SPS são solicitados a apresentar provas científicas contundentes, métodos de produção e processos relevantes, métodos de inspeção, amostragem e certificação consistentes, prevalência de doenças e pragas específicas, existência de áreas livres de doenças e pragas, condições ecológicas e ambientais adequadas, bem como quarentena e tratamentos quarentenários eficientes. A Convenção Internacional para Proteção dos Vegetais (CIPV) e a Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) são reconhecidos dentro do Acordo SPS/OMC, como os órgãos que harmonizam os padrões internacionais das medidas sanitárias e fitossanitárias. Dessa forma, estabeleceram-se normas e diretrizes harmônicas para Análise de Risco de Pragas (ARP), como forma de proteger o comércio internacional. Para a CIPV, ARP é o processo de avaliação de evidência biológica ou científica para determinar se uma praga deve ser regulada e a força de eventuais medidas sanitárias e fitossanitárias que devem ser tomadas. De acordo com a FAO, a análise de risco estabelece os riscos de uma praga exótica ou do impacto econômico pode causar em uma determinada área. Este risco pode ser definido tanto em bases qualitativas ou quantitativas, como a probabilidade (chance) que uma praga tem (inseto, ácaro, patógeno ou uma planta daninha) de se dispersar ou ser disseminada, com o auxílio do ser humano ou por meio de fenômenos naturais, de uma área para outra onde ele não ocorre e possa se estabelecer, dependendo das condições abióticas.

115


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Por sua vez, a análise do impacto de uma praga em determinada área deve abordar não somente aspectos econômicos, mas também social e ambiental. Para que a previsão do risco possa ser avaliada de forma coerente e pragmática, a análise deve ser realizada dentro de critérios técnico-científicos rigorosos e ser ainda abrangente, clara e passível de ser examinada por qualquer organização de proteção de plantas. Entre outros fatores, esta deve identificar a ameaça, determinar a probabilidade e as consequências dos eventos adversos, descrever as incertezas e acima de tudo, evitar ao máximo colocar em risco os ecossistemas agrícolas de um país, formulando recomendações práticas, lógicas e coerentes de serem executadas durante a mitigação do risco. Além desses órgãos, a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) vem pressionando os governos para a proteção não só dos produtos de interesse humano, mas também das reservas naturais. O aumento da população mundial e do nível de consumo por parte das pessoas têm contribuído para grande retirada dos produtos primários dessas reservas, também chamada de “pegada ecológica”, levando a ultrapassar os limites da sustentabilidade, ao mesmo tempo que contribui para o desbalanceamento energético dos ecossistemas. Associado a isso, as mudanças climáticas no planeta vêm proporcionando a emergência de novas pragas, principalmente nas regiões tropicais. Se essa tendência se mantiver nos quadros atuais, muito em breve a humanidade se verá frente a enormes catástrofes ambientais como a falta de água e de terras produtivas, além da fome e de diversas epidemias. Considerações finais Todos os enfoques até então comentados, em resumo, levam em consideração a definição da segurança biológica no entendimento mais simples e perfeitamente compreensível neste caso, que é o manejo de todos os riscos bióticos e abióticos associados à agricultura, pecuária e florestas, dentre outros, principalmente para o benefício da segurança alimentar e nutricional, considerando a obtenção dos alimentos livres dos impedimentos de ordem física, química, biológica e ambiental. Sabe-se que não existe risco zero, mas os riscos podem ser avaliados, gerenciados e comunicados. Para esses casos da produção primária, o risco significa a probabilidade da ocorrência do perigo, que por sua vez se traduz no potencial da ocorrência de danos, cuja severidade é medida pelo dimensionamento da gravidade do dano quanto às consequências resultantes de sua ocorrência, podendo ser baixa, média e alta. Referências VALOIS, A. C. C. Segurança biológica: agricultura, pecuária e florestas saudáveis e livres de doenças e pragas. Biotecnologia, Ciência & Desenvolvimento, n. 33, p. 4-7, 2004. VALOIS, A. C. C.; OLIVEIRA, M. R. V. Segurança biológica para o agronegócio. Agrociência. Montevideo, Uruguay, v. 9, n. 1/2, p. 203-211, 2005.

116


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

IV - Contos 1. Meu Primeiro Computador Renato Ferraz de Arruda Veiga Eng.Agr. FAZMACG (1979), Me. (1990) e Dr. (1996) pela UNESP-Botucatu. Pesquisador Científico VI (aposentado) pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), de 1980 a 2014. Diretor Técnico e de Divulgação da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos (SBRG), Editor Chefe da Revista RG News e Diretor Administrativo da Fundação de Apoio à Pesquisa Agrícola – FUNDAG.

Introdução Quando nos tornamos idosos, e mais ainda quando nos aposentamos, necessariamente passamos por uma reflexão, dia a dia, e sentimos uma necessidade imensa de querer agradecer a todos que nos ajudaram na vida! Logicamente que isto é impossível, porque alguns destes anjos já voaram para se encontrar com Deus, mas encontrei uma maneira de agradecer, pelo menos para alguns destes personagens, assim, para tanto quero pedir licença aos leitores para contar como tive minhas primeiras lições digitais, como pude adquirir o meu primeiro computador e apresentar os personagens desta História. Esperamos com este conto abrir espaço para quem deseje se expressar desta forma para registrar suas memórias em recursos genéticos. Os colegas idosos, como eu, entenderão a história a seguir! Aconteceu Durante a graduação, na Faculdade de Agronomia e Zootecnia "MCG", de Espírito Santo do Pinhal - SP, hoje Unipinhal, tive que abusar do apoio logístico de meu saudoso pai, Dr. Ary de Arruda Veiga [então Chefe da Estação Experimental de Tietê – do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) Figura 1.], pois necessitava adquirir uma máquina muito cara na década de setenta, uma calculadora científica, a ser utilizada nas aulas de estatística e topografia – logicamente aprendi muito com aquela máquina sensacional, mas, ainda não era o “meu computador”!

Figura 2. Augusto Tulmann Neto

Figura 1. Ary de Arruda Veiga

Meu contato inicial com um computador aconteceu nas férias do penúltimo ano da faculdade, quando fiz estágio em melhoramento de feijão irradiado, com o Dr. Augusto Tulmann Neto, Figura 2., no Centro de Energia Nuclear para a Agricultura (Cena), em Piracicaba (logo ao lado da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz - ESALQ/USP), quando ainda era o tempo de “furar os cartões”, em 1977, fato que ficou 117


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

adormecido por dois anos, já que só depois de formado, quando realizei estágio na Seção de Botânica Econômica do IAC, voltei a chegar perto de um computador, pois, coincidentemente minha sala localizava-se no andar de cima da Seção de Computação, no Edifício Franz W. Dafert, na qual o “Cisco” ocupava uma sala inteira – aqui foi apenas uma relação “osmose” por vizinhança! Mas, em 1980 fui contratado e aí sim, naquela década, fiz meus primeiros treinamentos com “The Basic (Beginner's All-purpose Symbolic Instruction Code)”, em aulas ministradas pela Seção de Computação do IAC, com dois alunos por máquina – mas quando chegava no meu prédio da Seção de Botânica já havia esquecido tudo, pois não tinha computador para treinar, nem no próprio serviço e muito menos em casa. De qualquer forma, a década de oitenta foi rica para mim, não com computador, mas aprendendo a digitar em uma máquina de escrever Remington, e foi nela que digitei o meu primeiro levantamento dos recursos fitogenéticos do IAC, e onde organizei os dados de passaporte das principais culturas da instituição, em um único documento, a pedidos de meu saudoso chefe e orientador Dr. Emílio Bruno Germek (Figura 3). Os últimos anos da década de oitenta e os primeiros da década de noventa, foram também muito profícuos, já que compramos para Sistema de Figura 3. Emílio Bruno Germek Introdução e Quarentena de Plantas – IAC (o qual coordenava, após reforma institucional) uma maravilhosa máquina de digitar elétrica – quanta modernidade, até podia apagar os erros com o chamado “corretor”. Fica claro aqui também, que ainda não era o “meu computador”! Foi somente no ano de 1994, quando havia realizado todo o meu trabalho do doutorado, na UNESP-Botucatu, com Arachis sylvestris (A. Chev.) A. Chev. (hoje: Arachis veigae S.H.Santana & Valls - em minha homenagem), que por uma necessidade de minha tese, e por sugestão do Dr. José Francisco Montenegro Valls (Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia – meu “irmão de coração” Figura 4.), apoiado financeiramente pelo Programa Cooperativo para el Desarollo Tecnológico Agroalimentario y Agroindustrial del Cono Sur (Procisur) – por intercessão da Dra. Clara Oliveira Goedert (também da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, e então coordenadora internacional do Figura 4. José Francisco programa de recursos genéticos do Procisur – primeira Montenegro Valls entrevistada da revista RG News, Figura 5.) que viajei para Corrientes para me orientar com o Dr. Antônio Krapovickas – Instituto de Botánica del Nordeste (Ibone – CONICET/UNNE – Argentina), maior autoridade no gênero Arachis no mundo, e quem publicaria a monografia do gênero com 60 espécies novas. Isto era necessário para mim, já que eu, embora não fosse um taxonomista, levantaria a hipótese de que todas as 20 populações de A. silvestris, nada tinham a ver com exsicata original Figura 5. Clara Oliveira depositada por Augusto Chevalier, no Museu de Paris, e que, também, Goedert citaria que uma das populações trabalhadas na tese sequer seria da mesma 118


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

espécie que as demais; aliás, concluíra que seria uma nova espécie (hoje: A. seridoënsis Valls, C.E.Simpson, Krapov. & R.Veiga) – entenderam porque eu tinha que ter contato com a nova monografia do gênero, preparada pelo Dr. Krapovickas?

Figura 6. Antonio Krapovickas e Carmem Leila Cristóbal

Enfim, fui muito bem recebido pelo saudoso Dr. Krapovickas (então, Presidente da Sociedade Argentina de Genética) e por sua esposa Dra. Carmen Lelia Cristóbal (então, Presidente da Sociedade Argentina de Botânica – o herbário do IBONE hoje leva o seu nome), Figura 6, que me abrigaram tão gentilmente em sua própria casa, em Corrientes – Ar. (Pessoas espirituosas, pelos cargos citados, eles jocosamente se chamavam de “a ditadura científica da Argentina”).

Tenho que dizer que ficar trabalhando no herbário do Ibone, com a orientação destes dois grandes amigos-mestres-ídolos, foi um presente divino! Desculpem-me, ainda sobre o computador, foi aí que vi pela primeira vez um diminuto notebook, carregado para todo lado pelo Dr. Krapovickas – apenas vi, é lógico! Bem, para encurtar a história! No dia em que voltaria para o Brasil, a Dra. Carmem me chamou num canto, e disse: - Renato, sei que você recebeu U$ 1,000 do Procisur, e percebestes que não deixamos você gastar um Peso Argentino sequer - enfim, tudo tinha um propósito! – Ao chegar ao Brasil quero que você me mande uma carta escrita no computador que você vai comprar com este dinheiro, foi por isto que lhe ajudamos aqui, nada de soñar con vidiocasetera! Aí, ao chegar ao Brasil, sem o meu videocassete, corri para comprar o meu primeiro XP (http://www.museudocomputador.org.br/) com uma maravilhosa impressora matricial, cuja primeira impressão foi uma cartinha de agradecimento aos amigos argentinos! Considerações finais Agora sim chega ao fim a minha história que, sem os amigos, jamais teria ocorrido naquela época de “vacas magras”. Muito obrigado a todos que me ajudaram nesta caminhada profissional, bem como ao meu primeiro computador, sem os quais jamais teria sido o pesquisador que fui em recursos fitogenéticos, em especial com o gênero Arachis L., além, é claro, de ser o primeiro Editor Chefe da revista RG News! Esperamos ter mostrado de forma sintética e divertida o avanço do manejo da informação, uma condição essencial para o estudo dos recursos genéticos, resultante da interação homemmáquina, que sem os avanços da computação teria muita dificuldade para viabilizar.

119


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

V – Entrevistados da vez Osmar Cavassan O HOMEM QUE DÁ VOZ AO CERRADO Por Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira Editor Chefe substituto da RG News

Possui graduação em Licenciatura Em Ciências pela Fundação Educacional de Bauru (1972), graduação em Licenciatura Em Ciências Biológicas pela Faculdade de Ciências Farias Brito (1974), mestrado em Ciências Biológicas (Biologia Vegetal) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1982), doutorado em Ecologia pela Universidade Estadual de Campinas (1990) e livre-docente pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho". Atualmente é professor adjunto da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Fitossociologia, atuando principalmente nos seguintes temas: cerrado, florística, fitossociologia, ensino de ciências e educação ambiental.

Perguntas e Respostas 1 – Professor, primeiramente agradecemos a sua disponibilidade. Seu nome está intimamente ligado a um dos biomas mais importantes do Brasil, o Cerrado. Como ele se encontra atualmente no quesito preservação? Quais são as áreas de conservação e que papel tem tido as áreas privadas na região de Bauru? Ouvi dizer que do Cerrado original, que cobria 21% do Estado, restou apenas 1%? Isso procede? Como chegamos a esse ponto? Resposta: Eu agradeço o convite. Historicamente as matas, principalmente aquelas do Domínio da Mata Atlântica, foram as primeiras a serem degradadas. Além de fornecerem madeira de boa qualidade para a marcenaria e carpintaria, eram indicadoras de solo de boa qualidade para a agricultura. Os cerrados, considerados como indicadores de solos de baixa qualidade, eram utilizados como pastagens naturais. Recentemente, com o desenvolvimento da tecnologia agrícola, os cerrados geralmente ocupando relevos de fácil mecanização, também foram degradados, cedendo espaço para pastagens com gramíneas exóticas, plantações de cana, eucaliptos e pinus. Realmente, a estimativa para as áreas remanescentes de cerrado no Estado de São Paulo, até o final da década passada, era de aproximadamente 1%. Com a assinatura da lei estadual número 13.550, de 2 de junho de 2009, a velocidade de devastação diminuiu. 2- Seguindo a mesma questão, sobre Bauru, como está a saúde das suas matas? Que importantes recursos genéticos têm sido identificados nos últimos anos nessas áreas? Existem espécies vulneráveis ou no caminho da extinção na região? Resposta: O município de Bauru possui remanescentes de mata estacional semidecidual, que é uma formação vegetal do Domínio da Mata Atlântica e de Cerrado. Em alguns pontos identificam-se áreas de transição entre estas duas formações vegetais. Nos vales, a vegetação ribeirinha, também conhecida como mata ciliar, é representada por margens inundadas 120


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

periodicamente ou constantemente encharcadas. Permanecem em unidades de conservação, principalmente na Estação Ecológica “Sebastião Aleixo”, onde predomina mata, Jardim Botânico Municipal de Bauru, Reserva Ecológica da Sociedade Beneficente Enéas de Carvalho Aguiar e Reserva Legal do Campus de Bauru da UNESP. Nestes, predomina cerrado nos interflúvios e mata ribeirinha nos vales. Os trabalhos realizados revelam alta diversidade vegetal e animal, embora sejam restritos aos organismos macroscópicos. Pouco sabemos sobre os microrganismos, tão importantes para os ecossistemas que lá operam quanto os macroscópicos. Dentre as espécies já identificadas, algumas encontram-se nas listas de espécies em extinção no Estado de São Paulo. 3 – Professor, existem herbários na cidade? Como tem sido o papel destes herbários na identificação das espécies e preservação da biodiversidade local? Resposta: Conheço pelo menos três herbários. O mais antigo é o BAUR, na Universidade do Sagrado Coração. Temos o UNBA na UNESP em Bauru e o herbário do JBMB no Jardim Botânico Municipal de Bauru. São responsáveis por acondicionar material botânico testemunho de qualquer atividade, principalmente pesquisas, envolvendo vegetais. Não tem, diretamente, nenhum papel na preservação, uma vez que o material botânico nele incorporado é um ramo seco. 4 – Sabendo que as perturbações humanas sobre essas áreas são constantes, quais são as grandes dificuldades de se gerir e manter planos de conservação nesses fragmentos? Como as Leis têm colaborado (ou não) para que sejamos bem-sucedidos nos planos de conservação do cerrado local? Resposta: A utilização de áreas, outrora ocupadas por cerrado, muitas vezes são norteadas apenas pelos valores econômicos de sua utilização. O pouco conhecimento sobre os valores do cerrado, quer seja ambiental, estético, cultural, educacional e até econômico, limita os processos de sua sábia utilização, onde se deve associar a capacidade de desenvolver com o mínimo de perturbação. As leis protegem o cerrado, mas se não forem bem interpretadas e associadas a um plano consciente, fundamentado em ciência e tecnologia, podem ter o seu uso equivocado. 5 – Em Bauru existe o Instituto Ambiental Vidágua? Pode nos falar um pouco sobre ele? Existem outros Institutos atuantes? Resposta: Conheço pouco deste e de outros Institutos com atuação ambiental em Bauru. 6 – Estamos celebrando os biomas na campanha da Fraternidade deste ano. Que voz tem tido o bioma do Cerrado a nível nacional e local? As pessoas conhecem de fato a riqueza do bioma do Cerrado? Resposta: O tema desta Campanha da Fraternidade é bem-vindo. Chama a atenção para um bioma que não se resume em um conjunto de árvores e animais selvagens. O Cerrado deve ser conhecido pelos seus aspectos ecológicos, geográficos, sociais, históricos e econômicos. Ele tem uma identidade, principalmente pelas populações que vivem no Brasil Central, área nuclear do Cerrado. Aqueles que nasceram e sempre viveram na região do Cerrado, conhecem as suas características e aprendem a conviver com ele e respeitá-lo. Professor Osmar, em nome de toda a equipe da RG News agradecemos as suas palavras e esperamos poder contribuir com essa reportagem para um maior conhecimento desse importante tema que é o bioma do Cerrado. 121


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Alexandre Magno Sebbenn Por Marcos Vinicius Bohrer Monteiro Siqueira Editor Chefe Substituto da Revista RG News

Graduado em Engenharia Florestal (UFSM, 1992), mestre em Ciências Florestais (ESALQ/USP, 1997), doutor em Genética e Melhoramento de Plantas (ESALQ/USP, 2001) e pós-doutor em Genética Florestal (Thunen Institute-Alemanha, 2007), é pesquisador científico do Instituto Florestal de São Paulo e professor de Genética de Populações nos cursos de pós-graduação da UNESP/Ilha Solteira e Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Atua principalmente nos seguintes temas: genética de populações, genética quantitativa, melhoramento florestal e conservação genética. Seus principais interesses científicos são: investigar como se processa a dispersão contemporânea de pólen e sementes; como é a reprodução e a distribuição espacial de genótipos em espécies arbóreas localizadas em fragmentos e florestas contínuas; quais são os impactos do corte seletivo de árvores sobre processos como sistema de cruzamento, fluxo gênico, e sobre a diversidade genética e demografia de espécies arbóreas da Amazônia; determinar métodos de exploração florestal que garantam a sustentabilidade genética e a produtividade de madeira de espécies arbóreas da Amazônia; aplicação de DNA-fingerprint para identificar espécies, país de origem e concessão florestal de madeira comercializada; determinar tamanhos amostrais para a coleta de sementes com fim de conservação genética; melhoramento genético de espécies exóticas e nativas para o estado de São Paulo e outras regiões brasileiras.

Perguntas e Respostas 1 – Alexandre, primeiramente agradecemos a sua disponibilidade. Seu nome está intimamente ligado ao melhoramento florestal. Como temos progredido nesse campo nos últimos anos no Brasil? Quais são os grandes gargalos e quais têm sido as principais metas dos centros de pesquisa, como o Instituto Florestal (IF)? Resposta: Os progressos têm sido principalmente com espécies de grande interesse econômico, como por exemplo, Pinus, Eucalyptus e Seringueira (Hevea brasiliensis). Os avanços têm sido grandes, resultando em populações mais produtivas, resistentes a pragas e doenças. Ressalto a importância da incorporação de novas técnicas moleculares, como microssatélites e SNP’s (polimorfismo de nucleotídeo único ou polimorfismo de nucleotídeo simples), além de métodos de análises estatísticas que tem evoluído paralelamente. Isso tem permitindo inferências para calcular graus de parentescos e endogamia, conhecer em detalhes o sistema de reprodução, grau de isolamento genético de pomares de sementes, distância a que plantios comerciais devem estar espacialmente isolados de outros plantios, para evitar contaminação com pólen de plantas transgênicas, entre outros. O grande gargalo é ainda associar o genótipo com o seu fenótipo, embora isso tenha se aproximado muito nos últimos anos com o sequenciamento total de genomas como o caso do gênero Eucalyptus, realizado pelo grupo do Prof. Dr. Dario Grattapaglia (EMBRAPA/CENARGEN, Brasília). Outro grande gargalo é a falta de estudos sobre o potencial de espécies nativas brasileiras para utilização em plantios comerciais. Temos uma das maiores diversidades de espécies arbóreas do planeta e ainda sabemos e utilizamos muito pouco sobre estas. O IF, juntamente com a EMBRAPA e Universidades, como a UNESP, campus de Ilha Solteira, está conservando ex situ populações de espécies nativas do estado de São Paulo, mas ainda o número de espécies é muito pequeno, diante do número de espécies que ocorrem nos biomas paulistas. No IF, mais de 99% dos plantios são da década de 1970 a 80 e muito pouco foi estabelecido após este período, devido a dificuldades institucionais a que o IF foi submetido. O grupo de melhoramento e conservação genética do IF, junto com nossos maiores parceiros da EMBRAPA e Universidades como UNESP/Ilha Solteira, Botucatu, ESALQ, CENA/USP, etc., está estudando os bancos de germoplasma estabelecidos, utilizando 122


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

técnicas moleculares e de genética quantitativa, com o intuito de conhecer os níveis de diversidade e variabilidade genética retidos, o tamanho efetivo, o controle genético de caracteres adaptativos de produtividade e quais estratégias de manejo. Em outros termos, através da seleção, quais sãos as mais indicadas para a transformação desses bancos em pomares de sementes, para atender a demanda de sementes para reflorestamentos comerciais e de recuperação ambiental. Isso é fundamental porque mesmo que os bancos conservem muito dos genes das populações de origem, estes podem ser facilmente perdidos por catástrofes como fogo, vendavais, pragas, o que já ocorreu em alguns casos como em testes com Cordia alliodora (louroamarelo), Swietenia macrophilla (mogno), Cedrela fissillis (cedro), Pinus tecunumanii e Grevillea robusta (Grevílea robusta), por exemplo. A coleta de sementes nos bancos e uso em reflorestamentos garante que estes genes sejam distribuídos para outras áreas, dando maior garantia de sua preservação. Queremos que as futuras gerações tenham acesso aos mesmos recursos naturais que hoje nós temos. Isso é nossa maior motivação. Isso é fundamental não só para os paulistas, mas também para todos brasileiros e pessoas de outros países. Uma contribuição dos paulistas para humanidade. 2- A questão do desmatamento tem tido implicações diretas nos recursos genéticos no Brasil. O que suas pesquisas no IF têm demonstrado a respeito, de forma geral? Resposta: Sim, obviamente. São muitos os indicativos, mas tentando ser breve, meus estudos têm mostrado que o processo de fragmentação florestal, que isola espacialmente populações e indivíduos na paisagem, resulta também no isolamento genético das populações, devido ao processo de dispersão de pólen e sementes seguir um padrão de isolamento por distância, além de certas atividades de uso da terra inibir ou restringir o movimento de animais dispersores entre os fragmentos florestais. Por exemplo, não temos encontrado imigração de sementes nos fragmentos para espécies como Araucaria angustifolia, Cariniana legalis, Copaifera langdsdorphii e Myracroduon urundeuva e a taxa de imigração de pólen em geral é baixa (< 10%). Isso é grave, pois mesmo com a entrada de certas proporções de genes via imigração de pólen, existe um longo caminho entre uma semente originada de um doador de pólen localizado fora do fragmento até a fase adulta. Por exemplo, esta semente pode não se tornar uma árvore adulta, devido ao fato de que foi predada como resultado do aumento da frequência de predação. A redução da disponibilidade de sementes para os animais pode fazer com que praticamente todas as sementes sejam atacadas. Desta forma, com a ausência de entrada de novos genes nas populações, toda dinâmica populacional fica restrita à população remanescente no fragmento, e como a grande maioria das espécies tropicais têm baixa densidade populacional (< 1 árvore/ha) tem se observado um aumento do parentesco e da endogamia nas gerações pósfragmentação. Isso pode levar a depressão por endogamia e, finalmente, à extinção de populações. Outro ponto muito importante é a perda de diversidade biológica nos fragmentos florestais, devido à impossibilidade das populações de todos os organismos ampliarem seus tamanhos, a não ser que o fragmento seja ampliado. Após a fragmentação, os fragmentos podem ainda conter alta diversidade de espécies de árvores, mas com o passar do tempo, o aumento da densidade populacional de uma espécie, resulta na diminuição do tamanho de populações de outras espécies. Outra coisa, devido ao avançado estado de fragmentação das florestas tropicais, muitas populações, ou melhor, a maior parte das populações já foram extintas e nunca serão resgatadas. Este é o maior problema para a humanidade, pois podiam conter fármacos, ou outras utilidades, mas agora não existem mais. Tem algo mais grave do que isso? Sim, o processo de fragmentação florestal de desmatamento continua andando a passos largos. O que temos que fazer para minimizar estes efeitos negativos? Preservar o que sobrou incluído árvores isoladas, as quais têm sido determinadas como importantes, pois servem de trampolim para os agentes polinizadores, ligar geneticamente populações, enriquecer as florestas após o plantio de 123


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

indivíduos originados de fragmentos vizinhos, e ligar populações por corredores, ou seja, com atividades de reflorestamento originadas da coleta de sementes de grande número de árvores matrizes (mínimo 50 árvores matrizes). 3 – Você desenvolve suas pesquisas em um Estado onde (ainda) existem recursos para fazer pesquisa de ponta na área de genética de plantas. Na sua ótica, temos mostrado cientificamente a riqueza dos nossos recursos lá fora? Resposta: Sim, mas ainda temos muito a pesquisar, pois embora o estado foi e continue sendo intensamente fragmentado, ainda existe grande diversidade de espécies, as quais possuem diferentes características reprodutivas e ecológicas. A ciência está ainda na fase de embrião. Tem muito trabalho pela frente. Nos últimos anos pesquisadores brasileiros têm aumentado as publicações em revistas científicas do exterior, o que demonstra o reconhecimento de nossa capacidade de fazer ciência de qualidade, de ponta, acessar questões importantes para a sociedade. 4 – A ciência, e particularmente as ferramentas moleculares, têm evoluído muito em um curto espaço de tempo. Poderia falar um pouco sobre isso? Resposta: Sim, felizmente. O desenvolvimento dos marcadores microssatélites e SNPs merecem destaque, por suas características de codominância e de alto polimorfismo em termos de número de alelos, no caso dos SSRs, compensado nos SNPs que apresentam apenas dois alelos pela possibilidade e acessos de um número grande de locos ao longo do genoma dos organismos. Isso permite distinguir genótipos homozigotos de heterozigotos e, juntamente com o paralelo desenvolvimento de métodos de análises estatísticas populacionais, tem nos permitido investigar processos contemporâneos de dispersão de genes via pólen e sementes, logo, entender o que está acontecendo agora, no presente, como resultados desta devastação irracional das florestas naturais. Estas técnicas têm também permitido conhecer em detalhes o parentesco e endogamia em populações naturais e de melhoramento, como a diversidade genética se distribui no espaço e tempo, os padrões de reprodução e dispersão de genes, relação genética entre espécies, determinar espécies, origem de madeira e muito mais. 5 – Temos percebido que áreas da ciência até então pouco “comunicáveis”, começaram a juntar forças e passamos a ter cada vez mais uma interdisciplinaridade para compreender os recursos genéticos florestais. Como você, como pesquisador, observa essa evolução de novos campos trabalhando juntos? Resposta: Observo isso, como um ponto fundamental e muito positivo, uma evolução importante para entendermos processos genético-ecológicos mais profundamente e como utilizar as informações acessadas em benefício da sociedade. Por exemplo, estudos de genética de populações sem auxílio de estudos ecológicos resultam em investigações pobres, e o inverso é também verdadeiro. Na minha opinião trata-se de um caminho sem volta, e novas investigações possivelmente sempre envolverão diferentes áreas da ciência. 6 – Estamos celebrando os biomas na campanha da Fraternidade deste ano. O que os pesquisadores podem fazer para mostrar para população a grandeza dos recursos genéticos que temos nesse país (e como muitos deles estão desaparecendo)? Resposta: Fazer palestras e entrevistas, utilizando uma linguagem simples, menos técnica, mas sem perder fidelidade na apresentação dos resultados de nossas pesquisas. Alexandre Sebbenn, em nome de toda a equipe da RG News, agradecemos as suas palavras e esperamos com essa reportagem poder contribuir para um maior conhecimento desse importante tema que é o bioma Cerrado. 124


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

VI – Eventos 1. Aconteceu a) Inauguração: Embrapa inaugura Centro de Recursos Biológicos Johanna Döbereiner Por: Ana Lucia Ferreira Formada em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo pela Universidade Gama Filho (1990) e pós-graduação em Comunicação Empresarial, pela Universidade Cândido Mendes (2005). Atualmente é analista A da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em Jornalismo Especializado (Comunitário, Rural, Empresarial, Científico).

Trata-se de uma estrutura que reúne laboratórios onde está mantida uma coleção de três mil microrganismos, que foram coletados por pesquisadores na natureza, em diferentes regiões do país, e que possuem potencial para serem utilizados como insumos biológicos para a agricultura brasileira. Localizado em Seropédica/RJ, o CRB-JD conta ainda com um banco de DNA microbiano, que possibilita a realização de estudos sem que haja a necessidade de cultivos, otimizando o tempo de pesquisa e garantindo material de qualidade. A expectativa é de que, com a nova infraestrutura, seja possível avançar na conservação dos microrganismos e, principalmente, realizar pesquisas e negócios com o setor produtivo. "Pretende-se oferecer análises de qualidade de inoculantes, seguindo as normas do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e a produção de inoculantes para a pesquisa, para a difusão de tecnologias e, eventualmente, para o atendimento a pequenas demandas de produtores”, informa o pesquisador Jerri Zilli, curador do CRB-JD. As pesquisas no Centro de Recursos Biológicos Johanna Döbereiner deverão envolver prospecção de microrganismos e moléculas com potencial biotecnológico para a agricultura, desenvolvimento de bioprocessos – como novas formulações – e estudos de taxonomia microbiana. História O CRB-JD foi criado a partir da junção das estruturas das coleções de culturas da Embrapa Agrobiologia e do laboratório de bioprocessos e análise de qualidade de inoculantes. Ele faz parte da Rede de Centros de Recursos Biológicos Brasileira e, mais especificamente, está inserido no CRB-Agronegócio, cuja estruturação global é responsabilidade da Embrapa. 125


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

O início desse trabalho foi ainda nos anos 1950, quando a pesquisadora Johanna Döbereiner isolou as primeiras bactérias fixadoras de nitrogênio. Desde então, a coleção se multiplicou e mais de 50 estirpes já foram autorizadas pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) para o uso em inoculantes comerciais. "O Brasil é líder mundial no uso de bactérias fixadoras de nitrogênio na agricultura e a economia resultante da utilização desses microrganismos é superior a oito bilhões de dólares", explica o pesquisador Jerri Zilli. Em 2016, a Embrapa Agrobiologia já havia obtido junto ao Mapa o cadastro de laboratório para análise de controle de qualidade de inoculantes e também o de estabelecimento produtor de inoculantes. Neste ano, portaria do órgão concedeu à Unidade o status de Coleção Oficial para atender às demandas das indústrias de inoculantes. Com a estruturação do CRB-JD vislumbra-se o preenchimento de lacunas, seja na pesquisa ou no desenvolvimento tecnológico de novos bioinsumos para uso na agricultura, contribuindo com os avanços de bioeconomia no País. “O principal diferencial será a aproximação com o setor produtivo, buscando a troca de conhecimento e experiência na solução de problemas da agricultura nacional e a aproximação das parcerias público-privadas”, aponta o chefe-geral da Embrapa Agrobiologia Gustavo Xavier. Genética molecular Até 2012 conhecia-se apenas as características fenotípicas e morfológicas (aparência e forma) dos microrganismos depositados no CRB-JD e isso limitava o desenvolvimento das pesquisas. Mas, nos últimos anos, com o uso de ferramentas moleculares, foi possível conhecer melhor a taxonomia (classificação) dos microrganismos e, além disso, estruturou-se um banco de DNA que está disponível para os pesquisadores. Segundo Zilli, as bactérias são mantidas no laboratório e, se não fosse esse trabalho cuidadoso, poderiam desaparecer. Atualmente, 1.300 bactérias estão caracterizadas por meio de sequências específicas do DNA. "Se alguém necessitar fazer novos estudos para trabalhos biotecnológicos, não há necessidade de cultivar a bactéria, é possível utilizar somente os DNAs guardados", esclarece o curador. O conhecimento genético pode contribuir para que novos produtos sejam gerados pela pesquisa. Por esse motivo, a Embrapa Agrobiologia tem como meta a caracterização de pelo menos duas mil bactérias de sua coleção.

126


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Nota do Editor: Johanna Liesbeth Kubelka Döbereiner (Aussig, 28 de novembro de 1924 – Seropédica, 05 de outubro de 2000). Formou-se em Agronomia pela Universidade de Munique, em 1950. Poucos meses depois veio para o Brasil, onde ela foi contratada pelo Instituto de Ecologia e Experimentação Agrícola, atual Centro Nacional de Pesquisa em Agrobiologia da Embrapa, localizado no município Itaguaí, atual Seropédica/RJ. Naturalizada brasileira em 1956, obteve grau de Mestre pela Universidade de Wisconsin-Madison, Estados Unidos, em 1963. Posteriormente fez um curso de bacteriologia no Instituto Pasteur de Paris. Suas pesquisas foram fundamentais para que o Brasil desenvolvesse o Proalcool e se tornasse o segundo produtor mundial de soja. Seu trabalho com fixação biológica do nitrogênio permitiu que milhares de pessoas consumissem alimentos mais baratos e saudáveis, o que lhe valeu a indicação ao Prêmio Nobel em 1997. É a sétima cientista brasileira mais citada pela comunidade científica mundial e a primeira entre as mulheres, segundo levantamento de 1995 da Folha de S. Paulo.

127


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

b) SIRGEALC agora é SIRGEAC

Criado no Brasil com a denominação de Simpósio Latino-Americano de Recursos Genéticos, e posteriormente alterado para Simpósio de Recursos Genéticos Latino-Americano e o Caribe (SIRGEALC), a partir desta 11º edição adotará a denominação de Simpósio Internacional de Recursos Genéticos para as Américas e o Caribe (SIRGEAC), o que possibilita a inclusão dos Estados Unidos e Canadá. O XI SIRGEAC foi realizado de 15 a 18 de outubro, no México na cidade de Guadalajara. O tema escolhido foi: "Integração da biodiversidade diante das mudanças climáticas". O evento contou com a participação de mais de 400 cientistas e acadêmicos, representando cerca de 21 países, que se reuniram para apresentar os desafios na conservação de recursos genéticos que serão afetados devido às mudanças climáticas. Mais de 200 trabalhos foram apresentados sobre conservação, documentação, avaliação, caracterização, conservação e uso sustentável de recursos genéticos agrícolas, florestais, aquáticos, microbianos e pecuários. Ocorreram aproximadamente 40 palestras e foram realizados seis eventos paralelos sobre temas de conservação in situ, melhoria participativa, integração da biodiversidade na agricultura e gestão da agrobiodiversidade.

Destaque para a participação da Dra. Rosa Lia Barbieri – Vice-presidente da SBRG que fez parte do comitê organizador do evento.

128


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

c) III Simpósio da Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste A terceira edição do Simpósio da RGV-NE, realizado pela Rede de Recursos Genéticos Vegetais do Nordeste (RGV-NE) e apoiado pela SBRG, aconteceu na cidade de Aracaju-SE, de 08 a 11 de outubro de 2017. Apresentou como tema “Agrobiodiversidade: valor, conservação e uso”. A programação foi construída de forma participativa, tentando considerar o status do conhecimento e os trabalhos desenvolvidos pelas instituições no Nordeste do Brasil, alinhada às fragilidades e desafios da ação de conservação e a importância do fortalecimento do tema e dos trabalhos com os recursos genéticos na região. Foram abordados temas como: conservação da biodiversidade agrícola e estratégias para conservação e desenvolvimento local sustentável; estratégias de inovação para acesso aos recursos genéticos para alimentação considerando, inclusive as plantas subutilizadas e os novos costumes alimentares. O Simpósio contou com representantes de quase 60 instituições, pesquisadores, professores, definidores de políticas públicas, estudantes, técnicos, profissionais liberais, agricultores, comunidades tradicionais e representantes de organizações não governamentais, do Brasil e do exterior. Por meio destas instituições e pessoas, todos os Estados da Região Nordeste foram representados, assim como pelo menos um Estado das outras regiões do Brasil, além dos países Canadá, França, Espanha e Estados Unidos. Com o objetivo de popularizar o tema junto à sociedade, o evento promoveu a realização do “Recursos Genéticos no Parque”, realizado no Parque da Sementeira. Também houve uma visita técnica a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) do Caju e aos bancos de germoplasma situados no campo experimental da Embrapa Tabuleiros Costeiros, em Itaporanga d’Ajuda, no estuário do Rio Vaza-Barris. Com essas ações, o evento garantiu um espaço de discussão entre pesquisadores e cidadãos de forma a promover o avanço da ciência, em especial no contexto dos desafios do desenvolvimento sustentável. Os Anais deste evento já estão publicados em nosso volume especial da revista RG News Vol. 3 N°2 Ano: 2017 disponível em nossa página: www.recursosgeneticos.org/revistas.

129


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

2. Acontecerá a) V Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos – V CBRG

Entre os dias 06 e 09 de novembro de 2018, será realizado em Fortaleza o V Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos. O Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos se apresenta como um importante fórum de discussão entre instituições que se dedicam à pesquisa em recursos genéticos, constituindo-se uma importante ação de capacitação e atualização de profissionais e acadêmicos no tema. O tema da quinta edição do evento é “Valor, inovação e uso: o futuro dos recursos genéticos”. Entre os destaques da programação do evento esta a realização do IV Workshop de Curadores do Brasil e a rodada de negócios, com objetivo de aproximar representantes de BAGS de diferentes instituições a empresas que têm em seus produtos a biodiversidade aportada. Esses encontros fomentarão laços de parceria, construção de projetos com vista à inovação tecnológica e desenvolvimento de novos produtos. Concomitantemente ao V CBRG, ocorrerá a Feira Nacional dos Guardiões da Agrobiodiversidade, no Centro de Negócios do Sebrae, evento aberto ao público em geral que tem como principal objetivo difundir a importância dos recursos genéticos e o trabalho dos agricultores. Mantenha-se informado sobre evento acompanhando o site da SBRG e nossas redes sociais!

130


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

VII – Memória dos Recursos Genéticos Memória Internacional CARL VON LINEU (1707-1778) por Renato Ferraz de Arruda Veiga

Carl Nilsson Linnæus, em português, ou Carlos Lineu, ou Carl von Linné, ou ainda Carolus Linnaeus. Lineu como aqui é conhecido, mais especialmente por ser o classificador das principais plantas, animais e microrganismos, como o “L.”. Concebeu a idéia de divisão e denominação, como forma de organizar os organismos vivos. Foi o primeiro cientista a utilizar a Figura 1. Lineu quando jovem. nomenclatura binômica, desenvolvendo o sistema de classificação hierárquica em classe, ordem, família, gênero e espécie, o que deu origem ao formato do moderno Código Internacional de Nomenclatura Botânica. Para organizar as plantas, além da organografia, utilizou também características sexuais, enquanto que para animais e minerais, apenas pela sua aparência externa. Foi Botânico, Zoólogo e Médico sueco, criador da nomenclatura binomial e da classificação científica, sendo assim considerado o "pai da taxonomia moderna". Lineu foi um dos fundadores da Academia Real das Ciências da Suécia. Participou também no desenvolvimento da escala Celsius (então chamada centígrada) de temperatura, invertendo a escala que Anders Celsius havia proposto, passando o valor de 0° para o ponto de fusão da água e 100° para o ponto de ebulição. Já na sua época Lineu foi o botânico mais reconhecido, mas também é lembrado pelos seus dotes literários. A prova disto pode ser comprovada por outros escritores como: JeanJacques Rousseau que lhe enviou a seguinte mensagem "Diga-lhe que não conheço maior homem no mundo", por Johann Wolfgang Von Goethe que escreveu "Além de Shakespeare e Figura 2. Jardins de Lineu em Uppsala. Spinoza, não conheço ninguém entre os que já não se encontram entre nós que me tenha influenciado mais", ou August Strindberg, escrevendo "Lineu era na realidade um poeta que por acaso se tornou um naturalista". 131


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Lineu escreveu mais de setenta livros e trezentos artigos científicos, dentre os quais se destacam: Systema Naturae (1735); Fundamenta Botanica (1736); Flora Lapponica (1737); Genera Plantarum (1735-1737); Hortus Cliffortianus (1737); Flora Suecica (1745); Fauna Suecica (1746); Philosophia Botanica (1751); Species Plantarum (1753); Clavis Medicinae Duplex (1766); Mundus Invisibilis (1767). Também foi professor e orientador de 186 teses e dissertações de estudantes na Uppsala Univercity – Suécia. Ainda devem ser ressaltadas suas quatro autobiografias. Seus livros mais procurados são os de relatos de viagens.

Referências Vieira, E. In: Bibliografias e Curiosidades. http://biografiaecuriosidade. blogspot.com.br/2014/01/biografia-delineu.html. Obtido em 08/05/2017.

132


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Memória Nacional ÁLVARO SANTOS COSTA (1912 - 1998)

Por José Alberto Caram Souza-Dias PqC do Centro de Pesquisae Desenvolvimento de Fitossanidade, IAC.

Dr. Álvaro nasceu em Sorocaba - SP, em 9/1/1912. Eng. Agr.(1932) e Dr. (1955) pela ESALQ.

Tive o privilégio, ou porque não dizer a benção divina de conhecer o Eng. Agr., emérito pesquisador científico (PqC), fito virologista Dr. Álvaro Santos Costa em fins de 1976, quando eu ainda era estudante da Faculdade de Agronomia e Zootecnia “Manoel Carlos Gonçalves”, atual UNIPINHAL, e quis ainda o destino que iniciasse a minha carreira profissional ao seu lado, como PqC do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), e o acompanhasse até o fim de sua longa carreira profissional. O legado do Dr. Álvaro na virologia vegetal não tem precedente. Seus trabalhos são referências, quase obrigatórias, em manuais de Fitopatologia, livros ou artigos de revisão. Na literatura sobre viroses de praticamente todas as culturas, Costa, A.S. é citado (como autor principal ou como coautor) em maior número de vezes se comparado a outros fito virologistas. Foi autor em trabalhos clássicos e pioneiros sobre viroses, os quais são referências na literatura nacional e internacional. Exemplos desses trabalhos são os da premunização (“vacinação”) no controle efetivo da tristeza dos citros; da dinâmica das viroses transmitidas por mosca branca em feijão, tomate entre outras; das interações de viroses no algodão; da diagnose, epidemiologia e controle do vírus do enrolamento da folha e de outras viroses causadoras de degenerescência na batata-semente no Brasil; na caracterização e sistemas de produção/manutenção de mudas livres das principais viroses do morangueiro, videira, mandioca, entre outros. Dr. Álvaro atuou como pesquisador em mais de 200 projetos de pesquisa e mais de 3.000 experimentos científicos, resultando em mais de 1.000 publicações. Alcançou em 1977, pontuação por produção científica ainda não superada por seus pares, na carreira de Pesquisador Científico do Estado de São Paulo. Orientou mais de 30 dissertações de mestrado e 19 teses de doutorado, numa época em que pesquisador científico não tinha por norma nem obrigação, atuar como docente. Dr Álvaro integrava o quadro de professores dos Departamentos. de Fitopatologia da Esalq-Usp, da Unesp, e da Unicamp. 133


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Assim como todos os seus orientados, também passei longas horas em preparo da tese, nos finais de semana, na sua chácara, na “Praia Azul” de Nova Odessa- SP, e após a venda dessa chácara, em seu apartamento em Campinas. Éramos sempre saudados pela sua esposa Jean Relly Costa, na língua inglesa ou em português, mas com forte sotaque inglês, pois era original da Filadélfia, Nova Jersey (EUA). Dr. Álvaro a conheceu na biblioteca da Princeton University (EUA), onde ela trabalhava como bibliotecária. Dr. Álvaro recebeu convites para sair do IAC, tanto de universidades nos EUA, como de institutos de pesquisa na Alemanha, inclusive da FAO, declinando-os sempre para não deixar a Seção de Virologia e não interromper seus planos de expansão da Seção e projetos em andamento e, seus inúmeros colaboradores (pesquisadores, extensionistas, pós-graduandos), do próprio IAC, de outros institutos e de universidades do Brasil e do exterior. Como Dr. Alvaro e Dona Jean não tiveram filhos, isto explica o enorme interesse que tinha por seus discípulos, acompanhando a evolução de cada um, e tratando-os como “colegas-amigos-filhos”. Tal dedicação faz-nos afirmar que Dr. Álvaro foi, de forma direta ou indireta, “o pai, o avô e bisavô” da implantação e disseminação da Ciência da Fitovirologia, a nível nacional e internacional. Em 2001, a SBFito, acolheu em assembleia, o “Troféu Bota do Álvaro Santos Costa” (foto), por mim idealizado, em tributo à sua vida e obra. Trata-se de uma réplica da bota que ele usava em seu trabalho, esculpida em bronze no tamanho original, e fixada em uma plataforma de granito. Considerado o prêmio máximo no meio científico, esse Troféu já foi outorgado à 18 fitopatologistas. Dentre os principais prêmios e títulos honoríficos recebidos, destacamos os seguintes: Prêmio Princeton Chapter, 1943; prêmio em concurso de monografia do Ministério da Agricultura, 1946; eleito "Fellow" da American Association for the Advancement of Science (1957); certificado de mérito do U.S. Department of Agriculture, 1967; "award of merit" da American Phytopathological Society, 1972; medalha do jubileu de prata da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, 1973; Engenheiro Agrônomo do Ano pela Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado de São Paulo, 1974; prêmio "Frederico de Menezes Veiga", da EMBRAPA, 1975; membro titular fundador da Academia de Ciências do Estado de São Paulo, 1975; prêmio "Destaque " da Sociedade Nacional de Agricultura e "Destaque" de A Lavoura, 1978; recebeu o Prêmio Paulista de Fitopatologia pelo Grupo Paulista de Fitopatologia (GPF), em 1979; prêmio Summa Phytopathologica, 1980; diploma de Honra ao Mérito da Associação Brasileira de Estudos Técnicos da Agricultura, em 1980; medalha do CNPq por colaboração prestada, 1981; prêmio Arnaldo Gomes de Medeiros pela Sociedade Brasileira de Fitopatologia, 1982; Homenagem da Sociedade de Olericultura do Brasil, 1984. Um último prêmio que lhe fora outorgado, mas que por motivos de saúde não pode viajar a Brasília para receber das mãos do Exmo. Presidente da República Fernando H. Cardoso, foi o das Medalhas com Insígnias da Ordem Grã Cruz, mais alta categoria dessa comenda, 134


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

outorgada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Dr. Álvaro faleceu, poucos dias após, em 18-08-1998. Empenhei-me pessoalmente para que esse nobre e honroso prêmio fosse entregue, aqui no IAC, à viúva dona Jean. Consegui esse intento com apoio então Presidente do CNPq, Dr. Lindolfo Carvalho Dias, o qual veio ao IAC representando o MCT, e entregou oficialmente as medalhas à viúva, Dona Jean. A enorme e linda pedra, naturalmente chanfrada, assentada ao lado direito da entrada do prédio principal da “Seção de Virologia - IAC”, conseguida com apoio do Dr. Luiz Henrique Carvalho, então Chefe da Fazenda Santa Elisa, é um marco nobre e forte da importância do Dr. Álvaro, simbolizando a vida e todo seu legado.

135


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

VIII – Instituição Homenageada por Renato Ferraz de Arruda Veiga

Instituto Agronômico do Paraná O Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) é uma entidade vinculada à Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Paraná, desde 1972, em Londrina, Estado do Paraná. Como órgão de pesquisa agropecuária, sua missão é de “prover soluções inovadoras para o meio rural e o agronegócio do Paraná”. Tem como finalidades básicas a pesquisa técnicocientífica, a difusão de conhecimento e a transferência de tecnologia para o desenvolvimento do Estado. Complementando sua atividade de pesquisa, o IAPAR promove a difusão da tecnologia gerada, tanto diretamente, através de dias de campo, treinamentos, publicações, palestras etc., como indiretamente, através dos órgãos de assistência técnica e extensão rural, oficiais ou não. O IAPAR conta, também, com unidades descentralizadas - os Polos Regionais de Pesquisa - para facilitar a execução da pesquisa regional. ESTRUTURA DE BASES FÍSICAS. Conta com uma infraestrutura composta de uma Sede, em Londrina, cinco unidades regionais (Curitiba, Ponta Grossa, Paranavaí, Pato Branco e Santa Tereza), 19 Estações Experimentais, quatro Unidades de Beneficiamento de Sementes (UBSs), localizadas nas Estações Experimentais de Cambará, Palotina, Ponta Grossa e Londrina, contando esta última também com uma Unidade de Beneficiamento de Café, e 23 estações agro meteorológicas e 25 laboratórios de diferentes áreas de especialidade. Também utiliza dados de outras 37 estações do SIMEPAR - Sistema Meteorológico do Paraná. Mantém, ainda, um centro de treinamento equipado com auditório e alojamento em Londrina. Sua importância para a área de Recursos Genéticos tem sido muito grande desde a sua criação, possuindo relevantes BAG e formando inúmeros especialistas nesta atividade em seus quadros, além de realizar eventos nacionais e internacionais no tema.

Sinceros agradecimentos da Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos, ao IAPAR, pelo relevante apoio que deu e vem proporcionando a área de Recursos Genéticos do Brasil. 136


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

VIII – Homenagens Póstumas Hipólito Assunção Antonio Mascarenhas (1930 – 2017)

Por Elaine Bahia Wutke & Renato Ferraz de Arruda Veiga PqCs do Instituto Agronômico de Campinas – IAC/APTA

Hipólito graduou-se Eng. Agr. pela Universidade de Delhi, na Índia (1954), a seguir veio trabalhar no Brasil na iniciativa privada, revalidando seu título na ESALQ/USP, Piracicaba – SP (1961). Desde então se tornou Pesquisador Científico, do Instituto Agronômico, em Campinas - SP, onde permaneceu por 38 anos até a compulsória como PqC VI, em 2000. A partir de então, atuou no IAC por mais 12 anos, como servidor voluntário no Centro de Grãos e Fibras, colaborando em experimentos e publicações técnicocientíficas. Me. em Ciências pela Universidade da Flórida, em Gainesville – USA (1970), e Dr. em Agronomia, pela ESALQ/USP (1972).

Tivemos a honra de ter trabalhado ao seu lado no IAC (Elaine pela Seção de Leguminosas e Centro de Grãos e Fibras e Renato pela Seção de Botânica Econômica e Centro de Recursos Genéticos), e com ele aprendido muito. Neste ano ele completaria seus 87 anos de vida, tendo pesquisado as leguminosas, sobretudo, em adubação, fertilidade do solo, rotação de culturas e comportamento varietal. Atuou com as culturas do feijão e grão-de-bico, dentre outras graníferas e adubos verdes mas, principalmente, com a da soja. A atuação de Hipólito foi relevante em experimentação com adubação e manejo da soja, demonstrando a viabilidade econômica dessa cultura em solos de cerrado, dos mais arenosos aos mais argilosos, colaborando para o lançamento dos cultivares Pelicano, IAC-2 e Santa Rosa, utilizados com sucesso no desbravamento do cerrado nos anos de 1959 a 1972, sendo os dois últimos decisivos no aumento de produtividade da cultura. Recomendou a adubação adequada com potássio para a prevenção de doenças fúngicas; determinou benefício econômico para o agricultor de soja pelo aproveitamento da adubação aplicada em culturas antecedentes e também na produtividade das culturas de milho, arroz e trigo após dois anos de soja bem adubada, apenas com a substituição de parte da adubação nitrogenada necessária. Cabe ressaltar que, embora destacada como informação impactante em tempos mais recentes, em 1967 Hipólito já afirmava não ser necessária a aplicação de nitrogênio em cobertura para o aumento da produtividade em soja, desde que as sementes fossem inoculadas com rizóbio eficaz. Colaborou, ainda, para o estabelecimento do zoneamento agroclimático para a cultura da soja e determinou efeito positivo do cultivo de leguminosas nos rendimentos físico e econômico da cana-planta, dentre outros estudos. 137


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Participou do lançamento de 18 novas cultivares dessa leguminosa, escreveu 21 capítulos de livros; publicou 233 trabalhos em revistas científicas, 62 trabalhos de divulgação técnicocientífica, e mais de 30 em anais de Congressos e Reuniões. Foi Bolsista do CNPq por mais de 30 anos, tendo coordenado 10 projetos de pesquisa com recursos externos. Participou de 10 bancas de Mestrado e Doutorado, além de ter sido Assessor Ad. Hoc. da FAPESP e CNPq e revisor de trabalhos científicos para inúmeras revistas científicas nacionais. Colaborou também como membro de várias comissões da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA) e do Ministério da Agricultura, especialmente na planificação e na resolução de problemas relacionados à cultura da soja. Recebeu diversas homenagens como o “Diploma de Honra ao Mérito” pela SAA, em 1991, pelos relevantes serviços prestados à agricultura paulista. Homenageado pelo Governador do Estado de São Paulo, em1994, com o “Diploma de Honra ao Mérito”, pelos seus trabalhos com soja. Recebeu homenagem, em 1998, em Londrina, PR, durante a XX Reunião de Pesquisa de Soja da Região Central do Brasil, pelos relevantes serviços prestados à pesquisa brasileira de soja. Também recebeu o “Diploma de Honra ao Mérito” pelos relevantes serviços prestados à pesquisa sobre calagem e adubação da soja no Vale do Paranapanema, em São Paulo, conferido durante o Primeiro Encontro de Soja de Assis, SP, em 1999, e o Prêmio IAC 125 anos, em 2012, por sua atuação como pesquisador colaborador aposentado. Em seu estilo franco e direto, orientava os estagiários em seu futuro profissional, providenciando cartas de recomendação aos futuros orientadores nas Universidades e cobrava dos colegas tanto a leitura quanto a respectiva opinião sobre seus artigos publicados. Assessorava, sem remuneração, os sojicultores e técnicos de cooperativas, servindo de exemplo positivo para mim e todos que o conheciam. Nosso muito obrigado por tudo, Hipólito, principalmente pelo que fez pelo nosso IAC e pela agricultura brasileira. Bibliografia WUTKE, E.B; ROSSETTO, C.J.; NOVO, M.C.S.S. Hipólito Assunção Antonio Mascarenhas: uma vida a serviço da pesquisa agrícola no IAC. Piracicaba: POTAFOS, 2002, p.6. (Informações Agronômicas, n.97, Encarte Técnico).

138


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Shiro Miyasaka (1924 – 2017) “O Pai da Soja no Brasil”

Por Elaine Bahia Wutke & Renato Ferraz de Arruda Veiga PqCs do Instituto Agronômico de Campinas – IAC/APTA

Dr. Shiro Miyasaka nasceu em Hokkaido (Japão) imigrando para o Brasil com oito anos. Casou-se com Kazuco Sakiara Miyasaka (Foto 2), história que começou quando Shiro foi proferir uma palestra na escola em que ela estudava. Como ela perdeu a apresentação sobre o cultivo da soja, que era de seu interesse, optou por escrever ao professor, surgindo assim um extremo amor entre ambos, namorando, noivando, e casando em 1 ano. Desta união nasceram cinco filhos, 11 netos e um bisneto. Profissionalmente graduou-se Eng. Agr. pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ/USP) em Piracicaba – SP (1951). Tornou-se Pesquisador Científico do Instituto Agronômico em Campinas – SP (IAC/APTA). Em 1959, se tornou o primeiro Nikkei a obter o Doutorado em agronomia no Brasil, também pela ESALQ. No IAC foi o primeiro pesquisador da soja, o pioneiro em todo o País (hoje o maior exportador de soja do mundo), e ainda introdutor da Agricultura Orgânica no Brasil. Ainda foi o Chefe da Seção de Leguminosas e da Assessoria Técnica do IAC. Foi sócio fundador da Sociedade Brasileira de Genética, e da Associação dos Produtores de Agricultura Natural. Consultor do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, da FINEP, e da Associação Mokiti Okada Internacional. Professor de Agricultura Natural, no Colégio Agrícola Cooper Rural, em Jacareí, da OISCA, e Professor visitante na Universidade de Tsukuba-Japão. Publicou inúmeros trabalhos científicos e vários livros, como: “A soja no Brasil”, “Curso de Agricultura Natural”- Manual e vídeo, e “Manejo da Biomassa do Solo Visando a Sustentabilidade da Agricultura Brasileira”. Coordenou eventos, como: a Primeira Reunião Nacional de Feijão, que contou com mais de 700 pesquisadores e técnicos do Brasil e de outros países (1971).

139


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Dentre várias homenagens e prêmios recebidos está: Prêmio “Kiyoshi Yamamoto”, da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social”. Em 2008 foi homenageado pela APTA por sua contribuição à agricultura brasileira (Foto 1). Foi incluído dentre os revolucionários da agricultura, como uma das 25 personalidades que mudaram o rumo da agropecuária no Brasil, pela Revista Globo Rural, (1/10/2010) Com a soja, em 1952, realizou uma sequência de hibridações em conjunto com o melhorista norte-americano Leonard F. Williams. Das populações segregantes desenvolvidas pelos métodos genealógicos e de população (bulk), surgiram as cultivares IAC-1, IAC-2, Santa Rosa e Industrial. Na década de 70 essas duas últimas ocuparam expressiva participação na área de cultivo da soja em todo o país. O Santa Rosa chegou até mesmo a liderar, no mesmo período, a produção brasileira de sementes. Em 1957, identificou as cv. Santa Maria e Aliança Preta como as menos sensíveis ao fotoperiodismo e à baixa temperatura, se tornando as precursoras de outras cultivares adaptáveis às regiões de baixa latitude ou para semeadura durante as estações de outono e inverno. Atualmente ainda ministrava aulas no curso on line de Agricultura Natural, pela Universidade de Viçosa. No ano passado, com 92 anos, virou notícia ao se colocar ao lado dos demais pesquisadores científicos da ativa, em evento da Associação dos Pesquisadores Científicos do estado de São Paulo, na cidade de São Paulo, apoiando a luta de seus colegas.

140


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

Jaison Pereira de Oliveira (1965 – 2017) Por Renato Ferraz de Arruda Veiga

Eng. Agr. pela Universidade Federal de Goiás (1992), Me. em Agronomia pela Universidade Federal de Goiás (1997) e Dr. em Agronomia, área de concentração genética e melhoramento de plantas pela Universidade Federal de Goiás (2003). Dr. Jaison era pesquisador na Embrapa Arroz e Feijão, área de Recursos Genéticos de Feijão comum (Phaseolus vulgaris L.). Curador do Banco Ativo de Germoplasma de Feijão, onde desenvolvia pesquisas em Recursos Genéticos, coletas de acessos tradicionais, pesquisa em pré-melhoramento, Biometria aplicada a Recursos Genéticos de plantas (arroz e feijão). Nativo de Ituiutaba, Casado desde 2.000 com Cristiani Pereira.

Este agrônomo teve toda sua base científica alicerçada na Universidade Federal de Goiás, se especializando no mestrado com o tema Estudos Citogenéticos em Plantas Nativas do Cerrado, tendo por orientador o Dr. Almiro Blumenschein, com apoio da CAPES, enquanto no Doutorado seu tema foi Avaliação da Qualidade Nutricional do Grão em Populações de Milho (Zea mays) de Alta Qualidade Proteica e Seus Cruzamentos, sob a orientação do Dr. Lázaro José Chaves. Logicamente participou de muitos cursos, dentre eles destaca-se o de Capacitação em Conservação ex situ de Recursos Genéticos realizado no Centro Internacional de Agricultura Tropical, CIAT, Colômbia, em 2010. Desde a formatura, em 1992, permaneceu ligado à UFG, na Escola de Agronomia, quer seja inicialmente através de monitoria quer seja posteriormente como professor, ensinando na Graduação sobre Recursos Genéticos, Culturas da Soja, Algodão, Feijão, Amendoim, e Gergelim, além de ter sido bolsista do CNPq. Ainda nas Linhas de Pesquisa em Estatística e Experimentação Zootécnica, Melhoramento Genético Vegetal, Genética e Melhoramento de Milho para qualidade nutricional de grãos, Análises Laboratoriais e Físico-química, Citogenética de plantas nativas do cerrado, Estatística e Informática, Bioestatística aplicada à Farmácia, e Estatística Experimental, até o ano de 2007, quando assumiu como Pesquisador-A da Embrapa Arroz e Feijão. Na Embrapa trabalhou com a cultura do arroz, mas se dedicou principalmente ao feijão, em especial na área de Recursos Genéticos, na linha de caracterização com o BAG. Publicou 32 artigos científicos, um livro: ABREU, A. G. & DE OLIVEIRA, J. P. . Arroz do plantio à colheita. 1. ed. Viçosa: Editora UFV, 2015. v. 1. 242p , 10 resumos expandidos em congresso, 32 resumos em congressos, duas publicações técnicas, uma em jornal, nove publicações técnicas de mestrado, seis trabalhos de conclusão de curso de graduação. Participou 141


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

como titular em quatro bancas de mestrado e três de doutorado, orientou três teses de mestrado e uma de doutorado, e da organização do 10 Congresso Nacional de Pesquisa de Feijão, 2011. Participando de eventos com Recursos Genéticos que pude conhecê-lo e admirar o seu trabalho. Entusiasta da área, não perdia um evento neste tema, tendo orientado muitos colegas na graduação e pós-graduação, seguindo esta mesma linha de pesquisa. Foi assim que neste ano tive o prazer de revê-lo, mesmo que virtualmente, em uma banca de tese, ele na Embrapa Arroz e Feijão, em Santo Antônio de Goiás-GO e nós na UNESP Botucatu-SP, com sua orientada e do Prof. Rogério Peres Soratto, mesmo assim foi muito bom ter tido a oportunidade de reencontrá-lo ainda neste ano de 2017. Sua esposa se manifestou quando consultada sobre a homenagem: “Obrigada, ele de onde estiver estará com o coração cheio de amor pelo carinho dos amigos. Eu como esposa, amiga e companheira, agradeço pela homenagem. Deus os abençoe” Cristiani. A Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos também se manifestou: “É com profundo pesar que trazemos a triste notícia do falecimento de nosso querido amigo/sócio...parte deixando-nos muitas lições de profissionalismo e ética...” SBRG. Fica aqui registrado o vazio provocado pela ausência do amigo, colega e professor, que seu espírito continue nos orientando na profissão!

142


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos Genéticos

IX – Apoio

143


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos GenĂŠticos

X – Normas da Revista

144


Revista RG News 3 (3) 2017 - Sociedade Brasileira de Recursos GenĂŠticos

Fale conosco Revista RG News E-mail: revistargnews@recursosgeneticos.org

Sociedade Brasileira de Recursos GenĂŠticos - SBRG E-mail: sbrg@recursosgeneticos.org Acesse nosso site: www.recursosgeneticos.org

145


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.