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tive fome e não me

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gol de bicicleta?

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TIVE FOME E NÃO ME DESTES DE COMER

A fome é visivelmente uma produção da desigualdade social, resultado de um modelo de desenvolvimento capitalista, onde a sociedade está dividida em classes. No Brasil ela é histórica e toma formato crônico e coletivo, além de possuir significados distintos, tanto na coletividade como no universo particular das pessoas atingidas, como Maria do Carmo Soares Freitas descreveu em sua publicação – Agonia da Fome, em 2003. É um fato que fome e pobreza caminham de mãos dadas. Um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) em 2018, intitulado Síntese de Indicadores Sociais (SIS), revelou que a crise financeira dos últimos anos aumentou em 4,5 milhões o número de brasileiros vivendo em extrema pobreza, fazendo com que a desigualdade no Brasil atingisse nível recorde. Esse aumento significativo corresponde a 13,5 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha de extrema pobreza no país. O critério utilizado pelo IBGE na pesquisa foi o estabelecido pelo Banco Mundial para acompanhar a evolução da pobreza global que considera em situação de extrema pobreza aqueles que dispõem de menos de R$ 1,90/dia, o equivalente a aproximadamente R$ 145,00/mês para manutenção da vida.

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Com o crescimento da pauperização da população, consequentemente a insegurança alimentar também se mantém elevada, assim como o percentual de pessoas desnutridas e famintas, o que representa uma violação da dignidade humana e do direito social básico de alimentar-se, garantido no artigo 6º da nossa constituição federal. A Lei Orgânica da Assistência Social (Lei no. 8.742, 1993) prevê uma convergência de esforços, com ações integradas da iniciativa pública e da sociedade para garantir o atendimento às necessidades básicas (caput do art. 1º) como um caminho para o enfrentamento da pobreza, promoção da universalização dos direitos sociais (parágrafo único do Art. 2º) e efetivação da cidadania. É bem verdade que as responsabilidades imputadas à esfera pública nem sempre são cumpridas, mas isso não nos exime do cumprimento de nossos deveres como cidadãos. Somos corresponsáveis no socorro aos mais vulneráveis, diante da Lei dos homens e da Lei de Deus e não podemos fechar os olhos para a realidade que está diante de nós. Não se trata de assistencialismo ou paternalização de indivíduos, mas do reconhecimento de que a fome é gerada no berço das desigualdades sociais e para o combate à pobreza é necessário a garantia dos mínimos sociais para que as condições materiais não sejam impeditivas da prática cidadã daqueles que encontram-se em vulnerabilidade social. O próprio Jesus, durante o Sermão da Montanha descrito em Mateus 25.42, 44 e 45, chama nossa atenção para as necessidades básicas dos mais frágeis: “Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; [...] Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, [...] e não te servimos? [...] Em verdade vos digo que, quando a um desses pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim”. O nosso Senhor nos convida a olhar com sensibilidade, generosidade e responsabilidade para os que estão privados do suprimento de suas necessidades vitais, demonstrando sua preocupação e amor para com todos os necessitados e nos conferindo o compromisso de socorrê-los como se estivéssemos socorrendo a Ele próprio. Dessa maneira, Ele legitima a igreja não apenas como uma instituição filantrópica, mas também como um espaço de efetivação de direitos através do comprometimento de seus membros com um projeto de lealdade aos interesses das categorias empobrecidas. Capacitando, potencializando para a solidariedade, sentido de bem comum e finalmente para exigência de direitos. Neste sentido, a Igreja do Recreio segue na vanguarda oferecendo serviços de relevância no contexto onde está inserida. O CCH (Centro de Cuidado Humano) e o CASACAP (Centro de Ação Social Antonio Caldas Pinheiro), principais espaços de atendimento ao público vinculado à instituição, estão unindo forças para arrecadação e distribuição de alimentos durante a pandemia de Covid-19. De acordo com David Beasley, diretor do WFP (sigla em inglês) – Programa Alimentar Mundial da ONU, o “Relatório global sobre crise alimentar 2020” diz que 130 milhões a mais de pessoas passarão por fome extrema até o final do ano e a pandemia pode agravar a desnutrição e a fome em todo o planeta. O momento é oportuno para que a igreja demonstre através de suas ações o amor pelo qual nosso Mestre Jesus disse que seríamos reconhecidos como seus discípulos: “Nisto conhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (João 13.35) e também de proclamar o Evangelho através do nosso compromisso com o próximo.

andresa gouveia

assistente social voluntária no CCH andresa.gouveia@gmail.com

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